cinema na escola

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO FILMES NA ESCOLA: Uma abordagem sobre o uso de audiovisuais (vídeo, cinema e programas de TV) nas aulas de Sociologia do Ensino Médio.” Autora: MARIA ADÉLIA ALVES Orientadora: Profª Drª PATRIZIA PIOZZI Este exemplar corresponde à redação final da dissertação de Mestrado defendida por Maria Adélia Alves e aprovada em Comissão Julgadora. Data: _____/_____/________ Assinatura: ___________________________________ (Orientadora) Comissão Julgadora: ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ Campinas, dezembro de 2001

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Uma abordagen sobre a utilizaçaode audivisuais nas escolas nas aulas do ensino medio de sociologia

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAO

    DISSERTAO DE MESTRADO

    FILMES NA ESCOLA: Uma abordagem sobre o uso de audiovisuais

    (vdeo, cinema e programas de TV) nas aulas de Sociologia do Ensino Mdio.

    Autora: MARIA ADLIA ALVES Orientadora: Prof Dr PATRIZIA PIOZZI

    Este exemplar corresponde redao final da dissertao de Mestrado defendida por Maria Adlia Alves e aprovada em Comisso Julgadora. Data: _____/_____/________ Assinatura: ___________________________________ (Orientadora)

    Comisso Julgadora: ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________

    Campinas, dezembro de 2001

  • ii

    by Maria Adlia Alves, 2001.

    Catalogao na Publicao elaborada pela biblioteca da Faculdade de Educao/UNICAMP

    Bibliotecria: Rosemary Passos CRB-8/5751 Alves, Maria Adlia AL87f Filmes na escola: uma abordagem sobre o uso de audiovisuais (vdeo,

    cinema e programas de TV) nas aulas de Sociologia do ensino mdio / Maria Adlia Alves. - - Campinas, SP : [s.n.], 2001.

    Orientador: Patrizia Piozzi. Dissertao (mestrado) Universidade Estadual de Campinas,

    Faculdade de Educao. 1. Cinema na educao. 2. Ensino de segundo grau. 3. Educao.

    4. Cincias Sociais. 5. Escolas. 6. Recursos audiovisuais. I. Piozzi, Patrizia. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educao. III. Ttulo.

    01-0171-BFE

  • iii

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAO

    FILMES NA ESCOLA: Uma abordagem sobre o uso de audiovisuais

    (vdeo, cinema e programas de TV) nas aulas de Sociologia do Ensino Mdio.

    Dissertao de Mestrado apresentada como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre Banca Examinadora da Faculdade de Educao da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP.

    Autora: MARIA ADLIA ALVES

    Orientadora: Prof Dr PATRIZIA PIOZZI

    Campinas, dezembro de 2001

  • i

    RESUMO

    Este trabalho visa investigar as possibilidades de utilizao dos discursos

    audiovisuais no processo de ensino da Sociologia no Ensino Mdio. A investigao foi

    realizada, com professores dessa disciplina da Rede Pblica Estadual de Ensino na cidade

    de Campinas, a partir de entrevistas abertas sobre a importncia dada s imagens em

    movimento e sua utilizao e relevncia na escola.

    Atravs da anlise dos relatos desses professores sobre seus trabalhos com

    audiovisuais, principalmente filmes e programas de TV, constatou-se as dificuldades e

    incertezas defrontadas por estes na escolha, reflexo e anlise dos filmes utilizados.

    Dificuldades encontradas, principalmente, ao lidarem com a linguagem do audiovisual

    dentro da escola e, tambm, por no terem noo do alcance, dos limites e das

    possibilidades desta forma de expresso dentro da sala de aula em seu trabalho. Alm disso,

    foi possvel perceber um grande distanciamento da instituio escolar com relao aos

    discursos audiovisuais, suas possibilidades e limites.

    A abordagem feita sobre as experincias desses professores apontou para a

    necessidade, ao se utilizarem das linguagens audiovisuais em suas aulas, de uma reflexo e

    abordagem mais criativa, sensvel, argumentativa, baseada no dilogo, no se limitando ao

    uso de filmes como mero recurso auxiliar didtico. Mas, o contato com esse discurso udio-

    imagtico, que traz outros modos de perceber e conhecer de forma prazerosa, apontou

    tambm para a necessidade de uma abordagem aberta, a todo momento repensada,

    preparada para o novo e para o aparecimento de diferentes idias e opinies, para que o

    filme e a reflexo realizada sobre ele extrapolem os limites da escola, sem restries

    quando ultrapassarem as expectativas e o contedo da disciplina, no determinando ou

    limitando o pensamento dos alunos, mas estruturando suas subjetividades de forma

    responsvel e reflexiva, tornando o espao escolar um lugar para o conhecimento, e para o

    exerccio da interdisciplinaridade, da pluralidade e da reflexo comunicativa.

  • ii

    ABSTRACT

    This work aims to investigate the possibilities of the use of audiovisual means in the

    process of teaching Sociology in the Secondary School. The research was done with

    teachers of this discipline of the Public Schools of the State in the city of Campinas, from

    open interviews about the importance given to the moving images and its use and relevance

    in the schools.

    Through the analysis of the statements given by these teachers about their work with

    audiovisual means, mainly films and TV shows, we could verify the difficulties and

    uncertainties faced by them during the process of choice, consideration and analysis of the

    films. The difficulties were, mainly, in dealing with the language of the audiovisual means

    inside the school and also the lack of knowledge of the scope, limits and possibilities of this

    form of expression inside the classroom. Besides, we could see a great distance between the

    school as an Institution and the audiovisual media and its possibilities and limits.

    The approach made on these teachers experiences pointed to the need, when they

    use audiovisual means in their classes, of a reflection and a more creative, sensitive,

    argumentative (based on dialogue) approach, not limiting the use of films as a mere

    secondary teaching device. On the contrary, when they take advantage of this audiovisual

    expression it brings other ways of learning in a pleasant manner. It also pointed to the need

    of a more open approach, always well thought and prepared for the new and for the

    appearance of different ideas and opinions, so that the film and the reflections resulted from

    it can go beyond the school limits, without censorship when they overcame the expectations

    and content of the discipline, not limiting nor determining the students minds, but ordering

    their subjectivities in a responsible and reflective way, making the school a place for

    knowledge, interdisciplinarity, plurarity and the reflection of the communications.

  • iii

    Com muito Amor, Dedico este trabalho ao Sr. Juvncio e a Sr. Deolinda,

    meus pais, que me deram a VIDA.

    E, em especial, ao Guilherme,

    meu sobrinho, que me relembrou sobre o significado da Persistncia e da Alegria.

  • iv

    AGRADECIMENTOS

    Prof. Dr. PATRIZIA PIOZZI, que sempre foi solcita, atenta, presente e

    paciente comigo, em todos os momentos importantes deste trabalho, e com quem

    pude contar com o apoio para sua realizao.

    Prof. Dr. Cristina Bruzzo, que atravs de suas idias, despertou meu

    interesse para esse tema, iniciando-me nos primeiros passos deste trabalho.

    Ao Prof. Dr. Milton Jos de Almeida, pelas crticas pertinentes ao trabalho

    no momento da Qualificao, e ao Grupo OLHO, onde encontrei um campo vivo

    de reflexo.

    Ao Prof. Dr. Wenceslo Machado de Oliveira Jr. por ter, atravs de seus

    escritos, ajudado a conduzir esta dissertao.

    Prof. Dr. urea Maria Guimares e ao Prof. Dr. Reginaldo Carmello

    Correa de Moraes, pela gentileza de terem aceitado a condio de suplente na

    Banca Examinadora da defesa.

    Aos professores das disciplinas que cursei, pelas boas sugestes e idias

    apresentadas, durante o decorrer de meu curso.

  • v

    A todos os funcionrios da Faculdade de Educao, em especial a secretria

    do DECISAE, funcionrios da recepo, da Secretaria da Ps-Graduao e da

    Biblioteca da Faculdade de Educao pelos auxlios prestados.

    Ao CNPq pelo apoio financeiro durante 24 meses.

    A todos os meus amigos e colegas com quem pude apresentar e discutir

    aspectos de minha Dissertao.

    minha famlia.

    Agradeo a minha me e a meu pai pelo apoio, amparo e pacincia sem

    limites, em todas as circunstncias.

    E a todos que contriburam, direta ou indiretamente, para a realizao deste

    trabalho.

    Campinas, dezembro de 2001.

  • vi

    NDICE

    pgina

    APRESENTAO ...............................................................................................................1

    CAPTULO I .........................................................................................................................9

    DO APARATO TCNICO NESCESSRIO ...................................................................12

    DA MOTIVAO PARA O USO .................................................................................14

    DA IMPORTNCIA DO QUESTIONAMENTO DA MDIA ..........................................16

    DA ESCOLHA DO FILME PARA A AULA ..................................................................30

    DA ABORDAGEM DAS IMAGENS EM SALA DE AULA .............................................44

    DAS DIFICULDADES ENCONTRADAS ......................................................................49

    DA IMPORTNCIA DA UTILIZAO DE FILMES EM SALA .....................................59

    EM BUSCA DE UMA BREVE PAUSA............................................................................63

    CAPTULO II .....................................................................................................................67

    DA ANLISE REFLEXIVA BASEADA NA SOCIOLOGIA ............................................71

    DA PRESENA DE FILMES NA ESCOLA PARA ALM DA ABORDAGEM

    INSTRUMENTAL, COM FINS UTILITRIOS E PRAGMTICOS ..............................................87

    DA ESCOLA ENQUANTO O LUGAR DO DILOGO ................................................122

    CONSIDERAES FINAIS ...........................................................................................131

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..............................................................................137

  • 1

    APRESENTAO

  • 2

  • 3

    O surgimento e o desenvolvimento cada vez mais rpido e intenso dos

    audiovisuais, com suas tcnicas, habilidades e funes cada vez maiores e

    diferentes, em nosso mundo, faz com que a vida das pessoas esteja totalmente

    envolvida por eles, criando crescentes relaes de dependncia. No espao escolar,

    no entanto, isso no diferente, o audiovisual entra na escola, interferindo na aula

    dos professores e influenciando os alunos de forma a envolv-los, transformando

    seu modo de conhecer, pensar, agir e estar no mundo.

    A educao formal tem por base a lngua, a linguagem oral e escrita. As

    sociedades humanas se utilizam destas linguagens e tambm da linguagem

    audiovisual para as suas comunicaes habituais e, sobretudo, para a elaborao

    de iderios polticos, religiosos, sociais e culturais que determinam a hegemonia

    dos grupos dirigentes sobre a massa1. Essas sociedades tambm criam objetos e

    imagens, elaboram e definem modos de condutas, gestos, expresses, sentimentos

    e atitudes que tambm participam da legitimao dessas idias e da presso sobre

    todos os indivduos sociais, colaborando para a produo e instalao de um viver

    e de uma viso de mundo que penetra e influencia a instituio escolar direta ou

    indiretamente. A escola, com seus mtodos, didticas e tcnicas participa

    efetivamente do projeto poltico pedaggico de seu tempo. Embora, enquanto

    instituio, seja um dos lugares de reproduo do status quo, h em seu interior

    a possibilidade da crtica, da dvida, da contestao.

    A entrada da linguagem do audiovisual na escola trouxe consigo novos

    modos de ensinar, possibilidades de perceber e compreender. Podemos falar de

    uma educao por imagens, ou atravs das imagens, ou com imagens, presente na

    1 Cfr. a esse respeito, FRANCASTEL, Pierre. "Introduo: Sociologia da Arte e problemtica do imaginrio - pg. 6. in A REALIDADE FIGURATIVA: elementos estruturais de sociologia da arte. Editora Perspectiva, So Paulo, 1973.

  • 4

    formao dos indivduos e de toda a sociedade, de forma muito prxima e atuante,

    seja na escola ou em qualquer outro ambiente ou instituio do espao pblico. A

    escola sempre foi vista como o lugar da transmisso planejada do conhecimento

    e da formao do ser humano, para o trabalho e para a vida, e, por isso, a entrada

    do audiovisual nela colabora para a realizao desta formao integral.

    Os meios de comunicao, principalmente os que envolvem imagens, tem

    modificado as formas de pensar, agir, sentir e conhecer do ser humano, trazendo o

    que, a partir de ento, vai ser pensado e tratado como realidade. Constitudo de

    fragmentos captados do mundo real, ele o filme, o cinema no mostra a

    realidade, afinal as tcnicas figurativas no so apenas meios para criar imagens

    de um tipo especfico, so tambm meios de perceber e de interpretar o mundo2.

    O homem foi e completamente influenciado de acordo com o surgimento de

    novos meios, cada nova linguagem (por ex. pintura, fotografia, cinema, televiso,

    vdeo, etc.) gera novos hbitos e prticas, novos tipos de ao e de experincia que

    transformaro sua postura frente aos condicionamentos do mundo, sua percepo

    e compreenso da realidade social e histrica, e de si mesmo. (...) toda

    modificao dos instrumentos culturais, na histria da humanidade, se apresenta

    como uma profunda colocao em crise do modelo cultural precedente; e seu

    verdadeiro alcance s se manifesta se considerarmos que os novos instrumentos

    agiro no contexto de uma humanidade profundamente modificada, seja pelas

    causas que provocaram o aparecimento daqueles instrumentos, seja pelo uso

    desses mesmos instrumentos. A inveno da escrita, embora reconstituda atravs

    2 OLIVEIRA JR., Wenceslao Machado de. A CIDADE (TELE)PERCEBIDA: em busca da atual imagem do urbano. Pg. 57. Dissertao de mestrado apresentada na Universidade Estadual de Campinas/Faculdade de Educao - Campinas, S.P., 1994.

  • 5

    do mito platnico, um exemplo disso; a da imprensa, ou a dos novos

    instrumentos audio-visuais, outro.3

    Inovaes de ordem tcnica, tecnolgica e fsica, que geram transformaes

    no meio de produo e nas relaes dos homens entre si e com seu trabalho,

    mudanas nos meios de transporte, transformaes no imaginrio social, nos

    valores e crenas, transformaes nos modos de produo e nos prprios

    mecanismos do capitalismo e suas variantes, determinam mudanas no modo de

    perceber e conhecer o mundo, em grande medida, pelo uso que se faz delas e pelo

    modo de encontrar solues e realizar aes para as situaes vividas,

    remodelando, assim, a percepo e transformando os conhecimentos e a

    conscincia humana.4

    A televiso e o cinema so, ainda hoje, os grandes disseminadores e

    propagadores de imagens da atualidade, em grande parte responsveis pelas

    informaes que chegam ao conhecimento da maioria das pessoas numa

    sociedade.5 Ao assistir TV ou ao ver um filme sentimos estar presentes ao

    acontecimento visto, muitas vezes chegando a nos pensar como uma testemunha

    ocular do ocorrido. A TV nos d a impresso de estarmos ao vivo, no local

    mostrado, j o cinema nos envolve num clima de imaginao em que nossa

    conscincia e nosso olhar tambm o olhar que a tela mostra. Como nos diz

    Almeida: "No cinema, voc senta, o seu olhar fixa-se na tela e as imagens faro, por

    3 ECO, Umberto. APOCALPTICOS E INTEGRADOS. Pg. 34. Editora Perspectiva, coleo debates, n 19, 5 edio, So Paulo, 1993. 4 Cfr. para as idias que contriburam neste pargrafo: ALMEIDA JR., Joo Baptista de. IMAGEM E CONHECIMENTO: anlise das concepes representacionista e fenomenolgica e suas implicaes na educao. Pg.. 7. Tese de doutorado apresentada na Faculdade de Educao na Universidade Estadual de Campinas UNICAMP, Campinas, S.P., 1997. 5 OLIVEIRA JR., Wenceslao Machado de. A CIDADE (TELE)PERCEBIDA: em busca da atual imagem do urbano. Pg. 8. Dissertao de mestrado apresentada na Universidade Estadual de Campinas/Faculdade de Educao - Campinas, S.P., 1994.

  • 6

    voc, os movimentos que seu corpo e seu olhar fariam se voc tivesse que

    realmente movimentar-se para ver tudo o que o filme mostra: voar, penetrar no

    solo, chegar perto, distanciar-se, e assim por diante. As cmeras filmaram o que o

    diretor do filme quis, o projetor do cinema joga-as na tela, para voc seguir o olhar

    do filme como se fosse o seu."6

    As imagens que chegam at ns so constantemente repetidas, criadas e

    recriadas, montadas e misturadas com ou sem intenes claras e conscientes,

    gerando efeitos em seus espectadores. Imagens e sons que juntos nos trazem

    informaes, nos sensibilizam e nos emocionam, nos ajudam a conhecer, decifrar,

    perceber, nos informar, sobreviver e tambm iludir, enganar, dirigir, dominar e

    controlar.

    Na escola todas essas imagens flmicas so escolhidas, agrupadas e

    reagrupadas, ordenadas e classificadas dentro de um contexto sob um domnio

    visando alcanar objetivos, no caso de nossos entrevistados, a transmisso de um

    contedo sociolgico pr-estabelecido, a apreenso deste por parte dos alunos de

    forma mais agradvel e perceptiva, ser geradora de discusses e capaz de

    aplacar os nimos mais exaltados dos alunos durante as aulas. Diferentemente da

    linguagem escrita, que desenvolve mais o esprito de anlise, de rigor e de

    abstrao, (...) a linguagem audiovisual treina mltiplas atitudes perceptivas,

    constantemente solicita a imaginao e reinveste a afetividade com um papel de

    mediao primordial no mundo.7

    6 ALMEIDA, Milton Jos de. CINEMA, ARTE DA MEMRIA E DA SOCIEDADE. Pg. 2-3. 7 BABIN, Pierre e KOULOUMDJIAN, Marie-France. OS NOVOS MODOS DE COMPREENDER: a gerao do audiovisual e do computador. Pg. 107. Edies Paulinas, So Paulo, 1989.

  • 7

    Este trabalho visa investigar as possibilidades de utilizao dos discursos

    audiovisuais no processo de ensino da Sociologia no Ensino Mdio. A investigao

    foi realizada com professores dessa disciplina da Rede Pblica Estadual de Ensino

    na cidade de Campinas, a partir de entrevistas abertas sobre a importncia

    atribuda s imagens em movimento e sua utilizao na escola.

    Nossa pesquisa abordou filmes e programas de TV, pois, no momento da

    investigao, eram estes recursos audiovisuais oferecidos pela rede de ensino

    estadual das escolas estudadas. Uma investigao que implicasse um alargamento

    da dimenso do audiovisual, que abarcasse outras tecnologias e suas

    potencialidades no caberia dentro da realidade em que se encontravam e, por que

    no dizer, em que muitas ainda se encontram.

    O estudo abordou a insero do audiovisual na escola, especificamente nas

    aulas de Sociologia, observando sobre as transformaes que este meio de

    comunicao gerou na escola e no modo de ensino, e refletindo sobre a influncia

    da cultura imagtica numa instituio controlada, direcionada, transmissora de

    contedos de forma linear, repleta de definies e certezas, como a escolar.

    Acreditando que a entrada de produtos culturais, no caso aqui filmes e

    programas de TV, possa abalar as formas de ensino e das relaes

    tradiconalmente estabelecidas na escola, procuramos localizar, em nosso trabalho,

    a influncia e o alcance dos audiovisuais na educao e em que medida estes

    interferem na formao dos indivduos na escola. Para tanto, este foi dividido em

    duas partes.

    Ao longo do primeiro captulo apresentamos de forma descritiva as

    entrevistas abertas realizadas com os professores de Sociologia das Escolas

  • 8

    estaduais de ensino da cidade de Campinas. Neste relato, procuramos abranger os

    posicionamentos dos entrevistados frente utilizao de filmes e/ou programas de

    TV em suas aulas, seus objetivos com isso, suas concepes a respeito dos

    audiovisuais e sua relao com a escola, suas principais dificuldades encontradas e

    suas anlises dos resultados.

    No segundo captulo procuramos, atravs da reflexo sobre as palavras dos

    professores, abordar como estes tratavam o audiovisual em sala enquanto objeto

    da cultura, sua influncia e interferncia no processo de ensino e suas

    conseqncias.

  • 9

    CAPTULO I

  • 10

  • 11

    Iniciamos nossa pesquisa entrevistando professores que lecionavam a

    disciplina de Sociologia em 1998 nas escolas estaduais na cidade de Campinas.

    Foram entrevistados 10 professores, cobrindo as 14 escolas que possuam essa

    disciplina, dentre estes, dois no faziam uso de audiovisuais em suas aulas, sendo

    que apenas um deles demonstrou interesse em us-los futuramente em seu

    trabalho. As entrevistas seguiram roteiro pr-estabelecido, com perguntas abertas

    possibilitando respostas em forma de depoimentos, sobre suas prticas com

    imagens em movimento em sala de aula. A partir dos resultados destas entrevistas

    evidenciou-se a importncia dada imagem, de uma forma geral, e sua

    utilizao, em quais condies d-se seu uso e algumas dificuldades encontradas

    no uso de filmes por esses professores.

    Atravs das entrevistas, buscamos ouvi-los e, por meio de suas falas,

    conhecer suas experincias e prticas no cotidiano escolar, suas imagens preferidas

    para serem usadas nas aulas de Sociologia, os caminhos encontrados e imaginados

    por eles ao se utilizarem de filmes em suas aulas.

    Faremos aqui recortes das falas desses professores, na busca de construir um

    mosaico, procurando dar ou achar um sentido, criar uma histria interpretando

    relatos de vivncias, e assim escrever sobre falas, pensadas ou simplesmente

    expressas sem grandes reflexes, sobre imagens usadas em sala de aula, sobre suas

    aes.

    Escreveremos sobre relatos de experincias em que o olhar do professor

    direciona o olhar do aluno buscando com isso que o aluno fale mais, questione.

    Nos deteremos nas opinies e na prtica de professores que ao se utilizarem de

    imagens em suas aulas esperam que seus alunos, aps assistirem determinados

    filmes, falem, discutam, argumentem mais, se expressem oralmente em sala, ou

  • 12

    escrevam bem e mais em seus trabalhos, demonstrando terem capacidade de

    reflexo e anlise crtrica .

    O texto a seguir diz sobre um certo tipo de olhar. O olhar que o professor de

    Sociologia tem sobre imagens flmicas ou programas de TV escolhidos por ele para

    serem vistos por seus alunos em sala de aula.

    O professor, pensado como um autor, que escolhe imagens e as coloca num

    determinado contexto escolar, e como um espectador privilegiado, com um senso

    de observao apurado e crtico, balisado na Sociologia, que permite discernir e se

    utilizar das informaes dadas atravs de imagens e sons, com sua prtica fonte

    de conhecimento.

    O professor um autor, produtor e diretor de um momento. D uma forma

    para o que est ensinando, e, principalmente, para o "ato de ensinar". Cria e/ou

    recria imagens para o contedo ensinado. Escolhe os filmes que considera mais

    representativos daquilo que acredita ser a melhor forma, porque no a nica, do

    contedo sociolgico e de sua transmisso. Transforma em imagens o tema

    escolhido, trazido e abordado em sala de aula. Geralmente ligado ao tema que est

    abordando em aula, aparentemente livre" na escolha do filme que utiliza seja

    para distrair, seja para ilustrar, seja para atrair, seja para completar e/ou

    complementar, seja para enriquecer seu trabalho de alguma forma.

    O professor, autor e espectador, o por uma escolha pessoal e deliberada.

    Escolha esta derivada de sua individualidade, de sua particularidade, de sua

    emoo, de sua histria, de seus desejos, das presses que sente oriundas da

    instituio escolar, dos pais, dos alunos para quem d aula, da sociedade, de sua

    cultura, da posio social em que se encontra.

  • 13

    Quando traz um filme para a sala de aula o introduz num contexto

    determinado. A escola uma instituio com histria e tradio. o lugar onde as

    pessoas aprendem a ler, escrever e fazer contas, a classificar, selecionar, organizar,

    como devem pensar, se informam sobre a ordem e o funcionamento das coisas do

    mundo. Embora a imagem em movimento no seja um elemento totalmente novo

    na escola, ela ainda pensada de maneira a provocar um certo estranhamento, algo

    que incomoda e traz muitas dvidas. Podemos dizer que a escola ainda no

    absorveu totalmente e no integrou a linguagem do audiovisual no conjunto das

    informaes que julga ser necessrias para a formao dos indivduos que a

    freqentam. E seus professores ainda encontram muitas dificuldades no

    tratamento das imagens, na introduo e aceitao desse elemento "moderno",

    atraente e fascinante que representado pelos meios de comunicao, e no caso,

    aqui, pelos filmes e programas de TV.

    DO APARATO TCNICO NECESSRIO

    As escolas estudadas, pblicas, geralmente oferecem recursos,

    equipamentos, mas difcil viabilizar o uso desses. So equipadas com o mnimo

    necessrio, possuindo na maioria dos casos videocassete, TV, biblioteca, sala para

    assistir vdeo, antena parablica, videoteca que possui "algumas coisas, no tem

    muitas coisas no", como se apresenta na fala de uma das entrevistadas.

    A instituio escolar se apresenta como moderna, progressista, voltada para

    o futuro, uma instituio com o olhar "pra frente". Aparentemente a escola

    equipada com o bsico da moderna tecnologia: TV, vdeo, antena parablica,

    videoteca, etc. Mas o que se fazer com isso? Como coloca Bruzzo: "no possvel

  • 14

    desconsiderar as condies concretas de atuao dos educadores e a limitao que

    se impe criatividade e empenho profissional"8. O equipamento tecnolgico, sem

    o conhecimento mnimo para lidar com ele, sem uma base para seu uso, sem a

    criatividade do professor, em juno com problemas estruturais e conjunturais que

    dificultam e at mesmo inviabilizam o uso de audiovisuais em sala de aula, muitas

    vezes no tem em si muito valor.

    So poucas aulas semanais, com curta durao cada uma. Professores

    dificilmente conseguem trabalhar em conjunto com outros professores. Diretores

    com metas diferentes impedem e/ou atrapalham o trabalho. Como se apresenta na

    fala de uma das professoras.

    "Tem videoteca? Videoteca, at deve ter algumas coisas a sim, algumas coisas que o Governo manda. Tem antena parablica, mas esse ano eu tenho poucas aulas. So quatro aulas semanais: 3 de Histria, na 8 srie, e uma de Sociologia no 1 colegial, e eu no estou interagindo com a escola. E eu no sei exatamente at que ponto eles usam isso, e eu no sei como essa videoteca. Na escola que eu estava, no ano passado, tinha uma videoteca boa, mas eu s fiquei sabendo, porque um dia eu pedi pelo amor de Deus para me darem as chaves dos armrios, porque estava tudo fechado. Nunca ningum usou aqueles vdeos, usava os vdeos que a gente mesmo tem em casa, eu tenho um monte de coisa em casa que eu j usei. Mas eu queria o tal do "Kaspar Hauser", aquele filme que eu te falei. Porque eu dava aula em duas escolas, no "Coreolano Monteiro", que ainda tem essa disciplina, e dava aula no "Jamil Gadia". No "Coreolano", eu fiz um trabalho com esse filme com a professora de Portugus. Ela mexeu com a questo da linguagem, e eu mexendo com a questo da cultura. Foi muito legal. Eu tentei fazer isto na outra escola e

    8 BRUZZO, Cristina. O CINEMA NA ESCOLA: o professor, um espectador. Pg. 134. Tese de doutorado apresentado na Faculdade de Educao da universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Campinas, 1995.

  • 15

    na lista da videoteca tinha o filme, mas no estava ali, na hora de achar a fita... sumiu a fita. E era uma coisa fechada, ningum usava, to complicado. Diretor pensa uma coisa, professor pensa outra... Em geral, eles pensam que esto fazendo um trabalho democrtico, mas na verdade no esto coisa nenhuma, enfim, era uma escola meio complicada, muito racha dentro da escola, alguns grupos que pensavam de um jeito, outros pensavam de outro... Havia muitos professores? Tem bastante. Enfim, a coisa no rolou muito bem. A gente perdia muito tempo brigando. Vrias faces ali dentro, e na hora de acontecer... no acontecia coisa nenhuma."

    (Entrevista com Prof. Maria)

    Afinal o que d para fazer com to poucas aulas?

    DA MOTIVAO PARA O USO

    Contudo o gosto pelo cinema e a atrao por filmes preservam o desejo e o

    interesse para traz-los at seus alunos. Dificuldades de ordem financeira, pouco

    tempo destinado ao lazer so apontados como principais responsveis pela

    dificuldade e impossibilidade de se ir ao cinema. Alm disso, o pouco tempo em

    casa, sendo dividido entre o cuidado com os filhos e/ou destinado ao descanso,

    onde a TV assistida como um passatempo, so colocados como fatores

    responsveis pelo fato de assistirem poucos filmes pela TV ou em vdeo, e por um

    comportamento de baixo consumo, e por isso s o gosto pelo cinema, presente em

    suas vidas, ajuda no interesse e os motiva para que se utilizem de "imagens

    flmicas" em suas aulas.

    "O que voc acha do cinema? Voc gosta de assistir filmes?

  • 16

    Eu acho que... eu gosto de assistir filmes, eu percebo que a fora do cinema enquanto... engraado, que quando eu vou assistir um filme, eu saio de l com a impresso de que aquele filme no valeu a pena, e depois, eu me vejo me reportando s imagens do filme, me identifico com alguma coisa que se passou no filme, mesmo que, no momento, eu no tenha valorizado aquilo. Eu acho que das diverses possveis, a que eu mais gosto cinema. Eu acho que a linguagem do cinema tem um poder de... se comunica muito fcil com a gente o cinema! uma coisa muito... te envolve muito o cinema. Pena que eu tenho pouco acesso ao cinema." "Tem alguma dificuldade para ir ao cinema, qual? Falta de dinheiro."

    (Entrevista com Prof. Marta)

    "Ento, o que eu acho do cinema? No gostar de cinema muito difcil. Eu tenho visto poucos filmes por questes circunstanciais: criana pequena, grana curtssima. Eu no devo ser a nica. Tenho visto pouco mesmo, embora, isso me faa muita falta."

    (Entrevista com Prof. Maria)

    "Eu adoro cinema. Acho um veculo que te leva a viajar. Voc pode ir tanto para o inferno, quanto para o cu, vamos dizer assim, os dois extremos. Cinema eu acho legal. Um veculo fantstico capaz de nos transportar para muito alm da imaginao." "Voc gosta de assistir filme? Eu gosto. Eu tenho uma dificuldade brutal porque eu morro de sono. Voc vai ao cinema noite, depois de trabalhar o dia inteiro, pode ser o filme mais interessante do mundo... no tem essa. Cochilar o meu grande problema. Mesmo em casa, tem TV a cabo, mas...(...) Tinha meses que eu no conseguia assistir um filme, porque eu deito na cama, eu durmo. (...) Porque a hora que voc vai ter a noite mesmo, e noite voc j est quebrada. Fica complicado, mas sempre que d eu curto."

    (Entrevista com Prof. Ana)

  • 17

    Com isso o professor se depara com outras dificuldades, que o gosto pelo

    cinema, e os equipamentos na escola no so suficientes para superar.

    Mesmo assim os professores em sua maioria se mostraram interessados na

    introduo de imagens em movimento em suas aulas e as utilizam cada um sua

    forma e a seu gosto, um, dois, trs, at cinco filmes durante o ano.

    DA IMPORTNCIA DO QUESTIONAMENTO DA MDIA

    Sem dvida os professores estudados no pensam a escola como uma

    instituio fechada, sem relao com a sociedade e todas as instncias poltico-

    econmicas e culturais que a integram, e sem relao com os meios de

    comunicao e com quem os domina, sem receber interferncia destes meios, ou

    seja, completamente desvinculada do processo de comunicao social. Colocam

    assim a escola como um lugar importante para se tratar de assuntos, questes e

    temas relacionados mdia e apresentados por ela.

    "Qual na sua opinio o papel da educao, da escola e do professor diante da mdia, dos meios de comunicao, e de seus produtos culturais? Voc acha que esse tema, meio de comunicao, deve ser tratado na escola? Acho que sim, inclusive porque eles so bombardeados pelos meios de comunicao, e se voc no der uma viso crtica, hoje em dia, eu passei da fase de ficar dizendo: eu sou a dona da verdade; eu tive disso, embora no seja muito bom para um socilogo, mas eu at passei por isso, achando que eu tinha que doutrinar porque eles eram muito fraquinhos. Isso faz muito tempo. O que eu fao hoje tentar dar subsdios para que eles pensem sozinhos. E tem que pensar sobre essas coisas, porque voc bombardeado, e uma coisa extremamente antidemocrtica. Voc est recebendo aquilo, e

  • 18

    se voc no tem o mnimo de crtica... uma coisa extremamente totalitria, que lembra o totalitarismo. Ento isso muito srio. Voc tem que tentar dar alguns subsdios, alguns elementos para que eles consigam discernir certas coisas."

    (Entrevista com Prof. Maria)

    "Qual sua opinio sobre o papel da educao, da escola, ou do professor frente mdia, os meios de comunicao? O papel us-los a nosso favor. Eu acho que o papel, eu acho que a gente tem que usar toda essa produo em nosso favor, reverter a coisa para o nosso lado, que uma coisa meio complicada, mas a nica forma de a gente superar tudo isso, toda essa imagem. Ns estamos l no sculo passado em termos de educao, e eu acho que o nico jeito tentar usar isso, reverter esse processo. "Ratinho livre", pega o "Ratinho Livre", traz para a sala de aula e mostra o que isso, o que a degradao, porque aquilo ali uma degradao. Eu assisto "Ratinho Livre" sem preconceito nenhum, mas acho aquilo um horror, aquilo um circo, parece os Gladiadores, um absurdo, as pessoas se expem, vo l expor para o Brasil inteiro o que est acontecendo dentro da sua casa, d para entender isso? uma degradao, ento, mas ele assiste isso, ento, vamos levar para a sala de aula e mostrar para ele. Por que ele gosta, tem prazer em ver a desgraa do outro?"

    (Entrevista com Prof. Ana)

    "Qual na sua opinio o papel da educao, da escola, at mesmo do professor diante da mdia e dos produtos que ela apresenta? Eu acho que ns temos tambm que, muitas vezes, alertar os alunos para o tipo de produto que est sendo colocado para eles assistirem, at pegar um filme que pode at parecer ruim, pssimo. Mostrar para eles o que est por trs daquele filme ou daquele programa e estar colocando para eles como funciona a mdia. Dependendo da poca, no 1 semestre por exemplo, eu coloquei para eles um pouco da questo do futebol, da Copa, porque pra tudo, porque tem que fechar tudo, o comrcio tem que fechar, todo mundo tem que ir embora mais cedo para casa. Por que isso? E agora o que eu estou batendo bastante com eles a questo das eleies. Estou pedindo para eles assistirem os programas eleitorais,

  • 19

    estou com texto em cima disso. O meu vdeo, eu perdi o manual e eu no sei como gravar nele, mas eu queria gravar alguns programas eleitorais e levar para eles, ou se coincidir, se a televiso no estiver conectada com a TV Escola, levar eles no horrio eleitoral para assistir um pedacinho do horrio e estar comentando com eles sobre isso. Pesquisas, como eles no tinham a mnima idia de como se fazia uma amostragem para pesquisa, eu trouxe alguns textos para eles. Eu j bato bastante nessa questo. Agora eu estou trabalhando com as eleies, com eles."

    (Entrevista com Prof. Dbora)

    "Qual sua opinio sobre o papel da educao, da escola, e at mesmo do professor diante da mdia, dos meios de comunicao, e os produtos que elas fazem? Olha, eu acho sim, que a educao, eu vou pensar assim, os meios de comunicao como um produto social, uma realidade, uma dimenso social, uma coisa a ser analisada do ponto de vista poltico, do ponto de vista no esttico. uma coisa a ser analisada (...)."

    (Entrevista com Prof. Jos)

    "Qual o papel da educao, da escola, do professor diante da mdia e dos produtos culturais que a mdia produz? Mdia de um modo geral. Eu acho que h uma falsa discusso nesse pas, a tica est invertida, quando eu falo que a educao a sada, voc encontrou uma vala, que no comum, no cho, uma discusso sria, tem um significado social muito grande. Mas voc no resolve o problema de um pas, colocando uma pessoa, s na escola.(...) A escola um aparato ideolgico, nada est fechado e nada est totalmente... tudo possvel. S que a escola interfere na sociedade e a sociedade interfere na escola. O que ns estamos vendo que, criaram um modelo para o aparato escolar que no reflete a realidade.(...) Eu acho que tem que mexer com a estrutura econmica, com a estrutura da lei, com a estrutura das relaes sociais, para que a sim, o indivduo possa atuar depois da escolaridade, porque seno, o cara no reflete nada. Eu acho que na questo da mdia, o papel da escola, ela uma formadora de opinio. A maneira como eu me visto, como eu falo, como eu

  • 20

    trato a coisa pblica, a maneira com que eu trato as pessoas. O professor tem esse papel, eu acho que eu sou uma pessoa que no vou ser um grande educador, no porque eu no queira, mas, porque eu tenho que lutar muito mais pela sobrevivncia por causa do salrio, que indigno para um professor, ao menos a minha funo.(...) Ento, eu acho que essa questo de educar, a gente o formador de opinio, sim, a esperana est aqui e a desesperana pode estar aqui tambm.(...) Na questo da mdia, eu penso que a mdia tem um papel fundamental, eu no sou pela censura, eu acho que tem que ter do "Ratinho" ao "Gugu", como a TV Cultura. E hoje, pelo pouco que eu vejo e leio e tento refletir de uma maneira mais aprofundada, eu acho que hoje voc tem uma sociedade televisiva interativa. Depois que surgiu o controle remoto eu no me levanto, uma vida um pouco mais ociosa, porque gera um grande exerccio voc levantar para mudar o canal, hoje voc est mais sedentrio nisso, mas quando voc tem o controle eu posso escolher. Eu estou percebendo que a massificao est dando mais espao para esses programas que, na minha opinio, so piores para a formao da cidadania e da conscincia, do que aqueles que, na minha opinio, so... uma televiso que leve a uma reflexo aprofundada, que me traga subsdios mais conseqentes, que me leve a refletir, que compare as situaes. Eu acho que a educao poderia estar por a tambm. Alguns dizem que esses programas tambm educam, eu tenho minhas dvidas se educam, no tenho nada contra as pessoas que esto l, ganham muito mais do que eu, sorte deles, azar meu. Como cidado, os valores podem estar at equivocados, mas a televiso tem um papel fundamental. Por que eu no vou falar do jornal? Porque o jornal pressupe um outro comportamento disciplinar, quer dizer, voc precisa ter um comportamento de leitura. O primeiro comportamento de leitura de uma cidadania o jornal, o jornal te induz, te prepara, te educa pra voc ler um livro, que um outro patamar. O rdio perdeu muito, apesar de que o rdio forte ainda, no nos centros urbanos, mas no interior ele ainda mais forte que a televiso, mas hoje quem define um perfil da cidadania a televiso, a mdia televisiva. E eu acho que ela teria um papel importante, eu sou muito crtico nessa questo da televiso, meus alunos, muitos gostam desses programas

  • 21

    que eu no gosto, e toda hora eu estou levando eles a refletirem, no estou falando que eles no devam assistir."

    (Entrevista com Prof. Pedro)

    Esses professores atribuem mdia um grande poder, pois atravs dela as

    pessoas so "bombardeadas" por imagens, idias, opinies, pontos de vistas,

    ideologias, e no tem tempo de pensarem sobre aquilo que vem. Por isso, acham

    importante passar para seus alunos alguns elementos para que eles tenham uma

    "viso crtica" para analisarem a ideologia presente na mdia. Pois a mdia,

    principalmente a TV, possui um grande poder de dominao, formadora de

    opinio, um lugar perigoso e portanto o papel do professor "alertar seus

    alunos", "tentar dar subsdios para que eles pensem sozinhos".

    Fala-se muito hoje da falta de autonomia que se tem diante das imagens, da

    escravizao que estas, atravs da mdia, nos impem. E, por isso, trazer imagens

    para a sala de aula, e/ou criticar e analisar as imagens recebidas atravs da TV,

    principalmente, seria uma boa forma de se garantir o direito de escolha e de

    pensamento diante das imagens.

    Podemos dizer que em nossa sociedade "adquire carter de verdade

    instantnea aquilo que mostrado, visto e ouvido"9, a semelhana com o real que

    as imagens em movimento possuem, contribuem para isso. Por isso a mdia, aqui

    no caso TV e cinema, adquire fora, pois as imagens e sons possuem um carter

    persuasivo, de coeso e imposio, apresentando-se como um discurso

    9 ALMEIDA, Milton Jos de. IMAGENS E SONS: a nova cultura oral. Pg. 46. Coleo questes da nossa poca, vol. 32, Editora Cortez, So Paulo, 1994.

  • 22

    momentneo, real e envolvente. Discurso respaldado pelo poder da imagem10 que

    est em convencer e sensibilizar. Convencer, pois toda imagem tida como uma

    prova da realidade, quem v sempre uma testemunha ocular do fato, daquilo que

    viu, e por isso necessrio ver para crer. E sensibilizar, pois a imagem tem a

    capacidade de seduzir e comover, nos atrai e nos toca, nos emociona. Pois tanto

    com o cinema quanto com a TV, por parte do espectador, "no h esforo mental

    significativo, h deslumbramento e aceitao. O impacto emocional, afetivo,

    global"11, a relao espectador-imagem no passa por uma construo racional,

    como numa leitura. No h a possibilidade de uma imediata interveno do

    espectador como acontece numa conversa, num dilogo.

    Ressalta-se diante disso uma situao "perigosa" em que o espectador pode

    ser conduzido por um prazer visual, "levado" por imagens sem tempo para refletir

    sobre elas, pois seu pensamento segue uma forma reflexa, visual, rpida,

    instantnea. Perigosa pelo fato de no haver forma de dominao mais eficaz do

    que aquela que direciona o indivduo dominado sem que ele a perceba, aquela que

    faz com que este indivduo acredite estar agindo e pensando de acordo com suas

    prprias vontades e/ou seus prprios desejos, no entanto age de uma forma

    mecnica, reflexa, sem grandes mediaes.

    Mas qual o lugar da imagem na educao? Qual o papel da escola diante do

    fascnio, do prazer e da aparncia de verdade da imagem?

    10 CALADO, Isabel. A utilizao educativa das imagens. Srie Mundo dos Seres. Editora Porto, Porto, Portugal, 1994. 11 OLIVEIRA JR., Wenceslao Machado de. A CIDADE (TELE)PERCEBIDA: em busca da atual imagem do urbano. Pg. 64 Dissertao de mestrado apresentada na Universidade Estadual de Campinas/Faculdade de Educao - Campinas, S.P., 1994.

  • 23

    A possibilidade de introduo da imagem na escola se apresenta portanto

    no momento seguinte, momento da apresentao ou viso da prpria imagem, do

    contato com ela, como nos coloca Almeida, "A diferena fundamental, que

    caracteriza o poder e a persuaso dos meios de comunicao em imagens e sons,

    que entre estes e os espectadores no se estabelece nenhum dilogo, nenhum jogo

    caracterstico da situao de uma conversa, no h possibilidade de divergncia

    nem interveno no discurso do outro, h somente a possibilidade de uma fala-

    reflexo, discusso aps sua exibio, e sem sua presena"12. O que o professor traz

    para a escola a possibilidade de uma fala-reflexo, uma discusso aps a exibio

    do filme ou programa de TV, traz a possibilidade de fazer junto com seus alunos

    um exerccio de pensamento.

    Para alguns autores a imagem da mdia de uma forma geral deveria ser

    tema principal de uma disciplina especfica, um curso de comunicao social para

    o colgio.

    Estudiosos da relao entre comunicao e educao colocam como pontos

    importantes e necessrios: a alfabetizao para leitura da imagem13; a importncia

    de uma efetiva introduo da Comunicao Social no ensino formal em todos os

    nveis14, pois o ensino deve se preocupar com as mensagens produzidas pela

    indstria cultural atravs de uma "leitura crtica da comunicao"; o papel da

    imagem no ensino e a apresentao de formas prticas para sua aplicao direta no

    12 ALMEIDA, Milton Jos de. IMAGENS E SONS: a nova cultura oral. Pg. 46. Coleo questes da nossa poca, vol. 32, Editora Cortez, So Paulo, 1994. 13 ALMEIDA JR., Joo Baptista de. IMAGEM E CONHECIMENTO: anlise das concepes representacionista e fenomenolgica e suas implicaes na educao. Pg.. 270. Tese de doutorado apresentada na Faculdade de Educao na Universidade Estadual de Campinas UNICAMP, Campinas, S.P., 1997. 14 SOARES, Ismar de Oliveira. "A Nova LDB e a Formao de Profissionais para a Inter-relao Comunicao/Educao", pgs. 21-26. Revista Comunicao e Educao, Ano I, N 2, janeiro/abril, So Paulo, 1995.

  • 24

    ensino buscando, principalmente, "tornar a pessoa mais atenta a todo o processo

    informativo, s mediaes conjunturais e do processo de produo da indstria

    cultural, que interfere nos resultados informativos"15.

    Considerando essa relao entre o homem e os meios de comunicao uma

    forma perigosa, pois manipula conscincias, e persuasiva, pois seduz e impulsiona

    o indivduo-espectador para aes sem prvio controle, esses estudiosos colocam

    como imprescindvel ao indivduo um posicionamento crtico que o auxilie na

    observao, anlise e julgamento daquilo com que entra em contato e que lhe

    permita decodificar as informaes recebidas, discernindo sobre a qualidade e a

    validade de seu contedo. Para tanto, seria necessrio a existncia de uma

    disciplina especfica que trataria dessa relao, educando as pessoas desde cedo a

    no serem ingnuas com relao aos meios de comunicao e seus produtos.

    Podemos dizer que esses estudiosos, como SOARES e MORN, "adotam

    uma concepo simplista dos efeitos do cinema e da televiso e, concedendo aos

    meios audiovisuais de comunicao um lugar desmesurado na corrente das

    causalidades, encontram uma explicao fcil para os males de nossa sociedade"16

    e assim atribuem escola e criao de uma disciplina especfica a reparao e a

    resoluo dos males sociais, e s imagens do cinema e da televiso, a "culpa", e a

    responsabilidade por esses males sociais.

    De um modo geral, portanto, essas teorias17 sobre a mdia pensam o

    telespectador de uma forma passiva, na qual o que lhe cabe reconhecer,

    15 MORN, Jos Manuel. "O vdeo na sala de aula". Revista Comunicao e Educao, So Paulo, (2): 27-35, janeiro/abril, 1995. 16 TARDY, Michel. O PROFESSOR E AS IMAGENS. Pg.24. Editora Cultrix. So Paulo, SP, 1976. 17 ENZENSBERGER, Hans Magnus, em MEDIOCRIDADE E LOUCURA, pgina 69-71, apresenta essas teorias de uma forma crtica como sendo: 1- "A tese da manipulao que aponta para a dimenso

  • 25

    aprender, se informar, se educar, se instruir a partir de modelos e produtos

    culturais (em imagens-sons) construdos para ele. A mdia pensada como

    exercendo um incontrolvel poder de seduo, persuaso e manipulao sobre seu

    pblico e o indivduo-telespectador pensado como se fosse uma tbula rasa, algo

    pronto para ser amoldado e preenchido como for necessrio, algum que no

    escolhe.

    Baseadas na relao afetiva, emocional, sensvel e hipntica que se

    estabelece entre o espectador e a imagem do vdeo, da televiso ou do cinema,

    essas teorias, portanto, tem por ideal romper essa relao mgica de participao

    emotiva, essa hipnose, visando obter um pensamento crtico com relao ao meio e

    imagem. O objetivo principal mostrar o perigo e o poder da imagem. educar

    para criticar os meios. educar para se proteger dos meios.

    Apesar de sentirem a dominao e atriburem um grande poder mdia e

    sua relao com os telespectadores e a sociedade de um modo geral, e aceitando a

    idia de que os indivduos espectadores, para no serem ingnuos e passivos com

    relao aos produtos da mdia e seus contedos, necessitam de uma "viso crtica",

    os professores entrevistados no vem necessidade na criao de uma nova

    disciplina para abordar temas como mdia, TV, meios de comunicao e todas as

    suas implicaes com relao sociedade e aos indivduos, e acham que a

    Sociologia suficientemente capaz para abordar esses temas.

    ideolgica imputada aos canais da mdia. O canal da mdia compreendido como sendo um condutor neutro, que despeja opinies sobre um pblico considerado passivo." A mdia portanto conduziria o espectador para uma falsa conscincia e ele seria manobrado sem sequer compreender o que est acontecendo com ele. 2 - "A tese da imitao que argumenta principalmente em termos morais.(...) Qualquer pessoa exposta a ela (mdia) acaba se habituando libertinagem, irresponsabilidade, ao crime e violncia". 3 - A tese da simulao onde o espectador torna-se incapaz de distinguir entre a realidade e a fico. 4 - A tese da imbecilizao onde "a mdia ataca no apenas a capacidade de criticar e diferenciar e a fibra moral e poltica de

  • 26

    Nessa relao que se estabelece entre a mdia e os telespectadores, o

    professor de Sociologia se v no papel de alert-los, pois para o professor h algo

    oculto, dissimulado nos programas televisivos, que permite que o espectador seja

    enganado ou se envolva sem ter conscincia do que est acontecendo com ele. Por

    exemplo, podendo ser levado a ter opinies e idias sem refletir sobre elas, (no

    tendo assim condies de escolher o que seria o melhor para si ) ou ento tomando

    por verdade algo montado e recortado para que o espectador tome determinada

    posio e no outra, sendo induzido a pensar de uma determinada forma, sendo

    levado a acreditar em algo que no verdadeiro.

    Mas nem s perigo e dominao encontra o professor de Sociologia na

    imagem, e por isso no s procura falar de TV e seu contedo em sala, mas se

    utiliza de filmes de fico em seu trabalho. Utiliza a imagem, portanto, como um

    recurso que permite no s a crtica dos determinantes polticos e ideolgicos dos

    meios, mas que possibilita uma aproximao afetiva dos alunos com o tema

    estudado, buscando outras formas de perceber e conhecer que no s atravs do

    discurso e da leitura.

    Apesar do professor no ver a necessidade da criao de uma disciplina

    especfica para tratar de assuntos relacionados mdia, e s imagens, ele ao se

    utilizar de filmes em suas aulas se depara com dificuldades e dvidas, sentindo

    que sua formao falha para elimin-las e para auxili-lo em seu trabalho.

    "Voc sente falta de algum treinamento especfico ou de alguma coisa que poderia estar lhe auxiliando? Gostaria muito de...

    seus usurios, como tambm sua capacidade bsica de percepo, at mesmo sua identidade fsica".

  • 27

    Eu adoraria, porque a coisa fica meio amadora, percebe no meu discurso como fica amador. Eu tento, mas eu t dura. No vou ao cinema. O que eu tenho so umas fitas l em casa que eu gravo algumas coisas da TV. O que precrio. Se eu tivesse a disponibilidade de fazer um curso, uma coisa sobre isso, seria maravilhoso. Voc acha que qualquer professor pode estar usando isso, no precisaria ser um especialista em filmes para estar usando? Acho que no. Mas, estaria faltando esse tipo de... Acho que falta." Voc acha que o professor deveria ter um treinamento especfico ou cursos, voc acha que falta isso? Para o professor atualmente faltam sim, muitos cursos de atualizao, cursos nos quais eles possam estar se atualizando na rea deles, fora da rea deles, acho que falta muito isso. A universidade, geralmente, ela oferece muitos recursos para ns que j estamos trabalhando, mas s vezes a dificuldade muito grande, trabalha dois perodos, no tem tempo. Ento eu no sei se poderia partir da Universidade ou como esto tendo agora esses cursos do PEC, abrir mais propostas de cursos ou at abrir um curso nessa parte para os professores de todas as disciplinas, mas acharia interessante se abrisse."

    (Entrevista com Prof. Maria) Voc conhece algum livro ou texto que voc considera importante, que poderia estar te auxiliando em como estar usando imagem? No conheo nada. Eu lembro de uma conversa que eu tive com uma aluna que faz mestrado, ela tava falando sobre o uso de vdeo histrico nas aulas de Histria, ela tava falando que ela achava complicado isso porque voc no, voc precisaria saber muita coisa sobre filme pra poder estar passando filme como recurso didtico em Histria, porque voc no sabe a fidelidade, quer dizer, a pesquisa do autor pra fazer aquele filme, e de repente voc passa aquilo, como o filme tem um poder de, ele te traz as coisas como verdade, acaba te trazendo as coisas como verdade da poca, e ela disse que esse tipo de preocupao os professores deveriam ter, eu achei interessante, foi a primeira vez que eu ouvi uma crtica ao uso de filmes em sala de aula." (...)

  • 28

    "Eu acho que poderia fazer parte do preparo dos professores, alguma oficina pedaggica para estar discutindo isso, mas eu vejo professores que simplesmente passam o filme e pronto e, s vezes, passam o filme pra poder matar tempo, alguma coisa assim, e a, eu acho que o uso errado. Voc acha que falta uma troca de experincia em como estar usando o filme em sala, ou alguma coisa especfica, como no caso de sua amiga em estar sabendo como foi feito o filme? Eu acho que existe uma deficincia tanto na formao acadmica do professor na Universidade, quando esto se formando para ser professor, e no ter orientao no sentido de uso de recurso audiovisual, a gente na Unicamp eu no me lembro de ter tido algo nesse sentido, acho que a preparao do professor falha nesse sentido, depois os rgos, governo de Estado, eu acho que no demonstra preocupao nesse sentido tambm, simplesmente tem l a sala de vdeo, mesmo o uso da TV Escola, aquilo sub utilizado eu no me lembro de ter visto algum falando que usou aquilo. Voc conhece a TV Escola? Eu vi a programao mas nunca utilizei. No sei de ningum que tenha utilizado. Tem algum programa legal? Eu s vi, li a programao, nunca assisti. Ento eu acho que as coisas ficam muito soltas, os professores no esto preparados para usar."

    (Entrevista com Prof. Marta) "Voc acha que o uso do vdeo em aula tem sempre que estar integrado com alguma coisa? Na verdade, eu acho que, mesmo os prprios professores, ns, no sacamos do prprio movimento, dessa prpria dinmica, dessa prpria historicidade, daquilo que est sendo produzido no filme, no s da questo da tcnica que eu t falando, mas da especificidade, dos objetivos, das garantias pra se entender que ele no ilustrao, mas que ele pode servir como estopim para reverberar discusses. Eu mesmo no via o cinema ou o filme como ilustrao, mas tambm tinha poucos elementos para ir alm. (...)

  • 29

    Onde voc acha que est a falta? O professor deve ser um entendido, deve ter um preparo para esse tipo de coisa? Eu acho que tem, que a sociedade usa determinados meios, ns usamos determinados meios e a pelo prprio movimento... esvaziamento da extensidade dessas tcnicas, desses meios, a gente vai usando, mas dificilmente no vivido, no comum dos mortais, ns todos, a gente comea a interrogar, "mas espera a!", "isso tem a ver", "no tem a ver", por que tem a ver?, como possvel ler isso com essas imagens? Como que possvel? A gente d, "como um dado natural", porque a gente j vai sendo educado numa sociedade de imagens, no isso? Mas no comum a gente produzir uma dimenso de estranhamento. Dizer: - No, olha, espera a. um meio, mas para ser interrogado, a gente tem que sacar quais so as interrogaes, sacar e por que a gente no est sacando? Eu acho muito mais tambm porque vem dessa coisa, porque funciona, por exemplo essa questo do uso de vdeo na televiso, disse bobagem, porque o uso do audiovisual na escola... por onde passa o pensamento do professor e da escola, etc... e tal, de permitir que, porque a escola um reduto bem fechado, n, ela filtra determinadas... o que se passar, o que pode entrar dentro dela e o que no pode. S que entra, mesmo que ela no queira, mesmo que a administrao no queira, entra n. E a, quer dizer, quando se usa isto, o professor usa, a escola usa, olha, todo mundo tem em casa TV, todo mundo assiste TV. Ento vamos, muitas vezes voc tem 50 neguinhos em sala de aula, vai te dar um refresco, pelo menos eles esto assistindo, o processo no vai importar tanto, se vai detonar a uma discusso... se o professor vai dar conta ou no vai... vai possibilitar mais ou menos segurar essa onda, se no vai, porque que no vai, como que no vai. No, tem muito isso. Tinha uma professora de Cincias que era muito assim, olha vou passar meus documentrios de Biologia porque eles vo ficar quietos, principalmente agora noite que eu tenho 5 aulas e que vai me dar um refresco do caramba, eu j dei 10 aulas. 10 aulas exagero da minha parte, eu j dei trocentas aulas de manh e agora dou tarde, e agora vem a noite. Ento essa coisa fica meio... no que seja um conceito, no , seria um absurdo eu falar que um conceito de professores, mas a vem, do tipo assim... Porque a televiso entra, porque

  • 30

    a imagem entra na escola, porque ela no pode mais segurar as comportas de que uma educao est sendo produzida por imagens para alm dela. Por que o computador entra na escola? No porque um projeto da escola, porque o projeto da escola, pelo menos de uma escola pblica de esvazi-la disso, como no pode... no segura as comportas, a entra. Mas a existe esses ene usos - mudam de uso, se transforma sem muitas interrogaes, sem muito questionamento, pelo menos eu tenho visto assim. No que no h trabalhos que no vo para uma outra linha, porque a gente tem que situar mesmo a escola como espao, evidentemente, que no transforma, se defronta ali, se engalfinha ali, uma arena, e que h uma ao e resistncia de todos os lados. Mas, eu acho que falta isso, sacar que no porque a escola no conseguiu segurar as comportas, que esses meios entraram, porque a escola tambm faz parte do processo social, da sociedade mais ampla, no uma ilha, que ela no segura, que os alunos no so filtrados quando entram ali. Ela no filtra. Sabe por que eu estou falando isso? Porque como esses meios vo entrando ali dentro da escola, no em funo dos projetos que ocorrem no seu interior, que eu acho que seria legal se fosse assim, se os professores, a direo, todos estivessem em p de que... olha, por a, porque ns queremos ou porque importante por isso e por isso. Mas no . (...) eu t pensando nessa coisa, nesse desvnculo entre um projeto do uso e o uso que se faz (...)".

    (Entrevista com Prof. Antnio)

    Parece-nos que especfico e primordial para o professor, por um lado,

    saber como fazer, como conseguir transmitir conhecimento, como ensinar atravs

    de imagens, e, por outro, como no ser ingnuo e sim crtico com relao s

    imagens que a todo momento, em nossa moderna sociedade, nos so impostas

    pelos meios de comunicao e apresentadas a ns no cotidiano. um fazer que

    est ligado a uma Educao com os meios de comunicao, em que o professor se

    utiliza da mdia como um recurso a mais em sala que lhe permite a introduo de

    outros elementos no momento da aprendizagem. um fazer que est ligado a uma

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    Educao para os meios de comunicao, em que o professor seria responsvel por

    dar uma "viso crtica" ao aluno e tambm por dar uma preparao para que esse

    entre em contato com imagens e com os produtos culturais.

    DA ESCOLHA DO FILME PARA A AULA

    O professor um espectador especial pois j viu as imagens que utiliza

    antes de us-las em suas aulas, antes de mostr-las e discuti-las com seus alunos.

    "O que voc leva em considerao quando voc escolhe um filme? Eu sempre assisto antes, eu nunca peguei filme no escuro para passar para eles, mesmo que algum indique. Eu vou l, pego, assisto e vejo do que trata o filme para poder passar para eles antes. Eu sempre procuro ver, dentro daquilo que eu estou trabalhando, o que aquele filme pode contribuir, para eles poderem estar entendendo melhor, o que eu quero passar com aquele filme, e eu procuro deixar isso bem claro para eles antes de eles assistirem o filme: vocs esto assistindo o filme por esses motivos, porque se voc leva um filme e no d uma satisfao, no diz o que quer com aquele filme, geralmente dispersa, se o filme no interessante para eles, dispersa, se voc coloca um objetivo, mesmo que eles estejam achando chato, que eles no tenham gostado, eles ficam atentos at o final."

    (Entrevista com Prof. Dbora) Atravs de quais formas voc escolhe os filmes que voc passa? Sugestes de quem? So idias suas ou voc j pegou sugesto de algum aluno, de algum amigo, algum professor? Como que voc faz para escolher, para selecionar os filmes que voc vai passar na aula? Geralmente um filme que eu j assisti. Eu no me lembro de ter passado um filme que algum tenha sugerido, no que eu no possa fazer isso, mas como eu gosto muito de assistir, s vezes eu j tenho alguma coisa mais ou menos em vista,

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    dependendo do assunto, da coisa, eu j fico imaginando, pxa seria interessante passar o filme. Porque uma coisa voc ter o conceito, outra coisa voc viver o cinema, a arte, ela trabalha uma outra dimenso "afetiva" ou perceptiva. Voc trabalha com a percepo, ento voc, atravs de uma produo fictcia, voc vivncia uma situao que talvez voc no vivenciaria realmente aquela situao. Voc pode vivenciar isso atravs do cinema."

    (Entrevista com Prof. Jos) "O que voc leva em considerao quando vai passar um filme? Por exemplo, quando eu dava aula..., no como ilustrao, mas que se sensibilize para o tema. Por exemplo, dando a questo do descobrimento do Brasil, o perodo e tal, "Cristvo Colombo, 1492", no ilustrao e eu deixava bem claro isso pra eles: - gente, olha, tem um filme que tenta dar umas imagens, ou uma verso sobre como que a gente podia se sensibilizar pelas imagens com um tempo que vivido pela humanidade, que nos pertence, mas que a gente no viveu".

    (Entrevista com Prof. Antnio) "Voc tem preferncia por algum tipo de filme em especial? um filme que voc assistiu ou escolheu antes? Tem que ser um filme que eu tenha visto. De todo jeito eu tenho que ver o filme. Um filme que tenha o tema que eu t trabalhando. Se so atuais... feitos o ano passado... (...) D para pegar qualquer filme, desde que voc trabalhe de uma forma interessante, voc tem que dar uma motivada na classe."

    (Entrevista com Prof. Maria)

    tambm um produtor, pois escolheu as imagens que deseja mostrar, e

    sobre as quais pretende refletir com seus alunos.

    "Todos os filmes que voc escolhe para passar, todos esto diretamente ligados com o tema que voc est passando na aula, com

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    o currculo? Como que voc faz para escolher os filmes? Precisa estar muito ligado com a temtica ou com assuntos do momento? A temtica. Eu procuro a temtica, no caso, ela ser voltada para se pensar a realidade, ento da maneira como eu trabalho Sociologia, esta uma proposta... assim, que tem bastante sentido. No voc ficar... A proposta assim, utilizar o pensamento sociolgico das Cincias Sociais de uma maneira geral para estar pensando a realidade, ento eu penso que ao estar discutindo o conceito de Cultura, eu no estou fazendo uma teoria desligada, eu estou pensando a realidade a partir de um conceito, a gente no pensa sem conceito, seja ela daquilo que a gente considera natural, nossa fala permeada de conceitos, conceitos de senso comum, etc.. Ento, e o filme vai ser encaixado nisso da, agora eu no lembro de ter de repente pego um filme, no caso eu vou pegando assuntos que esto rolando para ir encaixando na temtica."

    (Entrevista com Prof. Jos) "E como voc escolhe o filme para passar? At agora foram os filmes trabalhados, previamente elaborados, porque a gente obrigado a fazer um planejamento, o que uma coisa tambm extremamente questionvel. Porque voc pode planejar e chegar na sala de aula, a classe tem outra cara, outro perfil, isso na rea de humanas, porque Matemtica, Qumica, Fsica aquilo e pronto. No comeo do ano voc obrigado a fazer planejamento, eu detesto, mas eu tenho que fazer, e a partir desses temas voc vai usar alguns recursos de filmes, de programas que batam com o tema que voc est trabalhando."

    (Entrevista com Prof. Maria) "Quem escolhe os filmes que voc usa? Voc j pediu indicao de um outro professor ou coisa que voc assistiu, gostou, ou coisas que os alunos sugerem? J. s vezes o que eles sugerem, converso muito com outros professores, vejo, s vezes at aceito indicao. Tal filme legal para tal coisa e a eu vou pegando, eles vo colocando, eu tambm, s vezes vejo um filme e pro para pensar: esse filme interessante, d para trabalhar com tal coisa, ento a

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    eu anoto o nome, guardo, deixo l e quando eu tenho oportunidade, eu passo. Falando do "Medidas Extremas", eu troco o nome do filme, que eu assisti o ano passado num curso de especializao e achei realmente que daria para trabalhar em sala de aula, e agora, eu estou levando ele para a sala de aula."

    (Entrevista com Prof. Dbora) "Qual seria o critrio para voc escolher ou selecionar um filme? Voc est falando de um tema e pega um filme relativo ao tema, ou ento voc aproveita os assuntos do momento? Geralmente eu estou falando de algum tema e pego o filme de acordo com aquele tema. Se no tiver filme com aquele tema, eu no pego filme, eu no costumo, a qualidade, sei l."

    (Entrevista com Prof. Marta)

    Aparentemente os limites da escolha do filme usado em sala, alm de sua

    ligao com o tema abordado no momento em sala de aula e o fato do professor j

    conhecer e ter assistido previamente o filme, so determinados pela forma de

    aquisio do produto cultural utilizado. Os professores no demonstraram

    preferncia na escolha entre documentrio ou fico, nem entre curtas ou longas-

    metragens. Esses formatos no apareceram como determinantes durante a escolha,

    embora, geralmente, usem com mais freqncia fico, longas metragens e filmes

    "mais comerciais", principalmente pela facilidade de encontra-los e adquiri-los.

    Mesmo se utilizando de filmes poucas vezes durante um ano, cerca de uma

    ou duas vezes, os professores de Sociologia optam geralmente pela utilizao de

    "filmes comerciais", ou seja filmes mais comuns e de fcil aceitao pelos alunos,

    em suas aulas. A fico se torna muito mais presente na escola do que a aparente

    ligao com a "realidade-verdade" dos documentrios, assim, trabalham com

    acontecimentos criados, como numa simulao. Vivenciar um acontecimento sem

    estar presente, podendo ouvi-lo, v-lo e senti-lo sem perigo, envolvendo-se sem

  • 35

    riscos (se que isso possvel). E, a partir da, interpretar o que se viu, ouviu e

    sentiu direcionado apenas pelo tema proposto previamente na aula. O aluno,

    diferente de assistir TV ou um filme no cinema (lugares de diverso e passatempo),

    faria ento uma interpretao temtica relacionada ao contedo de uma disciplina

    especfica, no caso Sociologia, direcionada pelo professor, onde as suas emoes

    estivessem presentes com a razo, dada por um "aparente" distanciamento, pois

    assiste-se um filme, produto cultural de entretenimento, num contexto

    determinado ("srio", pois responsvel pela formao, para a vida e/ou para o

    trabalho, do indivduo, onde se tem um "compromisso" de ser promovido para a

    prxima srie) que a escola.

    Podemos observar que a presena em sala de aula desses filmes mostra uma

    mistura aparentemente estranha e que no parece ter uma ligao consistente entre

    indstria de massa e ensino, que parece demonstrar fortemente uma luta contra a

    evaso escolar e contra o desinteresse cada vez maior por parte dos alunos pela

    escola e tudo o que ela oferece e representa.

    Pois ao mesmo tempo em que a introduo de imagens em movimento na

    escola trouxe a possibilidade de uma crtica e uma desmistificao da mdia de um

    modo geral, pois esse era o objetivo principal dessa introduo, com essas imagens,

    programas de TV e filmes, deu-se a entrada na escola de um elemento novo,

    ldico, agradvel e de entretenimento que mexe com as emoes, sentimentos,

    memria, ou seja, o que aparentemente no controlvel, medido e determinado.

    Alm da facilidade de acesso ao produto cultural, outra varivel importante

    considerada no momento da escolha do filme pelo professor foi a receptividade do

    aluno com relao ao filme, como mostra a fala de um dos professores: "Eu espero

    que eles gostem". O aluno aparentemente tem que ser receptivo, aceitar o filme. Ou

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    seja, o filme tem que prender a ateno do aluno, ou por ser agradvel, ou por

    incomodar de alguma forma.

    "Voc acha que estar usando filmes facilita alcanar seus objetivos, as coisas que voc estava pensando, com mais facilidade? Ou se voc no estivesse usando filmes no mudaria muita coisa? Eu acho que uma maneira de chegar at o aluno, hoje em dia voc pode estar trabalhando com um grupo super-interessado, mas tambm pode estar trabalhando com um grupo super aptico. Ento o filme, a imagem, s vezes, tem uma resposta muito melhor do que o que escrito, para estimular, para chamar a ateno, trazer aquele aluno at voc, despertar o interesse dele para aquilo que voc est trabalhando. s vezes, a imagem tem mais resultado do que um texto, por mais interessante que o texto seja."

    (Entrevista com Prof. Dbora) "Eu j usei filme de longa metragem, curtas, j usei alguns programas de TV gravados. Depende daquilo que eu consigo encontrar, que seja ou um contraponto quilo que eu estou discutindo, ou que leve eles mais frente na reflexo, ou que seja simplesmente uma constatao, porque nem sempre aquilo que a gente pressupe que o adolescente esteja sabendo, que a realidade est a, tem coisas que ele nunca viu. Eu vou dar um exemplo pra voc objetivamente: tem um curta que ganhou o Festival de Gramado em 89, chamado "Ilha das Flores", a primeira reao foi a seguinte, eles no imaginavam que aquilo existisse, o primeiro impacto que d, ento pra te demonstrar que voc precisa escolher, no importa que seja um longa, um documentrio, ou um estritamente educacional, institucional ou alguma coisa da televiso pra voc perceber at a prpria reao deles."

    (Entrevista com Prof. Pedro)

    E aps prender a ateno deve suscitar questionamentos, opinies e deve

    mexer com o aluno. Transformaes internas e discusses, falas, palavras por parte

    do aluno so esperadas e valorizadas pelo professor aps assistirem ao filme.

  • 37

    "Voc acha que o uso da imagem provoca uma transformao na anlise ou reflexo que a pessoa vai fazer sobre outros assuntos? Voc quer passar um tema, voc usa tal filme, voc acha que o filme vai estar ajudando, no s a ficar dentro daquele tema, mas pensar outras coisas, voc acaba refletindo sobre outras coisas tambm? Eu acho que sim, que leva sim. Porque ele pode estar se questionando, mudar questionamentos prprios, ou mudar a maneira de ver determinado assunto, de repente um assunto que para ele, no livro, no texto chato... Voc passa um filme sobre aquele assunto, a imagem vai estar falando aquele mesmo fato de uma outra forma de linguagem e, aquilo vai prender mais a ateno dele e, vai levar como j levou alunos a questionarem mais, a procurarem saber mais sobre determinado assunto, desperta ou pode despertar o interesse dele para outras coisas. Voc acha que facilita a pessoa a pensar sobre outras coisas? Facilita."

    (Entrevista com Prof. Dbora) "Quando voc bota um tema l, a a coisa pipoca, eles trazem na bagagem deles aquilo que eles vem."

    (Entrevista com Prof. Ana) "(...) agora, eu tentei estabelecer uma outra experincia, uma outra relao que mais de que servisse como estopim para uma discusso, etc... - Quero que vocs me contm o que passou e o que no passou. O que essas imagens nos possibilitam diante de nossas inquietaes, tem essa lgica prpria?(...)"

    (Entrevista com Prof. Antnio)

    Alm disso, para no parecer que o professor est "matando aula" ou como

    uma forma de perceber se os alunos "entenderam" o filme ou se ocorreu alguma

    mudana (interna ou no, aparente ou disfarada, sutil ou evidente) neles ou como

    "eles perceberam esse tipo de informao", espera-se geralmente que o aluno faa

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    uma atividade aps assistir ao filme. Ou seja "Sempre tem um trabalho depois"

    (Entrevista com Prof. Jos).

    "Fale um pouco sobre como voc trabalha com os alunos quando voc est usando filme dentro da aula, como voc faz, a prtica mesmo? Se um documentrio d at para ir parando, mas filme eles no gostam que pare, congele, para comentar alguma coisa. s vezes, eu falo para eles: gente, preste ateno em tal coisa! Em determinada parte do filme que vai acontecer uma situao, da na hora eu s falo para eles: ateno! A eles j se ligam de que aquela parte do filme e depois sempre um comentrio ou uma discusso aberta ou, s vezes, no d tempo de fazer essa discusso logo em seguida. Ento, eu peo para eles fazerem um comentrio individual em casa para entregar, e na outra aula... Eu peo para eles fazerem individual em casa para entregar, porque a eles vo sentar e vo relatar mesmo as impresses deles, porque s vezes, de uma semana para outra, esquece muita coisa. Muitos alunos so dispersivos e eles simplesmente fogem. Da eu comento com eles, leio os comentrios e depois que eu leio os comentrios eu tambm volto a comentar. Eu procuro ler bem rpido para devolver para eles, para no comentar dois meses depois do filme, no adianta, fica ruim, eu procuro ler bem rapidinho e entregar para eles para comentar rpido."

    (Entrevista com Prof. Dbora) "No, tem alguns que tem, mas a voc tem que fazer: quem tem vdeo, para gravar o programa, para depois assistir. Porque uma coisa assim, que eu tenho notado assim, no ficar na opinio, uma briga que s vezes eu tenho com o aluno. Uma coisa voc dar a sua opinio, mas preciso sair da opinio tambm, porque se no voc fica s no "achismo", eu acho isso, sou a favor, sou contra, e (...), os alunos falam: - Professor, vamos conversar um pouco. Vamos! Aula de Sociologia para mim, para determinada escola, s ficam conversando sobre aborto, sobre isso, sobre aquilo, eu falei, legal, mas acho que seria mais fcil para mim fazer isso, vocs vo ficar muito mais... e eles estavam acostumados tambm a este tipo de experincia que aula de Sociologia, aula de

  • 39

    Filosofia, voc dar sua opinio, a voc escreve qualquer coisa, a na realidade voc reproduz, voc acaba reproduzindo a mesma coisa, voc no altera a sua percepo, voc no altera a sua compreenso, ento eu acho que tem que ter essa... tem que haver um acrscimo, uma mudana se no houver no adianta nada, voc simplesmente ficou matando tempo ali, e a a aula, o filme que voc v, voc fica como curiosidade, ou o texto que voc l. Ah! Que curioso, mas e a, para que serve isso, que importncia tem isso, que importncia tem voc compreender, por exemplo um conceito de Cultura do ponto de vista antropolgico, por exemplo, o que isso tem a ver, o que isso vai alterar na minha vida, ento acho que nesse trabalho, eu tinha que explicar para eles isso da, a importncia disso da, no que eles no tenham espao para conversar, dar opinio, s que agora vamos sair da opinio, voc vai escrever um texto, se voc vai falar para uma outra pessoa, e a? Ento, uma dificuldade, voc dizer, voc descrever uma situao, ento, precisa aprender, porque se eles no fazem isso, eu acho que tambm no estaria auxiliando eles a lerem a realidade. Por exemplo, os meios de comunicao, ler um filme, eu acho que... Eles estariam lendo do mesmo jeito? . Eu acho que uma questo, trgico isso, se a gente fosse cair naquele relativismo, voc vai ter a sua leitura, no, eu vou falar, escrever se eles quiserem dar a opinio, ser contra ou a favor eles do, mas eles precisam ter um espao na avaliao para eles conclurem, dar opinio deles."

    (Entrevista com Prof. Jos)

    Mas, "no raro que haja um descompasso entre o filme visto pelo professor

    e aquele que impressiona seus alunos."18 Nada garante que o filme que o professor

    assiste o mesmo filme que o aluno tambm assiste. Embora direcionado por um

    tema comum, possivelmente o espectador no dominar todas as informaes e

    nem recebe da mesma forma a(s) mesma(s) mensagem(s). Esse ideal de

  • 40

    direcionamento, e condicionamento que o professor busca, demonstra direta ou

    indiretamente que ele acredita na existncia de uma forma sociolgica de ver o

    filme, que no permite mltiplas interpretaes, e portanto, esse ato de ver e

    analisar o filme em sala de aula no to aberto assim, e nem "to democrtico". O

    ponto de vista dos professores entrevistados de que em seu trabalho, ao se

    utilizar de filmes, estejam dando uma "viso crtica" a seus alunos, mas na prtica

    impem uma forma de anlise que acaba sendo induzida aos alunos na prtica.

    "Voc acha que existe uma forma Sociolgica de se ver e analisar filmes? Voc pode pegar por exemplo a questo da massificao, de estar passando valores massificados e fazer uma anlise dos programas em cima disso, da televiso em geral, dos filmes. Tem sim, d para fazer. Em que as Cincias Sociais podem contribuir para estar analisando filmes? Tem alguma coisa especfica que s as Cincias Sociais pode ler o filme dessa forma ou analisar um filme de determinada forma? No. Eu acho que outras reas de conhecimento tambm podem estar levantando aspectos do filme. As Cincias Sociais, ela vai levar mais para a questo dos mecanismos sociais. Na Filosofia, pode estar questionando uma srie de outras coisas. Histria tambm, um momento contemporneo. A Lngua Portuguesa, os usos, os costumes, a linguagem pode estar comparando. D para vrias disciplinas usarem."

    (Entrevista com Prof. Dbora)

    "Existe uma forma sociolgica de se ver e analisar filmes? Eu acho que para quem se formou em Sociologia, automaticamente voc tem uma forma sociolgica de ver as coisas todas, isso intrnseco."

    (Entrevista com Prof. Maria)

    18 BRUZZO, Cristina. O CINEMA NA ESCOLA: o professor, um espectador. Pg. 131. Tese de doutorado apresentado na Faculdade de Educao da universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Campinas, 1995.

  • 41

    "Voc acha que existe uma forma sociolgica de se ver e analisar filmes? Eu acho que tem. Tem uma histria, tem uma leitura sociolgica no cinema. Por exemplo, seria voc analisar o cinema, a partir das condies sociais que ele foi produzido, um tipo de esttica que voc pode... ou ento pegar o filme e ler apenas o aspecto sociolgico, possvel."

    (Entrevista com Prof. Jos)

    "Voc acha que existe uma forma sociolgica de se ver e analisar filmes? A Sociologia contribui em que? Acho que sim, porque por exemplo quando a minha aluna perguntou se comunista come criancinha, a eu falei, no, a completamente ideolgico, comecei a explicar para ela a situao da Guerra Fria, fui citando filmes onde aparece o alemo oriental, aquela pessoa dura, insensvel, o russo insensvel, a falei do "Rock 4" que aparece tambm umas coisas assim, quer dizer, eu acho que essa aluna, esses alunos que absorveram esse tipo de coisa eles passam a olhar para a coisa de uma forma diferente. Voc acha que ela vai comear a assistir essas obras todas de outra forma? Eu tenho impresso que sim, claro que isso algo muito pequeno diante do que a gente sonha que poderia ser. Mas eu acho que acontece isso sim, e eu lembro disso em mim no 2 grau, influncia que teve essas coisas para mim no 2 grau foi muito forte, tanto que tem a ver com minha opo de estudar Sociologia."

    (Entrevista com Prof. Marta)

    "Existe uma forma sociolgica de se ver e analisar filmes? Eu acho que existe. possvel. A cinematografia a rea do conhecimento que a comunicao, a televiso, rdio, cinema, jornal, tudo. Agora, eu posso fazer um olhar sociolgico sobre a mdia, sobre a comunicao, por exemplo: em que mo est, a quem interessa, que momento histrico vive, quais conflitos so subjacentes, o que se revela, o que no se revela. Eu acho que as Cincias Sociais... porque no podemos esquecer o seguinte: a comunicao um produto de uma relao de construo, produto de relaes de

  • 42

    trabalho, baseada na minha rea de conhecimento que Cincias Sociais, tambm. O produto desse trabalho tem que ser discutido, como eu no meo a histria da humanidade por aquilo que ela produz, mas pela maneira como ela produz. Essa a viso que eu tenho, isso quer dizer o seguinte: que as relaes que se do no interior de uma televiso, no interior de um jornal, ou de uma grfica, dentro de uma editora, vo refletir no produto de um trabalho, porque eu era exmio crtico no perodo da ditadura, os perodos de recesso da histria da humanidade, e agora que eu vivo um processo de construo da democracia, eu perdi minha seara.(...)".

    (Entrevista com Prof. Pedro)

    "Voc acha que existe uma forma sociolgica de se assistir TV, de ver vdeo, de estar analisando imagens? De uma forma sociolgica? . Mais crtica ou no. Existe alguma coisa especfica na Sociologia que d uma bagagem maior para voc fazer esse tipo de anlise? No sei se necessariamente. Eu acho que sim, porque quem tem a viso da Sociologia, assiste TV com outros olhos, mas acho que isso no regra, no necessariamente s o cara que faz Sociologia, outra pessoa que tenha uma...sei l, um jornalista, uma pessoa que esteja ligada, que tenha conscincia das coisas, que tenha uma certa, um senso crtico, acho que voc no precisa ter feito Sociologia para voc poder discernir algumas coisas. Em que voc acha que as Cincias Sociais podem contribuir para analisar, para a gente no ser to ingnuo na hora de se estar assistindo algum filme ou programa de TV? Como que ela pode contribuir? Ela pode contribuir a partir do momento que voc trabalha com os alunos esse senso crtico, esse olhar crtico, de ver as coisas um pouco alm do que est a na cara, voc tem que mostrar, tem que dar direo."

    (Entrevista com Prof. Ana)

  • 43

    O professor busca um certo direcionamento ao assistir o filme e constri

    toda uma situao para realiza-lo (o direcionamento) e apresent-lo (o filme).

    "Por exemplo, eu falo: vou passar um filme: "Brincando nos Campos do Senhor". Falo mais ou menos o que a histria. A histria de uma tribo indgena na Amaznia, que eles nunca tinham tido contato com os brancos e a depois vo ter contato com alguns pastores, vo l. Eu fao uma sinopse, mais ou menos para eles saberem o que eles vo assistir, que tipo de filme para no chegar l, ento, dou mais ou menos uma preparada, no que eu dirija j, isso no, ento isso, a durante o filme..." "Voc fala alguma coisa assim: Preste ateno naquilo. Comenta alguma coisa ou s assiste mesmo? No. Comento algumas coisas. Seria interessante vocs prestarem ateno..., mas eu procuro no dirigir muito, s algumas coisas. s vezes voc acaba falando, como tpicos."

    (Entrevista com Prof. Jos) " Mas voc falou que sempre d uma prvia no... quando voc introduz um filme, voc faz como? Sugere, eles aceitam ou no, e depois? Dou. Se eu peo para eles assistirem eu sempre estou colocando, por exemplo "Contato", eu falei, coloca uma discusso assim no filme, vai assistir, interessante, preste ateno no que o filme est colocando, alguns vo assistir, alguns prestam ateno, alguns vo por entretenimento mesmo. Mas geralmente se voc sugere alguma coisa tem porqu para estar sugerindo, no s entretenimento, porque o ator bonitinho, voc fala: olhe tal coisa no filme, sempre procuro fazer isso com os filmes que eu j assisti, eles vem perguntar, sugestes. Com este grupo que eu tenho no "Mrio Natividade", sempre parte das alunas: - D uma listinha de sugestes de filmes para mim assistir. Ento eles vem pedir, a eu vou falando o que eu achei interessante, porque eles comentam filmes que eles assistiram tambm, porque eles acharam interessante, o que eles viram no filme que eles gostaram, d sempre para questionar um pouquinho."

    (Entrevista com Prof. Dbora)

  • 44

    "Eu quero que voc tente pegar uma parte mais especfica de seu trabalho com relao a estar usando filme. Como voc trabalhou com seu alunos? O caso, por exemplo, a experincia com vdeo foi o documentrio "Muito alm de Cidado Kane". (...) as classes assistiram ao filme e a em cima dessa, primeiro, antes de assistir ao filme eu tentei preparar um pouco o terreno, porque como eu j conhecia o documentrio, etc... e tal, pode at chamar isso de diretivismo, no sei, pode at ter sido mesmo, alguns chamam, eu tentei situar o documentrio na histria do pas, quando vai aparecendo um monte de fatos histricos, de dados do movimento histrico, etc.. e tal. Eu tentei preparar, expositivamente falando: gente, olha, vamos juntar com outras disciplinas que vocs j viram, Histria do Brasil, e pegar exatamente a questo do Ps-64, o que vocs acham, vou tentar abrir um pouco mais. E foi assim, um impacto, para eu ver que aquele momento, que aquele processo histrico para eles no estava nada claro. E a eu tentei situar: olha gente, acho que vai ficar uma coisa meio... como vocs assistem televiso, que aquela coisa assim... vai passando as imagens e no bem assim. Pelo menos eu vejo que no bem assim, para depois ir passando o filme, e em alguns momentos eu parava, eles ficavam fodidos com isso, a eu falava: t vendo gente aqui, eu acho que tem algumas coisas a. Pelo menos da maneira como eu via, e a vai. E depois eles, depois no final, abrindo, n, que eles achavam, se gostaram, entenderam, no entenderam, qual a do documentrio? O que um documentrio? O que significa? Se verdade, a imagem verdade, ou no ? uma das vises, ? Fazendo esse trabalho de relativizao, e no caso do "Vtor", pelo menos no perodo da tarde, deu resultado. Deu resultado no sentido de que possibilitou o debate, possibilitou conversas, porque eu acho que o "Vtor" ainda uma escola diferenciada".

    (Entrevista com Prof. Antnio)

    Prevalecendo assim a sua interpretao, o professor mostra um sentido,

    direciona a anlise. Resta saber se esse direcionamento radical, opressivo, nico,

  • 45

    ou at que ponto uma atitude de esforo que busca sentidos para o que analisa,

    visando desencadear reflexes que reconheam os determinantes na imagem, que

    colaborem para que os alunos se situem no contexto histrico-social e que tragam

    novos sentidos, novas perspectivas e propostas.

    DA ABORDAGEM DAS IMAGENS EM SALA DE AULA

    Para facilitar a anlise geralmente o filme abordado juntamente com

    outros recursos. Uma mistura de linguagem onde uma complementa a outra.

    "Voc aborda o filme sozinho ou com algum outro recurso? Voc usa texto? Por exemplo, esse filme que eu passei, "Brincando nos Campos do Senhor", eu usei uma entrevista com Arton Krenak, mas no que necessariamente, eu