cad. terminologia 2

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    INTRODUOMETODOLOGIADAPESQUISATERMINILGICABILINGE

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    USP UNIVERSIDADE DE SO PAULOReitor: Prof. Dr. Jacques MarcovitchVice-Reitor:Prof. Dr. Adolpho Jos Melfi

    FFLCH FACULDADE DE FILOSOFIA,LETRAS E CINCIAS HUMANASDiretor: Prof. Dr. Francis Henrik AubertVice-Diretor: Prof. Dr. Renato da Silva Queiroz

    VendasLIVRARIAHUMANITAS-DISCURSOAv. Prof. Luciano Gualberto, 315 Cid. Universitria05508-900 So Paulo SP BrasilTel: 3818-3728 / 3818-3796e-mail: [email protected]://www.fflch.usp.br/humanitas

    Humanitas FFLCH/USP abril 2001

    FFLCH/USP

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    FFLCH/USP

    2001

    UNIVERSIDADE DE SO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CINCIAS HUMANAS

    INTRODUOMETODOLOGIADAPESQUISATERMINILGICABILINGE

    FRANCISHENRIKAUBERT

    ISBN 85-7506-031-7

    2aedio

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    Copyright2001 da Humanitas FFLCH/USP

    proibida a reproduo parcial ou integral,sem autorizao prvia dos detentores do copyright

    Servio de Biblioteca e Documentao da FFLCH/USPFicha catalogrfica: Mrcia Elisa Garcia de Grandi CRB 3608

    Editor ResponsvelProf. Dr. Milton Meira do Nascimento

    Coordenao EditorialM. Helena G. Rodrigues MTb n. 28.840

    Projeto Grfico e DiagramaoSelma M. Consoli Jacintho MTb n. 28.839

    RevisoSimone DAlevedo

    HUMANITASFFLCH/USP

    e-mail: [email protected]: 3818-4593

    A 889 Aubert, Francis HenrikIntroduo metodologia da pesquisa terminlogica

    bilinge / Francis Henrik Aubert 2. ed. So Paulo:FFLCH/CITRAT, 2001.

    103 p. (Cadernos de terminologia, 2)

    ISBN 85-7506-031-7

    1. Terminologia 2. Terminografia I. Ttulo II. Srie.

    CDD 20 ed: 418

    A srieCadernos de Terminologia uma publicao do CITRAT Centro Interdepartamentalde Traduo e Terminologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da Univer-sidade de So Paulo.

    A constituio da normalizao terminolgica no Brasil n. 1

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    SUMRIO

    Apresentao ................................................................................. 7

    Introduo ..................................................................................... 11

    Captulo IConceituao e delimitao da terminologia .................................. 23

    Captulo IIProcedimentos bsicos da terminologia as fontes ....................... 37

    Captulo IIIProcedimentos da pesquisa pontual ................................................ 47

    Captulo IVProcedimentos da pesquisa temtica .............................................. 59

    Captulo VO registtro de dados terminolgicos ............................................... 73

    Captulo VICaminhos alternativos para a pesquisa terminolgica bilinge ..... 91

    Referncias bibliogrgicas ........................................................... 101

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    APRESENTAO

    A srie Cadernos de Terminologia, publicao do CITRAT(Centro Interdepartamental de Traduo e Terminologia), chega aoseu segundo nmero.

    Esta srie corresponde, cronologicamente, terceira publica-o apresentada pelo CITRAT. A revista TradTerm, de carter anual,tem como objetivo acolher trabalhos de pesquisadores e de profissi-

    onais vinculados traduo e terminologia. OBoletim do CITRAT,visando a preencher uma lacuna nessas duas reas, procura contri-buir para o intercmbio gil de informaes a respeito de pesquisasem andamento, de eventos e de experincias concernentes s ativi-dades terminolgicas e tradutolgicas. Complementando essas duaspublicaes, Cadernos de Terminologia pretende divulgar trabalhosterico-metodolgicos, e tambm prticos, que tenham como objetode anlise a terminologia de carter mono-, bi- e plurilngue.

    Neste segundo nmero, apublicao Cadernos de Terminolo-gia apresenta o trabalhoIntroduo metodologia da pesquisa ter-minolgica bilnge. De autoria do Prof. Dr. Francis Aubert, profes-sor titular junto ao Depto. de Letras Modernas da Faculdade de Filo-sofia, Letras e Cincias Humanas da Universidade de So Paulo, otrabalho , como enfatiza o autor, fruto de sua atuao didtica e desua pesquisa, constante e sistemtica, no mbito do Curso de Espe-cializao em Traduo ministrado na referida faculdade.

    Introduo metodologia da pesquisa terminolgica bilngueretrata, assim, de forma didtica e bastante clara, as reflexes doautor a respeito de duas disciplinas que, embora distintas em relaoao carter epistemolgico e ao objeto de estudo, freqentemente vem

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    seus caminhos cruzarem-se no momento do trabalho prtico: a tra-duo e a terminologia.

    De carter multidisciplinar, a terminologia estabelece, com atraduo, relaes extremamente ntimas, pois, no exerccio de suasatividades, tradutores de textos tcnico-cientficos necessitam con-sultar trabalhos resultantes da prtica terminolgica, sejam eles mono,bi- ou mesmo plurilngues: glossrios, dicionrios terminolgicos,bases de dados terminolgicos, entre outros produtos.

    Nem sempre, no entanto, esses trabalhos terminolgicos es-to disponveis no mercado. Se algumas reas sobretudo as relati-vas s tecnologias de ponta dispem de mais obras publicadas, certo que nem sempre esses trabalhos so elaborados com uma me-todologia adequada. Desse modo, as lacunas existentes em relao avrias reas e sub-reas, alm de tornarem mais rdua e penosa atarefa tradutolgica, conduzem, inevitavelmente, a uma proliferaode termos, pois um tradutor v-se levado a tomar decises pessoais(criando um termo vernculo, adaptando-o ou adotando o termo es-trangeiro), nem sempre coincidentes com as de outros tradutores oude outros profissionais da subrea analisada.

    Expondo, assim, os vrios momentos em que se cruzam oscaminhos da terminologia e da traduo, o trabalho Introduo metodologia da pesquisa terminolgica bilngue apresentado emseis captulos, antecedidos de uma introduo. Nesta, o autor apre-senta toda a problemtica que envolve o trabalho da traduo tcnicaem suas relaes com a terminologia. No primeiro captulo, Francis

    Aubert define terminologia, conceito polissmico, e mostra os limi-tes dessa disciplina frente a outras disciplinas conexas, como alexicologia, a lexicografia, a semntica. Enfatiza, nos trs captulosseguintes, os procedimentos bsicos do trabalho terminolgico: asfontes, a pesquisa pontual e a pesquisa temtica. O quinto captulo dedicado sistematizao dos procedimentos de registro dos dadosterminolgicos, tendo em vista a possibilidade de intercmbio entreos pesquisadores e os produtos de suas pesquisas e ainda a integraodesses trabalhos em grandes bancos de dados terminolgicos. Porltimo, no sexto captulo, o autor apresenta algumas outras possibi-

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    lidades de pesquisa terminolgica bilnge, baseadas na compila-o de dados em materiais lexicogrficos j existentes. A publicaooferece, portanto, um painel representativo das distintas etapas dotrabalho terminolgico.

    Assim, ao contribuir, muito oportunamente, para a apresenta-o da metodologia da pesquisa terminolgica de carter bilnge,este trabalho contempla tambm a metodologia relativa a trabalhosterminolgicos monolnges, indispensveis para a busca dos equi-valentes nos trabalhos bilnges ou plurilnges. E, por preencheressas lacunas, Introduo metodologia da pesquisa terminolgicabilnge constitui obra de consulta indispensvel a todos os quedesenvolvem trabalhos em traduo e em terminologia.

    Ieda Maria Alves

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    INTRODUO1

    Os estudos terminolgicos e os estudos da traduo constitu-em disciplinas autnomas entre si. A terminologia, enquanto campode investigao, entretm relaes estreitas com a lexicologia, a le-xicografia e a semntica, embora no se confunda com estas nemconstitua simplesmente uma subrea das mesmas, e seu estatuto derea de aplicao da lingstica e/ou da sociolingstica parece

    inquestionvel. A tradutologia, por sua vez, tem por objetivo a an-lise de um fenmeno complexo, ao mesmo tempo lingstico,sociocultural, histrico, esttico, poltico e individual. Deste modo,a tradutologia extravasa os limites da lingstica ou da literatura com-parada (que constituem, historicamente, suas duas matrizes tericasiniciais) e tende a confundir-se, em mltiplos aspectos, com o per-curso e a aventura do Homem, enquanto ser cultural, necessitando,para seu adequado enquadramento, do recurso a todo o conjunto dascincias deste mesmo Homem.2

    1 Uma primeira verso desta introduo foi elaborada pelo autor como prova es-

    crita para o concurso de livre-docncia na rea de Estudos Tradutolgicos,FFLCH/USP, em dezembro de 1991. Em uma segunda verso, este texto foipublicado naRevista Alfa, n. 36, UNESP, 1992, sob o ttulo Problemas e urgn-cias na inter-relao terminologia/traduo. Na presente verso, alm de pe-quenas alteraes de natureza estilstica, acrescentaram-se as consideraes es-pecficas sobre o papel da lngua inglesa como um tertiusterminolgico e tradu-tolgico.

    2 A distino aqui proposta confessadamente de natureza mais didtica do queessencial. A terminologia, embora focalize subconjuntos restritos do lxico decada idioma, precisamente por tratar-se de uma disciplina lingstica contm,em si, ainda que de forma menos evidente do que a teoria e a prtica tradutrias,aspectos que remetem pragmtica, antropologia, s culturas. Como transpa-

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    No entanto, se, na sua epistemologia e no seu objeto de estu-dos, a terminologia e a traduo abarcam e se conduzem por cami-nhos distintos, nofazertradutrio bem como nofazerterminolgicoesses mesmos caminhos se cruzam e se entrecruzam. Com efeito,como afirma Galinski (1985), translators are probably the largestidentifiable individual user group for terminologies[...]Ou seja, ostradutores profissionais apresentam-se como um dos principais gru-pos de usurios finais dos produtos da pesquisa terminolgica (glos-srios, dicionrios tcnicos, bases de dados terminolgicos etc.).Nessa perspectiva, cabe aos estudos terminolgicos gerarem essesprodutos, com base em metodologias adequadas, proporcionando re-cursos confiveis para o exerccio da tarefa tradutria.

    Mas as relaes traduo/terminologia no se estabelecem, narealidade cotidiana, de maneira to simples, direta e unidirecional. A

    traduo mesmo limitando as presentes consideraes sua moda-lidade interlingual, no sentido de Jakobson (1969) to antigacomo os primeiros contactos entre povos de lnguas distintas. A ter-minologia, entendida como estudo descritivo e sistematizador(padronizador) dos vocabulrios das lnguas de especialidade, cons-titui rea de estudos relativamente recente e a produo de materiaisterminolgicos, particularmente em forma bilnge, ainda, emmuitos domnios, apenas incipiente.3Dispe, verdade, de uma gamade metodologias testadas e cujos frutos parecem indicar a sua ade-quao. Mas, como se procurar caracterizar no que segue, as di-menses, a complexidade e a urgncia das tarefas a serem executa-das podem exigir a adoo ainda que temporria de caminhosalternativos, de atalhos, mesmo que precrios.

    Com efeito, a contribuio da terminologia descritiva prti-ca tradutria constitui, ainda, um projeto em curso e, nesse contexto,

    recer mais adiante, mesmo a terminologia tcnico-cientfica no infensa srefraes de ordem cultural, de viso-de-mundo (vide, tambm, Azenha, 1994).

    3 Embora a reflexo ora apresentada tenha como pano de fundo a percepo e avivncia dos problemas terminolgicos colocados para a traduo de/para a ln-gua portuguesa, particularmente na sua variante brasileira, ela se aplica, mutatismutandis, a qualquer outra constelao lingstica.

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    a relao entre as reas nem sempre se d de maneira benfica, querpara a traduo, enquanto usuria da terminologia, quer para a pr-pria terminologia.

    Nota-se, de imediato, nos materiais terminolgicos dispon-veis, a existncia de sensveis lacunas na descrio do uso mono- ebilnge, que afetam determinados idiomas como um todo ou, mes-mo em situaes mais favorveis, determinadas reas do saber e dofazer, lacunas essas que prejudicam o exerccio adequado da tarefatradutria de e/ou para determinadas lnguas ou entre determinadospares de lnguas. Em termos monolnges, a falta de descries esistematizaes mais exaustivas e validadas pelos usurios tende agerar a proliferao de termos, por meio de solues ad hocvari-veis de usurio para usurio (especialista ou no), de entidade paraentidade, de regio para regio, resultando, ao final, em um verda-

    deiro emaranhado de dialetos de especialidade, para os quais os es-tudos dialetolgicos ainda esto a dever uma maior ateno. Assim,por exemplo, o Conselho Nacional do Carvo do Reino Unido cons-tatou que, dos 400 termos tcnicos utilizados na Inglaterra para osobjetos, ferramentas, profisses e processos da extrao do carvopertinentes da boca da mina para dentro, 300 so suprfluos, en-quanto reduplicaes, sinnimos e parassinnimos dos 100 termosbsicos que, idealmente, dariam conta da realidade a ser denomina-da (Pinchuck, 1977). Os diversos usurios da lngua francesa dis-pem de 14 termos diferentes para designar a prateleira de ovos deuma geladeira de uso domstico.4E, para trazer a questo para nossa

    prpria realidade, a julgar pelos classificados dos jornais, imperauma certa vaguido de conceitos no setor imobilirio, entre terre-no, chcara, stio e fazenda.

    As conseqncias prticas de tal estado de coisas para a tradu-o e, mais particularmente, para o tradutor, so variadas. Gera-se anecessidade suplementar de adquirir, para alm de um conhecimen-to terminolgico bsico, um certo domnio dos seus principais diale-tos e registros. Requer-se, o que nem sempre factvel, a identifica-

    4 Apud R. Dubuc, depoimento pessoal (1987).

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    o mais precisa do subgrupo de destinatrios mais diretamente vi-sados, para a adequao dialetal do texto. E reduz-se, por vezes sen-sivelmente, a fiabilidade da sempre recomendada consulta ao espe-cialista, pois o consultor a que o tradutor tiver acesso pode no com-partilhar das preferncias terminolgicas dialetais dos efetivos des-tinatrios da traduo em pauta.

    As lacunas e inadequaes dos materiais terminolgicos bi-lnges, por sua vez, so de pelo menos duas naturezas distintas. Emum primeiro aspecto, constata-se a existncia, nas relaes cientfi-cas, tecnolgicas e culturais interpovos, de binmios mais ou menosprivilegiados, isto , de contactos mais ou menos intensos que justi-ficam, ou, pelo menos, explicam, a existncia de uma razovel quan-tidade de materiais terminolgicos para a relao ingls francs,francs italiano, espanhol ingls, e similares e, inversamente,

    uma franca pauperidade para relaes que envolvam, em um de seusplos, idiomas que no compartilham de tais relaes privilegiadas,como o caso da lngua portuguesa, por exemplo. Acresce, aqui,que os materiais disponveis freqentemente se concentram em umadeterminada direo tradutria (por exemplo, a relao inglspor-tugus em detrimento da relao inversa portugus ingls), nemsempre espelhando, nessa discrepncia, uma correlao efetiva coma real demanda por informaes terminolgicas confiveis.

    Um segundo aspecto problemtico que cabe ressaltar prende-se ao fato de que, ao contrrio do que no apenas o leigo mas, certa-mente, a maioria dos seus prprios usurios imagina, as lnguas de

    especialidade no usufruem de qualquer privilgio em relao lin-guagem dita comum em termos de biunivocidade, quer na relaonoo/termo (ou seja, significado/significante) quer na relao ter-mo da lngua X / termo da lngua Y: em primeiro lugar, porque oconceito de lnguas de especialidaderefere-se no apenas ao lxicoespecfico das tecnologias ditas de ponta mas a todo domnio dofazer humano, englobando, portanto, atividades domsticas como oartesanato, culinria, reas por definio especficas de cada corpopoltico (direito e jurisprudncia) etc., etc. cada qual, a seu modo,portadora de fortes marcadores culturais, individualizadores inter- e

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    intralingualmente; em segundo lugar, porque nem mesmo nas referi-das tecnologias de ponta, a universalidade conceptual e, eventual-mente, designativa, constitui uma norma geral. Aqui, como em qual-quer outro tipo de discurso, variam as vises-de-mundo e variam osreferentes: a fibra de vidro, embora de idntica composio fsico-qumica, no tem as mesmas aplicaes em um pas tropical e emum pas subpolar; o aparelho eletrnico de ltima gerao no serconfigurado da mesma maneira em um pas com tenso eltrica uni-forme e constante e em outro com tenso eltrica varivel e incons-tante.

    Da sobreposio desses dois aspectos adquire-se, ainda, a per-cepo de que os graus de dizibilidade interlingual no so equiva-lentes, ou seja, no independem da direo tradutria. Em uma rela-o lingstica, cultural, tecnolgica, econmica e poltica entre duas

    partes em que as correlaes de foras no so equilibradas, perce-be-se, claramente, a possibilidade maior de dizer a alteridade daparte mais forte dentro do contexto lingstico-cultural da parte maisfraca, e a possibilidade sensivelmente menor na direo inversa. Essefato manifesta-se, por exemplo, na utilizao relativamente comumde emprstimos(isto , de termos mantidos em sua forma lingsticaoriginal) na traduo tcnica do ingls para o portugus, como subs-titutivo aceitvel, para o usurio final do texto traduzido, do equiva-lente vernculo, desconhecido do tradutor ou, mesmo, efetivamenteinexistente, enquanto que a aplicao do mesmo recurso no sentidoinverso (portugusingls) apresenta uma incidncia menor e, quan-

    do utilizado, ser portador de uma outra inteno comunicativa (in-dicao de peculiaridade cultural, exotismo e similares).

    A esse propsito, h um outro elemento a considerar: o papelespecfico da lngua inglesa na comunicao global, que, indepen-dentemente das vicissitudes geopolticas e econmicas dos diversospases anglo-saxnicos, configura-se como o latim(para alguns, osabir) das relaes internacionais contemporneas. Com efeito, oingls deixou de ser propriedade exclusiva dos pases anglo-saxnicos e ex-colnias. O ingls da interao poltica, econmica,cultural e tcnico-cientfica o ingls de todos e de cada um dos

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    participantes de tal interao, muitos dos quais certamente a maio-ria no tm nele seu idioma materno.

    Tal fato traz duas conseqncias mais evidentes para a termi-nologia multilnge e para a prtica tradutria. De um lado, tende ainstitucionalizar o processo de triangulao, pelo qual o tradutorenvolvido em um trabalho entre dois idiomas quaisquer recorre a umterceiro idioma (usualmente o prprio ingls) como ponto de passa-gem, de contacto, entre a lngua de partida (LP) e a lngua de chega-da (LC). Assim, por exemplo, uma traduo de uma patente norue-guesa para o portugus dificilmente se viabiliza sem recorrer, emvrios momentos, a uma dupla consulta terminolgica noruegusingls + inglsportugus. A despeito dos riscos evidentes, decor-rentes da inevitvel dupla filtragem e das mltiplas cadeias associa-tivas no-coincidentes envolvidas o que sempre motivou fortes

    crticas a tal procedimento, no totalmente desconhecido mesmo narea da traduo editorial, quando a lngua de partida e/ou de chega-da faz parte dos idiomas tidos por exticos a perda do carter na-cional do ingls favorece, em um primeiro momento, sua assunode canal privilegiado para a comunicao interlingual e intercultural.Transforma-se, deste modo, o mal necessrio em um instrumentoefetivo de trabalho.

    De outro lado, porm, a generalizao do ingls como lnguade trabalho internacional contm, em si, o germe de novos riscos.Para manter a analogia com a antiga Roma, o Ingls Vulgar passa,atualmente, pelo mesmo processo de diferenciao que caracterizou

    o seu antecessor no mesmo papel, o Latim Vulgar. Com efeito, jno se trata mais de mero chiste falar de umFrench English, de umBrazilian English etc., ao lado de um Indian English, CarribeanEnglish, Australian Englishe outros tantos, mas de uma evidenterealidade, os termos do ingls universalizado assumindo, em cadaespao cultural, valores prprios que se contrapem prpria uni-versalizao pretendida.5Subsistem pois, ainda que sob novas facetas,

    5 Assim, por exemplo, o termo marketing, inserido em um texto em portugusbrasileiro (por exemplo, na composio propaganda e marketing), no tem amesma extenso de sentido do termo homgrafo em ingls.

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    os riscos intercomunicabilidade, talvez mais graves porque de cer-to modo mais eficientemente mascarados. E justificam-se, at commaior nfase, os trabalhos de terminologia descritiva bilnge quepermitam efetuar a comunicao interlingual de forma direta, isto ,sem recorrer ao tertiusingls.

    J na sua vertente sistematizadora (ou padronizadora) a termi-nologia esbarra, novamente, na constatao de que as lnguas de es-pecialidade, como qualquer outro registro de qualquer idioma, com-partilham da natureza multifacetada e permanentemente varivel daslnguas, no tempo e no espao. Essa variao decorre no apenas demodismos, da criao simultnea de objetos e processos, da por ve-zes algo inadequada capacitao lingstica daqueles que, na pes-quisa, na indstria, no comrcio e em qualquer outra atividade hu-mana exercem o papel de denominadores das novas noes e con-

    ceitos, mas, o que talvez seja de natureza mais essencial para a ques-to aqui discutida, do fato de que a comunidade dos usurios dosjarges no monoliticamente constituda, no social e cultural-mente uniforme. Pelo contrrio, constituem esses participantes so-ciais e lingsticos subgrupos com pressupostos, intenes e moti-vaes bastante distintas, o que, cedo ou tarde, acaba por conduzir aexpresses lingsticas diversificadas que retratam tal diferenciao.Afora algumas poucas reas privilegiadas de relativo consenso6(sis-tema mtrico universal, terminologia bsica da qumica, uso de razese afixos gregos na terminologia mdica) efetivamente invivel in-sistir em obter um comportamento terminolgico7idntico do enge-

    nheiro de projetos, do operrio da linha de montagem, do publicit-rio e do vendedor, do funcionrio da oficina ou centro de assistnciatcnica, autorizada ou no, do usurio final do produto. Assim, o

    6 Mesmo nestas, insista-se, o consenso relativo. Ainda que o modelo bsico dosistema mtrico universal seja, por definio, idntico de pas a pas, em situa-o efetiva de uso, as flutuaes so inmeras. O que no Brasil o consumidoradquire por mililitros e por gramas em outras paragens adquirido por decilitrose por hectogramas, por exemplo. Nem a boa e velha aritmtica escapa destasflutuaes: nos pases escandinavos, o sinal indica subtrao e no diviso.

    7 Parte integrante do comportamento verbal como um todo.

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    esforo de padronizao terminolgica que no levar esse dadosociolingstico em devida considerao e, ao menos no caso bra-sileiro, essa parece ser a situao correr o risco de cair no vazio,de tornar-se letra morta.

    Depreende-se, do que precede, que a situao das terminolo-gias, em termos de sua adequada descrio e sistematizao, aindaest longe de ter atingido nveis satisfatrios. Depreende-se, ainda,que as variveis algo complexas envolvidas tornam a tarefa dos es-tudos terminolgicos um processo a ser conduzido a longo prazo. E,no entanto, percebe-se, igualmente, a sua urgncia.

    De fato, a ausncia de estudos terminolgicos descritivos esistematizadores em nmero e grau de confiabilidade suficientes tornao operador do ato tradutrio um fator ainda que involuntrio deincremento da situao catica, da proliferao desordenada das ter-minologias. Como sugere Hoof (1982), diante das lacunas, das in-formaes desencontradas, o tradutor, muitas vezes leigo no dom-nio referencial do texto que traduz,8v-se compelido improvisa-o, a produzir uma interlnguaterminolgica, que nem sempre des-loca mas, apenas, acrescenta-se ao uso terminolgico anteriormenteexistente.9

    Diante desta realidade, o presente trabalho, fruto da atuaodidtica e de pesquisa do autor desenvolvida no mbito do Curso deEspecializao em Traduo da Faculdade de Filosofia, Letras e Cin-cias Humanas da Universidade de So Paulo, pretende propormetodologias e abordagens que permitam, tanto ao estudioso da tra-

    duo e/ou da terminologia quanto aos seus praticantes, a elabora-o de materiais terminolgicos monolnges e, particularmente, bi-lnges com relativa segurana e com resultados suficientemente fi-dedignos para proporcionarem instrumentos de trabalho que neutra-

    8 Conforme deixa a entender Hoof, esse problema no caracterstico apenas desociedades ditas em desenvolvimento.

    9 Na vivncia do autor, essa improvisao nem sempre se d apenas como dis-farce de uma efetiva incompetncia mas chega a ser solicitada, estimulada pe-los receptores do texto traduzido.

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    lizem, ao menos em parte, a aludida situao de caos e confuso queos usurios da traduo tcnica e os usurios das diversas lingua-gens de especialidade enfrentam em suas atividades cotidianas.

    * * *

    Embora j incipientes em anos anteriores, os estudos termino-lgicos na Universidade de So Paulo conheceram um impulso maisefetivo aps a realizao de um Curso de Atualizao, ministradopelo terminlogo canadense Robert Dubuc, em 1987, na Faculdadede Filosofia, Letras e Cincias Humanas. Apesar de constantes atua-lizaes e adaptaes realidade terminolgica brasileira, inclusives conseqncias metodolgicas de tal realidade, o presente textoinspira-se, em grande parte, no roteiro proposto no livro de Dubuc,

    Manuel Practique de Terminologie.Registro, aqui, a dvida para coma referida obra, que o presente trabalho de forma alguma substitui,mas, talvez, possa pretender complementar (ou aclimatar), em al-guns aspectos pertinentes.

    Francis Henrik Aubert

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    CONCEITUAOEDELIMITAODATERMINOLOGIA

    1. Generalidades

    Os progressos em todos os campos e setores de atividade hu-mana, inclusive a disseminao de conhecimentos e de tecnologias,

    dependem, em grande medida, da existncia de terminologias ade-quadamente construdas em todas as lnguas de e para as quais sepretenda efetuar uma transferncia de conhecimentos e de tecnologia.

    Observa-se, com efeito, uma crescente necessidade de maiorpreciso no trabalho terminolgico, visto que as terminologias cons-tituem a base de:

    a o ordenamento do conhecimento (ou seja, a classificaoconceptual de cada disciplina cientfica ou ramo de atividade huma-na);

    b a transferncia de conhecimentos e de know-howtecnolgico;

    c a formulao e disseminao de informaes especializa-das (redao e publicao cientficas);

    d a transferncia de textos cientficos para outros idiomas(pela traduo e pela interpretao);

    e a armazenagem e recuperao de informao especializa-da (por meio de linguagens de busca, tesauri, ndices, classificaes,inclusive bancos de dados eletrnicos).

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    O nmero relativamente reduzido de pesquisadores brasilei-ros ativamente engajados na rea e sua disperso em mtodos, abor-dagens e procedimentos distintos constituem circunstncias que secontrapem imensido das necessidades sociais no mbito da ter-minologia. De fato, so facilmente detectveis, nos universos acad-mico e profissional, situaes caticas na nomenclatura dos objetos,conceitos e processos dosabere dofazer, situaes essas que contri-buem, de maneira acentuada, ao travamento e gerao de rudo nacomunicao, resultando em distores que tm, potencial e efetiva-mente, um elevado custo representado por desperdcios no processode transmisso do conhecimento, tanto entre os interlocutores locaisquanto nas relaes comunicativas internacionais. A tal configura-o acrescenta-se uma nova necessidade, de natureza no apenas lin-gstica mas, fundamentalmente, poltica, decorrente da adeso de

    Portugal Unio Europia. Um dos resultados desta integrao eu-ropia, envolvendo um pas de lngua portuguesa, poder ser o esta-belecimento de relaes de equivalncia terminolgica entre esta ln-gua e as demais lnguas europias com base na norma lusitana. Ofato de tal estabelecimento de equivalncias dar-se no mbito dossistemas informatizados de traduo e terminologia organizados eempregados pelos organismos supranacionais da Comunidade Eu-ropia acabar, previsivelmente, por assegurar sua ampla difuso,dificultando, ainda mais, a interao entre essas lnguas e o portu-gus do Brasil.

    2. Os conceitos de terminologia

    2.1 Terminologia-objeto e terminologia-instrumento

    O conceito de terminologiarecobre pelo menos duas acepesdivergentes, que incumbe desde j distinguir. De um lado, pode refe-rir-se ao conjunto de termos caractersticos de determinada rea ousubrea a terminologia da Qumica, a terminologia da QumicaIndustrial, a terminologia do Futebol. De outro, pode designar o es-

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    tudo de tais terminologias, o conjunto de pressupostos, mtodos erepresentaes que permitem a descrio das linguagens ditas deespecialidade.1Ser nesta segunda acepo que o termo vir empre-gado neste trabalho, reservando-se para o primeiro sentido os desig-nativos vocabulrioou linguagem de especialidade. No primeirocaso, trata-se da terminologia-objeto; no segundo, da terminologia-instrumento.

    Observa-se, com efeito, que em cada setor de atividade huma-na, profissional ou no, ocorre a necessidade de gerar e nomear con-ceitos e noes especficas da atividade e desenvolvem-se hbitoslingsticos prprios, por vezes idiossincrticos, que, em conjunto,tipificam o que com certa freqncia, embora algo impropriamente,se designa porjargo.

    Tais jarges, ou linguagens de especialidade, so observveiscomo parte integrante do comportamento lingstico do Homem noexerccio de qualquer atividade, desde a industrial e cientfica at aartesanal e domstica. Por linguagem de especialidade entende-se,genericamente, o conjunto de marcas lexicais, sintticas, estilsticase discursivas que tipificam o uso de um cdigo lingstico qualquerem ambiente de interao social centrado em uma determinada ativi-dade humana. Nestes termos, a terminologia, enquanto instrumentodescritivo, tem por objeto de estudo um dos componentes essenciaisdas chamadas linguagens de especialidade: o seu lxico.

    2.2 A especificidade da terminologia frente lexicografia

    2.2.1 Natureza

    Em vista do que foi exposto no item anterior, a terminologiaaparenta constituir uma subdiviso da lexicografia. Com efeito, ambasessas disciplinas tm por objeto o componente lexical e dos esforostanto da terminologia quanto da lexicografia resultam materiais de

    1 Do inglsLanguage for Special Purposes(LSP).

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    consulta bastante similares em sua designao: vocabulrios, glos-srios e dicionrios.

    Por sua natureza, a terminologia e a lexicografia so discipli-nas estreitamente aparentadas. Ambas constituem prticas cujamatria-prima so as palavras. No entanto, se observarmos mais deperto essas duas prticas, ficam tambm evidentes as suas caracte-rsticas especficas, que as individualizam.

    Trata-se, aqui, primordialmente, de uma questo de ponto-de-vista. A lexicografia considera as palavras enquanto parte do lxico,ou seja, como fazendo parte do conjunto de unidades de que umadeterminada comunidade dispe para se comunicar por intermdioda lngua. J a terminologia considera as palavras enquanto um con-junto delimitado por uma situao concreta de utilizao.

    2.2.2 Situao

    Deste modo, a terminologia evita em grande parte os proble-mas da lexicografia, que tem por tarefa dar conta do lxico da lnguacomo um todo. Em terminologia, a situao sempre dominante.No se trata, portanto, de atingir a universalidade; o que se faz ne-cessrio identificar o contedo conceptual especfico da situaoem que a palavra encontra-se integrada. constatao empiricamentefcil de se fazer que cada palavra assume como que uma coloraoespecial no seu emprego em situao. Este contedo nocionalconotado pela situao de importncia para o terminlogo. Aterminologia visa a dar do vocabulrio que investiga uma imagemreal, no virtual.

    Visto deste modo, no deve ser difcil perceber que a termino-logia tenderia, ao menos em sua essncia primeira,2 denominao,

    2 Esta distino, entre um procedimento semasiolgico e um procedimentoonomasiolgico, freqentemente utilizada na bibliografia (vide, por exemplo,Dubuc, 1978) como o principal trao distintivo lexicologia/terminologia. Narealidade, a distino se sustenta somente na gnese terminolgica, ou seja, no

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    isto , parte da apreenso nocional para identificar a designao doconceito apreendido. J a lexicografia procede, sistematicamente,em sentido inverso, buscando as definies dos signos identificados.

    2.2.3 A situao no se limita realidade extra-lingstica

    No discurso terico-metodolgico da terminologia, observa-se, por vezes, uma tendncia a confundir a situao de uso com asituao extra-lingstica (das coisas a serem nomeadas), o que in-duz ao pressuposto de que essa situao extra-lingstica que es-trutura o vocabulrio de especialidade, pressuposto esse que deriva, evidente, do entendimento da terminologia como sendo de cartereminentemente onomasiolgico. Justifica-se, deste modo, a posturanormativista dos estudos terminolgicos.

    A observao emprica das lnguas de especialidade, particu-larmente em seus confrontos bilnges e multilnges, no entanto,sugere ser essa uma caracterizao muito restritiva do conceito desituao, e, mesmo, dos conceitos de lngua e de linguagem, queevoca, em alguns aspectos, o conceito ingnuo de lngua, comomero reflexo da realidade tangvel e no o que efetivamente , oconstituidor privilegiado (ainda que no exclusivo) da percepo darealidade (tangvel ou intangvel). A situao de uso, na terminolo-gia descritiva que aqui se propugna, engloba a realidade percebida(e, portanto, pr-moldada lingstica e antropologicamente) e a pr-tica lingstica dos usurios da lngua de especialidade, sem des-

    cartar suas eventuais incongruncias lgicas, suas marcas cultu-rais, regionais e socioletais, suas idiossincrasias, reduplicaes sino-nmicas, as relaes sociais e hierrquicas entre os diversos usuriosetc., etc.

    momento da criao do termo ou da propositura de uma soluo neolgica paraum problema especfico de designao, tpicos da abordagem pontual (videadiante, Cap. III). Na abordagem temtica (vide adiante, Cap. IV), bem como naterminologia bi- e multilnge, a distino bem menos clara, ocorrendo fre-qentes inverses de prioridade no procedimento bsico, condutor e deixandoportanto, de constituir trao distintivo pertinente.

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    Assim, por exemplo, o conceito desaneamentoaplica-se, noportugus brasileiro, tanto Engenharia Ambiental como um todocomo, especificamente, ao Tratamento de Efluentes. J em francs,o termo equivalente assainissementsomente utilizado no contextoespecfico de coleta de guas servidas (esgotos), isto , a uma partedo Tratamento de Efluentes que, em portugus (mas no em fran-cs), inclui as guas pluviais. Em francs, no faz sentido sanear oambiente, mas, to somente, administrar ou acomodar (am-nager).3

    Deste modo, se h uma estruturao, esta se d a partir de todoesse complexo de variveis, lingsticas e extra-lingsticas, e noapenas de uma realidade extra-lingstica divorciada da lingua-gem. Esta no apenas a representa ou a reflete, mas, de certo modo,a institui.

    2.2.4 Metodologia de trabalho

    2.2.4.1 Seleo dos termos

    Em funo da orientao especfica da terminologia, a sele-o dos termos que constituiro o objeto de seu estudo no serconduzida da mesma forma que para a elaborao de um dicionriogeral da lngua.

    Para a terminologia, trata-se de determinar, em um primeiromomento, se o termo pertence ao vocabulrio da rea estudada e aoquadro definido para a pesquisa. Uma investigao focalizando ovocabulrio da indstria metalrgica reunir os termos que, na situ-ao de pesquisa, referem-se a esse setor, ou a um aspecto restrito domesmo, ou, ainda, a disciplinas vinculadas mesma.

    Na tica do lexicgrafo, a seleo ser efetuada em funo dovalor semntico dos termos. Quanto mais rico for o contedo se-

    3 Devo o exemplo a Da (1996).

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    mntico do termo, maior o seu interesse. A lexicografia procura apre-sentar um perfil completo do termo. A palavra interessante emfuno de seu sentido, e o domnio de sua aplicao passa a segundoplano.

    Assim, na srie

    ferro de passar, ferro de soldar, ferro de verruma

    o lexicgrafo ter sua ateno chamada pelo sentido da palavraferroem cada um desses sintagmas. O terminlogo somente se interessarpor um ou mais desses termos na medida em que puder identific-los como etiquetas para uma determinada realidade a ser denomi-nada.

    2.2.4.2 Identificao das unidades lexicais e terminolgicas

    A abordagem aqui proposta conduz a uma distino entre uni-dade terminolgicaeunidade lexical. A unidade terminolgica estan-do vinculada necessidade de exprimir as realidades especficas deuma tcnica ou de uma cincia, numa situao concreta de funciona-mento, englobar, muito freqentemente, mais de uma unidade lexi-cal (isto , mais de uma palavra), constituindo uma forma sintagmti-ca e o prprio sintagma ser no raro menos lexicalizado do que as

    chamadas palavras compostas.Observe-se, no entanto, que haver sempre um certo nvel de

    lexicalizao. No seria cabvel considerar uma construo do tipo

    elemento propulsor para embarcaes de baixo calado

    como uma unidade terminolgica, configurando, antes, uma defini-o do que um elemento de vocabulrio.

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    2.2.4.3 Anlise

    A anlise faz parte integrante da investigao terminolgica

    tanto quanto da lexicogrfica, mas o seu encaminhamento percorrevias bastante diversas. A anlise lexicogrfica prope-se delimitar asuperfcie nocional de um termo, identificar todos os seus sentidos,de modo a estabelecer o seu perfil semntico, tendente a apresen-tar-se bastante complexo e multifacetado. O processo todo da anli-se resulta na elaborao de uma definio, que deve ser semantica-mente equivalente unidade estudada. Nesta perspectiva, o exemplono passa de uma ilustrao da definio.

    Para a terminologia, a etapa de anlise visa permitir preenchersemanticamente os termos identificados na etapa do levantamentoou, inversamente, designar com um termo os contedos nocionais

    identificados como unitrios. a situao que interessa ao termin-logo. a situao que identifica o domnio de utilizao do termo, asmodalidades e condies de seu emprego. a situao que fornece-r os elementos nocionais que permitem associar designao umcontedo semntico apropriado, quer para encontrar um correspon-dente em outra lngua, quer para proporcionar a denominao ade-quada do objeto a ser nomeado. Na ausncia de traos concretosprecisos, a situao fornecer co-ocorrncias reveladoras do contex-to do termo estudado.

    O processo analtico da terminologia visa, pois, a identifica-o de um contedo nocional ou, na falta deste, de uma utilizao

    funcional. Mais importante do que definir discutvel se a defi-nio tarefa do terminlogo ou do especialista de assunto identificar os traos semnticos mais pertinentes: natureza como; finalidade para que serve; funo como funciona; ma-terial do que feito; ou, ainda, os empregos caractersticos, ostorneios de frase especficos do vocabulrio empregado na situa-o em estudo.4

    4 Para uma discusso mais ampla sobre o problema da definio em terminologia,vide, entre outros, Dubuc, 1985, e Sager, 1990.

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    Para o terminlogo, o contexto no constitui mera ilustraode uma definio inferida a partir de um grande nmero de contex-tos exaustivamente coligidos, e sim o veculo dos traos semnticoscaractersticos que permitem associar termo e conceito em uma situ-ao precisa.

    Em conseqncia, a unidade de informao tambm dife-rente: enquanto para a lexicografia o verbete de dicionrio, para aterminologia afichaterminolgica. E, para o especialista chamadoa definir ou a padronizar os termos de sua rea de conhecimento, asfichas terminolgicas constituiro, em conjunto, um dossi deembasamento para a sua interveno.

    2.2.4.4 A unidade de informao

    Como ficou sugerido, o verbete de dicionrio visa reconstituiro perfil semntico da unidade lexical. O verbete formulado de acordocom uma certa estratgia pedaggica: pretende ensinar ao leitor o(s)sentido(s) da palavra. A definio constitui, assim, componente es-sencial do verbete, ao qual se acrescentam, conforme o caso, obser-vaes de ordem gramatical, etimolgica etc. Os sentidos definidosso hierarquizados, segundo critrios histricos, lgicos ou, por ve-zes, de freqncia. Os exemplos fornecidos ilustram os diversos sen-tidos. O prprio verbete construdo em torno da palavra-chave, nocaso de lexias compostas e complexas. Em sntese, a unidade deinformao lexicogrfica sinttica, descritiva e pedaggica.

    J a ficha terminolgica constitui uma constatao do uso emsituao. A definio no constitui a parte essencial, exceto na medi-da em que a situao registrada contenha a definio. Fundamenta-se esta ficha sobre um contexto, cujos traos semnticos permitamdepreender a relaosignificado(conceito)/significante(designao).Cada ficha terminolgica constitui um ncleo autnomo e a unidadeterminolgica (ou termo) vem apresentada em sua ordem sintagmticanormal. Cada sintagma aparecer em ficha prpria e, ao menos

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    idealmente, cada ficha terminolgica ser monossmica; ou seja, acada novo sentido identificado na situao corresponder uma fichadistinta. A ficha terminolgica , pois, analtica, descritiva.

    2.3 A especificidade da terminologia frente semntica

    Em um de seus sentidos mais corriqueiros, a semntica dapalavra se afigura como constituindo um estudo geral das relaesentre os signos lingsticos e seus respectivos referentes. O que im-porta, em primeiro lugar, semntica determinar de que modo umdado signo veio a ser associado a um dado referente, ou seja, porqueum cobertor denominado cobertor. H, portanto, uma dimenso

    diacrnica que inerente semntica embora nem sempre explici-tada. Idealmente, ao menos, a semntica busca as origens da palavra,para da acompanhar os seus caminhos histricos, suas progressivasexpanses ou restries de sentido. Ao final, o percurso semnticose reveste de um aspecto sincrnico, e apresenta o escopo de sentidoque o signo assume na atualidade.

    Assim, por exemplo:

    Comadre (s.f.)

    Lat. cum + mater

    Lat.V. cummatre

    Sentido original: co-me (madrinha em relao pro-genitora, ou progenitora em relao me) sentido pr-prio.

    Primeira extenso: mulher fofoqueira (sentido figura-do, abstrato).

    Segunda extenso: urinol para pacientes que esto im-pedidos de se levantarem do leito (sentido figurado,concreto).

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    A abordagem terminolgica em relao ao mesmo signo serbastante diversa. Essencialmente preocupada com a situao de co-municao, a terminologia somente se valer da diacronia de modoincidental, na criao neolgica ou na resoluo de questes de pa-dronizao, por exemplo para decidir se o estudo dos fenmenosprosdicos frasais de uma lngua deve ser denominado intonao,entonaoou entoao.5Por sua natureza intrnseca, a terminologia privilegiadamente sincrnica. Por outro lado, a relao do signocom seus diversos referentes no constitui aspecto relevante para aterminologia.

    Assim, para o cientista social, o que interessa determinarque uma dada relao social, que se estabelece pelo batismo, e que instituidor ou confirmador de uma relao privilegiada de amizadeou de dependncia social entre duas mulheres, torna cada uma des-

    sas mulheres a comadre da outra, no seio de um tipo de relaosocial genericamente rotulada como compadrio. Se, por outro lado,o objeto de estudo em pauta o equipamento hospitalar, notar-se-que determinado recipiente, com determinado formato e de certa fi-nalidade, denominado comadre. A filiao eventual entre essesdois sentidos no constitui preocupao do terminlogo.

    5 A aplicar-se o critrio diacrnico, a terceira opo dever ser a preferencial.

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    PROCEDIMENTOSBSICOSDATERMINOLOGIAASFONTES

    1. Generalidades

    Como ficou sugerido anteriormente, a investigao termino-lgica, em suas etapas primeiras, tende a partir de um problema de

    designao(perspectiva monolnge) ou de estabelecimento de equi-valncia(perspectiva bilnge).

    Na primeira perspectiva, comum conhecer-se o objeto, o ser,o evento, o processo em pelo menos algumas de suas caractersticasbsicas (traos conceptuais) e indagar-se a respeito da(s) forma(s)de nome-lo. Trata-se, tipicamente, do estabelecimento de uma rela-osignificado/significante(ou, no vocabulrio da prpria termino-logia, conceito/designao), em que o significado ou componentessubstanciais do mesmo so conhecidos, enquanto a determinao dosignificante correspondente constitui o objetivo da busca, visandocompor o signo terminolgico, isto , o termo. Alternativamente,

    conhece-se a rea a ser investigada, constituindo meta do trabalhoefetuar o levantamento dos termos pertinentes rea em questo, emambas as facetas dos mesmos.

    Na segunda perspectiva, conhece-se o termo em determinadalngua ou variante desta e busca-se determinar o termo equivalente(isto , que mais se aproxime, embora no necessariamente seja co-incidente) em outra lngua ou variante. No se trata, simplesmente,de identificar o rtulo diferente para a mesma coisa, emboraalguns dos produtos da lexicografia e da terminologia comparada(dicionrios tcnicos, glossrios) tendam, em sua concepo e feitura,

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    a estabelecer tal iluso. Aqui, como na primeira perspectiva, a pedrade toque o conceito, o significado especfico do termo, no mbitoda linguagem de especialidade em pauta e, com base na maior oumenor interseco entre os respectivos significados observados nasduas lnguas ou variantes em confronto, poder-se- considerar ostermos como equivalentes, parcial ou totalmente, ou meros falsoscognatos.

    Para empreender as buscas propostas acima, impe-se optarpor procedimentos que assegurem aos resultados uma confiabilidadeapropriada. Tais procedimentos incluem, especificamente, a seleodas fontes de consulta, a identificao e segmentao dos termosnestas fontes e a delimitao dos contextos de ocorrncia dos termosem questo que proporcionem, mediante definies, explicaes oudescries, o levantamento dos principais traos conceptuais neces-

    srios configurao do conceito recoberta pelo termo.

    2. As fontes

    Uma questo preliminar diz respeito qualificao do prpriopesquisador. O terminlogo deveria ser ou deveria tornar-se um es-pecialista de assunto para poder empreender a pesquisa terminolgi-ca em determinada rea? Pode ou deve ser, ele prprio, uma fonte deconsulta pertinente?

    Na realidade, embora primeira vista o terminlogo especia-lista detenha uma certa vantagem na conduo da pesquisa termino-lgica, a especializao mais aprofundada no efetivamente neces-sria ao terminlogo. Na perspectiva metodolgica adotada nestetrabalho, o terminlogo , antes de tudo, um praticante de uma meto-dologia lingstica, desempenhando um papel de assessoria aos usu-rios dos diversos vocabulrios de especialidade. Seu papel no seconfunde com o do especialista, e , mesmo, concebvel que o exer-ccio simultneo de dois papis de pesquisador (terminlogo) e deespecialista (fonte de informao terminolgica) poderia introdu-

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    zir um certo vis na elaborao da pesquisa (por exemplo, favore-cendo determinada escola de pensamento, determinado subjargoinstitucional etc., vide tambm item 2.3 abaixo).

    A experincia tende a mostrar que basta, inicialmente, adqui-rir como que um certo verniz, isto , um conhecimento bsico,introdutrio, equivalente quele que se obtm pela assimilao dosverbetes pertinentes de uma enciclopdia de grande porte e/ou deobras introdutrias algo do tipo Eletrnica para Principiantes ouViolo sem Mestre para poder dar ponto de partida pesquisaespecfica. A partir desta iniciao ao domnio em questo, o contactocom as fontes utilizadas para levantamento dos dados acabar ex-pandindo, ao menos em parte, este conhecimento inicial.

    2.1. Seleo das fontes

    As fontes primrias para a investigao terminolgica podemser de dois tipos: textos escritos e depoimentos orais. Os textos es-critos abarcam uma variada gama de publicaes, incluindo obras dedivulgao, revistas especializadas, manuais, especificaes tcni-cas e, em determinados casos, vocabulrios ou dicionrios monoln-ges especficos. Os depoimentos orais so geralmente coligidosmediante entrevista com especialistas da atividade cuja terminolo-gia se quer levantar.

    Em ambos os casos, impe-se, de imediato, a determinaoda adequao das fontes s necessidades da pesquisa terminolgica,o grau de confiabilidade das mesmas e o volume de material a serutilizado.

    2.2. Adequao das fontes

    Fontes adequadas para a pesquisa terminolgica so aquelasque, alm de atenderem aos requisitos da confiabilidade e da

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    representatividade (vide item 2.3 abaixo), proporcionam a clara iden-tificao da totalidade do termo, no apenas da designao mas, igual-mente, do conceito. No basta, portanto, que a fonte confirme a exis-tncia do termo e sua pertinncia para o domnio sob investigao;dever, igualmente, conter expressos os traos conceptuais relevan-tes para o estabelecimento da relao noo/designao (ou, pelomenos, alguns destes) e suficientes para distinguir o termo em ques-to dos demais termos da especialidade.

    Assim, verifica-se que, com certa freqncia, as chamadasrevistas especializadas, voltadas para um pblico restrito e relati-vamente homogneo, so menos apropriadas para a pesquisa ter-minolgica do que se poderia supor primeira vista. este o casotpico das diversas revistas de Medicina (mas, menos tipicamente,das revistas de Informtica, que tendem a abarcar um universo

    amplo de leitores, desde o pr-iniciante o indivduo que aindapensa em adquirir seu primeiro microcomputador at o analistade sistemas), as quais, salvo exceo, somente contero definiese/ou descries razoavelmente explicativas dos conceitos que ostermos de especialidade recobrem quando da apresentao de umanova tcnica, uma nova abordagem clnica ou teraputica, e simi-lares, e somente para os termos especificamente designativos detais novas abordagens. Assim, embora tais materiais possam serteis em um estgio preliminar, que vise simplesmente identificaros termos correntes da especialidade e determinar a sua freqnciarelativa, no se mostram adequados para a consecuo do levanta-

    mento terminolgico, que ter de buscar textos possivelmente ti-dos pelos prprios especialistas por mais elementares, introdutrios,mas que, por este mesmo fato, necessariamente contm as defini-es, descries, caracterizaes ou explicaes de que o termin-logo tem de se valer na organizao dos dados a coligir. Impe-se,portanto, em um estgio preliminar, uma observao longitudinaldos materiais coletados a fim de verificar o grau de explicitaodos termos neles contidos, e, conforme o caso, buscar a sua com-plementao ou substituio por textos mais ricos em informaesconceptuais.

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    2.3 Confiabilidade das fontes

    Uma fonte tida por confivel na medida em que for repre-

    sentativa dos discursos efetivamente empregados pelos usurios oupor um subgrupo claramente identificvel de usurios do domniosob investigao, ou seja, do uso correntetanto no sentido espacial(abarcado diversas regies, instituies e/ou grupos sociocultural-mente definveis) quanto temporal (atualidade).

    A medio do grau de confiabilidade das fontes constitui,admitidamente, uma operao no isenta de certa subjetividade. Talsubjetividade, no entanto, passvel de controle mediante a aplica-o de alguns critrios pragmticos.

    A atualidade da fonte pode ser relativamente bem determi-nada mediante a verificao da data de publicao (alternativamen-

    te, controle da data de entrevista). Assim, em grande parte dos dom-nios de investigao terminolgica, textos publicados ou entrevistasrealizadas nos ltimos cinco anos podem, a priori, ser tidos porconfiveis deste ponto de vista.1 A representatividade espacial (aabrangncia social da linguagem de especialidade utilizada no texto/na entrevista), por sua vez, depender de outros fatores, de controlepor vezes mais difcil, abrindo margem maior para o arbtrio e parao risco do terminlogo. Publicaes de entidades representativas(Instituto de Engenharia, Sucesu, Abia, IPT e similares) ou por em-presas de grande porte2sero, salvo indicao em contrrio pelosespecialistas de rea, representativos do uso corrente. J as normas

    tcnicas emitidas por entidades tais como DIN, Ansi, ISO, ABNT e

    1 Evidentemente, h aqui uma certa flutuao, para mais ou para menos. A termi-nologia do xadrez no apresenta grandes alteraes nestes ltimos vinte ou trin-ta anos, justificando, portanto, a incluso no corpusde textos publicados nadcada de 1960 e 1970. J a Informtica, a Biotecnologia, as cincias ambientais,as telecomunicaes e vrias outras reas de ponta passam por ritmos evolutivosto rpidos que certamente um texto de cinco anos j poder ser tido por datado,revelador de um estado diacrnico claramente distinto do atual.

    2 Estas, porm, tendem, no raro, a desenvolver um subjargo interno, um dialetoterminolgico prprio.

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    congneres no so necessariamente representativas do uso efetivo,na medida em que constituem, tambm no que tange terminologiaempregada, textos de carter normativo, cuja aceitao e difusovariar de acordo com condicionantes culturais, polticos, scioeco-nmicos e outros, de difcil controle ou verificao por parte do ter-minlogo.

    No que tange aos depoimentos verbais, de especialistas, colo-ca-se, tambm, aqui, o problema da confiabilidade. Todo tradutortcnico que j teve ocasio de recorrer ao auxlio de mais de umespecialista para a soluo de problemas terminolgicos pontuaissabe que, em assim procedendo, tender a receber mais de uma solu-o. Incumbe, portanto, na pesquisa terminolgica que se vale daassessoria de especialistas, verificar a sua representatividade em ter-mos de formao, de anos de experincia, setor e instituio em que

    atua, eliminando ou mitigando o efeito dos dialetos terminolgicos. primeira vista, uma das fontes a serem privilegiadas, parti-

    cularmente na pesquisa terminolgica bilnge, seria o texto para oqual se dispe tanto da verso original quanto da traduo. No en-tanto, cabe aqui ponderar que, se efetivamente a pesquisa terminol-gica empreendida constitui uma real necessidade dos usurios, talnecessidade deriva da ausncia de uma descrio e sistematizaoterminolgicas anterior, inclusive poca de produo da traduodo texto em questo. Assim sendo, a confiabilidade das soluesterminolgicas encontradas pelo tradutor e/ou revisor, de resto noasseguradamente especialistas de rea ou, se o forem, sem necessa-

    riamente disporem da capacitao lingstica suficiente para apropositura de solues terminolgicas, particularmente no que tan-ge criao neolgica, , no mnimo, algo precria.3

    Por outro lado, foroso admitir que, no caso especfico dospases lusfonos, a produo local de textos com caractersticas apro-priadas para constiturem fontes primrias de informaes termino-lgicas no sempre das mais abundantes, em todo e qualquer ramo

    3 O presente comentrio aplica-se, mutatis mutandis, ao uso de textos traduzidoscomo fonte primria para a terminologia monolnge.

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    da cincia e da tecnologia. O pesquisador pode, assim, ver-se dianteda contingncia de no dispor de fontes suficientes em lngua portu-guesa que tenham sido originariamente produzidas nesta lngua. Emtais circunstncias, o recurso a fontes que sejam tradues de outroidioma pode configurar-se como uma ltima opo, em princpioindesejvel mas, no caso, inevitvel. Sugere-se, nestes casos, que oterminlogo busque o aval de pelo menos dois especialistas de rea,em termos da confiabilidade e da excelncia da fonte traduzida.4

    Outro tipo de fonte possvel constitudo dos dicionriosmonolnges de especialidade. Caracterizam-se estas obras comoprodutos de especialistas, contendo, alm do termo, a sua definioe, eventualmente, observaes quanto rea de aplicao, restriesde uso e demais comentrios, bem como citaes bibliogrficas,correspondendo, em grande medida, a um levantamento terminol-

    gico monolnge. Suas deficincias manifestam-se no j aludido visdo especialista, alm de assumirem um carter por vezes normativo,que pode no corresponder ao uso efetivo constatvel entre os diver-sos grupos de usurios. Ainda, como toda obra de referncia deman-da um tempo relativamente longo de confeco e sua atualizaoconstante esbarra nos custos industriais relativamente elevados paraum mercado nem sempre amplo, h um forte risco de desatualizao.Assim, por exemplo, um dicionrio monolnge de especialidadepublicado em 1991 dificilmente incorporar usos mais atuais do queat 1989 e, em 1996, estar, efetivamente, datado no de cinco masde sete anos. Dependendo da rea em questo (maior ou menor dina-

    mismo da evoluo conceptual e/ou tecnolgica), um diferencial detempo de sete anos pode comprometer a validade da fonte em termosde sua atualidade. No entanto, desde que se tenha sempre presente anatureza destes riscos, o dicionrio de especialidade pode ser utili-zado como instrumento auxiliar e, em circunstncias especficas (vide

    4 Casos similares podem ocorrer com tradues autorizadas, como, por exem-plo, os manuais desoftwaredisponveis em diversas lnguas e fornecidos junta-mente com os respectivos programas. Tais manuais representam a verso oficialdasoftwarehouseem questo e, no mbito limitado do programa em questo,podem vir a determinar e a consagrar o jargo a ser empregado.

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    Cap.VI), como fonte primria dos levantamentos sistemticos (pes-quisa temtica) ou, mais freqentemente, como uma das fontes pri-mrias dos levantamentos isolados (pesquisa pontual).

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    PROCEDIMENTOSDAPESQUISAPONTUAL

    1. Generalidades

    A investigao terminolgica descritiva pode desenvolver seem duas vertentes: apesquisa pontuale apesquisa temtica.A pes-quisa terminolgica pontual aquela que visa a soluo de proble-mas isolados de designao, enquanto a pesquisa terminolgicatemtica se prope efetuar o levantamento do vocabulrio termino-lgico de uma determinada atividade, especialidade, tcnica.

    2. A pesquisa pontual

    A pesquisa pontual, embora se desenvolva num horizonte es-treito, particular, tem como vantagem mais evidente proporcionarsolues rpidas para problemas especficos.

    Seus procedimentos fundamentais incluem:

    (a) Dilogo com o cliente.Como etapa preliminar, incumbeprecisar o conceito para a qual se busca uma denominaoe deve resultar no levantamento de certos traos conceptuais,preciso da rea ou domnio de aplicao e, por vezes, nadesignao em outra lngua.

    (b) Consulta a dicionrios. Se a questo posta parte de umconceito e de uma designao em outra lngua (Lngua dePartida LP), o terminlogo dever verificar o conceitonos dicionrios monolnges da LP em questo, iniciandoo processo com os dicionrios gerais e prosseguindo com

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    os especficos. Tal operao permitir completar as infor-maes por vezes insuficientes dadas pelo cliente ou, ain-da, constatar uma real divergncia entre as indicaes docliente e as definies propostas nos dicionrios.

    (c) Consulta a especialista. Pode fazer-se necessrio recorrera especialista, particularmente para dirimir as dvidas ori-ginadas das disparidades verificadas nas diversas fontes enas indicaes iniciais.

    (d) Dicionrios bilnges. Se a designao em LP for conheci-da, consultar-se- os dicionrios bilnges, sempre indo dosgenricos aos especficos (se houver), obrigatoriamentecomplementando tal consulta com a verificao em dicio-nrios monolnges da Lngua de Chegada (LC), novamentepercorrendo o caminho dos genricos aos especficos.

    (e) Utilizao dos traos conceptuais. Caso no haja ou se des-conhea a designao do termo em LP, ou caso os dicion-rios bilnges no ofeream qualquer pista, parte-se dostraos conceptuais de que se dispe, escolhe-se osdescritores (unitermos), os quais serviro de guia para aseleo dos verbetes a serem consultados em dicionrios eem enciclopdias, ou, ainda, em ndices remissivos. De res-to, o estabelecimento de quadros de traos conceptuais dis-tintivos mostra-se constituir instrumento til para a deter-minao das possveis equivalncias entre termos, particu-larmente em situao bilnge.

    (f) Verificao de ocorrncia. Embora nem sempre haja a pos-sibilidade de se verificar a ocorrncia da situao encon-trada, qualquer indicativo neste sentido servir como com-provao da pertinncia da escolha feita pelo terminlogo.

    (g) Criao neolgica. Caso todas as tentativas anteriores semostrem incapazes de proporcionarem a soluo desejada,resta, ainda, a possibilidade de proposio neolgica, quepoder adotar uma entre vrias estratgias disponveis:(i) importao direta do termo de LP (emprstimo), como

    emsoftwareou office-boy;

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    (ii) adaptao, desde a ortogrfico-lexical, como em dele-tar (na linguagem da informtica) ou alavancar(nosentido econmico), at a semntico-parafrstica, comoem Corporate Taxpayer Register of the Ministry of

    Financepor CGC/MF;(iii) criao de termo recorrendo aos recursos das lnguas

    clssicas (grego e latim), como usual na Medicina,na Qumica, nas cincias da terra etc.

    (iv) criao de termo recorrendo aos recursos do verncu-lo, como em entoao,em lugar do franco-britnicointonation.Os recursos mais propriamente vernaculares incluema composio e a derivao, a reconstituio filolgica(ou seja, partindo do latim e submetendo o termo s

    mutaes mais provveis de evoluo fontico-fonolgica constatveis na histria do idioma), a ana-logia com campos lxico-semnticos aparentados etc.De qualquer modo, a criao neolgica, por parte doterminlogo, constituir necessariamente apenas umaproposio: suas condies de aceitabilidade so difi-cilmente controlveis e normalmente sero constata-das apenas a posteriori.

    Convm observar que o percurso delineado acima sugere umaordem de fatores apropriada numa perspectiva estritamente termi-

    nolgica. O tradutor profissional, no entanto, que freqentemente sedepara com situaes em que dever assumir um papel de pesquisa-dor terminolgico, tender a adotar uma seqncia diferente, pelasprprias condies de produo1de seu produto principal, o textotraduzido. Assim, a necessidade de empreender uma pesquisa termi-nolgica pontual somente se tornar patente aps ter percorrido al-gumas etapas preliminares que, normalmente, tm incio no dicion-

    1 Condies essas que incluem, no infreqentemente, uma presso temporal aguda(prazo).

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    rio bilnge de especialidade, passando por dicionrios gerais e deespecialidade monolnges, e possivelmente desembocando, apseventual consulta ao cliente/especialista, na criao neolgica ou emformas alternativas combinando o emprstimo com a parfrase etc.Tal inverso no deve ser tida por ilegtima ou menos adequada.Apenas, do ponto de vista terminolgico, pode no proporcionar omesmo grau de segurana.

    3. Exemplos de pesquisa pontual

    3.1 Exemplo de emprego dos unitermos

    Caso se deseje conhecer a denominao do dispositivo fixadono chassi de um veculo de passeio e que serve de ponto de amarra-o/fixao de um reboque, pode-se definir os domnios pertinentescomo compreendendo: veculos automotores, carros de passeio ereboques; a natureza do referente como componente opcional, ferra-gem; e a finalidade como a acoplagem para rebocamento de veculono motorizado por veculo automotor.

    Com base neste levantamento conceptual, termos tais comoveculo, carro de passeio, opcionais, acoplagem, reboque e reboca-mento constituiro os termos de referncia para empreender a buscaem enciclopdias, manuais e documentao especializada (normas,catlogos, especificaes tcnicas e similares).

    3.2 Exemplo de criao neolgica por analogia

    Evidentemente, as pesquisas nas fontes bibliogrficas nemsempre resultam na localizao de determinado termo, quer por fa-lha de documentao, quer por inexistncia efetiva do termo. Nestescasos, pode caber a propositura de uma criao neolgica, funda-mentada na analogia com situaes similares.

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    Assim, por exemplo, suponha-se que se queira designar demaneira clara e distintiva a categoria de indivduos que esto sendotreinados para determinada funo em uma empresa ou instituio,mas que no sejam pessoas em vias de formao ou recm-formadasde faculdade ou escola tcnica (caso em que a designao consagra-da seria estagirio), categoria essa que em lngua inglesa desig-nada como a de trainee. Pode-se, por analogia com a prpria ter-minologia acadmica graduando, mestrando, doutorando emque a desinncia -andoindica algum em vias de obter determinadahabilitao, propor o termo treinando, convertendo o gerndio ver-bal em substantivo.

    3.3. Exemplo de pesquisa pontual bilnge2

    No direito penal franco-canadense, o termo en probationapli-ca-se a uma pessoa culpada de um delito e que se beneficia de umsursis, pelo qual ela no chega a cumprir pena de deteno, enquantoo termo en libert surveilleindica algum j em liberdade aps tercumprido um certo perodo de tempo encarcerado. Coloca-se o pro-blema de verificar quais as designaes equivalentes no direito pe-nal brasileiro.

    (a) Verificao nos dicionrios de LP

    No havendo disposio dicionrios de especialidade na LP,o exame preliminar ficou limitado a dois dicionrios gerais: o Petit

    Robert(ed. de 1973) e oLexis(ed. de 1979).

    No primeiro, o termo en probationfoi encontrado somente nosentido religioso. Consta o verbete libertque, em sua segunda acepo,apresenta a seguinte definio:

    2 Devo parte da elaborao deste exemplo a Isabel Rupaud, tradutora pblica doidioma francs.

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    Situation de qui nest pas retenu captif (oppos captivit,emprisonnement). Rendre la libert a un prisonnier. Dr.Li-bert provisoire, accorde un individu en tat de dtention

    prventive. Libert sous caution. Libert surveille.

    No segundo, o termo en probationapresenta, em sua terceiraacepo, a definio

    sursis avec mise lpreuve.

    Ocorre, ainda, o termosurveiller, que, em seu segundo senti-do, vem apresentado como segue:

    Dr. Libert surveille. Situation dun dlinquant qui nest

    pas en prison, mais qui doit se prsenter rgulirement lapolice.

    As fontes consultadas no entram em choque com a informa-o originariamente apresentada; apenas, a preciso de libert surveillecomo implicando um certo perodo anterior de deteno no foi con-firmada.

    (b) Verificao nos dicionrios gerais de LC

    Dada a relativa transparncia entre a lngua francesa e a portu-

    guesa, julgou-se desnecessrio apelar para os dicionrios bilnges.Passou-se, ento, consulta doNovo dicionrio da lngua portugue-sa, de Aurlio Buarque de Holanda, edio de 1975. Neste, o verbe-tesursis, j sugerido na LP, apresenta a definio suspenso condi-cional da pena e uma remisso ao verbetesuspenso.

    Sobsuspenso, localizou-se a expressosuspenso condicio-nal da pena, conceituada como

    Adiamento da execuo de certas penas menos graves im-postas a criminosos ou contraventores primrios, por medi-

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    da de poltica criminal, desde que, em determinado perodode tempo, no pratiquem nova infrao, e no cabo da qual sed por extinta a sua punibilidade.

    Tal definio parece compatvel com os conceitos indicadospara en probationna LP.

    Encontra-se, ainda, no mesmo dicionrio, o item liberdadevigiada, que aparenta ser a traduo literal de libert surveille. Noentanto, a definio proposta

    Medida revogvel que consiste na entrega de um menor de-linqente a pessoa ou instituio que, fiscalizada por umdelegado do tribunal, se incumbir da reeducao do menor[...]

    no apresenta praticamente qualquer interseco com os conceitospropostos para en libert surveille, salvo o fato de pertenceremambos ao subdomnio do direito penal.

    (c) Verificao nos dicionrios especficos de LC

    Consultou-se oVocabulrio jurdico de Plcido e Silva (1982),o qual registra, sob o verbetesuspenso da pena, a seguinte defini-o:

    SUSPENSO DA PENA. a no aplicao da pena, ou ano execuo da condenao, quando assiste ao ru a facul-dade de requerer e obter semelhante benefcio.

    A suspenso da condenao, ou da pena, chamada tecnica-mente de sursis.

    [...]

    Como se verifica, o sursis bem se distingue do livramentocondicional, outra espcie de benefcio dado ao sentencia-do. Osursis vem antes da deteno, ou da recluso. O livra-

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    mento condicional posterior, indicando-se prmio peloexemplar comportamento da condenao. simplesmenteda suspenso condicional da pena.

    J o termo liberdade vigiada, a forma aparentemente mais li-teral de traduzir-se en libert surveille, aparece no referido Vocabu-lrio jurdicodefinido como segue:

    LIBERDADE VIGIADA. Assim se diz respeito da vigilnciaespecial exercida pelas autoridades policiais ou judicirias,a respeito de certas pessoas, em virtude da qual so as mes-mas mantidas em constante observao, a fim de que se anotea conduta tida.

    (c) Consulta a especialista:Nenhum.

    (d) Determinao dos traos conceptuais

    Condenao Deteno

    en probation +

    en libert surveille + +

    sursis (fr.) +

    sursis (por.) +

    suspenso condicional da pena +

    livramento condicional + +

    liberdade vigiada

    (e) Constatao de uso

    Constatao dos termos livramento condicionalesuspensocondicional da pena, como equivalente asursis, no Cdigo de Penal

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    brasileiro, respectivamente Art. 77 e 83, e no Cdigo de ProcessoPenal brasileiro, respectivamente Art. 696 e 710.

    (f) Concluso

    Confirma-se, desta forma, que as equivalncias pertinentes so:

    en probation= sursis, suspenso condicional da pena

    en libert surveille= livramento condicional.

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    PROCEDIMENTOSDAPESQUISATEMTICA

    1. Generalidades

    Como ficou dito, a pesquisa terminolgica temtica prope-se empreender o levantamento do vocabulrio pertinente a uma de-terminada atividade ou tcnica e no a busca de solues para pro-blemas isolados de designao. Assim, se de um lado requer um

    investimento maior de recursos e de tempo, dificultando o atendi-mento s situaes mais emergenciais, a pesquisa temtica apresen-ta, de outro, como principal vantagem, a amplitude das informaescoligidas, na sua aplicabilidade no apenas soluo de problemasisolados de designao ou de equivalncia, mas a todo tipo de pro-blema que possa ocorrer dentro de determinada rea ou subrea.

    2. Pblico-alvo e abrangncia

    Como j se insistiu reiteradas vezes nesta apresentao meto-

    dolgica, a terminologia descritiva , primordialmente, uma termi-nologia situacional. A situao de uso do jargo terminolgico com-preende diversos aspectos, inclusive, com elevada relevncia, aque-les atinentes variao social. Os usurios de determinado vocabu-lrio de especialidade no constituem, com efeito, um grupo homo-gneo. Na rea das cincias da sade, por exemplo, compartilham ese entrecruzam em um espao nocional j por si multiforme (aborda-gens alopata, homeopata e prticas naturistas ou alternativas em ge-ral) pesquisadores, mdicos e paramdicos, psiquiatras, enfermeirose assistentes de enfermagem, administradores hospitalares, burocra-

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    tas do setor pblico e do setor privado, sanitaristas e voluntrios dascampanhas de vacinao, farmaceutas, industriais e industririos,vendedores, publicitrios, especialistas de marketing e balconistasde drogaria, benzedeiras e mdiuns, massagistas e acupuncturistas,organizadores de eventos, redatores e jornalistas vinculados espe-cialidade, profissionais srios e charlates, sem esquecer a variadagama de pacientes e as variadas formas de automedicao, cada qualcom uma determinada apreenso desta realidade, com histricos in-dividuais e coletivos, competncias, crenas, nveis scioeconmicose scioculturais e, em seu contexto especfico de atuao, motiva-es por vezes bastante distintas.

    de se prever que, com tantos e variados participantes, comtantas e variadas motivaes, formaes e informaes, com tantasposturas diversas e mesmo divergentes, os reflexos no uso lingstico

    em geral e na linguagem de especialidade em particular sero inevi-tveis. Assim, dificilmente poder-se- pretender satisfazer s neces-sidades de todos os usurios calcando o levantamento em uma nicaperspectiva sociolingstica: entre o mdico e o balconista de droga-ria, entre o pesquisador e o publicitrio, os vocabulrios encontrar-se-o em interseco, no em relao de identidade. O conceito queum denominar efeito analgsico acelerado o outro designar comotomou X [...] a dor sumiu.

    Desta forma, um dos primeiros requisitos para o adequadoencaminhamento de uma pesquisa temtica consistir da definiodo pblico-alvo. Este ser mais ou menos restrito, mais ou menos

    ampliado, conforme as circunstncias e as necessidades percebi-das como motivadoras da pesquisa em questo. Ou seja, do pontode vista terico-metodolgico, no h nada que indique, a priori,ser mais conveniente adotar uma abordagem restrita a um ou al-guns poucos subjarges correlatos ou, inversamente, ser mais apro-priado ampliar o leque at a totalidade dos subjarges pertinentes rea ou domnio em questo. Mas as conseqncias da adoo deuma ou outra postura far-se-o sentir em toda a seqncia da pes-quisa, particularmente no que tange seleo das fontes e ao regis-tro dos dados.

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    De certa forma vinculada determinao do(s) pblico(s)-alvoest a segunda opo preliminar a ser tomada: a do grau de abran-gncia. Em termos simplificados, pode-se escolher entre efetuar umlevantamento bsico ou um levantamento exaustivo.3No primeirocaso, o objetivo ser a constituio de um inventrio dos termos es-senciais especialidade em questo, na mdia4no ultrapassandotrezentos ou quatrocentos termos; no segundo, ser preciso prever olevantamento de por volta de 2.500 termos.5O levantamento bsicoproporciona resultados mais rpidos, mas coloca a questo, talvezproblemtica para o iniciante na rea de conhecimento em pauta, dedistinguir termos essenciais e termos acessrios.6O levantamentoexaustivo, inversamente, demanda mais tempo, mas coloca menosexigncias para a seleo dos termos, uma vez consolidada a gradeconceptual (vide item 4.1, adiante).

    3. Volume de fontes

    Ao contrrio do que comumente se imagina, a pesquisa termi-nolgica no exige o recurso a um volume muito elevado de fontes.Asseguradas a adequao, a confiabilidade e a representatividade

    3 Entenda-se, aqui, tendente ao exaustivo, j que a prpria dinmica da lingua-gem em geral, e das linguagens de especialidade em particular, tornam a exaus-tividade uma meta inalcanvel na prtica.

    4 Esta mdia deve ser entendida somente como um parmetro aritmtico elemen-tar, estando sujeita a fortes flutuaes, para mais ou para menos, dependendo dograu de especificidade e de complexidade conceptual da rea ou da subrea sobinvestigao.

    5 Com dois a trs mil termos obtm-se, no geral, uma cobertura bastante exausti-va (no sentido da nota 1, supra) para cada tema especfico. Evidentemente, nosnveis hierrquicos superiores (rea e subrea), o nmero de termos poder fa-cilmente atingir as dezenas ou mesmo as centenas de milhares.

    6 Um instrumento possvel para delimitar o campo de levantamento bsico seriauma estatstica de freqncia dos termos, baseada em procedimentos automati-zados de anlise lexical.

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    dos materiais, em uma situao tpica7um levantamento monolngepode ser efetuado utilizando trs a quatro obras bsicas, de iniciao(vide captulo anterior, item 2) que, por sua prpria natureza, tende-ro a conter um elevado ndice de definies e/ou contextosexplicativos, complementado com 10/12 artigos de revistas especi-alizadas e/ou entrevistas com especialistas.8

    J para a pesquisa bilnge, a exigncia ser relativamentemaior. Com efeito, no basta simplesmente adicionar para a segundalngua o mesmo volume de material. Exceto no caso j caracteriza-do como indesejvel de uso de textos originais e respectivas tradu-es, inevitvel que os campos semnticos cobertos pelos textosna primeira e na segunda lngua apresentem-se em interseco, noem relao de identidade. Assim, para assegurar uma razovel co-bertura das noes e termos levantados a partir do corpusna primei-

    ra lngua, convm, na segunda lngua, aumentar em duas vezes ovolume, ou seja, recorrer a seis ou oito obras fundamentais e porvolta de vinte artigos de revistas especializadas. Mesmo com estaprovidncia, porm, a experincia demonstra que a cobertura obtidana segunda lngua corresponder, em mdia, a 80% das noes etermos coligidos na primeira lngua, a cobertura dos termos rema-nescentes tendo, geralmente, de ser efetuada por meio de consultaaos especialistas de rea.

    7 Ressalve-se que podem ocorrer situaes em que a inexistncia ou inacessibili-dade de obras introdutrias, fundamentais, e/ou as caractersticas das revistasespecializadas da rea em questo (vide item 2.2 acima), a repartio de deter-

    minada rea do conhecimento em abordagens, filosofias, escolas de pensa-mento conflitantes, ou, inversamente, a consolidao de uma determinada reade conhecimento em uma nica grande obra de cunho enciclopdico podemexigir um volume maior ou, ao contrrio, podem facultar o uso de um volumemenor de fontes do que o aqui proposto. Entenda-se, pois, as indicaes conti-das neste item como caracterizando uma mdia, e no uma norma rgida.

    8 Evidentemente, caso o pblico-alvo e a abrangncia definidas para a pesquisaenvolvam o vocabulrio tpico de segmentos de usurios que normalmente noincluem entre suas atividades a publicao de textos de sua especialidade talcomo tende a ser o caso de profissionais de nvel secundrio e tcnico o levan-tamento terminolgico ter de incluir, em escala mais significativa, o recurso entrevista.

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    4. Identificao e segmentao dos termos

    4.1. Identificao A rvore de domnio e a grade conceptual

    Sendo uma das preocupaes centrais da metodologia aquidelineada para os estudos terminolgicos a observao da ocorrn-cia das noes e designaes em situao efetiva de uso, as fontesprimrias, conforme descrito anteriormente, compe-se, privilegia-damente, de textos escritos e entrevistas com os efetivos usurios dojargo a ser descrito. Tais materiais, no entanto, para servirem ade-quadamente ao propsito dos levantamentos terminolgicos, terode ser submetidos a determinados tratamentos para assegurar a ade-quada identificao das noes e designaes relevantes.

    A determinao do que e do que no relevante para o le-

    vantamento proposto exige, primordialmente, a definio clara docampo semntico a ser abordado. Com efeito, muitas fontes, em par-ticular as fontes com caractersticas introdutrias, de iniciao reaou ao domnio visado, tendem, em grande medida, a apresentar umcerto grau de hibridismo temtico. Assim, um texto de introduo tcnica fotogrfica conter, alm da nomenclatura especfica, ter-mos tcnicos relativos a domnios mais ou menos conexos, como atica, a Fsica, a Qumica, Geometria, e outros. Mesmo um textomais especfico poder tangenciar outras reas, na ilustrao daaplicabilidade da tcnica proposta; por exemplo: um texto sobreaerofotogrametria poder fazer referncia avaliao imobiliria, a

    equipamentos de uma linha frrea, de uma explorao agropecuriaou estrutura fsica de servios pblicos urbanos, como objetos pas-sveis de descrio pela tcnica aerofotogramtrica. Caso no se dis-ponha de uma definio prvia suficientemente clara e detalhada dasubrea ou tema para o qual o levantamento proposto, corre-se,aqui, dois riscos, igualmente prejudiciais qualidade do resultadofinal: o risco do rudo e o risco do silncio. O primeiro correspon-de aos termos irrelevantes ao tema proposto, comoplano qinqenalem um dicionrio de mecnica; o segundo, s lacunas, aos termosno elencados em determinado levantamento e que, no entanto, so

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    bsicos para a rea em questo, como a falta do verbete reatoremum glossrio de eletricidade e eletrnica.

    A fim de evitar tais deficincias, comprometedoras da quali-dade e da fiabilidade do levantamento como um todo, incumbe de-terminar, na seqncia iniciao rea, estabelecer a rvore dedomnio ou grade conceptual relevante.

    Por rvore de domnio (do francs, arbre de domaine, videDubuc, 1985) entende-se um esquema que defina, ordenadamente, area, a subrea e o tema da pesquisa a ser empreendida. A seguir,definem-se as diversas classes semnticas pertinentes a este tema,como no exemplo:

    [rea] construo civil

    [Subrea] construo rodoviria

    [Tema] equipamentos de construo rodoviria

    maquinrio insumos produtos processos operadorese componentes

    O modelo acima organiza-se em estrutura de arborescncia emostra-se bastante til para diversos campos. Em outros, porm, emque a relao entre os traos semnticos pertinentes mais com-plexa, pode ser mais interessante adaptar o modelo a uma gradeconceptual, como no caso que se segue (Medeiros, 1995):

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    Sade Pblica

    Epidemiologia

    Febres Hemorrgicas de Origem Viral

    Agente Causador bola Marburgo Sabi Febre Amarela Dengue CHF-Congo

    Doena

    Preveno

    Contgio

    Diagnstico(exames e sintomas)

    Evoluo

    Teraputica

    Uma vez montada a rvore de domnio ou a grade conceptual,esta servir como pedra de toque para a seleo dos termos cons-

    tantes do corpus. Diante de qualquer termo aparentemente relevan-te, o pesquisador verificar na grade conceptual em que medida otermo em questo apresenta caractersticas suficientes para ser arro-lado sob uma das rubricas (ou ramos da estrutura em arborescncia)da grade. Configurada a adequao, o termo ser retido para o levan-tamento. Assim, no primeiro exemplo proposto, usina mvel de as-

    faltosatisfaz ao critrio de adequao, por tratar-se da designao deum maquinrio utilizado como equipamento de construo rodovi-ria. J o termo licitao, embora pertinente ao domnio da constru-o rodoviria, no constitui equipamento empregado na construorodoviria e sim forma de obteno de contrato para execuo de

    obras de construo rodoviria. Deste modo, usina mvel de asfaltoser retido no levantamento e licitaoexcludo do mesmo.9

    9 Na prtica, a grade conceptual ser montada em duas etapas. Numa primeira,precedente ao incio do levantamento, mas aps a iniciao ao domnio, a gradeser elaborada em uma verso preliminar, isto , constituir uma hiptese detrabalho, a ser testada em termos de sua adequao e pertinncia. Pela experin-cia, aps o registro dos primeiros cinquenta a 75 termos, ser possvel diagnos-ticar as eventuais lacunas, os ramos improdutivos, as eventuais incongrunci-as e efetuar as correes necessrias.

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    4.2. Segmentao

    Um outro problema diz respeito segmentao dos termos, par-

    ticularmente em domnios em que o terminlogo dispe, apenas deconhecimentos rudimentares e recentes. Com efeito, diferentementedo que ocorre na descrio lexicogrfica (vide Cap. I, item 2.2), emque a grande maioria dos verbetes composta de unidades monovoca-bulares, as designaes descritas pela terminologia abarcam, com ex-trema freqncia (no raro acima de 50% do inventrio total), formascompostas de duas, trs ou mais palavras. Para o recm-iniciado aodomnio situao em que o terminlogo se encontrar na maioriados casos coloca-se, aqui, a questo da adequada delimitao dostermos, em que vocbulo se iniciam e em que vocbulo se encerramesses termos, de perceber os diversos graus de solidariedade entre os

    diversos componentes, para assim poder caracterizar as seqnciastextuais como compondo, ou no, unidades terminolgic