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com Fernando Birmann Alexandre Canatella Bruno Rondani Ricardo Penzin Giana Sagazio Daniel Leipnitz Walkiria Marchetti Carolina Ignarra André Ferraz Eric Santos BRAIN HUB conectando mentes disruptivas

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Page 1: BRAIN HUB · 2019-12-22 · de que seu cliente de hoje pode não ser o seu cliente de amanhã, como advoga a consultora Charlene Li. Na newsletter Brain Hub, que publicamos semanalmente

com

Fernando Birmann

Alexandre Canatella

Bruno Rondani

Ricardo Penzin

Giana Sagazio

Daniel Leipnitz

Walkiria Marchetti

Carolina Ignarra

André Ferraz

Eric Santos

BRAIN HUBconectando mentes disruptivas

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QUEM SOMOS

ruptura é a única constante do Século 21. Ela é resultado de um movimento de mudança acelerada, contínua e permanente, provocada e alimentada pela tecnologia. Notícias isoladas não ajudam a compreender em profundidade a nova Economia Digital e seus impactos na vida de pessoas, empresas e países. É preciso um novo jornalismo, uma nova narrativa, que espelhe a

transformação socioeconômica e política que já está em curso

Por isso criamos a The Shift, uma empresa de insights as a service que tem como missão identificar, apresentar, traduzir, contextualizar e antecipar a ruptura. Geramos contextos combinando informações, análises, opiniões, conversas, estudos e dados, coletados junto aos protagonistas da profunda transformação pela qual passamos. Nossos insights ajudam profissionais e empresas a entender e explorar os cenários disruptivos do Século 21.

Conheça e assine nossos produtos:• Newsletters semanais sobre o cenário disruptivo – www.theshift.info• Podcast semanal com as melhores conversas sobre inovação disruptiva com gente que faz isso todo dia – www.b9.com.br/shows/theshift/

FALE COM AS EDITORAS:Cristina De Luca – [email protected] Bassi – [email protected]

MANDE SUGESTÕES: [email protected]

PATROCÍNIOS E PROJETOS: [email protected]

ONDE ESTAMOSThe Shift Avenida Paulista, 1374, 12º andar, sala 150 Bela Vista – São Paulo – SP CEP: 01310-100

Design: Sylvio Pinheiro – [email protected]

@copyright: Todas as fotos utilizadas neste e-book foram cedidas pelos entrevistados e são de uso livre para divulgação.

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BRAIN HUB

DISRUPTAR É PRECISO

Boa leitura, boas conexões, boas ideias

As editorasCristina De Luca & Silvia Bassi

o Século 21, a nova definição de insanidade é procurar respostas nos mesmos lugares do passado. A ruptura é a única constante, nos negócios, na sociedade e na vida de cada pessoa e ela não vem dos lugares óbvios. Como acredita a futurologista Amy Webb, autora do livro “The Signals are Talking”, para entender a disrupção que vem com o uso cada vez mais

abrangente da tecnologia digital, é preciso olhar para o fringe, ou seja, para as bordas, para o entorno e não exatamente para o que está na nossa frente.

Mas como avançar uma empresa, um negócio, no meio da tempestade de mudanças mantendo os resultados necessários para sustentar a operação hoje e torna-la à prova de disrupção no futuro? Só abrindo mão do status quo e questionando tudo. Mudando o modelo mental que pede o conforto do terreno conhecido, do consumidor/cliente já cativo, para abraçar a mudança, a prática do erro rápido em busca do acerto, a ideia de que seu cliente de hoje pode não ser o seu cliente de amanhã, como advoga a consultora Charlene Li.

Na newsletter Brain Hub, que publicamos semanalmente às sextas-feiras, entrevistamos disruptores, pessoas que decidiram que é preciso acordar todo dia pensando como vamos desaparecer amanhã. Em todas as áreas de negócios, em todos os segmentos da economia e da sociedade. Gestores, inovadores, empreendedores, pensadores, analistas. Brain Hub é literalmente um conector de cérebros, ligando os leitores a mentes disruptivas e suas ideias.

Reunimos as primeiras dez entrevistas neste e-book que você está recebendo como um presente da The Shift para ajudar a pensar. Nossos entrevistados e entrevistadas olham para a realidade pela lente da inovação disruptiva, turbinada pelas tecnologias digitais mas, principalmente, focada no que realmente importa: o consumidor hiperconectado do Século 21, cada vez mais exigente, cobrando experiências genuinamente digitais com marcas, serviços e produtos.

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ÍNDICE

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Fernando Birmann, Head of the Digital Office da Solvay

Alexandre Canatella, Diretor de Negócios Digitais do Carrefour Brasil

Bruno Rondani, Fundador e CEO da 100 Open Startups

Ricardo Penzin, Head of Business Develpment Brasil Hyperloop TT

Giana Sagazio, Diretora de Inovação da CNI

Daniel Leipnitz, Presidente da ACATE

Walkiria Marchetti, Diretora executiva do Bradesco

Carolina Ignarra, Sócia fundadora da Talento

André Ferraz, CEO e founder da In Loco

Eric Santos, CEO e co-founder da Resultados Digitais

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O CAÇADORDE DISRUPÇÃO

Fernando BirmannHead of the Digital Office da Solvay

ense em um grupo industrial comprometido com o desenvolvimento de produtos químicos desde 1863. Agora pense em transformação digital e ruptura. Há cinco anos, o trabalho de Fernando Bir-man é fazer com que essas duas realidades estejam em perfeita harmonia. A área liderada por ele ajudou a criar uma mentalidade digital na empresa.

Head of the Digital Office da Solvay, sua missão e a da sua equipe é ouvir seus clientes internos e externos, pesquisar, experimentar e desenvolver soluções digitais que modernizem processos e gerem novos negócios. Em outras palavras, apoiar a adoção de tecnologias digitais que agreguem valor para os negócios e melhorem a forma como as pessoas trabalham. As tecnologias digitais também são fundamentais para o desenvolvimento de processos industriais melhores, mais rápidos e sustentáveis.

A área de Birman integra o tripé de inovação da companhia junto com as áreas de Pesquisa e Desenvolvi-mento e a Solvey Ventures. Juntas elas ajudaram a Solvay a abrir mão de um portfólio altamente diversificado, dependente de mercados cíclicos, em troca de um portfólio focado de produtos e soluções altamente espe-cializados, feitos sob medida para solucionar os desafios os clientes. É um bom exemplo de empresa que, ao amadurecer digitalmente, não apenas está inovando mais, como está inovando de forma diferente.

Birman é um caçador de rupturas em um universo de rápidas e constantes mudanças. E recebeu a THE SHIFT para conversar sobre seu trabalho. Acompanhe o melhor da conversa.

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RUPTURA É…“Na Solvay tivemos que flexibilizar e estender um pouco o conceito de ruptura para não ficar muito presos somente na ideia de mudança radical. Porque se a gente fosse levar o conceito de ruptura muito ao pé da letra, talvez ainda não tivéssemos nenhum projeto, ou no máximo identificado um ou dois.

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Então incluímos no conceito de ruptura aqueles projetos que têm impacto muito grande na forma de fazer negócios, mesmo não sendo uma reinvenção total. E ainda assim, são poucos. Para 90 projetos de melhoria de processos, e experiência de clientes internos ou externos a gente vai ter no máximo 10 projetos de ruptura, con-siderando esse conceito ampliado com o qual trabalhamos. Hoje estamos trabalhando em vários pilotos de IoT nos quais a gente coloca sensores nos clientes, ou no produto. Esses sensores trazem informações novas que são analisadas pela Solvay, que conhece o produto e o mercado, gerando serviços e informações extras para os clientes. Isso não muda totalmente o negócio, mas agrega muito valor para o cliente, venden-do coisas muito úteis para ele no formato de software, apps, relatórios. Para uma indústria B2B que vendia só produtos físicos, passar a vender produtos digitais para clientes de áreas como energia, mineração e pesca é uma mudança grande.

Também consideramos ruptura a desintermediação, quando pulamos o cliente e passamos a vender direto ao consumidor. A Solvay está entrando no mercado de prótese e implantes dentários, com polímeros super es-peciais. Falamos direto com o consumidor e vendemos o produto para clínicas capacitadas a aplicar o produto.

A gente convida o negócio a descobrir o que pode agre-gar valor ou representar uma ruptura, através da organi-zação de workshops, contratação de consultorias, e por aí vai. Cada unidade de negócio contrata de acordo com o seu budget. Não é algo imposto, mas é algo desejável. Cada um reporta o que pode fazer e o prazo.

Minha área entra na hora da implementação do projeto, ou para dar uma consultoria tecnológica, ou para ajudar na adoção de métodos ágeis, design thinking, análises de user experience, execução de provas de conceito. E a minha área

também pode identificar alguma startup ou tecnologia que represente a inovação ou disrupção para uma área específica e fazer a ponte. Primeiro, em 2014, a gente começou a tra-balhar muito a cultura, através de eventos, pal-estras, workshops, formação dos funcionários… Eu ficava provocando... Em 2015, a gente orga-nizou uma visita do board da empresa ao Vale do Silício. Hoje parece bobagem, mas naquela época, ajudou a dar o clique. Os executivos acordaram e começaram a não só a falar como a cobrar de todo mundo uma estratégia digital.

“Quando a gente muda substancialmente um negócio, agregando muito valor, isso é considerado uma ruptura.”

“Estamos todos aprendendo a olhar para esse ecossistema de startups como parceiro. Pelo bem do negócio tem que ser assim. Che-gamos a empurrar a inovação no começo. Hoje a gente trabalha mais sob demanda. Eu acho isso bom.”

Hoje cada negócio da Solvay tem autonomia para buscar o novo. São 10 unidades de negócio e cada uma delas está em um estágio de matu-ridade diferente nessa busca pela inovação.

| Fernando Birmann| Fernando Birmann

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Cada unidade de negócio começou a fazer o que era pos-sível, respeitando a cultura e o mercado. Com o tempo a es-tratégia digital foi se fundindo com a estratégia de negócio. Hoje, o nível de resposta de cada unidade é bem diferente. A gente percebe que algumas deslancharam e outras ainda têm muito por fazer. Mas todas têm noção da importância do digital. Sabem que o digital é a inovação. Entendem que

o digital traz oportunidades de melhorar o negócio.

Lidero uma equipe de 20 pessoas que atua como facilitadora para essas 10 unidades de negócio, e que não olha só para a ruptura. Continua olhando para melhoria dos proces-sos internos também. Porque a gente quer in-corporar novas tecnologias que modernizem a forma de trabalhar, que facilitem a gestão dos prédios, e por aí vai. Antes essa equipe era for-mada por generalistas. Hoje são todos especial-istas, porque eles precisam entender, mais que as áreas de negócio, das tecnologias que vamos usar. Hoje a gente já tem unidades de negócio que estão muito perto dessa autonomia, de não precisar do nosso apoio e mentoria, e outras áreas que ainda são totalmente dependentes. Quem já era inovador lá atrás, sempre soube respeitar as ideias e dar espaço para o novo surgir.

O principal desafio é aproveitar as melhores oportunidades tecnológicas que podemos identificar e tentar im-plantá-las rapidamente. Então o trabalho requer uma quantidade intensa de construção de relacionamento in-terdepartamental.

Com a TI, por exemplo, é uma cooperação total. A área Digital não pode trabalhar sem a TI. Nossa tarefa é testar novas tecnologias e fazer com que funcionem. Fazer provas de conceito, pilotos... Depois que a gente aprova o uso de uma nova tecnologia, toda a operação é repassada para a TI. Mas esse repasse tem que ser feito de forma cuidadosa. Por isso o sincronismo e a parceria com a TI são fundamentais.

Hoje a empresa tem quase 50 robôs em operação, e esse número vai explodir. RPA a gente trabalhou e homologou 4 anos atrás. A TI é que toca RPA hoje. Os primeiros projetos de Analytics também foram feitos por nós em 2014 e 2015. Hoje é um assunto dominado pela TI. E até por algumas áreas de negócio. P&D, por exemplo, já tinha cientistas de

dados antes desse profissional passar a ser chamado assim. Eles sempre trabalharam com muitos dados, simu-lações... O mesmo acontecia em algumas áreas indústriais. Hoje existe uma cooperação muito grande entre os cientistas de dados das três áreas.

“A empresa inteira começou a olhar para fora, para as dores dos clien-tes, a falar de novos modelos…”

“A novidade de hoje vai ser o legado de amanhã”

“A hora que a empresa como um todo, em cada unidade de negócio, souber buscar o digital, a minha área pode ser totalmente ab-sorvida pelas áreas. Trabalhamos para isso. É importante para o grupo que o digital seja cada vez mais mesclado ao core de negócio.”

| Fernando Birmann

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No IoT Industrial estamos estudando todos os padrões de comunicação no nosso Laboratório de IoT em Brux-elas, onde vamos armazenar os dados, como vamos armazenar... Recentemente tomamos a decisão de colocar tudo na Google Cloud Platform, e colocar uma antena 4G dentro de uma das nossas fábricas. Uma usina química tem muito metal nos tanques, dutos... tudo isso bloqueia o sinal de WiFi. O custo para usar só WiFi seria muito alto.

O cenário de IoT interno está bem dominado. Nosso desafio agora são os projetos de IoT externos. Esses esbar-ram em questões como o GDPR, por exemplo. Principalmente em relação a cibersegurança dos dados.

É preciso primeiro saber dar espaço para que as ideias surjam. As grandes ideias disruptivas não necessaria-mente vêm de um laboratório, de um cara inteligente... Qualquer um, inclusive um cara operacional, pode ter aquele insight. O desafio é saber dar oportunidade para isso acontecer. O digital é uma fonte brutal de oportuni-dades. Se a mudança ainda não chegou, ela vai chegar, porque ela já chegou no seu cliente, inclusive o cliente B2B, e se você não fizer nada você pode ser levado pela onda. Os bancos, por exemplo, estão sendo co-midos pelas bordas. As fintechs estão incomodando. Tanto é que eles já começaram a se mexer. Mesmo indústrias como as nossas, que são muito B2B, precisam estar atentas. Acompanhar o que está acontecendo com os clientes. Por exemplo, um dos nossos maiores clientes é a cadeia automotiva. É ób-vio que ela está mudando. O compartilhando de automóveis é uma tendência consolidada e irreversível, que vai representar uma redução da frota. Lá no Vale do Silício eles falam que a frota atual vai ser dividida por 10. O carro elétrico vai forçar uma mudança nos projetos, consumir novos materiais. A Rhodia precisa estar preparada para substituir alguns metais, fornecer produtos para as novas baterias... Se a Amazon começar a vender produtos químicos de uma hora para outra, a gente vai ter que mudar porque esses produtos vão virar commodities.

Se eu fosse convidado hoje para assumir a TI de uma empresa brasileira e dono falasse que ele precisa de al-guém para implantar um desses sistemas de ponta, desses grandes players da tecnologia, eu diria a ele que é mais im-portante olhar para o negócio e saber se ele vai sobreviv-er, do que fazer um implantação caríssima na retaguarda. Primeiro ele precisa se preocupar com a continuidade do negócio.”

O dono e a principal liderança da empre-sa têm que liderar o processo e mostrar que existe uma onda de inovação que vai chegar nela. É difícil achar que algum negócio esteja totalmente imune às mu-danças que o digital trouxe.

“O seu cliente pode desaparecer, ou mudar tanto que se você não estiver preparado para atender, outra em-presa vai tomar o seu lugar.”

| Fernando Birmann| Fernando Birmann

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UM REVOLUCIONÁRIONA COZINHA

Alexandre CanatellaDiretor de Negócios Digitais do Carrefour

á 22 anos, Alexandre Canatella olha para as plataformas digitais como um meio de transformar os hábitos alimentares dos brasileiros. Em julho de 1997 criou o Cyber Cook para ser “um livro de receitas algorítimico” que conseguisse trazer para o digital o mesmo carinho do livro de receitas escritas a mão e cheio de recortes de jornais e revistas das nossas mães e avós.

Com mais de 100 mil receitas e 2,4 milhões de usuários únicos, o Cyber Cook, juntamente com outros dois portais do grupo e-Mídia, foi comprado pelo Carrefour Brasil em novembro de 2018. A compra agregava uma peça importante no plano Carrefour 2022, lançado em janeiro de 2018 pelo CEO do Grupo Carrefour, Alexandre Bompard, com a missão de tornar a empresa líder mundial da transição alimentar, oferecendo PARA TODOS, alimentos de qualidade e confiança a um preço justo.

Agora como Diretor de Negócios Digitais do Carrefour Brasil, Canatella está ligado à nova unidade de negócios do grupo, dedicada à transformação digital, chamada Carrefour e-Business Brasil (CeBB), liderada por Paula Cardoso. E está focado em transformar o Cyber Cook na plataforma inteligente de ligação do consumidor com as iniciativas de e-commerce de alimentos do grupo.

Canatella é um revolucionário na cozinha em busca de democratizar o jogo alimentar com transparência para o consumidor. E recebeu a THE SHIFT para compartilhar a receita. Acompanhe o melhor da conversa.

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RUPTURA É…“A possibilidade de pensar diferente e fazer diferente por causa da inovação. O caminho mudou porque o con-sumidor adotou uma nova perspectiva de escolher fazer diferente com o digital, desde como interage com seu banco até como abastece, usa o transporte etc.

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O Carrefour é uma empresa líder no negócio de venda de alimento. A venda de alimento, em geral, sempre foi centrada em loja, e o Carrefour sempre ofereceu uma experiência magnífica para o cliente na loja. O plano Car-refour 2022, lançado pelo CEO Alexandre Bompart, definiu um caminho que envolve a empresa ser protagonista no negócio de ser orientada pelo consumidor. Aí a perspectiva muda, porque a loja é parte da experiência mas não é só essa experiência. O consumidor compra na loja mas busca outros caminhos, e o ponto de contato físico fica sendo complementar.

A empresa viu a possibilidade de crescer digitalmente não só liderando o comércio eletrônico de alimentos, mas também com a ambição de liderar a revolução de como o con-sumidor come, como ele interage com o pro-dutor do alimento, como ele se informa sobre o alimento. O grupo olha isso como parte da sua engenharia.

É preciso considerar todas as características culturais, de uso tecnológico, e virar o modelo completamente. Como olhar uma fila de supermercado e encon-trar uma forma de tirar o consumidor da fila escolhendo pagar a compra com seu celular sem passar pelo check-out tradicional, por exemplo.

Com a magia de que não seremos só uma empresa digital. Somos uma empresa figital. Nós seremos sempre uma em-presa com um ponto de venda físico como oportunidade de contato com o consumidor. Todas as plataformas juntas de-vem trazer eficiência. O consumidor reconhece essa eficiên-cia como valor de marca e compra mais com você. A trans-formação tem de ser invisível, os meios digitais precisam ser naturais para o consumidor e dentro de uma oferta ampla. Eu acredito em evolução do consumidor, ele não vai abolir pontos de contato, vai usar melhor os pontos de contato que forem bons para ele porque ele está muito mais preparado.

O Cyber Cook, dentro do projeto do Carrefour de liderar a transição alimentar, se foca em alimentação mais saudável PARA TODOS. Isso carrega uma responsabilidade enorme, porque não pode ser nicho, tem de ser para toda a sociedade. Nos últimos anos nos concentramos em aprender sobre as receitas. O Carrefour pegou esse aprendizado de máquina que acumulamos para dar transparência para as receitas.

Transparência é descobrir quanto custa um risoto, uma carne de panela. Quanto custa cada ingrediente de uma receita (o valor de uma xícara de farinha, uma colher de manteiga) e depois poder medir a receita pelo valor de cada porção que rendeu. Esse dado é importante para tangibilizar o valor da comida e dar a dimensão do impacto econômico do desperdício.

“A engenharia do varejo tradicional era a experiência da loja, e agora ela se concen-tra no consumidor como um ser digital e analógico, o que exige um olhar mais amplo com o melhor dos dois mundos.”

“O Cybercook nasceu da observação de como as pessoas acumulavam o conhecimento sobre o que cozinha-vam no caderno de receitas. Deci-dimos ser curadores de um grande caderno de receitas algorítimico”.

| Alexandre Canatella

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Criamos a possibilidade de saber o valor do alimento. E depois criamos a possibilidade das pessoas se preocuparem como os nutrientes dos alimentos. A pessoa no ponto de venda está olhando os nutrientes de um ingrediente, mas precisa também colocar cada prato do dia na composição total dos nutrientes daquele dia. Criamos um botão que você clica e informa o que sobrou dos ingredientes da receita que você fez e o que você pode fazer com eles. A busca também mudou para ser uma busca por receita, ou por atributos de estilo de vida (rica em proteína, vegana, sem lactose...) e também por atribuição de preço.

O próximo passo. Primeiro estamos criando o DNA alimentar das pessoas – preferencia, tendência alimentar e assertividade na ajuda na decisão. Nos próximos meses vamos conectar as receitas à oferta de compra através do site, levando em conta os ingredientes da receita para as regiões onde o e-commerce atende. Mas também vamos poder indicar uma loja próxima para comprar os mesmos ingredientes. Vamos ser uma porta de entrada inteligente para que a sua compra não envolva só uma lista, mas uma programação sobre o que você quer cozin-har, e dar uma inteligência para que você se abasteça conectado com os alimentos que quer produzir na sua casa.

Comer saudável é uma escolha. A grande sacada é essa. E isso passa por como comprar melhor. Vamos con-siderar que na América Latina, 30% do que produzimos é desperdiçado nos lares. Se reduzir isso com melhor gerenciamento do que cozinhamos e compramos, o consumidor poderá direcionar seus recursos para comprar alimentos que não comprava normalmente. Isso é inteligência democrática. A tecnologia tem de estar invisível para a população. Evoluímos bastante em tecnologia na cozinha. O micro-ondas é um exemplo. Agora é o mo-mento de dar o salto da tecnologia no preparo, em como tomamos a decisão da compra da comida, e precisamos olhar a tecnologia digital como aliada nisso.

O Cyber Cook também olha para os consumidores sendo makers. Vimos, por exemplo, crianças fazendo slimers em casa e postando no instagram. Mas, no verão, essa mesma criança estava fazendo seu próprio sorvete – os famosos xup-xup, geladinho, sacolé. Vi-mos o aumento da busca dessas receitas no site e o e-commece alimentar montou bundles de ingredi-entes para as pessoas fazerem o geladinho em casa. Podemos portanto antecipar, olhar os movimentos de busca de receita, interpretar esses dados e criar opor-tunidades que se conectem a insumos de compra.

Novas tecnologias. Uma tecnologia invisível para o consumidor mas altamente visível para uma alimentação mais saudável é a rastreabilidade. Fomos pioneiros nisso e ganhamos prêmios envolvendo o rastreamento dos alimentos. Isso é importante para caracterizar a origem, tempo de colheita, chegada até as lojas, etc.. O block-

“Nós somos uma plataforma de 100 mil re-ceitas que integrou atribuições de serviços. Viramos um assistente para preparar um ali-mento. A partir da transparência que damos ao consumidor, conseguimos ser democráti-cos no jogo alimentar.”

“Estamos olhando muito além da métrica antiga do acompanhamento do checkout. Por isso podemos pro-mover um insumo em épocas sazonais e trazer a atenção do consumidor para outro tipo de alimento.”

| Alexandre Canatella| Alexandre Canatella

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chain é um adicional a isso, para buscar mais segurança na transação dessas informações. Faz parte da evolução para o consumidor, que pode tomar uma decisão fazendo a leitura do QRCode de um produto na gôndola, com aplicativo do Carrefour no celular, e saber de onde vem o alimento.

A tecnologia entra também para eliminar o atrito da experiência de compra em lojas. Os atritos são filas em horários determinados: criamos o scan and go que é uma forma de você mesmo pagar suas compras sem passar pela fila. Lojas autônomas são uma experiência, mas precisamos saber onde elas vão ficar, o que elas precisam oferecer. Pode ser super simples, mas também pode ser frustrante se a não tem o estoque dos produtos certos, se não tiver o ponto no lugar certo. É preciso saber o que uma pessoa quer: será que é entrar, comprar e ir embo-ra sem passar por um atendente? Depende. Quem vai à peixaria quer falar com o peixeiro, por exemplo.

O digital tem se encaminhado para ajudar nisso. Nas tecnologias de logística, buscamos uma alter-nativa descentralizada com as side stores: estoques confinados para o e-commerce alimentar exclusivos para suportar a compra online daquela região. Isso em uma cidade como São Paulo é revolucionário porque o alimento fica mais próximo do consumidor. Estreamos três side stores nos últimos meses. Isso é disruptivo na logística do alimento e uma peça-chave.

Não temos dúvida sobre esse cenário. Podemos abreviar o caminho do consumidor para a comida fa-zendo as parcerias certas. Como a parceria que fize-mos com o Rappi, que se tornou o parceiro ideal para construir esse momento com a gente. O consumidor poder receber o pedido, com um shopper fazendo sua compra e levando na última hora para sua casa é importante.

A loja autônoma foi uma parceria com a Zatti, que já tinha experiência. Na área de dados, temos a parceria com a Props, que é uma startup de administração de Big Data que esta acelerando nosso negócio de como vamos trabalhar melhor o CRM, como vamos estruturar nossos dados para um futuro analítico. Precisamos ter mais inteligência sobre demanda e preço, por exemplo.

A tecnologia é protagonista. Como não vamos usar a tecnologia e o ecossistema de startups que está avançan-do?! A transformação é a possiblidade de alianças. O mercado em geral, antes da transformação digital, pensava em fornecedores. Agora pensa em alianças para acelerar a transformação.

Desde o lançamento do plano Carrefour 2022, o Carrefour no Brasil primeiro criou uma vice-presidência de transformação digital liderada pela Paula Cardoso, como presidente do banco Carrefour. O banco é uma empresa altamente transformada, o quinto maior emissor de cartão de crédito no Brasil. É uma operação que trabalha com squads, metodologia ágil etc.

A Paula teve um grande mérito e acumulava a presidência do banco e agora se dedica exclusivamente à iniciati-va Carrefour e-business Brasil, que é uma vertical que hoje abrange tecnologia, e-commerce, inovação, omnicana-lidade, o marketing com pensamento transversal de comunicação e o negócio de Big Data para acelerar. Even-

“Hoje o e-commerce alimentar represen-ta um número inferior a 2% das vendas. Até 2022 estamos falando de 20 a 30% da venda alimentar. Isso transforma o negócio de venda de alimento. Vamos construir a liderança nisso construindo um mercado”

| Alexandre Canatella

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tualmente vamos acessar o ecossistema de startups ou M&A ou Corporate Ventures.

Anteriormente vendíamos chocolate em barras. Hoje vendemos a oportunidade do consumidor fazer seu próprio chocolate em casa para presentear. Ex-trapolamos vender e conectamos o Cyber Cook para a pessoa fazer sua lembrança de chocolate para a Páscoa com as receitas. Esse tipo de coisa só acon-tece se todas as áreas forem contaminadas. O Carrefour tem a missão de se tornar o varejista mais acessível para orgânicos. Nosso planejamento prevê a ampliação das vendas de orgânicos para R$ 500 milhões até 2022, comparada a menos de R$ 50 milhões em 2018. Não é só vender, sendo mais acessível no preço, mas também na consideração do consumidor: temos que comer mais planta não porque a proteína tá cara mas porque a diversidade da comida é importante. Quando ele não acha um produto, ele tem de saber sobre sazonalidade e ter alternativas.

Há mais empresas olhando isso. Surgem jovens de 23 anos criando novos alimentos saudáveis e o e-commerce tem de ser uma nova forma de dis-tribuir esses alimentos. A competição pulverizada vai ser altamente benéfica para o consumidor que vai conhecer novas formas de se alimentar. E o Car-refour, com sua marca própria, se prepara também para competir nessa oferta. Lançamos 290 novos SKUs em 2018 e 450 em 2019. Os novos alimentos vão usar ingredientes que a gente não imaginava,

como proteína de ervilha, por exemplo. A experiência alimentar é afetiva, é prazerosa e o consumidor não abandona hábitos, ele descobre novos alimentos.

“O e-business Brasil tem uma missão de contaminação do grupo, para que a gen-te olhe a transformação como oportuni-dade de ruptura de como fazíamos os processos, e qual a nova forma possível baseada em dados, venda online, na efi-ciência de conhecimento e conteúdo.”

“O futuro do alimento passa por mais fornecedores. O que antigamente era ligado a produtos regionais, agora cada dia mais passa por um aumento de sorti-mento de produtos saudáveis.”

| Alexandre Canatella

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O MATCHMAKER DA INOVAÇÃO

Bruno RondaniFundador e CEO da 100 Open Startups

ruptura começa com uma mentalidade de inovação aberta e processos bem azeitados, de forma a fazer a colaboração crescer. Foi por conhecer bem a cultura fechada de grandes corporações e universidade que Bruno Rondani, engenheiro, empreendedor e investidor, decidiu, junto com os amigos Rafael Levy e Carla Colonna, criar a rede 100 Open Startups.

O objetivo deles é ajudar cada membro do ecossistema a decidir sobre onde alocar recursos, tempo, esforço e dedicação em iniciativas desejadas pelo mercado, afastando toda a ineficiência dos fundos, que muitas vezes têm uma influência muito grande, mas pouco contribuem resolver problemas dos consumidores, deixando obsoletos quem até então era líder de mercado.

Nascida em 2016, a rede conta hoje com pouco mais de 8,6 mil startups ativas, 1,3 mil corporações e 15 mil avaliadores. E realiza anualmente um levantamento apontando as startups mais atraentes do ecossistema. O deste ano foi publicado ontem, e tivemos acesso a números exclusivos que nos permitem afirmar que Bruno pensa e age como um catalisador da inovação aberta do Brasil, e como um matchmaker de relações valorosas e promissoras.

Os dados sobre as ranqueadas de 2019 mostram um grupo de empresas maduras – 82% estão em fase de mercado, com produto e faturamento – e um coletivo de founders igualmente maduro: 54,2% deles já em-preenderam anteriormente e a maior fatia (31,9%) tem entre 31 e 35 anos. O faturamento somado desse grupo foi de mais de R$ 193 milhões em 2018, projetando crescimento para R$ 324 milhões em 2019.

Agora, o matchmaker vai testar mais um pedaço da sua plataforma: o 100 Open Angels, uma ação de co-inves-timento que vai beneficiar 25 startups, que devem receber R$ 1,5 milhão cada. A turma de ranqueados de 2019 vai disputar uma dessas fatias em rodadas de speed-dating no evento Whow!

Nessa entrevista, Bruno revela os conceitos por trás das engrenagens que fazem a rede prosperar. E explica como funciona o framework que permite às grandes corporações e aos empreendedores testarem novos mod-elos de negócios digitais, com liberdade para errar e aprender.

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RUPTURA É…“Romper com o jeito como as coisas vinham sendo feitas. No nosso contexto, mudar alguns paradigmas de como a inovação é feita. A disrupção acontece quando aquelas coisas que anteriormente eram vistas como empecilhos para a inovação passam a ser encaradas e usadas como fortalezas.

No passado, inovação era algo bastante sigiloso, protegido. O elemento principal era a patente, o segredo industrial. O papel do inventor era criar uma vantagem estratégica contra os concorrentes e a sua atuação precisava ser extremamente controlada. Todo o esforço era para garantir que a propriedade intelectual ficasse vinculada à empresa.

Esse paradigma de inovação prevaleceu por muito tempo. E até entre as primeiras startups... algo similar ao antigo modelo prevaleceu no ambiente das venture capital. A forma de operação era furar as fortalezas cor-porativas e tentar cooptar as mentes mais criativas dentro das corporações, que estivessem dispostas a sair e inovar fora, com um pouco mais de flexibilidade, em empresas emergentes, sem precisar da estrutura corpo-rativa e atuando quase como piratas. Os termos “Piratas do Silicon Valley”, ou “Os 8 traidores” (*) são típicos dessa época.

Hoje é totalmente diferente. Falamos em co-criação, redes de inovação, open innovation, a gente adotando open startups, os fundos colaborando com redes de anjo, anjos colab-orando com plataformas de crowdfunding, grandes empresas servindo de plataformas para startups, chamando as startups para tra-balharem com elas.

A 100 Open Statups é a derivação de técnicas, de metodologias de open innovation e de tec-nologias de colaboração. Do desejo de encon-trar uma forma de permitir que o ecossistema possa interagir de forma colaborativa, mantendo a estrutura capitalista baseada na competição, no livre mer-cado, onde as empresas precisam se apropriar e monetizar os investimentos feitos.

Uma rede colaborativa aberta que deixa para trás o paradigma do inventor para adotar o paradigma do corretor. Que coloca mais foco no que é mais capaz de atrair, de conectar, de ressignificar, de criar através da colaboração, e menos foco naquele que cria e depois protege, desenvolve e explora sozinho uma ideia.

E note, tudo isso respeitando a propriedade intelectual. A gente não está propondo um sistema onde nin-guém mais é dono de nada. O ponto central do nosso processo é que você mantém a possibilidade de fechar e de abrir quando for mais vantajoso. Por isso que a gente gosta do termo matchmaker. Por ser um modelo que provoca mudanças na forma de interação entre as pessoas.

“O problema, nas últimas duas décadas é saber qual será a nova metodologia, o novo framework para trabalhar esse modelo de inovação cada vez mais aberta, onde predo-mina o paradigma da colaboração, da troca de ideias entre todos os agentes do ecoss-istema, respeitando a competição, os confli-tos estratégicos.”

| Bruno Rondani

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Por exemplo, no caso do relacionamento entre pessoas. Antigamente, você se relacionava amorosamente com alguém com algum vínculo social comum: colegas da escola, de trabalho, amigos da família, pessoas que frequentavam os mesmos ambientes. Esse era o ponto de contato inicial.

Hoje, uma parte significativa dos relaciona-mentos amorosos tem início online. A pessoa conhece nas redes sociais, nos app de relacio-namento e aí deriva o relacionamento para o presencial, quando começa a estabelecer uma relação de confiança.

Assim você está conectado, mas também está protegido de relações que você não quei-ra estabelecer, revelações que não façam sen-tido ser feitas antes do momento certo, etc.

A startup publica o que é relevante para encontrar parceiros, para ter feedback e para validar ideias, sem expor completamente o que faz, ou sem ter que abrir a propriedade daquela inovação para rede. Ela se mantém a criadora, mas pode se abrir de forma controlada para aqueles com os quais tenha inter-esse de interagir.

O mesmo vale para as corporações que reconheçam não ter todas as competências, para inovar, ou para solucionar uma dor dos clientes, mas sabem que podem haver pessoas lá fora que talvez possam ajudar, viabi-lizar e acelerar o processo de inovação.

Como elas muitas vezes não querem mostrar para o mercado suas eventuais fraquezas ou estratégias ao diz-er estão procurando tal coisa, elas conseguem publicar as suas necessidades somente para aquelas startups nas quais elas tenham interesse. Podem filtrar e convidar somente aquelas que elas julgam estarem aptas a ajudar, após uma avaliação prévia do perfil. E também vão abrir poucas informações no primeiro momento.

Quando começamos a trabalhar com Open Innovation, nosso trabalho era conectar as grandes empresas às universidades. As universidades têm duas coisas: competências (linhas de pesquisa) e patentes (geradas por esses grupos de pesquisa). E começaram a criar escritórios de transferência de conhecimento e tecnologia, mas só conseguiram organizar a parte de patentes.

Era difícil saber se um determinado pesquisador estava interessado em trabalhar para uma determinada empresa. Elas se preocupavam em proteger o conhecimento patenteado para que ele pudesse ser transferido para exploração comercial. Era um processo muito penoso e moroso. Um desafio, ainda hoje, envolvendo duas instituições complexas: a universidade e a grande empresa.

O que mudou completamente, e que fez a gente crescer muito, foi que a quantidade de startups cresceu mui-to. E como elas também estavam acostumadas a não revelar as suas ideias e projetos, pouquíssimas tinham sucesso. Era preciso superar as barreiras entre a não revelação e o match com os possíveis parceiros.

“O que a gente criou foi uma plataforma que permite que o primeiro contato entre pes-soas que queiram inovar seja feito online, em um ambiente inspirado nos matches, ain-da sem ter muitas informações sobre elas, e aprofundar a relação marcando encontros presenciais na medida em que ganham con-fiança entre si.”

| Bruno Rondani

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A gente abriu a Open Innovation para as startups a partir de programas de capacitação. O primeiro foi o Desafio Brasil, da FGV.

Então abrimos essa base de estudantes e proje-tos para executivos de grandes empresas, para que dessem feedback apenas. No fundo, era um processo de mentoria. Mas à medida que os exec-utivos começaram a se envolver com comunidades de empreendedores, eles perceberam que podiam começar a empreender também, a partir de opor-tunidades reais.

Hoje, a maior parte das startups mais atraentes da nossa base têm entre seus fundadores executivos com experiência prévia nas suas áreas de atuação. Deix-aram de ser apenas os garotos de 20 anos sem nada a perder, ainda que eles continuem podendo participar da rede e também estejam representados entre as startups de sucesso. Com esse processo que a gente criou, passamos a ter um público muito mais qualificado empreendendo.

Os avaliadores e os investidores anjo foram necessidade que a gente sentiu mais recentemente. Nem todo mundo está disposto a abandonar uma carreira e empreender. Mas são pessoas que querem ter contato com esse universo de inovação, de startups, aprender com ele, se manter conectado com as possibilidades de dis-rupção que possam estar ocorrendo, se tornar um profissional melhor e até investir.

Então, para que eles pudessem se beneficiar de todo o conhecimento e troca gerados na rede, eles passam a ingressar só como avaliadores ou, caso tenham interesse de investir como um investidor anjo.

Começamos com um modelo de equity crowd-funding, porque percebemos que existia o interes-se desses executivos de participarem com aportes menores. Hoje, por tecnologia e por regulamentação, isso passou a ser possível. O nosso modelo para o Open 100 Angels começa com um investimento de R$ 5 mil. Eles podem ajudar na criação de uma startup sem serem necessariamente um empreendedor líder.

A ideia não é a mesma do crowdfunding financeiro. Não é só pelo apelo financeiro. É essa ideia que deixa o crowdfunding pequeno. Não há garantia de que o dinheiro investido vai retornar. Vale mais o aprendizado, o esforço, o envolvimento com o desenvolvimento de um projeto, onde o conhecimento dele é valorizado.

Caso o empreendimento onde ele investiu tenha sucesso empresarial, aí sim ele passa a ser sócio, com par-ticipação no capital da empresa. Hoje o nosso ranking mede objetivamente acordos, negócios, investimentos

“O nosso trabalho era promover jovens querendo empreender, com ideias mui-to iniciais e sem nada a perder. Eles não tinham muita dificuldade de revelar seus projetos para o mercado. Queriam viabilizar as ideias. Serem vistos e recon-hecidos por quem já estava bem posicio-nado no mercado.”

“Hoje, do total de avaliadores, 2 mil já investiram em startups e grande parte participa da plataforma com o objetivo de encontrar empresas para investir.”

| Bruno Rondani

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fechados dentro do ecossistema. Não é opinião mer-cado. É resultado. A efetivação, em contratos, dos relacionamentos estabelecidos. Pontua em quem tem melhor desempenho em termos de negócios gerados.

A gente está trabalhando para que a colaboração se viabilize por meio da nossa metodologia. E que essa colaboração tenha impacto na economia do país. Nossa missão é criar a nova economia. Viabilizar as empresas do futuro, sabendo que todos os mercados estão ou vão passar por disrupção. Queremos ajudar a gerar os novos líderes de mercado.

Em 5 anos, eu espero que a nossa metodologia seja a referência para a criação de novos negócios e a modern-ização das empresas existentes.”

“Junto com o pequeno investimento ele também aprende mais sobre esse mun-do, vê como é o jogo, e se prepara para fazer um investimento maior.”

| Bruno Rondani

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eis minutos. É o tempo que uma pessoa levaria para percorrer os 96 quilômetros entre Campinas e São Paulo se estivesse dentro de uma capsula do Hyperloop, o modal de transporte terrestre que traz para o chão a velocidade dos grandes aviões comerciais. O mesmo trajeto, hoje, leva de 90 (com muito boa vontade) a 120 minutos.

O Hyperloop não é só um meio de transporte ultrarrápido, é uma revolução que começou a partir de um docu-mento de 57 páginas publicado por Elon Musk (quem mais?!) em agosto de 2013, em oposição ao projeto de con-strução de “um dos mais lentos e mais caros” meios de transporte coletivo: um trem-bala ligando São Francisco a Los Angeles que poderia custar US$ 77 bilhões.

“Seria ótimo ter uma alternativa para voar ou dirigir, mas, obviamente, apenas se for realmente melhor do que voar ou dirigir”, escreveu Musk. “Um quinto modal, depois de aviões, trens, carros e barcos” que pudesse transportar passageiros em terra, com velocidade supersônica, conectando cidades de alto tráfego, distantes em até 1.500 quilômetros. “Mais barato, mais seguro, mais conveniente, energeticamente sustentável, e imune a cli-ma e a terremotos”. Capaz de percorrer a distância de 610 km entre as duas cidades em 30 minutos.

Enquanto o projeto do governo da Califórnia nunca saiu do papel (aprovado em 2008, viu seu custo estimado dobrar dos US$ 33 bilhões iniciais para US$ 77 bilhões) e foi recentemente engavetado pelo governador da Cal-ifórnia, Galvin Newson, a ideia-semente de Musk materializou-se e atraiu outras empresas, como a Hyperloop Transportation Technologies, e a Virgin Hyperloop One.

Mas afinal o que é o Hyperloop? “Essencialmente são longos tubos de 4 metros de diâmetro, apoiados em pilares de 15 metros de altura, dentro dos quais uma cápsula (pod), praticamente um avião sem asas, viaja a ve-locidades supersônicas sem atrito com o ar, graças ao vácuo dentro dos tubos, e sem eletricidade”.

É assim, com essa explicação simples, que o brasileiro Ricardo Penzin descreve o objeto-chave de sua missão “desafiadora e divertida” de emplacar no Brasil projetos utilizando a tecnologia da Hyperloop Transportation Technologies (TT), a primeira empresa a pegar o desafio lançado por Elon Musk em agosto de 2013.

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A INOVAÇÃO A 1.200 KM/HORA

Ricardo PenzinHead of Business Develpment Brasil Hyperloop TT

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RUPTURA...“O desafio de ter um novo modal de transporte é grande. É uma batalha diária. É como pensar no Ozires Silva falando 50 anos atrás sobre a Embraer. Ninguém acredita. É uma questão de trabalho.

O Brasil historicamente vem a reboque das tecnologias disruptivas. O país é a oitava economia do mundo, mas está no 73º lugar entre os 130 países do ranking de infraestru-tura do World Economic Forum. Temos 12% de nossas rodovias pavimentadas e temos uma ferrovia que trafega a 27 quilômetros por hora em média. Se crescermos 5%, corremos o risco de não ter energia para sustentar. Quanto perdemos de roubo de carga, acidentes, quanto se gasta no sistema de saúde com acidentes de caminhão?

Fazia sentido ter uma operação aqui para começar a desbravar o país, que não é um país para amadores. Pre-cisamos de tempo e de estrutura para convencer as pessoas. A curva do Hyperloop é a mesma curva de todas as tecnologias disruptivas do mundo, as pessoas precisam ser convencidas de que existe, que é viável e que é benéfica para o país e para as empresas.

Estamos tentando trazer para o Brasil desen-volvimento tecnológico e potencialmente oferecer para o país a construção de um sistema que hoje é muito mais eficiente, rápi-do, barato e sustentável do que temos hoje. Temos conversas governamentais e privadas para potencializar isso o mais rápido possível e ter nos próximos anos um projeto no chão, pelo menos iniciado, para um primeiro Hyper-loop no Brasil/

“Imagine poder conectar cidades distantes do Brasil em 2 horas e meia de forma rápida e sustentável.”

A Hyperloop TT nasceu dentro do JumpstartFund, uma incubadora criada no final de agosto de 2013 para re-unir dinheiro e cérebros que levassem adiante as ideias do documento de Musk. No final de 2013 a Hyperloop TT lançou seu próprio documento atestando que o Hyperloop era possível e em 2014 consolidou-se com 100 funcionários (hoje 400), entre eles engenheiros e designers vindos da Boeing, Airbus, NASA, Harvard, UCLA, e Stanford, colaborando globalmente nos EUA, Ásia, Austrália e Europa.

No Brasil, a tarefa de Penzin é seduzir grupos privados e entidades governamentais a trazer para o país o meio de transporte que a Hyperloop TT já emplacou em Abu Dhabi (que deverá ter seu primeiro Hyperloop em funcionamento no final de 2021), Alemanha (porto de Hamburgo), Ucrânia, China (província de Guizhou) e Ohio (Chicago-Cleveland), com 12 contratos avançados de viabilidade em outros países, sem falar na França, onde tem em Toulouse sua plataforma de teste construída. Confira a conversa.

“Claro que temos potenciais concorrentes nesse cenário, mas bem vindos à ruptura. As companhias aéreas podem se sentir ameaça-das ou, montar um Hyperloop e ser operado-ras do sistema. Uma cápsula custaria 1/5 do preço de um avião.”

| Ricardo Penzin

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A Hyperloop TT começou em 2013, com o duelo do Hyperloop, e de lá pra cá estamos construindo o quinto modal de transporte do mundo. Em cinco ou seis anos saímos de um documento de 57 páginas para uma con-strução real efetiva em tamanho real em funcionamento.

Temos uma primeira versão em Toulouse, na França, que é uma pista de certificação de 320 metros e vai ser expandida para ter 1,5 km. Já testamos o vácuo e agora vamos testar a cápsula. Estamos fazendo várias missões para Toulouse para as pessoas entenderem o pro-jeto. A concepção do projeto está pronta, e só construir.

Temos contratos com 12 países e conversando com mais de 40. Abu Dhabi está em projeto executivo para começar em 2020 e construir uma linha comercial de 147 km que ficará pronta em 2023, sendo que até o final de 2021 teremos os cinco primeiros quilômetros funcionando. Nos EUA tem o projeto para conectar Chicago a Cleveland, com estudo de viabilidade com parceiro e está em andamento. O projeto de Ohio é conectar todas as grandes cidades da região e gerar economia. Quando se conecta grandes cidades o poder de gerar novas receitas é imenso

Na Europa temos um projeto de carga na Alemanha, com o porto de Hamburgo, assinado no ano passado. Na França está nosso lab de passageiros. Tem projetos de licenciamento tecnológico que usam a nossa tecnologia. Estamos na Índia, China, Indonésia, África e conversando com o governo australiano.

Dependendo de onde falamos, o Hyperloop chama a atenção por motivos diferentes. Por exemplo, se pegar os portos de Santa Catarina, Paranaguá e Santos, o que chama a atenção é a capacidade de levar as cargas. Se falamos do trajeto Campinas/São Paulo, o atrativo é o transporte de passageiros. Depende da rota e da demanda que ela tem.

O Hyperloop é uma obra de construção como qualquer outra. Entramos nos mesmos modelos de outras arquiteturas de transporte como ferrovias e rodovia, mas nossa vantagem são a eficiência e o custo operacional, muito menores. Nosso break even é em média 15 anos. Isso, na infraestrutura é o melhor do mundo, eu me arriscaria a dizer. A operação custa 1/10 do que custa uma ferrovia. E de capex (construção) somos 1/3 do que é um trem bala e 1/5 d que é um metrô.

O tempo de construção depende do tamanho da rota. Campinas a São Paulo, por exemplo, levaria 3 anos entre o estu-do de viabilidade, projeto executivo, teste, operação. Para operar é preciso ou ter a concessão do direito de passagem, se for desbravar uma rota nova, ou usar uma rota preexistente de uma operadora - construir na paralela de uma rodovia ou ferrovia, por exemplo. Isso vai depender muito do parceiro local. Uma Ecovias pode querer usar a rota deles para explorar o transporte de carga e aumentar o faturamento, por isso passa a ser relevante construir na lateral da rodovia.

Não estamos falando de uma tecnologia para 50 anos na frente, não é futuro distante. Es-tamos falando de hoje.

“Nossa inovação não é software, é hardware, é infraestrutura, por isso o desafio é ter pelo menos um construído para sensibilizar as pessoas comuns. O povo de inovação e tec-nologia já conhece e aprova.”

| Ricardo Penzin

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Nossa tecnologia de propulsão consegue fazer com que a capsula se locomova hoje sem eletrificar o trilho. O contrário do trem-bala, que precisa eletrifi-car o trilho inteiro, o que tem um custo de consumo de energia muito alto e exige limpeza constante dos trilhos (custo de US$ 2 milhões por mês) porque está em um sistema aberto. Se perde a conectividade o trem bala não anda. No nosso caso, estamos em um sistema fechado, sem resistência do ar, sem luz, sem energia, somos sustentáveis. Nossa manutenção é menor, não é preciso limpar o trilho.

A cápsula não tem janela, mas a nossa preocu-pação é o bem estar do passageiro. Então, dentro da cápsula, nas laterais, tem telas que simulam a visão externa como se fossem janelas. Você pode escolher a paisagem que vai ver na janela, por exemplo, até de outros países. Ela acompanha o movimento da sua cabeça, tem perspectiva para dar a sensação de janela e não enjoar o passageiro.

Eu sempre fui de inovação. Eu era o coordenador de inovação para o estado de são Paulo da CNI e aí trabalha-va tanto governo quando empresas privadas. Aí um grande amigo me convidou para ingressar nessa aventura. A experiência desses dois anos é desafiadora e divertida ao mesmo tempo. Desde 2017 tem sido um desafio diário, mas bastante engrandecedor, e com aprendizado muito grande.”

“A tecnologia do Hyperloop é muito sim-ples: é um pilar, com dois tubos em cima com 4 metros de diâmetro, e uma cap-sula dentro que é basicamente um avião sem asas, se movendo à velocidade máx-ima de 1.200 km/hora.”

“É o momento de mostrar para o mundo que a gente é viável e que a gente existe.”

| Ricardo Penzin| Ricardo Penzin| Ricardo Penzin

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ntre 129 países, o Brasil é o 66º mais inovador segundo o Índice Global de Inovação (IGI). O país per-deu duas posições em relação ao ano anterior, em que ocupava o 64ª lugar. E vem perdendo compet-itividade. Um dos fatores determinantes para o resultado foi a piora na avaliação dos insumos para inovação, que são o conjunto de ferramentas disponíveis no país para o desenvolvimento da inovação — o Brasil caiu de 58º para 60º lugar.

Gianna Sagazio, diretora de Inovação da Confederação Nacional da Indústria e CEO do Instituto Euvaldo Lodi, co-ordena uma série de iniciativas no âmbito da instituição, incluindo a MEI, Mobilização Empresarial pela Inovação, que há uma década vem trabalhando junto ao governo, academia e setor empresarial no sentido de construir um ambiente favorável para que o país reverta essa quadro. O Marco Legal da Ciência e Tecnologia, o Marco Legal da Inovação, CTI, a Lei do Bem e a Embrapii são algumas iniciativas que, segundo ela, tiveram origem na articulação construída dentro da MEI.

“Mas não melhoramos o tanto quanto o Brasil, como nona economia do mundo, deveria. Estamos atrasados. Falta um senso de urgência. O mundo está avançando rapidamente e estamos ficando para trás. O país precisa entender inovação como um investimento público. Ter uma visão de longo prazo que entenda a inovação como uma estratégia de desenvolvimento. Estamos na contramão, com gastos em educação ciência e tecnologia sendo contingenciados. Inovação não é gasto. Não pode ser contingenciada”, diz ela.

A falta de políticas de estímulo à inovação está entre os principais fatores que emperram a transformação no país, especialmente no segmento industrial, atrás somente da burocracia excessiva, dos baixos níveis de ed-ucação e qualificação de mão-de-obra e de instrumentos de financiamento para P&D. Hoje a maior parte das indústrias brasileiras tem usado apenas recursos próprios para investir em pesquisa e desenvolvimento. “O em-presário reconhece a importância da inovação, e sua incorporação à estratégia corporativa”, diz ela. Mas muitas vezes a falta de recursos e de informação o impede de fazer mais.

Nessa conversa, Gianna Sagazio fala sobre as iniciativas em curso na CNI e na MEI para ampliar a consciência dos diversos atores de que a inovação é um processo sistêmico, de longo prazo.

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A INOVAÇÃO NÃO PODE SER CONTINGENCIADAGiana Sagazio, Diretora de Inovação da CNI

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DISRUPÇÃO É ...“A quebra radical em busca do novo. É a ruptura com um processo, comportamento ou uma ideia estabeleci-da. Para isso é fundamental o conhecimento, a curiosidade e a coragem para assumir riscos. Ao aceitar o risco, você se permite experimentar e admite o erro. É o que te aproxima de fazer algo que ninguém nunca fez antes.

Na CNI temos um programa que leva empresários e gestores públicos brasileiros para conhecer grandes polos de inovação disruptiva no mundo, o programa de Imersões em Ecossistemas de Inovação. Um dos principais responsáveis por aproximar a indústria brasileira com o que há de mais avançado pelo mundo. Não chega a ser uma imersão, ou uma missão de negócios. O objetivo é ampliar o conhecimento. Dar um choque de realidade.

Em uma dessas visitas, diretores da Gren-dene viram um carro ser produzido em uma impressora 3D. Imediatamente, começaram a estudar a possibilidade de integrar a im-pressão 3D no processo produtivo deles, para substituir a usinagem de moldes. E não só as grandes empresas podem participar dessas viagens. Temos a missão de levar mais conhe-cimento para pequenas e médias empresas também.

Esse dado está entre os principais resultados do projeto Indústria 2027, realizado pela CNI, a MEI e o Instituto Euvaldo Lodi. Das 759 grandes e médias empresas participantes, 21,8% projetam ter o processo produtivo to-talmente digitalizado em um horizonte de 10 anos.

Para acelerar esse processo a gente precisa de ter uma Política de Inovação no país. E não se faz uma política de inovação sem conhecer a indústria. Por isso mesmo acabamos de criar um grupo de trabalho de Indicadores na MEI. Ter indicadores sobra a nossa realidade permitira nos comparar com a realidade de outros países, e traçar estratégias para posicionar o país.

Divulgamos agora em maio os resultados de uma pesquisa com 100 CEOs que faz um bom diagnóstico dos principais entraves à inovação, na opinião deles. A maioria [96%] considera a inovação estratégica para suas companhias. Mas apenas 31% deles fazem investimentos significativos em pesquisa e desenvolvimento. Fariam mais se o ambiente fosse favorável. A falta de financiamento, a burocracia excessiva, os níveis baixos de educação e qualificação de mão-de-obra e a falta de políticas de estímulo atrapalham.

A importância de melhorar o ecossistema de inovação levou, há onze anos, à criação da Mobilização Em-presarial pela Inovação (MEI), com objetivo de intensificar a articulação entre setor empresarial, a academia e governo para a melhor as políticas de inovação e estimular investimentos públicos e privados em pesquisa e desenvolvimento. A academia precisa trabalhar mais próxima da indústria.

“Os desafios são imensos. Atualmente, ape-nas 1,7% das empresas brasileiras operam nos padrões da Indústria 4.0.”

“O problema é maior entre as médias e pequenas empresas do setor industrial, que não têm recursos para inovar.”

| Giana Sagazio

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Recentemente, a MEI lançou o documento “Agenda 2019-2020”, com uma série de propostas para tornar o Brasil, de fato, um país inovador. Precisamos buscar soluções para criar um ecossistema de inovação eficiente, com instituições fortes, regras claras e descomplicadas... As reformas em curso no país ajudam. Mas temos que olhar também para política de inovação para a economia digital, recursos humanos e pequenas e médias empresas, incluindo as startups.

Na prática, o sistema indústria, formado pelo Senai, Sesi e IEL, tem hoje cerca de 100 institutos de tecnologia e inovação distribuídos em todo o Brasil, capazes de gerar soluções inovadoras para a indústria brasileira. Os institutos trabalham desde a fase pré-competitiva do processo inovativo, até a etapa final de desenvolvimento, quando o novo produto está prestes a ser fabricado pela indústria.

O IEL, por sua vez, criou o programa Inova Talentos, em que projetos de Pesquisa, Desen-volvimento e Inovação (PD&I) nascem da par-ceria entre o Instituto com empresas e univer-sidades. O objetivo é selecionar, capacitar e inserir no mercado de trabalho profissionais para exercerem atividades de inovação.

O IEL coordena a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI). E é o principal apoiador do Prêmio Nacional de Inovação, que recon-hece organizações inovadoras no Brasil. A iniciativa é resultado da parceria da CNI com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). E também criou o programa Inova Global, por meio da MEI. Ele auxilia a indústria brasileira na construção de parcerias com empresas de diversos lugares do mundo. E promove o intercâmbio de bolsistas e a recepção de pesquisadores estrangeiros para a execução de projetos inovadores, oferecendo inúmeros benefícios para a indústria.

O Sistema Indústria atua tanto fazendo a formação dos trabalhadores quanto desenvolvendo pesquisa, desenvolvimento e inovação. E fomentando o empreendedorismo.

Temos o desafio de conectar as grandes indústrias às startups de maneira a acelerar o nosso ecossistema de inovação. Para isso, precisamos aprender com as experiências estabelecidas e assim defender condições mais amigáveis para que essas empresas consigam se desenvolver e ganhar escala.

No próximo dia 13, em São Paulo, o seminário Casos de Inovação na Indústria vai mostrar 30 empresas de diversos portes e áreas de atuação que ilustram a importância estratégica da inovação para o desenvolvimen-to da indústria nacional. Há pequenas, médias e grandes; há também startups, subsidiárias de empresas es-trangeiras e multinacionais brasileiras. Apesar da diversidade, em todas elas inovar significou criar valor para a empresa.

“A qualidade da educação básica e do ensino superior é um fator diretamente relacionado ao grau de inovação de uma economia. In-ovação é resultado da capacidade humana. Nossos esforços na formação de recursos hu-manos precisam ser maiores.”

| Giana Sagazio

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O QUE LER PARA ENTENDER O ESTADO DA INDÚSTRIA 4.0

• 9 tecnologias que estão transformando a produção industrial no mundo todo e norteando a chamada 4.0 é o tema desse estudo do BCG. A tecnologia digital avançada já é usada na fabricação, mas com a Indústria 4.0, ela irá transformar a produção e mudará relacionamentos tradicionais de produção entre fornecedores, produtores e clientes - assim como entre humanos e máquinas.

• Oportunidades de mercado da indústria 4.0, tendências e previsão de análise de crescimento até 2026 são abordados no novo estudo que acaba de ser publicado pela Report Consultant. O mercado em torno da Indústria 4.0 está avaliado em US$ 66 bilhões em 2019 e deverá chegar a US$ 152 bilhões em 2016, com taxa de crescimento anual de 14% no período.

• Um farol para iluminar o caminho da indústria 4.0. Essa é a proposta do projeto Global Lighthouse Net-work, criado pelo World Economic Forum em parceria com a McKinsey & Company. Trata-se basicamente de uma rede de fábricas e outras instalações ligadas à produção e manufatura que são apresentadas como exemplos para as empresas que estão com dificuldades para enxergar o caminho da transfor-mação digital. “70% das empresas globais estão em um ‘purgatório’ com seus pilotos”, diz Francisco Betti, líder do grupo Advanced Manufacturing Industry ligado ao projeto.

• Fabricantes que não adotarem a Indústria 4.0 correm o risco de ficar para trás na curva do caminho. O alerta é da consultoria GlobalData. Ela publicou um estudo elencando cinco tecnologias chave que definem a mudança de paradigma que vem com a Indústria 4.0. O documento inclui exemplos de cinco diferentes multinacionais que fizeram a lição de casa.

• Como preparar a planta de fábrica para a Indústria 4.0? A Interesting Engineering preparou um guia com 6 insights importantes para montar um road map para a smart factory.

| Giana Sagazio

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aniel Leipnitz sabe o quanto é difícil fazer uma empresa de tecnologia crescer e ganhar credibilidade longe dos grandes centros de consumo no Brasil. Atual presidente da Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE), Lepnitiz lembra que quando começou sua empresa costumava pegar o ônibus noturno para São Paulo para fazer reuniões de negócio na cidade. “Eu não tinha condições finan-ceiras para pagar uma passagem de avião. ia de ônibus, trocava de roupa na rodoviária e ia com o

computador debaixo do braço mostrar meus produtos.”.

Por isso, Leipnitz está focado na missão da entidade, de promover a cultura da inovação em toda Santa Ca-tarina, e quer aumentar o reconhecimento da indústria catarinense no estado, país e internacionalmente. Sua estratégia: unificar as ações e mover a iniciativa privada para criar uma personalidade tecnológica para o Estado que reflita em credibilidade para as empresas do ecossistema.

Para reforçar o ecossistema de inovação catarinense, a Associação é gestora de iniciativas como a incubadora MIDITEC, o laboratório de inovação aberta LinkLab, Verticais de Negócios, o programa de apoio a startups em fase inicial StartLab, rede de investidores-anjo, uma sede em São Paulo que acolhe os empreendedores que, como ele, querem ampliar seus negócios, e um escritório em Boston, para buscar reconhecimento para a região.

Santa Catarina tem mais de 12 mil empresas (1,2 mil membros da ACATE), segundo estudo realizado pelo Ob-servatório ACATE em 2017, que faturaram em média R$ 1,255 milhões, com 16.609 empreendedores e que em-pregam 47.445 colaboradores. O setor de Tecnologia fatura R$ 15,53 bilhões anuais, o que representa 5,6% da economia do Estado (R$ 249 bilhões, segundo dados do PIB de 2015).

Nessa conversa, Leipnitz conta como a ACATE, nos últimos 4 anos, conseguiu materializar a tecnologia para a região, dobrando o número de empresas e investindo em projetos para ampliar a colaboração entre empresas tradicionais e startups. Inspirado em modelos globais de sucesso, o executivo tem uma visão muito pragmática de como ter sucesso na empreitada. Confira.

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A FORÇA DA IDENTIDADE TECNOLÓGICADaniel LeipnitzPresidente da ACATE

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DISRUPÇÃO É ...“Olha, a ruptura é tu procurar quebrar paradigmas sem se prender ao que já foi feito antes como referência, começar a fazer coisas sob outra esfera. É o pensar diferente, trabalhar a resolução de problemas, de situações, levando em conta outras coisas outras perspectivas, sair da caixa. Quando falo de não fazer as mesmas coisas, falo de olhar para os problemas com outro olhar. É preciso focar no problema e nos benefícios.

Muita coisa mudou desde a criação da ACATE. A gente acabou evoluindo de uma entidade que era quase que um condomínio de empresas, para a ser uma entidade que entrega valor, onde as pessoas têm vontade de estar junto e pertencer. Por necessidade, acabamos criando modelos e produtos que agregam valor aos em-preendedores e isso transformou realmente a nossa entidade.

O ponto de virada foi há 3,5 anos. A ACATE tinha o networking, os cursos, mas, em determinado momento, quando fomos para um espaço diferente, quando construímos a sede nova no galpão, é como se a sociedade que não nos enxergava começasse a nos enxergar. A gente conseguiu tangibilizar, tornar real o que para a so-ciedade não era visível. E a nossa relação com a cidade mudou da água para o vinho.

As pessoas começaram a frequentar o nosso espaço e começaram a ter muita vontade de trabalhar ali, pas-sear, jantar. Era uma coisa diferente. Isso começou a fosterizar um ambiente de inovação que trouxe novas pessoas para dentro.

É um trabalho árduo, difícil, de conscien-tização, que exige quebrar paradigmas. Foi um movimento da iniciativa privada, de dar uma personalidade tecnológica para o Estado. Ob-viamente que a iniciativa pública tem apoiado, mas o Estado tem suas limitações, o país tem seus problemas.

Quando eu falo de marca para o Estado, isso tem muito a ver com credibilidade que ela pas-sa para as empresas que vêm dele. Quando falamos da marca Vale do Silício ou a marca Israel (The Startup Nation), por exemplo, a empresa associada a eles tem uma credibilidade. Tem algumas coisas muito peculiares, muito pragmáticas que eles fizeram em Isra-el que podemos absorver e replicar e que vão fazer toda a diferença. Procuramos viajar muito e pegar muitos benchmarks de fora.

A Coreia do Sul, por exemplo, é um grande benchmark para nós. Aprendemos muito. Nos chamou muito a atenção o fato de cada lugar que a gente ia, nas diferentes entidades, todos falavam a mesma língua, todos estavam direcionados para o mesmo caminho. Isso marcou muito e usamos esse conceito aqui.

Entendemos que isso fortalece o movimento. Temos também Israel, toda a mudança de Barcelona, as ini-ciativas de Paris, o próprio Vale do Silício, a Irlanda e Singapura. De cada um deles a gente acaba “beliscando” alguma coisa e naturalizando.

Há mais ou menos quatro anos, a gente começou a colocar no pensamento das pes-soas que se o Estado fosse unido, tivesse uma marca única, traria muito mais credi-bilidade para todas as empresas e isso aju-daria o ecossistema a crescer.

| Daniel Leipnitz

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Talvez por causa disso o nosso problema de falta de profissionais de TI seja até maior. Esse talvez seja o nosso principal desafio como setor. Temos uma série de programas, mas eles não são suficientes. Levamos em conta todo o estudo de trabalho e aprendizado de outros polos tecnológicos. Por exemplo, nen-hum deles se desenvolveu sem buscar gente de fora. No Vale do Silício, por exemplo, mais de 50% das pessoas são de fora. Na área de engenharia, 70% vêm de fora.

Aqui trabalhamos, ainda em forma de piloto, o ensino médio e direcionando o interesse dos jovens para a parte lógica, de resolução de programas. Temos programas de ensino de programação nas escolas, programas como o Entra 21, Geração Tech, e programas regionais para preparar os jovens a partir de uma demanda da própria região. São programas que envolvem o apoio do Estado, das prefeituras e das empresas locais.

Temos exemplos fantásticos. Pessoas que eram mecânicas que acabaram se tornando programadores. Protéticos que acabaram entrando na área de tecnologia. Incentivamos também a vinda de pessoas de fora. Os sites das empresas de tecnologia ressaltam as qualidades do Estado, como qualidade de vida, programas de saúde, educação... Tem dado certo. Tem bastante gente vindo de outros Estados, já é 20% da força de trabalho.

Sobre transformação digital, é uma questão de troca da cabeça das pessoas, de modelo mental que precisa mudar. A gente está começando a fazer iniciativas desse tipo. Começamos a ver a questão de corporate ven-tures. Temos um programa chamado LinkLab, que trabalha nesse sentido. Uma segunda etapa dele vai entrar nessa questão da catequização digital das empresas.

Estamos entrando no terceiro ciclo do Lin-kLab com 100% de renovação e expandindo para mais dois regionais, um de Joinvile e out-ro em São José e recebendo pedidos de todos os pontos do país para expandir isso. E é um sucesso.

É um índice altíssimo. São 30 empresas par-ticipando, grandes empresas. Cada unidade tem um limite de 10 empresas. Então a ideia

é que isso gere uma grande rede de lugares dispersos no Estado. Para cada empresa participante tem pelo menos 10 a 15 empresas vinculadas a ela fazendo negócios. Elas propõem desafios, selecionam e também fecham negócios. Às vezes acontecem investimentos, mas deixamos isso muito livre. Se faz sentido, o investi-mento acontece. Esses 42% incluem também isso eventualmente.

Temos iniciativas de parcerias com empresas, como a Cargil, para criar laboratórios de desenvolvimento. Ela comprou uma empresa de Agritech que tem aqui na região e daqui ela vai fazer o laboratório de inovação para

Desde que a gente começou a trabalhar isso, em 2014, vimos que simplesmente do-brou o número de empresas de tecnologia do Estado. Conseguimos fazer programas muito mais consistentes, trabalhar o desen-volvimento do ecossistema de forma muito mais acertada.

Enquanto os números do mercado giram em torno de 3% de negócios entre as corporate e as startups, nós conseguimos ter um índice de 42% de negócios entre as empresas par-ticipantes e as startups.

| Daniel Leipnitz

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o mundo. Tem outras iniciativas de empresas como Philips, Ambev, trazendo seus laboratórios de inovação para o Estado. Temos o Mercado Livre, Peixe Urbano, GE. Um movimento muito bacana.

A unidade aberta em São Paulo tem a função de resolver uma dor que sempre afeta as empresas de fora. No meu início, por exemplo, eu não tinha condições financeiras para pagar uma passagem de avião. Ia de ônibus, trocava de roupa na rodoviária e ia com o computador debaixo do braço mostrar meus produtos. O espaço ajuda a quem é novo poder levar uma empresa para uma reunião, deixar sua mala, descansar.

Tu já tem tanta dificuldade para conseguir vender, ser competitivo, isso ajuda a passar credibilidade, pode passar um endereço de filial lá. As métricas ainda são subjetivas, mas com certeza está influenciando positiva-mente.

Nosso centro em Boston tem duas funções. Uma é de ter acesso ao que está acontecendo lá em termos de tecnologia, descobertas, cére-bros. Tem o MIT, tem Harvard. Estar próximos é importante. E tem o espaço para quem quer ir aos Estados Unidos, de ter uma sede, um ponto de partida. Ainda não tem um ponto de captação de profissionais de lá, nosso ponto principal é construir uma visibilidade para o Estado lá, uma credibilidade.

É um trabalho de formiguinha. Focamos muito no último ano nos empreendedores que lá moram, que têm sucesso, e que não têm a mínima ideia do que está acontecendo em Santa Catarina. Empreendedores de grosso calibre. Isso está sendo bem importante.

A questão da vocação, de forma mais específica, acaba decolando quando se tem muito dinheiro, em países muito ricos. Acreditamos mais na diversidade. Em Florianópolis temos iniciativas de energia, marketing digital, big data, vamos criando pequenos clusters e cada polo regional está livre para criar a sua vocação específica. As nossas fundações de pesquisa, o dinheiro público, tem de ter uma vocação e não botar dinheiro de governo em estudos que não geram valor. As iniciativas do governo têm de ter foco em coisas que ajudem o governo a ser mais eficiente. Precisamos de soluções pragmáticas.

A tecnologia muda o mundo. É uma grande democratizadora de conhecimento. A gente vai ter um papel fundamental, a médio e longo prazo, no sentido do direcionamento que vamos dar para ela. Vai ser uma coisa limitada a quem tem dinheiro, quem tem recursos, ou vai ser uma coisa que vamos conseguir democratizar? Isso é muito mais do que o simples acesso à internet. Estou falando de acesso a tecnologias de saúde, de ed-ucação. Temos um papel muito forte de tentar fazer com que isso seja democratizado. Se não vamos ter uma divisão social gigantesca mais para frente, acelerada pela fronteira tecnológica”.

O mundo da tecnologia é um mundo muito pequeno. Todo mundo se conhece, existe uma coisa muito importante e emblemáti-ca que é a confiança. O Peter Thiel, um dos ícones da área, diz o seguinte: “primeiro me apresente para alguém que confie em você e que te apresente”

| Daniel Leipnitz

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AS 4 INICIATIVAS ESTRATÉGICAS DA ACATE

• MIDITEC - O MIDITEC é uma incubadora de empresas de base tecnológica gerenciada pela ACATE e pelo Sebrae/SC. Ao longo de seus mais de 20 anos de história, a incubadora foi eleita pela Anprotec por quatro vezes como a melhor incubadora do Brasil e, pelo UBI como 5ª melhor incubadora do mundo, em 2018. Ao longo de sua trajetória, mais de 100 empresas já participaram do programa, entre as quais Pixeon, Resultados Digitais, Ahgora, Arvus, JExperts, Knewin etc.

• LinkLab - O LinkLab foi inaugurado em 2017 e conta hoje com 2 unidades operantes (CIA Primavera e CIA São José - este segundo será inaugurado amanhã em cerimônia oficial) 18 corporates e 34 startups conectadas. O projeto consiste em um laboratório de inovação aberta, onde são feitas conexões entre corporates e startups inovadoras. As corporates patrocinam o espaço, investindo em inovação para elas próprias, enquanto as startups podem se candidatar para desenvolver soluções para essas empresas.

• Verticais de Negócio - As verticais de negócio são clusters constituídos por empresas de tecnologia asso-ciadas à ACATEque atuam em um mesmo segmento de mercado, tais como Saúde, Educação, Segurança, Construção, entre outras. O modelo estimula os empreendedores a se conhecer, trocar experiências e buscar o desenvolvimento conjunto. Criadas em 2009, as Verticais de Negócios são um dos grandes diferenciais da entidade e continuam crescendo e gerando novos projetos. Hoje são 13 verticais no pro-grama, que promovem encontros e eventos periódicos com debates e realização de ações sobre temas de relevância para cada segmento.

• StartLab - O programa tem como objetivo auxiliar startups de base tecnológica em fase de ideação a desenvolver seus modelos de negócio e alcançarem maiores níveis de maturidade. Por meio da metod-ologia ACATE de desenvolvimento do empreendedor e da startup, as empresas terão acesso à rede de mentores ACATE. O programa está com inscrições abertas para startups.

| Daniel Leipnitz

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la é matemática e a única brasileira no ranking Women Business Pioneers In Artificial Intelligence, pelo qual a IBM reconhece mulheres precursoras no uso da Inteligência Artificial. Participou de várias inci-ativas estratégicas do Bradesco, como a supervisão do desenvolvimento do sistema de IA para o aten-dimento dos clientes, o BIA (Bradesco Inteligência Artificial). E hoje, como diretora executiva do banco, Walkiria Schirrmeister Marchetti responde pelas áreas de Tecnologia, Inovação, Pesquisa e Operações.

Com o mesmo entusiasmo com que conta como o sistema de inteligência artificial foi capaz de aprender a língua portuguesa, incluindo gírias e regionalismos, Walkiria comenta nessa entrevista como o banco veio estru-turando o seu processo de inovação disruptiva, até formar o que ela chama de ecossistema InovaBra.

“A cultura de inovação está no DNA do banco”, diz ela, ressaltando no entanto que hoje ninguém inova sozin-ho. É importante unir a disposição das grandes corporações em empreender e as ideias inovadoras das startups no uso de tecnologias como a própria IA, a IoT e o blockchain, para melhor atender ao consumidor. Que, por sua vez, já não pode mais ser segmentado somente pelos critérios tradicionais, como idade, ocupação e escolaridade, por exemplo, mas cada vez mais por seus comportamentos durante a sua jornada digital.

Conceitos como o do internet banking e mobile banking caminham para ser substituídos pelo Open Banking e o modelo de operação através de plataformas. E o Bradesco e seus parceiros já se preparam para esse futuro não muito distante, como você poderá conferir no desenrolar da conversa.

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NO COMANDO DA INOVAÇÃO

Walkiria MarchettiDiretora executiva do Bradesco

DISRUPÇÃO É ...“Uma questão complexa. Várias definições correm aí no mercado, mas eu gostaria de dar uma bem simples: disrupção é o novo. Um novo produto... Um novo serviço... Uma nova experiência que traga valor para o con-sumidor.

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Na verdade, a disrupção vem do consumidor, quando ele busca simplificar a vida ao usar um produto ou serviço mais acessível, que ofereça conveniência, uma experiência completa e de forma mais barata. A tecno-logia entra nesse cenário muito mais como um meio, não tanto pela própria tecnologia, mas pela forma como ela é aplicada para gerar valor para o cliente.

E as tecnologias exponenciais disruptivas que surgem têm feito esse processo ser mais veloz do que no pas-sado, não é? A humanidade sempre passou por pequenas e grandes revoluções ao longo do tempo, como no caso da Revolução Industrial, com o vapor e, depois, com a eletricidade.

Hoje nós temos tecnologias que permitem um movimento ainda mais acelerado, com uma capacidade de processamento bastante grande, a possibilidade de captura e uso de um conjunto de dados imensa... Tudo isso para entender as necessidades do consumidor.

O Bradesco sempre acompanhou muito de perto toda a evolução tecnológica e como apli-car as novas tecnologias a serviço do cliente. Desde quando compramos o nosso primeiro computador, quando passamos a oferecer transações através da Internet, ou quando criamos o nosso primeiro cartão de débito, o objetivo sempre foi poder entregar valor mais rápido aos nossos clientes. Com a Inteligência Artificial não foi diferente.

Primeiro criamos um grupo interno que iniciou estudos sobre a nova tecnologia, capitaneado pela área de Pesquisa e Inovação, porque entendíamos que a Inteligência Artificial ainda não estava madura, mas que já era o momento de a gente começar a experimentar. Por volta de 2016 nós abrimos o primeiro projeto e decidimos buscar o primeiro caso de uso.

Tínhamos um ponto a resolver, que era como levar o conhecimento sobre os nossos produtos e serviços à nossa força de vendas nas agências... Temos uma centena de pro-dutos, dada a diversidade da organização, que atua como banco, seguradora, empresa de consórcio, corretora e uma abrangência grande da nossa rede agências. O tempo para formar conhecimento, levá-lo a todos, é muito grande.

Essa etapa de alimentação da base foi a mais fácil. Depois veio a etapa de treinamento, que é uma das mais importantes na implementação de qualquer projeto de Inteligência Artificial. Nós usamos a nossa própria rede de agências para treinar a nossa base de conhecimento. Elas nos ajudaram a construir a nova ferramenta de trabalho e aprimorar a base. Foi um trabalho conjunto.

Para nós a Inteligência Artificial é a nova elet-ricidade. Ela vai permear todas as atividades do ser humano e, consequentemente, todas as atividades de uma empresa.

Então, começar a trabalhar com a IA na criação de uma base de conhecimento dos nossos produtos e serviços reunindo toda a informação que estava dispersa entre docu-mentos e pessoas, foi um bom caso de uso.

| Walkiria Marchetti

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Além da alimentação da base e do treinamento da IA, existe também uma estrutura de curadoria que é re-sponsável por acompanhar permanentemente as interações com a base de conhecimento e avaliar se as res-postas foram assertivas ou não.

No modelo que implementamos, a consulta é remetida a um atendente humano, de forma totalmente trans-parente para quem está interagindo via chat, caso a resposta não tenha sido satisfatória após 5 interações. Essas derivações para o atendimento humano também servem de insumo para a gente retroalimentar o pro-cesso.

Hoje temos uma equipe de mais de 100 pes-soas que cuida de todo esse ciclo da IA. Mas especificamente da BIA, que é o acrônimo de Bradesco Inteligência Artificial. Nós chamamos essa área de Centro de Excelência da BIA, C-BIA. Ele cuida de agregar as novas capacidades da IA, como linguagem natural, interpretação de voz e de texto, no sentido fazer melhorias na interação e também do treinamento contínuo da base de conhecimento.

Quando entendemos que tínhamos uma base de conhecimento bastante madura, a BIA passou a atender também os nossos clientes. E acredito que temos aí uma vantagem competitiva.

Começamos alimentando a base de conhecimento com os 11 produtos mais demandados, para exercitar o modelo, a governança e, principalmente, fazer as integrações com os nossos canais de atendimento. Hoje es-tamos com quase 90 produtos nessa base, disponíveis para acesso por nossos clientes. E expandimos também para outros setores, como a seguradora.

No caso do banco, o foco é a melhoria do atendimento do cliente, para que ele seja cada vez mais personalizado e resolutivo. No caso da seguradora é menos na oferta do produ-to e mais no momento de mais desconforto, em que o cliente mais precisa do seguro, para ajudá-lo a resolver o problema. A BIA pode chamar o guincho mais próximo, ligar para oficina mais próxima, conduzir o atendimento.

Todas as empresas têm os seus padrões de ética que devem ser estendidos à aplicação de IA. Nós aplicamos

análise de score em análise de crédito há mais de 25 anos. Não é novidade. E fizemos com as tecnologias vigen-

tes à época. Por isso é muito importante estabelecer governança e curadoria permanente na interpretação das

intenções e das bases de conhecimento.

Quando termina esse trabalho? Nunca! Porque é um trabalho do cuidar mesmo. De acompanhar permanentemente as inter-ações para aprimorar o sistema.

A aplicação da IA tem em seu bojo uma questão ética, como deve ser em qualquer outro relacionamento da empresa e consum-idor antes da tecnologia.

| Walkiria Marchetti

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Tomamos muito cuidado com os diferentes

vocabulários que temos aqui no país, por ex-

emplo. Palavras que tem um significado no Rio Grande do Sul podem ser diferente em outra parte do país. A IA não é só uma máquina que ingere informações e toma decisões sem su-pervisão. Por trás dela existem pessoas que estão cuidando desses pontos. Quem ensina a máquina é o ser humano. Na verdade, muitos, uma equipe multidisciplinar. E essa atividade de ensinar algo à máquina exige métodos e processos. Foi com este cuidado que a BIA foi concebida.

O cliente deve ver a IA como um instrumento para aumento de valor agregado de produtos e serviços, não só na interação com o banco. É claro que ela também vai permear o ganho de eficiência operacional da instituição financeira, por ajudar a reduzir custos e os preços cobrados do cliente. A IA também ajuda nos mecanismos de proteção, de compliance, de combate a fraudes e, sem dúvida, na segurança.

Como os perímetros fugiram das fronteiras das orga-nizações, em função do aumento de uso das platafor-mas, cada vez mais será preciso usar a IA na prevenção e proteção das operações. Então, na nossa estratégia, a IA permeia toda essa cadeia de valor, que vai desde a inter-ação até à proteção, passando por eficiência.

A participação de equipes multidisciplinares - mais do que isso, de competências distintas, diversas - que con-sigam trabalhar de maneira colaborativa, é condição básica para enfrentar as mudanças que temos vivenciado no mercado. Não é mais uma questão do tipo “seria ideal que...”. Quem não estiver operando nesse modelo já perdeu uns 4 anos nessa corrida para atender as necessidades do consumidor.

No Bradesco temos outra vantagem competitiva. Sempre trabalhamos em um modelo de colegiado, por premissa estratégica, desde a fundação do banco. Não é uma prática de agora, em função da transformação digital. As áreas trabalham de forma coordenada, com governança robusta e de forma colaborativa. Mas novas competências surgiram. Competência técnicas e, sobretudo, comportamentais.

Então há de fato um esforço de trazer esses novos conhecimentos e expertises para perto. Em especial, as expertises dos cientistas de dados e dos profissionais de UX, necessários para o que se vai desenvolver dentro da orga-nização.

Colaboração é outra palavra super estratégica nesses novos tempos.

O InovaBra faz parte disso. É uma espécie de LEGO, no qual a somatória das partes faz a entrega.

Entender e respeitar a cultura de cada região ou país também é primordial. Os parâmetros para interpretar uma intenção são diferentes nos Estados Unidos, na Euro-pa e no Brasil.

| Walkiria Marchetti

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E aí não tem muito segredo não. O que a gente faz é nos associarmos com quem domina o know how que precisamos: desde parceiros tecnológicos, até de universidades e de startups especializadas em certos nichos.

É o trabalho coordenado, envolvendo todos esses atores, que faz a entrega no fim do dia.

A inovação sempre esteve no DNA do banco. Mas dentro desse movimento de grande de transformação digital, há 5 ou 6 anos nós entendemos era importante que estruturássemos de forma mais adequada o que começamos a chamar de ecossistema de inovação.

O primeiro movimento que fizemos nesse sentido foi estabelecer um comitê executivo de inovação, para que a gente tivesse um colegiado onde as iniciativas fossem debatidas e o corpo executivo desse o aval. Organiza-mos polos por linhas de negócio, produtos, canais, meios de pagamento, cartões, futuro das agências, banco do futuro e seguros. Depois a gente acabou criando um para backoffice também.

Nesses polos havia sempre um patrocinador da iniciativa, e a participação de pessoas de outras áreas envolvi-das, de pesquisa e inovação (olhando um pouco o que estava acontecendo no mundo do ponto de vista de modelos de negócio e de tecnologias), da área comercial e da equipe de TI (software, infraestrutura e arquite-tura). Uma das iniciativas surgidas nesse movimento foi o Next.

Esse movimento foi muito focado na estruturação de métodos de trabalho, como adoção de design thinking, internamente. Quando já estava funcionando bacaninha, passamos para o passo seguinte que foi promover o trabalho conjunto com as startups.

Aí surge o segundo instrumento do InovaBra. Nesse início ainda com um programa anual de chamada das startups e um método de seleção do de que casava com as necessidades do banco. Dentro de um processo multiestruturado de governança, os polos eram os anjos das startups. Se o pessoal de produtos encontrasse algo interessante, ele passava a ser o anjo daquela startup. No dia do pitch, a stratup tinha 5 minutos para apresentar a sua proposta, o anjo outros 5 minutos para defender e o comitê mais 5 minutos para debater se a proposta ia em frente ou não. Se fosse, passávamos para a fase de experimentação.

Foi muito bacana, porque isso trouxe novo oxigênio. As equipes do banco tiveram contato com um mundo muito amplo, de diversidade de soluções de empresas, que encontraram determinados nichos para certas necessidades que muitas vezes a gente não havia percebido; e as startups recebiam um suporte muito grande sobre o relacionamento com uma empresa de grande porte. Havia questões de escala, segurança, coisas que precisavam ser complementadas nas ideias que elas trouxeram.

As chamadas eram para resolver problemas do banco. A gente ganhava uma solução desenhada em pouco tempo e para as startups também era interessante, porque elas vinham atrás de mercado e não de investi-mento. Para eles, um parceiro como o Bradesco implementando soluções tinha muito mais valor que qualquer investimento inicial. O modelo de corporate venture só surgiu depois, com a área que olha investimentos de private equity permanentemente, inclusive em startups.

| Walkiria Marchetti

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Nós entendemos que isso precisava ser um processo contínuo. E aí vieram três mecanismos importantes:

• O Lab, que é um ambiente de inovação colaborativa com os parceiros tecnológicos, incluindo os grandes fornecedores, onde eles ficam residentes, como em um espaço de coinovação, desenvolvem provas de conceito conosco em um ambiente com infraestrutura segregada e disponível, e aceleram a implemen-tação;

• O Habitat, que busca conectar o mercado, incluindo os nossos clientes corporate [são mais de 70 cor-porações presentes], startups residentes [que já têm faturamento próprio, já receberam algum tipo de investimento e trabalham com tecnologias como algoritmos, IA, Big Data, blockchain, IoT e computação imersiva], fundos de investimento e comunidade acadêmica;

• E o InovaBra hug, uma plataforma digital colaborativa onde as startups podem expor suas ideias, e cas orporações e o próprio Bradesco podem publicar desafios de negócios para que as startups interessadas apresentem soluções.

Em um ano de existência, o Habitat já proporcionou mais de 170 negócios entre corporações e startups, startups com startups e startups com o Bradesco. Gerou também algumas soluções já em uso, algumas para melhorar processos internos do banco, ou das agências, outras desenvolvidas e implementadas pelos clientes.

Hoje, um trabalho em curso é aproximar mais o Habitat de outros polos de inovação, como o Porto Digital e a Acate, para promover a troca de estrutura, de experiências e de atividades. Outro é promover o uso dos hubs internacio-nais, em Nova York e Londres, onde alguns dos membros do Habitat, do Porto Digital e da Acate podem passar algum tempo estudando o mercado, modelos de negócio, aplicações de determinadas tecnologias.

Vemos o InovaBra como um instrumento. Ele é tático. E serve a três pilares estratégicos bem definidos. E a In-teligência Artificial também permeia esses três pilares, assim como blockchain e a melhor UX. O primeiro pilar é a aceleração digital do banco tradicional, para tornar a vida dos nossos clientes mais simples e objetiva, usando principalmente o mobile, que é o canal preferencial hoje e toca toda a pirâmide social. A BIA está dentro desse contexto, de apoiar esse processo de aceleração digital.

O segundo pilar é o banco digital propriamente dito, olhando não só o uso do mobile, mas a mudança do com-portamento do consumidor, de ponta a ponta, que é muito baseado em jornadas. No dia a dia desse consumi-dor. O Next nasce aí, para atender a um consumidor hiperconectado. Ele é baseado no conceito de plataforma, onde estão conectados parceiros que possam contribuir para a melhoria do atendimento da jornada do cliente e, principalmente, ajuda-lo na gestão de seus objetivos.

Ninguém inova sozinho. É um ganha-ganha. O que a gente tem buscado no InovaBra é o match perfeito, dada a necessidade do con-sumidor, com uma empresa que queira em-preender e uma startup com uma excelente ideia.

| Walkiria Marchetti

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Se esse público é consumidor de Uber ele pode chamar o Uber de dentro do Next. A mesma coisa para alimen-tação, para diversão. A ideia é que esse cliente tenha o Next como a sua plataforma de interação para resolver boa parte do que precisa fazer na sua jornada diária. É uma outra proposta de valor. Estamos hoje com 1,2 milhão de contas, em um ritmo de 8 mil contas sendo abertas por dia.

O terceiro pilar estratégico é o Open Banking. E aí estamos falando das era das plataformas mesmo. Estar presente em várias plataformas, podendo ter vários tipos de participação: pro-dutos do Bradesco sendo ofertados em outras plataformas, ou o Bradesco como plataforma oferecendo serviços seus e de terceiros, ou o Bradesco como agregador de uma outra plata-forma com outro produto.

Uma iniciativa que a gente tem nesta linha, que já está lançada, é o Portal MEI, que disponibiliza consultoria, formalização, abertura de contas e soluções financeiras e não financeiras para correntistas e não correntistas do Bradesco, desde que microempreendedores individuais (MEI). Todos os serviços disponibilizados são gratu-itos, mesmo para não clientes.

O microempreendedor individual é um público amplo no país, tem as suas dores não só para tocar o seu negócio, como também para se formalizar, pela dificuldade de obtenção de informação e de conhecimento do processo. Dentro do conceito de plataforma, buscamos criar uma jornada que cobrisse todo o ciclo de vida de um MEI e orquestramos a oferta das soluções necessárias, muitas delas criadas por parceiros. O Sebrae for-nece as informações. O MEI Fácil e o Dicas MEI são parceiros que ajudam na formalização do negócio.

O cliente também pode abrir uma conta dig-ital com um pacote de produtos e serviços formato para ele, e ainda ter acesso a um pequeno ERP para gerir o negócio. E se vend-er alguma coisa, abrir uma loja digital, ou ter acesso a um PDV para o seu ponto de venda. Ele tem acesso ao enxoval completo, que pode ser Bradesco ou não.

Por tudo isso, a gente vê o ecossistema do In-ovaBra como um celeiro. Se a gente não tiver esses braços estendidos... mais que braços, cabeças, a gente não vai conseguir compor e integrar uma oferta de valor na era das Plataformas.

A ruptura é contínua. O processo de inovação deve ser contínuo também. O mundo incumbente dá susten-tação para o outro. Todo novo, primeiro, precisa gerar uma percepção de valor para o consumidor. O consum-idor começa a adotar. Só quando massifica é que a gente pode dizer que a disrupção aconteceu. E aí pode ser que o consumidor abandone o tradicional. Fica no mercado quem conseguir atender bem o cliente.

Essas plataformas abertas vão atender a necessidade de um determinado nicho de ponta a ponta. Vamos ver isso acontecer no mercado, com certeza.

“Então, entender a necessidade de determi-nados públicos e cobrir a cadeia de valor de ponta a ponta será importante não só para o setor financeiro, como para outros segmen-tos de mercado também.”

| Walkiria Marchetti

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em toda inovação é disruptiva. Mas é hora agora de combinar que nem toda disrupção preci-sa ser tecnológica. Se a tecnologia está mudando negócios e transformando empresas, a cultura corporativa, que busca “fosterizar” ambientes inovadores e pessoas que conseguem pensar “por que não?”, precisa ser inclusiva e diversa. Mas quando o assunto é a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, popularmente conhecida como a lei de cotas, as empresas derrapam na curva e perdem grandes chances de agregar novos olhares disruptores em suas equipes.

Em 2004, Carolina Ignarra, formada em Educação Física, e pós-graduada em dinâmicas dos grupos e espe-cialista em neuroaprendizagem, começou a receber propostas de trabalho e ligações de recrutadores que lhe ofereciam emprego como atendente ou secretária em outras companhias. As propostas não faziam sentido, já que Carolina, paraplégica aos 22 anos por causa de um acidente de moto, seguia uma carreira de sucesso como responsável por todo o programa de ginástica laboral de uma grande empresa.

“Foi aí que eu percebi que as propostas vinham de empresas que estavam tentando preencher as cotas exigidas pela lei, que tinha entrado em vigor naquele ano, sem olhar para minhas competências ou formação profissional. Fiquei indignada”, diz Carolina. A indignação deu espaço para a ruptura: “decidi que era preciso mudar essa visão equivocada e comecei a elaborar palestras para atacar o problema”.

As palestras cresceram e Carolina criou em 2008 a Talento Incluir, uma consultoria que ataca todos os lados do problema ao desenvolver projetos de consultoria, treinamento, seleção e retenção com o objetivo de apoiar a inclusão de pessoas com deficiência como profissionais e também como consumidores, em mais de 300 empre-sas, como Gol, Raia Drogasil, Bradesco, Tereos, PwC, GRU Airport, IBM e Mercado Livre, entre outras. Os números da Talento impressionam: mais de 5 mil profissionais empregados e, em 2018, uma base de currículos de 36 mil pessoas com deficiência prontas para trabalhar e desenvolver suas carreiras.

“A lei abriu 425 mil vagas até agora e a meta é chegar a 1 milhão, mas isso nem faz cócegas nos 9 milhões de profissionais com deficiência que o país tem hoje”, diz Carolina, uma das finalistas do Prêmio Veja-se – categoria Diversidade – para cidadãos excepcionais que se destacaram em 2018, como agentes de mudanças na sociedade brasileira. A conversa a seguir é fundamental. Confira.

N

A INCLUSÃOÉ DISRUPTIVACarolina IgnarraSócia fundadora da Talento Incluir

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DISRUPÇÃO É ...“Para mim a disrupção é transformar o olhar das pessoas, o ambiente e a cultura das empresas, para com a diversidade. Uma empresa é disruptiva quando está aberta a diferenças, quando tem cabeças dispostas a ol-har para pessoas com deficiência e ver pessoas capazes. É interessante porque a conversa sobre diversidade e inclusão, que acelerou de uns cinco anos para cá, junto com as discussões sobre inovação, acabou sendo uma espécie de marco, de divisor de “antes” e “depois”, do olhar sobre pessoas com deficiência.

É um movimento que vem alterando a for-ma como as pessoas pensam na diversidade como parte do negócio. Existe uma mudança no jeito de fazer algo, para o bem, mais social, mais humanizado. A partir da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, ativa desde 2004, temos um movimento que abriu o mercado de trabalho e gerou impactos impor-tantes no consumo, no atendimento e até no turismo, que caminham para enxergar o defi-ciente como um cidadão integrado na sociedade.

Meu trabalho é apoiado cada vez mais por estudos e documentos científicos que mostram que a produtivi-dade aumenta quando é acompanhada da inclusão. Visitei recentemente uma empresa, por exemplo, e a rep-resentante do RH me explicava que queria mudar porque todas as pessoas dentro da companhia eram muito iguais e pensavam muito igual e era preciso corrigir isso, trazer novos olhares, novas pessoas para dentro.

A tecnologia tem papel importante, mas eu continuo fazendo o meu trabalho com foco no ser humano. Tudo começou porque eu fui resgatada pelo trabalho. Eu tive sorte de poder voltar para o meu trabalho depois do ac-idente e continuar na minha carreira. Essa continuidade fez toda a diferença na minha vida.

Em 2004, quando eu já estava trabalhando há um tempo após o acidente, comecei a receber ofertas de em-prego e ligações de empresas de recrutamento querendo me contratar para cargos que não tinham nada a ver com minhas competências e formação profissional. Eram cargos de atendente, de secretariado... e aí eu entendi que, por causa da Lei de Cotas em vigor, as pessoas estavam tentando simplesmente preencher cotas.

Minha primeira reação foi de revolta. Eu não me conformava com o fato de que era pre-ciso existir uma lei para teremos chances de trabalho. E com isso veio a ideia de criar pal-estras sobre o tema que acabaram gerando a minha empresa, para corrigir esse erro, para esclarecer e mudar a postura da empresa com relação às cotas.

Quando penso na questão da inovação liga-da à diversidade, dá para perceber que de cinco anos para cá a inovação não está só na tecnologia mas também na postura das em-presas.

Trabalho é um resgate de vida para as pessoas com deficiência.

Eu tenho a audácia de convencer as empre-sas a mudar seu jeito de olhar para as pes-soas com deficiência.

| Carolina Ignarra

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Temos algumas formas de atuar. Nosso objetivo é promover equidade dos seres humanos. Lembrando que equidade é tratar as pessoas diferentes dando-lhes as mesmas oportunidades. Nosso trabalho é convencer a todos que é preciso olhar a equidade. Fazemos palestras, ferramentas, workshops, books informativos, para informar as pessoas de por que existem cotas. Nossa outra frente é funcionar não exatamente como uma agência de empregos, mas uma agência de inclusão. Acompanhamos o funcionário, orientamos o gestor, che-camos o ambiente de trabalho e as práticas.

Outra frente, que vem depois da contratação, é trabalhar a continuidade, ou seja, ver se esse profissional tem oportunidades de crescimento na empresa depois que foi contratado. Oferecemos coach para ajudar as pes-soas a crescerem, tanto o profissional que foi contratado, quanto os grupos na empresa e os gestores.

A quarta frente é ligada à acessibilidade. Isso ultrapassa a questão arquitetônica (ram-pas, espaços de mesa etc.). Porque existem as barreiras não percebidas, como as barreiras comunicacionais, por exemplo – como uma pessoa alfabetizada em libras pode ter acesso às comunicações corporativas se elas não esti-verem na forma acessível?. As pessoas evitam falar sobre pessoas com deficiência porque culturalmente aprenderam a evitar essa con-versa.

E existem as barreiras metodológicas, que são processos corporativos que foram desenvolvidos mas que não atendem à diversidade. Por exemplo, se o trabalho exige marcar uma planilha com cores, se o software não tiver acessibilidade isso não terá o menor sentido para um cego. Essas barreiras são as mais obscuras, porque nem sempre o gestor entende que precisa ser abrangente na metodologia para atender todos os mem-bros da equipe.

O RH tem bastante responsabilidade no programa de inclusão, mas não pode ser o único dono. Quando o RH é muito vaidoso, a gente tem muita dificuldade de chegar a todos os pontos da empresa. Mas quando ele entende que precisa levar a gente para conversar com a alta liderança tudo muda. A gente consegue mostrar para a liderança que não é apenas cumprir a lei, é preciso saber que não basta contratar, tem de incluir a pes-soa na cultura corporativa

Agora, a liderança intermediária, a quem o fun-cionário responde, essa fica dividida entre a cobrança das suas entregas corporativas e as medidas de flexib-ilidade que ele precisa ter para incluir as pessoas com deficiência. Essa gestão está muito focada em cumprir metas e isso impacta na sua resistência. Por isso o pro-grama precisa ser top down. A gestão da companhia precisa dizer ao gerente que vai entender que a meta pode não ser batida naquele período porque é preciso primeiro treinar as pessoas com deficiência.

Quando a gente não fala sobre o assunto, a gente não entende, e se a gente não entende não consegue mudar. Então trabalhamos com os gestores para quebrar essas barrei-ras com conversa.

Quando montamos um grupo integrado na empresa, isso muda. Não é mais uma questão de o RH ‘mandar’, é o grupo todo que entende que é preciso mudar.

| Carolina Ignarra

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O uso de práticas de seleção às cegas e as tecnologias de Inteligência Artificial e Analytics no processo de seleção são um avanço, mas não é por aí que vamos resolver o problema. Lutamos para que não seja preciso ter a blind selection para que a pessoa com deficiência chegue até a fase de contratação. Tem de mudar o olhar. A ruptura está em fazer o gestor entender que a deficiência não impede a pessoa de ser o profissional que ela é. É preciso que o gestor se questione se ele rejeita um candidato porque tinha uma informação incompleta na cabeça. As questões de diversidade precisam ser rotina nas empresas.

A informação, a cultura, são as únicas formas de combater os vieses que aparecem desde sempre na vida das pessoas. Eles são formados pelas informações que recebemos na vida sobre esses temas. A gente costuma diz-er que são rótulos culturalmente formados e é uma maioria da sociedade. Usamos informação para combater isso. Não é uma palestra que vai resolver tudo. Tem de explicar que os comportamentos que excluem qualquer minoria - negros, pessoas com deficiência, gays - são os mesmos, só mudam os rótulos.

O preconceito é um comportamento au-tomático do ser humano, é o pensamento rápido. Você rapidinho forma uma opinião. A questão é o que você vai fazer com ela e aí en-tra o pensamento lento. Será que eu acho que uma pessoa é incapaz porque carrego comigo vieses? Se eu peço para você imaginar um pilo-to de avião, a imagem que vai aparecer é de um homem e eventualmente de uma mulher. Mas poucas pessoas vão pensar na Jessica Cox, uma piloto de avião, licenciada, que nasceu sem as mãos mas pilota com os pés.

Sobre as tecnologias disruptivas que estão surgindo, desde sinais de voz para ajudar cegos a andar, sensores, óculos, exoesqueletos que podem fazer pessoas andarem, é preciso olhar com otimismo, mas não pode perder um elemento importante de vista: a pessoa com deficiência não tem problema por ter deficiência, ela tem prob-lema com o comportamento a sua volta. A grande questão não é eu voltar a andar para ser aceita. A questão é as pessoas não serem paternalistas, não se comportarem de forma diferente.

Conseguimos a abertura das organizações por causa das cotas, mas especialmente agora acelerou, porque com a inovação a busca por diversidade aumentou. Quando era apenas o foco no ser humano era mais difícil, agora é um foco de negócio. Agora conseguimos comprovar com estudos que legitimam o discurso e isso traz espaço e recursos financeiros das empresas.

Temos clientes nos abordando para ajudar no desafio de treinar pessoas para atuar em TI. Temos um projeto com o Mercado Livre que vai treinar 30 pessoas, junto com o Instituto da Oportunidade Social (IOS), que nasceu na Totvs, e que trabalha com treinamento em tecnologia. A IBM é nosso cliente desde 2011 e estamos conver-sando sobre treinamento em tecnologia com eles também. A Talento Incluir entra na parte comportamental, para eliminar os vieses, e o IOS entra com a parte técnica.

Temos hoje 24% da população com deficiência no Brasil. Isso quer dizer 45 milhões de pessoas com deficiên-cia. Esse dado é do IBGE de 2010, que foi atualizado por um segundo estudo do IBGE em 2016. Em 2020 terá um novo estudo e é importante pensar no formato do questionário, em como o representante do Censo vai fazer as perguntas. Será que a pergunta é clara o suficiente para identificar a deficiência? O questionador fez a

Se eu não conheço, vou ficar com aquilo que me contaram. E o que você ouviu das pessoas com deficiência até hoje?

| Carolina Ignarra

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pergunta da forma correta? Em 2000 o núme-ro era de 14% e quando melhoraram o ques-tionário o percentual passou para 24%.

Acontece que empregamos apenas 451 mil pessoas até agora. A lei de fato abriu essas va-gas. Quando chegarmos aos 1 milhão, que é a meta, ainda assim nem faremos cócegas no número total.

As empresas que estão começando a se ajustar à lei acham que é injusto, mas quem já começou descobriu que tem gente com muita competência para contratar. Uma empresa que eu atendi há um ano, por exemplo, tinha 9 funcionários com deficiência e precisava ter 13 para estar na cota. Hoje ela tem 16 pessoas empregadas e está em busca de mais profissionais porque percebeu que é possível achar as pessoas competentes e contratar sem abrir mão do rigor e do perfil procurado. Essas pessoas têm salários maiores, estão crescendo na carreira, sendo reconhecidas.

A questão cultural e social do Brasil transcende a minha condição. Eu sou uma pessoa privilegiada, tive aces-so a coisas que outros não tiveram. Então, o que tem de ficar claro é que a lei é uma medida transitória para igualar o que está desigual O ideal é ela não existir, mas nesse momento ela é importante. A lei de cotas abriu o discurso para a diversidade e aí pessoas que se sentiam diminuídas ou impactada começaram a levantar as bandeiras. A lei de cotas é o que tem de acontecer agora.

Tem uma questão que é importante, a das boas intenções. As pessoas tentam fazer com que nós com deficiên-cia não tenhamos deficiência. Essa diferença não precisa ser igualada ou eliminada, eu preciso que a diferença seja respeitada.

A fiscalização da lei de cotas estima que desse total, tirando pessoas idosas e crianças, ex-istem 9 milhões de brasileiros com capaci-dade laboral com deficiência.

A gente precisa ser respeitada com a dif-erença que a gente tem. A questão da tec-nologia traz melhorias, mas é preciso hu-manizar os relacionamentos para que as diferenças não sejam eternas.

| Carolina Ignarra

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ACREDITE, LOCALIZAÇÃO GARANTE PRIVACIDADEAndré FerrazCEO e founder da In Loco

le tem 28 anos e desde cedo aprendeu com o pai, professor de computação, o quão fácil era hackear sistemas. Também ainda criança, se encantou com o conceito da computação ubíqua. Já na universi-dade, junto com cinco amigos, decidiu trabalhar em uma solução que pudesse resolver o problema de privacidade na Internet, aliando dois conceitos aparentemente conflitantes: conveniência e anonimi-zação.

“Decidimos nunca coletar dados de identificação civil nem cruzar as informações que coletamos com as de bas-es de dados externas”, diz André Ferraz hoje o CEO da empresa, a In Loco, forte candidata a se tornar um unicór-nio brasileiro com presença global. “Começamos com a vontade de criar algo que não existia. Agora, o objetivo é construir uma empresa global”.

Criada em 2011, a empresa passou os dois primeiros anos participando de uma série de competições de start-ups. No primeiro aporte, foi avaliada um pouco abaixo do que André imaginava, mas sete vezes mais do que a proposta inicial do fundo. Valor que levou a Junta Comercial de Recife a questionar o investimento várias vezes, sem aceitar que um grupo de oito universitários pudesse valer tanto. O processo emperrou e o investimento só foi cair na conta no início de 2013.

A partir daí foi arregaçar as mangas. Em 2014, o primeiro produto chegou ao mercado. E a ideia de criar produ-tos sensíveis ao contexto baseados em geolocalização escalou. Hoje a empresa atende diversos segmentos que vão do varejo à indústria de aplicativos O2O (on-line to off-line).

Hoje as soluções da empresa estão presentes em 60 milhões de celulares brasileiros e 600 aplicativos parceiros, com mais de 25 milhões de endereços mapeados no mundo e um bilhão de visitas registradas mensalmente. A meta de curto prazo é chegar a 120 milhões de celulares nos próximos 18 meses, 50 milhões deles nos Estados Unidos.

Em junho deste ano a empresa recebeu uma nova rodada de investimento, Serie B, com aporte de 20 milhões de dólares (cerca de 80 milhões de reais) para acelerar seus planos de expansão internacional, liderado pelos fun-dos Valor Capital Group (CargoX, Gympass, Pipefy e Stone Pagamentos) e Unbox Capital (fundo de Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza).

André é um agente de ruptura que pensa grande, como você verá nessa entrevista exclusiva. Mas dois pontos são inegociáveis na sua jornada: “Maior transparência e respeito do usuário”, diz. Anote aí!

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DISRUPÇÃO É…“Algo que muda o status quo. Que muda o padrão, propondo uma maneira diferente de fazer as coisas. No contexto da In Loco, disrupção é criar protocolos de autorização e personalização para serviços de Internet das Coisas de maneira anônima. Esse sempre foi o norte da empresa, ser uma plataforma de autenticação para a computação ubíqua, usando a geolocalização.

Mas essa visão é de muito longo prazo. E precisávamos gerar negócios para financiar o nosso crescimento. En-tão, começamos atacando mercados que nos ajudassem a desenvolver o produto, passo a passo.

Olhamos primeiro para os mercados que precisavam entender o comportamento do consumidor no mundo físico para criar ex-periências melhores e estratégias de negócio baseadas em dados reais. O mercado de pub-licidade, terceiro na lista de mercados potenci-ais para a solução, foi o primeiro a apostar na nossa proposta.

Se há 10 anos, ainda na universidade, a gente saísse por aí falando que os gigantes digitais como Google e Face-book seriam questionados, e a proteção da privacidade se transformaria em um problema sério, nos chamariam de loucos. Hoje a nossa crença é uma preocupação para empresas de diferentes segmentos de mercado

Este ano demos mais um passo rumo a nossa visão. Piv-otamos de uma plataforma de mídia mobile localizada, para uma plataforma de tecnologia para a economia dos apli-cativos. Oferecemos soluções que vão desde a validação do cadastro de um novo usuário até sistemas antifraude. A área que mais cresce na empresa hoje é um pacote de soluções de tecnologia para clientes que atuam em mobile banking, mobile payments e mobile commerce.

Hoje trabalhamos com smartphones, mas vejo a nossa solução equipamento qualquer dispositivo IoT de uso pes-soal. Ela será um misto de protocolo de segurança com aplicações habilitadas nesses dispositivos. Um protoco-lo baseado no comportamento, e não na identidade. Que

mantenha o usuário anônimo e, ainda assim, agregue inteligência com base no contexto de uso das aplicações.

Nosso produto para publicidade nos ajudou a provar ao mercado, e a nós mesmo, que era possível oferecer per-formance superior ao das plataformas existentes, sem obrigar o usuário a permutar a sua privacidade, a entregar a sua identidade.

Não existia no mercado nada parecido com o que a gente estava propondo, então a avaliação era difícil. Não havia critérios ou base de comparação.

Nosso foco continua sendo a criação de uma plataforma para autenticação dos dispositivos e das aplicações de IoT, em deslocamento, que reconheça os usuários sem identificá-lo. Não vamos nos afastar um centímetro dessa meta de longo prazo.

| André Ferraz

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Com essa onda toda da Transformação Digital, a fome por dados aumentou. Muitas empresas ainda pensam que pre-cisam de todo e qualquer dado. Isso não é necessariamente verdade. Precisamos de alguns dados específicos, que vão fazer a diferença para o negócio. Todo o resto é lixo.

A grande pergunta que as empresas devem se fazer diari-amente é quais são os dados essenciais para o seu negócio. Tudo o que não entrar nesse critério, melhor descartar. Porque cada dado adicional colocado para dentro é mais risco, tanto de compliance quanto reputacional.

Nossa motivação foi encontrar maneiras de descrever uma pessoa, de forma inequívoca e autêntica, para que nenhuma outra pessoa possa se passar por ela, sem precisar saber nenhum dado de identificação civil dela. E explicar isso não é fácil.

Convencer investidores e usuários também não é. Somente em 2019, cinco depois de entrar no mercado e sete anos depois da fundação lá no Porto Digital, é que a empresa recebeu um aporte de milhões de dólares usados no proces-so de expansão nacional e internacional.

Já lançamos um e-book, uma cartilha, criamos a In Loco University... São iniciativas que aju-dam o mercado a entender como operamos. O mau uso da tecnologia de localização por algumas empresas abriu margem para uma interpretação equivocada sobre a tecnologia. Um dos principais aspectos disseminados é o de que dados de localização levam, necessariamente, à invasão da privacidade. Dados de localização são dados sensíveis, sem dúvida. Mas não precisam ser o novo mal do mundo.

Se bem usados, os dados de localização podem ser uma ferramenta importante para trazer benefícios, como evitar fraudes e o bombardeio de anúncios que não interessam... Eles podem ajudar a tornar a vida mais prática, dando acesso a conhecimento e serviços que façam sentido no contexto da nossa jornada diária...

Privacidade é determinante na nossa estratégia de negócio. Ainda assim, a Comissão de Proteção de Dados Pessoais do Ministério Público do Distrito Federal abriu um inquérito civil no ano passado para investigar como coletamos dados pessoais.

Somos detentores da tecnologia de localização mais precisa hoje e isso traz para nós um enorme senso de re-sponsabilidade com relação à proteção de dados. Essa investigação do MP, que não posso comentar em detalhes, porque corre em segredo de justiça, é algo compreensível, porque de fato uma tecnologia tão poderosa como essa, se usada de forma irresponsável, pode trazer muitos danos para a sociedade.

Imagina, por exemplo, se tivéssemos utilizado a tecnologia para mapear pessoas que estiveram em manifes-

A cultura que se criou no Vale do Silício sobre privacidade, de en-tregar conveniência em troca de informações pessoais, é injusta e está com os dias contados. O preço da conveniência não deve ser a privacidade.

Colocamos os assuntos localização e privacidade na agenda do mercado. Criamos eventos para discutir riscos e o que precisa ser feito para assegurar que cada pessoa seja dona dos seus dados.

| André Ferraz

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tações ou comícios, durante o período eleitoral. Possivelmente poderia influir na eleição, e nós não queremos ser responsáveis por isso. Recebemos propostas e recusamos. E vamos recusar sempre.

Pense também se pudéssemos mapear comportamentos e descobrir a orientação sexual, etnia, raça, religião das pessoas e esses dados caíssem nas mãos de grupos extremistas. De fato, se o dado de localização for mal tratado, pode ser danoso.

No primeiro dia após a abertura do inquérito, fomos falar como o promotor. Expliquei exatamente como nós criamos soluções para evitar todos esses exemplos. Expliquei toda nossa infraestrutura de segurança, como é composto nosso time, com mais de 100 pessoas dedicadas em tecnologia... Vamos investir mais de R$ 10 milhões para aperfeiçoar segurança.

Além disso, acredito que a Lei Geral de Proteção de Dados é um marco histórico e im-portante para proteger nossas individualidades e nossos dados.

Há conceitos que tornam o uso da localização muito eficiente, por impactar diretamente os dados coletados, como contexto, acurácia, fre-quência e recência. Mas são termos técnicos que assustam...

Contexto, para nós, é tudo aquilo que dá sentido para a circunstância em que a localização foi coletada. Em vez de só usar as coordenadas do GPS, é possível localizar o dispositivo que a pessoa está usando apenas sa-bendo que ela está na loja X do shopping Y, em uma determinada hora de um dia de sol... Depois, esse mesmo dispositivo estava na academia Z, e na universidade U, restaurante R... Em cada um desses pontos é possível enxergar oportunidades de interagir com os donos dos dispositivos, agregando inteligência para construir perfis de usuário.

Frequência é o intervalo de tempo em que você coleta dados e recência é o quão atual ele é. Se você tem uma tecnologia de localização que coleta dados com alta frequência - várias vezes por dia - o resultado é um mapea-mento da jornada do consumidor muito mais detalhada, relevante. Se os dados só são coletados a cada 60 minu-tos, as movimentações que aconteceram naquele intervalo não foram detectadas, mesmo se muito importantes.

Então, ter uma tecnologia que consiga coletar os dados na frequência certa, nos momentos em que o usuário entra e sai de um determinado local é o que de fato consegue trazer diferencial na construção de uma inteligência sobre o comportamento do usuário.

Para que as pessoas reflitam, posso garantir que dois dados de localização que, quando combinados, prati-camente levam à identificação do dono do smartphone são os endereços de casa e trabalho. Com exceção de algumas categorias de aplicativos como os de delivery que precisam saber o local exato onde a pessoa mora ou trabalha, estes dados não precisam ser coletados com precisão. A informação sobre qual bairro a pessoa mora e trabalha já é suficiente para que o serviço seja prestado e a identidade da pessoa preservada.

A LGPD nos assusta muito menos do que assusta outras empresas, já que a preocupação com a privacidade é parte do nosso modelo de negócio.

| André Ferraz

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Nas nossas soluções coletamos dados anôn-imos não apenas para detectar visitas, mas também para a extrair informações contextu-ais associadas a elas (como o local e a intenção do visitante). Como existem várias restrições nas rotinas de coleta de dados impostas pelos sistemas operacionais e várias preocupações com os recursos do dispositivo (como con-sumo de energia), a melhoria da capacidade de detecção não é uma tarefa fácil e exige o desenvolvimento de algoritmos inteligentes que identificam os melhores momentos para coletar dados relevantes.

É bem difícil encontrar um profissional pronto no mercado, capaz de desenvolver esses algoritmos. O que a gente faz é recrutar nas universidades, através de um teste on-line. Esse teste é primeiro filtro. Depois, os selecionados fazem um teste presencial. Só depois dessa avaliação técnica, mão na massa, os candidatos vão para a uma entrev-ista presencial com os fundadores da InLoco, para avaliar a aderência à cultura da empresa. Nos interessa saber suas motivações e crenças. Hoje é tão difícil encontrar quem tenha o conhecimento quanto as soft skills necessárias. Diria que em uma proporção 50/50.

Queremos ter no radar gente que dê im-portância a conceitos como simplicidade, transparência, que esteja preocupada com questões como a autenticidade do que encon-tramos na internet e a proteção de dados on e off-line.

Se eu pudesse dar um conselho para a galera que ainda não entrou na universidade, mas que já está preocupada com o seu futuro, eu

diria para que estudassem duas coisas: computação e ética. E tem que ser as duas. Não é uma ou outra. As duas, combinadas. Computação, porque o nosso mundo vai ser controlado cada vez mais por algoritmos, e mesmo que eles não tenham interesse em saber programar, vão precisar saber como os algoritmos são construídos. E ética porque não basta ter competência para saber trabalhar a tecnologia, para criar códigos, para ser disruptivo.

É isso que nos rege na In Loco. Nosso modelo de negócio coloca o consumidor no centro. Somos disruptivos porque, na contramão de outras empresas, queremos resolver o problema da privacidade na internet.

Descobrimos que é possível entregar conveniência, fluidez, agilidade e segurança para às pessoas e empresas sem necessi-dade de coletar dados identificáveis ou sensíveis dos cidadãos. Já recebemos propostas de muito dinheiro para campanhas políticas e religiosas, mas eticamente não faz parte dos nossa visão. Desde o princípio queremos ser a plataforma que entrega conveniência e privacidade, sem interferir em processos democráticos e agir de maneira antiética.

Tem muita gente que ainda pensa que privacidade não tem importância. O grande problema hoje não é uma questão de tecnologia, é uma questão de mentalidade, de cultura. Aqui o privacy by design é para valer.

Tem que ter ética. Trabalhamos com seres humanos, somos seres humanos. A tecnologia tem que servir ao ser humano e não o contrário.

Para criar nossas soluções usamos muito criptografia, IoT e muita Inteligência Artificial. O que nos abriga a formar a mão de obra também.

| André Ferraz

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Quando a IoT chegar, a preocupação com privacidade vai escalar. Tudo o que a gente faz hoje vai ser automatiza-do de alguma forma. A gente aqui acredita que precisaremos ter mais controle sobre esses dispositivos, porque a superfície para ataques de segurança vai aumentar de forma exponencial, aumentando também a possibilidade de vazamento de informações pessoais.

Dá para resolver os problemas de privacidade e autenticidade na Internet se mudarmos o padrão de autenti-cação. Hoje, esse padrão sempre exige a nossa identidade civil entre os fatores usados. E nem toda aplicação precisa dessa informação.

A empresa que dominar a nova forma de autenticação para a Internet das Coisas vai capturar uma oportunidade de mercado maior que o Android capturou… E a gente quer estar nessa briga.

| André Ferraz

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ric Santos tem 38 anos e não acredita em mitos. Acredita em trabalho duro, sistemático e em playbooks que têm como único foco criar produtos inovadores que façam sentido para o consumidor.

Como CEO e co-fundador da Resultados Digitais (RD), startup que nasceu em 2011 para ajudar médias e pequenas empresas a crescer com tecnologia de marketing digital, ele passou dois anos em modo

bootstrapping construindo uma startup que tivesse o fit correto de marketing para se tornar uma empresa sus-tentável que atraísse capital de risco para crescer.

“No começo da RD tínhamos duas coisas claras na cabeça: não sabíamos se ia ter capital, portanto teríamos que meter o pé sozinhos; e não queríamos iniciar nenhuma rodada de investimento se não tivéssemos achado um modelo bacana para o negócio, ou seria colocar gasolina em carro desgovernado”.

Só em 2013 veio a primeira rodada de investimentos, e outras se sucederam, até a mais recente de RS$ 200 milhões, o maior investimento já recebido por uma startup de SaaS (Software-as-a-Service) na América Latina. A RD hoje tem mais de 700 funcionários, 13 mil clientes globais e escritórios em São Paulo, Joinville, Bogotá, Cidade do México e San Francisco. E já soma US$ 91 milhões captados junto a investidores que acreditam em sua visão.

Sua carreira de empreendedor começou em 2005, com a Praesto, uma empresa de desenvolvimento de apli-cativos para mobile que nasceu dois anos antes do iPhone e da revolução do ecossistema de apps.

Agora, à frente da RD, uma Scale Up que acelera para ganhar mercado global, Eric encara as dores do crescimento e da inovação contínua com um playbook que se mantém privilegiando o entendimento do consumidor enquanto cria uma cultura corporativa que deve ser observada de muito perto por incumbentes e disruptores. Ele não gosta de mitos, mas é, ele mesmo, um dos ícones do empreendedorismo brasileiro que dá certo. Confira o papo.

E

O PLAYBOOK DA DISRUPÇÃOEric SantosCEO e co-founder da Resultados Digitais

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DISRUPÇÃO É ...“Eu tenho uma visão bem Clayton Christensen do que seria disrupção, que é basicamente resolver uma neces-sidade do consumidor que não estava atendida, de forma plena ou parcial pelo mercado, com com uma oferta que tem uma pegada mais simples, ou uma abordagem diferente para o mesmo problema.

Um caso clássico de ruptura é o iPhone. Ele democratizou o acesso aos apps, que já exist-iam antes dele ser lançado, mas estavam mui-to distantes do usuário comum porque eram muito complexos de instalar e usar. O iPhone criou todo um ecossistema que permitiu colo-car milhares de serviços na mão das pessoas.

O que a gente via, quando começamos a RD, é que o marketing digital era uma ferramenta poderosa para poucas empresas. Tinha todo aquele shift do mar-keting saindo para o online, tinha todos os os benefícios do engajamento, mensuração, construção de ativos digitais, etc..

Mas tudo o que víamos estava disponível para poucas em-presas que estavam usando o conceito na época. As médi-as e pequenas companhias passavam ao largo porque não tinham noção disso. A coisa era - e ainda é - complexa, e aí as grandes terceirizavam a tarefa para empresas especial-izadas em marketing digital que as pequenas não tinham recursos para contratar.

Eu escrevi o (blog) Manual da Startup entre 2009 e 2012. Revendo muitos dos posts, recentemente cheguei à con-

clusão de que continuam válidos até hoje. Eu via em 2009 o movimento forte da lean startup e o tema era muito importante: achar primeiro o tal market fit para um produto.

O framework de lean startup pede que se trabalhe de forma sistemática em cima de uma ideia para encontrar formas de crescer o negócio. Usei muito disso no começo da RD e fomos muito rigorosos na sua aplicação para poder começar do jeito certo.

Eu vejo hoje as startups com duas ou até três fases bem definidas: primeiro a busca pelo product market fit; uma segunda fase, inter-mediária que é encontrar economics que fun-

A ruptura tem menos a ver com o ineditis-mo da coisa e muito mais com o “acertei o ângulo” para atingir pessoas em uma escala muito maior.

Nossa proposta tinha três pontos: ser mais simples de usar e aprender; ser uma plataforma que englobasse todos os recursos em uma só ferra-menta; e ter preço acessível.

O conceito principal é que as empresas de tecnologia não morrem por incapacidade de fazer um produto, mas sim por incapaci-dade de fazer um produto que tenha de-manda suficiente disposta a comprar e usar esse produto.

| Eric Santos| Eric Santos

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cione para viabilizar o produto; e aí a fase ‘pau na máquina’, que é crescer e escalar, a tal fase de Scale Up. Muito das crenças relacionadas ao mind set de sartups continuam válidas.

A partir de 2014 eu mudei nosso playbook para a Scale Up, do crescimento, e aí foi montar máquina para tudo: máquina de venda, de produção, de contratação... etc.. É a fase de levantar capital de verdade e colocar o capital para trabalhar.

Quem está começando deveria ler o Lean Startup e os livros do Steve Blank. Eu gosto do Blitzscalling, mas acho ele é mais ilustrativo e menos didático e mais adequado para Scale Ups. Porque ele mostra que no crescimento vai faltar processo, que vai doer, e indica o que focar em cada estágio (vila, cidade, etc.).

Acho que o ecossistema de empreendedo-rismo no Brasil amadureceu vertiginosamente nesse período. Em dois anos recentes tivemos deals e saídas grandes, que só tinham acontecido lá atrás, em 2007, como a venda do Buscapé, por exemplo. O venture capi-tal cresceu e agora temos uma avalanche.

Com o capital semente (seed money) é a mesma coisa, era raro em 2010 e hoje é disseminado. No ambiente de Floripa [Florianópolis, onde fica a sede da RD], por exem-plo, tem de tudo: investidores, advogado, fundos, men-tores, gente com playbook pronto etc.. É impressionante o que aconteceu. Os mitos de 2010 eram reais pra gente, mas hoje o cenário mudou.

Ficamos dois anos no bootstraping. Eu coloquei dinheiro no começo, fizemos muito trabalho de consultoria que gerava dinheiro para o customer development, todos os founders não tinham salário. Ficamos super, super leans até o final de 2012. Aí captamos um seed de 500 mil reais e em 2013 tivemos a primeira rodada institucional, mas aí já tinha produto rodando e eu já sabia como fazer um

produto funcionar. Aí dava para botar lenha na fogueira.

Talvez seja necessário para amadurecer o ecossistema, ter esses momentos de oba-oba. Lembra quando a Economist publicou a capa do Cristo Redentor decolando? Veio um monte de fundos e muita grana sem sentido, que aca-bou indo embora. Esse movimento volta agora mais forte, maduro.

Uns dois anos atrás chegamos a errar na RD tentando aplicar playbook de Scale Up em iniciativas que na verdade precisavam de playbook de startup.

É importante lembrar que quando você le-vanta a grana institucional o jogo vira, e aí é preciso crescer e garantir a saída do VC.

No começo da RD tínhamos duas coisas claras na cabeça: não sabía-mos se ia ter capital, portanto tería-mos que meter o pé sozinhos; e não queríamos iniciar nenhuma rodada de investimento se não tivéssemos achado um modelo bacana para o negócio, ou seria colocar gasolina em carro desgovernado.

| Eric Santos

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O ecossistema de venture capital de hoje já sabe o que fazer, não coloca dinheiro em pro-jeto sem pé nem cabeça, espera dos founder provas de resiliência. Claro que tem muita agi-tação e ainda tem gente sem noção colocando dinheiro em coisa ruim, mas os momentos de correção estão ajudando a afinar o mercado.

Tivemos muitos erros e muitos acertos, mas nenhum deles de consequência muito grande. Nem grandes sacadas, mas também nenhuma grande caca.

Na categoria dos erros, uma das coisas que demorou para eu virar a chave foi quando mudamos de Market Fit para o modo Scale Up. Não nos preparamos adequadamente para isso, pessoas, modelo financeiro, etc,, ainda estavam no modo scraping. Eu teria tirado um tempo maior para dar arrumada na casa antes de acelerar para crescer.

Um exemplo: a RD tem uma cultura muito forte de promoção interna. As pessoas entram na empresa e vão crescendo e sendo promovidas. Em uma fase eu tinha 200 pessoas e umas 40 em posição de lider-ança. Dessas, 35 nunca tinham sido líderes na vida e não tinham vivência corporativa. Se tivesse parado, teríamos criado aulas de liderança paras as pessoas.

Agora, na medida que a empresa fica mais com-plexa, claro que é mais difícil inovar. Aí começa o

desafio da tal corporação ambidestra - a organização que consegue crescer e ganhar eficiência com um core business mais maduro, que pede uma batida de bumbo de gestão com mais experiência, mas que precisa co-existir com a necessidade contínua de inovar para se manter relevante.

O que temos feito é ter estruturas blindadas, até fisicamente, e um modelo de gestão dessas iniciativas dif-erente do convencional. Adquirimos uma empresa de CRM no ano passado, por conta do produto e da tecno-logia, e agora estamos tentando encaixar na nossa máquina, mas intencionalmente estamos deixando esse grupo pequeno, com 15 pessoas. O líder do grupo é o CEO da empresa antiga e minha relação com ele é de mentor e não de CEO, porque não é hora de cobrar dele as mesmas entregas que se cobra da empresa regular.

A nossa participação internacional é um outro exemplo de como se pode errar ao juntar tudo. Tentamos fazer tudo junto e foi um show de horror. O pessoal que estava montando a oper-ação internacional não sabia ainda direito como fazer e começou a tirar o foco de todo mundo na empresa inteira que tentava fazer acertar.

Tem um certo glamour em torno do em-preendedorismo que, quem vive o dia a dia sabe que não tem nada de glamoroso.

Talento precisa de desafio e desenvolvimen-to. Se ele não estiver se esticando o tempo inteiro ele vai olhar pro lado.

Quando eu ouvia esse debate sobre in-ovação, uns 4 anos atrás, eu tinha essa postura meio arrogante de dizer que isso era tema para dinossauros porque a gente inovava o tempo todo.

| Eric Santos

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Tem algumas coisas que influenciam muito na cultura e no clima corporativo. Quando o negócio cresce 50, 100, 200 por cento ao ano, por tabela você sabe que vai ter um monte de oportunidades e caixinhas novas de crescimento que os talentos internos poderão pegar e fazer acontecer.

Somos muito explícitos quando relacionamos a nossa cultura, nossos valores, com os trade-offs que elas trazem. Sempre que falo de cultura com o time eu falo dos nossos seis valores e sempre lembro que cada valor, para não ser genérico, tem de vir com algo que você está perdendo.

Em todas as áreas da empresa a gente dá tre-inamento, ensina tudo o que for possível para replicar conhecimento. Isso atrai muita gente de fora, que fica fascinada com a empresa e quer entrar Mas o lado ‘ruim’ é que isso tam-bém “entrega o jogo”, o nosso segredo, e mui-tas vezes parece que poderíamos andar mais rápido se não parássemos tanto para para fazer conteúdo interno, mas isso é uma falsa ideia de problema.

Outra coisa é a fidelidade baixa. As pessoas hoje pulam muito de empresa para empresa e nosso modelo para resolver isso é inspirado no livro do Reid Hoffman, o The Alliance, que tem o conceito do tour of duty, um pacto realista de lealdade entre empregados e empregadores.

Nos anos 70, a fidelidade ao trabalho fixo era maior porque as expectativas de estabilidade eram garantidas.. Hoje está todo mundo meio free agent. Para a empresa é ruim, porque não tem perspectiva de segurança so-bre aquele funcionário, mas para a pessoa também é, porque se a empresa percebe que o funcionário não tem compromisso ou expectativa, ela não vai apostar naquela pessoa todas as fichas que poderia.

O que o Reid fala é que é preciso reconhecer a natureza do novo mundo e ter um pacto racional entre ambos, uma missão com início, meio e fim que, se for quebrado antes do prazo pactuado, a parte estaria quebrando um compromisso moral. No final sim, se vc quiser terminar e sair tá tudo certo, no hard feelings.

Temos um nível de turnover que não é tão baixo na RD, mas ele hoje é quase planeja-do. As pessoas estão fechando ciclos e quan-do elas saem é porque encaixe não acontece mais. O principal pra mim é não ser hipócrita e ter uma conversa aberta e estruturada sobre isso, e o tour of duty é um excelente caminho.

Em perspectiva macro, o foco no consumidor está melhorando, mas tem várias empresas que não entenderam. Elas vêm de um tempo em que o consumidor tinha pouca oferta de produtos e serviços, pouquíssima informação e não tinham uma forma de amplificar a frustração dele com a empresa, não tinha

Nosso modelo é: fez alguma coisa certa e que funciona? Pára e ensina todo o time a fazer. Isso é um trade-off do valor. Por isso tenta-mos sempre trazer gente que está associada aos valores.

O legal desse pacto é que as duas partes se esforçam, no final, para mostrar que têm de refazer o pacto e achar alguma coisa que faça sentido para renovar. A tendência é que as pessoas fiquem muito mais.

| Eric Santos

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canais para ecoar o que sentia. Hoje tem mais oferta, acesso à informação, sites que permitem reclamar online e convencer minha rede inteira de que a empresa é bacana ou ruim.

Em cima disso ainda vem uma mudança sistêmica do modelo de negócios. A grande maioria está indo para um modelo de assinatura ou modelo de receita recorrente para o negócio. Eu às vezes falo em palestras sobre o Starbucks, que tem análises super sofisticadas da recorrência para saber se vale abrir uma loja ou não, e lem-bro que o app de pagamentos deles está na frente de todos os meios de pagamento nos EUA.

A empresa vive e morre pelo lifetime value, e o lifetime value hoje é a vida do cliente. E é uma questão de tempo para a morte de quem não leva em conta isso. É preciso mui-tas vezes tomar decisões malucas respalda-das pelos dados que vêm dos clientes ou até um leap of faith baseado em dados internos ou do mercado. E isso se mostra verdadeiro no resultado final.

| Eric Santos

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