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1 ESTUDOS INTERDISCIPLINARES PROPRIEDADE E DIREITO PENAL O PATRIMONIO CRIMINAL Elena Burgoa

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1

ESTUDOS INTERDISCIPLINARESPROPRIEDADE E DIREITO PENAL O PATRIMONIO CRIMINAL

Elena Burgoa

2

Tutela penal propriedade

o direito de propriedade

inserido na parte dos direitos económicos, sociais e culturais da CRP

art. 62º (Direito de propriedade privada)

―1. A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição‖.

1995- revis. CP- superou-se uma desigualdade sancionatória (entre crimes contra as pessoas e crimes contra o património) que conduzia a que o furto qualificado fosse punido mais severamente do que as ofensas corporais graves (denunciada pela Prof.ª TB)

3

Do texto CRP

resultam directamente

obrigações explícitas de incriminaçãoart. 117º, n.º 3,

e o 271º, n.º 1 CRP.

haverá obrigações implícitas de incriminar?

As ofensas graves à propriedade ―têm de ser punidas‖?

4

como REALIZA o CP a defesa, a tutela da propriedade?

sistematização dos crimes contra o património, que atende ao critério do bem jurídico protegido:

- Crimes contra a propriedade;

- Crimes contra o património em geral

- Crimes contra direitos patrimoniais

- Crimes agravados contra bens do sector público e cooperativo

5

Bem jurídico

de crimes contra a propriedade

a

crimes contra o património

6

qual será o conceito de património válido para o direito penal?

???

7

Provérbio popular (outros saberes)

―Ladrão que rouba a ladrão tem cem anos de perdão‖

Concorda?

Tem cem anos de perdão

ou uma bela confusão?

8

Conto ―Ali Babá e os quarenta ladrões‖

Ali Baba de Maxfield Parrish (1909).

Ali Baba (Arabe: علي بابا)

9

género literário

As histórias infantis como forma de consciência de mundo, é um encontro com uma forma de literatura, como oportunidade de reflectir sobre um elemento extra-jurídico

10

História"Todo mundo conhece a história de Ali-Babá‖.

O começo.... ―Era uma vez...‖

Há muito, muito tempo, numa cidade lá para os lados do Oriente, vivia Ali Babá....

Ali Babá deveria ser punido?

Porquê?

11

Conceito penal de património

- Concepção económica

- Concepção jurídica

- ― jurídica-económica

- ― pessoalista

V. conimbricense, pp. 277 e ss, a propósito c. burla

12

Sentido jurídico

conjunto de direitos ou obrigações patrimoniais

(independentemente de envolverem valor económico)

13

Ac. TRL 29-09-94:

Sumário:

―A existência do crime de furto não depende do valor do objecto subtraído; basta que se trate de coisa móvel alheia susceptível de relações jurídicas‖

14

Sentido económico

abrange as posições que envolvam valores patrimonialmente computáveis

(apesar de proibidas ou qualificadas de ilícitas pelo direito)

15

Sentido económico - jurídico

(justifica-se pelo princípio unidade do direito)

o património é constituído pela globalidade das ―situações e posições‖ com valor ou utilidade económica, detidas por uma pessoa e protegidas pela ordem jurídica ou, pelo menos, cuja fruição não é desaprovada por essa mesma ordem jurídica.

No conceito de património estão abrangidos os direitos subjectivos patrimoniais (a propriedade ou da posse), os lucros cessantes e demais expectativas de obtenção de vantagens económicas.

16

Face ao sentido económico-jurídico

o prejuízo a que alude o artigo 11º do Decreto-Lei nº454/91 (regime j. cheque sem provisão)

- deverá traduzir-se numa diminuição patrimonial, sofrida pelo portador ou beneficiário do cheque, já que este, dispondo de um título de pagamento, não vê satisfeito o seu crédito pela instituição bancária.

Mas o prejuízo criminalmente relevante pressupõe que ao portador seja conferido, pela ordem jurídica, odireito ao recebimento da quantia titulada pelo cheque, direito que pode resultar afastado face

á génese, eventualmente ilícita, da relação subjacente.

(por exemplo ......tráfico drogas, economia paralela)

17

Concepção pessoalista (funcional)

Relação entre as coisas ou elementos patrimoniais e o concreto titular

O património enquanto unidade estruturada para a realização da pessoa humana

Conteúdo de ―utilidade‖ em função interesses do titular

De forma pioneira, acolheu esta tese a STS 23 abril 1993 (Caso de la Colza)

18

Provérbio popular

―Achado não é roubado‖

Será verdade?

19

CC

Coisas susceptíveis ocupação (art. 1318.º CC)

Coisas móveis perdidas (art. 1323.ºCC):

Deve restituir ou avisar dono

Ou anunciar achado modo mais conveniente..., ou avisar as autoridades...

Porém, quando alguém encontra uma mala de dinheiro e devolve ao dono é notícia...

Porque? estava apenas cumprindo a Lei

20

Art. 209.º CP (Apropriação ilegítima em caso de acessão ou de coisa achada)

―1- Quem se apropriar ilegitimamente de coisa alheia que tenha entrado na sua posse ou detenção por efeito de força natural, erro, caso fortuito ou por qualquer maneira independente da sua vontade é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.

2- Na mesma pena incorre quem se apropriar ilegitimamente de coisa alheia que haja encontrado.

3- O procedimento criminal depende de queixa. É correspondentemente aplicável o disposto nos arts 206.º e 207.º‖.

21

Crimes contra a propriedade

Os crimes contra ao propriedade não determinam a transferência de propriedade, mas afectam, de algum modo o seu exercício. Em regra, supõem a perda de detenção e a constituição de uma nova detenção sobre uma coisa.

22

Crime de furto

- O furto é, por excelência, ―o‖ crime contra a propriedade.

- Bj- especial relação facto com a coisa – tutelando também a detenção ou mera posse....

- Estrutura concisa,

poucas palavras :

Subtrair, coisa, móvel, alheia......

- Rica problemática – cruzamento direito civil e penal

23

Quem furta não se torna proprietário, limita-se a subtrair a coisa.

Por isso, o crime de furto poderia ser considerado um crime de perigo: o proprietário continua a ser proprietário, só que não pode exercer as faculdades inerentes ao direito de propriedade.

24

O art.203º do CP

enuncia elementos que permitem compreender a fórmula geral de tutela do direito de propriedade pelo Direito Penal

―Quem‖

??

25

“subtracção”

em que consiste ??

qual é o momento – exacto - da subtracção??

- imprescindível operatividade dos tipos......(lugar e tempo, consumação, tentativa (desistência), causas justificaç....

26

Diversos entendimentos (ordem exigência crescente):

1- contrectatio – o agente toca a coisa.....

2- amotio – apreensão - o agente remove (desloca) a coisa...., constituição nova detenção...

3- ablatio - o agente transfira a coisa fora da esfera de domínio...., abandone local subtracção ....

4- illatio – o agente conserve a coisa em lugar seguro....em pleno sossego (ainda que transitoriamente...), ....indo, por ex. a sua casa....-posse pacífica coisa

27

Furto simples (art. 203.º CP)

(breve descrição típica....)

- elementos normativos expressos

coisa móvel alheia

- implícitos ?? coisa ....dotada de valor patrimonial?? - sentido económico -jurídico

*

Furto uso – veículo - (208.º)

―intenção restituição‖ – elemento implícito

28

Ac. TRP 26-04-06:

―Para efeitos do preenchimento do crime de furto, a quantia de € 1,29 é um valor relevante, não desprezível‖.

―Seguindo os ensinamentos .... que acima explanámos, diremos que as ―coisas‖ para que possam ser objecto do crime de furto têm de ter algum valor, embora mínimo, mas não desprezível, punindo a lei o ―facto‖ quando da sua prática resultar ―prejuízo‖ para o lesado. Ao contrário do defendido pela Exma. Juiz, não podemos partilhar o entendimento, que a quantia de 1,29 euros é uma quantia desprezível para a generalidade das pessoas‖.

29

art. 204.º CP (FQ) se distinguem dois níveis distintos de qualificação ou agravação:

O valor funciona como agravação

valor elevado- n.º 1

valor considerav. elevado, n.º 2

valor diminuto- desqualifica

= roubo, burla, ....

Valores objectivados (não subjectivos)

30

Problemas de quantificação Indeterminação

Limites ―fixados‖ legalmente/ou normativos ―objectivados‖:

- Quando não é possível quantificar o valor da coisa /prejuízo ??

- Na dúvida sobre o exacto valor da coisa ??

- - Na dúvida sobre se tem ou não valor ??

- Qual é o valor de furto de um cartão de crédito - Bilhete euro - milhões- …………. ??

31

Infidelidade (224.º CP)-

Administração danosa (235.º CP)

―art. 235.º - 1. Quem, infringindo normas de controlo ou regras económicas de uma gestão racional, provocar dano patrimonial importante.....

―importante‖

??

A definição dos limiares...

32

Furto qualificado1 — Quem furtar coisa móvel alheia:a) De valor elevado;b) Colocada ou transportada em veículo ou colocada emlugar destinado ao depósito de objectos ou transportada porpassageiros utentes de transporte colectivo, mesmo que asubtracção tenha lugar na estação, gare ou cais;c) Afecta ao culto religioso ou à veneração da memóriados mortos e que se encontre em lugar destinado ao cultoou em cemitério;d) Explorando situação de especial debilidade da vítima,de desastre, acidente, calamidade pública ou perigo comum;e) Fechada em gaveta, cofre ou outro receptáculo equipadoscom fechadura ou outro dispositivo especialmentedestinado à sua segurança;f) Introduzindo -se ilegitimamente em habitação, aindaque móvel, estabelecimento comercial ou industrial ouespaço fechado, ou aí permanecendo escondido com intençãode furtar;g) Com usurpação de título, uniforme ou insígnia deempregado público, civil ou militar, ou alegando falsaordem de autoridade pública;h) Fazendo da prática de furtos modo de vida; oui) Deixando a vítima em difícil situação económica;......

33

2 — Quem furtar coisa móvel alheia:

a) De valor consideravelmente elevado;

b) Que possua significado importante para o desenvolvimento

tecnológico ou económico;

c) Que por sua natureza seja altamente perigosa;

d) Que possua importante valor científico, artístico ou

histórico e se encontre em colecção ou exposição públicas

ou acessíveis ao público;

e) Penetrando em habitação, ainda que móvel, estabelecimento

comercial ou industrial ou outro espaço fechado,

por arrombamento, escalamento ou chaves falsas;

f) Trazendo, no momento do crime, arma aparente ou

oculta; ou

g) Como membro de bando destinado à prática reiterada

de crimes contra o património, com a colaboração de pelo

menos outro membro do bando

34

subtracção de “coisa móvel alheia”

O objecto do crime é uma coisa móvel alheia.

Qual é o conteúdo??

35

subtracção de...

- órgãos, sangue....

- energias (electricidade, sinal...)

- água

- informação (suportes informáticos), ....

são ―coisas‖ susceptíveis de ser furtadas?

36

―coisa móvel alheia‖

Mas o que é uma coisa móvel?

A noção é prevista no Código Civil (205.º CC)

A contrário....

com grande clareza: coisa móvel é a coisa não incorporada, directa ou indirectamente, no solo a título permanente.

37

O 203.º CP abrange a subtracção de árvores??

38

―Em data não concretamente apurada mas entre Dezembro de 2001 e 11 de Março de 2002, o arguido X mandou retirar do referido prédio rústico que sabia pertencer às assistentes, 32 carvalhos médios, 4 pinheiros grandes e um pinheiro médio, tudo com um valor de mercado de 1.025 €.

Efectivamente o arguido X vendera estas árvores a J.,..., ignorando o comprador que as mencionadas árvores lhe não pertenciam.O arguido agiu com o intuito de despojar o prédio das assistentes das referidas árvores, vendendo-as como se de coisa sua se tratasse e com o propósito também conseguido de ficar para si com o que lhe correspondia do preço da venda efectuada‖.

39

Ac. TRC 31-10-07 –

Considera a existência crime FQ (??):

I- A noção de coisa para o direito penal tem mais o sentido que o comum das pessoas lhe empresta do que a noção jurídica extraída do art.º 202º do Código Civil.

II- Daí que uma árvore possa ser objecto dum furto, para o que basta desligá-la do solo, tal como podem ser objecto de furto as partes integrantes ou componentes de coisas imóveis bastando delas separá-las materialmente.

40

Assim, em Direito Penal, o conceito deve ser compreendido

numa perspectiva funcional, orientada

teleologicamente:

podem ser objecto do crime de furto todas as coisas originariamente móveis, mas também todas as coisas imóveis que possam ser transformadas em móveis e subtraídas, como as árvores.

41

―coisa móvel alheia”

-o caso do furto de coisa comum...

-das coisas em compropriedade

- bens dos cônjuges...... ??

**

Suponha que estando em curso acção de divórcio um cônjuge retira certos objectos (quadros valiosos....) da residência do casal.

42

A exigência de que a coisa seja alheia, implica que ela não seja do agente do crime, no todo ou em parte.

Assim, estando em curso uma acção de divórcio, a subtracção de um bem que integre o património comum não constitui furto.

43

―Os bens comuns do casal, enquanto subsistir tal comunhão, não têm a natureza de coisa alheia em relação a qualquer dos cônjuges, não podendo por isso ser objecto do crime de furto‖.

(TRP- 16-3.05)

44

A intenção de apropriação constitui um elemento subjectivo especial que acresce ao dolo.

O dolo de furto requer, nos termos gerais, que o agente saiba que a coisa é alheia e queira subtraí-la – a título de dolo directo, necessário ou eventual (artigo 14º do CP).

Mas exige-se ainda que o agente se pretenda comportar em relação à coisa como se fosse seu proprietário, exercendo as faculdades inerentes a esse direito. O agente não se torna titular da coisa em sentido jurídico, salvo se ocorrer a usucapião, pelo que não se exige, objectivamente, a apropriação.

Trata-se de um crime incongruente - tipo subjectivo é mais extenso do que o tipo objectivo.

45

Crime de abuso de confiança

o agente apropria-se de uma coisa alheia que lhe foi entregue por título não translativo de propriedade.

Continua a não haver uma apropriação em sentido jurídico, mas o agente passa a comportar-se como proprietário da coisa

- inversão título posse

CPEsp nomen iuris- ―apropriación indebida‖

46

Abuso de confiança

1 — Quem ilegitimamente se apropriar de coisa móvelque lhe tenha sido entregue por título não translativo dapropriedade é punido com pena de prisão até três anos oucom pena de multa.2 — A tentativa é punível.3 — O procedimento criminal depende de queixa.4 — Se a coisa referida no n.º 1 for:a) De valor elevado, o agente é punido com pena deprisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias;b) De valor consideravelmente elevado, o agente é punidocom pena de prisão de um a oito anos.5 — Se o agente tiver recebido a coisa em depósitoimposto por lei em razão de ofício, emprego ou profissão,ou na qualidade de tutor, curador ou depositário judicial, épunido com pena de prisão de um a oito anos.

47

―Os bens comuns do casal não são coisa alheia para efeitos do art. 205.º CP‖

(Ac.TRP 07)

O marido, administrador investimentos casal

procedeu ao levantamento das economias do casal no montante 241.081 Euros...;

Sendo proprietário...; não lhe tinham sido entregue por título não translativo da propriedade...

48

Terá de haver dados objectivos que comprovem que o agente quis apropriar-se da coisa

........

Nem sempre será fácil.

Na prática, este crime (Ab. confiança) só é punido quando o agente adopta uma conduta com um significado claro, como a tentativa de vender a coisa ou a recusa de a devolver....

49

Identificação dos títulos abrangidos ??

A ―BANCO Leasing, SA‖ apresentou queixa contra A com base no contrato de locação financeira por efeito do qual a queixosa locou à denunciada um veículo automóvel da marca..., no valor de 20.000.00 €.

Porém, o contrato veio a ser resolvido por não ter cumprido o pagamento pontual das rendas, que deixaram de ser pagas a partir da 19º renda. A queixosa resolveu o contrato, nos termos das respectivas condições e legislação aplicável ao mesmo, e em resultado dessa resolução e das obrigações dela decorrentes, ficou a denunciada obrigada a restituir o veículo locado. Tal não veio a suceder, pelo que a queixosa accionou os meios legais e judiciais permitidos...O veículo continua sem ser restituído..., pelo que a queixosa considera estar a denunciada incursa no crime de abuso de confiança, p.p. pelo art.º 205º do C. Penal

?? Aprecie a procedência queixa

Se a obrigação entrega não resulta do título mas do incumprimento, fora da abrangência do tipo.....

50

Crime de furto de uso de veículo (208.º CP)

―quem utilizar automóvel ou....sem autorização de quem de direito.....‖

Assim, se alguém subtrai um automóvel alheio sem intenção de apropriação comete um furto de uso.

Tutela fragmentada DP

Por que razão existe este crime?

Crime de roubo (210.º CP) – crime pluriofensivo

51

Crime de dano (212.º-213.º CP)

representa

a lesão mais irreversível do direito de propriedade

a coisa é destruída no todo ou em parte

52

Merece atenção a incriminação prevista no

D-L 28-84- crimes contra a economia:

Art. 32.º Destruição bens próprios com relevante interesse economia nacional

Ultrapassa o estritamente patrimonial, relativização direito propriedade - função social

*

Propriedade imobiliáriaArt. 215.ºCP (usurpação coisa imóvel) – apenas as

formas graves (violentas); as outras formas direito civil suficiente

Art. 216.ºCP (alteração marcos) – frequente meios rurais...

53

Paradigmático dos crimes contra o património

Crime de Burla art. 217º e ss. CP.

a jurisprudência em matéria de burla

constituiu uma amostra completa e muitas vezes pitoresca da sociedade.

Traduzem o reflexo das grandes particularidades da nossa época – interesse sociológico/antropológico

54

Artigo 217.º

Burla

1 — Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro

enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano

sobre factos que astuciosamente provocou, determinar

outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a

outra pessoa, prejuízo patrimonial é punido com pena de

prisão até três anos ou com pena de multa.

2 — A tentativa é punível.

3 — O procedimento criminal depende de queixa.

4 — É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos

206.º e 207.º

55

Artigo 218.º

Burla qualificada

1 — Quem praticar o facto previsto no n.º 1 do artigoanterior é punido, se o prejuízo patrimonial for de valorelevado, com pena de prisão até cinco anos ou com penade multa até 600 dias.2 — A pena é a de prisão de dois a oito anos se:a) O prejuízo patrimonial for de valor consideravelmenteelevado;b) O agente fizer da burla modo de vida;c) O agente se aproveitar de situação de especial vulnerabilidadeda vítima, em razão de idade, deficiência oudoença; oud) A pessoa prejudicada ficar em difícil situação económica.3 — É correspondentemente aplicável o disposto nosn.os 2 e 3 do artigo 206.º4 — O n.º 1 do artigo 206.º aplica -se nos casos do n.º 1e das alíneas a) e c) do n.º 2.

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- elementos do crime de burla

A conduta astuciosa do ―burlão‖ motiva o erro ou engano; em consequência do erro ou engano, a vítima passa ao acto de que resulta o prejuízo patrimonial.

- é uma forma evoluída de captação do alheio...

- a sagacidade do agente comporta uma regra de "economia de esforço‖....

Provérbio ou máxima: ―O prazer do inteligente é fazer de idiota perante um idiota que se faz de inteligente‖

- linha divisória entre a fraude, constitutiva da burla, e o simples ilícito civil - Fraude Civil versus Fraude Penal

57

Situações atipicidade

―na verdade, nos negócios, em que estão presentes mecanismos de livre concorrência, o conhecimento de uns e o erro ou ignorância de outros, determina o sucesso, apresentando-se o erro como um dos elementos do normal funcionamento da economia do mercado‖ ....‖é comum nas transacções comerciais civis ou comerciais certa malícia entre as partes...que procuram efectuar uma operação mais vantajosa‖

58

....‖ Não são dolosos, quer para efeitos penais quer para efeitos civilísticos, as sugestões ou artifícios usuais, do erro, quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da lei, da estipulação negocial ou daquelas concepções‖

(Ac. STJ 07)

59

Art. 235.º CP (Administração danosa)

―1. Quem, infringindo normas de controlo ou regras económicas de uma gestão racional, provocar dano patrimonial importante.....

2. A punição não tem lugar se o dano se verificar contra a expectativa do agente‖.

60

o pb dos actos de gestão que impliquem riscos -negócios de risco - êxito/insucesso

Aventuras especulativas......

concessão créditos com riscos elevados.....

Conduta típica?

Atípica quando a conduta se mantém nos limites da ―política de risco‖ definida pelo titular do património.

―normas prudenciais‖

―balizas impostas pela natureza da empresa‖

―diligente homem de negócios‖

-------Áreas risco permitido – atipicidade gestores ou administradores

Aliás, o risco é uma dimensão da actividade económica....

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Cláusula prevista no n.º 6 do art. 379.º CVM:

―O disposto neste artigo não se aplica às

operações efectuadas pelo Banco Central Europeu, por um Estado, pelo seu banco central ou por qualquer outro organismo designado pelo Estado, por razões de política monetária, cambial ou de gestão de dívida pública, nem às operações de estabilização de preços, quando sejam efectuadas nas condições legalmente permitidas‖.

62

Fáceis são de compreender estas cláusulas..

Trata-se de impedir que o direito penal seja um contra-estímulo á indispensável assunção risco

no âmbito da vida negocial, económica....

63

Modalidades autónomas ―burla‖

- Burla informática- abrange situações não

enquadráveis crime clássico – sem estado erro....;

Relevantes sociológicamente (frequência):

- prestação serviços/transportes

- seguros

- trabalhadores

- ......................

64

A (in)correcta compreensão crime clássico burla

- Possibilidade de Burla por omissão?

- Pode o Estado ser vítima crime burla?

- .....

A emergência de outros paradigmas –tutela bens jurídicos colectivos

Fraude fiscal......

65

Aproximação - sobreposição tipos....

Crimes patrimoniais comuns e ―parentescos‖

Burla/ Burla tributária, fraude fiscal, manipulação mercado, fraude na obtenção subsídios….

abuso confiança/ abuso confiança fiscal, S.S, peculato, desvio subvenção, abuso de informação….

66

O premio (ou relevância) da reparação

- crimes contra património

Art. 206.º, 1 – ref. 07- para crimes públicos

pressuposto concordância ofendido e arguido, evitando custos processuais....

Art. 206.º, 2 CP - atenuação

- outra criminalidade:

crimes fiscais – 105.º n.º 4 e 6; 22...

crime fraude na obtenção subsídios

cheque....

67

(...) Levarem os Reis consigo ao Paraíso ladrões, não só não é companhia indecente, mas acção tão gloriosa e verdadeiramente real, que com ela coroou e provou o mesmo Cristo a verdade do seu reinado, tanto que admitiu na cruz o título de rei. (...). E para que um discurso tão importante e tão grave vá assentando sobre fundamentos sólidos e irrefragáveis, suponho primeiramente, que sem restituição do alheio não pode haver salvação. (...). Quer dizer: se o alheio que se tomou ou retém, se pode restituir e não se restitui, a penitência deste e dos outros pecados não é verdadeira penitência, senão simulada e fingida, porque se não perdoa o pecado sem restituir o roubado, quando quem o roubou tem possibilidade de o restituir. Esta única excepção da regra foi a felicidade do bom ladrão, e esta a razão porque ele se salvou. (...)

Padre António Vieira – “Sermão do Bom Ladrão”, pregado na Misericórdia de Lisboa, no ano de 1655.

68

A história assevera que ―Roma não paga traidores‖

Mas a colaboração agentes é uma ferramenta valiosa para ser desprezada no DP, necessidade certo pragmatismo e eficiência....

Assim, as propostas legislativas sobre o estatuto ou figura do ―arrependido‖

permitem que alguém que se encontre envolvido em crimes difícil investigação,

colaborando com a justiça possa beneficiar de um estatuto e de um regime jurídico próprio ......

69

Crimes contra direitos patrimoniais

não tutelam o património no seu conjunto, mas direitos patrimoniais específicos, que podem ser direitos reais ou de crédito

- insolvências, frustração créditos, favorecimento credores...;

- receptação

70

Receptação (art. 231.º CP)

1 — Quem, com intenção de obter, para si ou para outra pessoa, vantagem patrimonial, dissimular coisa que foi obtida por outrem mediante facto ilícito típico contra o património, a receber em penhor, a adquirir por qualquer título, a detiver, conservar, transmitir ou contribuir para a transmitir, ou de qualquer forma assegurar, para si ou para outra pessoa, a sua posse,

é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.

.........

71

Receptação

De forma de comparticipação a crime autónomo

- Perpetuação da relação patrimonial antj...diminuindo possibilidade da vítima facto anterior restaurar relação com a coisa...

- Potencia perigo prática crimes patrimoniais –―os receptadores são os grandes fautores crimes patrimoniais‖ (E. Correia)

- Visa também a tutela da ―segurança geral comunidade‖

72

Receptação de sucedâneos (233.º CP)

‖São equiparadas às coisas referidas no art. 231 os valores ou produtos com elas directamente obtidos‖

Assim, os benefícios obtidos como contraprestação (valor venda, renda, aluguer, juros...etc.)

- contra-estímulo negociação coisa

- Pureza circulação bens

73

Dos crimes contra o sector público ou cooperativo

- Apropriação ilícita – art. 234.º CP

- Administração danosa – art. 235.º CP

Qualificação crimes comuns contra património

Art. 82.º CRP- coexistência de 3 sectores de propriedade dos meios de produção

74

Art. 368.º - A CP - Branqueamento1 — Para efeitos do disposto nos números seguintes, consideram -se vantagens os bens provenientes da

prática, sob qualquer forma de comparticipação, dos factos ilícitos típicos de lenocínio, abuso sexual de crianças ou de menores dependentes, extorsão, tráfico de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, tráfico de armas, tráfico de órgãos ou tecidos humanos, tráfico de espécies protegidas, fraude fiscal, tráfico de influência, corrupção e demais infracções referidas no n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, e dos factos ilícitos típicos puníveis com pena de prisão de duração mínima superior a seis meses ou de duração máxima superior cinco anos, assim como os bens que com eles se obtenham.

2 — Quem converter, transferir, auxiliar ou facilitar alguma operação de conversão ou transferência de vantagens, obtidas por si ou por terceiro, directa ou indirectamente, com o fim de dissimular a sua origem ilícita, ou de evitar que o autor ou participante dessas infracções seja criminalmente perseguido ou submetido a uma reacção criminal, é punido com pena de prisão de dois a doze anos.

3 — Na mesma pena incorre quem ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade das vantagens, ou os direitos a ela relativos.

4-10 ........

75

Crime branqueamento

- Figura criminal recente

- Sanciona manobras ocultação origem ilícita bens ou vantagens

- Determinação infracções geradoras vantagens

- Processo branqueamento - aparência de legalidade

- Como prevenção da eficácia do confisco

77

A sabedoria popular

garante

―Que o crime não compensa‖

Caiu em desuso? O crime compensa?

78

A perda instrumentos, produtos e vantagens

Transferência propriedade para o Estado- trânsito julgado sentença

- Instrumenta sceleris

- Producta sceleris

- Vantagens

Representam realidades e fundamentos diversos

Perigosidade objectos e produtos - prevenção perigo

prática crimes decorrente objectos e produtos

perda vantagens - visa a prevenção criminalidade em geral

79

Regime geral :arts. 109-112.º CP

Regimes específicos:

- ―lei droga‖: D-L 15/93

- RGIF

- CVM

- etc.....;

- Lei 5/2002-

80

Natureza dogmática da perda dos bens??

- Medida segurança ??

- Pena acessória v. D-L 28/84

- Efeito da pena

-―providência sancionatória análoga à da medida de segurança‖ – independente da culpa – ideia prevenção - (Figueiredo Dias)

v. Ac. TC 336/06 = FD

- Outros .....

- V. jurisprudência TEDH

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Artigo 109.º CP (Perda de instrumentos e produtos)1 — São declarados perdidos a favor do Estado os objectos que

tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos.

2 — O disposto no número anterior tem lugar ainda que nenhuma pessoa determinada possa ser punida pelo facto.

3 — Se a lei não fixar destino especial aos objectos perdidos nos termos dos números anteriores, pode o juiz ordenar que sejam total ou parcialmente destruídos ou postos fora do comércio.

*- Instrumentalidade ou perigosidade – jurisprudência modera através causalidade adequada e princípio proporcionalidade (na justa medida)

- Não depende culpa agente, nem condenação....

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Garantia direito de propriedade de terceiros – só proprietário boa fé merece protecção

Artigo 110.ºCP - Objectos pertencentes a terceiro

1 — Sem prejuízo do disposto nos números seguintes,a perda não tem lugar se os objectos não pertencerem, àdata do facto, a nenhum dos agentes ou beneficiários, ounão lhes pertencerem no momento em que a perda foidecretada.2 — Ainda que os objectos pertençam a terceiro, é decretada a perda

quando os seus titulares tiverem concorrido, de forma censurável, para a sua utilização ou produção, ou do facto tiverem retirado vantagens; ou ainda quando os objectos forem, por qualquer título, adquiridos após a prática do facto, conhecendo os adquirentes a sua proveniência.

3 — ......

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Artigo 111.º CP - Perda de vantagens

1 — Toda a recompensa dada ou prometida aos agentesde um facto ilícito típico, para eles ou para outrem, éperdida a favor do Estado.2 — São também perdidos a favor do Estado, sem prejuízodos direitos do ofendido ou de terceiro de boa fé, ascoisas, direitos ou vantagens que, através do facto ilícitotípico, tiverem sido directamente adquiridos, para si oupara outrem, pelos agentes e representem uma vantagempatrimonial de qualquer espécie.3 — O disposto nos números anteriores aplica -se àscoisas ou aos direitos obtidos mediante transacção ou trocacom as coisas ou direitos directamente conseguidos pormeio do facto ilícito típico.4 — Se a recompensa, os direitos, coisas ou vantagensreferidos nos números anteriores não puderem ser apropriadosem espécie, a perda é substituída pelo pagamento ao Estado do respectivo

valor.

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Artigo 111.º CP - Perda de vantagens

- Pressuposto - prática facto ilícito-criminal

- Princípio ganho bruto ou líquido?

- Exclui vantagens em cadeia (vantagens retiradas indirectamente 2.ªs e 3.ªs transacções)

- Os testa ferros

- Princípio proporcionalidade

- Perda sucedâneo em valor (objecto posse legítima de 3.º, ....)

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(pequena) manifestação princípio proporcionalidade

Artigo 112.º CP- Pagamento diferido ou a prestações e atenuação

2 — Se, atenta a situação sócio -económica da pessoa em causa, a aplicação do n.º 4 do artigo anterior se mostrar injusta ou demasiado severa, pode o tribunal atenuar

equitativamente o valor referido naquele preceito.

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―Lei droga‖ (D-L 15/93)- amplia as situações de perda às vantagens indirectas (‖em cadeia‖) seguindo obrigações internacionais ….

Artigo 37.º- Bens transformados, convertidos ou misturados1 - Se as recompensas, objectos, direitos ou vantagens a que se

refere o artigo anterior tiverem sido transformados ou convertidos em outros bens, são estes perdidos a favor do Estado em substituição daqueles.

2 - Se as recompensas, objectos, direitos ou vantagens a que se refere o artigo anterior tiverem sido misturados com bens licitamente adquiridos, são estes perdidos a favor do Estado até ao valor estimado daqueles que foram misturados.

Artigo 38.º- Lucros e outros benefíciosO disposto nos artigos 35.º a 37.º é também aplicável aos juros,

lucros e outros benefícios obtidos com os bens neles referidos.

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Artigo 36.º-A (D-L 15/93)- Defesa de direitos de terceiros de boa fé

1 - O terceiro que invoque a titularidade de coisas, direitos ou objectos sujeitos a apreensão ou outras medidas legalmente previstas aplicadas a arguidos por infracções previstas no presente diploma pode deduzir no processo a defesa dos seus direitos, através de requerimento em que alegue a sua boa fé, indicando logo todos os elementos de prova.

2 - Entende-se por boa fé a ignorância desculpável de que os objectos estivessem nas situações previstas no n.º 1 do artigo 35.º

3 - O requerimento a que se refere o n.º 1 é autuado por apenso, notificando-se o Ministério Público para, em 10 dias, deduzir oposição.

4 - Realizadas as diligências que considerar necessárias, o juiz decide. 5 - Se, quanto à titularidade dos objectos, coisas ou direitos, a questão se

revelar complexa ou susceptível de causar perturbação ao normal andamento do processo, pode o juiz remeter o terceiro para os meios cíveis.

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Qual é o destino?

Artigo 39.º (D-L 15/93) - Destino dos bens declarados perdidos a favor do Estado

1 - As recompensas, objectos, direitos ou vantagens declarados perdidos a favor do Estado, nos termos dos artigos 35.º a 38.º, revertem:

a) Em 30% para a entidade coordenadora do Programa Nacional de Combate à Droga, destinando-se ao apoio de acções, medidas e programas de prevenção do consumo de droga; b) Em 50% para o Ministério da Saúde, visando a implementação de estruturas de consulta, tratamento e reinserção de toxicodependentes; c) Em 20% para os organismos do Ministério da Justiça, nos termos das disposições legais aplicáveis ao destino do produto da venda de objectos apreendidos em processo penal, visando o tratamento e reinserção social de toxicodependentes em cumprimento de medidas penais ou tutelares.

2 .....

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Artigo 380.º-A CVM(Apreensão e perda das vantagens do crime)

1 - Sempre que o facto ilícito gerar para o arguido ou para terceiro por conta dequem o arguido negoceie vantagens patrimoniais, transitórias ou permanentes,incluindo juros, lucros ou outros benefícios de natureza patrimonial, esses valoressão apreendidos durante o processo ou, pelo menos, declarados perdidos nasentença condenatória, nos termos previstos nos números seguintes.

2 - As vantagens patrimoniais geradas pelo facto ilícito típico abrangem as mais valiasefectivas obtidas e as despesas e os prejuízos evitados com a prática do facto,independentemente do destino final que o arguido lhes tenha dado e ainda que astenha posteriormente perdido.

3 - O valor apreendido nos termos dos números anteriores é afecto à reparação doslesados que tenham feito valer a sua pretensão no processo crime, sendo 60 % doremanescente declarado perdido a favor do Estado e 40 % a favor do sistema deindemnização dos investidores.

4- Nos processos por crimes de abuso de informação e manipulação de mercado são aplicáveis as medidas de garantia patrimonial (CPP), sem prejuízo do recurso às medidas de combate à criminalidade económico-financeira previstas em legislação avulsa.

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Instrumento específico....e radical

Visando criminalidade organizada e económico-financeira – art. 7 Lei 5/2002

“Confisco alargado”

Modelo importado (modelo americano)

via diversos instrumentos internacionais

Dadas as dificuldades de provar que os bens patrimoniais do

arguido constituem vantagens provenientes de actividade ilícita – presunção de vantagem de actividade ilícita

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Art. 7.º lei n.º 5/02 (Perda de bens)

―Em caso de condenação pela prática de crime referido no art. 1.º, e para efeito de perda de bens do Estado, presume-se constituir vantagem de actividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito....‖.

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confisco alargado – ―sanção de suspeita‖

Procedimento in rem

- Desliga a vantagem do concreto facto típico – ―vantagem de actividade criminosa presumida‖

- PretendeCombater lucros (presuntivamente) ilícitos....

Destruir base económica actividades ilícitas- evitar continuação act. Criminosa

- Suscita pbs compatibilidade princípios liberais de direito e processo penal....

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Lei 5/02 - regime especial visando combater a criminalidade organizada e

económico-financeira

Artigo 7.º- Perda de bens

1 - Em caso de condenação pela prática de crime referido no artigo 1.º, e para efeitos de perda de bens a favor do Estado, presume-se constituir vantagem de actividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito.

2 - Para efeitos desta lei, entende-se por património do arguido o conjunto dos bens: a) Que estejam na titularidade do arguido, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício, à data da constituição como arguido ou posteriormente; b) Transferidos para terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, nos cinco anos anteriores à constituição como arguido; c) Recebidos pelo arguido nos cinco anos anteriores à constituição como arguido, ainda que não se consiga determinar o seu destino.

3 - Consideram-se sempre como vantagens de actividade criminosa os juros, lucros e outros benefícios obtidos com bens que estejam nas condições previstas no artigo 111.º do Código Penal.

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O MP deve fazer prova da prática de um crime do catálogo do art. 1.º

Artigo 1.º - Âmbito de aplicação1 - A presente lei estabelece um regime especial de recolha de prova, quebra do segredo

profissional e perda de bens a favor do Estado, relativa aos crimes de: a) Tráfico de estupefacientes, nos termos dos artigos 21.º a 23.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro; b) Terrorismo e organização terrorista; c) Tráfico de armas; d) Tráfico de influência; e) Corrupção activa e passiva; f) Peculato; g) Participação económica em negócio; h) Branqueamento de capitais; i) Associação criminosa; j) Contrabando; l) Tráfico e viciação de veículos furtados; m) Lenocínio e lenocínio e tráfico de menores; n) Contrafacção de moeda e de títulos equiparados a moeda. 2 - O disposto na presente lei só é aplicável aos crimes previstos nas alíneas j) a n) do número anterior se o crime for praticado de forma organizada. 3 - O disposto nos capítulos II e III é ainda aplicável aos demais crimes referidos no n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro.

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A falta implementação da figura decorre das dificuldades de aplicação da solução legislativa....

Artigo 8.º (Promoção da perda de bens)

1 - O Ministério Público liquida, na acusação, o montante apurado como devendo ser perdido a favor do Estado.

2 - Se não for possível a liquidação no momento da acusação, ela pode ainda ser efectuada até ao 30.º dia anterior à data designada para a realização da primeira audiência de discussão e julgamento, sendo deduzida nos próprios autos.

3 - Efectuada a liquidação, pode esta ser alterada dentro do prazo previsto no número anterior se houver conhecimento superveniente da inexactidão do valor antes determinado.

4 - Recebida a liquidação, ou a respectiva alteração, no tribunal, é imediatamente notificada ao arguido e ao seu defensor.

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Artigo 9.ºProva

1 - Sem prejuízo da consideração pelo tribunal, nos termos gerais, de toda a prova produzida no processo, pode o arguido provar a origem lícita dos bens referidos no n.º 2 do artigo 7.º

2 - Para os efeitos do número anterior é admissível qualquer meio de prova válido em processo penal.

3 - A presunção estabelecida no n.º 1 do artigo 7.º é ilidida se se provar que os bens: a) Resultam de rendimentos de actividade lícita; b) Estavam na titularidade do arguido há pelo menos cinco anos no momento da constituição como arguido; c) Foram adquiridos pelo arguido com rendimentos obtidos no período referido na alínea anterior.

4 - Se a liquidação do valor a perder em favor do Estado for deduzida na acusação, a defesa deve ser apresentada na contestação. Se a liquidação for posterior à acusação, o prazo para defesa é de 20 dias contados da notificação da liquidação.

5 - A prova referida nos n.s 1 a 3 é oferecida em conjunto com a defesa.

Artigo 10.º (Arresto) Artigo 11.º (Modificação e extinção do arresto)

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Artigo 12.º(Declaração de perda)

1 - Na sentença condenatória, o tribunal declara o valor que deve ser perdido a favor do Estado, nos termos do artigo 7.º

2 - Se este valor for inferior ao dos bens arrestados ou à caução prestada, são um ou outro reduzidos até esse montante.

3 - Se não tiver sido prestada caução económica, o arguido pode pagar voluntariamente o montante referido no número anterior nos 10 dias subsequentes ao trânsito em julgado da sentença, extinguindo-se o arresto com esse pagamento.

4 - Não se verificando o pagamento, são perdidos a favor do Estado os bens arrestados.

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Bibliografia – portuguesa -

- Jorge Godinho, ―Brandos Costumes? O Confisco penal com base na inversão do Ónus da prova (Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, artigos 1º, 7º a 12º),

in Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra, 2003, págs. 1315-1363;

- Damião da Cunha, ―Perda de bens a favor do Estado-arts. 7º a 12º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro (Medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira), in CEJ, Medidas de Combate à Criminalidade Organizada e Económico-Financeira, Coimbra, 2004, págs.121-164

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Cooperação

- Lei n.º 25/2009- regime jurídico da emissão e da execução de decisões de apreensão de bens ou elementos de prova na UE, em cumprimento da Decisão Quadro n.º 2003/577/JAI,do Conselho,

- Lei n.º 88/2009- regime jurídico da emissão e execução de decisões de perda de instrumentos, produtos e vantagens do crime, transpondo para a ordem jurídica interna a Decisão Quadro n.º 2006/783/JAI, do Conselho, relativa à aplicação do princípio do reconhecimento mútuo às decisões de perda.

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Convenção das Nações Unidas contra a corrupção - Convenção Mérida (México), de 2003

- A recuperação de activos é uma importante inovação e um princípio fundamental da Convenção.

- Os Estados Partes devem apoiar-se entre si com extensas medidas de cooperação e assistência neste campo, a fim de fazer valer os interesses das vítimas e dos donos legítimos desses recursos.

- Os Estados Partes devem permitir que suas autoridades cumpram uma ordem de confisco ou de congelamento por um tribunal de outro Estado Parte solicitante. E considerar medidas que permitam o confisco, mesmo sem uma condenação no âmbito criminal.

101

Perda bens – valor /ConfiscoSanção patrimonial

Mesmos objectivos - multa proporcional

(O CP português segue sistema ―dias multa‖ - art. 47.º CP)

Multa proporcional:

- Outro instrumento combate criminalidade organizada;- De acordo com a vantagem ou benefício alegadamente

obtida; - Em determinados crimes consistentes na obtenção

vantagem patrimonial;- Complementa o confisco

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Pbs sobreposição (dupla valoração)

concorrem

Multa proporcional – confisco vantagem

§ 43 StGB salvaguarda que

a vantagem confiscada não deverá ser considerada na valoração do património a efeitos de determinar a quantia da multa.

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Crimes fiscais

Debate

Fraude fiscal em relação as vantagens ilícitas

- Caso Nécora- STS de 7-12-1996

- Caso Roldán – STS 21-12-1999

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Argumentos política criminal:

A favor:- Ppio igualdade- impede tratamento fiscal más favorável a quem viole

Direito.....

- Materialização dos benef ilícitos em outras inversões em cadeia –obstaculizando fiscalidade

Contra:

falta consenso na doutrina tributária

Facto tributário ?? Incremento patrimonial derivado factos ilícitos;

- Carácter subsidiário – na falta prova carácter ilícito bens

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Enriquecimento ilícito (art. 20.º Conv. ONU contra corrupção)

Cada Estado parte considerará

unicamente com sujeição a sua constituição e aos princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico

a possibilidade de adoptar as medidas legislativas e de outra índole que sejam necessárias para qualificar como delito, quando cometido intencionalmente, o enriquecimento ilícito, ou seja,

«o incremento significativo do património de um funcionário relativo aos seus ingressos legítimos que não possam ser razoavelmente justificados».

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Propostas legislativas

Projecto de Lei89/XI Crime de enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas - PSD

Projecto de Lei43/XI - BE Cria o tipo criminal de enriquecimento ilícito.

Projecto de Lei25/XI Cria o tipo de crime de enriquecimento ilícito. - PCP

http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/IniciativasLegislativas.aspx

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ESTUDOS INTERDISCIPLINARESPROPRIEDADE E DIREITO PENAL O PATRIMONIO CRIMINAL