cartilha boas práticas agropecuárias

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Experiência das famílias agricultoras do Assentamento Nova Cotriguaçu - MT com manejo de pastagem e criação de gado leiteiro Boas Práticas

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Page 1: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Realização

Experiência das famílias agricultoras do Assentamento NovaCotriguaçu - MT com manejo de pastagem e criação de gado leiteiro

Boas Práticas

Page 2: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias
Page 3: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

1ª Edição

Cotriguaçu – Mato Grosso – Brasil2014

Experiência das famílias agricultoras do Assentamento NovaCotriguaçu - MT com manejo de pastagem e criação de gado leiteiro

Boas Práticas

Page 4: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Instituto Centro de Vida

Boas Práticas: Experiência das famílias agricultoras do Assentamento Nova Cotriguaçu ‐ MT com manejo de pastagem e criação de gado leiteiro. Textos: Camila Rodrigues, Daniel Ferreira, Sandra Regina – Cotriguaçu, MT: Instituto Centro de Vida, 2014

48p. : il. ISBN : 978‐85‐623611‐07‐4 1. MANEJO DE PASTAGEM. 2. GADO LEITEIRO. 3.

SUSTENTABILIDADE. 4. AGRICULTURA FAMILIAR. I. Rodrigues, Camila. II. Ferreira, Daniel. III. Regina, Sandra. IV. Título

EXPEDIENTE

Projeto Cotriguaçu Sempre Verde

Coordenador do Projeto - Renato FariasAssistente de Coordenação - Camila RodriguesEquipe TécnicaCarolina Jordão (Gestão Ambiental Municipal);Elisângela Sodré e Suzanne Scaglia (Governança Socioambiental nos Assentamentos);Rodrigo Marcelino (Integração Áreas Protegidas);Sandra Regina (BPA Leite);Vando Oliveira, Eduardo Florence e Vilmar Andretta (BPA Corte); Bruno Simionato (Prodemflor);Vinícius Silgueiro (Geotecnologias); e Daniela Torezzan e Andrés Pasquis (Comunicação).Textos - Camila Rodrigues, Daniel Ferreira e Sandra ReginaRevisão - Camila Rodrigues, Daniel Ferreira e Daniela TorezzanFotografias- Arquivo ICV, Daniel Ferreira e Sandra ReginaProjeto Gráfico - Fátima Silva

Atribuição-NãoComercial-CompartilhaIgual CC BY-NC-SAEsta licença permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho para fins não comerciais, desde que atribuam a você o devido crédito e que licenciem as novas criações sob termos idênticos

Page 5: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

AgradecimentosÀs 15 famílias envolvidas, que toparam

essa iniciativa juntamente com o ICV;Às associações rurais do Assentamento

Nova Cotriguaçu;Ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais

e a Prefeitura Municipal;e à equipe, parceiros e colaborares do ICV.

Page 6: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Encontro de avaliação com as famílias do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde

Page 7: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

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Sumário

Capítulo IComeço de Conversa

Capítulo IIConhecendo o Instituto Centro de Vida

Capítulo IIIDesvendando o Projeto Cotriguaçu Sempre Verde

Capítulo IVOlhares sobre Cotriguaçu

Capítulo VProduzir melhor, sem desmatar a floresta

Capítulo VIColhendo os frutos

Capítulo VIIMais conhecimentos e aprendizagem

Capítulo VIIIOlhando para o futuro

Protagonistas dessa história

Fontes de Pesquisa

Page 8: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Sistema de piquetes na área do agricultor Dezílio

Page 9: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Esta publicação integra o campo de estratégia de

ação do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde do Instituto Centro de Vida (ICV), como forma de valorizar a produção e disseminação do conhecimento pelas famílias agricultoras envolvidas e, também, como meio de sistematizar toda essa experiência vivenciada pelos agricultores e agricultoras, colaboradores, parceiros, redes de articulações e equipe do ICV com o manejo de pastagem e cr iação de gado le i te i ro no Assentamento Nova Cotriguaçu no município de Cotriguaçu, noroeste do Mato Grosso.

A cartilha “Boas Práticas - Experiência das famílias agricultoras do Assentamento Nova Cotriguaçu - MT com manejo de pastagem e criação de gado

leiteiro” traz a sistematização de experiências e ações vivenciadas por esse conjunto de atores nos últimos, quase, quatro anos. A publicação permite aos agricultores/as envolvidos/as refletir essa trajetória percorrida para empoderamento do conhecimento e transmitir essas aprendizagens a outros grupos ou atores.

Para chegar até esta publicação foi realizado um processo ordenado e participativo, envolvendo as

famílias agricultoras, equipe do ICV e parceiros, na reconstrução das experiências; na geração de conhecimentos por meio da reflexão crítica dos

Começo de conversa

Cap

ítu

lo I

Sistematização é um exercício de aprendizagem,

produz novo conhecimento. As experiências dos

agricultores e agricultoras familiares são

carregadas de sabedoria, precisam virar letra,

palavra e página para compor histórias. Histórias

para serem lidas, promover reflexões e ganhar o

mundo. Assim como esta cartilha que traz

desafios e conquistas de um processo coletivo de

práticas e aprendizagens.

capítulo

Iagentes que participaram delas; e na construção dos aprendizados resultantes, tanto para dentro do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde quanto em direção ao seu entorno. Esperamos que esta cartilha traga não só um espelho de uma experiência que vem dando certo no manejo de pastagem e produção de leite, mas os desafios que os agricultores e agricultores pecuaristas vêm ultrapassando para chegar nos resultados exitosos. Sabemos que todo o conjunto de iniciativas não está pronta e acabada, precisa avançar mais para consolidar numa proposta de agricultura familiar integrada à pecuária de forma sustentável.

Um bom passeio por essa experiência. Uma boa

leitura!

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Page 10: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Oficina de Sistematização de Experiência com os/as agricultores/as

Page 11: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O Instituto Centro de Vida (ICV) é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), fundada em 1991. Apresenta como missão “construir soluções compartilhadas para a sustentabilidade do uso da terra e dos recursos naturais” e tem como visão de futuro que o “Mato Grosso torne-se referência em g o v e r n a n ç a a m b i e n t a l e c o n t r o l e d o desmatamento, com as áreas protegidas efetivamente conservadas e manejadas, uma produção empresarial agropecuária e florestal pautadas em práticas sustentáveis e uma agricultura familiar fortalecida com base agroecológica”.

Nesses 23 anos de trajetória no Mato Grosso, o ICV já atuou em regiões do Território Portal da Amazônia, região oeste da Bacia do Xingu, Noroeste e Bacia do Alto Paraguai. O Instituto possui sede na capital do estado e escritórios nos municípios de Alta Floresta e Cotriguaçu. O ICV desenvolve suas ações baseadas em sete iniciativas temáticas (Transparência Florestal, Incentivos Econômicos, Defesa Socioambiental, Pecuária Integrada, Desenvolvimento Rural Comunitário, Bom Manejo Florestal e Municípios Sustentáveis) e três núcleos (Articulação em Redes, Comunicação e Geotecnologias).

Quer saber mais sobre oInstituto Centro de Vida?

Acessewww.icv.org.br

Conhecendo o Instituto Centro de Vida

capítulo

II

9

O trabalho do ICV consiste em construir ações compartilhadas e articuladas de sustentabilidade que visam conciliar a produção agropecuária e florestal com a conservação e recuperação dos ecossistemas naturais e de seus serviços. A atuação do Instituto tem como base estudos e análises, bem como em experiências práticas no campo, sempre buscando a participação efetiva e ativa dos atores locais nesse processo.

A disseminação da produção do conhecimento é um campo importante para o ICV, que se dá por me io da comunicação soc ioambienta l , capacitação e empoderamento de grupos sociais em seus mais diversos contextos. Um marca importante também na caminhada do Instituto é o trabalho em parceria, que contribui para ampliar resultados e incentivar a formação redes com outras organizações e coletivos de diversos setores da sociedade.

Page 12: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Agricultor Joel de Jesus e seu filho na área de lazer das vacas leiteiras

Page 13: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Desvendando o Projeto Cotriguaçu Sempre Verde

Desde 2011, o Projeto Cotriguaçu Sempre

Verde atua com diferentes grupos da sociedade local com o apoio do ICV, de parceiros, e do Fundo Vale. Atua para a promoção de nova trajetória socioeconômica e ambiental para o município de Cotriguaçu com atividades que permitam a manutenção da floresta, reduzindo o desmatamento e a degradação florestal e apoiando o desenvolvimento de atividades produtivas com menos impacto sobre os recursos naturais.

O Projeto está arquitetado em cinco grandes frentes que fazem parte das estratégias de envolvimento e resultados das ações: 1 ) Ges tão amb ien ta l municipal; 2 ) P r o g r a m a d e Desenvolvimento do Bom Manejo Florestal (Prodemflor); 3) Governança social e a m b i e n t a l n o s assentamentos; 4) Integração das áreas p r o t e g i d a s ( T e r r a Indígena Escondido e Parque Igarapés do Juruena); e

capítulo

III5) Boas Práticas Agropecuárias (BPA) para o gado de corte e leite. Esta cartilha resgata toda a construção da experiência e vivência deste último componente com o manejo de pastagem e criação de gado leiteiro com as famílias agricultoras do assentamento Nova Cotriguaçu.

As ações do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde procuram conciliar o desenvolvimento econômico da produção agropecuária, florestal e de base a m i l i a r c o m a c o n t í n u a r e d u ç ã o d o desmatamento e da degradação florestal. Para alcançar esses resultados do Projeto, busca-se também aprimorar a gestão e as práticas em todos os níveis, desde a gestão pública municipal

até a propriedade individ-ua l , p r imando pe la articulação de diversos atores locais e parcerias institucionais.

Esta publicação traz as experiências das BPA para o gado de leite no intuito de promover novas práticas para melhor gestão da área rural, em que vivem e

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Agricultores/as, parceiros e equipe do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde

Page 14: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

trabalham os agricultores e as agricultoras familiares, a partir do manejo sustentável de pastagem e produção agrícola consorciada. O manejo adequado dos animais e do capim gera um sistema mais equilibrado, possibilitando tanto um ganho econômico, através do aumento da produtividade, na qualidade animal, do leite e da pastagem, como também contribui para a conse rvação dos r e cursos na tura i s - principalmente solo e água - e diminui a pressão sobre as áreas de florestas, devido ao aumento na capacidade de suporte da pastagem.

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Sistema de piquetes com manejo do pasto

Curso de formação para famílias agricultoras

Page 15: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O município de Cotriguaçu, com apenas 23 anos de emancipação, está localizado no Noroeste do estado do Mato Grosso. Tem uma população estimada em 16.689 habitantes (IBGE, 2013) numa área de 9.460 km². Possui três áreas protegidas, que são o Parque Estadual Igarapés do Juruena, Parque Nacional do Juruena e a Terra Indígena Escondido.

A exploração da madeira é uma das fontes de renda da população por ser um polo florestal, no entanto, a pecuária se apresenta como uma atividade em forte expansão, com um rebanho de mais de 200 mil cabeças. Existe uma população rural muito representativa nos assentamentos de reforma agrária e nas Terras Indígenas Escondido, da Etnia Rikbaktsa. A população rural é de 9.855 habitantes, ou seja, é um município mais rural quando analisados os números dos moradores da área urbana que é de 5.132 habitantes. Ao todo, são 2.571 famílias que vivem no meio rural.

Em média, o valor do rendimento mensal por pessoa nos domicílios rurais é de R$ 170,00. O mapa da pobreza e desigualdade no município aponta para 37,66%. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Cotriguaçu é de 0,601 (IBGE, 2010).

Cotriguaçu está entre os 23 municípios da Amazônia Legal considerados prioritários para

Olhares sobre Cotriguaçu

capítulo

IVações de controle e prevenção do desmatamento. O munic íp io se des taca por uma taxa de desmatamento mais elevada que a média regional e pela diversidade das tipologias fundiárias e usos da t e r r a p r e s e n t e s e m s e u território.

N o m u n i c í p i o h á t r ê s assentamentos: Projeto de Assentamento (PA) Juruena, PA Cederes e PA Nova Cotriguaçu. E s t e ú l t i m o é considerado o segundo maior assentamento do e s t ad o c om 1 . 2 8 2 famílias e é nele que são desenvolvidas as ações das B o a s P r á t i c a s Agropecuárias com gado leiteiro.

IDH serve de comparação entre os países (ou municípios),

com objetivo de medir o grau de desenvolvimento econômico

e a qualidade de vida oferecida à população. O IDH vai de 0

(nenhum desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento

humano total). Quanto mais próximo de 1, mais desenvolvido

é o país ( ou o município).

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Page 16: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Assentamento Nova Cotriguaçu

Fundado em 1993, está localizado ao oeste do município de Cotriguaçu numa área de 95.058 hectares entre as Terras Indígenas Escondido (ao leste) e o Parque Nacional de Juruena (ao norte). Ao todo, são 10 comunidades dentro do Assentamento, destas, duas são núcleos urbanos (Nova Esperança e Nova União). E, no total, o Assentamento está dividido em 1.502 lotes.

As ações de Boas Práticas Agropecuárias com manejo de pastagem e criação de gado leiteiro são realizadas nas comunidades Novo Horizonte, Ouro Verde e Santa Clara. São 15 famílias agricultoras trabalhando em 15 sistemas

Amazônia Legal é uma área que corresponde

a 59% do território brasileiro e engloba a

totalidade de oito estados (Acre, Amapá,

Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia,

Roraima e Tocantins) e parte do estado do

Maranhão, perfazendo cinco milhões de km².

Nela, residem 56% da população indígena

brasileira. O conceito de Amazônia Legal foi

instituído em 1953 e seus limites territoriais

decorrem da necessidade de planejar o

desenvolvimento econômico da região e, por

isso, não se resumem ao ecossistema de

selva úmida, que ocupa 49% do território

nacional e se estende também pelo território

de oito países vizinhos.

14

Mapa de Cotriguaçu dentro da Amazônia Legal

integrados de pastagem, criação bovina leiteira e produção agrícola.

As famílias assentadas no PA Nova Cotriguaçu são resultado do processo de luta e conquista da reforma agrária. Apesar de a região ser mon tanhosa e d e s o l o r a so , há uma predominância de pastagem, principalmente para produção leiteira e, em menor escala, uma diversidade de cultivos na agricultura familiar, como feijão, milho, café, mandioca, fruteiras, hortaliças, pupunha, inhame, abóbora e babaçu.

Page 17: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O Assentamento é muito rico em recursos hídricos, como nascentes, córregos, riachos e cachoeiras. Todas as áreas rurais têm acesso à água potável, seja em cacimbas, nascentes, rios ou água encanada por gravidade.

A chegada da energia elétrica é recente na localidade. O uso das telecomunicações (orelhão e celular) ainda é limitado. As estradas principais e vicinais são de péssimo acesso, devido às constantes chuvas que caem na região e ao tráfego de caminhões e carretas pesadas com madeira, gado e tanques de leite – que saem diariamente do Assentamento, ou que apenas passam por ele, para comercialização em Cotriguaçu e em outros municípios, como Colniza.

RAIO-X

Novo Horizonte

70 famílias

Associação dos Pequenos Produtores Rurais

Juntos Chegamos Lá

Ouro Verde

70 famílias

Associação Grupo de Reflorestamento

Agroindustrial Ouro Verde do Norte

Santa Clara

30 famílias

Associação dos Pequenos Produtores Rurais

de Santa Clara

Cada lote ocupado pelas famílias tem, em

média, 50 a 100 hectaresCRITÉRIOS DE SELEÇÃO DAS FAMÍLIAS

Ter uma infraestrutura mínima nas áreas, como cercas, currais e bebedouros em áreas da ordenha do leite;

Participar dos cursos, reuniões e oficinas do Projeto;

Ser produtor de leite e ter gado leiteiro; Disponibilizar a propriedade para demonstrar

a experiência, recebendo visitas e apoiando o monitoramento das unidades;

Oferecer uma contrapartida (mão de obra e madeira);

E residir pelo menos há cinco anos no Assentamento.

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Page 18: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

PERFIL DAS COMUNIDADES

Aptidão e vocação para pecuária de leite, com um número significativo de produtores;

Dificuldade no escoamento produção, com necessidade de melhorar a organização social

Altos índices de degradação nos recursos hídricos e nas pastagens;

Carência em assessoria técnica.

Área da agricultora Maria Margarida. Ao redor da casa, além do manejo do pasto, planta diversas culturas inclusive mantém uma horta

Há muitas fontes d’águas no Assentamento como nascentes, riachos e cachoeiras

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“Não queria ficar no Projeto, pois não tenho marido. Conversei com o meu filho e topou. No início, a gente não botava muita fé no Projeto. Mas, depois a gente foi vendo que era um negócio bom. Além do manejo do pasto, tenho minhas plantações, minha horta, criação de animais e ainda comercializo o óleo e o sabão do babaçu. Não coloco mais veneno nas plantações. Não compro mais remédio de farmácia pro gado, nem ração. O leite mudou muito com o manejo do pasto, tá com um sabor diferente, mais gosto, com muita nata. Trabalho menos. Hoje, a vida melhorou aqui pra gente.”

Maria Margarida de OliveiraAgricultora da comunidade de Santa Clara

Page 19: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Produzir melhor, sem desmatar a floresta

AGRICULTURA FAMILIAR A agricultura familiar inclui todas as atividades agrícolas de base familiar e está ligada a diversas áreas do desenvolvimento rural. Consiste em um meio de organização das produções agrícola, florestal, pesqueira, pastoril e aquícola que são gerenciadas e operadas por uma família no qual predomina a mão-de-obra familiar, tanto de mulheres quanto de homens. A agricultura familiar tem um importante papel socioeconômico, ambiental e cultural.

A criação de rebanho bovino de Cotriguaçu cresceu significativamente na última década, numa média de 10,6% ao ano acompanhando a expansão das áreas desmatadas que é 7,6% ao a n o , e m m é d i a . O m u n i c í p i o t e m , aproximadamente, 240 mil cabeças. Esse rebanho ocupa uma área total de pastagens equivalente à área total desmatada do município, cerca de 190 mil hectares, já que as demais atividades agrícolas têm baixíssima expressão em termos de área ocupada. A taxa média de lotação é de 1,3 cabeças ou 0,9 Unidades Animal (UA) por hectare.

capítulo

V

Pecuária é uma atividade significativa no Assentamento

A pecuár ia bov ina es tá p resen te em aproximadamente 76% dos estabelecimentos rurais de Cotriguaçu e costuma ser uma das p r i n c i p a i s f o n t e s d e r e n d a d e s s e s estabelecimentos. Cerca de 70% das áreas com pecuária realizam, exclusivamente, pecuária de corte, enquanto 15% se dedicam somente à produção de leite e 19% têm as duas atividades; e apenas 4% das propriedades com pecuária bovina realizam a fase de engorda, sendo que a grande maioria realiza apenas a fase da cria, que é a produção de bezerros.

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Page 20: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O acesso ao mercado para escoamento da produção leiteira ou a venda de bezerros é, muitas vezes, via atravessadores. Estes praticam preços muito baixos no mercado (em média, o litro do leite é comercializado por R$ 0,48), gerando perda da lucratividade e desvalorização

da atividade produtiva leiteira na agricultura

familiar.

Ao mesmo tempo, a lógica de ocupação da pecuária e a forma de produzir estão baseadas em um modelo insustentável, não somente na questão ambiental como também na perspectiva de produção. Essa prática ultrapassada de agropecuária é vivenciada fortemente nas áreas do Assentamento Nova Cotriguaçu. Para manejar os pastos, as famílias agricultoras seguem a forma convencional de uso do solo, com retirada de madeira, corte e queima na formação da pastagem. Essa pecuária extensiva, sem nenhuma prática de manejo, tem gerado degradação do solo e água em um curto período de tempo, levando ao abandono ou a abertura de novas áreas de floresta.

Nesse sentido é que surge, em 2011, dentro do Projeto Cotriguaçu Sempre Verde, o componente Boas Práticas Agropecuárias com o manejo de pastagem e criação de gado leiteiro. A ideia era potencializar a cadeia produtiva leiteira com sustentabilidade e preservação ambiental, e

“A ideia de BPA leite surgiu a partir de uma necessidade e d e u m a r e a l i d a d e d a s f a m í l i a s agricultoras, em

que a maioria da renda delas vem da

pecuária. A proposta não era fomentar, mas

manter a atividade de forma sustentável e que trouxesse outras possibilidades para a área da família, como plantar de forma consorciada, fazer um bom manejo do pasto e preservar a floresta e seus recursos naturais. Essa foi a nossa porta de entrada.”

Renato Farias - Coordenador do Projeto

“As ações do BPA Leite caminham no intuito de fortalecer a agricultura familiar, integrando pecuária e agricultura, para que os homens e a s m u l h e r e s permaneçam no campo p r o d u z i n d o c o m d i v e r s i d a d e e qualidade de forma sustentável preservando a floresta e seus recursos naturais”.

Camila Rodrigues - Assistente de Coordenação do Projeto

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Page 21: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

fomentar a geração de renda entre as famílias a g r i c u l t o r a s a p a r t i r d a p r o d u ç ã o e comercialização do leite, sem perder de vista também o cultivo consorciado e diverso na agricultura familiar. Uma forma de valorizar a mão-de-obra familiar e a diversificação do sistema de produção, numa experiência integradora do modelo produtivo de agricultura familiar com a pecuária. Sem essa relação e interação (agricultura e pecuária) não há sustentabilidade nesse modelo de agricultura familiar que vem sendo construído com o Projeto Cotriguaçu Sempre Verde.

Depois da mobilização e divulgação da proposta do Projeto, juntamente com as associações rurais

AGROECOLOGIA

Não é um conjunto de técnicas, nem um modelo de fazer agricultura; é um estar no mundo. É uma decisão política e social. Não é um estilo de agricultura alternativa ou orgânica.

O saber agroecológico contribui, também, para a construção de um novo paradigma produtivo ao mostrar a possibilidade de produzir com a natureza e de viver em harmonia com o meio ambiente. Diz respeito ainda a sinergia entre sistemas naturais e sociais, entre ambientes e culturas, sendo que os seres humanos têm a capacidade de direcionar essa sinergia.

A Agroecologia inclui o cuidado e defesa da vida; a prática da solidariedade e cooperação; produção de alimentos; consciência política e organizacional; e o respeito às relações de gênero e à diversidade étnica, religiosa e sexual. Compreende-se que ela seja inseparável da soberania alimentar e energética; pela defesa e recuperação de territórios; pelas reformas agrária e urbana; pela cooperação e aliança entre os povos do campo e da cidade; e pelo acesso e democratização dos meios.

A Agroecologia se insere, dessa maneira, na busca por construir uma sociedade de cidadãos (produtores) livremente associados para a sustentação de toda a vida; sociedade na qual o objetivo final deixa de ser o lucro, passando a ser a emancipação humana.

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Área com produção consorciada

Page 22: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

da localidade, espontaneamente as famílias foram aderindo a ideia de trabalhar de um novo jeito com a pecuária leiteira baseada na agricultura familiar. Logo no início, houve muita desconfiança e boatos que o ICV queria tomar as terras das famílias. Aos poucos, foi sendo construída uma relação de parceria e confiança entre as famílias e a equipe do ICV.

A intenção é que todo o trabalho fosse baseado

nos princípios agroecológicos. No entanto, essa abordagem agroecológica vem sendo construída ao longo da aproximação com as famílias agricultoras, respeitando o processo de transição dos s is temas. A presença do ICV nas

comunidades também era um marco histórico na v ida das famí l ias e do Assentamento, representava a chegada, pela primeira vez, de algum tipo de assessoria técnica para os moradores e moradoras.

Ao todo, são 15 famílias acompanhadas e assessoradas pelo Projeto Cotriguaçu Sempre Verde, que toparam vivenciar uma forma de produzir e gerar renda sem agredir e desmatar o ambiente. Juntamente com os agricultores e agricultoras foi construído um termo de compromisso. Os primeiros passos foram: visitar as áreas de cada famí l ia , anal isar o so lo de cada estabelecimento rural e levantar quais as pessoas que trabalham com gado leiteiro. Onde era escolhido o local dos piquetes, foram colhidas entre 10 a 20 amostras de terra na profundidade 10 cm a 25 cm. As amostras do solo eram colhidas para análise de nutriente e salinidade e enviadas ao laboratório. Quando necessário realizava a correção do solo com calcário e adubo. A partir das correções do solo, gradativamente era feita a renovação do pasto através da adubação.

O passo seguinte após escolha da área que seria instalado o sistema de piquete, foram coletadas as coordenadas com uso de GPS e elaborado o croqui da área. Na sequência, com essas

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Reunião de acompanhamento do projeto

Page 23: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Responsabilidades*

- Comparecer as reuniões e facilitar as visitas dos técnicos no projeto;

- Executar as ações acordadas com o técnico de campo;

- Realizar e disponibilizar anotações referentes a esta produção;

- Colaborar na divulgação dos resultados obtidos, disponibilizando a propriedade para visitas de outras pessoas ligadas ou não ao p ro je to , sendo ass im, um mul t ip l i cador da exper iênc ia e do conhecimento;

- Respeitar as nascentes e as APPS mantendo-as cercadas;

- Contribuir com a contrapartida das ações que é a sua mão de obra;

- Disponibilizar as lascas para cerca;- Cuidar e zelar dos materiais das unidades;- Ser produtor de leite, ter gado de leite na

propriedade;- Respeitar o meio ambiente, não fazer uso de

queimadas;- Caso haja desistência, o agricultor/a deve

devolver todo material para o ICV, que será repassado para outro agricultor/a.

*Faz parte do termo de compromisso construído pelos agricultores/as.

Visita a uma área calcarizada e adubada

21

informações, foram dimensionados o tamanho dos piquetes e gerado o mapa para demarcação das divisões em campo. O capim mais comum que era utilizado pelas famílias como forragem era o Braquiária ou Mombaça. Em seguida, foi feita a pesagem do gado e contagem do número total de vacas para obter o tamanho e espaçamento dos piquetes, e saber a quantidade de massa necessária para alimentar cada vaca leiteira dentro do sistema..SISTEMA DE PIQUETE

Cada família envolvida no Projeto recebeu materiais e kit para implantação do sistema de piquete. Para os agricultores e agricultoras foram

Page 24: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Os mutirões foram momentos importantes entre as 15 famílias envolvidas no Projeto. Os agricultores e as agricultoras destacaram a i m p o r t â n c i a d a i n t e g r a ç ã o e n t r e o s beneficiários/as, iniciativa nunca vista ao longo dos 21 anos de existência do Assentamento: envolver as três comunidades para trabalharem juntas. Oportunidade também de estimular o trabalho comunitário e o espírito solidário entre os/as trabalhadores/as rurais. Foi construído coletivamente com os/as agr i cu l to res/as um calendário de mutirões para as implantações dos sistemas nas áreas das famílias.

Para obter um bom resultado no manejo de pastagem, as famílias foram orientadas a terem controle da entrada e saída do gado de acordo com a altura do capim. Melhoraram as condições do curral, adequaram um espaço melhor para ordenha - como construção de galpão - e implantaram bebedouro (com água encanada) e comedouro (para sal mineral ou outras misturas de ração) para o gado. Ao mesmo tempo, o sistema de piquete serviu para isolar as Áreas de Preservação Permanente

entregues arames lisos para fazerem molas para fechar as porteiras dos piquetes, bate estaca feita no torno, barras de ferro como isolador para-raio e fio terra, e arames lisos apropriados para cerca elétrica. O kit continha placa solar para produção de energia, bomba d'água, eletrificado, bateria e mangueira.

Foi feito um regime de mutirão envolvendo as famílias para implantar os 15 sistemas de piquete. Cada pessoa ficou responsável por uma atividade da implantação: alguns, marcando os croquis e piquetes ou furando as estacas, uns, montando as cercas elétricas de arame e, outros, colocando as castanhas (isoladores de energia).

Sistema de piquete

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Cada sistema de piquete possui, em média, de 18 a 36 p i q u e t e s . U m piquete tem, em média, áreas de 25x25m chegando a t é 4 0 x 5 0 m , dependendo do espaço disponível ou do relevo da área.

Page 25: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

(APPs) dentro da propriedade, evitando que o gado entrasse nela para beber e provocasse danos ambientais aos recursos hídricos da área rural, como nascentes, riachos e cachoeiras. Houve também distribuição de mudas para plantio nas áreas de APPs e nos espaços de lazer do gado em parceria com o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PrevFogo) - organismo ligado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

SUPLEMENTAÇÃO ALIMENTAR

Apesar de a chuva ser abundante em Cotriguaçu, há um período curto de estiagem (em torno de três meses) no município. Pensando nesse momento de seca e numa suplementação adicional, as famílias foram incentivadas a plantarem a cana-de-açúcar como complemento alimentar para o gado leiteiro, misturada a ureia. A ideia não é a substituição do capim como forragem, mas dá uma oferta a mais de proteína e energia para o gado.

Esse processo de plantio da cana não aconteceu aleatório. Os/as agricultores/as passaram por formação, através de oficinas, ministrados por técnicos convidados pelo ICV. Nesses momentos, era discutida a importância da utilização dessa

Geralmente, cada sistema de piquete ocupa uma área de 1 a 3,5 hectares do lote da família. Cada sistema de piquete possui, em média, de 18 a 36 piquetes.Um piquete tem, em média, á r e a s d e 2 5 x 2 5 m chegando até 40x50m, dependendo do espaço disponível ou do relevo da área.

23

Mutirões para instalação das cercas elétricas

ração suplementar junto com a ureia, passadas dicas de como plantar e colher a cana, e fornecidas orientações de como triturar cana e preparar a mistura. Cada agricultor/a e n v o l v i d o / a n o p r o j e t o t a m b é m recebeu mudas de cana para fazer o replantio em suas áreas.

A cana-de-açúcar é uma forragem rica em energia, tanto

Page 26: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

maior quanto a riqueza de açúcar no caldo. A principal limitação nutricional é o baixo conteúdo de proteína. A ureia é utilizada para fazer essa compensação nutricional. No entanto, a utilização inadequada de ureia poderá levar à intoxicação e à perda do gado. A suplementação com um sal mineral de boa qualidade também é indispensável para dietas baseadas em cana-de-açúcar.

A experiência da cana-de-açúcar não deixou baixar a produção leiteira nesse período de estiagem e melhorou também a qualidade do leite. É uma tecnologia simples, de fácil implementação e de baixo custo que contribui para aumento e estabilização da produção de leite aos níveis obtidos durante o período das chuvas.

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Princípios para as Boas

Práticas Agropecuárias

adotadas no sistema que o

I C V e a g r i c u l t o r e s

trabalharam:-Recupe ração da á rea degradada.- Recuperação do pasto;- Manejo do pasto.-Manejo e bem estar dos a n i m a i s n o s i s t e m a Piquetes.

-Bom manejo dos recursos hídricos no sistema de piquetes.

T e c n o l o g i a

SocialC o m p r e e n d e p r o d u t o s , t é c n i c a s o u m e t o d o l o g i a s r e a p l i c á v e i s , desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social.

Instalação da placa solar na área da agricultora Gercina Souza Chagas

Implantação de bebedouro com água encanada

Page 27: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

SISTEMA DE PIQUETE – É uma tecnologia social que consiste em o/a agricultor/a reservar um espaço na sua área (em média de 1 a 4,5 hectares) para plantio de capim próximo ao curral. Nesse espaço, é implantado um conjunto de piquetes (de 10 a 30 piquetes – varia de acordo com a quantidade de gado e espécie de pasto), que são divididos por cercas elétricas alimentadas com placas solares (duas linhas de arame presas às estacas e às barras de ferro) e com isoladores de correntes elétricas e para-raios.

Esses piquetes são enumerados e com abertura e fechamento do espaço para melhor rodiziar os gados dentro do pasto, ou seja, cada dia o/a agricultor/a coloca seu gado em um piquete diferente para alimentar com capim. No caso do capim Braquiária, a entrada do gado no piquete se dá quando o pasto está com 40 a 50 cm de altura, com saída dos piquetes na altura 25 a 20 cm. Já com o capim Mombaça, a altura ideal da entrada nos piquetes é de 70 á 80 cm, com saída de 30 a 40 cm. Deve-se usar um tempo de descanso para cada piquete sempre respeitando a altura de entrada e altura de saída do capim. A ideia do sistema de piquete é garantir, de forma regrada, e renovar naturalmente o solo e o pasto a cada certo período. A intenção da cerca elétrica é “domesticar” o gado para não derrubar os piquetes.

O sistema de piquete proporciona uma integração do conjunto de elementos para criação do gado e

produção leiteira e agrícola na área da família. Integrados nesse espaço dos piquetes, estão o curral, galpão para ordenha e espaço de lazer (uma área de descanso do gado, geralmente bem arborizada para garantir sombra) com o bebedouro e comedouro. Ao redor do sistema de piquete, está a produção consorciada da família com uma diversidade de culturas, como o milho, feijão, mandioca, abóbora, fruteiras e pomar.

Além de facilitar a vida da família (menos trabalho, menos gasto de tempo e menos despesa), melhorar a produção bovina leiteira e promover a geração de renda, o sistema de piquete evita a degradação do solo, a derrubada da floresta e o uso de queimadas.

Marcação dos piquetes para melhor gestão na área do agricultor João Costa

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Page 28: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Outra suplementação que vem sendo feita pelos/as agricultores/as é a produção da farinha do babaçu (palmeira muito comum na região), misturada com o sal mineral e o farelo da folha do nim. A farinha do babaçu é considerada fonte de proteína na ração bovina. Já a folha seca moída do nim (o farelo), adicionada ao sal ou à ração do gado, combate os vermes e evita a mosca do chifre. Esse suplemento, além de melhorar a qualidade do leite, melhora também a pelagem da vaca.

A adoção dessas rações complementares trouxe benefício não só para o gado, mas mudança de comportamento do/a trabalhador/a rural com a aceitação dessas técnicas alternativas de baixo valor econômico. As famílias que estão no Projeto não compram mais suplementos químicos e nem remédios para as vacas. Essas práticas melhoraram significativamente a sanidade animal e também qualidade do leite.

SANIDADE ANIMAL

O cuidado com as vacas não é somente com a forragem, mas também com a qualidade de vida (sanidade) desse gado. Neste sentido, foram realizadas diversas oficinas sobre a higienização do animal (e também com o leite) e de sanidade das vacas leiteiras. Durante esses momentos de

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ORIENTAÇÕES- Após a colheita, não estocar a cana por mais de dois

dias;- Efetuar a picagem da cana-de-açúcar no momentode

fornecer aos animais;- Misturar uniformemente a ureia à cana picada para

evitar riscos de intoxicação;- Aguardar o período de adaptação, observando o gado

com regularidade;- Depois do período de adaptação, fornecer cana-de-

açúcar mais ureia;- Usar cochos bem dimensionados, permitindo livre

acesso dos animais;- Eliminar sobras de forragem do dia anterior;- Manter água e sal mineral à disposição dos animais;- Fornecer concentrado em função do nível de produção

de leite ou ganhos de peso desejado.

Plantio da cana na área do agricultor Edemir Oliveira

Page 29: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

formação foi debatida a importância da vacina e orientações de técnicas de vacinação, pois antes havia muitas perdas de doses de vacinas e irritação no couro do gado por falta de higienização das pistolas.

A sanidade animal envolve questões relacionadas a enfermidades dos animais, saúde pública, controle dos riscos em toda a cadeia alimentar, assegurando a oferta de alimentos seguros e bem estar animal. Para assegurar a saúde animal, é necessária a existência de serviços veterinários bem estruturados, capacitados e aptos para detecção e adoção precoce das medidas de controle e erradicação das doenças.

FORMAÇÃO E ASSESSORIA TÉCNICA

A disseminação do conhecimento junto às famílias agricultoras foi outra preocupação do Projeto. A formação, por meio de oficinas, foi constante para os/as agricultores/as, tanto na parte de gestão dos sistemas produtivos como também técnicas como o manejo do pasto e práticas produtivas. Foram contratados consultores ou firmadas parcerias com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) para ministrarem cursos e oficinas.

Curso prático da cana como suplemento alimentar

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Entre esses diversos momentos de formação, os/as agricultores/as participaram da Oficina sobre fungo biológico da cigarrinha para o bom controle na pastagem, tanto para o capim como para a cana-de-açúcar. A ideia foi capacitar os/as agricultores/as para identificação do inseto, aplicação do fungo de forma correta no pasto e monitoramento da reação na pastagem.

O uso do fungo biológico da cigarrinha é um controle de baixo custo, eficiente e responsável. É um método que não é agressivo ao meio

Page 30: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

ambiente, em que o agricultor gasta, em média um litro por hectare a R$ 10,00 reais no método natural; já como método químico, o valor do litro custa R$ 70,00. Outra questão que vem sendo construída nas dinâmicas e ações do Projeto envolvendo o manejo do pasto na produção leiteira é o empenho do ICV em garantir a assessoria técnica a essas famílias envolvidas. A equipe técnica do ICV vem acompanhando (manutenção dos sistemas), monitorando as ações, orientando e se reunindo com esses/as agricultores/as.

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Oficina de Sanidade Animal com os agricultores

“O babaçu como suplemento da ração melhorou a qualidade do leite e a pelagem das vacas. Na seca, faço a mistura da cana, misturando a farelo de babaçu e o sal mineral. É outra qualidade de alimentação para os animais”.

Daniel Ferreira de Oliveira - Agricultor da comunidade de Ouro Verde

Page 31: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O ICV tem feito um esforço para dar conta de uma assessoria técnica mais presente junto às famílias, em face das limitações existentes: uma única técnica disponível para todas essas dinâmicas e o péssimo acesso as estradas do Assentamento e comunidades – que estão há quase três horas de distância da sede do município, dependendo da época do ano. O Instituto vem tentando superar esses desafios, procurando animar e facilitar os processos de organização e qualificação das demandas das famílias diante desse modelo de produção e de integração da pecuária leiteira com a agricultura familiar numa lógica sustentável.

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Troca de experiências é muito recorrente entre as famílias agricultoras envolvidas no Projeto

Oficina de combate à Cigarrinha

INTERCÂMBIO DE EXPERIÊNCIAS

O ICV acredita que uma das estratégias da produção do conhecimento e da socialização das experiências vivenciadas pelas famílias agricultoras nesses processos das Boas Práticas Agropecuárias com a produção do leite integradas ao modelo produtivo da agricultura familiar seja a realização de intercâmbios. Estas iniciativas permitem a socialização e a troca de conhecimentos, de forma hor izonta l e socialmente construída nos mais diversos espaços, como na própria comunidade, em outros municípios, em oficinas e em feiras.

Page 32: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

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Área com sistema de piquetes

O resultado do diálogo entre agricultores/as e técnicos/as também é bastante positivo. O saber popular, somado ao conhecimento técnico, produzido pelas organizações, universidades, centros de pesquisas, entre outros, geram soluções inovadoras com impactos positivos na vida dessas famílias.

Alguns agricultores/as puderam participar do Intercâmbio manejo agroecológico em pastagem no município de Juína – MT. Esse momento serviu para os/as trabalhadores/as conhecerem e aprimorarem técnicas de baixo custo para implantação das cercas elétricas, que depois foram disseminadas para outras famílias do Assentamento envolvidas no Projeto.

Outro momento de intercambiar experiências foi quando os indígenas da Etnia Rikbaktsa foram até o Assentamento conhecer o beneficiamento do babaçu e colheram mudas de cana-de-açúcar para replantio nas terras indígenas. Houve também trocas de sementes entre os/as assentados/as e os índios. Além de socializarem saberes e experiências, foi também um espaço de aproximação e integração entre as famílias agricultoras da localidade e o povo indígena. Diálogo que não acontecia há 21 anos, desde a criação do Assentamento.

Intercâmbio ao município de Juína - MT

Page 33: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

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Pela segunda vez, o ICV realizou a Encontro de Saberes e Sabores dentro do Assentamento. O espaço vem servindo para as famílias agricultoras se integrarem, conhecerem e socializarem outras experiências, exporem e comercializarem produtos. O momento serve também para confraternização, onde os/as agricultores/as recebem visitantes de outras comunidades e municípios. No local, acontecem apresentações culturais e artísticas de moradores/as da própria localidade.

Po r t an to , o s i n t e r câmb ios de e x p e r i ê n c i a s e s t i m u l a m o s participantes a se expressarem e facilitam não só as discussões das p r á t i c a s , m a s f o r t a l e c e m a construção e a socialização do saber. É uma estratégia apropriada para as famílias agricultoras, pois vivenciam o “aprender fazer”.

“A gente ficou meio 'cismado' de entrar no Projeto. Demoramos a entender o Projeto. Fizemos muitas perguntas. Depois fomos sabendo mais sobre as atividades. Com o sistema de piquete é menos trabalho. Melhorou muito a nossa vida. A gente teve muita orientação e apoio do ICV. O Projeto trouxe resultados para os homens e as m u l h e r e s c o m a t i v i d a d e s e desenvolvimento para nosso meio rural. Todo mundo junto, homem e mulher, trabalhando juntos”.

Dezi Valério do Nascimento - Agricultor da comunidade de Santa Clara

Page 34: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Exposição fotográfica durante o II Encontro de Saberes e Sabores no Assentamento

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Manejo do pasto para gado leiteiro Intercâmbio entre as famílias agricultoras

Page 35: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Está claro, e é perceptível nos resultados e nos depoimentos das famílias agricultoras, que houve avanços e conquistas ao longo desses quase quatro anos de trajetória e envolvimento do Projeto no Assentamento Nova Cotriguaçu. Essas 15 famílias adotaram novas práticas, e técnicas e hábitos não só na produção leiteira e no manejo do pasto, mas buscaram transformações de vida promovendo qualidade e bem estar na família e preservando a floresta e o seu conjunto de recursos naturais, sem perder de vista a geração de renda.

Além de promover um bom manejo dos pastos com o gado leiteiro, aumentou também a produtividade do leite. A maior parte da produção é escoada para um lacticínio da região (um litro de leite é vendido para esse laticínio por apenas R$

0 , 4 8 ) . D e n t r o d o A s s e n t a m e n t o h á tanques refrigerados mantidos pelo lacticínio para armazenar essa p r o d u ç ã o l e i t e i r a . D iar iamente , os/as a g r i c u l t o r e s / a s r e c o l h e m o l e i t e e a r m a z e n a m n e s s e s

Colhendo os frutos

capítulo

VI

“Só depois que soube o milagre do santo, que era os piquetes. Passamos a construir e instalar juntos, um apoiando o outro. Ajuda muito no manejo do pasto. As vacas têm horário de ficar e sair dos piquetes e ir para área de lazer. Tudo isso é menos trabalho pra gente, porque é ao redor de casa. Facilitou bastante a vida da gente. Precisamos agora ampliar para outras famílias que não tiveram acesso. Melhorou muito minha vida e a vida da minha família.

Adilson Ferreira de JesusAgricultor da comunidade de Ouro Verde

E m 2 0 1 2 , n o v e produtores familiares a n t e s d a s B o a s Práticas Agropecuárias produziam 6.784 litros de leite mensal. Já em 2013, 13 produtores colheram 12.794 litros de leite por mês.

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Page 36: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

tanques. A cada dois dias o lacticínio passa recolhendo essa produção armazenada. Somente, um agricultor que beneficia o leite com produção de queijo, que é comercializada dentro do Assentamento e na cidade.

A experiência de Boas Práticas Agropecuárias melhorou, ainda, a qualidade da água para o gado beber. Ficando próximo do curral, a água encanada direto no coxo evita que o gado pisoteie as nascentes e le i tos dos r ios . Os/as agricultores/as estão tendo um maior controle do pasto fazendo com que as vacas tenham sempre ração por um prolongado período do ano.

Um dos exemplos de sucesso vem da família do agricultor Euler Werner, do sítio Estrela de Fogo, da comunidade de Ouro Verde. Em 2012, antes de adotar as Boas Práticas, com 15 vacas ordenhava, por mês, 1.692 litros de leite e vendia, o litro, a R$ 0,45. Nos meses de seca (entre agosto e setembro) ordenhou em torno 1.457 litros de leite. O capim era a Braquiária com um sistema de pastejo totalmente aberto.

Após entrar no Projeto com as Boas Práticas, passou a usar dois hectares da sua área para o sistema de piquete com capim Mombaça. Em 2013, com as mesmas 15 vacas, ordenhou 3.571 litros de leite (cada litro custava R$ 0,59). No período da seca (agosto-setembro) a produção caiu para 2.665 litros.

Em 2014, com 15 vacas, vem mantendo a media 2.900 litros de leite por mês com preço de R$ 0,62 por litro de leite, pois tem bezerros sendo amamentados. O agricultor Euler Werner conta com o envolvimento da família (esposa e dois filhos) nos afazeres do dia-a-dia da sua área.

“Esse Projeto foi um trem bom. Facilitou muito a vida da gente. Quero ampliar a quantidade de piquetes. O manejo do pasto não só trouxe benefício para o animal e pra nossa área, mas também pra nossa família; trouxe um ganho a mais.”

Euler Werner - Agricultor da comunidade Ouro Verde

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Page 37: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Através de um monitoramento mensal realizado pela assessoria técnica, pode-se constatar que as Boas Práticas Agropecuárias de leite trouxeram resultados signif icativos em termos de produtividade. Antes, a média da produção dos agricultores envolvidos no projeto era de 608 litros de leite por mês, após adotar estas práticas, a média passou a ser 800 litros de leite mensal. Há uma situação de um agricultor cuja produção era de 1.931 litros de leite, antes do projeto, e que, agora, passou a ser de 2.931 litros de leite por mês. Esse aumento da produtividade se deu pelo bom manejo e pelo número de vacas, que varia de 10 cabeças a 20 cabeças.

As famílias passaram a desenvolver uma maior

Em média, cada família produz de 30 a 70 litros de leite por dia; e tem uma renda men-s a l c o m e s s a produção leiteira entre R$ 200,00 e R$ 750,00.

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consciência ambiental em torno da floresta com mais sustentabilidade e cuidados com a natureza em suas áreas rurais. D i m i n u í r a m , consideravelmente, as queimadas, a derrubada da mata e o uso de a g r o t ó x i c o s . A i n d a passaram a dar uma maior atenção às APPs, isolando, com cerca, essas áreas e as nascentes.

Os/as agricultores/as começaram a planejar e a aperfeiçoar a gestão da área ao redor de casa. Começaram a diversificar, ainda mais, a produção com o plantio de várias culturas e a proporcionar, também, uma melhor alimentação para a família. Esses resultados apontam para uma maior valorização na produção de forma consorciada.

A chave de sucesso também pode estar nessa integração d e a g r o p e c u á r i a e agricultura familiar na perspectiva da construção de um modelo produtivo sustentável para essas 1 5 f a m í l i a s e ,

Momento de avaliação do projeto com as famílias

Page 38: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Parte das residências dessas 15 famílias não tem energia elétrica. É através da energia gerada pela placa solar que elas puderam ter acesso não só para ligar a bomba d'água, mas para abastecer toda a residência. Com a chegada da placa solar, compraram televisão, liquidificador, máquina de lavar e outros eletrodomésticos, promovendo mais qualidade de vida e bem estar para toda a família.

Os filhos, antes da chegada da placa solar, à noite faziam os deveres da escola à luz da lamparina com “diesel queimado”, causando muita fumaça que era inalada. Hoje, a energia produzida pela placa solar faz com que as lâmpadas clareiem os momentos de estudo da criançada e sem fumaça.

“ A g e n t e e s t á sendo massacrado com esse preço, além da gente não ter estradas boas para escoar o leite. Es tamos sendo

muito prejudicados com esse preço do leite com o valor muito baixo.”

João Alves de Souza - Agricultor da comunidade de Novo Horizonte

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principalmente, para a floresta. Essa experiência mostrou as possibilidades de desenvolvimento de um modelo de agricultura integrado à produção agropecuária leiteira, valorizando a mão-de-obra e a diversidade produtiva da agricultura familiar.

O trabalho e os resultados das 15 famílias e n v o l v i d a s n o P r o j e t o m o s t r a m u m reconhecimento e uma replicação da experiência por parte de outras famílias dentro do Assentamento. Espontaneamente, as famílias beneficiadas começaram a receber visitas de outros agricultores e agricultoras da localidade querendo conhecer essa experiência de Boas Práticas Agropecuárias no intuído de replicar.

O bom manejo dos pastos com o gado leiteiro mostrou que melhorou também a qualidade da água para o gado beber. Com os sistemas próximos do curral e com água encanada direto no coxo, evita que o gado pisoteie as nascentes e leitos dos rios. Diminuiu também a mão de obra na hora do parto dos bezerros. Os agricultores também passaram a fazer controle do pasto com sobra de capim em um espaço reduzido nos piquetes.

Hoje, os/as agricultores/as isolam as áreas de APPs e nascentes com cercas. Adotaram o plantio da cana-de-açúcar para complemento alimentar no período de seca para o gado leiteiro e passaram

Page 39: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

a aplicar fungo natural para controle da cigarrinha no pasto.

Outro fator importante com as dinâmicas do Projeto foi a aproximação e o envolvimento dessas 15 famílias, proporcionando uma maior participação nos debates, reuniões e encontros da comunidade ou da associação. A experiência trouxe um empoderamento de conhecimento, mobilização e organização comunitária para o s / a s a g r i c u l t o r e s / a s . E s s e s / e s s a s trabalhadores/as passaram a ocupar espaços .

Esses resultados não foram alcançados do dia para a noite. Representam um processo de cons-trução de confiança e transparência entre esse grupo de agricultores/as e o ICV nessa trajetória de quase três anos. Planejamento e diálogo foram

Parte das residências dessas 15 famílias não tem energia elétrica. É através da energia gerada pela placa solar que elas puderam ter acesso não só para ligar a bomba d'água, mas para abastecer toda a residência. Com a chegada da placa solar, compraram televisão, liquidificador, m á q u i n a d e l a v a r e o u t r o s eletrodomésticos, promovendo mais qualidade de vida e bem estar para toda a família.Os filhos, antes da chegada da placa solar, à noite faziam os deveres da escola à luz da lampar ina com “d iese l queimado”, causando muita fumaça que era inalada. Hoje, a energia produzida pela placa solar faz com que as lâmpadas clareiem os momentos de estudo da criançada e sem fumaça.

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também dois pilares importantes nesse percurso. Planejar bem para ter um bom alicerce e desen-volver um exitoso trabalho. E, dialogar sempre quando se trabalha no coletivo, para conhecer as necessidades e fragilidades do outro e respeitar o tempo de cada um. Tudo isso só foi possível porque, juntos, famílias e ICV, construíram uma visão comum: reestruturar uma cadeia produtiva local de forma sustentável, valorizar a agricultura familiar e diminuir o desmatamento.

Área da agricultora Maria Margarida

Page 40: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Área consorciada com outras culturas

Page 41: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

É muito importante cuidar da higienização da vaca, do bezerro e da ordenha

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Mais conhecimentos e aprendizagem

capítulo

VIIMANEJO SANITÁRIO

As práticas voltadas para manter a sanidade do rebanho consistem, basicamente, de cuidados indispensáveis às vacas gestantes, ao parto, aos recém nascidos e na prevenção contra as principais doenças infectocontagiosas.

Vacas gestantes/parto

Nos últimos dois meses de gestação deve-se proceder a secagem do leite, para que a glândula mamária possa "descansar" e preparar-se para a próxima lactação.

Três semanas antes do parto as vacas devem ser levadas para um secagem do leite, para que a glândula mamária possa "descansar" e preparar-se para a próxima lactação.

Três semanas antes do parto as vacas devem ser levadas para um pasto maternidade localizado próximo ao curral, de modo a facilitar a inspeção diária e, quando necessária, a intervenção na hora do parto. É importante que, neste período, os animais já recebam a mesma dieta que irão ter após o parto.

Especialistas afirmam que se deve interferir, minimamente, no parto, ainda que este possa se traduzir em algumas horas de desconforto para o animal, devendo-se sempre consultar um veterinário em casos de complicações.

Cuidados com os recém-nascidos

Tão logo quanto possível, após nascida, a cria deve mamar o colostro – a absorção máxima se dá entre as primeiras seis e 10 horas declinando

Page 42: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

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gradualmente até as 36 horas – sendo importante que permaneça com a mãe nas primeiras 24 horas ou que, pelo menos, nela possa mamar, em intervalos de 12 horas, o equivalente a 10% do seu peso. Esses cuidados são cruciais para a futura saúde do animal, já que é pela ingestão e absorção do colostro que ele adquire os anticorpos, que são as defesas contra os agentes causadores das doenças.

O corte e desinfecção do umbigo é outra prática necessária para evitar a contaminação de doenças, usando-se, para isso, uma solução desinfetante constituída de álcool iodado a 10%.

Doenças infectocontagiosas

Não se pretende abordar sobre as doenças que acometem o gado de leite, portanto detalhes e casos específicos devem ser reportados ao veterinário da região. Entretanto, vale ressaltar que alimentando bem, fazendo um bom manejo de pastagem e adotando medidas preventivas, entre elas as vacinações obrigatórias contra aftosa, raiva e brucelose (que seguem esquema específicos regulamentados pelas campanhas oficiais de governo) o rebanho tende a se desen-volver e a se reproduzir de forma saudável.

A mamite (inflamação da glândula mamária) constitui um dos mais sérios problemas de saúde animal na pecuária leiteira, causando grandes prejuízos à cadeia produtiva do leite. Segundo os especialistas, trata-se basicamente de uma doença de manejo, em que índices elevados indicam que uma ou mais práticas estão sendo executadas de forma inadequada. Portanto, para prevenção deve ser considerado todo o manejo diário da propriedade, desde quando o animal

está no pasto, vai para a ordenha e volta para o pasto.

É, principalmente, na ordenha, que se deve observar a condução do pro-

cesso preventivo, já que quando mal conduzida é a

grande causadora da mamite. Assim alguns cuidados são reco-mendados:

- Adotar o teste da caneca telada ou de fundo escuro, realizado diaria-mente, que permite detectar a mamite clínica nos primeiros jatos de leite, quando grumos ficam depositados e são facilmente perce-bidos na tela ou no fundo escuro da caneca;

Page 43: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

O/a agricultor deve preservar e viver em harmonia com a floresta

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- Seguir linha de ordenha, onde primeiramente são ordenhadas as vacas sadias, depois, as que já tiveram mamite e foram curadas e, finalmente, aquelas que estão com mamite e em tratamento;

- Nos casos de mamite clínica (aquela que se pode ver a olho nu) o animal deve ser retirado do recin-to, para não contaminar o ambiente, e ser orde-nhado mais tarde, após os sadios; se a mamite for crônica, o animal deve ser descartado.

O tratamento das vacas com mamite varia segun-do cada caso, devendo ser precedidos de orde-nhas sucessivas em torno de quatro ao dia e, se for o caso de necessidade de medicamento, tratar após a última ordenha do dia.

CUIDANDO BEM DA FLORESTA

As florestas cobrem cerca de 30% da superfície terrestre. É nas florestas e em outros cobertos vegetais que se realiza a fotossíntese da qual depende a vida: produção de oxigênio. São consi-deradas “pulmões do mundo”, que servem de habitat para plantas, árvores e animais. Nelas estão importantes recursos naturais, servido como um espaço vital da convivência harmoniosa entre a fauna e a flora. Por isso, as florestas são importantes para quem mora no campo e na cidade.

Page 44: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Dicas de prevenção e cuidados com a floresta:

- Nunca faça queimadas para limpar solo ou preparar a terra para plantio. Além de desmatar, esse fogo pode atingir a floresta e causar grandes proporções;

- Evite colocar fogo para combater a cigarrinha;

- Não é permitido, nos espaços rurais, o lança-mento de foguetes ou qualquer tipo de fogo-de-artifício, exceto quando não produzem recaídas incandescentes;

- É proibido fazer fogo de qualquer espécie, inclu-indo fumar, no interior das matas, nas vias que as delimitam ou as atravessam. Sempre ter cuidado com as bitucas de cigarro próximo a floresta;

- A linhas elétricas que atravessam zonas flores-tais deverão salvaguardar uma faixa de proteção: limpa de mato e arvoredo;

- As máquinas ou equipamentos de motor à combustível são obrigadas a estarem equipadas com dispositivos de retenção de fagulhas ou tapa chamas nos tubos de escape próximo ou no interior das matas.

- Tenha sempre em mãos um meio para conter, de imediato, qualquer incêndio;

- Plante árvores que possam contribuir para a contenção da linha de um incêndio;

- Crie uma zona de segurança, no mínimo de 50 metros, entre a sua casa, os materiais combustí-veis e a floresta.

- Não deixe as crianças brincar com fósforos ou isqueiros.

Page 45: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

É inquestionável o empoderamento das 15 famíli-as com a chegada do Projeto. Seja o empodera-mento de conhecimento com essas Boas Práticas Agropecuárias, seja o empoderamento político e cidadão, pois esses/essas agricultores/as cons-truíram diversos espaços: de saberes, de organi-zação comunitária e de direitos. Os resultados, os avanços e as conquistas apontam para um novo caminho que eles e elas livremente escolheram trilhar. Resta saber se querem continuar no rumo desse caminho, diante de um conjunto de desafi-os.

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Olhando para o futuro

capítulo

VIII

“O Pro je to t rouxe t ransformações significativas na vida das famílias. Possibilitou mudanças e aceitação de hábitos. Pensar no manejo, é pensar e valorizar o 'ao redor de casa', no cultivo de várias culturas e na melhoria da qualidade da produção leiteira. Todo esse processo resultou na consolidação e na afirmação da identidade desses homens ou dessas mulheres como agricultor ou agricultora familiar. Ao mesmo tempo, permitiu a construção do saber juntos (famílias e técnicos), sem distinção e sem hierarquia”

Sandra Regina Gomes - Técnica de campo do Projeto

Harmonia do ambiente com um bom manejo do pasto integrado à prática de uma agricultura diversificada

Page 46: Cartilha Boas Práticas Agropecuárias

Uma das dificuldades enfrentadas pelas famílias é estrutural. As estradas são de péssimo acesso para escoar a produção leiteira e falta energia elétrica para melhor armazenar e resfriar o leite. Além disso, as famílias também precisam de mais tanques para esfriar o leite. Por falta de espaço para armazenar, a comunidade Novo Horizonte já chegou a perder 1.200 litros de leite. As condições das estradas e falta de energia elétrica têm difi-cultado, também, a comunicação, a educação e a saúde dos moradores/as do Assentamento.

Os/as agricultores/as almejam mais valorização da produção leiteira, pois é muito baixo o valor

“Já tinha ouvido falar em sistema de piquete, m a s n u n c a t e r i a condições de pagar as d e s p e s a s d e i n s t a l a ç ã o e manutenção. Graças a o I C V t e m o s o s p i q u e t e s . F a ç o o manejo com o capim de

qualidade. Não preciso mais trabalhar fora de casa. Hoje, tenho mais condições de trabalhar, produzir e viver na minha área com minha família.”

João Carlos Moza - Comunidade de Ouro Verde

44

que o lacticínio paga pelo litro do leite (um litro = R$ 0,48). O grupo está se articulando com outro lacticínio na região para comprar também parte dessa produção. Acreditam que havendo concor-rência, haverá aumento no valor pago pelo litro do leite.

Atualmente, essas 15 famílias têm dificuldade em acessar os programas federais, bem como, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), tanto para comercialização do leite como para os produtos agrícolas. Querem, também, ter acesso a créditos de investimento para a amplia-ção da produção e beneficiamento leiteiro. No entanto, as famílias esbarram nas exigências da formalidade e na burocracia do Estado, como a falta de documento para comprovar a proprieda-de das terras. Pretendem ainda buscar o melho-ramento genético das vacas para uma produtivi-dade de qualidade e para entrar no mercado local.

Muitos lotes dentro do Assentamento ainda não foram regularizados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). As famíli-as ainda lutam pela regularização fundiária e ambiental, pois se deparam com muitos entraves em documentação e reconhecimento pelos órgãos competentes.

Essa experiência poderá se firmar como modelo

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para outras iniciativas de desenvolvimento das famílias e das comunidades rurais dentro do Assentamento Nova Cotriguaçu pela definição de um projeto de futuro, de vida, numa perspectiva de uma agricultura familiar integrada à pecuária leiteira sustentável. Prova de que agricultura familiar e pecuária podem estar integradas a uma proposta de recuperação e preservação da flores-ta.

Outro desafio dessa experiência em Boas Práticas Agropecuárias foi os próprios agricultores e agricultoras serem protagonistas desse processo, dessa história. Isso implicou na apropriação do Projeto pelas famílias e na construção de uma rede de parceria durante esses quase três anos de atuação (ICV, associações, prefeitura, Senar e Sindicato dos Trabalhadores Rurais).

O Projeto permitiu o empoderamento e o reconhe-cimento dessas pessoas enquanto agricultores familiares, valorizando um modelo de agricultura integrada à pecuária, viável, que promovesse a preservação da floresta, mas também potenciali-zasse a cadeia produtiva leiteira e fomentasse a geração de renda. Proporcionou uma mudança na vida dessas pessoas, trazendo a responsabili-dade de cada um como sujeito dessa transforma-ção e do próprio destino. Cabe a cada um/uma continuar como protagonista desta historia...

Integração do pasto com o plantio consorciado na agricultura familiar

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Novo HorizonteAlvino Rosa de Oliveira - Neuza Maria de Souza (Sitio Oliveira)Gercina Souza Chagas – João Alves de Souza (Sítio Monte Líbano)João da Costa Marques – Maria Rosa Marques (Sítio Nova Esperança)Manoel Braz Ferreira – Joana Darc Paula da Silva (Sítio Sonho Realizado)Moises Ferreira de Jesus - Elisângela Meneses de Jesus (Sítio Água Boa)Raimundo Albino Pereira - Delani Albino Pereira (Sitio Deus Dará)

Ouro Verde Adilson Ferreira de Jesus - Aparecida Silva Santana (Sítio Deus é Amor)Daniel Ferreira de Oliveira – Ângela Ferreira de Jesus (Sítio Três Coqueiro)Euler Werner – Jaquicele Gomes de Oliveira Werner (Sítio Estrela de Fogo)Gersi Hermano dos Santos - Adineia Costa Martins dos Santos (Sítio Frente Azul)João Carlos Moza – Leidimar Maria Eloy Moza (Sítio Nova União)Joel Ferreira de Jesus - Patrícia Lopes Damasceno de Jesus (Sítio Boa Vista)

Santa ClaraMaria Margarida de Oliveira Barbosa (Sítio São José)Dezi Valério do Nascimento – Ivani Costa do Nascimento (Sítio Vale do Prata) Edemir Oliveira Cezar (Sítio Felicidade)

Protagonistas dessa história

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1. A estratégia de assessoria técnica do

Projeto Dom Helder Camara. PDHC, 2010.

2. Diagnóstico Social, Econômico e Ambiental Planejamento Participativo. ICV, 2012.

3. Guia Metodológico de Sistematização de Experiências. Programa PESA/ FAO, 2004.

4. Revista Desafios do Desenvolvimento – IPEA . Ano 5. Edição 44, 2008.

Siteswww.cidades.ibge.gov.br

www.contriguacu.mt.gov.br

www.embrapa.br

www.fao.org.br

www.fbb.org.br

www.icv.org.br

Fontes de Pesquisa

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Anotações

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Intercâmbio nas áreas de manejo entre as famílias

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Realização Apoio