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I S A M A S e m i n á r i o d e a r q u i t e t u r a m o d e r n a n a A m a z ô n i a 17,18 e 19 de fevereiro de 2016. ARQUITETURA EM PALMAS TO: Considerações sobre uma modernidade extemporânea CARDOSO, MARIANNA G. P.; REIS, PATRICIA O. B. (2) 1. Universidade Federal do Tocantins. Curso de Arquitetura e Urbanismo. Avenida NS 15, 109 Norte, Campus UFT Palmas, Coordenação de Arquitetura e Urbanismo, Bloco Bala 2, Plano Diretor Norte, CEP 77001-090, Palmas - TO. [email protected] 2. Universidade Federal do Tocantins. Curso de Arquitetura e Urbanismo. Quadra 508 Norte, QI 13, Alameda 11 HM 02, Lote 02 - A Residencial Trianon Bloco A, Apto. 403. Plano Diretor Norte. CEP. 77006-652. Palmas - TO. [email protected] RESUMO Após quase três décadas da sua fundação, a cidade de Palmas apresenta um conjunto de edifícios considerável e já se percebe a formação de um repertório arquitetônico local. Dentro desse contexto este artigo pretende analisar o conjunto de edifícios que simbolizam a produção arquitetônica da cidade, centrando-se especificamente nos edifícios institucionais construídos ao longo da década de 1990. Adotando a monumentalidade modernista, os prédios das instituições públicas se consolidam como o conjunto de referência regional, sinalizando os ensejos de uma identidade edilícia palmense e indícios de valor patrimonial. Seus diferentes usos e tipologias, também revelam uma diversidade, tanto formal quanto construtiva. Assim, dentro da variedade edificada pretende-se discutir o patrimônio arquitetônico palmense estabelecendo relações entre modernidade, contemporaneidade, identidade, na tentativa de responder as seguintes questões: a arquitetura em Palmas enquadra-se em um cenário de modernidade tardia ou já superada? Poderá essa arquitetura consolidar-se como patrimônio arquitetônico brasileiro? Palavras-chave: Arquitetura; Palmas; Patrimônio

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Page 1: CARDOSO, MARIANNA G. P.; REIS, PATRICIA O. B. (2) · institucionais, que estão divididos em dois grupos: os edifícios do conjunto da Praça dos Girassóis (Palácio Araguaia, Tribunal

I S A M A – S e m i n á r i o d e a r q u i t e t u r a m o d e r n a n a A m a z ô n i a 17,18 e 19 de fevereiro de 2016.

ARQUITETURA EM PALMAS – TO:

Considerações sobre uma modernidade extemporânea

CARDOSO, MARIANNA G. P.; REIS, PATRICIA O. B. (2)

1. Universidade Federal do Tocantins. Curso de Arquitetura e Urbanismo.

Avenida NS 15, 109 Norte, Campus UFT Palmas, Coordenação de Arquitetura e

Urbanismo, Bloco Bala 2, Plano Diretor Norte, CEP 77001-090, Palmas - TO.

[email protected]

2. Universidade Federal do Tocantins. Curso de Arquitetura e Urbanismo.

Quadra 508 Norte, QI 13, Alameda 11 HM 02, Lote 02 - A Residencial Trianon Bloco A,

Apto. 403. Plano Diretor Norte. CEP. 77006-652. Palmas - TO.

[email protected]

RESUMO Após quase três décadas da sua fundação, a cidade de Palmas apresenta um conjunto de edifícios considerável e já se percebe a formação de um repertório arquitetônico local. Dentro desse contexto este artigo pretende analisar o conjunto de edifícios que simbolizam a produção arquitetônica da cidade, centrando-se especificamente nos edifícios institucionais construídos ao longo da década de 1990. Adotando a monumentalidade modernista, os prédios das instituições públicas se consolidam como o conjunto de referência regional, sinalizando os ensejos de uma identidade edilícia palmense e indícios de valor patrimonial. Seus diferentes usos e tipologias, também revelam uma diversidade, tanto formal quanto construtiva. Assim, dentro da variedade edificada pretende-se discutir o patrimônio arquitetônico palmense estabelecendo relações entre modernidade, contemporaneidade, identidade, na tentativa de responder as seguintes questões: a arquitetura em Palmas enquadra-se em um cenário de modernidade tardia ou já superada? Poderá essa arquitetura consolidar-se como patrimônio arquitetônico brasileiro? Palavras-chave: Arquitetura; Palmas; Patrimônio

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Introdução

A história da arquitetura de Palmas ainda não foi escrita, não obstante dos

estudos que tiveram como objetivo construir a memória do planejamento da cidade1.

Os trabalhos que se dedicam a seus edifícios ainda são poucos e não aprofundam a

temática, caracterizando-se como simplórias catalogações de exemplares avulsos.

Essa fragilidade é descrita por Souza ao afirmar que “se São Paulo teve Vilanova

Artigas e Rino Levi, e tem Paulo Mendes da Rocha, o Rio de Janeiro teve Lucio Costa,

Eduardo Reidy e os irmãos Roberto, Brasília tem Oscar Niemeyer e Lelé, e Manaus

tem Severiano Porto, em Palmas não se nota a influência de lideranças fortes, que

pudessem apontar um caminho” (SOUZA, 2007). Outrossim, no aspecto do

planejamento urbano de Palmas Segre nos indica: “Se em Brasília há invenção, como

afirmou muito entusiasmado Le Corbusier, em sua última viagem ao Brasil em 1962,

em Palmas não houve inovação alguma do ponto de vista do urbanismo” (SEGRE,

2004).

Nesse sentido, o presente artigo se propõe a explorar a história arquitetônica

por meio dos edifícios que representam a arquitetura local e que se estabelecem como

importante conjunto patrimonial da região norte do país.

É preciso, no entanto, ressaltar que o desenvolvimento da arquitetura

palmense está atrelado ao processo de implantação do plano urbanístico. Dessa

forma, seguindo o mesmo processo de construção das cidades inteiramente

planejadas, como Chandigarh e Brasília, a história da arquitetura em Palmas

acompanha o desenvolvimento da cidade e a sua forma urbana pode ser encarada,

também, como uma arquitetura.

A malha da cidade é marcada por quadras regulares de aproximadamente

600m x 700m, separadas por grandes avenidas que interceptam o plano de norte a sul

e de leste a oeste, imprimindo à paisagem urbana um aspecto de espalhamento.

“Dispersos na paisagem e construídos paulatinamente, os edifícios projetados para as

principais instituições públicas foram imprimindo à cidade aspecto arquitetônico-

1 Os livros: “A segregação planejada: Goiânia, Brasília e Palmas” (MORAIS, Maria, 2006) e “Palmas - um

projeto e múltiplos olhares” (REIS, Patricia, 2015, Org.); as teses: “Paisagem e Urbanidade, os limites do projeto urbano na conformação de lugares em Palmas” (COCOZZA, Glauco, 2007), “Girassóis de Pedra – Imagens e metáforas de uma cidade em busca do tempo” (SILVA, Valéria, 2008); “A concepção de Palmas (1989) e sua condição moderna” (VELASQUES, 2010); dissertações e artigos científicos: “Palmas, cidade nova ou apenas uma nova cidade?” (SEGAWA, Hugo, 1991), “A gênese de Palmas” (LIRA, Elizeu, 1995), “O desenho urbano de Palmas” (TRINDADE, Dirceu, 1999), retratam as questões urbanísticas de Palmas, .

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urbano semelhante ao de Brasília” (CARVALHO, G.O. M.; MATOS, M. C. REIS, P. O.

B, 2014).

A percepção dialética entre a “arquitetura” e “urbanismo” é necessária na

leitura e escrita da história da arquitetura palmense, todavia, o foco deste estudo é no

patrimônio edificado.

O recorte analisado centra-se no conjunto arquitetônico da Praça dos Girassóis

e entorno imediato, com o critério temporal de análise dos edifícios institucionais da

primeira década após a fundação da cidade. Observa-se que, mesmo tendo sido

projetados no fim do século XX, os edifícios possuem um forte diálogo com o

modernismo. No caso particular do conjunto da Praça dos Girassóis, os edifícios

guardam forte identidade entre si, tanto pelo partido arquitetônico, quanto pelos

materiais e técnicas construtivas. Os demais edifícios, apesar de apresentarem uma

linguagem arquitetônica diversificada, apresentam resquícios da influência do

movimento moderno brasileiro, como será evidenciado posteriormente.

Dessa forma apresenta-se um mapeamento arquitetônico de doze edifícios

institucionais, que estão divididos em dois grupos: os edifícios do conjunto da Praça

dos Girassóis (Palácio Araguaia, Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa,

Secretarias do Estado e Memorial Coluna Prestes) e os edifícios do entorno imediato

ao centro cívico (Tribunal de Contas do Estado (2), Tribunal Regional Eleitoral (3),

Delegacia da Receita Federal (4), Centro de Ensino Médio (5), Palacinho (6), Espaço

Cultural (7) e Prefeitura Municipal).2

Após a apresentação desse panorama edificado, inserem-se algumas

considerações acerca da arquitetura palmense e suas associações ao movimento

moderno brasileiro, salientando-se os temas referentes a uma modernidade

extemporânea, tardia, destacando o caráter de monumentalidade, identidade entre o

conjunto arquitetônico estudado e possibilidades de um regionalismo por meio da

análise dessa arquitetura. Por fim, à guisa de conclusão fazem-se questionamentos

sobre o patrimônio moderno e como a arquitetura palmense se insere neste contexto.

1. A gênese de uma arquitetura palmense

2 As pesquisas acerca da Arquitetura Tocantinense vêm sendo desenvolvidas no Grupo de Pesquisa em

Arquitetura Contemporânea (GPAC), que abarca o acervo de imagens e entrevistas apresentadas neste artigo.

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Mesmo em um quadro temporal recente é possível evocar uma história

arquitetônica local e perceber a consolidação de um conjunto de edifícios que

apresentam uma certa historicidade e que representam a constituição de uma

arquitetura singular, sobretudo os edifícios institucionais da primeira década da

construção da cidade (1990).

Dentro desse conjunto arquitetônico precursor é possível identificar duas

categorias distintas, os edifícios implantados na praça cívica da cidade e os prédios

que são adjacentes a ela, dispostos em diferentes pontos da malha urbana, como

pode-se ver na figura 1.

Figura 1- Mapa de localização dos edifícios.

Autor: Paulo DN, 2016.

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1.1 O conjunto arquitetônico da Praça dos Girassóis

Na Praça dos Girassóis (1) - marco inicial da nova capital do Tocantins e centro

administrativo do Estado - estão localizados os edifícios dos poderes representativos,

corresponde ao centro cívico da cidade.

A praça tornou-se uma referência simbólica, pela localização privilegiada

dentro do traçado urbano e pela disposição e monumentalidade dos prédios públicos

que a compõem. Sua localização corresponde ao cruzamento das duas avenidas mais

importantes da cidade, a Av. Theotônio Segurado e a Av. Juscelino Kubitschek. Fazem

parte dela o Palácio Araguaia (sede do poder executivo), a Assembleia Legislativa

(Palácio João D´Abreu), o Palácio da Justiça (Palácio Feliciano Machado Braga), o

Memorial Coluna Prestes e as Secretarias do Estado. É considerada uma das maiores

praças3 da América Latina, com extensão de aproximadamente 570 mil metros

quadrados.

Cada inserção simbólica neste espaço tem uma lógica moldada, embora não

seja autoexplicativa, inclusive a desmesurada extensão da praça, que não se justifica

pelo que nela existe, a paisagem cotidiana, que é resultado da grandiosidade do

espaço, vendo bem, transbordamento de monotonia, dir-se-ia. A figura 2 destaca os

principais prédios e elementos simbólicos da praça.

3 Além de prédios institucionais abriga também os seguintes monumentos: o Relógio do Sol (com seis

metros de altura), o Cruzeiro (símbolo religioso), Monumento aos Pioneiros, Monumento à Biblia, Praça Krahô (homenagem aos grupos indígenas do Tocantins) e o Monumento aos 18 do Forte de Copacabana.

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Figura 2 - Praça dos Girassóis (imagem manipulada por REIS, 2011).

Fonte: Google Earth (2009).

A monumentalidade que a praça e seus edifícios exercem na cidade é o traço

mais marcante dessa arquitetura urbana, que representa ao mesmo tempo distinção e

grandeza. Os edifícios oficiais estão isolados e impõem-se no contexto urbanístico,

inclusive topográfico, eles não poderiam passar despercebidos ou perderiam o sentido

da sua existência, o de propagandear ou materializar as realizações do político

responsável, pela localização e edificação privilegiada.

1.1.1 O Palácio Araguaia e suas sucessivas descaracterizações

O Palácio Araguaia na figura 3, por exigência do governador, foi localizado em

ponto estratégico do relevo. De acordo com os técnicos responsáveis pelo projeto, a

frase proferida pelo governador Campos foi a seguinte: “Eu quero o palácio lá no topo

daquele morro”.4 A escolha confluiu à parte mais elevada da área escolhida, isso

4 REIS, P. Modernidades Tardias no Cerrado: Discursos e Práticas na História de Palmas – TO

(1990-2010). Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: UFRJ, 2011.

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mudou um pouco a localização do eixo e o desenho da praça central. Foi um

redesenho em função da resolução pessoal do governador de colocar o palácio nesse

ponto mais alto que poderia ser visto de todos os lados.

O prédio depois de inaugurado passou por várias intervenções tanto na sua

fachada quanto em seu entorno, por exemplo: foram adicionados dois pórticos de

cinco metros de altura por trinta metros de largura, que seriam as entradas para

estacionamentos privativos, nos sentidos leste-oeste. Houve também a eliminação de

uma praça original elíptica, a adição e depois a retirada de um monumento à Lua,

além de acréscimo de elementos na cobertura do edifício e a aplicação de painéis nas

vigas do seu coroamento.

Alguns artistas foram solicitados pelo gestor e suas obras fortaleceram os

interesses e os valores da elite política que ora se constituía em Palmas. Logo nos

primeiros anos da cidade, a arte foi voltada à produção de obras vinculadas à

elaboração de emblemáticos trabalhos dessa natureza e o Palácio Araguaia é um bom

exemplo dessa prática, pois foi objeto de sucessivas descaracterizações ao longo dos

últimos anos e nenhuma delas autorizadas pelos autores do projeto original.

Maurício Bentes, artista carioca, veio ao Tocantins em 2001, a convite do

governador. O objetivo da viagem foi realizar um estudo sobre uma obra que

posteriormente foi intitulada de “frontispício”. Tratava-se de um globo dourado com

raios, que representavam o “sol alado”, elementos simbólicos e com conotações

exotéricas destoante da proposta do projeto.

Nos dias 15 e 21 de outubro de 2006 os globos foram retirados com maçarico

por solicitação do governador em exercício e guardados, com a alegação emitida em

nota oficial da Secretaria de Comunicação do Estado, que citava levantamento

realizado pela Fundação Cultural, de que a instalação dos acessórios não obedeceu a

todos os trâmites técnicos-legais, relativos à Lei de Direitos Autorais, uma vez que não

consta no projeto arquitetônico original.

Em 23 de setembro de 2011 um novo elemento foi inserido à fachada do

Palácio, desta vez uma reprodução gigantesca do Brasão do Estado do Tocantins, no

mesmo lugar de onde foram retirados os globos. A nota de serviços descrevia

trabalhos de “restauração das frisas e confecção de obras de arte para o Palácio

Araguaia.”

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Figura 3 – Palácio Araguaia com o Brasão do Tocantins, elemento inserido em 2011 e não

fazia parte do projeto original. Em destaque, também, o alto-relevo na viga de coroamento,

obra do artista Maurício Bentes. Foto: Acervo GPAC (2016)

Conforme o exposto, constata-se visível descaracterização do Palácio

Araguaia, com a inserção, retirada e reinserção de elementos que não faziam parte do

projeto original dos arquitetos Ernani Vilela e Maria Luci da Costa.

O gestor encomendou novas obras a Maurício Bentes, que criou painéis

(denominados “Frisas” pela Secretaria de Cultura do Estado) de imagens que

relatavam a história oficial do Tocantins. Os painéis foram fixados em volta do Palácio,

no coroamento do prédio e, também, não faziam parte do projeto inicial do edifício.

Os painéis de Bentes em alto-relevo, denominados de “frisas” no projeto que

originou a sua criação, são sucessivas imagens monocromáticas a céu aberto, feitos

em fibras de vidro e gravadas nas vigas de concreto do Palácio. São painéis que

contam a História Oficial do Tocantins.

Bentes mudou-se para Palmas e executou outras obras na Praça, são elas: o

Monumento aos 18 do Forte de Copacabana, a escultura de Luiz Carlos Prestes sob

uma coluna, no Memorial Coluna Prestes (projeto de Oscar Niemeyer) e o Monumento

aos Pioneiros. O artista deixou inclusive projetos inconclusos, amplamente divulgados

nos jornais da cidade no período de idealização e concretização.

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1.1.2 A complementação dos três poderes: o Tribunal de Justiça e a

Assembleia Legislativa

Os prédios da Assembleia Legislativa (figura 4) e do Tribunal de Justiça (figura

5) são projetos de Manoel Balbino de Carvalho Neto e de Luiz Fernando Cruvinel

Teixeira respectivamente, ambos construídos em 1990.

Figura 4 - Palácio João D´Abreu, Palmas, Tocantins (Sede do Legislativo).

Foto: Acervo GPAC (2016)

Figura 5 - Palácio Feliciano Machado Braga (Sede do Judiciário)

Foto: Acervo GPAC (2016).

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Os prédios possuem a forma de prismas regulares, tem um caráter horizontal

na paisagem da praça, ou seja, uma característica que confere peso e sensação de

estabilidade estrutural, além do que a identidade arquitetônica se completa pela

utilização de tijolo aparente e concreto em quase todas as fachadas

A presença de elementos como brises, pergolados, jardins internos e

superfícies espelhadas demonstram o mínimo de preocupação com as condições

climáticas do lugar, embora internamente sejam utilizados sistemas de

acondicionamento artificial. Para o arquiteto Edson Eloy Souza (2007), por exemplo, o

prédio da Assembleia Legislativa:

“Como os demais edifícios da praça, o partido utilizado para sua solução volumétrica leva em conta a criação de um sombreamento com expressivos quebra-sóis verticais, complementados por pérgulas e abas destinados a amenizar os rigores do clima diretamente sobre as áreas de trabalho e circulação. Dois generosos pátios internos pergolados fazem a transição do exterior para o interior. Três pavimentos administrativos superiores em plantas que formam um H com os vazios dos pátios e um subsolo destinado ao plenário resolvem o programa arquitetônico.” (SOUZA, 2007).

A escala monumental é a característica mais notável da linguagem

arquitetônica da Praça dos Girassóis, os prédios possuem um caráter palaciano que

lembram a disposição e a grandeza do eixo monumental do Plano Piloto de Brasília.

1.1.3 As secretarias: os ministérios do Estado

Projeto de Ernani Vilela e Maria Luci, de 1990 os prédios das secretarias do

Estado (figura 6) possuem plantas semelhantes, similares a “contrafortes com floreiras

em tijolos à vista”.5

5 VILELA, Ernani. Arquiteto e urbanista de prédios institucionais da Praça dos Girassóis. Correspondência

eletrônica enviada à autora da tese durante o ano de 2008.

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Figura 6 - Secretarias de Estado – Projeto dos arquitetos Ernani Vilela, Maria Luci da Costa e

Luiz Fernando Cruvinel Teixeira. Fonte: Acervo GPAC, 2016.

Partindo de uma planta retangular simples, estes edifícios foram reproduzidos

12 vezes nos três quadrantes da praça, ficando somente o quadrante sudeste

incompleto e remetem em menor escala os ministérios da capital federal. Com apenas

dois pavimentos, cada edificação é pousada em um talude revestido de material

cerâmico, que eleva o conjunto e fecha cada edifício em si, delimitando assim as

fronteiras com o espaço exterior.

Adotando os mesmos materiais de revestimento dos edifícios dos três poderes,

os edifícios das secretarias reforçam a ideia de conjunto da praça e se inserem na

lógica da identidade desejada pelos arquitetos.

1.1.4 A intervenção posterior: o Memorial Coluna Prestes

Em 2001 foi construído na Praça dos Girassóis o Memorial Coluna Prestes

(figura 7), um projeto desenvolvido ainda na década de 90 por Oscar Niemeyer para a

Barra da Tijuca, mas que não foi executado. Um encadeamento de questões políticas

levaram o projeto a ser construído no Tocantins.6

6 FILHO, Luís Carlos Prestes. Depoimento concedido a Patrícia Orfila Barros dos Reis. Palmas: 03 de

dezembro de 2009.

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O prédio abriga um acervo de aproximadamente trezentas peças que

pertenceram a Luiz Carlos Prestes e aos membros da Coluna, fotografias, filmes,

livros, armas, móveis, documentos diversos, dois diários particulares com

reconstituição do movimento tenentista à Revolução de 1930.

Figura 7 – Memorial Coluna Prestes, Projeto de Oscar Niemeyer

Fonte: Acervo GPAC, 2016.

Com uma volumetria simples bem característica das obras de Niemeyer, um

cilindro monocromático branco pousado no solo, contornado por uma rampa vermelha,

o pequeno edifício de 570 metros quadrados possui apenas um pavimento e um

subsolo. A rampa curva externa ao edifício possibilita tanto o acesso ao interior do

mesmo como a estátua de Luís Carlos Prestes, sobre uma coluna inserida em um

diminuto espelho d’água.

No pavimento térreo encontra-se a única sala de exposição e no subsolo existe

um miniauditório e toda a estrutura técnica (palco, plateia, camarim, cabine de

projeção e sanitários).

Apesar de ser a única obra de um arquiteto renomado pela crítica nacional e

internacional, o edifício não possui qualquer relação com o conjunto edificado da praça

e por esse motivo é alvo de constantes questionamentos sobre sua inserção no local.

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1.2 O conjunto arquitetônico do entorno

1.2.1. O Palacinho

Construído em 1989, o Palacinho (figura 8) foi uma das primeiras edificações

da cidade, servindo como sede provisória do Poder Executivo de 1 de janeiro de 1990

a 9 de março de 1991. Em madeira e com uma planta baixa ortogonal, o edifício de

dois pavimentos abriga hoje um museu. Não foram encontrados documentos que

comprovem a autoria deste projeto, mas em entrevista com o arquiteto Ernani Vilela

em 2008, o mesmo afirmou ser o autor da obra.

Figura 8 – Palacinho, Projeto do Arquiteto Ernani Vilela. Foto: GPAC, 2016

O edifício da Prefeitura Municipal (figura 9), localizado em área institucional nas

margens da avenida Teotônio Segurado, na quadra 502 sul, em espaço planejado

para ser o Paço Municipal da cidade - projetado em 1989 também pelo

GRUPOQUATRO.

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Figura 9 – Prefeitura de Palmas, Projeto GRUPOQUATRO, 1990

Foto: GPAC, 2016.

Uma vez que a praça central da cidade abrigaria a sede do poder estadual, foi

implantada mais ao sul uma praça para servir a estrutura municipal. O projeto do Paço

não foi concluído, apenas o edifico destinado à prefeitura, que se impõe no centro da

praça.

1.2.2. A Escola de Ensino Médio

A Escola de Ensino Médio (1993) foi idealizada para ser uma arquitetura

protagonista, que acompanhasse as intenções metodológicas de melhoria dos

espaços de ensino profissionalizante no Tocantins, figura 10.

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Figura 10 – Escola de Ensino Médio,

Projeto de Edison Eloy de Souza e Pedro Lopes Jr, 1993

Fonte: Arquivo pessoal de Pedro Lopes Jr, 2016.

Os arquitetos Edison Eloy de Souza e Pedro Lopes Jr pesquisaram a melhor

maneira de dispor espaços de laboratórios de biologia, gabinete odontológico,

informática, biblioteca, refeitório, áreas de convívio, esporte, praça central para a

realização de encontros, dentre outros e perceberam que não iriam conseguir colocar

todas essas funções num único volume, de modo que distribuíram o partido em cinco

blocos, nos quais enfatizaram os aspectos de convivência, bem como de conforto

ambiental, privilegiando a ventilação natural, garantindo ao prédio “respiração natural”,

nas palavras do arquiteto Pedro Lopes, que enfatiza, também, que os arquitetos

decidiram não esconder os telhados, respeitando o clima e adaptando a arquitetura à

região norte.

1.2.3. Espaço Cultural

Construído em 1996, de autoria de Paulo Henrique Paranhos, o Espaço

Cultural (figura 11) é um complexo arquitetônico formado por vários edifícios, são eles:

salas, auditórios, teatro, camarins, sanitários, lanchonete, biblioteca, cinema e uma

grande praça coberta por treliças metálicas espaciais, característica estrutural

marcante deste edifício.

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Figura 11 – Espaço Cultural José Gomes Sobrinho, Arquiteto Paulo Henrique Paranhos, 1996.

Foto: GPAC, 2016.

O Espaço Cultural é um projeto premiado nacional e internacionalmente, e,

segundo o arquiteto Paulo Henrique Paranhos:

“Ele surge da intenção de preservar a paisagem circundante enriquecendo a mancha verde no traçado da capital, preservar as perspectivas da serra para quem transita na Av Teotônio assim como manter continuidade da paisagem do grande parque em sua vizinhança, fez com que fosse criado um edifício que, de forma sutil, se inteirasse com a topografia natural.” 7

O teatro, denominado Fernanda Montenegro, tem capacidade para acomodar

500 pessoas e o cinema 209. A grande área coberta pode abrigar aproximadamente 5

mil pessoas e é utilizada para a realização de shows e grandes eventos.

1.2.4. O prédio da Delegacia da Receita Federal e do projeto do Tribunal

Regional Eleitoral

O projeto do arquiteto Sergio Teperman, o prédio da Delegacia da Receita

Federal (1998), conta com expressivos vãos internos que permitem setorização dos

espaços com o uso de divisórias. Neste edifício destacam-se os elementos vazados

7 Depoimento cedido aos estudantes Carolina Vasconcelos, Jéssica Cabral, Ricardo Freitas e Vitor

Colliccio em 2014, para a exposição intitulada Arquitetura Contemporânea em Palmas – TO.

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em cerâmica para a proteção climática que envolvem os dois blocos de três

pavimentos, a proteção está colocada a uma curta distância das paredes, garantindo

sombreamento e ventilação.

Projeto do escritório GRUPOQUATRO, o Tribunal de Contas do Estado (1999)

tem 7.892 m² de área construída, possui quatro pavimentos-tipo, com subsolo. O

prédio acompanha a identidade visual de conjunto da Praça dos Girassóis, o jogo de

blocos volumétricos, o uso de elementos vazados de cerâmica aparente e a intenção

de proteger fachadas contra os rigores climáticos são características que se repetem

na maioria dos exemplares estudados, confirmando a adaptação da arquitetura às

exigências regionais.

No projeto do Tribunal Regional Eleitoral (1996 - 1997), figura 12 os arquitetos

Edison Eloy de Souza e Pedro Lopes Junior tinham com premissa tentar controlar a

luminosidade e o conforto interno dos ambientes, tendo em vista que o prédio ficaria

totalmente exposto a uma insolação desfavorável para a implantação. Fizeram

estudos de funcionalidade do edifício, com subsolo, estacionamento, auditório,

refeitório e estudaram um brise externo colocado sobre as aberturas do edifício.

Segundo o arquiteto Edison Eloy de Souza (2007):

“O projeto traz estrutura de concreto independente das vedações, modulado em duplo balanço, instalações prediais com "shafts" visitáveis em todos os pavimentos e sistema de ar-condicionado central. O destaque visual e estrutural fica com a marquise de entrada, com pilares em forma de V que nascem do subsolo da garagem”.

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Figura 12 – Tribunal Regional Eleitoral, Arquitetos Edison Eloy de Souza e Pedro Lopes Jr,

2003. Foto: GPAC, 2016.

Ao longo da sua execução, esta obra sofreu inúmeras modificações indevidas,

como por exemplo: na cobertura estava prevista área de restaurante e café com

pergolado e concreto aparente, com vistas para o lago de Palmas, que não foi

executada.

2. A herança modernista

Em visão panorâmica, o modernismo pode ser caracterizado pela ruptura com

a tradição, pelo uso de novos materiais e pela precisão funcional, racionalismo e

expressividade. Para Montaner (2012)

“A arquitetura moderna desenvolveu-se em dois períodos marcadamente distintos: o entreguerras, período de experimentos de vanguarda, de textos programáticos e de obras-manifesto, mas de produção limitada, condicionada a partir de 1929 pela crise econômica; e o pós-guerra, de 1945 a 1965, em que a arquitetura não só se expandiu e se realizou de maneira mais produtivista e massiva, como também se transformou a fim de se adaptar à cultura de cada

lugar.” (MONTANER,2012, p.137)

Entendemos o caso da arquitetura de Palmas como uma modernidade que se

expressa fora de seu tempo, tardia, extemporânea. Palmas surge quando “a

modernidade já é considerada patrimônio” (MONTANER, p.152). Uma modernidade à

margem – fora dos centros hegemônicos internos e externos, uma modernidade tardia

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no sentido de recepção tardia dos princípios modernos, atrelados ao plano urbanístico,

a arquitetura institucional e os monumentos da capital tocantinense.

Pontuamos também que o planejamento da capital do novo estado, bem como

a a produção arquitetônica dos primeiros prédios foram marcados por um processo de

subserviência técnica e autoritarismo do gestor, sobretudo na escolha da localização

de prédios institucionais significativos, intervenções em detalhes construtivos e

decorativos.

Em entrevista com arquiteto Pedro Lopes, coautor do Tribunal Regional

Eleitoral e da Escola de Ensino Médio, destacamos trechos que reforçam a percepção

de unidade do conjunto arquitetônico da praça.

“Basta você observar a tipologia dos edifícios, seus materiais, cores, linhas, formas, então existe sim esse formalismo, foi intencional inclusive o desenho disso, para que tivesse uma família de edifícios que caracterizasse a cidade administrativa.”

8

Os princípios que definem as características desse conjunto remetem à

formação acadêmica dos arquitetos, como é o caso do projeto do Palácio Araguaia, de

Ernani Vilela e Maria Luci da Costa. Ernani vivenciou em sua escola de formação

(Universidade de Brasília) o auge do movimento moderno brasileiro, cujos cânones

estão expressos na arquitetura racionalista e monumental da própria Capital Federal.

A influência que esta geração de arquitetos brasileiros teve é notória nas

características de suas obras.

3. Palmas e seu patrimônio arquitetônico

A inscrição de Brasília na lista do patrimônio mundial da Unesco em 1987 abriu

a questão da preservação do patrimônio moderno no Brasil. As ações de tombamento

das obras-símbolo do Movimento Moderno se multiplicaram nos últimos anos, em

parte impulsionadas pela atuação dos órgãos de preservação como

UNESCO/ICOMOS internacionalmente, IPHAN e alguns ligados às instâncias

estaduais e municipais no cenário nacional. Soma a esta parcela institucional o

trabalho desempenhado pelo DOCOMOMO e pelas pesquisas acadêmicas na

temática.

8 LOPES, Pedro. Depoimento concedido a Patrícia Orfila Barros dos Reis. Palmas: 10 de junho de

2009.

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Contudo, embora seja possível verificar avanços no desenvolvimento de

políticas de proteção deste patrimônio recente em todo o mundo, o resguardo das

obras arquitetônicas do modernismo revela-se mais laborioso quando comparado às

obras de outros períodos. Mesmo após a ampliação do conceito de patrimônio, a qual

muito se transformou desde o Der Moderne Denkmalkultus, de Alois Riegl do início do

século XX, saindo da noção de monumento e partindo para um aporte culturalista, a

característica presente do repertório moderno provoca entraves nos processos de

proteção. No caso da modernidade tardia de Palmas a discussão sobre a defesa de

um possível patrimônio é praticamente ausente.

A única obra salvaguardada pelo Estado é o Palacinho, e pode-se afirmar que

esta proteção se deve muito mais a uma atribuição histórica, por ter sido a primeira

edificação institucional, do que por razões ligadas a valores arquitetônicos da

edificação. No contexto nacional, a atenção ao patrimônio tocantinense tem-se se

restringido a conjuntos coloniais, de Natividade e Porto Nacional, e ao patrimônio

natural arqueológico do Estado.

Nesse sentido como atribuir um valor de patrimônio ao conjunto arquitetônico

em Palmas? O conjunto edificado palmense pode ser considerado patrimônio

arquitetônico brasileiro? Se há de fato uma inclinação à proteção, quais seriam as

obras e como seria a política de preservação empregada?

De fato, consideramos que as obras apresentadas possuem um valor para a

história da cidade e constituem-se como algo particular na história da arquitetura

brasileira. Todavia, dado o estágio inicial da pesquisa desenvolvida pelo Grupo de

Pesquisa em Arquitetura Contemporânea (e falta de consolidação de pesquisas

anteriores sobre o tema) ainda não conseguimos mensurar as dimensões desta

atribuição patrimonial.

Dentro deste contexto o GPAC tem desde 2015 se engajado em inventariar as

obras arquitetônicas da cidade, e para o biênio de 2016-2017 o inventário será

ampliado. O documento é um primeiro passo para um futuro estudo de proteção e

tombamento, e constitui-se como uma importante ação neste quesito. Ressalta-se que

são muitas as questões e é preciso um esforço conjunto dos órgãos da gestão e dos

pesquisadores para a formulação de respostas mais concretas.

Enquanto não há um debate preciso, as edificações a cada ano sofrem

modificações a critérios dos gestores e mudanças significativas alteram as

características originais dessas obras. Assim, mesmo que em estágio inicial, a

pesquisa do GPAC visa atuar também na tentativa de evitar reformas abusivas,

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abandono e até mesmo demolição dos prédios que expressam a cultura, a história e,

por que não, a identidade da cidade.

Por fim, sublinha-se a necessidade de se deslocar o eixo de atenção da história

da arquitetura no Brasil, englobando as produções da região amazônica, e sobrelevar

o fato de que a região norte, em específico Palmas, possui um conjunto edificado

moderno a ser descoberto e valorizado nacionalmente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

CARVALHO, G.O. M.; MATOS, M. C. REIS, P. O. B. Apontamentos urbano-

arquitetônicos sobre um quatro de século de Palmas (Tocantins – Brasil): Plano,

processo de consolidação e aspectos contemporâneos da cidade. Arquiteturas do

Mar, dar Terra e do Ar. Lisboa: Editora da Academia de Escolas de Arquitetura e

Urbanismo de Língua Portuguesa, 2014.

FILHO, Luiz Carlos Prestes. Depoimento concedido a Patrícia Orfila Barros dos

Reis. Palmas: 03 de dezembro de 2009.

LOPES, Pedro. Depoimento concedido a Patrícia Orfila Barros dos Reis. Palmas:

10 de junho de 2009.

MONTANER, Josep M.; A modernidade superada: ensaios sobre arquitetura

contemporânea. Editora G. Gili, São Paulo, 2012.

SEGRE, Roberto. Arquitetura Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Viana &

Mosley, 2004, p. 19.

SOUZA, Edson Eloy. Planejar no Cerrado. Revista Arquitetura & Urbanismo. Coluna

Intersecção. Edição 159 - junho 2007.

REIS, P. Modernidades Tardias no Cerrado: Discursos e Práticas na História de

Palmas – TO (1990-2010). Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: UFRJ, 2011.