cap. xviii e xix- historias dos trabalhadores e epopeia da pedra

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Cap. XVIII e XIX- Historias Dos Trabalhadores e Epopeia Da Pedra

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Memorial do convento

Memorial do Convento Jos Saramago

As histrias dos trabalhadores do convento e a epopeia da pedraCaptulos XVIII e XIXb1Introduo Os captulos XVIII e XIX do Memorial do Convento retratam os sacrifcios e as histrias de alguns elementos de um povo sujeito aos mais dolorosos esforos e sacrifcios para levantar um convento em Mafra, s para satisfazer os caprichos de um rei megalmano que, a pretexto de uma promessa, quis mostrar a Portugal e ao mundo o seu poder e a sua grandeza.

esse povo trabalhador, obediente e sacrificado que o autor elege como verdadeiro heri do seu romance. Quis louvar esses homens, porque, segundo ele S para isso escrevemos, torn-los imortais (p. 250)

b2Era uma vez um rei que fez promessa de levantar um convento de Mafra.

Era uma vez a gente que construiu esse convento. ()

O autor conjuga aqui magistralmente duas das linhas narrativas do romance:b3captulo XVIII sntese esquemticaTranscrio do poema O Infante D. Henrique, da Mensagem de F. Pessoa (intertextualidade explcita);Fonte dos avultados rendimentos de D. Joo V: Macau, Goa, Diu, Melinde, Moambique, Angola, So Tom, Cabo Verde, Aores, Madeira, Brasil;"Medita D. Joo V no que far a to grandes somas de dinheiro, a to extrema riqueza, medita hoje ontem meditou (...) ", p. 234O narradorintradiegtico o personagem que, dentro do texto, assume o papel de narrador.g4captulo XVIII sntese esquemticaCrtica ao hbito de importar quase tudo o que se usou nas obras e decorao do convento de Mafra; Sendo domingo, os homens contam uns aos outros as suas histrias pessoais. Baltasar um desses narradores intradiegticos das 7 micronarrativas que ilustram as vidas sacrificadas dos trabalhadores do convento." De Portugal no se requeira mais que pedra, tijolos e lenha para queimar, e homens para a fora bruta (...) Se o arquiteto alemo, se italianos so os mestres dos carpinteiros (...) se negociantes ingleses, franceses, holandeses e outras reses todos os dias nos vendem e nos compram, est muito certo que venham de Roma, de Veneza, de Milo e de Gnova, e de Lige, e da Frana e da Holanda, os sinos e os carrilhes, e os candeeiros, as lmpadas, os castiais, os tocheiros de bronze e os clices, as custdias (...) tudo quanto Europa (...)" (pp. 234-35)O narradorintradiegtico o personagem que, dentro do texto, assume o papel de narrador.g5H neste captulo um belo exemplo de globalizao, j que se recorre a produtos e produtores de todo o Mundo, para a grandiosidade da construo.

Para alm de todos estes factos suprfluos, foram chamados 20.000 homens para trabalharem na construo do convento.

Homens todos eles com condies de vida precrios, longe das famlias, pobres a nvel material, mas tambm de esprito

Trabalhavam de sol a sol e quase nem para comer ganhavam.

Alguns deles dialogam sobre a sua vida, o seu passado.

Contudo, no interessava nem como nem porqu. O importante era construir o convento segundo as exigncias do rei, no valia a pena nem sequer questionar.

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As micro-histrias de sete trabalhadores

Francisco Marques-Nasceu em Cheleiros, perto de Mafra;-Tem mulher e 3 filhos pequenos;-Toda a sua vida foi trabalhar de jornal;-Como a misria era muita, resolveu vir trabalhar no convento;-A sua mulher est outra vez prenha; -o dinheiro que ganha deixa-o mulher;-Ganhava duzentos ris de jornal Jos Pequeno -no tem pai, nem me, nem mulher-no sabe se o seu nome o que tem e se teve algum antes;-apareceu numa aldeia ao p de Torres Vedras;- foi o vigrio que o batizou;-O nome Jos o nome da pia, o Pequeno puseram-lhe mais tarde pois no cresceu muito;- corcunda;-veio para Mafra porque gosta de trabalhar com os boisG No tem trabalho fixo, trabalha ao dia: trabalhar de jornal? 200 reis de jornal?Jos o nome de batismo7Joaquim da Rocha-nasceu no termo de Pombal;-tem l mulher;- filhos teve 4, mas todos morreram antes de fazerem 10 anos 2 de bexigas negras e os outros 2 de espinhela cada e sangue chupado;- tinha um cerrado de renda, mas o ganho no dava para comer;- decidiu ir para Mafra, pois o trabalho era garantido e por muitos anos;- diz que no vai a casa h 6 meses e que se calhar no volta l mais.Manuel Milho-vem dos campos de Santarm;-atravs dos oficiais do corregedor, soube das obras em Mafra e decidiu ir para l;-2 homens vieram com ele, mas acabaram por no sobreviver (ficando num aluimento de terras)-sente a falta do rio da sua terra e descreve-o: () sempre a bater na areia, ao passo que o rio corre entre duas margens, como uma procisso penitente, () a gua o espelho que passa e est parado ().b8 Joo Anesveio do Porto e tanoeiro;- veio para Mafra para fazer e consertar as dornas, as pipas e os baldes;-Diz que at Deus foi tanoeiro, e d o exemplo: (vejam-me essa grande dorna que o mar);-deixou a famlia no Porto; j h dois anos que no v a mulher;- s vezes sonha que est deitado com ela, mas no sabe se ele ou no;- o nico oficial dos ofcios.

Julio Mau-Tempo- natural do Alentejo., tem mulher e filhos.-veio trabalhar para Mafra por causa das grandes fomes que padece a sua provncia.-diz-se surpreendido por ainda restar gente viva, -as pessoas que ainda l vivem e at mesmo ele acostumaram-se a comer ervas e bolotas. -poucas so as terras fabricadas e semeadas.- se vim para Mafra foi porque o vigrio da minha freguesia apregoava nas igrejas que quem viesse passava a ser criado de el-rei, no bem bem criado, mas como se fosse.G o nico oficial dos ofcios? emprego fixo;Dorna um recipiente feito demadeira, para armazenar as uvas dasvindimas.9Baltasar Mateus conhecido por Sete-Sis, mas no sabe a origem deste apelido;Diz ter estado perto do Sol, mas afirma que se disser coisas insensatas porque bebeu de mais ou devido ao Sol que apanhou.Tem quarenta anos; a me j morreu e o pai mal pode andar parece ter razes nos ps ou o corao procura da terra para descansar.Ainda jovem foi agricultor, ao servio de outros.Foi militar e ficou sem a mo esquerda, deixando de servir para a guerra.Esteve uns anos em Lisboa, a acarretar carne.14 anos10Captulo XIX sntese esquemticaOs trabalhos de transporte de pedra-me (Benedictione) de Pro Pinheiro para Mafra.Mudana de servio no trabalho de Baltasar: dos carros de mo junta de bois.Enumerao das condies para o transporte a pedra gigantesca (muitos homens, duzentas juntas de boi, espcie de nau da ndia, vinte carros, cordas, calabres, cunhas, alavancas, rodas, martelos, torqueses, chapas e ferro, gadanhas, (p. 249);

B lugar da beno11Captulo XIX sntese esquemticaO desvio de Francisco Marques, para se encontrar com a mulher (p. 251)Listagem dos trabalhadores e descrio pormenorizada da pedra (p. 253).Carregamento da pedra na Nau da ndia e ferimento de um homem (perda do p) (p. 255);Primeiro dia da viagem e incio da narrativa de Manuel Milho (histria da rainha e o ermito) (p. 260);

G Nau da ndia - carro especialmente concebido para o seu transporte12Captulo XIX sntese esquemticaSegundo dia do transporte da pedra e retoma da narrativa de Manuel Milho (p. 263);

Chegada a Cheleiros e morte de Francisco Marques (atropelado pelo carro que transporta a pedra) bem como de dois bois; (p. 269)

Velrio do corpo do trabalhador.

b13Captulo XIX sntese esquemticaManuel Milho retoma a narrativa.Missa e sermo de domingo.Final da histria narrada por Manuel Milho.Chegada da pedra ao local da Baslica, aps oito dias de percurso.

b14

Neste captulo, Baltasar conseguiu, com a ajuda de Joo Pequeno, passar de simples carreiro a boieiro, podendo assim, participar na viagem a Pro Pinheiro para transportar at Mafra uma grande pedra, que iria ser utilizada na Baslica do Convento. A viagem que duraria oito dias.O transporte da pedrag15Recursos estilsticos b16 () de Macau as sedas, () de Goa os diamantes brutos, () de Diu os tapetes, () de Melinde o marfim, de Moambique os negros, o ouro, () de So Tom a madeira, ()- Enumerao

Essa, foi uma vez que subi a uma serra muito alta, to alta que estendendo o brao tocava-se no sol - Hiprbole

() o hbito faz o monge ; () Deus castiga sem pau nem pedra -Provrbio

() Talvez esquerda de Deus esteja outro deus, talvez Deus esteja sentado direita doutro Deus, talvez Deus seja s um eleito doutro deus, talvez sejamos todos deuses sentados () - Repetio anafrica

b17Aspetos Simblicos b18ConventoSmbolo do definitivo, do imutvel, do eterno e, nesse sentido, ope-se passarola. evidente o contraste entre o carter libertador do projeto de Bartolomeu de Gusmo (Passarola Voadora), que evidencia a atitude criadora do homem e a capacidade de vencer barreiras quando trabalha em conjunto, e a natureza opressora da promessa do rei, que espelha uma vontade egosta e megalmana do rei, que quis edificar uma obra para imortalizar a sua memria.

b19A epopeia da Pedra meO O transporte desta grande pedra de mrmore de Pro Pinheiro a Mafra uma epopeia, uma vez que esta ao descrita com "grandeza" clssica e vista como um ato herico dos trabalhadores, que tm de transportar uma pedra gigantesca, num carro especialmente concebido para o seu transporte, que comparado a uma nau da ndia, com a ajuda de duzentas juntas de bois e os seiscentos homens que a puxam.

g20Nmero Sete So sete as histrias dos trabalhadores narradas no cap. XVIII.

O SolAssociado a Baltasar e ao povo, o SOL sugere a ideia de vida, de renovao de energias (o povo trabalha at exausto no convento, de sol a sol, como se v em Neste dia, desde o nascer do sol at ao fim da tarde () (p. 262).

g21A histria da rainha e o ermitoA histria de Manuel Milho: Manuel conta um bocadinho duma histria todos os dias noite e, no fim da viagem, termina-a. Uma rainha no sabia se gostava de ser rainha porque no sabia o que era ser mulher. Ento, falou com um ermito que a aconselhou a largar tudo e a ir procurar as respostas. O rei, humilhado por ter sido deixado, mandou homens a fio procurar a rainha e o ermito, mas nenhum foi encontrado e nunca se soube se ele chegou a ser homem e a rainha chegou a ser mulher. Porqu? Porque essas respostas s o prprio a pode alcanar.S se pode saber o que se sendo Talvez voando, (p. 273) diz Baltasar, ou seja, correndo atrs dos nossos sonhos.G eremita - m indivduo que, usualmente porpenitncia,religiosidade,misantropiaou simples amor natureza, vive em lugar deserto, isolado.22Intencionalidade Crtica b23O verdadeiro protagonista de Memorial do Convento o povo trabalhador.

Em primeiro lugar e de forma positiva, a valorizao e elevao categoria de heri imortal das figuras representativas do povo annimo.

A gente que construiu o convento o povo annimo que trabalha e sofre s ordens do rei, no s para cumprir a sua promessa mas tambm para satisfazer a sua vaidade.

um povo humilde e trabalhador, elogiado e enaltecido pelo autor, que tenta tir-lo do anonimato e o individualiza em vrias personagens e tambm simbolicamente, atribuindo-lhe um nome para cada letra do alfabeto, num simples desejo de o tornar imortal e de o incluir na Histria de Portugal: Alcino, Brs, Cristvo, Daniel, Egas, Firmino.

b24O trabalho do povo no conventoMafra simboliza o espao de servido desumana a que D. Joo V sujeitou todos os seus sbditos para alimentar a sua vaidade.

Vivendo em condies deplorveis (Ilha da Madeira), os trabalhadores foram obrigados a abandonar as suas casa e a erigir o convento para cumprir a promessa do seu rei e aumentar a sua glria

A palavra MAFRA, segundo o narrador, significa a martirizao desses homens que foram () mortos, assados, fundidos, roubados, arrastados () (p. 306) .

b25Viso depreciativa da populao portuguesa, feita pelo prprio el-rei:De Portugal no se requeria mais que pedra, tijolo e lenha para queimar, e homens para a fora bruta, cincia pouca (p. 234).

Preferncia aos artfices e aos produtos importados: Se o arquiteto alemo, se italianos so os mestres dos carpinteiros (...) se negociantes ingleses, franceses, holandeses e outras reses todos os dias nos vendem e nos compram, est muito certo que venham de Roma, de Veneza, de Milo e de Gnova, e de Lige, e da Frana e da Holanda, os sinos e os carrilhes, e os candeeiros () (p. 234)

Em termos gerais, nos captulos em estudo, a crtica que Jos Saramago faz estende-se :g26Referncia falta de higiene dos operrios do convento de Mafra:Entre a obra e a Ilha da Madeira fica um espao amplo, calcado pelo ir e vir dos operrios, sulcado pelas rodeiras dos carros que vm e vo, felizmente est agora tudo seco, ()

Demostrao da ignorncia do povo:() Mafra foi um dia sobrevoada pelo Esprito Santo ()

g27Atualmente ...Atualmente existem leis que defendem os trabalhadores, no permitindo injustias, desigualdades ou abusos por parte dos patres, existe mais segurana no trabalho assim como mais higiene o que faz com que o trabalho no seja to doloroso e provoque tantas mortes, como aconteceu na construo do convento onde muitos perderam a vida.

Hoje em dia tambm h mquinas especializadas para os trabalhos mais pesados, o que no aconteceu com o transporte da pedra, em O Memorial do Convento que provocou muitos feridos e at perdas humanas, com simboliza a morte de Francisco Marques.b28Trabalho elaborado por:Bruno Macedo , n. 3

Gil Teixeira, n. 7