capítulo iii_a liderança

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CAPÍTULO III A LIDERANÇA 1. Liderança a definição do conceito 1.1. Da liderança à gestão 2. A liderança a perspetiva histórica 2.1. A teoria dos traços 2.2. A teoria sobre estilos comportamentais 2.3. A teoria situacional ou contingencial da liderança 3. A nova liderança 3.1. A liderança carismática, transformacional e transacional 4. A liderança e o problema da mudança

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Artigo sobre Liderança.

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  • CAPTULO III

    A LIDERANA

    1. Liderana a definio do conceito

    1.1. Da liderana gesto

    2. A liderana a perspetiva histrica

    2.1. A teoria dos traos

    2.2. A teoria sobre estilos comportamentais

    2.3. A teoria situacional ou contingencial da liderana

    3. A nova liderana

    3.1. A liderana carismtica, transformacional e transacional

    4. A liderana e o problema da mudana

  • A Liderana

    136

    CAPTULO III A LIDERANA

    A liderana uma espcie de corrente que necessita de dois plos.

    Lderes e seguidores. Sem um deles, no h circulao de energia

    no h liderana. (Rego, 1998:15)

    Na ltima centria, o conceito de liderana tem sido objeto de incontveis

    estudos no s ao nvel dos fenmenos sociais em geral mas tambm ao nvel dos

    comportamentos humanos em particular. Ainda que a investigao seja

    substancialmente mais significativa no contexto internacional, o estudo da liderana tem

    ocupado progressivamente os investigadores nacionais no mbito das vrias cincias

    sociais e humanas.

    Na verdade, a temtica assume uma relevncia to expressiva nos estudos

    organizacionais que autores como Bolman e Deal asseguram que a liderana

    encarada como uma panaceia para quase todos os problemas sociais (2003:336). Nesta

    linha Cunha e Rego (2005) referem-se mesmo impossibilidade de falar de gesto e de

    organizao sem recorrer ao conceito de liderana. Apesar do incremento atual dos

    estudos sobre a liderana, esta temtica remonta aos primrdios da humanidade. Com

    efeito, nas empresas e demais organizaes humanas, a liderana um conceito basilar

    na medida em que o administrador precisa de saber conduzir os indivduos e conhecer

    as suas motivaes (Chiavenato, 1993). Apesar da importncia capital que recai sobre a

    liderana no comportamento dos indivduos, o conceito assumiu relevncia unicamente

    com a Teoria das Relaes Humanas na medida em que a Teoria Clssica valorizava

    apenas a autoridade formal ao considerar simplesmente a chefia dos nveis hierrquicos

    superiores sobre os nveis inferiores nos aspetos relacionados com as atividades e

    funes do cargo. Por seu lado, a Experincia de Hawthorne procurou evidenciar que a

    existncia de lderes informais, enquanto guardies das normas e expectativas do grupo,

    assegurava o controlo sobre o comportamento do grupo, levando os indivduos a agirem

    como um grupo social coeso e integrado.

  • A Liderana

    137

    Na medida em que se registam inmeras teorias e modelos de liderana, a nossa

    opo de anlise recaiu nos modelos que se tm evidenciado nos ltimos tempos em

    torno da questo da liderana organizacional.

    Consequncia das mltiplas abordagens e das perspetivas adotadas pelos

    investigadores, assistimos a uma profuso de definies do conceito de liderana. Bass

    (1990) assegura que existem tantas definies quantas as pessoas que definiram o

    conceito, logo, encontrar uma definio consensual e paradigmtica (Cunha et al., 2003)

    no tem sido possvel. Com efeito, com o aparecimento das Cincias Sociais, por volta

    do sculo XIX, a temtica da liderana perdeu parte significativa da sua aura misteriosa

    e enigmtica (Jesuno, 1996).

    1. Liderana a definio do conceito

    No contexto organizacional atual torna-se cada vez mais pertinente discutir a

    temtica da liderana. Se atendermos s justificaes de Syroit (1996), esta necessidade

    prende-se com fatores de vria ordem, das quais destacamos o carcter imperfeito da

    morfologia organizacional quanto regulao do comportamento, a relao entre a

    organizao e a comunidade envolvente, a necessidade de mudanas sistmicas e o

    equilbrio da organizao.

    Os vocbulos lder e liderana entraram definitivamente no rol de termos triviais

    ao sarem do campo tcnico e entrarem, definitivamente, no domnio da utilizao

    comum. Mas de que falamos ao usarmos estes termos? Apesar da vasta investigao

    produzida no mbito da literatura organizacional em torno destes conceitos, os

    resultados equacionados nem sempre so elucidativos e auxiliares na tentativa de

    enunciar uma definio concetual sendo frequentemente arrolados termos como poder,

    autoridade e gesto por contraste (Neves, 2001).

    Apesar da multiplicidade de definies existentes, importa-nos neste contexto

    relevar a existncia de um sujeito que tem como competncia influenciar um grupo de

    indivduos. Esta premissa implica, ento, considerar a liderana como algo que

    pressupe um destinatrio coletivo, no que difere de poder, de comportamento

    poltico, de autoridade ou de influncia social.

  • A Liderana

    138

    Etimologicamente, lder e liderana so termos de introduo recente no lxico

    portugus oriundos do ingls leader e leadership; traduzem a ideia, respetivamente, de

    guia virtual e qualidade ou funo de lder.

    Na lngua portuguesa, estes conceitos esto profundamente ligados arte de

    comando, mas, obviamente, a tnica nesta literatura de inspirao poltica e militar

    posta nos aspetos biogrficos do lder enquanto ator que dirige um processo e no na

    liderana propriamente dita. O advento das cincias sociais, em particular, da sociologia

    e da psicologia, possibilitou alargar esta viso algo restrita da liderana.

    Neves (2001) considera que os mltiplos estudos sobre a temtica tm mostrado

    a liderana como caraterstica da personalidade, como forma indutora de obedincia,

    como exerccio de influncia ou outros comportamentos especficos, como meio de

    persuaso, como relao de poder, como meio de alcanar objetivos ou como uma

    combinao de mltiplos fatores.

    A proliferao de estudos tericos, empricos e experimentais na rea da

    liderana possibilitou o aclaramento do conceito de liderana sem, no entanto,

    chegarmos a definies consensuais e definitivas. Importa no esquecer que as

    definies de liderana devem ser entendidas no contexto cientfico e temporal em que

    foram produzidas.

    Perante esta realidade complexa e multivariada, a liderana dever ser analisada

    sob diversos ngulos enfatizando distintas variveis contingenciais (situacionais) no se

    restringindo apenas ao tipo de subordinados e situao de trabalho. Assim, na definio

    de liderana, devero ser tidas em conta variveis como a configurao organizacional,

    o ciclo de vida das organizaes ou as culturas organizacionais e nacionais

    diferenciadas.

    Face a esta multiplicidade e complexidade de estudos, como definir, ento,

    liderana? Sem sermos exaustivos, procuraremos, ento, apresentar algumas definies

    que julgamos mais representativas.

    Antes da 2. Guerra Mundial, a liderana era definida de acordo com as

    caratersticas de personalidade do lder dos Magos. A seleo natural dos lderes

    resolvia os problemas da eficcia. Mais tarde, a abordagem comportamental entendeu a

    liderana de acordo com os comportamentos suscetveis de distinguir os lderes dos no

    lderes. A aposta na formao dos lderes respondia naturalmente aos problemas de

    eficcia organizacional.

  • A Liderana

    139

    Em quase todas as definies se encontra implcita a ideia de que um ou mais

    sujeitos de um grupo podem ser encarados como lderes e que estes indivduos diferem

    em certos traos dos restantes membros do grupo (aos quais chamamos subordinados ou

    seguidores), o que por sua vez implica uma estrutura grupal hierrquica.

    Um grupo muito significativo de definies assume a liderana como um

    processo interativo entre os membros do grupo, composto por lderes e seguidores com

    uma orientao definida para determinados objetivos.

    Da vasta panplia existente na literatura organizacional, selecionmos cinco

    definies cuja leitura conjunta nos permitir compreender os principais enfoques das

    teorias que desenvolveremos seguidamente.

    Tannenbaum et al (1970) descrevem a liderana como uma influncia

    interpessoal efetuada num determinado contexto e conduzida atravs do processo de

    comunicao humana com a inteno de alcanar um ou vrios objetivos especficos.

    Por seu turno, Hersey e Blanchard (1988) consideram a liderana como o

    processo de influenciar as atividades de um membro ou grupo com o propsito de deles

    conseguir esforos que permitam atingir metas numa determinada situao. Relaciona-

    se, ento, algo que funo do lder, dos seguidores ou subordinados e de outras

    variveis situacionais.

    Yukl (1994) define liderana como um processo de influncia que implica a

    interpretao dos acontecimentos pelos seguidores, a eleio dos objetivos para a

    organizao ou grupo, a organizao das atividades para alcanar os objetivos, a

    motivao e empenho dos seguidores para atingir os objetivos, a manuteno das

    relaes de colaborao e do esprito de equipa e a angariao de apoio e cooperao de

    sujeitos exteriores ao grupo ou organizao.

    Syroit (1996) apresenta a liderana como um conjunto de atividades exercidas

    por um sujeito detentor de uma posio hierarquicamente superior, direcionadas para a

    conduo e orientao das atividades dos outros sujeitos, com o propsito de atingir

    eficazmente o objetivo do grupo.

    A definio proposta pela equipa Global Leadership and Organizational

    Behavior Effectiveness (GLOBE), embora primando pela simplicidade, sublinha a

    competncia de um sujeito para influenciar, motivar e habilitar os outros sujeitos a

    contriburem para aumentar a eficcia e o sucesso das organizaes a que pertencem.

    (House et al, 1999).

  • A Liderana

    140

    Na verdade, este conjunto de definies encerra um conjunto de ideias

    transversais que percorrem o conceito de liderana, nomeadamente no que respeita

    existncia de lderes e liderados ou seguidores que aceitam o primeiro, ajudando-o a

    definir as suas posies permitindo ao mesmo tempo que o processo da liderana se

    operacionalize. Acresce, ainda, a distribuio desigual de poder entre os lderes e os

    restantes indivduos da organizao, fator a usar para influenciar as condutas dos

    seguidores.

    Aliado ao conceito de liderana, encontramos outras noes associadas e que

    nos parecem ser relevantes para a economia deste trabalho. Assim, termos como

    influncia, poder e autoridade esto em perfeita sintonia com as questes relativas

    liderana.

    Na verdade, a essncia da liderana passa pela influncia que exercida sob os

    seguidores. Rego (1997) apresenta a influncia como um processo transacional no qual

    um indivduo ou grupo atua com o propsito de modificar o comportamento de um

    outro sujeito ou grupo num determinado sentido. A eficcia do lder est intimamente

    ligada com a sua capacidade de influenciar no s os seguidores como tambm os pares

    ou os agentes externos.

    Com efeito, a capacidade de influncia advm no s das bases de poder que o

    lder possui, como tambm da forma como as operacionaliza. O mesmo autor, de modo

    muito simples, define poder como a capacidade potencial para influenciar os outros

    (Rego, 1997). Esta capacidade advm de vrias fontes de poder e exercida atravs da

    adoo de estratgias de influncia. De acordo com Yulk (1994), existem diversas

    fontes de poder (cf. Quadro 12).

    Quadro 12 Fontes de poder (adaptado de Yulk, 1994:14)

    Tipo de poder Caractersticas

    Poder de posio

    Autoridade formal

    Controlo sobre os recursos e recompensas

    Controlo sobre os castigos

    Controlo sobre a informao

    Controlo do meio

    Poder pessoal Experincia

    Amizade/lealdade

    Carisma

    Poder poltico

    Controlo sobre os processos de deciso

    Coligaes

    Cooptao

    Institucionalizao

  • A Liderana

    141

    A este propsito, Rego apresenta uma recolha interessante de definies de

    poder (cf. Quadro 13) produzidas por diversos autores.

    Quadro 13 Algumas definies de poder (adaptado de Rego, 1997: 250)

    Autor Definio

    Russel, 1938 Poder a produo dos efeitos desejados.

    Perrow, 1986

    Poder a capacidade de as pessoas ou grupos obterem para si prprias

    outputs (bens, remuneraes, status social ) de um sistema em que outras

    pessoas ou grupos procuram os mesmos outputs. O poder exercido para

    alterar a distribuio inicial dos outputs, para estabelecer uma distribuio

    desigual, ou para os mudar.

    French, 1956 O poder que A tem sobre B igual mxima fora que A pode exercer

    sobre B menos a mxima fora que B pode mobilizar em sentido contrrio.

    Dawson, 1986 Poder a capacidade de obter decises, aes e situaes de acordo com os

    nossos interesses.

    Bernoux, 1986 O poder de A sobre B a capacidade que A tem de, na sua relao com B,

    os termos da troca lhe serem favorveis.

    Dalhl, 1957 A tem poder sobre B na medida em que pode obrigar B a fazer qualquer

    coisa que no faria sem a interveno de A.

    Kanter, 1977 Poder a capacidade de mobilizar recursos.

    Mintzberg, 1989 Poder a capacidade de produzir ou modificar os resultados ou efeitos

    organizacionais.

    Finkelstein, 1992 Poder a capacidade dos atores individuais obterem o que desejam.

    Greiner e Schein, 1988

    Poder a capacidade de levar outra pessoa ou grupo a aceitarem as nossas

    prprias ideias ou planos. Em essncia, o poder capacita para obter de

    outros o que deles se pretende.

    Yulk, 1989 O poder a influncia potencial de um agente sobre as atitudes e

    comportamentos de uma ou mais pessoas-alvo.

    Por sua vez, o poder e autoridade so conceitos divergentes. Se o poder pode ser

    entendido como a capacidade para exercer influncia, a autoridade traduz, to-s, o

    poder que advm da ocupao de uma dada posio na organizao. Isto , os detentores

    de autoridade detm poder, no entanto, os detentores de poder no possuem,

    forosamente, autoridade.

    Efetivamente, liderana e poder so processos de influncia, a ligao entre os

    dois conceitos assenta na influncia e a sua distino reside na ao. Enquanto o poder

    a influncia em potncia, a liderana envolve o exerccio real do poder. A liderana no

    deixa, portanto, de ser um fenmeno de poder.

    Apesar do desconforto provocado pela diversidade de definies ou pontos de

    vista, a liderana continua a despertar uma contnua reflexo por parte dos

    investigadores, nomeadamente, no que respeita liderana eficaz.

  • A Liderana

    142

    Tal como a conceo de liderana, a liderana eficaz oferece, tambm, uma

    multiplicidade de definies em parte devido aos critrios que permitem medir a

    eficcia. Em causa esto aspetos como a performance do grupo, a sua sobrevivncia ou

    crescimento, a atitude dos seguidores, a contribuio do lder para a coeso, motivao

    dos membros, soluo de problemas, a capacidade de sobrevivncia s crises ou os

    lucros obtidos.

    1.1. Da liderana gesto

    Das muitas questes que envolvem a liderana, importa, tambm, ressaltar o

    debate existente entre o binmio liderana versus gesto. Se os conceitos so

    praticamente sinnimos para muitos autores, outros h que os afastam por completo na

    medida em que gestores e lderes atuam em campos significativamente opostos.

    vulgar entender-se a liderana como um processo mais emotivo e intenso do

    que a gesto visto que os lderes encarnam uma verso mais carismtica e inspiradora,

    arriscam, so dinmicos e criativos, sabem lidar de perto com a mudana. No que

    respeita aos gestores, estes so mais cerebrais, lidam com a eficincia, o planeamento,

    os procedimentos, os controlos e os regulamentos. Logo, vulgar encontrarmos um

    lder sem ser gestor ou um gestor sem ser lder.

    Bennis e Nanus (1985) diferenciam com nitidez estes conceitos. Assim, a gesto

    implica provocar, realizar, assumir responsabilidades, comandar enquanto a liderana

    consiste em exercer influncia, guiar, orientar. Os gestores sabem o que devem fazer, os

    lderes sabem o que necessrio fazer.

    Na esteira de Bennis (1989), Rego (1998) advoga que lderes e gestores so

    divergentes no s em termos temporais mas tambm quanto ao modo como lidam com

    o contexto, o grau de inovao que defendem e o modo como questionam as situaes.

    Os lderes apresentam-se mais intuitivos, imprevisveis e proactivos, mais preocupados

    com os objetivos a longo prazo, com a inovao e originalidade por oposio ao

    conservadorismo, administrao, adaptabilidade e imitao mais particulares dos

    gestores. (cf. Quadro 14).

  • A Liderana

    143

    Quadro 14 Gestores e lderes (adaptado de Rego, 1998:28)

    Gestores Lderes

    Rendem-se situao. Procuram agir sobre a situao.

    Administram. Inovam.

    Questionam-se sobre o como e o quando. Questionam-se o qu e o porqu.

    Tm perspetivas a curto prazo. Tm perspetivas a longo prazo.

    Imitam. So originais.

    As competncias de gesto podem ser

    ensinadas/aprendidas. As competncias de liderana no podem ser

    ensinadas/aprendidas.

    Para Rost e Smith (1992), a liderana e a gesto apresentam, tambm, uma

    natureza divergente embora ambas sejam necessrias para a sobrevivncia e a

    prosperidade das organizaes. (cf. Quadro 15). Este autor defende que a liderana

    uma influncia de relacionamento, ao passo que a gesto um relacionamento de

    autoridade.

    Quadro 15 Gesto versus Liderana (adaptado de Rost e Smith, 1992:192-201)

    Gesto Liderana

    Privilegia um relacionamento de autoridade. Implica a influncia de relacionamento.

    Refere-se a gestores e subordinados. Refere-se a lderes e seguidores.

    Exige a coordenao de indivduos e

    recursos para a produo e venda de bens e/ou

    servios numa organizao.

    Exige lderes e seguidores que procuram

    mudanas reais na organizao.

    Reclama coordenao de atividades para

    produzir e vender bens e/ou servios que

    traduzam as metas da organizao.

    Reclama que as mudanas procuradas reflitam

    as metas mtuas de lderes e seguidores.

    Na linha de Rost e Smiht, Kotter (1992) partilha da ideia que faz divergir os dois

    termos embora os considere a ambos como distintos e complexos sistemas de ao.

    Cada sistema apresenta as suas prprias funes e atividades peculiares, por isso, os

    dois so indispensveis num ambiente organizacional complexo e instvel. Nesta tica,

    a gesto existe para fazer frente complexidade e a liderana para dar resposta

    mudana. Sem uma gesto equilibrada, as organizaes tendem a ficar caticas, por

    isso, o ideal seria aliar uma forte aliana a uma forte gesto, usando uma para equilibrar

    a outra.

    difcil encontrar um indivduo excelente nas duas reas na medida em que a

    liderana implica formar e manter um compromisso com uma viso bem definida, gerir

    a mudana de maneira a melhorar a organizao, criar e gerir uma equipa de grande

  • A Liderana

    144

    rendimento, inspirar, motivar e influenciar o grupo, liderar atravs do exemplo e

    assumir a responsabilidade. Por sua vez, a gesto abrange o pensamento e o

    planeamento estratgicos, debrua-se sobre a forma de rentabilizar as capacidades do

    grupo, com a delegao, apreciao e desenvolvimento, com os recursos financeiros, as

    comunicaes e monitorizaes, com a avaliao do desempenho e consequentemente

    com a apresentao dos resultados (Earley, 2002). Porm, este autor reconhece que,

    apesar das grandes dissemelhanas, tanto a liderana como a gesto se sobrepem e so

    essenciais para o sucesso das organizaes (idem) (cf. Quadro 16).

    Quadro 16 Lderes e gestores (adaptado de Earley, 2002:34)

    Os gestores Os lderes

    submetem-se. controlam o contexto.

    administram. inovam.

    mantm. desenvolvem.

    focam-se nos sistemas e estruturas. focam-se nas pessoas.

    perguntam como e quando. perguntam o qu e porqu.

    aceitam o status quo. desafiam o status quo.

    fazem a coisa bem. fazem a coisa certa.

    Contudo, certos autores como Yulk (1994), House e Aditya (1997:445) advogam

    a possibilidade dos gestores se tornarem lderes e vice-versa na medida em que o

    binmio de criao artificial e estereotipada. Os gestores transformam-se em lderes

    no momento em que propiciam viso, direo, estratgia e inspirao s organizaes e

    respetivos atores. Rowe (2001) advoga esta hiptese e, nesta perspetiva, prope um

    modelo triangular cujos vrtices apontam para as lideranas gestionria, visionria e

    estratgica. Assim, o papel de gestor e o papel de lder coexistem no vrtice da liderana

    estratgica (cf. Quadro 17). O lder gestionrio apela segurana financeira a longo

    prazo, garante a ordem, no considera as inovaes que podem reformar a organizao.

    A viso, o sonho, a emoo e a criatividade no fazem parte dos seus planos. Ao

    contrrio, o lder visionrio investe a viabilidade da organizao a longo prazo. Estimula

    a mudana, a inovao e a criatividade. O realismo e a frieza, imprescindveis para

    garantir a continuidade da organizao a curto prazo no so considerados.

    Harmoniosamente, o lder estratgico coordena estas duas vertentes da liderana. Alia

  • A Liderana

    145

    os atributos do gestor com os de lder, viabilizando deste modo a organizao a longo

    prazo sem penhorar a segurana financeira a curto prazo.

    Quadro 17 A liderana estratgica: a harmonizao das lideranas visionria e gestionria

    (adaptado de Rowe, 2001)

    Lid

    era

    na

    ges

    tio

    n

    ria

    reativo, elege uma atitude passiva perante os objetivos (estes radicam mais na necessidade do que

    em desejos ou sonhos).

    Rev-se como conservador e estabilizador da ordem existente.

    Relaciona-se com os indivduos de acordo com os seus papis no processo de tomada de deciso.

    Envolve-se em situaes e contextos caractersticos das atividades quotidianas.

    Decide excecionalmente recorrendo aos valores.

    Guia-se para os comportamentos de curto prazo e baixo custo, atento ao desempenho financeiro.

    As escolhas que faz so motivadas pelo ambiente interno e externo.

    Recorre ao pensamento linear.

    Lid

    era

    na

    vis

    ion

    ri

    a

    proativo, influencia os membros da organizao sobre o que desejvel, possvel e necessrio.

    No teme o risco.

    Lida com as pessoas emptica e intuitivamente.

    Trabalha na organizao mas no pertence organizao.

    Orienta-se para o desenvolvimento das pessoas e com o futuro da organizao. Acredita no elevado

    desempenho das pessoas.

    Decide frequentemente com base em valores.

    Orienta-se para a inovao, o capital humano e o fomento de uma cultura que assegure a

    viabilidade a longo prazo.

    Fomenta as escolhas estratgicas dado que marcam a diferena na organizao e no ambiente.

    Lid

    era

    na

    est

    ra

    tg

    ica

    Combina harmoniosamente as lideranas visionria e gestionria.

    Privilegia o comportamento tico e baseia as decises em valores.

    Conjuga as operaes do dia-a-dia com as responsabilidades a longo prazo.

    Equaciona e desenvolve estratgias com impacto imediato mas que asseguram a estabilidade e

    desenvolvimento organizacional a longo prazo.

    Acredita veementemente no desempenho dos superiores, pares, subordinados e dele prprio.

    Utiliza quer o pensamento linear quer o no linear.

    Usa metforas, analogias e modelos que facilitem a sobreposio de conceitos aparentemente

    contraditrios.

    Aposta nas escolhas estratgicas dado que fazem a diferena na sua organizao e no ambiente.

    Com efeito, no exerccio de algumas funes ou momentos da vida

    organizacional, a liderana pode ser mais relevante do que a gesto, ou vice-versa

    aceitvel que a liderana seja mais ativa no princpio do ciclo de vida organizacional,

    em momentos de mudana ou em organizaes inseridas em ambientes agitados. Por

    sua vez, a gesto prevalece em ocasies de estabilidade.

  • A Liderana

    146

    Nas organizaes do mundo moderno, gestores e lderes so peas fundamentais:

    a liderana deve ser temperada com gesto (com o intuito conferir realismo e

    estabilidade ao sonho/viso) e a gesto condimentada com liderana (com o propsito

    de evitar a estagnao e prosperar a longo prazo). Sempre que no possvel conciliar

    num mesmo indivduo as duas funes, necessrio assegurar a dupla liderana

    (Cunha, 2000; Rego e Cunha, 2003).

    Aceitando a premissa que gestores e lderes so componentes imprescindveis no

    puzzle das organizaes modernas, parece-nos que a figura-sntese proposta por Pina e

    Cunha (2000) traduz a ideia da complementaridade das duas noes em estudo (cf.

    Figura 4).

    Figura 4 Um ensaio visual para a compreenso das distines liderana-gesto e lderes-

    gestores (adaptado de Pina e Cunha, 2000:273)

    Isolados ou em conjugao de esforos com os gestores, os lderes so figuras de

    primeira linha na morfologia das organizaes, responsveis ltimos no s pelos

    triunfos mas tambm pelos fracassos. A ligao entre as aes dos lderes e os

    resultados de eficcia altamente complexa, no-linear, a longo prazo e de difcil

    escrutnio. A parcela dos resultados que pode ser atribuda s aes protagonizadas

    diretamente pela liderana dificilmente poder ser inventariada com grande preciso (cf.

    Figura 5).

  • A Liderana

    147

    Figura 5 Cadeia ilustrativa entre as relaes entre a atividade do lder e os resultados

    organizacionais (adaptado de Yulk:1994:7)

    O papel da liderana entendido de modo variado pelos vrios investigadores

    no que respeita ao desempenho dos indivduos, grupos e organizaes. Na base estar,

    certamente, um conjunto de fatores simultaneamente internos e externos que restringem

    consideravelmente o papel do lder. Rego (1998) arrola um conjunto de fatores

    responsveis por essa diversidade de opinies: a cultura organizacional, a fora dos

    stakeholders, o jogo entre os vrios agentes organizacionais, as estruturas internas que

    limitam a tomada de deciso, as condies econmicas externas, a situao do mercado

    de trabalho e os custos do dinheiro junto das entidades financiadoras. Acresce, ainda, o

    nvel organizacional na medida em que os lderes de nveis inferiores da hierarquia

    tendem a ser mais contidos na sua ao do que os lderes de topo.

    Por vezes, a dificuldade em atribuir liderana a sua verdadeira valia advm de

    duas variveis distintas: em primeiro lugar, entre as aes do lder e o resultado

    produzido pode distar um perodo de tempo mais ou menos longo; e em segundo lugar

    outros fatores (quer internos quer externos organizao) exercem influncia sobre

    essas variveis, e, desse modo, difcil saber qual o papel que cabe ao lder e a esses

    fatores.

    Rego (1998) considera os efeitos da liderana como diretos e indiretos. Por um

    lado, o lder pode diretamente levar os seguidores a trabalharem mais e melhor mediante

    a aplicao de incentivos ao desempenho e da definio de objetivos estimulantes. O

    lder pode, tambm, ampliar as capacidades e competncias dos subordinados para o

    trabalho atravs de formao contnua, clarificar as metas e procedimentos a realizar,

    organizar e coordenar as atividades de modo mais eficiente, eliminando atrasos,

    duplicao de esforos e desperdcios, e, ainda, reunir os recursos necessrios para

  • A Liderana

    148

    realizar o trabalho. Por outro lado, indiretamente o lder pode promover a mudana da

    cultura organizacional, incrementar a longo prazo capacidades e competncias dos

    seguidores, apostar nas alteraes tecnolgicas utilizadas nos diversos procedimentos,

    gizar mudanas ao nvel da estratgia e da estrutura morfolgica da organizao.

    2. A liderana a perspetiva histrica

    A multiplicidade de estudos dedicados liderana apresenta como grande

    consequncia uma vasta panplia de teorias, orientaes e modelos. Efetivamente,

    parece-nos que tanta abundncia significa a dificuldade de explicitar o conceito de

    liderana.

    Apesar da diversidade, so comummente aceites trs paradigmas principais na

    conceptualizao da liderana: o primeiro assenta no estudo dos traos da personalidade

    do lder, o segundo apela observao dos comportamentos adotados pelo lder no

    exerccio da liderana e o terceiro refere-se s variveis situacionais ou contingenciais

    que condicionam a eficcia da liderana.

    Se no primeiro dos trs paradigmas, o importante isolar e caracterizar os

    atributos pessoais do lder, marcos essenciais na distino entre lderes e no lderes, no

    segundo, o relevo atribudo quilo que os lderes fazem no que respeita s suas

    funes na tentativa de descrever os comportamentos que mais se correlacionam com a

    eficcia organizacional. Por sua vez, a terceira perspetiva, enfatiza uma lgica mais

    contingencial ou situacional na medida em que se pretende apurar as influncias do

    meio e do contexto que podem condicionar os efeitos da liderana.

    Porm, nas ltimas dcadas, novas perspetivas tm sido apontadas referindo-se ao

    carisma e capacidade transformacional dos lderes no que respeita relao que

    mantm com os membros da organizao. Prevalece a preocupao em integrar aspetos

    comportamentais e os traos da personalidade assim como o tipo de interaes que se

    estabelecem entre todos os membros da organizao.

  • A Liderana

    149

    O Quadro 18, adaptado a partir de Bryman (1992), procura fazer uma sntese sobre

    a evoluo temporal das vrias perspetivas que traduzem, de certo modo, as tendncias

    dos estudos sobre a liderana.

    Quadro 18 Tendncias no estudo da liderana (adaptado de Bryman, 1992)

    Perodo Perspetiva Caracterizao

    At finais dos anos 40 Traos da personalidade A liderana um atributo

    inato.

    Finais dos anos 40 at finais

    dos anos 60 Comportamentos do lder

    A eficcia da liderana est

    relacionada com o tipo de

    comportamento do lder. Finais dos anos 60 at ao

    incio dos anos 80

    Abordagem

    situacional/contingencial

    A eficcia da liderana

    influenciada pelo contexto.

    Anos 80

    Novas abordagens da

    liderana (liderana carismtica,

    transformacional, transacional)

    A liderana est dependente da

    viso do lder.

    2.1. A teoria dos traos

    Os primeiros estudos sobre liderana, realizados at II Guerra Mundial,

    tiveram como preocupao maior definir e isolar os atributos fsicos, psicolgicos e

    aptides que diferenciassem os lderes dos no-lderes e os lderes eficazes dos no-

    eficazes. Estes atributos ou competncias so, vulgarmente, designados por traos.

    Chiavenato (1993:175) define trao como qualidade ou caracterstica distintiva da

    personalidade. De acordo com Yulk (1994), os traos consistem num conjunto de

    atributos fsicos, traos de personalidade, necessidades e motivos e valores.

    Com a ideia do grande homem1 bem definida, o lder, dotado de traos e

    competncias inatas, facilmente, desempenha as suas funes com eficcia em qualquer

    situao, especialmente nas difceis. As caractersticas marcantes do lder permitem-lhe

    influenciar o comportamento dos outros membros da organizao. Nesta fase, os traos

    1 A teoria do grande homem foi defendida, por volta de 1910, por Carlyle. Segundo o autor, os grandes

    avanos e progressos da humanidade resultaram da ao de homens com traos da personalidade muito

    especficos e vincados.

  • A Liderana

    150

    mais comummente aceites passam pela inteligncia superior, criatividade, eloquncia,

    autoestima, estabilidade emocional, o nvel de energia, intuio, poder de persuaso.

    Com efeito, um lder eficaz capaz de inspirar confiana, ser inteligente, percetivo e

    decisivo perante os subordinados. Visto que nem todos os sujeitos eram possuidores

    destas qualidades inatas, estveis e distintivas apenas os que as detivessem poderiam ser

    considerados potencialmente lderes e tidos como heris. Assim, no sendo possvel a

    formao, a teoria dos traos privilegia a seleo dos lderes. Contudo, a teoria de traos

    da personalidade apresentava determinados aspetos frgeis que acabariam por ser

    contestados ao verificar-se que os traos de personalidade so escassamente preditores

    da eficcia dos lderes (Jesuno, 1996:53).

    Da profuso de pesquisas resultou uma pluralidade de traos e competncias no

    coincidentes entre si e que acabaram por pr em causa esta teoria na medida em que a

    presena de um conjunto de traos num individuo no preditor de sucesso. Aps a

    reviso de inmeros estudos sobre liderana feita por Stogdill (1948), o autor conclui

    que um lder dotado de determinados traos pode ser eficaz num contexto mas ineficaz

    noutro. Por outro lado, lderes distintos dotados com diferentes traos podem ser bem

    sucedidos no mesmo contexto.

    Apesar do abalo provocado pelos estudos de Stogdill (1948), a teoria dos traos

    continuou a merecer aplicao nomeadamente na seleo de novos lderes e novos

    traos continuaram a ser identificados. Porm, em 1974, Stogdil2 (1974) fez a reviso de

    163 estudos e apontou novos traos e competncias com incidncia no desempenho da

    liderana (cf. Quadro 19). Neste trabalho, o autor defende que os indivduos possuidores

    de determinados traos tm mais hipteses de serem lderes eficazes do que os sujeitos

    que deles carecem, contudo tal no lhe garante automaticamente a eficcia. Na verdade,

    a relevncia dos diferentes traos parece estar dependente do contexto.

    2 Bass and Stogdill Handbook of Leadership (Stogdill, 1974) uma das mais famosas obras sobre

    liderana, nela aparecem compilados os dados mais relevantes sobre modelos, investigaes e aplicaes

    prticas da liderana.

  • A Liderana

    151

    Quadro 19 Traos e competncias mais vulgares nos lderes eficazes (Adaptado de Yulk, 1989,

    1994)

    Traos Competncias

    Adaptabilidade ao contexto Inteligente

    Atento ao ambiente social Conceptualmente bem dotado

    Ambicioso e direcionado para o sucesso Criativo

    Afirmativo Diplomtico

    Cooperativo Eloquente

    Decisivo Conhecedor das funes do grupo

    Motivado para impressionar os outros Organizado

    Enrgico Persuasivo

    Persistente Socialmente bem dotado

    Autoestima

    Capaz de absorver o stress

    Desejoso de assumir responsabilidades

    Estas premissas apontadas por Stogdill continuam atualmente3 a ser valorizadas

    pelos investigadores na medida em que muitos estudos continuam a enfatizar a

    relevncia de certos traos parecendo mesmo haver um ressurgimento do tema (Cunha

    et al, 2003). No entanto, atualmente parece ser consensual que a liderana no pode

    cingir-se apenas personalidade do lder, ainda que este seja um fator relevante. O

    contexto e os seguidores so elementos essenciais para a compreenso da liderana

    assim como uma abordagem alicerada no terreno (Silva, 2010).

    A ligao desta teoria liderana carismtica parece bvia na medida em que

    ambas identificam o lder como um heri ou cavaleiro branco enviado para salvar a

    organizao das dificuldades presentes (Cunha et al, 2005:24).

    Chiavenato (1993) aponta cinco razes que traram esta teoria na medida em que

    no foi feita a distino entre os vrios traos da personalidade; foi esquecida a

    influncia e reao dos seguidores nos resultados da liderana; no foram tidos em

    conta os traos adequados a cada tipo de tarefa e objetivos a alcanar; foi ignorada a

    situao concreta em que a liderana se operacionaliza e, finalmente, de modo simplista,

    3 A ttulo de exemplo, no estudo levado a cabo por Kirkpatrick e Locke (1996) so referenciados seis

    traos de personalidade (motivao, desejo de liderar, honestidade e integridade, confiana, capacidade

    cognitiva para interpretar informao, conhecimento da tarefa) que marcam a diferena entre os

    indivduos lderes e os no-lderes. Contudo, reconhecida a possibilidade dos traos serem aprendidos e

    aperfeioados com o intuito de potenciar a eficcia dos lderes. Este ponto de vista, demarca-se, ento, da

    teoria inicial que postulava o facto dos traos serem inatos e as falhas de carter no poderem ser

    corrigidas.

  • A Liderana

    152

    foi equacionado que o lder dotado de traos de liderana permanentemente lder

    durante todas as ocasies e em qualquer situao.

    As reaes adversas perante esta teoria de liderana vo, certamente, dar origem

    a um novo modelo mais centrado na crtica aos traos mantendo todavia a crena na

    possibilidade de identificar o lder universal (Jesuno, 1996: 55).

    2.2. A teoria sobre estilos comportamentais

    As teorias sobre estilos comportamentais surgiram como resposta s fragilidades

    apresentadas pela teoria dos traos nos finais dos anos 40, princpios dos anos 50. Se a

    teoria dos traos enfatiza aquilo que o lder , a abordagem dos estilos de liderana

    refere-se a tudo aquilo que o lder faz. O estilo de comportamento do lder , agora, o

    principal fator a ter em conta nos estudos sobre liderana. Efetivamente, a procura de

    comportamentos eficazes uma rea de estudo menos problemtica do que a anlise dos

    traos da personalidade do lder na medida em que se torna mais simples criar modelos

    de comportamento do que descrever estruturas de personalidade e caractersticas de

    funcionamento. Desta forma, identificados os comportamentos prprios dos lderes

    possvel apostar em programas de formao que impulsionem a sua eficcia. J no

    estamos perante um lder nato mas assistimos, pelo contrrio, ao treino do lder com o

    fito de incutir e aperfeioar comportamentos eficazes.

    A rutura com a anterior teoria dos traos deve-se em grande parte a autores

    como Lewin (1939) que aps diversas experimentaes em grupos naturais concluiu

    que o comportamento do lder resulta da funo da personalidade do lder e da situao.

    Mais tarde, Lippit e White (1952,1960) submeteram grupos de crianas com 10 anos,

    orientados para a execuo de tarefas, a trs diferentes de estilos de liderana

    (autocrtica ou autoritria, liberal ou laisse-faire e democrtica) durante determinados

    perodos de tempo. O lder autocrtico estabelecia todas as aes do grupo, estipulava

    os mtodos, fases de execuo, procedimentos a operacionalizar, distribua recompensas

  • A Liderana

    153

    e punies. Por sua vez, o lder democrtico encorajava e motivava os membros do

    grupo a tomarem decises descrevendo em traos largos as etapas genricas para atingir

    os objetivos e metas delineados e quais os procedimentos opcionais. Ao grupo era

    permitido formar equipas de trabalho e o lder encarregava-se de distribuir crticas e

    elogios com rigor e objetividade. Finalmente, o lder liberal definia-se pela sua atitude

    no participante nas tarefas e atividades realizadas, mantendo-se afastado e indiferente

    permitindo ao grupo agir como bem entendesse (cf. Quadro 20).

    Quadro 20 Os trs estilos de liderana (adaptado White e Lippitt)

    Liderana autocrtica Liderana democrtica Liderana liberal

    O lder estabelece as

    diretrizes sem participao do

    grupo.

    As linhas gerais so

    discutidas e definidas pelo

    grupo, estimulado e auxiliado

    pelo lder.

    A interveno do lder

    mnima, existindo liberdade

    completa nas decises grupais

    ou individuais.

    O lder fixa as medidas e as

    tcnicas para a implementao

    das tarefas, cada uma por sua

    vez.

    O grupo delineia as medidas

    e as tcnicas para atingir o

    alvo, pedindo aconselhamento

    tcnico ao lder quando

    necessrio. Este prope

    alternativas ao grupo e as

    tarefas a realizar resultam de

    intenso debate.

    A participao do lder no

    debate restrita dado que

    apresenta apenas os materiais

    ao grupo, esclarecendo que

    poderia fornecer informaes

    desde que as solicitassem.

    O lder destina qual a tarefa

    que cada membro deve realizar

    e qual o parceiro de trabalho.

    A diviso de tarefas tarefa

    do prprio grupo e cada

    individuo livre de escolher o

    seu parceiro de trabalho.

    A diviso de tarefas e a

    escolha dos parceiros fica a

    cargo do grupo. O lder no

    participante.

    O lder dominador

    personaliza os elogios e

    crticas ao trabalho de cada

    um.

    O lder procura ser tambm

    um membro da equipa, sem

    encarregar-se substancialmente

    das tarefas. objetivo e nas

    crticas e elogios limitam-se

    apenas aos factos.

    O lder no procura avaliar

    ou regular a execuo de

    tarefas. Quando questionado, o

    lder comenta as atividades do

    grupo.

    Os resultados das observaes efetuadas pelos referidos autores evidenciaram

    padres de comportamento diferenciados consoante os estilos de liderana aplicados

    pelos lderes. O grupo submetido liderana autocrtica apresentava maior volume de

    trabalho realizado. O grupo sujeito ao estilo liberal ficou abaixo dos resultados

    esperados no que respeita quantidade de tarefas realizadas bem como sua qualidade.

    O grupo submetido liderana democrtica denota uma produo de tarefas inferior

    obtida atravs da liderana autocrtica, contudo a qualidade do trabalho foi muito

    superior. Tendo em conta os resultados apresentados por este estudo, a liderana

    democrtica ganhou terreno sobre os restantes estilos numa altura em que surgiram

    dvidas quanto viabilidade dos sistemas democrticos.

  • A Liderana

    154

    Segundo Chiavenato (1993), sobre estes estudos foi possvel concluir que em

    determinadas situaes, a liderana autocrtica tem efeitos positivos e funciona quando

    os demais estilos fracassam; noutras situaes, a liderana democrtica resulta quando

    os demais estilos falham e, finalmente, a liderana liberal supera os restantes estilos em

    certas ocasies.

    Na verdade, o lder no seu quotidiano deve aplicar os trs estilos de liderana,

    consoante a circunstncia, os membros da organizao e as tarefas em execuo.

    Qualquer lder manda cumprir ordens, consulta os subordinados antes de tomar

    decises, sugere tarefas aos subordinados. A principal dificuldade da liderana reside

    em adequar o estilo situao, aos subordinados e s tarefas a serem realizadas.

    Dos mltiplos programas de pesquisa realizados no mbito desta perspetiva

    destacam-se os realizados nas Universidades de Michigan e de Ohio. Quer num caso

    quer no outro, remontam aos estudos pioneiros sobre estilos de liderana

    protagonizados por Lewin (1939), Lippit e White (1952,1960). Os investigadores da

    Universidade de Michigan referiram a existncia de duas categorias de comportamento:

    a primeira orientada para as tarefas (nvel em que o lder define e operacionaliza-se os

    seus afazeres e os dos seguidores, com a finalidade de atingir os objetivos) e a segunda

    orientada para as pessoas/relacionamento (nvel em que o lder atua de modo cordial e

    colaborante, se interessa pelos seguidores e o seu bem-estar). Os lderes com

    comportamento direcionado para a tarefa preocupam-se, primordialmente, com a

    superviso e cumprimento da tarefa por parte dos subordinados; executar a tarefa mais

    importante do que o crescimento e a satisfao dos indivduos com os quais trabalha.

    Por sua vez, os lderes orientados para as pessoas atingem maior sucesso no que respeita

    produtividade e satisfao no trabalho na medida em que fomentam relaes amistosas

    e o cumprimento das tarefas produto do clima interno.

    A abordagem de Likert (1961,1967) paradigmtica desta linha ao perspetivar

    quatro sistemas de liderana tpicos conhecidos por sistema 1: autocrtico explorador;

    sistema 2: autocrtico benevolente; sistema 3: consultivo e sistema 4:

    democrtico/participativo (cf. Figura 6). No sistema 1, a confiana no existe entre os

    lderes e os subordinados na medida em que o processo de controlo muito rgido.

    Decises, definies de objetivos e metas so traados a partir do topo da organizao.

    Os subordinados regem-se pelo medo, ameaas, punies e, eventualmente,

    gratificaes. A interao praticamente nula. Por sua vez, no sistema 2 existe um grau

    de confiana entre lderes e subordinados um pouco maior. Apesar das decises,

  • A Liderana

    155

    definio de metas, objetivos e processos de controlo serem tomados pelos lderes,

    existe j alguma delegao nos subordinados intermdios. No sistema 3, a interao e a

    comunicao ascendente e descendente moderadas promovem valores como a confiana

    entre os lderes e os subordinados. No sistema 4, a confiana nos subordinados total

    por parte dos lderes ao ponto de muitas decises poderem ser partilhadas. A

    comunicao horizontal (entre pares) e a comunicao vertical (ascendente e

    descendente) facilitam o inter-relacionamento na organizao. A participao e

    envolvimento na vida organizacional motivam os subordinados a aumentar os lucros, a

    estabelecer objetivos e a melhorar os mtodos para os alcanar. A vertente formal e a

    vertente informal da organizao esto em sintonia de modo que todas as foras dentro

    da organizao se esforam para alcanar os mesmos objetivos declarados.

    Figura 6 Os sistemas de liderana/eficcia da organizao (adaptado Likert, 1967)

    O autor criou um instrumento repartido por 18 escalas capaz de medir a que

    sistema pertence a organizao, designado Perfil de Caractersticas das Organizaes.

    Segundo Likert (1961,1967) ao contrrio dos sistemas 1 e 2, os sistemas 3 e 4

    favorecem a produtividade organizacional e a satisfao do pessoal, as sugestes dos

    subordinados so tidas em condio pelos lderes, o apoio incondicional e a confiana

    recproca. Na verdade, o sistema 4 de Likert aponta para o treino de candidatos a

    lderes, dadas as oportunidades que oferece, atravs da participao, aos novos lderes

    (Jesuno, 1996). Apesar de suportado por inmeros estudos, esta abordagem de Likert

  • A Liderana

    156

    foi considerada inconsistente por no ter em conta a situao: com efeito, diferentes

    tipos de situao exigem distintos estilos de liderana.

    Os estudos liderados pela Universidade de Ohio tiveram, tambm, como

    objetivo central elencar estilos comportamentais da liderana eficaz a partir da anlise

    fatorial de questionrios, da observao direta e sem pressupostos tericos. Destacamos

    o modelo de Blake e Mouton (1964), popularizado como grelha gerencial. Este modelo

    pretende avaliar a preocupao do lder face aos indivduos e s tarefas resultando cinco

    estilos essenciais (cf. Figura 7). Esta grelha de dupla entrada sustentada por dois eixos,

    um que reproduz o grau de ateno orientado para as pessoas e outro dirigido para as

    tarefas/produo, ambos graduados de 1 a 9; o cruzamento dos dois eixos gera os cinco

    principais estilos de liderana, identificados em funo da orientao para pessoas ou

    para as tarefas. Naturalmente, o estilo 9.94 o estilo mais eficaz na medida em que

    enfatiza simultaneamente a orientao para as pessoas e para as tarefas e, por esse

    motivo, cada lder deve situar o seu desempenho na grelha com o intuito de melhorar e

    atingir o ponto ideal.

    Figura 7 O modelo da grelha gerencial (Adaptado de Blake e Mouton, 1964)

    4 Segundo a grelha de gesto gerencial (Blake e Mouton, 1964), no estilo 1.9., gesto tipo simptico, a

    ateno s necessidades de relacionamento satisfatrio das pessoas promove um ambiente e ritmo

    organizacionais de trabalho cordiais; no estilo 9.9., gesto tipo integrador, a execuo de tarefas parte de

    pessoas ativamente envolvidas: as relaes de confiana e o respeito nascem dos objetivos comuns aos

    membros da organizao; no estilo 5.5., gesto tipo intermdio, a necessidade de concluir um trabalho e a

    manuteno da motivao dos indivduos num grau satisfatrio so perfeitamente compatveis; no estilo

    1.1., gesto tipo anmica, o exerccio de um esforo mnimo para levar a cabo o trabalho necessrio e

    apropriado para manter os indivduos na organizao; no estilo 9.1., gesto tipo autocrtico, a realizao

    da tarefa possvel sem que o elemento humano interfira grandemente.

  • A Liderana

    157

    Apesar da sustentabilidade e da recetividade, este modelo comeou a ser

    questionado no que respeita sua aplicabilidade na formao e seleo dos lderes. A

    preocupao com a identificao dos traos do lder universal d lugar a orientaes

    mais contingenciais, em que o contexto, tal como as motivaes e capacidades dos

    subordinados, nvel de estruturao da tarefa, posicionamento da estrutura hierrquica,

    quem exerce o papel essencial na opo do comportamento mais adequado. Em

    consequncia, a investigao produzida nos anos 60 e 80 sublinha a predominncia da

    contingncia, referindo a relevncia dos fatores contextuais no que respeita aos traos e

    comportamentos individuais, na determinao de uma liderana eficaz.

    2.3. A teoria situacional ou contingencial da liderana

    Aps as fragilidades apresentadas pelas teorias anteriores, de finais dos anos 60

    at ao incio dos anos 80, a abordagem situacional ou contingencial da liderana

    acrescenta um novo aspeto ao estudo da liderana: para atingir a eficcia, cada situao

    exige um tipo de liderana diferente e adequado ao contexto. Este novo contributo no

    invalida, contudo, a relevncia da teoria dos traos e dos comportamentos para o estudo

    da liderana. Neste sentido, a liderana no se aplica apenas quilo que o lder ou faz

    mas estende-se, tambm, ao tipo de subordinados que compem a organizao, ao tipo

    de tarefas a realizar e ao contexto em que todos os membros da organizao esto

    inseridos.

    Deste modo, as teorias situacionais ou contingenciais tm como pressuposto

    orientador a inexistncia de um estilo nico ou caracterstico da liderana vlido e

    comum a todas as situaes. Com efeito, cada contexto em particular requer um tipo de

    liderana diferenciado. Assim, o lder eficaz aquele que evidencia a capacidade de

    adaptao a grupos de sujeitos com determinadas particularidades sob condies muito

    diversificadas. Lder, grupo e situao constituem, na verdade, um conjunto de variveis

    capitais para a explicao da eficcia da liderana.

    Na medida em que as abordagens anteriores no eram suficientes para explicar o

    xito e a derrota do mesmo lder integrado em organizaes e contextos diferentes, esta

  • A Liderana

    158

    nova abordagem consegue isolar a varivel situao e catapult-la como elemento

    catalisador de uma liderana eficaz.

    As teorias situacionais podem ser enquadradas de acordo com duas

    subcategorias: numa primeira subcategoria, o comportamento do lder tido como uma

    varivel dependente da situao dado que existem certos fatores que determinam o

    modo como os lderes atuam: o nvel hierrquico, a dimenso da organizao, a

    dependncia de outras organizaes, as situaes de crise, o estdio de maturidade da

    organizao, as expetativas dos superiores, pares e seguidores, os procedimentos

    burocrticos, as politicas organizacionais, a (in)existncia de recursos; na segunda

    subcategoria, os diferentes padres de comportamento ou traos so avocados como

    indispensveis liderana eficaz em diferentes situaes.

    Neste mbito evidenciam-se mltiplos estudos dos quais se destacam a teoria

    caminho-objetivos, a teoria dos substitutos de liderana, o modelo situacional de Hersey

    e Blanchard (1988), a teoria da contingncia de Fiedler (1970), o modelo das ligaes

    mltiplas de Yulk (1971,1994), o modelo normativo de Vroom e Yetton (1973) e a

    teoria dos recursos cognitivos (Fiedler, 1986). Centrar-nos-emos, apenas, em trs dos

    modelos mais significativos: o modelo de Hersey e Blanchard (1969, 1988), na teoria da

    contingncia de Fiedler (1970) e no modelo das ligaes mltiplas de Yulk (1971,

    1994).

    Enquadrada nesta abordagem, a teoria da liderana situacional de Hersey e

    Blanchard (1969, 1988), tambm, conhecida como teoria dos ciclos de vida, baseada

    substancialmente nos estudos formulados pela Universidade de Ohio, advoga que o

    comportamento e a forma de atuao do lder depende do grau de maturidade5 dos

    seguidores e medida que este evolui, alterar-se-, tambm, o tipo de liderana6 a

    5 Rego define maturidade como conhecimento, experincia, e capacidade, assim como confiana,

    empenhamento e motivao para a realizao de uma determinada tarefa, no sendo perspetivada como

    caracterstica pessoal, ou trao de personalidade, mas sim como algo que tem a ver com uma tarefa

    especfica (Rego, 199:302). A maturidade pode, ento, dividir-se em duas componentes distintas: a

    maturidade no trabalho a realizar e que refere os aspetos mais tcnicos das tarefas, exprimindo-se pela

    competncia e conhecimentos que os indivduos tm sobre aquilo que devem fazer e a maturidade

    psicolgica que simboliza os sentimentos de autoconfiana e abertura para aceitar a responsabilidade pela

    concretizao das funes designadas.

    A maturidade no trabalho pode ser avaliada numa escala de quatro intervalos: M1: pouca maturidade;

    M2: alguma maturidade; M3: bastante maturidade; M4: muita maturidade.

    A maturidade psicolgica tambm pode ser avaliada numa escala com quatro intervalos: 1: raramente;

    2: s vezes; 3: frequentemente; 4: geralmente. 6 Segundo Hersey e Blanchard (1969, 1988) podemos distinguir quatro estilos especficos de liderana:

    S1 dirigir, dar ordens (alta orientao para a tarefa e baixo relacionamento na medida em que o lder

    define as funes e informa os seguidores sobre as tarefas, quando e como realiz-las, a nfase posta no

    comportamento diretivo; S2 persuadir, vender (alta orientao para as tarefas e alto rendimento com as

  • A Liderana

    159

    aplicar (cf. Quadro 21). Este modelo, virado essencialmente para a formao dos

    lderes, para alm de avaliar o estdio de maturidade do indivduo, refere que o lder

    deve, tambm, avaliar o nvel de maturidade do grupo na medida em que os membros

    que o compem interagem na mesma rea de trabalho.

    Assim, perante os quatro nveis de maturidade identificados pelos autores, o

    lder deve aplicar quatro estilos de liderana diferenciados: a) face a sujeitos de baixa

    maturidade (M1), o lder deve dar ordens, dirigir, especificar (S1); b) os indivduos que

    no sabem e no querem assumir responsabilidades (M2), o lder deve vender a soluo

    para o problema, persuadindo-os (S2); c) os colaboradores que sabem mas no querem

    assumir as responsabilidades (M3) devem ser estimulados e chamados a participar na

    tomada de decises (S3); d) sempre que os subordinados sabem e esto dispostos a

    assumir responsabilidades (M4), o lder deve delegar (S4).

    Conforme se pode observar pela figura abaixo, sempre que os colaboradores

    assumem elevados graus de maturidade, o lder diminui o controlo sobre as tarefas,

    diminuindo, tambm, o comportamento de relacionamento. Desde que ajustado ao grau

    de maturidade dos subordinados, qualquer dos estilos pode revelar eficcia. Para os

    autores no h one best way, ou seja um estilo universal, eficaz em todas as situaes,

    o que no acontecia por exemplo em Blake e Mouton7 (1964).

    pessoas) o lder apresenta um comportamento diretivo e de apoio aos seguidores de modo que as tarefas

    possam ser realizadas de acordo com a definio e estruturao delineada; S3 participar (baixa nfase na

    estruturao das tarefas e alto nvel de relacionamento com as pessoas) A tomada de deciso

    partilhada, embora o lder encarne o papel principal enquanto facilitador e comunicador; S4 delegar

    (baixa nfase na estruturao das tarefas e baixo nvel de relacionamento com as pessoas) o apoio

    fornecido pelo lder aos colaboradores mnimo na medida em que estes so capazes de desenvolver o se

    trabalho e possuem elevados nveis de motivao para atingir as metas solicitadas. 7 Na senda da grelha gerencial de Blake e Mouton (1964), os quatros estilos de liderana propostos por

    Hersey e Blanchard (1969, 1988) revelar-se-iam todos relativamente ineficazes em comparao com o

    nico estilo verdadeiramente eficaz, o estilo 9.9.

  • A Liderana

    160

    Quadro 21 Modelo situacional de Hersey e Blanchard (adaptado 1969, 1988) N

    IVE

    IS D

    E

    MA

    TU

    RID

    AD

    E

    DO

    S

    CO

    LA

    BO

    RA

    DO

    -

    RE

    S

    M1

    No capaz e no quer

    assumir

    responsabilidades ou

    inseguro

    M2

    incapaz de assumir

    responsabilidades,

    mas tem vontade ou

    confiana

    M3

    capaz mas no tem

    vontade de assumir

    responsabilidades ou

    inseguro

    M4

    capaz de assumir

    responsabilidades e,

    simultaneamente tem

    vontade ou confiana

    Est

    ilo

    s d

    e li

    der

    an

    a a

    pro

    pri

    ad

    os No empenhado

    nem competente

    empenhado mas

    incompetente

    No empenhado

    mas competente

    empenhado e

    competente

    Estilo E1

    (diretivo)

    Dar ordens

    Guiar

    Dirigir

    Estabelecer

    Estilo E2

    (persuasivo)

    Vender

    Explicar

    Colaborar

    Comprometer

    Estilo E3

    (participativo)

    Participar

    Encorajar

    Colaborar

    Comprometer

    Estilo E4

    (delegativo)

    Delegar

    Observar

    Monitorizar

    Faculta normas

    especficas e

    superviso rgida,

    diz o que fazer,

    quando e como

    Explana as

    decises e clarifica;

    debate, explica o

    porqu

    Partilha ideias,

    debate, apoia,

    facilita, fomenta a

    participao na

    tomada de decises

    Delega as

    responsabilidades

    na tomada de

    decises e na sua

    implementao Componente de

    tarefa do lder

    Componente de

    relacionamento do

    lder

    Baixa

    Elevado

    Elevado

    Elevado

    Baixa

    Elevado

    Baixa

    Baixa

    Este modelo de liderana, considerado popular para efeitos de formao de

    lderes, apresenta, segundo a crtica, uma conceptualizao ambgua (Cunha, 2003),

    frgeis fundamentos tericos na medida em que a teoria explicitada resulta de

    evidncias empricas reunidas com base em milhares de aplicaes realizadas um pouco

    por toda a parte.

    Contudo, o modelo continua a granjear boa recetividade no que respeita

    formao de lderes, designadamente, no mundo militar e -lhe reconhecido o

    contributo para a compreenso da necessidade dos lderes atuarem conforme as

    situaes, adotando um comportamento flexvel.

    Foi este o entendimento de Casse (1991) ao defender que cada um dos quatro

    estilos deve ser aplicado em diferentes circunstncias de mudana: assim, em situaes

    reativas, o lder deve usar o estilo persuasivo para convencer os seus seguidores das

    vantagens da mudana a implementar; o estilo diretivo deve ser utilizado pelo lder para

    gerir a mudana em situaes de crise, embora o lder possa recorrer ao estilo

    persuasivo para determinar a forma como a mudana ser implementada; em situaes

    antecipativas, o lder deve recorrer aos estilos participativo e delegativo, solicitando aos

  • A Liderana

    161

    indivduos para trabalharem no problema, invocando a criatividade e a inovao e

    delegando autoridade e responsabilidade.

    Em resultado de vrios estudos realizados por Jesuno (1996) em aes de

    formao de lderes portugueses, o estilo de liderana dominante em Portugal o estilo

    S1-S2 e depois o estilo S2-S3, estando este ltimo associado a um maior grau de

    eficcia. O estilo S4 bastante mais raro de encontrar junto dos lderes portugueses,

    sinal de uma maior dificuldade em delegar.

    Se o modelo de Hersey e Blanchard (1969,1988) defende que o lder deve alterar

    o comportamento em funo da situao (flexibilidade comportamental), o modelo

    avanado por Fiedler (1970) advoga que a eficcia do lder resulta da seleo da pessoa

    certa para determinada situao, ou ento, atravs da produo de mudanas sobre a

    situao de maneira a adequ-la ao lder. O lder, na perspetiva de Hersey e Blanchard

    (1969,1988) deve aprender a reconhecer as situaes e a adotar os comportamentos a

    elas ajustados. J na perspetiva de Fiedler (1970), o lder deve aprender a reconhecer-se

    a si prprio e a praticar uma certa engenharia situacional.

    O modelo de Fiedler (1970) um dos mais representativos desta teoria. O autor

    defende que a prpria situao molda a relao entre os traos do lder (estilo do lder) e

    o desempenho do grupo: a eficcia do lder resulta dos seus atributos (orientao para o

    relacionamento ou orientao para a tarefa) e o controlo que possui da situao (grau

    favorvel da situao). O sucesso dos sujeitos na tomada de deciso depende da

    anuncia entre o modo como trabalham com os membros do grupo e o tipo de funes

    que tm que desempenhar. Desta forma, os lderes mais orientados para as tarefas so

    mais eficazes em situaes de elevado ou baixo controlo do que os orientados para o

    relacionamento. Por sua vez, os lderes orientados para o relacionamento so mais

    eficazes em ocasies de controlo moderado (cf. Figura 8)

  • A Liderana

    162

    Figura 8 O modelo contingencial de Fiedler (Adaptado de Fiedler, 1970)

    A partir da reviso dos estudos descritivos do comportamento dos lderes Yulk

    (1971,1994) apresentou uma classificao na qual procurou integrar os mltiplos

    contributos existentes data. O procedimento estendeu-se aos vrios resultados e teorias

    acerca dos comportamentos de lderes eficazes. Deste ensaio, em 1971, surgiu a

    primeira teoria, melhorada em 1994. Na verdade, a teoria das ligaes mltiplas abarca

    quatro tipos de variveis: comportamentos do gestor, variveis intermdias, variveis de

    eficcia e variveis situacionais (cf. Figura 9).

    Figura 9 Modelo de ligaes mltiplas (adaptado de Yulk, 1971, 1994)

    Este modelo releva a importncia da ligao entre os comportamentos que o lder

    pretende realizar (por um lado, clarificar, delegar, desenvolver, reconhecer e apoiar e,

    por outro, planear, desenvolver problemas, monitorizar, construir esprito de equipa) e a

    eficcia da unidade organizacional que pretende alcanar, uma vez que a relao entre

  • A Liderana

    163

    estas duas reas condicionada por um conjunto de fatores importantes, as variveis

    intermdias (os esforos dos membros da organizao; capacidades dos subordinados e

    clareza do papel; organizao do trabalho; colaborao e esprito de equipa; recursos e

    apoio e coordenao externa). A eficcia resulta, ento, da conjuno de todas as

    variveis. Cada varivel interage com todas as outras e uma falha na engrenagem pode

    pr em causa a eficcia organizacional.

    No que respeita s variveis situacionais, estas podem interferir no processo em

    trs situaes distintas: numa fase inicial, neutralizando as aes do lder sobre as

    variveis intermdias se, por exemplo, as tarefas a executar pelos colaboradores forem

    repetitivas e rotineiras diminuindo, assim, a relevncia do fator cooperao e coeso.

    Em segundo lugar, independentemente das aes do lder sobre as variveis

    intermdias, existem vrios aspetos da situao que as determinam. So disso exemplo:

    o esforo dos colaboradores ser mais relevante se a organizao possuir um sistema de

    reconhecimento do mrito que atribua as recompensas ao mrito; a qualificao maior

    ou menor dos indivduos estar dependente do facto de a organizao poder ou no

    pagar salrios elevados compatveis com as funes a realizar; a colaborao e o

    esprito de equipa so determinados pelas caractersticas do grupo ou pelo sistema de

    recompensas. Finalmente, acresce que alguns aspetos da situao relativos realizao

    de mudanas e reao aos problemas so limitativos para o lder: este pode ver o seu

    comportamento limitado por imposies legais ao pretender agir disciplinarmente sobre

    os subordinados ou ao ver a neutralizao das suas aes protagonizada por sindicatos

    fortes.

    Na enunciao deste modelo, Yulk (1971, 1994) equaciona duas grandes asseres

    gerais: por um lado, se o lder atuar no sentido de minorar lacunas ao nvel das variveis

    intermdias, a eficcia organizacional dever a curto prazo ser mais facilmente

    atingvel; por outro, se o lder atuar no sentido de tornar a situao mais propcia (linha

    tracejada na Figura 11), a eficcia da unidade organizacional ser maior a longo prazo.

    Ainda que sejam reconhecidas vrias virtudes ao modelo das ligaes mltiplas,

    ele enforma vrias fragilidades, nomeadamente, por no explicar a forma como os

    comportamentos de liderana interagem entre si para produzir resultados sobre as

    variveis intermdias e por no particularizar as relaes entre as variveis situacionais.

    Ainda que existam diferenas significativas entre os modelos que acabmos de

    elencar, alguns aspetos so comummente considerados por todas as propostas. Em

    primeiro lugar, a aceitao de que os comportamentos de quem lidera podem estar

  • A Liderana

    164

    centrados tanto na execuo das tarefas como nas relaes entre os membros do grupo

    parece ser um pressuposto vlido para explicar o facto de alguns lderes serem mais

    eficazes do que outros que tendem a centrar-se apenas numa rea. Em segundo lugar, h

    a registar a centralizao da liderana na figura do lder, partindo-se da premissa que

    este fator seria determinante para influenciar a satisfao dos atores organizacionais e

    controlar a performance dos colaboradores.

    Os estudos levados a cabo sobre esta proposta revelam uma moderada

    aceitabilidade do modelo na medida em que so identificadas algumas fragilidades no

    s quanto elaborao de instrumentos de avaliao8 para medir o grau motivacional do

    lder mas tambm no que respeita avaliao da situao9 (Ferreira, 2001).

    Importa, ainda, referir que se as teorias sobre as quais nos temos vindo a debruar

    pretenderam ultrapassar a construo de um modelo universal pronto-a-vestir

    aplicvel a todas as situaes, acabaram por postular um one best way para uma

    determinada situao.

    3. A nova liderana

    O princpio da dcada de 80 pautou-se por um certo pessimismo no que diz

    respeito ao estudo da liderana na medida em que surgiram inmeras teorias

    explicativas da eficcia organizacional, contudo, os dados no foram considerados

    consensuais nem no seio de cada teoria ou modelo nem nas mltiplas abordagens que

    foram surgindo. Como consequncia desta situao, foram aparecendo novas propostas

    que tentaram assimilar pressupostos oriundos de vrios quadrantes conceptuais

    nomeadamente no que respeita aos traos da personalidade. Os trabalhos produzidos

    centram-se, sobretudo, na anlise dos traos dominantes partilhados pelos lderes

    eficazes, contribuindo para a compreenso do impacto das caractersticas pessoais e

    comportamentos dos lderes eficazes e qual o seu papel na implementao de aes que

    conduzem ao sucesso da organizao. O lder encarado como algum que ilustra a

    8 Fiedler utilizou a escala LPC (Least Prefered Coworker) para medir o grau de orientao motivacional

    do lder (orientao para as tarefas ou para o relacionamento). 9 As variveis situacionais so complexas, difceis de avaliar e nem sempre fcil balizar a qualidade das

    relaes lder-seguidores, nem o nvel de estruturao da tarefa ou o poder de posio que o lder detm.

  • A Liderana

    165

    realidade organizacional atravs da articulao entre uma viso e os valores que lhe

    servem e base.

    Por esta altura os psiclogos organizacionais viram na cultura organizacional e na

    mudana cultural peas estruturantes do sucesso organizacional. Os trabalhos de Schein

    (1988, 1990) demonstraram a relao dual entre a cultura e liderana. De acordo com o

    autor, os lderes fazem a cultura e so altamente influenciados pela mesma. Na verdade,

    os lderes enquanto criadores da cultura carecem de capacidades e competncias muito

    especficas como a persistncia, a pacincia ou a confiana emocional. Os lderes,

    detentores de uma viso, devero no ter a capacidade de a transmitir aos seus

    colaboradores mas tambm de a fazer cumprir.

    Esta alterao de paradigma funda-se na perspetiva cultural10 das organizaes que

    faz depender o sucesso das organizaes de uma cultura organizacional forte e de

    valores partilhados entre todos os colaboradores. A funo basilar da liderana reside,

    ento, ao nvel da manipulao da cultura (Schein, 1990).

    A corroborar esta linha de pensamento, Costa (1998) acrescenta que

    a questo da liderana passa, assim, a fazer parte integrante dos estudos sobre a cultura

    organizacional tendo vindo, concomitantemente, a dar-se uma deslocao significativa das

    concees tradicionais da liderana (ligada aos modelos racionais e burocrticos) para um

    novo entendimento do papel do lder mais ligado s questes culturais e simblicas e aos

    processos de influncia Costa (1998:133).

    Por sua vez, Reto e Lopes (s/d) ao identificarem liderana e influncia, atribuem

    ao lder, enquanto gestor da cultura e do simblico organizacional, trs dimenses

    essenciais

    que exigem dele a a criao de uma viso que permita dotar a empresa de uma identidade;

    a ancoragem desta viso no sistema de normas e valores maioritariamente partilhadas na

    organizao; a personificao da identidade do grupo e da prpria viso (Reto e Lopes,

    s/d: 77).

    Os lderes culturais, atores cimeiros das organizaes, tambm designados

    metaforicamente por profetas, poetas, negociadores e encenadores (Deal, 1992:41),

    10 A questo da cultura organizacional, enquanto referencial terico, adveio de um conjunto de trabalhos,

    na rea da gesto empresarial, que procuram explicar o sucesso de empresas japonesas. Sobre esta

    questo ver Captulo sobre Cultura Organizacional.

  • A Liderana

    166

    imbudos de uma viso que procura dotar a organizao de uma identidade, devero

    centrar a sua ao na criao e gesto da cultura da organizao, recorrendo

    manipulao de valores, rituais, cerimnias, histrias, heris, mitos e outros artefactos

    simblicos com o intuito de fomentar nos seguidores um sentido de pertena, uma

    identidade e uma mobilizao coletivas.

    A viso organizacional de que temos vindo a falar consiste, basicamente, numa

    imagem ideal do futuro da organizao pensada estrategicamente e respetivos caminhos

    de acesso. Obviamente, exige o envolvimento de todos os atores da organizao,

    aliados estratgicos do lder.

    Foi j um pouco nesta perspetiva que surgiu o movimento vulgarmente conhecido

    como Nova Liderana no qual se destaca a liderana carismtica de House (1977), a

    liderana transformacional de Bass (1985) e Burns (1978), a teoria atribucuional da

    liderana carismtica de Conger e Kanungo (1987) e as teorias da liderana visionria

    (Bennis e Nanus (1985). Transversal a estas propostas encontramos o interesse pelo

    estudo de lderes histricos e gestores de vrias organizaes que conseguiram obter

    resultados excelentes mesmo em contextos de crise e de grande concorrncia quer

    interna quer externa. Na verdade, os lderes carismticos suscitam fortes sentimentos

    perante os seguidores sejam eles de atrao ou de rejeio e levam-nos a implementar

    grandes esforos com o fito de corresponderem aos seus desafios e solicitaes.

    3.1. A liderana carismtica, transformacional e transacional

    O processo de influncia atravs do qual o lder engendra mudanas profundas nas

    atitudes e comportamentos dos colaboradores, levando-os a um comprometimento

    veemente com os objetivos e misso da organizao aplicvel quer liderana

    carismtica quer liderana transformacional. Apesar da sobreposio existente entre os

    dois conceitos, vulgar atribuir liderana transformacional uma maior profundidade.

    Estas novas teorizaes, que a dcada de 80 deu a conhecer, partilham o facto de

    ancorarem o lder enquanto figura detentora de um conjunto excecional de

    caractersticas. O carisma, vocbulo de origem grega que significa dom divino e de

    aplicao recente na rea da literatura organizacional, est na base destas competncias

  • A Liderana

    167

    manifestadas pelo lder. Consiste numa espcie de ingrediente mgico da boa liderana

    (Rego e Cunha, 2003). O carisma acaba por ser o resultado do processo de interao

    entre o lder e os seus seguidores. Parece, contudo, evidente que certos traos do lder,

    como a autoestima, as profundas convices, a eloquncia, a estabilidade ou o instinto

    tendem a aumentar-lhe o carisma. O prprio contexto organizacional pode potenciar

    todos estes efeitos e catapultar o lder como fator altamente agregador das necessidades

    dos colaboradores. Na verdade,

    o processo pelo qual os lderes carismticos geram entusiasmo e empatia nos seguidores

    no claro, mas uma componente importante a articulao de uma viso apelativa que

    toca, consciente ou inconscientemente, nas necessidades, valores e sentimentos dos

    seguidores. Os apelos emocionais so realados com o uso de smbolos, metforas e

    representao de eventos dramticos, e podem ser complementados com a persuaso

    racional, visando convencer os seguidores de que a sua estratgia para alcanar as metas

    partilhadas vivel e eficaz (Yulk, 1994:341).

    Klein e House (1995) definem metaforicamente o carisma como o encontro entre

    a fasca e a matria inflamvel e o oxignio. A combusto efetiva-se apenas no

    momento da conjugao dos trs elementos (cf. Figura 10). A fasca representa o lder

    com atributos e comportamentos carismticos; a matria inflamvel ilustra os

    seguidores disponveis e permeveis ao carisma do lder e o oxignio alude ao ambiente

    carismtico, frequentemente, caracterizado pela perceo de crise e pelo desencanto

    com a situao vigente. Com efeito, as exploses de liderana so propcias nos

    momentos em que os seguidores preveem momentos de crise e outorgam ao lder a

    capacidade de as ultrapassar.

    Figura 10 Carisma (adaptado de Kleine e House, 1995)

  • A Liderana

    168

    Aps uma reviso sobre a literatura de cariz organizacional, House (1977)

    equacionou uma teoria na qual tenta identificar o modo como os lderes carismticos

    agem e diferem dos outros indivduos bem como o contexto em que podem mais

    facilmente ter xito. Com efeito, esta teoria multidimensional abarca no s os traos,

    os comportamentos, as influncias mas tambm as variveis situacionais (cf. Quadro

    22) e por isso considerada mais abrangente e integrativa pela crtica.

    Quadro 22 Fatores que suscitam efeitos carismticos (Adaptado de House, 1977)

    Tipos de Fatores Fatores

    Traos da

    personalidade do lder

    Tem necessidade de poder

    Procura ser dominante

    Revela autoconfiana elevada

    Est convicto da moralidade das suas crenas

    Comportamento do

    lder

    Cria a impresso de competncia junto dos seguidores

    Atribui relevncia significativa ao trabalho dos seguidores inspirando o seu empenho e dedicao

    Modela papis

    Manifesta confiana nos colaboradores

    Transmite elevadas expetativas de desempenho aos colaboradores

    Desperta os seguidores para a misso do grupo de modo a suscitar empenho e esforo nas tarefas

    Condies

    facilitadoras Define os papis dos colaboradores em termos ideolgicos de forma

    apelativa

    Os efeitos carismticos do lder levam os seguidores a confiar na correo das

    suas crenas, manifestando crenas semelhantes s dele, aceitando-o sem reservas e

    nutrindo por ele valores de estima e grande obedincia. Estes efeitos so, ainda,

    acrescidos de partilha de objetivos ambiciosos, de elevada identificao com o lder, de

    envolvimento emocional na misso organizacional que o lder materializa.

    Contudo, o modelo no esteve isento de crticas dado que a liderana carismtica

    resulta, sobretudo, da relao erigida entre o lder e os seus seguidores, no sendo

    considerada do ponto de vista organizacional.

    Ainda assim, a teoria desenvolvida por Conger e Kanungo (1987) e mais tarde,

    por Conger (1989) mantm a tnica de que o carisma no um atributo individual mas

    uma interao entre o lder, os seguidores e o contexto propcio ao carisma e representa

  • A Liderana

    169

    um enorme desenvolvimento na compreenso da liderana carismtica ao defini-la

    como um fenmeno atribucional: os seguidores observam certos comportamentos no

    lder e atribuem-lhe determinadas qualidades carismticas. Os traos, os

    comportamentos do lder, o processo de influncia e as condies facilitadoras

    constituem, agora, os elementos fundamentais do modelo e foi a partir deles que os

    autores desenvolveram o modelo comportamental da liderana carismtica.

    O carisma suscetvel de existir com maior probabilidade em lderes que

    defendem uma viso divergente do statu quo; utilizam meios no convencionais para

    atingi-los, advogam o autossacrifcio, no hesitam em assumir riscos pessoais ainda que

    os custos sejam elevados, demonstram confiana nos seus argumentos e propostas,

    induzem os seguidores a considerar a situao atual como negativa e inaceitvel

    considerando a situao futura como atrativa e atingvel, denotam assertividade e

    autoconfiana, revelam preocupao com as necessidades dos colaboradores, elegem

    um registo elitista, empreendedor e exemplar e evidenciam, ainda, um gosto profundo

    pelas reformas ou mudanas radicais. Contudo, qualquer um destes comportamentos do

    lder est, parcialmente, dependente da situao.

    Na verdade, a identificao pessoal (os colaboradores veneram o lder, almejam

    imit-lo e agradar-lhe) e a internalizao (os colaboradores interiorizam as atitudes e

    valores veiculados pelo lder que fomenta neles a motivao para alcanar a misso

    organizacional) explicam o processo de influncia, repercutido no excecional empenho

    dos seguidores na viso/misso organizacional. Nesta perspetiva, o carisma tende a

    ocorrer, sobretudo, em contextos marcados pelo desencantamento dos colaboradores ao

    pressentirem uma crise quer ela seja real ou fictcia.

    Com efeito, variveis como os comportamentos de liderana, as caractersticas

    especficas dos colaboradores e os atributos da prpria situao determinam a

    atribuio de carisma aos lderes. Rego e Cunha (2003) consideram que a atribuio do

    carisma ocorre, sobretudo, quando os colaboradores com caractersticas especficas

    reconhecem traos e comportamentos especficos nos lderes em condies especficas.

    Neste modelo, o carisma concebido como uma dimenso observvel tal como as

    vertentes da considerao individual, da valorizao da tarefa e dos comportamentos

    autocrticos e democrticos.

    Para alm deste primeiro pressuposto, o carisma existe a partir das tarefas

    executadas pelos seguidores que se relacionam direta ou indiretamente com o lder.

    Assim, os processos de influncia tornam-se essenciais no reconhecimento dos lderes

  • A Liderana

    170

    carismticos pelos seguidores. Nesta tica, Conger e Kanungo (1987) definem a

    liderana como um processo que implica a mudana dos atores organizacionais de um

    determinado estado para outro nvel de desenvolvimento tendo como fundamento a

    viso do prprio lder (imagem mental projetada pelo lder para evocar o futuro da

    organizao e dos seus agentes).

    O processo de implementao da liderana carismtica consubstanciado em trs

    fases distintas e referem-se aos comportamentos do lder, ao processo de influncia

    protagonizado pelo lder e s condies facilitadoras. O Quadro 23 procura ilustrar a

    integrao da proposta de Conger e Kanungo (1987) e Conger (1989).

    Quadro 23 Fatores explicativos da liderana carismtica (Adaptado de Conger e Kanungo

    (1987) e Conger (1989)

    Tipos de Fatores Fatores

    Comportamentos do

    lder

    Extremeza da viso

    Riscos pessoais elevados

    Uso de meios no-convencionais

    Avaliao apurada da situao

    Viso atrativa e alcanvel

    Assertividade e preocupao com as necessidades dos seguidores

    Uso do poder pessoal

    Comportamento exemplar, empreendedor e elitista

    Agente de mudanas radicais

    Processo de influncia

    Identificao pessoal dos seguidores com o lder

    O lder faz com que os seguidores internalizem atitudes e crenas que so relevantes para a prossecuo da misso

    Condies

    facilitadoras Desencantamento dos seguidores ou crise

    Apesar da validade da liderana carismtica e dos resultados positivos obtidos

    pelos lderes carismticos nas unidades organizacionais, Rego (1998) refere no s a

    existncia de lderes carismticos positivos (orientam-se fundamentalmente para as

    necessidades dos seguidores e da organizao) e negativos (preocupam-se

    essencialmente com as suas prprias necessidades e, por isso, so designados

    narcisistas) mas tambm para os lderes carismticos positivos suscetveis de

    produzirem resultados negativos.

    A liderana carismtica e a liderana transformacional so conceitos recorrentes

    da literatura organizacional na rea da liderana, constituindo para alguns autores

    conceitos de certo modo sobrepostos.

  • A Liderana

    171

    A criao da expresso liderana transformacional atribuda a Burns (1978) e

    pretende traduzir a liderana praticada pelos lderes que impulsionam grandes

    mudanas nas unidades organizacionais, deixando marcas profundas e duradouras. Este

    modelo teve por base a compreenso dos processos subjacentes ao relacionamento entre

    o lder e os seguidores que se demarcasse das explicaes aliceradas na estruturao

    das tarefas ou na considerao individual.

    Os lderes transformacionais induzem, acima de tudo, os seguidores a

    ultrapassarem os seus prprios interesses estimulando profundamente o seu

    empenhamento e compromisso em prol dos desgnios da organizao. Estes lderes,

    instigadores da mudana e dotados de elevados nveis de moralidade e de motivao,

    desenvolvem a conscincia dos seguidores invocando a ideais como a justia, a

    igualdade, o humanitarismo, a liberdade ou a paz e repelindo veementemente

    sentimentos bsicos como o medo, a ganncia, o dio e a inveja.

    A liderana autenticamente transformacional, impregnada de preocupaes de

    natureza tica, considerada enquanto padro de liderana motivando desempenhos

    elevados dos atores organizacionais e grandes transformaes nas organizaes (Cunha

    e Rego, 2005) A sua caracterizao est sucintamente explanada no Quadro 24.

    Quadro 24 Como atua o lder autenticamente transformacional (Cunha e Rego, 200:35)

    Actuao do lder autenticamente transformacional

    Orienta a sua necessidade de poder para

    benefcio da organizao e dos seus seguidores.

    Est interior e exteriormente preocupado com o

    bem do grupo, da organizao ou da sociedade

    como um todo.

    Fomenta os valores da lealdade, da justia, da

    honestidade, dos direitos humanos, da verdade, da

    franqueza, da harmonia e do trabalho srio.

    Est disposto a fazer auto-sacrifcios. honesto, autntico, confivel.

    O seu objectivo no ser idolatrado mas

    obter a adeso dos seguidores a ideais.

    Promove polticas, procedimentos e processos

    ticos.

    Focaliza-se no desenvolvimento dos

    colaboradores. Proporciona apoio, mentoria e

    oportunidades de crescimento aos colaboradores.

    Ajuda os seguidores a questionarem as assunes

    e a gerar solues mais criativas.

    Tolera e fomenta a expresso de pontos de

    vista diferentes dos seus prprios.

    Procura desenvolver competncias de liderana

    nos seguidores. Ajuda-os a serem mais

    competentes e bem-sucedidos.

    Trata cada seguidor como indivduo. Para ele, as pessoas so um fim em si mesmo e

    no instrumentos.

  • A Liderana

    172

    Burns (1978) considera que a liderana transformacional difere da liderana

    transacional na medida em que esta ltima estimula os colaboradores em benefcio

    prprio, o poder do lder alicerado na autoridade proporcionada pela posio

    hierrquica, respeito pela regras e pela tradio. Ao invs a liderana transformacional

    maneja valores como a responsabilidade, a honestidade e outros valores similares

    veiculados pelo lder atravs de apelos inspiracionais.

    Ao desenvolver mais tarde o modelo da liderana transformacional, Bass (1985)

    elenca quatro componentes distintos neste tipo de liderana interligados entre si (cf.

    Quadro 25).

    Quadro 25 Componentes da liderana transformacional (adaptado de Bass, 1985)

    COMPONENTES

    Carismtica As caractersticas carismticas do lder transformacional so de

    natureza socioafetiva e inspiram sentimentos de lealdade e

    devoo nos seguidores.

    Inspiracional O lder entusiasma os seguidores a cumprir os objetivos da