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El Memorial de Rio Grande do Sul y su "Museu dos Direitos Humanos" junto al Consulado del Uruguay en Porto Alegre, el Colegio Israelita, la B'nei B'rit, el Instituto March Chagall y la Federación Israelita do Rio Grande do Sul presentan la muestra del artista uruguayo Roberto Saban: DEPORTADOS. Exposición que se inauguró en el 2012 en el Museo de la Memoria de Montevideo, itineró por las ciudades de Las Piedras, Minas, Maldonado y Buenos Aires. En esta oportunidad inaugura el 19 de junio y cierra el 15 de Julio en Porto Alegre. Curaduría y textos: María Eugenia Grau.

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Curaduría y textos:María Eugenia Grau

Roberto Saban

19 de Junho a 15 de Julho 2015

Rua 7 de Setembro 1020Centro Histórico - Porto Alegre

Memorial do Rio Grande do Sul

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"Abtransport von 20.5.1944”. Ficha nazi Figura la lista de deportados en el vagón “IV4b” del convoy 74. Camp de Drancy, Paris - Auschwitz. Las columnas corresponden al número de deportado dentro del convoy, el nombre de la víctima, año de nacimiento,

profesión y número de marca de detenido.

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Drancy (París). Lleva la firma del jefe del campo y ya tiene asignado el número de marca del destino fnal como detenido: 20776.

Recibo de los 1590 francos que portaba Isak Saban el 30 de agosto de 1944 al

ser confinado en el Campo de Concentración de

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Geld verdinen (detalle), 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Essex, 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Staatlos (detalle), 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Embarquement, 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Comedian harmonists, 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Salvajismos (detalle), 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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Agradecimientos

Secretaría de Estado da CulturaGoverno do Estado do Rio Grande do Sul. Brasil

Dirección General para Asuntos Culturales.Ministerio de Relaciones Exteriores del Uruguay

Sr. Bernard Kats y Sra.

Dr. Carlos Bua. Universidad de Leipzig

Colégio Israelita BrasileiroOrganização Internacional Judaica de Direitos Humanos "B'nei B'rith"Instituto Cultural Judaico "Marc Chagall"Federacao Israelita do Rio Grande do Sul

Consulado General del Uruguay en Porto Alegre

Admin
Texto tecleado
B'nai B'rith RS
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Geld verdinen (detalle), 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.

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DEPORTADOSRoberto Saban

Curadoria e textos :

María Eugenia Grau

DeportadosRoberto Saban

Desenho: Azul Cordo / Passaros Voando

www.robertosaban.com.arg

Memorial do Rio Grande do SulJunio-Julio

Porto Alegre- Brasil

Tradução ao português: Nibya L. Kats

deportadospoa.blogspot.com

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Cartas de Izak Saban

Faz dois anos que chegaram às minhas mãos cartas que Izak Saban enviou ao seu filho Nissim no fim dos anos ’30 / início dos ’40 do século passado. A família Saban, procedente de Bursa (Turquía) falava uma variação muito especial da língua espanho-la, o ladino ou juedeuespanhol, a qual escreviam mediante un alfabeto próprio e tradicional da sua cultura, que é uma variedade do alfabeto hebraico conhecido como escritura cursive (manus-crita) sefardi ou soletreo e que se escreve, portanto, da direita à esquerda. Sirvam de exemplos ilustrativos o começo de uma das cartas na qual indicava-se o destinatário e a parte final com a assinatura do remetente.

---------------------------------------------------------------------------------------------nabaS nisiN oji odirek ium la (= al muy querido hijo Nisin Saban)---------------------------------------------------------------------------------------------

Izak e sua esposa Dona Saban terminaram sua vida na capi-tal mundial do horror e do sofrimento, nem mais nem menos que em Auschwitz. Ele, um entre mais de um milhão de pessoas que lá foram humilhadas, maltratadas e assassinadas, mas suas cartas permitem-nos dar cara a uma delas e assim compreender melhor o que esse número tão enorme, tão inabarcável e incom-preensível realmente significa.

Meu fascínio pessoal pelo triste destino do emissário destacorrespondência e o interesse científico deste legado que à mim, na realidade, só me corresponde valorizar na sua justa medida no seu aspecto lingüístico levou-me a convertê-lo no meu projeto de graduação.

O valor lingüístico deste corpus epistolográfico reside no fato de que se trata de um dos poucos testemunhos de que dispomos da variação judeuespanhola da cidade de Bursa. Meu trabalho de pesquisa tem como objetivo estudar, sistematizar e expor as caraterísticas desta variedade de língua, conforme manifestam-se nestes documentos, para o qual é necessária a sua prévia edição crítica.

O problema principal reside nos adendos marginais e interli-neares que são numerosos e de leitura ainda mais dificultosa de-

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vido a que a letra aparece mais comprimida e menos nítida e está mais exposta aos danos próprios e das zonas marginais. Estamos tentando determinar a realidade fonética do texto, quer dizer, tentar averiguar como soaria o texto se fosse lido pelos próprios Izak e Nissim e tentar compreende-lo da forma mais completa possível.

A interpretação fonética é problemática principalmente no âmbito das vogais, ditongos e hiatos, já que o sistema de es-critura empregado os reproduz de forma muito imperfeita. A compreensão está dificultada pela ausência de pontuação, de acentuação própria deste sistema de escritura (não há pontos, vírgulas, sinais de interrogação, acentos, etc.) pelo léxico e ex-pressões de origem turca entremeados e pelo nosso desconhe-cimento de acontecimentos da vida de nossos personagens aos quais mencionam-se o que simplesmente se pressupõe-se.

O projeto ainda encontra-se na sua primeira fase de prepa-ração da edição crítica. Mas durante a minha estadia na Universi-dade de Heidelberg ofereci um curso dedicado ao judeoespanhol no qual nossos alunos aprenderam a ler soletreo usando preci-samente estas cartas. Alguns deles preparam a sua exposição e trabalho de conclusão de curso sobre elas. Todos ficaram muito impressionados e tão fascinados como eu pela língua e cultura sefardi em geral e pela experiência vital concreta que teve em sorte Izak Saban. Acredito que esse interesse e sensibilização ficarão gravados neles para sempre, pelo que pode se dizer que o meu trabalho com as cartas da família Saban já começaram a dar seus frutos.

Dr. Carlos BuaUniversidade de Leipzig

Março 2015

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Ante uma imagem –tão antiga como seja– o presente não cessa de reconfigurar-se (…)

Ante uma imagem –tão recente, tão contemporánea como seja– o passado não

deixa de configurar-se, sendo que toda imagem é pensável numa construção de memória.

Sempre, ante a imagem, estamos ante o tempo. Georges Didi–Huberman; Ante el tiempo1

O núcleo sustancial da exposição “Deportados” está constituídopor obras de caráter duplo realizadas ao longo de 2011. As mes-mas são acompanhadas por outras de observação frontal, por um espaço multi-mídia e alguns objetos. O conjunto pretende confi-gurar o espaço onde confluem, junto à sua última criação, com-plementos formais e conceptuais de provenienças várias: desde os arquivos do artista, até obras consideradas antecedentes de sua nova série; elos que somam e veiculam diversos aspectos formais como temáticos em comúm.

Tempos recortados: imágens-formasSe escolhessemos um únco ponto de vista, a série de Roberto Sa-ban narraria a peripécia de seus pais Nissim e Ellen no intento de sair de uma Europa convulsionada na vertigem fascista e anti-se-mita nos anos prévios à Segunda Guerra Mundial. Para destacar e personalizar o marco de procedência de cada um, o artista convida a observer suas obras, seja de seus avessos ou reversos, a maneira de um roteiro duplo de trajetos vitais. Os personagens terminarão conhecendo-se na travessía que – de-pois de muitas viscicitudes - conseguem concretisar na América. Outros familiares aparecem no centro do relato visual: os avós paternos e seu desenlace fatal. Eles sobrevoam toda a série, des-de seus avessos, como ausência, sem imagens concretas.

---------------(1) Didi-Huberman, Georges; Ante el tiempo. Editorial Adriana Hidalgo,

Buenos Aires, 2005, pág. 12

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Cronologías cruzadasIsaac (Isak) Saban: Nasce em Bursa, Turquía, 1862; morre em Auschwitz, Polónia, 1944 (Convoio 74, trasladado desde o Campo de Drancy).

Donna Cherasi: nasce na Grécia, 1886; morre em Auschwitz, Polónia, 1944 (Convoio 74, trasladada desde o Campo de Drancy).

Hermann Reininger: Nasce em Cernowitz, Bucovina (Império Austro-Húngaro) 1887; morre em Santiago de Chile, 1962.

Sofie Falikmann: Nasce em Cernowitz, Bucovina (Império Aus-tro-Húngaro) 1885; morre em Santiago de Chile, 1954.

Nissim Saban: filho de Donna e Isaac, nasce em Bursa, Turquía, 1914; morre em Montevidéu, 2004.

Ellen Reininger: Filha de Hermann e Sofie, nasce em Berlim, 1920; morre em Montevidéu, 1993.

A família de Saban era dona de uma bodega de anis e vinho na cidade de Bursa. Colhiam vide e tinham a sua própria refinaría no bairro judeu da cidade.

Suas origens remontam à Toledo (Espanha) até a expulsão pela Inquisição. Passados os séculos, a Lei Seca dos Jovens Turcos ocasionou a falência do negócio familiar. As medidas tomadas por Kemal Ataturk nos anos ’20 geraram repercusões familiares: por um lado foram benévolas com a judería, mas também estri-tas em relação com o service militar e contrárias aos interesses comerciais das vinícolas da família. Hoje a casa permanece intac-ta e a rua chama-se em turco: Rua do Bodegueiro.

1934: Nissim, desertor do exército turco, estabelece-se em Barcelona; a partir de então, chama-se Miguel. Partici-pa com os seus irmãos num negócio familiar: vende toalhas e gravatas (anos depois no Uruguai, seu filho escutava do seu pai o pregão de suas vendas na Espanha). Se dividem: o maior Jako (Jacques depois) no norte; Rafael e Nissim, no sul.

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1935: Hermann Reininger inventa secadores de cabelo de menor emissão de calor e mantém com as suas filhas a cabeleiraria da rua Büllowstrasse em Berlim.

1936: Com o início da Guerra Civil na Espanha, a venda ambulante para os Saban torna-se perigosa e Nissim – desocupado e perseguido – clama por sair do país. Possui um documento turco que não é válido nem para ficar no país nem para ir embora.

1937: Nissim escapa a Marselha ilegalmente junto com seu irmão Rafael. O maior, Jacques, fica preso, primei-ro pelos franquistas no norte da Espanha e depois pela polícia de Vichy que seguindo órdens da S.S. da França, o confina no Campo de Drancy. Sobreviveu pelo seu trabalho como cozinheiro desse Campo. Morreu em Paris em 1986.

1938: Nissim consegue um empréstimo de US$ 50, os necessários para que Panamá lhe conceda um visto de turista. Padece fome, desempregado, várias vezes lhe fazem ensaiar contra paredões de fuzilamento. O prefeito de Bouches de Rhone assina sua expulsão da França. Emite um documento de “Refus de séjour, nationalité apatride d’un passeport Nansen avec visa de transit” pela qual deve deixar o país no prazo de 30 dias.

1939: Solicita no consulado de Panamá em Marselha um visto para emigrar com a sua família. Rejeitado aos seus pais, outorgado a ele e ao seu irmão Rafael, consegue embarcar no vapor “Columbus” desde o porto de Marselha a Panamá. Deixa um amor no na-vío: Ellen Reininger, berlinesa de 19 anos, que viajava escapando com a sua família de Alemanha até La Paz (Bolívia). Nissim pede visto ao consulado boliviano no Panamá para entrar em La Paz. Várias cartas de Ellen Reininger expressam seu desejo de que Nissim emigre para Bolívia. As cartas estão escritas parte em inglês e parte em espanhol. Nissim estabelece-se em La Paz. Pede a um amigo turco que escreva suas

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cartas de amor em alemão. Com as poupanças dos primeiros meses de trabalho, compra os vistos e consegue a autorização de saída dos seus pais em Marselha e de um primo em Tanger.

Ellen trabalha no salão de cabelereiria do seu pai em La Paz. Pouco tempo depois, a família emigra para o Chile devido ao estado de saúde da sua mãe.

1940-44: Nissim recebe cartas de amigos turcos e franceses pedindo serem salvos junto com as suas famílias.

1941: Emite carta ao consul boliviano em Marselha recla-mando pela não chegada dos vistos aos seus pais, depois de anos de ter pago por eles com sobre-preço. Por meio do consulado suiço em La Paz, Nissim envia dinheiro à Cruz Vermelha de Genebra para ser entre-gue aos seus pais.

1942: Segue enviando dinheiro aos seus primos e ao pai, que sofrem fome e continuam reclamando para se-rem evacuados da França.

1943 (Novembro): No semanário alemão publicado en La Paz: “Rundschau von Illimani”, Hermann Reininger anuncia o casamento de sua filha Ellen com o Sr. Nissim Saban. No entanto, interrompe-se a corres-pondência de Isaac ao seu filho.

1944: Chegam boatos a La Paz, onde é dito que os vistos foram revendidos a outros prófugos com documen-tos falsificados. Isaac e Donna ficam em situação de desaparecidos.

1947: Um empresário uruguaio, de visita ao Lago Titicaca e agradecido pelos serviços de Nissim, convida ele a trabalhar no Hotel Nogaró de Montevidéu, no inverno e em Punta del Este no verão. O casal resolve emi-grar.

1948: Nasce em Montevidéu seu primeiro filho Roberto.

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1950: Nissim obtem a cidadanía e o passaporte uruguaio. Seu primeiro documento legal e válido que terá de-pois de 30 anos.

1953: Nasce em Montevidéu a segunda filha: Diana.

1962: A familía Saban em Montevidéu confirma que Isaac e Donna foram sequestrados e confinados no Cam-po de Drancy; chegam vivos a Auschwitz, levados às cámaras de gas e os seus corpos cremados.

No mesmo ano o governo alemão concede a Ellen Reininger a “Wiedergutmachung” (reparação histó-rica): uma indenização por razões de “não ter podido terminar seus estudos secundários”. Com esta repa-ração, a família realize uma viagem com o objetivo de percorrer todas as cidades onde residem os fragmen-tos das suas famílias.

Herman Reininger participa do julgamento de Eich-mann em Jerusalén.

2012: Roberto Reininger Saban reside em Buenos Aires desde 1977. Realiza seguidas viagens a Montevidéu, lugar escolhido para realizar a amostra “Deportados”.

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Saban denomina este conjunto: las cajitas (“as caixinhas”). Odiminutivo – ao qual acabamos acostumando numa gíria interna de intercâmbios – carece de ingenuidade: o artista inicialmente mostrava a sua obra como um jogo, especie de solilóquio com a sua história, ao qual desplazava para um canto secundário: as caixinhas eram concebidas como símiles de caixotes entre-fecha-dos, recordatórios autobiográficos demais, que não pretendia dar a conhecer.

A possibilidade de percorrer estas criações com movimentos circulares e envolventes nas suas duas partes, sugere uma mu-dança com o posicionamento tradicional, que mantemos como observadores ante uma obra plana. Outros aspectos produzem estranhezas singulares: a aparição saindo da fronteira habitual da obra, ou a inclusão de objetos que o artista foi achando em mer-cados e que iam lhe sugerindo diversas analogías com o desen-volvimento de sua criação.

Saban soma de todo, desprendido de qualquer preconceito referido a hierarquisação de materiais. Desta maneira enche o es-paço, violenta o espaço. O conjunto da série relata paralelamento um tempo de violência histórica, condensado em pequenos for-matos, que nos exige uma disposição física muito próxima.

Se estamos acostumados a procurer intuitivamente um centro nas obras - aquele que nos ajuda encontrar seu nó temático – se observamos com aderências culturais de leitura: da esquerda à direita, de cima abaixo; se estamos habituados a um modo de escutar relatos: do antes ao depois, da causa à conseqüencia, enfrentar-nos à Deportados nos produz um certo impacto. Saban desordena tudo, fragmenta tudo, o faz explodir.

Nessas resoluções formais radicam as claves do seu conteúdo.

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Heranças compartilhadasSe circunscrever a um único relato significaria reduzir a varieda-de expansiva dos processos da memória desplegados na série: multiplicidade das imagens, textos, selos, objetos, mapas… tudo um magma que excede o relato único. O conjunto poe em funcio-namento um universe de ancoragens variadas. Um deles radica na composição das obras, onde voluntariamente esquivam-se pontos organizados de observação; o artista agrega outros desvíos, especialmente cronológicos. O resultado redunda em unidades pequenas as quais formal- e conceitualmente terminam configurando sentidos de alto espesor. O resultado é o desborde da história privada e familiar numa sorte de herança coletiva.

No transcurrir de múltiplas entrevistas, o artista insistía em salientar: a série não está pensada para centra-se na Shoá. É a minha intenção, por meio de uma homenagem aos meus avós (deportados uns, assasinados outros, que esta obra seja capáz de se ampliar numa visão inclusive a todos aqueles, que por profes-sor outras religiões das oficiais, ou por pensar diferente, tenham sido históricamente perseguidos, expulsos, e assasinados 2.

Não obstante, o artista esolhe uma proposta que refere vi-sualmente à imagens estreitamente vinculadas a sentimentos de stupor e desesperança que atravessam amplos setores da socie-dade europeia da época; seja por sua condição de comunista, homosexuais, sindicalistas, ciganos, artistas abstatos, judeus … seres considerados outros, por conseguinte perigosos desde uma lógica de terrorismo de estado, própria de pensamentos totali-tários excluintes.

Saban consegue fusionar seu eixo temático com um campo plástico de diversas técnicas: gravuras, desenhos, óleos, proce-dimentos de envelhecimento sob material documental, todos recortados.

Trabalha em camadas sucessivas; em primeiro lugar escolhe como suporte óleos descartados – da sua autoría – que trata-vam temas locais de praia, tango, e milonga. Essas figuras, sem desaparecer por completa, ficam como substratos que invadem os novos relatos desde sua própria profundidade de execusão. Às vezes atuam como elementos cromáticos imprecisos: como figures fragmentárias indiferentes, e inclusive comentando esta nova trama temática.

A inclusão de pinturas outorga um aspecto paradoxal, por serem

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obras posteriors, ao tema tratado em camadas mais superficiais. Esses framentos de óleos emergem desde o fundo do soporte, apa-rentando rupturas na superficie, como se fossem de um jogo a mais de memórias/heranças ditadas a partir de sua própria criação. Saban transforma seus fragmentos de óleos em observadores omniscien-tes que (trágicamente) não podem evitar o destino que atravessarão os personagens do passado. Estas intervenções técnicas, vinculan-tes do tempo, representam leitmotiv de todo o conjunto. As obras da serie “Deportados” convidam a serem olhadas dupla-mente de um e outro lado, porque cobre tanto os anversos como os reversos, relatando períodos de memórias, com um resultado formal e conceitualmente envolventes. No conjunto prevalence a técnica do collage que permite tamper a modo de camadas super-postos os óleos que o artista pintou anos atrás.

“Essex” é um dos exemplos dos reversos que contém vários elementos documentários, manipulados e selecionados pelo artista e que concentram-se na história familiar maternal.

Tanto os anversos como os reversos contam histórias de perso-nagens expulsos de diferentes procedências com a escalada dos fascismos européios. Costumes, indumentárias, línguas – entre ou-tros aspectos culturais – marcam diferenças que os acontecimentos, porém, farão confluir enfrentados ao objetivo comúm de sobreviver.

Como o resto do conjunto, “Essex” também esta atravessada por anacronismos nos quais Saban trabalha superpondo tempos, sem respeitar a ordem cronológica, e sim obedecendo a uma poética pessoal sugerida pelas lembranças. Entre imagens que denotam o enorme caos histórico de pesadelos pode distinguir-se uma queanuncia um destino imprevisível: a fotografia recortada “bandeirin-ha uruguaia na mão” que é o próprio artista com a sua avó; outro salto temporal.

A obra leva o nome da marca do automóvel que a família da sua mãe tinha na Alemanha e que hoje descansa como fotografía e brin-quedo acima do bastidor da obra, em forma de objeto achado.

---------------(2) A obra “FALCÓN” é um exemplo da intrusão de imágens de terrorismos vivi-

dos desde a história recente. Assim o artista refer em forma direta a esse tipo de

automóveis pela repressão na Argentina para operativos de seqüestro. Adicionava

a palavra trens numa clara identificação à transportes de reclusão de morte duran-

te a Segunda Guerra Mundial.

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O mal do arquivo ou essa impe-riosa necessidade...........

“do desejo de arquivar, apresenta-se como parte do desejo de encontrar ou localizer ou possuir o momento de origem das coisas” 3.

Todas as obras das series se nutrem de textos que procedem, na sua maior parte, de cartas familiars 4. Este intenso intercâm-bio epistolar, relaciona-se com as súplicas dos avós paternos de conseguir uma saída de Marselha, ante as constances ameaças de deportação. A pesar dos esforços do filho Nissim em tirar eles da França – escreve a governos e a associações solidárias, manda dinheiro para expedir passaportes e vistos que ficam pelo ca-minho – os idosos são confinados primeiro no Campo de Drancy (nos arredores de Paris) e desde alí transladados finalmente a Auschwitz onde são vítimas do genocídio. Essa correspondência – que estava escrita numa caligrafía rashi ou solitreo hoje inentili-gível – silencia-se abruptamente e o desenlace final é confirmado muitos anos depois 5. O artista inclui outros fragmentos de cartas em inglês, em espanhol, e em ladino, nas quais ainda hoje é possível ler as descrições dos tratamentos anti-semitas em vários lugares de Europa.

Estes documentos são resultado de uma persistente recoleção de testemunhos. Junto às cartas, a obra de Saban abunda em desenhos superpostos e recortados onde figuram idosos sozin-hos, malas, vagões, metáforas diversas do terror e o extermínio. As imagens cruzam-se com muitas outras também freqüentes: selos, pedaços de documentos de passaportes, que destacam em diferentes línguas a condição de “Deportados”, apátridas, permis-sos de permanência mínimos, expulsão.

Ante estes fragmentos que remetem às situações de pesadelo, o artista mistura outros tantos que paralelamente dão conta demomentos vitais tão felices, correqueiros e intransferíveis como os de todas as pessoas; imagens de ferias, partituras de melodías de moda, artistas de cinema, amores, aspirações.

Toda a série esta atravessada por descontinuades e relatos contrapostos onde saltam ou fundem-se diferentes tempos: fo-tografías de damas do ‘900 e dos anos ’40, velhos com indumen-tária turca tradicional; manifestações das juventudes nazistas; um menino pequeno (o próprio artista) segurando a bandeirinha

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uruguaia nos começos dos ’50.A estranheza que provocam acentúa-se com a intrusão de

objetos que participam – um tanto satíricamente – em várias das obras; algumas figures saindo das bordas como curioseando, colaboram em produzir outras interrogantes.

---------------(3) Carolyn Steedman. “Something she called a fever: Michelet, Derrida and Dust”

citado em Lacapra, Dominick, “Historia en tránsito”, Fondo de Cultura Económica,

Buenos Aires, 2004, pág. 46.

(4) O material epistolar foi achado pelo artista numa pequena carteira de cou-

ro, que provinha da Europa, quando a morte do seu pai em 2004. Materialisa o

intercâmbio desesperado entre Nissim Saban e o seu pai e termina em quanto o

filho Morava na Bolívia. Ao erradicar-se no Uruguai, trouxe elas consigo, conser-

vando-as até a sua morte – junto a outros objetos de valor – naquela carteirinha

de couro. O objeto faz parte da amostra.

(5) “As cartas escritas em rashi,caligrafía medieval caraterística dos judeus es-

panhois, hoje são indescifráveis. Nem espertos em línguas mortas, nem rabinos

sefaradies idosos, tem conseguido ler os textos (………) como se fosse de hiero-

glífos que velhas gerações legaram aos seus descendentes; o artista faz as vezes

de arqueólogo, resgata essas cartas do esquecimento”. Dra Karen Saban; panel

explicativo da série: Cartas de mi abuelo turco, Roberto Saban, 2008.

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Tecnica de gravurocom fotopolímeroEssas velhas cartas originais – como outros exemplos documen-tários que nutrem a série – foram submetidos pelo artista a um lento processo técnico de gravuras sob pranchas de cobre. A téc-nica, relativamente recente, foi aprendida no atelier da gravurista Alicia Díaz Rinaldi.

Os documentos foram fotocopiados préviamente num filme transparente ou filmina. As placas foram envolvidas num outro filme particularmente sensível aos claroscuros. Com uma lámpa-da de calor geirou-se um complexo processo de “marcado” na placa, o qual permitiú sua posterior impressão no papel com um resultado final semelhante a água forte.

Assim, cada fragmento documental na obra de Saban – quem à primeira visão sugere um recorte e cole de caráter espontáneo e rápido – é o resultado de uma meticulosa excecução.

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A colagem e os tempos recortadosPara teóricos como Theodor Adorno, a caraterística fundamental da arte do século vinte, centrava-se na colagem. Para ele, a nova técnica constituía um equivalente do mundo. Sua pretensão, além de copiá-lo era fazer-nos vê-lo de maneira contraditória e penetrante. Desde esse ponto de vista, a colagem permite ver o mundo ao tempo que o afasta. Seu desenvolvimento, a possibili-dade de introdução de diferentes materiais e técnicas, e o manejo que faz do tempo, producem certas surpresas ao mesmo tempo que colaboram no vislumbrar correspondências comunicantes com a obra de Saban.

Cem anos após de sua produção no ocidente o artista insiste na técnica de colagem como um grande guardachuvas embaixo do qual desenvolvem-se outros de seus procedimentos técnicos. Fazendo uso dele, consegue manipular recortes de passados que apresenta à maneira de montagem. Nesse sentido sua proposta está estreitamente vinculada com a noção de história de Walter Benjamin, quem concebe os períodos históricos na equação de tempos/espaços que se batem, pontos que permitem enxergar as marcas do tempo. O artista parece afirmar – como o teórico Dominick Lacapra – que as coisas estiveram no passado, contém um futuro irregular, em parte impredescível e algo fantasmático. “O passado foi marcado por outros passados e também pelas suas mais ou menos enganosas anticpações de futuros” 6. Assim do seu jeito, vai registrando marcas ou heranças compatilhadas desde sua própria experiência de memória, na liberdade de es-colha dos fragmentos e na trama associativa que eles lhe pro-vocam; constroi, reconstroi e desconstroi, tanto materiais como situações.

Cá e lá deparamos com fotografías. Sabemos que nalgumas delas, registram-se seus familiars: pai, mãe, avó paterno, avô maternal, o mesmo artista, porém, muitas outras representam seres não reconhecíveis, fotografías adquiridas em mercados que vendum albuns abandonados. Todos esses personagens são alí, na construção revulsiva de Saban (e que nos remete à expressão de Martin Heidegger quando explicava sua noção de tempo) 7.

Cartas de outros, rostos de outros, acaso o artista tenha pre-tendido apresentar uma corrente de tempos não lineais nos quais coexistem ecos de si-mesmo. Pelo que o outro congelado (em fo-

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tografías e tantas vezes anónimo) reconfigure-se num dramático: sou eu ; tal vez intuido desde perspectivas temporais que fazem brincar com analogías e anacronismos 8. Esses tempos hetero-geneos possibilitam um amplo leque simbólico. Tal visualidade exige que sua obra seja examinada desde o ánguloda memória, que dizer desde as manipulações, desplazamentos técnicos, descontinuidades provocadas a partir de múltiplas construções cronológicas.

É o artista do proveedor de imagens o agente que colabora nos processos de memóros comuns a todos. Ele faz isto desde sua participação num acontecimento ou através da materialização artística de suas lembranças.

O percurso da obra de Saban confronta-nos com um itine-rário familiar de passados marcados por outros passados e suas antecipações de futuro. São as caixas que denuncíam através de materiais decapados múltiplos percorridos vitais em tempos de estupor .

María Eugenioa GrauMontevidéu, fevereiro de 2012.

---------------(6) Lacapra, Dominick: Ob. Cit. pág. 50.

(7) “Quando Heidegger explicava o conceito de tempo, sinalizava que sempre

há alguma coisa que não ha terminado, sempre estou a caminho com meu ser

alí. Quando esse alguma coisa não falta, o ser alí já não é”. Em Bozal, Valeriano:

O tempo do stupor; Edições Siruela, Madri, 2003, pág. 36. (8) O filósofo Primo

Levi transforma a noção de Heidegger. Reconsidera em clave contemporánea o

“ser alí” nutrindo-o especialmente de “intercambiadilidade com os outros (…) no

tempo de hoje e de amanhã (…) Eu sempre sou o outro” ; Levi, Primo; Se isto é

um homem; Muchnik Editores, Barcelona, 2001, pág. 229.

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Listado de obrasAvesso Reverso

Exiliado Tú?Zeugnis FascistenRassemblement Wie manSalvajismos La PazaEmbarquement ZeitungDéfense Nationale Comedian HarmonistsGeld verdienen Rose d’amourFalcon EssexRefus de sejour FremdenpassVítimas Expulsão

Medidas 20 x 30 cm

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Roberto Saban Montevidéu, 1948

– Fundación Esteban Lisa, Buenos Aires. Profesor Isaac zylberberg.– Prácticas en el Círculo de Bellas Artes de Bs. As.– Academia Profesor Edurado Mc Entyre.– Seminarios en el Museo Nacional del Grabado de Buenos Aires.– Seminarios de arte Sumie.– Taller AXA, grabadoras Gabriela Aberastury y Lucrecia Orloff.– Taller de Grabado de Alicia Díaz Rinaldi.– Seminarios de acuarela en la Fundación Academia Guillermo Roux.– Taller de Gabriela Aberastury: Espacio Camargo.

Ilustrações– Argentina: Colaborou com ilustrações comemorativas. Consulado Uruguaio.– México: Portada para o livro ganhador do Premio Nacional de Poesia E.G. Rojo Arthur 2008.– Buenos Aires. Portada da novela Des-encontros de Roberto Miguelez, Editorial Dunken, 2010.– Montevidéu. Gravuras e desenhos comemorativos. 45 aniversário PIT-CNT y 11 Congreso del PIT-CNT. 2011.

Amostras coletivasBuenos Aires, Rosario, Salta (Argentina), Ayuntamentos de la Diputación de Toledo (Espanha), Tokio, Yokosuka (Japão), República Checa, Devon, Sussex (Inglaterra), Montreal, Montevidéu, Nova York.

Amostras individuaisMontevidéu, Durazno, Maldonado, Salto, Buenos Aires, Rosario (Santa Fe), Londres, Roma, Paris.

www.robertosaban.com.ar

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ReferênciasTapa: 1939 (detalhe)

Pág. 4, Falcon (detalle)

Pág. 7, página do relatório nazista do “Abtransport von 20.5.1944” onde figura a lista dos deportados no vagão “IV4b” do convio 74. Camp de Drancy, Pa-ris-Auschwitz. As colunas correspondem ao número de deportados dentre do convoio, o nome da vítima, ano de nascimento, profissão e número de marca do detenido.

Pág. 8, recibo dos 1590 francos que portava Isaac Saban o 30 de agosto de 1944 ao ser confinado no Campo de Concentração de Drancy (Paris). Leva a assinatura do chefe do campo e já tem assinado o número de marca do destino final como detento: 20776.

Pág. 9, Zeitung (detalhe)Pág. 10, Homenagem ao pai (2000) (detalhe)Pág. 11, Falcon (detalhe) Pág. 12, Geld verdienen (detalhe)Pág. 13, Wie man (detalhe)Pág. 14, Zeitung (detalhe)Pág. 15, Tú?Pag. 16, EssexPág. 19, Défense Nationale (detalhe)Pág. 20, Staatlos (detalhe)Pág. 21, EmbarquementPág. 22, La Paz (detalhe)Pág. 23, Zeugnis (detalhe) Pág. 24, La Paz (detalhe)Pág. 27, Défense NationalePág. 29, Comedien HarmonistsPág. 30, Salvajistmos (detalhe)Pág. 32, Geld verdienen (detalhe)

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Uma unidade indivisa

“………….o passado foi marcado por outros passados e também pelas mais ou menos en-

ganosas antecipações de futuros” Dominick Lacapra

Com esta citação María Eugenia Grau termina a sua apresentação da exposição “Deportados” de Roberto Saban e eu começo com ela esta pequena introdução, porque este pensamento de Domi-nick Lacapra nos fala de que a realidade do mundo entende-se pela sua mobilidade indivisível, onde presente e passado são uma unidade indivisa. O passado conserva-se por si mesmo de maneira automática, embora não sejamos conscientes disso.

Às vezes refletimos sobre o nosso passado recente de ditadura e opressão, com violações sistemáticas dos direitos humanos, e o recortamos do resto da nossa história como se houvesse sido um episódio isolado, sem antecedentes.

O que a exposição de Roberto Saban nos diz é que por trás de um passado há outros passados que o explicam e que a história da humanidade é uma só, além dos espaços geográficos onde acontece.

Por baixo do nosso passado recente marcado pela terrorismo de Estado há outros passados de autoritarismo anti-democrático que estabelecem uma continuidade dentro da nossa identidade nacional e dentro da nossa civilização, onde os genocidios e o terrorismo de Estado são expressões desta civilização onde esta-mos imersos e nos questionam permanentemente à respeito.

Saban expressa isto com as ferramentos da arte, trabalhando na representação da Memória. Representar é tornar presente aquilo que não esta; é fazer presente a ausência, trazer-a no-vamente a nossa Memória. Representar é produzir no campo simbólico.

Os fatos passados só podemos fazê-los presentes por meio de uma representação simbólica. Por meio do símbolo o pen-samento faz alusão ao ausente e imagina o que, além de toda linguagem, é da ordem do inefável e originário. Como narrar o inenarrável que significa a tortura, por exemplo?

O símbolo, superposição inesgotável de estratos do sentido,

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faz falar nele ao enigma.O mito, a arte e a religião são da ordem do símbolo; e a arte

aparece como instrumento destacado para representar a memó-ria. A criação artística incorpora a subjetividade, a intencionalida-de e a significação, qualidades que entendemos como caraterísti-cas da Memória.

Com a arte constrói-se um sentido para o passado e cons-troi-se o presente. As obras de arte generam um acontecimento na pessoa que enfrenta-se a elas, produzindo uma singularidade pela qual a pessoa constroi seu próprio relato.

A representação simbólica é o que faz perdurar a Memória Histórica na consciencia do coletivo. Quando consigamos pro-duzir um volume significativo de literatura, obras de arte, filmes, relatos, memoriais onde a sociedade se identifique, teremos con-seguido gerar uma consciencia coletiva sustentada no simbólico.

“Deportados” avança nessa direção.

Elbio FerrarioCoordenador do Museo de la Memoria

MUME Montevidéu, fevereiro de 2012.

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---------------------------------------------------------------------------------------------Défense Nationale, 2011 Meios combinados, decapados, óleos, etc. 20x30 cm.---------------------------------------------------------------------------------------------

O título da obra responde a um pamfleto de rua – que na suaversão completa convocava à insurreção operária contra o regime de Vichy na França – achado pelo artista entre as cartas que guardava do seu pai. Configura um dos exemplos com mais textos da série entre “Deportados” na qual destingue-se com clareza uma multiplicidade de línguas: rashi, ingles, espanhol, processadas como fundo de imagens ou como superficies. Saban trabalha encima de soportes de óleos de sua autoria, aos quais cobre quase na sua totalidade com fragmentos de documentos reutilizados, recortados e dispostos na modalidade técnica de colagem, decolagem, decapado. Sempre sem pretender controlar cada fragmento – e a partir e uma primeira escolha documental – permite ser influenciado por uma associação continua onde oselementos interagem. Algúns restos de seus óleos reaparecem – como pode-se ver com clareza no rosto que emerge desde ofundo do soporte que pareceria observer desde o futuro ao per-sonagem encostado na sua mala -. Desta maneira o artista vincula tempos diferentes: as vezes concentra-os em acontecimentos vertiginosos e globais prévios á Segunda Guerra Mundial, que fuciona a seu passado familiar; outras, dá pulos cronológicos. Maneja tempos subjetivos, anacró-nicos, desde os quais denuncía os futuros latentes que as figures ignoram.

Défense nationale, 2011. Medios combinados, decapados, óleos, etc., 20 x 30 cm.