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    1

    Universidade da Amaznia

    Carrilhes

    de Murilo Arajo

    NEAD NCLEO DE EDUCAO A DISTNCIA Av. Alcindo Cacela, 287 Umarizal

    CEP: 66060-902 Belm Par

    Fones: (91) 4009-3196 /4009-3197 www.nead.unama.br

    E-mail: [email protected]

    n e a d

    N c l e o d e E d u c a oa D i s t n c i a

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    2

    Carrilhes de Murilo Arajo Sobre a primeira edio:

    Lido pela pela primeira vez em pblico, quando o autor contava com vinte anos, Carrilhes um livro de adolescncia.

    Esse fato explica suas hesitaes. E explica igualmente suas audcias. Arvorava ele inicialmente, quando surgiu a lume, esta

    NOTA INDISPENSVEL Em certas poesias, vai impressa em tipo maior uma ou outra frase, fortemente enftica. Ao contrrio, as palavras escritas em tipo menor devem ser lidas brandamente, como num esmorzando.

    que eu sentia, ento, como agora, ao contrrio de muitos poetas que vieram a constituir comigo depois as alas do modernismo, que a pontuao era insuficiente para dar todas as inflexes exigidas pela expresso potica.

    Serviam de introduo ao livro estas palavras: Meus versos formam simplesmente uma srie de emoes ritmadas e assim

    devem ter ao menos um interesse psicolgico. Meus versos obtero poucos acolhimentos de estmulo ou justia, tendo eu

    vivido (alis por fora das circunstncias e no por qualquer vaidade) longe dos meios literrios que geram muitas reputaes.

    Meus versos se exprimem algumas vezes por formas ainda no usadas, formas intermdias entre a antiga estrofao e a mtrica nova, livres s vezes aparentemente ou livres complementares, ou formando sries com as tnicas deslocadas simetricamente, linha a linha. So tentativas nascidas no da extravagncia, mas da insatisfao que nos causam sempre as formas de exprimir.

    Meus versos no tm freqentemente bastante clareza; que a conciso excessiva uma tendncia geral que hoje pesa sobre quase todos os temperamentos: na poesia, futuristas ou saudosistas, um Verhaeren, um Nervo ou um Whitman, so como Debussy na msica, Bergson no ensaio ou Rodin na escultura, a vitria da idia esboada sobre a idia desenhada.

    Meus versos, dolorosos que sejam, no nasceram nunca de pieguismos artificiais, mas tm uma origem profundamente humana: o sofrimento. E orgulho-me apenas de ter sofrido, porque a adversidade um ttulo de educao espiritual um ttulo que me honra muito.

    A crtica nova mais autorizada coroou, todavia, de modo extremamente generoso, as tentativas do estreante.

    A crtica rotineira daqueles tempos de tirania mtrica, ao contrrio, fez grandes restries s discutidas "extravagncias do poeta"...

    E no eram extravagncias. Eram as trepidaes de um 14 bis, de um primeiro aviozinho aventureiro, aflito por arrancar-se da plancie rasa, to rasa e to ch. Carrilhes Sinos de Bronze

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    3

    Agonia Inrcia

    Heri Morto Aos outros Invocao

    Elegia Viso

    Escravido Palpitando Carnaval

    Impossveis Baladilha Pobreza Espuma

    Luminosa Hospital Idade

    Confisso Coroas Mastros

    Sinos de Cristal

    Dois anjos A de outrora Aspirao

    Sereia Na praia A queixa Sonetilha

    Exlio Madrugada

    Ingenuamente Esperana

    Infncia Romance Pastorinha

    Treno Piedade Mariucha Infinitude

    Vespertina Sinos de Ouro

    Adorao Perfeita

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    4

    Essa... Ternura

    Espelhos Ninfias Esttica

    Despertar Romanesca

    Jasmins Epitalmio

    Bailado Iluso

    Domingo Primitivo Bonana Idealismo

    Final Carrilhes

    Sou o tristonho sineiro que moureja fiel s vozes do alm, surdo s vozes do cho sou o Quasmodo novo e pobre, em minha igreja

    Nossa Senhora da Imaginao.

    Invisvel igreja! Igreja da Lei Nova! Templo de naves de ouro e prticos de luar! Amo o teu campanrio espiritual que trova...

    (Amem todos o incenso... outros o altar!)

    Amo o teu harmonioso campanrio

    Imaginrio e inatingvel a vibrar

    estas rimas e sons que, solitrio, escuto, limpas, limpo no ar

    a gorjear.

    Amem outros o altar, amem outros ou incenso, sejam mestres rabis ou deuses da orao...

    Serei na torre s.

    Sinos! Tudo o que penso Ecoai longe do p,

    musicai na amplido!

    Rolando ecos no mundo oh, versos ide zoando interpretando a alta e sonora inspirao.

    Vozes de ouro e de bronze e de cristal, vozeando eu s posso cantar no vosso carrilho!

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    5

    ... e s posso chorar no vosso carrilho.

    ...E s posso chorar... no vosso carrilho... Sinos de Bronze

    Sinos de Bronze! o vosso timbre escuto dobrando em luto

    dobrando e soluando quando tange.

    A angstia negra o corao me morde: O vosso acorde

    a Morte vem zo-lo como um alfanje?

    Eu vos escuto como um choro fundo, quando aprofundo

    o nada... a vida e o ser se me confrange.

    Sinos de bronze! a vossa voz to longa, na noite se prolonga

    como um gemido ao longe... E plange, plange! Agonia

    Os cilcios das dores os cilcios eis a norma de bronze do meu culto!

    Venham angstias, venham sacrifcios! Venham profundos males em tumulto!

    Venha o choque moral, profundo, herico,

    que faz um gnio at de um triste paranico!

    Venha esta gua lustral que o nico batismo: a gua vem da lgrima, a salvar do Abismo!

    Venha a luta essa luta em que me esforo!

    Venha a luta que gera a esperana e o esforo!

    Venha um maior pesar, que faa achar mais doce a Morte a rir, que me olha afiando a foice!

    Venham profundos males em tumulto, venham angstias, venham sacrifcios! Eis a norma de bronze do meu culto:

    os cilcios das dores os cilcios! Inrcia

    A cidade! A cidade em seus rumores! E a civilizao turbilhoando!

    e a vida em febre forte delirando

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    6

    com furores, clamores e estertores!

    E h lutadores ao sol marchando! ao sol marchando!

    Por que s eu no luto ou no comando? por que sou preso s mgoas interiores

    com Saudade e Esperana meus amores e com desiluses me acorrentando?!

    E h vencedores,

    h vencedores ao sol cantando!...

    Heri morto

    Ora afinal que vale a vida?... o mundo? Quando, com riso desdenhoso e largo, combateste e venceste, o riso, ao fundo

    era talvez... era decerto amargo!

    Forte! Agora sorri no teu letargo final, com um riso plcido e profundo

    melhor que o riso desdenhoso e largo! Pois afinal que vale a vida?... o mundo?

    To nobre, no sofreste entre mesquinhos?

    No tinha abrolhos numa grande parte das palmas que colheste nos caminhos?

    As rosas do triunfo na tua arte

    s agora so limpas dos espinhos para forrar-te o sono e coroar-te!

    Aos outros

    Sabeis o que ser sombra oh, vs que sois o dia? Sabeis o que sofri, que sofro e sofrerei?

    No! Para vs, o sol para vs a alegria! Correi ao bom jardim da esperana.. e colhei!

    Colhei risos e mel. Tambm eu sorriria

    se soubesse sorrir, pois nem sorrir mais sei...

    E agonio de sonho, e sonho de agonia! Mas por que para que, se era triste, sonhei?

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    7

    Invocao

    Lua elevada, lmpida... trmula e taciturna, s lua, a gara olmpica, pssaro da iluso!

    Lua, s polida e difana... Placa espelhar noturna, serves de espelho mgico para a Saudade! no?

    Lua de paina alvssima paina a florir soturna,

    que arminhos teus levssimos hoje me afagaro?

    Lua de sonho e mrmore! Branca e inefvel urna, Derrama-me o teu blsamo! Traze-me a solido!

    Elegia

    Penso na bruma almalm... No colo da neve de uma neve eternamente fria

    sonharia em silncio... e a alvorada do polo no meu sonho de paz esplenderia.

    E por que temeria o cu plmbeo de morte?

    E por que temeria o gelo em penedia?

    No: j sofri sereno outro frio mais forte: certa voz... certo olhar e certo adeus, um dia...

    Penso na bruma alm alm, no colo

    da neve de uma neve eternamente fria... Oh o inverno sem fim dos defuntos, num solo

    onde a cal como neve choveria! Viso

    Tenho noite a viso de que as estrelas de ouro

    vo descendo ao meu sonho e vm danando em coro.

    Sinto-as numa nevrose... numa fascinao... numa alucinao!

    Louras, lcidas, longas, lindas, leves, lentas quer agonie ou goze

    eu as sinto nevoentas, lnguidas e luarentas,

    uma por uma dando o plido claro!

    Uma diz: "Chamo-me Apoteose!" Outra diz: "Chamo-me Afeio" Outra , levssima, a Confiana,

    outra a Lembrana, outra a Ambio...

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    8

    E assim tenho a viso de que as estrelas de ouro vm, danando, ao meu sonho e vo descendo em coro.

    Mas choro de aflio...

    pois falta a estrela que procuro em choro, falta a que foi na terra um vulto louro,

    falta a que est no cu, e acha desdouro descer e iluminar-me o corao!...

    Escravido

    Comparada ao alm, a Terra um calabouo. Ah! Quando morre algum, esse dobre eu ouo

    no d o sinal para um forado se livrar?

    Morrer... morrer no de crcere mudar?!

    Oh carcereira Vida, haver ainda trguas? ... No sem fim, cada mundo (alguns milhes de lguas...)

    para o Pensamento a priso... celular!

    Deus s livre e pode em liberdade voar! Palpitando

    No rodas rudemente e mecanicamente, no rodas rude, rija e mecanicamente,

    mola viva do ser a bater, a bater?!

    Corao, no te pude encordoar de esperana! Corao, poderei te encordoar de esperana?

    Tua corda j cansa a bater, a bater!

    Carnaval

    Noite. Noite infernal: Uiva na rua a