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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL ROSANA DE ARAÚJO CARNEIRO A ATUAÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL CAPS III SER II FORTALEZA 2013

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE BACHARELADO EM SERVIÇO SOCIAL

ROSANA DE ARAÚJO CARNEIRO

A ATUAÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL – CAPS III SER II

FORTALEZA

2013

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ROSANA DE ARAÚJO CARNEIRO

A ATUAÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL – CAPS III SER II

Monografia submetida à aprovação da

Coordenação do Curso apresentado ao Curso

de Serviço Social da Faculdade Cearense

(FAC), como requisito parcial para obtenção

do grau de Graduação.

Orientador: Profª Ms. Virzângela Paula Sandy

Mendes.

FORTALEZA

2013

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Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

C289a Carneiro, Rosana de Araújo

A atuação das Assistentes Sociais no Centro de Atenção

Psicossocial – CAPS III SER II / Rosana de Araújo Carneiro.

Fortaleza – 2013.

91f. Orientador: Prof.ª Ms. Virzângela Paula Sandy Mendes.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.

1. Saúde Mental. 2. Prática profissional. 3.

Interdisciplinaridade. I. Mendes, Virzângela Paula Sandy. II.

Título

CDU 364

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ROSANA DE ARAÚJO CARNEIRO

A ATUAÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL – CAPS III SER II

Monografia submetida à aprovação da

Coordenação do Curso apresentado ao Curso

de Serviço Social da Faculdade Cearense

(FAC), como requisito parcial para obtenção

do grau de Graduação.

Orientador: Profª Ms. Virzângela Paula Sandy

Mendes.

Data de Aprovação:___/___/_____.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________

Profª. Ms. Virzângela Paula Sandy Mendes

(Orientadora)

__________________________________________________

Profª. Ms. Mayra Rachel da Silva

(1ª Examinadora)

__________________________________________________

Profª. Esp. Richelly Barbosa de Medeiros

(2ª Examinadora)

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DEDICATÓRIA

Com muita gratidão, à minha amada e preciosa

família; a minha mãe Francisca Maria; ao meu

pai Pedro (in memorian); ao meu irmão

Ronaldo; às minhas irmãs Rosângela,

Fernanda Kelly e Maria José, que estão

presentes na minha vida e acompanharam todo

o meu tempo vivido na graduação e, entre

ausências e presenças, suportaram comigo as

dificuldades e as alegrias desse tempo,

fazendo-se presença constante de apoio,

incentivo e admiração durante toda a minha

vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primordialmente a Deus, criador da vida, autor da criação, o Pai

supremo o qual coloco toda a minha confiança e volto a minha fé, o Alfa e Ômega, o

Princípio e o Fim. Ao Deus do impossível, que sabiamente me guiou e tornou possível este

sonho e, nesta árdua caminhada, concedeu-me graças e bênçãos, dons e talentos, alegrias e

tristezas e, nesse misto de altos e baixos, tempestades e bonanças, permitiu-me vencer e

perceber a sua sublime presença em todos os momentos, dessa forma, fazendo-me sentir com

mais força a alegria da vitória. Enfim, a Deus os meus infinitos agradecimentos.

Ao meu querido pai (in memorian) que, mesmo na glória de Deus, acredito que

esteve ao meu lado intercedendo a Deus por mim e na certeza de que se estivesse nesse

mundo terreno, permaneceria ao meu lado e muito se alegraria com essa conquista.

Agradeço carinhosamente a minha querida e santa mãe a qual amo muito e por ela

muito sou amada, que sempre esteve e está ao meu lado em todos os momentos da minha

vida, principalmente nessa desafiante caminhada acadêmica e de fim de curso. Por suas

orações, palavras, carinho, apoio e confiança que depositou em mim, sempre me incentivando

a ser melhor.

Agradeço as minhas queridas irmãs Rosângela, Fernanda Kelly e Maria José pelo

apoio, a paciência, a colaboração que dedicaram a mim nesse período, contribuindo de forma

significativa com a minha formação acadêmica.

Agradeço ao meu irmão Ronaldo por sua contribuição nesse processo.

Aos meus amigos e irmãos missionários do Grupo de Oração “Missionários de

São Miguel Arcanjo”, que pacientemente suportaram a minha ausência no serviço e nas

missões e rezaram por mim.

Aos meus padrinhos Salete e Edmilson, que acompanharam parcialmente essa

fase da minha vida, sempre me incentivando com uma palavra de sabedoria, motivando-me e

me dando forças para superar as dificuldades e se alegraram com a minha conquista.

Agradeço as minhas colegas da turma de Serviço Social 2013.2, que de forma

direta ou indireta tiveram participação na minha vida acadêmica; àquelas que me

acompanharam desde o primeiro semestre, que contribuíram para o meu crescimento,

serviram de exemplo, fizeram-me pensar diferente, elegeram-me como líder de sala e

acreditaram em mim.

Agradeço carinhosamente as minhas colegas de equipe Vera Lúcia, Camila

Oliveira, Rosieli Almeida, Waldiane Rocha e Yara Viana entre as quais desenvolvemos mais

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afinidades e assim se fizeram presentes, tornaram-se amigas e companheiras e juntas nesse

período aprendemos a vencer as barreiras e superar os desafios através do apoio mútuo.

Meu agradecimento particular e especial a minha amiga Vera Lúcia, que esteve

mais presente na minha vida acadêmica, que tanto me ajudou, apoiou, incentivou e contribuiu

com o meu processo de formação, sendo exemplo de força e vitória.

Aos professores da Faculdade Cearense que contribuíram com a minha formação;

aos que se dedicaram, aos que se comprometeram e aos que marcaram a minha trajetória

acadêmica.

Agradeço especialmente a professora Richelly Barbosa, que acompanhou a

trajetória desse trabalho no último semestre da faculdade na disciplina de TCC, orientando,

incentivando, tranquilizando-me, avaliando o processo e me acompanhando até a defesa do

trabalho, dessa forma, contribuindo para o êxito com qualidade.

Agradeço ao CAPS III SER II que me acolheu muito bem no período de três

semestres como estagiária do Serviço Social, na pessoa da coordenadora Adriana Magalhães e

da atual coordenadora Beatriz Rennó, que me recebeu tão bem, que apoiou o meu trabalho

viabilizando a pesquisa de campo.

Agradeço a assistente social Liduina Alves, minha primeira supervisora de campo,

a minha porta de entrada no CAPS III da SER II, que me recebeu tão bem, orientou, apoiou,

ensinou, incentivou e se tornou inesquecível para mim.

Agradeço também a assistente social Juliana Lima, minha supervisora de campo

no segundo semestre de estágio, que me acompanhou, orientou, ensinou e contribuiu de forma

construtiva com a minha formação acadêmica.

Meu agradecimento especial a assistente social Concebida, minha supervisora de

campo do terceiro semestre de estágio, que deu continuidade a esse processo na etapa final,

que me conduziu tão bem na prática profissional com o seu exemplo de profissional

comprometida, orientou, ensinou, incentivou e, dessa forma, contribuiu significativamente

com a minha formação acadêmica.

Agradeço carinhosamente a todas as assistentes sociais do CAPS III SER II, que

participaram das pesquisas e se dispuseram a contribuir comigo na construção desse trabalho,

que me receberam tão bem, participaram com tanta satisfação, motivando-me e me

incentivando com atitudes e palavras.

Agradeço, de modo especial, as minhas amigas e colegas de trabalho Thais Araújo

e Priscila Vitta, do Centro Pediátrico da UNIMED, que pacientemente compreenderam o meu

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cansaço nas alternadas noites de plantões, facilitando o meu descanso, no período em que

precisei conciliar estudo e trabalho.

Agradeço a minha orientadora, professora Virzângela Paula, que aceitou me

acompanhar nessa fase final e, pacientemente, orientou, tranquilizou, incentivou a chegar ao

fim e construiu comigo esse trabalho, dessa forma, contribuindo com o sucesso da minha

conclusão.

Agradeço a participação da banca, as professoras Mayra Rachel e Richelly

Barbosa, que aceitaram fazer parte desse momento ímpar em minha vida e que contribuíram

significativamente com suas considerações e proposições.

Enfim, a todos e todas, com atenção, satisfação e carinho, o meu muito obrigada.

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A humildade é o primeiro degrau para a sabedoria.

(São Tomás de Aquino)

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RESUMO

A proposta da Reforma Psiquiátrica tem nos CAPS`s – Centro de Atenção Psicossocial - um

de seus maiores pilares. A proposta desses espaços abertos é oferecer tratamento aos usuários

com transtorno mental na perspectiva de inserção social. Para tanto, conta com uma equipe

interdisciplinar, sendo um desses profissionais o assistente social. Nesse sentido, a presente

pesquisa analisa como se estabelece a atuação desses profissionais no contexto do CAPS III –

situado na Regional II, na Cidade de Fortaleza - Ceará. Como objetivos específicos temos:

compreender a importância da atuação das assistentes sociais no CPS III SER II; perceber os

desafios da atuação das assistentes sociais no CAPS III SER II; conhecer as motivações das

assistentes sociais para atuarem no referido CAPS. A metodologia utilizada para a realização

desta pesquisa é de cunho qualitativo cujos instrumentos de base foram a pesquisa

bibliográfica e a pesquisa de campo. Para enriquecer a pesquisa de campo utilizamos a técnica

da entrevista semiestruturada gravada, aplicada individualmente com cada profissional

entrevistada, seguindo roteiro previamente elaborado. As categorias centrais que

fundamentaram esta pesquisa foram Saúde Mental, prática profissional e interdisciplinaridade

a partir das quais discorremos nosso estudo e embasamos as análises dos dados. Por fim,

identificamos que as assistentes sociais do CAPS atuam de forma ética e comprometida,

reconhecendo que precisam elaborar estratégias de superação e luta, mesmo diante das

limitações e dificuldades postas no cotidiano da instituição.

Palavras – Chaves: Saúde Mental. Prática Profissional. Interdisciplinaridade.

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RÉSUMÉ

La proposition de Réforme Psychiatrique a dans le CAP`s - Centre de Attention

Psychosociaux - un de ses plus grands piliers. La proposition de ces espaces ouvrerts est de

fournir aux utilisateurs avec troubles mentaux du point de vue de l'inclusion sociale. À cette

fin, a une équipe interdisciplinaire, l'un étant le assistant social. En ce sens, cette recherche

examine comme établit la performance de ces professionnels dans le contexte de CAPS III -

situé dans la Régional II, en ville de Fortaleza - Ceará. Les objectifs spécifiques sont:

Comprendre l'importance de la performance des assistants sociaux dans CAPS III SER II,

identifier les défis de la performance des assistants sociaux dans CAPS III SER II et

comprendre les motivations des assistants sociaux d'agir à ce CAPS. La méthodologie utilisée

pour cette recherche est une étude qualitative dont les instruments utilisées etaient la

recherche bibliographique et la recherche de camp. Pour enrichir la recherche de camp a

utilisé la technique d'entretiens semi- structurés enregistrés, appliquées individuellement à

chaque professionnel interrogé, suivant un script préparé à l'avance. Les catégories centrales

qui ont soutenu cette recherche étaient de la Santé Mentale, la pratique professionnelle et

l’interdisciplinaire, à partir de leur, nous écrivons notre étude et nous avons analysé les

données. Enfin, nous avons constaté que les assistants sociaux dans le CAPS agissent de

façon éthique et compromis, en reconnaissant que le besoin d'élaborer des stratégies de

surmonter et de lutte, même avec les limites et les difficultés mises en le quotidienne de

l’institution.

Mots - clés: Santé Mentale. Pratique Professionnelle. Interdisciplinarité.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CADS – Centro de Atenção Diária

CAPS – Centro de Atenção Psicossocial

CAPSad – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Droga

CAPSi – Centro de Atenção Psicossocial Infantil

CFESS – Conselho Federal de Serviço Social

CLT – Consolidação das Leis de Trabalho

CNS – Conselho Nacional de Saúde

CNSM – Conferência Nacional de Saúde Mental

COI – Centro de Orientação Infantil

COJ – Centro de Orientação Juvenil

HDs – Hospitais Dias

ISGH – Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar

NAPS – Núcleo de Atenção Psicossocial

OMS – Organização Mundial da Saúde

PMF – Prefeitura Municipal de Fortaleza

PT-MG – Partido dos Trabalhadores de Minas Gerais

SER – Secretaria Executiva Regional

SRT – Serviços Residenciais Terapêuticos

SUS – Sistema Único de Saúde

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 12

2 O CONTEXTO DA LOUCURA E O PROCESSO DE

INSTITUCIONALIZAÇÃO

18

2.1 As várias faces da loucura ao longo da História: da Idade Média ao século XIX 18

2.2 A loucura a partir do século XX: Os processos de institucionalização e

desinstitucionalização do louco

25

3 A REFORMA PSIQUIÁTRICA COMO MARCO NO PROCESSO DE

DESINSTITUCIONALIZAÇÃO

30

3.1 Os CAPS no processo de desinstitucionalização 35

3.2 A inserção dos saberes na Saúde Mental e a interdisciplinaridade 39

4 UMA ANÁLISE SOBRE OS DESAFIOS E AS MOTIVAÇÕES NA

ATUAÇÃO DAS ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL – CAPS III SER II

45

4.1 Sobre o Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III da SER II 45

4.2 Perfil básico das assistentes sociais do CAPS III da SER II 47

4.3 A análise da prática profissional no CAPS III SER II – a partir dos dados

coletados em campo

50

CONSIDERAÇÕES FINAIS 73

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 78

APÊNDICES 82

ANEXOS 88

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1. INTRODUÇÃO1

O trabalho aqui apresentado é fruto, primordialmente, de decisão. Partindo dessa

afirmação, descrevo com emoção, alegria e muitos sonhos que a decisão e ponto de partida

para o desenvolvimento deste trabalho surgiu no ano de 2010, quando decidi fazer um curso

de graduação e, por motivações pessoais, ingressei no curso de Serviço Social da Faculdade

Cearense.

Ao longo de minha trajetória acadêmica fui vivenciando experiências de

aproximação e distanciamento com as várias áreas que envolvem a atuação do Serviço Social

e, por experiências da vida pessoal, a priori, o meu interesse estava direcionado à área sócio

jurídica, mais especificamente a área da adoção.

É bem verdade que nada como a experiência de campo para lhe fazer mudar de

ideia, para lhe assustar ou lhe apaixonar, ou lhe assustar e em seguida lhe apaixonar. Vivi a

segunda experiência a partir de 2012, no quinto semestre da vida acadêmica, quando ingressei

no campo de estágio para cumprir a disciplina de estágio curricular obrigatório do curso: o

Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III SER II. A escolha do campo não foi pessoal, mas

foi a oportunidade que surgiu naquele momento, em meio a tantas limitações e concorrências

pelas vagas de estágio.

Foi o primeiro ano que os CAPS abriram vagas para estágio do Serviço Social.

Seis vagas foram destinadas a minha turma e o critério de ocupação foram as melhores médias

anuais seguidas da escolha pelas instituições. Fiquei na sexta colocação e escolhi o referido

CAPS pela aproximação com o hospital o qual exerço um trabalho formal, de nível médio.

Providenciei as documentações necessárias e iniciei minhas atividades de estágio

em março de 2012. Sabia pouco sobre a saúde mental, desconhecia os equipamentos

substitutivos e suas finalidades, não tinha a noção da realidade dos hospitais psiquiátricos,

conhecia a Reforma Psiquiátrica somente pelos textos estudados em sala, enfim, “caí de

paraquedas” naquela instituição, ou seja, na saúde mental.

Fui bem recebida e orientada por minha primeira supervisora de campo, a

assistente social Liduina Alves, busquei leituras, aproximei-me dos profissionais, observei a

dinâmica do serviço envolvendo profissionais e usuários e, nessa vivência, experimentei

inicialmente a fase do “assustar”.

1 Como forma de aproximar os leitores da pesquisadora, o relato inicial da introdução está na primeira pessoa do

singular.

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Logo no primeiro semestre do estágio curricular, em todas as minhas produções,

diários de campos, trabalhos exigidos na academia e em minhas falas, fiz questão de deixar

claro que não me identifiquei com a saúde mental por perceber uma realidade complexa no

trato com os usuários e por uma série de dificuldades encontradas naquele contexto. Lembro

que me comovia ao ver o comprometimento e a instabilidade mental dos usuários e me

inquietava ao perceber as limitações quanto ao retorno positivo deles, que estavam sujeitos a

surto e a uma variedade de comportamentos estranhos e inusitados a qualquer momento. Nas

primeiras intervenções senti vontade de chorar, por comoção e imaturidade diante da

realidade que os usuários apresentavam.

As visitas domiciliares e aos hospitais psiquiátricos me assustaram bastante nessa

fase, talvez pela inexperiência, por passar a conhecer uma realidade antes desconhecida por

mim, o medo em lidar com a situação, o lado emocional que não estava preparado para aquela

realidade, mas as experiências, as idas e vindas, as conversas com os profissionais e com as

colegas estagiárias de outros CAPS e instituições me fizeram perceber as limitações dos

campos de estágio em geral e adquirir maturidade para atuar nas mais diversas áreas

demandadas ao Serviço Social. Nessa fase, as experiências me fizeram crescer e evoluir para

a fase do “apaixonar”.

Cheguei ao segundo semestre do estágio curricular com mais maturidade, pois a

realidade já era conhecida e saí da fase de observação da prática para a intervenção

supervisionada, nesse período com outra supervisora de campo, a assistente social Juliana

Lima. As atividades já eram percebidas de outra forma, o olhar lançado à intervenção das

profissionais já era carregado de maturidade e criticidade, as visitas domiciliares e

hospitalares já eram desejadas por mim, mas com o objetivo de aprender sobre a intervenção

das assistentes sociais naquela atividade demandada, não nego que lidar com o paciente com

transtorno mental é sempre uma incógnita, pois eles agem em um inesperado.

Nessa fase vivenciei de perto as dificuldades, limitações, inquietações e desafios

postos para a equipe do Serviço Social naquele equipamento da saúde mental. Inseridas num

contexto de precarização do trabalho, de limitações de recursos humanos e materiais, das

condições físicas do ambiente de trabalho e das exigências postas pela hierarquia, as

profissionais buscavam efetivar suas práticas comprometidas com o Projeto Ético Político da

profissão, até que chegaram as eleições para a gestão municipal de Fortaleza e,

consequentemente, a mudança da gestão.

Cheguei ao terceiro semestre do estágio curricular supervisionado agora com a

nova gestão. Mudanças e mais mudanças. Percebam que passei pela terceira supervisora de

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campo em um período de três semestres, isso devido à instabilidade das condições de trabalho

postas a todos os profissionais daquele CAPS, dessa vez, com a assistente social Concebida

Nunes. As demissões aconteceram, a nova gestão contratou profissionais aprovados na

seleção da prefeitura e, nessa dinâmica, entraram sete assistentes sociais no serviço, que antes

compunha um quadro de três ou quatro profissionais da área.

Foi diante desse contexto e das breves experiências apresentadas, dentre tantas

vividas, que me senti instigada a compreender sobre a atuação das assistentes sociais desse

CAPS. Nesse período, apesar de ter elaborado e executado um projeto de intervenção sobre

ouvidoria e ter muitos subsídios de análises e estudos nessa área, decidi para o meu Trabalho

de Conclusão de Curso me apropriar da bagagem de conhecimentos adquiridos no período do

estágio supervisionado e defini como objeto de estudo as profissionais do Serviço Social, na

perspectiva de contemplar nosso objetivo geral, que é analisar como se estabelece a atuação

das assistentes sociais no Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III SER II.

Desse modo, as motivações para realizar esta pesquisa partem de um processo de

construção adquirido em minha trajetória acadêmica, ou seja, das experiências no período do

estágio supervisionado, que ocorreram de março de 2012 a junho de 2013. Nesse período, foi

possível perceber as limitações e desafios enfrentados pelas profissionais da instituição, fato

que nos instigou a realizar este estudo com o grupo de profissionais do Serviço Social.

A pesquisa contempla como objetivos específicos: contextualizar a loucura

destacando os processos de institucionalização; compreender a inserção dos/as assistentes

sociais nos serviços substitutivos de Saúde Mental, destacando o processo de

desinstitucionalização; refletir sobre os desafios e possibilidades da atuação das assistentes

sociais no CAPS.

Quanto à metodologia podemos destacar que a presente pesquisa foi desenvolvida

com a abordagem de caráter qualitativa, tendo em vista o estudo realizado com seres

humanos. Esse tipo de abordagem, Segundo Godoy (1995, p.53), “[...] ocupa um reconhecido

lugar entre as várias possibilidades de se estudar os fenômenos que envolvem os seres

humanos e suas intricadas relações sociais, estabelecidas em diversos ambientes.” Para

Goldenberg (2009, p. 53), “os dados qualitativos consistem em descrições detalhadas de

situações com o objetivo de compreender os indivíduos em seus próprios termos.” Portanto, a

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referida abordagem foi de grande importância para compreender o objeto estudado, pois

permitiu uma percepção ampliada da realidade analisada.2

Realizamos a pesquisa bibliográfica entre agosto e outubro de 2013, com o

objetivo de fundamentar as análises a partir das obras de autores que estudaram os aspectos

que norteiam a referida temática. Segundo Gil (2002, p.44), “[...] a pesquisa bibliográfica é

desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e

artigos científicos.” Assim, a partir da pesquisa bibliográfica fundamentamos a compreensão

das categorias saúde mental, prática profissional e interdisciplinaridade, que foram analisadas

no desenvolvimento da pesquisa.

A pesquisa de campo foi realizada nos meses de outubro e novembro de 2013,

proporcionando o contato direto com o campo e permitindo aprofundar questões, comprovar a

veracidade dos fatos analisados e a partir da observação e percepção, viabilizou as análises e

conclusões. Segundo Gil (2002, p.53), “[...] no estudo de campo, o pesquisador realiza a

maior parte do trabalho pessoalmente, pois é enfatizada a importância de o pesquisador ter

tido ele mesmo uma experiência direta com a situação de estudo.”

Realizamos a pesquisa com o grupo de assistentes sociais do CAPS III SER II,

que é composto, atualmente, por sete profissionais que atuam em equipe multidisciplinar. A

técnica utilizada foi de entrevistas semiestruturadas gravadas, com o consentimento das

entrevistadas, com o objetivo de coletar dados através de roteiro previamente elaborado, o

qual foi dividido em dois tópicos que contemplaram perguntas sobre o perfil básico do

profissional e sobre a prática profissional no referido CAPS. Sobre essa técnica, Bertucci

(2012, p.63), esclarece “[...] é desenvolvido um roteiro de entrevista básico. Entretanto o

pesquisador tem flexibilidade para introduzir, alterar ou eliminar questões, de acordo com as

necessidades da pesquisa.” Portanto, é uma estratégia para o aprofundamento das

investigações.

Nesse sentido, esclarecemos para as entrevistadas que a pesquisa foi aprovada

pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário, em outubro de 2013, como forma

de cumprir as formalidades exigidas no processo, resguardando o sigilo e cumprindo os

protocolos da pesquisa realizada com seres humanos, em conformidade com a Resolução

196/96 (CNS).

Ainda nesse contexto, é importante esclarecer que para resguardar o sigilo da

pesquisa identificamos as entrevistadas por nomes fictícios, a fim de preservar suas

2 A partir desse parágrafo, o discurso está na 1ª pessoa do plural, pois apresento os aspectos elaborados em

conjunto com a orientadora da pesquisa.

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identidades. Desse modo, apresentamos o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE),

assinado por ambas as partes como ciência dos objetivos da pesquisa e da liberdade que

possuem no processo.

Quanto às categorias analisadas no decorrer deste estudo, saúde mental, prática

profissional e interdisciplinaridade, apropriamo-nos de um rico referencial teórico para

fundamentar o percurso. Destacamos: Bisneto (2011); Foucault (1972); Oliveira (2005);

Marcolino (2005); Iamamoto (2007; 2008); Raichelis (2008), dentre tantos outros autores e

artigos que enriqueceram esta pesquisa.

Referente à categoria Saúde Mental, Dr. Lorusso esclarece:

Saúde Mental é o equilíbrio emocional entre o patrimônio interno e as exigências ou

vivências externas. É a capacidade de administrar a própria vida e as suas emoções

dentro de um amplo espectro de variações sem contudo perder o valor do real e do

precioso. É ser capaz de ser sujeito de suas próprias ações sem perder a noção de

tempo e espaço. É buscar viver a vida na sua plenitude máxima, respeitando o legal

e o outro3. (LORUSSO, 2013, p.1).

Nesse sentido, é possível compreender que a saúde mental faz parte do complexo

psicológico do ser humano, que envolve o poder da mente associado aos fatores do mundo

externo, envolvendo os sujeitos e a capacidade dos indivíduos de administrar a vida sem

perder a razão e o sentido de viver. Portanto, enfatizamos que - diante do quadro de transtorno

mental que compromete os indivíduos e os tornam usuários dos CAPS - há um grande desafio

dos profissionais da área que atuam nesse contexto, na perspectiva de saber lidar com a

ausência ou comprometimento da saúde mental.

Quanto à categoria prática profissional do Serviço Social, Iamamoto (2004, p.

114) expressa que “[...] tem um caráter essencialmente político, travestido, porém de uma

aparência de atividades dispersas, descontínuas de caráter filantrópico, marcadas pelo

fornecimento de benefícios sociais.”

Portanto, é nesse sentido que surge a compreensão da prática que oscila entre o

fatalismo e o messianismo. O primeiro está relacionado à prática do comodismo atrelado a

uma visão de incapacidade e impossibilidade de superação frente aos desafios do cotidiano. O

segundo diz respeito à prática de caráter voluntarista, subjetivista e ingênua na perspectiva de

privilegiar os propósitos individuais do profissional. (IAMAMOTO, 2004).

No que se refere à interdisciplinaridade, Ribeiro e Farias (2010) compreendem

que a busca pela interdisciplinaridade é a construção plural de alternativas no âmbito das

3 Disponível em: <http://www.saude.pr.gov.br>. Acesso em: 10 out.2013.

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Ciências, portanto, não compreendem a busca de um saber genérico, diversificado. Entretanto,

é uma forma de organização da equipe de modo estrutural, havendo reciprocidade, troca de

saberes e enriquecimento mútuo, bem como tendência à horizontalização das relações de

poder.

Nesse contexto, enfatizamos que cada capítulo foi elaborado na perspectiva de

elucidar os objetivos específicos, de modo que, após essa Introdução, no segundo capítulo

apresentamos o contexto histórico da loucura ao longo dos tempos, até o século XIX. A

proposta desse capítulo é contextualizar a loucura, apresentando as diferentes formas de

percebê-la no decorrer dos períodos históricos da humanidade, perpassando os

acontecimentos que impulsionaram as transformações em relação à forma de compreendê-la e

tratá-la enfatizando o processo de institucionalização da loucura.

No terceiro capítulo, apresentamos o contexto da Reforma Psiquiátrica como

marco no processo de desinstitucionalização, destacando os CAPS como novos equipamentos

substitutivos e destacando também a inserção dos saberes na Saúde Mental, com ênfase na

inserção do/a assistente social nesse campo de atuação.

O quarto capítulo é apontado como o de maior importância, pois é a partir dele

que contemplamos o objetivo geral da pesquisa, tendo em vista que apresentamos as falas das

entrevistadas e realizamos as análises fundamentadas pelos autores que compreendem as

questões abordadas. Inicialmente, apresentamos um breve histórico do CAPS e,

posteriormente, a análise da prática profissional a partir dos dados coletados em campo. Nesse

contexto, apresentamos também os resultados e as discussões alcançados com a pesquisa.

Em suma, a presente pesquisa foi de grande importância para compreender sobre a

prática profissional do Serviço Social no CAPS III SER II, uma área do saber que em

contexto geral se inquieta com a indagação do que realmente faz o/a assistente social, tendo

em vista ser um profissional que exerce grande importância dentro das instituições, pois são

capacitados para atenderem as demandas do campo social, intervindo e apresentando

respostas por vezes imediatas, profissionais que, através do olhar analítico, crítico e reflexivo,

próprio do Serviço Social, percebem o contexto para além da realidade apresentada.

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2. O CONTEXTO DA LOUCURA E O PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO

2.1 As várias faces da loucura ao longo da história: da Idade Média ao século XIX

A proposta deste capítulo é contextualizar a loucura, apresentando as diferentes

formas de percebê-la no decorrer dos períodos históricos da humanidade, perpassando pelos

acontecimentos que impulsionaram as transformações em relação à forma de compreendê-la e

tratá-la.

Ao considerarmos a natureza histórica e transitória da loucura é possível observar

que as sociedades elaboram práticas e representações diversificadas. Marcolino (2005) afirma

que o louco já foi considerado um ser iluminado, dotado de poderes, já foi visto como um ser

possuído pelo demônio, outrora como preguiçoso, desqualificado e improdutivo.

Complementando essa análise, Silva (2013) citando Bisneto (2011), destaca que a loucura ora

foi apreciada, ora combatida, dependendo de como se manifestava em determinado contexto

ou da sociedade a qual estava inserida.

Historicamente, em cada época as sociedades apresentam suas concepções sobre a

loucura, que vão desde as concepções filosóficas e mitológicas, perpassando pela concepção

religiosa da loucura como possessão demoníaca, algo sobrenatural, até a concepção científica

da patologia, ou seja, a loucura como doença mental. Contudo, como afirma Marcolino (2005,

p.45), “Os séculos passados são preciosos referenciais para entendermos o presente.” Diante

disso, a trajetória que vamos percorrer ao longo desse capítulo contribuirá para o

entendimento a respeito da concepção da loucura ao longo dos séculos.

De acordo com Pereira (1994), a gênese da loucura pode ser esquematizada em

três grandes momentos. A princípio, vivenciou um período de liberdade e de verdade, que

inclui os últimos séculos medievais - do século XV ao século XVI -; em um segundo

momento, o período da “grande internação”, que contempla os séculos XVII e XVIII; e, por

fim, a época contemporânea, após a Revolução Francesa, quando a Psiquiatria assume o

compromisso de tratar a loucura que superlota os asilos.

Na Antiguidade e na Idade Média, até antes do Renascimento, os loucos eram

acolhidos e as manifestações da loucura eram percebidas como uma forma de manifestação

divina. Os tratamentos médicos eram fenômenos localizados, restritos e opostos às práticas

populares e mágico-religiosas. Nesse contexto, os cuidados direcionados aos pobres tinham o

caráter caritativo. Cabia a eles vagar pelas ruas e mercados, sobrevivendo da caridade ou de

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pequenos trabalhos, enquanto aos ricos restava a clausura domiciliar sob os cuidados de um

profissional contratado para este fim. (MARTINS; SOARES; OLIVEIRA; SOUZA, 2011).

De acordo com Filho (1994), na Idade Média (século XI ao XIII), predominava a

concepção religiosa, onde a loucura era associada à possessão diabólica, explicada como o

mal desenvolvido no homem pelos demônios. O louco era visto como o ser errante que

vagava pelas cidades e mantinha-se esquecido pela sociedade. Não tinha vez, nem voz. Sua

voz foi anulada, abafada, desvalorizada e a ela não era atribuída importância.

A esse respeito o autor ainda destaca que:

A eles eram interditados o testemunho na justiça, a responsabilidade de um ato ou de

um contrato, e até mesmo a comunhão na santa missa. Nele se identificavam

poderes estranhos, como o de revelar uma verdade escondida, poderes

premonitórios, ou, em sua ingenuidade, perceber coisas que a sabedoria dos outros

não conseguia perceber. (FILHO apud TUNDIS; COSTA, 1994, p.78).

Nesse sentido, percebemos que nesse período histórico os loucos eram excluídos

do meio social, de modo a serem tratados como seres diabólicos, isso devido a concepção

sobre a loucura que se tinha na época. O louco era vista como um ser assustador, monstruoso,

sobrenatural, que vagava pelas ruas e não fazia parte do convívio social, ou seja, eram sujeitos

desprovidos de direitos.

Segundo Heidrich (2007, p.25), “Até a Idade Média, a loucura é entendida como

uma experiência trágica. Não era atribuída a ela uma questão moral, de conduta, de certo ou

errado. [...] a loucura recebia uma explicação mística.” Porém, no final desse período

histórico, a loucura se insere em um universo moral e passa a ser percebida como um vício do

homem. (HEIDRICH, 2007).

Entretanto, de acordo com Costa e Tundis (1994, p.20-21), durante toda a

Antiguidade e a Idade Média o louco desfrutou de certa liberdade, de modo que a loucura era

vivenciada em estado livre, circulava e fazia parte do cenário e linguagens comuns. A doença

mental era uma questão de âmbito privado, determinada pelos costumes e o poder público só

intervinha em assuntos de direito. “Os tratamentos médicos na Grécia e Roma antigas

permaneceram como fenômenos localizados, restritos a uns poucos abastados, contrariamente

as práticas populares e mágico-religiosas amplamente difundidas.”

Os autores ainda esclarecem que a relativa liberdade desfrutada pelos loucos nas

sociedades pré-capitalistas é atribuída ao baixo índice de pessoas com problemas mentais,

quando estas “eram reduzidas e a curta duração média da vida não permitia que determinados

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transtornos, hoje sabidamente mais incidentes na idade madura e na velhice, aparecesse em

proporção significativa” (COSTA; TUNDIS, 1994, p. 21-22).

No campo artístico a loucura era exaltada. Sobre a loucura nas artes, Filho

esclarece que:

Ela discorria pela “Nave dos Loucos” e “Jardins das Delícias”, de Bosch; pelos

personagens de Hamlet e Macbeth; pelo Elogio da loucura, onde Erasmo assinalava

que o homem é tanto mais feliz quanto mais numerosas são suas modalidades de

loucura, e que ela está inscrita no coração do ser humano. (FILHO, 1994, p.78-79).

Nesse sentido, o autor demonstra que no campo das artes a loucura era ilustrada

em obras literárias de modo a ser enaltecida na tentativa de desmistificá-la como algo distante

dos seres humanos. Assim, relaciona a loucura ao estado de felicidade que todo ser humano

possui em seu coração e, desta forma, aproxima-a da condição necessária do ser humano.

Portanto, nesse contexto, do período medieval até o Renascimento, o

confinamento dos loucos era uma exceção e os lugares de confinamento existentes tinham a

finalidade de retirar do convívio social as pessoas que não se adequavam a realidade social,

tendo em vista que a loucura não era compreendida como um fenômeno que exigia um saber

específico, científico e não era caracterizada como doença.

Essa forma de conceber a loucura ocorre até o Renascimento, mais precisamente,

até a fase do Mercantilismo, período marcado por avanços na economia e que em sua essência

via a população como o bem maior de que dispunha uma nação. Com esse entendimento, a

sociedade daquela época comportava-se de modo que todos aqueles que não podiam

contribuir no intenso movimento da produção, comércio e consumo, passavam a ser excluídos

da sociedade, ou seja, encarcerados. (FILHO, 1994).

De acordo com Marcolino (2005), na lógica mercantilista europeia, a ociosidade

era fato presente na sociedade de modo que era considerado o maior vício da época. Essa

forma de pensar tinha como consequência à edificação de instituições para o recolhimento de

idosos, crianças abandonadas, portadores de deficiência física, mendigos, pessoas acometidas

por doenças venéreas e os loucos, os quais eram obrigados a realizar trabalhos, como forma

de punição.

Na Renascença, a loucura se apresenta em toda parte, envolvida em todas as

experiências com suas imagens ou seus perigos. No período Clássico, ela se apresenta por trás

das grades e se há manifestação é à distância, vista pelo ângulo do isolamento, tendo em vista

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não haver identificação com a forma de ser concebida no Renascimento. (FOUCAULT,

1972).

No período histórico posterior ao século XVII a loucura se configurava em um

contexto de discriminação e de perda do poder simbólico, que usufruía no Renascimento.

Nesse contexto a loucura passou a ser progressivamente isolada do espaço social, expulsa

para os antigos lugares que abrigavam inicialmente os leprosos e, posteriormente, os

portadores de doenças venéreas. A inserção dos loucos nos lugares de confinamento

representava a desagregação do corpo indicando com intensidade a experiência da morte.

Assim,

Durante séculos o doente mental teve seus direitos aviltados em atitudes e

legislações que não o conferiam sequer o direito de ser visto como ser humano. Aos

que eram acometidos por qualquer transtorno mental oferecia-se um modelo de

assistência hospitalocêntrico e asilar, cujo principal objetivo era o confinamento e,

por conseguinte, total isolamento do meio familiar e social. (RIBEIRO; FARIAS,

2010, p.131-132).

Nesse sentido, compreendemos como a sociedade da época tratava o louco. A

discriminação e a exclusão já faziam parte do cotidiano da pessoa com transtorno mental, a

garantia dos direitos era uma realidade muito distante desse público. Na verdade, eram

privados até mesmo do direito de serem vistos e tratados como seres humanos e é nesse

contexto que é oferecido a assistência manicomial, portanto, o isolamento, o confinamento, a

clausura.

Segundo Silveira (2008), Foucault considera que foi no classicismo que surgiu

uma nova percepção da loucura enquanto risco para a sociedade. A partir daí a loucura

começa a se configurar como fator de desorganização da família, desordem social, perigo para

o Estado. (FOUCAULT, 1997, p. 80).

A Idade Moderna foi um período marcado por transformações sociopolíticas e

econômicas que mudaram o curso da História. Depois do século XVII, o Iluminismo e o

Renascimento influenciam no surgimento das Ciências e desenvolvimento da Medicina, tendo

iniciado o campo da formação médica e psicológica que, ao longo da História, classifica a

loucura como doença mental.

O século XVIII é marcado por uma série de mudanças, que são concretizadas

através das Revoluções Francesas e Industriais, revolucionando, além da Europa, o mundo

inteiro. Nesse período, com a Revolução Industrial, emergiram alterações nos processos

tecnológicos, que aumentaram a produtividade e contribuíram para a implementação de um

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novo ritmo à produção. Com o advento do modo capitalista de produção a sociedade

vivenciou uma série de transformações no âmbito social, econômico e político, sobretudo no

modo de produzir.

Com a Revolução Francesa foram abertas possibilidades para uma nova forma de

organização da sociedade, a qual o povo ganhou mais autonomia passando a ter seus direitos

respeitados. Levantando a bandeira da liberdade, igualdade e fraternidade os revolucionários

representavam seus anseios naquele momento. Desta forma, os homens passaram a ter o poder

de agir e transformar a realidade, enquanto a Ciência passa a explicá-la.

Retratando a Psiquiatria nesse contexto, tinha-se o hospital de Bicetrê, em Paris,

que era uma instituição de assistência filantrópica e assistencial, local destinado ao

internamento dos sujeitos indesejáveis à sociedade, lugar de exclusão social da pobreza e da

miséria que constituía parte da sociedade. Diante dessa realidade, Filho enfatiza que:

São reclusos os órfãos, os epiléticos, os miseráveis, os libertinos, os velhos e as

crianças abandonadas, os venéreos, os aleijados, os religiosos infratores e os loucos.

Pra esse fim são criadas ou reformadas instituições como Bicêtre e La Salpêtrière,

ou Chrenton e Saint- Lazare, todas para abrigarem os incapazes. No entanto, em tais

estabelecimentos, não se tinha como objetivo a reintegração desses indivíduos à

sociedade ou qualquer outra finalidade terapêutico-pedagógica. (FILHO, 1994,

p.79).

Dessa forma, todos aqueles que ofereciam alguma ameaça para a sociedade eram

excluídos dela. Nesse sentido, foram criadas as instituições hospitalares com o objetivo de

retirar da sociedade os “indesejáveis”, pois não havia a intenção de tratá-los ou de oferecê-los

melhores condições de vida, mas de retirá-los do convívio social.

Nesse contexto de transformações que emergiram com as revoluções as mudanças

foram provocadas em todas as esferas da vida humana e têm influenciado na dinâmica social

até os dias de hoje. Na Medicina os avanços tecnológicos contribuíram com várias

descobertas; na Psiquiatria, o médico Philippe Pinel se interessa por estudar e tratar os

diversos desvios ou alienação mental e passa a direcionar um novo olhar para a realidade dos

sujeitos acometidos com tais problemas.

De acordo com Marcolino (2005), no final do século XVIII, Philippe Pinel é

nomeado para a direção do hospital francês Bicêtre e, a partir de então, difunde uma nova

concepção de loucura, a qual fundamenta a alienação mental enquanto distúrbio das funções

intelectuais do sistema nervoso. Este define o cérebro como sede da mente, onde se manifesta

a loucura. Com a proposta de Pinel, a loucura passa a ter status de doença mental, o que

requer conhecimentos médicos e técnicas específicas. O autor ainda esclarece que:

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O final do século XVIII foi marcado por essa atitude encorajadora de Pinel e seus

seguidores. E foi a partir daí que a psicologia médica teve expressão em toda a

Europa. A loucura passa a ser enxergada na ótica científica. Tem–se ainda uma nova

constituição de instituição asilar para o tratamento de doentes mentais, concepção

esta que sofrerá também muitas críticas a posteriori, tanto pelos críticos da

sociologia, quanto da própria área da psicologia médica. (MARCOLINO, 2005,

p.47).

Portanto, é nesse contexto que a loucura começa a ser percebida por outro ângulo,

ou seja, passa a ser compreendida como alienação mental, gerando consideráveis

transformações na forma de pensar e lidar com ela, embora as estratégias para tratar a loucura

nesse período sofram críticas, instigando sempre novas formas de pensar.

Nos primórdios do século XIX, Philippe Pinel e Hegel estavam envolvidos num

movimento que compreendia a loucura agregada pela razão. O médico francês, através de

suas experiências clínicas, influenciou as concepções filosóficas de Hegel, pois estavam

motivados sob uma mesma perspectiva. O filósofo compreendia a loucura como contradição

na razão, que ainda existe e se dá entre a consciência do sujeito e a organização do

pensamento, e não como perda da razão, enquanto Pinel a compreendia como um simples

desarranjo no interior da razão. Portanto, Pinel e Hegel concebiam a loucura sob uma mesma

perspectiva, ou seja, como fenômeno real existente dentro de uma razão. (OUYAMA, 2005).

O autor ainda esclarece sobre o pensamento de Hegel que:

A loucura sobrevém exatamente quando esta hierarquia é invertida, quando a

consciência perde o controle de colocar as coisas no seu posto racional, quando o

sujeito não consegue ordenar sua consciência numa “totalidade ordenada”. A

loucura ocorre no momento da sublevação de alguma “determinação particular”.

Quando um elemento, que faz parte da “totalidade ordenada” ganha autonomia e

torna-se um elemento heterogêneo, estranho, ao sistema. (OUYAMA, 2005, p. 1).

No entendimento de Hegel, o louco não é um ser monstruoso ou mitológico, mas

um sujeito real em conflito consigo mesmo, um ser humano e racional em confronto com sua

própria desordem. Assim, concebe o louco como um sujeito dotado de razão, mas em conflito

com essa razão. Nesse sentido, para Hegel, o fato de estar louco não tira do sujeito à condição

de ser humano, ser digno de direitos e deveres.

Neste sentido, os hospitais psiquiátricos da época eram espaços rigorosamente

médicos reservados para os alienados. Com Pinel, os alienados são desacorrentados e sua

alienação inscrita na posologia médica. O médico francês acreditava que o isolamento das

interferências externas seria necessário para se conhecer um objeto, tendo em vista que uma

vez isolado o objeto poderia ser melhor observado. Desse modo, separou e agrupou os

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diferentes tipos de alienações e delírios, fazendo comparações entre si, a partir da rigorosa e

constante observação dos enfermos. (HEIDRICH, 2007).

Neste contexto, Pinel desenvolve um conjunto de estratégias voltadas para a

reeducação da mente alienada, conhecido como tratamento moral, que funcionaria como um

policiamento interior. A tecnologia de Pinel “inaugurava um novo estatuto para a loucura: o

de doença mental e consequentemente, para o louco: o de doente mental, necessitando,

portanto de cuidado e tratamento, só disponível na estrutura asilar do tratamento moral.”

(HEIDRICH, 2007, p. 35-36).

De acordo com Pereira (1994), as técnicas utilizadas por Pinel construiu em torno

dos loucos um círculo de julgamentos morais, tendo em vista que no asilo o comportamento

do louco era constantemente vigiado, buscando diminuir suas pretensões, negar seus delírios,

erros e ilusões, enfim, ridicularizar seu modo de ser. O autor ainda esclarece que:

Qualquer desvio em relação a uma conduta normal devia ser observado e seguido de

punição imediata. E tudo isso sob a direção de um médico cuja tarefa era de um

rigoroso controle ético. Em suma, a grande tarefa do asilo era [...] homogeneizar

todas as diferenças, isto é reprimir os vícios, extinguir as irregularidades, denunciar

tudo aquilo que se opõe às virtudes da sociedade. (PEREIRA, 1994, p.86).

Nesse contexto, é possível compreender a forma de tratamento direcionado a

pessoa com transtorno mental. A sociedade era composta por padrões de conduta e toda

conduta que não fosse considerada normal, ou que ameaçasse a ordem, deveria ser punida. Ou

seja, o louco sofria severas punições devido a sua alienação mental e aos seus atos

inconscientes.

Nesse sentido, o asilo não constitui um espaço neutro de observação, diagnóstico

e terapêutico, apesar de se apresentar desta forma ao ser visto do exterior, em sua aparência

imediata, mas em seu interior constitui um espaço social onde o doente sofre um processo de

acusação, julgamento e condenação, produzindo no louco o sentimento de remorso da sua

própria culpa. (PEREIRA, 1994).

Vale ressaltar que, a contribuição de Pinel na história da psiquiatria está no âmbito

da descoberta da instituição asilar e o reconhecimento do louco como alienado, um ser doente

da razão, trazendo a problemática da loucura para a Medicina. A partir daí surgem os

hospitais psiquiátricos como instituição de estudo e tratamento da alienação mental.

(OUYAMA, 2005).

Sobre esse processo de mudanças na forma de conceber e tratar a loucura,

Resende (1994) aponta uma problemática: “[...] se as amarras que atavam fisicamente os

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doentes mentais foram efetivamente rompidas, outras surgiram, tanto mais perigosas porque

sutis, consentidas e sofisticadas.” Contudo, se refere as novas formas de tratar a loucura

através das instituições asilares que se utilizavam do tratamento moral e se configuravam em

espaços de julgamento, policiamento e punição do doente mental.

Nesse sentido, estava configurado na sociedade o modelo de assistência

psiquiátrica institucionalizada através do modelo asilar, que enclausurava o louco e o retirava

do convívio social e familiar, mantendo-o em regime de internação perpétua, de modo que os

institucionalizados não tinham direito de escolha, nem havia outra forma de tratamento ou de

resposta a doença mental. (SILVA, 2012).

Observamos que as formas de compreender a loucura nos diferentes tempos

históricos não foram uniformes e passaram por processos de vivências de experiências sociais

que vão gradativamente reconfigurando-a e fundamentando a construção do conhecimento

científico no trato da loucura, bem como influenciando os espaços e as práticas direcionadas a

ela.

2.2 A loucura a partir do século XX: os processos de institucionalização e

desinstitucionalização do louco

O século XX é marcado por acontecimentos históricos, que impulsionaram

mudanças no contexto histórico das sociedades e, dentre eles, a Primeira e Segunda Guerra

Mundial (1914 e 1939, respectivamente) representaram marcos que ocasionaram grandes

mudanças, de ordem econômica, social e geopolítica no Brasil e no mundo.

Neste contexto, em meados do século XX, no âmbito da saúde mental, ainda se

configurava o modelo de institucionalização do louco representada pela instituição asilar,

lugar em que a loucura era dominada e condenada ao silêncio. “O louco e a loucura ficaram

ilhados no manicômio até o século XX, mais especificamente até o pós Segunda Guerra

Mundial, quando a questão da loucura passará a se constituir como expressão da questão

social” (HEIDRICH, 2007, p. 52).

E sobre a realidade vivenciada no contexto da institucionalização e suas

consequências, o artigo de Maxwell4 relata que:

4 Disponível em: <www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br>. PUC- Rio Certificação digital nº 0811995/CA.

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A institucionalização trouxe inúmeras consequências para o portador de transtorno

mental como, por exemplo, a fragmentação e/ou extinção do convívio familiar;

perda da identidade, liberdade; negação da subjetividade e de todos os direitos;

incapacidade de exercer a cidadania. (MAXWELL, 1995, p.20).

Neste contexto, é possível perceber que a loucura não era tratada nesses espaços,

mas agravada. Porém, ao se conhecer a realidade no interior desses espaços, as formas

desumanas aplicadas como tratamento e referir à forma de tratamento é um tanto quanto

contraditório. Contudo, essas práticas eram utilizadas para conter a loucura e expressas como

tratamento para mascarar a realidade vivenciada pelos doentes mentais, indivíduos

forçadamente submetidos nessa realidade e sem direitos, sequer, de ser ouvidos. De acordo

Silva,

A necessidade de criação de hospitais psiquiátricos no século XVIII evoca a não

reflexão de graves problemas do ser humano e da sociedade, esta última que como

resposta aos inúmeros “incivilizáveis”, cria instituições de violência que tinham

como procedimentos usuais a inflição de sofrimentos físicos e morais àqueles que

não se ajustavam ao modelo de modo de produção e sociedade impostas, os mais

alterados sofriam torturas e eram imobilizados com lençóis úmidos e choques.

(SILVA, 2012, p.57)

Portanto, era essa a realidade encontrada no interior das instituições manicomiais.

A forma de tratar a loucura tornava o quadro da pessoa com transtorno mental ainda mais

agravado, tendo em vista o sofrimento e a repressão sofrida pelos pacientes internos.

No Brasil, ainda de acordo com Silva (2012), a atenção ao doente mental iniciou

com a chegada da família real, em 1808. O País vivia um contexto de mudanças sociais e

econômicas em prol do crescimento das cidades e das populações, de modo que fazia

necessário o uso de medidas de controle, criando espaços para acolher os que ameaçavam a

paz e a ordem social. Em 1852, em decorrência de protestos médicos contra a forma das

Santas Casas administrarem os cuidados com os loucos, é criado o primeiro hospício

brasileiro no Rio de Janeiro, Hospício Dom Pedro II, em conformidade com os propósitos da

escola alienista francesa. Segundo Marcolino

De acordo com o Ministério, a criação do hospício está diretamente relacionada ao

crescimento e reordenamento das cidades (urbanização) e à necessidade de

recolhimento dos habitantes desviantes que perambulam pelas ruas: os

desempregados, imigrantes principalmente, que não aceitam as condições de

trabalho existentes, os mendigos, os órfãos, marginais de todo tipo e os loucos – os

quais são recolhidos aos Asilos de Mendicância de órfãos, administrados pela Santa

Casa de Misericórdia. (MARCOLINO, 2005).

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Nesse sentido, a institucionalização do louco nos asilos configurava o modelo de

assistência psiquiátrica ofertada na época, no Brasil e no mundo, como a principal forma de

tratamento, marcada pelos processos de internações que retirava o louco do convívio social.

Era uma assistência violenta que enclausurava o paciente, privando-o e isolando-o do contato

familiar e social, de modo que não favorecia no tratamento nem na evolução do seu quadro de

saúde mental. Ao contrário: gerava o agravo, pois era uma suposta forma de “tratar” através

de maus tratos que, por vezes, levava o paciente a óbito.

Nesse contexto, surgem inúmeras inquietações por parte de vários segmentos

sociais em relação ao modelo de assistência psiquiátrica vigente, tendo em vista o tratamento

por meios violentos que não promovia a recuperação e cidadania dos doentes, mas tornava-os

pessoas sem vez e sem voz.

Desse modo, com a crise do modelo de assistência centrado nos hospitais

psiquiátricos e com a luta dos movimentos sociais, surge o movimento da Reforma

Psiquiátrica. Esse movimento direcionou um novo olhar sobre o modelo da Saúde Mental na

perspectiva de romper com a tradição manicomial e passou a exigir atenção na promoção dos

serviços tecnológicos e de cuidados na área, propondo a promoção de um modelo substituto

ao modelo vigente e que pudesse contribuir com a inserção social e familiar dos pacientes

com transtornos mentais e, sobretudo, para a promoção da cidadania, considerando que se

tinha um modelo que não apresentava progresso no quadro psíquico dos pacientes, mas, ao

contrário, um visível fenômeno de regresso, definhamento e óbito dos pacientes com

transtorno mental.

É importante salientar que a Reforma Psiquiátrica no Brasil foi inspirado pela

experiência da Reforma Italiana que foi influenciada pelo pensamento crítico do médico

Franco Baságlia frente às questões que envolvem o trato com o paciente psiquiátrico. A

iniciativa da Reforma Psiquiátrica Italiana surgiu a partir da inquietação de Franco Baságlia

que, em 1961, assume a direção do Hospital Psiquiátrico de Gorizia, na Itália. De acordo com

Mesquita, Novellino e Cavalcante:

O modelo asilar ou hospitalocêntrico continua predominante até o final do primeiro

meado do século XX. Até que em 1961, o médico italiano Franco Baságlia assume a

direção do Hospital Psiquiátrico de Gorizia, na Itália. No campo das relações entre a

coletividade e a isanidade, ele assumia uma atitude crítica para com a psiquiatria

clássica e hospitalar, por esta se centrar no princípio do insulamento do alienado. Ele

defendia, ao contrário, que o doente mental voltasse a viver com sua família. Sua

atitude inicial foi aperfeiçoar a qualidade de hospedaria e o cuidado técnico aos

internos no hospital em que dirigia. Essas normas e o pensamento de Franco

Baságlia influenciaram, entre outros, o Brasil, fazendo ressurgir diversas discussões

que tratavam da desinstitucionalização do portador de sofrimento mental e da

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humanização do tratamento a essas pessoas, com o objetivo de promover a re-

inserção social. (MESQUITA; NOVELLINO; CAVALCANTE, 2004, p.4).

Baságlia revolucionou a história da saúde mental na Itália e influenciou os demais

países na iniciativa de mobilização contra o modelo de assistência psiquiátrica asilar. Foi

responsável por melhorar as condições de hospedaria e o cuidado técnico aos internos em

Gorizia, percebeu a necessidade de profundas transformações tanto no modelo de assistência

psiquiátrica quanto nas relações entre a sociedade e a loucura, assumia uma posição crítica

mediante a psiquiatria clássica e hospitalar por favorecer o isolamento do louco, iniciou o

fechamento do Hospital de Trieste, promoveu a substituição do tratamento hospitalar e

manicomial por uma rede territorial de atendimento e “No ano de 1973, a Organização

Mundial de Saúde (OMS)5 credenciou o Serviço Psiquiátrico de Trieste como principal

referência mundial para uma reformulação da assistência em saúde mental.”

Amarante e Rotelli (1992) corroborando Dell’ Acqua, (1987) afirmam que, em

suma, a experiência de Trieste conduziu à destruição do manicômio, ao fim da violência e do

equipamento da instituição psiquiátrica tradicional, apresentando possibilidades quanto à

constituição de uma rede de atenção que oferece e produz cuidados e, ao mesmo tempo,

oferece e produz novas formas de sociabilidade e de subjetividade para os que sofrem com

algum problema psiquiátrico e necessitam de assistência.

De acordo com Silva (2012), a ciência que compreendia o “louco” como

necessitado de tratamento através do aprisionamento, colocando-o dentro dos asilos passa a

ser questionada e debatida, ou seja, as formas de hospitalização e institucionalização são

repensadas e analisadas, de modo que nega a clausura, a distância, a negação do louco como

forma de tratar a doença, concebendo um novo paradigma de tratamento, de forma humana,

em comunidade, no seio familiar, deslocando-o da caótica realidade dos hospitais, colônias e

diversas formas de prisões para a realidade de um tratamento que o insere no meio social,

portanto, com direito a liberdade.

E sobre a concretização dessa liberdade o autor ainda esclarece que “foi e ainda se

faz necessário um percurso de quebra de estigmas e de barreiras, como o preconceito, a não

aceitação do outro e uma estrutura capaz de sustentar a desinstitucionalização que foi iniciada

por Franco Baságlia.” (SILVA, 2012, p. 67).

A experiência italiana de desinstitucionalização foi um marco em âmbito mundial,

extrapolando a ideia de desospitalização. Franco Baságlia e seus companheiros italianos

5 Disponível em: <www.ifb.org.br>. Acesso em: 17 set.2013.

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inovam esse meio, pois além de questionar os manicômios e suas desumanidades, também

entendem e denunciam a situação desumana como sendo reflexo da questão social da

exclusão e fruto da opressão da sociedade capitalista. (HEIDRICH, 2007).

Portanto, o processo de desinstitucionalização italiana, inspirou e influenciou a

experiência brasileira, contribuindo com o processo de quebra de paradigmas e desconstrução

dos velhos modelos institucionalizados, sobretudo, no campo teórico, instigando os atores

sociais a lançarem um novo olhar para modelo de assistência à saúde mental e tomarem a

posição de luta em favor do bem-estar da parcela de indivíduos que sofrem com os descasos,

tendo em vista que se tratam de seres humanos, cidadãos de direitos, porém, privados deles.

Neste sentido, o processo de desisntitucionalização não se trata de uma teoria

vaga, verticalizada, afastada do cotidiano e da vida real das pessoas envolvidas, mas da

produção coletiva, viva, inserida e representada na contradição diária dos serviços que foram

transformados nesse processo. Sobre a desinstitucionalização,:

Voltada basicamente para objetivos administrativos e com significado restrito de

“tirar os pacientes do hospital”, a desinstitucionalização, como desospitalização, não

questiona a doença mental ou o papel dos médicos/técnicos com relação à doença e

o doente. Também não há um questionamento ou crítica sobre o saber que legitima a

psiquiatria como “a área” que trata/sabe tratar a loucura e o louco. Nessa concepção,

o processo limita a noção de “instituição” ao hospital psiquiátrico/ manicômio.

Desinstitucionalizar significa, portanto, tirar os loucos da instituição, no caso, do

hospital e oferecer o tratamento em outro local. (HEIDRICH, 2007, p.54).

Em contrapartida, o deputado Paulo Delgado afirma que a desinstitucionalização

não é desospitalização, como vem sendo entendido e apresentado por profissionais, médicos

psiquiátricos, em nosso País. Afirma que a desinstitucionalização é um complexo processo

social que envolvem muitos atores e altera as relações de poder entre os pacientes, os

profissionais e as instituições, com origens no questionamento do modelo de atendimento

autoritário e divisor, tendo o hospital como núcleo.

No próximo capítulo, apresentaremos o processo da Reforma Psiquiátrica e os

novos equipamentos substitutivos da saúde mental, bem como a exigência e inserção de novos

saberes nesse campo, sobretudo do Serviço Social.

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3. A REFORMA PSIQUIÁTRICA COMO MARCO NO PROCESSO DE

DESINSTITUCIONALIZAÇÃO

O processo de desinstitucionalização da loucura tem como marco primordial o

movimento da Reforma Psiquiátrica, que aconteceu em âmbito mundial. A partir desse

movimento foi direcionado um novo olhar sobre o paradigma da loucura, ou seja, a forma de

tratá-la e percebê-la no meio social. As pessoas com transtorno mental de moderado à grave

saíram de dentro dos muros dos hospitais, que ofereciam uma forma “mascarada” de

tratamento e passaram a serem tratados a partir da perspectiva da inserção social e promoção

da cidadania.

Segundo o deputado Paulo Delgado, “A Reforma Psiquiátrica é de certa forma a

abolição da escravidão do doente mental, seu fim como mercadoria de lucro dos hospitais

fechados, da exploração do sofrimento humano com objetivos mercadológicos”6. Portanto,

um movimento com finalidade revolucionária, que almejava a superação da assistência asilar

tradicional em prol da garantia dos direitos humanos das pessoas com transtorno mental,

embora os impasses registrados nesse processo.

Complementando essa análise, Heidrich (2007) - citando Amarante (1996; 1999;

2003) -, apresenta que o movimento da Reforma Psiquiátrica abrange quatro dimensões: a

técnico conceitual, que se refere à desconstrução e a reconstrução do entendimento sobre

doença mental, saúde mental, isolamento, normalidade, etc.; a técnico assistencial, que se

refere à construção de uma rede de equipamentos substitutivos do modelo hospitalar, a

construção de novas possibilidades para os sujeitos; a dimensão jurídico política, que se refere

à promoção da cidadania dos sujeitos; e a dimensão sócio cultural, que se refere a um

conjunto de práticas que buscam a transformação do imaginário social em relação a loucura, a

doença mental, dentre outras terminologias dessa área.

Analisando essa percepção do autor é possível perceber que as dimensões

apresentadas abrangem a totalidade do que representou e fundamentou o movimento da

Reforma Psiquiátrica. Nesse contexto, trazendo para a realidade contemporânea, percebemos

também os avanços conquistados a partir dessa luta. Portanto, em meio aos desafios e a

6 Revista Cidadania Outros Olhares - Humanização do tratamento psiquiátrico no Brasil: a importância da lei

10.216, de Paulo Delgado. Realização: Escritório de Juiz de Fora/MG e Gabinete do Deputado Paulo Delgado

em Brasília/DF – Disponível em: <http://www.paulodelgado.com.br>. Professor e sociólogo pela UFJF, com

mestrado em Ciência Política pela UFMG, Paulo Delgado é deputado federal pelo PT de Minas Gerais há quatro

legislaturas. Membro da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional é vice-líder do Partido na Câmara.

Autor da Lei 10.216, a lei da Reforma Psiquiátrica, e defensor de políticas de inclusão social.

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realidade da saúde pública em um contexto ampliado, há uma constante busca pela efetivação

dos direitos, a inserção social e a promoção da cidadania das pessoas com transtorno mental.

Nesse sentido, Paulo Delgado afirma que:

É preciso também criar espaços protegidos, proteger o paciente psiquiátrico em

serviços onde ele possa desenvolver toda a sua potencialidade. Mas não podemos

manicomializar os Caps e os Naps, que são estruturas antimanicomiais. Não podem

ser apropriadas pelo saber manicomial. É preciso educar os deseducados,

desconstruir para reconstruir. (REVISTA CIDADANIA OUTROS OLHARES,

p.10).

Nesse sentido, compreendemos que o autor alerta para o cuidado de não manter as

práticas do antigo modelo de assistência psiquiátrica nos novos equipamentos. Os

equipamentos substitutivos existem para dar outro lugar à pessoa com transtorno mental.

Esses espaços têm uma proposta de promoção da cidadania e inclusão social da pessoa com

transtorno mental, portanto, devem resguardar esses indivíduos e efetivar as propostas

voltadas a eles, libertando-se dos paradigmas da antiga assistência enraizados no imaginário

social. Então, que os novos espaços sejam reconstruídos nessa perspectiva.

A Reforma Psiquiátrica no Brasil foi um movimento advindo da mobilização das

classes populares, segmento que mais fortaleceu a luta por transformações no campo da Saúde

Mental. O movimento foi caracterizado por exigir mudanças no modelo vigente, tendo em

vista o despertar dos diversos atores sociais, em um determinado tempo histórico, para a

realidade violenta a qual eram submetidos os indivíduos com transtorno mental. Mesquita,

Novellino e Cavalcante esclarecem que:

Na década de 70 são registradas várias denúncias quanto à política brasileira de

saúde mental em relação à política de privatização da assistência psiquiátrica por

parte da previdência social, quanto às condições (públicas e privadas) de

atendimento psiquiátrico à população. É nesse contexto, que no fim da década

citada, que surge a questão da Reforma Psiquiátrica no Brasil. Pequenos núcleos

estaduais,7 principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais

constituem o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM). No Rio de

Janeiro, em 1978, eclode o movimento dos trabalhadores da Divisão Nacional de

Saúde Mental (DINSAM) e coloca em xeque a política psiquiátrica exercida no país.

(MESQUITA; NOVELLINO; CAVALCANTE, 2004, p.4).

Nesse sentido, compreendemos que o movimento da Reforma Psiquiátrica foi

instigado pelos diversos segmentos da sociedade a partir das inquietações diante do modelo de

assistência psiquiátrica prestado aos doentes. As denúncias surgem nesse contexto na

perspectiva de mudar essa realidade, pois com a política de privatização da assistência

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psiquiátrica a rede hospitalocêntrica tornou-se um rico mercado e os usuários serviam de

fontes de lucros.

No Brasil, o movimento inicia no final da década de setenta, contemporâneo ao

surgimento da Reforma Sanitária, levantando a bandeira de luta em prol dos direitos dos

pacientes psiquiátricos no País. Esse processo foi dividido em duas fases: “a primeira de 1978

a 1991 compreende uma crítica ao modelo hospitalocêntrico, enquanto a segunda, de 1992 aos

dias atuais destaca-se pela implantação de uma rede de serviços extrahospitalares.”

(MESQUITA; NOVELLINO; CAVALCANTI, 2004).

Na década de 1980, o movimento pela Reforma Psiquiátrica brasileira vai

ganhando força e experiência a partir da realização de encontros, congressos e conferências.

De acordo com os estudos de Pitta (2011), é o Congresso de trabalhadores de Bauru, realizado

em 1987 que alcança o consenso de ser o marco de articulação de diferentes movimentos

sociais em torno da Reforma Psiquiátrica, particularmente de São Paulo, Rio de Janeiro,

Minas Gerais, onde se pactuou o lema “por uma sociedade sem manicômios”, que teve

origem na Itália.

A realização desse encontro foi decidida durante a I Conferência Nacional de

Saúde Mental, respondendo a uma indicação da 8ª Conferência Nacional de Saúde que

aconteceu no Rio de Janeiro, em 1986, e representa um marco histórico na história da

psiquiatria brasileira. Ainda segundo Pitta (2011), a decisão para sua realização foi instigada

pela constatação de que a perspectiva sanitarista de incorporar as propostas reformistas nas

políticas oficiais vinha sendo anulada pela resistência passiva ou ativa da iniciativa privada,

da estrutura manicomial, da burocracia estatal e do conservadorismo psiquiátrico.

Nesse contexto, é construído o desejo de uma sociedade sem manicômios e partir

dele surge a luta antimanicomial, em 18 de maio de 1987, data que passa a ser decretada como

o Dia da Luta Antimanicomial, com inúmeras atividades culturais, artísticas e científicas, em

muitas cidades do País, com o objetivo de sensibilizar e envolver novos atores sociais para a

questão. PITTA (2011). Assim,

O movimento da luta antimanicomial compõe o cenário nacional de luta em prol dos

direitos dos usuários e familiares a uma atenção digna dos serviços de saúde, através

de ações que se multiplicam e pautam pela criatividade dos protagonistas, que

buscam mudar o imaginário social sobre a loucura. (BARBOSA; COSTA;

MORENO, 2012, p.46).

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Nesse sentido, identificamos que as mobilizações sociais ocorridas nesse período

aconteceram em âmbito nacional e foram instigadas pelo desejo de combater o modelo de

assistência violenta e excludente, que se tinha antes da Reforma Psiquiátrica. Segmentos da

sociedade lutavam por uma sociedade sem manicômios e propunham um modelo de

assistência mais humano e promovedor da cidadania.

Ainda de acordo com Barbosa, Costa e Moreno (2012), o Manifesto de Bauru é o

documento da fundação do Movimento Antimanicomial, que marca o compromisso da aliança

social entre os profissionais e a sociedade para o enfrentamento da questão da loucura e de

suas formas de tratamento, buscando a articulação nacional, e pautando-se, enquanto

movimento social e sindical, na defesa de uma reforma sanitária democrática e popular.

Nesse contexto, compreendemos que essa luta abriu possibilidades para a

desinstitucionalização da loucura. Para Paulo Delgado, “a luta antimanicomial desconstruiu a

lógica da internação no senso comum brasileiro e preparou a sociedade para receber as

pessoas com transtornos mentais como cidadãos com direitos”.

Complementando esse contexto, destacamos que foi a partir da Reforma

Psiquiátrica que surgiu relevantes serviços de atendimento substitutivos ao modelo hospitalar,

como o Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS), os Centros de Atendimentos Psicossocial e

seus vários tipos (CAPS I; CAPS II; CAPS III; CAPSi; CAPSad), os Centros de Atenção

Diária (CADS), os Hospitais Dias (HDs) e os Centros de Convivência e Cultura.

(MESQUITA; NOVELLINO; CAVALCANTI, 2010).

Nessa trajetória, durante a década de 1990, de acordo com o Ministério da Saúde

(2005), o contexto histórico da Reforma Psiquiátrica é marcado pelo compromisso firmado

pelo Brasil na assinatura da Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência

Nacional de Saúde Mental, que passam a entrar em vigor no país as primeiras normas

federais, regulamentando a implantação dos serviços de atenção diária, fundadas nas

experiências dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-dia, e as primeiras normas para

fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos.

Nesse período surge o projeto de Lei do deputado Paulo Delgado (PT-MG), que é

apresentado ao Congresso Nacional, no ano de 1989, com a proposta de regulamentação dos

direitos da pessoa com transtorno mental e a extinção progressiva dos manicômios no País.

Após aprovação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei passou por um processo de

tramitação que levou doze anos para ser aprovado como a Lei da Reforma Psiquiátrica no

País, a aprovação ocorreu em abril de 2001.

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Reconhecida nacionalmente como Lei Paulo Delgado (Lei Federal 10.216/2001),

consta em seu corpo teórico a proposta que institui um novo modelo de tratamento aos

portadores de transtornos mentais no Brasil, redirecionando a assistência em saúde mental;

privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária; dispondo sobre

a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais, porém, não instituindo

mecanismos claros para a progressiva extinção dos manicômios.

O modelo proposto conta com uma rede de serviços e equipamentos variados tais

como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), os Serviços Residenciais Terapêuticos

(SRT), os Centros de Convivência e Cultura e os leitos de atenção integral (em Hospitais

Gerais, nos CAPS III). O Programa de Volta para Casa, que oferece bolsas para egressos de

longas internações em hospitais psiquiátricos, também faz parte desta Política8. Conforme

ressalta Pitta,

Na primeira metade da década de 1990, foram inaugurados quase cem serviços de

atenção diária que seguiu crescendo inercialmente. Na ocasião, considerava-se que a

substituição asilar vinha acontecendo “de maneira inequívoca e regular no Brasil nos

últimos dez anos”, e que se podia esperar uma aceleração do processo. (PITTA,

2011, p.8).

Nesse sentido, percebemos que a rede dos novos equipamentos foi crescendo e se

espalhando por todo País. Com isso houve um avanço do número de equipamentos

substitutivos, embora a esperada substituição tenha ocorrido gradativamente, mas não de

forma acelerada.

O ano 2000 foi marcado pela aprovação da Lei Paulo Delgado, que apesar de

redirecionar a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento em

serviços de base comunitária, não institui mecanismos claros para a progressiva extinção dos

manicômios. Porém, impõe novo impulso e novo ritmo para o processo de Reforma

Psiquiátrica no Brasil.

É no contexto da promulgação da lei 10.216/2001 e da realização da III

Conferência Nacional de Saúde Mental, que a política de saúde mental do governo federal,

alinhada com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se ganhando maior

sustentação e visibilidade. (BRASIL, 2005).

A Reforma Psiquiátrica é consolidada como política de governo na III

Conferência. A partir daí é conferido aos CAPS valor estratégico para a mudança do modelo

8 Disponível em: <conselho.saude.gov.br>. Acesso em: 21 set.2013.

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de assistência, defendendo a construção de uma política de saúde mental para os usuários de

álcool e drogas, e estabelecendo o controle social como a garantia do avanço da Reforma

Psiquiátrica Brasileira. É essa Conferência que fornece os substratos políticos e teóricos para

a política de saúde mental no Brasil. (BRASIL, 2005).

Nesse sentido é possível perceber que, ao longo da História, as conquistas no

âmbito da saúde mental foram permeadas por um movimento dinâmico e “revolucionário” em

prol da garantia dos direitos da pessoa com transtorno mental, buscando superar os velhos

modelos de assistência psiquiatra, além de construir e efetivar novas possibilidades

assistenciais, legitimando as transformações conquistadas nesse processo. Desta forma,

Ainda mais importante do que os planos nacionais e as leis, que têm a sua

importância e a sua eficácia, são os trabalhos práticos de implantação de novas

experiências que demostrem e comprovem ser possível prestar atenção psiquiátrica

diferenciada, sob novos modelos de cuidado, sem necessidade do asilo, do hospital,

da violência, da discriminação da segregação, que demostrem ser possível uma

prática psiquiátrica que crie novas dimensões, novas subjetividades, que produza

vida e não morte. (AMARANTE; ROTELLI, 1992, p. 50).

Dessa forma, todo esse percurso vem reafirmar que o processo histórico da

Reforma Psiquiátrica, compreendido como transformação de saberes, práticas, valores sociais

e culturais, marcado por tensões, desafios e conflitos. Neste sentido, ele se inscreve nas

possibilidades e limites das políticas públicas e, em particular, do Sistema Único de Saúde, da

implementação de projetos comprometidos com a afirmação de direitos de cidadania, com a

luta contra as desigualdades sociais e os mecanismos de exclusão social.9

No próximo item apresentaremos uma breve contextualização sobre os CAPS no

Brasil.

3.1 Os CAPS no processo de desinstitucionalização

Conforme salientamos anteriormente, o surgimento dos CAPS no Brasil emerge a

partir dos movimentos mobilizadores das transformações ocorridas nas últimas décadas na

rede de atenção à saúde mental. Foi com o movimento da Reforma Psiquiátrica no Brasil que

muitas conquistas foram aderidas à saúde mental. Esse processo articulou intensas

9 Sistema Único de Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Relatório Final - III Conferência Nacional de Saúde

Mental “Cuidar sim, excluir não” - Efetivando a Reforma Psiquiátrica com acesso, qualidade, humanização e

controle social. Brasília, 11 a 15 de dezembro de 2001.

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mobilizações, lutas, encontros, conferências, que contribuíram para o surgimento de portarias

e leis de âmbito federal, viabilizando a promoção da rede assistencial de saúde mental.

Vale acrescentar que os movimentos que emergiram nas últimas décadas tinham

caráter social e popular compostos por associação de familiares, sindicalistas, trabalhadores

integrantes do movimento sanitário, membros de associações de profissionais e pessoas com

longo histórico de internações psiquiátricas, todos conhecedores e inseridos na dura realidade

dos pacientes com sofrimento mental.

Os CAPS são Centros de Atenção Psicossocial que surgiram nesse contexto de

transformações da rede de assistência psiquiátrica no Brasil, na perspectiva de superação do

modelo asilar. A proposta desses equipamentos consiste na reinserção da pessoa em

sofrimento mental, no mundo social, por meio da reabilitação psicossocial, considerando os

fatores biopsicossociais, culturais e espirituais, bem como do individuo como sujeito de sua

história, do envolvimento da família, da comunidade e da equipe multiprofissional e

interdisciplinar como importante conjunto de apoio dentro das intervenções e com o objetivo

de proporcionar atenção integral ao indivíduo. (MARTINS; SOARES; OLIVEIRA; SOUZA,

2011).

No Brasil, o primeiro equipamento foi inaugurado em março de 1987, na cidade

de São Paulo, denominado CAPS Professor Luiz da Rocha Cerqueira. A criação dos CAPS e

de todos os equipamentos por toda parte do País foram frutos de um intenso movimento

social, que buscavam a melhoria da assistência psiquiátrica no Brasil, instigando o processo

de desinstitucionalização da loucura.

Nesse contexto os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) surgem como espaço

terapêutico entre o hospital e a comunidade, com a finalidade de auxiliar a integração social

dos sujeitos e oferecer assistência psicoterápica, assim como atividades artísticas, culturais e

recreativas, proporcionando a atenção psicossocial. (MARTINS, SOARES, OLIVEIRA e

SOUSA, 2011).

Dessa forma, segundo o Ministério da Saúde (2005), Os CAPS devem ser

substitutivos, e não complementares ao hospital psiquiátrico. Cabe a estes equipamentos o

acolhimento e a atenção às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, procurando

preservar e fortalecer os laços sociais em seu território. Portanto, o CAPS deve ser o núcleo

de uma nova clínica, produtora de autonomia, o qual deve convidar o usuário à

responsabilização e ao protagonismo em toda trajetória do seu tratamento.

Os serviços substitutivos que têm surgido no País são regulamentados pela

Portaria nº. 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002 e integram a rede do Sistema Único de Saúde

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– SUS, que está fundamentado na universalização do direito à saúde, que por sua vez fortalece

a condição de cidadania e democratiza o acesso aos serviços. (BRASIL, 2004).

Com a Constituição da República de 1988, a saúde passou a ser reconhecida como

direito social, ou seja, inerente à condição de cidadão, cabendo ao poder público a

obrigação de garanti-lo: A saúde é direito de todos e dever do Estado (Art. 196).

Essa conquista política e social pode ser atribuída a diversas lutas e esforços

empreendidos pelo movimento da Reforma Sanitária, entre 1976 e 1988. Pela

primeira vez na história do Brasil, foi promulgada uma Constituição que reconhece a

saúde como direito social, dispondo de uma seção específica e contando com cinco

artigos destinados à saúde. (Paim, 2009, p.43).

Nesse sentido, a Constituição Federal legaliza a saúde como dever do Estado

tornando-o responsável pela oferta dos serviços públicos de saúde, como forma de garantir

esse direito aos cidadãos. Como esclarece o autor, essa conquista advém das mobilizações

sociais surgidas no contexto da Reforma Sanitária.

Nesse contexto, podemos afirmar que o SUS fundamenta-se em propostas que

visam o bem estar físico, mental e social dos indivíduos, pois é um sistema criado para

amparar o cidadão, buscando atender suas necessidades em todos os âmbitos da saúde e

garantindo-lhes a condição de direito através do acesso ordenado, do tratamento adequado e

humanizado, garantindo acesso integral, universal e gratuito para toda a população brasileira.

Embora reconheçamos que, na realidade contemporânea, as propostas, muitas vezes, não são

efetivadas conforme deveriam.

Portanto, a política de Saúde Mental compõe a política de Saúde Pública, que está

permeada por todo esse contexto de garantia dos direitos. Nesse sentido, os CAPS constituem

um serviço de saúde aberto e comunitário do Sistema Único de Saúde – SUS.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como instituições destinadas ao

acolhimento das pessoas com transtorno mentais oferecem atendimento à população de sua

área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários

pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços

familiares e comunitários. É um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser

substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos. (BRASIL, 2004).

As práticas dos CAPS funcionam como catalizadores da construção de territórios

existenciais de modo a inserir ou reinserir os usuários tornando-os cidadãos ou de

mundos nos quais os seus usuários possam conquistar ou reconquistar seu cotidiano.

Desta maneira os CAPS assumem papel de estrutura complexa que, entre outras

coisas, procura ser ponte de relacionamento entre o indivíduo, com suas

particularidades, e as demais redes sociais. (MARTINS; SOARES; OLIVEIRA;

SOUSA, 2011, p.33).

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Nesse sentido, os CAPS têm a finalidade de contribuir de forma positiva no

tratamento da pessoa com transtorno mental, elaborando estratégias para ampliação de

espaços sociais e de convivência, objetivando manter o vínculo dos usuários com o meio

social e buscando incluir o cidadão usuário em outros meios que possam estimulá-los a serem

protagonistas da sua história, quebrando os paradigmas da visão do louco excluído e

aprisionado.

São objetivos dos CAPS: oferecer atendimento à população da área de

abrangência, realizando a reinserção social e o acompanhamento clínico dos usuários

promovendo o acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços

familiares e comunitários. (BRASIL, 2004)

O público alvo desses equipamentos são pessoas com transtornos mentais severos

ou persistentes, dependentes de drogas psicoativas e a crianças e adolescentes com transtornos

mentais. Para atender esta demanda, existem diferentes modalidades de CAPS de acordo o

tamanho da estrutura ofertada (profissionais, atividades terapêuticas, entre outras) e a

demanda específica a ser atendida. (MARTINS; SOARES; OLIVEIRA; SOUSA, 2011).

Nesse contexto, vale ressaltar que os centros de atendimentos em referência são

classificados por ordem decrescente de porte e complexidade populacional. Desse modo, as

divisões são feitas da seguinte forma: CAPS I (para municípios com população entre 20.000 e

70.000 habitantes), CAPS II (para municípios com população entre 70.000 e 200.000

habitantes) e CAPS III (para municípios com população acima de 200.000 habitantes).

(BRASIL, 2002)

De acordo com a especificidade da demanda, os CAPS são divididos da seguinte

forma: CAPS I, II e III, destinados ao atendimento a pessoas com transtornos mentais severos

e persistentes; CAPS ad, para atendimento à população com transtornos decorrentes do uso de

substâncias psicoativas, como álcool e outras drogas; e CAPSi, para atendimento a crianças e

adolescentes com transtornos mentais (BRASIL, 2002).

De acordo com o artigo de Silva (2012) - citando Sampaio (2010) -, o CAPS não

constitui apenas um tratamento específico para doentes mentais: ele tenta prevenir a rotulação,

o estigma e a cronificação que esses pacientes sofrem. É um equipamento que previne o

isolamento dos portadores de transtornos mentais, busca tratar sem a necessidade de internar,

garantindo a eles a atenção, seja através de oficinas, grupos de apoio ou através do

acompanhamento psicológico e médico e com o acompanhamento de sua família sem a

quebra de nenhum vínculo.

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Portanto, os Centros de Atenção Psicossocial surgem como equipamentos

estratégicos no processo de desinstitucionalização do modelo manicomial, na perspectiva de

suprir as necessidades da assistência básica em saúde mental. São dispositivos que

possibilitam a substituição do modelo manicomial por um modelo aberto, descentralizado e

que promove o cuidado dos usuários de forma livre, considerando a importância do

tratamento no seio da família e da sociedade, promovendo a cidadania e a autonomia e visa o

bem estar e o equilíbrio emocional dos usuários.

Nesse contexto, embora conhecendo a história, as propostas, os objetivos e as

finalidades dos CAPS e reconhecendo a sua importância na assistência psiquiátrica hoje, vale

ressaltar que existem muitas problemáticas que envolvem os novos equipamentos da saúde

mental e dificultam a oferta dos serviços e cumprimento das propostas.

Essas dificuldades estão mais ou menos agravadas de acordo com cada território,

variando de gestão para gestão, de administração para administração. Há dificuldades na

estrutura física, na escassez dos recursos humanos, nas limitações de recursos financeiros, na

precária capacitação dos profissionais envolvidos, na forma de contratação do quadro de

profissionais, enfim. Ainda se faz necessário lutar para efetivar e garantir as propostas dos

novos equipamentos da saúde mental, pois se essas dificuldades fossem sanadas certamente os

manicômios já não precisariam mais existir.

No próximo capítulo, apresentamos a inserção dos saberes na saúde mental e a

interdisciplinaridade como forma de destacar que os novos equipamentos instigaram a

presença dos profissionais de áreas específicas para contribuir na efetivação das propostas dos

novos serviços de assistência psiquiátrica.

3.2 A inserção dos saberes na Saúde Mental e a interdisciplinaridade

O contexto histórico da Saúde Mental passou por uma série de transformações ao

longo da história da humanidade, ganhando formas e conquistando espaços mais

especificamente a partir do momento em que a loucura passou a ser tratada como doença

mental. Nesse sentido, emergiram a necessidade de aprimorar o trato do objeto central da

Saúde Mental: a pessoa com transtorno mental.

A partir da Reforma Psiquiátrica surgem os equipamentos substitutivos do modelo

hospitalocêntrico na perspectiva de promover um tratamento diferenciado à pessoa com

transtorno mental. Para isso se faz necessário que os novos equipamentos componham

estrutura adequada para dar suporte e desenvolver a proposta de desinstitucionalização do

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louco promovendo um tratamento humanizado com foco na promoção da cidadania e

reinserção social dos usuários dos serviços.

Nesse contexto, são criadas as portarias da saúde mental como forma de dar conta

das exigências, que emergem frente às transformações ocorridas nesse contexto e para

instituir os parâmetros de funcionamento dos equipamentos substitutivos, dentre outros

aspectos. Aqui identificaremos que o assistente social também é um profissional exigido pela

portaria.

Desse modo, enfatizamos o CAPS tipo III, que é campo das análises dessa

pesquisa, portanto, de acordo com a Portaria nº. 336/2002, dos recursos humanos. A equipe

técnica mínima para atuação no CAPS III, para o atendimento de 40 (quarenta) pacientes por

turno, tem como limite máximo 60 (sessenta) pacientes/dia, em regime intensivo, é composta

por 02 (dois) médicos psiquiatras, 01 (um) enfermeiro com formação em saúde mental, 05

(cinco) profissionais de nível superior, dentre eles, psicólogo, assistente social, enfermeiro,

terapeuta ocupacional, pedagogo ou outro profissional necessário ao projeto terapêutico, além

de 08 (oito) profissionais de nível médio, que podem ser técnico e/ou auxiliar de enfermagem,

técnico administrativo, técnico educacional e artesão.

Ainda de acordo com a Portaria nº. 336/2002, para período noturno de

acolhimento, em plantões corridos de 12 horas, a equipe deve ser composta por:

a - 03 (três) técnicos/auxiliares de enfermagem, sob supervisão do enfermeiro do

serviço; b – 01 (um) profissional de nível médio da área de apoio; 4.3.2.2 - Para as

12 horas diurnas, nos sábados, domingos e feriados, a equipe deve ser composta por:

a - 01 (um) profissional de nível superior dentre as seguintes categorias: médico,

enfermeiro, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, ou outro profissional

de nível superior justificado pelo projeto terapêutico; b - 03 (três) técnicos/auxiliares

técnicos de enfermagem, sob supervisão do enfermeiro do serviço c - 01 (um)

profissional de nível médio da área de apoio.

Diante do exposto, percebemos que dentre tantos aspectos que compõem a

estrutura dos novos equipamentos, os recursos humanos são recortes presentes no conteúdo da

portaria, tendo em vista que os equipamentos não são compostos apenas pela estrutura física,

ou financeira, mas também por um complexo que envolve os recursos humanos configurados

em equipes interdisciplinares, que desenvolvem suas atividades dialogando com vários

saberes.

Portanto, os novos modelos de atenção à saúde mental exigem profissionais os

quais a sua formação priorize ações inovadoras tirando o foco do indivíduo e da farmacologia

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como único ponto de apoio e exigem profissionais que não tem na figura do médico sua única

possibilidade de referência. (BOARANI, 2011).

É oportuno salientar que, de acordo com Oliveira e Alessi (2005), a assistência

psiquiátrica, inicialmente restrita à prática médica, respaldava-se na classificação e descrição

das doenças mentais, de modo que o conceito de cura era centralizado na figura do médico e o

local de realização era a instituição psiquiátrica, desenvolvendo nesses locais práticas

complementares de pessoal subalterno, com foco no controle dos internados.

Os autores enfatizam que “Essa organização do trabalho, que se pautava pelo

exercício da medicina liberal, característica do século XIX, sofreu modificações que se

relacionam com as transformações sócio históricas ocorridas, desse período até a atualidade”.

(OLIVEIRA; ALESSI, 2005, p. 25).

As práticas na saúde passaram por um processo de transformações deslocando-se

da prática médica liberal para as práticas coletivas de trabalho. Desse contexto de

transformações sociais surgiu a enfermagem moderna/profissional e, posteriormente, a

psicologia e o serviço social para incorporar a equipe de assistência à saúde mental.

(OLIVEIRA; ALESSI, 2005).

Destacamos, nesse contexto, a inserção do Serviço Social na Saúde Mental como

forma de compreender como a profissão se inseriu nesse meio e para enfatizar que a categoria

desenvolve um papel importante mediante as propostas do novo modelo de Atenção

Psicossocial, sobretudo compreender como a profissão se reafirma nesse contexto que tem um

olhar centrado nas práticas médicas e do campo da psicologia, tendo em vista o objeto de

estudo desta pesquisa.

Segundo Bisneto (2007) a origem do Serviço Social na Saúde Mental não se deu

no interior da categoria, não partiu de necessidades terapêuticas ou clínicas, mas foi um

processo que surgiu em um contexto mais ampliado, o contexto da modernização

conservadora do Estado ditatorial brasileiro na perspectiva de uma possível legitimação em

áreas críticas, como a atenção à saúde dos trabalhadores do sistema previdenciário brasileiro.

O autor esclarece que:

O Serviço Social em Saúde Mental iniciou-se nos anos 1940 pela atuação no COI –

Centro de Orientação Infantil e no COJ – Centro de Orientação Juvenil. Porém o

número de assistentes sociais permaneceu pequeno e seu escopo de atuação era bem

distinto do atual, atendendo a jovens e famílias na prevenção higienista. Por isso

pode-se dizer que a estrutura atual originou-se só após 1964, com a mudança do

atendimento previdenciário na Saúde Mental dos indigentes para os trabalhadores e

seus dependentes em internações asilares, com a prestação de serviços sociais

necessários ou benéficos para a lógica dos manicômios a fim de legitimá-los na

situação de pobreza dos pacientes. (BISNETO, 2007, p. 113).

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Nesse contexto, é a questão social que demanda a profissão para a área da Saúde

Mental no Brasil e cabe aos assistentes sociais compreender que é por esta relação que o

Serviço Social se insere na área, tanto historicamente como na atualidade. Portanto, não

devem propor uma atuação terapêutica, mas voltada para dar conta das diversas expressões da

questão social demandadas aos equipamentos de Saúde Mental. (BISNETO, 2007).

Com o movimento da Reforma Psiquiátrica foi proporcionado à categoria uma

ampliação da contratação nessa área de atuação, pois na medida em que esse movimento dá

importância à reabilitação social dos portadores de sofrimento mental ele proporciona a

ampliação do campo de trabalho do assistente social, tendo em vista que demanda programas

nas áreas de trabalho, habitação, lazer, tornando relevante a necessidade de se estabelecer uma

cidadania efetiva para os usuários da rede de Saúde Mental. (BISNETO, 2007).

Ainda segundo Bisneto (2007, p. 116), “o médico psiquiatra não dá conta de todas

as demandas colocadas pela problemática de seus pacientes. Para sucesso do empreendimento

conta com vários outros profissionais que complementam sua atuação, e o assistente social é

um deles”. Portanto, ao Serviço Social compete todas as demandas do campo social que

perpassam o plano biológico ou psicológico e que as demais categorias não tem propriedade

para atuar.

É válido salientar que nos CAPS os profissionais atuam em equipes

interdisciplinares, tendo em vista que a interdisciplinaridade é uma prática presente nas

equipes profissionais dos equipamentos substitutivos da saúde mental e envolve saberes da

Medicina, da Psicologia, do Serviço Social, da Terapia Ocupacional, da enfermagem, dentre

outros.

As práticas desenvolvidas nos equipamentos da saúde mental têm a proposta de

romper com os fundamentos do modelo médico psiquiátrico e desenvolver ações inovadoras,

diversificadas, criativas e ligadas a uma rede exigindo a mobilização de todos os envolvidos

no contexto, desde os trabalhadores até os usuários (BOARANI, 2005). Ainda segundo

A mobilização de todos os atores envolvidos nesse processo, especificamente os

trabalhadores, requer também a ruptura modelo médico-centrado e especializado.

Esse modelo, caracterizado pela fragmentação do trabalho, divisão entre o trabalho

dirigente e executor e hierarquização das relações entre técnicos e usuários, gera

muitos problemas e conflitos na equipe, pois impede o intercâmbio necessário das

concepções teórico-técnicas e das práticas entre seus membros. (BOARANI, 2005,

p. 165).

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Portanto, tendo em vista o trabalho em equipe interdisciplinar é importante que

haja integração da equipe como um todo, com foco no bem-estar das pessoas inseridas no

serviço que buscam a recuperação e controle da doença mental. Entretanto, as dificuldades

encontradas nos processos de trabalho em equipe não contribuirão para a promoção dos

usuários. Desse modo, devem ser administradas de modo a não prejudicar os sujeitos

envolvidos nos serviços.

Conforme Oliveira e Alessi (2008) há três características estruturantes das equipes

dos serviços de saúde mental, que são determinantes para que o processo de trabalho

desenvolvido se organizasse com bases no modelo médico, com prejuízo da atenção

psicossocial, que são a distribuição numericamente desigual dos profissionais, predomínio de

capacitação/especialização médica e contratos temporários de trabalho. Nesse contexto os

autores esclarecem que:

A ausência ou presença frágil de profissionais, em grande parte despreparados para

desenvolver uma assistência tecnicamente fundamentada, favorecia para que o

profissional médico, detentor de capacitação técnica, determinasse a hegemonia das

práticas organizadas segundo o paradigma médico-biológico que em sua maioria,

determina a formação médica. Em relação ao terceiro, os atendimentos de saúde

mental vinculados à rede municipal [...] se estruturavam, em grande medida, a partir

de trabalhadores sem vínculo efetivo de trabalho, resultava em atendimentos

descontinuados, realizados em horários marginais e com pouca acreditação junto à

população. (OLIVEIRA; ALESSI, 2008, p.1220).

Diante do exposto, é possível perceber a existência de fatores que permeiam as

condições para a realização de uma prática comprometida com as propostas da Política de

Saúde Mental e que se configuram desde os primórdios do pós década de 70 e, ainda hoje,

está inserido no interior dos equipamentos em meio às práticas interdisciplinares.

Segundo Moretto (2008), o trabalho em equipe é uma forma de trabalho coletivo

que se configura na relação de troca entre as intervenções técnicas e o envolvimento dos

diferentes profissionais, de modo que a partir da relação estabelecida entre trabalho e

interação, os profissionais podem elaborar consensos que configuram um real projeto

assistencial comum, que integrará a equipe de trabalho.

De acordo com Raichelis (2006), contrariando o que muitas vezes é considerado

sobre o trabalho interdisciplinar, ele demanda a capacidade de apresentar com clareza os

aspectos particulares de análise e propostas de ações frente aos objetos comuns a diferentes

áreas do saber, de modo que cada profissão busca colaborar a partir dos conhecimentos

específicos de suas áreas.

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Nessa perspectiva, o trabalho interdisciplinar é uma articulação fundamental e

estratégica no exercício das atividades demandadas nos equipamentos e que afirma a

identidade e competência de cada profissão, exigindo maior clareza das áreas dos saberes em

articulação no sentido de convergirem para o êxito de projetos a serem assumidos

coletivamente. (IAMAMOTO in RAICHELIS, 2006).

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4. UMA ANÁLISE SOBRE OS DESAFIOS E AS MOTIVAÇÕES NA ATUAÇÃO DAS

ASSISTENTES SOCIAIS NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL – CAPS III

SER II

4.1 Sobre o Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III da SER II10

Esse capítulo representa o ponto máximo da nossa pesquisa, o momento em que

apresentamos os resultados e discussões a partir da análise dos dados coletados em campo,

com o grupo de assistentes sociais do CAPS III SER II. Com a análise pretendemos

compreender como se estabelece a atuação das assistentes sociais na referida instituição,

tendo em vista o desenvolvimento de uma prática comprometida com o projeto ético político

da profissão frente às limitações da política de saúde mental e o atual modelo de assistência

psiquiátrica no Brasil.

O Centro de Atenção Psicossocial – CAPS Geral da SER II é um CAPS tipo III,

que se diferencia dos demais por seu caráter de atendimento integral em 24 horas, atendendo à

população de referência com transtornos mentais severos e persistentes. É o primeiro CAPS

24 horas de Fortaleza e está localizado na Rua Coronel Alves Teixeira, 1500, Dionísio Torres,

na cidade de Fortaleza – CE.

De acordo com Nogueira (2009), no ano de 2005, na cidade de Fortaleza, a

Prefeitura iniciou a ampliação do número de CAPS. A princípio foram formadas equipes de

saúde mental para atuar na rede de atenção básica à saúde, as quais gradativamente

transformaram-se nas atuais equipes dos CAPS. Com essa estratégia, houve um salto

considerável de três para quatorze o número de unidades, divididos nos tipos CAPS ad, CAPS

Geral e CAPS infantil. Inicialmente, havia três CAPS com sedes próprias nas regionais III, IV

e VI, bem como as equipes mínimas de saúde mental que atuavam nos postos de saúde.

Foi nesse contexto de ampliação do número de equipamentos substitutivos que

surgiu o CAPS Geral da SER II, no ano de 2006, com sede própria. Porém, antes o seu

funcionamento iniciou no posto de saúde Frei Tito. Com funcionamento de segunda à sexta,

de 08 às 17 horas, o CAPS Geral da SER II atendia a população adulta com adoecimento

mental e da abrangência do seu território.

Reconhecendo a necessidade de um equipamento do tipo III na cidade de

Fortaleza, a prefeitura da cidade - representada pela ex-prefeita Luiziane Lins11

- decide

10

Parte dos dados apresentados nesse tópico são relatos próprios, pois faz parte do conhecimento adquirido ao

longo do período do estágio curricular obrigatório e supervisionado vivido na instituição.

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reconfigurar o CAPS Geral da SER II em tipo III e, a partir desse momento, passa a funcionar

24 horas com a proposta de um atendimento humanizado em todos os turnos e sob a

coordenação da terapeuta ocupacional Adriana Magalhães. Neste contexto, a referida

instituição passa por uma reforma e ganha dez leitos ampliando seu horário de acolhimento à

pacientes adultos com transtornos mentais e em crise.

Segundo fonte do Jornal O Povo12

, foi em abril de 2012 que o CAPS Geral da

SER II foi reinaugurado passando a se chamar Dr. Nilson de Moura Fé13

, em homenagem a

esse grande militante da Reforma Psiquiátrica do Brasil, mais especificamente do Ceará. A

meta do serviço é realizar atendimento de até 45 pacientes por mês no período noturno, com

demandas encaminhadas de outros CAPS e, não somente, podendo permanecer na unidade

por até dez dias seguidos ou trinta dias alternados, de acordo com o quadro clínico de cada

paciente.

Conforme plano terapêutico elaborado pela equipe do Serviço Social da

instituição, o fluxo da clientela chega através da Rede de Atenção Básica ou por demanda

espontânea. Para o acolhimento 24 horas, o CAPS recebe pacientes que já são atendidos no

serviço, em caso de crise, bem como pacientes encaminhados de outras regionais e que se

encontrem em crise. (FERREIRA; VACONCELOS; TORRES, 2013).

O atendimento é realizado por uma equipe que atua em caráter interdisciplinar

composta por: médicos; farmacêuticos; psicólogos; enfermeiros; assistentes sociais;

educadores físicos; terapeutas ocupacionais; nutricionistas; massoterapeutas; artistas, bem

como profissionais de nível médio.

Neste ano de 2013, na gestão do atual prefeito Roberto Claúdio14

, o CAPS III da

SER II está sob a coordenação da psicóloga Beatriz Araújo Rennó Lima e conta com uma

equipe de 85 profissionais divididos nos três turnos que desenvolvem atividades de:

acolhimento; avaliação inicial; reavaliação; acolhimento noturno 24 horas; dose

supervisionada; farmácia; grupos terapêuticos, dentre outras, que realizam serviço de apoio ao

usuário. (FERREIRA; VACONCELOS; TORRES, 2013).

11

Assumiu a prefeitura de Fortaleza em 2004 e permaneceu até 2013. 12

Disponível em: <http://www.opovo.com.br>. Caderno Saúde/dia 05 de abril de 2012. 13

Dr. Nilson de Moura Fé foi médico psiquiatra que fez história na saúde pública pensando a reformulação de

conceitos, com políticas de saúde inovadoras, contribuindo para a construção de uma rede de atenção integral em

saúde mental. Em sua trajetória, destacam-se a Comissão de Reforma Psiquiátrica no município de Fortaleza, o

primeiro programa de Residência Médica em Psiquiátrica do Ceará, na década de 1980, o estímulo à qualificação

de médicos clínicos em saúde mental e o apoio às Jornadas de Saúde Mental. Dr. Nilson de Moura Fé faleceu em

16 de dezembro de 2009. 14

Atual prefeito de Fortaleza. Assumiu a prefeitura no ano de 2013.

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Vale ressaltar que a Prefeitura Municipal de Fortaleza, em sua atual gestão, tem

realizado um trabalho de reestruturação do espaço físico dos equipamentos de saúde como um

todo, bem como dos equipamentos de saúde mental, sobretudo do CAPS III da SER II, fato

que confere ao equipamento uma melhoria qualitativa nesse aspecto, tendo em vista a

importância também de estar com “a casa arrumada” para acolher os pacientes em um

ambiente favorável ao seu tratamento.

O CAPS III da SER II é o cenário da pesquisa de campo realizada nesse estudo

com o grupo de assistentes sociais ativas no serviço e que compõe a equipe interdisciplinar

comprometida com a reabilitação psicossocial das pessoas com transtorno mental do território

de abrangência. No próximo tópico, apresentamos o perfil básico das assistentes sociais do

CAPS III SER II para apresentá-las e aproximar os leitores da categoria profissional analisada

nesse estudo e fundamentar as análises dos dados coletados em campo.

4.2 Perfil básico das assistentes sociais do CAPS III da SER II

Realizamos pesquisa de campo no período de outubro/2013 e novembro/2013 no

Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III da SER II com o grupo de sete assistentes sociais

ativas no serviço. Segundo Gil (2002, p. 53), no estudo de campo “o pesquisador realiza

maior parte do trabalho pessoalmente [...] e como o pesquisador apresenta nível maior de

participação, torna-se maior a probabilidade de os sujeitos oferecerem respostas mais

confiáveis.” Portanto, é importante ressaltar que os dados coletados em campo são

apresentados de forma fidedigna.

Como técnica para coleta de dados, utilizamos entrevista semiestruturada gravada

individualmente com o consentimento das profissionais do Serviço Social, sujeitos da

pesquisa. Para Gil (2002, p.117), a entrevista semiestruturada “é guiada por relação de pontos

de interesse que o entrevistador vai explorando ao longo de seu curso”. Desse modo, o perfil

básico das assistentes sociais foi traçado a partir da coleta de dados em campo, com a

aplicação de um roteiro de entrevista contendo dois tópicos.

O primeiro tópico15

aborda o perfil básico do profissional contemplando

informações sobre: a faixa etária; estado civil; naturalidade; local de residência; ano de

graduação; tipo de instituição de ensino; nível de titulação; área da primeira experiência como

assistente social; áreas que já atuaram; área que mais se identificam; tempo de atuação na

15

Ver roteiro de entrevista aplicado. Disponível em Apêndice A.

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saúde mental e tempo de atuação no CAPS III da SER II. O segundo tópico16

aborda oito

questões relacionadas à prática profissional no CAPS III da SER II.

Ressaltamos que todas as profissionais são do sexo feminino, que foi mantido o

sigilo e como forma de preservar suas identidades seus nomes não foram divulgados. Por isso,

para identificá-las utilizamos nomes de pedras preciosas, pelas características que as

diferenciam das outras pedras, pela peculiaridade de sua essência e por serem raras. Assim, é

a categoria das assistentes sociais, que se diferenciam das demais categorias pela sua

capacidade de análise crítica e reflexiva e do olhar para além da realidade, um olhar para além

do olhar das outras categorias; profissionais que têm suas peculiaridades e, se comprometidas

com a prática profissional e com o Projeto Ético Político da profissão, tornam-se profissionais

raras.

Quanto à faixa etária das entrevistadas, identificamos que as assistentes sociais

que atuam hoje17

no CAPS III da SER II estão na faixa etária entre 30 (trinta) a 55 (cinquenta

e cinco) anos, sendo que das sete entrevistadas três se encaixam no perfil de 31(trinta e um) a

40 (quarenta) anos, três no perfil de 41(quarenta e um) a 50 (cinquenta) anos e uma no perfil

acima de 50 (cinquenta) anos.

Sobre o estado civil, identificamos que das sete entrevistadas, cinco se dizem

casadas, uma solteira e uma divorciada. Quanto à naturalidade, as entrevistadas são todas

cearenses, porém, nem todas naturais de Fortaleza. Há uma profissional natural de Aquiraz –

Ceará, uma de Nova Russa – Ceará e uma de Tauá – Ceará, as demais nascidas na própria

capital.

Quanto à instituição a qual foram graduadas, todas as profissionais afirmaram que

concluíram a graduação na rede pública, pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). E

sobre os demais tópicos que contemplam o ponto um do roteiro de entrevista, apresentamos

individualmente, o perfil básico de cada assistente social a seguir:

ÀGATA – Graduada no ano de 2003, sua primeira experiência profissional como assistente

social foi na área da saúde, mas já atuou também em áreas de projetos sociais. Essa

profissional aponta que mais se identifica com a área da saúde e que atua na saúde mental há

10 meses e no CAPS III da SER II há 08 meses, pois passou dois meses em um CAPS ad.

16

Ver roteiro de entrevista aplicado. Disponível em Apêndice B. 17

Período: 12/2013.

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CRISTAL – Graduada no ano de 2000, fez especialização, mas não citou a área, teve sua

primeira experiência profissional na área da assistência e já atuou na área da habitação;

contudo, se identifica mais com a assistência social. Atua há 08 meses na saúde mental, no

CAPS III da SER II.

ESMERALDA – Graduada no ano de 2001, fez duas especializações, em Serviço Social e

Saúde da Família e em Serviço Social Trabalho e Ética Profissional. Teve sua primeira

experiência na área da saúde e já ainda atua nessa área, bem como na saúde mental há um ano

e dois meses, no CAPS III da SER II.

JADE – Graduada em 1999 fez três especializações em Saúde da Família pela Universidade

Federal do Ceará – UFC, em Psicopedagogia pela Universidade Vale do Acaraú – UVA, e

Previdência Social pela Pótere. Sua primeira experiência profissional como assistente social

foi na área da assistência e, além da assistência já atuou na saúde e na área do trabalho –

Economia Solidária. Hoje atua na saúde mental há dez meses, no CAPS III da SER II.

PÉROLA – Graduada em 1990, nascida e residente na cidade de Fortaleza – Ceará. Fez

especialização em Administração Hospitalar e a sua primeira experiência profissional como

assistente social foi na área da saúde, a única em que já atuou e, consequentemente, é a que

mais se identifica. Atua na saúde mental há um ano, no CAPS III da SER II.

SAFIRA – Graduada no ano de 1983, fez especialização na área da família e sua primeira

experiência profissional como assistente social foi na assistência social. Já atuou na área dos

Direitos Humanos e como assistente social de empresa, com desvio de função, assumindo

atividades do setor de Recursos Humanos. A profissional se identifica mais com a área dos

Direitos Humanos e atua na saúde mental há doze meses, no CAPS III da SER II.

TURQUESA - Graduada no ano de 2007.1, fez especialização, mas não citou a área. Sua

primeira experiência profissional como assistente social foi na assistência social e já atuou na

saúde, habitação e área sociojurídica, porém tem mais afinidade com a área da saúde e saúde

mental, bem como com a área sociojurídica. Atua na saúde mental há sete meses, no CAPS III

da SER II.

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Vale ressaltar que todos os profissionais do Centro de Atenção Psicossocial –

CAPS III da SER II são admitidos por seleção pública da Prefeitura, regulamentados pela

Consolidação das Leis de Trabalho - CLT, com contrato temporário de seis meses renováveis

por até dois anos, inclusive a categoria do Serviço Social. Contudo, não há na instituição

nenhum profissional servidor público.

Nesse sentido, é importante destacar também que no ano de 201118

, havia apenas

três profissionais do Serviço Social no CAPS III da SER II, em regime terceirizado pelo

ISGH – Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar. Em 2012, com a seleção da prefeitura

Municipal de Fortaleza, os profissionais terceirizados foram substituídos pelos profissionais

aprovados e, nesse contexto, foram lotados no referido CAPS sete assistentes sociais19

.

Portanto, havia uma limitação de recursos humanos que foi suprida com a contratação dos

profissionais aprovados pela seleção da prefeitura, embora que todas essas formas de

contratação não garantam a estabilidade do profissional.

4.3 A análise da prática profissional no CAPS III SER II – a partir dos dados coletados

em campo

Esse é o momento da pesquisa em que apresentamos os dados a partir das falas

dos sujeitos entrevistados. Momento em que apresentamos os resultados e discussões a partir

dos dados coletados com a pesquisa de campo. É a própria fala das assistentes sociais

entrevistadas articuladas com os estudos teóricos de autores que contribuíram para atingir o

objetivo da pesquisa.

A análise dos dados apresentados nesse momento da pesquisa será realizada a

partir do tópico 220

(dois) do roteiro de entrevista, com o objetivo de compreender a prática

profissional do Serviço Social no CAPS III da SER II a partir das falas dos sujeitos

entrevistados.

As entrevistas foram agendadas previamente de acordo com a disponibilidade de

cada profissional, obedecendo aos protocolos legais exigidos no processo, sendo realizadas na

própria instituição. Enfatizamos que as entrevistas foram individuais e aconteceu de forma

bem tranquila como uma conversa informal entre duas colegas da mesma categoria.

18

Dados coletados no período de estágio vivenciado na instituição – de 2011.2 a 2012.2. 19

Os sujeitos dessa pesquisa. 20

Ver roteiro de entrevista aplicado. Disponível em Apêndice B.

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O primeiro aspecto abordado na entrevista tem por finalidade conhecer como as

assistentes sociais compreendem sua atuação na saúde mental, mais especificamente no

equipamento CAPS. As respostas dadas a essa interrogativa foram voltadas a questão da

mediação dos direitos sociais e a intervenção do Serviço Social frente às expressões da

questão social, como especificidade da categoria e que são demandadas no serviço.

Nesse sentido, destacamos a fala de três profissionais, que representam a

compreensão de cada uma quanto à importância da atuação do Serviço Social na saúde

mental. A assistente social Ágata relata que:

O trabalho do assistente social ele é importante dentro da saúde mental porque ele

vai fazer a articulação entre família, serviço e paciente. [...] Ele não se limita a

questão saúde doença, o processo de adoecimento, ele tem uma abrangência né, um

leque que são exatamente as refrações da questão social que a gente tem que estar

preparado pra todo dia quando chegar um caso específico, uma situação

diferenciada. [...] O assistente social ele é capacitado exatamente pra lidar com

essas diferentes questões e não só o foco do processo saúde doença, e no caso

específico, doença né, transtorno mental.

Nesse sentido, compreendemos que a atuação das assistentes sociais é importante

porque a categoria profissional é capacitada com a instrumentalidade da mediação e

desenvolve suas atividades a partir de uma visão totalitária do real, transcendendo a realidade

da demanda posta, percebendo para além do contexto apresentado no cotidiano e conseguindo

articular as partes envolvidas, de modo que não se limita às particularidades, mas a totalidade

que envolve o contexto. E essa totalidade é exatamente as expressões da questão social que

envolve a história de vida dos seus usuários e que são demandadas no cotidiano do serviço.

Segundo Iamamoto (2008), para o Serviço Social a questão social é a base de sua

fundação enquanto especialização do trabalho. Por isso, os assistentes sociais, por meio de

serviços sócios assistenciais, intervêm nas relações sociais cotidianas, no atendimento as

várias expressões da questão social em que os indivíduos sociais estão envolvidos. São as

problemáticas no trabalho, na família, na luta por moradia, por terra, questões que envolvem a

saúde, a assistência, entre outras dimensões. Portanto, é a questão social que confere um

estatuto de elemento central que constitui a relação entre profissão e realidade social.

A esse respeito Turquesa esclarece que:

A importância é pelo lado social dos usuários que vem aqui, que a psiquiatria não

dá conta, a psicologia não dá conta, nem a terapia ocupacional. Então, tem um lado

que... Além da gente somar com essas outras especialidades, a gente também tem

um lado que só a gente dá conta que é esse lado social mesmo, questões familiares...

São essas interfaces que só o Serviço Social se apropria.

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Nesse contexto, percebemos que a profissional deixa claro que as expressões da

questão social são uma especificidade do Serviço Social, que nenhuma outra categoria

profissional consegue dar conta porque não tem o conhecimento especifico na área. Portanto,

as assistentes sociais somam no trabalho em equipe, tendo em vista que o processo de

adoecimento do indivíduo com transtorno mental tem relação intrínseca com as problemáticas

que envolvem seu cotidiano, ou seja, com as várias expressões da questão social que

permeiam a vida dos sujeitos, usuários do CAPS III da SER II.

Assim, o reconhecimento da questão social, como objeto de intervenção da

profissão, exige a atuação profissional em uma perspectiva totalizante, fundamentada na

identificação das determinações sociais econômicas e culturais das desigualdades sociais.

(CFESS, 2009).

Ainda em conformidade com a cartilha do CFESS (2009), a intervenção

fundamentada no aspecto teórico político pressupõe:

Leitura crítica da realidade e capacidade de identificação das condições materiais de

vida, identificação das respostas existentes no âmbito do Estado e da sociedade civil,

reconhecimento e fortalecimento dos espaços e formas de luta e organização dos

trabalhadores em defesa de seus direitos; formulação e construção coletiva, em

conjunto com os trabalhadores, de estratégias políticas e técnicas para modificação

da realidade e formulação de formas de pressão sobre o Estado, com vistas a garantir

os recursos financeiros, materiais, técnicos e humanos necessários à garantia e a

ampliação dos direitos.

Ou seja, se todas essas ações forem apreendidas pelas assistentes sociais no

cotidiano da prática profissional, certamente a categoria fará um trabalho comprometido com

o campo social e com as bases que fundamentam a profissão. O profissional do Serviço Social

deve se apropriar dessas ações para que a partir da identificação das determinações postas

pelas desigualdades sociais, demandadas no cotidiano do serviço, desenvolva seu trabalho

com uma maior compreensão do contexto sócio histórico para situar sua intervenção.

Podemos elencar em conformidade com o CFESS (2009) que as assistentes

sociais na saúde atuam em quatro grandes eixos, que são o atendimento direito aos usuários, a

mobilização, a participação e controle social, a investigação, planejamento e gestão, a

assessoria, qualificação e formação profissional.

Nesse contexto, nas atividades de atendimento direto aos usuários predominam as

ações sócio-assistenciais, ações de articulação interdisciplinar e ações socioeducativas, as

quais não ocorrem de forma isolada. Porém, integram o trabalho coletivo em saúde,

caracterizados por serem complementares e indissociáveis. (CFESS, 2009).

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Portanto, nas entrelinhas das falas das entrevistadas identificamos que as

assistentes sociais do CAPS III SER II, na saúde mental, a partir das atividades realizadas no

serviço desenvolvem as ações assistenciais e ações socioeducativas, desde os simples

acolhimentos até as mais complexas visitas domiciliares.

Também identificamos que desenvolvem ações de articulação com a equipe de

saúde, a partir do trabalho interdisciplinar, e ações do eixo de assessoria, qualificação e

formação profissional através da supervisão de estágio. Através do grupo de direitos sociais,

identificamos que as profissionais realizam atividades relacionadas ao eixo de mobilização,

participação e controle social que, em suma, são ações voltadas para a organização da

população e usuários na perspectiva de reivindicação de seus direitos e do eixo de

investigação, planejamento e gestão, o qual envolve ações de fortalecimento da gestão

democrática e participativa em prol dos usuários na garantia de seus direitos.

Ainda sobre a importância da atuação das assistentes sociais, Jade expressou da

seguinte maneira:

O papel do Serviço Social ele é importante a medida que ele dá uma melhor

condição de vida ao usuário,[...] ele pode proporcionar essa interface entre o

paciente e a família, ele pode proporcionar também uma melhor estadia enquanto

ele está internado aqui. Em relação aos pacientes que são atendidos na consulta

ambulatorial aí a intervenção do Serviço Social se dá de forma em relação a

garantia dos direitos, a gente tem muitos casos que são encaminhados pacientes pro

BPC, a questão do passe livre, então o Serviço Social ele faz essa mediação, essa

interlocução entre o usuário e o médico.

De acordo com Santos (2010), as assistentes sociais atuam nas expressões da

questão social e na mediação de direitos para atendimento às necessidades da população

usuária. Desse modo, quanto mais a categoria estiver capacitada para interpretar e apreender

as determinações sócio-históricas que surgem no cotidiano, mais terá condições para elaborar

respostas profissionais qualificadas.

Nesse sentido, para Oliveira (1998, p.84), a mediação é “uma categoria [...]

histórica no processo de trabalho do assistente social. A mediação acontece em todas as

instâncias [...] por meio dos vínculos que estabelece com as diferentes manifestações do seu

cotidiano de trabalho.” Portanto, compreendemos que as profissionais têm entendimento

sobre a importância do seu fazer profissional e se apropriam da instrumentalidade pertinente à

profissão para o desenvolvimento da prática profissional no CAPS III da SER II.

Para Lessa (2003, p.88), “o grande desafio consiste em buscar identificar e

responder as demandas que estão sendo postas ou pressupostas, tendo a preocupação de

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estabelecer o nexo com as “necessidades sociais” que estão subjacentes a elas.” E essa é a

essência de apreensão do trabalho do assistente social na busca o verdadeiro sentido.

Quanto às atribuições das assistentes sociais no CAPS III da SER II, as

entrevistadas foram quase unânimes em suas respostas e descreveram as atividades do

serviço, enfatizando que atuam em equipe interdisciplinar e que todas as categorias realizam

as mesmas atividades, salvo as demandas específicas de cada profissão, com exceção da

categoria médica.

Tendo em vista que as atribuições e competências dos profissionais de Serviço

Social são orientadas e norteadas por direitos e deveres, que constam no Código de Ética

profissional e na Lei que regulamenta a profissão, tanto os profissionais como as instituições

devem observá-los e respeitá-los. (CFESS, 2009).

Enfim, em relação às atividades realizadas, as respostas foram bem semelhantes e

repetitivas. Portanto, destacamos a fala de três profissionais para representar as respostas

apresentadas pelo grupo das entrevistadas, as quais destacaram as atividades de acolhimento,

de avaliação inicial, do acolhimento 24 (vinte e quatro) horas, visita domiciliar, respostas a

ofícios e grupos terapêuticos como atribuições desenvolvidas por toda a equipe

interdisciplinar. Em seus relatos expressaram:

No CAPS especificamente, como a gente atua em equipe interdisciplinar algumas

atividades elas são meio que coletivas [...] digamos assim, todos os profissionais de

nível superior eles desempenham as atividades, por exemplo: o acolhimento, [...]

avaliação inicial, [...] visitas domiciliares, [...] o trabalho de grupo. (ÁGATA).

Inúmeras. [...] A gente trabalha aqui com acolhimento que na realidade são feitos

por vários profissionais, um rodizio, cada dia um profissional e nesse acolhimento o

Serviço Social tem um olhar diferenciado. [...] A gente tem a avaliação inicial que é

quando o paciente chega ao CAPS pela primeira vez. [...] a gente faz visita

domiciliar. [...] A gente tem os grupos que o Serviço Social também trabalha. [...] A

questão da supervisão de estágio [...] A questão de relatórios e as demandas do 24

(vinte e quatro) horas. (JADE).

Nós assistentes sociais temos várias atribuições, dentre elas temos a avaliação

inicial. [...] Temos também outra atividade que é o acolhimento [...] Temos o

serviço do 24 (vinte e quatro) horas [...] Temos também a visita domiciliar. [...]

Temos também os grupos terapêuticos que acontecem de segunda à sexta aqui com

as assistentes sociais. [...] O assistente social também tem uma atribuição que eu

acho importante que é a supervisão de estágio. (CRISTAL)

Nesse contexto algumas profissionais também destacaram algumas atribuições

específicas do Serviço Social. É importante perceber que duas assistentes sociais, Pérola e

Turquesa, relatam com mais especificidade o papel do assistente social dentro das atividades

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coletivas. É o olhar diferenciado das profissionais frente à demanda posta no serviço. Como

evidenciam as falas a seguir:

Faz parte das nossas atribuições [...] introduzir a pessoa ao serviço, mostrar pra

eles o que o serviço oferece e fazer a ligação das pessoas aos outros serviços. [...] A

gente tem essa atribuição de passar esse tipo de orientação, bem como acolher

aquela pessoa e mostrar pra ela que ela não é só o paciente, mas que é um cidadão,

que ele não é só um doente, ele está naquele momento precisando daquele serviço,

mas ele também tem uma vida lá fora. [...] Eu acho que o nosso papel é fazer com

que eles se conscientizem cada vez mais de que eles fazem parte da sociedade, sim!

Que eles têm papel na vida, que eles podem atuar. (PÉROLA).

São nossas atribuições os atendimentos sociais que só a gente pode fazer. [...] As

visitas domiciliares também que não só o Serviço Social faz, mas o nosso olhar

quando vai pra uma visita domiciliar é diferente do olhar do psiquiatra, do

psicólogo, a gente ver coisas...para além dos outros. [...] A avaliação inicial, o

acolhimento (TURQUESA).

Desse modo, o papel do assistente social não é apenas fazer o acolhimento, o

atendimento individual, a avaliação inicial, mas acima de tudo é fazer nesse atendimento o

que é privativo da profissão, desenvolver as ações socioassistenciais e socioeducativas e fazer

a mediação do indivíduo com o serviço prestado, apresentando o que lhe é de direito

promovendo a cidadania e a reinserção social.

Nas falas das assistentes sociais entrevistadas identificamos claramente que em

sua atuação elas desenvolvem ações fundamentadas, especificamente, nos eixos das ações

socioassistenciais e socioeducativas, reconhecendo-as como atribuições próprias do Serviço

Social.

Tendo em vista que as profissionais desenvolvem sua prática dentro do trabalho

coletivo, que é proposto aos equipamentos substitutivos da saúde mental, no pós Reforma

Psiquiátrica identificamos que as atribuições demandadas ao Serviço Social, apesar de serem

atividades da coletividade, as assistentes sociais conseguem extrair nessas atividades as

especificidades do Serviço Social e direcionar seus atendimentos em conformidade com os

princípios da profissão, de forma ética e comprometida.

Segundo Guerra (2012, p. 41), “o espaço reservado ao Serviço Social, como um

ramo de especialização do trabalho coletivo, é o de dar respostas, buscar prontamente

soluções à pluralidade de questões que lhes são colocadas.” E é nesse sentido que as

assistentes sociais do CAPS III da SER II atuam: através da escuta qualificada, identificando a

demanda e buscando respostas adequadas às diversas necessidades histórico-sociais como

forma de legitimar a profissão.

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Sobre as demandas mais recorrentes para o Serviço Social no CAPS III da SER II

as assistentes sociais apresentaram:

[...] Vem muita demanda de dúvidas em relação a benefício social, BPC,

aposentadoria, quem pode e quem não tem direito, é em relação mais a questão

sócio econômica mesmo, as demandas familiares, de conflitos familiares que vem, a

própria reinserção do paciente que tá no 24 horas. (TURQUESA).

[...] A mais recorrente eu diria que são os encaminhamentos as outras instituições e

as resposta dos ofícios, uma demanda muito grande assim... ela tá sendo muito

recorrente e ele tá demandando da gente também muito tempo. (ÁGATA).

Aqui o que eles procuram mais é essa parte de aposentadoria, BPC, principalmente

BPC porque a maioria não contribui com a assistência e eles têm muito essa

confusão do que é aposentadoria do que é o BPC. A parte também de família, né.

(PÉROLA).

A questão de relatório e as demandas do 24 horas que todos os encaminhamentos

dos pacientes do 24 horas eles passam, não necessariamente, mas eles passam pelo

Serviço Social. A gente tem que sempre tá vendo lá o que cada paciente tá

precisando e o olhar do Serviço Social pros pacientes internados, acolhidos ele é

um olhar de prioridade. (JADE).

O que é mais direcionado para o Serviço Social são questões familiares, num

contexto geral. [...] Sempre mais é a questão centrada na família. [...] Então assim,

é mais quando tem algo intrinsicamente da família, relacionado com a família [...].

O atendimento do Serviço Social ele gira muito em torno dessa família [...] Os

relatórios, os ofícios quando chegam eles estão relacionados a uma demanda em

que a família está envolvida, então realmente essa é também outra demanda que é

bem específica do Serviço Social, ou seja, que ela é realmente uma demanda

colocada pra gente porque se ele precisa de uma visita, de um relatório social,

então, é claro que é o Serviço Social que tem o profissional capacitado para dar

respostas a essas demandas sociais. (ESMERALDA).

Nesse sentido, percebemos que as demandas mais recorrentes para o Serviço

Social são as relacionadas ao contexto social e, na referida instituição, as questões mais

demandadas são as que envolvem a família. As assistentes sociais atuam na perspectiva de

mediação dos direitos sociais. Nas falas acima, identificamos também que além das questões

familiares, têm as questões de dúvidas quanto aos benefícios previdenciários.

De acordo com Santos (2010), o assistente social tem plena liberdade para atuar

com indivíduos, grupos, famílias e/ou comunidade, bem como definir formas de acesso e

atividades direcionadas ao enfrentamento das expressões da questão social e da luta em prol

dos direitos, de acordo com suas atribuições e competências.

Portanto, o profissional precisa ter o conhecimento de suas atribuições e

competências para estabelecer prioridades de ações e estratégias, a partir das demandas do

cotidiano que vão sendo apresentadas pelos usuários do serviço, de dados epidemiológicos, ou

seja, fatores determinantes das doenças e da disponibilidade da equipe de saúde para

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desenvolverem ações conjuntas. (CFESS, 2009). Nesse contexto, segundo Bisneto (2010, p.

112),

O assistente social está aí colocado para atender às necessidades da Psiquiatria em

minimizar as contradições do sistema e atender à racionalidade médica no que o

mundo “psi” não dá conta: a extrema pobreza dos usuários e o estado de exclusão

social resultantes das políticas econômicas e sociais do capitalismo monopolista, do

neoliberalismo, da globalização e da reestruturação produtiva no Brasil.

Nesse sentido, o Serviço Social está posto para dar respostas às demandas da

questão social que surgem em consequência da dinâmica capitalista que rege a sociedade e

que, nesse contexto, nenhuma outra especialidade dá conta dessas questões de âmbito social e

que influem no processo de adoecimento das pessoas.

É o Serviço Social que tem o profissional capacitado para lidar com essas

demandas e contribuir com o trabalho das outras especialidades, de modo que o usuário é

tratado em sua totalidade e não somente no foco saúde doença. “O assistente social é nesse

sentido, um intelectual que contribui, junto com inúmeros outros protagonistas, na criação de

consensos na sociedade.” (IAMAMOTO, 2012, p.69).

Quanto à avaliação das profissionais sobre o trabalho interdisciplinar no CAPS III

da SER II identificamos divergências nas falas das assistentes sociais em relação a forma

como cada uma percebe esse trabalho interdisciplinar. Há profissionais que avaliam de forma

positiva, outras de forma negativa e as motivações para as variadas percepções será o alvo de

nossas análises.

Para o grupo que avalia as limitações do trabalho em equipe os relatos foram os

seguintes:

Isso depende muito não é nem das profissões que tem aqui, mas das pessoas.

Deveria ter uma abertura maior com a psicologia, mas alguns profissionais são

resistentes. Quando a gente vai com alguma demanda, um ou outro a gente

consegue resolver alguma questão mais urgente, mas alguns têm uma resistência

muito grande [...] Acho que deveria ter uma... apesar de já ter tido algumas

reuniões para rever esses casos com a psicologia a gente ainda tá tendo uma

“dificuldadezinha” pra trabalhar em conjunto. (TURQUESA).

“Eu acho que as assistentes sociais [...] a gente é um grupo bem coeso [...] a gente

procura ajudar umas as outras [...] já em relação as outras categorias eu acho

muito limitado, eles nem se ajudam entre si e nem ajudam os outros, eles são muitos

fechados. [...] não tem essa troca que eu acho que se tivesse essa troca o serviço

podia ser bem melhor do que é, muitas cabeças pensantes, muitas ideias, muitas

sugestões. A gente podia melhorar muita coisa, mas eu não vejo esse entrosamento,

cada um cuida do seu espaço cada um cuida do que tem pra fazer [...]. E o

assistente social, eu acho que pela própria dinâmica da profissão, a gente é meio

inquieto, a gente não é muito de esperar que as coisas venham, a gente é muito de ir

atrás, de ir buscar porque a gente preserva o bem estar do individuo.” (JADE).

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Eu acho que poderia ser melhor, poderia ser bem melhor... A gente poderia ter mais

estudos de casos, existem casos que realmente precisa sentar para conversar sobre

aquele paciente. Eu acho que isso ainda deixa muito a desejar. (PÉROLA).

Diante das contradições percebidas com as respostas a essa questão, percebemos

que no CAPS III da SER II as dificuldades apresentadas pelas profissionais podem estar

relacionadas ao âmbito das relações interpessoais. De acordo com Luzio (2006), muitas vezes,

as equipes não realizam reuniões para discutir o cotidiano dos serviços e, quando o fazem, as

dificuldades e divergências identificadas nos encontros são vivenciadas como conflitos

localizados no âmbito das relações pessoais afetivas, dos conflitos com a chefia ou deslocam-

se para o campo da qualificação profissional.

Segundo Boarani (2011), as dificuldades e conflitos da equipe interdisciplinar no

contexto do trabalho tem causado muito sofrimento aos profissionais, e não viabiliza qualquer

transformação na saúde mental. Desse modo, a equipe, a coordenação e os usuários precisam

de apoio para a construção do seu projeto, conhecer e problematizar seus referenciais, criar

mediações e reorganizar as formas de trabalho.

O trabalho em equipe merece ser refletido e as atribuições do profissional do

Serviço Social precisam ser especificadas e divulgadas para os demais profissionais,

resguardando-se, assim, a interdisciplinaridade como perspectiva de trabalho a ser defendida

na saúde21

.

De acordo com Oliveira e Silva (2008), para se constituir como equipe

interdisciplinar, além da presença de diferentes profissionais, há que se buscar a interlocução

com o próprio sujeito-usuário, a família e a sociedade. Enfim, não basta um conjunto de

competências diversas. Portanto, o trabalho em equipe interdisciplinar não deve ser

compreendido apenas no âmbito da instituição, mas perpassando esse contexto e se

estendendo ao complexo da sociedade na perspectiva de promover a cidadania e reinserção

dos usuários, tendo em vista ser a real proposta dos equipamentos substitutivos da saúde

mental. Segundo Boarani (2011, p.87)

Os profissionais de Saúde Mental, diante das dificuldades de se inserirem ou de se

manterem no mercado de trabalho, cada vez mais têm procurado trabalhar nos

serviços públicos sem terem, no entanto, o preparo e o comprometimento suficientes

com suas propostas e finalidades. Sabemos que a construção da Atenção

Psicossocial, por constituir-se um processo anti-hegemônico, mais do que um

preparo teórico-técnico, requer compromisso político daqueles que nele participam.

21

Portaria CFESS n. 2 de 26 de janeiro de 2009.

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Nesse contexto, não podemos descartar a possibilidade de profissionais da equipe

que trabalham insatisfeitos e que por isso não se comprometem com as propostas do CAPS e

passam a desenvolver uma prática pragmática, ou seja, o fazer por fazer, o fazer para cumprir

obrigações e normas. Essa insatisfação pode estar relacionada às consequências da

consolidação do projeto neoliberal em curso no País, mais precisamente no mundo do

trabalho. A exclusão de parcela da população do mercado de trabalho, a precarização das

condições de trabalho, a fragilização da organização dos trabalhadores, tudo isso têm

produzido consequências negativas nas condições de vida e de saúde da população.

(BOARANI, 2011).

Para o grupo que considera positivo o trabalho da equipe interdisciplinar os

relatos foram bem diferenciados das anteriores, porém, bem semelhantes entre si, conforme

apresentamos:

[...] Esse trabalho interdisciplinar é muito positivo e os profissionais aqui eu os

percebo bem soltos no sentido de se dispor mesmo nesse aspecto de compreender o

espaço do outro, a visão do outro profissional, de respeitar, de ouvir né, então eu

acho que isso é muito bom aqui dentro. Eu não tenho tido dificuldade em relação a

isso [...] (SAFIRA).

Eu vejo assim que a equipe... os outros profissionais são muito disponíveis para dar

um apoio uns aos outros. Eu vejo isso, porque, por exemplo, as vezes eu estou num

atendimento que eu tenho dúvida eu sei que eu posso recorrer a qualquer outro

profissional de outra categoria e pedir a opinião dele, pedir a ajuda dele[...]. Então

eu acho que aqui no CAPS a gente tem uma parceria bem legal com os outros

profissionais. (ESMERALDA).

Eu avalio de forma positiva, nunca tive conflitos com profissionais de outras áreas

não! Quando eu tenho dificuldade de identificar se o paciente é perfil CAPS ou não

eu procuro o psicólogo que já tem mais experiência que eu e percebo que flui muito

bem essa comunicação, esse contato, essa troca de experiência quando a

dificuldade aparece [...] eu percebo que flui muito bem não tenho nada a

acrescentar de forma negativa. (CRISTAL).

Eu acho que apesar da gente ter uma demanda muito grande a equipe é boa sabe, a

gente tem essa abertura na interdisciplinaridade, a gente sempre tá discutindo os

casos né, infelizmente a gente tem um problema em relação a agenda da psicologia

que é uma agenda muito cheia pra gente atender, a nossa demanda é muito grande,

mas a gente tem conseguido em alguns casos específicos colocar para um psicólogo

que tem mais perfil [...]. Eu tenho conseguido essa abertura com os colegas, das

outras categorias. É muito bom, eu avalio positivamente. (ÁGATA).

Nesse sentido podemos concluir que as percepções são muito relativas de

profissional para profissional, devido às afinidades de cada profissional com os membros da

equipe interdisciplinar, e que é importante se ter essa abertura apresentadas pelas profissionais

e o bom relacionamento com a equipe interdisciplinar, pois as ações desenvolvidas em equipe

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refletem no bom desempenho das atividades no CAPS e consequentemente nas ações voltadas

para a recuperação e promoção dos usuários.

Sobre os equipamentos substitutivos da Saúde Mental as assistentes sociais do

CAPS III da SER II, em seus relatos, percebem a importância, mas também as limitações

existentes nessa área da saúde. E sobre isso expressa:

É complicado [...].os equipamentos são bons, mas o olhar das pessoas é que não

mudou em relação a isso. [...] A verdade em relação à mudança... eles só saíram de

um lugar maior, mais aberto, com mais pacientes para um local menor com menos

pacientes e que parece uma casa que muitas vezes é realmente só uma aparência

por conta das paredes e dos muros, não muda muita coisa.[...] (TURQUESA).

Essa profissional tem uma percepção negativa e pouco ampliada sobre os novos

equipamentos, de modo geral, pois deixa claro que houve apenas uma mudança de local.

Nesse aspecto, discordamos dessa percepção, tendo em vista que em relação ao modelo

manicomial que se tinha antes do movimento da Reforma Psiquiátrica, hoje a assistência

oferecida aos pacientes com transtorno mental é consideravelmente melhor, de modo que os

usuários saíram do contexto da clausura, do aprisionamento e do tratamento medicamentoso

para uma assistência em liberdade que envolve não somente o tratamento com medicamentos,

mas também ações de estimulo ao bom convívio social, apesar de concordarmos com as

limitações existentes nesse contexto.

Segundo Boarani (2011), o processo de desinstitucionalização na Saúde Mental

reconstrói o pensamento de uma época que exige mais participação, compromisso e inclusão,

na perspectiva de romper com o pensamento que naturaliza o atendimento à pessoa com

transtorno mental de forma asilar e manicomial. Portanto, consideramos que os novos

equipamentos de Saúde Mental têm feito a diferença nesse contexto, oferecendo um

tratamento de forma a promover os usuários do serviço.

Nesse sentido, para enfatizar nossa compreensão a esse respeito destacamos fala

da assistente social Ágata, que considera a importância dos equipamentos da Saúde Mental

mesmo percebendo as inúmeras limitações do serviço, conforme expressa:

[...] Foi muito importante pra saúde mental, como um todo essa mudança de

paradigma, essa mudança de visão, essa quebra do comodismo [...].Assim, tem

muitas dificuldades ainda, ainda precisa ser investido muito na saúde como um

todo, desde a atenção básica até os CAPS especificamente, né, hospital mental,

CAPS, residências terapêuticas ainda precisam de muito investimento, muitas

capacitações para os profissionais para se chegar a um patamar de excelência, mas

que pela mudança como tudo aconteceu e está acontecendo e se encaminhando eu

acho positivo. Precisa melhorar? Precisa, não é excelência, têm algumas

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dificuldades a gente sabe né, mas dos moldes que estava antes para hoje eu acho

que deu um salto assim qualitativo fantástico. (ÁGATA).

A esse respeito, Oliveira e Alessi (2005) acrescentam que a Reforma Psiquiátrica

apresenta um novo olhar teórico assistencial na saúde mental à medida que define o sujeito

que sofre com transtorno mental como não necessitado de interdição a partir da proposta de

substituição dos antigos modelos pelas instituições abertas e inseridas socialmente, não

excludentes e não violentas no trato pessoal e social com os usuários, que mantém as relações

de poder no sentido horizontal e trabalho coletivo - incluindo os usuários, sua família e a

comunidade -, desenvolvendo práticas técnico-assistenciais adequadas e para além da

medicalização dos sintomas, com a finalidade promover a autonomia afetiva e material da

pessoa para as relações pessoais, familiares e sociais.

Na fala da assistente social Pérola e, posteriormente, na fala da assistente social

Safira, cada profissional expressa sua percepção nesse aspecto e faz a relação do tratamento

oferecido no serviço aderido ao convívio familiar, relatando a importância dessa

complementação para os resultados do tratamento e recuperação dos usuários. As

profissionais assim se expressam quanto aos novos equipamentos da saúde mental.

[...] Deu uma qualidade de vida muito maior pra quem usa pra quem necessita

porque ele pode tá em casa né? Pode tá no seu local, no local que é pra se sentir

seguro que é em casa, ao invés de tá trancafiado, isolado, longe como se fosse assim

um braço cortado né, eu acho que teve a parte da inclusão social dessas pessoas,

muito valido, pena que sejam poucos. [...] É muito válido, é muito, muito válido,

você já imaginou uma pessoa sair de dentro de um hospital e puder ir pra casa,

ficar recebendo a medicação em casa, eu acho que até as crises são mais

espaçadas, principalmente aqueles que têm apoio da família. (PÉROLA).

[...] É um modelo bem mais humano, não resta dúvida que é bem mais estendido no

sentido de contemplar melhor as necessidades dos pacientes, de possibilitar o

paciente nessa coisa da interlocução com a família, com os outros serviços, com

outros profissionais, com outras instituições. [...] Eu acho que tá tendo um

diferencial por isso né, por serem espaços mais abertos e terem essa coisa da

permeabilidade entre o espaço e as outras composições da sociedade. (SAFIRA).

Desse modo, percebemos pela fala das profissionais que elas compreendem as

propostas dos CAPS e reconhecem a sua importância para a melhoria da qualidade de vida

dos usuários. De fato, expressam com propriedade a importância desse tratamento em

liberdade, o quanto é válido e que traz retornos significativos aos usuários, fazendo a grande

diferença em relação aos antigos modelos de assistência asilar.

Conforme Ribeiro e Farias (2010, p.136) “a reestruturação da assistência

psiquiátrica preconiza alternativas de compreensão sobre a loucura, tendo no serviço social

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uma das profissões com formação e competência para intervir nessa área”. Nesse sentido, as

profissionais expressam o quanto os novos equipamentos têm sanado lacunas dos antigos

modelos ao apresentarem que é uma rede ampliada e que contemplam melhor as necessidades

dos usuários, fazendo diferença e reforçando o novo paradigma da Saúde Mental. Isso mostra

que as assistentes sociais do CAPS têm conhecimento das propostas dos novos equipamentos.

Segundo Pitta (2011), o sucesso da Reforma consiste na compreensão da

necessidade de construção de uma abrangente rede de cuidados para manter a existência de

pessoas/usuários/pacientes em tratamento e que, sem esse novo contexto, estariam destinados

a perambular pelas ruas em condição de abandono ou a vegetar em manicômios nos longos

períodos de internação. Para enfatizar esse pensamento a assistente social Cristal em seu

relato diz:

Hoje a gente percebe com grande avanço na saúde mental em geral, porque antes

era um sistema fechado, prisioneiro, não tinha uma situação de acolhimento de

família, de contato familiar, o paciente era muito isolado e a partir do momento que

surgiram os CAPS e as residências terapêuticas com certeza... a gente já ouviu

muitos relatos de pacientes colocando que eles estão se sentindo muito mais... que a

saúde está muito mais próxima do que antes quando estavam presos naqueles

hospitais de saúde mental, era uma situação muito fechada, sem contato com o

mundo, sem contato com outros profissionais, sem ouvir, sem participar de grupo,

de outras oficinas. Os pacientes antes não tinham visão de futuro e hoje com essas

instituições a gente percebe que eles estão conseguindo resgatar muito mais sua

saúde mental e sua cidadania. O exercício da cidadania está muito mais próximo

pra eles. (CRISTAL).

Na fala de Cristal ela retrata as mudanças no contexto da saúde mental após a

substituição dos antigos modelos de assistência psiquiátrica para o novo modelo pautado no

tratamento oferecido especificamente pelos CAPS. Considera com grande avanço se

comparado ao que se tinha antes. Portanto, essa profissional tem conhecimento da proposta

essencial dos CAPS e reconhece que as mudanças são consideráveis e que têm feito a

diferença na vida dos usuários à medida que os aproximam do exercício da cidadania, que é

uma das propostas dos novos equipamentos da saúde mental.

Nesse sentido, reconhecemos que as limitações nesses espaços são presentes e

relevantes, tendo em vista que as propostas não são de fato efetivadas como deveriam e

ninguém melhor para apresentar essa realidade do que os próprios profissionais que atuam nos

equipamentos de Saúde Mental. Assim, destacamos a fala de Jade e Esmeralda que em seus

discursos relatam que:

[...] Os novos equipamentos têm contribuído, mas não dão conta, eles não suprem a

demanda, ele não dá conta da demanda posta. [...] A legislação ela é muito clara, o

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paciente ele tem que ser visto pelo psiquiatra a cada dois meses no máximo e a

gente tá marcando consulta pra três meses, três meses e meio, então isso mostra que

o equipamento não supri a carência, é importante, é interessante essa questão dos

CAPS, das residências só que a quantidade é insuficiente pra demanda. (JADE).

Os equipamentos têm que melhorar muito. Muita coisa mudou, muita coisa

melhorou, mas ainda precisa mudar, muitas coisas precisam melhorar [...]. Mas eu

vejo assim, que gradativamente as coisas estão melhorando, e eu espero que

melhore mais ainda porque só quem sai ganhando é o cidadão [...]

(ESMERALDA).

Na visão das assistentes sociais os objetivos dos equipamentos substitutivos da

Saúde Mental ainda não são conhecidos por parcela da sociedade, nem mesmo por alguns

usuários e familiares que dele precisam e, se conhecem, não direcionam um olhar aberto,

diferenciado do modelo manicomial, o que dificulta a relação usuário-serviço- sociedade na

perspectiva da efetivação das propostas dos equipamentos substitutivos. Nesse sentido, a

assistente social Ágata reforça que “tá sendo muito difícil colocar na cabeça da família essa

nova ordem que foi construída, essa luta, essa nova visão da saúde em que os pacientes têm

que realmente ter o convívio social.”

Quanto aos desafios enfrentados pelas assistentes sociais na instituição,

percebemos que há percepções diferenciadas por parte da cada profissional. A assistente

social Pérola quando indagada sobre os desafios, assim se expressa:

Agora você me pegou. De um modo geral a coordenação é muito aberta a novas

ideias, eu acho que... Eu pelo ao menos estou muito satisfeita. O que poderia ser

melhor? Essa parte da socialização das ideias, da equipe interdisciplinar. Acho que

poderia melhorar o aspecto físico [...], essa parte física deixa muito a desejar, acho

que daqui é o pior. As próprias políticas públicas poderiam ser melhores, mas isso

não é do âmbito do CAPS, é geral [...]. Esse CAPS é muito bom de trabalhar, você

tem uma liberdade boa, as ideias são bem aceitas.”(PÉROLA).

Essa profissional reconhece a abertura dada pela coordenação e expressa sua

satisfação no CAPS III da SER II. Considera pontos que precisam melhorar e enfatiza, de

modo geral, que há limitações das próprias políticas públicas, deixando subentendido que esse

fato pode justificar os desafios postos no cotidiano da instituição e as limitações do sistema de

saúde pública.

Em nossa análise, percebemos que Pérola se limitou em sua resposta, se

compararmos com as respostas das demais profissionais. Com isso compreendemos a

subjetividade da profissional que, em determinado momento da entrevista, relata que é a sua

primeira experiência no serviço público, pois sempre atuou na rede privada. Por outro lado,

percebemos que por conhecer o público e o privado a profissional tem uma compreensão

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neutra, e responde de forma ética, tendo em vista que poderia apresentar sua resposta tendo

como parâmetro o serviço privado, com isso percebendo inúmeras limitações do serviço

público.

Outro elemento que pode ser analisado a partir dessa fala é o fato da precarização

do trabalho, ou seja, a contratação - por meio de seleção - dos profissionais do serviço, que

não garante nenhuma estabilidade profissional na instituição, podendo gerar o pensamento de

que, por isso, não se pode discordar de muitas coisas, nem, literalmente, bater de frente com a

gestão e nem falar demais para não correr o risco de perder o espaço. Por isso, por vezes é

mais viável concordar em certos pontos, mas com o cuidado para não infringir os

fundamentos e princípios da profissão.

No contexto das falas trazidas pelas demais profissionais é possível observarmos

que há desafios relevantes que de fato dificultam o trabalho da categoria no CAPS III SER II.

Vejamos os relatos:

O trabalho com a equipe interdisciplinar é um desafio [...] Tudo que ninguém quer

resolver manda para o Serviço Social, o setor da resolução de problemas. [...] A

gente as vezes se depara com pessoas que têm uma formação familiar que acaba

refletindo na sua vida profissional, com postura de individualidade, autoritarismo e

a gente enquanto profissional se depara com essas categorias.” A gente não tem um

espaço que seja a sala do Serviço Social, a gente tem o espaço físico, mas ele não

acontece efetivamente. [...] a gente vai atendendo aonde dá, aonde tem espaço,

aonde não tem a gente atende na cozinha, e aí eu me pergunto: e o sigilo

profissional, né? E o nosso código de ética que prevê o sigilo profissional? Aonde é

que fica esse sigilo? E a privacidade do paciente? Então, eu acho que é uma outra

problemática que a gente enfrenta.” (JADE).

São vários, né? Desde a aceitação do local para a gente ficar como sendo o Serviço

Social foi complicado, a gente pegou essa sala meio que na marra e foi ficando, foi

ficando e colocando o nosso nome e se “apossando” do local pra dizer assim: é

nossa sala! Os nossos atendimentos são feitos lá, tem que ser sigilosos, a gente não

pode estar aqui correndo pra cima e pra baixo com o paciente como muitas vezes a

gente atendeu até na cozinha por falta de espaço. [...] São os ofícios que chegam

aqui pra gente e temos que responder e muitas vezes são demandas que outros

profissionais tem que responder. Está lá escrito que quer tal profissional e tal

profissional e vem para o Serviço Social e a gente tem que se desgastar com o outro

profissional [...]. Então assim, acaba gerando um atrito. (TURQUESA).

Nesse contexto, Jade apresenta inicialmente que não há o entendimento por parte

da equipe interdisciplinar sobre o que é atribuição específica do Serviço Social, de modo que

tudo que ninguém resolve manda para o Serviço Social. Já Pérola, em outro momento,

enfatiza: “a gente é vista como aquela pessoa que resolve tudo e nem sempre a gente pode

fazer isso porque a gente tem que se utilizar das políticas e nem sempre as políticas abrangem

aquela solicitação deles.”

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Assim como Turquesa, ao final de sua fala, apresenta que há demandas que vão

para o Serviço Social a partir de outros profissionais. Desse modo, cabe ao profissional se

impor e atuar na perspectiva de efetivação de uma prática comprometida com os pilares que

fundamentam sua atuação. De fato, é um grande desafio.

O assistente social tem tido, muitas vezes, dificuldades de compreensão por parte

da equipe de saúde quanto suas atribuições e competências frente à dinâmica de trabalho

apresentada nas unidades de saúde determinadas pelas pressões com relação à demanda e à

fragmentação do trabalho ainda existente. Porém, essas dificuldades devem impulsionar a

realização de reuniões e debates entre as diversas categorias profissionais para o

esclarecimento de suas ações e estabelecimento de rotinas e planos de trabalho. (CFESS,

2009).

Jade e Turquesa apontam para a problemática do espaço físico e, com isso, a

dificuldade de realizar uma prática que garanta o sigilo profissional. O que identificamos

nesse contexto é que há a necessidade de uma reorganização e de planejamento na instituição,

na perspectiva de formular estratégias para sanar ou amenizar as limitações que dificultam o

trabalho das profissionais na instituição, embora seja importante lembrar que houve mudança

de gestão a qual tenta reorganizar o serviço a partir das lacunas deixadas pela gestão anterior.

Nesse contexto, abrimos um parêntese para esclarecer que hoje o grupo de

assistentes sociais do CAPS III da SER II tem feito a diferença nesse espaço, embora ainda de

forma tímida. Mas, no período das entrevistas de campo, percebemos que mudanças

aconteceram no seio da categoria se comparada com o período da gestão anterior, no sentido

de se articularem para definir, registrar e documentar as ações desenvolvidas pelo Serviço

Social como forma de efetivar a profissão no contexto geral da instituição e como fruto dessa

mobilização e articulação da categoria, surgindo, assim, o primeiro plano terapêutico do

Serviço Social no CAPS III da SER II, elaborado pelas próprias assistentes sociais e

instigadas pela indefinição do papel do Serviço Social na instituição. Para ilustrar esse

parêntese aberto apresentamos esse trecho da fala de Ágata:

Às vezes a gente faz um trabalho belíssimo, mas a gente não senta pra registrar, pra

oficializar, pra apresentar, pra dar visibilidade, então eu acho que a gente tem que

se organizar mais nesse sentido [...] E é a partir disso que as pessoas fazem aquela

pergunta: O que é que o Serviço Social faz? E aí pra isso a gente está sempre

criando instrumentos de mostrar o trabalho, os planos de trabalho, eu acho que o

desafio é esse. Falta a gente ter esse tempo de pensar mais... a gente tá muito assim

no agir, na rotina, no motor ligado, no imediato e a gente tem que parar, criar um

projeto, vamos pensar em um projeto das atribuições [...]. Então, é isso que falta

pra gente, mas a gente tá caminhando, a gente já tá montando devagarzinho mesmo

na correria do dia a dia. E eu já consegui montar o plano de trabalho com as

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meninas, a gente já conseguiu estabelecer algumas atividades privativas, alguns

grupos, algumas rotinas [...], a gente já tá construindo também os POPs, Então,

tudo isso é o trabalho que vai se somando a nossa rotina diária. (ÁGATA).

Partindo para o que diz o Código de ética da profissão, dos direitos e das

responsabilidades gerais do assistente social, o artigo 2º apresenta que constituem direitos do

assistente social a “Inviolabilidade do local de trabalho e respectivos arquivos e

documentação garantindo o sigilo profissional22

” e a “ampla autonomia no exercício da

profissão, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais incompatíveis com as suas

atribuições cargos ou funções.23

Assim, o que leva as profissionais a atenderem na cozinha, sabendo que o Código

de ética trata da inviolabilidade do local de trabalho, é somente o compromisso com o seu

usuário que nada tem a ver com as limitações do equipamento. O Código de Ética também

deixa claro que o profissional tem ampla autonomia no exercício da profissão. Portanto, como

nem tudo que vai para o Serviço Social é compatível com suas atribuições e as assistentes

sociais não são obrigadas a prestar o serviço exigido ou demandado pelo equipamento ou por

outra categoria.

Observamos que a profissional Jade demonstrou preocupação no cumprimento de

suas atribuições privativas diante das limitações apresentadas no contexto da instituição,

considerando como desafio relevante a questão da garantia do sigilo profissional. Desse

modo, no contexto apresentado nas falas de Jade e Turquesa percebemos que há uma grave

falha que fere o Código de ética da profissão no âmbito da inviolabilidade do local de

trabalho, já que não há um espaço físico reservado para o trabalho do assistente social e no

âmbito da ampla autonomia no exercício da profissão, quando demandam tudo que ninguém

resolve para o Serviço Social.

Ainda em conformidade com o Código de Ética, das relações com as instituições

empregadoras e outras, o artigo 7º apresenta que constituem direitos do assistente social

“dispor de condições de trabalho condignas, seja em entidade pública ou privada, de forma a

garantir a qualidade do exercício profissional.24

” Do sigilo profissional, o artigo 15º apresenta

que constitui direito do assistente social manter o sigilo profissional.

22

Item “d” do Art. 2º. 23

Item “h” do Art. 2º. 24

Item “a” do Art. 7º.

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Em contrapartida, Safira e Esmeralda pontuam como desafio as dificuldades de

acesso dos usuários nos outros equipamentos de saúde que complementam seu tratamento e as

limitações existentes para o acesso das políticas públicas, bem como na busca de seus direitos.

Em suas falas relataram:

Acho que é um desafio para a gente a aproximação com esses outros espaços, no

sentido de, alguns pacientes, por exemplo, que não são perfil nosso que a gente

possa encaminhar pra outros espaços e que possa ser desenvolvido trabalho com

esse paciente. [...] A demanda é elaborar estratégias para facilitação de acesso dos

nossos pacientes nesses outros equipamentos. [...] Acho um grande desafio do

Serviço Social. (SAFIRA).

São vários né. É um desafio pra gente quando você precisa fazer um

encaminhamento desse sujeito pra buscar um direito dele e você saber que ele não

vai conseguir, você está encaminhando e tudo porque você não pode tirar as

esperanças dessa pessoa. (ESMERALDA).

De acordo com Lessa (2003, p. 87), sobre a atuação do assistente social na área da

saúde, “o profissional se insere no processo de trabalho como agente de integração ou elo

orgânico entre os diversos níveis do SUS e entre este e outras políticas sociais.” Entretanto, as

dificuldades são pertinentes às deficiências do sistema de saúde pública vigente no País.

Ainda segundo Lessa (2003), nesse contexto, o produto principal do trabalho do

assistente social é a recomposição da integralidade das ações do sistema, embora com as

dificuldades e limitações no percurso, tendo em vista que o trabalho do assistente social no

SUS tem sido permeado de contradições, dificuldades de funcionamento e a falta de

resolutividade do sistema de saúde.

Diante dos desafios apresentados pelas profissionais entrevistadas, indagamos

sobre os desafios mais relevantes na prática profissional no CAPS III SER II e que dificultam

a efetivação dos princípios que norteiam a profissão. As profissionais apresentaram desafios

quanto ao sigilo profissional, o acesso aos serviços complementares, as limitações logísticas e

a indefinição do trabalho do Serviço Social.

Tendo em vista que a profissão do Serviço Social está amparada pelo Projeto

Ético Político como instrumental que norteia a profissão no seu fazer profissional e está

fundamentado pelo Código de Ética da Profissão - pela Lei que Regulamenta a Profissão e

pelas Resoluções e Diretrizes Curriculares - é importante enfatizar que as assistentes sociais

têm todo um aparato legal que respalda a sua prática profissional.

As Resoluções contribuem para favorecer as condições de trabalho à medida que

regulamentam temas presentes no cotidiano profissional com o objetivo de garantia das

competências e atribuições profissionais e das condições ética e técnicas para o exercício

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profissional do assistente social. (SANTOS, 2010). Desse modo, é a partir dos elementos que

constituem esses aparatos legais que a prática profissional do Serviço Social deve se

fundamentar para o desenvolvimento de uma prática comprometida com a efetivação da

profissão. Portanto, as profissionais devem estar sempre em observância dos seus princípios

éticos políticos para evitar a prática pragmática.

Diante desse esclarecimento percebemos que a maioria das profissionais do CAPS

III da SER II têm propriedade sobre o conteúdo desses documentos legais e reconhecem na

instituição os desafios relevantes para a efetivação de uma prática comprometida.

Apontando o sigilo profissional como desafio relevante, a assistente social Jade

apresenta a sua inquietação da seguinte forma:

O sigilo profissional acho que é um grande desafio. Você atender de forma que você

garanta àquele usuário o sigilo das informações porque as salas não têm trancas,

tem sempre alguém batendo, sempre alguém utilizando aquele espaço, você não

consegue em alguns momentos garantir esse sigilo, não por negligência

profissional, mas porque a própria instituição ela não dá condições. [...] (JADE).

Percebemos que Jade tem claramente o conhecimento dos direitos e deveres do

assistente social que está contido no Código de Ética da profissão no que se refere à garantia

do sigilo profissional e se angustia com as condições postas na instituição, as quais não

garantem o compromisso do profissional na busca de manter esse direito do usuário. Nesse

aspecto destacamos que somente essa assistente social apresentou o sigilo profissional como

desafio relevante.

Quanto ao desafio do acesso aos serviços complementares de saúde e das

limitações logísticas, destacamos as falas de Safira, Esmeralda, Cristal e Ágata que relatam:

Eu acho que é essa coisa da disponibilização desses serviços complementares

[...].Que eles aconteçam de uma forma bem efetiva [...]. Acho que é o desafio mais

relevante... que se institucionalize alguns espaços para consecção dessa

complementação do nosso serviço. (SAFIRA).

É realmente um desafio estar fazendo esses encaminhamentos, saber se realmente a

demanda e a necessidade daquela pessoa foi atendida, então isso é um desafio

muito grande para o assistente social porque nós trabalhamos com políticas

públicas e as políticas públicas são muito fragmentadas, o que hoje é resolvido em

determinado local, amanhã poderá não ser e aí o cuidado que o profissional tem

que ter de estar encaminhando esse sujeito para o local que ele poderá ser ouvido e

dar andamento ao atendimento de sua demanda, mas pra isso exige que o

profissional seja comprometido [...] (ESMERALDA).

Esse desafio da dificuldade material e de expediente para fazer acontecer os

grupos, se houvesse essa providencia facilitaria muito mais, e sobre o instrumental

de resposta dos outros equipamentos, de outras políticas [...] que é tão importante

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para o serviço esses instrumentais de referência e contra referência. [...].

(CRISTAL).

A gente esbarra mais na questão logística da coisa, sabe, pela desestruturação da

saúde de uma forma geral, eu diria logisticamente, por exemplo, número de pessoal

insuficiente, computadores, motorista, carro disponível, eu acho que há mais um

problema logístico agora o fazer profissional na nossa autonomia de fazer

encaminhamento ou decidir determinados casos ou dar determinadas respostas [...]

Eu acho que o nosso fazer profissional, eu acho tranquilo, assim a gente tem

bastante autonomia pra essas questões e esbarra mesmo na logística da

problemática da instituição porque ela tem muitos problemas nessa ordem né [...]

(ÁGATA).

Ao analisarmos a problemática de acesso aos equipamentos de referência e contra

referência, ou seja, os equipamentos complementares da saúde, podemos considerar que as

limitações nos serviços públicos são consequências da conjuntura neoliberal da sociedade

capitalista que, para Iamamoto (2007, p. 160), “amplia-se cada vez mais, a seletividade dos

atendimentos, fazendo com que a proclamada universalização dos direitos sociais se torne

letra morta.”

Portanto, concordamos que esse é de fato um desafio relevante, e que os

equipamentos da Saúde Mental devem funcionar na perspectiva da intersetorialidade, ou seja,

pautadas nas articulações entre sujeitos e setores sociais diversos. Porém, há as dificuldades

de efetivação das políticas intersetoriais devido à precariedade dos serviços públicos. Nesse

debate, segundo Iamamoto (2007, p. 161):

É essa realidade de precariedade dos serviços públicos que enfrentamos e da qual

temos de partir no cotidiano profissional, não podendo deixar que ela nos asfixie.

Não temos de ser necessariamente levados ao imobilismo, à descrença, à desilusão

profissional. Há que superar essa posição fatalista, como também àquelas visões

idealizadas [...]

Portanto, a precariedade dos serviços públicos faz parte dos desafios postos pela

lógica capitalista em todas as esferas e o profissional deve manter uma postura de superação,

fazer a mediação necessária, utilizar as possibilidades oferecidas, fazer articulações devidas,

mas não se frustrar, mas compreender o contexto da sociedade que incide para pertinência das

limitações nesse campo.

E sobre as limitações logísticas, Ágata, em sua fala, reconhece como desafio

relevante, cita o que considera como limitação logística e associa à desestruturação da saúde

como um todo, ou seja, não considera uma problemática particular do CAPS III da SER II,

mas em âmbito geral, o que converge ao ponto da precariedade dos serviços públicos.

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Nesse aspecto concordamos parcialmente que essa problemática é de ordem geral,

no contexto da saúde pública, mas também consideramos uma problemática da instituição

relacionada à falta de planejamento, organização e mobilização, por parte da gestão, na

perspectiva de suprir as necessidades de recursos que possibilitem o trabalho da equipe.

Ainda nesse contexto dos desafios, apenas uma profissional considera que não há

desafio relevante que dificulte a prática profissional na instituição. Assim se expressa:

Não, não acho que desses que eu citei dificulte o trabalho do Serviço Social não,

poderia ser bem melhor, mas dificultar não, não pára, não fica estagnado. O

trabalho do Serviço Social vai continuando, mas poderia ser melhor? A gente

poderia ter um local de trabalho mais favorável? Poderia. (PÉROLA).

Em nossa análise, percebemos uma contradição na fala da entrevistada. Pérola tem

a percepção de que poderia ser melhor, mas não considera que os desafios existentes

dificultem a sua atuação. Portanto, compreendemos os desafios como algo que, ao dificultar

os meios, exige mais esforço para se conseguir determinados objetivos. É difícil considerar

que os desafios existentes não dificultem o trabalho do profissional na instituição em alguma

intensidade.

Para Turquesa, a indefinição do trabalho do Serviço Social é um desafio relevante

e, acrescentamos que assim, em sua fala reconhece como desafio:

A nossa própria prática profissional [...]. Nós mesmos temos que ter uma visão do

que é o nosso trabalho aqui dentro, o que temos que fazer, o que é atribuição nossa.

A gente tem que realmente sentar, discutir entre nós, entre os setores e realmente

criar... nós temos o Serviço Social do CAPS, o que esse Serviço Social faz? E

quantificar isso. [...] Então a gente tem que criar formas que se efetivem porque a

gente só discutiu, conversou e até agora ninguém começou. (TURQUESA).

Nesse momento, a referida assistente social demonstra sua inquietação sobre a

indefinição do papel do Serviço Social, considerando como desafio relevante e, ao mesmo

tempo, sabe o que é necessário fazer para efetivar o seu trabalho e reconhece que as ações

permanecem estagnadas no âmbito das discussões entre elas. Para Iamamoto (2007, p. 161)

“Este quadro tem sido fonte de angústias e questionamentos sobre o nosso papel profissional,

diante das dificuldades de criar, recriar e implementar propostas de trabalho.”

Sobre as atividades realizadas pelo assistente social, identificamos que há uma

diversidade e uma heterogeneidade das ações desenvolvidas no CAPS III da SER II. De

acordo com Lessa (2003, p. 86-87), “diante da quantidade e da variedade de ações, uma

parcela significativa dos profissionais sente dificuldade em identificar o que é o Serviço

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Social e o que faz o assistente social.” E é a partir desse contexto e diante da realidade

apresentada pelas profissionais que somos instigadas a concordar com a autora, nesse aspecto.

Portanto, diante das realidades apresentadas, concluímos que os desafios são

constantes e devem ser vistos na perspectiva de crescimento e superação, instigando as

profissionais na busca de alternativas criativas e estratégicas para direcionar sua ação

profissional fundamentada no Projeto Ético Político da profissão.

Sobre as motivações para atuarem no CAPS III da SER II as assistentes sociais

fazem relatos sobre a satisfação profissional frente: ao retorno recebido dos usuários; os

resultados apresentados por eles; o vínculo construído na convivência com os usuários; a

contribuição do Serviço Social nesse processo de recuperação; promoção e reinserção social

dos usuários; a relação com as diversas situações que acrescentam o trabalho das

profissionais; a felicidade e realização profissional que sentem com o trabalho de mediação

dos direitos, quando percebem os resultados obtidos; enfim, o que motiva é o cotidiano, a

vivência com os usuários e a contribuição dada à eles a partir do seu trabalho.

Nesse contexto, para ilustrar as motivações das profissionais no CAPS

apresentamos abaixo as falas de algumas delas:

[...] o serviço vai lhe absorvendo de um jeito que você não tem como não gostar,

são várias histórias, são várias pessoas cada uma com a sua individualidade e você

não tem como não gostar disso, acompanhar a evolução do paciente, então você vê

que efetivamente as coisas acontecem e você acaba tendo uma resposta do seu

trabalho, então é isso que me motiva a ficar aqui. Querendo ou não você acaba

criando um vínculo com os pacientes e vendo que tem algum resultado, não é aquele

trabalho de enxugar gelo como em alguns outros locais a gente tem. (TURQUESA).

[...] o que mais motiva é você puder perceber que você tá contribuindo de alguma

forma pra melhorar a vida daquela pessoa, do paciente ou da família, de um

encaminhamento que você faz gerou uma expectativa, a expectativa foi alcançada e

ele conseguiu uma melhora do quadro clínico ou conseguiu realmente o auxilio que

ele tanto tava precisando pra melhorar a renda da família, então assim, isso

gratifica você. (ÁGATA).

Ah, o que motiva assim é quando você percebe que um atendimento que você fez a

um determinado usuário... [...] quando você percebe que a sua intervenção motivou

para o avanço na saúde dele e que ele está superando aquela dificuldade de quando

ele entrou para o serviço, e você percebe que ele está tendo grandes avanços e está

superando aquela dificuldade e ele dá um depoimento num grupo reconhecendo que

o serviço mudou sua vida. [...] (CRISTAL).

[...] Hoje eu posso dizer que o que me motiva é esse meu dia a dia, essa minha

vivência aqui dentro da instituição junto com os pacientes, junto com as famílias e

mesmo diante das dificuldades existentes na rede como um todo, eu saber que posso

dar minha contribuição. [...] (ESMERALDA).

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Todas as profissionais de alguma forma apresentaram suas motivações, mesmo

diante das dificuldades, limitações e insatisfações existentes no cotidiano do trabalho

profissional. Percebemos que elas encontram motivos para desenvolverem uma prática

comprometida com os princípios éticos políticos da profissão.

Identificamos pelas falas das assistentes sociais que suas motivações estão

relacionadas ao contato com os usuários, ao retorno dado, a efetivação da prática profissional

e as contribuições do Serviço Social nesse processo de alcance das propostas de promoção,

recuperação e reinserção dos usuários do CAPS.

Embora que, nesse contexto, não podemos negar que a realidade da precarização

do trabalho e a precariedade dos serviços públicos desgasta e desmotiva a equipe

ocasionando, em determinados momentos, influência nas ações do cotidiano, na prática

profissional. Diante dessa realidade, a saída inconscientemente encontrada pelos profissionais

é naturalizar essa situação.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Inicialmente é importante salientar que este estudo não tem a pretensão de emitir

conclusões definitivas ou fechadas, mas contribuir para a compreensão dos leitores sobre o

tema abordado, bem como dos interessados pela temática na perspectiva de ampliar seus

conhecimentos e, a partir do material elaborado, instigar novas discussões e debates.

Os estudos que realizamos no decorrer deste trabalho nos proporcionou analisar

como se estabelece a atuação das assistentes sociais no Centro de Atenção Psicossocial –

CAPS III - SER II, o qual verificamos, desde o período de estágio supervisionado, muitas

dificuldades, as quais dificultavam a prática profissional das assistentes sociais. A partir de

então surgiram as inquietações que nos levou a desenvolver esta pesquisa.

Cada capítulo abordou pontos de extrema importância que fundamentam a

compreensão do objeto de estudo na perspectiva de contemplar de forma clara os objetivos

específicos da pesquisa.

Nesse contexto, realizamos, inicialmente, um resgate histórico da loucura,

perpassando pelo contexto da Reforma Psiquiátrica até a análise dos dados coletados em

campo. Quando fazemos um resgate histórico da loucura, desde a antiguidade até o século

XIX, destacando o processo de institucionalização do louco, identificamos as várias

concepções da loucura ao longo da história da humanidade e percebemos que há uma

evolução nos conceitos e nos paradigmas lançados a esse respeito.

A loucura, que antes estava relacionada a fenômenos mitológicos, filosóficos ou

religiosos, passa a ser compreendida como doença mental e a partir desse momento é

construído todo um aparato de tratamento para contê-la. É nesse contexto que se efetiva a

institucionalização da loucura através do modelo de assistência asilar e hospitalocêntrico.

Com esse estudo verificamos que, a partir do momento em que a loucura passa a

ser compreendida como doença mental, é instituído o modelo de assistência asilar, que

consiste na institucionalização do louco através da rede de sistemas fechados em ambiente

hospitalar. Nesse cenário, a loucura era tratada por via medicamentosa, punitiva e repressiva,

de modo que não contribuía para a evolução do quadro clínico e psicológico dos indivíduos,

mas para a regressão desse quadro.

É no contexto da loucura que se efetiva os modelos de assistência psiquiátrica no

Brasil e é a partir da Reforma Psiquiátrica que emergem os novos equipamentos da saúde

mental, os CAPS e as Residências Terapêuticas. As transformações ocorridas, ao longo dos

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tempos, foi gerando fatos que culminaram no movimento da Reforma Psiquiátrica, o marco

do processo de desinstitucionalização.

Hoje, sabemos que vivemos em um contexto de transformações aligeiradas, da

busca constante de sobrevivência em meio às constantes transformações de âmbito social,

político, econômico e cultural, de modo que o sistema capitalista - que rege o complexo

mundo globalizado - tem agravado na sociedade os problemas de cunho social e,

consequentemente psíquico. É a saúde mental dos indivíduos que está sendo comprometida

pelo ritmo acelerado e pelo sistema, sutilmente e gradativamente, destrutivo que envolve os

sujeitos sociais. Nesse contexto, não é difícil perceber o crescente número de pessoas com

algum tipo de transtorno mental em nossa sociedade, em nossa família, em nosso convívio

social.

No contexto da Reforma Psiquiátrica, o segundo capítulo traz um resgate desse

processo e nos faz compreender a importância desse movimento para as novas construções na

área da saúde mental. Foi com o movimento da Reforma Psiquiátrica que emergiram as

transformações mais significativas no contexto da saúde mental. A institucionalização do

louco já não era a melhor forma de tratar a loucura e segmentos da sociedade passaram a

perceber e se inquietar com a assistência ofertada.

Surgem os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) com a proposta de promover

a cidadania e “reinserir” a pessoa com transtorno mental na sociedade, embora o termo

reinserção não seja o mais adequado, tendo em vista que os indivíduos sempre estiveram

inseridos na sociedade, porém, excluídos dela. Entretanto, é a expressão utilizada pelas

portarias e materiais elaborados na área para sensibilizar que a pessoa com transtorno mental

não deve ser excluída, mas incluída no convívio social. Reconhecemos, ainda que insipiente,

um novo olhar para a Saúde Mental na perspectiva de superação e de aceitação dos sujeitos

comprometidos, cidadãos de direitos que devem estar envolvidos em todas as esferas sociais

sem discriminação.

Assim, embora saibamos que a Reforma Psiquiátrica não conseguiu materializar

de forma integral as suas propostas devido às inúmeras relações de poder que envolvem esse

contexto, reconhecemos que ela contribuiu de forma relevante para as transformações

ocasionadas na assistência psiquiátrica, mesmo percebendo que ainda há muitos desafios a

serem superados para que se efetivem políticas públicas destinadas a saúde mental.

Nesse sentido, é na perspectiva da promoção e inclusão dos indivíduos que sofrem

com transtorno mental que se inserem os saberes na área da saúde mental e, de maneira

específica, no âmbito social, essa área demanda a atuação do/a assistente social, um

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profissional que tem dentre os princípios que fundamentam o seu projeto ético-político a

inclusão social e a promoção da cidadania.

Como esclarecemos nesta pesquisa, a profissão do assistente social tem seu

trabalho materializado a partir das mais variadas expressões da questão social. Desse modo,

compreendemos a importância da atuação desse profissional na saúde mental, área permeada

por situações de vulnerabilidade, problemas relacionados a questões familiares,

discriminação, exclusão, dentre outros conflitos.

Identificamos, também, que são demandados aos CAPS, através dos usuários, as

mais variadas expressões da questão social. Portanto, a atuação do assistente social se faz

necessária e é a partir dessa realidade que a categoria se insere na saúde mental.

Identificamos nesse processo de estudos e análises que os profissionais que atuam

na área ainda encontram muitas limitações para efetivar as propostas do novo modelo de

assistência psiquiátrica devido à própria instabilidade das condições de trabalho e a forma

como são postos nesse mercado. Nessa conjuntura, recentemente, a forma de contratação dos

profissionais nos CAPS aconteceu a partir de um processo seletivo promovido pela Prefeitura

Municipal de Fortaleza (PMF), regido pela Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), com

contrato por tempo determinado, de seis meses à dois anos, o prazo máximo de prorrogação.

Há muitas limitações referentes ao próprio conhecimento dos profissionais sobre a

área, sobre os objetivos, as finalidades, dentre tantos aspectos. Há limitações quanto ao

conhecimento das propostas da rede e também quanto ao contexto da Política de Saúde

Mental, tendo em vista que os profissionais não recebem capacitação específica para atuar na

área. Porém, a prática profissional foi se efetivando, construindo-se e se tornando conhecida,

gradativamente, a partir dos conhecimentos adquiridos no cotidiano institucional, através de

outros profissionais que já atuavam há mais tempo na área.

Percebemos também a necessidade de que as categorias profissionais inseridas

nesses CAPS`s se organizem e elaborem os seus projetos de intervenção, delimitando o papel

de cada um. Acreditamos que, se não houver esse entendimento as atividades desenvolvidas

tendem a se tornarem rotineiras e burocráticas, podendo cair na prática profissional

pragmática, messiânica e/ou fatalista.

Diante da realidade das condições dos serviços públicos prestados à sociedade

sabemos que não é uma tarefa fácil efetivar políticas públicas, ou seja, fazer valer os direitos

dos cidadãos, oferecer serviços que dependem do Estado em meio à existência de uma

hierarquia que, por vezes, renunciam o poder de efetivar esses direitos. Percebemos a

fragilidade e limitação das políticas públicas de saúde mental materializado nas condições de

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trabalho e de infraestrutura precárias. É nesse contexto que se inclui o assistente social: na

dramática incumbência de atuarem na perspectiva de efetivação da politicas públicas, na

busca constante dos direitos dos cidadãos e na mediação dos conflitos gerados em todas as

dimensões.

Quanto aos resultados e discussões, concluímos a partir das experiências e

vivências no período desse estudo, bem como das análises dos dados coletados, que as

assistentes sociais do referido CAPS compreendem a importância da atuação da categoria na

Saúde Mental, especificamente no CAPS, e percebem a importância da sua atuação no âmbito

da articulação e mediação entre instituição, família e sociedade na perspectiva de identificar e

responder as demandas que estão sendo postas e, assim, as profissionais buscam o verdadeiro

sentido do seu trabalho.

As assistentes sociais entrevistadas apresentaram as atividades e atribuições

demandadas no serviço, de modo que nos permite identificar a relação entre a questão social e

a inserção do Serviço Social na instituição. Com as atividades demandadas, as profissionais

desenvolvem ações socioassistenciais e socioeducativas, possibilitando a mediação ou o

acesso da pessoa com transtorno mental ao que lhe é de direito, no serviço prestado.

Nesse aspecto, concluímos que as assistentes sociais - embora as atividades sejam

coletivas, ou seja, todas as categorias profissionais desenvolvem as mesmas atividades no

CAPS - conseguem extrair dessas atividades o que é especifico do Serviço Social,

direcionando seus atendimentos com ética e compromisso visando à promoção e inclusão dos

usuários inseridos no serviço.

Quanto à avaliação das profissionais sobre o trabalho interdisciplinar

identificamos percepções diferenciadas e pontuamos nossas análises e considerações a partir

das falas das profissionais. Para as profissionais que expressaram com uma avaliação positiva

identificamos que isso se deve às afinidades com os outros profissionais e o bom

relacionamento que os profissionais têm entre si, permitindo um bom desempenho das ações

desenvolvidas em equipe ou pela equipe. Enquanto que, para as profissionais que avaliaram o

trabalho interdisciplinar com uma visão negativa, identificamos que as dificuldades

apresentadas podem estar relacionadas às relações interpessoais e as dificuldades de

compreensão por parte da equipe quanto às atribuições e competências do Serviço Social.

No que se refere à percepção da categoria sobre os novos equipamentos da saúde

mental identificamos que as assistentes sociais do CAPS têm conhecimento sobre os

equipamentos, as propostas e também as limitações que envolvem as instituições. Isso

demonstra que a categoria está comprometida e afinada com o trabalho que desenvolve, pois o

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conhecimento que elas detêm é fruto das experiências e da busca individual de cada

profissional, tendo em vista o pouco tempo de atuação na saúde mental.

É importante destacar também que as assistentes sociais do CAPS identificaram

os desafios postos à prática profissional e buscam atuar na perspectiva da superação. Embora

por vezes efetivem uma prática pragmática elas têm convicção do seu papel e do que é

necessário para atuar de forma ética e comprometida com o Projeto Ético Político da

profissão. Nessa perspectiva, elaboram, mesmo de forma ainda tímida, estratégias de

efetivação da prática comprometida com o sujeito social e conseguem encontrar a partir

desses sujeitos, os usuários, motivações para atuar no CAPS III da SER II.

Diante do exposto, consideramos que a atuação das assistentes sociais no referido

CAPS pode ir para além das fronteiras postas no cotidiano institucional, superando com mais

vigor as dificuldades e limitações que impedem o desenvolvimento das atividades e a

promoção dos direitos das pessoas com transtorno mental.

Embora as entrevistadas não tenham mencionado esse aspecto, consideramos que

uma possível saída para a efetivação dos direitos das pessoas com transtorno mental está no

envolvimento desses sujeitos e de seus familiares, os quais precisam se apropriar da legislação

e dos canais de participação e de luta, ou seja, os conselhos e assembleias de usuários,

articulando-se, sobretudo, com os demais usuários dos tantos CAPS`s existentes.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – PONTO 1 (UM) DO ROTEIRO DE ENTREVISTA

O presente questionário é destinado às profissionais do Serviço Social do Centro de Atenção

Psicossocial – CAPS III SER II, cujo tema da pesquisa é “A atuação das assistentes sociais no

Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III SER II.” Solicitamos às profissionais que

respondam as perguntas realizadas, considerando que será mantido sigilo, de modo que as

respostas não serão publicadas e, enfatizamos que, as informações aqui recolhidas serão

destinadas unicamente à pesquisa e análise científica dos dados coletados.

Entrevista nº ______ Data ___/___/___ Duração _______ Gravação________

1. PERFIL BÁSICO DO PROFISSIONAL

Considerando que todas as profissionais são do sexo feminino, segue abaixo as questões

necessárias para traças o perfil de cada profissional entrevistada.

Faixa etária (até dez/2013)

( ) 20 – 30

( ) 31 – 40

( ) 41 – 50

( ) acima de 50

Estado civil

( ) solteira ( ) casada ( ) união estável

( ) viúva ( ) Divorciada

Naturalidade _____________________

Reside em:

( ) Fortaleza – Ce ( ) Outro Município ( ) Outro Estado

Especifique_____________________

Qual foi o ano de sua graduação__________________

A instituição de ensino foi:

( ) privada ( ) pública ( ) EAD

Especifique____________________

Nível de titulação:

( ) graduação

( ) especialização

( ) mestrado

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( ) doutorado

Algo a acrescentar____________________________________________________

Área da primeira experiência profissional como assistente social

( ) Saúde

( ) Saúde Mental

( ) Assistência

( ) Previdência

( ) Sócio – Jurídica

( ) Habitação

( ) Educação

( ) Outros - Especifique _____________________________

Em quais áreas já atuou:

( ) Saúde

( ) Saúde Mental

( ) Assistência

( ) Previdência

( ) Sócio – Jurídica

( ) Habitação

( ) Educação

( ) Outros - Especifique _____________________________

Com que área mais se identifica

( ) Saúde

( ) Saúde Mental

( ) Assistência

( ) Previdência

( ) Sócio – Jurídica

( ) Habitação

( ) Educação

( ) Outros - Especifique _____________________________

Há quanto tempo atua na saúde mental?_______________

Há quanto tempo atua no CAPS III SER II?____________

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APÊNDICE B – PONTO 2 (DOIS) DO ROTEIRO DE ENTREVISTA

1. SOBRE A PRÁTICA PROFISSIONAL NO CAPS III SER II

1. Como você compreende a importância da atuação das assistentes sociais na saúde

mental, mais especificamente no equipamento CAPS?

2. Quais as atribuições das assistentes sociais no CAPS III SER II?

3. Quais as demandas mais recorrentes para o Serviço Social no CAPS III SER II?

4. Como avalia o trabalho interdisciplinar no CAPS III SER II?

5. Como você percebe os equipamentos substitutivos da saúde mental hoje?

6. Quais os desafios enfrentados pelas assistentes sociais na instituição?

7. Considera que há algum desafio mais relevante na prática profissional, nessa

instituição, que dificulta a efetivação dos princípios que norteiam a profissão?

Especifique:

8. Mediante a realidade do serviço, o que lhe motiva a atuar no CAPS III SER II hoje?

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APÊNDICE C

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (ENTREVISTA)

Convidamos você para participar da Pesquisa “A atuação das assistentes sociais

no Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III SER II”, sob execução das pesquisadoras

Virzângela Paula Sandy Mendes (responsável) e Rosana de Araújo Carneiro (participante), a

qual pretende analisar como se estabelece a atuação das assistentes sociais no CAPS III SER

II.

Sua participação é voluntária e se dará por meio de entrevista, que consiste em

respostas a perguntas apresentadas a você pela pesquisadora. A entrevista será realizada no

Centro de Atenção Psicossocial – CAPS III SER II, com duração aproximada de 40 minutos,

no dia previamente marcado, de acordo com a sua disponibilidade. Os depoimentos desta

entrevista serão gravados com seu consentimento.

Não há riscos decorrentes da sua participação, mas consideramos que o fato de ser

entrevistada pode gerar ou não, fatores antecedentes de ansiedade, preocupação, desconforto,

inquietação que são naturais em qualquer processo ou atividade nova que mude ou acrescente

a rotina e você possui a liberdade de retirar sua permissão a qualquer momento, seja antes ou

depois da coleta dos dados, independente do motivo e sem nenhum prejuízo a sua pessoa e

nem ao seu trabalho na Instituição.

Se você aceitar participar, estará contribuindo para o esclarecimento sobre a

atuação das assistentes sociais no serviço. Ressaltamos que tem o direito de ser mantida

atualizada sobre os resultados parciais da pesquisa. Esclarecemos que, ao concluir a pesquisa,

será comunicada dos resultados finais.

Não há despesas pessoais para a participante em qualquer fase do estudo.

Também não há compensação financeira relacionada à sua participação. Se existir qualquer

despesa adicional, ela será paga pelo orçamento da pesquisa.

As pesquisadoras assumem o compromisso de utilizar os dados somente para esta

pesquisa. Os resultados da pesquisa serão analisados e publicados, mas sua identidade não

será divulgada, sendo guardada em sigilo.

Em qualquer etapa do estudo, poderá contatar as pesquisadoras para o

esclarecimento de dúvidas ou para retirar o consentimento de utilização dos dados coletados

com a entrevista:

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Virzângela Paula Sandy Mendes, contato: 99693517 e Rosana de Araújo

Carneiro, contato: 87048497, email: [email protected]

Caso tenha alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa também

pode entrar em contato com o Centro de Atenção Psicossocial - CAPS III SER II, situado à

rua Cel. Alves Teixeira, 1500, Dionísio Torres. Contato: 31052638 e o Comitê de Ética em

Pesquisa do Hospital Universitário – HU, endereço: rua Cap. Francisco Pedro, 1290, Rodolfo

Teófilo, Fortaleza-Ce, contato: 3366-8167.

Consentimento Pós–Informação

Eu, _________________________________________________________________, fui

informada sobre o que a pesquisadora quer fazer e porque precisa da minha colaboração, e

entendi a explicação. Por isso, eu concordo em participar do projeto, sabendo que não vou

ganhar nada e que posso sair quando quiser. Este documento é emitido em duas vias que serão

ambas assinadas por mim e pela pesquisadora, ficando uma via com cada uma de nós.

___________________________________________

Data: ______/ ______/ ______

Assinatura do Participante

____________________________________________

Assinatura do Pesquisador Responsável

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ANEXOS

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ANEXO-1

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ANEXO-2