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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU DOUTORADO EM AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO AVALIAÇÃO DA CONTAMINAÇÃO DO SOLO POR METAIS TÓXICOS (CÁDMIO, CROMO, CHUMBO E ALUMÍNIO) EM ESTANDES DE TIRO NO ESTADO DO PARANÁ/BRASIL Valmir de Souza Lajeado, setembro de 2016

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  • CENTRO UNIVERSITRIO UNIVATES

    CURSO DE PS-GRADUAO STRICTO SENSU

    DOUTORADO EM AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO

    AVALIAO DA CONTAMINAO DO SOLO POR METAIS TXICOS

    (CDMIO, CROMO, CHUMBO E ALUMNIO) EM ESTANDES DE TIRO

    NO ESTADO DO PARAN/BRASIL

    Valmir de Souza

    Lajeado, setembro de 2016

  • Valmir de Souza

    AVALIAO DA CONTAMINAO DO SOLO POR METAIS TXICOS

    (CDMIO, CROMO, CHUMBO E ALUMNIO) EM ESTANDES DE TIRO

    NO ESTADO DO PARAN/BRASIL

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Ambiente e Desenvolvimento, do Centro Universitrio UNIVATES, como parte da exigncia para obteno do grau de Doutor em Ambiente e Desenvolvimento na rea de concentrao Tecnologia e Ambiente.

    Orientador: Prof. Dr. Odorico Konrad

    Co-orientador: Prof. Dr. Affonso C. Gonalves Jr.

    Lajeado, setembro de 2016.

  • RESUMO

    O objetivo da pesquisa foi mostrar os riscos a que esto expostos os profissionais de

    segurana pblica quando do treinamento de tiro em estandes. A hiptese levantada

    e confirmada foi de que os solos dos locais de treinamento esto contaminados por

    metais txicos, em especial o chumbo. Diante disso, foram realizadas anlises do

    solo de estandes de tiro da Polcia Militar do Paran (PMPR), localizados nos

    municpios de Cascavel, Cruzeiro do Oeste e So Jos dos Pinhais, e tambm de

    dois estandes particulares em Marechal Cndido Rondon e Guara, atravs de

    levantamento de amostras em duas campanhas realizadas: uma no ano de 2013 e

    outra em 2015. Foram apurados os teores de chumbo (Pb), cromo (Cr), alumnio (Al)

    e cdmio (Cd), e verificado se havia ndices de contaminao por esses metais,

    culminando com a apresentao do panorama atual dos estandes utilizados pelos

    policiais militares. O trabalho apresenta os resultados do monitoramento temporal do

    solo nos anos citados, consistindo na anlise dos ndices alcanados, obtendo-se,

    assim, os teores dos metais tendo em vista a deposio de projteis de arma de

    fogo no solo dos estandes. Foi possvel avaliar o grau de contaminao existente,

    confrontando com a determinao legal da Resoluo 420/2009, do CONAMA, que

    estabelece os nveis aceitveis ou no de metais no solo. Os resultados das

    anlises dos nveis de metais permitiram estabelecer as condies ambientais dos

    solos dos estandes de tiro. Do levantamento, se concluir que os teores de metais

    txicos encontrados nos solos dos estandes demandam ateno; como no caso do

    Pb, os resultados apresentam ndices elevados, pois 60% das amostras

    ultrapassaram o Limite de Investigao estabelecido pela norma legal. Essa

    constatao sugere a pronta interveno da PMPR e dos donos dos estandes

  • particulares nos locais pesquisados iniciando, de imediato, aes de remediao nas

    reas j contaminadas com a elaborao de planos de manejo, a fim de se evitar o

    aumento da contaminao e a exposio ao risco dos atiradores, policiais militares e

    populao da circunvizinhana.

    Palavras-chave: contaminao; estande de tiro; metais txicos.

  • ABSTRACT

    The objective of the research was to show the risks public safety professionals are exposed to when practicing at shooting ranges. The hypothesis which was tested and confirmed was that practicing areas soils are contaminated by toxic metals, especially by lead. Therefore, soil analyzes were performed at shooting ranges owned by the Military Police of Paran (MPPR), located in the cities of Cascavel, Cruzeiro do Oeste and So Jos dos Pinhais, also at two private shooting ranges located in Marechal Cndido Rondon and Guara. One sample was collected in 2013 and the other in 2015. The levels of lead (Pb), chromium (Cr), aluminum (Al) and cadmium (Cd) were valued, and it was checked if there were signs of contamination by these metals, culminating with the presentation of the current situation of the shooting ranges used by the militaries. The paper presents the results of the time monitoring of the soil in those years, consisting in analyzing the reached data, obtaining the metal levels once there is a constant deposition of firearm projectiles on the shooting range ground. It was possible to evaluate the degree of contamination, which was confronted with the legal determination of the Resolution 420/2009 of CONAMA, which establishes acceptable levels of metals in soils. The results of the metal levels analysis made it possible to establish the environmental conditions of shooting ranges soils. The study made concluded that the toxic metal levels found in the shooting ranges soils demand attention; as in the example of Pb, which the the results showed high rates, 60% of the samples exceeded the limit set by the legal norm. This conclusion suggests the immediate intervention by MPPR and by the owners of the private shooting ranges tested, immediately starting to take actions over the already contaminated areas, elaborating management plans in order to avoid the increase of the contamination and the exposure of the militaries and surrounding population. Keywords: contamination; shooting range; toxic metals.

  • DEDICATRIA

    A meu pai Joo (in memoriam) e minha me Sebastiana que dignamente me

    oportunizaram o estudo.

  • AGRADECIMENTO

    A Deus que me permite a vida.

    Professora Ada, da Escola Municipal Vereador Andr Nadolny, professora

    que me ensinou a ler e escrever.

    A todos os professores e professoras que por minha vida passaram e me

    fizeram chegar at aqui.

    A Cristiane, minha esposa e tambm professora, pelo amor incondicional, e

    pelo apoio, com certeza sem ela no seria possvel esta conquista.

    Maria Clara e Ana Luiza, minhas filhas, pelo carinho, amor e compreenso

    quando da minha ausncia.

    Ao professor Odorico Korand, meu orientador, pela pacincia, dedicao e

    zelo ao me ensinar bons caminhos da cincia e por me tolerar nos debates pessoais

    e online, obrigado pela motivao.

    Ao professor Affonso Celso Gonalves Junior, meu co-orientador, pela

    parceria, dedicao e companheirismo alm das calorosas e gentis recepes no

    laboratrio.

    Ao meu amigo Ricardo Braga que foi parceiro nos trabalhos de campo e

    anlises qumicas.

    Ao povo brasileiro que por meio da CAPES me garantiu cursar o Doutorado.

    Aos funcionrios do Programa de Ps Graduao em Ambiente e

    Desenvolvimento, da biblioteca central da UNIVATES, em especial a Ana, e todos os

    demais servidores da instituio, pela presteza e gentileza no atendimento deste

  • aluno.

    Aos funcionrios e alunos do Laboratrio de Qumica Ambiental e

    Instrumental da Universidade Estadual do Oeste do Paran (UNIOESTE), campus

    de Marechal Candido Rondon PR, pela ateno e qualidade do trabalho prestado.

    A todos os pesquisadores e estudiosos que serviram de inspirao e

    contriburam com seus conhecimentos para a construo deste trabalho.

    A todos os policiais militares que me ajudaram e me dirigiram palavras de

    incentivo para continuar no caminho da pesquisa.

    A todas as pessoas que com certeza esqueci de mencionar, pois, foram e so

    inmeras, que direita e indiretamente me ajudaram a alcanar este objetivo.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Arma de fogo: pistola Marca Taurus, calibre .40, utilizada pela PMPR. ... 32

    Figura 2 Estrutura de um projtil de arma de fogo. ................................................ 32

    Figura 3 Projteis depositados no solo do estande de tiro da APMG. .................... 42

    Figura 4 - Trado Holands sendo utilizado durante a pesquisa................................. 58

    Figura 5 Processo de coleta das amostras ............................................................ 60

    Figura 6 Mapa da localizao dos estandes de tiro pesquisados no Estado do Paran. ...................................................................................................................... 61

    Figura 7 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Marechal Candido Rondon ........................................................................................ 63

    Figura 8 Croqui do estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR. . 63

    Figura 09 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Guara ....................................................................................................................... 64

    Figura 10 Croqui do estande de tiro particular em Guara-PR. .............................. 65

    Figura 11 Local coberto por vegetao onde ao fundo se pode ver o barrando do estande desativado de Guara .................................................................................. 65

    Figura 12 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Cruzeiro do Oeste ..................................................................................................... 66

    Figura 13 Croqui do estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR. ............ 67

    Figura 14 Barreira de pneus preenchida pelo solo do local do Estande de

  • Cruzeiro do Oeste ..................................................................................................... 67

    Figura 15 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Cascavel.................................................................................................................... 68

    Figura 16 Croqui do estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR. .......................... 69

    Figura 17 Para-balas e barreira de pneus do Estande de Cascavel ...................... 70

    Figura 18 Vista da distribuio no terreno das reas de coleta da APMG ............. 71

    Figura 19 Croqui do estande de tiro desativado da PMPR na APMG, em So Jos dos Pinhais-PR. ......................................................................................................... 71

    Figura 20 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande desativado da APMG ................................................................................................. 72

    Figura 21 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG .................................................................................................... 73

    Figura 22 Croqui do estande de tiro principal da PMPR na APMG, em So Jos dos Pinhais-PR. ......................................................................................................... 74

    Figura 23 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG .................................................................................................... 75

    Figura 24 - Mapa simplificado de solos do Estado do Paran .................................. 82

    Figura 25 - Descrio, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG - Manancial ................................................................................. 98

    Figura 26 Projteis depositados no solo do estande de tiro da APMG. ................ 101

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Valores mdios dos teores de argila, silte, areia e capacidade de troca catinica (CTC) das reas de estande de tiro no estado do Paran. ........................ 80

    Tabela 2 - Valores orientadores de substncias para solos e guas subterrneas ... 84

    Tabela 3 - Valores mdios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das reas do estande de tiro particular de Marechal Candido Rondon-PR. ............................................................ 85

    Tabela 4 - Valores mdios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das reas do estande de tiro de tiro particular em Guara-PR. ................................................................................ 88

    Tabela 5 - Valores mdios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das reas do estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR. ........................................................................ 91

    Tabela 6 - Valores mdios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das reas do estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR. ...................................................................................... 93

    Tabela 7- Valores mdios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das reas do estande de tiro da PMPR (desativado) na APMG em So Jos dos Pinhais-PR. .............................. 96

  • LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1 Resultados anlise especial estande Marechal Cndido Rondon .......... 87

    Grfico 2 Resultados anlise especial estande Guara .......................................... 89

    Grfico 3 Resultados anlise especial estande Cruzeiro do Oeste ........................ 92

    Grfico 4 Resultados anlise especial estande Cascavel ...................................... 95

    Grfico 5 Resultados anlise especial estande APMG Desativado ........................ 97

    Grfico 6 Resultados anlise especial estande APMG Principal .......................... 100

    Grfico 7 Comparativo dos resultados dos estandes pesquisados em relao aos Valores de Investigao. ......................................................................................... 107

  • LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SMBOLOS

    ABNT - Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ACI - rea Contaminada sob Interveno

    Al - Alumnio

    AMR - rea em Processo de Monitoramento para Reabilitao

    AOAC - Associao Oficial de Qumica Analtica

    B - Boro

    Ca Clcio

    Cd Cdmio

    CERCLA - Comprehensive Environmental Response, Compensation, and Liability Act

    CETESB - Companhia Ambiental do Estado de So Paulo

    CF - Constituio Federal

    CFSd - Curso de formao de soldados

    Cl - Cloro

    Co Cobalto

    Codevasf- Companhia de Desenvolvimento dos Vales do So Francisco e do Parnaba

    CONAMA - Conselho Nacional de Meio Ambiente

    Cr - Cromo

    CSM/MOP - Centro de Suprimento e Manuteno de Material Operacional

    CSM-Int - Centro de Suprimento e Manuteno de Intendncia

    CSM-MB - Centro de Suprimento e Manuteno de Material Blico

    CSM-O - Centro de Suprimento e Manuteno de Obras

  • CSP - Curso Superior de Polcia

    CTC - capacidade de troca catinica

    Cu Cobre

    DOD - Departamento de Defesa dos Estados Unidos.

    EB - Exrcito Brasileiro

    EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

    EPA - Agncia de Proteo Ambiental dos Estados Unidos

    EUA - Estados Unidos

    Fe - Ferro

    gr - Grain

    GSR Guns hot residues

    IAP - Instituto Ambiental do Paran

    K - Potssio

    LI Limite de Investigao

    LQ - Limite de quantificao

    Mg Magnsio

    MMRP - Programa de Resposta de Munies Militares

    Mn - Mangans

    Mo - Molibdnio

    N - Nitrognio

    NBR - Norma Brasileira

    Ni - Nquel

    ONU - Organizao das Naes Unidas

    P - Fsforo

    Pb chumbo

    PCRJ - Polcia Civil do Rio de Janeiro

    PM - Polcia Militar

    PMPR - Polcia Militar do Paran

    PNMA - Poltica Nacional do Meio Ambiente

    S - Enxofre

    Sb - Antimnio

    SEAV - Setor Especial de reas Verdes

    SPT - Standard Penetration Test

  • UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paran

    USACE - US Army Corps of Engineers

    VRQs - Valores de Referncia de Qualidade

    ZEI - Zona Especial Institucional

    Zn - Zinco

    ZR1 - Zona Residencial 1

    ZR3 - Zona Residencial 3

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ................................................................................................... 17

    1.1 Justificativa ........................................................................................... 21

    1.2 Objetivo geral ........................................................................................ 22

    1.3 Objetivos especficos ............................................................................ 22

    2 REFERENCIAL TERICO ................................................................................ 24

    2.1 A PMPR qualidade do servio, treinamento, arma de fogo e resduos contaminantes............................................................................................. 24

    2.2 Polcia e arma de fogo contaminao e poluio .............................. 30

    2.3 A proteo ambiental breve relato da evoluo no tempo ................. 35

    2.4 Metais txicos, metais pesados conceitos, contaminao e consequncias ............................................................................................ 40

    2.5 Influncia do Cd na sade humana e meio ambiente ........................... 43

    2.6 Influncia do Cr na sade humana e meio ambiente ........................... 44

    2.7 Influncia do Pb na sade humana e meio ambiente ........................... 45

    2.8 Influncia do Al na sade humana e meio ambiente ............................ 48

    2.9 Estandes de tiro provveis fontes de contaminao ......................... 49

    2.10 Normas ambientais regulamentao do CONAMA ......................... 51

    3 PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS .......................................................... 55

    3.1 Mtodos e ferramentas amostragem ................................................. 55

    3.2 Mtodos e ferramentas determinao dos pontos de coleta ............. 57

    3.3 Estandes de tiro objetos da pesquisa ................................................... 61

    3.3.1 Estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR . 62

    3.3.2 Estande de tiro particular (desativado) em Guara-PR ............ 64

    3.3.3 Estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR .............. 66

  • 3.3.4 Estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR ............................ 68

    3.3.5 Estande de tiro da PMPR na APMG em So Jos dos Pinhais-PR ................................................................................ 70

    3.4 Determinao dos teores totais dos metais txicos ................... 75

    3.5 Anlise qumicas e fsicas (granulometria) do solo ..................... 76

    4 RESULTADOS E DISCUSSO ......................................................................... 78

    4.1 Teores totais dos elementos txicos no solo ........................................ 78

    4.2 Resultados obtidos a partir das determinaes de metais (Cr, Cr, Pb e Al) dos estandes de tiros analisados .................................................... 84

    4.2.1 Estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR . 84

    4.2.2 Estande de tiro particular (desativado) em Guara-PR ............ 88

    4.2.3 Estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR .............. 90

    4.2.4 Estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR ............................ 92

    4.4.5 Estande de tiro desativado da PMPR na APMG em So Jos dos Pinhais-PR ......................................................................... 95

    4.2.6 Estande de tiro em atividade da PMPR na APMG em So Jos dos Pinhais-PR ................................................................ 98

    4.2.7 Estande de tiro secundrio da APMG/PMPR em So Jos dos Pinhais-PR .............................................................................. 102

    5 CONSTATAES, INFERNCIAS E SUGESTES ....................................... 104

    6 CONCLUSO .................................................................................................. 114

    REFERNCIAS .................................................................................................. 117

    ANEXOS ............................................................................................................. 130

  • 17

    1 INTRODUO

    A Polcia Militar (PM), por meio de seus agentes, se constitui no brao

    armado do Estado que detm, por questes legais, o monoplio do uso legtimo da

    fora quando exista um descumprimento da ordem legal vigente. Assim, o uso de

    arma de fogo um requisito inerente ao policial militar, que, muitas vezes, se v

    diante de situaes-limite que requerem decises acertadas em fraes de

    segundo.

    A atividade policial militar de risco. Desse modo, a utilizao de uma arma

    de fogo requer uma qualificao profissional adequada. Nesse contexto, os

    policiais militares, para a utilizao de armas de fogo, necessitam de um

    treinamento que exige muito conhecimento tcnico.

    Os treinamentos se do pela execuo de disparos com as armas utilizadas

    pela corporao, como meio de se qualificar o profissional de segurana pblica.

    Esses treinamentos so parte da formao dos policiais militares e se prolongam

    ao longo da carreira como ferramenta contnua de qualificao profissional.

    Em regra geral, e no caso especfico da Polcia Militar do Paran (PMPR),

    no momento da prtica do treinamento, os policiais utilizam, em suas armas,

    munio real, a qual , geralmente, composta de projteis de chumbo (Pb), que, ao

    serem disparados, se depositam nos barrancos, localizados nos estandes de tiro,

  • 18

    levantados para servirem de anteparo, sejam em estandes particulares ou

    pertencentes PMPR.

    Em termos comparativos, nos Estados Unidos (EUA), onde h estudos

    consistentes sobre disparos de arma de fogo, existem mais de 3.000 armas

    pequenas de uso militar ativas em estandes de tiro, e estima-se que

    aproximadamente 70.000 toneladas de Pb so adicionados aos solos dos estandes

    por ano (MARIUSSEN et al., 2012).

    A necessidade de treinamento constante com a aplicao de tcnicas que

    exigem a repetio quase que exaustiva do disparo real de arma de fogo acarreta a

    produo de um grande volume de resduo de Pb acumulado nos barrancos dos

    estandes de tiro. O que se aduz a priore que esses resduos produzam um

    impacto ambiental1. E, como Pb, um metal pesado que pode apresentar

    consequncias danosas aos seres vivos, h que existir um controle de suas fontes

    de emisso, como o caso dos treinamentos de tiro da PMPR. Um estudo sobre a

    utilizao de armas de pequeno porte em estandes de tiro das foras militares no

    Canad demonstrou a contaminao elevada com cobre (Cu), Pb, antimnio (Sb) e

    zinco (Zn) (LAFOND et al., 2013).

    No levantamento prvio feito nesta pesquisa no se encontrou normatizao

    que regulamente o tratamento ambiental de tais resduos produzidos durante os

    treinamentos de tiro da PMPR. No existem normas disciplinadoras que

    determinem a gesto de resduos slidos, em especial o Pb, ou, ainda, um

    monitoramento sobre os nveis de concentrao do referido metal no solo dos

    estandes de tiro.

    Percebe-se que esses treinamentos reais de tiro, feitos em estandes de tiro,

    ao que tudo indica, no primam pela preservao do meio ambiente, pois os locais

    so, de certa forma, adaptados para o fim a que se destinam, menosprezando a

    1 Conforme a Resoluo n 001/86 do CONAMA, considera-se impacto ambiental qualquer

    alterao das propriedades fsicas, qumicas e biolgicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: a sade, a segurana e o bem-estar da populao; as atividades sociais e econmicas; a biota; as condies estticas e sanitrias do meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais.

  • 19

    possibilidade de contaminao do solo por sustncias txicas, em especial, metais

    pesados (BVENURA & AFOLAYAN, 2012).

    Os treinamentos para emprego das armas de fogo se do nos estandes de

    tiro da corporao e estandes de tiro particulares localizados em diversos

    municpios do Estado do Paran. Para o treinamento, so utilizadas munies reais

    cujos projteis so compostos de Pb, lanados contra os barrancos dos estandes

    de tiro. Por ficarem depositados no solo, so, em tese, uma fonte de contaminao,

    o que despertou o interesse de estudo do presente trabalho.

    A pesquisa estudou os nveis de metais txicos provenientes de projteis de

    arma de fogo no solo de determinados estandes de tiro particulares e da PMPR,

    em cinco regies do Estado do Paran.

    Atualmente h questes que no possuem respostas, como, por exemplo:

    os estandes de tiro da PMPR representam risco aos policiais que os utilizam?

    Representam risco comunidade localizada no seu entorno? Os estandes de tiro

    da PMPR so fonte de contaminao para o meio ambiente? Caso exista

    contaminao, qual o nvel em que se encontra? Se existentes, os nveis de

    contaminao esto dentro dos parmetros legais? Existe regulamentao que

    determine o controle e monitoramento dos estandes de tiro? H estudo ou existe

    determinao para a recuperao das reas de estande de tiro degradadas?

    Diante desse cenrio, a hiptese que os estandes de tiro da PMPR, e

    tambm os particulares, so fontes de contaminao do solo em nveis superiores

    aos permitidos pela legislao em vigor, no caso a Resoluo 420/2009 do

    Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). E, atualmente, para os estandes

    de tiro, no h controle ambiental adequado dos resduos produzidos pelos

    treinamentos, considerando-se que, quanto maior for a utilizao e a deposio de

    projteis de Pb no solo dos estandes de tiro, maior (in tese) ser a contaminao,

    no s do solo, mas tambm das guas superficiais e subterrneas da regio do

    entorno.

    Seguindo um roteiro proposto na introduo apresentada a justificativa que

  • 20

    deu base ao presente trabalho, destacando a importncia da pesquisa indita no

    mbito da gesto ambiental no que diz respeito contaminao do solo por metais

    txicos nos estandes de tiro da PMPR.

    O segundo captulo apresentar o referencial terico sobre o tema,

    discorrer sobre a atual legislao e os aspectos ambientais. Exibir ao leitor as

    caractersticas e efeitos, sobre o ambiente e seres humanos, dos metais txicos,

    com embasamento em autores que j pesquisaram o tema.

    O terceiro captulo trar o procedimento metodolgico que foi utilizado para

    realizao da pesquisa, demonstrando quais foram os estandes pesquisados,

    determinando suas localizaes e caractersticas. Esclarecer que a amostragem

    foi realizada com base na metodologia proposta pelo Instituto Ambiental do Paran

    (IAP), alm de similaridade com as diretrizes da Agncia de Proteo Ambiental

    dos Estados Unidos (EPA) 2000/2003. Alm disso, deixa claro que as amostras de

    solo coletadas foram encaminhadas para o Laboratrio de Qumica Ambiental e

    Instrumental da Universidade Estadual do Oeste do Paran (UNIOESTE), campus

    de Marechal Cndido Rondon - PR, para a realizao das anlises propostas.

    O quarto captulo apresentar os resultados encontrados trazendo ao leitor a

    discusso desenvolvida. Ser apresentado um debate intenso acerca dos ndices

    obtidos em laboratrio em confronto com as determinaes legais da Resoluo

    420/2009 do CONAMA. Sero apresentadas as consideraes sobre os valores de

    anlise de rotina, anlise de micronutrientes, anlise granulomtrica e anlise

    especial. Esta ltima apresentar os valores dos seguintes metais: alumnio (Al),

    cdmio (Cd), chumbo (Pb) e cromo (Cr). Finalizando o captulo, demonstrar-se- se

    a hiptese levantada sobre a contaminao dos estandes foi ou no comprovada.

    No quinto captulo, sero apresentadas as constataes, inferncias e

    sugestes deduzidas a partir dos resultados obtidos. Ser, tambm, exposta uma

    abordagem atual das disposies nacionais e internacionais, no que tange gesto

    inovadora de estandes de tiro, como forma de contribuio para uma melhoria na

    administrao dos espaos pesquisados.

    https://translate.googleusercontent.com/translate_c?depth=1&hl=pt-BR&ie=UTF8&prev=_t&rurl=translate.google.com.br&sl=en&tl=pt-BR&u=http://ac.els-cdn.com/S0301479713000595/1-s2.0-S0301479713000595-main.pdf%3F_tid%3Db5967cd2-5e0c-11e4-ba80-00000aab0f26%26acdnat%3D1414437120_83cb5d9178df92f5c8af8efeb9d9998c&usg=ALkJrhg1KIKVaPkHESDwf4iUr8RnKpaW-g#8

  • 21

    Por fim, sero declaradas as concluses sobre todo o levantamento feito no

    presente trabalho

    1.1 Justificativa

    O tema da segurana pblica conquista cada vez mais a ateno de

    pesquisadores, que demonstram, em grande parte, certa preocupao tanto com o

    estudo do funcionamento desarmonioso da sociedade, como com a falta de

    condies para a preservao da ordem pblica. Tudo com nfase na

    concentrao da criminalidade nos grandes centros urbanos, assunto de relevante

    importncia nas sociedades contemporneas em cujo cenrio a polcia tem papel

    de destaque (PASSOS, 2011).

    Ao observar o funcionamento de um estande de tiro, em que policiais

    realizam treinamento com suas armas de fogo disparando contra barrancos onde

    ficam depositados os projteis compostos de chumbo, surgiu o questionamento: h

    contaminao do solo?

    O chumbo um metal txicos que causa graves problemas sade

    humana, portanto, estudar seus efeitos no solo dos estandes de tiro de suma

    importncia para impedir danos ao meio ambiente e aos usurios destes locais.

    O fato de existirem estandes sem um manejo adequado dos projteis

    acumulados no solo suscitou a dvida motivadora da pesquisa. Compreender os

    processos que geram resduos de Pb, e demais metais txicos, provenientes dos

    disparos de armas de fogo de policiais militares em treinamento, se tornou

    imperativo para uma boa gesto dos estandes de tiro da PMPR e particulares.

    A base da justificativa do presente estudo pode ser verificada na contradio

    entre o dever de proteger e a ao de contaminar o solo decorrente do treinamento

    (essencial qualificao profissional) dos policiais militares com munio de projtil

    de Pb. Ressalta-se que esta atividade se d, a priori, sem qualquer preocupao e

    regulamentao especfica que vise controlar e monitorar as reas sob o risco de

  • 22

    contaminao, viabilizando, ao menos, alguma ao de remediao.

    A pesquisa se torna relevante ao buscar e apresentar dados que possam

    demonstrar a real situao de reas potencialmente contaminadas por metais

    txicos, especialmente o Pb.

    No tocante sade pblica, tais dados so de fundamental importncia para

    a proteo dos policiais militares que utilizam os estandes de tiro, bem como da

    comunidade que vive no entorno destes locais, e atingida, direta ou

    indiretamente, pela contaminao.

    Alm do ineditismo, o trabalho contribuir para a formulao de normas de

    gesto das referidas reas e fornecer subsdios para estabelecer polticas

    pblicas, visando ao enfrentamento do problema relacionado contaminao.

    Assim, contribuir tambm para alertar os responsveis pela PMPR (tambm dos

    estandes particulares) sobre a importncia do monitoramento dos estandes de tiro

    no que concerne contaminao e ao manejo ambiental adequado.

    1.2 Objetivo geral

    O estudo em questo apresenta como objetivo geral avaliar os teores e

    distribuio dos metais txicos: cdmio (Cd), cromo (Cr), Pb, alumnio (Al) no solo de

    cinco estandes de tiro (trs da PMPR e dois particulares), definindo parmetros que

    permitam estabelecer nveis de contaminao nas referidas reas pela disposio dos

    projteis de Pb disparados por armas de fogo.

    1.3 Objetivos especficos

    No que tange aos objetivos especficos, o trabalho procurou:

    - Caracterizar os parmetros fsicos e qumicos dos solos onde esto situados

  • 23

    os estandes de tiro analisados na pesquisa;

    - Apresentar a distribuio e a concentrao das variaes de metais txicos

    nos estandes de tiro envolvidos na pesquisa;

    - Identificar se os estandes de tiro pesquisados so possveis fontes de

    contaminao do solo, avaliando o efeito da deposio de projteis de Pb disparados

    por arma de fogo nesses locais;

    - Discutir os resultados obtidos, sugerindo propostas para uma nova gesto dos

    resduos slidos encontrados nos estandes de tiro.

  • 24

    2 REFERENCIAL TERICO

    Neste captulo descrita a reviso bibliogrfica sobre o tema apresentando

    a estrutura bsica de funcionamento da PMPR, tratando da importncia da

    qualidade do servio prestado, bem como da necessidade de treinamento com

    arma de fogo e consequentemente a existncia de resduos contaminantes. Ainda

    tratar da proteo ambiental ao logo do tempo, relacionando a dinmica dos

    metais txicos apontando os principais aspectos toxicolgicos e a influncia na

    sade humana e meio ambiente do Cd, Cr, Pb e Al. Derradeiramente aborda

    descritivamente a questo da contaminao dos estandes de tiro apresentando ao

    final a legislao e os aspectos ambientais contidos em normas ambientais e em

    especial na regulamentao do CONAMA.

    2.1 A PMPR qualidade do servio, treinamento, arma de fogo e resduos contaminantes

    A temtica da segurana pblica encontra-se entre os direitos e garantias

    fundamentais descritos no caput do artigo 5 Constituio Federal (CF) (MARCHI,

    2010). A concretizao dos direitos fundamentais numa sociedade democrtica tem

    relao direta com a aplicao da lei no cotidiano social. Infere-se, no entanto, que

    a aplicao da lei apenas efetiva-se de forma justa quando da existncia de

    organismos policiais cientes do seu papel de protetor da ordem constitucional.

    Desta feita, houve um aperfeioamento constitucional e os direitos humanos

  • 25

    evoluram juntamente com a polcia, exigindo uma adequao nova realidade, o

    que gerou transformaes em benefcio da sociedade (MARCHI, 2010).

    A conscincia policial representada pela formao cidad do agente

    estatal, processo de formao que se d pelo treinamento. Baslio (2008) destaca

    que a funo do treinamento policial capacitar o agente policial para o trabalho

    dirio. Se o treinamento estiver em desacordo com os ditames constitucionais de

    respeito aos direitos fundamentais, ter-se- uma organizao policial repressora

    cujas consequncias so perniciosas para a democracia. Assim, a formao do

    policial fundamental para a construo e efetivao dos direitos fundamentais do

    cidado. O exerccio de segurana nas condies de cidadania plena foi, e ainda ,

    muito discutido por diversos autores na contemporaneidade (COSTA, 2005).

    A percepo que se tem de que uma mudana est em curso quando da

    aplicao de novos modelos de policiamento, com uma vertente mais dedicada aos

    anseios das comunidades locais. A mudana de foco na atuao dos organismos

    policiais depende, em boa medida, de um treinamento eficaz que transmita

    informao, desenvolva habilidades, atitudes e conceitos, com vista a uma

    adequada formao do policial (BASILIO, 2008).

    Novas iniciativas de formao por meio da inovao, como, por exemplo, o

    ensino a distncia, tm o potencial de beneficiar o policiamento e melhorar a

    segurana pblica (MUGFORD, et al., 2013). Porm, a tnica apresentada nos

    modelos atuais de policiamento realizados pelas Polcias Militares Brasileiras ainda

    possui uma enorme fora repressiva. Segundo Baslio (2008), em uma poltica de

    segurana repressiva, os policiais so formados para atuarem de forma reativa.

    A melhoria da qualidade dos servios prestados pela PMPR, ao que tudo

    indica, e pelo discurso emprico, depende de aes que facilitem uma formao

    sociocultural e profissional de maior nvel, aliada a polticas que respeitem e

    concretizem o direito de todos educao, coadunada com os ditames de um

    estado democrtico de direito (ORTEGA, 2015).

    Desse modo, possuir, em seus quadros, policiais com uma formao

  • 26

    qualificada far com que uma instituio de segurana pblica possa fornecer ao

    cidado um servio de boa qualidade. Com agentes bem preparados, a funo

    primordial de guardar os mandamentos constitucionais se completar pela

    formao qualificada e continuada (LUIZ, 2008).

    Em um pas onde o senso comum vislumbra uma formao policial precria

    e corrompida, o fortalecimento de iniciativas ou mesmo de polticas pblicas

    voltadas ao resgate da imagem da polcia fundamental para a reestruturao do

    modelo de formao e qualificao profissional. O ensino policial necessita ser

    voltado a uma formao profissional que atenda aos anseios do cidado que ser

    atendido e do policial que realizar a atividade de policiamento. Uma formao

    qualificada, para que o agente policial possa exercer suas funes com excelncia,

    essencial para o fortalecimento da estrutura educacional da prpria instituio

    (LUIZ, 2008)

    Diante do cenrio acima apresentado, algumas discusses acerca da

    formao do profissional de segurana pblica afloram. Um qualificado agente

    pblico de segurana passa por treinamentos tericos e prticos, pois deve haver

    um equilbrio entre o intelecto e o fsico. No que concerne parte fsica do

    treinamento, alm de habilidades como correr e saltar, os policiais devem saber

    atirar com suas armas de fogo (PERSSON, 2011).

    A utilizao de armas de fogo exige habilidade, destreza e treinamento

    apropriado, pois o emprego inadequado pode gerar danos irreparveis, como a

    perda de vidas humanas. Assim, h necessidade de constante treinamento haja

    vista a necessidade de preparar o policial para oferecer uma resposta coerente, em

    uma situao que envolve estresse e medo, e que sua conduta seja capaz de

    proteger a prpria vida e a de terceiros, mantendo a coerncia com as normas e a

    ordem social (PINC, 2011).

    O treinamento com arma de fogo pode ser simulado ou real. No caso

    simulado, o policial pode realizar diversos exerccios que no exigem o disparo da

    arma de fogo propriamente dito. J no caso do treinamento real, o agente deve

    efetuar disparos com o armamento apropriado. Nesse caso, as instituies policiais

  • 27

    utilizam-se dos chamados estandes de tiro (locais devidamente reservados para a

    prtica do tiro real) onde os policiais realizam os treinamentos fazendo disparos

    com suas armas de fogo2.

    Em geral, esses estandes de tiro so locais abertos, cercados por muros de

    alvenaria. So tambm levantados barrancos de terra, que servem de anteparo

    para os tiros disparados pelas armas de fogo. Mas, mesmo sendo os estandes de

    tiro instalados, muitas vezes, em locais afastados, a prtica do tiro expe ao risco

    seus praticantes por uma srie de aspectos, dentre os quais destaca-se a

    exposio ao rudo causado pelas de armas de fogo, que um fator de risco

    estabelecido (CHOI et al., 2012).

    Em se tratando de resduos, at mesmo os orgnicos, se convertem em

    problema quando descartados de forma inadequada. Essa desateno, em muitos

    casos, traz o acmulo de resduos (lixo) em reas imprprias, podendo gerar

    contaminao do solo e guas, bem como causar desconforto aos moradores,

    gerando e atraindo insetos e outros animais, potenciais transmissores de doenas,

    entre outros processos de poluio ambiental (HOEHNE et al., 2012).

    Aps o disparo de arma de fogo propriamente dito, grande parte dos

    resduos proveniente do cano da arma, resultado de partculas queimadas e no

    queimadas da plvora, consistindo em compostos orgnicos e de metal, tal como

    Pb, Cu, lato, nquel ou de material de encamisamento (TRIMPE, 2011).

    Resduos, no caso dos projteis de arma de fogo, que se convertem em um

    passivo ambiental que tende contaminao do solo das reas dos estandes de

    tiro. O acmulo de Pb, com a sua consequente deposio no solo, pode levar

    graves implicaes ao ecossistema e aos seres humanos (PERES & MOREIRA;

    2003).

    Estudo realizado na Dinamarca mostrou que uma grande parte (quase 60%)

    dos atiradores de estandes de tiro fechados naquele pas tinham concentraes de

    2 Constatao in loco em vrios municpios onde esto localizadas as unidades da PMPR.

  • 28

    Pb no sangue potencialmente prejudiciais (GRANDAHL, et al., 2012).

    Os resultados encontrados sobre os teores dos metais analisados neste

    trabalho podero contribuir para a formao de uma base de dados, bem como

    para o estabelecimento de normas de controle e manejo ambiental dos estandes

    de tiro da PMPR, diminuindo o potencial de risco relativo contaminao do solo

    por metais txicos. Isso, pois, avaliar o risco representado pela contaminao do

    solo urbano para a sade humana uma questo crtica na pesquisa acadmica e

    polticas pblicas (BI et al., 2013).

    Ademais, no que tange legislao, a PMPR, conforme a Lei 16.575 - 28 de

    Setembro de 2010, instituio permanente, fora auxiliar e reserva do Exrcito

    Brasileiro (EB), organizada com base na hierarquia e na disciplina, destina-se

    preservao da ordem pblica, polcia ostensiva, execuo de atividades de

    defesa civil. Assim, exerce tambm atividade de fiscalizao e proteo ao meio

    ambiente.

    A PMPR, como todas as outras polcias militares brasileiras, so reguladas

    pelo Art. 144, 5, da CF, sendo responsveis pelo policiamento ostensivo e

    preventivo, cabendo a elas a funo de polcia administrativa (SOUZA, 2006).

    A estrutura da Polcia Militar Paranaense divide-se em rgos de direo,

    rgos de apoio e rgos de execuo. Os rgos de direo compem o

    Comando-Geral da Corporao, que compreende: Comandante-Geral;

    Subcomandante-Geral; Estado-Maior; Corregedoria-Geral; Diretorias; Gabinete do

    Comandante-Geral; Comisses; Conselho Econmico e Financeiro; Assessorias

    Militares; Consultoria Jurdica (PARAN, 2010).

    Os rgos de apoio, por sua vez, realizam as atividades-meio da

    Corporao, atendendo s necessidades de pessoal, de semoventes e de material

    de toda a Polcia Militar, atuando em cumprimento das diretrizes e ordens dos

    rgos de direo (PARAN, 2010).

    Dentre os rgos de apoio, a Diretoria de Apoio Logstico possui, em sua

  • 29

    subestrutura, o Centro de Suprimento e Manuteno de Intendncia (CSM-Int), o

    Centro de Suprimento e Manuteno de Material Blico (CSM-MB) e o Centro de

    Suprimento e Manuteno de Obras (CSM-O), responsveis pela aquisio,

    recebimento, armazenagem, distribuio e controle de suprimentos, veculos,

    armamentos e munies, bem como pela execuo, fiscalizao, manuteno e

    controle das edificaes e obras da Corporao (PARAN, 2010).

    O Centro de Suprimento e Manuteno de Material Operacional (CSM/MOP)

    o rgo incumbido do recebimento, da estocagem, da distribuio dos

    suprimentos e da execuo da manuteno no que concerne ao armamento e

    munio, ao material de comunicaes, ao material de motomecanizao e ao

    material especializado de bombeiros (PARAN, 2010).

    Segundo a legislao, os rgos de execuo so constitudos pelas

    unidades operacionais da Corporao e realizam as atividades-fim da PMPR;

    cumprem as misses ou a destinao da Corporao. Para isso, executam as

    diretrizes e ordens emanadas dos rgos de direo e so apoiados, em suas

    necessidades de pessoal, de semoventes, de material e de servios, pelos rgos

    de apoio (PARAN, 2010).

    A possibilidade de contaminao do solo pela ao de agentes da PMPR

    (por meio do treinamento de tiro nos estandes de tiro sob sua responsabilidade)

    no pode ser admissvel em uma instituio que tem por dever a proteo do meio

    ambiente por suas aes de fiscalizao dado que, dentre os rgos de execuo,

    a PMPR possui o Batalho de Polcia Ambiental, encarregada do policiamento

    ostensivo, visando ao cumprimento dos dispositivos legais na proteo da fauna,

    da flora e do meio ambiente (PARAN, 2010).

    A exigncia de uma nova postura que conceba a preservao do meio

    ambiente uma tendncia nas corporaes privadas e tambm no mbito pblico.

    Num exemplo recente, o governador da Flrida, nos EUA, emitiu decreto exigindo

    que todos os rgos estaduais realizem as suas reunies em hotis com

    certificao ambiental, determinando aos servidores do Estado que se utilizem

    hotis com certificados-verdes para atividades oficiais (PARSA et al., 2014).

  • 30

    Retomando a pesquisa da Lei 16.575, no se identificou em seu bojo o

    rgo responsvel pelo descarte ou reuso do material blico ou munio utilizados

    pela PMPR, tampouco normas internas que regulamentem o tratamento ambiental

    dos resduos produzidos aps os treinamentos, ou diretrizes que estabeleam

    cuidados e controle dos espaos fsicos dos estandes de tiro no que concerne

    poluio e contaminao por metais txicos3.

    2.2 Polcia e arma de fogo contaminao e poluio

    Conforme o Decreto-Lei n 667, de 2 de julho de 1969, compete s Polcias

    Militares, executar com exclusividade, o policiamento ostensivo fardado, planejado

    pela autoridade competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a

    manuteno da ordem pblica e o exerccio dos poderes constitudos (BRASIL,

    Decreto-Lei n 667, 1969).

    No estado do Paran, a PMPR o rgo responsvel pelo policiamento

    ostensivo fardado em todo territrio paranaense. Policiamento ostensivo aquele

    em que o policial, isoladamente ou em grupo, pode ser reconhecido de relance,

    quer pelo fardamento utilizado, quer pelo armamento ou pela prpria viatura

    (ROCHA, 2009). Para tanto, alm de utilizar um fardamento que os identifique

    imediatamente, os policiais militares fazem uso de armas de fogo, as quais, no

    entanto, podem contaminar o meio ambiente ou, at mesmo, polu-lo (CHOI et al.,

    2012).

    Nesse sentido, compreende-se contaminao como parte de um processo

    de poluio; refere-se transmisso de substncias ou microorganismos nocivos

    sade, sua constatao no implica necessariamente um desequilbrio ecolgico

    (BRAGA, et al. 2002). E, conforme a Lei 6.938/81, poluio a degradao da

    3 Foram pesquisados os arquivos legislativos da PMPR, no sendo encontradas normas relativas ao

    tema.

  • 31

    qualidade ambiental resultante de atividades que, direta ou indiretamente,

    prejudiquem a sade, a segurana e o bem-estar da populao ou lancem matrias

    em desacordo com os padres ambientais estabelecidos.

    J a Lei 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Poltica Nacional de

    Resduos Slidos define em seu artigo 3, inciso III, que rea contaminada local

    onde h contaminao causada pela disposio, regular ou irregular, de quaisquer

    substncias ou resduos. A citada lei define ainda o que resduos slidos so

    material, substncia, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas

    em sociedade, a cuja destinao final se procede, se prope proceder ou se est

    obrigado a proceder, nos estados slido ou semisslido, bem como gases contidos

    em recipientes e lquidos cujas particularidades tornem invivel o seu lanamento

    na rede pblica de esgotos ou em corpos dgua, ou exijam para isso solues

    tcnica ou economicamente inviveis em face da melhor tecnologia disponvel

    (BRASIL, Lei 12.305, 2010).

    Para se chegar concluso de que arma de fogo pode contaminar ou at

    poluir o meio ambiente, h que se conhecer o funcionamento da ferramenta. Arma

    de fogo pode ser entendida como uma mquina trmica, cuja utilizao independe

    da fora fsica (excetuando a fora relacionada ao pressionamento do gatilho) e,

    como no poderia deixar de ser, baseia-se nos princpios da termodinmica

    (CHEMELLO, 2007).

    As armas de fogo (Figura 1) utilizadas pelos policiais militares podem ainda

    ser definidas como artefatos de arremesso que empregam a fora expansiva dos

    gases resultantes da combusto da plvora para expelir seus projteis (GEORG;

    KELNER e SILVINO JR, 2011).

  • 32

    Figura 1 Arma de fogo: pistola Marca Taurus, calibre .40, utilizada pela PMPR.

    Fonte: http://www.taurusarmas.com.br, acessado em 12 abr. 13.

    Os integrantes da Polcia Militar utilizam diversos equipamentos, como

    cassetetes e algemas, que no se constituem em arma de fogo. Todavia, com as

    armas de fogo, utilizada munio (Figura 2), artefato completo, pronto para

    carregamento e disparo de uma arma, ou seja, so corpos carregados com

    explosivos ou agentes qumicos destinados a produzir danos (BRUM, 2010).

    Figura 2 Estrutura de um projtil de arma de fogo.

    Fonte: CHEMELLO, 2007, com adaptao do autor.

    O conceito de munio ainda considera os tiros de exerccio, que no

    possuem carga de exploso, mas apenas de lanamento, tiros de salva, utilizados

  • 33

    em cerimnias militares, mesmo que s produzam rudo e h, ainda, munio de

    festim utilizada nos treinamentos da tropa (BRUM, 2010).

    No caso do trabalho dirio dos policiais militares, utilizada, em suas armas,

    o que se conceitua de munio letal, caracterizada em usinados com

    preenchimento do estojo provido de iniciador (espoleta) de fogo central ou anular,

    com carga propelente e projtil slido (ARAJO, 2007).

    Assim, quatro elementos bsicos compem a estrutura da munio: estojo,

    mistura iniciadora, plvora e projtil (ou conjunto bucha + bagos de Pb, nos

    cartuchos de caa) (ANDRADE, 2005).

    Ao ser disparada uma arma de fogo so produzidas, dentro do cartucho,

    partculas provenientes de resduos da espoleta, do propelente e metais dos

    projteis e da prpria arma, pois, no ato do disparo, o detonador golpeia a espoleta

    e o calor da combusto (carga de inflamao) derrete a mistura iniciadora ou

    primer (FREITAS, 2010; ROMAO, et al., 2011).

    As munies letais possuem, nos cartuchos, misturas iniciadoras base de

    estifinato de Pb [PbOH(NO)], nitrato de brio, trissulfeto de antimnio, tetrazeno e

    Al. (CHEMELLO, 2007). As composies de plvora e mistura iniciadora nas

    munies podem ser diferentes, seja pela simples desigualdade na proporo entre

    ingredientes ou na prpria composio (SALLES, 2011).

    Essa mistura iniciadora responsvel por deflagrar a combusto da plvora

    (carga de projeo) contida no estojo em funo de uma deformao da cpsula de

    espoletamento que quebra os cristais de estifinato de Pb (composto explosivo), um

    oxidante (nitrato de brio, dixido de Pb ou nitrato de Pb), um combustvel

    (trissulfeto de antimnio ou siliceto de clcio), sensibilizantes (trinitrotolueno,

    tetraceno) e aglutinantes (goma-arbica, resinas celofane e goma-laca) (FREITAS,

    2010; ROMAO, et al., 2011).

    A dinmica do funcionamento de um disparo de arma de fogo pode ser descrito da

    seguinte maneira:

  • 34

    A expanso gasosa ocorre pela regio anterior do cano da arma, orientada para frente; contudo, parte do fluxo de massa gasosa expelido pela regio posterior da arma. Este fluxo contm os gases provenientes da combusto (CO e SO), assim como vrios compostos inorgnicos, como nitrito, nitrato, ctions de metais como chumbo (Pb),antimnio (Sb) e, particulados metlicos oriundos do atrito e da subsequente fragmentao dos projteis metlicos disparados (BORGES, p. 47, 2013).

    Conforme Martiny e Pinto (2008), uma grande quantidade de vapor contendo

    material particulado gerada quando do disparo por uma arma de fogo. Esse vapor

    expelido pelas aberturas e folgas presentes na arma. Em pistolas, o escape dos

    gases ocorre principalmente pela boca do cano, janela de ejeo e eventos de

    exausto (quando presentes). J em armas como os revlveres, esse material

    expelido pelo cano e folgas do tambor. Em armas longas, como fuzis e carabinas,

    os gases podem ser expelidos pelo cano, janela de ejeo, eventos de exausto e

    quebra-chama (MARTINY & PINTO, 2008).

    De todo o processo, os elementos Pb, Sb e Ba so os principais

    marcadores qumicos presentes nos resduos inorgnicos produzidos por disparos

    de armas de fogo (ROMAO, et al., 2011). A composio das partculas do material

    expelido nos gases contm elementos metlicos advindos do cano (Fe), estojo (Cu,

    Zn, Ni), projtil (Pb, Sb) e principalmente do iniciador (normalmente Pb, Ba e Sb;),

    alm de componentes (orgnicos) da plvora (MARTINY & PINTO, 2008).

    Esses elementos e as partculas e gases expelidos a partir do cano da arma

    so considerados como "resduo de disparo ou plvora" (em ingls, guns hot

    residue - GSR); esse material, aps o disparo, acaba depositado na roupa ou corpo

    de uma vtima ou na roupa e mos de um atirador (ALVAREZ & ARCO, 2012).

    No s o disparo gera contaminao, representando riscos ao ambiente,

    mas tambm o manejo de grnulos de Pb, no momento da montagem dos

    cartuchos e durante a reciclagem da sucata de Pb de projteis j utilizados

    (SANTOS, 2006).

    Alm de toda a composio qumica descrita na mistura iniciadora do

    cartucho de munio, pode ser encontrada no projtil liga de Pb (contendo Pb,

  • 35

    estanho e antimnio). Outro tipo encontrado o projtil encamisado e semi-

    encamisado, sendo que o ncleo deste ltimo frequentemente de Pb puro

    (ANDRADE, 2005).

    Destaca-se que a presena de determinadas substncias no meio ambiente,

    como a dos metais txicos acima descritos, em quantidades que causem

    desequilbrio, modificando a estrutura original do local, acarreta a contaminao da

    rea. Ao realizar estudo na regio de Flandres, na Blgica, Van Dyck (1995) definiu

    que geralmente um local contaminado um lugar onde os resduos (resultado da

    ao humana) esto presentes ou em que a poluio dos solos e guas

    subterrneas pode ocorrer.

    Cabe esclarecer que a Lei 12.305/2010, que trata de resduos slidos, define

    que resduos perigosos so aqueles que, em razo de suas caractersticas de

    toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, dentre outras, apresentam

    significativo risco sade pblica ou qualidade ambiental, de acordo com lei,

    regulamento ou norma tcnica.

    Aps se entender a dinmica de funcionamento das armas de fogo e

    verificando todo o processo qumico que envolve o treinamento dos policiais pelo

    disparo das armas, pode-se fazer um paralelo com o conceito de Van Dyck (1995)

    e definir um estande de tiro como um local contaminado por resduos perigosos.

    2.3 A proteo ambiental breve relato da evoluo no tempo

    A preocupao com a qualidade do meio ambiente, ao longo do tempo, vem

    se tornando tema principal em debates no cenrio mundial. Na histria luso-

    brasileira, j no reinado portugus de Dom Afonso IV, havia previso de sanes

    aos que interferissem no meio ambiente sem autorizao. Em 1393, as

    Ordenaes Afonsinas (conjunto de legislaes do perodo colonial portugus) j

    proibiam o corte deliberado de rvores frutferas (WAINER, 1999).

  • 36

    As Ordenaes Filipinas de 1603 (outro conjunto de legislaes do perodo

    colonial portugus) demonstravam evidentes preocupaes com o meio ambiente,

    determinando, dentre outras providncias: a proibio de caa de determinadas

    espcies animais, a proibio de pesca com rede em determinadas pocas,

    menes expressas poluio das guas, normativas sobre a ictiofauna, guas,

    animais domsticos e regulava a pesca: (locais, perodo e instrumentos) (COSTA et

    al., 2012).

    No perodo da repblica, com a vigncia da Constituio de 1891, avanos

    foram constatados no Cdigo Civil de 1916, que previa o uso nocivo da

    propriedade. Na dcada de 1930, aparecem as primeiras legislaes que trataram

    especificamente da proteo ao meio ambiente, dentre as quais destacam-se a

    proteo aos animais, cdigo das guas, explorao da caa e pesca (BERTOLI,

    2004).

    Hodiernamente, no cenrio mundial, a questo ambiental passa a ganhar

    corpo no sculo XX, tendo como marco, na dcada de 1960, o lanamento do livro

    Silent Spring (Primavera Silenciosa) de Raquel Carlson, no qual a autora descreve

    os perigos do uso de pesticidas qumicos e apresenta a nocividade desses

    produtos aos seres vivos e ao meio ambiente (SILVA, 2005).

    Em 1972, um grupo, denominado Clube de Roma, constitudo por

    intelectuais e empresrios preocupados com as consequncias que uma crise

    ecolgica poderia acarretar (GRM, 2000), publicou um relatrio chamado The

    Limits of Growth (Os Limites do Crescimento), apontando que o consumo mundial

    estava crescendo de tal forma que levaria a humanidade a um colapso.

    Tambm em 1972, em Estocolmo, na Sucia, a Organizao das Naes

    Unidas (ONU) realizou uma conferncia sobre o Ambiente Humano, que resultou

    na Declarao de Estocolmo e no reconhecimento de que os Estados

    necessitavam de uma resoluo universal sobre a proteo e a melhoria do meio

    ambiente humano (PASSOS, 2009).

  • 37

    Assim, se inicia a construo de mecanismos de proteo do meio ambiente,

    com um vis de universalidade. Vinte anos depois, a ONU realiza outra

    Conferncia sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992,

    que teve como escopo discutir problemas urgentes referentes proteo ambiental

    e ao desenvolvimento socioeconmico (PASSOS, 2009).

    Seguindo a evoluo mundial, no Brasil, o direito a um meio ambiente

    ecologicamente equilibrado se tornou um direito fundamental do cidado (BRASIL,

    1988), donde decorre a obrigao dos rgos fiscalizadores de inspecionarem as

    atividades poluidoras.

    A CF de 1988 foi uma inovao no mbito nacional, pois trouxe ao cenrio

    brasileiro o artigo 225, que reza:

    Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e futuras geraes (BRASIL, 1988).

    O texto constitucional prescreve obrigaes a quem agride o meio ambiente,

    com a previso, no 2, de que aquele que explorar recursos minerais fica

    obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com soluo tcnica

    exigida pelo rgo pblico competente, na forma da lei (BRASIL, 1988).

    O legislador constitucional ainda previu no 3 que as condutas e atividades

    consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitaro os infratores, pessoas fsicas ou

    jurdicas, a sanes penais e administrativas, independentemente da obrigao de

    reparar os danos causados (BRASIL, 1988).

    Mesmo antes dos ditames constitucionais, a Lei 6.938/81, que instituiu a

    Poltica Nacional do Meio Ambiente (PNMA), estabeleceu padres de qualidade

    ambiental, o zoneamento ambiental, a avaliao de impactos ambientais, bem

    como o licenciamento e a reviso de atividades efetiva ou potencialmente

    poluidoras (BRASIL, 1981).

  • 38

    A PNMA define a competncia e orienta os rgos governamentais, nos trs

    nveis de poder, no que concerne definio de reas, critrios e normas de ao,

    com vistas a garantir o crescimento e desenvolvimento econmico, tentando

    preservar o meio ambiente, de maneira sustentvel, por meio da conscientizao,

    fiscalizao e da aplicao de penalidades (VIANNA et al., 2005).

    Mesmo com a edio da Lei 6.938/81, somente em 2009 foi aprovada a

    Resoluo n 420 do CONAMA, no dia 28 de dezembro de 2009, que dispe sobre

    os critrios e valores orientadores da qualidade do solo quanto presena de

    substncias qumicas, e estabelece diretrizes para o gerenciamento ambiental de

    reas contaminadas por essas substncias em decorrncia de atividades

    antrpicas (CONAMA, 2009).

    A Resoluo define etapas de gerenciamento do solo, orientadas pelos

    rgos ambientais competentes (federais, estaduais e municipais) tendo como

    princpios bsicos a gerao e a disponibilizao de informaes; a gradualidade

    na fixao de metas ambientais, como subsdio definio de aes a serem

    cumpridas; a racionalidade e otimizao de aes e custos; a responsabilizao do

    causador pelo dano e suas consequncias; e a comunicao de risco (CONAMA,

    2009).

    Os rgos governamentais, ao realizarem especificamente o monitoramento

    e controle ambiental, necessitam de tcnicas analticas capazes de determinar

    vrios elementos, principalmente os metais pesados, haja vista os efeitos txicos

    nos seres vivos (VIERA, 2004).

    Nessa perspectiva, a Resoluo determina que a proteo do solo deve ser

    realizada de maneira preventiva, a fim de garantir a manuteno da sua

    funcionalidade, ou de maneira corretiva, visando restaurar sua qualidade, ou

    recuper-la de forma compatvel com os usos previstos (CONAMA, 2009).

    Assim define como funes principais do solo, dentre outras: servir como

    meio bsico para a sustentao da vida e de habitat para pessoas, animais, plantas

    e outros organismos vivos; manter o ciclo da gua e dos nutrientes; agir como filtro

  • 39

    natural, tampo e meio de adsoro, degradao e transformao de substncias

    qumicas e organismos (CONAMA, 2009).

    A Resoluo constitui uma fonte de informaes sobre os conceitos a serem

    empregados na proteo de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para

    tanto, define um conceito para o que seja contaminao:

    [...] presena de substncia(s) qumica(s) no ar, gua ou solo, decorrentes de atividades antrpicas, em concentraes tais que restrinjam a utilizao desse recurso ambiental para os usos atual ou pretendido, definidas com base em avaliao de risco sade humana, assim como aos bens a proteger, em cenrio de exposio padronizado ou especfico (CONAMA, 2009).

    Com vistas preveno e controle da qualidade do solo, a determinao

    legal da Resoluo implica que os empreendimentos, cujas atividades

    apresentarem potencial de contaminao dos solos e guas subterrneas,

    devero, por exemplo, a critrio do rgo ambiental competente, implantar

    programa de monitoramento de qualidade do solo e das guas subterrneas na

    rea do empreendimento e, quando necessrio, na sua rea de influncia direta e

    nas guas superficiais (CONAMA, 2009). Alm dessa determinao, os

    responsveis pelo empreendimento devem apresentar relatrio tcnico conclusivo

    sobre a qualidade do solo e das guas subterrneas (CONAMA, 2009).

    De acordo com a Lei 12.305/2010 os responsveis pelos estandes de tiro

    devem ser considerados geradores de resduos slidos, pois, assim so definidas

    as pessoas fsicas ou jurdicas, de direito pblico ou privado, que geram resduos

    slidos por meio de suas atividades, nelas includo o consumo (BRASIL, Lei

    12.305, 2010).

    Atualmente a potencialidade de contaminao do solo e guas nos estandes

    de tiro premente, tendo em vista as condies em que estes se encontram, sendo

    necessria a realizao de levantamento e monitoramento da qualidade do solo em

    suas reas de abrangncia.

  • 40

    2.4 Metais txicos, metais pesados conceitos, contaminao e consequncias

    Em relao terminologia empregada, h uma controvrsia e uma crtica ao

    termo metais pesados. O termo frequentemente usado para se referir a um

    conjunto muito heterogneo de elementos, incluindo o grupo de metais, semi-

    metais e no metais, que tm sido associados com a contaminao e potencial

    toxicidade, sendo mais usual para identificar elementos definidos como poluentes

    do meio ambiente e alimentos (AJN et al., 2013; SOARES, 2004).

    Ao largo da controvrsia, o termo metais pesados utilizado para

    elementos qumicos que contaminam o meio ambiente, que provocam diferentes

    danos biota, quais sejam, metais, semi-metais e mesmo no metais como, por

    exemplo, o selnio (TSUTIYA, 1999).

    A presena de substncias e de metais no solo por si s no motivo de

    preocupao, pois nutrientes como nitrognio (N), fsforo (P), potssio (K), clcio

    (Ca), magnsio (Mg) e enxofre (S) (macronutrientes), ferro (Fe), mangans (Mn),

    cobre (Cu), molibdnio (Mo), zinco (Zn), boro (B), cloro (Cl) e nquel (Ni)

    (micronutrientes) so considerados essenciais ao crescimento dos vegetais por

    desempenharem funes consideradas vitais ao desenvolvimento das plantas

    (KIRKBY & RMHELD, 2007; JEZLER, 2012).

    A contaminao causada por metais pesados em solos tratados com

    resduos urbanos avaliada frequentemente pelos teores totais desses elementos

    no solo, mas h, ainda, a possibilidade de contaminao do lenol fretico devido

    grande concentrao de metais pesados (TSUTIYA, 1999).

    Devido migrao de lixiviados, solos tm sido contaminados com metais

    pesados, tais como Pb, Cu, Zn, Fe, Mn, Cr e Cd, encontrados em resduos slidos,

    gerando srios problemas ao meio ambiente (KANMANI &; GANDHIMATHI, 2012).

    Aumentos da concentrao de metais pesados no solo, em especial de Pb,

  • 41

    tendo em vista a ao antropognica, que podem causar srios riscos sade

    humana, necessitam ser estimados e estudados (ABREU, ABREU & ANDRADE,

    1998).

    Os metais pesados tm se apresentado cada vez mais prximos da cadeia

    alimentar dos animais e, em especial, da do homem (FERNANDES et al., 2007).

    Isso tambm se verifica quanto aos teores de metais pesados presentes em solos

    e disponveis s plantas, sendo de fundamental importncia a avaliao do risco de

    entrada desses elementos potencialmente txicos na cadeia alimentar (FERREIRA,

    et al., 2001).

    A constatao de que a utilizao de armas de fogo libera metais txicos no

    meio ambiente, os quais podem causar contaminao, traz consigo a obrigao de

    verificar as consequncias do uso e emprego desses equipamentos pelos policiais

    militares. Gonalves Jr. (2013) declara que, em meio aos poluentes, os metais

    txicos esto entre os que mais causam preocupao, dado que vrios processos

    tm produzido resduos ricos nesses elementos.

    O que se verifica que o processo de treinamento dos policiais militares

    gera a contaminao por Pb no momento da denotaoda espoleta, que contm

    estifilato de Pb, sendo liberadas partculas de Pb quando o projtil passa atravs

    do cano da arma (SANTOS, 2006).

    Resumidamente, o processo de treinamento feito pelos policiais militares,

    para utilizar armas de fogo, se d pela repetio de tcnicas de tiro e, por

    consequncia, o disparo de arma de fogo propriamente dito. As armas expelem

    projteis compostos de Pb. Esse material lanado contra os barrancos onde

    ficam depositados.

    Conforme o manual do Mtodo Giraldi - 2006, o treinamento de tiro de

    policiais no exige um local (estande de tiro) sofisticado; para a sua realizao,

    basta um simples barranco para conteno dos projteis (GIRALDI, 2006). O

    manual conclui declarando que o treinamento pode ser feito, de igual forma, em

    qualquer bairro ou cidade (GIRALDI, 2006).

  • 42

    Ao se verificar o Manual Giraldi 2006, a inferncia que se pode fazer de

    que no h preocupao ambiental alguma quando da instalao ou treinamento

    em um estande de tiro. Logo se vislumbra que o solo dos barrancos e toda rea

    que serve de anteparo aos projteis nos estandes de tiro sejam passveis de

    contaminao por metais txicos, em especial Pb.

    O presente trabalho aponta que o treinamento de tiro por policiais se mostra

    tambm como fonte de contaminao. Como se pode observar pela Figura 3,

    muitos resduos slidos ficam depositados no solo dos estandes de tiro, de modo

    semelhante ao que ocorre no estande de tiro da Academia Policial Militar do

    Guatup (APMG).

    Figura 3 Projteis depositados no solo do estande de tiro da APMG.

    Fonte: Elaborado pelo Autor

    Entender a dinmica de um possvel processo de contaminao do solo por

    metais txicos de grande importncia, tendo em vista os riscos que pode

    acarretar qualidade das guas superficiais e subterrneas, alm dos altos custos

    envolvidos em operaes de remediao (SOARES et al., 2005).

    Est patente que o uso de armas de fogo pela PMPR caracteriza-se como

  • 43

    uma fonte de contaminao. Os projteis de Pb se constituem em resduo slido

    depositado no solo dos estandes de tiro, e, como tal, acarretam vrios problemas.

    Konrad & Calderan (2011) destacam dentre eles: a poluio do ar, contaminao

    do solo, das guas superficiais e dos lenis freticos; riscos sade pblica pela

    proliferao de diversos tipos de doenas; agravamento de problemas

    socioeconmicos.

    2.5 Influncia do Cd na sade humana e meio ambiente

    O Cd encontrado naturalmente na crosta da Terra, sendo comumente

    associado ao Zn, Pb e minrio de Cu, com uma abundncia de 0,1 a 0,5 mg.L

    (PIZZAIA, 2013). A contaminao por Cd pode acontecer via ingesto de produtos

    agrcolas e de solo, resultando em potencial risco sade (CAMPOS et al., 2013).

    Em humanos, o Cd pode se acumular com maior nfase nos rins, no fgado

    e nos ossos, podendo levar a disfunes renais e osteoporose, alm de favorecer a

    gerao de radicais livres, interferncias no sistema imunolgico e nervoso,

    consequentemente afetando o sistema visual e olfativo; pode, ainda, causar

    enfisemas pulmonares e desmineralizao ssea (PIZZAIA, 2013). Os efeitos

    txicos do Cd se manifestam principalmente nos ossos e rins. Pessoas com baixas

    reservas de ferro so particularmente vulnerveis a esses efeitos adversos

    (GARCA & CRUZ, 2012).

    Alm de comida e cigarros, que so as principais fontes de exposio dos

    seres humanos ao Cd, a exposio pode ocorrer atravs de lquidos, seja por conta

    de tubulaes que contenham Cd em soldas ou gua contaminada por resduos

    descartados nos rios ou em locais de captao (GARCA & CRUZ, 2012).

    Existem evidncias epidemiolgicas que determinam ser o Cd um agente

    carcinognico em relao sade humana, sendo classificado em stimo lugar no

    ranking da lista das substncias mais perigosas divulgadas pela Agncia de Sade

    Pblica Federal dos EUA (LACORTE, 2012).

  • 44

    2.6 Influncia do Cr na sade humana e meio ambiente

    Sendo considerado um elemento com trao essencial para o ser humano, o

    Cr um metal de grande importncia na rea da indstria, como o caso da

    galvanoplastia, polimento de metais, produo de ligas metlicas, estruturas da

    construo civil, fertilizantes, tintas, pigmentos, curtumes, preservativos para

    madeira entre outros usos, consequentemente, considerado um grande poluidor

    do meio ambiente (AMORIM, 2000; TRINDADE et al., 2012; CETESB, 2014).

    Conforme Trindade(2012):

    Entretanto, se encontrado em altas concentraes, tambm pode ser txico aos indivduos. A intoxicao geralmente conduz corroso do aparelho digestivo, diarrias, nuseas, efeitos cutneos, danos aos rins, fgado e pulmes, hemorragias internas e desenvolvimento de carcinomas (TRINDADE et al., p. 68, 2012).

    Rotineiramente, materiais que utilizam Cr so descartados de forma

    inadequada e sem tratamento. Esses resduos possuem alto poder de

    contaminao, pois o Cr liberado atinge os lenis freticos com facilidade, ou

    mesmo reservatrios ou rios, que so as fontes de abastecimento de gua das

    cidades (MAGRO, 2010).

    Em condies normais, as concentraes de Cr em gua doce so baixas.

    Na forma trivalente, o Cr essencial ao metabolismo humano, porm, na forma

    hexavalente, txico e cancergeno (CETESB, 2014). A presena do Cr em altas

    concentraes traz consequncias ambientais, principalmente, sobre espcies

    aquticas, acumulando-se em guelras, brnquios, vsceras, corao, pele,

    escamas e msculos (MAGRO, 2010).

  • 45

    2.7 Influncia do Pb na sade humana e meio ambiente

    Conforme Mavropoulos (1999), ao citar Larini, a contaminao do solo pelo

    Pb pode se dar de forma natural ou geolgica, ou ainda por meio de atividades

    exercidas pelo homem, como a minerao, a indstria e o transporte. E

    complementa ressaltando que o teor de Pb nos solos tende a se alterar de regio a

    regio. Por exemplo, em regies prximas s vias de trfego intenso e de

    indstrias, os teores de Pb se apresentam bem mais elevados do que aqueles

    encontrados em reas isoladas (MAVROPOULOS, 1999).

    Estudos apontam que a contaminao por Pb nos solos provm de fontes

    antrpicas, tais como o uso de insumos agrcolas com teores elevados de Pb,

    deposio atmosfrica, minerao e resduos industriais (PIERANGELI, 1999).

    No trabalho apresentado por Van Geen et al. (2012), que buscou estimar a

    populao do Peru que poderia estar exposta ao Pb do solo contaminado nas

    proximidades de minas de explorao, foi constatado que 53% das amostras de

    solo tinham uma concentrao de Pb acima do mximo de 1.200 mg/kg

    recomendados pela Agncia de Proteo Ambiental dos EUA (EPA).

    Esse estudo obteve resultados esclarecedores, pois demonstrou que, nos

    locais pesquisados, as cinco maiores concentraes de Pb no solo, que variaram

    entre 5.000 e 12.000 mg/kg, foram observadas em amostras colhidas acerca de

    500 m da margem do poo de extrao e apenas 11 das 74 amostras

    apresentaram concentraes de Pb abaixo do limite de 400 mg/kg conforme

    recomenda a EPA (VAN GEEN et al., 2012).

    Pierangeli et al. (2001) faz uma observao quanto aos teores de Pb e

    normas reguladoras brasileiras:

    No Brasil, teores de chumbo superiores aos reportados na literatura mundial tm sido observados em alguns fertilizantes e calcrios (Amaral Sobrinho et al., 1992), biosslidos (Langenbach et al., 1994) e compostos de lixo urbano (Cravo et al., 1998). Embora existam normas regulamentares relativas concentrao mxima permitida de Pb para que um resduo ou corretivo possa ser adicionado aos solos, elas so muito genricas, uma vez que no levam em conta os atributos dos solos. (PIERANGELI et al., p. 280, 2001)

  • 46

    Geralmente, o Pb acumula-se na camada superficial do solo em vista de sua

    baixa mobilidade no perfil (ABREU, ABREU & ANDRADE, 1998). Miranda et al.

    (2011), ao citar Peres e Moreira (2003), destaca que no somente os solos

    poludos por essa substncia como tambm guas poludas ou as resultantes de

    suas fragmentaes, geram a contaminao dos animais que as habitam, podendo

    constituir uma ameaa para a sade humana atravs da biomagnificao (PERES

    & MOREIRA; 2003).

    Uma pequena quantidade desse metal transportada para as guas

    subterrneas ou mesmo superficiais. A maior parte do Pb fica retida no solo. Esse

    processo ocorre tendo em vista vrios fatores como o pH, a composio mineral,

    quantidade e tipo de matria orgnica, dentre outros encontrados no solo, que

    dificultam a travessia (PAOLIELLO; CHASIN, 2001).

    Vrias so as fontes de contaminao do solo. Cunha (2003) aponta a

    galena, sulfeto de Pb, como a fonte primria mais importante de Pb e a principal

    fonte comercial. Outra fonte, como, por exemplo, a atividade de minerao, tem a

    capacidade de perturbar ou alterar os ciclos naturais dos elementos qumicos no

    ambiente, causando a acumulao dos metais txicos nas guas, sejam elas

    superficiais ou subterrneas, tambm nos sedimentos, solos, na atmosfera e,

    portanto, no organismo dos homens e animais, por meio da ingesto de gua e

    alimentos e da inalao de partculas de poeira (CUNHA, 2003).

    Todavia, no caso do Pb, quando encontrado em nveis de exposio

    moderada no ambiente e nas ocupaes laborais, um importante aspecto dos seus

    efeitos txicos a ser observado a reversibilidade das variaes bioqumicas e

    funcionais induzidas (MOREIRA & MOREIRA, 2004a).

    O Pb um elemento txico no essencial que se acumula no organismo e

    compromete virtualmente todos os rgos e sistemas do corpo humano, sendo que

    os mecanismos de toxicidade propostos envolvem processos bioqumicos basilares

    (MOREIRA & MOREIRA, 2004).

  • 47

    No organismo humano, a absoro do Pb influenciada por alguns aspectos

    como a rota de exposio, forma qumica, tamanho da partcula, assim como pela

    solubilidade dos compostos desse metal e variaes individuais fisiolgicas e

    patolgicas (MOREIRA & MOREIRA, 2004b).

    Em adultos, os efeitos da exposio podem influenciar as funes do

    sistema nervoso central e tambm o aumento da presso sangunea, o que se

    torna um fator de risco para pessoas cardiopatas (JAKUBOWSKI, 2011).

    Grande parte das pesquisas sobre os efeitos na sade provocados pelo Pb

    tem sido focada em crianas porque elas so mais vulnerveis ao Pb do que

    adultos. Estudos mostram que as crianas sofrem mais, pois, nelas, os efeitos

    crticos atingem o sistema nervoso, enquanto que nos adultos com exposio

    ocupacional excessiva, ou at por acidente, os cuidados so com a neuropatia

    perifrica e a nefropatia crnica (JAKUBOWSKI, 2011; MOREIRA & MOREIRA,

    2004a).

    Gonalves Jr (2013), ao citar Paoliello & Chasin (2001), explica que o Pb o

    metal pesado txico em maior quantidade na crosta terrestre, apresentando uma

    concentrao mdia entre 10 e 20 mg/kg-1. Ademais o referido metal provoca vrias

    alteraes bioqumicas, todas elas deletrias (SCHIFER, BOGUSZ &MONTANO,

    2005).

    Uma releitura da teoria acerca da contaminao do solo por Pb mostra

    fontes clssicas de contaminao:

    No Brasil, dentre as principais fontes, temos: a poeira contaminada nas reas das comunidades que vivem prximas a fbricas ou ao redor de mineraes; o material particulado trazido para o interior da casa por aqueles que trabalham em indstrias que manipulam chumbo; o uso de porcelana esmaltada e utenslios de PVC; a fabricao caseira de chumbadas de pesca e cartuchos; tinturas de cabelo; tintas de brinquedos; projteis de arma de fogo alojados em articulaes ou canal medular; e at mesmo alimentos, industrializados ou frescos, dependendo se a gua utilizada na irrigao ou o solo onde foram plantados esto ou no com nveis de chumbo elevados (EVANGELISTA & SILVA, p. 8, 2013).

    Os efeitos do Pb no organismo humano so devastadores, razo pela qual

    http://lattes.cnpq.br/4734802565141093

  • 48

    se faz necessrio manter o controle dos nveis do referido metal no meio ambiente,

    observando rigorosamente os ditames legais.

    2.8 Influncia do Al na sade humana e meio ambiente

    Apesar de ser dos elementos mais abundantes, o terceiro elemento depois

    do oxignio e slica no meio ambiente, configurando 8,8 % na crosta terrestre, o Al

    est presente em reduzidas quantidades nos seres vivos (ROSALINO, 2011). O Al

    e seus sais so amplamente usados pela indstria no tratamento da gua, como

    aditivo alimentar, na fabricao de latas, telhas, papel alumnio, na indstria

    farmacutica (CETESB, 2014).

    Em solos cidos e com elevados teores de Al3+, a toxicidade de Al o fator

    mais limitante produtividade agrcola (DEL GUERCIO & CAMARGO, 2011;

    KOCHIAN, 1995). Conforme a Companhia Ambiental do Estado de So Paulo

    (CETESB) (2014), na gua, o Al pode ocorrer em diferentes formas:

    [...] influenciado pelo pH, temperatura e presena de fluoretos, sulfatos, matria orgnica e outros ligantes. [...] Em guas com extrema acidez, afetadas por descargas de minerao, as concentraes de alumnio dissolvido podem ser maiores que 90 mg/L. Na gua potvel, os nveis do metal variam de acordo com a fonte de gua e com os coagulantes base de alumnio que so usados no tratamento da gua (CETESB, p. 6, 2014).

    Autores divergem quanto classificao do Al. Oliveira (2014) entende que o

    Al, apesar de no ser classificado como metal pesado, est entre a vasta relao

    de poluentes da gua e interfere significativamente no ecossistema aqutico

    quando em excesso (OLIVEIRA, 2014).

    Cunha et al. (2011) e Silva (2007) entendem que o Al um metal pesado

    abundante nas rochas e causa problemas em 30-40% das terras cultivveis do

    planeta. Em solos cidos, ele torna-se solvel, absorvido pelas razes e inibe o

    crescimento das plantas (CUNHA et al., 2011; SILVA, 2007).

    A principal via de exposio humana ao Al pela ingesto de alimentos e

  • 49

    gua, com exceo da via ocupacional, no havendo indicaes de que apresente

    toxicidade aguda por via oral (CETESB, 2014).

    No h indicao de carcinogenicidade para o Al, porm, alguns autores o

    relacionam doena de Alzheimer e a outros tipos de escleroses, j que nos

    pacientes com a doena foi detectado o aumento da concentrao de Al no

    crebro, msculos e ossos (CETESB, 2014; DANTAS et al., 2007).

    2.9 Estandes de tiro provveis fontes de contaminao

    A PMPR mantm, em algumas cidades do Estado, estandes de tiro onde so

    realizados os treinamentos de seus agentes. Em alguns casos, os estandes de tiro

    so reas abertas onde os disparos de arma de fogo so realizados contra

    barrancos de terra, ou armaes de pneus preenchidos com areia ou com a

    prpria terra do local4.

    A deposio de resduos de munies em estande de tiro pode representar

    uma ameaa para o meio ambiente e fauna, tendo em vista que animais

    domsticos ou selvagens podem beber de crregos ou lagos contaminados, ou

    podem alimentar-se do pasto contaminado na rea do campo de tiro (MARIUSSEN

    et al., 2012).

    Os estandes de tiro da PMPR so locais onde os militares esto expostos ao

    contato com o Pb, quer seja pelo manuseio do armamento e munio ou mesmo

    pelo Pb no solo resultante dos disparos nos barrancos. Assim, conforme artigo 14

    da Resoluo 420/2009 do CONAMA,a existncia dos estandes de tiro demanda

    um cuidado ambiental(CONAMA, 2009).

    Entretanto, ao se buscar informaes sobre a gesto ambiental dos

    estandes de tiro da PMPR, no foram encontradosdados disponveis que

    permitissem deduzir se h ou no contaminao destes espaos. No havendo

    4 Constatao mediante visitao in loco dos estandes da PMPR.

  • 50

    informao disponvel, no h, em tese, um conflito ambiental (MEDEIROS, 2004).

    Peddicord & Lakind (2000), ao pesquisarem o estande de tiro ao ar livre do

    Centro Blue Mountain Sportsman, operado por Westchester Country, que fica a

    aproximadamente 40 km ao norte de Nova York, EUA, trataram dos riscos para a

    sade humana e ecolgica em um campo de tiro ao ar livre; fizeram avaliaes dos

    perigos aos seres vivos decorrentes do uso de munies e armas de fogo.

    Os autores destacaram que o Pb se converte numa exceo ao risco mnimo

    sade humana. As anlises indicaram nveis elevados de Pb no sangue (acima

    de 10 g/dL) para os clientes do centro de tiro e funcionrios, decorrentes do uso

    de armas de pequeno calibre e da ingesto de sedimentos e guas superficiais

    (PEDDICORD & LAKIND, 2000).

    Os resultados da anlise indicam nveis elevados de Pb no sangue (acima

    de 10 g / dL) tambm para as crianas que convivem nos estandes de tiro

    pesquisados. Cerca de 30% das crianas que ingerem solo, sedimentos e guas

    superficiais apresentaram alteraes significativas nas amostras de sangue

    (PEDDICORD & LAKIND, 2000).

    Os autores concluem que sedimentos e guas superficiais parecem ter

    maior contribuio para os nveis elevados de Pb no sangue das crianas que

    adentram os estandes de tiro de forma irregular (PEDDICORD & LAKIND, 2000).

    A probabilidade da existncia da contaminao do solo dos estandes de tiro

    por Pb alta. Conforme Hardison Jr. et al. (2003), a contaminao de solos pela

    utilizao de disparos com projteis de Pb est em crescimento. Em sua pesquisa,

    os autores procuraram apurar a existncia de contaminao de campos de tiro e as

    reaes de intemperismo de projteis de Pb no solo, alm do significado da

    abraso dos projteis de Pb para a contaminao do solo.

    Segundo os autores, a abraso de projteis de Pb e, na sequncia, seu

    intemperismo, pode ser uma fonte expressiva de contaminao por Pb em solos de

    um estande de tiro (HARDISON JR. et al., 2003).

  • 51

    Este estudo, vinculado aos demais apresentados ao longo da

    presente pesquisa, leva a diligenciar atentamente para a existncia de

    contaminao, e at de poluio, por metais pesados dos solos dos estandes de

    tiro da PMPR e de estandes particulares (HARDISON JR. et al., 2003).

    2.10 Normas ambientais regulamentao do CONAMA

    Machado et al. (2004) indica que a seriedade de um determinado cenrio de

    contaminao depende de alguns fatores, dentre os quais preciso que haja a

    disponibilizao do contaminante para o meio ambiente. Os autores esclarecem

    que:

    Havendo a disponibilizao do contaminante, interessante que se conheam os possveis caminhos a serem percorridos pelo mesmo, a intensidade e o espraiamento da contaminao. Desempenham um papel fundamental na busca de respostas para estas questes as condies hidrogeolgicas, as caractersticas das camadas de solo e as condies geotcnicas do local, assim como as caractersticas do prprio contaminante. Havendo a possibilidade do contaminante se propagar, necessrio que se identifiquem as possveis formas de exposio da populao ao contaminante (existncia de poos para o consumo de gua, ingesto de alimentos contaminados, aspirao de poeira, geofagia, etc.) (MACHADO et al., p. 142, 2004).

    O ponto de referncia para verificar se h ou no contaminao dos solos

    pesquisados a Resoluo n 420/2009 do CONAMA, que dispe sobre critrios e

    valores orientadores de qualidade do solo quanto presena de substncias

    qumicas e estabelece diretrizes para o gerenciamento ambiental de reas

    contaminadas por essas substncias em decorrncia de atividades antrpicas

    (CONAMA, 2009).

    Ao fazer uma anlise sobre a citada Resoluo, Skorupa (2013), citando

    Rohde (2008), apresenta as fases para se estabelecer valores de qualidade do

    solo:

    Para este fim, foram estabelecidos os seguintes termos e definies: 1. valor de referncia de qualidade: concentraes naturais, determinadas com base em interpretao estatstica de anlises fsico-qumicas de diversas amostras; 2. valor de preveno: concentraes-limite de

  • 52

    determinada substncia, com o intuito de garantir a manuteno e/ou restaurao do ecossistema, compatveis com os usos previstos; 3. valor de investigao: definio usada para concentraes de determinada substncia no solo ou na gua subterrnea acima do qual existem riscos potenciais sade humana. A determinao de concentraes naturais de um elemento ou substncia no solo (background), sem influncia antrpica, um passo importante para a definio de valores orientadores e preventivos de contaminao do solo. Outro termo bastante comum na literatura o nvel de base (baseline) que a concentrao de um determinado elemento ou substncia em alguns pontos de amostragem no tempo, e que pode incluir influncia humana (ROHDE, 2008). Assim, o nvel de base no corresponde necessariamente s concentraes naturais de elementos ou substncias no solo (background) e definido como o intervalo de dois desvios-padro em relao mdia, ou seja, a incluso de 95% dos resultados do intervalo (ROHDE, 2008), assumindo-se uma d