carta de tycho brahe a johannes kepler em graz

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    Carta de Tycho Brahe a Johannes Kepler em Graz

    scientizudia, So Paulo, v. 2, n. 4, p. 567-74, 2004

    Carta de Tycho Brahe a Johannes Kepler em Graz1

    Eruditssimo e prestatssimoSenhor Johannes Kepler,

    Exmio matemtico, agora naEstria ou ustria, escrito pelo seuQuerido amigo

    Doutssimo Senhor, recebi, no vero precedente em Wittenberg,2pouco tempo antesde me ausentar, quando preparava a minha viagem Bomia, as tuas agradabilssimase eruditssimas cartas e, por causa dos exmios dotes de teu engenho, -me permitido,ainda que eu no te conhea pessoalmente, considerar-te muito querido. Porm, nohouve nenhuma oportunidade de respond-las, desde aquele tempo at agora, em

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    virtude das vicissitudes de meus afazeres e tambm dos preparativos para a viagem anovos lugares. Conseguindo, porm, um pouquinho de cio, juntamente com a como-didade de mandar-te as minhas [cartas], decidi no demorar mais tempo em respon-der. Li3as coisas que tu narras prolixamente desde o incio acerca do expurgo desseUrsus indolente; na verdade, desnecessariamente com poucas palavras tu te desculpascom to refinada declarao, pois eu mesmo tenho te desculpado satisfatoriamentemuitas vezes por outras coisas, e nada de mal atribu s tuas cartas; na verdade, eu ti-nha inserido aquelas cartas como agora as recebo de ti, mutiladas e corrompidas porcausa do seu ornamento, pois assim ele teve o trabalho e as divulgou com esse escritochocante e malfico, sem que soubsseis ou quissseis. A respeito das minhas hipte-ses,4por ele roubadas e vendidas a seu favor, a questo no tanto a da indiscrio, a

    das inverdades e calnias que brotam do livro, arruinando de modo jocoso, com suapena delirante, com mentiras imprudentssimas e criminosas, minha honra e estima,e at minha ptria e famlia honradssimas, e no se envergonhou em difamar tanto,apenas com o mesmo [livro], espalhando tais coisas em pblico, embora ele prprioconfessasse no prefcio, escrito pela sua prpria mo, com o qual, pelo menos, agra-dece-me afirmando que ele me deve favores, dirigindo-me algum louvor, mas, na ver-dade, inspido (como se costuma dizer) e cheio de tolices; mas isto porque ele esteve,no por poucos dias, hospedado comigo em Uraniburgo, quando lhe dei generosamentecomida e bebida e, ainda por cima, quando foi embora, dei-lhe dinheiro; e eis qual o

    agradecimento que ele d por essas e outras coisas! Aproveitou da ocasio dessas con-fuses, tal como aparece em nosso primeiro tomo das Cartas astronmicas, na carta deChristopher Rothmann,5matemtico do Landgrave, na qual chama esse Urso de patifetorpe, quando este estava na corte de seu prncipe,6conhecendo-o assim pela prpriaexperincia e, tambm, pelo relato feito por outros desse lugar, onde antes vivera. Ver-dadeiramente, ao menos, isto me foi referido de modo jocoso pelo dito de outra cartade Rothmann, na qual este ltimo declara por qual dolo ele subtraiu, naquele tempo es escondidas, algumas de minhas coisas, pelas quais nada recebi; e que tambm porsua prpria mo (que negar no se pode) me foram arrancadas; sem dvida, se me res-

    tasse uma folga dos graves estudos, no toleraria aquelas cartas at que fossem retira-das de nossos impressos, e que sendo obrigados a rever aquele livro que foi por mimeditado, e manchado pelo nome desse Urso selvagem e ftido,7sem que desse modo oepteto acrescentado possa ser indigno, ou ainda segundo o juzo costumeiro dos ho-mens; assim seria feita uma injria, segundo no s Rothmann, mas tambm muitosoutros que o conheceram, e que o percebem bem. Na verdade, porque no falo geral-mente em meus escritos sobre a vida e os costumes dos outros, quaisquer que sejam,omiti o nome dele na carta ao magnfico senhor Jac Curtz,8de timo carter; depois,em Warnerburgo, li no livro sobre a Mecnica da astronomia como o dito senhor Jac

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    Curtz o chama e o intitula de plagiador.9Mas aconteceu que, enquanto eu confiava aalguns estudiosos o trabalho de corrigir as provas tipogrficas desse livro de cartas elhes entregava os originais manuscritos, eles levaram tudo adiante sem nada mudar enem ousaram interpelar a mim, que estava ausente, sobre outras coisas mais srias;portanto, tudo que tinha autografado permitiram que fosse impresso, feito assim semnenhum cuidado, o que [ocasionou que] o nome dele ficasse com os eptetos coloca-dos. Se, na verdade, esta causa for suficiente e justa, ento em breve cuidaremos, detodo modo, de responder a essas malcias ditas furiosamente contra mim e os meus eat contra minha ptria. Ele poderia igualmente queixar-se da injria e refut-la pormeios lcitos, se alguma coisa tivesse sido feita contra ele; mas no pelo desejo desen-freado de vingana, deixar-se enfurecer com nimo to impotente piorando muito as

    coisas. No entanto, no estimes que eu esteja comovido com esse velhaco mais do queminhas condies permitem ejulgas(no entanto, com o nimo cndido) se nem mes-mo digno da ira do Imperador (como algum j escreveu para mim). Contudo, eletentou, contra o direito humano e divino, e contra as constituies honradssimas doImprio, difamar-me por escrito, com a cara lavada, bem alm de toda minha verdadee mrito; cuidei, portanto, de agir com o mesmo direito e segundo as leis para que elefosse reprimido e castigado. [...] Como, verdadeiramente, entendo pelas tuas [cartas]que tu no vistes esses papis imundos e idiotas, envio um exemplar para que tu vejasmais detidamente a tal carta e julgues as outras coisas quais sejam. Vers inteiramente

    quanto o plgio louco, maldizente, ignorante e asqueroso, e bem infestado pelo mau-cheiro do seu autor. Talvez tu nunca leste calnias mais vergonhosas. Os ouvidos detodos os cordatos e bons se horrorizam com elas. Certamente, trato a respeito desseUrso Dithmarsus muito mais, pois nem tanto por ti ou por mim digno das palavraspronunciadas, e se tu conhecesses o mesmo inteiramente (como dizem) e na pele (jno falo sobre a sarna glica, a qual brota por causa da impureza da vida), testemunha-rias o mesmo comigo, como h algum tempo testemunhei. Acrescentarei, pelo menos,uma nica coisa, na causa da defesa das nossas hipteses, embora isso seja o mnimo etenho mais argumentos e mais vlidos no que exponho mais adiante. Aquelas hipte-

    ses, descobertas primeiramente por mim no ano de 1584, as quais ele no hesitou ematribuir a si mesmo, algum acreditar verdadeiramente que tenham sido invento dele?Pois todos sabem que ele nunca foi instrudo em nenhuma observao celeste de ondepudesse chegar a novas hipteses. Ele no pode (muito menos poderia) demonstrarpor essa nova suposio, segundo todas as particularidades, o lugar em que aparece umnico planeta, quanto mais [o lugar] dos trs superiores.10Pergunto, a algum queentende, se acreditaria que ele descobriu tal coisa.11

    Mas, enquanto eu mesmo no publicava as minhas idias, hesitando em manifes-t-las,12outros, alm dele, ousaram atribuir a si mesmos certas descobertas [minhas].13

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    Entre esses est um certo Scotus, de nome Ducano,14professor de medicina e mate-mtica em Helmstade, o qual, como recebesse na Dinamarca essa minha teoria, ensi-nou-a primeira e privadamente em Rostock aos seus discpulos. Ele no negava serminha e ainda chamou-a tychoniana mas, como eu estava prximo, temia que, se fi-zesse de outro modo, eu viria a saber. s escondidas, porm, sussurrava ao ouvido dodiscpulo ter atribudo a mim aquela hiptese em virtude de uma homenagem, paraque eu pudesse ter mais aceitao e autoridade entre seus discpulos, mas que, verda-deiramente, era sua prpria; e depois, em Helmstade, mais longe de mim, continuou(a cham-la de sua) mais audaciosa e vergonhosamente, parte em suas prelees p-blicas, parte em algumas exposies. Mas essa fraude e impostura ficou amplamenteesclarecida quando foi descoberta por outros, principalmente pelo senhor Doutor

    Daniel Cramero,

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    pregador entre os estirinenses, homem singularmente erudito, queantigamente era ouvinte, um entre outros, desse Scoto em Rostock. Se pudesse, logocuidaria que fosse colocado a eles o exemplo de tua carta ao nobilssimo senhor Oli-gero16dos rosa-cruzes, meu parente, do qual era ento pedagogo o dito Cramero, queescreveu [carta] sobre isso, depois da minha partida da Dinamarca.

    Assim, do mesmo modo, Roeslin,17se lcito dizer, mais astuto e cauteloso, pre-sumiu apresentar as minhas idias como suas; no entanto, fez de tal modo que, comono negou que essa especulao era minha, confessou, porm, que ele, depois que des-cobriu as semelhanas, a reencontrou no meu livro sobre o cometa de 1577. Realmen-

    te, o disfarce escolhido no pde merecer f, pois aquele meu livro,18

    pelo que me lem-bro, foi impresso h 9 anos, e as disposies das revolues celestes introduzidas pormim j eram conhecidas por muitos. Mas, por nada mais, isso produziu pelo menosuma fraude muito grande, porque, enquanto tentasse provar que essa hiptese foi suadescoberta, em nenhuma outra, de certo modo, conseguia, pois, graas a Deus, (se ten-tasse) corrigi-la, impingiria enormes absurdos, perturbando a prpria simetria e aspropores das revolues, estabelecendo coisas muito afastadas das prprias aparn-cias. Isso tudo para que da fique muito claro que ele nem ao menos entendeu essashipteses e muito menos foi o autor delas; e que tambm fique certo principalmente

    de que ningum at agora penetrou em nenhuma outra [hiptese] da astronomia.19Eu nunca julguei que Maggini, o italiano,20ficasse impressionado por tal coisa.

    Porque ele, em carta de prprio punho destinada a mim,21confessou que descobriuprimeiro aquela hiptese tirada do nosso segundo livro acerca dos fenmenos etreos,e que, principalmente, agradou-lhe o modo pelo qual provo o Sol transitar pela rbitade Marte (porque pensa que os orbes sejam reais no cu, pela sentena da Vulgata),mas admitiu o contrrio.22Se outros so conhecedores dessas especulaes, neste caso,

    verdadeiramente, concordam com a opinio acerca de Maggini, entre os quais Fran-cisco Patricius,23que, alis, faz meno dele no erudito volume a respeito da nova

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    Filosofia; na verdade, ele [Maggini] claramente afirma ela ser minha, mas a pervertede tal modo e por ignorncia a interpreta mal e contra as minhas prprias idias pos-tuladas e assumidas, a emporcalha e a mutila de tal modo que aqui muitas [coisas] pos-tas no relato dele no reconheo como minhas; e sobre isso tambm protestarei publi-camente. Mas a respeito dessa hiptese ou de outras no discutiremos muito; a questo: quem pode encontrar aquela razo, tanto em quantidade e movimentos contnuos,quanto discretos, que poder salvar os fenmenos celestes para sempre?24Esse otrabalho da obra, por ele seremos considerados. Desde o princpio, porm, eu no sa-bia que tu recebias por intermdio de Mstlin a correspondncia a ti endereada, e queele tambm correspondia contigo acerca daquelas que eu enviava a ele; admiro-meque ele mesmo no quisesse responder alguma coisa depois de tanto tempo, nem para

    ele nem para os outros s [cartas] que eu havia mandado tantos anos atrs.

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    Por acasojulgas certo que isso venha de um homem ingnuo, aparentemente versado nas disci-plinas matemticas? No de meu costume, de resto, prevenir desconhecidos por car-tas, mas costumo muito mais ser prevenido por eles, quanto menos [costumo] receberresposta alguma para as minhas cartas, passado tanto tempo. Mas, para o futuro, da-quele por quem sempre tive grande apreo, como os meus escritos editados publica-mente podem testemunhar, no serei mais importunado por cartas desagradveis, comome acontece.

    Gostas o que eu escrevi para eles e para ti acerca das coisas astronmicas? Toda-

    via, certamente tereis notado que eles no penetram essas coisas assim inteiramente,e que para eles ficam escondidas muito mais coisas e maiores que escaparam dilign-cia tanto dos antigos quanto dos modernos. Tu te esforas com muitas razes, as quaiseu no desaprovo, para persuadir-me de fazer valer minhas observaes celestes nostribunais; o que verdadeiramente no recusarei fazer a seu tempo, tanto pelas causasque aduzes abundantemente como por outras. Na verdade, o mais cedo possvel fareiisso, porque muitas foram as coisas por mim estabelecidas na astronomia, trazidas luz e selecionadas por meio de observaes bem fundadas;26[...] Obters, no entanto,algum dia, se a providncia divina o permitir, aquelas coisas que foram descobertas

    por mim nos cus h muitos anos, na verdade to defeituosas e mutiladas, para nodizer incertas, assim como aquelas que se encontram nas pouqussimas tabelas de

    Werner,27ou do notvel Johannes Schner28(de fato, no vi nenhuma coisa observa-da por Werner, se tu tens alguma, comunica-me), deixadas por Regiomontanus29 eGuatero30mais exatas e constantes por si, e, alm disso, so to abundantes que comdificuldade podem ser contidas em algum grande volume.

    Acrescentarei o livro das epstolas, do qual [falei] acima, juntamente com nos-sasMecnicas,31as quais usei por mais de vinte anos como instrumento e agora estocompletas, se puderem ser oportunamente trazidas de Praga para ti. Das epstolas, com

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    exceo daquelas anteriormente mencionadas, percebers por acaso algumas que soto inteis [...] Pelas Mecnicascompreenders com quanto esforo empreendi a re-novao da astronomia, quanta diligncia usei nelas e quanto tempo despendi. Desco-brirs ainda perto da parte posterior a prova escrita daquelas coisas que at agora nes-se gnero de trabalho descobri e que, para a posteridade, com a inspirao do Criadordas coisas celestes, sero completamente expostas e, tambm, do mesmo modo, aque-las cartas dos senhores Jac Curtz e Maggini, s quais fiz meno anteriormente. Ti-

    vesse eu mandado o exemplar ilustrado (como dizem), com ele mais prontamentediscernirias tudo, se no estivesse, porm, esgotado.

    A respeito de teu livro,32sempre tive dele, assim como de seu autor, a alta estimaque ele merece; e, de qualquer modo, no recusei e nunca recusarei a ti e a outros que

    se ocupam de assuntos to sublimes e to afastados da compreenso comum, procu-rando o ncleo da verdade, a minha aprovao e sempre os tenho louvado. No entanto,o mais importante que eu no aprovo aquilo que no teu engenhoso escrito se mostra,entre outras coisas, comoum erro comum, o de atribuir realidade s rbitas celestes.Por esta via, ordenas prontamente as imaginaes copernicanas33e, desse modo, nonegarei que subscreves facilmenteos movimentos celestes obterem uma certa sime-tria, qual subjazem razes para os planetas moverem-se ao redor de um centro comdistncia diferente do Sol ou da Terra; mas as propores das disposies e a harmoniaso dadas a posterioripelos movimentos quando as suas ocorrncias se apresentam e,

    ao contrrio, no se pode pretender que so dadas a priori, tal como tu e Mstlin que-rem, e elas so difceis de encontrar. Se algum realizar essa obra, direi que superouaquele antigo Pitgoras, o qual pressentiu que a harmonia celeste bem-ordenada esta-

    va profundamenteem todo o mundo. Pode-se dizer que os movimentos circulares nocu no poucas vezes produzem as mais variadas figuras angulares e, devido a seumo-

    vimento composto, muitas vezes oblongas; e examinando atentamente algumas, pos-svel ver que isso se faz por acidente, e a razo abomina essa suposio. Com efeito, oportuno que os circuitos dos astros sejam compostos todos por crculos; alis, noretornariam perpetuamente de modo uniforme e igual [para o mesmo lugar] e frustra-

    riam, assim,a perenidade; de outro modo, seriam tanto menos simples e mais anma-los, no se acomodando nem ao uso, nem doutrina.34Em relao a Mercrio,35noh do que te queixar; sua estrela no foi observada por mim, e o mesmo nos queriamostrar Coprnico com os seus Fenmenos; o que certamente correto, pois rara-mente afasta-se dos raios do Sol e suaesfera est mais inclinada na Dinamarca do queem Freiberg, na Prssia, onde viveu Coprnico; alm disso, o mar emite muito mais

    vapores ao redor da ilha onde habitamos que em Vstula; no entanto, [observei] muitasvezes mais [do que Coprnico], at quase duas vezes por ano, pois que, em nossoUraniburgo, vigiava acuradamente os astros tanto no nascente como no poente, tendo

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    ele sido observado por ns no cu; e nem mesmo seu astro [Mercrio], entretanto, queraramente aparece e muito tortuosamente digno de punio; como evidente, pode-se fugir por um atalho. De nenhum modo deve ser recusado tomando as observaesdbias dos outros, como tentou fazer Coprnico.

    Acerca de Vnus, quanto at agora foi possvel investigar, certo que o seu apogeuno se adianta muito ao solar; de outro modo, como percebeu Coprnico, [isso] noserviu inteiramente para ele, como ocorre com as Alfonsinas imitando Al-Battni.36

    No entanto, emsua excentricidade no existe uma razo semelhante, pois conclui queela muito menor do que a solar. Quanto a ser mutvel, ainda no afirmei, mas issono foi nem provado nem reprovado pelo teu engenhoso raciocnio.37

    Extrair sutilmente da estrela polar ou de qualquer outra que o ano terrestre

    [como] pensado por Coprnico indicaria na oitava esfera algumas pequenas paralaxesestelares; e, mesmo antes, freqente e diligentemente tentei detect-las; e nada disso,apesar da diligente observao, foi verdadeiramente descoberto at agora.38Pois ad-

    verti que a estrela polar, em qualquer tempo do ano, observada com preciso acima ouabaixo do plo e tomado o verdadeiro afastamento, est no mesmo lugar (o qual nesteano est a 2o5110 e com 6o1326 de meridiano, transitando acima e abaixo do plo),do mesmo modo o desvio seria reduzido ao meio, ou melhor, entre a quarta ou sextaparte (a viso mais sutil no distingue), se tivesse mostrado a elevao do plo; h muitoindaguei porque Christhopher Rothmann que, condescendendo com a especulao de

    Coprnico, opinou que aqui alguma coisa de diferena est subentendida; e disso nada a favor do teu Coprnico (cuja especulao elegante e engenhosa h muito costumoadmirar e proclamar), observando hoje um resduo de alvio. Procura em outra parte,se quiseres. Mas, acerca disso e de outras [coisas] falarei contigo de boa vontade maisplenamente e com muita alegria, se tu me prometeres visitar-me algum dia, pois agoraser para ti menos dificultoso do que antes, j que estarei na Bomia, que certamenteno est muito afastada de ti e dos teus, fixando minha nova sede em Urnia, ondehabitarei no castelo imperial de Benatek, a 5 milhas de Praga. Pois julgo que tu jsoubestes por outros (que vivo aqui h meio ano), que fui generosamente chamado da

    Alemanha por sua majestade imperial, tendo sido muito bem recebido e com muitaboa vontade. No entanto, no gostaria que fosse a severidade do destino a te obrigar ame procurar, mas que fosse antes por vontade prpria e por amor e afeio aos [nos-sos] estudos comuns.39Qualquer coisa que seja, no entanto, encontrars em mim noapenas um amigo na prosperidade, qualquer que ela seja, mas um amigo teu tambmna adversidade, e cujo conselho e auxlio nunca te faltar, mas que antes te possa levara coisas timas. E, se vieres a tempo, talvez encontremos mais retamente aquelas ra-zes para ti do que antes foi encontrado. Adeus. Quando escreveres de Viena, mande ascartas ao Doutor Blotius,40que agora preside a Biblioteca Imperial; ele facilmente as

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    receber em Praga, onde logo me encontraro. De novo, com felicidade, adeus. Escritoem Benatek, a Veneza dos bomios, no dia 9 de dezembro do ano de 1599, do novocalendrio.41

    Teu amigussimo

    Traduzido do original em latim por Claudemir Roque Tossato e Paulo Geraldo Bevilacqua

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    Notas a Carta de Tycho Brahe a Johannes Kepler em Graz

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    Notas

    1A traduo desta carta foi feita a partir de Kepler (1949, p. 89-96).

    2Quando Kepler escreveu a Brahe em 19 de fevereiro de 1599, desculpando-se pelos seus elogios a Ursus na carta de1595, Brahe estava em Wittenberg, uma das paradas que ele fez aps partir de Hven at chegar em definitivo a Praga.3Aqui se inicia a narrao das queixas de Brahe contra Ursus, tal como foi apontado no trabalho introdutrio. Parao leitor compreender o contedo desse longo pargrafo, so necessrios alguns esclarecimentos. Em primeiro lu-gar, Brahe desculpar Kepler por ter mandado a carta de 1595 elogiando Ursus; em segundo lugar, ocorre a menos Cartas astronmicas, que so um conjunto de cartas trocadas, principalmente, entre Brahe, Rothmann e o landgravede Hesse; chamadas de Tychonis Brahe Dani, epistolarum astronomicarum libri(Livro de cartas astronmicas de Tycho

    Brahe da Dinamarca), publicada em 1596 em Hven. Em algumas das cartas do livro, Rhotmann, amigo de Brahe,chama Ursus de patife e plagiador, por utilizar indevidamente o modelo hbrido de Brahe; Ursus, ao ler essa carta,publicou o livroFundamentos da astronomia, no qual ataca ferozmente Brahe e utiliza a carta de Kepler de 1595 parase defender. Assim, o pargrafo deve ser entendido nesse contexto, de freqentes ataques a Ursus.4As hipteses so as relativas ao modelo hbrido em disputa, a centralidade da Terra, movimentando-se a Lua e oSol ao seu redor, e os cinco planetas restantes movendo-se ao redor do Sol.5Christopher Rothman (1550-1597), grande matemtico e astrnomo, foi assistente de Guilherme ivno observat-rio em Cassel, em Hesse. Acreditando piamente em Coprnico, discutiu com Brahe, seu amigo pessoal, geralmentepor correspondncia, diversos assuntos ligados admisso das teses heliocntricas. Foi, juntamente com Mstlin,um dos primeiros a aderir ao copernicanismo na Alemanha.6Trata-se de Guilherme iv, Landgrave (prefeito) de Hesse.7Brahe to duro com Ursus que, mesmo sendo cartas contra ele, gostaria de retirar qualquer meno ao seu nomedo livro.8Vice-chanceler imperial de Rudolfo ii. Curtz foi um dos intermedirios na vinda de Brahe para Praga.9Brahe est se referindo a uma carta escrita em 1590 por Jac Curtz ao prprio Brahe, onde aquele chama Ursus,sem se referir ao seu nome, de plagiador. Brahe incluiu essa carta na obra Restaurao mecnica da astronomia.

    10Os planetas superiores no modelo de Brahe e Ursus so Marte, Jpiter e Saturno, os inferiores, Mercrio e Vnus.11Brahe injusto com Ursus. Segundo Dreyer, o melhor bigrafo de Brahe, Ursus certamente foi um pensadororiginal, e ele poderia ter tido independentemente a mesma idia que teve Tycho (1963, p. 276).12Brahe no quis publicar logo o seu modelo hbrido porque queria obter mais dados e comprovaes antes detorn-lo pblico; publicou em 1588 o seu livro contendo o modelo porque Ursus, alguns meses antes, apresentou oseu modelo hbrido, conforme foi dito no trabalho introdutrio.13Nos prximos trs pargrafos, Brahe acusar Ducanus Scotus, Roeslin e Maggini como plagiadores das suas hip-teses. Esses personagens no tm o mesmo peso que Ursus, e as contendas no tiveram a repercusso que teveaquela entre Brahe e Ursus. Provavelmente, a incluso dos trs nomes na carta serve apenas para ressaltar, peranteKepler, quantos astrnomos usaram ilegalmente as hipteses do modelo hbrido proposto por Tycho.14No foi possvel obter dados sobre essa pessoa.

    15No foi possvel obter referncias sobre esse senhor.16Amigo de Brahe que manteve correspondncia com ele entre 1596 e 1601.17Heliseus Roeslin (1544-1616); mdico e professor. Roeslin no foi propriamente um astrnomo, apenas se inte-ressou pela astronomia aps a nova de 1572 e o cometa de 1577. A ele foi atribudo um modelo hbrido de universo,semelhante ao de Brahe; mas o prprio Roeslin afirmou que o modelo de Brahe era superior ao de Ptolomeu e deCoprnico, e defendeu a prioridade de Brahe sobre Ursus (cf. Hellman, 1971, p. 164).18O livro obviamente oDe mundi, de 1588, que contm o modelo hbrido de Brahe.19Brahe duro com Roeslin, afirmando que ele no teria competncia para entender e descrever os fenmenoscelestes, os movimentos planetrios, utilizando as novas hipteses.20Trata-se de Antonio Giovanni Maggini (1555-1617), astrnomo italiano; dedicou-se docncia de matemtica eastronomia, publicando vrias efemrides. Ptolomaico, manteve correspondncia com Brahe, discutindo vriosaspectos acerca das tabelas dos movimentos planetrios.

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    Claudemir Roque Tossato

    21Essa carta foi mandada para Brahe em setembro de 1590, e ele a inseriu na obraRestaurao mecnica da astronomia.22Aluso ruptura das esferas de cristais. Como foi visto na introduo, no modelo de Brahe as rbitas de Marte edo Sol intersectam-se, de modo que tal modelo no compatvel com a existncia de orbes slidos. Maggini, segun-do ele prprio, chegou a esse mesmo modelo, mas, por ser mais cristo do que Brahe, o abandonou porque o consi-

    derava contrrio sSagradas escrituras.23No foi possvel recolher qualquer informao acerca desse personagem.24Essa ltima frase de Brahe importante para a compreenso da astronomia do sculo xvi. Ela se liga a Pierre deRame (1515-1572), conhecido pelo nome latinizado Petrus Ramus. Humanista, matemtico e filsofo, foi um gran-de antiaristotlico e antipapista. Sua principal contribuio astronomia restringe-se metodologia, quando pu-blica o livroScholarum mathematicarum libri xxxi(Ensinos de matemtica, livro xxxi), em 1569, na Basilia, pedindo areformulao da astronomia que, para ele, deve ser uma astronomia sem hipteses, baseada somente nas ob-servaes celestes. Sua crtica alicera-se no uso excessivo que a astronomia fazia, no sculo xvi, de epiciclos, de-ferentes, excntricos, equantes etc, sendo uma cincia matemtica apenas e no, fsica. Ramus pedia aos astrno-mos deterem-se nas observaes celestes e expressarem os movimentos segundo elas. Brahe teve um encontro comRamus em 1570, e pretendeu, mas no conseguiu, basear a astronomia somente em observaes; o problema que

    ele no conseguiu abandonar o princpio de circularidade e uniformidade, usando os artifcios abominados porRamus. Salvar os fenmenos celestes para sempre, como escreve Brahe, seguir a exigncia de Petrus, no fazermais hipteses, representar os pontos dos movimentos planetrios sem utilizar hipteses que sejam equivalentes aoutras. Quem fez isso foi Kepler, quando abandonou o axioma platnico.25Creio que nessa passagem, Brahe est cobrando de Kepler se ele sabia, por intermdio de Mstlin, da disputaentre ele, Brahe, e Ursus. Alm disso, Brahe tambm cobra de Mstlin que esse se ponha mais a seu favor na conten-da com Ursus. Mstlin, sendo um copernicano, mas no muito declarado, deve ter passado por uma crise entredefender um modelo que ele no aceitava plenamente em pblico ou se declarar um copernicano.26O contedo deste pargrafo se refere ao catlogo das observaes coligidas por Brahe durante toda a estadia emUraniburgo. Esse catlogo foi publicado com o ttulo Progymnasmata, na cidade de Praga em 1602, aps a morte deBrahe. Nessa obra esto catalogadas 777 estrelas, sendo o melhor catlogo feito antes do uso do telescpio. De cunhoanticopernicano, o livro considerado o mais importante de Brahe. Kepler usou esses dados e os aperfeioou, uti-lizando-os, juntamente com suas leis dos movimentos planetrios, para determinar tabelas de posicionamentos,produzindo a obra Tabelas rudolfinas, publicada em 1627, tendo esse nome em homenagem a Rudolfo ii. Na verdade,Brahe na carta faz meno de public-las, mas esperava justamente por Kepler para auxili-lo na organizao dasobservaes de acordo com o seu modelo hbrido, discutido na introduo, mas Kepler organizou os dados no siste-ma combatido por Brahe, o copernicano.27Johann Werner (1468-1528), astrnomo alemo. Foi educado na Itlia, dedicando-se aos estudos dos cometas.Seu trabalho foi importante para a astronomia do sculo xvipela determinao das distncias planetrias com o usoda trigonometria.28Astrnomo alemo (1477-1547). Foi o responsvel, junto com Osiander, pela publicao doDe revolutionibus, deCoprnico. Tratou dos posicionamentos dos planetas e dos possveis movimentos da Terra, principalmente no se-gundo captulo de seu livro Opusculum geographicum(Opsculo geogrfico), publicado em 1533 na cidade de Nuremberg.

    29Forma latinizada de Johannes Muller (1436-1476). Um dos principais astrnomos antes de Coprnico. Uma dassuas principais contribuies astronomia foi a traduo do Almagesto, retirando erros grosseiros cometidos pelatraduo de George de Trbizonte (sculo xiii).30No foi possvel obter referncias de Guatero. Provavelmente, foi discpulo de Regiomontanus.31 a obra Astronomiae instauratae mechanica(Restaurao mecnica da astronomia), editada em Wandsberg, em1598. Nessa obra, Brahe descreve todos os instrumentos que utilizou em Uraniburgo, o quadrante, a armila equato-rial e o sextante, entre outros. O livro apresenta desenhos e detalhes da utilizao dos instrumentos. A renovao daastronomia professada por Brahe consiste no uso em grande escala das observaes celestes como condutoras dasteorias em astronomia.32Neste pargrafo inicia-se a crtica de Brahe ao mtodo apriorstico usado por Kepler noMysterium cosmographicum.

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    Notas a Carta de Tycho Brahe a Johannes Kepler em Graz

    scientizudia, So Paulo, v. 2, n. 4, p. 575-8, 2004

    33imaginaes copernicanas. O interessante que, nesse perodo especfico da histria da astronomia, o coper-nicanismo, por no ser dado diretamente aos sentidos, isto , ningum v ou sente a Terra se movimentar, vistopor Brahe como uma imaginao, fruto de imagens construdas na mente que, primeira vista, no tem relaoalguma com as experincias. De fato, o copernicanismo conceitual; representa-se intelectivamente o mundo pro-

    posto por Coprnico. Isso aponta para uma das grandes dificuldades pelas quais esse programa nascente passou:permitir resolver os problemas empricos e, ao mesmo tempo, dar explicaes que tm como base conceitos queno podem ser comprovados diretamente pelos sentidos.34Essa exposio que se inicia em Pode-se dizer que [...] mostra um dos problemas filosficos de Brahe. Por umlado, ele um ardoroso defensor da astronomia observacional, defendendo a construo de teorias a partir da expe-rincia; por outro lado, entretanto, rejeita qualquer fuga ou ruptura com o axioma platnico de movimentos circula-res e uniformes ou compostos desses; as curvas oblongas que os planetas fazem so acidentais, no servindo nemao uso, nem doutrina. O interessante que, mesmo defendendo a astronomia observacional, Brahe no mudou,nesse caso, o apego conceitual circularidade e uniformidade.35Brahe, aps criticar a metodologia kepleriana, passa a apresentar trs problemas tcnicos do copernicanismo,relativos a Mercrio, Vnus e falta de paralaxe estelar. Em relao a Mercrio, o problema refere-se disposio

    dos planetas. Nos modelos geocntricos, no h critrios rgidos para a disposio dos planetas inferiores; Saturno,Jpiter e Marte foram admitidos por qualquer modelo geocntrico como os planetas superiores; tambm a Lua foivista como o astro mais prximo da Terra; mas entre o Sol, Mercrio e Vnus a situao era mais complexa, pois asdistncias de Mercrio e Vnus ao Sol so difceis de obter, so controversas. Plato admite que depois da Lua vem oSol, Mercrio e Vnus; para Ptolomeu, vem Mercrio, Vnus e o Sol. O critrio de Ptolomeu foi o de calcular adisposio do cosmo assentada nas medidas dos ngulos formados pelos epiciclos de cada planeta. Coprnico, aodotar a Terra de movimentos, trouxe um critrio diferente para calcular as distncias planetrias e, atravs das dis-tncias, os tempos de revoluo dos planetas. Tal critrio o clculo das distncias por trigonometria, devendo-seconhecer, para isso, a distncia angular mxima do planeta em relao Terra. Pelas observaes de Mercrio ouVnus se pode calcular a elongao mxima de cada um uma tangente (na rbita do planeta) que une a Terra e oplaneta, formando uma perpendicular com o Sol. Por esse critrio, pode-se conhecer a distncia e o tempo detranslao de cada planeta, o que levou Coprnico a conferir a seguinte ordem ao mundo celeste: E se o primeiroargumento permanece vlido porque ningum apresentar outro mais evidente do que ser a extenso do tempo amedida do tamanho das esferas [...], a primeira e mais alta de todas a esfera das estrelas fixas [...]. Segue-se depoisSaturno, o primeiro dos planetas que percorre a sua rbita em 30 anos. A seguir vem Jpiter que completa a suarevoluo em 12 anos e Marte em dois anos. A revoluo anual ocupa a quarta posio na qual dissemos que est aTerra juntamente com a esfera lunar como um epiciclo. Em quinto lugar Vnus realiza o seu percurso em nove me-ses. Por fim, Mercrio est na sexta posio completando o seu circulo em oitenta dias. No meio de todos encontra-se o Sol (Coprnico, 1984, p. 51-2). A objeo de Brahe se liga falta de observaes seguras para Coprnico deter-minar as distncias planetrias por esse mtodo. Em primeiro lugar, porque Brahe, mesmo estando em Uraniburgo,um local menos adequado do que Vstula, terra de Coprnico, conseguiu determinar melhores observaes das queutilizou Coprnico. Em segundo lugar, porque as observaes usadas por Coprnico so dbias, com pouca margemde confiana.

    36Abu Abdullh Muhammad ibn Jdiral (850-929), astrnomo rabe. Fez correes nos trabalhos de Ptolomeu,que os levaram a construir novas tabelas sobre o Sol e a Lua, descobrindo o movimento do apogeu solar.37A questo nesse pargrafo refere-se a um problema tcnico envolvido em dois modelos distintos de universo.Brahe critica Coprnico por este querer imitar as alfonsinas, isto as tabelas baseadas nos modelos ptolomaicos, emrelao ao afastamento do apogeu de Vnus relativo ao solar.38Brahe fala da ausncia de paralaxe estelar. Esta foi uma das principais dificuldades para a aceitao do copernica-nismo no final do sculo xvi. Brahe destaca que fez cuidadosas observaes, nada encontrando. De fato, sem o usodo telescpio impossvel, dada a grande distncia em que esto as estrelas da Terra, encontrar uma paralaxe estelar.39Brahe quer que Kepler junte-se a ele em Praga no por motivos financeiros ou polticos, mas por amor astrono-mia. A histria mostra que Kepler pode ter se unido a ele por amor astronomia, mas os motivos imediatos foramoutros. Kepler estava passando em Graz por uma situao difcil, motivada principalmente pelas disputas religiosas

  • 7/25/2019 Carta de Tycho Brahe a Johannes Kepler Em Graz

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    578 scientizudia, So Paulo, v. 2, n. 4, p. 575-8, 2004

    Claudemir Roque Tossato

    entre protestantes e catlicos. Se a sua situao estivesse boa naquele momento em Graz, seria difcil saber se eleaceitaria ou no o pedido de Tycho.40No foi possvel obter informaes sobre esse bibliotecrio.41Em 1582, o papa Gregrio xiii(1502-1585) convocou uma comisso de especialistas para reformular o calendrio

    juliano, que tinha um erro de 11 dias em relao ao movimento solar. Depois das discusses feitas pelos estudiosospresentes na comisso, o papa declarou que o dia a seguir 04 de outubro de 1582 seria 15 de outubro. Desse modo,Brahe est aderindo ao novo calendrio gregoriano. Cabe lembrar ainda que a carta tem um ps-escrito que contmpedidos de Brahe para que Kepler mande informaes sobre os eclipses que foram catalogados por Mstlin e envia,tambm, um poema seu. O ps-escrito no foi includo na traduo da carta por no se remeter ao seu principalassunto.