calderón, jelin. classes sociais e movimentos sociaia na al, rbcs, 1987

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CLASSES SOCIAIS E MOVIMENTOS SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA perspectivas e realidades FERNANDO CALDERÓN E ELIZABETH JELIN Introdução O ponto de partida para a análise das classes sociais e dos movimentos sociais na América Latina exige uma fundamentação histórica. Para o resto do mundo, os acontecimentos e personagens que talvez mais tenham ficado como pontos de referência históricos da região, na primeira metade do século XX, tenham sido a Revolução Mexicana e, depois, Cárdenas, Vargas no Brasil, Haya de la Torre no Peru, Perón na Argentina, e a Revolução Boliviana de 1952. O restante é mais recente, faz parte de um presente que se estende no tempo: a Revolução Cubana, Allende no Chile, os autoritarismos dos anos setenta, a frágil democracia que se projeta para o futuro. Convém, então, começar esta análise a partir desse fenômeno complexo, peculiar à região, - ainda que com variações importantes entre os casos concretos - que foi o fenômeno do populismo, presente nos fatos e personagens históricos mencionados. Não se trata de caracterizá-lo em detalhe ou de entrar numa polêmica explicativa, coisa que em grande medida já foi feito por outros autores, mas de assinalar algumas presenças importantes e alguns vazios que clamam por ser preenchidos no estudo das classes subalternas e nos movimentos sociais, no tocante a esse fenômeno da história latino-americana. E, a partir dessa fundamentação histórica, avançar em direção ao presente. Antes, porém, algumas notas sobre as características básicas das sociedades latino-americanas e seus estados, que constituem o contexto histórico-estrutural (para usar uma expressão tão associada a uma maneira latino-americana de aproximar-se dos fenômenos sócio-políticos) dos processos que vamos estudar. A crise do modelo agroexportador de organização econômico-social, a partir dos anos 1930, deu lugar a profundos processos de transformação econômica e social nos principais países da região: a urbanização e as migrações internas, a industrialização, a criação do mercado interno, a modernização, o desenvolvimento de grupos e classes baseados em interesses urbanos e seu papel crescentemente importante nos rumos da atividade política. Estes processos de transformação da estrutura social não foram suaves nem graduais, mas constituíram resultados, e ao mesmo tempo germes, de enfrentamentos e conflitos sociais e políticos significativos. Em todos eles, contudo, manifesta-se uma característica especial: uma presença notória e precoce do Estado como ator social. Com efeito, na América Latina, é difícil falar de um Estado como apenas refletindo o conflito social; estamos mais propriamente em presença de um Estado que, através de sua gestão, tem um papel determinante na própria conformação dos interesses econômicos e dos atores sócio-políticos. Ademais de constituir-se num "produto", foi desde muito cedo um Estado "produtor" de sociedade. A contrapartida desta forte presença do Estado é a relativa lentidão no processo de formação das classes sociais, na sua manifestação como atores coletivos ou como forças sociais, na sua presença - com autonomia e identidade clara - no cenário da história. Esta caracterização estrutural não significa que estejamos em presença de Estados todo-poderosos e de sociedades inexistentes, silenciosas. Seria mais adequado pensar na América Latina como uma região onde os processos de luta, os conflitos associados aos processos de transformação, manifestaram-se muito mais como conflitos dentro do Estado do que como lutas estritamente sociais. O cenário da ação foi com mais freqüência o interior do Estado do que a sociedade. Nas análises e interpretações das ciências sociais, contudo, esses traços foram exagerados e levados a sua expressão mais pura. Como se na América Latina não houvesse existido sociedade, mas somente processos

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  • CLASSES SOCIAIS EMOVIMENTOS SOCIAISNA AMRICA LATINAperspectivas e realidades

    FERNANDO CALDERN E ELIZABETH JELIN Introduo O ponto de partida para a anlise das classes sociais e dos movimentos sociais na Amrica Latina exige umafundamentao histrica. Para o resto do mundo, os acontecimentos e personagens que talvez mais tenham ficadocomo pontos de referncia histricos da regio, na primeira metade do sculo XX, tenham sido a Revoluo Mexicanae, depois, Crdenas, Vargas no Brasil, Haya de la Torre no Peru, Pern na Argentina, e a Revoluo Boliviana de1952. O restante mais recente, faz parte de um presente que se estende no tempo: a Revoluo Cubana, Allende noChile, os autoritarismos dos anos setenta, a frgil democracia que se projeta para o futuro.

    Convm, ento, comear esta anlise a partir desse fenmeno complexo, peculiar regio, - ainda que comvariaes importantes entre os casos concretos - que foi o fenmeno do populismo, presente nos fatos e personagenshistricos mencionados. No se trata de caracteriz-lo em detalhe ou de entrar numa polmica explicativa, coisa queem grande medida j foi feito por outros autores, mas de assinalar algumas presenas importantes e alguns vazios queclamam por ser preenchidos no estudo das classes subalternas e nos movimentos sociais, no tocante a esse fenmenoda histria latino-americana. E, a partir dessa fundamentao histrica, avanar em direo ao presente.

    Antes, porm, algumas notas sobre as caractersticas bsicas das sociedades latino-americanas e seus estados,que constituem o contexto histrico-estrutural (para usar uma expresso to associada a uma maneira latino-americanade aproximar-se dos fenmenos scio-polticos) dos processos que vamos estudar.

    A crise do modelo agroexportador de organizao econmico-social, a partir dos anos 1930, deu lugar aprofundos processos de transformao econmica e social nos principais pases da regio: a urbanizao e asmigraes internas, a industrializao, a criao do mercado interno, a modernizao, o desenvolvimento de grupos eclasses baseados em interesses urbanos e seu papel crescentemente importante nos rumos da atividade poltica. Estesprocessos de transformao da estrutura social no foram suaves nem graduais, mas constituram resultados, e aomesmo tempo germes, de enfrentamentos e conflitos sociais e polticos significativos. Em todos eles, contudo,manifesta-se uma caracterstica especial: uma presena notria e precoce do Estado como ator social. Com efeito, naAmrica Latina, difcil falar de um Estado como apenas refletindo o conflito social; estamos mais propriamente empresena de um Estado que, atravs de sua gesto, tem um papel determinante na prpria conformao dos interesseseconmicos e dos atores scio-polticos. Ademais de constituir-se num "produto", foi desde muito cedo um Estado"produtor" de sociedade. A contrapartida desta forte presena do Estado a relativa lentido no processo de formaodas classes sociais, na sua manifestao como atores coletivos ou como foras sociais, na sua presena - comautonomia e identidade clara - no cenrio da histria.

    Esta caracterizao estrutural no significa que estejamos em presena de Estados todo-poderosos e desociedades inexistentes, silenciosas. Seria mais adequado pensar na Amrica Latina como uma regio onde osprocessos de luta, os conflitos associados aos processos de transformao, manifestaram-se muito mais como conflitosdentro do Estado do que como lutas estritamente sociais. O cenrio da ao foi com mais freqncia o interior doEstado do que a sociedade.

    Nas anlises e interpretaes das cincias sociais, contudo, esses traos foram exagerados e levados a suaexpresso mais pura. Como se na Amrica Latina no houvesse existido sociedade, mas somente processos

  • econmicos e aparelhos polticos, alm disso desconectados entre si. Como assinala Touraine, "a desvinculao entre oenfoque economicista e a interpretao dos atores poltico-ideolgicos no deixa espao para conceitos sociolgicosintermedirios, em particular para as categorias que descrevam relaes entre atores e formas de ao" (Touraine,1987, p. 3). precisamente nesse nvel intermedirio que procuramos situar este trabalho. 1. O POPULISMO A decomposio da dominao oligrquica ligada a um modelo agrominerador voltado exportao e a um padro derelaes sociais e polticas clientelsticas, deixava um espao para a emergncia e consolidao de novas foraseconmicas, sociais e polticas. A sada histrica no foi simples.

    Em alguns casos, no plano econmico, ocorreu um desenvolvimento mais voltado para dentro, baseado naindustrializao, que ia conformando novos setores sociais - burguesias industriais, classes trabalhadoras urbanas -,mas que requeria simultaneamente uma forte ao de promoo por parte do Estado: os interesses econmicos ligados indstria no estavam cristalizados em classes sociais com perfil prprio. A burguesia industrial, muitas vezes, nopodia distinguir-se dos interesses anteriormente hegemnicos, ligados economia agroexportadora. Sua debilidade nolhe permitia estabelecer sua presena na cena social e poltica, sem recorrer a alianas com outros setores e sem umapresena forte do Estado na promoo e proteo de seus interesses. Parecia um dilema sem sada possvel. Em certosentido, a burguesia industrial no conseguia constituir-se como classe no campo das relaes de produo; para logr-lo, devia ao mesmo tempo conseguir um espao poltico no Estado para, a partir dele, abrir o espao econmico paradesenvolver sua ao, geralmente relacionada com os interesses das novas classes mdias e das prprias classessubalternas.

    A forma especfica das alianas variou de caso para caso. Em vrias situaes, a burguesia industrial exerceuum papel determinante; em outras, compartilhou seu papel com setores mdios, camponeses e operrios. Osmovimentos histricos foram diversos, mas deram lugar a um fenmeno singular, um sistema latino-americano de aosocial: o populismo. Um modelo poltico em que as classes emergentes ligadas ao processo de industrializao (tantoburguesias nacionais modernizantes como setores populares, especialmente urbanos) encontraram -, ou melhor dito,formaram, embora com diferentes graus de poder e influncia no produto final - um Estado e um regime que pudessedar resposta poltica, econmica e social crise da dominao oligrquica (Weffort, 1973; Laclau, 1977).

    Alguns movimentos populistas foram muito mais disseminados e unvocos, como foi o caso do Velasquismo noEquador. Outros, de grande fora, no alcanaram o poder do Estado, como o APRA no Peru. No obstante, em todosos casos nacionais, tiveram um papel central na vida poltica e nos padres de relaes sociais, chegando a modificaras pautas de ao cotidiana de suas sociedades, tanto na vida familiar como no bairro, na cidade, na comunidade, noescritrio ou na fbrica, afetando todos os aspectos da vida, a msica, a literatura, o cinema, o esporte, a sexualidade, oamor, a reciprocidade e as desavenas, as zombarias e as brincadeiras de rua; criando e recriando, dessa forma,complexas relaes internas de solidariedade e de oposio frontal a tudo o que fosse externo comunidade populista.Positiva ou negativamente, o populismo motivou vivncias ineludveis para os latino-americanos. "Eindependentemente de pertencer ou no ao partido Aprista", afirma Marcos Martos, "a vinculao que ns, osperuanos, temos com ele, no uma vinculao racional, como no so racionais todas as nossas esperanas e todas asnossas frustraes" (in Valderrama et al., 1980). Esse mesmo texto mostra a influncia cotidiana do populismo na vidado Peru. Esta, entretanto, uma temtica pouco estudada.

    As relaes entre economia e poltica na histria recente da Amrica Latina no podem ser interpretadas datica de um materialismo simplista: no so as classes que se desenvolvem na esfera produtiva e, depois, conseguem ahegemonia poltica. Tampouco o reino das idias e vontades, de projetos ideolgicos que, a partir desse plano,influenciam e transformam as relaes econmicas. Todavia, essas duas vises, o economicismo e o politicismo,dominaram o espao interpretativo das cincias sociais da regio, at pouco tempo atrs.

    Com efeito, uma primeira linha de interpretao das transformaes sociais na Amrica Latina, de grandeinfluncia nas cincias sociais e na formulao de polticas nas dcadas dos anos cinqenta e sessenta, foi a visodesenvolvimentista elaborada pela CEPAL. O foco era econmico: o desenvolvimento centrado na expanso industrial.Da perspectiva da sociedade, a interpretao convergente partia de um modelo sociolgico da modernizao. Desseponto de vista, as transformaes sociais so encaradas como a extenso gradual, ao conjunto da populao, dascaractersticas "modernas" associadas com a industrializao. A modernizao social condio para a transformaoeconmica ou conseqncia dela. A formao de novas classes ou setores sociais aparece como um produto detransformaes na estrutura produtiva, ligadas por seu turno implementao de projetos nos quais o Estado tem umpapel central. O social automtico; o econmico, no fundo, produto de vontades polticas progressistas. O

  • pensamento cepalino, por exemplo, uma proposta de planejamento econmico cuja realizao invoca umainterveno estatal (CEPAL, 1969).

    O modelo da modernizao tinha uma caracterstica bsica: parecia que o resultado final, o ponto de chegada,era relativamente claro. Com maior ou menor clareza, a anlise partia de uma viso global do ponto de chegada que,para alguns, podia ser uma sociedade organizada e integrada ao nvel do Estado nacional, com classes sociais "bemdelineadas" que poderiam ir-se diluindo progressivamente numa sociedade de massas; para outros, o ponto final era arevoluo e a passagem a uma organizao social socialista. O interessante, no caso, no apenas o fato de que osobservadores e analistas tinham um modelo global claro, mas a circunstncia de que tambm o tinham os prpriosatores. Tanto as propostas desenvolvimentistas como os movimentos de libertao nacional e os projetos classistaspossuam formulaes ideolgicas globais, orientadas por uma noo de progresso dirigido para uma totalidadeidentificvel.

    Voltemos, contudo, ao populismo. Tratou-se de uma criao histrica latino-americana em resposta aosdesafios colocados pela crise da dominao oligrquica. Mas constituiu uma resposta que devia solucionar umproblema scio-poltico resultante das transformaes econmicas: como combinar burguesias dbeis com setoresmdios em ascenso e classes subalternas emergentes que no contavam com canais institucionalizados para aexpresso de seus interesses. Talvez o caso da revoluo boliviana constitua uma interessante ilustrao dessesdesafios. A revoluo implicou uma srie de transformaes scio-polticas (reforma agrria, nacionalizao de minas,voto universal, controle e co-gesto operria, milcias populares, etc.) que no conseguiram desenvolver-se e organizarum sistema institucional estvel (Medina Echavarra, 1973), nem produzir uma articulao societal e nacionalinclusiva, sobretudo pelos antagonismos entre sindicatos, trabalhadores e Estado (Garca, 1966), nem ainda criar umsistema poltico aberto e competitivo, principalmente pela prtica vertical e elitista da cpula partidria em relao sociedade (Malloy, 1968). Esses fatores eram considerados, pelos autores, como necessrios para que fosseempreendido um desenvolvimento econmico nacional. Obviamente, tais desafios no poderiam ser compreendidossem as presses externas do governo norte-americano sobre a revoluo nacional (Caldern, 1982).

    A anlise das diversas experincias populistas latino-americanas produziu uma abundante literatura,especialmente no tocante caracterizao do regime poltico e interpretao terica do que Cardoso e Falettodescrevem como "o grave problema da incorporao dos amplos setores socialmente mobilizados pelo processo deindustrializao" (Cardoso e Faletto, 1969, p. 109).

    As interpretaes do populismo enfatizaram as defasagens e as assincronias no processo de modernizao(Germani) ou na revoluo das expectativas (Di Tella). Nelas, o papel central liga-se "colocao em disponibilidade"ou mobilizao social dos novos setores sociais subalternos, resultado das fortes correntes migratrias em direo scidades, da industrializao e da urbanizao. A canalizao ou incorporao destes setores era a questo poltica domomento. Ao combinar-se essa questo com as necessidades do fortalecimento poltico da nova burguesia urbana ecom elites disponveis em setores dissidentes ou decadentes das camadas oligrquicas, deu-se o compromisso oualiana sobre o que se baseou o populismo (Weffort, 1973). Torna-se difcil compreender cabalmente este processosem levar em conta o papel central exercido pelos setores mdios, tanto no plano da liderana poltica como no que dizrespeito ao seu papel mediador entre foras sociais presentes nos jogos populistas (Faletto, 1979, in Caldern, org.,1979).

    No entraremos aqui numa apresentao e anlise crtica das interpretaes do populismo, o que j foi feito(Laclau, Graciarena, Franco, Weffort), mas nos perguntaremos, mais especificamente, o que significou o populismopara as classes sociais subalternas emergentes e quais as formas de ao coletiva se deram nesse perodo.

    Neste ponto, a dinmica do populismo caracteriza-se por uma ambigidade essencial. Referindo-se ao Brasil,mas aplicando-se por extenso a outras sociedades, diz Weffort: "O populismo foi um modo determinado e concretode manipulao das classes populares, mas constituiu tambm um modo de expresso de suas insatisfaes" (Weffort,1978, p. 56).

    Cabe, ento, perguntar o que foram os regimes populistas para as classes subalternas. A resposta depende desituaes scio-histricas especficas, relacionadas tanto com as diversidades nacionais como com as variadaspropostas ideolgicas. O grau preexistente de organizao e articulao das classes subalternas condicionar suaparticipao na criao e exerccio dos regimes populistas, situao que tem a ver tambm com as especificidades dodomnio oligrquico. Isto d ensejo formao e estabelecimento de setores e prticas distintas, em alguns casos maisvoltadas ruptura, como no Mxico e na Bolvia, enquanto em outros mais marcadas por caractersticas denegociao, como na Argentina e no Chile. Seria preciso interpretar analogamente as variadas propostas doutrinrias,desde a analiticamente mais acabada, do APRA no Peru, at proposta nacional difusa do varguismo.

    O populismo constituiu um reconhecimento, da perspectiva do poder, da existncia scio-poltica das classes

  • subalternas; implicou igualmente na extenso de seus direitos de cidadania, tanto polticos como sociais. Tambmsignificou um uso poltico dos setores subalternos como clientela de apoio sujeita a manipulao, e representou umaforma de direcionar e criar normas previsveis nas relaes trabalhistas, necessrias para o desenvolvimento capitalista.Constituiu tambm, em vrios casos, como no brasileiro, uma tentativa de frear ou de antecipar-se ameaa detransbordamento social, de revolta, de revoluo. Decorre disso o fato de que as anlises refiram-se tofreqentemente cooptao e manipulao, bem como so conseqncia disso as referncias explicativas "imaturidade" do desenvolvimento da classe trabalhadora, incapaz de defender-se dessa manipulao.

    O conceito de povo especialmente til para a anlise deste perodo da histria social latino-americana, j quea dinmica social deu-se em relao a este ator amorfo e difuso, heterogneo internamente, mas que reflete melhor asformas de emergncia e formao dos setores subalternos do que o faz a noo de classe social. Conceitualmente, anoo de povo remete a um sistema de oposies mltiplas, ligadas a mbitos poltico-ideolgicos e de relaessociais, mais que a formas de insero num modo de produo. O povo contrape-se ao bloco de poder, aludindo posio subordinada em face dos setores dirigentes. Tambm conota a origem local/nacional frente ao estrangeiro,assim como uma continuidade relativa das tradies populares. Laclau assinala a importncia do popular para aconstituio de discursos e ideologias polticas:

    "(As tradies populares) constituem o resduo de uma experincia histrica nica e irredutvel, constituindo,como tal, uma estrutura de significados mais slida e durvel do que a prpria estrutura social" (Laclau, 1977, p.167).

    Em sntese, trata-se de uma relao de incorporao dos setores subalternos de maneiras mltiplas, e no comoator diferenciado e autnomo (como classe social): tanto como ator na produo (da a relao entre o populismo e ocrescimento e reconhecimento do mbito sindical); como enquanto consumidor de servios do Estado (expanso dacidadania atravs dos direitos sociais); como na qualidade de clientela poltica de lderes carismticos, numa relaodireta lder-massa, sem organizaes intermedirias ou mediadoras. Tudo isto de maneira contraditria e ambgua.

    A multiplicidade de articulaes do povo com o Estado e com os setores dominantes dificulta a visualizao derelaes transparentes e unvocas. No mundo das cincias sociais, isto ocasionou a proliferao de polmicas einterpretaes contrapostas, mais do que a anlise com base emprica de situaes histricas concretas Poder-se-iadizer que existe um vazio no que diz respeito ao estudo de movimentos sociais concretos, de suas caractersticas decotidiano e dos sentidos da ao coletiva popular. H, contudo, duas reas em que a investigao conseguiu transpor oslimites da especulao: a formao do movimento operrio e as lutas camponesas. Em ambos os casos, as pesquisasrealizadas permitem perceber as ambigidades e contradies histricas presentes. a. O movimento operrio no populismo: alguns casos (Jelin, 1981) No Brasil, depois do xito do golpe militar de 1930, foram-se introduzindo novos cdigos e leis trabalhistas. Nestemesmo ano de 1930, criou-se o Ministrio do Trabalho; em 1931, introduziram-se regulaes referentes ao Sindicatonico (representao atravs de um nico sindicato por setor produtivo) e uma limitao na proporo detrabalhadores estrangeiros em cada sindicato reconhecido. A estas medidas, seguiram-se outras dirigidas a estabelecero papel do Estado nas relaes trabalhistas. As mais significativas em termos da futura capacidade do Estado paracontrolar o movimento operrio foram o requisito de reconhecimento sindical por parte do Ministrio do Trabalho e aatribuio ao Estado do poder de deciso dos nveis salariais (Vianna, 1976).

    Discutiu-se muito as razes para esta interveno massiva do Estado na cena trabalhista na dcada dos trinta.Alguns autores destacaram a necessidade de controle poltico da classe operria, assinalando que a natureza precriada estabilidade poltica lograda pelas faces rivais dominantes no poderia resistir presena de um movimentooperrio livre (Rowland, 1974). Ademais, esta legislao tambm respondia a presses econmicas: desta maneiraassegurava-se a previsibilidade das relaes trabalhistas e a disciplina no mercado de trabalho, estabelecendo-se as"regras do jogo" que as novas massas urbanas deviam seguir (Oliveira, 1975). Tambm, por certo, estavam presentesos elementos paternalistas.

    O caso da Argentina aponta numa direo semelhante. O grau de poder dos setores populares, assim como anecessidade de apoio poltico, eram muito maiores do que no Brasil. O mercado de trabalho, por outro lado, j tinhaum grau de regulamentao considervel (Gaudio & Pilone, 1975). De fato, as aes coletivas da classe operria,incluindo greves e mobilizaes populares em apoio a velhas reinvindicaes, foram determinantes de muitos dosdireitos e benefcios que os setores populares obtiveram na dcada dos quarenta (Doyon, 1975; Little, 1979).Comparadas com o Brasil, as relaes entre o Estado e a classe operria na Argentina dos anos quarenta eram muitomenos paternalistas.

  • A aliana poltica que apoiou Pern incluiu em posies centrais o movimento operrio organizado e as massaspopulares (Murmis e Portantiero, 1971; Germani, 1973). Esta participao e apoio a Pern, baseou-se contudo emganhos reais que os setores operrios estavam obtendo, ganhos pelos quais vinham lutando desde muito tempo,caractersticas legais e organizativas do movimento operrio de massas no foram muito diferentes das brasileiras,incluindo um forte poder regulador do Estado, atravs da ao do Ministrio do Trabalho no reconhecimento dossindicatos. Se, durante os primeiros anos do regime peronista, a estrutura das relaes trabalhistas emergentes podiacanalizar eficientemente os interesses das classes trabalhadoras, esta mesma estrutura pde, depois, ser utilizada peloEstado para eliminar grupos opositores dentro do movimento operrio e para controlar politicamente os operrios(Little, 1979).

    O Mxico apresenta alguns traos peculiares, que no permitem expor sua histria na mesma seqncia que ados dois outros casos (Spalding, 1977; Reyna e Miquet, 1976). A revoluo mexicana deslocou a dominaooligrquica antes que nos dois outros casos e a sua Constituio de 1917, inclua j muitos dos direitos trabalhistas queforam estabelecidos na Argentina ou no Brasil vinte ou trinta anos depois. Para o Mxico, as dcadas de trinta equarenta no foram o perodo de reconhecimento legal da classe operria, mas o perodo do reconhecimento e daincorporao real desta classe no sistema poltico (Marvan, 1977; Anguiano, 1975; Leon, 1978).

    Alm disto, o precoce reconhecimento legal, enfrentava uma classe operria extremamente frgil. Somentepequenos grupos de lderes ativistas, muitos deles sem insero nas fileiras operrias, conseguiram ter acesso vidapoltica do pas, durante o perodo revolucionrio. No se tratou de um fenmeno massivo. At dcada dos quarenta,o Mxico era predominantemente um pas agrcola e rural, e os setores de trabalhadores urbanos eram muito limitados,tanto numericamente quanto de um ponto de vista organizativo. Havia excees em alguns setores econmicosespecficos, tais como os petroleiros e os ferrovirios. A emergncia e crescimento das organizaes trabalhistas demassa e o estabelecimento de canais de participao foram simultneos com a criao de uma fora de trabalhoindustrial-urbana massiva. A seqncia temporal no foi a clssica, segundo a qual, primeiro h um momento deemergncia da classe operria urbana e, depois, o crescimento de suas organizaes: Ambos ocorreram ao mesmotempo e vinculados entre si.

    Num grau maior que nos outros casos, as organizaes operrias no Mxico no podem ser vistas como frutode um desenvolvimento "natural" no processo de formao da classe operria; estas organizaes surgiram como partede um processo poltico exgeno, ligado s necessidades e projetos de outros setores sociais que tentaram controlare/ou cooptar o movimento operrio. Desde cedo, as tentativas de formao de organizaes alternativas ouindependentes (a partir das greves dos ferrovirios de 1926, ou a de 1948, por exemplo) no puderam prosperar. Operodo crucial para o estabelecimento de um padro de relaes entre o Estado e os trabalhadores foi a presidncia deCardenas, entre 1934 e 1940. Nesta poca, o Estado e as instituies polticas se encontravam ainda numa situaofluida, sem estarem totalmente reconstrudos desde a Revoluo. De fato, foi um perodo de discusso entre propostasalternativas de organizao poltica, de mecanismos de representao e inclusive de regimes polticos. A dcada dostrinta foi, no Mxico, um tempo dominado pelas alianas e conflitos entre personalidades - Cardenas, Calles, LombardoToledano - que continuamente definiam e redefiniam suas posies e suas bases sociais de apoio. Um destes conflitos,entre Cardenas e Calles, se resolveu a partir de uma mobilizao massiva dos setores sociais subordinados em apoio deCardenas. Sua vitria levou a um processo de institucionalizao e de cristalizao de sua base de poder. Enquanto seencontrava no controle do aparelho de Estado, esta institucionalizao conformou-se novamente como um vnculodireto entre as organizaes de massa e os arranjos polticos dominantes. Eventualmente, este arranjo chegaria aimplicar a subordinao. A criao da CTM (Confederao de Trabalhadores Mexicanos), em 1936, e sua rpidaconsolidao como organizao ligada ao governo e ao partido, marcou o final de um perodo de mobilizao polticade massa e o comeo de sua incorporao formal, atravs dos canais institucionais de um sistema poltico unipartidrio(Leon, 1978).

    Por outro lado, a reorganizao da economia mexicana aps vinte anos de turbulncias devidas Revoluo e aconflitos regionais posteriores, apenas poderia ocorrer atravs da integrao do mercado nacional e da regulamentaodas relaes de trabalho. As demandas polticas foram predominantes no perodo de Cardenas; as econmicastornaram-se muito mais centrais durante os anos da guerra, quando se deu um verdadeiro boom industrial. Nestemomento, estabeleceu-se um "pacto trabalhista", que congelava salrios e disputas, pacto este plenamente aceito emesmo patrocinado pela organizao trabalhista mais importante, a CTM, que j era parte integrante do partido dogoverno, o PRI (Contreras, 1977; Medina, 1977; Ortega, 1977).

    Em resumo, nos trs casos, o projeto de industrializao proposto pelas novas classes dominantes durante esteperodo envolveu o crescimento dos setores populares urbanos. Estes novos setores populares - pelo fato mesmo de suaconcentrao em reas urbanas e a simultnea fratura das formas tradicionais de dominao - foram mobilizados em

  • termos polticos. Em conseqncia, iriam exercer um papel significativo, ainda que subordinado, na aliana polticagovernante. As implicaes da legislao trabalhista implementada nesta poca so mltiplas: foi uma resposta genunas demandas originadas nas necessidades da populao trabalhadora; foi tambm um mecanismo para incrementar adisciplina, o controle, a previsibilidade da fora de trabalho; finalmente, foi parte de um processo de negociaespolticas dirigido para obter o apoio dos setores populares.

    Mesmo nos momentos de maior xito do modelo populista, quando funcionava sem dificuldades, houvemanifestaes de descontentamento e oposio, testemunho da existncia de movimentos espontneos ou alternativosda classe operria. O protesto se manifestou basicamente de duas maneiras. Primeiro, de algumas organizaesoperrias independentes ou alternativas que haviam sobrevivido, ligadas a partidos minoritrios ou opositores, deforma legal ou no. Estas organizaes estavam prontas para entrar em ao logo que o cenrio poltico mostrasse ummnimo sinal de abertura, ou quando o controle sobre as organizaes populares se debilitasse. Exemplos deste tipo soa emergncia e desenvolvimento das organizaes operrias no Brasil durante a democratizao de 1945-46 (Weffort,1973); o ressurgimento de organizaes operrias antiperonistas na Argentina em 1955 (Senen Gonzales, 1971), e osesforos para desenvolver organizaes operrias autnomas na CTM no Mxico em 1948 e 1958 (Alonso, 1972;Pellicer de Brody e Reyna, 1978).

    Em segundo lugar, houve movimentos espontneos da base, no necessariamente ligados a organizaesalternativas. Assim, na Argentina, pde-se observar um aumento considervel nas mobilizaes e greves durante osltimos trs anos do governo peronista, entre 1952 e 1955 (Doyon, 1975); o mesmo ocorreu no Brasil em 1945-46,concentrando-se em So Paulo em 1953 (Moises, 1978); e, finalmente, houve uma mobilizao espontneaconsidervel no Mxico em 1958 (Alonso, 1972).

    Em muitos casos, as organizaes estabelecidas, o sistema de negociao trabalhista em funcionamento e osmecanismos institucionais de resoluo de conflitos puderam absorver o descontentamento manifestado nestasmobilizaes. Por exemplo, durante o perodo 1952-1955, as reivindicaes dos trabalhadores argentinos foramfundamentalmente por salrios (Doyon, 1975), e puderam ser resolvidas atravs dos mecanismos estabelecidos. Outroscasos, tais como os ocorridos no Mxico em 1958-59, necessitaram o uso de diversos mecanismos para restabelecer a"paz civil". Neste caso, o movimento operrio centralizado incorporou algumas das demandas, aceitando pressesvindas de baixo; houve considervel cooptao das lideranas emergentes no movimento opositor; e finalmente,sempre resta o recurso da represso.

    Numa perspectiva histrica, o tipo de legislao trabalhista e de organizaes operrias que surgiu nessemomento, respondeu s necessidades conjunturais, convertendo-se em um canal de integrao dos setores populares nasociedade e um mecanismo de sua representao poltica. Quando a situao econmica e poltica se modificouespecialmente quando o Estado se colocou numa posio mais autnoma em relao s classes subordinadas que ohaviam apoiado, este mesmo corpo de regulamentos pde ser utilizado para controlar e manipular as organizaesoperrias. Uma vez que uma estrutura organizativa se estabelece, vai-se tornando independente das condies que lhederam origem. (Stinchcombe, 1965). Desta maneira, arranjos feitos para resolver uma determinada crise conjuntural,tiveram conseqncias histricas e estruturais que condicionaram o desenvolvimento posterior da posio dos setoressubordinados frente ao Estado.

    Assim, no perodo ps-populista, a partir dos anos setenta, as transformaes econmicas e polticasimplicaram em significativas modificaes na situao do movimento operrio. A expanso dos setores industriais deponta e a conseqente heterogenizao da fora de trabalho, aliada a modificaes polticas autoritrias, resultou emgeral numa poltica onde havia margem para a negociao ou, em ltima instncia, a represso, mas no a tolerncia.Sob estas condies at o final dos anos sessenta e comeo dos setenta as manifestaes de protesto operrias voltam aestar presentes, mas de forma original. No Brasil o movimento sindical,com a figura de Lula, esteve no centro dasatenes no perodo do "milagre brasileiro". b. Os movimentos camponeses Em vrios pases latino-americanos, por causa dos processos populistas, os camponeses tiveram um papel polticofundamental, tanto nas lutas pela distribuio ou recuperao de terras, quanto na redefinio das relaes entresociedade, partido e Estado. Os casos mexicano e boliviano ilustram esta perspectiva.

    Em ambas as situaes os camponeses participaram decisivamente na luta contra o sistema de propriedade deterras e a dominao oligrquica, introduzindo nos agitados processos revolucionrios, demandas de acesso terra,direito cidadania poltica e reivindicao de participao social, seja pela via dos egidos, das comunidades ou dossindicatos camponeses.

  • No Mxico, aps os quatro anos de luta revolucionria (1910-1914), iniciou-se um conflitivo e burocrticoprocesso poltico e legal de aquisio de terras que apenas se consolida em meados da dcada de trinta. "Haviamobtido uma vitria, para continuarem sendo simplesmente camponeses" (Womack, 1970, p. 364). Na Bolvia, a lei dareforma agrria de agosto de 1953 constitui um duplo marco: culmina uma longa luta (1937-1953) pelo acesso legal propriedade da terra, pela distribuio de terras, e pela aceitao da organizao sindical (Dandler 1983; Antezana,1968) e, por outro lado, assinala o incio de um conflitivo e kafkiano dinamismo de legalizao e distribuio de terrasque, em formas e intensidades distintas, s se consolidou nas reas de cultivo tradicional, 25 anos depois (Alho, 1979).

    Vrios estudos, tanto de analistas locais quanto estrangeiros, do conta de inumerveis experincias daparticipao camponesa sob governos populistas instveis e liderana de caudilhos curiosos. O certo que, no Mxicoe na Bolvia, o processo de reforma agrria foi acompanhado no s pela busca de uma afirmao camponesa eindgena, mas tambm por uma intensa e instvel fragmentao poltica partidarista, que culminou na subordinao docampesinato ao Estado e a criao de um novo sistema de intermediao e cooptao camponesa de singularsignificado. Slvia Rivera (1984) e Dandler (1984) ilustram as diferentes experincias de sindicalismo paraestatalcampons na Bolvia, e Bartra (1976) Womack (1969) e Warman (1976) estudam, sob diferentes pontos de vista, odesenvolvimento de mecanismos de cooptao e intermediao no Mxico.

    O resultado foi diverso e paradoxal; diverso porque a intensidade da reforma dependeu tanto das demandas epresses camponesas, como dos interesses e correlao de foras no Estado. Paradoxal, porque apesar das mltiplastransformaes operadas (mudana nas relaes de trabalho, incorporao ao mercado e educao, maior integraonacional, etc.) a situao social dos camponeses, na relatividade do tempo histrico, no mudou substancialmente.Anenecuilco e Ucureta, talvez bero dos movimentos agrrios mais importantes da histria da Amrica, permanecemno atraso e na pobreza.

    Mltiplas so as interpretaes tericas geradas por estes movimentos sociais. Desde vises evolucionistas, emtermos de formas de evoluo da conscincia camponesa (Quijano, 1979) ou do processo de integrao camponesa emtermos de modernizao (Lewis, 1922; Clark, 1970), at o papel do campesinato no processo de mudanarevolucionria. Na literatura marxista, as polmicas Haya-Mariategui no esgotaram o tema, e foram produzidosinmeros textos sobre o papel dos camponeses num processo revolucionrio, sejam eles considerados sujeitoshistricos ou como aliados da classe operria. Possivelmente, a grande maioria destas interpretaes teve como panode fundo as experincias camponesas populistas. Um dos temas que acompanharam estas discusses est relacionadocom o papel do campesinato num sistema capitalista. O campesinato tende a extinguir-se e proletarizar-se ou assumirnovas formas, ampliando ou recriando sua identidade e ao coletiva? A respeito desta ltima colocao, depois devrias anlises crticas, Warman visualiza o campesinato como "uma nova alternativa para a organizao de umasociedade futura" (Warman, 1980 e 1986).

    Em sntese, sob o populismo, a ao camponesa esteve orientada para a transformao das relaes deexplorao nas fazendas, para a afirmao da cidadania e para a superao de mecanismos de discriminao tnica dotipo casta, prprios do sistema de dominao oligrquico. Assim, a busca de reconhecimento e autoafirmaocamponesa nestes movimentos, produziram importantes transformaes societais, como reformas agrrias, sufrgiouniversal, reconhecimento da cidadania e a proliferao de importantes ncleos organizativos do campesinato,sobretudo sindicais. Em termos mais abstratos, possvel assinalar que a ao camponesa combinava orientaes detransformao de relaes de classe, de autonomia e identidade nacional e de afirmao tnico-cultural.

    Certamente, estas orientaes no implicaram numa panacia de autonomia da ao camponesa, mais sim emconfusas e complexas imbricaes no interior do campesinato e entre este e outros grupos sociais, o partido e o Estadopopulista. 2. Movimentos sociais, poltica e sociedade nos anos setenta A queda do presidente Allende simbolizou, talvez com maior fora que outros processos polticos na regio, a perda deprojeo histrica dos movimentos sociais de orientao industrial totalizante Se revisarmos as perspectivas e a forareal dos movimentos sociais na Amrica Latina que pretendiam alcanar modelos nacionais independentes outransformaes classistas acabadas (seja da burguesia industrial, seja do proletariado e seus aliados), provavelmenteconcluiremos, como vrios textos da bibliografia citada, que estas orientaes e prticas foram perdendoprogressivamente seu impulso vital. Paralelamente, possvel distinguir nos ltimos quinze anos, a emergncia denovos atores sociais e de novas prticas coletivas, tanto no seio dos movimentos sociais clssicos (operrio-campons),como no desenvolvimento de novos movimentos de gnero, geracionais, urbanos, tnicos, de direitos humanos, etc.,que no chegaram a colocar-se metas nem aes holsticas.

  • No plano das interpretaes, nos primeiros anos da dcada de setenta, comea-se a passar de umaconceitualizao estrutural totalizante das classes sociais ao estudo de atores especficos e a problemticas setoriais. Oestado do debate terico na regio neste momento est refletido na conferncia e posterior publicao do livro Asclasses sociais na Amrica Latina, patrocinado pela UNAN (1973). Os ensaios tericos (de Poulantzas, Touraine eFernandes) so amplamente discutidos por vrios autores, trazendo luz casos concretos e especificidades histricas.Esta foi uma tentativa de colocar a temtica das classes sociais de maneira universalista, a partir de um dilogo entreeuropeus e latinoamericanos, dentro de uma perspectiva marxista. O resultado foi um contraste entre explicaestericas generalizadoras e anlises histricas e setoriais especficas, sem estabelecer as pontes e as mediaes entreelas. Talvez tenha sido a ltima tentativa de atingir uma viso universalista das classes sociais, na qual no se encontraa presena da dinmica social atravs da anlise dos movimentos sociais.

    Dentro da multiplicidade e aparente caos na bibliografia sobre o tema, possvel localizar alguns elementosque permitem ordenar a heterogeneidade e variedade neste campo. Em primeiro lugar, a confrontao entre a tradiomarxista e a funcionalista em suas verses latino-americanas viu-se fortemente influenciada e transformada pelapresena dos trabalhos de A. Touraine, primeiro no Chile e, depois, no restante da regio. Tanto seus estudosconcretos, como a produo terica ligada regio, deram um impulso fundamental no estudo dos movimentos sociais(di Tella et al., 1967; Touraine, 1976; Touraine, 1975, entre outros). Seu livro mais recente, Atores Sociais e SistemasPolticos na Amrica Latina (Touraine, 1987) sem dvida o esforo mais compreensivo de uma interpretao globalda problemtica que nos ocupa, constituindo um novo marco no desenvolvimento do tema.

    A partir do comeo dos anos setenta, cabe mencionar duas linhas de desenvolvimento temtico neste campo,baseadas em experincias na regio; os estudos sobre o movimento operrio, cujo eixo articulador foi o Grupo deTrabalho sobre Movimentos Trabalhistas (depois Comisso) da CLACSO, criado em 1972, e os estudos sobremovimentos urbanos, que reconhecem Manuel Castells como a figura de maior influncia.

    Com efeito, o referido autor realizou trs tipos de estudos que permitem reconhecer e visualizar um novo atorsocial, o urbano, os favelados ou "marginais". Estas suas anlises, e as que lhe seguiram, de alguma maneira rompemcom as vises monopolsticas preexistentes em torno do movimento operrio e campons na regio.

    Em primeiro lugar, tem especial relevncia um estudo terico sobre o sistema urbano (Castells, 1976), que emvez de criticar o enfoque funcionalista da sociologia urbana da Escola de Chicago, pretende, numa perspectivamarxista estruturalista, chegar a uma viso que integre a estrutura e prtica social urbana. O conceito de reproduo dafora de trabalho teria o papel articulador neste enfoque.

    Em segundo lugar, os trabalhos sobre urbanizao dependente e poltica urbana a respeito do monoplio estatalna reproduo da fora de trabalho urbano, do origem a uma nova forma de visualizao latino-americana dasoposies entre Estado e sociedade.Finalmente, vrios estudos empricos sobre movimentos urbanos, especialmente sobre os pobladores no Chile,mostram um novo ator social que com certa especificidade, atua na cena urbana e reivindica novas ordens deorganizao scio-espacial. Mais adiante, o desenvolvimento da rea estudada, permite ao autor e a outros enfatizarema importncia dos movimentos sociais como atores autnomos, construtores de histria e sociedade.

    Quanto a rea trabalhista, os diversos seminrios e reunies foram reunidos no volume editado por Kaztman eReyna (1977), num nmero especial da Revista Mexicana de Sociologia (Vol. 40, N.2, 1978) e, mais recentemente,em vrios projetos comparativos sobre o tema (resenhados em David e Goliath, 1980, N. 38-39 e David e Goliath,1985, N.48). No comeo, o movimento operrio foi visto no contexto da insero produtiva dos trabalhadores, comoexpresso organizada da classe (Kaztman e Reyna, 1977). Mas tambm, desde cedo, foi objeto de reflexo a suapresena como ator scio-poltico frente (ou integrado) ao Estado. Estas vises, mais "economicistas", por um lado, e"politicistas", por outro, foram se enriquecendo com elementos mais especficos do campo das relaes sociais, tantona anlise da dinmica interna do sindicalismo temas como a relao entre movimento sindical e orientaes operrias,a dinmica sindical de categorias sociais especficas como as mulheres, por exemplo quanto em sua vinculao comoutros movimentos e atores sociais. Na dcada dos oitenta, as anlises neste campo partem dos dois desafios centraispara o movimento operrio da regio: o enfrentamento da crise econmica e o desafio dos processos de transio econsolidao da democracia. As tenses entre um sindicalismo de confrontao ou de concertao parecem ser, nestemomento, o eixo dos dilemas do movimento operrio frente crise (Comisso de Movimentos Trabalhistas, 1986).

    Tanto os estudos sobre o movimento trabalhista como sobre os movimentos urbanos multiplicaram-se nadcada posterior. A estes se agregaram os referidos a outras reas de ao e de formao de atores coletivos: asmulheres, os jovens, os direitos humanos, os movimentos regionais, etc. No plano analtico, a transformao daorientao destes estudos, foi na direo de incorporar dimenses culturais e sociais na anlise, anteriormente tocentrada na primazia do poltico e do econmico.

  • 3. Perspectivas analticas dos movimentos sociais Uma caracterstica prpria da Amrica Latina que no existem movimentos sociais puros, ou claramente definidos,dada a multidimensionalidade no s das relaes sociais, mas tambm dos prprios sentidos da ao coletiva; porexemplo, um movimento de orientao classista provavelmente estar acompanhado de aspectos tnicos e de gneroque o diferenciam e assimilam a outros movimentos de orientao culturalista com contedos classistas. Desta forma,os movimentos sociais se vem nutridos por mltiplas energias que incluem, em sua constituio, desde formasorgnicas de ao social pelo controle do sistema poltico e cultural, at modos de transformao e participaocotidiana de autoproduo societal (Caldern 1986).

    Em termos gerais, a dinmica dos movimentos sociais tem como referncias fundamentais quatro campos dedesenvolvimento:

    Em primeiro lugar, todo movimento social possui uma estrutura participativa, como conseqncia de seuprprio objeto e experincia de organizao e luta. As formas, os nveis e os tipos de participao num movimentodefinem em grande medida a fora de suas metas. Um aspecto central que o carter piramidal ou restrito daparticipao ou, alternativamente, suas formas democrticas e abertas, no so independentes do prprio contedo daslutas do movimento. Aqui, a problemtica da "pequena poltica" ou do dia-a-dia vivencial do movimento reveste-se deespecial importncia.

    Em segundo lugar, todo movimento social tem sua prpria temporalidade, em grande medida definida por suaao frente ao sistema de relaes histricas. Por outro lado, ainda que todo movimento possua sua prpriacontinuidade histrica e sua vivncia existencial, cotidiana, os momentos de crise e conflito agudo so os que definemsua qualidade. Desta maneira, a combinao do "tempo" diacrnico e sincrnico do movimento so fundamentais parasua compreenso.

    Aqui, a visualizao da atual crise latino-americana e nacional tem uma importncia vital, na medida em que,em suas mltiplas expresses e sentidos, est presente nas vivncias e aes dos movimentos sociais; sobretudo seassumimos que estes so portadores em alguma medida - ainda que potencialmente - de uma nova ordem social,reivindicam um "novo modelo" de desenvolvimento econmico e possuem uma certa viso poltica do conjunto dasociedade. Est claro, no entanto, que a mudana depende igualmente das relaes econmicas dentro da sociedade.

    Em terceiro lugar, os movimentos sociais se desenvolvem de forma multilateral e heterognea no espao, emfuno do desenvolvimento desigual da conscincia, da organizao e da economia de uma localidade ou regiodeterminada. Por exemplo, um movimento social de direitos humanos pode chegar a ter caractersticas e significadosdistintos em diversos contextos geogrficos. Ainda que eles possam pretender, os movimentos sociais no tm finspredeterminados; eles o redefinem no prprio conflito.

    Um ltimo elemento global que se deve levar em conta para o estudo das prticas coletivas o que se refere aosefeitos sociais especficos destes movimentos sobre as relaes sociais e sobre a sociedade, mas no somente como oproduto da ao do sujeito, porm como produto de um campo de conflito em que os atores envolvidos na aomodificam-se a si mesmos atravs da interao recproca e compartilhada para obter um fim, para atingir uma meta.Esta relao pode introduzir modificaes especficas e gerais na sociedade, tanto em termos de transformaes nasrelaes de poder, como de efeitos especficos sobre determinadas ordens sociais. Mas tambm os movimentos sociaispodem introduzir, na base das relaes sociais que os recriam, culturas cotidianas de uma nova ordem que modifica avida dos homens: hbitos, costumes, valores, etc.

    Num recente trabalho, T. Evers (1984), colocou algumas idias importantes para reflexo sobre os movimentossociais: que as cincias sociais latino-americanas, preocupadas desde sempre com o poder e a vontade detransformao poltica, estiveram focalizando a realidade dos movimentos sociais em nossos pases, de uma maneiraexcessivamente centrada na questo do poder. Da perspectiva da transformao poltica, as expresses coletivas noinstitucionalizadas dos setores populares foram interpretadas como protestos pr-polticos, ou como embries departicipao popular a ser encabeados por um partido de vanguarda. O reconhecimento de que estas manifestaescoletivas no podem ser facilmente incorporadas a um partido revolucionrio levou a uma primeira reinterpretao deseu sentido poltico: de um lado, os que haviam assinalado seu carter limitado, reacionrio ou reformista; de outro, osque, perplexos, comearam a reconhecer a urgncia de olhar com mais profundidade o interior destes movimentos,para poderem, assim, descobrir sem preconceitos suas potencialidades e limitaes, historicamente contextualizadas.

    nesta nova orientao que se comea a identificar os movimentos sociais com as "novas formas de fazerpoltica". Nisto contudo, o tema do poder continua sendo o ordenador do pensamento interpretativo. Diferentemente deEvers, talvez seja o momento de repensar os movimentos sociais de uma outra perspectiva: no se trataria apenas de

  • novas formas de fazer poltica, mas tambm de novas formas de relaes e de organizao social; o que se estariatransformando ou engendrando uma sociedade, mais do que uma poltica nova.

    O significado e interesse analtico dos movimentos sociais reside em buscar neles evidncias de transformaesprofundas da lgica social. O que est em questo uma nova forma de fazer poltica e uma nova forma desociabilidade. Porm, mais profundamente, o que se intui uma nova maneira de relacionar o poltico e o social, omundo pblico e a vida privada, na qual as prticas sociais cotidianas se incluem junto a, e em direta interao com, oideolgico e o institucional-poltico. A pergunta que surge de imediato, impossvel de responder com preciso, se setrata de uma "nova realidade", ou se a vida social sempre ter sido assim, e ns apenas no a vamos em virtude dopeso dos paradigmas dominantes.

    O importante, neste momento do desenvolvimento de nosso conhecimento, reconhecer o campo aberto e - porque no - refletir sobre as condies da vida social e poltica. No h dvida que, pelo menos no Cone Sul, a ofensivaideolgica e repressiva dos regimes autoritrios teve efeitos importantes nas redefinies da relao entre o pblico e oprivado, assim como na perspectiva interpretativa das cincias sociais. Citando Lechner,

    "O que ocorre uma transferncia do pblico ao social. O pblico reinterpretado enquanto pblicoconsumidor... A constituio do sujeito j no remete ao cidado, mas ao consumidor... O mbito privado deixa de seruma proteo individualidade e incorporado publicidade do mercado" (Lechner, 1982, p. 21-23).

    Alm disto, ao transformar as condies de vida e de ao dos prprios pesquisadores, estes, como o resto dapopulao, porm com mais conscincia crtica, incorporam no seu prprio pensamento a cotidianidade;

    "O deslocamento do mbito pblico e a trivialidade do discurso poltico oficial dirigem a ateno para a vidacotidiana... Na medida em que as rotinas - o normal e natural - tornam-se problemticas, aumenta a complexidade davida cotidiana... perda das certezas soma-se o incremento das decises forradas, gerando uma experinciadolorosa" (Lechner, 1982, p. 24).

    Certamente, estes desenvolvimentos no so exclusivos do trabalho intelectual sob regimes autoritrios. Aincorporao do cotidiano como rea de reflexo e investigao na qual se condensam e manifestam de maneiracomplexa as estruturas e mecanismos do funcionamento poltico-social; a considerao das subjetividades dos atores edos pesquisadores; a anlise da poltica e das prticas coletivas devem ser contadas como desenvolvimentosimportantes do corpus das cincias sociais a nvel internacional. Influi nisto a reviso de nosso saber que, desde ofeminismo, coloca o reconhecimento da dimenso poltica do pessoal e a releitura da famlia como mbito scio-poltico-pblico (Jelin, 1984).

    Este o espao intelectual privilegiado no qual encontramos os movimentos sociais em processo de formao.Na espontaneidade, no no institucionalizado na ambigidade de demandas, nos sentidos contraditrios emultifacetados, ao e prtica coletivas, mais do que nas propostas ideolgicas ou nos aparelhos institucionais. oinvestigador que prope a leitura destas prticas como movimento social, sobre a base de uma operao analtica apartir da interpretao de sua insero no contexto scio-poltico e de seu desenvolvimento no tempo. Ou seja, otrabalho do pesquisador a busca do sentido de uma prtica coletiva, sentido que, obviamente, est embutido naconceitualizao dos prprios sujeitos, mas que vai alm dela.

    Estes movimentos aparecem na Amrica Latina num contexto de crise, muito heterognea e vasta, poisexpressa o esgotamento dos modelos de desenvolvimento capitalista. Neste sentido, as perguntas globais que cabefazer, ainda que no possamos dar-lhes respostas cabais neste momento, indicam a questo da medida em que seriapossvel pensar num modelo terico global da ao social na regio, a partir da fragmentao e da heterogeneidade dosmovimentos sociais. Como se definem os diferentes campos de conflito? Que orientaes esto em luta e quetendncias de articulao no plano nacional e regional possvel prever? Em termos mais globais, estamos frente gerao de um novo sistema de ao histrica? Implica isto a criao de sujeitos com capacidade globalizante pela viade ressignificao simblica de identidades comuns a partir do reconhecimento das diferenas? Ou entraremos maispropriamente numa fase cinzenta de racionalizao da ao social? (Touraine, 1984). 4. reas temticas dos anos oitenta A reviso da literatura recente indica que na Amrica Latina houve uma proliferao de estudos de casos de lutas e deprocessos de gestao de novas formas de ao coletiva - com a pergunta, implcita ou explcita, no sentido de saber seestamos em presena de um processo de formao de novos atores sociais ou histricos. Ainda que no tenhamos ainteno de resenhar toda esta literatura, basta assinalar alguns campos de conflito onde esta formao de atores maisvisvel e mostrar as tendncias temporais de seu desenvolvimento.

  • A) A condio operria. O panorama do movimento sindical mostra de certa maneira um comportamento operriobastante diverso, cujas orientaes dependem das condies sociais de trabalho e da situao poltica nacional.Inclusive nos casos especficos, so facilmente perceptveis fortes diferenas e oposies entre orientaes e interessessociais de diferentes linhas polticas, oposies entre direes e bases, oposies e ambivalncias no interior de ummesmo sindicato, etc: Neste sentido, as prticas trabalhistas na maioria dos casos so principalmente defensivas doposto de trabalho, dos salrios e dos benefcios sociais. Os efeitos da paralisao industrial ou dos processos dedesindustrializao parecem condicionar estes comportamentos e possivelmente, com relativa exceo da CUTbrasileira, o movimento operrio sul-americano perde aparentemente centralidade na poltica e na economia latino-americanas, impugnando mais os governos e os ministrios de trabalho que o capital, seja este internacional ounacional; a direo industrial da sociedade no est em questo para os trabalhadores.

    Entretanto, nestes espaos tambm possvel visualizar demandas de autonomia estatal, de independnciapoltica partidria e de democratizao interna que, provavelmente, voltem a ligar movimento operrio, de maneiradiferente do passado, com o sistema real de oposies capitalista que comea a viver a regio (Caldern, comp. 1986;Comisso de Movimentos Trabalhistas, 1986). B) Qualidade de vida, consumos coletivos e movimentos urbanos. Em grandes linhas, ao lado das prticas urbanastradicionais e inclusive dentro delas mesmas, desenvolveram-se recentemente quatro formas de ao coletiva. Aprimeira, de fortalecimento das unidades produtivas ou reprodutivas de pequena escala: oficinas artesanais, pequenoscomrcios, unidades ou associaes de consumo, pequenas unidades produtivas diversificadas em espaos urbanos e/oururais, etc., que de alguma maneira buscam ideologias e formas de organizao autogestionrias.

    A segunda implica o desenvolvimento de diferentes organizaes sociais urbanas, comisses de vizinhos,comits de abastecimento, centros cvicos, etc., que geram demandas pela descentralizao por bairros das polticas eaes municipais, e que em alguma medida, sustentam reclamaes quanto ao exerccio dos direitos do cidado. Domesmo modo, em vrias regies e em diferentes pases, comearam a organizar-se, dentro do mbito urbano, lutaspela descentralizao do Estado, em termos de obteno de maiores recursos econmicos e polticos. Em grandemedida, os habitantes urbanos se tornaram reivindicadores de uma nova ordem democrtica na "pequena poltica".

    A terceira consiste em demandas de renovao urbana, que implicam tanto transformaes nas relaes scio-culturais habituais, como impugnaes ordem espacial e ecolgica em nossas cidades; nesta orientao, ressaltammovimentos para melhorar a qualidade de vida, protagonizados fundamentalmente por setores mdios.

    Uma quarta ao coletiva refere-se s lutas urbanas que se convertem em espaos de comunicao plurissociale cultural entre diferentes grupos humanos, rompendo com a imerso urbana do passado; desta maneira so escutadasdemandas de aliana de classes, solidariedade nacional e cultural, em pequeno ambiente de resistncia de rua, ondeconvivem variados grupos sociais, tnicos, etrios, etc. (Caldern, comp., 1986; Revista Mexicana de Sociologia, v. 46,n.o 4, 1984). C) O campesinato. A terra, o mercado e a organizao camponesa constituem as demandas mnimas do mundo agrrio.Mas tambm emergem interesses e orientaes do campesinato que tendem a incidir em espaos nacionais e polticosmais amplos, conjugando orientaes classistas, nacionais e culturais. Dois fatos coexistem na regio: a presena defortes e organizadas confederaes nacionais de camponeses com caractersticas autnomas, porm capazes deestabelecer compromissos com outras foras sociais, compromissos s vezes insuficientes para constituir projetosnacionais compartilhados; de outra parte, organizaes sociais camponesas atomizadas em sindicatos locais que dealguma maneira ainda perseguem processos de unidade nacional. Talvez um fato que se destaca na ltima dcada sejaa presena, em vrios pases da regio, de organizaes camponesas que vo alm de suas demandas classistas e queao mesmo tempo se estruturam na recusa a prticas discriminatrias raciais, revalorizando atravs de sua memriahistrica prticas vernculas, para finalmente projetar-se como foras culturais alternativas nas sociedades capitalistascriolo-mestias.

    De outra parte, destacam-se as demandas tnico-culturais, por uma incorporao na cidadania na Nao a partirdo reconhecimento da identidade dos prprios grupos discriminados. No obstante, deve-se indicar que vrios dosmovimentos incluem tenses e demandas internas de carter tnico-cultural que provavelmente constituem elementosexplicativos importantes da ao coletiva analisada, elementos que at o momento foram pouco estudados (Caldern,comp., 1986; Caldern e Dandler, 1986) D) Os direitos humanos. Os movimentos de direitos humanos apelam, como princpio aglutinador de sua prticapoltica, a um sistema de valores fundamentais: a vida, a verdade, a justia, colocando exigncias ticas de carter

  • humanitrio. Ainda que sua lgica seja defensiva, sua potencialidade reside na capacidade de desnudar, partindo deuma tica fundamentalista, a lgica da dominao. Assim, a partir de uma estratgia defensiva, vai-se estruturandolentamente na sociedade um consenso social sumamente amplo e capaz de convocar setores muito amplos eheterogneos, que questiona e desqualifica a legalidade da dominao ditatorial. Porm, se trata em princpio deprticas expressivas, no instrumentais, que necessitam manter-se eqidistantes de todas as mediaes polticaspartidrias para poder continuar gerando um amplo consenso.

    Esta representatividade responde em parte existncia de um "vazio poltico" que, frente desmobilizaopopular, gera uma utopia profundamente mobilizadora e com forte potencial democratizador. Com efeito, numa boaparte da regio, os movimentos de direitos humanos foram a brecha pela qual comeou a renascer o movimentopopular, recuperando a memria histrica das lutas populares, na medida em que frente a um discurso ditatorialaniquilador do poltico, souberam gerar uma revalorizao daqueles valores de luta que costumam mobilizar ajuventude.

    Os direitos humanos surgem junto a uma revalorizao da democracia como construo, e no como algo dadoe preexistente. Todos aqueles valores que eram bvios, e que conformavam algo assim como um conjunto mnimo denormas ticas que se davam por aceitas e alm das quais se dirigiam as lutas polticas e sociais, tiveram que tornar aser reconstrudas, recolocadas e revalorizadas a partir da experincia de sua violao sistemtica pelos governosditatoriais.

    Assim, aqueles valores (a democracia poltica, o respeito s garantias constitucionais, o respeito pela vidahumana, etc.) que na Argentina dos anos sessenta careciam por completo de valor como demanda ou bandeira polticapara amplos setores da populao juvenil e politizada, nos anos oitenta foram os nicos recursos capazes de abrir umabrecha no obscuro panorama social e poltico nacional, capazes de aglutinar as mais diferentes camadas da sociedade,alm das mltiplas identidades polticas.

    Mas, quais so os potenciais democratizadores destes movimentos, e qual ser seu papel na prxima etapademocrtica, uma vez que o adversrio mais visvel, o Estado autoritrio-militar, cedeu lugar ao governo democrtico?Esta pergunta est ainda sem resposta. Em linhas gerais, o que se pode dizer no momento da transio democracia que os movimentos de direitos humanos deixaram pendente sua formulao positiva, concreta - j no sfundamentalista e tica - de um projeto poltico possvel (Jelin, 1985; Caldern, comp., 1986c; Jelin, comp., 1987). E) O gnero. Na problemtica dos movimentos de gnero, cabe fazer uma diferena entre aqueles movimentosprotagonizados principalmente por mulheres, mas que se estruturam ao redor de demandas diversificadas tais como osdireitos humanos, a qualidade de vida, o consumo, a moradia, a sade, etc., que podemos chamar de movimentos"femininos", e aqueles que levantam bandeiras relativas problemtica especfica, da mulher, que chamaremos"feministas". Esta distino analtica, porque freqentemente ambas as dimenses se complementam e se misturamno interior de um mesmo agrupamento feminino.

    Os primeiros, parecem ser uma extenso ativa, parcialmente politizada no sentido mais amplo do termo, dombito domstico e do papel central que desempenham as mulheres nas mltiplas atividades reprodutivas necessrias manuteno social. Em etapas de fechamento dos canais polticos, o social se politiza; as demandas sociais adquirempotencialidades cada vez mais questionadoras da ordem poltica. So formas de participao baseadas nos "papistradicionais" femininos, mas que, ao estender-se, adquirem conotaes inusitadas, capazes de questionar a ordemglobal. Em suas prticas, mostram uma capacidade de democracia e participao internas que no so usuais em outrasformas de organizao poltica, tais como os partidos, os sindicatos, etc. Um pluralismo aberto, um apoliticismoexplcito que tenta preservar-se de toda heteronomia, so traos comuns destes movimentos femininos.

    Neles se luta por direitos relativos familia, s crianas, ao bem-estar dos homens e das mulheres nos setorespopulares: direito ao consumo, direito dos cidados, direito sade e moradia. Surgem em grande parte comoresposta crise, ao subconsumo, ao desemprego, e so protagonizados por mulheres de extrao fundamentalmentepopular, ainda que muitas vezes ostentem um amplo policlassismo.

    Nos movimentos de tipo "feminista", as lutas femininas que encaram o problema da mulher, no respondempontualmente crise, podendo-se encontrar indicaes de sua presena desde o sculo passado e princpios deste, comas primeiras sufragistas, cuja luta era obter para as mulheres uma participao plena nos direitos de cidadania. Taismovimentos continuam ininterruptamente, porm com fluxos e refluxos, at as atuais organizaes feministas quereivindicam o direito sobre o prprio corpo (anticoncepo, aborto, a maternidade voluntria), a igualdade deoportunidades, de remunerao, que cada vez mais fazem da cultura seu campo de luta privilegiado.

    Poderia se afirmar que suas exigncias no surgem diretamente de situaes crticas de ponta, mas que soexigncias culturalmente filtradas a nvel internacional, que historicamente fluiram dos pases desenvolvidos para os

  • subdesenvolvidos e das classes altas para as classes baixas. Contudo o fato de que suas reivindicaes encontram cadavez mais eco nas mulheres das camadas populares indica que correspondem a condies concretas de vida de taismulheres. De fato, no desusual que organizaes "femininas" evoluam para reivindicaes "feministas".

    Sendo seu campo de batalha principal a cultura e a ideologia, os movimentos feministas contm apotencialidade de questionar a ordem social de uma maneira global, ordem que muitas vezes definem como o binmio"modo de produo capitalista/patriarcado", cujos termos so mutuamente interdependentes e se reforam. Por isto, aoquestionar as prticas e tendncias paternalistas na sociedade, o feminismo encontrou um modo capaz de aprofundar asfissuras da ordem social e poltica existente (Jelin, 1987; Caldern, comp., 1986). F) Os jovens. Uma das caractersticas comuns de vrias das sociedades latino-americanas a alta correspondnciaentre as relaes de poder e as estruturas etrias da populao, onde considerveis massas de jovens vem limitadassuas possibilidades de acesso ao poder e autoridade, ao prestgio, aos benefcios econmicos e ao reconhecimentosocial, em suma, participao social. Esta tendncia foi particularmente reforada sob os regimes ditatoriais, cujaspolticas no s suprimem os direitos de cidadania da juventude, mas tambm fizeram desta a sua vtima privilegiada.O jovem s valorizado quando rende tributo ordem e ao poder.

    De outra parte, os comportamentos juvenis se fazem compreensveis quando referidos s dimenses simblicasda vida social. De alguma maneira, a juventude se caracteriza por sua tendncia para orientaes fundamentalistas comrelao a valores, de ordem mais cultural que econmica.

    Desta maneira, o mundo dos jovens fica limitado a um espao de condutas desorganizadas e de crises deidentidade, onde a ao se prope reproduzir aquelas condutas que a modernizao quis neutralizar; as orientaes parao prazer imediato, o refgio comunitrio, a agresso.

    Os movimentos juvenis na Amrica Latina, com origem em fenmenos estruturais e histricos similares -reflexo da situao transicional que compete ao jovem em toda a sociedade - tm, contudo, caractersticas nacionaisbem diferenciadas.

    No obstante, expresses to dissimilares como "Morrer, lutando, de fome nem cagando" (cantada em coro porjovens chilenos mas radicalizados, e um bom smbolo da dimenso de disposio ao sacrifcio do allendismo) e "... oMEI poltico mas no partidarista e sectrio porque intervir em toda poltica que afete a nao, sem intrometer-senas destrutivas rivalidades de partido" (parte de um "iderio" do MEI paraguaio), ou "Minha arma a paz, meu partido o rock, e meu eterno fim o amor" (escrita por um roqueiro argentino na sua mochila), so exemplificadoras demovimentos sociais que indubitavelmente foram, para amplos setores juvenis, refgio, mbito de resistncia e canal departicipao no contexto de uma sociedade autoritria, fechada e em crise (Caldern, comp. 1986; N especial darevista CEPAL). G) A guerra e a poltica. Os movimentos de ao revolucionria se caracterizam por sua luta contra o Estado e osistema de dominao dependente, mediante a ao violenta. O campo do conflito coincide, nesse caso, com o campode batalha; isto implica complexas conotaes sociolgicas.

    Ningum pode negar a presena deste tipo de ao na histria da Amrica Latina; suas orientaes e suasformas concretas foram muito variadas: republicanas, nacionalistas, socialistas anarquistas e banditismo social; suasformas de luta foram, entre outras, montoneras, republiquetas, guerrilhas rurais, guerrilhas urbanas e guerras delibertao nacional.

    O problema consiste em detectar os diferentes sentidos sociolgicos desta ao poltica e sua viabilidade nosdistintos contextos nacionais e regionais, posto que vrias vezes conseguiram transformaes sociais e outras, maisnumerosas, a consolidao ou reemergncia de sistemas polticos altamente despticos. Entretanto, de alguma maneirase autodefinem como os sujeitos da mudana, que levam consigo o resto da sociedade, monopolizando o Estado e apoltica (Caldern, comp. 1986; Sanchez de Leon, 1985). 5. A transio nos movimentos sociais Nossa hiptese central procurou indicar as transformaes de atores coletivos, registrando nas ltimas dcadas umaperda de horizontes totalizantes, ou se quiser, uma crise da historicidade industrialista e sua substituio por umamultiplicao de novas prticas coletivas segmentadas.

    No possvel explicar esta situao pela gerao espontnea e voluntria de novas e pontuais orientaes daao. Existem outros fatores importantes que ajudam a explicar por que tende a produzir-se esta espcie de perda dehorizontes totalizantes a que fizemos meno.

  • Em termos da sociedade global, importante assinalar as transformaes nas e das relaes sociais que seoperaram na regio nos ltimos trinta anos. Fenmenos como o da brutal transnacionalizao da economia, em termosprodutivos, distributivos e de consumo, mudaram os padres de interdependncia entre os pases centrais e osperifricos: a atual crise e os processos de reestruturao capitalista no fazem mais que aprofundar as brechas entre omundo do norte e os povos do sul. Os impactos da revoluo tecnolgica, do sistema financeiro internacional e danova lgica do capital tendem a processos de concentrao do poder inditos at agora.

    As mudanas na estrutura agrria, como o desenvolvimento industrial em vrias esferas da agricultura, amercantilizao da economia camponesa e os processos de diferenciao camponesa, nos indicam as radicaismodificaes e transformaes sofridas pela relao fazenda-comunidade, fazenda-minifndio. De outra parte, atransformao nas estruturas territoriais nacionais e, sobretudo, o acelerado processo de urbanizao, conjuntamentecom as significativas transformaes e ampliaes da ao do Estado na sociedade e na economia, do conta dafragmentao e crescente autonomia das necessidades e demandas sociais. Parece que os novos processos dediferenciao social conseguiram fragmentar as aes coletivas.

    Na realidade, a crise a que aludimos significa a decomposio do modelo unificado entre o Estado-Nao, aindustrializao econmica e a modernizao social. Poder-se-ia dizer que nos ltimos quarenta anos, o modelopraticamente no se modificou, enquanto a realidade transformou-se substancialmente. As mudanas ocorridas foramde tal envergadura que surpreenderam as expectativas prprias do modelo. Em sua nova situao e em suas prticasinovadoras, a sociedade encarregou-se de questionar este paradigma industrial, seja em sua verso populista, classistaou liberal.

    Um segundo conjunto de fatores o referido s implicaes scio-culturais das polticas autoritrias em vriospases da regio. De uma parte, a destruio ou limitao do sistema poltico e dos direitos dos cidados provocaramum certo recolhimento para a vida privada, promovendo uma valorizao das relaes primrias e as dos mbitos devida microssocial. Vrios estudos empricos do conta de casos particulares. De outra parte, estas polticas geraram umalto grau de incomunicabilidade no interior da trama das relaes sociais e entre a sociedade e os partidos polticosque, por motivos repressivos ou outros, foram-se distanciando da vida cotidiana. Precisamente quando se abrem osprocessos de transio e de revalorizao democrtica, a volta ao pblico se realiza sobre estas bases.

    A mudana das relaes entre partidos polticos e movimentos sociais constitui um terceiro fator de nossahiptese explicativa. No passado, com o predomnio de modelos partidrios classistas ou populistas, buscava-se dirigire representar as maiorias nacionais e, em nome delas, elaborar programas ou planos de ao e orientar sua conduta. Aprpria competio poltica estava limitada por estes parmetros. Hoje em dia, os estudos de caso de movimentossociais na Amrica Latina assinalam repetidas vezes que estes questionam esta relao dependente e subordinadafrente aos partidos. Obviamente, isto no nega o exerccio da prtica partidria em muitos pases, mas coloca emrelevo que a relao tende a dar-se em outros termos. Ainda haveria que explorar se, nos pases onde as aescoletivas foram muito importantes e autnomas, a presena do sistema de partidos foi frgil, e se, ao contrrio, onde osistema partidrio foi forte, as aes coletivas dos novos movimentos sociais foram pouco significativas. Em todas assituaes, entretanto, constata-se um questionamento constante do tipo de inter-relao.

    possvel identificar pelo menos trs reas recorrentes deste questionamento. Uma boa parte dos estudosrealizados indica que os novos atores coletivos, questionam o sistema partidrio de representao. Perguntas como:quem nos representas? para que nos representa? para onde nos leva esta representao? indicam uma crtica quanto noo de representao formal ou de vanguarda revolucionria, representao de alguma maneira percebida comoelitista e geralmente referida aos setores mdios: intelectuais, burocratas, polticos, profissionais, etc. Naturalmente,esta crtica no alheia a experincias histricas de intermediao nem aos efeitos polticos que tais prticas implicam.Em todo caso, este um campo escassamente estudado.

    Outro nvel de questionamento estaria relacionado com a visualizao por parte dos atores sociais de umagrande distncia entre as velhas e as novas demandas dos cidados. Frente a demandas de crescente expanso social,registraram-se frgeis respostas propositivas e de processamento por parte dos partidos polticos. Temas como os damulher ou dos direitos humanos se situariam a este nvel.

    Finalmente, em muitos casos, os partidos so percebidos em sua estrutura organizacional como grupos fechadose hierarquizados que, em sua estrutura interna, no refletem a pluralidade de identidades ou a heterogeneidade dasdemandas societais. A prtica do prendi tuti, dominante na competio eleitoral, reafirmaria esta viso. Por exemplo,alguns estudos sobre a situao do movimento operrio expressam a crtica sobre a "surdez" dos partidos polticos paracaptar a nova condio e as novas demandas da classe operria.

    Deste modo, a perda das orientaes totalizantes, a decomposio do modelo nacional-estatal industrialista, asmltiplas transformaes scio-culturais internas e externas regio e os processos de diferenciao social que os

  • acompanharam, alm das novas conotaes particularistas da ao coletiva e do crescente distanciamento entre osmovimentos sociais, partidos, e Estado, constituem os traos bsicos sobre os quais se desenvolvem as tenses e asbuscas dos novos movimentos sociais.

    Esta situao, heterognea e mutante, pode ser vista como situao de transio. Nos ltimos anos, numerososestudos foram contribuindo de diferentes ngulos para a compreenso deste fenmeno. No entanto, o que ainda noexiste uma interpretao globalizante, unificada, desta realidade segmentada e plural.

    No obstante, imprescindvel relativizar estas tendncias segundo os processos especficos de pases e sub-regies. Por exemplo, na Amrica Central, mais especificamente na Nicargua e em El Salvador, persiste a temticada revoluo social e da libertao nacional. Mesmo nesses pases contudo, segundo vrios estudos recentes, estopresentes os traos aqui assinalados, como por exemplo a valorizao da vida cotidiana, dos direitos humanos, dareligiosidade popular, da democratizao social, etc. etc. (Coraggio, 1984; Camacho, comp., 1985)

    Para finalizar, pensamos que a Amrica Latina, vista da perspectiva dos movimentos sociais, est atravessandoum momento de reconstituio, que apresenta dois elementos complementares: por um lado, a emergncia de novosatores e prticas coletivas, onde a temtica das identificaes culturais e dos padres de novas relaes sociais estoimbricados de maneira complexa com a luta pelo poder e pela hegemonia poltica; por outro lado, a transformao nasprticas dos velhos atores e sua vinculao com os novos. Esta reconstituio ocorre paralelamente com um incipientemovimento terico coletivo que, em vez de propor-se um esquema analtico para interpretar estes novos fenmenos,produz uma releitura das experincias histricas do passado. Traduzido do espanhol, por Liliana Freitas da Cunha. Bibliografia ALBO, Xavier. Bodas de plata o rquiem por una Reforma Agraria. La Paz Centro de Investigacin y Promocin del Campesinado (CIPCA),1979. (Cuadernos de investigacin, n 15) ALONSO, A. El movimiento ferrocarrilero en Mxico. Mxico, Era, 1972. ANGUIANO, A. El estado y la poltica obrera del cardenismo. Mxico, Era, 1975. ANTEZANA, Luis. Congresos campesinos y estatuto orgnico de la Confederacin Nacional de Trabajadores Campesinos (CNTCB). La Paz,Consejo Nacional de la Reforma Agraria, 1968. (mmeo) BARTRA, Roger. Caciquismo y poder poltico en Mxico. Mxico, Siglo XXI, 1975. CALDERN, Fernando. La poltica en las calles; ciudad, desarrollo y estado en Bolivia: 1952-1978. La Paz, Centro de Estudios de la RealidadEconmica y Social (CERES), 1982. ____. (comp.) Los movimientos sociales ante la crisis, Buenos Aires, Universidad de las Naciones Unidas (UNU), Consejo Latinoamericano deCiencias Sociales (CLACSO), Instituto de Investigaciones Sociales de la Universidad Nacional Autnoma de Mxico (IISUNAM), 1986. ____. & DANDLER, Jorge. Movimientos campesinos y Estado en Bolvia. In: CALDERN F. & DANDLER, J. (comps.) Bolvia, la fuerzahistrica del campesinado. La Paz, Centro de Estudios de la Realidad Economica y Social (CERES), Instituto de Investigaciones de las NacionesUnidas para el Desarrollo Social (UNRISD), 1986, p. 15-50. CAMACHO, Daniel & MENJIVAR, Rafael. Movimientos sociales en Centroamerica. San Jos, Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales(FLACSO), Universidad de las Naciones Unidas (UNU), Instituto de Investigaciones Sociales de la Universidad Nacional Autnoma do Mxico(IISUNAM), 1985. CARDOSO, Fernando & FALETTO, Enzo. Dependencia y desarrollo en America Latina. Mxico, Siglo XXI, 1969. CASTELLS, Manuel. La cuestin urbana. Mxico, Siglo XXI, 1976. Las CLASES sociales en America Latina. Mxico, Siglo XXI, Instituto de Investigaciones Sociales de la Universidad Nacional Autnoma doMxico, 1973. CEPAL. Amrica Latina: el pensamiento de la CEPAL. Santiago, Editorial Universitaria, 1969.

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