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DANIELA GONÇALVES DE ABREU FAVACHO JOANA DE JESUS DE ANDRADE

ORGANIZADORAS

MAIS QUE ESPECIAL: por um

ensino de ciências inclusivo e transformador

1ª EDIÇÃO

Esta obra foi financiada por meio do 4º. Edital – Santander/USP/FUSP Fomentos às Iniciativas de Cultura e Extensão, sendo proibida sua comercialização. É proibida a reprodução parcial ou integral sem a autorização prévia e expressa da autora.

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto Universidade de São Paulo

Ribeirão Preto - SP

2020

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FICHA CATALOGRÁFICA

Capa Criação e Diagramação: Thiago de Souza Cavallini

Revisão: Hugo Alexandre Silva Favacho

Impressão: HerografInd. Gráfca LTDA-EPP

Ribeirão Preto – SP – Brasil – 2020

1ª Edição, Edição dos Autores

Todos os direitos reservados

Favacho, Daniela Gonçalves de Abreu; Andrade, Joana de Jesus de. MAIS QUE ESPECIAL: por um ensino de ciências inclusivo e transformador. Daniela Gonçalves de Abreu Favacho e Joana de Jesus de Andrade (organizadoras). Ribierão Preto, SP: Edição dos autores, 2020, p. 106

ISBN:978-65-00-00635-3

1. Educação especial. 2.Escola Regular. 3. Desenvolvimento humano. 4. Ensino de ciências.

CDD 370.71

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APRESENTAÇÃO

É com grande alegria que publicamos mais este livro que reúne muitas atividades que desenvolvemos no Centro de Ensino Integrado de Química (CEIQ) e nos permitimos refletir sobre elas. Neste livro descrevemos e refletimos sobre projetos de ensino de ciências que visam colaborar com a inclusão de pessoas com algum tipo de deficiência em escolas regulares. Desde 2017 temos trilhado passos nesta direção e este livro reúne experiências realizadas até o segundo semestre de 2019, quando recebemos apoio financeiro por meio do Edital Santander. No início da caminhada fomos refinando a nossa própria concepção de deficiência e de inclusão e, após diversas atividades realizadas, nos convencemos cada vez mais de que o defeito é uma condição biológica, mas a deficiência é um conceito social (VIGOTSKI, 1987). Portanto, ao assumir que nos constituímos por e com muitos outros, ampliamos diversos conceitos que têm sustentado outras teorias e outras práticas em nossos, já profícuos, projetos de estudo, pesquisa e intervenção na escola.

A proposta deste livro abarca, portanto, as reflexões de diferentes profissionais de saúde e educação, formados e em formação, a partir de três situações de trabalho com alunos com deficiência: as oficinas na Universidade realizadas com alunos da rede básica de ensino com desenvolvimento típico e não típico; as intervenções, por meio de um projeto financiado pela USP e com alunos bolsistas, em sala de aula da rede básica e; um curso de formação continuada de professores de ciências que contemplava diferentes abordagens, dentre elas palestras sobre o tema da inclusão.

Em 2017, tínhamos a seguinte questão: será que crianças com alguma síndrome, por exemplo, a trissomia 21, aprendem da mesma forma que as crianças consideradas de desenvolvimento típico? Inicialmente, supúnhamos que fosse diferente. A prática nos mostrou que as crianças com T21 tinham a mesma capacidade que as outras para aprender, de todo modo, o seu tempo de apropriação era diferente e perdiam a atenção com mais facilidade.

A iniciativa das oficinas nos colocou em contato com pais e professores e, ao ampliar as ações do projeto para o espaço escolar, percebemos que as oficinas nos prepararam para novos desafios que envolveriam colaborar com professores em salas de aula em escolas regulares no sentido de planejar atividades educativas inclusivas no ensino de ciências.

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Assim, tivemos projetos PUB (Programa Unificados de Bolsas da USP), aprovados com bolsistas em atuação nas escolas desde 2018. A partir deste trabalho, percebemos que na escola não seriam só alunos com T21, mas as mais variadas deficiências (síndrome alcoólica fetal, cegueira, baixa visão, autismo, etc). Também percebemos que não se trata de simplesmente adaptar materiais didáticos, mas pensar materiais dentro de estratégias inclusivas, que auxiliem na promoção do respeito e reconhecimento da diversidade.

Em certa medida este tem sido um dos maiores desafios, afinal, usamos as palavras “deficiência” e “deficiente” para designar aqueles que não se encaixam em uma determinada concepção de desenvolvimento dito normal, dentro da norma ou convencional. No entanto, analisando a natureza, vemos que a diversidade, o diferente é a regra e não a exceção, portanto, a diferença é absolutamente normal. Somos nós, no modelo de sociedade que construímos, que criamos barreiras que dificultam a naturalidade do que é diferente e privamos as pessoas de educação, de socialização e etc.

No início de 2018, devido ao crescimento dos trabalhos e do interesse de um grupo de pessoas com anseios quanto à inclusão parecidos com o nosso, criamos o Grupo de Estudos e Apoio à Praticas Inclusivas (GEAPI), formado inicialmente por docentes da universidade, professoras de ensino fundamental, pedagogas, técnicos e licenciandos em química. A necessidade de um olhar multiprofissional para a inclusão atraiu psicopedagogas e terapeutas ocupacionais em agosto de 2019. Priorizando realizar com qualidade nossas ações estabelecemos parceria com uma escola estadual e passamos a realizar periodicamente encontros com professoras e também com a coordenadora pedagógica da escola. Olhamos no particular cada aluno de inclusão e estudamos cada situação como estudo de caso, não perdendo de vista o indivíduo com alguma deficiência e a sala de aula como um todo. Desta forma, foram planejadas e realizadas atividades com algumas salas de aula da escola. Os licenciandos apoiaram adequando materiais e auxiliando as professoras. O primeiro capítulo deste livro relata e compartilha as reflexões e aprendizagens considerando principalmente a formação desses licenciandos em química.

Para atingir o objetivo de colaborar com a inclusão nas escolas regulares organizamos no ano de 2019 a IV Escola de Formação de Professores das Ciências da Natureza em parceria com a Diretoria de Ensino de Ribeirão Preto. Entre os temas abordados tivemos metodologias de ensino de ciências e temas relativos à inclusão. Durante as reuniões de planejamento definimos

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que não bastaria discutir metodologias ou estratégias de ensino com os professores, era necessário trabalhar para que os alunos de inclusão fossem reconhecidos e assegurados em seu direito de aprender. Por isso, além dos membros do GEAPI, nós também convidamos para a Escola de Formação a equipe técnica da Associação Síndrome de Down de Ribeirão Preto (RIBDOWN) e também profissionais do grupo Trissomia 21 de Ribeirão Preto, para que levassem discussões e reflexões sobre deficiências e representações sociais.

A partir do segundo capítulo temos textos escritos por membros do GEAPI (pedagoga e psicopedagoga) e também por outros parceiros vinculados à Ribdown. No penúltimo capítulo, fizemos uma reflexão sobre a formação dos professores de química para atuação na educação especial e por último, dedicamos um capítulo a formação continuada. Durante a Escola de Formação num diálogo informal com os professores pudemos traçar um pretenso panorama das diversas condições do trabalho com alunos com deficiência nas escolas de Ribeirão Preto e, a partir da troca de experiência, reconhecemos a importância de que estes formatos de iniciativas sejam fortalecidos e repetidos.

Daniela Gonçalves de Abreu Favacho e

Joana de Jesus de Andrade

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Sumário

Metodologias de ensino e inclusão: formação de licenciandos em química ................................ ..11

Inclusão na prática da sala de aula regular: um desafio possível ............................................... 43

Neurociências e educação: contribuições para o estudo do desenvolvimento humano no espaço escolar ................................................................... 53

O modelo Social da Deficiência na escola ................................................................................ 67

Os desafios encontrados no processo de educação inclusiva e a importância de uma equipe multidisciplinar para uma educação de sucesso.77

A formação de professores de Química e a educação inclusiva em perspectiva......................85

Formação continuada e inclusão na escola regular: pontos de vista a partir do diálogo com professores ........................................................... 93

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Metodologias de ensino e inclusão: formação de licenciandos em química

Douglas Silva da Hora Oliveira

Hilary Ísis da Silva

Daniela Gonçalves de Abreu Favacho

Apresentação

A formação de professores, em suas etapas inicial e continuada, tem como prerrogativa a constituição de um profissional capaz de trabalhar com diferentes situações e públicos. E, mais recentemente, insere-se nessa formação ampla que também possa ter um papel fundamental nos programas de atendimento a alunos com necessidades educativas especiais.

Não existe um ser humano igual ao outro. Cada um de nós tem suas características próprias. O ser humano é produto de sua história de vida e experiências, portanto, cada aluno é único. A diversidade pode ser motor para a aprendizagem e para construção de uma comunidade educativa democrática, a exemplo do contexto escolar adotado no Projeto Roma, no qual a individualidade é valorizada. Segundo Melero (2008, p.4) responsável pelo citado projeto:

Há muito se pensa que a educação inclusiva consistia em “integrar” crianças com algum tipo de deficiência na escola ... A partir de meu ponto de vista educação inclusiva é a luta contra a segregação, porque o que está em jogo não é que pessoas diferentes aprendam mais ou menos estar com o resto das crianças na sala de aula, mas a escola pública tem que oferecer outro modelo educacional em que todos aprendam a viver juntos.

O projeto Roma considera o desenvolvimento de competências cognitivas e meta-cognitiva, linguística, afetiva e autonomia. O projeto faz a proposição de aulas por meio de investigação e os temas são desenvolvidos a partir dos interesses individuais e identificação de uma situação problemática. A partir daí é levantado o que cada um sabe sobre o problema, são estabelecidas negociações, tarefas em grupo

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e individual, sistematização das etapas, conhecimentos e posterior apresentação para o grupo (MELERO, 2004).

Numa sala de aula geralmente uma mesma atividade é oferecida a todos, sem considerar que os alunos são diferentes. Conhecendo as características de seus alunos o educador pode planejar atividades que valorizem as potencialidades que cada um possui e propicie o desenvolvimento de outras. Numa sala de aula temos alunos com os mais variados perfis e, ao oferecer uma mesma atividade para todos os alunos, independentemente das diferentes características de cada um, surgem problemas: alguns terminam rápido e se não tem outra atividade podem incomodar o andamento da aula; os que demoram a terminar se sentem incapazes. Assim, quando somente uma parte consegue realizar a atividade com êxito, pode-se suspeitar que as atividades estão inadequadas para a zona de desenvolvimento dos alunos mais rápidos e dos lentos.

A zona de desenvolvimento proximal ou potencial é um conceito presente nos trabalhos de Vigotski (1896-1934), e compreende “a região psíquica” entre o que uma pessoa já consegue fazer sozinha e o que ela ainda pode adquirir com a ajuda do outro. Apesar deste ser um conceito teórico, entende-se que para considerar a zona de desenvolvimento da maioria dos alunos, o ideal é variar atividades individuais, em dupla, em grupos, atividades na sala, no laboratório, em casa e usar recursos didáticos diversificados: livros, jogos, filmes, etc. Ou seja, não há como medir, ver ou avaliar esses supostos lugares de desenvolvimento, mas saber que existem diferenças e que é possível intervir para que haja crescimento, apropriações e elaborações, é fundamental.

Em nosso grupo de trabalho na escola com crianças com desenvolvimento não típico partimos do pressuposto de que todos podem aprender, conforme já apregoaram Vigotski e Luria (1996). Com relação à Trissomia 21, as pessoas, assim como todas as outras, podem desenvolver talento cultural, científico, filosófico, artístico, etc. Conforme relata Rego (1999, p. 107), Vigotski afirma que um bom ensino é:

[...] aquele que se adianta ao desenvolvimento, ou seja, que se dirige às funções psicológicas que estão em vias de se completarem. Essa dimensão prospectiva do desenvolvimento psicológico é de grande importância para a educação, pois permite a compreensão de processos de desenvolvimento que, embora presentes no indivíduo, necessitam da intervenção, da colaboração de parceiros mais experientes da cultura para se consolidarem e, como conseqüência, ajuda a definir o campo e as possibilidades da atuação pedagógica. Visando contribuir para a formação de licenciandos em Química aptos para promover um ensino de qualidade e

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inclusão nas escolas, o projeto: “Métodos de ensino investigativo e inclusão de alunos com síndrome de Down: um diferencial na formação do professor de Química” iniciou em julho de 2017 e contou com a atuação de 3 licenciandos em Química, bolsistas do Programa Unificado de Bolsas de Estudos para Estudantes de Graduação (PUB) da USP. Por um ano, o projeto recebeu semanalmente um coletivo de 7 crianças com Síndrome de Down e/ou sem deficiências no espaço do CEIQ. Os bolsistas do projeto desenvolveram oficinas que versavam sobre diversos temas do currículo escolar de ciência do Ensino Fundamental.

Em 2018, o projeto citado mudou de formato e de título. O título passou a ser: “Ciências vai às escolas: oficinas inclusivas de ciências”. Neste ano ampliamos a parceria com uma escola estadual e quanto ao formato, os bolsistas passaram a estagiar na escola parceira em salas de aula com alunos de inclusão, ampliando o leque para atender outras deficiências para além da síndrome de Down. Com este formato, os bolsistas vivenciaram a o dia a dia da escola e auxiliaram os professores no planejamento de atividades inclusivas e desenvolvimento de materiais que possam auxiliar a aprendizagem dos alunos. A escola parceira possuía 311 alunos das séries iniciais e 230 alunos das séries finais do Ensino Fundamental. Em agosto de 2019, o Edital Santander em parceria com a USP possibilitou que conseguíssemos recursos financeiros para ampliar a atuação na escola parceira, sendo possível a compra de materiais para produção de recursos inclusivos.

Neste capítulo compartilharemos a experiência e reflexões em relação a formação docente durante o processo. Para melhor compreensão separamos as reflexões feitas a partir da oficina na universidade daquelas feitas com acompanhamento presencial dos licenciandos em química nas salas regulares na escola parceira.

Oficinas de ciências inclusivas na universidade – passos iniciais em 2017- preparando o terreno

Em 2017, o primeiro passo importante foi garantir a formação dos licenciandos em química que atuariam no projeto de extensão sobre metodologias de ensino de ciências inclusivo. Essas formações foram oferecidas por duas psicólogas que na época integravam a equipe técnica da Associação Síndrome de Down de Ribeirão Preto (RibDown), que é uma organização sem fins lucrativos. A Ribdown foi criada em 1998 com o objetivo primordial de promover a inclusão de pessoas com Síndrome de Down e outras deficiências em todos os níveis da sociedade. Para que pudessem ministrar as oficinas era necessário que pensassem sobre:

- o que entendo por deficiência?

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- a quem o termo deficiente se refere? - educação especial é só para pessoas com alguma deficiência?

- qual a história da educação de pessoas com deficiência no Brasil? E no Mundo?

- que projetos existem relacionados ao tema?

- quais as políticas nacionais relativas à educação especial?

- como será que os indivíduos com alguma deficiência se sentem quando são subjugados?

Neste sentido, foi oferecido aos licenciandos uma lista de artigos, os quais foram lidos e discutidos posteriormente no grupo, formado pela responsável pelo projeto, os licenciandos e as psicólogas.

Ao entrar em uma sala de aula, independentemente do nível de ensino, o professor se depara com múltiplas questões: quais conteúdos irá ensinar, de que forma irá apresentar os conceitos, quais metodologias irá utilizar para alcançar seus objetivos, como irá avaliar a aprendizagem dos alunos. Essas questões, relacionadas ao conteúdo curricular, não são as únicas que preocupam os docentes. Outras emergem em qualquer aula de qualquer disciplina, já que cada aluno é um sujeito, com múltiplas visões de mundo e necessidades.

Assim, o desafio dos licenciandos era bem maior do que apenas ensinar conteúdos científicos. Eles notaram que existiam questões mais amplas do que às relacionadas com a maneira como irá conduzir sua aula ou apresentar um determinado conteúdo. São as questões relacionadas aos sujeitos presentes na aula que definem o sucesso da aula. Essas questões, que envolvem aspectos cognitivos, emocionais e coletivos, deveriam ser consideradas tão ou mais importantes que as questões de conteúdo.

Como parte do processo as profissionais selecionaram alguns textos que foram sendo lidos e discutidos ao longo da formação dos alunos.

a) Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.

b) MENDES, E.G. Breve histórico da educação especial no Brasil. Revista Educación y Pedagogía, vol. 22, núm. 57, mayo-agosto, 2010.

c) SOFIATO, C.G. ANGELUCCI, C. B. Educação inclusiva e seus desafios: uma conversa com David Rodrigues. Educação e Pesquisa, v.43, n.1, 2017. ONU. Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (2006)

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d) MENDES, E. G. A radicalização do debate sobre inclusão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Educação v. 11 n. 33 set./dez. 2006.

e) VYGOTSKY, L. S. A defectologia e o estudo do desenvolvimento e da educação da criança anormal. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 37, n. 4, p. 861-870, dez. 2011.

f) DIAS, S. S; OLIVEIRA, M.C. S. L. Deficiência Intelectual na Perspectiva Histórico-Cultural: Contribuições ao Estudo do Desenvolvimento Adulto. Rev. Bras. Ed. Esp., Marília, v. 19, n.2, p. 169-182, Abr.-Jun., 2013

g) López Melero, M. El Proyecto Roma: una experiencia de educación en valores. Malaga: Aljibe, 2003.

López Melero, M. Construyendo una escuela sin exclusiones. Una forma de trabajar con proyectos en el aula. Málaga: Aljibe, 2004.

López Melero, M. Fundamentos y Prácticas Inclusivas en el Proyecto Roma. Madrid: Morata, 2018.

h) Carlos MORÓN, C.; MANCILA, I. Comprender el Proyecto Roma: Fundamentos Teóricos y Principios de Acción. Revista Interuniversitaria de Formación del Profesorado, 92 (32.2) (2018), 29-41.

Após a discussão dos textos acima, continuaram a formação na universidade com a professora responsável pelo projeto e acrescentou-se em nossas leituras outros textos de Vigotski. O objetivo era compreender como ocorre o desenvolvimento humano na visão deste autor e refletir como as pessoas com alguma deficiência poderiam ser consideradas com estas lentes. Outro autor, cuja leitura foi importante na composição das oficinas, foi Miguel López Melero, propositor do Projeto Roma.

As leituras e discussões fundamentaram a proposição da primeira oficina, que seria realizada na universidade, mais precisamente no CEIQ e havíamos decidido que:

Os temas abordados partiriam dos interesses dos participantes;

A decisão se faríamos de forma semanal ou quinzenal levaria em conta a opinião dos alunos;

Tentaríamos organizar as atividades em forma de assembleia sempre, pois isso era muito importante no Projeto Roma e estávamos dispostos a colocar em prática, uma vez que pela leitura dos textos de Vigotski e Meleiro, estes frisavam a importância do âmbito social e da aprendizagem social na aprendizagem particular de cada aluno e como isso gerava reflexos positivos na vida dos mesmos, tendo também a discussão das dificuldades da implantação deste método de trabalho.

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Fizemos a divulgação do projeto principalmente para famílias de crianças na faixa de etária de 7 a 12 anos com desenvolvimento típico e também com síndrome de Down. Durante a divulgação surgiu um aluno com 18 anos com transtorno neuro-psicomotor e se interessou em participar. Assim, a oficina iniciou com 15 participantes, sendo 8 adolescentes (com desenvolvimento típico) cursando o nono ano do ensino fundamental e 7 adolescentes com síndrome de Down matriculados nas séries iniciais do ensino fundamental. Os adolescentes típicos participaram só em dois encontros e não mais compareceram. Em contato telefônico, justificaram dificuldade em conseguir transporte até a universidade, já que sua escola era de uma cidade vizinha a Ribeirão Preto.

As 7 crianças com SD participaram efetivamente de todas as oficinas até o final. Por telefone, negociamos o melhor horário para todos e marcamos o primeiro encontro da oficina. Estudamos os dias da semana para qual seria mais acessível para os alunos, incluindo a duração da oficina, que ficou com três horas, tendo trinta minutos de intervalo, com lanche.

Antes do primeiro encontro, os licenciandos estavam no mundo das hipóteses e imaginação e se baseavam em experiências anteriores. Considerando que no CEIQ já tínhamos realizado outras atividades somente para pessoas sem nenhuma deficiência, tentávamos organizar/planejar tudo como se fossem alunos que já conhecemos e sem nenhuma diferença, após cada oficina íamos aprendendo mais e mais sobre essas diferenças e empaticamente nos tornamos outras pessoas e outros profissionais.

Não tínhamos ideia de quais seriam os desafios a serem superados. A seguir, relataremos dois encontros, desde o planejamento até a reflexão após o desenvolvimento.

Primeiro encontro

Iniciamos a oficina em outubro de 2017 às sextas-feiras das 14 às 17 horas. Abaixo há uma breve descrição dos participantes:

Aluno 1: 11 anos, uma criança esperta e tímida, quando colocado para falar em

grupo não demonstrava afinidade, todavia em um número menor de pessoas se mostrava totalmente disposto a fazer as atividades e em entender as mesmas.

Aluno 2: 11 anos, é uma criança falante, extrovertida e tem dificuldade em

prestar atenção. Observamos um comportamento agitado, facilidade de compreensão, entretanto só em relação ao que lhe interessava. Ela necessitava de

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um acompanhamento para ajudar na sua concentração e interesse pelo que estava sendo ensinado.

Aluno 3: 18 anos, é um jovem responsável, tem dificuldade com a fala, entretanto

é ótimo na escrita e na compreensão da matéria que está sendo ensinada, em ritmo um pouco diferente consegue acompanhar a matéria.

Aluno 4: 18 anos, tem dificuldade com prestar atenção no que está sendo dito

(interesse), tem ótima fala e escrita, consegue acompanhar a matéria se sente que está sendo levado a sério.

Aluno 5: 18 anos, não tem dificuldade nenhuma em seguir o ritmo, ajuda outro

aluno a se concentrar.

Aluno 6: 12 anos, não tem dificuldade nenhuma em seguir o ritmo, todavia se

demonstra desinteressado, mas pela falta de atenção, pois quando questionado ou instigado o mesmo se interessa.

Aluno 7: 13 anos, é um jovem com atenção e escrita boas, todavia dependendo

de sua companhia se torna muito disperso, logo observamos que devemos montar grupos separados de pessoas específicas para que se complementam.

Antes de nos encontrarmos com o grupo planejamos previamente todas as atividades referentes ao primeiro encontro que foi realizado da seguinte forma:

1. Realizamos uma apresentação pessoal dos alunos e dos monitores com nome, idade e o porquê de estarmos ali.

2. Após isso foi realizada uma dinâmica para integração e conhecimento inicial do grupo. Todos ficaram em círculo, e uma pessoa segurou o rolo de barbante, se apresentou e passou o barbante para outro, esse outro se apresentou e falou uma característica em comum com o colega que lhe passou o barbante, dessa forma toda se conheceram e perceberam que mesmo havendo diferenças todos possuíam algo em comum. O intuito do barbante nessa dinâmica é mostrar a união do grupo, visto que se um soltar o barbante a teia se desfaz, toda essa visão de grupo foi explicada pelos monitores durante a atividade.

3. Para todo grupo existem regras de boa vivência, logo montamos coletivamente as devidas regras para que o mesmo permanecesse em harmonia até o fim, então montamos um slide com figuras para que os alunos, olhando-as, pudessem associar com práticas de boas maneiras. No slide havia imagens que levavam para as seguintes

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regras: não chegar atrasado, não faltar, não gritar, não bater, ajudar os colegas, prestar atenção, não bagunçar a sala, jogar o lixo no chão, ser gentil com os colegas.

4. Falamos inicialmente sobre assuntos gerais da ciência visando despertar um interesse inicial dos alunos, para isso fizemos vários slides com imagens atrativas e no final seria exibido um vídeo sobre o assunto.

5. Tempo para o lanche.

6. Após o slide da ciência, dividimos o grupo (15 alunos) em 4 grupos mistos menores.

7. Após a divisão, passamos uma folha para cada grupo, para os mesmos anotarem o que estavam aprendendo relacionado a ciências nas escolas que frequentavam e o que gostariam de aprender em nossas oficinas.

8. Fizemos um experimento demonstrativo que envolvia conceito de pH, explicamos isto usando alimentos como limão e leite. O experimento é colorido e serve novamente para chamar atenção e despertar o interesse dos alunos.

9. Realizamos um experimento que fabricava massinha com cola branca, bicarbonato de sódio e água boricada. Os alunos realizaram todo o procedimento que serviu para novamente despertar o interesse do grupo sobre a ciência.

10. Encerramos o encontro com dúvidas dos alunos e conversa sobre o encontro.

Figura 1. Slides sobre a ciência.

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No início do primeiro encontro observamos uma certa timidez e medo por parte dos alunos, mas conseguimos diminuir esses sentimentos com as atividades propostas. A dinâmica do barbante tinha o objetivo de mostrar que todos ali tinham características em comum e todos eram capazes de estarem ali e poderiam ser amigos. Entendemos que despertar o reconhecimento de si e do grupo e o sentimento de pertencimento era importante.

A construção das regras de convivência foi inspirada no Projeto Roma. Tentamos incitar o interesse pela ciência organizando várias imagens bonitas, que fizessem menção a situações do cotidiano dos alunos. Queríamos dar suporte para que os alunos escolhessem o que estudar. Percebemos, refletindo sobre o processo, que esta forma de organizar tinha muito da nossa insegurança. Queríamos que escolhessem, mas dentro de temas selecionados por nós. Só depois analisamos que isso poderia não ser positivo para autonomia dos alunos. Como já mencionamos, com as crianças de desenvolvimento típico, várias imagens chamativas faziam que aumentassem o interesse. Com o grupo em questão, as crianças com SD perdiam atenção mais fácil com informações excessivas. Informações visuais eram importantes para os alunos com SD, porém precisavam ser mais objetivas.

Propusemos atividades não apenas visuais, mas também com a participação ativa dos alunos, uma delas, a que envolvia fabricar massinha (geleca) foi muito proveitosa, e os estímulos táteis causados deixaram todos muito instigados e interessados sobre o que era aquele material e como ele funcionava.

No final do encontro perguntamos para cada um o que haviam achado do encontro, se teríamos de mudar algo e o que esperariam para o próximo. Essa conversa novamente tinha o fim de integração e sentimento de pertencimento do grupo, os alunos participaram e nos deram retornos positivos.

Apesar do sucesso do primeiro encontro, em nossa avaliação interna percebemos que era preciso refinar a forma de tratamento que os licenciandos estavam dando aos participantes. A coordenadora do projeto nos convidou a refletir se estávamos tratando da mesma forma todos os participantes ou se tratávamos de forma infantilizada os alunos com SD. Comentarios como: “que gracinha”, “abraços a todo momento”, foram questionados pela coordenadora. Isto nos fez repensar nossa concepção sobre deficiência. Este primeiro encontro foi rico em aprendizagem.

Segundo encontro

No segundo encontro, os alunos típicos não compareceram por problemas de transporte, como já relatado, assim houve a participação de sete crianças. Esta oficina foi produzida a partir da análise dos interesses manifestados no encontro anterior e o tema mais votado para ser estudado foi rochas. Uma aluna com SD relatou que tinha feito uma viagem e visto uma “pedra vermelha” com seu pai e isto instigou

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todos os colegas. Assim como a primeira oficina, produzimos previamente todo material, as rochas foram emprestadas por um professor de mineralogia do Departamento de Química para que os alunos tivessem real contato com as mesmas, o planejamento da segunda oficina seguiu o mesmo escopo, sendo:

1. Levantamento dos conhecimentos e curiosidades sobre o tema rochas.

2. Relembramos as regras de boa convivência da assembleia, mostrando novamente os slides do primeiro encontro e abrimos o momento para colocações e discussões.

3. Fizemos um sorteio para dividir os alunos em 3 grupos menores, para a realização de um caça as rochas.

Grupo Granito - 2 alunos - monitora Maria Vitória.

Grupo Arenito - 2 alunos - monitora Heloísa/.

Grupo Basalto - 3 alunos - monitor Douglas.

4. Entregamos um mapa (Figura 2) e uma folha com dicas (Figura 3) para os alunos chegarem até as rochas que foi escondida.

5. Depois de encontrar as rochas, os alunos responderam um questionário sobre as características físicas e visuais das rochas encontradas pelo grupo, podendo as respostas serem feitas de forma: escrita, desenho ou por descrição oral.

Com as seguintes perguntas:

a) Quais características físicas (cor, textura, etc) você consegue observar na rocha encontrada?

b) A rocha encontrada possui qual tamanho?

c) Existem furos na superfície da rocha?

d) A superfície da rocha é brilhante?

e) Ao tocar na rocha observa-se uma superfície lisa ou porosa?

f) Descreva o que mais você observou na rocha?

h) A rocha tem camadas?

6. Cada grupo apresentou para o resto da turma as características observadas.

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7. Os licenciandos apresentaram via Datashow informações sobre os tipos de rochas e como são formadas (Figura 4).

8. Tempo de lanche

9. Depois foi apresentado outro slide (Figura 5) sobre as rochas do aquífero Guarani e suas características.

10. Em seguida os alunos gotejaram água em três pedras diferentes para tentarem descobrir qual é a pedra do aquífero que seria a que absorveria mais água.

11. Apresentamos um slide falando sobre o meteoro com um vídeo informativo e mostramos um pedaço de meteoro fornecido por uma professora do Departamento de Química.

12. Para falar que as rochas são compostas por metais, fizemos um experimento que consistia em queimar diferentes metais sendo que essas combustões liberaram chamas coloridas.

13. Encerramos o encontro com dúvidas dos alunos e conversa sobre o encontro.

Figura 2. Mapa para o caça rochas.

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Figura 3. Dicas para o caça rochas

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Figura 4. Alguns slides sobre os tipos de rocha.

Figura 5. Slides sobre o aquífero Guarani.

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Terceiro encontro

O terceiro encontro teve um total de sete participantes. Assim como nas outras oficinas, produzimos recursos didáticos previamente, os roteiros de experimentos, os slides e as folhas para escrita dos alunos.

O planejamento da terceira oficina teve o seguinte escopo:

1. Para dar início ao tema escolhido pelos alunos, visto que sempre seguíamos a curiosidade deles, nós separamos algumas imagens referentes à água, como rio, mares, torneiras e copos e geramos uma discussão: "Todas essas águas são iguais?" "Estas imagens tem algo de diferente entre si quando as comparamos? O que essas imagens têm de diferente?" Buscando sempre trazer curiosidade a ciência, começamos o encontro com a pergunta: De onde vem a água da chuva?

2. Apresentamos novamente as boas regras de convivência para lembrar a todos que somos um grupo e nosso trabalho tem de ser harmonioso.

3. Para estabelecer ligação da curiosidade dos alunos com temas diários e científicos fizemos a abordagem do ciclo da água, entregamos aos alunos um roteiro (Figura 9) de experimentos para que realizassem juntos e se ajudassem caso houvesse algum empecilho.

4. O roteiro consistia em colocar água quente em um recipiente retangular de vidro (aquário), e no centro, posicionar um erlenmeyer vazio, depois vedar a extremidade do aquário com um plástico, e sobre o plástico colocar algumas pedras de gelo e algodão, representando as nuvens. A água quente no fundo do aquário, ao evaporar, entrava em contato com o plástico gelado posicionado acima, e condensava-se, pingando dentro do erlen que estava posicionado no centro do aquário. O esquema representa perfeitamente o ciclo da água na natureza.

4. Reservamos um tempo para os alunos conversarem e concluírem o experimento, e os mesmos receberam uma ficha, com algumas questões para responder.

5. Propusemos para os alunos desenharem um erlenmeyer vazio no início e cheio no final para tentarem entender cada etapa do experimento e conversarem entre si, fortalecendo com tudo isso o sentimento de grupo.

6. Tempo de lanche

7. Após esta atividade, separamos e apresentamos o vídeo "O Show da Luna! Como a Água Vira Chuva?" para que os alunos pudessem entender de forma simples, recreativa e didática os passos de tudo o que eles haviam acabado de fazer, como uma espécie de revisão.

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8. Como última atividade, convidamos os alunos a compartilharem o que tinham aprendido com os colegas, na forma de um seminário. Logo, em um quadro branco, chamamos os alunos para desenhar e explicar uns aos outros o que haviam gostado e entendido do conteúdo. Essa interação entre eles durou até os minutos finais da nossa oficina e foi um período muito importante para percebemos que havíamos alcançado nossos objetivos do dia.

Figura 6. Roteiro experimento de água da chuva.

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A seguir descrevemos alguns diálogos estabelecidos neste dia. Identificaremos como LQ (licenciandos em química) e A (alunos):

LQ 1: Em nosso último encontro falamos um pouco sobre água. Onde encontramos água? Nosso corpo? Céu? Plantinhas? Tem água dentro da terra?

A: tem água no bebedouro.

LQ: tem água no nosso corpo?

A1: 90%

LQ 2: menos... uns 70%. Assim como nós será que as plantas também tem água? Vamos formar 2 grupos? Vocês vão receber um saco plástico e vão lá fora, no jardim do Departamento, vão escolher uma folhinha de alguma planta ou galho e colocar o plástico e fechar. Vamos deixar lá um tempo e depois vamos voltar e observar. (Os licenciandos acompanharam as crianças no jardim e um grupo quis colocar o saco em plantas expostas ao sol e o outro grupo escolheu plantas que estavam na sombra).

O encontro seguiu e num dado momento os LQ convidaram os participantes a ler o roteiro do experimento sobre de onde vem a água da chuva. Logo no início do roteiro estava escrito materiais e reagentes.

A2: O que é “reagentes”?

LQ2: imagina que você vai fazer um bolo. Os ingredientes: ovo, leite... são os reagentes. O produto é o bolo.

Começaram o experimento. A água colocada no aquário estava muito quente e sobre ela observou-se uma “fumaça” branca.

LQ1: por que ficou assim?

A3: é por que é vapor de água.

LQ1: olha de perto... será que é só vapor?

A4: Não... é líquido.

Após o experimento fomos ao jardim e recolhemos os sacos plásticos. A partir das observações discutimos transpiração, evaporação e etc. A seguir, exibimos um filme da Luna sobre a água da chuva e no final do dia utilizamos um jogo sobre o tema da água e que o CEIQ possui disponível em uma das televisões touch screen.

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Quarto encontro

O quarto encontro teve um total de seis participantes. Assim como nas outras oficinas, produzimos previamente todo material. A quarta oficina seguiu o mesmo escopo das demais, sendo:

1. Iniciamos o encontro trazendo para os alunos uma pequena revisão do encontro passado, pois os conteúdos científicos começaram a se interligar e iríamos precisar um do outro, para isso distribuímos uma imagem (Figura 7) que ilustra o ciclo da água e continha espaços em branco, para que os alunos preenchessem de acordo com as mudanças de estados físicos, assim como haviam visto no encontro anterior.

2. Explanamos o assunto sobre diferenciação do gelo, do vapor e do líquido, visto que é um assunto importante, tudo foi passado com calma, através de imagens, exemplos e vídeos.

3. Para complementar o assunto, levamos os alunos até uma parede interativa (Figura 8) no espaço do CEIQ, que ilustra os três estados da água, de maneira micro e macroscópica, para uma melhor visualização.

4. TEMPO DE LANCHE

Em seguida enchemos um aquário com água e fizemos a brincadeira do "afunda ou boia", inserindo assim um conceito de densidade para os alunos.

6. Para dar continuidade, apresentamos para os alunos uma proveta e iniciamos um experimento sobre diferentes densidades de líquidos e materiais, algo bem visível e os próprios alunos colocaram a mão na massa para a realização do experimento que utilizava em: proveta, glicerina, água, óleo, álcool etílico e corantes de diferentes cores, uma moeda de cobre, um pedaço de madeira pequeno (rolha), cenoura, uma tampa de plástico de garrafa. Os alunos ficaram responsáveis por montar a torre seguindo um roteiro (Figura 9) previamente feito por nós e depois colocaram os materiais sólidos nos líquidos e observaram onde os mesmos pararam.

7. Deixamos um momento para reflexão e discussão dos conteúdos e do experimento realizado.

8. Por fim, proporcionamos um espaço para os alunos tirarem suas dúvidas, falarem para a assembleia o que mais gostaram, o que mais aprenderam e o que mais despertou suas curiosidades.

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Figura 7. Revisão ciclo da água.

Notamos que era muito importante retomar os conceitos do último encontro não apenas em forma discursiva, como acontece em aulas convencionais, na maioria das vezes. Optamos pelo uso de imagens a partir das quais os alunos analisavam e completavam com palavras como: transpiração, evaporação, precipitação e etc.

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Figura 8. Roteiro experimento torre de líquidos.

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Figura 9. Parede interativa formada por modelos moleculares dos estados físicos da água.

Neste dia, como forma de avaliar a compreensão dos participantes, elaboramos uma avaliação que pedia que ligassem imagens a palavras (Figura 10).

Figura 10. Modelo de avaliação para os estados físicos da água.

Quinto encontro

O quinto e último encontro teve um total de sete participantes e teve um cunho diferente dos anteriores. Promovemos um piquenique, com roda de conversa, troca de informações e vivências para que o período de muitas informações e aprendizados novos fosse encerrado. Além de ser um momento

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de fechamento do conjunto de atividades, também foi muito importante, para que conseguíssemos perceber a evolução de cada um dos alunos.

Alguns desafios e superações

Os licenciandos em química precisaram identificar suas ideias sobre deficiência e analisar suas atitudes, no sentido de descobrir se reforçavam o preconceito, infantilização ou se colaboravam para que os indivíduos fossem percebidos em sua diversidade.

Apesar da proposta de trabalhar em assembleia a partir dos interesses dos alunos e incentivando a autonomia, tivemos dificuldade em colocar em prática. Ser o sujeito que escolhe o tema, direciona materiais e estratégia nos deixa em nossa zona de conforto. Para possibilitar que os alunos definissem os temas e participassem do planejamento, tivemos que lidar com nossas as incertezas e dividir a responsabilidade pelo aprendizado na oficina.

Reconhecemos a diversidade, porém, organizar de forma a levar em conta cada indivíduo em suas limitações e dificuldades é muito difícil numa oficina cuja proposta é coletiva. Enquanto propositores das atividades sentimos grande dificuldade e insegurança, e questionamos “como ensinar o mesmo assunto para toda a classe e fazer com que todos entendam?”. A partir desta pergunta que começamos a olhar para o individual dentro do todo, por exemplo, um aluno aprendia de maneira totalmente visual e desenhada, outro de maneira dialogada, outro apenas com experimentação e a partir disso fomos estudando aplicações do que queríamos ensinar englobando estratégias que contemplassem cada aluno.

Nos primeiros encontros, como parte da avaliação, elaborávamos questões sobre o conteúdo do dia e ficávamos muito frustrados quando os alunos com SD não respondiam. Nos sentíamos impotentes, fracassados, mas numa conversa com a Coordenadora do projeto, passamos a questionar a ferramenta que estávamos usando para avaliar. Tivemos um insight: a avaliação também precisava contemplar as características destes alunos. Como podemos avaliar todos os alunos de modo coletivo mas salientando cada uma de suas peculiaridades, ou seja os vendo como indivíduos reais dentro de um todo? Isto propiciou que repensássemos as avaliações. Se antes só concebíamos produção de textos como forma de respostas, passamos a considerar relacionar imagens e palavras e produzir desenhos.

Incentivar a colaboração e pertencimento é muito importantes para que os indivíduos se sintam bem e acolhidos. Em todo encontro cada ação era sempre voltada na assembleia e na sua integração como um grupo, assim, dentro das atividades propostas sempre era incentivada a cooperação entre os colegas, “Se você sabe desenhar isso ajude o outro, se você sabe isso e o outro não mostre como fazer.”

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Com a vivência experimentada na primeira fase do projeto vimos que a principal aquisição que tivemos foi a quebra dos padrões implantados pela sociedade, em todos os âmbitos que essa expressão pode chegar. Primeiramente nos vimos com dúvidas no quesito relação interpessoal com os alunos devido a todos os estigmas já internalizados dentro de nós, após essa quebra nos vimos dentro da necessidade de mudança em relação a toda prática pedagógica que havíamos visto a vida toda, tivemos de mudar nosso olhar para poder enxergar o indivíduo dentro de um todo e desta maneira trabalhar o todo.

Nesta primeira fase, estávamos confortáveis na universidade, já que os alunos que se deslocavam até lá e contávamos com todos os recursos do CEIQ disponíveis. Levando em conta que na escola as salas são numerosas, o professor tem que lidar com várias outras deficiências, além da SD, numa segunda fase do projeto mudanças foram feitas. Os licenciandos passariam a acompanhar professores em suas salas de aula e metodologias inclusivas passariam a ser pensadas por um grupo que se reuniria semanalmente para conversar sobre o ensino de conteúdos de ciência em salas com alunos de inclusão. Esta nova fase se iniciou em meados de 2018 e segue até o presente momento (início de 2020) em andamento.

Mudança de estratégia – inclusão na escola regular e novos desafios

A experiência na universidade foi muito rica e proveitosa para todos, mas a avaliação do coletivo apontava para a necessidade de trabalharmos também no “chão da escola”, junto com os professores e com uma classe convencional de alunos. Assim, decidimos que ao invés de oficinas na universidade, os licenciandos passariam a acompanhar professores em suas salas de aula em escolas parceiras. No início de 2019, a Escola Paulo Gomes Romeo, por meio da então coordenadora Mayra Zanetti, estabeleceu contato e solicitou a colaboração do CEIQ na formação dos professores da escola com relação a inclusão. Assim, no primeiro semestre, a Profa. Daniela Gonçalves de Abreu e a Profa. Joana de Jesus de Andrade participaram de algumas reuniões pedagógicas na escola e isso abriu caminho para uma parceria muito importante. Desde então, profissionais da escola, da universidade e também licenciandos em química começaram a se reunir periodicamente para estudar temas ligados a educação especial e planejar conjuntamente estratégias inclusivas que pudessem ser usadas na escola.

Deste encontro de pessoas surgiu o GEAPI (Grupo de Estudo e Apoio a Práticas Inclusivas), um grupo de estudos direcionado a investigar e auxiliar no processo de educação formal que se direciona à prática inclusiva. O GEAPI (Grupo de Estudo e Apoio a Práticas Inclusivas) tem realizado encontros semanais na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP). Fazem parte desse grupo licenciandos em química, docentes vinculados ao CEIQ,

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técnico de laboratório, bem como professoras do ensino fundamental da rede pública de ensino, coordenadores de educação fundamental da rede pública e psicopedagoga. Os licenciandos em química também participaram do desenvolvimento de recursos didáticos adaptados conforme as necessidades identificadas.

Além das reuniões gerais do GEAPI, na escola foram feitas reuniões menores com os professores de ciências e os licenciandos em química, visando identificar e caracterizar os alunos de inclusão da escola e suas respectivas necessidades a partir de laudos médicos e observação das professoras.

Perguntas que orientaram as ações:

1- Quantos alunos de inclusão a escola possui? 2- Quem são estes alunos? Idade? Histórico? Como se relacionavam com os

demais alunos? 3- Qual(is) conteúdos estavam previstos para serem abordados naquela

determinada série?

Os licenciandos elaboraram uma ficha de observação (a seguir) para orientar o recolhimento de dados durante sua frequência nas aulas de ciências na escola.

Ficha de observação da turma

Nome da escola: ___________________________________________________

Telefone de Contato: _______________________________________________ Nome do professor Colaborador:

_________________________________________________________________

Telefone de contato:________________________________________________

Aula observada (tema) ____________________________________________

Quantidade total de alunos:________

Quantidades de alunos de inclusão: Meninos _____Meninas: ______

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Observações durante as aulas: Os alunos se interessam pelas aulas de Ciências?

Os alunos são participativos nas aulas de Ciências?

Existe experimentação nas aulas de Ciências?

A sala possui grupos de alunos ou age como um grupo ao todo (explicar o comportamento grupal)? (Pergunta para incluirmos os conceitos de ensino em assembleia de Meleiro).

As informações recolhidas seriam fundantes para o planejamento das ações interventivas. É importante conhecer o perfil da sala e não só do aluno, uma vez que a proposta do GEAPI vai além de adaptação de materiais. Acreditamos que proporcionar estratégias inclusivas para a sala toda garanta que o aluno de inclusão se sinta parte da sala e quanto aos colegas, tem a possibilidade de reconhecer a diversidade e praticar o respeito. Destaca-se neste ponto, duas ações complementares e inovadoras: olhar ao mesmo tempo a sala e o aluno com necessidade especial. A maioria das experiências que temos tido contato prioriza o olhar para o aluno especial, é para ele que se desenvolve material, pensa-se numa estratégia particular.... Nossa proposta seria exatamente neste sentido.

Após o estágio dos alunos, os dados de observação eram estudados no grupo com a participação de algumas professoras e coordenação da escola e um plano de ação era construído. Esse plano de ação possui dois principais pontos, sendo eles um plano individualizado para o aluno, atendendo suas necessidades específicas, como por exemplo, atividades e avaliações adaptadas e; um trabalho em assembleia, ou seja, com todos os alunos da turma com os conteúdos trabalhados nas aulas de Ciências.

As ações de inclusão precisam de atuação de equipes multidisciplinares, pois alfabetização, por exemplo, embora associemos mais a profissional pedagoga, também envolve a fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, etc. Uma criança com pouco controle postural terá dificuldade ao segurar o lápis, colocar a força adequada que é necessária para escrita e assim por diante. Por isso a estimulação precoce é tão importante. Com o tempo, o GEAPI foi agregando profissionais de outras áreas, como fonoaudiólogas e psicopedagogas, o que muito contribuiu para enriquecer a atuação e a formação principalmente dos licenciandos em química.

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A seguir descreveremos um dos estudos de caso para exemplificar a atuação do grupo:

Estudo de caso – aluno 1 (transtorno de desenvolvimento psico-motor)

A aluna tinha 11 anos, cursava o 5º ano do Ensino Fundamental e já se encontrava incluída devido ao trabalho do professor. Existia um planejamento prévio individualizado e adaptação de recursos didáticos. O desafio era então fazer uma atividade que abrangesse toda a sala de aula. O conteúdo que estava sendo trabalhado nas aulas de ciências era sistema solar. Então, levamos uma maquete de planetário disponibilizada pelo CEIQ para dialogar com os alunos sobre o assunto e, como tarefa final, propusemos que em grupos construíssem uma maquete que seria apresentada para toda escola e os pais dos alunos. Priorizamos sempre as tarefas em grupo.

As escolas têm recebido alunos, pessoas com diversas deficiências: física, visual, auditiva e mental, incluindo síndrome de Down. A experiência com o projeto citado possibilitou perceber a importância de garantir a aprendizagem das crianças com deficiências junto com crianças de desenvolvimento típico. Estudos têm apontado que a inclusão de alunos com algum tipo de deficiência nas escolas regulares contribui para o desenvolvimento social e cognitivo de muitos deles, incluindo alunos com síndrome de Down.

Figura 11. Imagens das crianças manipulando um planetário.

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Figura 12. Crianças confeccionando uma maquete sobre o sistema solar.

Não se trata só de adaptar materiais didáticos para promover a aprendizagem de um aluno particular separado da turma, mas também utilizar propostas de metodologias inclusivas que envolvam todos os alunos de uma sala de aula, ou seja, que mobilize a sala toda na direção do conhecimento e do respeito pela diversidade.

Além da participação empolgante da turma, a aluno 1 estava engajada para apresentar sua parte da exposição, com um excelente resultado. A exposição teve também um aluno com deficiência visual e auditiva.

O próximo tópico a ser abordado na turma da aluna 1 foi “Água e saneamento basico”. Após dialogo com a professora da turma preparamos duas intervenções priorizando estratégias inclusivas com a sala da aluna 1.

Na primeira atividade, foi apresentado de forma dialogada para a sala os estados físicos da água e suas transformações. A seguir, a sala da aluna 1 foi organizada em dois grupos, sendo que em um deles (Grupo 1) foi utilizado uma manta aquecedora, béquer e um vidro relógio e foi montado um sistema em que a manta aquecia o béquer com água que estava tampado com um vidro relógio. O sistema mostrou a ebulição da água e a sua condensação quando encostava no vidro relógio. Por ser em grupo, a observação visual dos colegas narrando foi fundamental para compreensão de todos. Com o grupo 2, utilizamos modelos moleculares para ilustrar qual seria a composição da água (em termos de átomos). Os alunos puderam manusear os modelos e “brincar” de formar moléculas.

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Na segunda atividade, queríamos ilustrar o tratamento da água para isso montamos um sistema parecido com o de filtração para explicar o processo. Dialogamos com as crianças de onde será que vinha a água que bebiam e com as respostas íamos relacionando com o ciclo da água na natureza.

Figura 13. Demonstração do experimento de tratamento de água.

A partir das duas atividades pudemos perceber como é importante a realização de atividades práticas para fomentar as discussões e despertar a curiosidade das crianças. Em qualquer assunto podemos adaptar a linguagem.

Estudo de caso - aluno 2 (síndrome de Down com baixa visão)

Este aluno na época cursava o primeiro ano do ensino fundamental e com ele tivemos que desenvolver um trabalho diferente, pois percebemos que havia dificuldade na integração com a sala. Por exemplo, os alunos se sentavam em duplas e ele sozinho ao lado da mesa do professor. Precisávamos desenvolver recursos didáticos e/ou adaptar e pensar em estratégias para promover um estreitamento do vínculo com os colegas.

O aluno 2 manifestava um comportamento um pouco agressivo com os colegas, não parava sentado na carteira, não participava das atividades e saia muito da sala de aula. Como ele estava numa série de alfabetização, onde os colegas de turma estavam mais avançados nesse processo e ele ainda não, discutimos o caso no GEAPI e o primeiro passo foi diagnosticar em que estágio da alfabetização ele estaria. Será que ele conhecia algumas letras? Já conseguia reconhecer sílabas?

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Palavras? Assim, a coordenadora usando um alfabeto de madeira colorido num diálogo em tom de brincadeira levantou essas informações. O aluno conhecia pouquíssimas letras e não reconhecia sílabas. Além disso, tinha dificuldade em segurar o lápis. Pelo histórico soubemos que este aluno não tinha tido a oportunidade de fazer estimulação precoce, que envolve terapia ocupacional, fisioterapia, sessões com fonoaudiólogas e etc. Notamos que trabalhar a coordenação motora fina com o aluno 2 daria a base para o próximo passo.

As ações desenvolvidas relativas ao aluno 2 foram:

Planejamos confeccionar com toda a sala massinha feita com farinha e óleo para modelar as letras do alfabeto. Usamos corante para que a massinha tivesse cores variadas.

Assim, foram feitos materiais com as letras do alfabeto em tracejado, ampliados devido baixa visão do aluno. Esse material foi deixado com a professora para que ela aplicasse com ele, quando os outros alunos da sala estivessem fazendo outras atividades.

Exemplos das fichas encontradas na Internet:

Além disso, devido à baixa visão o aluno 2 tinha dificuldades em reconhecer dia/noite, chuva/sol/estações do ano, então foi planejada uma atividade para ser desenvolvida com a sala inteira que abordasse esses assuntos.

Das atividades na escola observamos que:

O trabalho com o aluno de inclusão é muito mais efetivo quando pensamos e planejamos atividades para sala toda. Os demais alunos da sala, entendem a

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dificuldade e tentam auxiliar o aluno nas atividades desenvolvidas para que o colega aprenda.

No caso do aluno 2, pudemos observar que a exclusão dele no âmbito social, reflete diretamente na sua postura na sala de aula. Ele não se sentia a vontade de estar naquele local, os outros alunos não entendiam as necessidades dele dentro da sala de aula e isso implicava na percepção de que ali não seria um ambiente agradável para ele.

Outra coisa que pudemos ver ao longo dessas atividades foi que é difícil a continuidade dos trabalhos, uma vez que alguns alunos faltam muito (é o caso do aluno 2). A coordenação da escola chegou a discutir a questão com a família, porém sem retorno positivo. Atividades pontuais (quando o aluno frequenta a aula) e falta de continuidade não colaboram para o desenvolvimento do projeto.

De todo modo, as oficinas na Universidade, as atividades em sala de aula, os experimentos, as modelagens, pesquisas em espaços externos, rodas de conversa, uso e discussão de vídeos e jogos, etc. tudo isso foi muito importante para a formação dos monitores bolsistas, no sentido de que foram situações de aprendizagem de docência absolutamente diferenciadas do que eles vivenciam na Universidade durante o curso de graduação. Para os professores e profissionais que participaram e continuam atuando conosco na Universidade e na Escola, fazer parte de um projeto com ações que têm como foco estudo, reflexão, discussão, intervenção e avaliação representa, sem dúvida, uma formação em serviço com aspectos diferenciados. O que se reflete na qualidade da formação profissional e acadêmica de cada um com importantes implicações sociais.

Para os alunos da escola o projeto tem representado espaços e tempos de atenção educacional e com recursos materiais, humanos e pedagógicos que, por diversos motivos, nem sempre as escolas conseguem subsidiar.

Assim, ressalta-se que o percurso trilhado até aqui tem resultado em ganhos para todos os envolvidos e continuamos com as oficinas, atividades na escola e com um grupo de estudos e pesquisas que se inicia no campo da prática, se fortalece no campo teórico e que tem firme propósito de efetivar novas práxis no campo educacional considerando a diferença, a inclusão e novas formas de conviver.

Agradecimentos

Ao Programa Unificado de Bolsas da Pró-reitoria de Graduação da USP pelas bolsas concedidas nos anos de 2017, 2018 e 2019; aos pais das crianças que participaram das oficinas na univesidade e também à Heloísa Canato Affonso e Maria Vitória Guidorzi, licenciandas em química que aturam principalmente nos primeiros passos do projeto.

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Inclusão na prática da sala de aula regular: um desafio possível

Mayra Fernanda Zanetti

1. O QUE É INCLUSÃO? QUEM INCLUIR?

Quando pesquisamos no dicionário a palavra Inclusão encontramos uma das definições gerais como ato ou efeito de incluir-se, introdução de uma coisa em outra. Na definição da medicina é uma substância estranha ou heterogênea que é introduzida em outro tecido; já na definição do campo da geologia encontramos ser a denominação genérica que é dada a corpos estranhos surgidos em minerais ou rochas. Em suma: estranho, heterogêneo, diferente ... esses são os conceitos também envolvidos implicitamente (às vezes de forma explícita também, infelizmente) quando falamos em inclusão educacional. É preciso se fazer lembrar que em educação nós estamos trabalhando com seres humanos, não com objetos, substâncias ou outras coisas desprovidas de sentimento, cognição e outros aspectos importantes que o cérebro é capaz de nos proporcionar na subjetividade de cada ser.

Além disso, quando dizemos que temos que incluir alguém, já está pressuposto nessa fala que esse alguém está excluído, é estranho ou diferente; e então cabe perguntar: Mas não vivemos justamente numa sociedade cuja base da democracia é a heterogeneidade e a diversidade? Seria necessário pontuar determinadas diferenças (muitas vezes de forma pejorativa, negativas) sendo que todos nós já somos diferentes? Se pensarmos em uma sociedade com compreensões mais complexas e humanas acerca deste tema, imagino um lugar onde esse termo seria desnecessário já que parte da premissa de que ser diferente é o normal. O padrão é a diferença!

Entendo que esse termo se fez necessário devido ao processo histórico que vivenciamos no desenvolvimento da humanidade na qual antes, de forma clara e consentida, os deficientes eram excluídos não só da escola, mas de todas as relações e participações sociais. Talvez hoje não consigamos eliminar esse termo “inclusão” na área educacional porque ainda é preciso que haja um olhar e ações específicas e pontualmente pensadas para garantir que as crianças com deficiência estejam imersas na sociedade e no contexto escolar e também que as conquistas não se percam.

Há que se considerar o grande avanço já conquistado até aqui, mas há também que se superar esse conceito como sendo apenas ligado àquelas crianças com deficiência. Será que apenas elas são excluídas na escola? E no plano de aula e prática do professor? No Projeto Político Pedagógico da escola? No currículo oculto que permeia as relações?

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Imagine você em uma aula de dança, desenho ou outra coisa da qual você não tenha um talento nato ou uma habilidade adquirida. Você, naquele momento, precisaria de um atendimento especial ou a mesma metodologia genérica do professor para a turma seria capaz de te fazer avançar e acima de tudo acreditar que você é capaz? Quando pensamos nisso, conseguimos perceber que o conceito de inclusão é mais amplo do que apenas olhar para inserção de crianças com deficiência no contexto escolar; é possível sentir que mesmo outras crianças “não laudadas”, ou seja, sem diagnóstico médico definido, mas que apresentam dificuldade ou defasagem, precisam também de um olhar e um atendimento educacional diferenciado para que possa avançar dentro de seu ritmo, limites e também potencialidades. E todos têm potencialidades! Mesmo aqueles com privações severas.

2. A CHAVE DA QUESTÃO: MUDANÇA NO OLHAR

Normalmente os professores, até mesmo os menos experientes, conseguem identificar que um aluno possui “dificuldade” em alguns dias ou semanas de aula e contato efetivo com ele. A questão é que muitos param por aí. Identificam e usam sempre aquele mesmo discurso para justificar o não desenvolvimento do aluno: “...mas esse aluno tem dificuldade” como se pra ele não resolvesse sequer tentar fazer alguma coisa. Na verdade, quando o professor diz isso, ele diz mais sobre ele mesmo do que sobre o aluno em si, pois ele não está justificando a incapacidade do aluno (até porque ela nem existe), está sim justificando ele mesmo e sua postura diante da dificuldade encontrada. Aí que está a chave da questão. É a mudança de/no olhar, mas não do olhar para rotular, superficial; e sim no olhar para sentir. Sentir que aquele aluno é capaz sim, mas precisará de diferentes maneiras, recursos, estratégias e planejamento para que possa partir de onde está e o que sabe para poder avançar e desenvolver. E quando sentimos (e nos comprometemos), somos capazes de lidar com os mais diversos perfis de alunos, dificuldades, defasagens ou deficiências em sala de aula. Uma estratégia eficiente para treinar e refinar esse “sentir” é olhar para aquela criança e pensar “E se fosse meu filho ou alguém querido meu ou da minha família?”, “Como eu gostaria que ele fosse pensado ou tratado?”. Pronto! Aí você ja começa a ter recursos para abandonar aquele olhar conformista do “não tem jeito, ele é assim mesmo” para um olhar inclusivo do tipo “Espera, vamos ver o que ele ja consegue, o que precisa e como posso fazer para ele desenvolver”. Seja para alunos com deficiência ou defasagem na aprendizagem, esse olhar inicial é capaz de mudar tudo! Mas como fazer isso na prática? É isso que trarei no próximo tópico.

Mas antes, uma observação importante. Sabemos que para uma integral inclusão é preciso mais que a boa vontade, esforço e conhecimento do professor pois envolvem muitos aspectos (estrutural, político, familiar, etc) para que tudo seja plenamente satisfatório e atinja seu nível máximo de desenvolvimento. Não entrarei nesse mérito aqui neste momento, mas eu, enquanto professora da rede pública, sempre lutei dentro e fora da sala de aula também, orientando e apoiando as famílias

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para conseguirem garantir os demais direitos que possuem e que podem dar subsídios para apoiar meu trabalho pedagógico em sala. Mas se com professor engajado assim já é difícil, tão pouco sem ele, seu olhar, comprometimento e estudo na busca de meios fica impossível de se pensar em inclusão real. Não somos os únicos responsáveis pela inclusão desses alunos, isso é fato! Mas fato também é que somos peça fundamental para que ações propositivas sejam tomadas e que a inclusão de fato se torne realidade.

3. AVALIAÇÃO E PLANEJAMENTO DOCENTE: COMO FAZER DE FORMA INCLUSIVA E CONTEMPLAR ÀS NECESSIDADES DE TODOS

“Para quem não sabe onde quer ir, qualquer caminho serve” dizia Lewis Caroll no clássico Alice no país das maravilhas. É justamente pensando nisso que para qualquer trabalho pedagógico bem feito é preciso um Plano bem detalhado e, antes disso, bem reflexivo acerca do seu aluno: suas habilidades já existentes (porque todos têm, mesmo aqueles com maior comprometimento em decorrência da deficiência) e suas potencialidades a serem desenvolvidas (o que todos possuem também!). A partir dessa reflexão que vem acompanhada por alguns momentos de avaliação diagnóstica, traçar o caminho para que consiga atingir esse desenvolvimento proposto no plano. É preciso enfatizar que quando dizemos avaliação, não necessariamente deva ser uma avaliação formal apenas (nos moldes, estratégias e conteúdos da série/ano do aluno), mas em situações que colocamos a aprendizagem daquela criança em jogo e podemos então avaliar como ela está pensando, que saberes possui e como podemos planejar novas situações para que ela avance em determinado conteúdo e/ou habilidade.

Dentre os tipos de planejamento docente podemos destacar:

Plano anual (Plano de Ensino): diz respeito ao plano traçado àquela turma como um todo ao longo daquele ano, normalmente dividido em disciplinas e bimestres.

Plano semanal (Semanário ou rotina): Este plano contempla as atividades (conteúdos/habilidades) que serão trabalhadas nas aulas daquela semana. Muitas escolas atribuem ao coordenador a função de receber e acompanhar essas rotinas afim de poder fazer um trabalho formativo contínuo com base nesse acompanhamento.

Plano Diário (Plano de Aula): O plano de aula são os encaminhamentos que serão dados pelo (a) professor (a) naquelas aulas do dia. Seria o passo a passo da aula mesmo. Importante dizer que neste plano precisam ser contempladas as adaptações das atividades necessárias para alunos com deficiência, dificuldade ou defasagem.

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Plano Individualizado de Ensino: Destaque para esse plano, pois justamente por meio dele é possível, considerando o Plano de ensino da turma, pensar e ajustar objetivos, conteúdos e/ou estratégias para atender àquele aluno com Necessidade Educacional Especial (tenha ele um laudo ou não). Importante nesse e outros planos fazer uma reavaliação com determinada periodicidade que o professor julgar necessária (mensal ou bimestral) para que possa acompanhar o quão eficaz está sendo para o desenvolvimento do aluno ou turma em questão. E sempre que necessário fazer alterações baseadas nessas avaliações reajustando o percurso.

Existe algum desses planejamentos que se sobressai aos outros? A resposta certamente é não, pois cada um tem seu objetivo específico e todos estão à serviço da qualidade do trabalho docente; e não é possível falar em qualidade sem que haja planejamento, nos seus mais diversos níveis como os citados acima.

4. PLANO INDIVIDUALIZADO DE ENSINO: INSTRUMENTO NORTEADOR DE PRÁTICAS INCLUSIVAS

Antes de elaborar qualquer plano é preciso conhecer a realidade que temos e o que queremos mudar nela. Essa premissa vale também para o Plano Individualizado de ensino. Ele é dividido em duas grandes partes:

1. Conhecendo o aluno: A) Informações pessoais, características de personalidade, alimentação,

higiene, interação, interesses, comunicação. B) Avaliação diagnóstica pedagógica: Habilidades de Escrita, leitura,

oralidade, produção textual, matemática, etc. De forma bem detalhada e descritiva.

2. Plano Individualizado de ensino: A) Objetivos gerais e específicos: O que se espera desenvolver com esse

aluno de maneira geral e especificamente em cada área. B) Estratégias: como serão as adaptações para atender às necessidades

desse aluno, que tipos de atividades ou estratégias a rotina dele precisa contemplar.

C) Avaliações: Momento de refletir e registrar os avanços ou não para manter ou alterar o plano.

Foi colocado a seguir uma sugestão de organização para um Plano Individualizado de ensino.

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Neurociências e educação: contribuições para o estudo do desenvolvimento humano no espaço escolar

Joana de Jesus de Andrade

Lidiane Paziani Lança

O mistério, enquanto ausência de significação ou de respostas, nos impacta, nos mobiliza, por vezes paralisa. Ao mesmo tempo, no paradoxo que sempre sustenta nossas interpretações, é ele também a condição da criação humana das respostas possíveis. Da (in)finitude do universo ao funcionamento de nosso corpo, os mistérios são muitos e as interpretações tão instigantes que nos perdemos nas várias possibilidades de respostas (científicas, religiosas, filosóficas...) daqueles que ousam questionar e “sair da caverna” como no mito platônico1.

Buscar respostas passa a ser então um imperativo humano, individual, mas que, só pode ser desvendado, explicado no ato do encontro coletivo. Pelo pressuposto sócio-histórico da condição humana vemos no outro a primeira possibilidade de significação (VIGOTSKI, 2000)2. É no outro que reside a primeira pergunta e a primeira resposta. E é no diálogo que as primeiras significações ganham vida. O diálogo que marca a constitutividade humana é o lugar privilegiado do encontro das interpretações, pois abarca as condições de troca, de ouvir e falar do/sobre os mistérios. E, quando percebe-se que o cérebro questiona o cérebro, o mistério e a curiosidade se ampliam. E é justamente sobre isso que tratamos neste texto: as relações humanas marcadas pelo ato constitutivo do encontro e do diálogo considerando a perspectiva da Neurociência e da Educação.

O cérebro (enquanto metáfora da mente humana) questiona o cérebro (enquanto órgão biológico, mas não só...) e as respostas, mistérios, vão sendo elaboradas, não porque se “descobrem” verdades, mas porque se constroem

1 O termo “sair da caverna” aqui refere-se ao texto “A alegoria da caverna” escrito por Platão na

obra A República escrita há aproximadamente 380 anos a. C. O texto refere-se à possibilidade de

acesso ao conhecimento, superando o mundo sensível, a crença e a opinião e atingindo o mundo

inteligível – exterior da caverna, lugar da luz e da razão (GONZALEZ, 2013).

http://www.usp.br/nce/wcp/arq/textos/203.pdf, https://www.isat.com.br/o-mito-da-caverna-

de-platao-educacao-aprendizado-e-a-descoberta-do-conhecimento/.

2 Lev Vigotski (1896-1934), em seus escritos sobre a constituição do ser humano,

destacava que a especificidade humana possui origem cultural e social, pois é “Através

dos outros constituímo-nos. Em forma puramente lógica a essência do processo cultural

consiste exatamente nisso” (VIGOTSKI, 2000, p. 24).

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respostas possíveis, provisórias e pertinentemente inacabadas, para que o diálogo continue...

Estudar e conversar sobre Neurociências e Educação tem sido um exercício, tanto para minha vida acadêmica quanto pessoal e profissional, já há algumas décadas. É um tema instigante e que não tem fim, pois sempre há algo novo, alguma informação retificada, uma pesquisa inovadora etc. E, além disso, a intensa mídia na atualidade ajuda a disseminar a curiosidade pelo tema, muitos trabalhos importantes da área, mas também muitos mitos e informações desencontradas que acabam disseminando tanto o tema quanto as confusões conceituais.

Neste texto, de caráter apenas descritivo, compartilho juntamente com uma aluna e colega de trabalho, um pouco de como tem sido esse exercício com colegas professores da rede básica de ensino, em diferentes eventos científicos e acadêmicos. No espaço dos cursos de formação continuada, seja na Universidade, nas prefeituras ou na Diretoria de ensino, o intuito é sempre que se conheça mais sobre um tema relativamente novo que é a Neurociência e mais ainda, um tema que se entrelaça à Educação por demanda de ambas as áreas. E, desde a escola, a expectativa se faz por uma série de motivos. No texto trazemos um pouco do que temos abordado e como temos, juntos, enfrentado e (re)significado os mistérios de um cérebro que ousa pensar o próprio cérebro3.

Geralmente a cena se repete. No dia do evento os colegas professores e professoras da rede básica de ensino vão se aproximando, desconfiados, expectativas mil. A sala está cheia e a comissão organizadora ansiosa, pois um dia especial de formação vai sendo construído em cada abraço de acolhida. Entre olhares de curiosidade o mistério se estabelece: o que será que vem por aí? E a escuta se encontra no mágico encontro do diálogo com muitos outros.

Ao pedir que sentem-se confortavelmente, convido aos colegas que façam um exercício de respiração4. Olhos fechados, atenção voltada para cada parte do

3 “É certo que cada um de nós se envaidece por ser capaz de pensar, e muitos até gostariam de saber como é possível que pensem como de fato pensam” (CANGUILHEM, 2006, p. 183). O cérebro e o pensamento, Georges Canguilhem http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-24302006000100006. 4 A respiração adequada tem influência direta na saúde física e mental. Como

consequência de uma respiração deficiente, a oxigenação cerebral inadequada pode

ocasionar dores de cabeça e desatenção (SLAVIERO, 2004). Estas consequências

dificultam a eficiência da aprendizagem pois, segundo a autora, impede que eles fixem a

atenção e finalizem raciocínios. Portanto, o professor adotando as técnicas em sala de

aula, pode tornar o ambiente de ensino acolhedor, tranquilo e mais adequado para a

aprendizagem.

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corpo, respiração profunda, cadenciada e atenta, música relaxante. Por alguns minutos os colegas esquecem da correria do dia-a-dia e atentam-se a sentir o seu próprio corpo. Esta dinâmica, que tem base no fato de que nosso cérebro consome cerca de 25% do oxigênio que respiramos é o argumento para falarmos da importância da respiração para saúde geral, para o autocontrole e para diminuir a possibilidade dos desconfortos causados pela má oxigenação. Esta prática, comum nas escolas orientais, tem sido inserida nas escolas ao redor do mundo no formato de práticas de meditação, yoga, mindfulness etc. (QUEIROZ; PUSIOL, 2019)5. Os ganhos são concretos e os relatos são de melhora no comportamento dos alunos e professores.

Em seguida, conversamos sobre o que significam os termos: neuro, ciência, educação e quais são as demandas da comunidade escolar quando pensamos nas inter-relações entre essas áreas. A partir de intervenção guiada e das falas dos professores surgem questões como: Na minha época não era assim, o que está acontecendo com a disciplina desses alunos? Tem que inovar, mas e o conteúdo, como fica? Eles não se lembram da matéria que foi ensinada ontem, o que eu faço? O que será do futuro desses alunos que não leem? O que será do futuro nas mãos deles(as)? Desisto! O meu salário será o mesmo no final do mês? Mas ele(a) tem laudo? Está medicado(a)? Mas é menino ou menina? Como devo chamá-lx? Depressão, suicídio, automutilação... O que fazemos com essas questões na escola? Como explicar, como entender?

Percebe-se que as demandas giram em torno de muitos não-saberes e chegam até o encontro enquanto queixa, lamento e busca de soluções, se possíveis fáceis e rápidas. É recorrente que essas falas sejam acompanhadas de um pedido de ajuda no sentido de transferir a responsabilidade para “alguém mais capacitado” como um médico, psicólogo, pais, policial. Obviamente esta não é uma postura de todos, mas é bastante comum e nós entendemos o seu fundamento, já que as atribuições são tantas, as condições de trabalho são difíceis no dia a dia da escola e que novas incumbências, são sempre desafiadoras. E, muitas vezes, quando concordamos coletivamente que o professor precisa assumir sua responsabilidade pedagógica, isso gera desconforto, pois destoa da formação inicial que eles possuem e que entendem como sendo a missão de ensinar o conteúdo. Neste momento

5 As técnicas de mindfulness, yoga e meditação, apresentam inúmeros benefícios para o desenvolvimento humano e para o ambiente escolar. As consequências no indivíduo são físicas e mentais, possibilitando o desenvolvimento psicomotor e cognitivo e a organização mental. Dessa forma, ao utilizá-las nas escolas, os alunos conseguem identificar seus limites e emoções e entendê-los, melhorando os relacionamentos inter e intrapessoal e com o meio ambiente (SCHULZ, 2019). Além disso, o autor complementa que o desempenho escolar e a aprendizagem também recebem ganhos com essas práticas, pois podem reduzir o déficit de atenção, a hiperatividade e melhorar a concentração, a memória e a criatividade.

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destacamos que a escola e suas funções mudam com o tempo e que deveríamos entender esse espaço na complexidade de tudo que ele abarca e não apenas como lugar de “transmitir” meras informações que atualmente encontram-se (esparsas e por vezes incorretas) na Internet.

Para sustentar a necessidade de que nossa atuação contemple o conteúdo, mas também a pedagogia, a psicologia, a biologia, destacamos que os educadores que estudamos no Brasil, de John Dewey, Paulo Freire, Maria Motessori, Lev Vigotski, Henry Wallon, Jean Piaget até os diversos pesquisadores da área educacional da atualidade, dificilmente apregoam um ensino voltado especificamente para um único campo como, por exemplo, o do ensino do conteúdo. A partir do diálogo que resgata as diversas esferas da educação, trazemos os principais conceitos de cada autor como a importância da experiência; do protagonismo do aluno; da adaptação de materiais/espaços/tempos/recursos; do respeito aos diferentes momentos de desenvolvimento social/emocional/psicológico/cognitivo; do lugar social de cada sujeito e das relações humanas como a base material e simbólica de todas as possibilidades de desenvolvimento e constituição humana. E, como forma de problematização destacamos aspectos relacionados ao uso de tecnologias na educação e possíveis formas de atuação na escola a partir de diferentes contribuições teóricas (BACICH; TANZI NETO; TREVISANI, 2015).

Além disso, trazemos também um recurso para discussão que costuma interessar bastante aos professores. Trata-se de um gráfico (Figura 1) publicado em um artigo por um grupo de pesquisadores (POH; SWENSON; PICARD, 2010) e que se refere ao uso de um equipamento – um sensor – para reconhecimento de atividade eletrodérmica, que é um índice sensível de atividade do sistema nervoso simpático. O artigo se refere ao equipamento e à exploração de suas potencialidades para a neurologia, mas um dos gráficos apresentados nos chama atenção pois mostra o resultado da ativação neural que foi medida durante sete dias na vida de um estudante. É importante destacar que o trabalho não tem foco educacional e foi realizado com um único estudante, mesmo assim, o que nos mostra o gráfico pode indicar aspectos importantes de nossa atuação em sala de aula.

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Figura 1. Gráfico de ativação neural em atividades de um estudante. Fonte: POH, M.Z., SWENSON, N.C., PICARD, R.W. A Wearable Sensor for Unobtrusive, Long-term Assessment of Electrodermal Activity, 2010.

Fato é que, em ações como assistir televisão e assistir aulas, parece existir

um padrão de ativação cerebral semelhante. Em contrapartida, as atividades que demandam postura ativa, como trabalhos de casa, aula de laboratório, estudo antes de exames e o momento do exame, mostram uma ativação no gráfico completamente diferenciada. E isso é discutido com os professores a partir de explicações sobre os processos de mielinização, aferência e eferência, ativação de diferentes áreas cerebrais, nestes casos especificamente do lobo frontal como “organizador e executor” de ações que resultam em aprendizagens de formas de ação complexas etc. (COSENZA; GUERRA, 2011)6.

6 A aprendizagem, do ponto de vista biológico, é resultado de uma série de processamentos e consolidações de informações no cérebro. Para isso, destacam-se os processos sensoriais que, por meio de um circuito celular presente no sistema nervoso, transportam a informação até o córtex cerebral (COSENZA; GUERRA, 2011). Os autores explicam que, ao chegar no córtex cerebral, as informações são processadas e como ele é encarregado de realizar diversas funções como o desenvolvimento da linguagem, da memória, do planejamento de ações, do raciocino lógico etc., é neste local que se elaboram as respostas ao estímulo recebido. Cabe enfatizar que o lobo frontal, região do córtex cerebral, tem uma importância enorme para a aprendizagem pois envolve a memória operacional, a atenção e as funções executivas. As funções executivas são os

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Uma das informações do gráfico que desperta interesse dos professores refere-se ao sono. Eles se espantam com o fato de que até dormindo há mais ativação do que nas aulas. Então, são explicados os mecanismos do sono e a sua importância para a consolidação de memorias de longo prazo (COSENZA; GUERRA, 2011)7, e que o sono e os sonhos são momentos singulares de reelaboração da realidade, são momentos de criação intensa e por isso, nossos neurônios não “dormem” enquanto nosso corpo descansa. Ao contrário, há grande ativação já que o sono acaba sendo um momento privilegiado para desenvolvimento de nossa criatividade (RIBEIRO, 2019).

A partir destas considerações destacamos, resgatando os teóricos da educação, que todos eles enfatizam a importância de que o aluno seja proativo, protagonista, seja o autor, criador de seu próprio processo de aprendizagem. Problematizamos que, quando Paulo Freire afirmava “ninguém educa ninguém” (FREIRE, 1987, p. 79) o que apontava era justamente para o fato de que aprender é uma ação de pro atividade do sujeito aprendente e não depende apenas da performance do professor. Esta performance pode ser interessantíssima, mas se o aluno for apenas um expectador passivo (como aparece no gráfico), o objetivo da aprendizagem ficará fora do espetáculo que pode ser uma aula enquanto encontro.

Em seguida reserva-se um tempo para explicações de ordem biológica do desenvolvimento humano destacando-se desde o momento da concepção até a juventude e maturidade. Enfatiza-se a importância do período da gestação pelos cuidados da e com a mãe que gesta, do impacto negativo que as drogas podem causar em momentos críticos de formação, proliferação e diferenciação das células neurais; da importância da alimentação balanceada, dos exercícios físicos e do momento do parto. Para tanto, além de serem trazidas figuras, divulgamos vídeos, revistas, artigos e documentários que podem ajudar a entender melhor este tema. No que se refere especificamente ao parto, resgata-se a perspectiva histórica dos milhares de anos de

planos de ação complexa, ou seja, são habilidades e capacidades que permitem identificar as metas e os objetivos almejados, planejar os comportamentos e as ações e executá-las (COSENZA; GUERRA, 2011). 7 É durante o sono que nossas sinapses são reorganizadas e os processos eletrofisiológicos envolvidos na sua formação funcionam, favorecendo a neuroplasticidade (COSENZA; GUERRA, 2011). Portanto, quando dormimos, nosso cérebro faz uma releitura das experiências e informações vivenciadas no dia, mantendo aquelas que são consideradas significativas e importantes para a sobrevivência diárias de forma mais estável e eliminando outras que estão em desuso. Dessa forma, é imprescindível que tenhamos períodos de sono com qualidade para que as experiências e as informações sejam memorizadas e facilitem a aprendizagem. https://sono.fmrp.usp.br/linksuteis/, http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862009000200013.

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evolução e da preparação do corpo feminino para este evento. Discute-se a questão do alargamento dos ossos da pelve e a produção de hormônios como a occitoxina que é um marcador fundamental na construção dos laços afetivos entre a mãe a cria8. No caso dos partos via cesariana, são comentados sobre a importância dos progressos que a medicina e a farmacologia proporcionaram com as anestesias, os medicamentos para diminuição da dor, a occitoxina sintética, e os diversos equipamentos que viabilizam a vida da mãe e do bebê em casos em que, historicamente, não haveria condições de sobrevivência.

Destaca-se que o parto, como momento de nascimento para o mundo externo, representa uma mudança extraordinária com alteração de pressão; temperatura; sensações táteis de um ambiente úmido para o seco; iluminação e; sons considerados altos, ou seja, são sensações que podem ser consideradas de choque para esse organismo que estava abrigado de modo bastante diferente no útero materno . O momento do parto, apesar de representar uma grande inauguração na vida humana, simplesmente não é lembrado na vida adulta. Poucas pessoas possuem memórias de antes de seus 3 ou 4 anos de idade. Isso porque áreas responsáveis pela memória, como o hipocampo, por exemplo, ainda não estão totalmente formadas e, portanto, as conexões neurais com outras áreas como o córtex temporal, não se consolidam.

A dependência e imaturidade biológica do bebê humano demonstra que nossa formação é aparentemente “prematura” em relação a outros animais. O tempo que precisamos para aprender a andar, a ver, a entender a lógica das relações com nossos co-específicos pode ser considerado longo quando comparamos, por exemplo, com um potro ou um bezerro que nascem e saem andando, mamando, e em poucos dias já estão ambientados em seu novo “habitat”.

De todo modo, esse tempo de desenvolvimento em aberto é justamente aquilo que possibilita um grande espaço-tempo para o desenvolvimento humano com o outro social (PINO, 2018)9. Comparativamente a outros animais, nossa “prematuridade” ontogenética representa um ganho no sentido de que a

8 O documentário O Renascimento do Parto – Chauvet Filmes (2013), produzido por Eduardo Chauvet e disponível na plataforma NETFLIX (https://www.netflix.com/title/80995575), apresenta os elementos que envolvem o parto chamado atualmente de humanizado. O documentário traz entrevistas e depoimentos e é um recurso muito profícuo para discussões sobre a importância do “parto normal” para o desenvolvimento neural periférico e central e para as conexões psicológicas entre mãe e criança. 9 Sugere-se, como complemento à esta explicação, que os professores assistam ao documentário produzido por Marta Kohl de Oliveira, “Coleção Grandes Educadores: Lev Vygotsky” - Atta Mídia e Educação (2006), sobre os planos genéticos do desenvolvimento humano estudados na Teoria Histórico-Cultural: filogênese, ontogênese, sociogênese e microgênese.

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possibilidade de intervenções e direcionamentos fica dependente das relações e dos cuidados de outras pessoas. E nisso, a educação tem um papel fundamental. Para além dos cuidados da família, na escola, e no Brasil com direito a creche desde os 4 meses de vida, a criança precisará ser cuidada e atendida em uma série de aspectos para os quais as educadoras (mulheres em sua maioria) serão imprescindíveis (AMORIM; VITORIA; ROSSETTI-FERREIRA, 2000). Quando discutimos estes aspectos ressalta-se que a educadora que troca fraldas e dá banho e mamadeira, é tão importante quanto a professora alfabetizadora nos anos iniciais do Ensino fundamental. Quando falo isso nos cursos, os colegas se olham, desconfiam, mas explico então os efeitos desses cuidados para que haja a continuidade da mielinização das vias sensoriais; para a plasticidade cerebral; para a produção de hormônios de crescimento; para regulação de temperatura corporal e batimentos cardíacos. Os cuidados que são tomados com o conforto dos bebês refletem-se em esferas biológicas, mas também em esferas psicológicas, afetivas e comportamentais, tanto na infância quanto na vida adulta. As condições materiais e interpessoais que propiciam segurança, alimento, aconchego e situações de significação mútua entre quem assume a função materna e os bebês auxiliam para o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores de atenção, percepção, memória, linguagem, raciocínio lógico e emoção, que são conceitos básicos nas obras de Luria e Vigotski e que sustentam as bases do desenvolvimento humano (LURIA, 1992; VIGOTSKI, 2007).

Após as discussões sobre parto e bebês, são explicitados conceitos sobre os diferentes tipos de células neurais e não apenas os famosos neurônios, mas também as células gliais e sua importância para a manutenção do órgão cerebral enquanto mantenedoras da “limpeza”, “fornecedoras” de nutrientes e formadoras do grande tecido cerebral. Também são explicados os mecanismos básicos das sinapses e, são comuns entre os colegas professores as dúvidas sobre epilepsia pois eles “ouvem falar” que essa doença decorre do “choque” elétrico provocado pelas sinapses e que esta seria uma doença contagiosa. Assim, neste momento são citados que existem tipos diferentes de acometimento, orienta-se a buscar sites específicos com orientações sobre o tema10 e são orientados sobre os cuidados básicos de atendimento a uma pessoa com crise epilética: necessidade de buscar sustentar com algo macio partes do corpo como a cabeça; não tentar segurar a língua de uma pessoa em crise; chamar socorro médico em caso de desconhecimento e demora na crise; não oferecer água, alimento ou medicamento imediatamente após a crise e; não assustar a pessoa com perguntas e cobranças pois a confusão mental pode ser comum após a crise. Além disso, busca-se desmitificar falas como transmissão por contato, possessão espiritual, doença mental sempre associada etc. Mas, explica-se que as drogas usadas para controle deste acometimento podem causar lentidão, percebida especialmente nas crianças medicadas que na escola muitas vezes ficam sonolentas e podem ter dificuldades de relacionamento com os colegas e, por vezes,

10 http://epilepsia.org.br/o-que-e-epilepsia/, https://www.einstein.br/doencas-sintomas/epilepsia.

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também de desempenho acadêmico. Situações, portanto, que requerem acolhida, cuidado e atenção e nunca estigmatizarão e preconceito.

Explica-se também a diferença entre sistema nervoso central e periférico e orienta-se locais de pesquisa sobre lesões de sistema nervoso periféricos com acometimento motor nos casos de lesão medular11 e traumatismo cranioencefálico por traumas, tumores ou AVC.

Muitas vezes o tema das traumatismo cranioencefálico leva a questionamentos sobre problemas psicológicos relacionados a traumas e isso é discutido superficialmente pois sempre há a orientação de grupos de pesquisa12 que atuam especificamente nesta área. Mas, esses questionamentos são uma base importante para desmistificarmos uma percepção de senso comum entre os professores e, de modo geral entre a população, de que uma pessoa tem uma lesão no cérebro (machucado) e por isso é “desatenta”, “nervosa”, “neurótica”, “ansiosa”, “psicopata” etc.

Outro assunto recorrente e que os professores relacionam a lesões cranioencefálicas ou medulares, é a presença da criança cadeirante na escola. É importante destacar a dificuldade em conhecer e entender as causas, origens e consequências da história de cada aluno(a) que precisa de uma cadeira de rodas para melhor locomoção. Assim, são esclarecidas as diferenças entre Paralisia cerebral, síndromes diversas e outros acometimentos que podem levar uma criança a precisar da cadeira. Além disso destaca-se a importância do trabalho conjunto com o professor de AEE – Atendimento Educacional Especializado no sentido de conhecer as especificidades de cada condição (deficiência motora, visual, auditiva, sinestésica); as funções deste professor de apoio e o que podemos e devemos fazer para que haja adaptações no sentido de viabilizar a participação efetiva de todos(as) os(as) alunos nas aulas.

Para retornar aos aspectos educacionais relacionados à aprendizagem e cognição resgata-se então o conceito de Sistema Funcional Complexo de Luria e Vigotski (ANDRADE; SMOLKA, 2012; LURIA, 1981). Este conceito é suscitado por Vigotski e sistematizado por Luria (Figura 2) que, a partir de seus estudos com crianças e adultos enfatizava que o desenvolvimento das áreas cerebrais acontece de modo cadenciado, articulado, interdependente e como se fosse um “concerto” musical, no qual diferentes “atores” (areas cerebrais) teriam papel diferenciado mas não menos importante para que

11 http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_pessoa_lesao_medular.pdf, http://www.sarah.br/. 12http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_reabilitacao_pessoa_traumatisco_cranioencefalico.pdf

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Figura 2. Sistematização do Sistema Funcional Complexo

Fonte: Elaboração Própria

a composição final de um ato, um gesto, uma fala, fossem consequência do funcionamento de um cérebro que funciona de modo articulado e interdependente.A Unidade Funcional I está localizada abaixo do nível do córtex, no tronco encefálico e, portanto, está relacionada com a atividade consciente, vinculada ao Sistema Reticular Ativador Ascendente (SRAA). Tem importante função na regulação da atenção e da percepção, na regulação do tônus cortical e, portanto, da consciência, da vigília e do sono, influenciando nos processos cognitivos. Mas, é importante ressaltar que “[...] o nível de excitação do sistema como um todo pode ir mudando gradualmente, modulando o estado funcional de todo o sistema nervoso” (LURIA, 1992, p. 163).

A Unidade Funcional II é formada pelos lobos occipital, parietal e temporal bem como as áreas associativas parieto-têmporo-occiptal. Possui como função receber os estímulos auditivos, visuais e táteis, analisá-los, memorizá-los e recodificá-los. Luria (2010) nomeia estas estruturas como áreas corticais posteriores (aferentes) e atribui a organização e a compreensão da linguagem como consequência das funções executadas vinculadas à Área de Wernicke, uma área localizada no giro superior do lobo temporal e extremamente importante para o desenvolvimento das funções superiores baseadas na linguagem.

A Unidade Funcional III está localizada nos lobos frontais e possui como função a associação dos diversos estímulos vindos de todo o encéfalo e, portanto, é responsável por grande parte do que chamamos de raciocínio lógico. Considerada por Luria (2010) como a mais importante e essencial sob as outras unidades para a consciência humana.

Com sua íntima participação na formação das intenções e nos programas de ação, subordinando a atividade aos focos dominantes, inibindo os fatores intervenientes e permitindo que os resultados das ações sejam comparados às intenções originais, os lobos frontais desempenham um papel essencial na regulamentação consciente do

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comportamento e no suporte da estável seletividade da atividade do homem, que é dirigida por um objetivo (LURIA, 2010, p. 223).

A partir do estudo do cérebro enquanto um sistema funcional e complexo

são trazidas situações concretas de sala de aula para que possamos refletir e relacionar ações pedagógicas com possíveis implicações na vida dos alunos.

Assim, para o desenvolvimento da Atenção e da Percepção, fundamentais para as relações de ensino e a aprendizagem, destaca-se a importância de que as atividades pedagógicas mais ativas ou mais passivas devam ter tempos de durações diferentes. Isso porque, muitas vezes, os professores não entendem os motivos pelos quais os alunos não “ficam quietos” ou “prestam atenção” em sua aula, mas nem sempre percebem o tempo de atenção requerida em uma mesma posição corporal que nem sempre é confortável para o aluno. O que implica diretamente na busca por mudança de postura, de olhar de sons, já que a os comandos da I Unidade Funcional referem-se justamente à regulação do estado de consciência influenciando todos os processos cognitivos pelo sono e pela vigília. E, como essa unidade é modulada pelos sistemas aferentes, o tempo e os modos de incentivar o aluno repercutem no quanto esse aluno conseguirá manter-se atento ou disposto a participar de uma atividade. A partir disso destaca-se que o “controle” da sala é diferente de domínio da atenção e que se as atividades forem diferenciadas para alunos diferentes, com tempos diferentes é possível que haja maior envolvimento motriz, emocional e cognitivo facilitando assim o engajamento e, consequentemente, as chances de aprender e criar no espaço da escola. É possível problematizar, a partir destas considerações, que os tempos de 50 minutos das aulas, o horário de início das aulas, geralmente as 7h da manhã, e o modelo fragmentado disciplinar, poderiam ser repensados a partir de modelos de ensino por projetos, ensino por investigação, PBL, design thinking, dentre outros (MORAN, 2013).

Com relação às Unidades Funcionais II e III, respectivamente relacionadas ao armazenamento e a associação de informações, são destacadas ações concretas que a escola e os professores poderiam realizar para que houvesse melhora na participação dos alunos. O primeiro aspecto destacado é o espaço físico, assim como mencionado na questão dos bebês e da infância, em todos os níveis educacionais o espaço físico tem papel fundamental ao sustentar informações de segurança e previsibilidade que farão com que o sujeito aprendente produza hormônios que garantam a tranquilidade, a satisfação e a felicidade por estar em um lugar acolhedor e que desperta interesse em manter-se por mais tempo. Assim, são apresentadas as ideias das salas ambiente (ALMEIDA, 2017) (que são salas específicas para cada área de conhecimento e com recursos materiais próprios). Esse modelo de organização existe de modo bastante reduzido na rede pública de ensino e o argumento é de que a movimentação dos alunos causa “bagunça” e barulho. Fato que é discutido e destacado como positivo, já que a mudança de ambiente desperta nosso corpo para novos desafios e permite que o cortisol e a adrenalina produzidos preparem nosso corpo para novas e desafiadoras situações. Preparação esta que não acontece quando o aluno fica sentado, passivo, esperando a troca de professores a cada 50 minutos.

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Destaca-se também a importância de que a tecnologia seja usada como recurso pedagógico, de todo modo, não falamos apenas de novas tecnologias como TV, tablets, celulares, mas de antigas técnicas de interação com o ambiente (VIEIRA PINTO, 2005). A exploração do espaço externo, o uso de árvores, grama, terra e não apenas de fotos nos livros, são grandes estimuladores do sistema nervoso periférico, ativam as vias sensoriais para os sons, cores, tamanhos, etc., e a interação com o meio faz com que nosso cérebro busque significar não apenas as informações faladas ou lidas, mas também sentidas. E sabe-se que as experiências vivenciadas são intensos recursos para produção de proteínas específicas que atuam na produção de memórias de longo prazo, ou seja, contribuem imensamente para a memorização e a aprendizagem (IZQUIERDO, 2018)13.

Além do espaço e dos recursos são destacadas as formas de organização do ensino com ênfase nas metodologias que potencializam a participação de todos os alunos; ressalta-se que as aulas podem ser organizadas como situações de estudo, como projetos de curto, médio e longo prazo, como sequências didáticas e que a escolha dos conteúdos e dos métodos pode ser feita conjuntamente com os alunos. Isso porque, geralmente, os alunos são receptores de um currículo, de uma aula e de uma escola que eles simplesmente não ajudaram a construir. Assim, quando os alunos fazem parte da pesquisa e da elaboração de planos de ação, de formas diferenciadas de currículo, eles sentirão a escola como sendo produto da participação deles e isso muda completamente a relação que se estabelece entre os atores da comunidade escolar.

Ao vivenciarmos o processo educacional em espaços diferenciados, com recursos diversos e com um modelo educacional que permita o protagonismo dos alunos, enfatiza-se que as ações coletivas, as pesquisas conjuntas, as criações de respostas a partir de situações complexas, poderão ter grandes efeitos na sustentação de uma educação mais afetiva e efetiva.

Para além de buscarmos respostas para os mistérios do universo e do cérebro, acreditamos que trabalhar com Neurociência e Educação nos coletivos de formação continuada de professores pode ser uma forma de criarmos respostas possíveis para problemas complexos. Sem pretensão de resolução de problemas educacionais amplos, que possuem demandas sociais, familiares, financeiras, etc., o que busca-se é que em nosso micromundo da sala de aula possamos viabilizar experiências de vida pautadas na compreensão do ser humano como biológico, psicológico, social, etc. ou seja, negando-se a considerar apenas uma esfera do ser.

Ao priorizar-se que o senso de pertencimento seja a base da vida na escola, destaca-se que as relações humanas sustentadas por meio do olhar acolhedor, da escuta ativa e atenciosa e do respeito mútuo, serão a base para o processo

13 http://www.scielo.br/pdf/ea/v3n6/v3n6a06.pdf,

https://drauziovarella.uol.com.br/videos/entrevistas-em-video/memoria-ivan-izquierdo/.

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educacional de aprendizagens mútuas de conteúdo, de práticas interpessoais e de desenvolvimento... humano.

Referências: ALMEIDA, N. F. Salas ambiente como estratégias de ensino-aprendizagem. Orientadora: Gloria da Anunciação Alves. 2017. 169 p. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017.

ANDRADE, J. J.; SMOLKA, A. L. B. Reflexões sobre desenvolvimento humano e neuropsicologia na obra de Vigotski. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 17, n. 4 p. 699-709, out./dez. 2012.

AMORIM, K. S.; VITORIA, T.; ROSSETTI-FERREIRA, M. C. Rede de significações: perspectiva para análise da inserção de bebês na creche. Cadernos de Pesquisa, nº 109, p. 115-144, mar. 2000.

BACICH, L.; TANZI NETO, A.; TREVISANI, F. M. (Org.). Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015.

CANGUILHEM, G. O cérebro e o pensamento. Natureza Humana, v. 8, n. 1, p. 183-210, jan.-jun. 2006.

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GONZÁLEZ, J. J. C. El mito de la caverna como acercamiento a las necesidades de conocimiento e información. INVESTIGACIÓN BIBLIOTECOLÓGICA, vol. 27, n. 60, may/agosto, 2013, p. 7-11.

IZQUIERDO, I. Memória. 3. Ed. Porto Alegre: Artmed, 2018.

LURIA, A. R. Fundamentos de Neuropsicologia. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1981.

LURIA, A. R. A Construção da Mente. São Paulo: Ícone, 1992.

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VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos

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O modelo Social da Deficiência na escola

Ana Claudia Alves Legore

A Associação Síndrome de Down de Ribeirão Preto (RIBDOWN) é uma entidade civil sem fins lucrativos e de interesse público. Foi fundada em 1998, por familiares de pessoas com síndrome de Down que se preocupavam com a inserção de seus(uas) filhos(as) no mundo, por isso em seu fundamento há a predominância de valores, como: Direitos Humanos, Protagonismo, Vida Autônoma, Dignidade e Emancipação.

Com a missão de defender e garantir os direitos da pessoa com deficiência, a Associação está sempre em busca de condições que promovam a autonomia dessas pessoas, isto é, situações que propiciem momentos de escuta, de participação social e, principalmente, de tomada de decisão a partir de vivências em seus programas institucionais (Mediação Escolar – Mediação Familiar – Formação Continuada – Articulação de Redes).

Todos seus programas estão cadastrados no CMDCA (Conselho Municipal da Crianças e Adolescente) e com atuação na Rede de Garantias de Direitos da Criança e do Adolescente. Aqui apresentaremos o programa Formação Continuada que visa combater a violação de direitos relacionados à criança e adolescente com deficiência, por meio da produção, sistematização e divulgação de conhecimentos relativos aos direitos humanos da pessoa com deficiência pautados na perspectiva do Modelo Social da Deficiência.

O programa Formação Continuada (2019 – 2020) prevê ações diversificadas relacionadas às mídias sociais (produção de conteúdo para site, Facebook, Youtube), eventos de formação para a rede, participação em eventos científicos e produção de material impresso (cartilha) para informação acerca dos direitos das pessoas com deficiência. Ações com o objetivo de proporcionar um fluxo contínuo de troca de experiências, dados, informações, materiais teóricos e metodológicos; dentre outros, para a rede setorial pública e privada, para as pessoas com deficiência e seus familiares e/ou públicos em geral.

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Nessas ações, nos propomos a propagar o Modelo Social de Deficiência, difundir informações sobre direitos destas pessoas e refletir sobre preconceitos e estereótipos que constituem barreiras que impedem a participação da pessoa com deficiência na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Mas o que são essas “barreiras”? O que isso tem a ver com participação social/inclusão e escola? Por que é importante um(a) professor(a) compreender a origem do fenômeno que impacta no processo ensino-aprendizagem de um(a) estudante com (ou sem) deficiência em sua sala de aula? Que estratégias podem nos ajudar a remover essas barreiras?

Foram com esses questionamentos que nos propusemos, no dia 29 de Agosto de 2019, em parceria com o CEIQ (Centro de Ensino Integrado de Química) do Departamento de Química da FFCLRP - USP/ Ribeirão Preto e com a Diretoria de Ensino – Região de Ribeirão Preto, a partilhar nossas vivências, convivências com as pessoas com deficiência e seus familiares; e contribuir com uma formação no curso da IV Escola de Formação de Professores de Ciências Exatas e Naturais. Neste encontro foi possível reunir 28 professores (as), de 27 escolas da rede estadual da cidade, que ministram aulas de Biologia, Física, Química, Matemática e Ciências no Ensino Fundamental II e Ensino Médio e realizar atividades teóricas e metodológicas (individuais e coletivas), absolutamente, possíveis de serem (re)utilizadas em sala de aula por esses(as) participantes da formação.

Iniciamos o encontro com uma apresentação de todos os participantes, pois conhecer a si, o Outro e a realidade, é o primeiro ato consciente para conhecer algo, como afirma Vigotski (1934/2003). Então, o primeiro momento foi de escuta, cada participante declarava seu nome, sua atuação, sua (com)vivência e experiências em sala de aula com as pessoas com deficiência, seus anseios, dúvidas, angústias...

Somente após conhecer, minimamente, a realidade desses participantes foi possível partilhar e perceber com eles(as) que os aspectos que compunham seus discursos eram/são os mesmos que compõem os discursos dos(as) associados(as) da instituição, enquanto estudantes e familiares. Ou seja, os mesmos aspectos aparecem

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nos discursos “dos dois lados” que vivenciam o grande desafio de quem deseja ser incluído e de quem precisa ajudar incluir.

Mas o que impede, então, que “esses lados” se relacionem em igualdade de condições entre si?

Sendo este um momento de reflexão, propusemos que cada participante preenchesse uma atividade individualmente para registar como ele(a) definiria o conceito de deficiência. Aqui, podemos trazer alguns exemplos:

“algo que de alguma forma causa dificuldade em aprendizado de

locomoção, mas que pode ser aprendido com ajuda de profissionais na

convivência escolar e familiar”

“dificuldade de exercer alguma atividade mental ou motora”

“deficiência é algo físico ou emocional que traz alguma dificuldade de

realização das diferentes atividades cotidianas”

“como algo que é considerado diferente, comparando com o que é

definido como normal”

“algo que falte à pessoa, que fuja das regras que a sociedade julgue ser

normal”

Podemos perceber nesses trechos discursivos que o conceito de deficiência, está centrado numa dificuldade em que uma pessoa traz. É como se fosse um “problema” da pessoa somente.

Esta conceptualização de deficiência, segundo Palacios (2007), converge com um modelo médico reabilitador do século XX, que fundamenta as características da deficiência como causas científicas que justificam uma incapacidade pessoal (saúde e enfermidade) e como as pessoas com deficiência são consideradas: pessoas que podem ser reabilitadas ou normalizadas e/ou que podem ser rentáveis para a sociedade. Foi baseado neste modelo que a busca da recuperação da pessoa e a educação especial se converteram em uma ferramenta indispensável no caminho de recuperação ou reabilitação. O que possibilitou o surgimento de um outro fenômeno: a institucionalização. Este centra-se em atitudes paternalista, nos déficits da pessoa (tendo menos ou mais valor = válidas e capazes).

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No entanto, segundo a autora, no final da década de 60 do século XX, um Movimento de ativistas, chamado Movimento de Vida Independente, na Espanha, inicia uma campanha por/pelas pessoas com deficiência a partir do lema “Nada sobre nós sem nós” que se opõe ao modelo médico, até então, prevalente histórico e culturalmente na sociedade. Para este Movimento, os pressupostos fundamentais para se conceitualizar a deficiência devem ser a compreensão de que, primeiro, as causas que originam a deficiência não são individuais, mas sim sociais pela maneira em que a sociedade se encontrava projetada; e segundo, se refere a utilidade da comunidade, partindo do pressuposto de que toda vida humana é igualmente digna, considerando que a pessoa com deficiência tem muito a contribuir com a sociedade, por isso podemos relacionar inclusão com aceitação da diferença.

Este modelo, denominado Modelo Social da Deficiência, diferencia a incapacidade/dificuldade (restrições sociais que experimentam) de deficiência (condição do corpo e/ou da mente); pois segundo o Manifesto elaborado pelo UPIAS (União de Psicologia Impaired Against Segregation) é a sociedade que incapacita as pessoas com deficiência, pois sua organização é algo que impacta a deficiência que as pessoas possuem deixando-as isoladas e excluídas de uma participação plena em sociedade.

Nessa perspectiva, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006/2009) e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (2015/2017) consideram, então, que “pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Art. 2º. BRASIL, 2015). Ou seja, a pessoa com deficiência é aquela que encontra impedimentos/ barreiras que dificultam a participação dessa pessoa na sociedade em igualdade de condições com seus pares.

A partir desse pressuposto, compreendemos que a dificuldade não está na pessoa que detém alguma deficiência, mas no meio social em que está inserida e; que a maior dificuldade está em remover essas barreiras que originam as causas da não participação da pessoa com deficiência no mundo. Segundo a LBI em seu Art. 4º (2015/2017) Barreiras são definidas como

qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros, classificadas em: a) barreiras urbanísticas: as existentes nas vias e nos espaços públicos e privados abertos ao público ou de uso coletivo; b) barreiras arquitetônicas: as existentes nos edifícios públicos e privados; c) barreiras nos transportes: as existentes nos

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sistemas e meios de transportes; d) barreiras nas comunicações e na informação: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens e de informações por intermédio de sistemas de comunicação e de tecnologia da informação; e) barreiras atitudinais: atitudes ou comportamentos que impeçam ou prejudiquem a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas; f) barreiras tecnológicas: as que dificultam ou impedem o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias;

Ressaltamos, que é de suma importância, que esse “novo” conceito de deficiência se propague por todos os setores da sociedade, mas principalmente e com urgência que esse seja absorvido no setor educacional brasileiro. Ainda que encontremos tantas questões na educação, precisamos perceber que a inserção da pessoa com deficiência em qualquer ambiente é um caminho que possibilita a participação de todos e todas, pois ao reconhecer que barreiras removidas propiciam acesso de informação, de comunicação, de mobilidade, e essencialmente acesso para que as relações se estabeleçam de uma forma mais horizontal, dificilmente deixaremos pessoas para trás.

Na escola, por exemplo, quando identificamos quais são as barreiras que estão impedindo que o(a) estudante aprenda e conviva bem com o Outro, compreendemos que os fenômenos existentes naquele espaço não se estabelecem sob uma única ordem ou que não há um único responsável por eles. Pois, segundo OEI (2017, apud Fullan, 2007) a escola pode contribuir para a mudança de paradigmas (o que podemos também nomear de rompimento de barreira atitudinal), para a participação e para a aprendizagem da pessoa com alguma deficiência e, ainda para a tão sonhada mudança educacional, que “é tecnicamente simples, porém política e socialmente complexa”. Imaginemos então, o espaço escolar sem as barreiras que as pessoas com deficiência encontram em seus processos pessoais, sociais, culturais, educacionais, políticos, econômicos, dentre outros:

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Espaço escolar com barreiras impedindo a participação do sujeito

Espaço sem barreiras

Fonte: Própria autora (2019). Ilustração Júlia Alves Bolfarini (2020)

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Mas, que estratégias poderíamos considerar potentes para removerem as barreiras?

Apesar de encontrarmos, na literatura sobre educação, inúmeras estratégias que podem ser utilizadas em sala de aula, é difícil identificarmos “a real receita” para que a absoluta aprendizagem escolar de qualquer estudante seja certeira, principalmente do(a) estudante com deficiência. Isto, muito provavelmente, se dá pela alta complexidade dos aspectos que compõem o desenvolvimento humano.

No entanto, é possível encontrar propostas de estudiosos do desenvolvimento humano na educação e na psicologia que nos inspiram a perceber “caminhos metodológicos” que oportunizam condições de participação em igualdade, pois esses consideram os modos de participação do sujeito e não apenas sua condição de participação. Na instituição, consideramos em nosso aporte teórico a Teoria e a Psicologia Social que nos iluminam e nos mobilizam a utilizarmos modos de participação, os quais compreendemos serem potentes estratégias, para inserir todas as pessoas nas atividades dos programas.

Percebemos que com essas estratégias é possível remover as barreiras que encontramos em nossos percursos de trabalho ajudando nossos(as) usuários (as) e, que por sua vez foram as mesmas utilizadas na formação aqui em questão, como: a escuta, o diálogo, a vivência, a reflexão e o coletivo.

Como se fosse realmente um caminho, iniciamos a formação com um momento de escuta para nos conhecer, diálogos sobre os sentimentos e emoções que surgem nos espaços escolares, partilhamos nossas vivências, isto é, a relação que temos com “esse alguém que tem uma deficiência”, refletimos individualmente sobre o conceito de deficiência, depois repetimos a reflexão com o apoio na teoria, e nos comunicamos o tempo todo relacionando a teoria com as práticas trazidas em suas vivências. Seguimos para um trabalho em grupo menor, onde esse coletivo deveria trabalhar cooperativamente para analisar e compartilhar suas ideias além de resolver uma situação problemática.

Nesse grupo menor era necessário que cada um(a) experenciasse o desafio de montar um banco de palavras que remetesse aos conceitos de deficiência discutidos agrupando-os, posteriormente, de acordo com as barreiras, como exemplificado na ficha de atividade, a seguir:

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Após o término da atividade algum participante do grupo menor trazia para o coletivo maior (grande grupo) como ficou o agrupamento dessas palavras que se remetiam ao conceito de deficiência. Aqui, o caminho se repete fortalecendo as estratégias supracitadas e proporcionando um momento de ressignificação sobre a própria compreensão desse conceito. Algo que podemos considerar como um desafio, pois culturalmente fomos “formados” a centralizar as dificuldades no sujeito e não no meio social.

Dessa forma, compreendemos que para contribuir com mudanças e na remoção dessas barreiras, estratégias como essas, que vão para além de “adequações de materiais didaticos”, é estar em formação contínua e em busca de ressignificar aquilo que nos foi (im)posto. São esses modos de participação que nos foi possível escutar os(as) professores(as), dialogar sobre os desafios diários que enfrentam nos espaços escolares e identificar que as origens das situações problemáticas que eles(as) vivenciam com os(as) estudantes com ou sem deficiência não estão (ou não podem estar) somente sobre suas “cabeças”; partilhar leituras e “novas” concepções que nos ajudam a compreender muitas causas dos problemas enfrentados na educação, ser desafiado e refletir nos possíveis caminhos para suas próprias práticas pedagógicas e, principalmente sobre a importância de fortalecer o coletivo sendo esse ponto chave para nos ajudar para as grandes e necessárias mudanças na educação.

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Após as atividades foi possível observar na avaliação da formação que participantes afirmam que mudaram seu modo de conceituar a deficiência, como podemos comparar e analisar nos discursos:

Discursos da atividade no início

da formação

Mudanças nos discursos na

avaliação da formação

“algo que de alguma forma causa

dificuldade em aprendizado de

locomoção, mas que pode ser

aprendido com ajuda de

profissionais na convivência

escolar e familiar”

“evidenciou que muitas atitudes influenciam bastante nas facilitações de convivências com pessoas com algum tipo de deficiência”

“dificuldade de exercer alguma

atividade mental ou motora” “através de relato de experiência, sempre se descobre algo novo, onde realmente muda maneira de pensar”

“deficiência é algo físico ou emocional que traz alguma dificuldade de realização das diferentes atividades

cotidianas”

“deficiência é alguma limitação, porém a pessoa precisa de uma sociedade que não a limite”

“como algo que é considerado diferente, comparando com o que é definido como normal”

“percebi que me limitava apenas na

pessoa com deficiência e não nas

barreiras colocadas pela sociedade”

“algo que falte à pessoa, que fuja

das regras que a sociedade julgue

ser normal”

“aprendi que os obstáculos estão na

sociedade e não no indivíduo com

deficiência”

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Por fim, enquanto instituição e pessoas, só nos resta agradecer a oportunidade de partilhar momentos tão enriquecedores e que nos motivam a levar de alguma maneira para pessoa com deficiência que a vida dela é valiosa e que é muito importante, para todos nós, que elas estejam presentes em nossas vidas, porque assim a sociedade fica mais organizada, mais comunicativa, mais flexível e resiliente.

Referência:

PALACIOS, Agustina: El modelo social de discapacidad: orígenes, caracterización y plasmación en la Convención Internacional sobre los Derechos de las Personas con Discapacidad. CERMI. Madrid: Ediciones Cinca, 2008.

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Os desafios encontrados no processo de educação inclusiva e a importância de uma equipe multidisciplinar para uma educação de sucesso.

Ana Fábia C. Foglietto Basso

Nos últimos meses, comecei a participar de um grupo de estudos direcionado a investigar e auxiliar no processo de educação formal que se direciona à prática inclusiva. Esse grupo se chama GEAPI (Grupo de Estudo e Apoio a Práticas Inclusivas) e realiza encontros semanais na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP). Fazem parte desse grupo alunos estagiários do curso de química, professores e técnico de laboratório da universidade, professores do ensino fundamental da rede pública de ensino, coordenadores de educação fundamental da rede pública e psicopedagoga.

O grupo começou com o estudo de alguns textos de Vigotski e com estudos de casos práticos baseados na experiência dos alunos estagiários, que têm um projeto de educação inclusiva direcionado ao ensino de ciências, e dos professores de ensino fundamental da rede pública.

Esses estudos abordam os maiores desafios encontrados pelos estagiários e profissionais ao atuarem com alunos especiais e/ou com dificuldades cognitivas em relação ao processo aquisição da aprendizagem formal. Ao falarmos de inclusão, é preciso levar em consideração todos os tipos de dificuldades existentes. Atualmente, trata-se de inclusão os casos que compreendem desde dificuldades de aprendizagem específicas como: Dislexia (visual, auditiva ou de compreensão), Transtorno do Déficit de Atenção (com ou sem hipertatividade), Transtorno Opositivo Desafiador, Transtorno Global do Desenvolvimento, até portadores de síndromes, de deficiência visual, auditiva e/ou deficiências mentais de leves a graves.

Além disso, é importante salientar que quando falamos de educação pública, podemos pensar em salas de aulas cheias, falta de estrutura, falta de assistentes e/ou equipe que auxilie os professores nessa tarefa de ensinar todos de maneira satisfatória.

Quando pensamos em inclusão, temos que pensar o indivíduo, inserido na instituição, fazendo parte de uma família e inserido na sociedade como um todo. Diante dessa realidade que se depara não somente com as dificuldades escolares, mas as vezes com falta de estrutura familiar e social e assim os desafios tornam-se ainda maiores. Sendo assim, podemos refletir sobre diferentes aspectos que interferem diretamente no processo de desenvolvimento do aprendiz.

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O que mudou com a Inclusão Obrigatória?

Historicamente vínhamos de um formato educacional homogêneo, onde era ensinado um determinado conteúdo e esperava-se que todos aprendessem ao mesmo tempo e da mesma maneira. Era determinado um padrão educacional e todos trabalhavam para que os objetivos fossem atingidos de maneira homogênea.

A partir do decreto da Lei de Diretrizes e Bases (Brasil, 1996) que determina que deverá existir uma educação de qualidade para todos, mudanças começaram a acontecer. As escolas passaram a ter diversidade maior de alunos e, nesse mesmo período, a sociedade começou a passar por uma grande mudança tecnológica. Com essas alterações, as mudanças na sociedade passam a acontecer de forma mais rápida e intensa.

As necessidades dos alunos mudam e, atualmente, em um mesmo ambiente encontramos, na sala de aula, alunos que não apresentam interesse por aulas expositivas, pois têm acesso à informações, rapidamente, ao acionar o botão de um computador, celular ou tablet. Ainda, encontramos aqueles que apresentam necessidades específicas, que precisam de atenção e atividades direcionadas para atingirem o mínimo exigido do conteúdo programático proposto para o ano que frequenta.

Diante dessas mudanças e novas exigências educacionais, os educadores se tornam ansiosos e inseguros em relação às melhores estratégias para ensinar, pois não receberam formação necessária para lidarem com essa nova demanda.

“(…) entre os seres aprendentes, encontram-se um material didático exigente, com prazos e limites e um ser-ensinante, que não foi preparado para atender as exigências da educação e que, portanto, não se encaixa no processo de mutações.” (Kallas, 2019, pg. 2).

“(…) entre quem ensina e quem aprende abre-se um campo de produção de diferenças.” (Fernandez, 2001, p.13)

Na maioria das vezes os cursos de formação não oferecem os recursos de que os profissionais necessitam para solucionar os problemas que enfrentarão em sala de aula. Na maioria das vezes, as instituições de ensino não possuem equipes multidisciplinares, e, assim a busca de alternativas para que o objetivo de inclusão seja atingido, parte somente de alguns profissionais e algumas instituições. Sendo assim, o apoio a estes profissionais é fundamental para auxiliá-los, com o objetivo de atingirem educação de qualidade para todos.

No decorrer desse capítulo abordarei os diferenciais de uma escola com equipe de apoio, a importância da relação positiva entre professor e aluno e o papel das famílias na vida dos alunos.

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Como funcionaria uma escola com apoio profissional necessário para atender essa clientela tão carente de cuidados e atenção? A escola com a equipe multidisciplinar, com certeza, ficaria muito mais preparada para trabalhar as necessidades especiais de cada indivíduo e do grupo todo. Como psicopedagoga posso abordar o papel deste profissional de maneira mais clara e completa dentro de uma perspectiva institucional ou clínica.

Tendo como objeto de estudo o processo de aprendizagem humana, a psicopedagogia procura investigar diferentes maneiras de aplicação e aquisição da relação ensino-aprendizagem. Sendo assim, o psicopedagogo atua como um facilitador do processo de educação formal e procura oferecer diferentes recursos que auxiliarão na aquisição do conhecimento.

Atuando de forma clínica ou institucional, a psicopedagogia terá como foco sempre a valorização e desenvolvimento das habilidades do ser aprendiz. No atendimento clínico, o psicopedagogo estará constantemente investigando, avaliando e aplicando recursos específicos que ajudem o individuo aprendiz a reconhecer, aceitar e trabalhar suas habilidades e dificuldades.

No trabalho institucional, parte-se da avaliação e investigação não só das necessidades individuais de cada aprendiz, como também das necessidades da instituição, pois, serão necessários recursos adequados para o sucesso do trabalho individualizado e consequente desenvolvimento do grupo. Neste trabalho é fundamental o auxílio de uma equipe multidisciplinar que atuará na complementação do processo avaliativo e posterior elaboração de atividades a serem aplicadas. A troca de informações é fundamental para um trabalho de sucesso.

A partir do processo de avaliação, realizado pelos diferentes profissionais, deverão ser elaboradas e aplicadas atividades que estejam de acordo com as potencialidades dos indivíduos aprendizes, pois, a partir desse processo, é possível trabalhar a autoestima do indivíduo, fazendo com que ele acredite na sua capacidade de aprender e se desenvolver. O profissional deverá estar muito bem preparado para que não se aplique uma atividade fácil ao ponto do indivíduo não se sentir valorizado, assim como não se deve aplicar uma atividade de complexidade acima das potencialidades do aprendiz, pois ele se sentirá incapaz.

Diante desse trabalho avaliativo, e, em busca dos melhores recursos para o processo de aprendizagem de cada aprendiz, a equipe multidisciplinar poderá auxiliar educadores e pais, de modo a amenizar as angústias dos mesmos diante dos obstáculos encontrados no processo de desenvolvimento de seus filhos e alunos.

A equipe multidisciplinar deve ser formada por pelo menos um psicopedagogo, um fonoaudiólogo e um psicólogo. O fonaudiólogo é importante para que possa avaliar e diagnosticar problemas relacionados à linguagem. É comum encontrarmos sintomas de alteração e ou dificuldades de aquisição e desenvolvimento da linguagem, possíveis dislexias, alterações auditivas e até mesmo

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alterações de Processamento Auditivo Central, que se refere a capacidade de receber, processar, memorizar e interpretar a informação recebida. Essa alteração não está relacionada ao “quanto” a pessoa ouve, mas sim a “como” ela ouve. E todas essas alterações interferem diretamente na atenção, na memória, na interpretação e, consequentemente, no processo de aquisição da aprendizagem formal.

Da mesma forma que o fonoaudiólogo, o psicólogo também desempenha um papel fundamental na equipe multidisciplinar, pois muitos sintomas apresentados pelos alunos são de ordem emocional e precisam de suporte para serem superados. Alterações e distúrbios comportamentais também podem ser melhor avalidados e diagnosticados por esses profissionais. Assim como os alunos, os professores também precisam desse apoio para que recebam orientações de como lidar com questões emocionais graves apresentados pelos alunos e orientações em relação as melhores práticas a serem aplicadas em grupo para superar as dificuldades individuais.

Além destes profissionais, outros profissionais como fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e musicoterapeutas podem fazer parte dessa equipe, conforme a demanda escolar, acrescentando diferentes recursos para um trabalho de sucesso.

Todos estes profissionais acima citados têm formação voltada para a investigação, compreensão e tratamento dos diferentes casos de dificuldades e deficiências, sendo assim, têm um papel muito importante no acolhimento às angústias dos professores e familiares das pessoas com necessidades especiais.

A relação professor – aluno

Quando pensamos em um professor, vem à nossa mente alguém superior, que sabe mais do que nós e que está pronto para nos ensinar algo. A postura segura e de liderança do professor é fundamental para que o aluno se sinta seguro e se abra para construir o conhecimento. Para isso, o professor não deve ser agressivo ou autoritário, mas, sim, firme e objetivo. Além do mais, a postura acolhedora e amorosa, é de extrema importância para que o vínculo positivo entre professor e aluno se estabeleça. Essas características devem ser as mesmas para alunos com ou sem necessidades especiais, afinal, todos os alunos são aprendizes, o que muda são suas necessidades.

O primeiro passo para um trabalho de sucesso é o reconhecimento e aceitação de nossas próprias potencialidades e limitações. Depois, precisamos direcionar esse olhar de potencialidades e limitações para o nosso aprendiz.

Na “aprendizagem – escolar, reflete-se toda a dinâmica social e familiar. Nosso trabalho será saber escutar e olhar para além e aquém daquilo que se percebe.” (Fernandez, 2001, pg.25).

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A partir dessa reflexão, olhamos então para a capacidade de superação das dificuldades e para a capacidade de aprendizado do novo. Nesse momento o trabalho se torna um desafio para o professor e para o aluno, que com a ajuda do professor poderá perceber que é capaz de aprender algo novo.

Quando essa troca ocorre, a auto-estima de professor e aluno aumenta e o processo de aprendizagem ocorre de maneira mais fácil, pois o professor se acalma e percebe que pode ensinar e fazer com que o aluno aprenda.

A proposta de atividades que estejam de acordo com a potencialidade do aluno é a chave para o início dessa relação positiva. Essa proposta pode se repetir várias vezes e assim que o aluno fica seguro, o professor poderá introduzir novos desafios. O professor então passa a aumentar o nível de complexidade da atividade e o aluno passa a perceber que consegue realizar uma atividade “mais difícil”. Portanto, gradativamente todo o processo se completa de forma natural.

Quando vamos conversando dessa maneira, parece que tudo é muito fácil e vai fluir levemente, não é mesmo?

Mas não é tão simples assim, pois dependendo do nível de consciência da dificuldade por parte do aluno, as posturas de resistência aparecem e o processo fica mais desafiador.

Nessa hora, o professor precisa se acalmar, munir-se de muita paciência e entender que essa postura do aluno é para se defender, pois um sentimento de inferioridade se instala e na verdade ele está precisando de ajuda para aceitar suas dificuldades e perceber que ele possui habilidades. Trabalhar na conscientização e compreensão de si mesmo auxiliará o aluno a descobrir quais caminhos o ajudarão a aprender mais. O professor, então, poderá ajudá-lo nesse processo, propondo atividades complementares e jogos que serão elaborados para todo o grupo, dentro do conteúdo que está sendo abordado. Dessa forma, o aluno especial se sentirá pertencente ao grupo e poderá lidar melhor com as questões sociais que o incomodam.

É importante salientar que o processo de aprendizado do aluno especial acontece, porém, não da mesma maneira que acontece com a maioria dos outros alunos. É preciso descobrir qual o melhor caminho para cada dificuldade. Normalmente é preciso trabalhar com os recursos concretos e procurar não aprofundar o conteúdo da maneira esperada para aquela série que esta sendo cursada. Plestsch e Braun (2008, p. 4) citam a compreensão de Vigotiski da seguinte maneira:

“(…) a criança cujo desenvolvimento foi comprometido por alguma deficiênciaa, não é menos desenvolvida do que as crianças “normais”, porém é uma criança que se desenvolve de outra maneira. Isto é, o desenvolvimento, fruto da sintese entre os aspectos orgânicos, socioculturais e emocionais, manifesta-se de forma peculiar e diferenciada em sua organização sociopsicológica. Assim, não podemos avaliar suas ações e compará-las com as demais pessoas, pois

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cada pessoa se desenvolve de forma única e singular.” (Silva et al., 2013).

A partir do momento em que estamos falando da relação professor – aluno e das conquistas do aprendiz, precisamos cuidar também do professor, que em alguns momentos, se sente frustrado por não atingir o objetivo inicial. A sensação de “fracasso”, normalmente, gera sentimento de angústia e impotência por não ter atingido seus objetivos. Precisamos lembrá-lo de que a partir do momento em que ele foca no aprendiz e pensa nas necessidades do aluno e não nas suas necessidades, isso pode acontecer, uma vez que o processo de ensino-aprendizagem gera erros e acertos. Pois é preciso oferecer para o aluno o que ele precisa e não o que o professor quer e/ou precisa. Muitas vezes o professor irá se frustrar, sofrer, se surpreender, mas a crença no poder de transformação o ajuda, muitas vezes, a atingir os objetivos, quando intervém de maneira segura e responsável.

Tendo como pontos principais as necessidades dos alunos e professores e na crença na capacidade de aprender e ensinar, as chances de um processo de aprendizagem de sucesso aumenta.

“(…)tudo que uma pessoa é capaz de planejar, ela é capaz de realizar, o segredo está em acreditar na sua capacidade de vencer” (Profa. Lourdes Duarte).

Agora vamos falar das famílias

Tudo começa no dia em que se recebe a resposta de um exame de sangue que vem escrito “positivo”. Ao chegar ao médico, somos recebidos com os cumprimentos: “- Parabéns, você esta gravida!”

Essa notícia é recebida de diferentes maneiras pelas famílias. Alguns ficam felizes, outros ficam surpresos, outros não acreditam, pois não planejavam ter um filho nesse momento… Enfim, cada um tem uma reação, mas a grande maioria se pergunta: “- E agora?”

Sim, agora dúvidas e preocupações farão parte do seu dia a dia.

Junto com um filho muitas responsabilidades virão e cada um terá uma maneira de lidar e assumir essas responsabilidades. Nesse momento pode vir ou não a aceitação desse filho e nessa hora o vínculo começa a se estabelecer!

Quando se pensa na educação de um filho, nunca sabemos se estamos agindo certo ou errado, mas sempre agimos de acordo com aquilo que acreditamos ser o melhor para ele, naquele momento. E o vínculo positivo ou negativo serão determinantes para a formação dessa pessoa que, agora, faz parte da sua vida para sempre.

A educação de um filho é uma tarefa muito difícil e exige uma dedicação muito grande. Quando nasce uma criança sem necessidades especiais já é um grande

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desafio educá-la. Ao pensarmos em uma criança com necessidades especiais esse desafio se torna muito maior.

A relação familiar é um dos aspectos mais importantes no processo de inclusão. Afinal, a família é a grande responsável pelo processo de desenvolvimento de qualquer pessoa, principalmente, aquelas com necessidades especiais.

Porém, fazemos parte de uma realidade onde as estruturas familiares se formatam de diferentes maneiras e vínculos.

Existem vários tipos de famílias na sociedade. Existem famílias que conseguem proporcionar todos os atendimentos que as crianças precisam; aquelas em que os pais precisam trabalhar o dia todo e dependem de outros para cuidarem de seus filhos; existem as que as mães ou pais que podem ou precisam ficar em casa têm muita dificuldade de entrar em contato com as limitações dos filhos; existem as que conseguem proporcionar um grande estímulo aos filhos e as que, simplesmente, os abandonam…

Enfim, cada família tem uma característica particular, que não precisa de julgamento e sim de compreensão. Pois cada um vive uma realidade própria.

Assim como é necessário existir um vínculo positivo entre professor e aluno, o mesmo deve ocorrer entre profissionais e família.

O vínculo de confiança e parceria deve ser prioridade no processo educacional e/ou terapêutico, inclusive, para que os professores e profissionais sintam-se seguros para fazer as orientações necessárias às famílias e essas estejam receptivas a isso.

Atualmente, é comum a transferência de responsabilidades das famílias para as escolas e profissionais que atendem seus filhos. É preciso ficar claro que o maior responsável pela educação e estímulo dos filhos é a família. Muitas vezes a família espera dos profissionais um papel que na verdade seria dela. As famílias precisam se conscientizar de que, a maior parte do tempo, seus filhos ficam com elas e não na escola ou na terapia.

A escola tem como papel o desenvolvimento da educação formal e desenvolvimento de habilidades cognitivas e relacionais dos aprendizes. Os profissionais desempenham diferentes papéis, cada um em sua área, que não envolvem as questões de valores de caráter, de higiene e de comportamento, de maneira direta. No entanto, eles trabalham essas questões dentro de uma visão terapêutica e reflexiva, com o objetivo de conscientização e reconhecimento de si mesmo.

As famílias passam por momentos de angústias, expectativas e ansiedade que precisam ser acolhidas pelos profissionais que estejam envolvidos no processo de desenvolvimento dos aprendizes e as perguntas começam a surgir.

“Sera que meu filho vai aprender a ler e escrever? Sera que aprendera matemática? Ele atingirá autonomia? O que você acha que ele vai conseguir aprender?”

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Essas e muitas outras questões são muito comuns e aparecem o tempo todo nos consultórios e escolas. Principalmente no período de alfabetização. Sempre que nós, profissionais, nos deparamos com essas questões, passamos a desempenhar um papel de acolhimento das angústias e precisamos acalmar essas famílias. Pois diante desse olhar, comportamentos extremos aparecem. Por um lado as cobranças começam e a exigência em relação aos filhos e aos profissionais aumentam, e, por outro a descrença e abandono ou superproteção surgem. Todos esses comportamentos extremos são prejudiciais ao processo de desenvolvimento do aprendiz e precisamos ajudar os pais a encontrarem um ponto de equilíbrio entre a cobrança e o cuidado para que estimulem de maneira adequada seus filhos.

Desempenhamos esse papel ajudando-os a compreender que cada um tem um tempo e uma habilidade particular, que às vezes o fato de não conseguir se alfabetizar, naquele momento, não significa que não conseguirá mais adiante. E que se por acaso não atingir o processo de aquisição da alfabetização, não significa que outra habilidade não será alcançada.

E mais uma vez voltaremos as questões que já foram abordadas anteriormente. O primeiro passo para a evolução dos filhos é o reconhecimento e aceitação de suas limitações e habilidades. É muito importante ajudar os pais a não deixarem de acreditar no poder da transformação!

Referências:

BOSSSA, Nádia. “A Psicopedagogia no Brasil: Contribuições a partir da prática”. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994

FERNANDEZ, Alícia. “Os idiomas do aprendente”. Porto Alegre: Artmed, 2001

KALLAS, R. Brusamolin. “Análise do papel do Ser-Ensinante em relação ao Ser-Aprendente com Dificuldades Especiais de Aprendizagem”, 7 edição Revista Científica Aprender, 2019.

PAIN, Sara. “Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem”. Porto Alegre. Artes Médicas, 1992

SILVA, F. G.; MENEZES, H. C. S.; OLIVEIRA, D. A. “Um estudo sobre a defectologia na perspectiva vigotskiana: a aprendizagem do deficient intelectual em reflexão”. Anais do XI Congresso Nacional de educação. 2013.

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A formação de professores de Química e a educação inclusiva em perspectiva

Gláucia Maria da Silva

Em 2008, foi apresentado o trabalho “Ressignificando a Formação de

Professores de Química para a Educação Especial e Inclusiva: Uma História de

Parcerias” no XIV Encontro Nacional de Ensino de Química realizado de 21 a 24 de

julho em Curitiba, posteriormente publicado pela Revista Química Nova na Escola

(RETONDO, SILVA, 2008).

De lá para cá, se passaram mais de dez anos durante os quais o Brasil, para responder às demandas da Educação Inclusiva e da Educação Especial, definiu novas políticas, organizou instrumentos legais e elaborou Diretrizes visando sua organização. Dentre outras, podemos citar a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008):

Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial passa a integrar a proposta pedagógica da escola regular, promovendo o atendimento às necessidades educativas especiais de alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Nestes casos e outros, que implicam em transtornos funcionais específicos, a educação especial atua de forma articulada com o ensino comum, orientando para o atendimento às necessidades educativas especiais desses alunos.

A educação especial direciona suas ações para o atendimento às especificidades desses alunos no processo educacional e, no âmbito de uma atuação mais ampla na escola, orienta a organização de redes de apoio, a formação continuada, a identificação de recursos, serviços e o desenvolvimento de práticas colaborativas (BRASIL, 2008, p.9).

Em 2015, a inclusão de disciplinas/conteúdos curriculares foi reforçada no Art. 28, incisos XIV da Lei Brasileira de Inclusão (Lei n. 13.146/2015), abrangendo todos os cursos de nível superior e de educação profissional técnica e tecnológica, não se restringindo apenas aos cursos de licenciaturas (BRASIL, 2015). Ademais, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica

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(RESOLUÇÃO CNE/CP nº 2, 2019) orientam que os cursos de formação deverão garantir nos currículos:

marcos legais, conhecimentos e conceitos básicos da Educação Especial, das propostas e projetos para o atendimento dos estudantes com deficiência e necessidades especiais (BRASIL, 2019).

Orientação semelhante consta no parágrafo oito do Artigo 10º da Deliberação CEE 154/2017 publicada pelo Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo que fixa Diretrizes Curriculares Complementares para a Formação de Docentes para a Educação Básica nos Cursos de Graduação de Pedagogia, Normal Superior e Licenciaturas, oferecidos pelos estabelecimentos de ensino superior vinculados ao sistema estadual (SÃO PAULO, 2017).

Entretanto, embora haja inúmeras orientações na legislação, várias pesquisas revelam que as instituições de ensino superior não têm atendido às recomendações legais (PUREZA, 2012; PEDROSO et al, 2013; BASSO, 2015; POKER E MELLO, 2016). A formação de professores para a Educação Especial na perspectiva de Educação Inclusiva continua sendo crucial. E questões relacionadas a como deve ser formado um professor (de Química, por exemplo) para atender às novas demandas que envolvem o trabalho com grupos diferenciados de alunos, incluindo crianças e jovens da chamada Educação Especial, ainda são fruto de muitos debates no meio acadêmico e na sociedade como um todo.

Questiona-se então como os cursos de Licenciatura em Química têm procurado enfrentar esse desafio. Nessa perspectiva, optou-se por avaliar as matrizes curriculares e os projetos pedagógicos dos cursos de formação de professores de Química das três universidades públicas paulistas.

Para tal avaliação procurou-se nas ementas das disciplinas das matrizes curriculares (programa e objetivos) e nos projetos pedagógicos disponibilizados nas páginas das Instituições de Ensino Superior, conteúdos que contemplassem temas relativos à Educação Especial: Educação Inclusiva; Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS); Inclusão; Deficiência; Altas Habilidades; Educação Especial; Necessidades Educativas Especiais; Transtorno; Deficiente.

Verificou-se que todos os sete cursos de Licenciatura em Química investigados se organizaram para preencher a exigência determinada pelo Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005 que trata da inclusão da disciplina Língua Brasileira de Sinais como componente curricular obrigatório nos cursos de formação de professores (BRASIL, 2005). Essas disciplinas encontram-se listadas no Quadro 1.

Quadro 1 – Relação de disciplinas dos cursos de Licenciatura em Química

das Universidades Públicas Paulistas relacionadas à Língua Brasileira de Sinais.

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Disciplina Carga horária

Semestre de oferecimento

Educação Especial, Educação de Surdos, Língua Brasileira de Sinais

60 h 8º

Introdução à Língua Brasileira de Sinais 30 h 4º

LIBRAS e Educação de Surdos 60 h 8º

Libras, Educação Especial e Inclusiva (modalidade de Educação a distância)

60 h 8º

O Quadro 2, por sua vez, apresenta os programas resumidos das disciplinas de LIBRAS oferecidas pelos cursos de Licenciatura em Química das Universidades Públicas Paulistas.

Quadro 2 – Programas resumidos das disciplinas dos cursos de

Licenciatura em Química das Universidades Públicas Paulistas relacionadas à LIBRAS.

Disciplina Programa resumido

Educação Especial, Educação de Surdos, Língua Brasileira de Sinais

Princípios, conceitos e concepções que compõem o campo da educação especial. Políticas educacionais, legislação, recomendações e declarações internacionais que disciplinam e orientam a educação especial brasileira. Contextualização histórica e política da Educação de surdos. Libras contexto histórico e legislação. Ensino prático da Libras.

Introdução à Língua Brasileira de Sinais

História da educação dos surdos e as atuais políticas linguísticas, educacionais e de saúde voltadas ao sujeito surdo. Implementação da educação bilíngue para surdos: a função do intérprete, do instrutor/professor surdo e do professor bilíngue. O uso da Língua Brasileira de Sinais na educação de sujeitos surdos. A Língua Portuguesa como segunda língua para sujeitos surdos. Língua Brasileira de Sinais:

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aspectos gramaticais e discursivos. Ensino-aprendizagem da Língua Brasileira de Sinais.

LIBRAS e Educação de Surdos Conhecimentos teórico-práticos introdutórios de LIBRAS e dos parâmetros que a caracterizam como língua; constituição do sujeito surdo pela LIBRAS; história da educação e as organizações dos movimentos políticos dos surdos; comunidades surdas e suas produções culturais; abordagens educacionais no ensino da pessoa surda; projetos de educação bilíngue; leis de acessibilidade e de garantia à educação.

Libras, Educação Especial e Inclusiva (modalidade de Educação a distância)

Fundamentos da Educação Especial e Inclusiva, o Atendimento Educacional Especializado, a acessibilidade e a Tecnologia Assistiva, Análise e conhecimento de Libras, Características da aprendizagem da pessoa surda, Análise e compreensão das mudanças necessárias no ambiente educacional para favorecer a inclusão escolar, Prática de Libras e o desenvolvimento da expressão visual, o papel do professor na Educação Especial em uma perspectiva de Educação Inclusiva, o histórico e conceituação da pessoa surda e a prática de Libras.

Vale destacar que uma das Instituições de Ensino Superior, responsável por quatro dos cursos de Licenciatura em Química, oferece a disciplina de LIBRAS na modalidade de Educação a Distância. A disciplina em questão contempla o estudo em Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), a partir de objetos educacionais, videoaulas, materiais didáticos, fóruns de discussão e web conferências ministradas por instrutora surda; além da realização de provas presenciais no campus onde é ofertado o curso de graduação.

De maneira geral, as disciplinas de LIBRAS discutem os marcos históricos da educação dos surdos e sua influência no processo de ensino-aprendizagem e na constituição das subjetividades do aluno surdo, bem como conhecimentos teóricos sobre esse alunado. Além disso, na maioria dos cursos de Licenciatura em Química

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estudados, a disciplina de LIBRAS é a única que traz algum tipo de conceituação sobre Educação Especial.

As exceções aparecem em três cursos de formação de professores de Química. Um deles também oferece a disciplina obrigatória Ensino de Química e educação inclusiva na qual são abordados assuntos atuais no campo da educação, como as contribuições dos estudos em Neuropsicologia e as políticas de inclusão escolar.

Outro curso contempla o “contato com a problematica da inclusão” nas disciplinas Atividades Teórico-Práticas de Aprofundamento I e II, que apresentam duas referências bibliográficas especificamente relacionadas à Educação Inclusiva. Além disso, propõe a disciplina Políticas sociais e pessoas com deficiência: transversalidade e intersetorialidade como optativa livre. Esta apresenta o debate teórico acerca das situações de deficiência, as compreensões e implicações desse debate na formulação das políticas sociais e na legislação nacional das áreas de educação, cultura, esportes, saúde e assistência. Aborda ainda as situações de deficiência como temática transversal às políticas sociais que demandam práticas intersetoriais. Ressalta-se, no entanto, que disciplinas optativas estão condicionadas aos interesses individuais dos estudantes e à disponibilidade do docente responsável em oferecer a disciplina regularmente. Essa preocupação é destacada por Silva (2009, p. 188-189):

Assim, restringe a formação e informações importantes a um pequeno grupo que, por motivos diversos, já possuíam algum contato com a temática. A grande maioria que, também, tornar-se-á professor (a) e, na sua vida cotidiana, em sala de aula, irá demandar de conhecimentos elementares desta questão não os terá, nem mesmo, orientações de onde encontrá-los. Sendo esta uma demanda transferida para a sua formação continuada.

O terceiro curso prevê, em disciplinas da área de Ensino de Química, espaço para o estudo de questões sobre inclusão a partir da reflexão sobre práticas e metodologias de ensino para atender a heterogeneidade dos alunos no contexto da educação inclusiva. Entre os tópicos encontram-se Estratégias metodológicas para o ensino de química com abordagens teórica, histórica, fenomenológica e representacional, inclusive voltadas para educação inclusiva e Estratégias para o ensino inclusivo em química.

No entanto, apenas o projeto pedagógico de um dos cursos denota preocupação com a Educação Especial e em atender ao Artigo 10 do Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, segundo o qual:

As instituições de educação superior devem incluir a Libras como objeto de ensino, pesquisa e extensão nos cursos de formação de professores para a educação básica, nos cursos de Fonoaudiologia e

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nos cursos de Tradução e Interpretação de Libras - Língua Portuguesa. (BRASIL, 2005)

Este projeto pedagógico menciona que “Devido à preocupação da Comissão Coordenadora de Curso com a formação do licenciando que atuará em escolas onde estudam alunos com necessidades especiais, vêm sendo implementados no curso projetos voltados para Educação Especial e Inclusiva”. Além de mencionar que “os projetos visam atender as determinações legais do MEC (Lei 10435/02 e Decreto 5626/05) e do Conselho Estadual de Educação (Deliberação CEE n°111/2012 alterada pelo Deliberação CEE 154/2017)” e de considerar Instituições Especializadas como a Associação dos Deficientes Visuais de Ribeirão Preto (ADEVIRP) e a Associação de Amigos do Autista (AMA) como campos de estágio curricular supervisionado do curso.

Em síntese, pode-se inferir, a partir da análise realizada, que todos os cursos de Licenciatura em Química das universidades públicas paulistas possuem em seus currículos pelo menos uma disciplina relacionada à Língua Brasileira de Sinais. É claro que o oferecimento de apenas uma disciplina não capacita os futuros professores de química a lidarem com a diversidade do público da educação especial. Todavia, conforme aponta Almeida (2005), a inclusão de disciplinas de Educação Especial nos cursos de licenciatura expressa a consonância entre a função social da universidade com sua missão e seu objetivo de formar profissionais comprometidos com o desenvolvimento social e coletivo.

Referências:

ALMEIDA, C.E.M. Universidade, Educação Especial e Formação de Professores. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 28, Caxambu, 2005. Anais... Caxambu, ANPED, p. 1-17.

BASSO, S. P. S. Curso de licenciatura na área de Ciências: a temática inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais. 2015. 131f. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho”, Bauru, 2015.

BORGES, W. F.; SANTOS, C. S.; COSTA, M. P. R. Educação Especial e formação de professores: uma análise dos projetos pedagógicos de curso (PPC). Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 14, n. 1, p. 138-156, jan./mar., 2019.

BRASIL. Decreto n. 5626 de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei n. 10436 de 24 de abril de 2002 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais e o art.18 da Lei 10.098 de 19 de dezembro de 2000. 2005. Disponível em: www.planalto.gov.br/ ccivil_03 /_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5626.htm. Acesso em: 6 fev. 2020.

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BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13146.htm. Acesso em: 6 fev 2020.

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. MEC/SEESP: Brasília, 2008. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica.pdf. Acesso em: 07 fev. 2020.

BRASIL. Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). 2019. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php? option=com_docman&view=download&alias=135951-rcp002-19&category_slug= dezembro-2019-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 15 fev. 2020.

PEDROSO, C.C.A.; CAMPOS, J. A. P. P.; DUARTE, M. Formação de Professores e Educação Inclusiva: análise das matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura. Educação (Unisinos), v. 17, n. 1, p. 40- 47, 2013.

POKER, R. B.; MELLO, A. R. L. Inclusão e formação do professor. Journal of Research in Special Educational Needs, v. 16, n. 1, p. 619- 624, 2016.

PUREZA, M. G. B. Desvelando o território da educação inclusiva na formação inical de professores de Geografia: os projetos pedagógicos da UFPA e IFPA em análise. 2012. 200f. Dissertação (Mestrado em Educação) Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2012.

RETONDO, C. G.; SILVA, G. M. Ressignificando a Formação de Professores de Química para a Educação Especial e Inclusiva: Uma História de Parcerias. Química Nova na Escola, n. 30, p. 27- 33, 2008.

SÃO PAULO (ESTADO). Deliberação CEE 154/2017. Diário Oficial - Poder Executivo - Seção I, publicado em 07 de junho de 2017 páginas 38 e 39. 2017.

SILVA, L. C. da. Políticas públicas e formação de professores: vozes e vieses da educação inclusiva. 2009. 251. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2009.

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Formação continuada e inclusão na escola regular: pontos de vista a partir do diálogo com professores

Daniela Gonçalves de Abreu Favacho

Flávia Denise Cardinali Mendes da Cunha

Joana de Jesus de Andrade

Como parte das atividades do CEIQ e da Equipe Curricular de Ciências da Natureza da Diretoria de Ensino da Região de Ribeirão Preto, em agosto de 2019 realizamos a IV Escola de Formação de Professores de Ciências Exatas e Naturais da FFCLRP. O objetivo deste evento é contribuir para formação continuada dos professores da Rede Estadual, priorizando a Área de Ciências da Natureza. No geral, os temas abordados em Cursos de Formação Continuada focam a atualização de conceitos científicos e metodologias de ensino-aprendizagem. Em razão do desenvolvimento de projetos de inclusão desenvolvidos no CEIQ, desde 2017, pudemos perceber a crescente demanda por uma formação que auxilie os professores a trabalhar de forma inclusiva, uma vez que os alunos de inclusão estão chegando às escolas e muitas vezes permanecem excluídos. Observamos a urgência da conscientização de que antes de se pensar em desenvolver qualquer atividade que seja para ensinar química, biologia, matemática ou qualquer outra disciplina (conteúdo curricular), é preciso que o professor observe atentamente as necessidades fundamentais para o desenvolvimento do processo de aprendizagem do aluno. É necessário estar atento e sensível ao direito de todos de acessar o conhecimento, percebendo a escola como local de aprendizagem e não apenas socialização dos alunos, principalmente os alunos com necessidades especiais e dificuldade de aprendizagem.

Desta forma, durante o mês de agosto e início de setembro de 2019 realizamos 4 encontros com 128 professores, e as temáticas misturaram metodologias e atualização científica com discussões sobre ensino inclusivo (Figura 1). De um total de 32 h, 12 h foram dedicadas à educação inclusiva.

Entre os temas que abordados destacamos:

a) Ensino de Ciências Inclusivo, no qual pudemos compartilhar

experiências obtidas no desenvolvimento de projetos do CEIQ em parceria com duas Escolas Estaduais de Ensino Fundamental. De forma dialógica a professora Mayra Fernanda Zanetti conduziu análise e reflexão sobre como a questão das deficiências

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vem sendo tratadas ao longo da história da humanidade; qual é o direito do aluno com deficiência em relação à educação; planejamento de estratégias e metodologias ativas de aprendizagem, entre outros temas relevantes.

b) O Modelo social de deficiência na escola. Este tema foi

abordado por Ana Cláudia Alves Legore, que é profissional integrante da Equipe técnica da Associação síndrome de Down de Ribeirão Preto.

Figura 1: Folder digital da IV Escola de Formação de Professores.

C) “A deficiência e suas representações sociais”. Este tema

foi abordado por membros do grupo T21 de Ribeirão Preto, sendo um psicólogo e uma professora bastante engajados na luta pela educação inclusiva.

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Por que temos que pensar em inclusão? Na sociedade existem pessoas que são deixadas de lado pelos mais variados

motivos: classe social, cor da pele, possuir algum tipo de limitação, entre outros. Todo ser humano precisa ser respeitado e ter garantidas oportunidades para se desenvolver. Educação Inclusiva não diz respeito a pessoas apenas com deficiências. Perguntamos aos professores:

Você se lembra de ter coleguinhas com algum tipo de deficiência nas salas de aula que frequentou durante sua formação escolar?

Provavelmente não se lembra por que estas pessoas estavam em casa, o que se pensava delas é que não tinham capacidade para aprender, muitas famílias tinham receio que os filhos frequentassem escolas regulares e estas podiam recusar estas pessoas. Com relação a síndrome de Down, muitos adultos atualmente, não foram alfabetizados, não foram auxiliados no aprimoramento de comunicação.

Pessoas com alguma deficiência por muito tempo foram subjugadas e privadas do convívio social::

“[...] para muitos, a condição de exílio, separação, de ficar à parte, segregados e experimentando sentimentos de rejeição [...] fez parte de suas vidas. [CARVALHO, 2004, p. 46].

É muito recente na sociedade brasileira enxergar as diferenças como uma diversidade que agrega riqueza e considerar a escola como LUGAR PARA TODOS.

A Educação Especial começou a ser discutida na década de 90, quando foi elaborada a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Unesco, 1990), ocorreu ainda a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien – Tailândia, no ano de 1990, e a Declaração de Salamanca (Unesco, 1994), firmada na Espanha em 1994. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva no Brasil é de 2008.

ESCOLA É LUGAR DE DIVERSIDADE. PESSOAS COM CARACTERÍSTICAS DIFERENTES e HABILIDADES E

DIFICULDADES DIFERENTES.

Em razão de tais políticas aumentou significativamente o número de crianças na escola. Segundo a Organização Mundial da Saúde 10% da população tem necessidades especiais de diversas ordens: visuais, auditivas, físicas, mentais, múltiplas, distúrbios de conduta e superdotação ou altas habilidades. Porém o número de matrículas desta população nas escolas é baixo. Segundo fragmentos da Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001, em 1998 havia 293.403 alunos com deficiências matriculados nas escolas brasileiras, sendo 58% com problemas mentais; 13,8% com

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deficiências múltiplas, 12% com problemas de audição; 3,1% de visão; 4,5% com problemas físicos; 2,4% de conduta. Apenas 0,3% possuíam altas habilidades ou eram superdotados e 5,9% recebiam “outro tipo de atendimento” (Sinopse Estatística da Educação Básica/Censo Escolar 1998, do MEC/INEP). Já em 2014 esse número passou para quase 700.000, ou seja um aumento importante em quase vinte anos.

Atualmente, qual imagem a seguir representa na sua opinião a inclusão que tem acontecido nas escolas?

A Constituição Federal Brasileira estabelece o direito das pessoas com

necessidades especiais receberem educação preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208, III). A diretriz atual é a da plena integração dessas pessoas em todas as áreas da sociedade. Trata-se, portanto, de duas questões – o direito à educação, comum a todas as pessoas, e o direito a receber essa educação sempre que possível junto com as demais pessoas nas escolas regulares.

No âmbito geral, pode-se considerar que estamos entre a segregação e a integração. Muitas crianças estão em sala de aula, mas apenas o objetivo de socialização é traçado para ela. Subjulga-se sua capacidade de aprender, como qualquer ser humano, que precisa ser motivado a isso, e as condições materiais da escola, salas lotadas e baixa remuneração dos professores contribuem para uma “inclusão de fachada”.

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Apesar de estudos científicos indicarem que a inclusão de alunos com algum tipo de deficiência nas escolas regulares contribui para o desenvolvimento social e cognitivo de muitos deles (VOIVODIC, 2003; SAAD, 2003; ARAÚJO, 2006; DUARTE, 2008), o desafio é fazer com que este tempo na escola seja válido.

Já avançamos muito ao garantir espaço nas escolas regulares, o momento atual é de fazer com que a presença na escola seja oportunidade de adquirir conhecimento sobre si e sobre as mais variadas áreas do saber.

A verdadeira inclusão implica em enxergar os alunos em sua totalidade (potenciais e limitações) e lançar mão de estratégias para a sala toda, considerando o aluno especial. Não se trata de desenvolver recursos adaptados.

É preciso se sentir parte da turma e empoderar esta criança no sentido de que ela é capaz!

D) Panorama dos desafios e caminhos relativos a educação inclusiva em Ribeirão Preto. No último dia da Escola de

Formação de Professores, solicitamos que os professores relatassem a situação da inclusão nas escolas em que já lecionaram e os desafios da sua prática relativos ao tema. Posteriormente, os textos produzidos pelos professores foram lidos e a seguir traçamos algumas considerações a partir das discussões e análises dos relatos destes professores.

As políticas relacionadas à inclusão escolar nos últimos anos implicam repensar qual é a função da escola. No contexto atual a escola recebe alunos com os mais variados diagnósticos e a partir disso tem um grande desafio, que vai desde a transformação/adequação do espaço físico da escola até modificação das práticas pedagógicas/metodológicas envolvendo os diferentes atores envolvidos na vida escolar dos estudantes.

Diante dessa realidade cabe repensar:

Qual é o papel da escola?

Considerando alunos com deficiência física ou intelectual, ou dificuldades de aprendizagem devemos preparar o indivíduo apenas para convívio social?

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Os objetivos educacionais postos nos planos de ensino e planos de aula são os mesmos, para todos os alunos?

Permitir que frequente a escola, mas não garantir acesso ao conhecimento é inclusão?

O momento histórico atual exige que atualizemos as práticas escolares. Estes questionamentos fomentam reflexões que envolvem a necessária atualização das práticas escolares para uma educação realmente inclusiva e contemporâneo.

...a educação é, pois, uma prática social ampla e inerente ao processo de constituição da vida social, alterando-se no tempo e no espaço em razão das transformações sociais”. [FERREIRA E OLIVEIRA, 2009, P. 237] Segundo Marcelo García (1999) a formação de professores carece de uma perspectiva multicultural, que instrumentalize o professor para contextualizar conhecimentos e perceber as influências sociais, políticas e culturais que a escola está sob influência. Isto dificulta um pouco a visão da diversidade que faz parte deste espaço e traz uma certa insegurança sobre o que fazer com os alunos que chegam à escola.

Em muitas situações os professores sentem-se incapazes de resolver os conflitos que surgem em sala de aula e remetem à formação insuficiente:

Prof. 1: o Estado está com projeto de inclusão social mas vejo

que estamos muito longe de sermos protagonistas dessa inclusão social em sala de aula, falta muito preparo para os professores, alunos, gestores pedagógicos. Tive uma situação de um aluno síndrome de down ....busquei ajuda na escola com inspetores e eles diziam que eu quem deveria resolver esta situação. Me perguntava: como resolver senão fui preparado para tal situação e nem mesmo os coordenadores tentam uma solução para tal. Hoje tenho em minha escola alunos surdos, para resolver minha situação faço curso de libras para interagir com o aluno.

Prof. 8: Percepções. Tive uma experiência com deficiente

auditivo, mas foi tranquilo, pois a aluna estava plenamente integrada ao grupo de alunos, era muito interessada em aprender e tinha acompanhamento de intérprete. Os cuidados eram em relação ao posicionamento da sala, durante as explicações e cuidado na correção, em função da escrita, pois há diferenças entre a forma como se estrutura a língua portuguesa e libras (conjunções, por exemplo). Além disso, tive alunos com problemas de alfabetização, mas sem laudo. A maior dificuldade

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é sempre em relação a metodologias e materiais adequados para minha disciplina (ciências). Sinto que falta uma formação específica em materiais/métodos. Sempre que participo de formações, levo as sugestões, mas gostaria de algo mais específico e direcionado com fontes/grupos que me apoiem para desenvolver materiais relevantes para a sala de aula.

Tanto a formação continuada como a formação inicial precisam incluir aspectos que valorizem a participação e inclusão social, na visão de Marcelo Garcia (1999) e Imbernón (2010). Um outro fator apontado nos relatos dos professores foi o número excessivo de alunos em sala de aula. Este fator dificulta o ensino mais individualizado, restringe o tempo de atenção do professor para com o aluno, afetando de certa forma a relação professor-aluno.

Prof 2: trabalho apenas com ensino médio. Não tem alunos

com deficiências (síndrome de down e autismo). A deficiência que noto é em relação à leitura e escrita. O maior desafio é o número de alunos em sala de aula.

Prof. 16: Incluir a pessoa deficiente em sala de aula é uma

prática que a Escola tem feito atualmente. Sempre nos deparamos com alunos com deficiências diferentes seja por paralisia cerebral, seja síndrome de down, hieprativos, disléxicos, deficientes físicos. ... Esta inclusão é mais de socialização. O professor tem que dar uma atenção diferenciada para este aluno deficiente. E o aluno que não tem deficiência? Está tendo a atenção que merece?

Prof. 6: Tenho um aluno de inclusão. Ele não consegue se

concentrar, não tem boa coordenação motora. Não consegue escrever direito, mas consegue ler, coloco este aluno junto com um colega para ajudá-lo. Com este colega ele tenta fazer no seu ritmo. Quando vou avalia-lo, faço isso oralmente e alguns conceitos básicos sobre o conteúdo de ciências ele possui. Se a sala tivesse 20 alunos e um professor auxiliar, provavelmente ele melhoria muito.

Prof. 10: Desafios para uma educação inclusiva (minha

prática). Muitos alunos em sala de aula; falta de apoio da família, por vezes porém isso também acontece na própria escola,

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professores, coordenadores e diretores que não tem grandes aspirações pela causa da inclusão de tais alunos, as vezes seria necessário um professor auxiliar, para ajudar com questões pedagógicas, outras vezes um cuidador; mais materiais de apoio, proporcionar de fato a inclusão social desse aluno em seu meio, priorizando-o também e respeitando seus limites, melhorar a formação docente em relação ao tema, etc. Em minha prática docente há alguns casos de inclusão, alguns alunos laudados e outros não. O que é perceptível é que, em geral, eles estão ali em sala e no ambiente da escola apenas para a inclusão social. Ficando em segundo plano a questão da aprendizagem em si. Sempre há um grande estímulo para a interação desses alunos e para o respeito da sala com eles. No meu caso, em minha escola, percebo um bom relacionamento entre todos. Por se tratar de uma escola de ensino os alunos compreendem bem a questão das deficiências e respeitam esses alunos. Quando há problemas, a coordenação sempre se prontifica a resolver e todos se envolvem. Porém ao meu ver, apenas a inclusão social acontece, pois, a parte pedagógica sempre fica de lado com estes alunos. Dou aula a 16 anos, e sinceramente, nunca vi professores ou escolas que se dedicassem efetivamente à questão pedagógica destes alunos. Não culpo ninguém por isso, até porque a vida do professor em sala de aula também é bastante complicada (fazer 3 turnos, muitas escolas, pública x particular). Realmente, é necessário falar sobre o tema e propor caminhos para uma real inclusão. Essas oficinas ajudam muito a pensar a prática em sala com estes alunos.

Isto indica que é necessário reorganizar o ensino considerando as condições de trabalho do professor. Trabalhos como os de Leonardo (2008) e Glat e Pletsch (2011) já sinalizaram esta dificuldade. Com muitos alunos em sala fica difícil para professor se aproximar, olhar de forma mais cuidadosa para as potencialidades e limitações de seu aluno de inclusão e todos os outros. Somado a isso, a organização das disciplinas em hora aula impõe uma convivência muito limitada.

A inclusão passa por enxergar o aluno, reconhecer o direito dele de estar na escola e ter acesso à aprendizagem; reorganizar o espaço escolar com menos alunos em sala de aula, recursos materiais que possibilitem adaptações e práticas diferenciadas. Outro fator apontado por Rosa e Papi (2017) é o tempo escolar, que é fundamental para um trabalho mais significativo com o aluno:

O tempo escolar não costuma ser organizado conforme a necessidade de aprendizagem dos alunos pois é determinado pela escola e instâncias superiores. Entretanto, há que ser considerado

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que para o trabalho com o aluno público-alvo da educação especial a ampliação do tempo poderia favorecer resultados positivos no desenvolvimento do aluno.

E O QUE CONCLUÍMOS? Ao compararmos o momento histórico atual com algumas décadas atrás

concluímos que tivemos grandes avanços no que tange a inclusão de pessoas com deficiência. Só o fato destas crianças terem o direito reconhecido de frequentar a escola regular já é algo a ser comemorado. No entanto, os desafios atuais são para que os objetivos educacionais ultrapassem apenas a socialização. Para que o acesso ao conhecimento seja alcançado precisamos repensar muitos fatores, entre eles, o papel da escola, a sua organização, formação de professores e etc. A análise dos relatos dos professores evidencia que, muitas vezes, a socialização ocorre, mas a aprendizagem dos alunos de inclusão nem sempre é consolidada.

Percebeu-se pelo diálogo com os professores que na medida do possível procuram fazer o melhor que podem. No entanto isso não é suficiente muitas vezes, devido a uma formação pobre em multiculturalismo e diversidade, salas com muitos alunos e tempo curto para um olhar mais demorado. Nota-se que a linha entre adaptar uma atividade para um aluno próximo ao que é solicitado aos colegas e empoderá-lo ou fazê-lo se sentir menos capaz é muito tênue. Os professores também relatam a falta de apoio da família muitas vezes. Muitos alunos de inclusão faltam além do comum nos dias letivos.

Referências:

ARAÚJO, C. A. Necessidades da criança com síndrome de Down em classe comum de escola regular particular: estudo de caso de uma criança no município de Embu das Artes. 2006 155f. Dissertação (Mestrado), Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, 2006.

CARVALHO, Rosita Edler. Educação Inclusiva: com os pingos nos “is”. Porto Alegre: Mediação, 2004.

DUARTE, M. Síndrome de Down: Um estudo sobre Inclusão Escolar na rede pública do ensino fundamental na cidade de Araraquara/SP. 2003. 94 f. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar). Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2003.

FERREIRA, Eliza Bartolozzi; OLIVEIRA, Dalila Andrade. (Orgs.). Crise da escola e políticas educativas. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

GLAT, Rosana; PLETSCH, Marcia Denise. Inclusão escolar de alunos com necessidades especiais. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2011.

IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

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LEONARDO, Nilza Sanches Tessaro. Inclusão escolar: um estudo acerca da implantação da proposta em escolas públicas. Revista Semestral da

Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, Maringá, v. 12, n.1, p. 431- 440, 2008. Disponível em: <www.scielo.br/pdf/pee/v12n2/v12n2a14.pdf >. Acesso em: 17 ago. 2015.

MARCELO GARCÍA, Carlos. Formação de professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora, 1999.

ROSA, K.B. da; PAPI, S.de O.G. Os professores e os desafios da inclusão de alunos com deficiência no ensino comum. Disponível em:

https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/24453_11921.pdf

SAAD, S. N. Preparando o caminho da inclusão: dissolvendo mitos e preconceitos em relação à pessoas com síndrome de Down. São Paulo: Vetor, 2003.

VOIVODIC, M. A. Inclusão escolar de crianças com síndrome de Down. Petrópolis: Vozes, 2004.

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Sobre os autores

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Profa. Dra. Daniela G. de Abreu Favacho

Mestre e Doutora em Ciências (DQ-FFCLRP-USP), Pós-doutora pela FE-USP-SP. Atua como professora da área de Ensino de Química do Departamento de Química da FFCLRP-USP. Além de coordenar o Centro de Ensino Integrado de Química (CEIQ), também coordena o um grupo multiprofissional que visa apoiar práticas inclusivas na escola e é orientadora do Programa de Pós-Graduação em Química da FFCLRP-USP.

Profa. Dra. Joana de Jesus de Andrade

Licenciada em Ciências Naturais e em Biologia (UNICENTRO), com mestrado em Educação nas Ciências (UNIJUÍ), doutorado e pós-doutorado em Educação (FE-UNICAMP). Atualmente é professora no Departamento de Química da FFCLRP-USP, professora do programa de Pós-Graduação em Educação da FFCLRP-USP e é coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Epistemologia e Psicologia no Ensino de Ciências (EPSEC).

Dra. Flávia Denise Cardinali Mendes da Cunha

Bióloga, Pedagoga, pós graduação em psicopedagogia com ênfase em Educação Especial. Professora da desde 2003, na Rede Estadual de Ensino, efetiva em 2013, tendo atuado também na Rede Municipal e Particular de Ribeirão Preto como professora de Ciências, Microbiologia e Citologia. Atualmente Professora Coordenadora do Núcleo Pedagógico da Diretoria de Ensino de Ribeirão Preto no componente curricular Ciências.

Dra. Mayra Fernanda Zanetti

Professora da rede pública de ensino. Pedagoga pós-

graduada em psicopedagogia com ênfase em Educação

especial e Atendimento Educacional Especializado. Atuou

como coordenadora pedagógica e atualmente como

formadora de coordenadores e professores de uma rede de

ensino.

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Me. Ana Claudia Alves Legore

Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em

Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de

Ribeirão Preto (2019). Possui graduação em Pedagogia pela

Faculdade de Educação São Luís (2004). Especialização em

Educação a Distância: Tutoria, Metodologia e Aprendizagem

(2013) e Logoterapia em Educação (2015). Atualmente é

coordenadora de Projetos da Associação Síndrome de Down.

Tem experiência na área educação escolar (2005/2017), com

ênfase em Métodos e Técnicas de Ensino, atuando

principalmente nos seguintes temas: educação (inclusiva),

emancipação, inteligência e deficiência".

Dra. Ana Fábia C. Foglietto Basso

Graduação em Pedagogia na Universidade de Ribeirão Preto

(UNAERP), Pós-Graduação em Psicopedagogia no Centro

Universitário Moura Lacerda, Especialização em

Neuropsicopedagogia no Centro Universitário Barão de

Maua, Especialização em Educação Especial na UFSCAR,

Formação em Psicoterapia corporal Neorreichiana no

Instituto Lumen, Estudo dirigido em dislexia na Portland

State University, Formação em Análise Bioenergética no

Instituto Lumen. Atualmente atendimento clínico a crianças,

adolescentes e adultos. Orientação de pais e orientação

escolar.

Profa. Dra. Gláucia Maria da Silva

Bacharel e Licenciada em Química (DQ-FFCLRP-USP), Doutora

em Ciências (IQSC-USP). Atua como professora da área de

Ensino de Química junto ao curso de Licenciatura em Química

e ao Programa de Mestrado Profissional em Química em Rede

Nacional do DQ-FFCLRP-USP. É tutora do grupo PET Química

USP RP do Ministério da Educação.

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Hilary Ísis da Silva

Licencianda em Química pela Faculdade de Filosofia, Ciências

e Letras de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo

Douglas Silva da Hora Oliveira

Licenciando em Química pela Faculdade de Filosofia, Ciências

e Letras de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo

Lidiane Paziani

Licenciada em Química pelo Instituto Federal de Sertãozinho

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