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CLIMA E AGRICULTURA: UMA INVESTIGAÇÃO APLICADA AO TRIÂNGULO MINEIRO E ALTO PARANAÍBA (MG)1
ROGÉRIO GEROLINETO FONSECA2
RESUMO: Nas áreas tropicais brasileiras, apesar da oscilação considerável da temperatura ao longo do ano, a precipitação constitui o elemento climático que mais chama a atenção pelo fato de apresentar uma sazonalidade mais acentuada, caracterizada pelo registro de volumes elevados de chuva durante o verão e estiagens que podem perdurar por todo o inverno. Além dessa distribuição desigual da precipitação no decorrer dos meses, a pluviometria pode variar fortemente, também, de um ano para outro, impactando as atividades humanas. A proposta desta pesquisa é investigar como se manifesta a variabilidade da precipitação na mesorregião geográfica do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba (TMAP), no estado de Minas Gerais, e suas influências sobre a atividade agrícola, mais especificamente os cultivos de soja, cana-de-açúcar e milho, que são os três principais produtos em área de cultivo dentre todas as atividades agrícolas. O período de análise contempla a atual normal climatológica, que parte desde 1991 e finda em 2020. A dinâmica pluvial será conhecida mediante análise dos registros de precipitação das estações pluviométricas cujos dados são disponibilizados pela Agência Nacional de Águas (ANA) na plataforma Hidroweb na Internet. Os dados da precipitação receberão tratamento estatístico que demonstrarão a variabilidade anual, trimestral e mensal das chuvas no TMAP. A variabilidade anual e sazonal da precipitação será obtida recorrendo-se à técnica do desvio padrão em relação à média, conforme utilizada por Sant’Anna Neto (1995), resultando na classificação dos períodos em seco, tendente a seco, habitual, tendente a chuvoso e chuvoso. Para analisar a produtividade da soja, da cana-de-açúcar e do milho, serão coletados os dados anuais (1991-2020) da “Produção Agrícola Municipal”, pesquisa setorial realizada pelo IBGE. Os volumes sazonais das chuvas serão relacionados à quantidade produzida/área plantada dos cultivos considerados, a fim de se conhecer como a variabilidade pluvial interfere nas atividades do meio rural. Essa análise consistirá no cruzamento desses dados por meio de cálculos de correlação simples e regressão linear simples. Será empregado, também, o balanço hídrico de Thornthwaite e Mether (1955), que resultará na avaliação ao longo do tempo da carga de água no solo em função de suas entradas (via precipitação) e saídas (por evapotranspiração). Conforme Galvani (2005), o balanço hídrico auxiliará a análise de como a estiagem ou o excesso de chuvas podem influenciar em uma maior ou menor produtividade dos cultivos analisados. A representação dos dados será demonstrada por meio de mapas, gráficos, tabelas e climogramas. Além das influências sobre a produção agrícola, espera-se revelar se há algum padrão na variabilidade pluvial no decorrer das últimas três décadas, e se há alguma tendência de aumento ou diminuição dos volumes anuais das chuvas, bem como de sua distribuição sazonal. Palavras-chave: Variabilidade Pluvial; Normal Climatológica; Produtividade Agrícola; Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba.
ABSTRACT: Despite the considerable oscillation of the temperature throughout the year, in the Brazilian tropical areas the precipitation is the climatic element that is most striking because of the fact that it has a more marked seasonality, characterized by high volumes of rain during the summer and droughts that can last through all the winter. In addition to this unequal distribution of precipitation over the months, rainfall can vary strongly, also, from year to year, impacting the human activities. The purpose of this research is to investigate how rainfall variability is manifested in the geographic mesoregion of the Triângulo Mineiro and Alto Paranaíba (TMAP) in the state of Minas Gerais, and its influences on agricultural activity, more specifically soybean, sugarcane and corn, which are the three
1 Trabalho derivado de Projeto de Pesquisa de Doutorado, com financiamento da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). 2 Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UNESP Rio Claro. E-mail de contato:
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main products in area of cultivation among all agricultural activities. The period of analysis contemplates the current climatological normal, which begins in 1991 and ends in 2020. The pluvial dynamics will be known by analyzing precipitation records of rainfall stations, whose data are available from the National Water Agency (ANA) on the Hidroweb platform on the Internet. The precipitation data will receive statistical treatment that will demonstrate the annual, quarterly and monthly rainfall variability in TMAP. The annual and seasonal variability of the precipitation will be obtained by using the standard deviation technique in relation to the average, as used by Sant'Anna Neto (1995), resulting in the classification of the periods as dry, tending to dry, usual, tending to rainy and rainy. In order to analyze the productivity of soybeans, sugarcane and corn, the annual data (1991-2020) of the "Municipal Agricultural Production", a sector survey carried out by IBGE, will be collected. The seasonal volumes of rainfall will be related to the quantity produced / planted area of the crops considered, in order to know how rainfall variability interferes with the activities of the rural environment. This analysis will consist of crossing these data through simple correlation calculations and simple linear regression. The water balance of Thornthwaite and Mether (1955) will also be used, which will result in the evaluation of the water load on the soil in function of its inputs (via precipitation) and outputs (by evapotranspiration) over time. According to Galvani (2005), the water balance will aid the analysis of how drought or excessive rains can influence in a greater or lesser productivity of the analyzed crops. The representation of the data will be demonstrated through maps, graphs, tables and climograms. In addition to the influences on agricultural production, it is expected to reveal if there is any pattern of rainfall variability over the last three decades, and whether there is any tendency to increase or decrease annual rainfall volumes, as well as their seasonal distribution. Keywords: Pluvial Variability; Climatological Normal; Agricultural Productivity; Triângulo Mineiro and Alto Paranaíba.
1 – Introdução
A climatologia, na sua ideia mais básica, de estudo do clima, recebe
diferentes abordagens de variados ramos da ciência, que estabelecem propostas de
definição do que é clima e de como ele se relaciona (em particular) com seus
respectivos objetos de estudo.
Nesta proposta de pesquisa, parte-se do entendimento de Monteiro na
definição do clima, desenvolvida a partir de pressupostos de Sorre.
A definição proposta por Sorre, como é sabido, é a seguinte: “O clima é a série dos estados atmosféricos acima de um lugar em sua sucessão habitual”. Para chegar a ela o autor enfatiza a noção de tempo (meteorológico) como unidade complexa, cheia de associações, dinâmica em essência, percebida sensorialmente, e passível de ser arbitrária e abstratamente decomposta e medida nos diferentes elementos que a constituem. [...] (MONTEIRO, 1976, p. 22, grifo do autor).
Para Monteiro, essa concepção é mais adequada por considerar a variação das
condições atmosféricas percebidas ao longo do tempo para, assim, se definir o clima
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de determinado local; o que possibilita melhor compreender a sua influência sobre a
organização do espaço, incluindo as atividades desenvolvidas pelas sociedades.
A análise climática se destaca entre as pesquisas que abordam as relações
entre o ambiente e a composição socioeconômica das sociedades. No âmbito da
Geografia, tais estudos se debruçam em investigações sobre os elementos do clima
e como eles influenciam e são influenciados pelas ações humanas (SANT’ANNA
NETO, 1998).
Seguindo o mesmo princípio, propõe-se a execução desta pesquisa focada na
dinâmica pluvial na mesorregião geográfica do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
(TMAP) e a sua relação com a atividade agrícola praticada no mesmo recorte
espacial entre o período de 1991 e 2020.
Localizado na parte oeste do estado de Minas Gerais, o TMAP é englobado
pela zona dos climas tropicais, marcado pela existência de duas estações bem
definidas quanto à precipitação: uma estação chuvosa que se estende de outubro a
abril, alternada por um período de estiagem que se estabelece de maio a setembro.
A precipitação média no TMAP varia em torno de 1.440mm anuais, sendo que a
parte leste da região registra as alturas pluviométricas mais elevadas, que diminuem
em direção à parte oeste (SANTOS, 2015).
No tocante à ocupação da região, o último Censo Demográfico realizado pelo
Instituto de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2010 apontou o número de
2.144.482 habitantes distribuídos em 66 municípios. A maior parte dessa população,
91,4%, vive nas cidades, resultado do intenso processo de transferência de
moradores do campo para as cidades ocorrido no Brasil a partir da segunda metade
do século XX. Nota-se que este processo foi muito intenso no TMAP, pois as taxas
de urbanização observadas na região são superiores àquelas referentes ao estado
de Minas Gerais como um todo (85,29%) e ao Brasil (84,36%) (IBGE, 2010).
Em termos econômicos, a região é considerada uma das mais dinâmicas de
Minas Gerais, destacando-se as atividades ligadas ao setor agropecuário e às
agroindústrias. A pujança do setor primário na economia regional pode ser verificada
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na comparação com o perfil das atividades econômicas do estado e do país.
Enquanto que a agropecuária representa 5,63% e 5,03% do Produto Interno Bruto
(PIB) de Minas Gerais e do Brasil, respectivamente, no TMAP o setor é responsável
por 11,18% da produção econômica (IBGE, 2014).
Dentre os cultivos agrícolas, destacam-se a soja, a cana-de-açúcar e o milho.
Nas últimas décadas, essas três lavouras têm se destacado como as mais
cultivadas, considerando-se a extensão das áreas de plantio. Segundo a Produção
Agrícola Municipal (IBGE, 2016), o produto mais cultivado é a soja (34,4%), seguido
pela cana-de-açúcar (27,6%) e pelo milho (16,8%), que juntos correspondem a
78,9% de toda a área de cultivo da atividade agrícola (figura 1).
Figura 1: Área plantada (ha) dos principais cultivos agrícolas do TMAP
Fonte: IBGE – Produção Agrícola Municipal – 1990 a 2016. Org.: FONSECA, 2018.
Portanto, é pertinente que, no âmbito da Climatologia Geográfica (voltada à
compreensão das interações entre o clima e a sociedade), um estudo sobre a
dinâmica pluvial do TMAP extrapole os elementos puramente climáticos. Nesta
proposta de pesquisa, opta-se por relacionar a variabilidade da precipitação com a
produção agrícola, devido ao destacado peso que o setor primário tem na economia
regional, proporcionalmente, duas vezes maior ao que se observa no restante do
estado de Minas Gerais e do Brasil.
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Outra justificativa para a realização desta investigação é conhecer se na atual
normal climatológica (1991 a 2020) a precipitação exerceu (ou tem exercido) alguma
alteração quanto à aptidão dos espaços rurais aos cultivos agrícolas praticados, a
exemplo do que aconteceu com a produção de arroz na região nas décadas de 1960
e 1970, que praticamente cessou devido às alterações climáticas.
A partir disso, derivam-se os enfoques que nortearão o desenvolvimento
desta investigação no sentido de elucidar algumas questões específicas; que são
aqui destacadas como hipóteses:
• as últimas décadas apontam para uma tendência de diminuição dos volumes
anuais de precipitação;
• durante os anos considerados secos, obtém-se uma produtividade agrícola
menor do que nos anos com excedentes hídricos;
• nos anos em que ocorrem os fenômenos El Niño e La Niña, a produtividade
do setor agrícola é impactada apresentando desvios para além da faixa
habitual de variação da produção (apesar da região estar posicionada em
uma faixa de menor interferência dessas anomalias climáticas originadas pela
oscilação do Pacífico Sul).
Para responder às hipóteses levantadas, formulou-se como objetivo geral
desta pesquisa analisar a variabilidade (temporal e espacial) das precipitações, de
modo a possibilitar os meios de se conhecer a influência da dinâmica pluvial sobre a
produção dos principais cultivos agrícolas do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. A
partir disso, foram estabelecidos cinco objetivos específicos:
• Analisar a dinâmica pluvial no TMAP por meio da variabilidade da
precipitação ao longo da normal climatológica compreendida entre 1991 a
2020.
• Identificar as zonas mais chuvosas e mais secas do TMAP e relacionar a
variabilidade espacial da precipitação com a espacialização dos diferentes
cultivos agrícolas praticados na região.
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• Avaliar os efeitos da dinâmica pluvial (anos secos, chuvosos e habituais)
sobre a produção de soja, cana-de-açúcar e milho.
• Verificar as influências que os fenômenos El Niño e La Niña exercem sobre a
produtividade dos cultivos de soja, cana-de-açúcar e milho.
• Identificar como o processo de modernização do setor agrícola pode ter
influenciado a prevenção da produção frente aos impactos de estiagens mais
severas.
2 – Precipitação, variabilidade e agricultura
A dinâmica pluvial constitui um papel central nas investigações sobre os
climas nas regiões tropicais. Sua variação ao longo do ano afeta diretamente a
disponibilidade da água (como recurso hídrico) às múltiplas necessidades da
sociedade no tocante ao consumo residencial, industrial, agropecuário e à produção
de energia.
Além da distribuição regional da precipitação, é de grande importância o conhecimento da sua distribuição através do ano. O curso pluviométrico durante o ano não é somente importante para a agricultura, mas também para toda a vida econômica (energia elétrica e comunicações). O caso da energia elétrica está, atualmente, ligado ao curso anual das precipitações. (SCHRÖDER, 1956, p.221).
É importante saber como se dá a distribuição espacial das precipitações por
uma área em análise; mas, mais do que isso, no tocante às atividades agrícolas, é
mister se investigar como se comporta a dinâmica pluvial ao longo do tempo, no
decorrer das estações do ano. É essa variação sazonal da distribuição das
precipitações e o reconhecimento do seu comportamento que vão determinar a
aptidão da região para a implantação dos cultivos e possibilitar o planejamento da
agricultura (SCHRÖDER, 1956).
Deste modo, fica clara a importância dos elementos climáticos na organização
dos espaços rurais. As previsões e o conhecimento do ritmo das intemperes
climáticas possibilitam desenvolver estratégias que amenizem os impactos nocivos
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de tais fenômenos sobre as atividades produtivas. Além de possibilitar a diminuição
dos riscos, o conhecimento sobre a variabilidade temporal dos elementos climáticos
pode favorecer a obtenção de lucros, vide o aumento da produtividade e a escolha
correta sobre quais tipos de produtos cultivar ao longo das estações (ANDRIUCCI;
SANT’ANNA NETO; FERREIRA, 2002, p. 56-57).
O zoneamento climático resultante dos estudos sobre a dinâmica dos
elementos do clima e a classificação do espaço quanto à aptidão agrícola
constituem vantagens ao planejamento dos agrossistemas, aumentando as
possibilidades de se obter uma maior produtividade dos cultivares agrícolas.
Contudo, a ocorrência de azares climáticos, como períodos muito prolongados de
seca ou uma sequência muito grande de dias chuvosos, apesar de raros (mas não
improváveis) impactam a fenologia das plantas e comprometem a produtividade dos
cultivos, mesmo que o ciclo produtivo tenha sido minuciosamente planejado
(SANT’ANNA NETO, 1998, p. 127-128).
A precipitação não é regular e homogênea no decorrer do tempo. Ela
apresenta variações ao longo dos dias, dos meses, dos anos. A variação da
frequência e intensidade das chuvas é registrada pelas estações meteorológicas e
possibilita conhecer melhor o regime das precipitações em um determinado local (ou
região). Essa variação é um comportamento natural da atmosfera e é essencial para
o entendimento do clima (ZAVATINNI; BOIN, 2013).
Todavia, um desvio dos volumes de chuva ou temperatura registrados em
uma localidade (ou região) deve ser tratado com cautela; mesmo que sejam
observados durante alguns anos em sequência, essa variação pode não representar
que uma mudança climática esteja em curso.
“As alterações no comportamento atmosférico de um ano para outro não significam, necessariamente, variação de clima. É imprescindível que se produzam em uma seqüência considerável de anos para definir uma tendência estatística indicadora de alteração.” (CONTI, 2000, p.19).
O apontamento de Schröder (1956) para o estado de São Paulo, de que para
a definição das estações do ano o comportamento da precipitação é mais relevante
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do que o da temperatura, também se mostra válido para a região do TMAP. No
entendimento do autor, apesar da oscilação considerável da temperatura no
decorrer do ano, a alternância mais drástica acontece em relação à precipitação,
que destoa pelo registro de volumes elevados de chuva durante o verão para
períodos de estiagem que podem perdurar por todo o inverno. Segundo o autor, é
mais importante se ater aos registros mínimos da precipitação do que aos máximos,
pois a ausência total das chuvas podem acarretar maiores transtornos à sociedade,
dependendo da sua forma de organização.
3 – Procedimentos metodológicos da pesquisa
Propõe-se desenvolver esta pesquisa com uma abordagem sistêmica à
compreensão das influências da precipitação sobre a organização das atividades no
espaço rural, por considerar que esta consegue satisfazer o intento de relacionar os
atributos físicos e sociais do espaço.
Pressupondo o paradigma sistêmico como o mais adequado para a análise geográfica do clima e seu papel na organização do espaço, e com base nas considerações de Monteiro (1978), partimos da concepção de que o clima é parte fundamental na compreensão do espaço, tanto no insumo de energia no sistema, quanto como regulador dos processos a eles inerentes. Desta forma, os principais atributos climáticos devem ser considerados tanto em sua gênese, sua distribuição espacial e seus processos temporais. (SANT’ANNA NETO, 1998, p.123).
Sant’Anna Neto (1998) ressalta que os elementos do clima, essenciais para
qualquer atividade no meio rural, devem ser entendidos como um insumo do sistema
de produção agrícola. Reforça-se que o sucesso das atividades não depende
exclusivamente das condições climáticas, sendo compartilhado com os recursos
financeiros, as técnicas e o trabalho humano que se têm disponíveis.
A base desta investigação será o cruzamento dos índices pluviais com os
dados anuais da produção agropecuária entre os anos de 1991 e 2020. A escolha
deste recorte temporal não é aleatória; ela compreende o período da atual normal
climatológica de referência.
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Dentre as referências bibliográficas que abordam temáticas que se
relacionam com esta pesquisa e que dão base às etapas de execução desta
investigação, destacam-se as obras de Schröder (1956), Sant’Anna Neto (1995),
Galvani (1995) e Zavattini e Boin (2013), além de teses e dissertações que também
são tomadas como referências pelo fato de serem resultados de estudos empíricos
utilizando-se tais pressupostos de investigação.
A dinâmica pluvial no TMAP será conhecida mediante análise dos registros de
precipitação das estações pluviométricas cujos dados são disponibilizados pela
Agência Nacional de Águas (ANA) na plataforma Hidroweb na Internet (figura 2).
Figura 2: Estações pluviométricas com registros de dados na plataforma Hidroweb
Com o intuito de abranger todo território do TMAP, expandiu-se a área de
seleção das estações pluviométricas em trinta quilômetros para além dos limites da
referida mesorregião, sobretudo para não comprometer a análise da dinâmica pluvial
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e sua correta representação cartográfica nas bordas da área estudada. Ao todo,
foram identificados no banco de dados da ANA os registros de 217 estações
pluviométricas.
Contudo, trabalhar-se-á com um reduzido número de estações, utilizando-se
somente aquelas que abranjam todo o período de análise e que tenham boa
consistência de dados (menor quantidade de falhas nos registros). Para minimizar o
problema das ausências de registros de precipitação, será realizado o
preenchimento com base na média dos dados das três estações mais próximas,
como sugerem Zavattini e Boin (2013).
Os dados da precipitação referentes ao período entre 1991 e 2020 receberão
tratamento estatístico que demonstrarão a variabilidade anual, trimestral e mensal
das chuvas no TMAP. Para o calculo da variabilidade anual e trimestral da
precipitação, recorrer-se-á à técnica do desvio padrão em relação à média, conforme
utilizada por Sant’Anna Neto (1995). Os resultados serão demonstrados na forma de
gráficos e tabelas, sendo cada período classificado em: seco, tendente a seco,
habitual, tendente a chuvoso e chuvoso.
Neste estudo será executada outra técnica de análise climática muito utilizada
em investigações que relacionam a variabilidade pluvial com a produtividade
agrícola: o balanço hídrico. Será empregado o balanço hídrico de Thornthwaite e
Mether (1955), que resultará na avaliação ao longo do tempo da carga de água no
solo em função de suas entradas (via precipitação) e saídas (por
evapotranspiração). Seguindo-se a indicação de Galvani (2005), o balanço hídrico
auxiliará a análise de como a estiagem ou o excesso de chuvas podem influenciar
em uma maior ou menor produtividade dos cultivos analisados.
Ainda em relação ao tratamento estatístico da pluviometria, pretende-se
analisar a formação dos veranicos, que correspondem aos dias sequenciais durante
o período chuvoso em que se estabelece tempo seco com forte calor. Os veranicos
serão analisados a partir da constatação de uma quantidade mínima de sete dias em
sequência sem o registro de chuvas durante os meses mais chuvosos (dezembro,
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janeiro e fevereiro), que correspondem ao período de desenvolvimento da maioria
das culturas agrícolas. O intuito é saber o quanto este fenômeno acarreta perdas na
produção agrícola.
A espacialização dos dados e as representações cartográficas serão
elaboradas no software ArcGIS 10.3, da ESRI. Os mapas de distribuição espacial
das chuvas serão produzidos mediante o procedimento geoestatístico da Krigagem,
que resultará na representação cartográfica das chuvas por isolinhas e possibilitará
se conhecer as partes mais chuvosas e mais secas do TMAP.
Para analisar a produção da soja, da cana-de-açúcar e do milho, serão
coletados os dados anuais (1991-2020) da “Produção Agrícola Municipal”, pesquisa
setorial realizada pelo IBGE e disponibiliza em seu sítio na Internet no canal Sistema
IBGE de Recuperação Automática (SIDRA).
Os dados anuais da precipitação e da produção agrícola serão cruzados,
buscando-se identificar as relações entre os diferentes volumes pluviais registrados
anualmente com a produtividade dos cultivos selecionados. Os volumes anuais das
chuvas serão relacionados à quantidade produzida/área plantada, a fim de se
descobrir como a variabilidade pluvial interfere na produtividade agrícola. Essa
análise consistirá no cruzamento dos dados por meio de cálculos de correlação
simples e regressão linear simples, demonstradas por Ferreira (2006) em estudo
sobre a influência da precipitação sobre a produtividade do milho e da soja nos
estados das regiões Sul e Sudeste do país.
Será ainda tomado o ano de melhor desempenho das atividades do setor
agrícola para se analisar o volume e a distribuição da precipitação ao longo daquele
ano de modo a se conhecer um padrão sazonal favorável da precipitação às
atividades do setor rural.
Os períodos de El Niño e La Niña também serão analisados para se descobrir
se esses fenômenos acarretam mudanças significativas no regime de chuvas da
região e, deste modo, influenciam o desempenho da produção. Sabe-se que esses
fenômenos alteram mais fortemente a dinâmica das precipitações nas regiões Norte,
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Nordeste e Sul do Brasil; esta análise possibilitará confirmar ou refutar a afirmação
de que a faixa central do país, na qual o TMAP se insere, tem a sua precipitação
pouco alterada quando da ocorrência dos fenômenos El Niño e La Niña.
Por fim, será avaliado se a modernização da agricultura observada nas
últimas décadas, graças ao desenvolvimento científico e tecnológico, conseguiu
aumentar a resiliência dos produtores rurais em períodos de estiagem mais
prolongadas. Para tanto, serão analisadas e comparadas a produção dos anos mais
recentes de escassez hídrica com os mais antigos; se confirmada a modernização
do setor, mediante a análise do uso de créditos e insumos para a produção agrícola,
a tendência é que a produção nos últimos anos considerados secos tenha sido
maior do que naqueles ocorridos nos anos 1990.
4 – Considerações finais
Com a execução dessa pesquisa, espera-se verificar se vigora alguma
tendência significativa de alteração dos padrões anuais de precipitação, tanto no que
diz respeito ao volume total das chuvas quanto à sua distribuição ao longo do ano.
Esta abordagem se insere na gama de variáveis consideradas nos estudos sobre
mudanças climáticas, e seus resultados poderão congregar tais pesquisas tão em
voga nos debates em climatologia.
Reitera-se a importância de se conhecer a fundo a dinâmica pluvial e suas
influências sobre a produção do setor agrícola no Triângulo Mineiro e Alto
Paranaíba, uma vez que tal setor é decisivo na organização dos espaços rurais e é
estratégico para o desenvolvimento econômico regional.
5 – Referências
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