como produzir um homem: moda, saúde e máquina como … · autoria deve ser citada. para fins...
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Fernando Bagiotto Botton
Como Produzir um Homem: Moda, Saúde e Máquina como Formadoras da
Masculinidade na Curitiba Moderna
Primeira Edição
Curitiba PerSe 2012
PerSe
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Copyleft Este livro ou parte dele pode ser copiado e reproduzido desde que sua utilização seja para fins estritamente educacionais e/ou acadêmicos, a autoria deve ser citada. Para fins mercadológicos ou pessoais é necessária a autorização do autor.
Catalogação na publicação (CIP).Ficha catalográfica feita pelo autor
Projeto gráfico, capa e arte: Samantha de Sousa Imagens fotografadas: Fernando Bagiotto Botton Editora PerSe
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A presente edição é resultado das pesquisas realizadas no PET-História UFPR do ano de 2007 a 2010. O texto foi originalmente escrito para a monografia de conclusão do curso de Licenciatura e Bacharelado em História na UFPR e sofreu alterações para melhor se adaptar ao formato. Breves trechos desse texto foram publicadas nas revistas Luminária (União da Vitória), v. 12, p. 101-111, 2011 e Historiar (Porto Alegre) v. 2, p. 1-17, 2009.
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À Eni e Saulo pela mão À Viviane pelas letras À Ana Paula pelo papel À Roseli pelas linhas À Samantha pela imagem
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Conteúdo
Intro.) A MASCULINIDADE EM CONSTRUÇÃO: UM DESLOCAMENTO DE OLHAR-10 Cap. 1) SOBRE A CRIAÇÃO SOCIAL E HISTÓRICA DAS DIFERENÇAS SEXUAIS------23
1.1) Os ideais burgueses e a família como construtores da diferença sexual------24
1.2) A dimensão linguística da diferenciação sexual: Os discursos, a verdade, os saberes e os poderes --------------------------------------------------------------------------30 Cap. 02) A MODERNIDADE E A CIDADE, SUAS CRIAS E CRIAÇÕES -------------------40 2.1) Curitiba e sua sociedade no adentrar da modernidade -------------------------42 2.2) A idealização de uma cidade e a citatização de um ideal: a modernidade como um discurso intelectual, o intelectual como um discurso moderno.--------46 Cap. 03) DA CRIAÇÃO DISCURSIVA DO HOMEM MODERNO: OS ASPECTOS CONSTITUTIVOS DOS DISCURSOS DE MASCULINIDADE NOS PERIÓDICOS DA ÉPOCA----------------------------------------------------------------------------------------66 3.1) Estética em transformação: A moda como construtora de sujeitos masculinos ---------------------------------------------------------------------------------------------------------67 3.2) A saúde e a higiene: Discursos de corpos e almas ----------------------------------78 3.3) A beleza da vertigem e a potência da força: A maquinaria como metáfora da nova masculinidade ------------------------------------------------------------------------90 APONTAMENTOS FUTUROS --------------------------------------------------------------98 REFERÊNCIAS ------------------------------------------------------------------------------108
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Introdução) A MASCULINIDADE EM CONSTRUÇÃO: UM
DESLOCAMENTO DE OLHAR
A masculinidade, desde os estudos evolucionistas do
século XIX, vem sendo compreendida a partir de modelos
naturalistas que a interpretavam enquanto uma consequência
biológica da formação humana, ou seja, foi desejada como
puramente sexual-biológica. Com isso foi se institucionalizando
através dos discursos técnico-científicos – tanto na sociedade
quanto na academia – a concepção de que a personalidade e as
ações sociais dos homens seriam delimitadas por sua
aparelhagem física, e que a diferença entre os sexos era fruto de
uma estrutura natural e inquestionável.
O primeiro campo de estudos a questionar parte dessa
concepção naturalista foi a psicanálise. A tese freudiana do
Complexo de Édipo foi (e ainda é) uma crítica influente pois
criou a concepção de que a masculinidade é formada de acordo
com as relações familiares, especialmente quando a criança
deseja sexualmente o progenitor do sexo oposto e percebe o do
mesmo sexo enquanto seu rival. Nessa interpretação o
Complexo de Édipo só teria final quando o menino “reconhecer
seu papel” e abrir mão do desejo pela mãe, tendo acesso ao
mundo viril do pai e a todas as demais mulheres (BADINTER,
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1993). Também Lacan foi paradigmático na interpretação
psicanalítica da masculinidade quando seccionou a
interpretação do Complexo de Édipo em três tempos: o
primeiro é o relacionamento filho-mãe, o segundo é a entrada
do pai na relação e o terceiro é o declínio do Complexo pela
renúncia materna da criança através da identificação com o pai
(portador físico e simbólico do falo). Lacan também propôs a
tese de que o falo1 demanda uma carga de legitimidade,
afirmando o masculino (captador e portador do falo) sob as
demais sexualidades (que abrem mão do falo). Para o
psicanalista, a mulher também é possuidora de um falo
simbólico, e o ato de amar é a doação de algo que ela não tem, a
partir do momento que trava uma relação sexual com um
homem, abre mão do seu falo simbólico para legitimar o falo do
homem que possui o poder da linguagem para nomeá-la
“mulher” (LACAN, 2006). É notável a compatibilidade entre as
interpretações psicanalíticas de Lacan com os estudos de Peter
Fry (1982) no que tange à categorização do atributo de homem
através da “atividade” ou da “passividade” na relação sexual,
onde só é legítimo o homem que penetra, independentemente
qual corpo, podendo inclusive penetrar outro homem sem
macular sua masculinidade – já o penetrado perde o status de
“macho”. Trata-se de uma hierarquia de dominação e submissão
1 Por falo não se refere necessariamente o pênis, trata-se de um objeto simbólico.
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onde um índice de atividade\passividade permeia a definição
do “ser ou não” masculino.
O historiador Albuquerque Jr. criticou a interpretação
psicanalítica da masculinidade, uma vez que ela opõe a
experiência-de-ser-homem à experiência-de-ser-mulher,
reproduzindo uma visão contraposta e binária dos gêneros.
Muitos estudos feministas também lançaram questões à
interpretação psicanalítica, especialmente a freudiana, ao passo
que se baseia no pressuposto naturalizante de uma família
heterossexual, nuclear, monogâmica, legitimando um modelo
ocidental, heteronormativo e burguês de construção familiar
(CITELI, 2001).
A crítica feminista da segunda metade do século XX
também ressaltou a concepção essencialista de sexualidade ao
afirmar que os sexos não definem os comportamentos sociais,
mas sim os gêneros, que são construídos e delimitados cultural,
social e subjetivamente – de acordo com a clássica frase de
Simone de Beauvoir “não se nasce mulher, torna-se mulher”
(1970). Isso abriu espaço para que se pensasse na construção
social dos gêneros, questionando os papéis sexuais antes vistos
como “naturais”. A partir de então se desconstruiu o argumento
de que os comportamentos de gêneros são naturais, visão
defendida pelo discurso técnico-científico.
A pesquisadora Giffin (2005) aponta que os primeiros
estudos feministas recusaram a participação dos homens e dos
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“men studies” – pois além de estarem se consolidando enquanto
um campo delimitado – consideravam que os homens eram os
únicos beneficiados pelo sistema de gênero, assim, não eram
passíveis de serem estudados pela nova abordagem que
pretendia dar voz às mulheres.
Na história uma perspectiva semelhante também foi
adotada, a exemplo, pela historiadora Michelle Perrot (1998).
Sua acertada interpretação – de que o corpo feminino havia
sido enclausurado no espaço privado e que a historiografia
somente referiu-se ao espaço público – considerava que a
história não deu voz às mulheres, pois privilegiava a história
dos homens. Porém, sua abordagem da “história dos excluídos”
não problematizou a masculinidade justamente por considerar
que, enquanto unicamente dominantes, os homens nunca
poderiam ser considerados como dominados. Embora esse veto
do feminismo e da história dos excluídos tenha sido uma
demanda produtiva e até necessária para aquele contexto, a
própria estudiosa Giffin (2005) concorda que isso auxiliou na
consolidação de uma visão de mundo baseada na oposição
entre razão e emoção, objetividade e subjetividade, feminino e
masculino, reproduzindo uma ótica de gênero binária e
reducionista.
Os estudos acerca da masculinidade, embora modestos
desde as décadas de 50 e 60, acabaram ganhando relativa
proporção na década de 70 e se difundiram especialmente na
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década de 80 nos países anglo-saxões. Segundo Arilha (apud
CECCHETTO, 2004) já em 1979 somavam 1.300 trabalhos
acerca da masculinidade somente no Instituto Tecnológico de
Massachusetts (MIT). Tais estudos foram aceitos, assumidos e
impulsionados por uma ampliação e renovação no campo de
abordagem dos próprios estudos feministas. Com esses fatores,
cresceu o numero de homens dedicados à reflexão de sua
própria existência. Segundo Giffin (2005) – nesse momento –
houve um sentimento de culpa e arrependimento, onde o
homem foi (auto)avaliado como opressor nas relações de
gênero e poder. A violência se estabeleceu como uma discussão
privilegiada nessa ocasião, uma vez que foi entendida como um
poder coercitivo utilizado pelos homens para construírem suas
identidades e reproduzirem sua supremacia dentre os gêneros.
Em sintonia com algumas críticas advindas de estudos
psicológicos levantaram-se questionamentos quanto à
universalidade desta supremacia masculina declarada, uma vez
que se encontraram diversas incompatibilidades entre os
modelos de poder masculino e a vivência de inúmeros homens.
Além disso, surgiram teses baseadas em estudos qualitativos
apontando para um sentimento de fragilidade do homem frente
à violência, à frieza e ao sofrimento da construção social e das
expectativas acerca da virilidade masculina. Tais alegações
permitiram que se defendesse uma “Crise da masculinidade”
(CONNELL, 1995).
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Na década de 90 o sociólogo Pierre Bourdieu revisita o
argumento da “Dominação Masculina” (1997), na qual aponta
para a vantagem masculina tanto na força física, quanto na força
simbólica. Segundo sua tese, dentro do processo histórico
humano2 se instituíram e reproduziram determinadas relações
de violência simbólica, compartilhadas consciente ou
inconscientemente entre dominantes e dominados. Nesse
aspecto, as relações entre gêneros são por ele compreendidas
através do conceito de “trocas simbólicas” onde a mulher passa
a ser – dentro das relações sociais – objeto de troca,
determinada pelo interesse dos homens, reproduzindo o capital
simbólico destes homens e sua dominação masculina.
A polêmica se estabelece entre os estudiosos defensores
da “crise da masculinidade” e os que propõem a tese da
“dominação masculina”. De um lado as pesquisas apontam o
homem viril, propenso à utilização de violência física ou
simbólica – consciente ou inconscientemente – para manter seu
status de dominante. Do outro lado, as pesquisas apresentam o
homem sensível e vitimado pelos degradantes processos e
rituais de construção do ideal viril de masculinidade. Nesse
impasse encontra-se boa parte dos debates – muitos ainda
atuais – acerca da masculinidade.
2 Especialmente na sociedade dos berberes da Cabília, estudada pelo sociólogo.
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Algumas propostas foram apresentadas para superar
essa querela. Estudiosos brasileiros como Oliveira (2004),
acreditam que tais oposições devem ser relativizadas de acordo
com o estrato social. Para o autor, nos baixos estratos mantêm-
se a visão valorativa dos elementos constitutivos do discurso
masculino, diferentemente das crises presentes nos homens das
classes médias e altas, frequentadores de consultórios
psicológicos.
A historiografia brasileira, especialmente nos anos 90 e
atualmente, também procurou meios para a superação das
oposições criadas pelos debates acerca da masculinidade e suas
relações intergêneros. Albuquerque Jr. (2003) buscou
compreender a masculinidade a partir de uma perspectiva
singular: dentro do processo de formação identitária
regionalista do nordestino.
Já Matos (2001) mostra a necessidade histórica de se
relativizar a contraposição de “masculinidade dominante”
contra “masculinidade vitimada”. Para a pesquisadora:
Essa universalização impõe dificuldades de se trabalhar com a masculinidade, que varia de contexto para contexto, sendo, portanto, múltipla, apesar das permanências e hegemonias. Assim, sobrevém a preocupação em desfazer noções abstratas de “homem” enquanto identidade única, a-histórica e essencialista, para pensar a masculinidade como diversidade no bojo da historicidade de suas inter-relações, rastreando-a como múltipla, mutante e diferenciada no plano das configurações de práticas, prescrições, representações e subjetivações. (MATOS, 2001,47)
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Diante dessa afirmação podemos delinear uma
tendência historiográfica que trata a masculinidade de acordo
com a singularidade, a subjetividade e a multiplicidade. Embora
pareça cedo demais para tomarmos um campo historiográfico
das masculinidades enquanto constituído, tais estudos ainda
são escassos para alcançarmos um debate suficientemente
aprofundado. Especialmente na historiografia brasileira e
latino-americana, podemos afirmar – e isso parece unanimidade
dentre os historiadores – que as masculinidades não podem ser
estudadas, nem entendidas, por si só. Diversos outros fatores e
instituições sociais devem ser levados em conta nos estudos
masculinos, como etnia, classe social, nacionalidade, geração,
temporalidade, territorialidade, dentre diversos outros fatores
altamente relevantes e não devem ser suprimidos numa
pesquisa. Segundo Connell, “para entendermos o gênero,
precisamos constantemente ir além do gênero” (1995).
Devemos fugir de qualquer acusação binária ou reducionista ao
estudar esse assunto a partir da multiplicidade da existência de
diversas masculinidades e suas múltiplas composições.
Estabelecidas as posições no tabuleiro de xadrez
historiográfico, tentaremos construir uma interpretação que se
oponha tanto às concepções de masculinidade como um jogo de
valorações fixas e socialmente estabelecidas e dominantes
(BOURDIEU), quanto algo psicologicamente necessário para as
vivências individuais dos homens (BADINTER) e que os põem
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em estado de crise na contemporaneidade (CONNELL). Como
alternativa, trabalharemos alinhados à teoria queer onde o
gênero não existe como uma categoria natural ou independente
das construções linguísticas, onde as construções discursivas
antepõem qualquer tipo de atribuição de gênero à
materialidade do corpo. Com isso, podemos chegar à conclusão
óbvia de que a masculinidade também não existe enquanto uma
construção natural baseada nos corpos. Mas então, como
poderemos nos concentrar em um “objeto” de estudos como a
masculinidade sendo que ele escapa à própria classificação?
Há aqui a necessidade de firmarmos nossa posição
teórica: compreendemos o gênero como um deslocamento de
olhar, como uma crença social e linguística na existência de
fronteiras e, com isso, na criação performativa das próprias
fronteiras. Isso é válido tanto para os sujeitos do passado, que
tiveram que construir suas subjetividades a partir de tais
princípios, quanto para o pesquisador que lança um olhar
específico sobre o passado, pressupondo que a palavra
“homem” ao mesmo tempo que foi usada no sentido amplo de
“humanidade”, também delimita um homem compreendido
como possuidor de um gênero e de uma subjetividade, um
homem que crê na diferença entre “masculino” e “feminino”, e
justamente por isso age de acordo com suas prerrogativas.
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Devemos ser cautelosos ao perceber que há duas
grandes dimensões que se entrecruzam constantemente
quando tratamos do termo “masculinidade”: a dimensão
discursiva e a dimensão do acontecimento. A dimensão
discursiva é o campo dos modelos ideais, das formas desejadas,
assim pode-se pensar em “masculinidades hegemônicas” e
“masculinidades subordinadas” como conceitua Connell (1995).
Nossa posição teórica propõe que tais conceituações apenas se
aplicam no campo discursivo pois suas delimitações são
sobremaneira homogeneizadoras, abrangem uma psicologia
social e uma forma de controle do imaginário de uma sociedade
(ou “mentalidade”) inexistente em uma sociedade em que
indivíduos pensam e agem de forma diferente, descentralizada
e rizomática. Ainda assim não podemos reduzir a importância
da esfera discursiva e de suas homogeneizações se pensarmos
tal campo como uma base estratégica. Compreendemos que
intelectuais, instituições, equipes de redações, projetos
governamentais, e toda a parafernália que compõe os
“mecanismos da sexualidade” (FOUCAULT, 2010a) se utilizam
dessa esfera para planejarem e incitarem ações frente à
sociedade. Suas influências são múltiplas e todos os modelos de
masculinidade possuem aqui um objetivo político: a construção
de um sujeito/objeto do conhecimento que responda às
características desejadas pelos próprios “dispositivos” sociais.
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Por motivo de delimitação teórica e documental, frisamos que é
esse, e apenas esse, o campo que aqui nos interessa.
Isso justifica nossa opção por centrarmos nos discursos
de masculinidade, para que alcancemos a dimensão em que as
subjetividades são pensadas no plano do ideal, das estratégias e
dos projetos de sociedade apresentados por um “mecanismo da
sexualidade” (FOUCAULT, 2010a). Por isso optamos por utilizar
enquanto documentação os periódicos como revistas e jornais,
já que por seus anúncios e crônicas pretendemos detectar as
características dos discursos normatizadores da masculinidade
na “modernidade curitibana”.
Os periódicos principais que foram estudados são: O Dia
(1924) , Gazeta do Povo (1919) e Diário da Tarde (1909) e as
revistas ilustradas de conteúdo literário como O Paraná (1910),
O Olho da Rua (1910-1911) e Ilustração Paranaense (1927). A
tal documentação daremos ênfase às descrições, idealizações e
incentivos da masculinidade vista como ideal, ou seja, quais
tipos e formas masculinas os periódicos da época procuravam
modelar. Assim, utilizaremos um recorte cronológico que
abrange desde a última década do século XIX até a terceira
década do século XX, compreendendo um período que
convencionou-se chamar por “modernização” da cidade de
Curitiba A escolha pela utilização de anúncios publicitários e
mercadológicos se justifica pela riqueza de análise
proporcionada por elas, pois enunciavam discursos permeados
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por juízos morais, com descrições maniqueístas e imagens
sensacionalistas, se mostrando como um enunciado riquíssimo
em discriminação dos valores caros aos contemporâneos,
especialmente no tocante ao gênero.
Assim, decidimos definir os pontos norteadores de
nossa pesquisa. Trata-se de uma análise acerca do gênero e do
processo de modernização curitibano unida a um exercício de
análise do discurso sobre masculinidade a partir das crônicas e
anúncios. Com esse livro buscaremos interpretar qual o modelo
de homem e de masculinidade foi positivado pelos discursos
dos periódicos da época, assim pretendemos perceber quais
características deveria ter o homem considerado ideal para
aquela sociedade, o que desvendaria muitos aspectos a respeito
do conjunto de valores e visões de mundo que aqueles
discursos possuíam e pretendiam imprimir em seus leitores.
Para realizarmos uma discussão mais aprofundada e
marcar uma posição política e epistemológica no campo dos
estudos de gênero decidimos estudar no primeiro capítulo a
construção da barreira que separou os homens das mulheres
com a invenção moderna do gênero e de seu atrelamento ao
corpo. Trabalhamos com a dimensão discursiva e política que
permitiu a criação desse tipo de ideais.
Por compreender que o gênero foi uma construção
estabelecida a partir de um ideário de modernidade
procuramos no segundo capítulo contextualizar o processo de
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modernização curitibano enfatizando as influências na
construção das subjetividades, especialmente através da ação
dos intelectuais curitibanos que proferiram os discursos e
“traduziram” os ideários de progresso, futuro, modernidade e
com isso, um tipo específico de concepção de cidade e de
masculinidade.
No terceiro e último capítulo nos centramos na análise
da publicidade em busca das delimitações e valorações do que
seria um homem socialmente desejado ou indesejado. Tratamos
de três temas principais que consideramos constituintes da
ideia de masculinidade socialmente sancionada: a moda e o
elogio à estética corporal; a saúde como sustentáculo de uma
sociedade do trabalho; e a ode à máquina como o principal
modelo para a construção de corpos e de ações masculinas.
Através dessa análise podemos encontrar algumas valorações
do “homem” enquanto um sujeito/sujeitado de um ideário
muito específico e particular de modernidade.
Temos a noção de que esse livro não tem a pretensão de
esgotar o assunto, ao mesmo tempo também observamos que
podemos propor alguns apontamentos e proposições que, de
antemão, visam trazer alguma contribuição para a
historiografia de gênero e masculinidade.