cc_ufpa_sousa (enviado 09 do 06 de 2011)

12
 MODELAGEM MATEMÁTICA NA PERSPECTIVA CTS: UMA PROPOSTA DE ARTICULAÇÃO PARA A FORMAÇÃO CRÍTICA E REFLEXIVA DO ALUNO Aldemar Batista Tavares de Sousa / [email protected] Adilson Oliveira do Espírito Santo / [email protected] Resumo: Este artigo busca apresentar as primeiras considerações referentes à pesquisa sobre possíveis relações existentes entre Modelagem Matemática e o enfoque Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS). Para isso, desenvolve um panorama histórico sobre a evolução da Matemática e da Tecnologia, enfatiza as discussões sobre os estudos CTS por despertar a conscientização da sociedade acerca das consequências que a ciência pode causar a ela e é realizada uma reflexão sobre os Estudos no âmbito da Educação Matemática que apontam para a necessidade de adequar o trabalho escolar a uma nova realidade da atividade humana. A Modelagem Matemática é vista como uma resposta à necessidade de formação política dos estudantes, possibilitando-os a atuarem criticamente em uma sociedade na qual a presença da matemática é forte. A pesquisa encontra-se em desenvolvimento, portanto ainda está na fase bibliográfica e seus resultados ainda estão insipientes. Dessa forma, pretendemos demonstramos o caminho para a articulação entre esses dois ramos de estudos, Modelagem Matemática e enfoque CTS, assim como a existência de convergênc ia entre a Tendência Atual e a Abordagem Temática , onde ambas  buscam referenciar os acontecimentos do mundo real e a contextualização do ensino da matemática e, assumindo que esse tipo de abordagem é na perspectiva CTS. Palavras-chave: Modelagem Matemáti ca. Enfoque CTS. Formação Crítica. Introdução A incessante busca pela sobrevivência pessoal e a necessidade de manutenção da espécie impulsionaram o homem a desenvolver sua capacidade inventiva, elaborando, desde o início de sua hist ória , ferra ment as, arti fíci os tec nológicos e int elec tuai s que funci ona vam com o si mpl es pro lo nga men to de seu cor po, até o des env olv imento de complexos sistemas políticos, sociais e culturais. Esses elementos, frutos de sua fértil imaginação, o fizeram mudar sua condição de espécie frágil, quase à beira da extinção e total men te de pen dente do rit mo dit ado pel a na tur eza, par a a con diç ão de esp éc ie dominante, responsável pelo futuro do planeta e protagonista da História. Para Eves (2007, p. 25), a Matemática teve sua origem com o homem primitivo  por meio do conceito de número e do processo de contar, resultante dos seus primeiros esforços para sistematizar os conceitos de grandeza, forma e número. Para ele é razoável admitir que “a espécie humana, mesmo nas épocas mais primitivas, tinha algum senso numérico, pelo menos a ponto de reconhecer mais e menos quando se acrescentava ou retirava alguns objetos de uma coleção pequena”. Nesse sentido, torna-se evidente que com 1

Upload: aldemar-sousa

Post on 07-Jul-2015

58 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 1/12

 

MODELAGEM MATEMÁTICA NA PERSPECTIVA CTS: UMA PROPOSTA DE

ARTICULAÇÃO PARA A FORMAÇÃO CRÍTICA E REFLEXIVA DO ALUNO

Aldemar Batista Tavares de Sousa / [email protected] Oliveira do Espírito Santo / [email protected] 

Resumo: Este artigo busca apresentar as primeiras considerações referentes à pesquisasobre possíveis relações existentes entre Modelagem Matemática e o enfoque Ciência,Tecnologia e Sociedade (CTS). Para isso, desenvolve um panorama histórico sobre aevolução da Matemática e da Tecnologia, enfatiza as discussões sobre os estudos CTS por despertar a conscientização da sociedade acerca das consequências que a ciência podecausar a ela e é realizada uma reflexão sobre os Estudos no âmbito da Educação

Matemática que apontam para a necessidade de adequar o trabalho escolar a uma novarealidade da atividade humana. A Modelagem Matemática é vista como uma resposta ànecessidade de formação política dos estudantes, possibilitando-os a atuarem criticamenteem uma sociedade na qual a presença da matemática é forte. A pesquisa encontra-se emdesenvolvimento, portanto ainda está na fase bibliográfica e seus resultados ainda estãoinsipientes. Dessa forma, pretendemos demonstramos o caminho para a articulação entreesses dois ramos de estudos, Modelagem Matemática e enfoque CTS, assim como aexistência de convergência entre a Tendência Atual e a Abordagem Temática, onde ambas

 buscam referenciar os acontecimentos do mundo real e a contextualização do ensino damatemática e, assumindo que esse tipo de abordagem é na perspectiva CTS.Palavras-chave: Modelagem Matemática. Enfoque CTS. Formação Crítica.

Introdução

A incessante busca pela sobrevivência pessoal e a necessidade de manutenção da

espécie impulsionaram o homem a desenvolver sua capacidade inventiva, elaborando,

desde o início de sua história, ferramentas, artifícios tecnológicos e intelectuais que

funcionavam como simples prolongamento de seu corpo, até o desenvolvimento de

complexos sistemas políticos, sociais e culturais. Esses elementos, frutos de sua fértil

imaginação, o fizeram mudar sua condição de espécie frágil, quase à beira da extinção etotalmente dependente do ritmo ditado pela natureza, para a condição de espécie

dominante, responsável pelo futuro do planeta e protagonista da História.

Para Eves (2007, p. 25), a Matemática teve sua origem com o homem primitivo

 por meio do conceito de número e do processo de contar, resultante dos seus primeiros

esforços para sistematizar os conceitos de grandeza, forma e número. Para ele é razoável

admitir que “a espécie humana, mesmo nas épocas mais primitivas, tinha algum senso

numérico, pelo menos a ponto de reconhecer  mais e menos quando se acrescentava ou

retirava alguns objetos de uma coleção pequena”. Nesse sentido, torna-se evidente que com

1

Page 2: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 2/12

 

o desenvolvimento gradual das relações sociais, tornou-se inevitável o desenvolvimento da

contagem simples.

Cáceres afirma que “o homem atual é o produto da evolução da espécie” e, o que

o distingue de qualquer outro animal é a cultura, pois ele não apenas utiliza determinados

instrumentos, mas é o único ser capaz de produzi-los habilmente. Só o homem é capaz de

desenvolver a aprendizagem e acumular conhecimentos. “A cultura surge dessa atividade

de criação tecnológica” (CÁCERES, 1988, p. 2-3). Esse processo de acumulação de

conhecimentos, possibilitada pela cultura, conduziu o homem a dois momentos históricos

cruciais conhecidos como a “Revolução Agrícola”, no terceiro milênio a.C. e a “Revolução

Industrial”; em cada um desses momentos, alterou profundamente a cultura e a sociedadehumanas em todo o mundo.

A Revolução Agrícola possibilitou ao homem deixar de ser nômade o que

implicou em novas necessidades e consequentemente novas tecnologias e sistemas de

contagens. A partir de 1870, a Revolução Industrial se expandiu para uma série de países.

Além da Inglaterra, Bélgica e França, os efeitos da revolução puderam ser vistos nos

Estados Unidos, Japão e Alemanha (CÁCERES, 1988, p. 148). Houve intenso

desenvolvimento científico e tecnológico, crescimento do capital e acúmulo de riquezas, oque causou, entre outras coisas, conflitos entre essas nações pelo domínio do mercado

mundial e do mundo colonial.

Houve nesse período histórico um vertiginoso progresso tecnológico juntamente

com o início de uma era de investigação científica nunca vista anteriormente,

  principalmente na mecânica e na química. Em principio, “a maioria das conquistas

tecnológicas era realizada não por cientistas, mas por artesãos e funileiros” e devido às

necessidades da indústria no século XX, “a ciência pura e a tecnologia se fundiram”,exigindo a participação de matemáticos e cientistas com grau universitário. (EVES, 2007,

 p.517-18)

Pelo panorama acima traçado, apesar do lapso histórico-temporal, torna-se

 perceptível que a matemática, assim como o desenvolvimento tecnológico, é uma criação

humana, fruto das necessidades evolutivas de suas relações e de sua cultura. Não obstante,

a matemática, por meio da educação e do desenvolvimento de suas pesquisas, passa a

fornecer aporte teórico para o aprimoramento das criações tecnológicas de seus criadores.

Hoje, mais do que nunca, a matemática é vista como uma ciência capaz de influenciar 

2

Page 3: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 3/12

 

diretamente no desenvolvimento científico e tecnológico assim como nas tomadas de

decisões de cunho econômico, político e social.

  Neste artigo são expostas as primeiras conclusões referentes à pesquisa

 bibliográfica que tem como título provisório: Articulação entre a Modelagem Matemática

e enfoque CTS: uma proposta de contextualização do ensino para a formação

critica/reflexiva do aluno. Como a pesquisa ainda está no início, a metodologia utilizada é

a pesquisa bibliográfica que objetiva identificar pontos comuns entre a Modelagem

Matemática na perspectiva sóciocrítica e a educação numa perspectiva CTS.

Educação na perspectiva da Ciência Tecnologia e Sociedade – CTSAs discussões em torno do tema Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), também

conhecidas por estudos CTS, enfoque CTS ou estudos sociais da ciência e da tecnologia

(LINSINGEN, 2004), vêm ganhando espaço nas discussões políticas, científicas e

acadêmicas na Europa, Américas Anglo-Saxônica e América Latina por despertar a

conscientização da sociedade científica e escolar sobre a necessidade de realização de

debates e reflexões acerca das consequências que a ciência e a tecnologia causam à

sociedade.A proposta inicial do enfoque CTS era fazer uma crítica fundamentalmente à

tradição clássica de compreensão da ciência. Essa visão tradicional colocava a ciência

como uma atividade neutra, autônoma, que é regida por suas próprias vontades, dessa

forma não tendo que dar satisfações à sociedade em que está inserida.

A concepção clássica das relações entre ciência, tecnologia e sociedade, embora presente, em boa medida, em diversos âmbitos do mundo acadêmico e em meiosde divulgação, é uma concepção essencialista e triunfalista. Pode-se resumir emuma equação simples: + ciência = + tecnologia = + riqueza = + bem-estar

social. (CEREZO, 2004, p.12, grifo do autor)

Tais discussões e questionamentos começam originalmente como uma crítica ao

modelo de desenvolvimento fundamental da ciência, em que se acreditava na equação

linear de desenvolvimento do círculo virtuoso: o investimento em ciência e tecnologia

 produziria o bem estar social.

O termo CTS é considerado polissêmico e para uma melhor compreensão dos

objetivos deste artigo torna-se necessário definir qual tipo de abordagem do termo será

aqui empregado. Para tanto, será aqui adotada a definição de educação na perspectiva CTSde Linsingen, na qual ele define que educar numa perspectiva CTS é:

3

Page 4: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 4/12

 

[ ... ] fundamentalmente, possibilitar uma formação para maior inserção socialdas pessoas no sentido de se tornarem aptas a participar dos processos detomadas de decisões conscientes e negociadas em assuntos que envolvam ciência

e tecnologia. Em outras palavras, é favorecer um ensino de/sobre ciência etecnologia que vise à formação de indivíduos com a perspectiva de se tornaremcônscios de seus papéis como participantes ativos da transformação da sociedadeem que vivem. (LINSINGEN, 2007, p.13).

Quando se fala em usar o ensino de ciências para formar cidadãos capazes de

melhor usufruir os benefícios de ciência e tecnologia não quer dizer que essa

conscientização que está sendo trabalhada é só pra tomar decisão na hora de comprar e

utilizar um produto cada vez mais impregnado das idéias de ciência e tecnologia. Esse tipo

de percepção, que não considero a ideal, não é absolutamente crítica. Ela forma apenas

 bons consumidores de ciência e tecnologia. Outra forma de compreensão que podemos ter 

sobre o assunto é aquela em que poderemos dizer que só saber o que se está comprando

não basta, mas que é necessário ir além. É preciso possibilitar a formação de cidadãos

conscientes, capazes de discutir os problemas causados por essa tecnologia, prever suas

consequências e avaliar a transformação que irá causar à sociedade.

Em busca de suporte a uma educação na perspectiva CTS, que tem como

finalidade formar cidadãos cônscios de seu papel e, na busca da contextualização dos

assuntos abordados e do acompanhamento das rápidas mudanças sociais e objetivando a

formação de sujeitos críticos, Brito (apud BRITO; GOMES, 2007) sugere um modelo da

 possível trajetória em busca desse ensino diferenciado, mostrado na figura 1.

  No esquema, são apresentadas propostas descritas na literatura, que objetivam

construir uma forma de ensinar diferenciada da Prática Dominante Atualmente i- PDA.

 Nesta prática, as características mais destacadas são: o direcionamento, a heteronomia e o

isolamento  social . Em outras palavras, a relação em sala de aula é predominantemente

unidirecional (professor→aluno), oferecendo poucas e limitadas oportunidades para

diálogo. Além disso, não há espaço para o acolhimento de saberes não escolares que

venham a confrontar-se abertamente com os saberes científicos, a fim de promover a

construção significativa de conhecimentos (BRITO; GOMES, 2007, p. 6).

4

Page 5: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 5/12

 

Figura 1: Representação da Proposta do ensino Através de Temas como mediadora entre a Prática dominante

Atualmente e a Tendência atual em educação em ciências. O sentido da seta representa o caminho em direçãoa essa tendência. (BRITO; GOMES, 2007, p. 6).

Em oposição ao ensino tradicional, Brito e Gomes (2007) sugerem a utilização da

Tendência Atual (TA) indicada pelas pesquisas em ensino de ciênciasii. Consideramos que

essa tendência é perfeitamente representada pela abordagem CTS ou educação em uma

 perspectiva CTS, pois é uma proposta mais preocupada com as implicações sociais do

conhecimento científico e da tecnologia que esse conhecimento produz.

As características fundamentais dessa tendência são: a Liberdade, a  Autonomia e a

 Interação Social . Enquanto na PDA a relação é predominantemente unidirecional, como já

expusemos, na TA o aluno tem liberdade para emitir opiniões, dialogar com pessoas (para

além do professor) e interagir com ambientes não escolares valorizando o saber não

científico para a construção de conhecimento, em conciliação com a ciênciaiii.

Fica claro que a mudança configurada nessa proposta passa por práticas ou

estratégias de ensino desenvolvidas como: os Microtemas, o Ensino Através de Temas,

Temas Geradores e as Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade, que melhor representam a

Tendência Atual. Entretanto, devido às várias implicações metodológicas, fica evidente

que para o objetivo desta pesquisa, que o ensino por meio de Microtemas e Ensino Através

de Temas são os que melhor se enquadram à proposição acima.

Desafios da Educação Matemática

Estudos no âmbito da Educação Matemática que acontecem no Brasil e em outros

 países apontam a necessidade de adequar o trabalho escolar a uma nova realidade marcada

 pela crescente presença da Matemática em diversos campos da atividade humana. Tais

5

Page 6: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 6/12

 

discussões têm influenciado análises e revisões nos currículos de Matemática no ensino

fundamental. (BRASIL, 1998)

As pesquisas na área de educação têm o objetivo de buscar sempre a melhoria do

ensino em todos os seus níveis e a matemática é uma disciplina que vem constantemente

recebendo duras críticas por parte dos educadores, devido a sua prática em sala de aula ser 

dissociada da realidade do aluno, o que, para muitos, é causa do grande número de

repetência escolar.

A insatisfação sobre o ensino da matemática revela que há problemas a serem

enfrentados, tais como a necessidade de reverter um ensino centrado em procedimentos

mecânicos, desprovidos de significados para o aluno. Há urgência também na busca por soluções que precisam transformar-se em ações cotidianas que, efetivamente, tornem os

conhecimentos matemáticos acessíveis a todos os alunos e, em reformular objetivos, rever 

conteúdos e buscar metodologias compatíveis com a formação que hoje a sociedade

reclama. (BRASIL, 1997).

Outro aspecto a ser destacado é o fato de que não podemos ignorar o caráter 

 político, econômico e social da Educação Matemática. Como qualquer outra disciplina

escolar, ela pode ser utilizada tanto para contribuir com a situação excludente e seletiva,em que só é aprovado quem serve para o mercado ou tem capacidade de entender e

aprender, quanto para a modificação deste quadro, conduzindo os alunos a uma formação

cidadã mais consciente de seus direitos e deveres na sociedade.

As Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares

 Nacionais, na parte dedicada a Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, diz

que as disciplinas dessa área compõem a cultura científica e tecnológica que, como toda

cultura humana, é resultado e instrumento da evolução social e econômica, na atualidade eao longo da história, quebrando, com isso, o caráter absolutista da ciência. (BRASIL,

2006). Tal documento aborda ainda, de maneira clara, a necessidade de contextualização e

o envolvimento com outras disciplinas do ensino de matemática. Ele afirma que

Esses tratamentos de aspectos geográficos, sociais e históricos podem ser feitosarticuladamente com as demais áreas, mas não é preciso que sejam deixados paraa área de ciências humanas, por conta da “natureza do conteúdo”. Pelo contrário, precisamente por sua natureza humanista, esses aspectos são significativos paradar contexto sócio-cultural a disciplinas científicas como a Biologia, a Física e aQuímica, e às linguagens matemáticas de que fazem uso, propiciando assim um

aprendizado mais eficaz. (BRASIL, 2006, p.31).

6

Page 7: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 7/12

 

Tais argumentos mostram a grande necessidade de mudança na maneira de realizar 

o ensino de matemática no Brasil. É preciso mobilizar esforços para que possamos alcançar 

em pouco tempo uma educação mais contextualizada, próxima da realidade do aluno e

voltada para a resolução de problemas locais.

Modelagem Matemática como alternativa.

A Modelagem Matemática na Educação é vista como uma estratégia de ensino de

conceitos matemáticos, capaz de inserir, no ambiente escolar, assuntos relevantes ligados à

realidade do aluno. Entretanto, para o entendimento desse trabalho, me aportarei na

definição de Modelagem Matemática segundo a Educação Matemática Critica de Araújo(2007, p. 59) que vai além da estratégia de ensino, ao ponto de se preocupar “com uma

formação política dos estudantes, de tal forma que eles atuem criticamente em nossa

sociedade na qual a presença da matemática é forte” e Barbosa (2004, p. 2) que entende

que a “Modelagem pode potencializar a intervenção das pessoas nos debates e nas tomadas

de decisões sociais que envolvem aplicações da matemática, o que parece ser uma

contribuição para alargar as possibilidades de construção e consolidação de sociedades

democráticas”.Com esse objetivo, não se deve deixar de levar em consideração que o aluno

encontra-se envolto em uma sociedade que está sofrendo transformações econômicas,

sociais e tecnológicas, fruto do processo da globalização. Tais transformações estão

afetando o modo pelo qual os indivíduos se relacionam entre si, com o mundo e com o

 processo de conhecimento.

A Educação matemática crítica como caminho.Alrø e Skovsmose (2010, p. 16), no livro “Diálogo e Aprendizagem em Educação

Matemática” afirmam que, em muitas escolas, mudanças radicais têm acontecido nas aulas

de Matemática. A metodologia tradicional tem sido ameaçada por abordagens temáticas e

 por trabalhos com projetos a tal ponto que já não se consegue tão facilmente distinguir uma

aula de matemática de uma aula de outra disciplina.

Skovsmose mostra a tendência em contrapor o ensino de matemática dito

tradicional com o ensino voltado para a criticidade do aluno por meio do movimento da

Educação Matemática Crítica. Para ele o entendimento de Educação Matemática

7

Page 8: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 8/12

 

tradicional é algo que muda com o tempo e varia de país para país, mas apresenta algumas

características:

[...] nesse modelo, as aulas costumam ser divididas em duas partes: primeiro, o  professor apresenta algumas idéias e técnicas matemáticas, geralmente emconformidade com um livro-texto. Em seguida, os alunos fazem algunsexercícios pela aplicação direta das técnicas apresentadas. O professor confere asrespostas. Uma parte essencial do trabalho de casa é resolver exercícios do livro.Há variações possíveis no tempo gasto com a parte expositiva e com a resoluçãodos exercícios. Outros elementos podem ser combinados com esse modelo, por exemplo, os alunos podem apresentar pequenos seminários ou exercíciosresolvidos. (ALRØ; SKOVSMOSE, 2010, p. 51)

Para esses autores, um aspecto singular do ensino da Matemática tradicional é o

 paradigma do exercício. Esse paradigma tem grande influência na Matemática no que diz

respeito à organização das aulas e também ao papel que a matemática desempenha na

sociedade como um todo, por exemplo, como uma função fiscalizadora (exercícios

matemáticos encaixam-se perfeitamente em processos de seleção). Geralmente, exercícios

de Matemática são preparados por uma autoridade externa à sala de aula. Nem o professor,

nem os alunos participam da elaboração dos exercícios.

Os autores enfatizam que o paradigma do exercício tem sido desafiado de muitas

maneiras, e colocam como exemplo: a resolução de problemas; proposição de problemasiv;abordagem temática; trabalho com projetos, etc. para os quais usam a expressão

“abordagem investigativav” para denominar esse conjunto de metodologias.

Ambos entendem que podemos tentar abandonar o paradigma do exercício para

entrar em um ambiente de aprendizagem diferente, os quais chamam de cenários de

investigação que são, por natureza, abertos. Nestes ambientes os alunos podem formular 

questões e planejar linhas de investigação de forma diversificada, participando assim do

 processo de investigação. Num cenário para investigação, a fala “O que acontece se...?” deixa de pertencer apenas ao professor e passa a poder ser dita pelo aluno também. E outra fala do professor, “Por que é dessa forma...?”, pode desencadear a fala do aluno “Sim, por que é dessa forma...?”. (ALRØ; SKOVSMOSE, 2010, p. 55-56)

 Na tabela abaixo, conseguimos visualizar os diferentes cenários educacionais, os

quais são denominados pelos autores como ambientes de aprendizagem (ver fig. 2). Os

ambientes (1), (3) e (5) representam o paradigma do exercício, com (1) e (3) predominando

no ensino de matemática tradicional e influenciando de forma decisiva os padrões de

8

Page 9: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 9/12

 

comunicação professor-aluno. Os ambientes (2), (4) e (6) representam cenários para

investigação nas três possíveis formas de referência para produção de significados.

Paradigma doexercício

Cenários parainvestigação

Referencias à matemática pura (1) (2)Referencias a semirrealidade (3) (4)Referencias ao mundo real (5) (6)

Figura 02: Ambientes de aprendizagem (ALRØ; SKOVSMOSE, 2010)

Para Alrø e Skovsmose, essas referências podem auxiliar o posicionamento dos

alunos na medida em que propiciam visão geral do que pode ser feito. Nos ambientes (1) e

(2), as referências são feitas somente à matemática pura. Em (3) e (4), as referências são

feitas à semirrealidade, ao passo que (5) e (6) incluem referência ao mundo real.

Considerações.

Para a obtenção de uma educação matemática crítica e emancipadora, a ênfase deve

ser dada ao ambiente (6), pois nele que estão presentes a oportunidade e a possibilidade de

trabalhar a modelagem matemática como uma alternativa de trabalho na abordagem

investigativa, por meio de cenários de investigação, utilizando, para esse fim, as

referências do mundo real.

Percebe-se a existência da relação entre a Tendência Atual, definida por Brito e a

abordagem temática trabalhada por Alrø e Skovsmose, pois ambas têm como referência os

acontecimentos do mundo real, ligados ao dia-a-dia do aluno, objetivando com isso uma

forma de contextualização do ensino da matemática. Brito, por sua vez, assume que esse

tipo de abordagem é realizado numa perspectiva CTS.

  Nos documentos oficiais sobre a educação brasileira fica claro que existe

atualmente a necessidade dessa contextualização do ensino de ciências e matemática com o

objetivo de se conquistar do interesse do aluno pelo conhecimento científico educacional.

Para isso, a ciência e a matemática devem levar para dentro da escola problemas da

realidade dos alunos, aproximando a realidade vivida do contexto escolar.

Considerando todo esse entrelaçamento de idéias e argumentações acima, somos

levados a considerar que é possível a articulação entre Modelagem Matemática na

 perspectiva da Matemática Crítica trabalhada por Barbosa, Loyola e Skovsmose, com a

Educação na Perspectiva CTS abordada por Linsingen e, dessa forma, podemos afirmar que a Educação Matemática realizada com essa tendência configura-se uma Educação

9

Page 10: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 10/12

 

Matemática na perspectiva CTS, articulando a Modelagem Matemática com as discussões

Sociais da Ciência e da Tecnologia.

Referências:

ALRØ, Helle; SKOVSMOSE, Ole. Diálogo e Aprendizagem em Educação Matemática,Tradução de Orlando Figueiredo. – 2. ed. – Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

ARAÚJO, J. L. Relação entre matemática e realidade em algumas perspectivas demodelagem matemática na Educação Matemática. In: BARBOSA, J. C.; CALDEIRA, A.D.; ARAÚJO, J. L. (Orgs.) Modelagem Matemática na Educação MatemáticaBrasileira: pesquisas e práticas educacionais. Recife: Sociedade Brasileira de Educação

Matemática, 2007. p. 17-32.BARBOSA, J. C. Modelagem Matemática: O que é? Por que? Como? Veritati, Feira deSantana, n. 4, p. 73-80, 2004. Disponível em: < http://www.uefs.br/nupemm/veritati.pdf >.Acesso em: 10 abr. 2011.

BIEMBENGUT, Maria Salett. Precursor: Aristides Camargos Barreto. BoletimInformativo do Centro de Referência de Modelagem Matemática no Ensino.Blumenau-SC, ano I, n 01, p.2, 2007. Disponível em: <http://www.furb.br/cremm/

 portugues/informcremm1.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2011.

BRASIL. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares

Nacionais+ (PCN+) – Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília:MEC, 2006.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC), Secretaria de Educação Fundamental (SEF).Parâmetros Curriculares Nacionais (1ª a 4ª série), Brasília: MEC/SEF, 1997.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC), Secretaria de Educação Fundamental (SEF).Parâmetros Curriculares Nacionais (5ª a 8ª Série), Brasília: MEC/SEF, 1998.

BRITO, L. P. de. Ensino de física através de temas: uma experiência de ensino naformação de professores de ciências. In: VII CONGRESSO NORTE/NORDESTE DE

EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA. Belém- Pará, 2004. Disponível em:<http://ufpa.br/ensinofts/cts/painel_licurgo.pdf >. Acessado em: 19 nov. 2010.

 ______; GOMES, N. F. O Ensino de Física Através de Temas no Atual cenário do Ensinode Ciências. In: ENCONTRO DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS,6, 2007. Anais eletrônicos..., Florianópolis, 2007. Disponível em: <  http://www.fae.ufmg.br/abrapec/viempec/viempec/CR2/p962.pdf >. Acessado em: 20 nov.2010.

CÁCERES, Florival. Historia Geral. 3. ed. São Paulo: MODERNA, 1988. 314 p

CEREZO, J. A. L. Ciência, Tecnologia e Sociedade: o estado da arte na Europa e nosEstados Unidos. In: SANTOS, L. W. (Org.). Ciência, tecnologia e sociedade: o desafio da

interação. 2. ed. Londrina: IAPAR, 2004. p. 11-44.

10

Page 11: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 11/12

 

EVES, Howard. Introdução à história da matemática. Campinas: SP. Editora daUNICAMP, 2004.

LINSINGEN, Irlan. Perspectiva educacional CTS: aspectos de um campo em consolidaçãona América Latina, Ciência e Ensino, Campinas, v.1, Número Especial: “Educação emCiência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente”, UNICAMP, nov. 2007. Disponível em: <http://www.ige.unicamp.br/ojs/index.php/cienciaeensino/article/viewFile/150/108>.Acessado em: 18 set. 2010.

LINSINGEN, Irlan. O enfoque CTS e a educação tecnológica: origens, razões econvergência curriculares. XI Congreso Chileno de Ingeniería Mecânica - COCIM 2004,2004, Antofagasta. Anais do COCIM 2004, 2004. v. 1. p. 1-11. Disponível em: <http://www.nepet.ufsc.br/Artigos/Texto/CTS%20e%20EducTec.pdf>. Acessado em: 18set. 2010.

11

Page 12: CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011)

5/8/2018 CC_UFPA_Sousa (Enviado 09 Do 06 de 2011) - slidepdf.com

http://slidepdf.com/reader/full/ccufpasousa-enviado-09-do-06-de-2011 12/12

 

i Brito chama de Prática Dominante Atualmente aquela que costumamos denominar de  Ensino Tradicional e que ainda predomina entre os professores e instituições em todos os níveis de ensino. Na área de ciências ela se caracteriza por reproduzir em ciclos a sequência: Conteúdo, Exemplos, Exercícios e Provas.

ii É chamada aqui de Tendência Atual (TA) no ensino de ciências a forma de educar que atende às reais exigências dasociedade contemporânea, que já foi comentado anteriormente.

iii Para maior aprofundamento, consultar (BRITO; GOMES, 2007).

iv O termo original em inglês é problem  posing, confira em (ALRØ; SKOVSMOSE, 2010).

v Uma abordagem investigativa pode tomar várias formas. Um exemplo é o trabalho com projetos, que foi empregadona educação primária e secundária por Nielsen, Patronis e Skovsmose (1999) e Skovsmose (1994), e no ensino superior  por Vithal, Christiansen e Skovsmose (1995) confira em (ALRØ; SKOVSMOSE, 2010).