cem anos sem antonio agú

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Cem Anos Sem Antonio Agu está direcionado ao passado histórico da Cidade de Osasco. O livro retrata o desafio de um italiano, uma pessoa predestinada ao sucesso. Era quase impossível acreditar que ele alcançaria o progresso, diante de tantos obstáculos. Mas a confiança em Deus, guardada em seu âmago, fez brotar o grande começo. Por sua vez a continuidade fez também passar por muitos homens e mulheres corajosos, incansáveis para tão sonhada “autonomia”. Outros tantos, de uma forma ou de outra colaboraram e, com certeza hão de colaborar sempre para o crescimento e a grandeza dessa Cidade de Osasco.

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Cem Anos Sem

Laura Leal

S ã o P a u l o 2010

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O livro Cem Anos Sem Antônio Agú resgata a história do empreendedor e fundador da cidade de Osasco, estando, hoje, constituída pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Em seus primórdios, a cidade era chama-da de Ilha de São João; mais tarde, Subúrbio da cidade de São Paulo.

Subjetivamente, a palavra “história” traz em seu cerne o respeito à vida dos seres humanos em sociedade ao longo do tempo. As fontes históricas são documentos, livros, fotos, objetos, estilos de vida, documentários de filmes inclusive depoimentos coletados em 2009, enfim, tudo o que diz respeito à História da Ciência Social.

Laura Leal, autora.

Este livro é dedicado à população da cidade de Osasco, Brasil, como também da cidade de Osasco, Itália, por ter sido ele,

Antônio Agú, um filho ilustre.

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aPreSeNtação

A história deste livro marca o percurso dos seres humanos numa deter-minada sociedade e época. São acontecimentos relacionados aos objetivos, às necessidades e aos costumes de uma população, ocorridos em datas a serem lembradas.

Cem Anos Sem Antônio Agú é um livro que conta a formação da cida-de de Osasco a partir do ano de 1887. Expõe situações vividas por uma população em uma época de urbanização que fez uso de técnicas para in-dustrializar seus produtos e assim laborar as terras e torná-las prósperas. Osasco está situada a oeste da capital do Estado de São Paulo, há dezesseis quilômetros, a partir do marco zero, do então complexo metropolitano da cidade de São Paulo.

É oportuno observar, pois esta ação aproxima o passado de sua história, que os pioneiros encorajados viveram e lutaram para a formação daquilo que hoje a cidade vive – a busca de uma realidade humana melhor para as próximas gerações.

Diante desta magnitude, convém à História da Ciência Social mostrar como os fatos evoluem e se transformam. Aquela família, aquela fábrica, aquela escola, aquele hospital, não existem como seres imutáveis. Há de se ocupar as lacunas para conhecer sua origem, a tradição de uma sociedade, enfim, a vida da humanidade. Entretanto, o livro não mostra somente os feitos heroicos e o sucesso daquela vila que se urbanizava. Há momentos de infortúnio como o fato relacionado à Cooperativa de Vidreiros.

No livro que você vai ler, descobrirá a postura de um povo simples, or-deiro e honesto que habitou e ainda habita a cidade de Osasco. São pessoas responsáveis pelas transformações em todo o campo, independentemente do grupo sociopolítico-cultural. E quantas vezes sentimos dificuldades em

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concretizar nossos objetivos! À proporção que relevamos a raça, a cor, o poder econômico, a crença, a opinião, valorizamos a herança cultural do município.

Tudo isso faz lembrar com satisfação o grande avanço ocorrido nessa trajetória: Ilha de São João, Subúrbio da cidade de São Paulo, Vila Osasco, Distrito de São Paulo, atualmente cidade de Osasco do Estado de São Paulo. Temos como fundador da cidade um empreendedor como Antônio Agú, um empreendedor com visão progressista, que foi motivo de publicação na imprensa da época, relacionado ao crescimento do bairro. Ao longo desse período houve mudanças de toda ordem, durante os cem anos pós-morte de Antônio Agú. Essa foi, pois, a forma encontrada para reconhecer e man-ter viva a memória daquele que deu origem à Osasco - Cidade Trabalho.

A autora

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Introdução

As fotos acima são destaque do sítio “Ilha de São João”, propriedade do fundador Antônio Agú, que um dia ele sonhou para depois se transformar na cidade de Osasco.

caPítulo i

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“O homem, ao construir, melhora o seu interior e o mundo. Se fizer da natureza a corrente do progresso, terá o objetivo alcançado. Para ser construtor e empreendedor é preciso acreditar; assim, tem a certeza do sucesso.” E ele fez isso; Antônio Agú criou e fundou a cidade de Osasco-Brasil.

A autora

Foto: Rômulo Fasanaro Filho - Osasco - atual - 2009

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oSaSco tem Na Sua HiStória a ParticiPação do íNdio, do

“coroNel FazeNdeiro” e do “coNStrutor emPreeNdedor”.

Walter Ramos - Fonte: Museu Municipal de Osasco - Dimitri Sensaud de Lavaud - Antônio Agú e famíliaFonte: Walter Ramos

Foto: Castelo di Miradolo - Osasco, Itália, utilizado em documentos como marca d’agua de certidõesFoto:by servizi_grafici

Fonte: José Luiz Alves de Oliveira

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Fonte: Museu Municipal Dimitri Sensaud de LavaudCertidão de Nascimento e Batismo de Antônio Agú.

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Fonte: Museu Municipal Dimitri Sensaud de LavaudCertidão de Nascimento e Batismo de Antônio Agú.

Fonte: Museu Municipal de Osasco - Dimitri Sensaud de Lavaud

Biografia de Antônio Agú

Nascido a 25 de outubro de 1845, às 9 horas, num povoado chamado Osasco, pertencente ao distrito de San Secondo di Pinerolo, província de Torino, região de Piemonte, na Itália, era o filho primogênito dos lavradores senhor Antônio Giuseppe de Pietro Agú e senhora Domênica Vianco. No mesmo dia do nascimento, foi realizado o batismo pelo sacerdote Michele Vianco, seu parente materno, na Igreja de Osasco, na Itália, pelo qual re-

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cebeu o nome de Antonio Giuseppe Agú. Foram seus padrinhos o senhor Giuseppe Vianco e a senhora Luiggia Vianco, que, assim como seus pais, eram agricultores e residiam em Osasco, na Itália.

Antônio Agú chegou ao Brasil no ano de 1872, aos 27 anos de idade. Foi casado com a senhora Benvenuta Chiareta, da qual desquitou legalmente. Dessa união nasceu a filha Primitiva Domenica Michela Agú em 22 de julho de 1872 e, de acordo com as informações contidas no histórico da Cúria Metropolitana da cidade de Osasco, Itália, nesse mesmo ano, o senhor An-tônio Agú chegou ao Brasil.

Passado algum tempo, Primitiva filha de Antônio Agú, casa-se na Itália com o primo de seu pai e se mudam para o Brasil. Vivendo no Brasil junto ao esposo Antônio Vianco e morando com seu pai, Primitiva deu a luz à menina Giuseppina Vianco. No entanto, a mãe Primitiva faleceu dezesseis dias após o nascimento da filha, tendo sido vítima da febre puerperal, dei-xando a criança com o pai senhor Antônio Vianco e o avô Antônio Agú, que por sua vez foram em busca da ajuda da prima Cristina Vianco na Itália, que veio para a criação e educação da pequenina Giuseppina. Após certo tempo a menina foi viver com familiares na Itália casando com Cesare En-rico. Desse relacionamento nasceram três filhos.

Foram muitas as razões que trouxeram os italianos para as Américas. No ano de 1870, a Itália, assim como muitos países europeus na época, passou por unificação acarretando a saída de muitos italianos do país. Os demais fatores que contribuíram para essa emigração foram: o confisco da propriedade de terra por falta de pagamentos de impostos, o esgotamento da terra, as relações pessoais entre trabalhadores e proprietários de terras, a crise agrícola, o desflorestamento, a política comercial e a falta de alimentos.

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Fonte: Livro: “Vida Social e Política de Raffard” de Pedro Silveira Rocha

Usina de Açúcar São Paulo S/A

Fonte: Livro: “Vida Social e Política de Raffard”de Pedro Silveira Rocha

Estação Raffard

* * *Na cidade de São João do Capivari, Antônio Agú se instalou, as-

sim que chegou ao Brasil em 1872, para trabalhar na Empresa Sucrerie Brasiliense, uma usina de açúcar localizada nesse município, região de Pi-racicaba, Estado de São Paulo. Nessa cidade, enquanto foi morador por quatorze anos, Antônio Agú trabalhou na construção do Engenho Central da Usina de Açúcar São Paulo. Essa usina foi o primeiro engenho insta-lado na cidade de Capivari, uma grande geradora de açúcar e álcool. Com grande potencial canavieiro e destaque na produção de novas tecnologias, o atual Grupo Cosan, está localizado em muitas cidades brasileiras como em Raffard, e subsidia a cidade de oito mil habitantes e gera muitos empregos e renda.

O Engenho Central de Capivari, construído em 1881, foi considerado digno de servir de exemplo para muitos estabelecimentos congêneres (Bi-blioteca do Arquivo Nacional 1885). Ele foi fundado em 1883 por Julio Henrique Raffard na cidade de São João de Capivari por meio do Decreto nº 6.317 no ano de 1876. Essa usina muito bem equipada e com boa opor-tunidade de trabalho acabou atraindo pessoas de vários lugares, tornando Capivari um pequeno povoado. O engenho-usina da cana-de-açúcar contri-

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buiu em grande escala para dar à cidade movimento e aspecto acentuada-mente industrial, fazendo da planta açúcar e aguardente. A capacidade da produção era de duzentas e quarenta toneladas. Consta que esse engenho paulista foi o único engenho central construído com capital estrangeiro e maquinário inglês.

O local rapidamente ficou conhecido por “Vila do Henrique Raffard”. Os primeiros povoados foram de imigrantes italianos e Antônio Agú foi um desses que, a partir de 1875, habitou sítios e fazendas da região de Pi-racicaba. Esses mesmos italianos viram a transformação do povoado em “Vila Raffard” e mais tarde em “Raffard”, em homenagem àquele que dedi-cou a sua vida, os sonhos e as esperanças às terras de São João do Capivari, o senhor Henrique Raffard. Com o progresso da região, houve necessidade de se abrir uma estrada de ferro para ligar São João de Capivari ao povoado Raffard, e o italiano Antônio Agú também trabalhou na construção desse trecho da ferrovia.

As fronteiras da cultura cafeeira e da cana-de-açúcar se alargavam cada vez mais em direção à região oeste do Estado. Os braços para tocar as plantações minguavam em decorrência da Lei Áurea, assinada pela prince-sa Isabel, que extinguia, em caráter definitivo e irrevogável, a escravatura no país. Assim, a saída mais viável foi substituir o escravo afro-brasileiro pelo trabalhador europeu assalariado. Observa-se que essa cidade carecia de mão de obra especializada e não podia parar seus largos passos em direção ao novo século só pela falta do trabalho escravo. É certo que o es-cravo trabalhava bem na lavoura, porém não era hábil no uso de máquina a vapor para o beneficiamento de grãos de café, algodão, milho e arroz. Também não possuía a prática de usar máquina para formatar telhas e tijolos nas olarias. A tecnologia estava somente ao alcance dos agriculto-res. Aquele que quisesse fazer uso de veículos, máquinas e demais instru-mentos para a lavoura, solicitava ao mecânico daquele local, um senhor chamado Henrique de Araújo, quem fabricava tais instrumentos em sua

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ferraria, aliás, muito bem montada no centro da cidade de São João do Capivari. Todos esses sinais de desenvolvimento que nem ao menos a cidade de São Paulo possuía, Antônio Agú almejava a realização de um sonho para o século XIX.

A narrativa esclarece o progresso que Antônio Agú daria às terras que veio a comprar no km 16 da Estrada de Ferro Sorocabana, na cidade de São Paulo; nada tem a ver com Osasco, Itália, mas com São João do Capivari, Estado de São Paulo, local onde fixou residência por quatorze anos. A Itália que Antônio Agú deixou, nada prometia aos filhos pátrios, tampouco vislumbrava o progresso. Com relação aos recursos para ad-quirir o sítio do km 16, onde existia uma pequena olaria de proprieda-de do senhor João Pinto Ferreira, eram provenientes da construção do Engenho Central de Capivari. Antônio Agú tinha propriedade na cidade e São Paulo, mais exatamente nas ruas Lins de Vasconcelos (região da Vila Mariana) e da Estação (atual José Paulino, no Bom Retiro). Foi na cidade de São João do Capivari, região de Piracicaba, Estado de São Paulo, o local em que se estabeleceu, posteriormente passando para o km 16 da Estrada de Ferro Sorocabana. São várias as razões para essa decisão, mas, entre elas, certamente, está a realização de um sonho, de construir um bairro.

A cidade de São Paulo, a partir do ano de 1887, começava a dar sinais de sua transformação de simples município para o complexo metropo-litano que hoje conhecemos. Antônio Agú, com seus 42 anos de idade, era considerado uma pessoa abastada e tinha amadurecido seus ideais. Era tempo de novos rumos e novos projetos. Ele não foi o primeiro e nem seria o único italiano que se mudou para a cidade de São Paulo, tanto que é correto afirmar que, entre 1872 e 1886, a população de origem italiana saltou de 8 para 25% em relação ao total de habitantes do país. São Paulo deixava de ser apenas um polo político da província para se tornar uma cidade desenvolvida e economicamente vibrante, dinâmica e exigente.

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Os braços italianos invadiam os meios de produção; eram pequenos co-merciantes, artesões, operários têxteis, engraxates, vendedores ambulantes e oleiros. A cidade já contava com as fábricas de tecidos, calçados, gêneros ali-mentícios e olarias. O panorama era vertiginosamente mudado. Como con-sequência, já faltava moradia para a população. Os apelos de mudanças não eram poucos e cada vez eram maiores os atrativos para se sair de São João do Capivari e seguir para a cidade de São Paulo.

* * *Autonomia e liberdade para a ação eram os elementos necessários

para Antônio Agú dedicar-se aos negócios de compra e venda de proprie-dades e empréstimos de dinheiro a juros para outros imigrantes como ele que viviam do trabalho nas olarias. Reformou a casa do doutor Domingos Jaguaribe no Bairro da Minhoca, na cidade de São Paulo.

Pode parecer uma coisa simples dar a outrem o poder de vender, hipotecar, passar e assinar escritura, entrar em qualquer ajuste, receber quantias de dinheiro, dar quitação, praticar todo e qualquer ato que for a bem de seus interesses. Porém, no caso de Antônio Agú e sua esposa Benvenuta Chiaretta Agú, isso foi uma ampla liberdade de ação. O fato de ter se casado em comunhão de bens fez com que Antônio Agú neces-sitasse da permissão de sua esposa para gestar a “Ilha de São João” bem como a casa de sua propriedade na Vila Raffard, na cidade de Capivari. Para assinar esse documento, Benvenuta Chiaretta Agú veio ao Brasil pela primeira e última vez. Não se sabe ao certo, mas essa procuração afirma que Benvenuta vivia em Comiana, na Itália. Mais que uma pro-curação com amplos poderes, Benvenuta Chiaretta deu ao marido a condição de se desenvolver e seguir a vida independentemente da von-tade dela. Antônio Agú estava livre para administrar as terras do km 16, fazer o que precisasse ser feito. Nessa mesma data, o casal passou outra procuração para dois advogados que buscariam o empréstimo hipotecário em banco.

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Esse foi um período econômico brasileiro em que o dinheiro prome-tido pelo imperador Dom Pedro II haveria de aparecer, já que a falta de papel-moeda no país foi uma das razões da queda da Monarquia. A emis-são de dinheiro seria uma das medidas econômicas do primeiro governo republicano. Assim, a atitude de Antônio Agú de pedir a dois advogados que procurassem dinheiro para que ele pudesse investir em suas terras, atitude normal para a época. Uma das exigências econômicas da Repúbli-ca beneficiamento das terras do km 16 foi o empréstimo a proprietários com terras produtivas. Ou seja, terras que tivessem culturas de lavoura e utensílios que garantissem, com sua penhora, o dinheiro tomado empres-tado aos bancos. As vantagens de se conseguir dinheiro emprestado no banco, nesse período, eram a taxa de juros menor e o prazo de pagamento das parcelas maior (semestrais).

* * *Compra das terras - Depois de suas viagens pela Estrada de Ferro

Sorocabana, o empreendedor ficou impressionado com as indústrias exis-tentes, principalmente na região de São Roque.

A partir daí, optou por fundar uma fábrica de tijolos e telhas que produ-ziria utilizando a terra (barro) como matéria-prima. Ele observou que nesse ramo havia a possibilidade de bons resultados, já que se tornara construtor. Esse projeto tornou-se real em 4 de junho de 1887. Ao se estabelecer no km 16 da Estrada de Ferro Sorocabana, Antônio Agú comprou do senhor João Pinto Ferreira uma gleba de terra contendo casas, ranchos, forno e plataforma para a carga e descarga das locomotivas ferroviárias.

No ano seguinte, adquire também o “Sítio Ilha de São João”, situado nos meandros do Rio Tietê, atual Bairro do Rochdale, contendo trinta mil pés de uva, que abastecia a atividade vinícola que só diminuiu após sete anos com a concorrência do vinho europeu, extinguindo-se o arrenda-mento para o barão Evaristhe Sensaud de Lavaud. Um de seus objetivos era atrair capitais de São Paulo para os trabalhos da olaria do sítio que ha-

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via comprado de João Pinto Ferreira. Os familiares começaram a chegar para ajudá-lo.

No ano de 1887, chegou da Itália o genro Antônio Vianco e esposa, filha de Antônio Agú, senhora Primitiva Vianco Agú. Depois veio o sobrinho, Giovanni Bapttista Agú, que passou a auxiliá-lo em seus empreendimentos. Antônio Vianco assim que chegou ao Brasil tornou-se sócio do sogro Antô-nio Agú no ramo das construções na “Empreiteira Antônio Agú e Genro”. A empresa encarregava-se da construção e direção das obras.

No mesmo ano de 1887, no km 16 da Ferrovia Sorocabana já havia um pórtico que servia para transportar a produção do local por meio do trem de carga até a cidade de São Paulo e de lá para os locais necessários para a utilização dos tijolos e telhas, além de outros produtos produzidos no local. Nos anos seguintes, Antônio Agú passou a vender terras para alguns co-nhecidos e amigos imigrantes, principalmente italianos, para incentivá-los a fixar residência e investir, especialmente, em atividades industriais ou co-merciais, além de ter sido ele o próprio investidor. É interessante observar o comentário de Alice Canabrava em seus estudos sobre as chácaras pau-listanas: “...encontra-se também a atividade agrícola ligada a uma produção industrial baseada no solo, a fabricação de telhas e tijolos. Nesses sítios, a olaria encontra-se associada ao pomar de árvores frutíferas em geral, e até há videiras para a fabricação de vinho”. E a propriedade comprada por An-tônio Agú tinha exatamente o perfil de chácara paulistana definida por Alice Canabrava. A raridade está no fato de o “Sítio Ilha de São João” ter sido a primeira propriedade da região do km 16 a ser vendida a um italiano, aliás, por um bom tempo – até 1902 –, foi esse o único sítio que passou de mãos brasileiras para estrangeiras.

* * *Lotes no Cemitério da Consolação, na cidade de São Paulo - Um

ano depois de sua chegada ao km 16, Antônio Agú adquiriu terrenos no pri-meiro cemitério de São Paulo, no Bairro da Consolação, em 28 de fevereiro

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de 1888. Foram dois lotes, de números 14 e 15, na Rua 16, no 1o Cemitério Público de São Paulo, conforme consta no assentamento do Livro no 2, folha 256, do ano de 1888, da Administração do Cemitério da Consolação.

* * *Posse Jurídica da Terra - No período colonial, as terras eram doadas

pela Coroa Portuguesa com base na solicitação daqueles que há muito tem-po ocupavam as terras requeridas.

Só para ilustrar, podemos citar as terras de Afonso Sardinha, próximas ao Morro do Jaraguá. Já havia a exploração do ouro nas terras do Jaraguá quando Afonso Sardinha solicitou ao rei de Portugal o documento que dava a ele a posse jurídica das terras, denominada “sesmarias”.

Na época das capitanias hereditárias, os donatários passaram a ter o poder de doar suas terras, “sesmar”, isto é, os donatários podiam ditar aos tabeliães de notas uma escritura de “dada de terras”, nas quais cedia deter-minado espaço de terra para que o “colono” o cultivasse. Em seguida, veio o poder das Câmaras Municipais de doar terras dentro de um determinado perímetro, ao redor do núcleo principal, a três quilômetros da vila, no sen-tido de fixar maior número de moradores. Aliado a todas essas primeiras divisões estavam o que podemos considerar uma subdivisão originária dos inventários e testamentos que dividiam normalmente em partes menores as propriedades herdadas.

Independentemente da forma jurídica como as terras eram passadas aos proprietários, a compra, venda e partilha de algumas heranças tinha escritu-ra pública lavrada por um tabelião de notas. Por quase trezentos anos, essas divisões ficaram sem controle, ou com duplo controle, ora da Igreja, ora dos Juízes Ordinários. Ou seja, os registros de propriedade das terras eram feitos pela Igreja ou, no caso de herança, pelos tabeliães do Judicial.

Por fim, quando a vida no país requeria controle, o rei Dom João VI resolveu cobrar o imposto pela compra e venda de terras dos proprietá-rios - e principalmente para que houvesse um controle seguro no caso de

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empréstimos financeiros entre pessoas, – por isso, surgiram os registros de hipotecas.

* * *Hipotecas - A oficialização dos registros de hipotecas nasceu em 1860.

Nos livros desses registros, ficavam anotados desde escravos até os animais que se davam como garantia de devolução do dinheiro tomado empresta-do. Nesse período, o que mais valia era a peça escrava. As terras eram um acessório quase sem valor monetário.

* * *Os registros de imóveis - Como hoje conhecemos, datam de 1890. Os

cartórios de registros nasceram de uma transformação social, política e fi-nanceira, mas fundamentaram sua maneira de registrar as propriedades nos registros de hipotecas. Há uma diferença muito importante entre o registro de imóvel e o registro de hipoteca que é o número que a propriedade rece-bia no cartório. Com base nesse primeiro número todas as transformações e divisões ocorridas nas terras consideradas originais podiam ser rasteadas através dos tempos. Assim, quem estuda formas jurídicas de propriedade de terras no Brasil de hoje precisa estudar “Dadas de Terras”, “Sesmarias”, “Inventários e Testamentos”, bem como escrituras públicas de diversos cartórios de notas para afirmar ser propriedade desta ou daquela pessoa em qualquer tempo. Não existe, em qualquer período da história do Brasil, pro-priedade de terra sem que haja um documento para confirmar sua posse.

Todas essas explicações servem para que as pessoas entendam que não é muito fácil aos historiadores de hoje encontrar de fato e de di-reito os proprietários das terras de séculos anteriores ao XIX e, muitas vezes, as exigências da lei na lavratura do documento notarial, o mais antigo dentre os documentos de terras, não exigiam muitas minúcias na descrição da terra e de suas divisas. Isso tornou mais difícil afir-