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Ano 10 . nº 29 . Julho / Agosto / Setembro / 2015 Boletim Trimestral do Escritório Professor René Dotti Áreas de Atuação: Direito Administrativo, Ambiental, Civil, Constitucional, Criminal, Desportivo, Eleitoral, Família e Sucessões. Novas considerações sobre “compliance” Julio Brotto Audiência de mediação e o novo CPC Rogéria Dotti O regime próprio de previdência social e a EC nº 88/2015 Maria Vitoria Kaled A banalização de ações penais por “erro médico” Alexandre Knopfholz STJ decide que é valida a cláusula de coparticipação em plano de saúde Patrícia Nymberg “Maioridade Penal: A luta contra a criminalidade juvenil (I)” (Prof. René Ariel Dotti) René Ariel Dotti . Rogéria Dotti . Julio Brotto Patrícia Nymberg . Alexandre Knopfholz Fernanda Pederneiras . Francisco Zardo . Vanessa Scheremeta José Roberto Trautwein . Fernando Welter . Gustavo Scandelari Rafael de Melo . Vanessa Cani . Cícero Luvizotto Luis Otávio Sales . Guilherme Alonso . Thais Guimarães Laís Bergstein . André Meerholz . Diana Geara . Emilly Crepaldi Bruno Correia . Ana Cristina Viana . Maria Vitoria Kaled Lorena Fadel . Fernanda Lovato

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Page 1: Boletim Trimestral do Escritório Professor René Dotti · STJ decide que é valida a cláusula de coparticipação em plano de saúde ... No dia 1 de julho ministrou uma aula na

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Ano 10 . nº 29 . Julho / Agosto / Setembro / 2015

Boletim Trimestral do Escritório Professor René DottiÁreas de Atuação: Direito Administrativo, Ambiental, Civil, Constitucional, Criminal, Desportivo, Eleitoral, Família e Sucessões.

Novas considerações

sobre “compliance”

Julio Brotto

Audiência de mediação e o

novo CPC

Rogéria Dotti

O regime próprio de previdência social e

a EC nº 88/2015

Maria Vitoria Kaled

A banalização de ações penais por

“erro médico”

Alexandre Knopfholz

STJ decide que é valida a cláusula de coparticipação

em plano de saúde

Patrícia Nymberg

“Maioridade Penal: A luta contra a

criminalidade juvenil (I)”(Prof. René Ariel Dotti)

René Ariel Dotti . Rogéria Dotti . Julio BrottoPatrícia Nymberg . Alexandre Knopfholz

Fernanda Pederneiras . Francisco Zardo . Vanessa Scheremeta José Roberto Trautwein . Fernando Welter . Gustavo Scandelari

Rafael de Melo . Vanessa Cani . Cícero LuvizottoLuis Otávio Sales . Guilherme Alonso . Thais Guimarães

Laís Bergstein . André Meerholz . Diana Geara . Emilly CrepaldiBruno Correia . Ana Cristina Viana . Maria Vitoria Kaled

Lorena Fadel . Fernanda Lovato

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EDITORIAL

A luta contra a criminalidade juvenil (I) (René Ariel Dotti) ...................................................................................................................................... 03

SEÇÃO INFORMATIVA

.......................................................................................................................................................................................................................................... 04

LEGISLAÇÃO

Mudanças relevantes ................................................................................................................................................................................................ 05

DIREITO DE FAMÍLIA E SUCESSÕES

Pensão alimentícia x salário mínimo (Fernanda Pederneiras) .................................................................................................................................. 06Supressão do sobrenome materno por ocasião do casamento (Thais Guimarães) ....................................................................................... 06Casamento homoafetivo: um direito garantido no Brasil e nos Estados Unidos da América (Diana Geara) ..................................... 07

DIREITO CIVIL

Novas considerações sobre “compliance” (Julio Brotto) ........................................................................................................................................ 07STJ decide que é valida a cláusula de coparticipação em plano de saúde (Patrícia Nymberg) ................................................................... 08Lei de Resíduos Sólidos: o risco de retrocesso (José Roberto Trautwein) ............................................................................................................. 08Extinção do contrato e manutenção de obrigações acessórias (Fernando Welter) ....................................................................................... 08Valores despendidos a título de honorários advocatícios contratuais - ressarcimento indevido (Vanessa Cani) ............................. 09Os direitos individuais do usuário nos planos coletivos de assistência à saúde (Cícero Luvizotto) .......................................................... 09A resolução da ANS (II): os fins não justificam os meios (Laís Bergstein) ........................................................................................................... 09Tiro na porta do shopping: ausência de responsabilidade do estabelecimento (Emilly Crepaldi) .......................................................... 10

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Audiência de mediação e o novo CPC (Rogéria Dotti) ............................................................................................................................................ 10Inaplicabilidade da presunção de periculum in mora nos pedidos de indisponibilidade formulados nas ações civis públicas de mero ressarcimento ao erário (Vanessa Scheremeta) ......................................................................................................................... 11

DIREITO CRIMINAL

A banalização de ações penais por “erro médico” (Alexandre Knopfholz) ........................................................................................................... 11Remição: a redução da pena pela reinserção social gradativa (Gustavo Scandelari) ...................................................................................... 12Dos crimes no novo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Rafael de Melo) ...................................................................................................... 12Imunidade parlamentar e prerrogativa de foro de vereadores (Luis Otávio Sales) ........................................................................................ 13A nulidade da “lei do menor esforço” em decisões judiciais (Guilherme Alonso) ............................................................................................. 13O crime de corrupção entre particulares (Bruno Correia) ..................................................................................................................................... 14TJPR afirma a necessidade de realização de audiência de custódia (Fernanda Lovato) ............................................................................... 14

DIREITO ADMINISTRATIVO

Lei municipal de tombamento (Francisco Zardo) ..................................................................................................................................................... 15A pesquisa de preços de referência para a licitação (André Meerholz) ............................................................................................................... 15Lei de mediação entre particulares e no âmbito da administração pública é publicada (Ana Cristina Viana) ...................................... 16O regime próprio de previdência social e a EC nº 88/2015 (Maria Vitoria Kaled) ............................................................................................. 16

ESPAÇO LIVRE DOS ESTAGIÁRIOS

Consumidor que compra pela internet tem assegurado o direito de se arrepender (Bianca Komar) ................................................... 17A sensação de impunidade e o sistema carcerário ineficaz (Dafne Hruschka e Larissa Ross) ............................................................................. 17O crime de vilipêndio a cadáver e as redes sociais (David Edson da Silva dos Santos) ........................................................................................... 18A autocomposição no novo CPC e nas ações de família (Eduardo Oliveira Siqueira) ......................................................................................... 18Injúria racial ou racismo? (Orlei Bonamin Neto) ........................................................................................................................................................... 19Bloqueio de bens do investigado antes do oferecimento da denúncia. Pode? (Vinícius Cim) ................................................................ 19

ÍNDICE

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A LUTA CONTRA A CRIMINALIDADE JUVENIL (I)

EDITORIAL

O tema da redução da maioridade penal tem sido, ao longo dos anos, uma questão aberta aos especialistas e à população em geral. Crimes gravíssimos como latrocínio, homicídio, roubo à mão armada e outros que produzem a sensação contínua de insegurança são praticados por jovens perigosos de 16 e 17 anos. A Câmara dos Deputados aprovou, em primeira discussão, o Projeto de Lei nº 171, de 1993, com a emenda nº 16, declarando que são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial, ressalvados os maiores de 16 anos, em casos de crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. Para se converter em lei, o projeto necessita de mais uma votação na Casa de origem e duas no Senado Federal, recebendo em cada Casa três quintos dos votos dos respectivos membros.

Não acredito que essa possível mudança possa trazer mais segurança para a população. Melhor seria que a alteração fosse feita no art. 121, § 3º, do Esta-tuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei nº 8.069/1990), que prevê, para o infrator, o internamento de até 3 anos. Esse limite, em minha opinião, deve ser ampliado até 8 anos para os crimes acima referidos e até 4 anos para outros de-litos violentos (tentativa de homicídio, lesão corporal grave e gravíssima, roubo à mão armada, por exemplo). O infrator poderá obter livramento condicional mediante o cumprimento de metade da sanção em face do bom comporta-mento e atos reveladores de harmônica integração social.

Embora reconhecendo os imensos benefícios humanos e sociais do ECA, é impossível ignorar a existência de várias disposições dulcificadas, como se a violência juvenil pudesse ser vista com as lentes de PANGLOSS. Há dois exem-plos claros: as expressões “ato infracional”, em lugar da clareza da palavra “cri-me” e “internado” em substituição a “preso”. São subterfúgios semânticos para tentar reduzir a gravidade objetiva de muitos delitos hediondos. A definição constante do art. 103 do Estatuto (“Considera-se ato infracional a conduta des-crita como crime ou contravenção penal”) é tautológica. É o mesmo que tentar definir o número 6 (seis) dizendo que é meia-dúzia. E a Constituição Federal, justamente na parte sobre os direitos e garantias fundamentais, fala em “prisão”. É evidente que o menor, quando estiver praticando um roubo e for impedido por populares, é “preso”. E não “apreendido”, como a imprensa tem divulgado. A apreensão, na linguagem comum e jurídica refere-se a coisas e não a pessoas.

RENÉ ARIEL DOTTI

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O Professor RENÉ DOTTI ministrou, no dia 10 de abril, a palestra “Manifes-tação Popular nos regimes democráti-cos”, a convite do Centro Acadêmico Ubaldino do Amaral da UNIVERSIDADE POSITIVO.

No dia 22 do mesmo mês, os alunos do UNICURITIBA receberam o Professor para a palestra sobre o livro “Ditadura – A liberdade de não ter medo, Advocacia nos anos de chumbo”.

No dia 13 de maio, o Professor DOT-TI participou de evento no Centro Aca-

dêmico Hugo Simas, da UFPR, e falou sobre o período da ditadura militar.

O seminário sobre “a Lei de Drogas, Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justi-ça”, que aconteceu em 16 de junho, na USP – Universidade de São Paulo, con-tou com a presença do Professor RENÉ DOTTI, com a palestra “Um depoimento sobre a Execução Penal do Brasil”

Em julho, participou do “III Semi-nário Nacional de segurança Pública e Execução Penal”, no auditório da OAB/

PR. Na ocasião, discursou sobre o tema “Lei de Execução Penal e a realidade Bra-sileira”.

Em setembro o Professor confir-mou presença no VIII Congresso da ABRAME (Associação Brasileira dos Ma-gistrados Espíritas), que será realizado em Florianópolis. O tema central do encontro será “a visão materialista e a espírita em torno da vida” e o tema da palestra correlacionado com a doutrina de ALLAN KARDEC.

No dia 15 de maio a Dra. ROGÉRIA DOTTI proferiu palestra no Encontro Anual da Associação dos Advogados de São Paulo, em Santos, com o tema “Motivação das decisões e precedentes jurisprudenciais”.

No mesmo mês, no dia 28, minis-trou palestra na UNIFOZ, em Foz do Iguaçu, e no XIII Congresso de Direito da Faculdade de Ciências Sociais Apli-cadas de Cascavel (UNIVEL). Os temas

abordados foram “Novo Código de Pro-cesso Civil: precedentes judiciais”, e “O novo CPC e o respeito aos precedentes judiciais”, respectivamente.

Em junho, no dia 10, abordou o tema “Tutela de Urgência e Tutela da Evidência” em evento da Procuradoria Geral do Estado do Paraná.

No dia 17 de julho ministrou uma aula na ABDCONST (Academia Brasi-leira de Direito Constitucional), sob o

tema “Sistematização de tutelas provisó-rias no NCPC: tutela cautelar e tutela an-tecipatória de urgência e de evidência”.

Já no dia 20 de julho, proferiu pa-lestra no “Ciclo de Palestras da Associa-ção Nacional dos Advogados da Caixa Econômica Federal – ADVOCEF”, sob o tema “Novo Código de Processo Civil”, tendo como debatedores os Ministros do STJ NÉFI CORDEIRO e ANTONIO CARLOS FERREIRA.

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SEÇÃO INFORMATIVA

Participação em eventos

Ética no Serviço PúblicoEm 28 de abril de 2015, o Advogado FRANCISCO ZARDO pro-

feriu, ao lado do Procurador-Geral de Justiça do Paraná, GILBERTO GIACÓIA, palestra sobre a Lei Anticorrupção e a Ética no Serviço Público, na abertura do V Seminário do Fisco Paranaense. O even-to foi promovido pelo Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita do Estado do Paraná (SINDAFEP) em parceria com a Escola de Ad-ministração Tributária (ESAT).

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LEGISLAÇÃO

* O presente espaço foi criado por sugestão do Advogado João Carlos de Almeida

Mudanças relevantes

» STF APROVA DUAS NOVAS SÚMULAS VINCULANTESForam aprovadas, pelo plenário do STF, em 17/06/2015, duas novas súmulas vinculantes. A primeira proposta (PSV 90) converte a súmula 646 em vinculante, cujo teor é o seguinte: “Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área”.Por sua vez, a PSV 97 transformou em vinculante a súmula 669, a qual dispõe que a “norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade”.Ambas terão aplicação imediata em todas as instâncias e esferas do Poder Judiciário, a partir da publicação no Diário de Justiça Eletrônico.

» MEDIAÇÃO ENTRE PARTICULARES E NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃOLei nº 13.140/2015, de 26/06/2015 (Publicada no DOU de 29/06/2015)Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a solução de confli-tos no âmbito da administração pública. E ainda, altera a Lei nº 9.469/1997, e o Decreto nº 70.235/1972; revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469/1997.

» PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO DO CÔNJUGE – IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIALei nº 13.144/2015, de 06/07/2015 (Publicada no DOU de 07/07/2015)Dispõe sobre o bem de família; inseriu, na Lei nº 8.009/1990, o inciso III, com a seguinte redação: “pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida”.

» HOMÍCIDIO E LESÃO CORPORAL CONTRA AGENTES DE SEGURANÇA PÚBLICA Lei nº 13.142, de 06/07/2015 (Publicada no DOU de 07/07/2015)Altera o Decreto-Lei nº 2.848/40 (Código Penal) para qualificar o crime de homicídio e aumentar a pena do crime de lesão corporal praticados contra integrantes das forças armadas, polícias, sistema prisional e Força Nacional de Segurança Pública – e também cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau – vitimados no exercício da função ou em razão dela. Também altera a Lei nº 8.072/1990 (Lei de Crimes Hedion-dos) para inserir a lesão corporal dolosa de natureza gravíssima e a lesão seguida de morte, quando praticadas contra tais agentes, no rol de crime hediondos.

» LEI DE INCLUSÃO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA)Lei nº 13.146, de 06/07/2015 (Publicada no DOU de 07/07/2015)Institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência, destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.Tem como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratifica-dos pelo Congresso Nacional por meio de Decreto Legislativo em conformidade com o procedimento previsto na Constituição Federal.

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Pensão alimentícia X salário mínimo

Supressão do sobrenome materno por ocasião do casamento

No último dia 05 de junho o SUPRE-MO TRIBUNAL FEDERAL, em julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 842157, reconhecendo a repercussão geral da matéria, reafirmou o entendi-mento de que o salário mínimo pode ser utilizado para a fixação da pensão alimentícia.

O recorrente alegava que a decisão do Tribunal de origem, que fixou ali-mentos a seus filhos com base no salário mínimo, teria violado o artigo 7º, IV, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), o qual veda a vinculação do salário míni-mo para qualquer fim.

O tema gerava controvérsia não só nos Tribunais locais, como também no SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, o qual, em várias oportunidades, manifestou-se com posicionamentos divergentes.

A recente decisão do STF acaba por ajustar o entendimento sobre a maté-ria, pacificando a controvérsia. O relator do recurso, Ministro DIAS TOFFOLI, sa-

lientou que a proibição de vinculação ao salário mínimo constante do art. 7º da CF/88 “visa impossibilitar a utilização desse parâmetro como fator de indexação para as obrigações não dotadas de cará-ter alimentar”. Considerando que a verba alimentar tem como objetivo a manu-tenção e a subsistência daquele que é considerado hipossuficiente, entende a Corte não haver ofensa ao dispositivo constitucional.

Há que se considerar, entretanto, o posicionamento crescente de nossos Tri-

bunais no sentido de afastar o salário mí-nimo como critério de reajuste da pen-são alimentícia, haja vista as distorções provocadas em razão do descompasso entre a correção da renda do alimentan-te e o aumento do salário mínimo.

Neste sentido, a jurisprudência vem entendendo por afastar tal critério de reajuste da verba alimentar, fixando ín-dices de correção que retratem a justa recomposição monetária, de modo a evitar que o encargo se torne excessiva-mente oneroso ao longo do tempo.

FERNANDA PEDERNEIRAS

THAIS GUIMARÃES

DIREITO DE FAMÍLIA E SUCESSÕES

Em recente julgamento, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no Recurso Espe-cial nº 1.433.187/SC, reconheceu a possi-bilidade da noiva suprimir o sobrenome materno no pedido de habilitação de casamento, diante do justo motivo de renegação pela sua mãe e irmã.

O recorrente, Ministério Público de Santa Catarina, sustentou que o orde-namento brasileiro só faz referência ao acréscimo do sobrenome, não da sua exclusão.

A alteração do registro de nascimen-to só é admitida, com a devida aprecia-ção judicial, em caráter excepcional e motivada, desde que não prejudique

terceiros. Isso porque a Lei de Registros Públicos e o art. 1.565, § 1º, do Código Civil regulamentam a possibilidade de acrescer o sobrenome do nubente quan-do da habilitação do casamento, mas não possibilita expressamente a altera-ção do sobrenome registral.

O Ministro Relator RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA destacou que não há impe-dimento para a supressão do sobrenome materno, pois “realiza o princípio da auto-nomia da vontade”, “ademais, o direito da pessoa passar a portar um sobrenome que não lhe remeta às angústias decorrentes do abandono materno e, em especialmen-te, corresponda à sua realidade familiar,

deve se sobrepor ao interesse público de imutabilidade do nome” (...). “No caso dos autos, é justificável e plausível a modifica-ção do patronímico materno na certidão de casamento da nubente”.

Destacou, ainda, que “inexiste no or-denamento jurídico pátrio qualquer regra expressa que proíba a supressão do patro-nímico materno da nubente que poderá adotar, sem prejuízo da sua estirpe mater-na, também o patronímico do futuro mari-do. Assim, na omissão da lei, o juiz decidirá o caso de acordo com analogia, os costu-mes e princípios gerais de direito”.

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Casamento homoafetivo: um direito garantido no Brasil e nos Estados Unidos da América

Repercutiu nas redes sociais, nas úl-timas semanas, a decisão da SUPREMA CORTE dos Estados Unidos que declarou inconstitucionais as leis estaduais que proíbem o matrimônio homoafetivo.

Em razão da decisão, agora, todos os estados norte-americanos devem cele-brar casamentos entre pessoas do mes-mo sexo.

O posicionamento da SUPREMA CORTE é de suma importância, pois os Estados Unidos são uma nação bastante plural e havia diferentes legislações esta-duais sobre o tema.

Veja-se que, naquele país, diferente-mente do que ocorre no Brasil, a compe-

tência para legislar sobre casamento é dos estados.

Em que pese a grande diferença en-tre os sistemas jurídicos brasileiro e nor-te-americano, no Brasil, a possibilidade de celebração de casamentos homoafe-tivos também partiu de uma importante decisão de nossa Corte Constitucional.

Neste sentido, vale lembrar que, em 2011, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL reconheceu a possibilidade de casais ho-mossexuais constituírem família através da união estável.

No mesmo ano, com base no julga-mento do STF e em interpretação do Có-digo Civil e Constituição Federal, o SUPE-

RIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA julgou que o casamento é, igualmente, um direito dos casais homossexuais.

E, em maio de 2013, com fundamen-tos nas referidas decisões, o CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, por resolução, proibiu que as autoridades compe-tentes recusem-se a habilitar, celebrar casamento civil ou converter união es-tável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.

Portanto, no Brasil, os casais homos-sexuais podem, desde o ano de 2011, optar por constituir família através da união estável ou do casamento.

DIANA GEARA

Voltamos ao tema abordado no úl-timo boletim, no qual procuramos de-monstrar que a adoção de mecanismo de compliance parte da efetiva compre-ensão de que a empresa moderna não pode sobreviver senão em absoluto regi-me de respeito às normas (e não de mera intenção de se blindar a empresa quanto à eventuais práticas ilícitas). Esse enten-dimento – e as decisões que dele decor-rem – naturalmente partem da diretoria da empresa: “tone at the top”.

Tomada a decisão, surgem os primei-ros aspectos práticos. O primeiro deles – e talvez o mais importante – seja res-ponder a pergunta: “Onde me encontro hoje e onde pretendo chegar?”. Para bem

responder essa indagação, necessaria-mente deve-se levar observar principal-mente o tamanho da empresa, assim considerado o número de pessoas que atuam em seu nome, direta e indireta-mente, e o seu ramo de atuação.

É natural que uma organização com um grande contingente de colaborado-res deva possuir um programa de com-pliance mais complexo, que contemple as especificidades de diferentes setores e áreas de atuação. Em uma pequena empresa, o programa certamente será muito mais simplificado, podendo mes-mo, a depender das condições, ser insti-tuído e fiscalizado pelo próprio Diretor, sem a necessidade da criação de uma

área especial para esse fim.Tão importante quanto o dimensio-

namento do negócio em relação ao pro-grama que se pretende instituir, é a ob-servação dos níveis de risco aos quais ela está sujeita, para o que, prioritariamente, analisa-se a sua área de atuação.

Uma empresa voltada ao forneci-mento de produtos e serviços à Admi-nistração Pública, e que participe habi-tualmente de licitações, por exemplo, está muito mais sujeita ao risco do que aquela que atua apenas na iniciativa pri-vada. O programa de compliance deve ser sensível a essa realidade, atentando aos riscos concretos de seu segmento a eles se amoldando.

Novas considerações sobre “compliance”

JULIO BROTTO

DIREITO CIVIL

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A Lei nº 12.305/2010 institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, alu-dida legislação contém os instrumentos para permitir o avanço necessário ao País no enfrentamento dos principais proble-mas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos.

Dentre os vários pontos, a Lei de Resídu-os Sólidos estabelece, no art. 54, que “a dis-posição final ambientalmente adequada dos rejeitos, observado o disposto no § 1º do art. 9º, deverá ser implantada em até 4 (quatro) anos após a data da publicação desta Lei”.

Ocorre que a aprovação do Projeto de Lei nº 425/2014 pelo Senado Federal pode representar um sério retrocesso para a Po-lítica Nacional de Resíduos Sólidos.

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS MEM-BROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO MEIO AMBIENTE sustenta que a prorrogação do prazo para que os municípios implantem a disposição final ambientalmente adequa-da dos rejeitos gerados em seu território pode trazer inúmeras preocupações, já que “...eleva para o dobro o prazo origi-nalmente estabelecido na Lei de política nacional de resíduos sólidos e, para os mu-nicípios com menos de 50.000 habitantes, lança para um horizonte de 11 (onze) anos a perspectiva de implantação de aterros de rejeitos antes prevista na lei nº 10.305/2010”.

A extensão do prazo afeta diversos inte-resses, dentre os quais se destacam as coo-perativas de catadores de lixo, as empresas de limpeza pública e os setores da economia obrigados a implantar a logística reversa.

Daí o entendimento da ABRAMPA, no sentido de que se faz necessário o “...diálo-go com o Congresso Nacional para que, an-tes das próximas votações, essa matéria seja debatida e aperfeiçoada no sentido de que seja assegurada a implantação de uma po-lítica nacional de resíduos sólidos socialmen-te justa, economicamente viável, inclusiva, transparente e que proporcione a preserva-ção do meio ambiente ecologicamente equi-librado para presentes e futuras gerações”.

Extinção do contrato e manutenção de obrigações acessórias

Lei de Resíduos Sólidos: o risco de retrocesso

JOSÉ ROBERTO TRAUTWEIN

FERNANDO WELTER

STJ decide que é valida a cláusula de coparticipação em plano de saúde

PATRÍCIA NYMBERG

A jurisprudência do SUPERIOR TRI-BUNAL DE JUSTIÇA é pacífica no sen-tido de reconhecer a abusividade de cláusula contratual que limita tempo-ralmente as internações hospitalares, conforme Súmula 302. Sem contrariar referido enunciado, recentemente o STJ reconheceu que não ocorre abusi-vidade quando a cláusula contratual estabelece a coparticipação do con-sumidor após determinado tempo de internação.

Segundo consta no Recurso Especial nº 1.511.640/DF, relatado pelo Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, desde que atendido o direito de informação, me-diante a redação de forma clara e ex-pressa da cláusula limitativa, bem como mantido o equilíbrio das prestações e contraprestações, não há que se cogi-tar em abusividade. Consta no acórdão que, diante de opções no mercado para a contratação de planos de saúde, com custos igualmente diversos, optou o consumidor por aquela que estava dis-posto a suportar e que, em gozo de sua

autonomia contratual, vinculou-se ao contrato com cláusula clara e expressa, embora de fato limitativa de seus di-reitos. O relator ainda enfatizou que “a opção legislativa pela interpretação mais favorável ao consumidor não correspon-de à conclusão de que todas as cláusulas contratuais devem ser-lhe favoráveis, mas que deverão ser extirpadas apenas aquelas aptas a desequilibrar o sinalag-ma contratual ou a desbordar os limites da razoabilidade”.

Com esse entendimento, foi dado provimento ao recurso da empresa Amil Assistência Médica Internacional S/A, alterando-se acórdão que havia decla-rado a abusividade de cláusula que es-tabelece a coparticipação do segurado nas internações superiores a 30 (trinta) dias. A respeito da Súmula 302, concluiu o relator que os precedentes que lhe de-ram origem decorrem de cláusulas que restringiam, de forma absoluta, a cober-tura de internações que extrapolassem o prazo contratado, situação distinta dos casos de coparticipação.

É equívoco frequente pensar que a extinção de um contrato provoca a eli-minação de todo e qualquer dever para os contratantes, de modo a permitir que passem a atuar livremente, como se nada houvesse existido.

Mesmo após a dissolução de um vín-culo contratual – seja por rescisão, seja por resolução por inadimplemento de uma das partes –, permanecem vivas certas obrigações acessórias oriundas da relação, cuja fiel observância pelos contratantes é fundamental para res-guardar o êxito do próprio rompimento.

Somente sob essa perspectiva é que se explica a validade de cláusulas que imponham às partes, em momento posterior à extinção do contrato, deve-res de confidencialidade e de não con-corrência por determinado período.

Portanto, romper um contrato não significa, necessariamente, obter um salvo conduto para fazer o que bem en-tender. Deverão as partes, então con-tratantes, comportar-se de modo a não causarem danos que resultem de viola-ção à lealdade e boa-fé contratual, sob pena de responsabilização judicial.

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Entrou em vigor em 06/07/2015 a Resolução da Agência Nacional de Saú-de Suplementar – ANS, que visa “esti-mular parto normal na saúde suplemen-tar”. Trata-se da Resolução Normativa nº 368, de 6 de janeiro de 2015.

A Resolução, nos moldes atuais, gera uma relevante preocupação jurí-dica, na medida em que o partograma (documento gráfico onde é registrada a evolução do trabalho de parto) pas-sa a ser considerado parte integrante do processo para pagamento do proce-dimento parto (art. 9º). Com isso, nos casos em que não houver utilização do partograma (leia-se, nas cirurgias cesa-rianas previamente agendadas), deve-rá obrigatoriamente ser apresentado ao plano de saúde “um relatório médico detalhado”.

O fim almejado é a redução do ín-dice de partos cesáreos custeados por planos de saúde, o que, em tese, seria louvável. A preocupação, no entanto, é de que as cesáreas que forem conside-radas “injustificadas” pelos auditores de planos de saúde tenham o pagamen-to ou o reembolso recusado, gerando prejuízos às consumidoras de planos de saúde e demandando a intervenção do Poder Judiciário.

Vale lembrar que é consolidado o entendimento jurisprudencial no sen-tido de que deve prevalecer a autono-mia do médico responsável pelo aten-dimento para optar, de acordo com as suas próprias convicções, pelo procedi-mento que considerar mais adequado à sua paciente.

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A resolução da ANS (II): os fins não justificam os meios

No vigente sistema processual civil não há norma que autorize o ressar-cimento dos honorários advocatícios estabelecidos entre uma das partes litigantes e o advogado por ela cons-tituído. Em sendo assim, embora a existência de decisões no sentido de que aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte relativos aos honorá-rios contratuais, entende-se indevida essa reparação.

A responsabilidade da parte vencida pelos honorários contratuais firmados dentro da autonomia da vontade do cliente e do advogado não é devida, pois inexiste relação jurídica entre a

parte vencida e o advogado da parte contrária. Neste sentido anota THEOTÔ-NIO NEGRÃO em sua obra “Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor”, 44ª edição, pág. 144, Saraiva, São Paulo, 2012: “Os honorários advocatícios contratuais, porque decorrentes de aven-ça estritamente particular, não podem ser ressarcidos pela parte sucumbente, já que esta não participou do ajuste (RDDP 53/146)”.

Logo, não produzindo efeitos o contrato de prestação de serviços ad-vocatícios com relação a terceiros que não participaram do ajuste ou com ele não concordaram, não há amparo para o pedido de ressarcimento.

Valores despendidos a título de honorários advocatícios contratuais - ressarcimento indevido

VANESSA CANI

Os direitos individuais do usuário nos planos coletivos de assistência à saúde

Em que pese o direito de acesso à saúde ser constitucionalmente ga-rantido (CF, art. 196), é bem verdade que todos aqueles que têm condi-ções de arcar com os custos optam pela contratação de um plano de as-sistência médica.

Além da modalidade individual, aquela na qual a pessoa física contrata diretamente o plano de saúde, existem os chamados planos coletivos, os quais são oferecidos por grandes empresas e associações de classe.

Muito se discutia se o usuário do plano de saúde coletivo tinha legitimi-dade para demandar contra a opera-dora do plano, especialmente no que tange a questões relativas ao contrato havido entre ela e a pessoa jurídica que havia firmado o contrato.

Recentemente, a Terceira Turma do STJ decidiu (Recurso Especial nº 1510697), por unanimidade, que o be-neficiário tem direito de discutir judicial-

mente questões relativas ao contrato.No caso em exame, a discussão

versava sobre os índices de correção utilizados pelo plano de saúde a fim de majorar a mensalidade. Segundo o relator, Ministro VILLAS BÔAS CUEVA, “as relações existentes entre as diferentes figuras do plano de saúde coletivo são si-milares às havidas entre as personagens do seguro de vida em grupo”.

Por essa razão, o Magistrado enten-deu que, por ser o beneficiário o des-tinatário final dos serviços, “o exercício do direito de ação não pode ser tolhido, sobretudo se ele busca eliminar eventual vício contratual ou promover o equilíbrio econômico do contrato”.

Assim, o importante precedente devolve ao consumidor final dos ser-viços prestados o direito de ação, per-mitindo que ele se insurja em face de vícios que venham a prejudicá-lo na relação contratual travada entre a ope-radora e o contratante originário.

CÍCERO LUVIZOTTO

LAÍS BERGSTEIN

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O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que entrará em vigor em 18 de março de 2016, trará importan-te alteração no que diz respeito à resolu-ção alternativa de conflitos, ou seja, à for-ma de solucionar os litígios sem ter que se aguardar por uma decisão judicial.

Segundo a nova lei, todos os proces-sos doravante terão seu início com uma audiência destinada à busca de uma conciliação ou mediação entre as partes (art. 334). Isso significa que o réu, ao in-vés de apresentar contestação e aguar-dar vários meses, terá a oportunidade de, desde logo, participar dessa audiên-cia, voltada justamente à busca de um consenso. Destaque-se que o prazo de defesa só começará a fluir após a reali-zação desse ato e, ainda assim, caso não seja possível o acordo.

Embora a audiência de conciliação já exista no sistema atual, esta só ocorre durante o processo, quando autor e réu já firmaram suas convicções e apresen-

taram manifestações por escrito. Com a mudança do Código, a proposta é outra: antes mesmo de ter que se defender, o réu é chamado para as tratativas do acor-do. E o que é melhor, as partes terão a oportunidade de contar com a atuação de um profissional capacitado para auxi-liá-las a encontrar uma solução amigável. Trata-se, assim, da mediação que busca justamente solucionar o litígio mediante técnicas de argumentação e negociação.

Por outro lado, caso ambas as partes entendam que a audiência será inexi-tosa, poderão requerer que o processo prossiga, independentemente deste ato. O que chama a atenção é que, para isso, faz-se necessário que tanto o autor quanto o réu manifestem, por escrito, o desinteresse na audiência (art. 334, § 4º, I). Ou seja, basta que um queira para que a audiência se realize. É o legislador apostando na solução amigável.

Trata-se de uma verdadeira mudança de paradigma. Doravante, juízes e advo-

gados deverão estar preparados para buscar os acordos. Isso porque a Justiça não comporta mais o enorme volume de processos que, dia a dia, aportam às cortes. Aliás, o atraso na prestação juris-dicional deixa todos com uma crescente sensação de injustiça. Assim, tudo o que puder ser feito para mudar a realidade será bem-vindo. Que venha a nova lei e as mudanças que ela propõe.

Audiência de mediação e o novo CPC

Em recente decisão (publicada em 01/07/2015), o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA entendeu que um shopping center não terá que indenizar a família de um consumidor que estava na porta do estabelecimento e foi atingido por um tiro disparado de fora.

No caso concreto, o disparo foi efe-tuado por um menor que, em verdade, pretendia atingir outrem.

Pois bem. Embora a aparente res-ponsabilidade do shopping, diante da relação de consumo existente entre as partes, estava-se diante de um fato de terceiro, ou seja, um fortuito externo

que não poderia ser previsto ou evitado pelo shopping, afastando, assim, qual-quer responsabilidade sua pelo pedido indenizatório. Foi justamente por isso que o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA deu provimento aos Recursos do shop-ping e da seguradora para afastar a con-denação então imposta pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Como bem ressaltou o Ministro Rela-tor MOURA RIBEIRO, a morte da vítima é uma “Triste fatalidade, sem dúvida. Mas o shopping em nada contribuiu para o even-to que provocou a morte da vítima. Logo, não há que se lhe imputar responsabilida-

de, por ausência de nexo de causalidade, já que o fato só pode ser debitado a um fortuito externo. Em casos análogos esta Corte firmou o entendimento no sentido de que o fato de terceiro afasta a causali-dade e, em conseguinte, a responsabilida-de do fornecedor de serviços. Na hipótese, o fato de terceiro, que efetua disparos de arma de fogo, em direção às dependências do shopping, atingindo o frequentador que estava na sua porta é circunstância apta a romper o nexo de causalidade, en-tre os alegados danos e a conduta do sho-pping”. (Recurso Especial nº 1.440.756/RJ).

Tiro na porta do shopping: ausência de responsabilidade do estabelecimento

ROGÉRIA DOTTI

EMILLY CREPALDI

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

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Inaplicabilidade da presunção de periculum in mora nos pedidos de indisponibilidade formulados nas ações civis públicas de mero ressarcimento ao erário

VANESSA SCHEREMETA

A banalização de ações penais por “erro médico”

São cada vez mais comuns ações penais nas quais médicos são acusados da prática de crimes de lesões corporais e homicídios em razão de supostos erros em sua atuação profissional. A imputa-ção, quase sempre, é a título de culpa (quando há negligência, imprudência ou imperícia); existindo, porém, casos em que a acusação ocorre na forma de dolo eventual (assunção do risco de pro-duzir o resultado). A experiência mostra que as acusações mais frequentes são contra anestesiologistas, cirurgiões e médicos que trabalham nas unidades de Pronto Atendimento e Emergência (“plantonistas”).

Os médicos têm a missão de tratar doenças, diminuir sofrimentos e salvar vidas. Conforme consagrado no Jura-

mento de HIPÓCRATES, “A saúde dos meus pacientes será a minha primeira preocupação (...) Manterei o mais alto respeito pela vida humana, desde sua concepção”. Quando tal juramento é de-sobedecido através de culpa ou dolo, é justa a responsabilização penal. Contu-do, o que se nota é a banalização das ações penais contra tais profissionais, através de uma perigosa lógica: se hou-ve morte ou lesão corporal, a culpa é do médico. Quiçá pelo desespero e so-frimento da vítima ou seus familiares, o culpado pelo resultado indesejado é sempre o médico. Trata-se de grave equívoco, pois, para a responsabiliza-ção penal, é necessário, no mínimo, o nexo de causalidade entre a conduta profissional e o resultado lesivo.

Demonstrando extrema sensibilida-de e caminhando contra a corrente da banalização de responsabilidades, o TRI-BUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, ao ab-solver médico pela suposta prática de le-sões corporais contra paciente, decidiu: “(...) a atividade médica é de meio e não de resultado, não sendo possível exigir do médico a garantia de sucesso dos proce-dimentos por ele realizados e que, muitas vezes, a partir de um acontecimento rela-tivamente simples (...) chega-se a um des-fecho trágico. Assim, aos profissionais da saúde compete o atendimento correto e indicado para a situação, pois a incerteza do resultado final é limitação decorrente da própria natureza de sua atuação”. (Ape-lação nº 1.253.138-1).

ALEXANDRE KNOPFHOLZ

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no julgamento do Recurso Especial Re-petitivo nº 1.366.721/BA, firmou a com-preensão de que o periculum in mora é presumido nas medidas cautelares de indisponibilidade de bens, requeridas no bojo de ações de improbidade ad-ministrativa, com base no artigo 7º da Lei nº 8.429/1992. Assim, bastaria para o seu deferimento a demonstração da existência de fortes indícios de respon-sabilidade pela prática de ato ímprobo que cause prejuízo ao erário. Todavia, em decisão proferida no Recurso Especial

nº 1.203.495/MT, o Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO ressaltou que tal en-tendimento não se aplica às ações civis públicas ajuizadas unicamente para fins de ressarcimento de danos ao erário, ainda que cumuladas com pedido de in-disponibilidade de bens. Ou seja: inexis-tindo pedido de condenação por ato de improbidade, não se pode utilizar a regra do art. 7º da Lei nº 8.429/92 e muito me-nos a presunção de periculum in mora extraída de sua exegese. Como bem res-saltado na decisão, além de no caso con-creto não ter havido o enquadramento

das condutas dos réus nos arts. 9º a 11 da Lei de Improbidade, “verifica-se que na presente ação o Parquet Federal buscou, apenas, o ressarcimento do dano (art. 37, §5º da CF/88), através do rito comum da Lei 7.437/85 (Ação Civil Pública), pelo que não pode alegar existir violação ao art. 7º da Lei de Improbidade Administrativa”. E, diante disso, aplicou-se a Súmula 7 do STJ, pois “... a revisão dos critérios para a decretação ou revogação da indisponibi-lidade de bens, (...) exige o revolvimento fático-jurídico dos autos, vedado em sede de Recurso Especial”.

DIREITO CRIMINAL

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No último dia 07 de julho foi publi-cada lei n° 13.146/2015, que, apesar de entrar em vigor 180 dias após sua pu-blicação, já merece atenção, pois sua vigência será de grande importância para a sociedade, recebendo inclusive a denominação de Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Dentre os 127 artigos da lei, encon-tram-se dispositivos que estabelecem sanções para crimes cometidos contra direitos de pessoas portadoras de defi-ciências.

O legislador criminalizou condutas cotidianamente verificadas, dentre as quais é possível destacar a incitação ou prática de discriminação contra por-tadores de deficiência, apropriação de seus bens ou rendimentos e, por fim, o abandono de pessoas com esta condi-ção especial.

Este último crime, que, aos nossos olhos, merece maior consideração por tratar-se do abandono de pessoas com essa condição especial em casas de saú-de ou de abrigamento, ou ainda, quan-do aquele que por lei esteja obrigado, deixa de prover as necessidades básicas da pessoa com deficiência, prática mui-to comum nos dias de hoje. Para referi-da conduta, o legislador estabeleceu a aplicação de uma pena que pode variar de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, além da multa.

Um aspecto relevante estabelecido na nova lei é a previsão do aumento de pena quando os tipos penais são pratica-dos por pessoa cujos cuidados da vítima são de sua responsabilidade.

Não obstante o acerto do legislador quanto a relevância social da lei, causa surpresa a ausência de um aspecto que

apresenta papel importante na repreen-são pretendida. Diferentemente da Lei Maria da Penha, por exemplo, este novo estatuto deixou de prever a vedação da aplicação de institutos processuais pre-vistos na Lei nº 9.099/1995, permitindo--se assim a aplicação de benefícios pro-cessuais estabelecidos aos crimes de menor potencial ofensivo.

Dos crimes no novo Estatuto da Pessoa com Deficiência

Remição: a redução da pena pela reinserção social gradativa

Não se reduz a pena de prisão, no Brasil, somente pelo seu cumprimento efetivo. A partir do momento em que se admite que uma das finalidades da repressão dos crimes é a ressocialização, deve-se privilegiar qualquer medida que seja compatível com ela, ainda que durante a execução da reprimenda – e desde que não comprometa a natureza de punição que a privação da liberdade deve ter.

A Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), em seu art. 126, prevê duas modalidades de remição: pelo trabalho e pelo estudo. O condenado tem direito a descontar 1 dia de pena a cada 3 dias de trabalho; 1 dia de pena a cada 12 ho-

ras de frequência escolar (ensino funda-mental, médio, superior e inclusive curso profissionalizante; todos presenciais ou à distância), desde que distribuídas em 3 dias. Ambos os tipos de remição podem ser realizados simultaneamente. A inser-ção, no ordenamento, da possibilidade de remição pela frequência escolar foi uma recente inovação trazida pela Lei nº 12.433/2011, seguindo tendência juris-prudencial (Súmula 341, STJ).

É indicativa de nova possibilidade de alteração legislativa a decisão profe-rida pelo STJ em 09/06/2015, nos autos do Habeas Corpus nº 312486, em que o Ministro SEBASTIÃO REIS JUNIOR conce-deu a um condenado o direito a ter sua

pena reduzida por uma nova espécie de remição: a leitura. Ainda sem previsão legal, essa nova ferramenta de efetiva-ção da reinserção social já era prevista pela Portaria nº 276, de 20/06/2012, do DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional). O preso tem um mínimo de 21 e um máximo de 30 dias para a lei-tura da obra e, após fazer uma resenha e ser ela aceita pela equipe responsá-vel e validada pelo Juiz, poderá obter 4 dias de redução da pena por obra lida. Trata-se de mais um incremento às possibilidades reais de recuperação do condenado, que estimula a superação definitiva do prejudicial método do iso-lamento celular puro e simples.

GUSTAVO SCANDELARI

RAFAEL DE MELO

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O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL re-afirmou recentemente (Recurso Extraor-dinário nº 600.063/SP, DJ 15/05/2015) o entendimento segundo o qual socorre também a vereadores a prerrogativa constitucional de imunidade parlamen-tar do art. 29, VIII, da CF, que lhes garante inviolabilidade quanto a opiniões, pala-vras e votos proferidos no exercício do mandato.

Trata-se de condição para o exercício livre do mandato por integrantes das Câmaras Municipais, exprimindo a inde-pendência plena do Poder Legislativo. Assim, não se sujeitam a responsabili-dade penal ou civil os mandatários que pratiquem atos qualificáveis como deli-

tos contra a honra (calúnia, difamação e injúria) no exercício das funções parla-mentares (representação, fiscalização e legislação). A cláusula constitucional de inviolabilidade – ressaltou a Corte Supre-ma – garante ao congressista proteção ampla, integral e ininterrupta, sempre que a atuação relacionar-se com o man-dato, estendendo-se, inclusive, às entre-vistas jornalísticas, à transmissão para a imprensa do conteúdo de pronuncia-mentos e às declarações feitas em meios de comunicação social.

A questão referente ao foro por prerrogativa de função (ou seja, o Juízo competente para julgar crimes cometi-dos por vereadores) possui tratamento

distinto. A Constituição Federal não pre-vê foro especial para vereadores (CF, art. 29, X), como o fez para os deputados e senadores (CF, art. 53, §1º). Essa omissão permite que as Constituições Estaduais disponham a respeito. Contudo, even-tual foro especial para vereador previsto em Constituição Estadual não tem efeito perante as regras de competência fixa-das na Constituição Federal. Assim, por exemplo, um vereador acusado de ho-micídio doloso deverá ser julgado pelo Tribunal do Júri (CF, art. 5º, XXXVIII, d), ainda que a Constituição de seu Estado preveja a competência do Tribunal de Justiça (cfe. a recente Súmula vinculante 45/STF).

Imunidade parlamentar e prerrogativa de foro de vereadores

LUIS OTÁVIO SALES

Os advogados estão acostumados com a seguinte situação, aqui caracteri-zada como a lei do menor esforço judicial: após a prolação de sentença e a interpo-sição de recurso para reanálise do méri-to processual, o julgamento de 2º grau “empresta” todos os fundamentos da primeira decisão para confirmá-la, sem qualquer complementação.

Embora muito comum, especialmen-te no processo penal, essa prática não parece se amoldar à garantia do duplo grau de jurisdição e à indispensabilidade de que, por segurança jurídica, o objeto de discussão decidido pelo Juiz singu-lar seja materialmente reanalisado por outros Magistrados. Afinal, as funções do duplo grau são justamente a de pro-porcionar a dialética e a de lançar olha-res distintos sobre a causa (já que o Juiz

condutor da instrução processual é, mui-tas vezes, vítima de uma indesejada par-cialidade decorrente do conhecimento pessoal da parte e das provas).

É verdade que, há vários anos, a ju-risprudência dos Tribunais Superiores se movimenta para repelir a simples repeti-ção das decisões recorridas como funda-mento único do acórdão. Mas a prática não parece ter fim. Tanto é que, há pou-cos meses, o Ministro NÉFI CORDEIRO do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTI-ÇA proferiu o voto condutor do acórdão do Habeas Corpus nº 214.049, estabelecen-do que: a) o acórdão que adota a senten-ça ou o parecer do Ministério Públi-co como razões

de decidir exclusivas é nulo, por falta de fundamentação; b) é possível a ratificação dos termos da decisão ou parecer anterio-res, “desde que o julgado faça referência concreta às peças que pretende encam-par, transcrevendo delas partes que julgar interessantes para legitimar o raciocínio lógico que embasa a conclusão a que se quer chegar”.

GUILHERME ALONSO

A nulidade da “lei do menor esforço” em decisões judiciais

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TJPR afirma a necessidade de realização de audiência de custódia

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Nos últimos anos, o Brasil se tornou palco de grandes escândalos envolven-do a corrupção, especialmente com a repercussão dos casos do Mensalão e da Operação Lava Jato. A necessidade de desestimular e punir com mais ri-gor este tipo de conduta tem sido ob-jeto da atividade legislativa, a exemplo da criação da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/13), que prevê punições contra pessoas jurídicas e incentiva a criação de procedimentos internos nas empre-sas voltados à integridade de seus fun-cionários, assim como das diversas pro-postas para aumentar a pena do crime de corrupção e torná-lo hediondo.

Recentemente, alguns dirigentes e executivos ligados à FIFA foram presos na Suíça acusados de prática de corrup-ção entre particulares, que é punível em diversos países (como França, Alema-nha, Itália e Inglaterra), mas não é crime no Brasil.

Isso deverá mudar se for aprovado o Projeto de Lei nº 236/2012, que cuida do novo Código Penal e punirá com pena de prisão de um a quatro anos aquele que “exigir, solicitar, aceitar ou receber vantagem indevida, como representante de empresa ou instituição privada, para favorecer a si ou a terceiros, direta ou indiretamente, ou aceitar promessa de

vantagem indevida, a fim de realizar ou omitir ato inerente às suas atribuições” (art. 167).

Nesse contexto, em que as normas de punição ao empresário e às insti-tuições vêm sendo ampliadas, os pro-gramas de Compliance – que visam assegurar o cumprimento da lei e dos procedimentos de conduta internos a prevenir a prática de infrações ou faci-litar a apuração das responsabilidades por elas – são cada vez mais utilizados no ambiente corporativo, especialmen-te por empresas de grande porte e que respondem pelas condutas de um alto número de funcionários.

O crime de corrupção entre particulares

BRUNO CORREIA

Em julgamento de Habeas Corpus que versava sobre uma prisão em fla-grante convertida em prisão preventi-va, a 5ª Câmara Criminal do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, em decisão unânime, reconheceu a necessidade de realização de Audiência de Custódia. A fundamentação do Habeas Corpus nº 1.358.323-2 foi no sentido de que a não realização da referida Audiência era con-trária ao Pacto de San José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário.

A Audiência de Custódia encontra previsão normativa em vários Tratados Internacionais de Direitos Humanos e tem por objetivo garantir a rápida apre-

sentação de indivíduos presos a um juiz nos casos de prisões em flagrante. Du-rante a Audiência, da qual participam também a Defensoria Pública ou o advo-gado do acusado e o Ministério Público, é feita uma primeira avaliação sobre o cabimento e a necessidade de manu-tenção da prisão. Assim, realiza-se de imediato o controle de legalidade e de adequação da prisão efetuada, além de uma avaliação das condições em que se encontra o sujeito conduzido.

Em seu voto, o Desembargador JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO frisou: “e uma das principais vantagens da imple-mentação da audiência de custódia no

Brasil, importa na missão de reduzir o en-carceramento em massa no país (...) em que pese a Constituição brasileira silencie sobre a obrigatoriedade deste controle, o juiz, que se destaca neste contexto, como representante do Poder Judiciário, tem a obrigação de não só conhecer a proteção internacional, mas aplica-la mediante controle de convencionalidade difuso, não podendo se furtar de realiza-lo”.

O projeto Audiência de Custódia, proposto em 6 de fevereiro deste ano, vem, aos poucos, ganhando força e sen-do implementado por diversos Tribunais do país.

FERNANDA LOVATO

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A pesquisa de preços de referência para a licitação

ANDRÉ MEERHOLZ

O início do processo licitatório é pre-cedido por uma série de procedimentos que permitem à Administração e aos po-tenciais interessados delimitarem ade-quadamente as condições da futura con-tratação. Um dos elementos de maior relevância se encontra na formação dos preços de referência, pelos quais a Admi-nistração licitante limita o valor máximo que se propõe a pagar por determinado bem ou serviço.

Embora seja uma etapa relevante na fase interna, a Lei nº 8.666/1993 não defi-ne como se deve proceder a pesquisa de preços para que se afira o referencial ade-

quado de preços. Neste sentido, torna-se relevante a recente decisão do Tribunal de Contas, estabelecendo diretrizes a serem observadas neste procedimento: “9.3.2. para fim de orçamentação nas licitações de bens e serviços, devem ser priorizados os parâmetros previstos nos incisos I e III do art. 2º da IN SLTI/MPOG 5/14, quais sejam, ‘Portal de Compras Go-vernamentais’ e ‘contratações similares de outros entes públicos’, em detrimento dos parâmetros contidos nos incisos II e IV daquele mesmo art. 2º, isto é, ‘pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados ou de domínio

amplo’ e ‘pesquisa com os fornecedores’, cuja adoção deve ser vista como prática subsidiária, suplementar.” (TCU, Plenário. Acórdão nº 1445/2015, Relator Ministro VITAL DO RÊGO. J. 10/06/2015).

A decisão repercute não apenas aos órgãos promotores de licitações. Ela inte-ressa diretamente aos licitantes, pois te-rão à sua disposição um novo parâmetro objetivo de controle dos referenciais de preço que orientam a licitação, podendo solicitar esclarecimentos ou até mesmo contestá-lo via impugnação ao edital caso se identifiquem vícios em sua formação.

DIREITO ADMINISTRATIVO

Lei municipal de tombamentoFRANCISCO ZARDO

Está em trâmite na Câmara Muni-cipal de Curitiba o projeto de lei que dispõe sobre a proteção do patrimônio cultural, em especial sobre o processo de tombamento. Embora a Constitui-ção Federal disponha que é atribuição do Poder Público, com a colaboração da comunidade, promover a proteção do patrimônio cultural brasileiro (art. 216, §1º), o projeto em comento contém elementos de constitucionalidade, no mínimo, duvidosa.

O primeiro é a própria competência do Município para legislar sobre o assun-to, uma vez que o art. 24, VII, da Cons-tituição confere tal atribuição somente à União, Estados e Distrito Federal. Aos Municípios compete promover a prote-ção do patrimônio histórico-cultural lo-cal, “observada a legislação e a ação fis-calizadora federal e estadual” (art. 30, IX).

Observa-se, ainda, possível ofensa ao

direito de propriedade, pois, contrariando o art. 216, §1º, da Constituição, o art. 4º do projeto não contempla a desapropriação como um dos instrumentos de proteção do patrimônio cultural. Por certo, haverá situações em que a restrição será tão rigo-rosa que inviabilizará o uso da proprieda-de, impondo-se a desaproriação median-te justa e prévia indenização.

Por fim, o projeto padece de mani-festa inconstitucionali-dade ao prever, no art. 92, a convalidação de todos os procedimen-tos administrativos de constituição de bem protegido realizados antes da vigência da lei. Além de contrariar o princípio da irretroa-tividade das leis, a con-validação atenta contra

a garantia do devido processo legal e do contraditório, visto que em muitos casos a restrição foi determinada sem a mais elementar das cautelas que é ouvir o proprietário.

Espera-se que o controle parlamen-tar seja bem exercido, depurando o projeto de eventuais ofensas ao texto constitucional.

Palácio Garibaldi . Foto: Macaxeira.

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O regime próprio de previdência social e a EC nº 88/2015

Lei de mediação entre particulares e no âmbito da administração pública é publicada

MARIA VITORIA KALED

ANA CRISTINA VIANA

Por meio da recente Emenda Consti-tucional nº 88, de 07/05/2015, foi altera-do o art. 40, da Constituição Federal, que dispõe sobre o Regime Próprio de Previ-dência Social dos servidores titulares de cargos efetivos União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclu-ídas suas autarquias e fundações.

Na redação anterior, a aposentado-ria compulsória ocorria aos 70 (setenta) anos de idade, com proventos propor-cionais ao tempo de contribuição. Com a Emenda, os servidores públicos também poderão se aposentar compulsoriamen-te “aos 75 (setenta e cinco) anos de idade, na forma de lei complementar”.

A EC nº 88/2015 também alterou

o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescentando o art. 100, segundo o qual até que entre em vigor a lei complementar de que trata o inciso II, §1º, do art. 40, da CF/1988, os Ministros do STF, dos Tribunais Superiores e do Tri-bunal de Contas da União “aposentar-se--ão, compulsoriamente, aos 75 (setenta e cinco) anos de idade, nas condições do art. 52 da Constituição Federal”.

A inserção do art. 100 ao ADCT, con-tudo, restringe significativamente o rol de servidores públicos com condições de se aposentar compulsoriamente aos 75 (setenta e cinco) anos de idade. Dian-te disso, tal restrição pode sofrer algu-mas críticas, especialmente em face do

princípio da isonomia, bem como diante do art. 3º, IV, da CF/1988, que prevê, en-tre os objetivos da República Brasileira, a promoção do bem de todos, sem discri-minação.

A par disso, é evidente que a eficácia imediata da elevação da aposentadoria compulsória, a partir de 08/05/2015, apenas aos Ministros do STF, dos Tribu-nais Superiores e do TCU, possui caráter nitidamente transitório, podendo ser estendido aos demais servidores públi-cos com a edição de lei complementar referida no inciso II, §1º, do art. 40, da EC nº 88/2015.

A busca pela celeridade processual no âmbito da Justiça Brasileira hoje, é, indiscutivelmente, uma premissa de pri-meira ordem. Exemplo disso é a edição do Novo Código de Processo Civil, que visa não só simplificar, como sobretudo tornar mais céleres os processos que tra-mitam no Poder judiciário. Trata-se, ou-trossim, de uma necessária adequação ao ordenamento jurídico atual, alberga-do em uma concepção constitucional.

A Administração Pública também ca-minha nesse sentido, sendo que aquela concepção de outrora, de um governo autoritário, vem a cada dia sendo aban-

donada por uma percepção mais paritá-ria, que trata o cidadão como um sujeito de direito. Por isso, instrumentos que visam diminuir a crassa distinção entre a Administração Pública e a sociedade já são uma realidade e vêm sendo paulati-namente implementados.

E é nessa esteira que se insere a Lei de Mediação n.º 13.140, recém-publica-da em 26 de junho de 2015. Trata-se de norma que disciplina a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e também de conflitos no âmbito da Administração Pública.

De acordo com o art. 1º, a mediação

se constitui como um “meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública”. Já o art. 2º estabelece os princípios que orientam a mediação entre eles, a isonomia entre as partes (inciso II), a informalidade (inciso IV) e a busca do consenso (VII).

É, como agudamente observa o CNJ, uma tentativa de decompor a “cultura da litigiosidade” (www.cnj.jus.br) e gerar a procura de soluções de conflitos de for-ma consensual.

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ESPAÇO LIVRE DOS ESTAGIÁRIOS

CONSUMIDOR QUE COMPRA PELA INTERNET TEM ASSEGURADO O DIREITO DE SE ARREPENDER

A SENSAÇÃO DE IMPUNIDADE E O SISTEMA CARCERÁRIO INEFICAZ

A compra de produtos pela internet tem crescido constantemente no Brasil. Algumas pesquisas apontam um cresci-mento de 20% em relação ao ano passa-do, no número de compras online (da-dos E-bt Consumo Virtual no Brasil). Isso porque a facilidade de não enfrentar filas e comprar no conforto da sua casa po-dendo encontrar preços de até 50% mais baratos na tela do computador são algu-mas das vantagens na compra online.

Porém, quem nunca se arrependeu de uma compra por impulso?

Em recente julgamento, o STJ enten-deu que o consumidor, que compra pela internet ou telefone, tem o direito de de-sistir da compra e receber seu dinheiro de volta. Trata-se do direito de arrepen-dimento, garantido pelo artigo 49 do Có-

digo de Defesa do Consumidor. De acordo com o Instituto Brasileiro

de Defesa do Consumidor (IDEC), essa situação é muito frequente entre os consumidores e vale recapitular que nas compras realizadas no estabelecimento comercial, mesmo que a entrega do pro-duto seja acordada para outra data ou para entrega a domicílio, tal direito não é atribuído ao consumidor. Nestes casos, vale a regra do ar-tigo 18 do CDC, que de-termina que a devolução do dinheiro seja realizada quando houver um defei-to no produto e quando este não for sanado no prazo de 30 dias.

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA vem consolidando jurisprudência no sen-tido de que não pode haver limitações ao exercício do direito de arrependimen-to. Em alguns julgados, as Turmas do STJ afirmaram serem de responsabilidade do fornecedor do produto os custos com des-pesas de entrega e devolução do produto.

A mídia tem noticiado uma onda de linchamentos contra suspeitos de come-ter infrações penais. Um dos casos em-blemáticos foi o da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, que foi espancada e mor-ta no Guarujá, em São Paulo, em maio de 2014, após a divulgação de um boato no Facebook. O mais recente ocorreu no dia 6 de julho deste ano, em São Luís do Maranhão: CLEDENILSON PEREIRA DA SILVA, suspeito de tentar assaltar um bar, foi amarrado a um poste e agredido até a morte.

Não foram os primeiros casos, tam-pouco serão os últimos. A questão a se refletir é que se costuma dizer que a jus-tificativa para a violência da população

contra os supostos infratores é a sen-sação geral de impunidade. No entan-to, vale lembrar que o Brasil possui a 4ª maior população carcerária do mundo, com mais de 600 mil presos. Caso sejam também considerados os que estão em prisão domiciliar, o Brasil salta para a 3ª posição, com mais de 710 mil pessoas privadas de liberdade.

Parece difícil pensar que há impu-nidade quando se observam tais esta-tísticas. O aumento da quantidade de condutas consideradas criminosas, bem como o do tempo das penas aos crimes já existentes não tem contribuído para diminuir a violência. Uma grande popu-lação carcerária não é sinônimo de um

sistema eficiente. O que há, de fato, é um crescimento no número de crimes e um grande índice de reincidência de quem já passou pelo sistema penitenciário (70%). Nota-se, portanto, que o encarce-ramento não cumpre sua função preven-tiva e repressiva.

Diante de tudo isso, o cidadão que enfrenta o “inimigo” diz estar fazendo justiça com as próprias mãos diante da inércia do Estado, mas não percebe que ele mesmo está sucumbindo à violência. Cabe ao Estado fazer justiça e é dele que deveria ser cobrada a diminuição da vio-lência social, dos índices de reincidência e, finalmente, da população carcerária.

BIANCA KOMAR | Acadêmica do 2º ano da PUC -PR

DAFNE HRUSCHKA e LARISSA ROSS | Acadêmicas do 3º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

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O CRIME DE VILIPÊNDIO A CADÁVER E AS REDES SOCIAIS

A AUTOCOMPOSIÇÃO NO NOVO CPC E NAS AÇÕES DE FAMÍLIA

Vilipendiar cadáver consiste na von-tade de humilhar ou desonrar a memória do morto. A conduta pode ser praticada através de gestos ou palavras, estas na forma escrita ou verbal. Historicamente este tipo penal tem sido ligado a situa-ções específicas, como necrofilia, rituais esotéricos e crimes que resultam em morte, com posterior ato de vilipendio por parte do autor.

Acontece que este cenário tem mu-dado. Com o advento e propagação das redes sociais (Facebook, What-sApp, Snapchat, etc) somos sur-preendidos com fotos e vídeos de pessoas mortas em locais públicos, residências, hospitais e até mesmo em seus ataúdes e sepulcros. Os que produzem ou compartilham estas imagens buscam ser aceitos e terem o status de estar onde os

amigos não estavam, ver o que eles não viram. Além de ultrajante, tal postura é in-fame, antiética e irresponsável.

Ainda que imensamente reprová-vel, filmar ou compartilhar fotos e ví-deos de pessoas mortas nas situações acima citadas não configuram o crime previsto no art. 212 do Código Penal, pois este crime exige interpretação restrita. Apesar da descrição do crime utilizar uma palavra não muito comum

(vilipêndio), este verbo não abrange o compartilhamento e produção de ima-gens do gênero, a conduta criminosa restringe-se a prática do verbo do tipo penal, ou seja, vilipendiar.

Não obstante, tal fato não isenta o sujeito de sanções administrativas nos casos de funcionário público que divulga imagens, demissão por justa causa quando se trata de funcionário de empresa privada e a propositura,

por parte da família, de ação cí-vel por danos morais.

Por fim, em 07/07/2015 o De-putado Federal CÉSAR HALUM (PRB/TO) apresentou um projeto de lei (PL nº 2237/2015) que torna crime a reprodução de fotos ou ví-deos de pessoas mortas.

Voltaremos ao assunto nos próximos boletins.

Após longas discussões e debates, entra em vigor em março de 2016 o Novo Código de Processo Civil. Dentre as inúmeras inovações por ele trazidas, destaca-se o anseio por uma mudança de paradigma, qual seja, a busca pela autocomposição, que necessariamente será implementada a partir de uma nova mentalidade na aplicação do código.

Acompanhando essa mudança trazi-da pelo Novo Código, outros dois gran-des diplomas legais, igualmente altera-dos, buscam na conciliação, mediação ou arbitragem a solução dos conflitos. São eles, a Lei nº 13.140/2015, que tra-ta da mediação entre particulares e da

autocomposição de conflitos no âmbi-to da Administração Pública, e a Lei nº 13.129/2015, que altera a Lei de Arbi-tragem, ampliando seu alcance. Ambas, assim como o novo código, visam à cele-ridade e a praticidade na resolução dos conflitos. Entretanto, a fim de que essas alterações tenham efetividade, é neces-sário que a aplicação destas seja estimu-lada por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Públi-co, que devem primar pela conciliação e outros métodos de solução consensual de conflitos.

Nesse sentido, também nas ações de família, serão envidados esforços para a

solução consensual da controvérsia, po-dendo o juiz dispor do auxílio de profis-sionais de outras áreas do conhecimento para a mediação e conciliação. Além dis-so, as audiências de mediação e concilia-ção poderão dividir-se em tantas sessões quantas forem necessárias, a fim de que seja viabilizada uma solução consensual.

Por fim, destaca-se que o Novo CPC apresenta normas específicas quanto aos mediadores e conciliadores, e sua atuação, sempre em busca de uma so-lução mais célere e prática dos conflitos, asseverando, portanto, se tratar de nor-ma fundamental do processo, a promo-ção da autocomposição.

DAVID EDSON DA SILVA DOS SANTOS | Acadêmico do 3º ano da PUC-PR

EDUARDO OLIVEIRA SIQUEIRA | Acadêmico do 4º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

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BLOQUEIO DE BENS DO INVESTIGADO ANTES DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. PODE?

VINÍCIUS CIM | Acadêmico do 5º ano da PUC/PR

Cotidianamente, a imprensa tem no-ticiado o bloqueio de valores em contas bancárias e de bens móveis e imóveis de investigados na assim denominada Operação Lava Jato. Da mesma forma ocorreu no caso criminal envolvendo o empresário EIKE BATISTA, no qual diver-sos carros luxuosos foram apreendidos por determinação judicial – embora, nesse caso, ele já respondesse a ações penais em razão de crimes contra o mer-cado de capitais.

Os dois exemplos evidenciam a constrição de bens de acusados antes da sentença penal condenatória e até mes-mo antes do oferecimento da denúncia,

como no primeiro caso. Mas, diante da inexistência de uma acusação formal contra o investigado, a constrição pode ser realizada? A resposta é: pode.

O Código de Processo Penal, em seu art. 125 e seguintes, dispõe sobre as cha-madas “medidas assecuratórias”, auto-rizando o sequestro ou arresto de bens para assegurar a recuperação de valores provenientes da infração penal, garan-tindo, assim, o futuro ressarcimento do ofendido, bem como o pagamento de eventual multa pecuniária e custas pro-cessuais decorrentes do processo, bas-tando existir, para tanto, razoáveis indí-cios de autoria e materialidade delitiva.

Muito comum em processos envol-vendo “crimes do colarinho branco”, a constrição, que pode ser realizada antes mesmo que o investigado tome ciên-cia da existência de um procedimento investigativo contra si, perdurará até o fim do processo, podendo haver a alie-nação antecipada do bem apreendido para evitar sua depreciação, conforme o art. 4º-A, da Lei de Lavagem de Dinheiro (9.613/1998), com o valor corresponden-te sendo depositado em conta judicial. Havendo a superveniência da absolvi-ção, a constrição é levantada, sendo de-volvida a integralidade do valor corrigi-do ao proprietário original.

INJÚRIA RACIAL OU RACISMO?ORLEI BONAMIN NETO | Acadêmico do 4º ano da Faculdade de Direito de Curitiba

Ao argumento de estarem abrigadas pelo direito constitucional da liberdade de expressão, as pessoas passaram a opi-nar sobre os mais diversos temas. Contu-do, verifica-se que em inúmeros casos, tais declarações ultrapassam “os limites”, e acabam por ferir direito alheio. Desta-cam-se, por exemplo, as declarações di-rigidas recentemente à apresentadora de televisão, MARIA JÚLIA COUTINHO.

Muitos saíram em sua defesa, con-

denando os autores das declarações de racismo. Entretanto, como diferenciar aqueles que fizeram declarações racis-tas, dos que cometeram o crime de in-júria racial?

O crime de injúria racial, previsto no art. 140, § 3º do Código Penal, corres-ponde à conduta de ofender a honra de outrem, utilizando-se de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, ori-gem ou a condição de pessoa idosa ou

portadora de deficiência. Trata-se de cri-me de ação penal pública condicionada, ou seja, o Ministério Público depende da representação da vítima para oferecer denúncia.

Por sua vez, o crime de racismo, re-gulamentado pela Lei nº 7.716/1989, corresponde, em termos gerais, a com-portamentos discriminatórios ou pre-conceituosos, em razão de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. É crime imprescritível e inafiançável, e trata-se de crime de ação penal pública incondicionada, ou seja, o Ministério Pú-blico pode denunciar, sem a necessida-de de permissão da vítima.

Assim, em síntese, a principal dife-rença consiste no fato de que a injúria é dirigida a uma pessoa, individualizada. Já o racismo, seria uma conduta precon-ceituosa dirigida a um grupo. Apesar da última ser mais grave que a primeira, ambas são completamente reprováveis.

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Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. Artigo 3° Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 4° Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos. Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Artigo 6° Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica. Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo 8° Toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra os actos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei. Artigo 9° Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo 10° Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida. Artigo 11° 1. Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. 2. Ninguém será condenado por acções ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam acto delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o acto delituoso foi cometido. Artigo 12° Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei. Artigo 13° 1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado. 2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país. Artigo 14° 1. Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países. 2. Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por actividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 15° 1. Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo 16° 1. A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais. 2. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos. 3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à protecção desta e do Estado. Artigo 17° 1. Toda a pessoa, individual ou colectivamente, tem direito à propriedade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade. Artigo 18° Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos. Artigo 19° Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão. Artigo 20° 1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas. 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. Artigo 21° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direcção dos negócios, públicos do seu país, quer directamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2. Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país. 3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto. Artigo 22° Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos económicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país. Artigo 23° 1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à protecção contra o desemprego. 2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de protecção social. 4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses. Artigo 24° Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas. Artigo 25° 1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bemestar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. 2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma protecção social. Artigo 26° 1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das actividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. 3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escholher o género de educação a dar aos filhos. Artigo 27° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2. Todos têm direito à protecção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria. Artigo 28° Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efectivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração. Artigo 29° 1. O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade. 2. No exercício destes direitos e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática. 3. Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 30° Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma actividade ou de praticar algum acto destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.

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Julho / Agosto / Setembro / 2015Ano 10 | Número 29

Tiragem: 2.000 exemplares Foto da capa: Guilherme Alonso

Impressão e acabamento: Corgraf

Boletim Trimestral do Escritório Professor René Dotti

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Jornalista Responsável: Taís Mainardes DRT-PR 6380

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De acordo com o art. 5º, alínea “b”, do Provimento nº 94/2000 da OAB – Conselho Federal.

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