cap6 evapotranspiracao

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Evapotranspiração 6- 1 6 EVAPOTRANSPIRAÇÃO 6.1 Evaporação, Transpiração e Evapotranspiração 6.1.1 Conceitos Evaporação é o conjunto de fenômenos de natureza física que transformam em vapor a água da superfície do solo, a dos cursos de água, lagos, reservatórios de acumulação e mares. Transpiração é a evaporação devida à ação fisiológica dos vegetais. As plantas, através de suas raízes, retiram do solo a água para suas atividades vitais. Parte dessa água é cedida à atmosfera, sob a forma de vapor, na superfície das folhas. Ao conjunto das duas ações dá-se o nome de evapotranspiração . Evapotranspiração potencial é a máxima evapotranspiração que ocorreria se o solo dispusesse de suprimento de água, suficiente. Evapotranspiração real ou efetiva é a perda d´água por evaporação ou transpiração, nas condições reinantes (atmosféricas e de umidade do solo). Nos períodos de deficiência de chuva em que os solos tornam-se mais secos, a evapotranspiração real é sempre menor do que a potencial. 6.1.2 Grandezas Características Perda por evaporação (ou por transpiração) é a quantidade de água evaporada por unidade de área horizontal durante um certo intervalo de tempo. Intensidade de evaporação (ou de transpiração) é a velocidade com que se processam as perdas por evaporação. Pode ser expressa em mm/hora ou em mm/dia. 6.1.3 Fatores Intervenientes a) Grau de umidade relativa do ar O grau de umidade relativa do ar atmosférico é a relação entre a quantidade de vapor de água aí presente e a quantidade de vapor de água no mesmo volume de ar se estivesse saturado de umidade. Essa grandeza é expressa em porcentagem. Quanto maior for a quantidade de vapor de água no ar atmosférico, tanto maior o grau de umidade e menor a intensidade de evaporação. b) Temperatura A elevação da temperatura tem influência direta na evaporação porque eleva o valor da pressão de saturação do vapor de água, permitindo que maiores quantidades de vapor de água possam estar presentes no mesmo volume de ar, para o estado de saturação. c) Vento O vento atua no fenômeno da evaporação renovando o ar em contato com as massas de água ou com a vegetação, afastando do local as massas de ar que já tenham grau de umidade elevado.

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Page 1: Cap6 Evapotranspiracao

Evapotranspiração

6-1

6 EVAPOTRANSPIRAÇÃO

6.1 Evaporação, Transpiração e Evapotranspiração

6.1.1 Conceitos

Evaporação é o conjunto de fenômenos de natureza física que transformam em vapor a água da superfície do solo, a dos cursos de água, lagos, reservatórios de acumulação e mares.

Transpiração é a evaporação devida à ação fisiológica dos vegetais. As plantas, através de suas raízes, retiram do solo a água para suas atividades vitais. Parte dessa água é cedida à atmosfera, sob a forma de vapor, na superfície das folhas.

Ao conjunto das duas ações dá-se o nome de evapotranspiração.

Evapotranspiração potencial é a máxima evapotranspiração que ocorreria se o solo dispusesse de suprimento de água, suficiente.

Evapotranspiração real ou efetiva é a perda d´água por evaporação ou transpiração, nas condições reinantes (atmosféricas e de umidade do solo). Nos períodos de deficiência de chuva em que os solos tornam-se mais secos, a evapotranspiração real é sempre menor do que a potencial.

6.1.2 Grandezas Características

Perda por evaporação (ou por transpiração) é a quantidade de água evaporada por unidade de área horizontal durante um certo intervalo de tempo.

Intensidade de evaporação (ou de transpiração) é a velocidade com que se processam as perdas por evaporação. Pode ser expressa em mm/hora ou em mm/dia.

6.1.3 Fatores Intervenientes

a) Grau de umidade relativa do ar

O grau de umidade relativa do ar atmosférico é a relação entre a quantidade de vapor de água aí presente e a quantidade de vapor de água no mesmo volume de ar se estivesse saturado de umidade. Essa grandeza é expressa em porcentagem. Quanto maior for a quantidade de vapor de água no ar atmosférico, tanto maior o grau de umidade e menor a intensidade de evaporação.

b) Temperatura

A elevação da temperatura tem influência direta na evaporação porque eleva o valor da pressão de saturação do vapor de água, permitindo que maiores quantidades de vapor de água possam estar presentes no mesmo volume de ar, para o estado de saturação.

c) Vento

O vento atua no fenômeno da evaporação renovando o ar em contato com as massas de água ou com a vegetação, afastando do local as massas de ar que já tenham grau de umidade elevado.

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d) Radiação Solar

O calor radiante fornecido pelo Sol constitui a energia motora para o próprio ciclo hidrológico.

e) Pressão barométrica

A influência da pressão barométrica é pequena, só sendo apreciada para grandes variações de altitude. Quanto maior a altitude, menor a pressão barométrica e maior a intensidade de evaporação.

f) Outros fatores

Além desses fatores, pode-se citar as influências inerentes à superfície evaporante, a saber: tamanho da superfície evaporante, estado da área vizinha, salinidade da água, umidade do solo, composição e textura do solo, etc.

6.2 Determinação da evaporação e evapotranspiração

A tabela a seguir resume os principais meios utilizados nas determinações da evaporação e da evapotranspiração real e potencial.

Tabela 6.1 - Meios utilizados nas determinações da evaporação e da evapotranspiração.

OBTENÇÃO

PARÂMETRO DIRETA INDIRETA EVAPORAÇÃO POTENCIAL

a) Evaporímetros - tanque Classe A - tanque Colorado - tanque russo - tanque CGI

b) Atmômetros - Piche - Livingstone - Bellani

Método de Penman

Thornthwaite e Holzman

Balanço Hídrico

Balanço de energia

Fórmulas empíricas

EVAPORAÇÃO REAL Lisímetros (sem vegetação)

EVAPOTRANSPIRAÇÃO POTENCIAL

- Equação de Thornthwaite - Método de Blaney- Criddle - Hargreaves - Penman modificado - Papadakis - Hamon

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EVAPOTRANSPIRAÇÃO REAL

a) Lisímetros - de percolação - de pesagem b) Parcelas experimentais c) Controle de umidade do

solo d) Balanço hídrico da

bacia

6.2.1 Medida e estimativa da evaporação potencial

a) Evaporímetros

São tanques que expõem à atmosfera uma superfície líquida de água permitindo a determinação direta da evaporação potencial diariamente. O mais utilizado é o tipo classe A do U.S. Weather Bureau que é um tanque circular galvanizado ou metal equivalente (Figura 6.1).

Figura 6.1 – Tanque “Classe A” – US Weather Bureau.

Procedimento da medida:

Efetuar a leitura, do dia ou horário, do nível d´água no tanque (ed)

Comparar com a leitura anterior, do dia ou horário (ea)

Calcular a diferença e1 = ed – ea

Estamos perante duas possibilidades, ter ou não ter ocorrido chuva no intervalo entre as duas leituras.

1º.) não houve chuva

então Eo = e1

2º.) houve chuva, com altura pluviométrica h1

então Eo = e1 + h1

Atenção: no caso de ter havido chuva intensa, o valor de e1 pode ser negativo.

Obs.: Quando ocorrer transbordamento no tanque a leitura será perdida.

Com o valor da evaporação potencial (E) pode-se estimar a evapotranspiração potencial (ETP) pela correlação:

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ETP = kp.E (6.1)

onde:

E = evaporação medida no tanque evaporimétrico em mm/dia;

ETP = evapotranspiração potencial em mm/dia, representa a média diária para o período considerado;

kp = coeficiente de correlação, que depende do tipo de tanque e de outros parâmetros meteorológicos.

Como o tanque evaporimétrico Classe A é largamente utilizado no Brasil, na Tabela 6.2 abaixo estão indicados valores do coeficiente kp, para o tanque classe A no Estado de São Paulo.

Tabela 6.2 – Coeficiente kp para o tanque Classe A no Estado de São Paulo.

c) Atmômetros

• Evaporímetro Piché

É constituído por um tubo cilíndrico de vidro, de 25 cm de comprimento e 1,5 cm de diâmetro. O tubo é graduado e fechado em sua parte superior; a abertura inferior é obturada por uma folha circular de papel-filtro padronizado, de 30 mm de diâmetro e de 0,5 mm de espessura, fixado por capilaridade e mantido por uma mola. O aparelho é previamente enchido de água destilada, a qual se evapora progressivamente pela folha de papel-filtro; a diminuição do nível d´água no tubo permite calcular a taxa de evaporação.

O processo de evaporação está ligado essencialmente ao déficit higrométrico do ar e o aparelho não leva em conta a influência da insolação, já que costuma ser instalado debaixo de um abrigo para proteger o papel-filtro à ação da chuva. A relação entre as evaporações anuais medidas em um mesmo ponto em um tanque Classe A e um do tipo Piché é bastante variável. Os valores médios dessa relação estão compreendidas entre 0,45 e 0,65.

Figura 6.2 –Evaporímetro Piché.

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• Atmômetro Livingstone

É essencialmente constituído por uma esfera oca de porcelana porosa de cerca de 5 cm de diâmetro e 1 cm de espessura; ela é cheia de água destilada e se comunica com uma garrafa contendo água destilada que assegura o permanente enchimento da esfera e permite a medida do volume evaporado.

6.2.2 Determinação da Evapotranspiração Potencial

Além da possibilidade de obtenção da evapotranspiração potencial a partir da correlação com a evaporação potencial, são usuais também os métodos de Thorntwaite, Blaney-Criddle e outros.

a) Método de Thorntwaite

O método de Thorntwaite é muito utilizado em todas as regiões, já que baseia-se somente na temperatura, que é um dado normalmente coletado em estações meteorológicas. Entretanto, por basear-se apenas nesse parâmetro, pode levar a resultados errôneos, pois a temperatura não é um bom indicador da energia disponível para a evapotranspiração. Outras limitações do método são: não considera a influência do vento, nem da advecção do ar frio ou quente, não permite estimar a ETP para períodos diários. Seu uso é mais adequado para regiões úmidas.

Neste método, a ETP pode ser estimada pela equação abaixo: a

I

tfETP

⋅⋅⋅= 10

6,1 (6.3)

onde:

ETP = evapotranspiração mensal ajustado, em cm;

f = fator de ajuste em função da latitude e mês do ano;

t = temperatura média mensal, em °C;

I = índice de calor anual dado por:

∑=12

1

iI onde

514,1

5

= t

i (6.4)

O valor de a é dado pela função cúbica do índice de calor anual:

a = 6,75.10-7.I3 – 7,71.10 -5.I2 + 1,792.10 -2.I + 0,49239 (6.5)

Os valores obtidos pela fórmula de Thornthwaite são válidos para meses de 30 dias com 12 horas de luz por dia. Como o número de horas de luz por dia muda com a latitude e também porque há meses com 28 e 31 dias, torna-se necessário proceder correções. O fator de correção (f) é obtido da seguinte forma:

3012

nhf ⋅= (6.6)

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Evapotranspiração

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onde:

h = número de horas de luz na latitude considerada;

n = número de dias do mês em estudo.

b) Método de Blaney-Criddle

Este método foi desenvolvido em 1950, na região oeste dos EUA, sendo por isso mais indicado para zonas áridas e semi-áridas, e consiste na aplicação da seguinte fórmula para avaliar a evapotranspiração potencial:

ETP = p.(0,457.t + 8,13) (6.7)

onde:

ETP = evapotranspiração potencial, em mm/mês;

p = porcentagem mensal de horas-luz do dia durante o ano (“p”) é o valor médio mensal);

t = temperatura média mensal do ar, em °C.

Tabela 6.4 – Valores de p .

5.2.3 Determinação da Evapotranspiração Real

a) Lisímetro

Lisímetro de percolação consiste em um tanque enterrado com as dimensões mínimas de 1,5m de diâmetro por 1,0m de altura, no solo, com a sua borda superior 5cm acima da superfície do solo. Do fundo do tanque sai um cano que conduzirá a água drenada até um recipiente. O tanque tem que ser cheio com o solo do local onde será instalado o lisímetro, mantendo a mesma ordem dos horizontes. No fundo do tanque, coloca-se uma camada de mais ou menos 10cm de brita coberta com uma camada de areia grossa. Esta camada de brita tem a finalidade de facilitar a drenagem d´água que percolou através do tanque. Após instalado, planta-se grama no tanque e na sua área externa. Na figura 2.4 é mostrado um lisímetro deste tipo.

O tanque pode ser um tambor, pintado interna e externamente para evitar corrosão, tanque de amianto ou tanque de metal pré-fabricado.

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Figura 6.4 – Esquema de um lisímetro.

A evapotranspiração real em um período qualquer é dada pela equação:

S

DPIE

−+= (6.8)

E = Evapotranspiração real, em mm/período;

I = Irrigação do tanque, em litros;

P = preciptação pluviométrica no tanque, em litros;

D = Água drenada do tanque, em litros;

S = Área do tanque, em m2.

b) Processos Indiretos

Em condições normais de cultivo de plantas anuais, logo após o plantio, a evapotranspiração real (ETR) é bem menor do que a evapotranspiração potencial (ETP). Esta diferença vai diminuindo, à medida que a cultura se desenvolve, em razão do aumento foliar, tendendo para uma diferença mínima antes da maturação; depois a diferença vai aumentando, conforme pode ser visto na figura 2.5. A avaliação da ETR a partir da ETP é de grande utilidade para o planejamento da agricultura irrigada. Tal avaliação pode ser feita, por meio de coeficientes culturais (Kc) dados na Tabela 6.4 para algumas culturas, da seguinte forma:

ETR = Kc.ETP (6.9)

Figura 6.4 – Relação entre ETR e ETP para cultura de ciclo curto.

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Evapotranspiração

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Tabela 6.5 – Coeficientes de cultura “Kc”.

EXERCÍCIOS PROPOSTOS E6.1 A evaporação real mensal de uma região é da ordem de 100 mm. Supondo

consumo per capta de 200 l/hab/dia, com a água perdida por evaporação em um reservatório de 6 km2 de área, poderia abastecer, durante um mês, uma cidade de:

a) a)10.000 habitantes; b) 100.000 habitantes; c) 30.000 habitantes; d) 300.000 habitantes.

E6.2 Um evaporímetro tipo Classe A está instalado próximo a uma represa, cujo espelho d´água tem uma área de 5 km2. A leitura do evaporímetro em um determinado dia foi de 18 mm e no dia anterior, 20 mm. No mesmo dia, o pluviômetro instalado ao lado registrou uma chuva de 5 mm. Nestas condições, pede-se:

a) O volume de água evaporado na represa, nesse dia; b) O número de pessoas que poderia ser abastecido com

este volume. e