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Artigo apresentado a disciplina de Folclore do Curso de Educação Fisica da UFPA-Castanhal!

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Page 1: Carimbó: da repressão a candidatura a patrimonio cultural brasileiro - Ester Corrêa

CARIMBÓ: DA REPRESSÃO A CANDIDATURA À PATRIMÔNIO

CULTURAL BRASILEIRO

Ester Paixão Corrêa

Universidade Federal do Pará, Castanhal, PA

RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo conceituar e analisar a manifestação cultural paraense chamada de Carimbó como parte do elemento cultural presente no folclore paraense. A conceituação se dá por bases em conteúdo teórico existente na Literatura folclórica do Brasil e do Pará, analisando-se seus aspectos mais importantes, desde sua origem até o contexto atual, em uma tentativa de aproximação com o mundo dos mestres, bem como de personagens relevantes no contexto do carimbó, justificando assim, o ritmo como patrimônio Cultural Paraense e candidato a Patrimônio Cultural Brasileiro.

Palavras-chave: Carimbó. Manifestação Cultural. Folclore Paraense.

INTRODUÇÃO

Este trabalho estuda alguns aspectos do folclore paraense, visto que o Estado é rico no

que tange a cultura, desde a culinária, danças, artesanato, religiosidade até a música, sendo

estes “produtos típicos” a expressão dessa cultura diferenciada que tipifica nossa identidade.

Destacaremos para este trabalho as particularidades de um ritmo e dança originalmente

paraense, o carimbó, sendo este o foco de análise aprofundado.

O Folclore tem como objetivo estudar manifestações materiais e espirituais de uma

determinada comunidade sejam elas, orais ou escritas, objetivas ou subjetivas que seja fruto

de experiências cotidianas e que possuam características de ter-se propagado ao passar do

tempo e espaço, ou seja, é a sabedoria do povo (MARTINS, 1999). O folclore paraense

originou-se na miscigenação das raças formadoras (negros, índios e portugueses), foi criado

pelo Cabloco a partir de seu contato com a natureza e o espaço onde vivenciava suas

experiências mais profundas que moldariam o que hoje temos como uma das referências

máximas na cultura paraense: O Carimbó.

No decorrer do trabalho será feito uma abordagem do carimbó como patrimônio

cultural do Pará, fazendo um levantamento de dados históricos desde sua fase em que não era

aceito chegando a ser proibido, fazendo uma conceituação de seus elementos constituintes e

essenciais e finalmente chegar-se-á na luta pela patrimonização e reconhecimento do carimbó

como Patrimônio Cultural Brasileiro.

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O CARIMBÓ

O Carimbó é uma das manifestações culturais do Estado do Pará que mais representa

simbolicamente a dança do Estado, transformando-se em um verdadeiro patrimônio cultural

paraense. A dança é executada em grupos composto por homens e mulheres, que dançam,

tocam e cantam o ritmo.

A palavra curimbó (carimbó) origina-se da junção de duas palavras: curi (madeira) e

imbó (oca) formando a expressão “pau oco que produz som”. Segundo Cascudo (2002), O

Carimbó é uma dança de roda, típica dos folgueados caboclos com acompanhamento de

percussão, o autor também o tipifica como instrumento o definindo como: “Atabaque, tambor

de origem africana, feito de tronco escavado. Sobre uma das aberturas se aplica um couro bem

esticado (...)”, levando-nos a conclusão que a palavra carimbó pode caracterizar não apenas a

dança em si, mas também os tambores que são os instrumentos principais que dão o ritmo

mais forte a dança. Portanto a palavra nos remete a compreensão dessa manifestação como

um todo.

Para Piai (2004), o Carimbó tem sua origem negra, surgindo durante as festas em que

os negros cultuavam seu santo padroeiro: São Benedito, com o tempo perdeu a sua essência

divina e tornou-se popular. Porém Martins (1999) diz que o carimbó é fruto da criatividade

dos índios tupinambás, mas não causava entusiasmo por ser um ritmo lastimoso e com

chegada dos africanos a dança passou a ter características diferentes ganhando ritmos

agitados, de andamentos rápidos e movimentados empolgando quem assistia.

Percebe-se que o Carimbó surgiu da necessidade que os negros sentiam de se divertir

para aliviarem e provavelmente, esquecerem dos maus tratos sofridos pela sua condição de

escravos.

O município de Marapanim, no nordeste paraense, defende a idéia de ser o criador e

guarda a fama de ser o principal divulgador desse ritmo empolgante. Esse município tem sua

economia baseada na pesca, sendo, portanto os pescadores responsáveis por grande parte do

acervo artístico de carimbó. Porém o ritmo está presente em outras regiões do Estado que

possuem tradição na divulgação e desenvolvimento do ritmo como é o caso da região do

Marajó (cidade de Soure) que apresenta o carimbó denominado pastoril, Santarém com seu

Carimbó Rural e a Zona do Salgado com o carimbó praiano (MARTINS, 1999).

Para que atualmente o carimbó fosse reconhecido e reproduzido em diversas regiões

do estado, ele passou por um processo histórico de marginalização, chegando a ser proibido,

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exatamente por conter na sua essência elementos fortes da cultura negra confundindo-se com

outras expressões dessa cultura e por ser apreciado pela classe mais popular da sociedade.

O carimbó foi reprimido oficialmente por muito tempo, chegando à forma jurídica em

meados do final do século XIX através do “Código de Posturas de Belém”, quando dançar

carimbó se tornou proibido pela polícia, por ser considerada uma dança de negros, de

desocupados e dança de escravos, portanto dançar carimbó poderia gerar um problema sério,

pois a sociedade não aceitava essa manifestação de origem negra (AMAZON VIEW, ANO 4;

GABBAY, 2010).

O carimbó passou a ser dançado, então, nos terreiros da capital, causando uma

exclusão do ritmo da cidade grande e fazendo-o migrar para cidades pequenas ou áreas rurais.

Porém, mesmo nas cidades do interior o carimbó não era totalmente aceito pela sociedade de

algumas localidades, por exemplo, em algumas cidades do interior, segundo Costa (2008,

p.154) “as mulheres que dançavam o carimbó eram vistas e caracterizadas por parte da

população pela qualificação de “mulher solteira” ou, em outras palavras, prostituta”. Mesmo

no interior do Estado havia a privação por parte da polícia dessa manifestação.

Uma das primeiras notícias que se teve de apresentação mostrando o carimbó como

manifestação folclórica em momentos especiais foi em homenagem a uma autoridade no final

da década de 50, pois até então, o carimbó era apenas parte do folclore paraense e era

entendido por quem estudava as manifestações da cultura regional. Nos anos 60, a idéia de

criar eventos para apresentar o carimbó ao público não obteve muitos resultados, pois o

carimbó era estereotipado como “música de roça, de bêbado, do pessoal da cana, do pessoal

do barraco” como relatou Pinduca¹ à Costa (2008), após outras tentativas frustradas de

apresentar o carimbó ao público nos anos 60, o carimbó continuou sendo visto como música

marginal até a década de 70.

Segundo Gabbay (2010), a partir dos anos de 1970 e 1980 o gênero passou a ganhar

espaço e legitimidade nas rádios e mídias da capital do Pará, através de compositores como

Pinduca, Mestre Lucindo, e Mestre Verequete, dentre outros.

Para Costa (2008) no início da década de 70 o carimbó entrou na fase de aceitação no

meio urbano e em pouco tempo ganhou notoriedade não só em Belém como em outros

estados do Brasil se tornando um dos gêneros musicais mais populares do Pará, ganhando

reconhecimento em âmbito nacional e até internacional com o lançamento de LPs de artistas

do gênero. Nesse mesmo período surgiram em Belém diversos grupos de carimbó que

juntamente com grupos do interior, contribuindo para o surgimento dos festivais de carimbó

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1 Artista de carimbó reconhecido no Pará. Será conhecido mais adiante nesse trabalho.

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tanto na capital quanto no interior, e com a aceitação da dança do carimbó principalmente

pelo público jovem. Porém a popularização do carimbó foi contraditória, pois era aceito e

tocado em vários ambientes da cidade e em outros lugares existia muita resistência,

principalmente em ambientes burgueses, de classe privilegiada, como festas de aniversários,

formaturas e casamentos, sendo mais aceito em eventos em clubes e casas de shows, na

maioria das vezes, na periferia.

Costa (2008), diz ainda que o público que mais apreciava o carimbó era o

universitário, que passou a estudar e debatê-lo, muitos criticavam a forma como o ele estava

sendo apresentado, principalmente por artistas como Pinduca, o qual segundo alguns debates

consideravam-no com “deturpador” do gênero por incorporar ao ritmo outros instrumentos

como guitarra e baixos, diferenciando-o do tocado originalmente no interior. Outros jovens

não se importavam com as questões estéticas, preferiam se divertir com o novo ritmo.

Em meados de 1973, começa-se a perceber a potencialidade comercial do carimbó,

pois mesmo ele não sendo aceito pela elite da cidade, já existiam vários espaços nos subúrbios

de Belém que realizavam eventos relacionados diretamente ao carimbó. Foi a partir desse

instante que o carimbó passa pela transição de manifestação folclórica para música popular,

pois a medida que ia se urbanizando ia se tornando música popular. Até então o carimbó não

havia sido assimilado como música popular, com o surgimento dos discos, dos shows, e a

divulgação na imprensa, ele começa a ser visto como música popular e elemento da

identidade do paraense. A partir desse contexto o carimbó passa a ser procurado inclusive por

artistas reconhecidos nacionalmente que passaram a gravá-lo, enquanto que no Pará surgem

manifestações folclóricas para a formação de grupos folclóricos e realização de diversos

eventos do gênero, incorporando movimentos de preservação do carimbó “raiz”. Por volta de

1976, o carimbó já era um ritmo conhecido em todo Brasil e era reconhecido como música do

Pará, enquanto que no Pará ele era amplamente aceito e tocado na periferia e em alguns

pontos da elite local (COSTA, 2008).

Nas últimas décadas, o carimbó ressurgiu como música regional e referência para

outros gêneros contemporâneos do Estado. O carimbó ganhou espaço e legitimidade a partir

da década de 70, através de compositores como; Mestre Lucindo, Mestre Verequete e

Pinduca, dentre outros, que foram os responsáveis pela divulgação do ritmo nas mídias do

Pará. Nos últimos anos, há uma discussão entre artistas, defensores e agentes culturais em

torno da apropriação do carimbó moderno (GABBAY, 2010).

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A DANÇA, MÚSICA E POESIA

Carimbó foi um termo usado inicialmente para definir os tambores, porém

posteriormente o termo generalizou-se, estendendo-se à música e a dança. O carimbó é uma

dança de pares soltos, onde os dançarinos se vestem tipicamente. As mulheres usam saias

longas, rodadas e coloridas, e blusas brancas com arranjos de flores na cabeça. Os homens por

sua vez, usam calças brancas e camisas de estampas coloridas, mesmo tecido das saias das

mulheres, e usam na cabeça um chapéu de palha. Ambos dançam de pés descalços 2.

Como descreve Martins (1999), a movimentação coreográfica é iniciada com duas

fileiras opostas, homens e mulheres frente uns para os outros. Os homens se aproximam das

mulheres, ao iniciar o ritmo, e batem palmas convidando-as para entrarem na dança. Ao

aceitarem o convite, elas por sua vez, iniciam um movimento circular formando uma grande

roda, girando e fazendo trejeitos com a saia com o intuito de atirá-la sobre a cabeça do seu

par. O homem dança procurando evitar que a saia da mulher cubra sua cabeça, pois se isso

acontecer ele será desmoralizado. No meio da dança, a mulher atira um lenço no chão

obrigando o homem a apanhá-lo com a boca, se conseguir tal feito, é aplaudido (PARÁ

ONDE, 2000). Martins (1999) complementa que a parte mais importante da dança é a

marcação coreográfica de um dos pés que fica sempre a frente do corpo.

Figura 1 – Dança de CarimbóFonte: www.enciclopediadaarte.com.br

A música, o ritmo é obtido através de instrumentos musicais como; o reco-reco, o

ganzá, que é o responsável por um som agudo, o banjo que sustenta a parte sonora da dança, a

flauta, o pandeiro grande, dois maracás e o mais importante e antigo instrumento; os

tambores. São usados dois tambores, um com sonoridade mais aguda e outro mais grave, para

serem tocados o “tocador” senta-se em cima e toca somente com as mãos (PARÁ ONDE,

______________________________

2 Informações retiradas de material produzido pelo Museu da Imagem e do Som/Pará

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2000; MARTINS, 1999). Porém, há quem faça um carimbó diferente do “original”,

utilizando-se de outros instrumentos elétricos como a guitarra e o baixo.

O carimbó é um bailado popular, não possui um enredo verbal, as cantorias, as letras

inicialmente eram inspiradas pelo trabalho do negro e pelos objetos que o cercavam,

atualmente no meio rural, onde se encontra o carimbó autentico, as cantorias enriquecem o

repertório musical, mudando apenas a realidade do sujeito e os objetos, sendo estes ainda

tema das canções3. As letras das canções refletem o cotidiano dos pescadores que dançam de

pés descalços na areia das praias. Em Martins (2010) há um reforço da idéia quando ele

afirma que “as letras das músicas exaltam os elementos da natureza, práticas diárias

específicas da região, de quem mora fora do centro urbano, além de exaltar a figura da

mulher”.

OS MESTRES E AS PERSONALIDADES

O carimbó teve e ainda tem inúmeros representantes no seu processo de construção,

são personalidade e mestres como: Mestre Lucindo, que deu asas ao gosto do ritmo, Mestre

Verequete, Pinduca, Chico Braga dentre outros que ainda se destacam, especialmente no

nordeste paraense, como Mestre Pelé em Marapanim (DIARIO DO PARÁ, 2009).

Augusto Gomes Rodrigues, talvez com esse nome ninguém o reconheça, pois para o

público ele é apenas o Mestre Verequete, ele nasceu no nordeste paraense4 em 16 de agosto de

1916, desde pequeno trabalhou em várias atividades, impedindo-o de aprender a ler e

escrever. Era filho de um popular freqüentador de manifestações culturais populares, desde

criança se envolvia em cordões de pássaro e bois-bumbás, por influência do pai. Na juventude

percorreu várias cidades do interior fixando-se em Icoaraci, distrito de Belém, por cerca de 40

anos. Sempre participou de festas populares de rua, sendo fundador e participante de vários

grupos de bois, deixando, na década de 60, o boi-bumbá para dedicar-se ao carimbó (COSTA,

2008).

Seu despertar para o carimbó ocorreu no período em que o ritmo ainda não era popular

em Belém, tornando-o um dos primeiros artistas a gravar um LP na década de 70. Porém,

desse período não se aproveitou muito de sua música, sua trajetória foi bastante difícil, pois

por não ser alfabetizado, ele foi enganado várias vezes por seus empresários e acabou quase

na miséria. Na década de 80, mudou-se para a periferia de Belém, e o carimbó encontrava-se

em outro contexto, se tornara um sucesso. Mas Verequete, pouco desfrutou de seus direitos

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3 Idem4 Há divergências na literatura consultada a respeito de sua cidade de origem.

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autorais, sempre teve dificuldades financeiras e sustentava-se vendendo “churrasquinho” em

frente de sua casa. Seu carimbó era o “pau-de-corda”, o carimbó de raiz, ele nunca quis

modernizar seu carimbó, preferia manter-se fiel ao ritmo autentico (COSTA, 2008).

O nome Verequete surgiu, quando ele foi ao batuque na companhia de uma namorada,

ficou impressionado com som do batuque e com um cântico que referenciava uma entidade

chamada Verequete, voltou para casa cantando a música, nascendo então, o nome Verequete

(MARTINS, 2010). Mestre Verequete morreu em novembro de 2009, após receber

homenagem do Presidente da República, convivendo diariamente com a pobreza, deixando

juntamente com sua obra, o que a imprensa5 descreveu como “a estranha sensação de que não

sabemos dar valor ao que nos é mais caro”.

Aurino Quirino Gonçalves, conhecido simplesmente como Pinduca, é outro ícone do

carimbó por ser um dos compositores de Carimbó mais populares no Estado, distingue-se de

outros artistas do gênero por ter introduzido o Carimbó eletrônico moderno, que possui

instrumentos eletrônicos, e mostra um ritmo mais acelerado. Outro diferencial é sua

vestimenta caracterizada pelo uso excessivo de adereços e colorido (MARTINS, 2010).

Pinduca nasceu no interior do Estado e começou a fazer sucesso na década de 70,

tocando em salões de festas da cidade e em clubes da periferia, inicialmente em bandas de

baile, e logo após ter seu primeiro contanto com o carimbó promoveu uma maior divulgação

desta manifestação, apesar da resistência encontrada nos lugares onde tocava; desde então

gravou seus LP‘s e depois CD‘s, passando a ser considerado assim como o “Rei do Carimbó”

(MARTINS, 2010; COSTA 2008).

Francisco Paulo Monteiro Braga é mais conhecido como Chico Braga, nascido no ano

de 1945, em Marapanim no Estado do Pará. É compositor e pescador, atualmente reside na

Ilha de Maiandeua, município de Maracanã, rodeado por gatos e cachorros, em suas

choupanas. Atualmente sua vida consiste em consumir álcool, e cantar carimbó. O próprio

compositor assume possuir mais de duzentas composições. Porém não há registro de suas

composições, segundo ele elas estão gravadas e guardadas em sua memória (BLANCO,

2004).

Lucindo Rebelo da Costa ou, como ficou marcado na história do carimbó, Mestre

Lucindo, pescador, caboclo nasceu no município de Marapanim em março de 1908. Ao

falecer em setembro de 1888 em decorrência de complicações pelo diabetes, deixou um vasto

acervo de composições ao carimbó, sempre retratando a realidade e o imaginário dos

pescadores, agricultores e outros cidadãos humildes. Mestre Lucindo se preocupava com a

______________________________5 Diário do Pará, nov. 2009.6 O Liberal Digital, mar. 2003.

_______________________________

5 Noticiado no jornal Diário do Pará em 04 de novembro de 2009, por ocasião de sua morte.

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preservação do carimbó mesmo não sendo reconhecido, em vida, pela sua obra. Atualmente,

Mestre Lucindo, é ao lado de Verequete e Pinduca, um dos maiores ícones do carimbó no

Estado6. Mestre Lucindo ficou conhecido a partir dos anos 80 sendo considerado desde então

como um dos grandes compositores de carimbó de Marapanim, e conseqüentemente do Pará

(COSTA, 2008).

PATRIMÔNIO CULTURAL

Com o objetivo de preservar, proteger e conservar as formas de expressão, bem como

os documentos e as músicas do carimbó, o mesmo foi declarado como Patrimônio Cultural e

Artístico do Estado do Pará, em 2009. Incluindo-o no calendário histórico, cultural, artístico e

turístico do Pará, passando a ser de responsabilidade do Estado, proteger tudo o que diz

respeito a produção e divulgação do carimbó (DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO, 2009).

Em paralelo a esse reconhecimento no Estado do Pará conquistado com êxito na terra

nativa do Carimbó, há uma campanha para o reconhecimento do Carimbó como Patrimônio

Cultural do Povo Brasileiro, envolvendo artistas, ativistas, pesquisadores e produtores

culturais. A campanha é um convite à adesão de qualquer pessoa que deseje fortalecer e

preservar a tradição do carimbó (GABBAY, 2010).

Em Dantas (2008), foi feita uma investigação sobre a importância do registro do

carimbó junto ao IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como

Patrimônio Cultural Brasileiro. Em entrevista à mesma, o pesquisador Isaac Loureiro, o líder

da campanha, argumenta que o carimbó é o gênero musical tradicional no Pará, e por ser uma

manifestação que atravessou séculos é considerado como um importante elemento da

identidade da cultura local, justificando assim a campanha iniciada oficialmente em 2008.

Isaac Loureiro ainda fala da importância do registro do carimbó, que significa a

garantia da sua preservação e o reconhecimento como patrimônio e elemento definidor de

nossa identidade. Pois com a homogeneização da cultura amazônica, onde a cultura

tradicionalista perde cada vez mais espaço para a cultura de massa, há um sério risco à

integridade à diversidade e identidade da cultura amazônica. Porém, para que tal registro seja

possível se faz necessário uma ampla mobilização da sociedade, das instituições públicas e

dos atores envolvidos no carimbó, formando uma integração e um espaço de cooperação

(DANTAS, 2008).

_______________________________

6 Segundo artigo escrito por Eduardo Rocha ao portal ORM, O Liberal Digital, em virtude do aniversário de mestre Lucindo, que estaria fazendo 100 anos se estivesse vivo.

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Por fim, Isaac Loureiro, complementa que com o registro do carimbó haverá um

fortalecimento da identidade local, uma valorização do trabalho dos mestres, tornando o

carimbó mais atrativo para as novas gerações, aumentando o cuidado com sua preservação e

chamando atenção para questões como sustentabilidade ambiental e inclusão social, bem

como modificando na sociedade o seu olhar sobre o carimbó, fazendo-a perceber suas

dimensões históricas (DANTAS, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse trabalho, tentou-se mostrar o processo evolutivo do carimbó como formador da

identidade do paraense, descrevendo as diversas facetas que o mesmo assumiu para

sobreviver e atualmente merecer o titulo de Patrimônio Cultural Paraense. O passeio por essa

história percorreu os terreiros e subúrbios por onde o carimbó se escondia em uma luta pela

sobrevivência, por ter sido considerado conteúdo inapropriado para a sociedade paraense, por

conter ofensas à paz e a ordem.

Apesar dessa sombra duradoura que se estabeleceu em cima dessa expressão cultural,

ela sobreviveu através da paixão e a vontade incansável de inúmeros artistas que desejavam

ver essa poesia simples e a dança envolvente em um espaço privilegiado e de reconhecimento.

Muitos desses artistas conseguiram superar essa fase carregada de preconceitos e conseguiram

trazer o carimbó para mais perto do imaginário do paraense, iniciando assim, uma fase do

carimbó como elemento de identificação ímpar da cultura paraense.

Atualmente em plena campanha para o registro do carimbó como Patrimônio Cultural

Brasileiro, o que se percebe é um clamor coletivo pela patrimonização, como forma de justiça

simbólica, por quem viu seus mestres morrer sem o devido reconhecimento seja financeiro ou

artístico e por quem carrega a necessidade de ouvir tantos outros mestres escondidos no

coração da Amazônia.

BIBLIOGRAFIA

BLANCO, Sonia M.R. O carimbó em algodoal e seus aspectos sócio-gráficos. In: Anais do V Congresso Latinoamericano da Associação Internacional para o Estudo da Música Popular - IASPM-AL. Rio de Janeiro, 2004.

CASCUDO, Luís C. Dicionário do Folclore Brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Global, 2002.

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Page 10: Carimbó: da repressão a candidatura a patrimonio cultural brasileiro - Ester Corrêa

GABBAY, Marcello. Representações sobre O carimbó: Tradição x Modernidade. In: Anais do IX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Intercom. Rio branco: Intercom, 2010.

DANTAS, Tereza. A luta de um patrimônio. Revista Raiz. Ed. Eletrônica. 2008.

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____________. Carimbó – O poder do ritmo paraense. Amazon View. Ano 4. Norte

Editorial

____________. Músicas e danças folclóricas do Pará. Museu da imagem e do som/Pará.

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SITES CONSULTADOS

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out. 2010.

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