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CAUSA E ORIGEM DOS NOSSOS MALES Uma explicação antropológico-espírita sobre a origem de nossos desvios morais. E por que temos dificuldade em mudar nosso comportamento.

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CAUSA E ORIGEMDOS NOSSOS MALES

Uma explicação antropológico-espírita sobre a origem de nossos desvios morais. E por que temos dificuldade em mudar nosso comportamento.

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Edição e distribuição

EDITORA EMECaixa Postal 1820 – CEP 13360 ‑000 – Capivari – SP

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Capivari‑SP– 2019 –

Juliano P. Fagundes

CAUSA E ORIGEMDOS NOSSOS MALES

Uma explicação antropológico-espírita sobre a origem de nossos desvios morais. E por que temos dificuldade em mudar nosso comportamento.

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Ficha catalográfica

Fagundes, Juliano P., 1977 Causa e origem dos nossos males / Juliano P. Fagundes – 1ª ed. mar./2019 – Capivari, SP: Editora EME. 176 p.

ISBN 978‑85‑9544‑094‑4

1. Filosofia. 2. Espiritismo.3. Evolução da humanidade. 4. Destinação da Terra.I. TÍTULO.

CDD 133.9

© 2019 Juliano P. Fagundes

Os direitos autorais desta obra foram cedidos pelo autor para a Editora EME, o que propicia a venda dos livros com preços mais acessíveis e a manutenção de campanhas com preços especiais a Clubes do Livro de todo o Brasil.

A Editora EME mantém o Centro Espírita “Mensagem de Esperança” e patrocina, junto com outras empresas, instituições de atendimento social de Capivari-SP.

CAPA | Juliano FagundesPROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO | Marco MeloREVISÃO | Rubens Toledo

1ª edição – março/2019 – 3.000 exemplares

Contato do autor | [email protected]

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Sumário

Agradecimentos ......................................................... 7 Introdução ................................................................... 91. Somos espelho de nosso passado .......................... 152. Nossa origem primitiva .......................................... 233. A fragilidade física................................................... 294. A baixa autoestima .................................................. 355. A descoberta da mais poderosa arma ................... 396. A fofoca ..................................................................... 417. Egoísmo e indisciplina ............................................ 458. Desregramentos sexuais ......................................... 499. Negativismo ............................................................. 5310. Necessidade da fé .................................................... 5711. Violência .................................................................... 6312. A posse como base para a destinação da Terra ... 6713. Trabalho e sofrimento ............................................. 7314. Conforto e ansiedade .............................................. 7915. Acúmulo de bens e sobrevivência ......................... 83

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16. Mais acúmulo e ansiedade ..................................... 8717. A necessidade dos princípios cristãos .................. 9118. O individualismo, consumismo e vaidade social . 10119. O preconceito social e racial ................................. 10520. O preconceito de gênero ....................................... 11321. Ditadura da magreza ............................................ 11922. Drogadição .............................................................. 12723. Ideais contraditórios .............................................. 13124. A eterna luta entre o bem e o mal ....................... 13525. O mundo está piorando? ...................................... 14326. Dor e morte ............................................................. 14927. E a felicidade? ......................................................... 157 Conclusão ................................................................ 171 Anexo I .................................................................... 177 Bibliografia .............................................................. 178

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente a Deus, sem o qual eu não poderia realizar qualquer trabalho e a Jesus, nosso eter‑no guia moral, com suas inolvidáveis lições de incompa‑rável valor.

Muito obrigado ao irmão César, meu mentor amigo, que tem sempre me orientado na melhor tomada de decisões.

Obrigado a minha amada esposa Eliane, pelo amor, fé e amizade que dedica a mim e também pelo apu‑rado senso crítico que sempre me salva de elucubra‑ções improfícuas.

Obrigado aos meus filhos, Catarina e Ian, que sem‑pre se empolgam com qualquer projeto que eu quei‑ra realizar.

Obrigado a minha mãe, Nerilda, que, mesmo sem entender muito bem o que eu estou fazendo ou quais minhas razões, está sempre lá para me apoiar.

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Obrigado à amiga Ivana Raisky, que quando men‑cionei a vontade de escrever essa obra disse: “A ideia parece ótima. Vá em frente”.

E um obrigado final à espiritualidade amiga, que nunca nos abandona, sempre paciente frente a nossa inerente teimosia.

Espíritas! Despojai-vos, portanto, do homem velho,pois é ao homem velho que farão sofrer.1

1. Santo Agostinho, Revista Espírita, abril de 1862.

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Introdução

No início de seu apostolado, o codificador da dou‑trina espírita, Allan Kardec, intrigado com a heteroge‑neidade da natureza humana, questionou os espíritos superiores sobre o caráter bom ou mau que os seres humanos apresentam desde o berço2. Pacientemente as entidades venerandas explicaram ao mestre lionês que todos fomos criados simples, ignorantes, e que vamos adquirindo valores e formando nosso caráter ao longo das provações pelas quais passamos em nossas existên‑cias materiais. Fica, então, muito claro que aqueles que aceitam a vida conforme é e buscam dar o melhor de si, encarnação após encarnação, chegam mais rapidamente ao objetivo do ser: a perfeição. E, da mesma forma, aque‑les que se revoltam, não aceitando a vida como é, sofrem

2. O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, questão 115.

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desmedidamente e, acumulando sentimentos de culpa a cada encarnação, acabam por distanciar‑se da felicidade e da perfeição.

Asseveram as entidades superiores que depende de cada um de nós o avanço para a perfeição, segundo nos‑sa própria vontade e a submissão à vontade de Deus.

Após obtemperar quanto às respostas dos espíritos superiores ao codificador, entendemos melhor o concei‑to de tábula rasa3 que hoje impera entre os acadêmicos de psicologia. É um conceito que se encaixa bem as nos‑sas origens espirituais, mas não tanto a nossa na atual existência. Já fomos uma tábula rasa, mas não somos mais. O que somos então? Um agregado de erros e acer‑tos, experiências mal e bem‑sucedidas, uma colcha de retalhos psíquica4, que vem sendo costurada desde o iní‑cio dos tempos, eliminando ou agregando partes a cada nova encarnação.

A cada nova experiência na carne, novos valores são acrescidos ao nosso ser. Muitas qualidades que temos hoje são valores que aprendemos e lapidamos por sécu‑los e até milênios, necessidades que precisaram de es‑

3. Tábula rasa (em latim: tabula rasa) é uma expressão que significa literalmente “tábua raspada”, e tem o sentido de “folha de papel em branco”. A palavra tabula, neste caso, refere-se às tábuas cobertas com fina camada de cera, usadas na antiga Roma, para escrever, fazendo-se incisões sobre a cera com uma espécie de estilete. As incisões podiam ser apagadas, de modo que se pudesse escrever de novo sobre a tábula rasa, isto é, sobre a tábua raspada ou apagada. Como metáfora, o conceito de tábula rasa foi utilizado por Aristóteles (em oposição a Platão) e difundido principalmente por Alexandre de Afrodísias, para indicar uma condição em que a consciência é desprovida de qualquer conhecimento inato – tal como uma folha em branco, a ser preenchida.

4. O termo psíquico é usado para fazer referência a tudo o que está relacionado com as funções e os elementos de caráter psicológico.

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forços para serem atendidas ou aptidões que optamos por desenvolver.

No entanto, todos esses valores precisaram ser rea‑valiados por nós a cada encarnação. Somos seres atem‑porais. Mas certos aprendizados são temporais. Somos filhos de Deus, eternos5, mas mutáveis. A necessidade de hoje pode não ser a necessidade de amanhã. O ser humano “velho”, com pensamentos e ações relegados a épocas passadas, precisa dar espaço a um ser huma‑no novo, atualizado com seu próprio tempo. O espiri‑tismo vem trazer a renovação ao mundo e não cabe a nós questionar as disposições divinas e, sim, participar dessa obra regeneradora.6

Temos a certeza de que os valores morais, dos quais hoje somos possuidores, foram conquistados ao longo do tempo. No entanto, nossos vícios morais também o foram. Mas por quê? O que nos levou reunir em nosso ser tantas boas qualidades e, ao mesmo tempo, tantas mazelas, que igualmente conservamos e desenvolvemos em nosso caráter? Conservamos conosco aquilo que jul‑gamos importante. Isso é ponto pacífico. Mas como pu‑demos conservar dentro de nós valores negativos como o egoísmo?

Considerado o vício mais radical7, a raiz de todos os vícios, o egoísmo é considerado, ao lado do orgulho, uma das grandes chagas da humanidade, incompatível

5. Para alguns, o termo eterno aplica-se a Deus. Porque não tem começo e nem terá fim. Aos espíritos, preferem o termo imortais. Nota do Revisor.

6. O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, cap. 3. FRANÇOIS- -NICOLAS-MADELAINE, Cardeal Morlot, Paris, 1863.

7. O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, questão 913.

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com a justiça, o amor e a caridade e neutralizando to‑das as outras qualidades. E quanto ao orgulho, “terrí‑vel adversário da humildade”, Jesus a esse se referiu, no Sermão do Monte, quando asseverou: bem-aventurados os pobres de espírito! Ou seja, o Reino dos Céus está reserva‑do aos simples, os que se despojaram da soberba. Ainda assim, muitos que são grandes na Terra erroneamente imaginam que seus títulos e riquezas são uma recom‑pensa por seus méritos, e que a sua essência talvez seja mais pura que a das demais criaturas.8

A vaidade, uma das muitas faces do orgulho, tam‑bém é causa de sofrimentos atrozes, porque nos trans‑forma em vítimas. Feridos no amor-próprio exacerbado, revoltamo‑nos, culpando a Providência ou transferindo tudo à má sorte. Quando as coisas não saem como pla‑nejamos e não conseguimos o que queríamos, achamos mais fácil culpar a divindade9.

Será que, em algum momento, o que consideramos hoje valores morais execráveis, não foram ferramentas de sobrevivência em um passado remoto? Por que con‑servaríamos conosco, encarnação após encarnação, va‑lores deturpados, um senso moral avesso ao bom‑senso, se não os julgássemos relevantes?

Afinal, tudo o que fazemos, fazemo-lo por julgar‑mos ser o certo a se fazer. E se não é certo hoje, poderá ter sido o melhor ontem, afinal, a cada era, mudam-se as leis humanas e os costumes dos povos. Quantas en‑

8. O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, cap. 7. LACORDAIRE, Constantina, 1863.

9. O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, cap. 5, item 4.

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carnações teremos vivido sob o jugo da “injustiça”, da violência, da “lei do mais forte” contra outras poucas existências, talvez dezenas, em épocas de justiça, direi‑tos e paz?

Talvez seja difícil abandonar velhos hábitos, porque só recentemente conhecemos novos valores. Será essa uma das mais céleres argumentações contra o sentimen‑to de culpa, tão combatido pelo espiritismo, que nos traz o conhecimento de causa necessário ao nosso refazimen‑to íntimo? Em tempos em que tantos espíritos vêm se arriscando – e não raro falhando – em aliar a psicologia tradicional aos ensinos doutrinários, talvez o caminho proposto pela antropologia10 seja mais feliz em nos elu‑cidar o quanto nossas encarnações passadas exigiram de nós, para que nossa psique se tornasse o que é hoje.

A obra que o leitor tem em mãos vem trazer uma série de fatos históricos, grandes descobertas antropológicas ventiladas sob o sopro renovador da doutrina dos espí‑ritos, que nos mostram que o mesmo pilar, sobre o qual

10. A antropologia (do grego άνθρωπος, anthropos, “homem”; e λόγος, logos, “razão”, “pensamento”, “discurso”, “estudo”) é a ciência que tem como objeto o estudo sobre o homem e a humanidade de maneira totalizante, ou seja, abrangendo todas as suas dimensões. A divisão clássica da antropologia distingue a antropologia cultural da antropologia física (ou biológica); já a divisão norte-americana, conhecida como Four Fields (Quatro Campos), divide a antropologia em arqueologia, linguística, antropologia física e antropologia cultural. Cada uma destas, em sua construção, abrigou diversas correntes de pensamento. Pode-se afirmar que há poucas décadas a antropologia conquistou seu lugar entre as ciências. Primeiramente, foi considerada como a história natural e física do homem e do seu processo evolutivo, no espaço e no tempo. Se por um lado essa concepção vinha satisfazer o significado literal da palavra, por outro restringia o seu campo de estudo às características físicas do homem. Essa postura marcou e limitou os estudos antropológicos por largo tempo, privilegiando a Antropometria, ciência que trata das mensurações das propriedades físicas do ser humano.

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construímos nossas mais valorosas qualidades, também sustentou os mais infelizes aspectos de nosso ser.

Sob esse ponto de vista, fazem-se cada vez mais cla‑ras as palavras do Cristo, na famosa Parábola do Joio e do Trigo.11 O Mestre conta que o Mundo Espiritual, ou Reino dos Céus, é como um lavrador que sai a semear uma boa semente em seu campo. Mas, à noite, enquanto todos dormem, vem um inimigo e semeia joio no meio do trigo, silenciosamente. Com o tempo, então, a lavou‑ra cresce, abundante, mas em meio dela, também o joio. Os servos, observando o que se passa nos campos, vão aturdidos até o dono do campo, questionar a qualida‑de das sementes plantadas pelo lavrador. Calmamente o homem responde que, com certeza, um inimigo quis “sabotar” sua lavoura. E, esclarecendo os servos que já se dispunham a arrancar o joio, o lavrador pede que es‑perem a época da colheita, onde o joio (que seria atirado ao fogo) poderia ser melhor separado do trigo (que seria guardado no celeiro).

Pois agora sabemos a verdade que vem à tona em momento oportuno ao nosso entendimento. Este é o tempo em que Jesus avisou que se comunicaria com os ceifeiros, com o advento do Espírito de Verdade, o con‑solador prometido: nós somos o campo em que cresce‑ram, com vigor, o trigo – que devemos recolher – e o joio – que devemos ajuntar para queimar. E devemos agir, aqui, agora.

11. Mateus 13:24-30.

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Capítulo 1

Somos espelho de nosso passado

Somos herdeiros de nós mesmos. Somos a soma de tudo o que já vivemos, a fusão de todas as experiên‑cias que vivenciamos ao longo de milênios incontáveis. Quem somos hoje possui uma razão – muito lógica – de ser.

A cada nova encarnação, aprendemos coisas novas, adquirimos novos valores, abandonamos antigos hábi‑tos, adquirimos novos... Entramos em contato com co‑nhecimentos estranhos a nós, os quais talvez levemos séculos para compreender, despertados pela necessida‑de de utilizá-los.

O que aprendemos, praticamos; o que sabemos fa‑zer, fazemos. No entanto, a cada nova experiência nas lides da matéria, uma nova realidade se desnuda para nós. Mudam as sociedades e suas leis humanas, mudam

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os parâmetros e normas de conduta. O senso moral flu‑tua, oscila; o legal se torna ilegal, para depois voltar a ser legal.

Afirma Kardec que o ser humano traz, ao nascer, aquilo que adquiriu em existências passadas. Nascemos tal qual desencarnamos. E cada existência torna-se, tam‑bém, um novo ponto de partida. Por isso, tanto faz saber quem fomos em existências pregressas, pois é certo que erramos. As tendências atuais sinalizam o campo em que fracassamos, clamando por corrigendas e reformas.

Ainda hoje muitas pessoas buscam as regressões de memória para, vislumbrando o passado, compreender melhor o presente. Mas entendemos que essa busca pode ser desnecessária senão frustrante e improfícua, pois em verdade, moralmente falando, somos o que fomos.

Aqui cabe também uma questão mais complexa. Como pode o homem ser responsável por atos e resga‑tar faltas dos quais não se recorda? Como pode o ho‑mem aproveitar-se da experiência adquirida em outras existências se essas caíram no esquecimento? Não seria mais proveitoso ao pecador que se lembrasse dos erros praticados, em vez de, a cada existência, começar tudo como se fosse uma página em branco no livro da vida? Como conciliar isto com a justiça de Deus?

Precisamos entender que, a cada nova existência, o homem tem mais inteligência e pode distinguir melhor o certo do errado. Se nos recordássemos de todo o passado, teríamos menos méritos. Quando o espírito entra na sua vida de origem (a vida espiritual) tem a chance de ver toda a sua vida se desenrolar diante de si; pode ver as fal‑

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tas cometidas e que causaram seu sofrimento e também as atitudes que poderia ter tomado para não cometê-las12.

Quando, então, nos preparamos para uma nova exis‑tência não raro procuramos provas semelhantes àquelas pelas quais passamos, ou os desafios que acreditamos apropriados ao nosso adiantamento. Pedimos, então, aos espíritos que nos são superiores e serão nossos guias, auxílio nas novas provações.

Enquanto encarnados, carregamos conosco a famosa intuição, que nada mais é que o aconselhamento de nos‑sos amigos espirituais que nos acompanham e auxiliam, diuturnamente, recordando‑nos de nossas faltas e nos inspirando novas condutas.

Sócrates (469 a.C. – 399 a.C.), um dos maiores sábios da Antiguidade13, utilizava de um método filosófico para se chegar à razão das nossas atitudes, baseado no que se passou chamar de Ironia e na Maiêutica. Na primeira fase do método, a Ironia, Sócrates – diante de outra pes‑soa que dizia conhecer determinado assunto – afirmava que nada sabia. Fazia uma série de perguntas, até o ou‑tro acabar por demonstrar, na verdade, sua ignorância.

Na segunda fase, a Maiêutica (que significa parto, em grego, nome que utilizou em homenagem à sua mãe Fenareta, que era parteira), Sócrates “dava luz às novas ideias”, construindo conceitos, mesmo que não se che‑gasse a conclusões definitivas. Indagava sobre o sentido dos costumes e as disposições de caráter dos atenienses, dirigindo-se à sociedade e ao indivíduo.

12. O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. 7.13. O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, Introdução, Parte 4.

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As perguntas socráticas terminavam sempre por re‑velar que os atenienses respondiam sem pensar no que diziam, ou agiam sem refletir sobre o que faziam. Re‑petiam e multiplicavam o que lhes fora ensinado desde a infância.

Quando um grupo conversava com o filósofo, era co‑mum que uma mesma pergunta recebesse respostas di‑ferentes e contraditórias. Normalmente, após certo tem‑po de conversa com o sábio, um ateniense via‑se diante de duas alternativas: ou zangar-se com a impertinência do filósofo perguntador e ir embora irritado, ou reco‑nhecer que não sabia o que imaginava saber, dispondo‑-se a começar, na companhia de Sócrates, a busca filosó‑fica da virtude e do bem.

Sócrates deu novo rumo à compreensão da ideia de felicidade, postulando, por exemplo, que ela não se re‑lacionava apenas com a satisfação dos desejos e neces‑sidades do corpo, pois, para ele, o homem não era só o corpo, mas, principalmente, a alma. Assim, a felicidade era o bem da alma, que só podia ser atingido por meio de uma conduta que ele considerava virtuosa e justa.

Para Sócrates, sofrer uma injustiça era melhor do que praticá‑la e, certo de estar sendo justo, não se intimidou nem diante da condenação à morte por um tribunal ate‑niense. Cercado pelos discípulos, bebeu a taça de vene‑no que lhe foi imposta e parecia feliz a todos os que o assistiram em seus últimos momentos.

Um outro grande modelo para os espíritas, pela si‑militude de ideias, foi o educador Johann Heinrich Pes‑talozzi (1746 – 1827), professor de Hippolyte Léon Deni‑

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zard Rivail quando este tinha apenas 11 anos de idade, no Instituto de Iverdon, na Suíça.

Um de seus trabalhos mais marcantes, a Teoria dos Três Estados de Desenvolvimento Moral14, trouxe à tona das discussões, de uma França iluminista, uma propos‑ta de hierarquia de valores humanos, extremamente coerente com o que sabemos sobre a evolução do ser, não só do ponto de vista socioantropológico, mas tam‑bém espírita.

Em resumo, Pestalozzi dizia que o ser humano atra‑vessaria três estados de desenvolvimento: estado natural, onde seríamos filhos do instinto, que nos conduz sim‑ples e inocentemente para todos os gozos dos sentidos ou prazer hedonista primitivo; estado social, em que nós, como espécie ou como povo, não nos submetemos mo‑ralmente ao Estado ou às leis, ou seja, aceitamos a socie‑dade e o estado de cidadania apenas para tornar nossa vida mais alegre e para gozar tudo o que nosso ser ani‑mal e sensorial tem que gozar e para que os dias sobre a Terra transcorram com satisfação e tranquilidade. O direito social não é assim um direito moral, mas apenas uma ampliação do direito animal. E, finalmente, o esta-do moral, que, segundo Pestalozzi, seria aquele no qual alcançássemos em nossa profissão tudo o que fosse pos‑sível alcançar.

Entretanto, há que se perguntar. Se nossa felicidade for garantida pelo direito, e, no pleno sentido da pala‑vra, formos cidadãos respeitados, estaríamos, então, sa‑

14. Trecho extraído do livro Minhas indagações sobre a marcha da natureza no desenvolvimento da espécie humana, escrito em 1797.

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tisfeitos no íntimo? Muitos pensariam que sim, mas não seria uma verdade. O direito social não satisfaz, o estado social não realiza. Não podemos permanecer tranquilos sobre o fundamento da formação civil, como não pode‑mos permanecer no mero prazer sensual e animal – nos‑sa alma entraria em desconfiança, sinuosidade e intran‑quilidade, que nenhum direito social poderia satisfazer.

Pestalozzi entendia que, apesar de nascer biologi‑camente como animais, a perfeição do homem, como ser vivo, estaria muito além dos limites físicos da nossa origem. Ele via nosso interior como divino, e fazia uma referência ao plantio da árvore ou da flor, quando colo‑camos esterco na raiz e a cobrimos de terra.

Mas, no fundo, o que fazemos ao ser íntimo da flor? A planta possui uma força em si mesma, que independe do meio. O material, através do qual a semente se desen‑volve, é de valor infinitamente menor que o da semente em si. Assim, mesmo que as circunstâncias, ou seja, o meio, fizessem o homem, este também fazia as circuns‑tâncias, com uma força em si mesmo: sua vontade.

Como obra da natureza, seríamos livres no mundo para fazer o que nos agrada e no direito de fazer o que nos serve. Como obra da espécie, estaríamos atados a relações e contratos, fazendo e suportando o que essas relações nos prescrevem como dever. Mas como obra de nós mesmos, estaríamos livres do egoísmo da nature‑za animal e das relações sociais e, ao mesmo tempo, no direito e no dever de fazer o que nos santifica e o que santifica nosso ambiente. Como obra da natureza, sería‑mos um animal perfeito. Como obra de nós mesmos, te‑

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ríamos que nos esforçar pela perfeição. A natureza fez a sua obra inteira, assim caberia a nós fazer a nossa.

Pestalozzi acreditava que nesse caminho podería‑mos encontrar um meio de trazer a natureza em har‑monia com nós mesmos. Que a natureza havia feito a parte dela e que nós fizéssemos a nossa parte. E que não poderíamos estacionar no ponto intermediário entre a natureza animal e a natureza moral, ou seja, o ser ina‑cabado. Por fim, uma de suas frases mais célebres, caso contrariássemos esses princípios: “Então não te espantes de que serás um costureiro, um sapateiro, um amolador ou um príncipe, mas não serás um homem”.

Mesmo separados por mais de 2 mil anos de histó‑ria, Sócrates e Pestalozzi teceram reflexões morais, cuja ideia central era muito similar. Muito natural que, acom‑panhando o progresso intelectual, no âmbito religioso, um ambiente em tese muito mais rico para o surgimento de reflexões morais, surgisse uma linha de raciocínio so‑bre a origem dos desequilíbrios morais humanos.

Um grande exemplo são os sete pecados capitais, quase tão antigos quanto o cristianismo. Mas eles só fo‑ram formalizados no século VI, quando o papa Gregório Magno, tomando por base as Epístolas de Paulo, definiu como sendo sete os principais vícios de conduta: gula, luxúria, avareza, ira, soberba, preguiça e inveja. A lis‑ta só se tornou “oficial” na igreja católica no século XIII com a Suma Teológica, documento publicado pelo teó‑logo Tomás de Aquino. No documento, ele explica o que os tais sete pecados têm que os outros não têm.

O termo “capital” deriva do latim, caput, que signi‑

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fica cabeça, líder ou chefe, o que quer dizer que as sete infrações são as “líderes” de todas as outras. A igreja até tentou oferecer soluções para os pecados capitais, crian‑do uma lista de sete virtudes fundamentais – humilda‑de, disciplina, caridade, castidade, paciência, generosi‑dade e temperança –, mas os pecados acabaram ficando mais famosos.

Com a evolução do conhecimento humano e a menor influência da igreja, os pecados capitais hoje são enten‑didos de maneira geral como hábitos negativos, junta‑mente com vários outros, como o egoísmo, o orgulho, a inveja, o ódio, a vingança, a maledicência, a impaciên‑cia, a intolerância etc.