centro de ciÊncias jurÍdicas curso de graduaÇÃo...

35
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO MÔNICA JANNINE ALENCAR NOBREGA A ATUAL PERSPECTIVA SOBRE O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO NO ÂMBITO DO RGPS CAMPINA GRANDE PB 2013

Upload: voduong

Post on 13-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Mai

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

MÔNICA JANNINE ALENCAR NOBREGA

A ATUAL PERSPECTIVA SOBRE O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO NO ÂMBITO DO RGPS

CAMPINA GRANDE – PB 2013

MÔNICA JANNINE ALENCAR NOBREGA

A ATUAL PERSPECTIVA SOBRE O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO NO ÂMBITO DO RGPS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Estadual da Paraíba, em cumprimento à exigência para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Me. Amilton de França

CAMPINA GRANDE – PB

2013

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL – UEPB

N754a Nobrega, Mônica Jannine Alencar.

A atual perspectiva sobre o instituto da desaposentação

no âmbito do RGPS [manuscrito] / Mônica Jannine Alencar

Nóbrega. 2013.

34 f.

Digitado.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em

Direito) – Universidade Estadual da Paraíba, Centro de

Ciências Jurídicas, 2013.

“Orientação: Prof. Me. Amilton de França,

Departamento de Direito Público”.

1. Direito previdenciário. 2. Desaposentação. 3. Aposentadoria. I. Título.

21. ed. CDD 344.02

MÔNICA JANNINE ALENCAR NOBREGA

A ATUAL PERSPECTIVA SOBRE O INSTITUTO DA DESAPOSENTAÇÃO NO ÂMBITO DO RGPS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Estadual da Paraíba, em cumprimento à exigência para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

. Aprovada em __/08/2013.

_________________________________________________ Prof. Me. Amilton de França / UEPB - Orientador

__________________________________________________ Prof. Me. Francisco de Assis Barbosa Júnior/ UEPB

__________________________________________________ Prof. Esp. Laplace Alcoforado Guedes de Carvalho / UEPB

AGRADECIMENTOS

A Deus, que tem me sustentado em força e me amparado nos momentos mais

difíceis. Sob Sua proteção pude enfrentar todos os obstáculos durante essa jornada.

À Nossa Senhora do Rosário, à sua interseção diante de Deus atribuo todo o bem

que me proveio de meus estudos.

Aos meus pais e irmão, pelo apoio e por terem sempre acreditado em mim. Não

existem palavras que demonstrem meu agradecimento a vocês, Mainha, Painho e

Lucas Jean.

À João Neto, meu amor e meu maior incentivador. Sem a sua constante dedicação

nada disso teria sido possível.

Aos meus tios Magally e Oriedí, pela acolhida durante esses cinco anos, meus

sinceros agradecimentos.

Às minhas amigas de turma, Amanda Gonçalves, Andressa Gonzaga e Mayara

Guimarães, com quem dividi as angústias e as alegrias durante o curso e por quem

nutro um carinho especial.

Aos amigos que fiz durante o período de estágio na PSF/CG e na PRM/CG, a

amizade de vocês fez com que se tudo se tornasse melhor.

Aos meus demais familiares pela torcida por meu sucesso.

Enfim, aos meus professores, que durante o curso me transmitiram além do

conhecimento, o amor pelo Direito.

"Nem as tropas, nem as armas, nem os comandantes, mas a Virgem Maria do Rosário é que nos deu a vitória".

LISTA DE ABREVIATURAS

CF Constituição Federal

EC Emenda Constitucional

FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INSS Instituto Nacional do Seguro Social

JEF Juizado Especial Federal

PIS Programa de Integração Social

REsp Recurso Especial

RGPS Regime Geral da Previdência Social

RMI Renda Mensal Inicial

STJ Superior Tribunal de Justiça

STF Supremo Tribunal Federal

TNU Turma Nacional de Unificação

TRF Tribunal Regional Federal

RESUMO

NOBREGA, Mônica Jannine Alencar1

A desaposentação pode ser conceituada como a renúncia a aposentadoria como forma de aproveitamento do tempo de contribuição posterior à concessão do benefício para aproveitá-lo na concessão de benefício mais vantajoso. O ponto nodal no tema da desaposentação diz respeito à questão da necessidade/desnecessidade de restituição dos valores recebidos durante a primeira aposentadoria. Grande parte da doutrina e jurisprudência se posicionam no sentido da desnecessidade da devolução dos valores. Porém, mesmo sendo amplamente discutida, a desaposentação ainda se encontra sem previsão legal. Atualmente inúmeros esforços jurisprudenciais e legislativos vêm sendo empreendidos no intuito de se resolver tal controvérsia e conceder maior segurança jurídica ao instituto. Palavras-chave: Desaposentação. Aposentadoria. Devolução de valores.

1 Concluinte do Curso de Direito pela Universidade Estadual da Paraíba.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................. 8

1 PREVIDÊNCIA SOCIAL E APOSENTADORIA ....................................... 10

1.1 APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO ...................................................... 11

1.2 APOSENTADORIA ESPECIAL ...................................................................................... 12

1.3 APOSENTADORIA POR IDADE .................................................................................... 13

1.4 APOSENTADORIA POR INVALIDEZ ............................................................................... 13

2 DESAPOSENTAÇÃO .............................................................................. 15

2.1 ORIGEM .................................................................................................................... 15

2.2 CONCEITO ................................................................................................................ 17

2.3 ESPÉCIES ................................................................................................................ 19

2.4 PRINCIPAIS CELEUMAS DOUTRINÁRIAS ...................................................................... 21

3 TRATAMENTO ATUAL DA MATÉRIA .................................................... 24

3.1 ANÁLISE DO PROJETO DE LEI 91/2010 ...................................................................... 24

3.2 ATUAL POSICIONAMENTO DO STJ: DECISÃO NO RESP N.º 1.334.488-SC ................. 25

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 28

ABSTRACT ...................................................................................................... 30

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 31

ANEXO- REsp 1.334.488/SC ........................................................................... 32

8

INTRODUÇÃO

A desaposentação tem ganhado cada vez mais espaços nas discussões

jurídicas recentes, por isso seu estudo é de tamanha importância. Pode-se afirmar

que se trata do tema mais evidente no Direito Previdenciário.2

Este trabalho tem como objetivo a averiguação de como se encontram as

discussões que permeiam o estudo da desaposentação, fazendo uma análise sobre

a atual situação de tal instituto e de suas problemáticas no quadro do Regime Geral

da Previdência Social.

A ausência de previsão legal exigiu que o Poder Judiciário se posicionasse

sobre este instituto, enquanto ao Legislativo coube a preocupação com a

regulamentação da matéria, alvo de vários Projetos de Lei, mas que até hoje

permanece em indefinição.

É entendida hoje, tanto pela doutrina como pela jurisprudência, como uma

possibilidade válida por tratar-se a aposentadoria de um direito patrimonial, sendo,

portanto, disponível. Entretanto surgiram divergências sobre a necessidade de

devolução dos valores recebidos quando o segurado encontrava-se aposentado.

A maior parte dos doutrinadores entende pela desnecessidade de restituição

dos valores pelo aposentado que solicita a desaposentação com o propósito de

obter benefício mais vantajoso. Acontece que a própria jurisprudência do STJ, como

se verá adiante, assenta neste mesmo sentido, asseverando o caráter patrimonial da

aposentadoria, assim como a natureza alimentar das prestações previdenciárias.

Foi utilizada, na feitura do presente trabalho, pesquisa bibliográfica em

diversos autores que tratam especificamente do objeto deste estudo, buscando-se a

cerca do tratamento da desaposentação pela doutrina e jurisprudência.

2 Serau Junior, 2013, p. 13

9

Em seguida foi feita apreciação de legislação, partindo-se da Constituição

Federal, para as Leis e Decretos que regulam a aposentadoria, assim como do

acervo jurisprudencial sobre a matéria.

Para um estudo mais sistemático do assunto, na primeira parte trata-se da

aposentadoria, discorrendo sobre suas espécies e requisitos no âmbito da

previdência social. Já na segunda parte analisa-se a desaposentação, sua origem e

ainda as principais discussões envolvendo o tema.

Já na terceira parte, analisa-se a conjuntura atual do instituto da

desaposentação, como se encontra o tratamento da matéria pelos Poderes

Judiciário e Legislativo.

Diante do exposto, o estudo da desaposentação mostra-se imprescindível,

vez que é tema sobre o qual ainda pairam inúmeras divergências. Tanto por não ter

alcançado definitividade jurídica, o que o torna passível de modificações, como pela

possibilidade que oferece ao meio jurídico promover o debate a cerca das

construções de tal instituto.

10

1 PREVIDÊNCIA SOCIAL E APOSENTADORIA

O conceito de seguridade social encontra-se esculpido no caput artigo 159 da

Constituição Federal, o qual reza “A seguridade social compreende um conjunto

integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a

assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”

Observa-se que a seguridade social divide-se em três áreas distintas: saúde,

previdência e assistência. Diferentemente do que acontece com os ramos da saúde,

marcada pela universalidade e, portanto, alcançando a todos, inclusive estrangeiros,

e da assistência social que abrange a todos os que encontram-se em estado de

pobreza, a previdência social é restrita ao rol de intitulados como segurados e

dependentes.

A previdência social tem como escopo a cobertura dos diversos riscos sociais

dentre eles riscos previsíveis como a velhice e imprevisíveis como a morte e a

invalidez, podendo ser definida nos moldes do art. 201 da Constituição Federal, in

verbis:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;

II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.

É dividida em Regime Próprio e Regime Geral de Previdência Social. Nas

palavras de Alencar (2011, p. 36) Regime geral é a oposição a regime específico de

servidores públicos. Naquele estão assentados os trabalhadores da iniciativa

privada, consistente na massa esmagadora da população brasileira [...].

11

O Regime Geral de Previdência Social é marcado pelas características da

contributividade e da compulsoriedade. Dessa forma, todo aquele que exerce

atividade remunerada estará obrigatoriamente vinculado ao RGPS, da mesma forma

como estará obrigado a verter contribuições previdenciárias.

Por conseguinte, a Lei 8.213/91, conhecida como Lei de Benefícios, que

complementa a definição e abrangência do texto constitucional, estabelece diversos

benefícios, dentre eles a aposentadoria. Sendo este o benefício mais vultuoso

concedido pela Previdência Social, tanto pelo número de segurados abrangidos,

como pela sua grande expressão monetária.

Nesse sentido,

[...] a aposentadoria é a prestação previdenciária por excelência, visando garantir os recursos financeiros ao beneficiário, de natureza alimentar, quando este já não possui condições de obtê-los por conta própria, seja em razão de sua idade avançada, seja por incapacidade permanente para o trabalho(BRAHIM, 2011, p. 07).

O RGPS possui quatro espécies de aposentadoria. Proceder-se-á a análise

de cada uma delas, o que se mostra imprescindível para adentrar ao tema principal

deste trabalho, qual seja, a desaposentação.

1.1 APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

A aposentadoria por tempo de contribuição depende unicamente do requisito

da carência. É necessário, porém, o cumprimento da carência, correspondente a

180 contribuições mensais.

É devida a todos os segurados que completem 35 anos de contribuição se

homem e 30 anos se mulher, conforme o art. 201, §7º, I da CF, exceto o segurado

especial que não contribua como contribuinte individual3.

No caso de professores que comprovem exclusivamente tempo de efetivo

exercício em função de magistério no ensino fundamental e médio, estes poderão

3 Nesse sentido a Súmula 272 do STJ: “O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito

àcontribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas.”

12

beneficiar-se de diminuição de cinco anos na idade mínima para a concessão do

benefício4. Dessa forma,

[...] os professores se aposentarão com 30 anos de contribuição e as professoras com 25 anos de contribuição, destacando que este benefício não mais privilegia os professores do ensino superior desde o advento da emenda 20/1998, bem como é curial que o tempo seja integralizado exclusivamente no magistério para que haja a redução.(AMADO, 2012, p. 523)

Essa modalidade de aposentadoria não exige idade mínima para sua

concessão, por esse motivo sofre inúmeras críticas por não abarcar um risco social

efetivo, permitindo assim, aposentadorias precoces.

1.2 APOSENTADORIA ESPECIAL

É devida ao segurado que tenha exercido atividade laborativa de forma

permanente, não ocasional ou intermitente durante 15, 20 ou 25 anos, sujeito a

certas condições prejudiciais de sua saúde ou integridade física, obedecendo a

carência de 180 contribuições mensais.

Enumera os seguintes segurados como beneficiários: segurado empregado,

trabalhador avulso e contribuinte individual. Este último apenas quando filiado à

cooperativa de trabalho e de produção.

O segurado deverá comprovar perante o INSS a exposição efetiva a agentes

físicos químicos ou biológicos5 que prejudiquem sua saúde ou integridade física

durante o período exigido.

4 Também serão beneficiados os professores de ensino infantil, fundamental e médio que estejam

exercendo atividades de direção de unidade escolar, coordenação e assessoramento pedagógico, a teor do artigo 1º, da Lei 11.301/2006 (AMADO, 2012, p. 523). 5 A relação dos agentes nocivos encontra-se no anexo 4 do Decreto 3.048/99.

13

1.3 APOSENTADORIA POR IDADE

Conforme o art, 48 da lei 8.213/91 a aposentadoria por idade será devida ao

segurado que completar a idade de 65 anos, se homem ou 60 anos, se mulher,

podendo essa idade mínima ser reduzida em 5 anos no caso dos segurados

especiais, aí incluídos os trabalhadores rurais e os que exercem atividades em

regime de economia familiar: o produtor rural, o pescador artesanal e o garimpeiro.

Todavia, além do requisito etário, o benefício em análise possui outro

requisito cumulativo, qual seja, a comprovação da carência de 180 contribuições

mensais.

Diferentemente do que ocorre com os demais segurados, segurado especial

para fazer jus ao benefício da aposentadoria por idade, prescinde da comprovação

do recolhimento de contribuição previdenciária, exigindo a lei apenas a comprovação

do efetivo exercício de atividade rural em regime de economia familiar, ainda que de

forma descontínua, durante o período imediatamente anterior a requerimento do

benefício.

1.4 APOSENTADORIA POR INVALIDEZ

A aposentadoria por invalidez segundo Amado (2012, p. 503) “é devida ao

segurado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que

lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nessa condição.”

Todos os segurados do RGPS poderão figurar como beneficiários dessa

modalidade de benefício, estando ou não em gozo de auxílio-doença. Sua

concessão depende do preenchimento de dois requisitos, qual sejam, a constatação

da incapacidade para o trabalho e a carência de 12 contribuição mensais.

14

Este último requisito poderá ser dispensado excepcionalmente em caso de

acidente de qualquer natureza ou causa, doença profissional ou o trabalho ou de

doenças e afecções listadas em ato regulamentar6.

A detecção da enfermidade é feita através de perícia médica realizada pelo

próprio INSS a qual será novamente realizada a cada 2 anos para confirmação da

continuidade da incapacidade.

Em sendo comprovada a cessação da incapacidade com possibilidade de

reabilitação profissional ou estabilidade das sequelas que permitam o retorno do

segurado ao trabalho com recuperação de sua capacidade laborativa, o benefício

poderá ser diminuído ou cessado.

6 A lista das enfermidades que ensejam a dispensa do período de carência é elaborada pelos

Ministérios da Saúde e da Previdência Social a cada três anos (KERTZMAN, 2011, p. 372).

15

2 DESAPOSENTAÇÃO

2.1 ORIGEM

O Instituto da desaposentação é relativamente novo no nosso ordenamento

jurídico. A sua primeira aparição remonta à década de 1980, tendo sido apresentado

pelo doutrinador Wladimir Novaes Martinez a quem é atribuída inclusive a

nomenclatura do instituto.7

Tema dos mais importantes do direito previdenciário na atualidade, o instituto

ganhou maior visibilidade durante a década seguinte, marcada por inúmeras

mudanças à legislação previdenciária.

Segundo Ladenthim (2009) e Sá (2009) citados por Serau Junior (2013, p. 52)

O estopim para essa verdadeira “explosão” do interesse a respeito da desaposentação pode ser (além do próprio valor dos benefícios previdenciários), a extinção do direito ao pecúlio e ao abono de permanência, no contexto das reformas previdenciárias neoliberais, em

meados dos anos 1990.

O pecúlio tinha previsão na Lei 8213/91 e era devido, dentre outros, ao

aposentado que retornasse a exercer atividade abrangida pelo RGPS.

Já o abono de permanência era garantido ao segurado que adquirindo o

direito a aposentadoria, optasse por permanecer em serviço. Consistia no valor

correspondente à 25% do salário-de-benefício, figurando assim, como um forte

instrumento de desestímulo às aposentadorias precoces.

Por conseguinte, ambos os institutos foram extintos do panorama

previdenciário com o advento da Lei 8.870/1994. Esta lei previa a isenção por parte

dos aposentados que novamente se filiavam ao regime da Previdência.

7 ALENCAR, Hermes Arrais, 2011, p. 73

16

Porém, tal isenção não perdurou por muito tempo, a Lei 9.032/1995

acrescentou o seguinte parágrafo ao art. 12 da Lei 8.212/1991 que trata do Custeio

da Previdência Social:

§ 4.º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social.

Desde então, o aposentado que retorna ao mercado de trabalho é obrigado a

verter contribuições à Previdência, sem que de tal ônus possa decorrer qualquer

direito à benefício previdenciário.

É o que consta do § 2.º, do art. 18 da Lei de Benefícios:

§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.

Outro fato importante foi a promulgação da EC 20/1998. Essa emenda criou

pedágio de 20% para as aposentadorias integrais e 40% para as aposentadorias

proporcionais. Na época, muitas pessoas por medo de perder o direito ao benefício

acabaram requerendo aposentadoria proporcional, o que desvalorizou o valor do

benefício.

A criação do fator previdenciário pela Lei 9.876/1999 tornou ainda mais

latente a necessidade de uma maneira de se reparar o valor das aposentadorias. O

fator previdenciário trata-se de um coeficiente calculado utilizando-se diversos

aspectos em relação ao segurado como idade ao aposentar-se, expectativa de

sobrevida e tempo de contribuição.

Na prática, o fator previdenciário funciona como instrumento para reduzir o

valor do benefício, nos casos de aposentadorias precoces.

Noutra banda, conforme expõe Alencar (2011, p. 49)

17

No ano de 2020, o número de pessoas com mais de 70 anos de idade (que corresponderá a 8,9% da população, no ano de 2000 correspondia a 5,1%) será superior ao número e crianças compreendidas entre zero e quatro anos em razão da brusca redução da taxa de fecundidade (que em 1960 era de 6,2 filhos/média por família, para em 1996, 2,3 f/m por f.) conjugada à elevação da expectativa de vida (que, em 1930, era de 39 anos, para o homem e 43, para a mulher; no ano de 2000, elevou-se para 64,1 e 71,9, respectivamente; em 2020, estima-se 69,3 e 77,1, respectivamente). (Fones:CEPAL, IBGE-Censos Demográficos e PNAD).

Desta feita, o fenômeno da desaposentação, possa ser, num país como o

nosso (onde o numerário da população idosa cresce a cada dia, do mesmo modo

que a elevação da expectativa de vida) reflexo do retorno do aposentado do RGPS

ao mercado de trabalho, assim como da insatisfação da classe dos aposentados

com o valor do benefício recebido.

Deste modo todos os fatores expostos levaram ao surgimento e contribuíram

para a maior amplitude que vem tomando o instituto da desaposentação.

2.2 CONCEITO

O termo “desaposentação” poderia dar uma idéia de desistência do benefício

pelo aposentado, o que diante das normas protetivas de nosso sistema

constitucional seria inaceitável.

Acontece que, o aposentado que busca a renúncia do seu benefício de

aposentadoria não almeja excluir-se da percepção de prestação previdenciária, ao

contrário,

[...] aqueles que buscam a desaposentação não pretendem ver-se desamparados de toa e qualquer prestação previdenciária, apenas ambicionam o recálculo de sua RMI; nos moldes atuais, isso se opera através da renúncia apenas à primeira aposentadoria, seguida de imediato da concessão de nova aposentação (SERAU JUNIOR, 2013, p. 21.)

A desaposentação pode ser definida como a possibilidade de o aposentado

que retorna ao mercado de trabalho renunciar ao benefício que regularmente

percebia, em prol da concessão de nova aposentadoria, com aproveitamento das

contribuições previdenciárias vertidas após a jubilação.

18

Nas palavras de Ibrahim (2011, p. 35), a desaposentação

[...] traduz-se na possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso [...] mediante a utilização de seu tempo de contribuição. Ela é utilizada colimando o status financeiro do aposentado (IBRAHIM 2011, p. 35).

Como se extrai dos conceitos apresentados, a desaposentação depende de

certas circunstancias fáticas. A primeira delas é o segurado ser aposentado, já que o

instituto em apreço é utilizado no pleito de novo benefício em substituição àquele

que vinha sendo percebido pelo aposentado.

Com o aposentado vertendo novas contribuições para o RGPS, não aparenta

ser justo que não pudesse reverter tais contribuições em prol de melhoria em sua

situação financeira.

De tal premissa decorre o segundo aspecto, que diz respeito ao proveito

econômico do aposentado. As contribuições vertidas após o jubilamento ao serem

incorporadas ao cálculo do novo benefício devem trazer-lhe vantagem, aumentando

a renda mensal do beneficiário.

Nesse sentido,

A desaposentação, desde que vinculada à melhoria econômica do segurado, ao contrário de violar direitos, somente os amplia. Seu objetivo será sempre a primazia do bem-estar do indivíduo, algo desejável por toda a sociedade (IBRAHIM, 2011, p. 40)

Há autores que entendem ser inexistente o instituto da desaposentação,

afirmando ser equivocada a utilização de tal denominação nos casos de renúncia à

aposentadoria pelo aposentado que pretende a concessão de novo benefício de

mesma natureza. Senão vejamos:

Sob o manto da desaposentação (sacramentado pelo STJ), busca o jubilado a transformação de sua aposentadoria como regra, da modalidade proporcional para integral, sob a forte argumentação de que possui contribuições vertidas posteriormente ao marco de sua aposentadoria (por ocasião do retorno ao mercado de trabalho) (ALENCAR, 2011, p. 113, grifo do autor)

19

Entende o retro citado autor, que a pretensão do aposentado é a

transformação do benefício da aposentadoria em outro8, como ocorre no âmbito da

Previdência Social com outros benefícios, apesar de tal posicionamento já ter sido

superado pelo STJ que

[...] encerrou paradoxo ao trilhar o rumo da aceitação da desaposentação e da inadmissibilidade da „transformação‟, a requerimento do Regime Geral da Previdência Social ao não admitir a conversão de aposentadoria por invalidez em aposentadoria por idade, quando satisfeitos os requisitos etário e de carência (ALENCAR, 2011, p. 113).

Após a devida conceituação do instituto em análise, passar-se-á ao exame da

aplicação da desaposentação no Regime Geral da Previdência Social.

2.3 ESPÉCIES

De acordo com o que foi versado, o aporte fático do instituto da

desaposentação é o retorno do aposentado ao mercado de trabalho, voltando assim

a contribuir para a Previdência, ensejando o aproveitamento das contribuições

vertidas após a sua aposentadoria.

Consoante explica Serau Junior (2013, p. 54), a desaposentação

consubstancia-se em

[...] renúncia a uma modalidade de aposentadoria, já implementada, para aproveitamento do respectivo tempo de contribuição/serviço, inclusive tempo de serviço posterior, na perspectiva de obtenção de nova e melhor aposentadoria.

Operando-se a desaposentação no mesmo regime de previdência, este não

sofreria abalo do ponto de vista financeiro, conforme acentua Ibrahim (2011, p.59)

Do ponto de vista atuarial, a desaposentação é plenamente justificável, pois se o segurado já goza de benefício, jubilado dentro das regras vigentes,

8 Vide artigo 660 da Instrução Normativa do INSS nº 45/2010: É vedada a transformação de

aposentadoria por idade, tempo de contribuição e especial, em outra espécie, após o recebimento do primeiro pagamento do benefício ou do saque do respectivo FGTS ou PIS.

20

atuarialmente definidas, presume-se que neste momento o sistema previdenciário somente fará desembolsos frente a este beneficiário, sem o recebimento de qualquer cotização, esta já feita durante o período passado.

Todavia, caso o beneficiário continue a trabalhar e contribuir, esta nova cotização gerará excedente atuarialmente imprevisto, que certamente poderia ser utilizado para a obtenção de novo benefício, abrindo-se mão do anterior de modo a utilizar-se do tempo de contribuição passado.

A desaposentação pode dar-se na seara do RGPS de duas formas distintas

em relação às modalidades de aposentadoria que tal regime contempla.

A primeira delas seria a possibilidade de o segurado permanecer na mesma

modalidade de aposentadoria, objetivando apenas o recálculo do valor do benefício.

Acontece que o recolhimento de novas contribuições refletiria de forma vantajosa na

RMI do segurado.

No caso do aposentado por tempo de contribuição a qual se deu de forma

proporcional. Caso o segurado contribua com mais de um salário mínimo, verá

diminuído o valor de seu benefício. Nessa situação o aposentado que retorne ao

mercado de trabalho e verta novas contribuições, poderá pleitear a desaposentação,

permanecendo na mesma modalidade de aposentadoria, porém em sua forma

integral.

É o que acontece também no caso do aposentado por idade. Por ter

incidência facultativa do fator previdenciário, em tal modalidade apenas novos

recolhimentos possibilitariam alguma modificação no valor do benefício, dando

inclusive a oportunidade de o segurado optar, quando da concessão do novo

benefício, pela incidência do fator previdenciário caso à época lhe seja mais

benéfico.

Porém, o mesmo poderia acontecer na modalidade de aposentadoria por

tempo de contribuição, na qual a aplicação do fator previdenciário é obrigatória. Em

sendo verificado que a incidência do fator ao tempo do pedido de desaposentação e

o recolhimento de novas contribuições acrescentaria vantagem ao benefício do

aposentado, a desaposentação é plenamente possível.

21

Ressalte-se que a contribuição previdenciária vertida após o jubilamento do

segurado só trará impacto positivo em sua renda caso permaneça em valor de

mesmo patamar ou superior à que gerou a aposentadoria. Isto porque, para o

cálculo do valor do benefício são descartados os 20% menores salários-de-

contribuição9, caso as novas contribuições do segurado sejam inferiores às que

entraram no cálculo da primeira aposentadoria, o efeito poderia ser contrário ao

pretendido.

A segunda hipótese pode ser verificada no caso de mudança entre

modalidades de aposentadorias. Isso se dá em relação ao segurado que deseja,

quando de uma aposentadoria por tempo de contribuição precoce na qual o fator

previdenciário acabou por diminuir significativamente o valor do benefício, trocá-lo

por aposentadoria por idade ao atingir o requisito etário.

Em relação à aposentadoria por invalidez, ressalte-se que esta não pode ser

alvo de desaposentação, pois o retorno à atividade é expressamente vedado,

resultando, inclusive, na perda do benefício conforme consta do art. 46 da Lei de

Benefícios que assim prevê: “O aposentado por invalidez que retornar

voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a

partir da data do retorno.”

2.4 PRINCIPAIS CELEUMAS DOUTRINÁRIAS

Existem inúmeras discussões no tocante ao instituto objeto desse trabalho.

Tais discussões são fruto da ausência de regulamentação legal da desaposentação,

restando à doutrina e jurisprudência esta difícil tarefa.

9 Art. 29 da Lei 8.213/91: O salário-de-benefício consiste:

I - para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário; II - para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo.

22

O primeiro ponto dessa discussão gira em torno da ausência de previsão legal

da desaposentação. Este é o principal argumento do INSS para a denegação de

pedidos dessa natureza.

Não obstante a argumentação levantada pela Autarquia Previdenciária, nos

explica Serau Junior (2013, p.48) que

esse não vem a ser o melhor entendimento para a hipótese ora estudada. É que, embora não “exista” fundamentação jurídica expressa para a desaposentação, este instituto (ou conceito) pode ser construído a partir de inúmeros argumentos jurídicos já presentes ao longo do ordenamento jurídico.

Nessa mesma esteira,

A vedação no sentido da impossibilidade da desaposentação é que deveria constar de lei. A sua autorização é presumida, desde que não sejam violados outros preceitos legais ou constitucionais. No caso, não se vislumbra qualquer empecilho expresso no ordenamento jurídico pátrio (IBRAHIM, 2011, p. 69)

Outro impasse diz respeito à possibilidade de renúncia pelo segurado ao

benefício da aposentadoria. Utilizando-se como fundamentação para justificar a

inviabilidade do desfazimento da aposentadoria, o conteúdo do art. 181-B do

Decreto 3.048/99, que assim reza: “As aposentadorias por idade, tempo de

contribuição e especial concedidas pela previdência social, na forma deste

Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis.”

No que tange à disponibilidade do direito à aposentadoria, a posição da

jurisprudência brasileira é no sentido da possibilidade da renúncia ao benefício da

aposentadoria, por sua natureza de direito patrimonial, sendo, portanto, disponível.

Nesse sentido, trecho do voto proferido pelo Des.Fred Jediael Galvão Miranda nos

autos do Processo 19.61.00.0107620-2/SP10:

A definitividade e a irreversibilidade dos benefícios é garantia que milita em favor do segurado, como regra de proteção, de maneira que se o detentor do direito abre mão da prestação previdenciária, não se legitima a resistência do INSS.

10 In: ALENCAR,Hermes Arrais, 2011, p. 85

23

Há ainda, no que diz respeito à possibilidade de desfazimento do ato

concessório da aposentadoria, se este causaria violação ao ato jurídico perfeito.

Como se sabe, a concessão do benefício decorre de ato administrativo, que após

seu decorrer completo assume o patamar de ato jurídico perfeito.

Nesse sentido, ressalta Alencar(2011, p. 75) em relação à desaposentação,

que esta não se trata de revogação do ato concessivo da aposentadoria, ao

contrário, firma entendimento de que esta “não está embasada na ilegalidade do ato

concessório, ao revés, parte do pressuposto de a aposentação decorrer de ato em

estrita consonância com os ditames legais, verdadeiro ato jurídico perfeito.”

Afirma o retro citado autor que

Justamente porque satisfeita a conformação do ato concessório, a benesse previdenciária, à legislação de regência, resta inviabilizado procedimento de anulação. Inadmissível, por igual, a cessação dos efeitos típicos a aposentadoria sob o pálio da motivação estatal da mera (in)conveniência ou (in)oportunidade (ALENCAR, 2011, P. 75)

O ponto mais importante nessa discussão diz respeito à questão da

devolução dos valores recebidos antes da desaposentação.

Tendo o segurado renunciado ao benefício de aposentadoria que vinha

recebendo para fazer jus a novo benefício mais vantajoso, surge a questão: Os

valores recebidos quando da primeira aposentadoria devem ser restituídos?

Nessa seara, muito bem elucida Ibrahim (2011, p. 64):

Naturalmente, como visa benefício posterior, somente agregará ao cálculo o tempo de contribuição obtido a posteriori, sem invalidar o passado. A desaposentação não se confunde com a anulação do ato concessivo do benefício, por isso não há que se falar em efeito retroativo do mesmo, cabendo tão somente sua eficácia ex nunc. A exigência da restituição de valores recebidos dentro do mesmo regime previdenciário implica obrigação desarrazoada, pois se assemelha ao tratamento dado em caso de ilegalidade na obtenção da prestação previdenciária.

Sustentam ainda, alguns autores, que a não devolução dos valores recebidos

durante a aposentadoria pretérita traria como conseqüência o equilíbrio financeiro-

atuarial da Previdência Social, o que como já explicitado anteriormente, não se

opera no âmbito do RGPS.

24

3.TRATAMENTO ATUAL DA MATÉRIA

3.1 ANÁLISE DO PROJETO DE LEI 91/2010

Existem muitas expectativas em relação à regulamentação da

desaposentação. Alvo de diversos projetos de lei que restaram infrutíferos, o instituto

permanece sem definição legal.

Muito se tem falado a cerca do Projeto de Lei 91/2010 de autoria do

Senador Paulo Paim. Ainda este ano o projeto foi aprovado pela Câmara de

Assuntos Sociais do Senado Federal.

O projeto propõe a inclusão do seguinte artigo na Lei 8.213/91:

Art. 18‐A. O segurado que tenha se aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social, por tempo de contribuição, especial e por idade, pode, a qualquer tempo, renunciar ao benefício da aposentadoria.

§ 1º Ao segurado que tenha renunciado ao benefício da aposentadoria fica assegurado o direito à concessão de nova aposentadoria, no âmbito do Regime Geral de Previdência Social, utilizando‐se na contagem do tempo de contribuição que serviu de base para a concessão do benefício objeto da renúncia e a contagem do tempo de contribuição posterior à renúncia, bem como o direito ao acúmulo de nova renda mensal do benefício, na forma do regulamento.

§ 2º A renúncia do segurado à aposentadoria, para fins de concessão de novo benefício no âmbito do Regime Geral de Previdência Social, não implica devolução dos valores percebidos enquanto esteve aposentado.”

Aparentemente, o projeto, se aprovado, colocaria fim a discussão a cerca da

possibilidade da desaposentação, assim como da devolução dos valores percebidos

na primeira aposentadoria.

Porém, não é o que acontece. O projeto contém um equívoco que contraria

toda a construção a cerca da desaposentação. Isto porque no projeto consta as

contribuições que serão consideradas para o cálculo da segunda aposentadoria, são

aquelas vertias apenas após a renúncia.

O aposentado que voltasse a trabalhar teria que renunciar a aposentadoria

recebida para assim desonerar o período contributivo pretérito, que seria somado

com as contribuições que forem vertidas a partir daquele momento.

25

Ora,

Não tem sentido um projeto de lei que restringe o segurado de usar as contribuições previdenciárias feitas após sua aposentadoria e ainda ficar sem receber o benefício que já fazia jus, ou seja, sem proteção previdenciária, para ainda voltar a recolher e só depois quando entender plausível requerer uma nova aposentadoria

11.

Dessa forma, ainda continua indefinida a tão aguardada lei que venha sanar

toda a celeuma que paira sobre o instituto a desaposentação.

3.2 ATUAL POSICIONAMENTO DO STJ: DECISÃO NO RESP N.º 1.334.488-SC

Inúmeros recursos encontram-se sobrestados no STF, aguardando o

julgamento em recurso repetitivo do Recurso Extraordinário nº 381.367, que foi

afetado para julgamento pelo Plenário por tratar-se de repercussão geral. O que

significa dizer que não há posicionamento do Supremo sobre a desaposentação até

este momento.

Tal fato não impediu o promover o enfrentamento da matéria, tornando-se

hoje o maior responsável pelo apaziguamento as principais questões relativas à

possibilidade de renúncia à aposentadoria, nesse sentido

o fato de a questão federal debatida nos autos ser objeto de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal não determina o sobrestamento dos julgamentos dos recursos especiais, e sim dos recursos extraordinários eventualmente interpostos em face dos arestos prolatados por esta Corte, que tratem da matéria afetada

12.

O posicionamento do STJ firmou-se no sentido de considerar a aposentadoria

direito patrimonial disponível, sendo, portanto passível de renúncia. Admitindo,

dessa forma, a viabilidade da desaposentação.

Contrariando tal entendimento, preceitua Alencar (2011, p. 106)

[...] em nosso pensar, disponível é o direito que recai sobre o aspecto monetário das prestações previdenciárias, a renda, mensal do benefício, não sobre o direito propriamente dito, este deve ser tido por indisponível.

11

FIGUEIRAS JUNIOR, Edson Machado. Erro no Projeto de Lei nº 91/2010 – Desaposentação. Disponível em <http://www.mfaa.adv.br/?p=3798>.Acesso em 19 de julho de 2013. 12

AgRg no Resp 1274328/RS, Rel. Ministro OG Fernandes, sexta turma, DJe 07/03/2013.

26

Ainda que não exercitado, o direito ao benefício integra o patrimônio jurídico o segurado, não admitida sua exclusão nem por vontade própria (ALENCAR, 2011, p. 106).

Em relação aos valores recebidos durante a vigência da primeira

aposentadoria, o STJ já vinha se posicionando neste sentido, conforme o seguinte

arresto:

CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RENÚNCIA ÀAPOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES. DESNECESSIDADE.PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO DE FUNDAMENTOS. ANÁLISE DEDISPOSITIVOS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. Prevalece nesta Corte entendimento no sentido de se admitir arenúncia à aposentadoria objetivando o aproveitamento do tempo decontribuição e posterior concessão de novo benefício,independentemente do regime previdenciário que se encontra osegurado, não importando em devolução dos valores percebidos. 2. A apreciação de suposta violação de preceitos constitucionais nãoé possível na via especial, nem à guisa de prequestionamento,porquanto matéria reservada pela Carta Magna ao Supremo TribunalFederal.Agravo regimental improvido. (STJ, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 02/08/2012, T2 - SEGUNDA TURMA)

Neste ponto são considerados pela Corte dois aspectos: a natureza alimentar

do benefício previdenciário, há muito reconhecida pelo STJ diante da boa-fé do

segurado; ausência de prejuízo ao regime de previdência concessor do primeiro

benefício13.

No âmbito dos Juizados Especiais Federais foi suscitado Incidente de

Uniformização Nacional. Assim, posicionou-se a Turma Nacional de Uniformização

no sentido de que

[...] a desaposentação é possível, mas é dependente da devolução dos valores percebidos a título de primeiro benefício.Ademais, ensejaria desequilíbrio financeiro-atuarial para os cofres do INSS, assim como possível locupletamento ilícito dos segurados, um verdadeiro privilégio (SERAU JUNIOR, 2013, p. 68).

Como se observa, o posicionamento da TNU se mostrou contrário ao que

preceitua o STJ, o que levou à suspensão do tema nos JEFs, frente tal dicrepância

de entendimentos.

Ressalte-se que não existe consenso no que diz respeito ao posicionamento

dos Tribunais Regionais Federais, o que vem causando dificuldade da consolidação

do instituto da desaposentação.

13

ALENCAR, Hermes Arrais, 2011, p. 109.

27

Nesse sentido,

Diferentemente do posicionamento mais consentâneo com os direitos fundamentais adotado pelo STJ, os Tribunais Regionais Federais encontram-se divididos: há os que assumiram uma postura mais conservadora, semelhante à adotada pela TNU, outros que possuem entendimento mais alinhado aos direitos sociais (SERAU JUNIOR, 2013, p. 69)

Em meio a tantas divergências, surge a maior novidade quanto à questão, diz

respeito a recente decisão do STJ em sede de recurso repetitivo14, no Recurso

Especial nº 1.334.488- SC. Analisaremos mais atentamente o seu teor.

Segundo o voto do Relator, o Minstro Herman Benjamin

Há dois pontos jurídicos a serem enfrentados in casu: a possibilidade de o segurado renunciar à aposentadoria e, se admissível, a necessidade de devolução dos valores recebidos por força do benefício pretérito.

O Superior Tribunal de justiça ao apreciar tais questões, põe fim às

discussões sobre tais premissas, obviamente, na seara infraconstitucional.

Consolida, portanto, tal decisão o entendimento de que os benefícios

previdenciários constituem-se em direitos patrimoniais disponíveis, além firmar

posicionamento sobre a desnecessidade do ressarcimento da aposentadoria que se

está renunciando como condição para a concessão de nova aposentadoria.

Dessa forma, diante das muitas divergências existentes, tal decisão desponta

como marco no instituto da desaposentação. Além do mais, servirá como orientação

para os TRFs, assegurando maior estabilidade ao instituto até que este venha a ser

regulamentado futuramente.

14

Conforme o art. 543-C do Código de Processo Civil “Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.”

28

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O atual panorama dos aposentados no nosso país vem levando esta classe a

retornar ao mercado de trabalho como forma de complementação da renda. Isso

somado as mudanças recentes ocorridas na legislação previdenciária, fizeram com

que a desaposentação se tornasse uma forma de correção do valor referente ao

benefício da aposentadoria.

Inúmeros debates se firmaram em torno da desaposentação no tocante à sua

viabilidade no ordenamento jurídico pátrio, assim como as conseqüências de se

admitir tal possibilidade.

A despeito dos demais pontos abordados por este trabalho, a maior celeuma

referente à desaposentação diz respeito à necessidade ou não da devolução dos

valores recebidos quando da primeira aposentadoria, pois na esfera do judiciário,

como se verificou com esse estudo, há diferentes posicionamentos, tanto pela

desnecessidade da restituição como pela sua desnecessidade.

A jurisprudência pátria vem se solidificando, principalmente por parte do STJ,

no sentido da assimilação da desaposentação. Porém, surgiram diversas

interpretações sobre o tema, o que gerou certa instabilidade sobre a forma como

deveria ocorrer a desaposentação.

Não se obteve ainda manifestação do STF sobre a desaposentação, tendo

restado ao STJ a tarefa de delinear o conteúdo de tal instituto, assim como seu

processamento.

O posicionamento atual do STJ, como visto, consolida o direito

desaposentação. Firmando entendimento no sentido da disponibilidade da

aposentadoria e da desnecessidade de restituição dos valores pagos pelo INSS. Tal

decisão, em sede de repercussão geral, será capaz, por enquanto, de dissipar

maiores contendas à respeito do tema.

Ademais, atualmente encontra-se em foco projeto de lei que visa regular a

desaposentação. Que, como visto, se aprovado, acarretará em situação diversa da

pretendida pelos milhares de aposentados que se encontram trabalhando

29

atualmente e desejam renunciar seu benefício em prol de nova aposentadoria de

valor satisfatório.

Desta forma, o que se quis acentuar com o presente estudo é que a

problemática referente à desaposentação só terá fim após pronunciamento do STF

sobre a matéria ou até a entrada em vigor de lei que regule tal instituto de modo

satisfatório.

30

ABSTRACT

The Failure retirement can be conceptualized as a waiver of retirement as a way of harnessing the contribution time after the granting of the benefit to enjoy it in granting benefit more advantageous. The nodal point in the failure retirement issue concerns the question of the need / no need to repay the amounts received during the first retirement. Much of the doctrine and jurisprudence are positioned towards the unnecessary return values. However, despite being widely discussed, the failure retirement is still no legal provision. Currently numerous jurisprudential and legislative efforts have been undertaken in order to resolve the dispute and grant greater legal certainty to such institute. Keywords: Failure retirement. Retirement. Returned values.

31

REFERÊNCIAS

ALENCAR, Hermes Arrais. “Desaposentação” e o Instituto da “Transformação” de Benefícios Previdenciários do Regime Geral de Previdência Social. São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

AMADO, Frederico. Direito e Processo Previdenciário sistematizado. 3. ed. São Paulo: JusPodivm: 2012.

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil,de e de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 05 dez. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 20 de juho de 2013.

______. Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 ago. 1991. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm. Acesso em 20 de julho de 2013.

______. Decreto 3.048 de 6 de maio de 1999. Aprova o Regulamento da Previdência Social, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 7 mai. 1999- Republicado em 12/05/1999. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm. Acesso em 20 de juhlo de 2013.

IBRAHIM, Fábio Zambite. Desaposentação. 5. ed.. Niterói,RJ: Impetus, 2011.

KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 8. ed. São Paulo: JusPodivm, 2011.

SERAU JUNIOR, Marco Aurélio. Desaposentação. 3. ed. Re. E atual. Rio de Janeiro: Forense, 2013.

32

ANEXO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.334.488 - SC (2012/0146387-1)

RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN

RECORRENTE : WALDIR OSSEMER

ADVOGADO : CARLOS BERKENBROCK E OUTRO (S)

RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF

RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : CONFEDERAÇAO BRASILEIRA DOS

APOSENTADOSPENSIONISTAS E IDOSOS COBAP -

"AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : JOSÉ IDEMAR RIBEIRO

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E

RESOLUÇAO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE

CONTROVÉRSIA.DESAPOSENTAÇAO E REAPOSENTAÇAO. RENÚNCIA

A APOSENTADORIA. CONCESSAO DE NOVO E POSTERIOR JUBILAMENTO.

DEVOLUÇAO DE VALORES. DESNECESSIDADE.

1. Trata-se de Recursos Especiais com intuito, por parte do INSS, de declarar

impossibilidade de renúncia a aposentadoria e, por parte do segurado, de dispensa

de devolução de valores recebidos de aposentadoria a que pretende abdicar.

2. A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para

computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de

contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de

posterior e nova aposentação.

3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto,

suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos

valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a

concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ.

4. Ressalva do entendimento pessoal do Relator quanto à necessidade de

devolução dos valores para a reaposentação, conforme votos vencidos proferidos

33

no REsp 1.298.391/RS; nos Agravos Regimentais nos REsps 1.321.667/PR,

1.305.351/RS,1.321.667/PR, 1.323.464/RS, 1.324.193/PR, 1.324.603/RS,

1.325.300/SC, 1.305.738/RS; e no AgRg no AREsp 103.509/PE.

5. No caso concreto, o Tribunal de origem reconheceu o direito à desaposentação,

mas condicionou posterior aposentadoria ao ressarcimento dos valores recebidos do

benefício anterior, razão por que deve ser afastada a imposição de devolução.

6. Recurso Especial do INSS não provido, e Recurso Especial do segurado provido.

Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.

ACÓRDAO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,

acordam os Ministros da PRIMEIRA Seção do Superior Tribunal de Justiça:

"Prosseguindo no julgamento, a Seção, por unanimidade, negou provimento ao

recurso especial do INSS e deu provimento ao recurso especial do segurado, nos

termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia

Filho, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Eliana Calmon, Arnaldo

Esteves Lima e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Sérgio Kukina e Ari Pargendler.

Brasília, 08 de maio de 2013 (data do julgamento).

MINISTRO HERMAN BENJAMIN

Relator