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Breve História da Inércia - I: O Problema do Movimento de Aristóteles a Copérnico [Brief History of Inertia - I: The Problem of Motion from Aristotle to Copernicus] Samuel Simon * e Evaldo Rezende ** Resumo: Nesse trabalho, examinaremos os estudos sobre o movi- mento, entendido como translação, ou deslocamento, desde as aná- lises de Aristóteles, passando pelas críticas feitas no período medieval ao aristotelismo, culminando com o trabalho de Nicolau Copérnico, que aprimora a noção de movimento relativo. Se, por um lado, Co- pérnico prepara o terreno para os estudos de Pierre Gassendi, René Descartes e Galileu Galilei sobre a noção de inércia, por outro lado, ainda mantém certa imagem de natureza com elementos aristotélicos. Palavras-chave: Movimento, Inércia, Aristotelismo, Imagem de Na- tureza Abstract: In the present work, we examine studies regarding motion – understood as traversal, or change of place – beginning with the analyses of Aristotle, passing through critiques of Aristotelianism in the medieval period, culminating in the work of Nicholas Copernicus, who prioritizes the notion of relative motion. If, on the one hand, Copernicus prepares the way for the studies of Pierre Gassendi, René Descartes and Galileo Galilei on the notion of inertia, on the other hand, he still retains a certain image of nature with Aristotelian elements. Keywords: Motion, Inertia, Aristotelianism, Image of Nature Introdução A noção de inércia, consolidada nos Principia de Newton, possui uma longa história, pois está dire- tamente vinculada ao problema do movimento. Essa noção é um caso admirável das relações entre his- tória e filosofia da ciência, ou, na terminologia empregada por Paulo Abrantes (Abrantes, 2016), das re- lações entre imagens de natureza e imagens de ciência. Os estudos do movimento, que têm suas raí- zes nos pensadores pré-socráticos, de maneira implícita ou mesmo explicita, como no caso de Zenão (ibid., p. 40), alcança uma elabora- ção sofisticada em Aristóteles, que marcará o desenvolvimento pos- terior de parte importante da Fí- * Professor Associado do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia - PPG- FIL/UnB. Trabalho parcialmente financiado pelo CNPq, na forma de Bolsa de Produtividade em Pesquisa. E-mail: [email protected] ** Mestre em Filosofia no PPG-FIL/UnB, e Membro do Grupo de Lógica e Filosofia da Ciência-UnB/CNPq. E- mail: [email protected] Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.6, n.1, jul. 2018, p. 241-266 ISSN: 2317-9570 241

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Breve História da Inércia - I: O Problema do Movimentode Aristóteles a Copérnico

[Brief History of Inertia - I: The Problem of Motion from Aristotle toCopernicus]

Samuel Simon * e Evaldo Rezende **

Resumo: Nesse trabalho, examinaremos os estudos sobre o movi-mento, entendido como translação, ou deslocamento, desde as aná-lises de Aristóteles, passando pelas críticas feitas no período medievalao aristotelismo, culminando com o trabalho de Nicolau Copérnico,que aprimora a noção de movimento relativo. Se, por um lado, Co-pérnico prepara o terreno para os estudos de Pierre Gassendi, RenéDescartes e Galileu Galilei sobre a noção de inércia, por outro lado,ainda mantém certa imagem de natureza com elementos aristotélicos.Palavras-chave: Movimento, Inércia, Aristotelismo, Imagem de Na-tureza

Abstract: In the present work, we examine studies regarding motion– understood as traversal, or change of place – beginning with theanalyses of Aristotle, passing through critiques of Aristotelianism inthe medieval period, culminating in the work of Nicholas Copernicus,who prioritizes the notion of relative motion. If, on the one hand,Copernicus prepares the way for the studies of Pierre Gassendi,René Descartes and Galileo Galilei on the notion of inertia, on theother hand, he still retains a certain image of nature with Aristotelianelements.Keywords: Motion, Inertia, Aristotelianism, Image of Nature

Introdução

A noção de inércia, consolidadanos Principia de Newton, possuiuma longa história, pois está dire-tamente vinculada ao problema domovimento. Essa noção é um casoadmirável das relações entre his-tória e filosofia da ciência, ou, naterminologia empregada por PauloAbrantes (Abrantes, 2016), das re-

lações entre imagens de naturezae imagens de ciência. Os estudosdo movimento, que têm suas raí-zes nos pensadores pré-socráticos,de maneira implícita ou mesmoexplicita, como no caso de Zenão(ibid., p. 40), alcança uma elabora-ção sofisticada em Aristóteles, quemarcará o desenvolvimento pos-terior de parte importante da Fí-

*Professor Associado do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia - PPG-FIL/UnB. Trabalho parcialmente financiado pelo CNPq, na forma de Bolsa de Produtividade em Pesquisa. E-mail:[email protected]**Mestre em Filosofia no PPG-FIL/UnB, e Membro do Grupo de Lógica e Filosofia da Ciência-UnB/CNPq. E-

mail: [email protected]

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sica, definindo-a como uma disci-plina autônoma a partir do séculoXVII. Nesse trabalho, nos limitare-mos a mostrar as relações entre osestudos sobre o movimento, con-forme desenvolvida inicialmentepor Aristóteles, evoluindo parauma discussão sobre o movimentorelativo no período moderno, atépreparar o terreno para a noção deinércia em Galileu, o que será apre-sentado em outro trabalho.

Mostraremos, nesse próximotrabalho (Breve História da Inércia- II: O problema da inércia em Gali-leu), que, além dessa raiz no estudodo movimento, a noção de causali-dade tem um papel central no con-ceito de inércia. Estimamos tam-bém que Galileu pode não ter solu-cionado completamente esse pro-blema. Em parte, evidentemente,pelo próprio desenvolvimento daFísica e da Matemática no início doséculo XVII, mas, talvez também,por suas concepções filosóficas, ouda imagem de natureza que possuía.

Movimento em Aristóteles

Entendido como deslocamento,

ou translação, o movimento é umadas formas de mudança, na ter-minologia aristotélica. Dessa ma-neira, os estudos de Aristóteles,embora estranhos à noção de inér-cia nos termos modernos, certa-mente foram decisivos para o de-senvolvimento deste conceito. Jáno Livro I da Física, uma das prin-cipais obras do Estagirita sobre oproblema do movimento (ou mu-dança1), os princípios internos sãodetidamente estudados, no con-texto da metafísica aristotélica.Uma conclusão importante nessesestudos refere-se ao número des-ses princípios para a determinaçãodo movimento. Aristóteles concluique são três, consistindo naquiloque sofre a mudança e no par decontrários que representa a dico-tomia falta/excesso. Esses prin-cípios, associados à mudança, deuma maneira em geral, incluemo deslocamento, ou ainda de umamaneira geral, a relação entre na-tureza e movimento. Como afirmaAristóteles no Livro III da Física:

Nature is a principle of mo-tion and change, and it is the

1 Os termos movimento e mudança em Aristóteles não são equivalentes. Évora (2005) aponta as diferenças entreessas duas noções, decisivas para o estudo da física aristotélica. Mas como bem observa Évora (ibid., p. 131), a dis-tinção entre “mudança” e “movimento” não é algo rigidamente estabelecido, pois houve ocasiões em que Aristótelesusou as duas palavras como se fossem apenas sinônimas, e não termos que apresentam diferentes nuances. De qual-quer forma, a distinção entre “mudança” e “deslocamento” é bastante clara em determinadas passagens da Física,conforme podemos observar no seguinte trecho do Livro VIII: “Now of the three kinds of motion that there are– motion in respect of magnitude, motion in respect of affection, and motion in respect of place - it is this last,which we call locomotion, that must be primary” (ARISTOTLE, 1991, Physics, p. 147; 260a27-260b14). Nos termosdo presente artigo, movimento será entendido no contexto da física moderna, ou seja, como deslocamento em umdado referencial no tempo.

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subject of our inquiry. Wemust therefore see that weunderstand what motion is;for if it were unknown na-ture too would be unknown.When we have determinedthe nature of motion, ourtask will be to attack in thesame way the terms, whichcome next in order. (ARIS-TOTLE, 1991, Physics, p.56; 200b 11-21).

É bem conhecida a diferença apre-sentada por Aristóteles entre mo-vimento natural e não-natural de-fendida em Do Céu (On the heavens,269a33). O movimento retilíneoadmite os dois casos, enquanto ocircular admite apenas o natural. Éinteressante ressaltar esse aspecto,pois, para o Estagirita, o contráriode um movimento retilíneo naturalsó pode ser violento. No caso domovimento circular, seu contráriotambém seria circular pois, comovolta a um mesmo ponto, não épor natureza contrário2. Dessa ma-neira, o movimento circular é sem-pre natural e ocorre apenas na re-gião de cima3 (ou supralunar).

Os escritos aristotélicos permi-tem delinear a sua elaborada con-

cepção de movimento, possibili-tando uma reflexão acerca da inér-cia, embora Aristóteles nunca te-nha utilizado esse termo (ele nãotinha uma noção de inércia comouma propriedade do movimento,ao contrário de Galileu). De fato,a inércia (persistência do movi-mento) não está elencada comoum dos princípios internos do mo-vimento, conforme vimos acima.Ademais, Aristóteles não compar-tilhava da ideia de que o movi-mento pudesse persistir por si só,afirmando que este era uma mu-dança de “alguma coisa para outracoisa”, ou seja, algo que possuía uminício e um fim (momentâneos),tese diferente daquela defendidana modernidade, quando o movi-mento foi definido simplesmentecomo um estado. Escreve Aristóte-les:

A consideration of the otherkinds of movement also ma-kes it plain that there issome point to which earthand fire move naturally. Forin general that which is mo-ved changes from somethinginto something, the starting-point and the goal being dif-

2 “Nor again can motion along the circle from A to B be regarded as the contrary of motion from A to C; for themotion goes from the same point towards the same point, and contrary motion was distinguished as motion froma contrary to its contrary. And even if one circular motion is the contrary of another, one of the two would be poin-tless; for that which moves in a circle, at whatever point it begins, must necessarily pass through all the contraryplaces alike. (By contrarieties of place I mean up and down, back and front, and right and left.)” (ARISTOTLE,1991, On the Heavens, p.7-8; 271a19).

3 De acordo com Pellegrin (2010, p. 62), é preciso “notar que os termos ‘supralunar’ e ‘sublunar’ são uma criaçãodos comentadores: Aristóteles fala da região ‘de cima’ e da região ‘daqui”’.

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ferent in form, and always itis a finite change. For ins-tance, to recover health is tochange from disease to he-alth, to increase is to changefrom smallness to greatness.Locomotion must be similar;for it also has its goal andstarting point— and there-fore the starting-point andthe goal of the natural move-ment must differ in form—just as the movement of co-ming to health does not takeany direction which chanceor the wishes of the movermay select. (Ibid., On theHeavens, p. 17; 277a13-277a27).

Essa diferenciação (mudança de al-guma coisa para outra4) será re-tomada adiante, tendo sido men-cionada agora apenas para subli-nhar que Aristóteles considerava omovimento como uma mudança,algo que tinha uma finalidade, eque não poderia persistir indefini-damente5. Logo, Aristóteles nãodefenderia um movimento inercial

– retilíneo -, perpétuo.Antes de analisar detalhada-

mente a negação da inércia emAristóteles, deve-se atentar parao fato de que, para o filósofo, omovimento tem uma finalidade, de-corrência da crença de que cadacorpo possui o seu lugar natural.A partir da noção de lugar natu-ral desenvolve-se toda a dinâmicaaristotélica, pois tal ideia é cru-cial para entender a finalidade dosmovimentos. Como bem lembraKoyré (1966, p.23), para Aristóte-les, “todo corpo é concebido comopossuindo uma tendência ao seulugar natural e, portanto, a retor-nar a esse lugar, quando daí afas-tado por violência”. Essa tendênciaexplicaria seu movimento natural“pelo caminho mais curto e rápido.Segue, então, que todo movimentonatural ocorre em linha reta, e quetodo corpo vai ao seu lugar naturaltão depressa que ele possa, ou seja,tão rápido quanto o meio circun-dante o permitir” (op.cit.)6. Por-tanto, o tipo de movimento reti-líneo (ascendente ou descendente)de cada elemento é determinado

4 Talvez, pudesse se utilizar aqui o termo stoicheíon, associado a “simples corpos” (stoicheia), empregado porAristóteles (Do Céu, 269a). Alguns autores, como Paul Moraux (ARISTOTE, 1965, p. 20) traduzem esse termoacima (“alguma coisa”) como “estado”, que evitamos nesse trabalho, tendo em vista o sentido utilizado no períodomoderno. Preferimos manter a tradução inglesa, que nos parece mais geral e menos problemática. Peters (1967,p. 180) lembra que Platão, no Timeu (201e), foi o primeiro a empregar o termo stoicheíon, mas em um contextolinguístico. Nesse sentido, concordamos com Polito (2015, p.5), que identifica o movimento (deslocamento), nafísica de Aristóteles, com um processo e não com um estado.

5 Aristóteles também menciona no Livro VI da Física que nenhum processo de mudança pode ser infinito comrespeito ao tempo (ARISTOTLE, 1991, Physics, p. 113; 241a 26).

6 “Tout corps est conçu comme possédant une tendance à se trouver dans son lieu naturel, et donc à y revenirdès que, par violence, il en est éloigné (...). Il s’ensuit que tout mouvement naturel s’effectue en ligne droite, et quetout corps va à son lieu naturel aussi vite qu’il le peut, c’est-à-dire aussi vite que le milieu ambiant le lui permet”.

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pelo fato de que cada coisa possuiseu lugar natural, no qual tendea permanecer caso nada altere talmovimento. A explicação de Koyrévem ao encontro da afirmação deAristóteles sobre a relação entre re-pouso e ação externa (constraint)7:

Now all things rest andmove naturally and by cons-traint. A thing moves na-turally to a place in whichit rests without constraint,and rests naturally in a placeto which it moves withoutconstraint. On the otherhand, a thing moves by cons-traint to a place in whichit rests by constraint, andrests by constraint in a placeto which it moves by cons-traint. Further, if a givenmovement is due to cons-traint, its contrary is natu-ral. (ARISTOTLE, 1991,On the Heavens, p. 69;276a22-276b22).

Observa-se, desde já, uma impor-tante divergência entre a filoso-fia aristotélica e a física galileana:para a primeira, o repouso é de-finido pela situação transitório docorpo e pelo lugar natural; para a

física moderna, o repouso é um es-tado do movimento.

A citação acima mostra a dicoto-mia entre movimento natural e nãonatural, explicada anteriormente.No entanto, no supracitado trecho,o Aristóteles diz que as coisas po-dem ser compelidas a se mante-rem em movimento. Ao dizer isso,ele reforça a tese de que existi-ria uma tendência ao repouso, con-forme afirma Koyré:

Ainsi, tout mouvement im-plique un désordre cosmique,une rupture d’équilibre, qu’ilsoit lui-mème effet immédiatd’une telle rupture, causéepar l’application d’une forceextérieure (violence), ou, aucontraire, effet de l’effortcompensateur de l’être pourretrouver son équilibre perduet violé, pour ramener leschoses à leurs lieux- na-turels, convenables, où ilspourraient reposer et se repo-ser. C’est ce retour à l’ordrequi constitue justement ceque nous avons appelé mou-vement naturel. (KOYRÉ,1966, p. 19)

Ou seja, tanto o movimento na-

7 Preferimos, aqui, não usar o termo força, como fazem alguns autores, pelo significado teórico que esse con-ceito assume na física moderna, especialmente com Isaac Newton. Mantemos a noção de “coação” ou ação externa.Muitas traduções utilizam o termo força em Aristóteles. No entanto, como bem observa Jammer (1999, p. 34),Aristóteles utiliza o termo força (dynamis) em dois sentidos – ativo e passivo; Platão, como já havia assinaladoCornford (1951, p. 236), também a utiliza nesses dois sentidos, mas a noção tem, nesse caso, origem na medicinagrega antiga.

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tural quanto o violento são dese-quilíbrios, caracterizando-se comoa causa da desordem (movimentonão natural ou “violento”) ou atentativa (movimento natural) deretornar à condição anterior, queconsiste no repouso de cada coisaem seu lugar natural correspon-dente. O repouso é o propósito(sake) do movimento8.

Assim, o movimento (comotranslação) cessa (momentanea-mente) quando o corpo movidoencontra o seu lugar natural. Ese o movimento natural admiteum contrário, ele não pode ser cir-cular, afinal movimentos circularesnão possuem contrários (ARISTO-TLE, 1991, On the Heavens, p. 7;270b32). Assim, as coisas que re-pousam em seus lugares naturais,afastam-se deles por ação externa eretornam devido à natureza (admi-tindo sempre um movimento con-trário) realizam um movimento reti-líneo, que só pode ocorrer no mundosublunar. Evidenciou-se que porser o movimento uma mudança deuma coisa para outra, ele não podepersistir indefinidamente, logo osmovimentos ascendente e descen-dente (que caracterizam contráriose assim só podem ser retilíneos)não são eternos. Conclui-se queAristóteles não teria defendido umainércia do tipo retilíneo ou linear,entendimento corroborado pela se-

guinte passagem do Livro VIII daFísica:

For the line traversed in rec-tilinear motion cannot be in-finite; for there is no suchthing as an infinite straightline; and even if there were,it would not be traversedby anything in motion; forthe impossible does not hap-pen and it is impossible totraverse an infinite distance.On the other hand, rectili-near motion on a finite lineis composite if it turns back,i.e. two motions, while ifit does not turn back it isincomplete and perishable;and in the order of nature,of definition, and of timealike the complete is prior tothe incomplete and the im-perishable to the perishable.Again, a motion that admitsof being eternal is prior toone that does not. Now ro-tatory motion can be eternal,but no other motion, whetherlocomotion or motion of anyother kind, can be so, sincein all of them rest must oc-cur, and with the occurrenceof rest, the motion has pe-rished. (ARISTOTLE, Phy-sics, 1991, p. 156; 265a17-27).

8 “[S]ince all the rest is for the sake of the end.” (ARISTOTLE, Physics, p. 32; 199a33)

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Ou seja, para Aristóteles é impossí-vel um corpo mover-se sobre umalinha reta infinita, pois não há li-nhas retas infinitas, e mesmo sehouvesse, seria impossível de serpercorrida. Afinal, é necessáriolembrar que Aristóteles defendia aexistência de um mundo finito, li-mitado por uma esfera.

Considerando-se que Aristótelestenha rejeitado a ideia de uma inér-cia linear, cabe agora analisar se eleteria intuído algo como uma “inér-cia” circular9. Em algumas pas-sagens de sua obra, quando tratado movimento circular, percebe-se que Aristóteles admitiu certa-mente a eternidade desse movi-mento10.

Contudo, mesmo intuindo aconservação do movimento (circu-lar), Aristóteles não abandonou aideia de causa, o que foi feitona modernidade11. A sentençaque inicia o Livro VII da Fí-sica expressa bem isso, pois Aris-tóteles afirma que “tudo o que

muda deve ser mudado por al-guma coisa”12 (ARISTOTLE, 1991,p. 115, Physics; 241b34). Talprincípio abrange tanto os corposdo mundo sublunar quanto aque-les do mundo supralunar, mas en-quanto os primeiros necessitam deuma força externa para se desloca-rem de seus respectivos lugares na-turais, os corpos celestes não de-pendem de contato para permane-cerem em movimento, e o fazemsegundo sua própria natureza13.

No entanto, como é bem conhe-cido, no livro XII da Metafísica,Aristóteles defendeu a existênciade um primeiro movente, eterno eimóvel, que seria a causa dos movi-mentos eternos e circulares no es-paço, e que move sem ser movido.Além disso, Aristóteles diz que, naregião supralunar, não existe ape-nas um único tipo de movimento es-pacial, uma vez que existe o movi-mento irregular dos planetas; as-sim, para cada movimento espacialdeve existir uma causa correspon-

9 A rigor, não se poderia falar em inércia, a não ser linear. O que queremos examinar aqui é se Aristóteles, eposteriormente Galileu, pensam em algum tipo de movimento que persiste independentemente da ação de umaforça externa, seja retilíneo ou não. Na terminologia aristotélica, sem a ação de uma causa eficiente.

10 [...]Now rotatory motion can be eternal; but no other motion, whether locomotion or motion of any otherkind, can be so, since in all of them rest must occur, and with the occurrence of rest the motion has perished(ARISTOTLE, 1991, Physics, p. 156; 265a 24).

11 Fátima Évora afirma que “a ideia de causa presente no conceito de movimento que sustenta e apoia a física an-tiga e medieval é eliminada no conceito de movimento da mecânica galileano-cartesiana. De acordo com a mecânicamoderna, o movimento não mais corresponde a um processo de mudança, como ocorre na dinâmica aristotélica,mas é um estado inteiro e absolutamente oposto ao repouso, o outro estado, e como tal não necessita de uma causapara mantê-lo. Uma causa será necessária apenas para alterar o estado do corpo. Este novo conceito de movimentoestá no cerne do princípio de inércia” (ÉVORA, 2005, p. 130, nota 6). Voltaremos a esse aspecto na continuidadedesse trabalho, quando discutiremos a inércia galileana.

12 “Everything that in motion must be moved by something”. Aristóteles retoma essa ideia em Do Céu: “Further,since everything that is moved is moved by something” (ARISTOTLE, 1991, On the Heavens, p. 37; 288a28).

13 (Ibid., p. 4, 269a5).

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dente, sendo esta uma substânciaeterna e imóvel. Ou seja, não existeapenas um movente14. Dessa ma-neira, o Estagirita situa-se numaposição curiosa para a Física mo-derna: para os movimentos do céu,defende uma espécie de causa efi-ciente – pois os motores são subs-tância -, mas sem contato, gerandoum movimento eterno, embora ir-regular. Ou seja, é causa, masnão uma força, no sentido que seráaprimorada por Descartes e Gali-leu; trata-se de uma ação, ou força“metafísica”, se assim podemos nosexprimir, e não física, como exi-girá a Física dos séculos XVII eXVIII. Rigorosamente, não se tratade uma inércia, mesmo circular,pois algo causa o seu movimento.No entanto, como não há contatofísico, temos um caso raro de movi-mento privilegiado e natural, quepersiste. Ou seja, seguindo nossoraciocínio, uma “inércia (circular)metafísica”. Como veremos, Gali-leu ainda não irá superar comple-tamente essa dificuldade.

As críticas à dinâmica aristoté-lica

As primeiras críticas à mecânicade Aristóteles surgiram menos dedois séculos após a morte do fi-lósofo, formuladas pelo astrônomo

Hiparco, que contestou a expli-cação aristotélica acerca do movi-mento dos projéteis, após a perdado contato com o motor. Hiparcoelaborou o conceito de força im-pressa, defendendo que o projétilpermanecia em movimento porque“a ação do motor (força externa)imprimiria ao corpo movente (pro-jétil) certa ‘força impressa”’ (BER-TOLDO, 2004, p. 26). Ou seja, aoinvés de o motor empurrar o ar nomomento do lançamento do projé-til (fazendo assim com que este sejaimpelido pelo ar e mantenha-se emmovimento, como pretendia Aris-tóteles), ele transmitiria algo aopróprio projétil, permitindo a con-tinuidade do deslocamento deste.Enquanto o projétil permanecesseem movimento, tal “força” dimi-nuiria paulatinamente, e após suacompleta dissipação, o movimentocessaria e o corpo passaria ao suacondição natural de repouso (ibid.,p. 26).

A tese de Hiparco não foi aceita,possivelmente por que, em parte,contrariava os ensinamentos do Es-tagirita. Mas Bertoldo (ibid., p. 27)menciona outras possíveis razõespara essa rejeição:

Provavelmente ela [a teoriade Hiparco] lhes devia pare-cer por demais abstrata ou

14 Nas palavras de Aristóteles, “That the movers are substances, then, and that one of these is first and anothersecond according to the same order as the movements of the stars, is evident”. (ARISTOTLE, 1991, Metaphysics, p.177-8; 1073b17).

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especulativa. Pois, como po-deriam crer que algo empur-rava o projétil, mas que nãopodiam ver e nem mesmoimaginar? [...] Também sepode acrescentar o fato deque a teoria de Hiparco erafraca ou mesmo insuficienteporque seu autor não apre-sentou nenhuma prova ob-jetiva para dar fundamentoà sua revolucionária concep-ção de “força impressa”, oque também ajudou a contri-buir para que ela caísse nomais completo esquecimentodurante séculos, até vir a serredescoberta por outros pes-quisadores.

Apenas no início da Idade Média ateoria de Hiparco ressurgiu comouma alternativa à solução de Aris-tóteles para o problema do movi-mento dos projéteis, por meio dasideias de João Philoponos15 (sé-culo VI d.C.). Como afirma Évora(1995a, p. 291):

[...] apesar de a literatura

dar enorme destaque à te-oria da força cinética im-pressa e incorpórea associ-ada à explicação do movi-mento violento, ela não cons-titui um elemento inovadorisolado. Ela faz parte de todauma teoria de movimento,desenvolvida por Philoponosque inclui um novo conceitode lugar, que implica numanova concepção de movi-mento natural e violento, ea fortiori numa nova dinâ-mica, alternativa à aristoté-lica. De acordo com a dinâ-mica de Philoponos, a velo-cidade de um corpo em mo-vimento é determinada peladiferença aritmética – e nãopela razão como propunhaAristóteles – entre a potên-cia motriz e a resistênciado meio através do qual ocorpo se move. O meio, se-gundo Philoponos, desempe-nha uma função unicamenterestritiva.

Ou seja, Philoponos nega a influên-

15 A influência de Philoponos manteve-se durante a Idade Média devido à aceitação de algumas de suas ideiaspor parte dos pensadores árabes. Diz Évora (1995b, p. 82): “Esta influência deu-se principalmente através dosárabes Avicena, ou Ibn Sina (980 – 1037), e Avempace, ou Ibn Badja (1106 – 1138), que advogaram a tese de que alei do movimento de Aristóteles deveria ser substituída pela lei da diferença aritmética, tal qual propôs Philopo-nos”. Ou seja, ao invés de considerar que a velocidade de um corpo em movimento é proporcional à razão entre aforça motriz (F) e a resistência ou densidade do meio (R) - ou, em outras palavras, em uma formulação algébricamoderna para a concepção aristotélica, a velocidade do corpo é dada pelo quociente entre F e R (v = F/R)-, Avicenae Avempace optaram por endossar a proposta de Philoponos, segundo a qual a velocidade do corpo não era dadapelo quociente, mas sim pela diferença entre a força motriz e a resistência do meio. Novamente, em uma notaçãomoderna, v = F - R. Sendo assim, apesar de as primeiras edições conhecidas da obra de Philoponos acerca da físicaaristotélica datarem de 1535 (grego) e 1542 (latim), “há hoje fortes evidências com respeito a sua influência nodesenvolvimento da filosofia da natureza anterior ao século XVI” (ibid., p. 82).

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cia do meio (ar) no movimento vio-lento (projéteis), embora não tenharejeitado a ideia de que tudo o queé movido deve ser movido por al-guma coisa. A solução encontradapor Philoponos foi propor queaquilo que provoca o movimentotransmite ao projétil uma força in-corpórea responsável pelo desloca-mento das coisas após elas perde-rem o contato com o motor inicial.Segundo Philoponos, não haveriaevidências de que o movimento vi-olento seria causado da maneiraconforme conjecturou Aristóteles(ÉVORA, 1995a, p. 292). O Estagi-rita havia proposto duas possíveisrespostas ao problema da continui-dade do movimento dissociado domotor inicial, e ambas são rejeita-das por Philoponos. Conforme ex-plica Évora (1993, p. 86):

[...] os projéteis são mo-vidos adiante mesmo depoisque aquilo que deu a elesseu impulso não esteja maistocando-os, ou 1) pela razãoda substituição recíproca16,de acordo com a qual o arempurrado adiante pelo pro-jétil volta e toma o lugar doprojétil, e então empurra-oadiante como alguns susten-tam; ou 2) pelo fato de que o

ar que foi empurrado, no ins-tante em que o projétil é ini-cialmente disparado, move-se com um movimento maisrápido do que a locomoçãonatural, para baixo do projé-til, empurrando assim o pro-jétil adiante.

De acordo com Évora, Aristótelesaparentemente preferiu a segundaexplicação para o movimento re-tilíneo violento, citando algumaspassagens da Física para corrobo-rar tal assertiva (215a15 e 266b28–267a15). Em todo caso, Philopo-nos discorda de ambas as explica-ções. No que concerne à primeira,na qual o ar empurrado pelo pro-jétil efetua um movimento contrá-rio, retornando para ocupar o lugardo corpo e impulsioná-lo adiante,Philoponos faz a seguinte conside-ração:

Let us suppose that anti-peristasis take place accor-ding to the first method in-dicates above, that the airpushed forward by the arrowgets to the rear of the ar-row and thus pushes it frombehind. On that assump-tion, one would be hard putto it to say what is (since

16 A ideia de substituição recíproca é denominada antiperistasis, termo que designa o processo pelo qual o arocupa o lugar do projétil, impelindo-o adiante e sendo, portanto, responsável pela manutenção do movimento docorpo. Nos termos de Cohen e Drabkin (citado também por ÉVORA, 1993, p. 87), “[t]he term is used in general ofthe process whereby P1 pushes P2 into P3‘s place, P2 pushes P3 into P4‘s place,. . . , Pn-1 pushes Pn into P1‘s place(COHEN & DRABKIN, 1966, p. 221 nota 8).

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there seems to be no coun-ter force) that causes theair, once it has been pushedforward, to move back, thatis along the sides of the ar-row, and, after it reaches therear of the arrow once moreand push the arrow forward.(. . . ) Such a view is quiteincredible and borders ratheron the fantastic (Philoponosapud. COHEN & DRAB-KIN, 1948, p. 221-222).

A segunda opção é consideradamais plausível por Philoponos,mas igualmente equivocada. Asuposição de que o ar seja capazde manter uma flecha ou pedraem movimento, mesmo após o pri-meiro motor não estar mais emcontato com o corpo lançado, se-ria plausível e não haveria a ne-cessidade de um motor. No en-tanto, logo a seguir ele apresentasuas objeções, fazendo uso de ex-periências de pensamento (recursoanálogo será empregado por Gali-leu, séculos mais tarde, também noproblema do movimento). A con-clusão final de Philoponos se con-figura, certamente, com a primeiraformulação mais aprimorada deum esboço para a noção de con-servação da quantidade de movi-mento e uma semente para o prin-cípio de inércia, como será ex-pressa muitos séculos mais tardepor Descartes nos Princípios da Fi-

losofia:

From these considerationsand from many others wemay see how impossible itis for forced motion to becaused in the way indica-ted. Rather is it necessaryto assume that some incorpo-real motive force is impartedby the projector to the pro-jectile, and that the air setin motion contributes eithernothing at all or else very lit-tle to this motion of projec-tile. (. . . ) And there willbe no need of any agency ex-ternal to the projectile (. . . ).(Philoponos apud. COHEN& DRABKIN, 1948, p. 223.Grifo dos autores).

Aristóteles recusou a ideia da exis-tência do vazio porque ela seriaincompatível com a sua Física (ecom a sua Metafísica), pois acre-ditava que o meio (ar) era o res-ponsável pelo movimento violento,algo que seria impossível no vazio,uma vez que “le vide, en effet, n’estpas un milieu et ne peut pas re-cevoir et donc transmettre et en-tretenir le mouvement”. (KOYRÉ,1966, p. 23). Philoponos não con-sidera esse aspecto como uma difi-culdade, pois defendia que o movi-mento era causado por uma forçaincorpórea impressa ao corpo, sema necessidade da ação do meio. Sob

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essa perspectiva, o movimento vi-olento poderia persistir no vazio.No caso dos movimentos naturais,cujo “motor é a própria naturezado corpo, a sua forma, que procurareconduzi-lo ao seu lugar” (ibid., p.26), o meio não desempenha o pa-pel de conservar o movimento, masapenas o de resistir a ele. Con-tudo, os corpos tendem a retornarao seu lugar natural o mais de-pressa possível, sendo retardadosapenas pela resistência do meio,inexistente no vazio. Consequen-temente, para Aristóteles, no vá-cuo, o movimento desses corpos se-ria instantâneo. Em resumo, o Es-tagirita rechaça a hipótese do vazioporque este implicaria a inexistên-cia do movimento violento (como ovazio não é um meio, ele não podeconservar o movimento) e do movi-mento natural (a velocidade desteseria infinita, algo absurdo).

Finalmente, embora o vazio nãoseja algo absurdo para Philopo-nos, esse filósofo parece não ad-mitir a possibilidade de um mo-vimento inercial. Como observaÉvora (1995b, p. 80-81):

Essa força motriz incorpórea,segundo Philoponos, não éuma coisa de natureza per-manente, mas desaparecegradualmente, até mesmo novazio. Esta diminuição sedá devido a uma dupla re-sistência: a) devido ao meio,b) devido a tendência do

corpo pesado de ir para oseu lugar natural. Philopo-nos portanto permanece sus-tentando uma postura anti-inercial, pois se, de acordocom sua teoria, a força mo-triz incorpórea não pode du-rar para sempre, também omovimento não pode durarad infinitum.

A questão do movimento segundoThomas Bradwardine

A despeito das críticas, formu-ladas nomeadamente por Hiparcoe Philoponos, a física aristotélicacontinuou ditando os rumos da ci-ência medieval até o século XIII.Segundo Steenberghen (1984, p.145):

O aristotelismo, prolongadoe completado pelo neoplato-nismo greco-árabe, não ofe-recia somente aos Latinos oselementos de uma vasta sín-tese filosófica, mas uma in-terpretação coerente e com-pleta, muitas vezes enge-nhosa, de todos os dadosobserváveis respeitantes aouniverso corporal [...]. Sese acorda em chamar “fí-sica aristotélica” a esta im-ponente tentativa de explica-ção integral da ordem cós-mica, pode dizer-se que estafísica de modo nenhum fora

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posta em causa no séculoXIII.

Todavia, o prestígio do aristote-lismo diminuiu no decorrer doséculo XIV17. Nesse século, umgrupo de filósofos e de lógicosresolveu empreender um estudomatemático acerca do movimento.Devido ao fato de a maioria delester lecionado no Merton College, emOxford, ficaram conhecidos como“mertonianos”, termo que posteri-ormente foi substituído por “cal-culadores” (CROMBIE, 1953, p.261), destacando assim a disposi-ção desses pesquisadores em inves-tigar a natureza sob uma perspec-tiva matemática. Ademais, esta-beleceram a distinção entre movi-mento uniforme (cuja velocidade éconstante) e movimento uniforme-mente disforme, que na linguagemmoderna recebeu o nome de movi-mento uniformemente acelerado. Nocaso deste último, não é a velo-cidade que é constante, mas sima variação dessa velocidade. Wil-liam Heytesburg (1313 – 1372),membro do Merton College, definiucomo a “velocidade da velocidade”(op.cit.).

É nessa tradição de pensamento

na qual se insere Thomas Bradwar-dine. Enquanto Aristóteles bus-cava investigar o movimento com-parando o deslocamento dos cor-pos, Bradwardine defendeu que osmovimentos podiam ser analisadospor si mesmos, comparados por in-termédio de suas grandezas. Trata-se de um estudo que envolve pro-porções, designado simplesmentepor cálculo (CUSTÓDIO, 2004, p.36). Acerca de Aristóteles, explicaCustódio (ibid., p. 36):

Para Aristóteles, a questãorelevante não era o cálculo,mas investigar quais as de-terminantes naturais que ex-plicam, objetivamente, a ex-periência sensível do au-mento ou da diminuição davelocidade do movimento.Esta investigação podia serfeita considerando, por umlado o efeito e, por outro, acausa. Não se trata aindade investigar o ato do movi-mento por ele mesmo, comopropõe Bradwardine, mas defazê-lo sob o ponto de vistado móvel, no primeiro caso,e sob o ponto de vista domotor, num segundo caso;

17 Antes disso, ainda no final do século XIII, a doutrina aristotélica conforme era ensinada na Faculdade de Artesda Universidade de Paris sofreu um claro revés quando, em 18 de janeiro de 1277, o papa João XXI pediu para queo bispo da cidade, Estêvão Tempier, conduzisse uma investigação acerca dos ensinamentos dos Mestres de Artes daUniversidade. Pouco mais de um mês depois, em 7 de março, houve a condenação de 219 proposições baseadas noaristotelismo, incluindo teses de Avicena (GILSON, 2007, p. 694), o tomismo (STEENBERGHEN, 1984, p. 133) e atese averroísta da “dupla verdade”, que por sua vez “consistia em sustentar que uma mesma proposição podia serconsiderada simultaneamente falsa, do ponto de vista da fé, e verdadeira, do ponto de vista da razão” (GILSON,2007, p. 694).

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sendo que a estes dois estu-dos somava-se um terceiro,relativo às causas.

Assim como os corpos mais gra-ves caem mais rapidamente, “entredois corpos leves, o de maior levezasubirá mais rapidamente” (ibid., p.38). Em suma, o estudo das cau-sas (das inclinações “para baixo”ou “para cima” dos móveis) per-mitia que Aristóteles comparassedois movimentos naturais e perce-besse qual deles era o “mais in-tenso” (ibid., p. 37). A veloci-dade de um corpo em movimentonatural é igual a sua tendência dedeslocar-se para o seu lugar na-tural, dividida pela resistência domeio (ibid., p. 38), relação que, emnotação moderna, seria expressa,como vimos acima (nota 15), pelaexpressão v = F/R18.

Bradwardine, por sua vez, acre-ditava que os movimentos pode-riam ser comparados no que tangeàs suas grandezas (velocidades). Opeso e a leveza eram considera-dos qualidades dos corpos compos-tos (ou seja, dos corpos formadospor alguma combinação dentre oselementos terra, água, ar e fogo),embora fossem consideradas forçasagindo em direções contrárias nointerior de um mesmo corpo com-posto. Ou seja, o que determina aforça motriz, e consequentemente

a resistência interna de um corpocomposto é a predominância deelementos “pesados” ou “leves” naconstituição do corpo. Da mesmaforma, quando o peso é a qualidadepredominante, ele se torna a forçamotriz do corpo como um todo,tendo por resistência a leveza. Aideia é que a velocidade é direta-mente proporcional ao peso e in-versamente proporcional à leveza.

Bradwardine parece ter sido pi-oneiro no estudo matemático domovimento, tendo buscado rela-cionar força, resistência e veloci-dade (CROMBIE, 1953, p. 247).O resultado desses esforços consis-tiu na elaboração de um Tratadosobre as proporções, onde Bradwar-dine tratou acerca da “precisa rela-ção matemática entre a magnitudeda força motora de Aristóteles, aforça do meio resistente e a veloci-dade alcançada pelo corpo em mo-vimento” (RONAN, 1983, p. 266).Após refutar todas as alternativasexistentes, por notar que nenhumadelas condizia com a ideia aris-totélica de que só há movimentoquando a força é superior à resis-tência, Bradwardine propôs que ovalor da velocidade dependia darazão entre a força motora e a resis-tência interna em uma formulaçãoque poderia ser escrita, segundoCrombie (ibid., p. 248), em umanotação moderna, segundo a fun-

18 Ver acima nota 15.

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ção logarítmica dessa razão forçamotriz e velocidade. Essa foi aforma, segundo Crombie, conhe-cida a partir do século XIV.

Os estudos de Bradwardine re-presentarem uma novidade em re-lação àquilo que era feito até o mo-mento, embora a sua base aindanão fosse experimental, mas me-ramente lógica, assim como a dosdemais estudiosos do Merton Col-lege. Essa nova forma de investi-gação física certamente influenciouo trabalho de Galileu séculos de-pois, especialmente com suas ex-periências de pensamento aplica-das ao estudo do movimento.

Jean Buridan

Segundo Crombie (ibid., 246-53), outros pensadores, além dePhiloponos, já no período clássico,não aceitavam a física aristotélicado movimento não-natural. Noperíodo medieval, como vimos, ospensadores do Merton College de-fendiam que o projétil mover-se-iadevido a uma “potência” proveni-ente do meio. A ideia desenvolvidapor Hiparco, e que foi aprimoradapor Philoponos, segundo a qual omotor transmitia algo ao movente,voltou a ser defendida em meadosdo século XIV, sobretudo pelo inte-lectual francês Jean Buridan (1300– 1358), discípulo de Guilherme de

Ockham (1285–1347), e que se tor-nou reitor da Universidade de Parisem 1328. Todavia, não existem evi-dências de que Buridan teve acessoaos escritos de Philoponos, poiscomo esclarece Évora (1993, p. 91-92):

[...] existe certa controvérsiasobre a influência da “teoriada força motriz incorpórea”de Philoponos sobre a “teoriada força motriz”, que se tor-nou amplamente aceita noséculo XIV e que foi poste-riormente elaborada por JeanBuridan (1300?-1358) sobo nome de “teoria do impe-tus”. Isso porque os escri-tos de Philoponus sobre estetema só se tornaram conhe-cidos em 1535, numa versãogrega, e em 1542, em latim.

Não obstante o provável desconhe-cimento das teses de Philoponos,Buridan também foi um comenta-dor da obra peripatética e tambémcriticou a explicação de Aristóte-les para o movimento dos projé-teis. Dentre os argumentos utiliza-dos para contestar a solução aris-totélica para o problema do des-locamento dos projéteis, Buridananalisa a possibilidade da antipe-ristasis19, ou seja, de que o ar mo-vido pelo projétil no ato do lança-

19 Ver acima, nota 16.

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mento realiza um movimento con-trário e então impulsiona o corpo,mantendo-o em movimento. Buri-dan demonstra a sua discordânciaem relação à tese aristotélica men-cionando o caso hipotético de umnavio em movimento, no qual ha-veria um marinheiro sobre o con-vés. Esse marinheiro não se senti-ria impelido adiante pelo ar, masao invés disso sentiria que o ara sua frente oferecer-lhe-ia resis-tência. Ademais, caso o homemestivesse posicionado atrás de al-guma carga (como grãos ou ma-deira), ele seria empurrado violen-tamente entre tal carga e o ar atrásdele, na hipótese de que o ar te-ria o poder de locomover o navio.Segundo Buridan, isso é refutadopela experiência20.

Em linhas gerais, trata-se deconsiderar que o ar não impulsi-ona os corpos, mas sim resiste aomovimento destes. Portanto, se oar não é o responsável pelo des-locamento dos projéteis, algo devefazê-lo, e segundo Buridan tratar-se-ia de uma força motriz (virtusmotiva) ou de um ímpeto (impetus)impresso ao corpo, ou seja,

it seems to me that it oughtto be said that the motorin moving a moving body

impresses (imprimit) in ita certain impetus (impetus)or a certain motive force (vismotiva) of the moving body,[which impetus acts] in thedirection toward which themover was moving the mo-ving body, either up or down,or laterally, or circularly.And by the amount themotor moves that movingbody more swiftly, by thesame amount it will im-press in it a stronger im-petus. It is by that im-petus that the stone is mo-ved after the projector cea-ses to move. But that impe-tus is continually decreased(remittitur) by the resistingair and by the gravity of thestone, which inclines it in adirection contrary to that inwhich the impetus was na-turally predisposed to moveit. Thus the movement ofthe stone continually beco-mes slower, and finally thatimpetus is so diminished orcorrupted that the gravity ofthe stone wins out over itand moves the stone downto its natural place. (CLA-GETT, 1961, p. 534-535.Grifo do autor.)

20 Esse exemplo do navio, utilizado por Buridan para refutar a hipótese da antiperistasis, está contida no LivroVIII, questão 12, de uma obra intitulada Questiones super Octo Physicorum Libros Aristotelis, publicada em Paris em1509. Tal texto foi traduzido por Marshall Clagett em The Science of Mechanics in the Middle Age (CLAGETT, 1961).Estamos utilizando aqui as citações de Buridan, conforme traduzido por Clagett.

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Da mesma forma como fizera Phi-loponos, Buridan admitiu que aforça motriz reduzir-se-ia devido àresistência do meio, mas contraria-mente ao filósofo neoplatônico, de-fendeu que tal impulso seria de na-tureza permanente, e que só nãose mantinha ad infinitum no pro-jétil por causa de forças externascontrárias. Ou seja, Buridan admi-tiu que o movimento pudesse di-minuir, embora não aceitasse quetal processo tratar-se-ia de algo es-pontâneo, conforme parece ter sidopara Philoponos21. Para Buridan,o impetus seria de natureza perma-nente (res nature permanentis) casonão houvesse a resistência do meioe a gravidade, que atuariam no en-fraquecimento dessa força motriz.No entanto, esse autor não renun-ciou completamente à física aris-totélica, pois manteve a ideia deque os corpos possuíam lugares na-turais para os quais tenderiam adeslocar-se.

A ideia de que o impetus seriauma qualidade permanente confe-rida ao projétil, responsável pelomovimento, seria uma antecessorada noção de inércia (CLAGETT,1961, 525). De fato, existe certasimilaridade entre ambos, nomea-damente no que se refere à tese deque o movimento persistiria na au-

sência de alguma força contrária.Não obstante, é preciso atentar-seàs sutilezas envolvidas na formu-lação de cada conceito, relaciona-das com o contexto histórico do de-senvolvimento da ciência, no qualo impetus estaria atrelado a umavisão de mundo - imagem de na-tureza, na terminologia de Abran-tes (op.cit.) -, mais marcadamentearistotélica. De fato, no caso doimpetus deve-se ter em mente queBuridan era adepto da teoria aris-totélica de que haveria lugares na-turais, e sendo assim que os corposvisariam o repouso. Logo, o “ím-peto” explicaria porque o projétilcontinuaria sua trajetória antinatu-ral, contrariando a condição natu-ral de repouso. Nesse caso, o movi-mento (natural ou violento) repre-senta, como vimos, uma condiçãode desequilíbrio.

Por outro lado, as concepções deBuridan acerca do movimento di-ferem das de Aristóteles porque oprimeiro buscou aplicar a teoria doimpetus tanto para o movimentoterrestre quanto para o celeste, fa-zendo com que as dinâmicas dosdois mundos fossem regidas pelomesmo conjunto de leis (ÉVORA,1993, p. 95). A unificação das me-cânicas terrestre e celeste contrari-ava a separação entre as regiões su-

21 Conforme exposto acima, Philoponos postulou que haveria uma força motriz responsável pelo movimento doscorpos, tanto natural quanto violento. De acordo com Évora, a força motriz incorpórea de Philoponos “não é umacoisa de natureza permanente, mas desaparece gradualmente, até mesmo no vazio” (ÉVORA, 1995b, p. 80).

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blunar e supralunar, que, segundoAristóteles, seriam governadas porleis distintas. Entretanto, ao pos-tular que o impetus era conferidopor Deus aos corpos celestes, Buri-dan volta a se aproximar das ideiasaristotélicas a respeito do movi-mento na região supralunar. Ouseja, diferente da noção de inérciado período moderno, a ação de umprimeiro movente (Aristóteles), ouo impetus de origem divina22 (Bu-ridan), exigem a presença de umaforça (metafísica).

Nicolas Oresme e a defesa do mo-vimento da Terra

Discípulo de Buridan, NicolasOresme (1320/23-1382), discor-dou de algumas ideias domestre,inclusive em relação à teoria doimpetus. Para Oresme, o impe-tus não era uma qualidade per-manente conforme pensava Buri-dan, mas algo que se consumiacom o tempo. No entanto, Oresmenão se limitou apenas a discutiros pormenores da teoria do impe-tus, ocupando-se também com adiscussão acerca da possibilidadedo movimento da Terra (conside-rado como uma hipótese, pois es-taria em conflito com a fé cristã), o

que o aproximou de uma noção deinércia e da relatividade do movi-mento.

Oresme discute o movimento daTerra examinando o conhecido ar-gumento da pedra atirada para oalto. Segundo ele, a pedra rea-liza dois tipos de movimentos si-multaneamente, tanto ao ser ar-remessada, quanto ao retornar aolocal do qual foi lançada. Issopor que, enquanto se move verti-calmente para cima e depois parabaixo, a pedra também efetua ummovimento circular, estando con-comitantemente em trajetória reti-línea e circular. Com isso, a pe-dra acompanha o movimento daTerra23, e assim cai precisamenteno mesmo ponto a partir de ondefoi arremessada. Entretanto, talsolução apresenta outro problema:por que nós não percebemos essemovimento composto do corpo?A resposta de Oresme vincula-seà ideia da relatividade do movi-mento, antecipando, assim, os ar-gumentos de Nicolau Copérnicoem quase duzentos anos. Resu-midamente, o argumento pode serdescrito do seguinte modo: umapessoa que estivesse a bordo de na-vio, mas sem ter consciência domovimento deste, pensaria que ao

22 Vale lembrar a semelhança incontestável da presença divina na origem do movimento na física de Descartes,conforme apresentada nos Princípios da Filosofia. Voltaremos a esse problema no próximo trabalho.

23 Trata-se da ideia de que um corpo qualquer, tal como uma flecha ou pedra, “é parte do sistema mecânico darotação da Terra, tal qual um homem que move sua mão verticalmente para cima e para baixo em um mastro éparte do sistema mecânico do navio” (CLAGETT, 1961, p. 599).

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deslizar sua mão em linha reta aolongo do mastro, ela estaria emmovimento retilíneo, quando naverdade a mão realizaria um mo-vimento composto: mover-se-ia deforma retilínea para baixo e tam-bém horizontalmente, seguindo adireção do navio, que por sua vezdeslocar-se-ia para leste. O tripu-lante é partícipe do movimento daembarcação, e como tal não per-cebe que está em movimento jun-tamente com ela.

Porém, segundo Évora (1993, p.99), havia a necessidade de lidarcom o argumento aristotélico deque cada corpo simples possui umprincípio motor. No caso da Terraimóvel, tal problema não se coloca-ria, mas caso ela estivesse em rota-ção, sua trajetória seria antinaturale exigiria o contato direto e perma-nente de um motor externo, para amanutenção desse movimento con-trário à natureza, em consonân-cia com a filosofia de Aristóteles.Oresme contornou a dificuldadepropondo que a Terra deslocar-se-ia naturalmente de modo circu-lar, dispensando a necessidade deuma força externa para mantê-laem movimento, já que este serianatural. Consequentemente, estetambém seria o movimento naturaldos corpos terrestres, na qualidadede partícipes do deslocamento daTerra, embora não possamos per-ceber a trajetória circular dos cor-pos a nossa volta, pela simples ra-

zão de que também compartilha-mos de tal movimento. Com isso,Oresme opôs-se a Aristóteles, umavez que este defendia que o mo-vimento circular era característicodos corpos celestes, enquanto queo retilíneo era próprio dos corposterrestres; contudo, isso não re-presentou uma ruptura completa,pois Oresme admitiu que os obje-tos terrestres também pudessem sedeslocar naturalmente de maneiraretilínea e para baixo, desde quenão estivessem em seu lugar na-tural (ibid., p. 100). Em resumo,Oresme defendeu a existência dedois tipos de movimento naturalpara os corpos terrestres: o circu-lar, devido ao fato de que a Terramover-se-ia circularmente; e o re-tilíneo (para baixo), que ocorreriaquando o corpo buscasse retornarao seu lugar natural.

Gilson (2007, p. 850) defendeque Oresme superou Buridan eanunciando as pesquisas de Des-cartes e Galileu, “Nicolau Oresmeé o predecessor direto de Copér-nico” (ibid.). Entretanto, a teo-ria de Oresme ainda estava incom-pleta, pois lhe faltou a percepçãoda propriedade inercial do movi-mento dos corpos.

Copérnico e o movimento relativo

A importância de Nicolau Co-pérnico (1473–1543), não somentepara a Astronomia, mas também

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para a Revolução Científica do sé-culo XVII, é muito conhecida eamplamente estudada (DUHEM,1913-1959; REICHENBACH, 1942;KUHN, 1985; CROWE, 1990; AP-PLEBAUM, 2000; HOLTON andBRUSH, 2005)24. Consciente deque a publicação do tratado AsRevoluções dos Orbes Celestes po-deria trazer-lhe problemas peranteas autoridades eclesiásticas, Copér-nico manteve o manuscrito em seupoder durante muitos anos, con-forme o próprio relata no Prefá-cio do livro, dedicado ao papaPaulo III (COPÉRNICO, 1984, p.6). Nesse Prefácio, Copérnico apre-senta sua teoria como uma “hipó-tese”. No entanto, o sentido dessetermo não é isento de controvér-sias. Na verdade, importantes in-terpretes do trabalho de Copérnicoavaliam que ele estaria conside-rando seu modelo mais do que umasimples suposição, mas como umsistema (form) que permite a de-terminação dos movimentos cele-tes (WALLIS, 1952, p. 484). Holton(op.cit., p. 20) afirma que o próprioCopérnico enfatiza que “the he-liocentric system provided a uni-que pattern into which all the pla-

nets must fit in a definite way”25.Copérnico, evidentemente, pres-sionado pelas dificuldades religi-osas da época, foi cuidadoso eafirma, também no Prefácio, quea sua motivação para pensar emformas alternativas para calcularos movimentos das esferas do Uni-verso deu-se porque “os matemáti-cos não estavam de acordo consigopróprios na investigação de taismovimentos” (COPÉRNICO, 1984,p. 7). Ainda nesse sentido, a van-tagem para um modelo mais ade-quado, ele afirma, seria a corretaelaboração do Calendário eclesiás-tico, discutida durante o Concíliode Latrão, que não pôde ser efe-tuada porque “a duração dos anose dos meses, bem como os movi-mentos do Sol e da Lua, ainda nãoestavam convenientemente medi-dos” (ibid., p. 11). Mas a defesamais importante ele já havia vincu-lado, páginas antes, à astronomia:

E deste modo, admitindo osmovimentos que eu à Terraatribuo na obra infra, comperguntas e longas observa-ções, descobri que, se estabe-lecermos relação entre a ro-tação da Terra e os movi-

24Considerando o desenvolvimento da Física no período moderno, especialmente com Galileu e seu trabalhopara os fundamentos da Física, concordamos com Infeld (1973, p. 66 ) quando ele afirma “[t]he work of Coperni-cus represents not only the beginning of modern astronomy but also the beginning of the modern science of theuniverse and of nature. (...) We know from the history of Science that the first step is always the most difficult”.

25 Essa questão é bastante complexa, pois Copérnico foi obrigado a introduzir epiciclos em seu sistema. O quepodemos dizer é que, de um ponto de vista geral, o modelo heliocêntrico corresponderia mais adequadamente aum sistema de mundo, para usar os termos de Galileu, do que o sistema geocêntrico, exatamente por uma melhoradequação e pelas previsões inéditas, como o tamanho do universo, problema indiferente no sistema ptolomaico.

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mentos dos restantes astros,e os calcularmos em confor-midade com a revolução decada um deles, não só se hão-de deduzir daí os seus fenô-menos, mas até se hão-de in-terligar as ordens e grande-zas de todas as esferas e as-tros assim como o própriocéu (ibid., p. 9).

Esse estudo dos movimentos dosoutros astros é empreendido a par-tir do Livro II, e mantém-se atéa última parte (Livro VI) do tra-tado As Revoluções dos Orbes Celes-tes, enquanto que no Livro I há adescrição das posições das esferase dos movimentos da Terra, con-forme Copérnico os compreende(ibid., p. 9-10)26.

O aspecto central para discutir oproblema da inércia no sistema co-pernicano é a relatividade do mo-vimento, conforme pode ser no-tado na seguinte passagem:

Na verdade, entre objectosque se movem igualmente namesma direcção, não se notaqualquer movimento, isto é,entre a coisa observada e o

observador. Ora a Terraé o lugar donde aquela ro-tação celeste é observada ese apresenta à nossa vista.Portanto, se algum movi-mento for atribuído à Terra,o mesmo movimento apare-cerá em tudo que é exte-rior à Terra, mas na direc-ção oposta. É o caso emprimeiro lugar da rotaçãodiurna (ibid., p. 29).

No entanto, a defesa do movi-mento terrestre implicava uma di-ficuldade em relação à ausência deuma mudança aparente de posi-ção das estrelas fixas enquanto aTerra passa para o lado oposto desua órbita (paralaxe estelar anual).Copérnico reconhece que tal mu-dança deveria existir, mesmo queseja irrelevante, e justifica que elanão é percebida pela falta de ins-trumentos capazes de medi-la, so-mado ao fato de que a esfera dasestrelas fixas estaria muito distanteda Terra, o que tornaria o desvioinsignificante.

Além da questão da paralaxe,Copérnico enfrentou outros pro-blemas em sua defesa do mo-

26 O problema da finitude ou infinitude do mundo também é complexa no trabalho de Copérnico. Koyré (1957,p.33-34) considera que o universo copernicano é francamente finito: “[...] the world of Copernicus is finite. Moreo-ver, it seems to be psychologically quite normal that the man who took the first step , that of arresting the motionof the sphere of the fixed stars, hesitated before taking the second, that of dissolving it in boundless space; it wasenough for one man to move the earth and to enlarge the world so as to make it immeasurable - immensum; to askhim to make it infinite is obviously asking too much”. Mas o próprio Copérnico hesita em relação a essa questão.No primeiro capítulo de seu livro, Copérnico afirma que o Universo tende a ser delimitado por uma esfera (ibid.,p. 17). No entanto, no Livro I, Capítulo VIII, ele diz deixar aos físicos a tarefa de discutir se o mundo é finito ouinfinito (COPERNICO, 1984, p. 40).

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vimento terrestre. Dentre eles,destaca-se a tese ptolomaica (con-tida no Almagesto, I, 7) de que se aTerra se movesse com uma rotaçãodiária, tal movimento teria de serbastante veloz, de modo que os ob-jetos terrestres dispersar-se-iam noespaço, ao invés de permaneceremem seus lugares. A rapidez coma qual a Terra deslocar-se-ia impe-diria que os corpos caíssem em li-nha reta em direção aos seus luga-res naturais. Além disso, segundoCopérnico, “veríamos as nuvens etudo o que está impresso no ar con-tinuamente arrastados para Oeste”(ibid., p. 38). Entretanto, o as-trônomo lida com tais objeções su-pondo que “se alguém for de opi-nião que a Terra se move, dirá porcerto que o movimento é natural enão violento” (ibid., p. 39). Dessaforma, a rotação terrestre não pre-cipitaria a desintegração do pla-neta, uma vez que tal movimentoseria natural. A terminologia deCopérnico é evidentemente aristo-télica:

[...] as coisas que são se-gundo a Natureza têm efei-tos contrários às que sãoprovocadas pela violência.

Com efeito, os objectos aque a força ou o impulsosão aplicados têm necessa-riamente de ser destruídose não subsistirão durantemuito tempo, mas as coi-sas que são feitas pela Na-tureza estão no seu estado27

natural e continuam na suaforma perfeita. É, pois, emvão que Ptolomeu teme quea Terra venha a dissipar-se,assim como todos os objec-tos terrestres, devido a umarotação produzida pela forçada Natureza, que é muito di-ferente do que pode ser reali-zado pela arte e pelo engenhohumanos (op.cit.).

Em seguida, Copérnico volta a in-sistir na ideia de que o movi-mento é relativo, com a qual con-seguia justificar porque não perce-beríamos a rotação terrestre. Eleacreditava que os objetos terres-tres eram partícipes do movimentoda Terra, tese também defendidapor Oresme. Para corroborar seuargumento, o astrônomo utilizouo exemplo de um navio em mo-vimento, tal como fizera Oresme,

27 Mantivemos a tradução “estado” da edição portuguesa, mas, como já dissemos acima – nota 4 -, evitamos essetermo. Concordamos com a edição inglesa, que traduz essa passage da seguinte maneira: “[b]ut the things whichare caused by nature are in a right condition and are kept in their best organization.” Grifo nosso (COPERNICUS,1952).

28 “E por que não havemos de admitir que a rotação diária é aparente no Céu, mas real na Terra? E é assim queas coisas se passam na realidade [...]. Na verdade, quando um navio navega com bonança, tudo o que está foradele parece aos navegantes mover-se pelo reflexo daquele movimento e, por outro lado, pensam que estão imóveiscom todos os objetos junto deles. Naturalmente, a mesma coisa acontece com o movimento da Terra de maneira

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mas com as devidas modifica-ções28. O astrônomo concluiu queas coisas, que de alguma formaestão ligadas à Terra, deslocam-se com ela quer porque o ar está“misturado com a matéria terres-tre e aquosa, quer porque o movi-mento do ar é adquirido, pois par-tilha com a Terra da sua rotação in-cessante, devido à contiguidade eà ausência de resistência” (ibid., p.41).

A relação entre o movimento re-lativo e o problema da inércia emCopérnico é apresentado em umamalgama de concepções moder-nas e aristotélica. Para ele, os cor-pos terrestres são dotados de umduplo movimento: o movimentocircular (ou horizontal), pelo fatode que acompanham o movimentoda Terra, e o movimento retilíneo(vertical), que ocorre quando osobjetos não estão em seus lugaresnaturais, seja quando se afastamde tais lugares devido a um movi-mento violento, seja quando bus-cam retornar ao seu estado naturalde repouso:

[...] o corpo simples per-manece na sua posição na-tural e na sua unidade.

Quando está nesta posiçãonão pode ter nenhum outromovimento excepto o circu-lar, pois que o corpo simplespermanece totalmente em simesmo como um corpo emrepouso. O movimento recti-líneo manifestar-se-á nos ob-jectos que abandonam a suaposição natural ou são arras-tados para fora dela ou dequalquer modo de lá saem.[...] o movimento rectilí-neo só ocorre nos corpos quenão se encontram no seu pró-prio estado nem em harmo-nia perfeita com a sua natu-reza (ibid., p. 42).

Tal ideia também fora sustentadapor Oresme, conforme exposto notópico anterior. Ambos ainda nãotinham a noção de inércia, mas asconsiderações copernicanas a res-peito das causas dos movimentoscircular e retilíneo corroboram ainterpretação de que ele pudesseter admitido a manutenção do mo-vimento circular (“inércia circu-lar”), pois a causa de um movi-mento dessa ordem manter-se-iaconstante na visão do astrônomo,o que não ocorreria com desloca-

que todo o Universo parece rodar” (ibid., p. 40-41). Essas considerações serão próximas a Giordano Bruno, comoveremos na segunda parte desse trabalho, a ser publicada. Consideramos que ambos prenunciam o princípio derelatividade clássico, enunciado posteriormente por Galileu e, em toda a sua generalidade, por Newton. Tambémcomo veremos, consideramos que Bruno tem teses menos aristotélicas, nesse aspecto, do que Copérnico. Talvez porsua visão de mundo antiaristotélica.

29 O movimento circular processa-se sempre sem alteração porque a sua causa é constante. Pelo contrário, osobjetos que se movem em linha reta perdem a causa que os acelera e os levou ao seu próprio lugar. Deixam entãode ser leves ou pesados, cessando esse movimento (ibid., p. 42).

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mentos em linha reta29.Veremos que parte das dificul-

dades de Copérnico sobre essetema persistirá nos estudos de Ga-lileu.

Conclusão

Um dos sentidos de mudança nafilosofia do Estagirita é o de trans-lação, ou descolamento. Vimos quevários pensadores se dedicaram aesse complexo problema ao longode quase vinte séculos, conside-rando o período que vai da Físicade Aristóteles até a publicação dolivro de Copérnico, em 1543. Osestudos desenvolvidos entre os sé-culos XIII e XVI irão aprofundar acrítica à física aristotélica em re-lação ao movimento, examinando,sobretudo, as concepções de mo-vimento natural e movimento vi-olento, ou forçado. As análisesde Bradwardine, Oresme, Buridane Copérnico preparam o cenáriopara o desenvolvimento posterior,que será feito por Gassendi, Des-cartes e Galileu, especialmente noque se refere aos estudos do mo-vimento relativo. Essa noção per-mitirá o desenvolvimento dos tra-balhos sobre o princípio de rela-tividade e do moderno conceitode inércia. Vale notar que, de

certa maneira, o próprio princí-pio de relatividade clássico foi in-tuído por alguns filósofos, comoBuridan, quando realiza sua crí-tica à noção de antiperistasis, eposteriormente por Oresme, Bruno(como veremos no próximo traba-lho) e Copérnico, nos estudos so-bre o movimento da Terra e sobreo movimento relativo. Seguindoa terminologia proposta por PauloAbrantes (2016), a imagem de na-tureza de Copérnico, ao lado daslimitações próprias do desenvolvi-mento conceitual da Matemática,da Física e da Astronomia do finaldo século XVI, pode ter desempe-nhado um papel considerável nasdificuldades encontradas por esseastrônomo30. Com o princípio derelatividade e o uso implícito decausalidade - no contexto de umarevolucionária conceituação algé-brica do movimento - Galileu irásuplantar muitas das dificuldadesde Copérnico.

30 Foi necessário o desenvolvimento do cálculo infinitesimal e integral, por Leibniz e Newton, para uma ade-quada síntese entre astronomia e física, ou ainda, entre a física celeste e a física terrestre. Mas somente a dinâmicanewtoniana fará a primeira síntese mais elaborada desse problema, onde as noções de massa e força tornam-sedeterminantes.

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