blow up imagens e miragens

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    Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 12(2): 15-35, novembro de 2000. HOMENAGEMJos Carlos

    Bruni

    quase uma tradio, tratando-se de cinema, que as primeiras

    imagens que nos so mostradas em um filme sejam as deuma srie de letreiros onde o nome dos atores, do diretor e doprodutor sejam-nos dados a conhecer. Em alguns filmes, entretanto,

    o diretor aproveita este espao para tambm introduzir-nos a alguma outracoisa, que no raras vezes passa despercebida do pblico.

    A abertura deBlow Up1, neste sentido, especial. Vemos, logoem seus primeiros momentos, vrios letreiros que se sucedem sobre umfundo amarelo, embalados pela msica de Herbie Hancock. Suas letras sovazadas, ao contrrio do que era esperado, e, atravs delas, podemosvislumbrar pedaos de uma imagem que ali se esconde, caprichosamente,

    dando-se apenas em pequenos pedaos aos olhos, mas apenas queles quese esforam decididamente em compreend-la. Para deixar claro o seuartifcio, e para detonar a curiosidade do espectador, quando surge o nomedo filme,Blow Up, as letras aumentam de tamanho, na proporo em que

    Blow Up

    imagens e miragensPAULO MENEZES

    Para o Bruni, meu amigo, com quem

    aprendi a perceber e a enfrentar os

    complexos dilemas do pensamento

    RESUMO: Este artigo analisa o filme Blow Up de Michelangelo Antonioni, buscandocompreender como o seu discurso visual questiona a relao entre real e imaginrio. Portrs de um crime do qual nada sabemos e nada saberemos, a busca efetuada pelofotgrafo levanta e problematiza as relaes entre as imagens e as coisas, sejam elasfotografias ou filmes, propondo significados para seus fundamentos e perspectivas quemuito os afastam das interpretaes que as colocam como reprodues ou representaesde um real pressuposto como ntegro e preexistente.

    PALAVRAS-CHAVE:Blow up,Antonioni,imagem,real,fotografia.

    Este texto tem por ba-

    se o primeiro captulode tese de douto-ramento orientada por

    Bruni.

    Paulo Menezes foi o-

    rientando de JosCarlos Bruni e con-tinua seu trabalho naeditoria de Tempo So-

    cial

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    avanam em nossa direo, at abrirem-se em toda a dimenso da tela,mostrando, pela nica vez, a imagem completa que estava escondida ali portrs e que, ao mesmo tempo que se faz mostrar, desaparece imediatamentesob o fundo das letras seguintes que dominam novamente a tela. Sabendo

    que algo l existe, passamos a tentar enxergar detidamente as imagens quenos so negadas a perceber. Para deixar isto ainda mais instigante, a nicaimagem que pudemos vislumbrar, ainda que por fraes de segundo, era ade uma moa que tirava as peas de sua roupa, em cima de um telhado.Pudemos acompanhar apenas sees de seus movimentos, que nospermitiram imaginar o que ela fazia, ao mesmo tempo que esta imagemparecia querer escapar, o tempo todo, por entre nossos dedos, em umestranho movimento que, ao parecer mostrar, acaba efetivamente por negar.Perfeita metfora, veremos que a proposta que engendrava no era de formaalguma inocente.

    As primeiras imagens que nos so realmente dadas a ver nosjogam novamente em um mundo de incongruncias. Montados sobre umjeep Land Rover, uma imensa trupe de mmicos agita-se vigorosamente,mos e pernas saltando pelo ar, acompanhados pelos gritos efusivos queemitem sem parar. Isto contrasta, de maneira cortante, com o fato de, emgeral, a mmica ser um dos lugares primordiais do seu oposto, o silncio. Olocal pelo qual passam no menos peculiar. Nada vemos ali, nenhum tipode movimento, nenhuma pessoa a no ser ojeep, que anda pelo meio dosprdios, todos vazios e sem qualquer sinal de vida. Perfeito cenrio para umgrupo a um s tempo mudo e barulhento, que s ir adquirir o seu maisprofundo significado quando, circularmente, reaparecer na cena final dofilme.

    O surgimento de nosso personagem principal, um fotgrafo demoda, ser tambm bastante inesperado. Ele aparece no meio de um grupoimenso de pessoas, com roupas velhas e desalinhadas, que sai de um estranholocal, parecido com uma grande fbrica somente muito depois, no momentoem que ele mostra as fotos que l havia tirado ao editor do livro que prepara,saberemos que se trata de um albergue de mendigos e de pessoas que notm outro lugar para dormir, os despossudos mas tambm sditos do grande

    reino, mesmo que j no to grande.Detalhes da sua relao com o mundo que o cerca j nos soapresentados desde a primeira cena. De dentro do carro, por meio de umradiotransmissor, ele comea a dar ordens a vrias pessoas. Quando chegaao ateli, distribui uma srie de servios aos seus auxiliares, de uma maneirafria e automtica. No instante em que Thomas entra no estdio, vemos amodelo que j o esperava h algum tempo. Mas no a vemos diretamente.Vemos apenas seu reflexo por meio de um espelho que parece estar ali

    jogado ao acaso. Ela aparece para ns como aparecer para ele: como puraimagem, a ser investigada e conquistada. A moa, no momento em que o v,

    ensaia uma reclamao por estar esperando h uma hora e ter umavio para pegar e no poder.... Cant what?, corta-a Thomasabruptamente, sem lhe dar a menor ateno. Sem muita ao, coloca-se emfrente a um fundo infinito escuro, que contrasta com a sua pele muito clara.

    1 Aqui , no Brasi l , acriatividade em mudarnomes de f i lmes realmente espantosa.Este filme de Anto-nioni recebeu entrens o nome absurdode Depois Daquele

    Beijo. Nas fitas devdeo, para no perdera referncia de um p-blico no especializa-do, juntou-se os dois.

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    Seu vestido preto, entremeado de reflexos brancos brilhantes queacompanham seus movimentos, com suas duas laterais abertas, apenaslevemente trespassadas por alguns fios que ligam sua frente s costas, eque, ao mesmo tempo, deixam vista toda a lateral nua de seu corpo, fino e

    comprido, insinuando-se atravs deles. A relao que se trava em seguida muito significativa. Thomas, aps tirar as primeiras fotos, bebe um copo devinho e troca a mquina 6x6 que utilizava por uma 35, com lente 50mm, alente que mais aproxima o que se v atravs dela com o campo de visonormal que os olhos contemplam2. Ela vai permitir uma maior aproximaoentre eles alm de mostrar-se a lente perfeita para o que veremos a seguir.

    A modelo deita-se pelo cho, exibindo-se e insinuando-sepreguiosamente em suas contores sonolentas. Thomas vai abaixando-sesobre o seu corpo, at ajoelhar-se sobre ela e encaixar-se sobre seu ventre,em um momento de extrema volpia visual. Ele a beija ligeiramente nopescoo, visando descontra-la ainda mais, e, a partir de ento, vemos osvrios movimentos cadenciados que os seus corpos circunscrevem no espao,finalizados em um instante de mxima excitao quando Thomas comea agritar de maneira resoluta e inconfundvel: Yes, Yes, Yes, terminando suasesso de fotos por meio de um clmax absolutamente visual e inquestionvel.Este orgasmo tambm desdobra-se visualmente na modelo, que continua alideitada pelo cho, passando suavemente a mo sobre seus seios, at jogaros braos para trs e ficar ali descansando, extasiada ela tambm com o atoque acabaram de finalizar. Thomas, por sua vez, ao terminar, retira a mquinafotogrfica do pescoo, levanta-se, e vai jogar-se sobre um sof, colocandodisplicentemente o p sobre a mesa de centro, de vidro. Acabou de nosmostrar, sem mediaes, a possibilidade de transformar em atividade fsicavisual direta a capacidade depenetrao que o aparato fotogrfico portaem si mesmo3.

    Ele trata as outras modelos com a mesma distncia e arrogncia.Organiza as suas posies, reclama com o chiclete que uma delas masca,grita bruscamente com outra que no conseguia sorrir. Por fim, ordena atodas que fechem seus olhos e relaxem, enquanto ele, simplesmente, vaiembora, fazer outra coisa.

    Seus relacionamentos so todos assim, permeados por um filtroque, ao mesmo tempo que permite uma espcie de ligao, mantminexoravelmente presente uma intransponvel distncia.

    Os nicos momentos em que o vemos aparentemente mais ligadoafetivamente a algum, demonstrando uma atitude mais carinhosa ereveladora, so aqueles em que est em companhia da mulher que moracom um pintor, em uma casa ao lado do ateli. Em um primeiro momento,aps conversar de maneira distrada com Bill sobre as suas pinturas, senta-se em uma poltrona enquanto ela, aps pegar uma garrafa de cerveja paralhe oferecer, passa a mo em seus cabelos comeando a massagear-lhe a

    cabea. Seu olhar est cabisbaixo e triste, mostrando-nos que, afinal, alireside alguma sensibilidade, mesmo que escondida. No momento em queele se levanta e sai, deixa-a sozinha, com o olhar perdido ao longe.

    O segundo momento ocorre quando, aps o roubo das fotos em

    2Que de aproxima-

    damente 60 (cf.Langford, 1974, p.87).

    3 Cartier Bresson diziaque o fotgrafo, coma mquina na mo,sempre age como seperpetrasse um crime,o que no deixa deser uma forma de vio-lao. A palavra foto-grafar, em ingls, no

    deixa dvidas toshoot significa atirar,matar, aplicar injeo,mas tambm fotografare filmar.

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    seu estdio, Thomas retorna novamente at o seu vizinho. Ao entrar sembater, caminha pelo corredor at olhar pela porta de um quarto. Seus olhosencontram-se com os dela, dessa mulher nunca nomeada, olhando-o comuma expresso de extremo incmodo, enquanto vemos Bill movimentar-se

    sobre seu corpo sem nada perceber. Momentos aps, ela vai encontr-lo noestdio. Thomas pergunta-lhe se nunca pensou em deix-lo, recebendo aresposta negativa. Entretanto, um pouco depois, ela vai lhe pedir que a ajude.Quando ele pergunta no qu poderia ajud-la, ela volta a falar sobre o crime,desconversando. Em todos os momentos em que se encontram, nuncaconseguem falar sobre eles, sobre suas vidas, sobre o que sentem, sobre obvio.

    O momento mais emblemtico da relao de Thomas com ascoisas e com o mundo que o cerca aquele dos encontros que vai ter comduas mocinhas4que vo at o estdio, na esperana e na vontade de serem

    fotografadas por ele. Seu primeiro encontro extremamente significativo:pedem-lhe dois minutos para conversar enquanto ele, sentado na cadeira desua secretria, diz-lhes, com uma expresso impassvel que denota ao mesmotempo um certo menosprezo, que no tem dois minutos nem mesmo paratirar o apndice fora. Seu ar sempre esse, de senhor do mundo, a um stempo superior, prepotente e arrogante.

    Em seu segundo encontro com elas, quando est no meio darevelao das fotos do parque, sua postura em nada se altera. Thomas ouveum barulho na porta da frente. Desce para abri-la mas, percebendo ummovimento diferente l fora, apenas vira de costas, levanta a ponta do p,aguarda alguns segundos para ento, suavemente, escorregar a mo sobrea maaneta deixando que a porta se abra de repente, e de uma s vez. Umadas garotas que ali se apoiava tropea, caindo de costas para dentro doateli, com o olhar assustado. Sua amiga, que entra em seguida, pergunta-lhe o bvio: Voc no estava nos esperando, estava?. As duas tm umar engraado e displicente. Seus cabelos tm o mesmo corte, liso, cado,com aquela franjinha anos 60 que escondia praticamente toda a testa.Seus vestidos so dois tubinhos muito justos, ambos tendo o azul como corpredominante. Uma delas veste meias amarelo-claro, combinando com a

    cor da barra do vestido. A outra, meias vermelho-claro. Esta usa, alm disso,um sapato tambm vermelho, com listas coloridas. A outra, um sapato azulcom enormes bolas amarelas. Os dois envernizados e brilhantes.

    Sobem rapidamente, e logo sentem-se atradas pela enormequantidade de vestidos que descansam em uma arara de uma das salas doestdio. Comeam a mexer em todos eles, enquanto a mais alta (Birkin)logo comea a retirar o seu. Deixa-o cair ao cho, e a vemos de costas, comuma meia cala que lhe cobre a cintura, comeando a experimentar umdeles. O que vemos a seguir uma cena pitoresca. Thomas entra na salasubitamente. Ela, que est com um vestido de alas ainda aberto nas costas,

    encolhe-se toda. A amiga foge ao ouvir o barulho da cafeteira, deixando-ossozinhos. Colocando seus dedos na ala do vestido, Thomas o arrancaenquanto ela o encara com um olhar misto de vergonha e entusiasmo. Elaagarra seu antigo vestido e com ele protege os seios desnudos, escondendo-

    4 Uma delas JaneBirkin, que ficaria mun-dialmente famosa al-guns anos depois, aocantar com o seu mari-doSerge Gainsboroughuma msica que seriaproibida em vrios pa-ses do mundo, in-

    cluindo-se a o Brasil,pela sua sonoridade queimitava (?) os ba-rulhos de um ato se-xual:Je taime.

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    se atrs do cabideiro. Sem pestanejar, nosso fotgrafo joga o cabideiro nocho, pisa em cima dos vestidos e vai em sua direo. Esta atitude marca demaneira indelvel a diferena intransponvel entre eles. Elas estoembevecidas por aqueles vestidos, que as atraem completamente, enquanto

    ele, no s no lhes d a menor importncia, como alm de tudo pisa sobreeles para chegar at ela. No se importa com os vestidos, e, no limite, nemmesmo se importa o mnimo com elas.

    Thomas aproxima-se, enquanto Jane Birkin encolhe-se com osbraos cruzados no peito perto da porta, e arranca-lhe das mos este outrovestido com o qual se protegia. Ela finge em seu rosto um certo ar acanhado,alternando sorrisos contidos com uma aparente surpresa pelo jeito atiradodo at ento asctico fotgrafo. Ele coloca a mo em seus cabelos; elamorde o seu pulso. Sinal inequvoco de que os toques foram autorizados.Comeam uma luta: ela grita, ele ri, e ns ficamos na dvida se ela se

    defende de verdade ou se est apenas e to somente fazendo um certocharme no jogo sempre complexo da seduo, quando dizemos no nomomento em que na verdade queremos dizer sim5. A resposta a esta dvidavem logo a seguir. A amiga, ouvindo a gritaria, vem correndo da cozinha e,ao perguntar o que est acontecendo, surpreende-se com a outra que se

    joga sobre ela, oferecendo-a a Thomas, alegando que ela possua um corpomais bonito, ao mesmo tempo em que comea, ela mesma, a arrancar-lhetodas as roupas. Ambas rolam pelo cho, tentando se despir, e depois corrempara o estdio onde desenrolam o fundo infinito lils por todo o cho. Jogam-se sobre ele enquanto finalmente se despem, sempre gritando e batendo osps, numa grande algazarra. Thomas entra finalmente na dana e as duasaproveitam para tambm despi-lo. Quer dizer, pressupomos que o despem,pois a cena cortada abruptamente neste momento, enquanto ele aindaest de calas, e, no momento em que retorna, todo o barulho j acabou eapenas vemos o fundo infinito todo amassado, para que s depois nos sejammostrados os trs. Porm, neste momento, elas j esto totalmente vestidase terminando de vesti-lo tambm. Ele ainda est deitado de costas, tendocada uma das garotas ajoelhadas literalmente a seus ps, colocando-lhedelicadamente as meias, num momento da mais completa e absoluta

    submisso, que no deixa dvidas sobre as intenes da relao que travaramcom o fotgrafo e, ao mesmo tempo, sobre a (des)importncia que ele mesmodeu a esta relao.

    Seu olhar, antes perdido no teto, passa pelo meio delas para atingiras fotos penduradas que atraem, magneticamente, de novo toda a suaateno. Thomas levanta-se uma delas comea a vestir-lhe a camisa epassa entre as meninas como se elas nem estivessem mais por ali. Quandoas duas se espantam com o fato de ele as mandar embora, sem tirar aomenos uma foto, sua resposta , ao mesmo tempo, emblemtica e sintomtica: estou muito molhado. Ao perceber que ambas olharam-se com o rosto

    espantado e um pouco atnito, ele termina por arrematar: E a culpa devocs.Esta cena de orgia, pressuposta e no-visvel, apesar de parecer

    ter sido absolutamente pueril, foi, ao mesmo tempo e por mais estranho que

    5 Simmel, ao tratar doerotismo como umaforma de sociabilidade,afirma: A natureza dacoqueteria feminina jogar alternativamentecom promessas e re-

    traimentos alusivos para atrair o homem,mas para deter-se sem-pre antes de uma de-ciso, e para rejeit-lo,mas nunca priv-lointeiramente da es-perana.(...)Seu com-portamento oscila entreo sim e o no, semfixar-se em nenhumdeles (Simmel, 1983,p.174-175). bvio

    que no momento emque a relao sexual seconcretiza este jogoperde o seu sentidoinicial.

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    isso possa parecer nos dias de hoje, bastante inovadora, por ter apresentadopela primeira vez, mesmo que apenas de relance, os plos pbicos de umamulher nas telas do cinema comercial, de grande pblico6. Mas, o que significativo para nosso argumento o jeito totalmente casual no qual ela

    comea, transcorre, e acaba. Alm de que, ao mesmo tempo em que umarelao coletiva totalmente ao acaso entre pessoas que no se conhecem, tambm uma bela mostra de uma relao sexual sem qualquer tipo deenvolvimento e que acaba da mesma maneira como comeou, escoandopela porta do estdio fotogrfico7. Isto nos mostra de maneira muito claraque a ligao de Thomas com o mundo se faz, primordialmente, pelos olhosdas lentes fotogrficas de suas mquinas. Quando lhe falta esta mediao,ele sempre age de uma maneira distante, fria e deslocada, sem envolvimentoevidente, sem dar a isso qualquer significado, e, conseqentemente, semconstituir algo que possa criteriosamente ser chamado de relao8. apenas

    a sua mquina que lhe permite colocar-se nas coisas e conseguir participardelas de uma maneira incisiva e decisiva.

    Thomas comunica-se com todo mundo e durante todo o filme.Mas sempre desta maneira exterior, como se no fosse ele e nem com ele,ou como se ele mesmo no estivesse l. Em apenas dois momentos tomarealmente a iniciativa de se comunicar, sem obter qualquer resultado. Soos momentos que se seguem ao roubo das fotos em seu estdio: quandoest com a mulher do pintor, como vimos, e quando est na festa no final dofilme, tentando falar com seu editor. Voltaremos a este assunto mais frente.

    Blow Up um filme repleto destes momentos onde parece quetodo mundo fala lnguas diferentes. Ou, onde parece que todo mundo fala amesma lngua mas que mesmo assim ningum se entende.

    As cenas que ocorrem no antiqurio so disto exemplares. Primeiro,com o velho empregado, que parece parte viva do que deveria estar vendendo.No momento em que v Thomas pela primeira vez, diz-lhe que no existenada l que seja barato e que ele est, portanto, perdendo tempo. Pergunta-lhe o que procura, para ento dizer que l no existem pinturas para seremvendidas. Quando Thomas mostra-lhe algumas, o empregado pergunta deque tipo so as que procura. sua resposta de que quer paisagens, ele

    responde que no as tem. Por fim, quando encontra uma paisagem, diz queaquela j est vendida, que todas esto vendidas. Nada do que Thomas dizretira o vendedor desta posio de recusa. um vendedor que s faz ocontrrio do que dele se espera, pois nunca vende nada. E que, ainda pior,espanta com o seu jeito sutil todos os possveis fregueses.

    Quando o fotgrafo volta loja, para falar com a proprietria,uma jovem sorridente com o olhar a um s tempo sonhador e distante, estalhe diz que quer vender a loja pois est cansada de antigidades. Quegostaria de fazer algo diferente... viajar para oNepal. Quando ele lhediz que o Nepal s antigidades, ela se espanta e diz, com o olhar

    compenetrado, que ento deveria tentar...Marrocos. Thomas sorri, e olhapara baixo com cara de que aquilo no tem jeito mesmo. Quando v umaenorme hlice e pede para saber seu preo, a moa faz um ar de no ter amenor idia e, aps pensar um pouco, acaba por dizer 8 libras.

    6 Aos olhos de hoje,obviamente. Na poca,considerada muito ou-sada, recebeu a te-sourados censores em vriospases (cf. Vogel, 1974,p. 215).

    7 evidente que sabemosque este acaso foiabsolutamente inten-cional, pelo menos porparte das meninas, queesperavam com issoabrir as portas para asesso de fotos, cominteresses mais do queevidentes. No caso dofotgrafo, que o quenos interessa, elas sim-plesmente surgiram donada em seu es-tdio,o que o importantepara o racio-cnio queestamos desenvolven-do.

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    Sobre o compartilha-mento de sentidos naconstituio de relaessociais cf. Weber(1978).

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    Parece, na verdade, que ela no tem a menor idia das coisas edo mundo que a cerca. Mundo este onde as coisas se trocam uma pelasoutras por meio das imagens (de)formadas que se fazem delas. O antiqurio um lugar sintomtico e significativo disto, pois acumula uma srie de objetos

    diferentes, cada um repleto de sua prpria histria, mas todos retirados deseu tempo e espao, que dariam as referncias e o sentido vida querecobrem e que podem desvelar ou revelar. Esta loja apenas umempilhamento de coisas que, s por estarem juntas, no portam nenhumsentido particular. apenas um lugar onde se vasculha um monte de objetospara se tentar encontrar alguma coisa interessante, interessante para ns.Como as fotos tiradas ao acaso no meio do parque, imagens sem sentidoprocurando reencontrar seu significado no fluxo do tempo e do espao, nofluxo da vida, de alguma vida, seja ela qual for. Ao serem recolocados emum fluxo qualquer de tempo, ao recuperarem a referncia de seu lugar na

    histria, ou sua referncia em uma outra histria, recuperam tambm suaidentidade como objetos e se reencontram finalmente com o seu temporeinserido no tempo presente. So, por fim, o seu presente de ento, queemerge no presente de hoje. Se isto no acontece, restam apenas como ummonte de objetos perdidos no meio do tempo do presente e largados em umespao qualquer, restos de um dia perdido no escoar complexo do tempo eda memria9.

    Uma outra idia aqui refora-se de maneira irrefutvel: de queneste filme, Antonioni constri as suas mulheres sempre como personagenssem vontades, confusas e aparentemente imbecis. So meras imagens quealternam de maneira nem sempre sutil os seus contedos: nunca sabem oque querem (como a vizinha e a dona da loja de antigidades), ou so purocorpo destitudo de ao (como as modelos), ou acham que esto conseguindoo que querem sem se dar conta da inutilidade de seus esforos (como asduas do ateli e tambm a que vai buscar o filme). Todas mostram-se fteis,nas vontades ou nos motivos, na forma pela qual vem e se inserem nomundo: pelos vestidos, pelo marido pintor, pelos nepais e pelos marrocos.No sabem o que querem e quando sabem nada conseguem. No sabempara onde vo. No possuem identidade prpria nem nada que as distingam

    uma das outras. Nenhuma delas nem ao menos tem nome. So pessoasque se misturam e se reduzem s coisas que as envolvem, aos espaos nosquais se encontram. So manchas a confundir ainda mais a marcha dosacontecimentos. So aparies desconexas no fluxo dos acontecimentosque desviam nosso heri da busca incessante de sentido. So duplos dosquadros de Bill, onde em princpio nada se v, e onde, com alguma sorte,pode-se olhar bem e por fim encontrar alguma coisa que tenha algum sentidono meio de tantos borres. Mas que nunca se encontra. Parecem ser aexpresso fugaz da ausncia de contedo, a materializao objetual de umgrande vazio, a recorrncia incessante e inexorvel de sua reduo a menos

    do que nada. Com apenas uma pequena exceo: a personagem vivida porVanessa Redgrave. Ela a nica que parece apresentar alguma vontade aomesmo tempo que demonstra saber o que faz e o que quer, por mais que,mesmo para ela, as coisas nunca saiam do jeito esperado. Alm de que, ela

    9 Sobre isso consulteBenjamin (1994a;1994b) e Deleuze(1985).

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    tambm, como as outras, vem assim como vai, sem deixar rastros ou pistas.O tradutor brasileiro, ao nomear o filme comoDepois Daquele Beijo, remetenossa ateno para o que deveria ser o tema central de sua histria: o suspensesobre o que teria acontecido depois de algum beijo, ou seja, depois do beijo

    no parque, e que seria a morte misteriosa de um homem tambm misterioso,sobre o qual no sabemos e nunca saberemos nada. claro que esteenredo no demora por se dissipar, mesmo que permanea como pano defundo da histria que vemos at o seu fim. Mas, seus fundamentos socuriosos e escassos. Nada sabemos sobre os seus personagens, por maisque um deles participe de uma longa cena com o fotgrafo. Terminamos ofilme sem nada saber sobre a mulher do parque, nem nada sobre o morto.Quem eles so, porque se escondiam, porque ele foi assassinado, porque elatem tanto medo, de onde ela veio, para onde ela foi, todas so perguntas squais o filme nega sucessivamente as respostas. Aquela moa viveu uma

    histria que no nos dada a conhecer, e que, portanto, no pode nos servircomo referencial. O mistrio que envolve aqueles dois namorados permanecesem soluo e no se dissipa at o fim do filme. Quem ficar preocupadocom o que aconteceu depois daquele beijo, no deixar de ir emborafrustrado do cinema, da mesma forma que ficaram aqueles que esperaramde Hitchcock explicaes sobre as razes e os porqus dos ataques de seuspssaros. O beijo e seus protagonistas no vm de lugar nenhum e no vopara parte alguma. Eles desaparecem dispersos pelo vento do parque noqual tudo que no podemos compreender aconteceu. Devemos, portanto,olhar em outra direo para tentarmos desvelar o que as imagens que vemosincessantemente nos negam.

    A pista crucial do que de fato a nossa histria, e do que deveriaestar atraindo decididamente a nossa ateno, nos dada a conhecer logonos momentos iniciais do filme. Thomas vai para a casa que existe ao ladodo estdio e l encontra-se com o pintor, que est olhando para uma tela quepinta h 6 anos. um quadro cubista, parecido com os que Picasso faziaentre 1911 e 1912, no penltimo momento de seu cubismo. o momento emque, passada a fase da decomposio, onde os objetos ainda so, mesmoque dificilmente, reconhecveis, seus experimentos levam-no a um

    desmembramento to brutal que nada mais de concreto podemos reconhecerna imagem que vemos do que apenas alguns de seus detalhes, que podemconformar algum elemento que se assemelhe a algo que por ventura possamosconhecer10.Nosso pintor, entretanto, parece seguir o caminho oposto quelesde seus predecessores. Olha para o quadro, dizendo que aquelas imagensnada significam para ele enquanto as pinta: so apenas uma grande confuso.Explica que depois se retm em algum detalhe, que lhe parece algo. A partirde ento, como se a pintura adquirisse vida prpria. Ela mesma se resolveria,se acrescentaria. como achar uma pista em uma histria de detetives.Sobre o cho de sua casa encontra-se outra de suas pinturas, esta aqui mais

    na chave de um expressionismo abstrato la Jackson Pollock. Pingos emais pingos sobre a tela. De vrias cores. Aquele pintor, na verdade, acaboude nos dar todos os indcios que precisvamos para entender do que se trataa nossa histria. Mesmo que ele no nos d quaisquer pistas sobre os seus

    10 Sobre o cubismo cf.Menezes (1997, espe-

    cialmente p. 130-135e 178-186), Golding(1968), Ashton (1985)e Stangos (1981), en-tre outros.

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    prprios atos. Suas pinturas no so para vender como no existem tambmpara serem dadas. Ele as faz apenas como um detalhe de uma busca pessoalque s para ele mesmo vai ter algum significado, como veremos ser tambma busca de Thomas por meio de suas fotos e do que elas revelam, durante

    todo o decorrer do filme.Toda a histria vai desenvolver-se a partir de um episdio banal,

    que ocorre completamente por acaso. Na verdade, e o que maissignificativo, ocorre sem que ele mesmo se d conta, no momento em quepasseia por um parque, situado em uma zona de renovao urbana deLondres, que Thomas identifica por trs sinais exteriores, algunsespecialmente curiosos. Ao sair com o seu carro para ir at o antiqurio, eleatravessa uma srie de lugares por onde podemos ver os tradicionaisexemplos da arquitetura antiga de Londres. Ao virar uma esquina, vemosuma chamin e blocos de prdios baixos de apartamentos, com arquitetura

    recente, alm de um trator em movimento, o que demonstra estarem estesconjuntos em fase final de construo. O terreno que ocupam ainda apresentauma parte vazia, cheia de entulhos, que termina na lateral cortada de umacasa. Isto nos mostra que as antigas construes foram derrubadas, paradar lugar ao novo que se ergue. Os outros dois sinais que ele aponta so osmais peculiares. O primeiro, o de uma me com seu carrinho de beb queatravessa a rua para ir at o parque, o que demostra a instalao nos arredoresde jovens casais em comeo de vida. O outro, evidentemente preconceituoso,refere-se a dois homossexuais que passeiam pela rua, acompanhados dedois poodles brancos, que Thomas encara de maneira to exacerbada nomomento em que vai entrar no antiqurio, a ponto de um deles terminarencarando-o rudemente de volta.

    Ao sair da loja, com sua mquina fotogrfica, caminha em direoa um parque que est ali ao lado. Ouvimos, desde o instante em que sai dela,o intenso farfalhar nas rvores que se movem ao vento. Passa ao lado deuma quadra de tnis, que ir adquirir um outro e diferente significado nofinal do filme. O parque parece ser vasto, com poucas pessoas a passear, oque refora a sensao de seu duplo isolamento, do parque e do fotgrafo.No momento em que fotografa algumas pombas que esto sobre um

    gramado, v um casal subindo para a parte mais alta do parque. Vai atrsdeles, curioso, para encontr-los, l em cima, em um amplo espao ondeesto totalmente ss, acompanhados apenas pelo barulho do vento e dasfolhas, e pelo olhar indiscreto do fotgrafo, claro. Esconde-se atrs deuma cerca, esquiva-se para trs das rvores, ajoelha-se no cho. O casal sed as mos, gira, brinca, beija-se, abraa-se. Mas, de repente, a mulher o ve sai correndo atrs dele. Thomas continua a fotograf-la, o que a deixaainda mais nervosa. Pede o filme, diz que pagaria por ele, mas que o queragora, e, para conseguir isso, agarra sua mquina e at morde a sua mo.Isto nos mostra que ele deve ter fotografado algo muito importante, algo que

    no deveria. Um caso proibido de pessoas famosas, apesar de desconhecidaspara ele, talvez. A reao da mulher sintomtica de que algo que deveriapermanecer escondido estava sendo exposto. curioso que a mulherargumenta em sua defesa, como fundamento de sua privacidade, o fato de

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    estarem em um lugarpblico, onde as pessoas deveriam ter paz, mas que,teoricamente, justamente um dos lugares menos privados do mundo, porestar vista de quem estiver por l. Talvez, por isso mesmo, s vezes possaser tambm o melhor deles para se esconder. A expresso final de seu rosto

    a mostra de seu temor, pois ela continua ofegante e apavorada quando lheafirma que eles nunca se encontraram, que ele nunca a viu. Ao olhar para olado e perceber que o seu companheiro no est mais l, corre de novoatravessando todo o gramado. Pra, l ao fundo, perto de uma rvore,enquanto Thomas continua a fotograf-la no dando muita importncia atodo o seu transtorno. Aps esta breve parada, ela continua correndo para ofim do parque por onde desaparece. Ficamos ainda alguns segundos a olharo parque vazio, silencioso, com suas rvores, seus arbustos, suas cercas, e aouvir o forte barulho do vento a balanar a copa das rvores. Esta imagemfinal, na qual nada vislumbramos de essencial, ser o local de uma srie de

    descobertas fundamentais, que nem ele mesmo ainda percebeu ter sidotestemunha. Na verdade, ele no foi mesmo testemunha de nada, comoveremos.

    A confirmao de que ele deve ter visto algo que no devia vemdo fato de que Thomas passa a ser seguido a partir do momento em quedeixa o parque. Enquanto est no restaurante conversando com o editor deseu livro um livro de ensaio fotogrfico sobre a Londres que ningum querver, a dos pobres e desabrigados algum comea a mexer em seu carro.Quando ele vai embora, vemos um carro que o segue. E, quando chega naporta de sua casa, ao entrar, d de cara com a misteriosa mulher que estavano parque, o que aumenta ainda mais a sensao da importncia e dedesconserto do que ele deve ter fotografado. Vanessa Redgrave mantm omistrio at o fim. Entra com Thomas, sobe para sua sala, olha assustadapara todos os lados enquanto ele continua com o seu ar impassvel de sempre,como se nunca nada estivesse acontecendo, ou como se nunca as coisasestivessem acontecendo com ele e sua volta. apreenso da moa que,em sua nica revelao, diz-lhe que sua vida est uma baguna e queseria um desastre se..., ele responde com o seu tradicional: E da? ...Nadacomo um pequeno desastre para arrumar as coisas. Ela anda de um lado

    para o outro, extravasando o nervosismo que no consegue controlar. Eledesconversa com um papo sobre querer fotograf-la como modelo, pedindoa ela que se sente no sof ao seu lado. Toca o telefone. Ele espera, espera,espera, e, de repente, atira-se pelo cho procurando o aparelho. Atende, e opassa para ela dizendo que a chamam, dizendo depois que a sua prpriaesposa. Seu jeito sempre o mesmo. Indireto, desconcertante, parecendosempre estar em um registro diferente dos outros. Suas atitudes nos colocamsempre em uma outra dimenso de discurso que parecemos nunca conseguiratingir. Referncias diferentes parecem fazer com que as falas no encontremum lugar comum de troca de experincias. Sua conversa sobre a mulher

    que estaria falando ao telefone a expresso deste deslocamento. Fala, edesmente, a cada passo, as informaes que ele prprio d de si mesmo. minha mulher. No, no . Apenas tivemos alguns filhos juntos... No,no tivemos, nem mesmo filhos. como se tivssemos tido filhos. Ela

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    fcil de conviver... No, no . Se fosse fcil, viveria com ela. Ele pareceno se comunicar com clareza atravs das palavras nem consigo mesmo.No o seu instrumento de comunicao preferido, nem o que ele controlamelhor. Este seu jeito explosivo de fazer as coisas, que confunde os outros,

    a curiosa expresso da transposio, para as imagens que vemos da suavida, de uma outra forma de comunicao que no se d pelo discursodireto, mas por bits de informao. Se isolados, estes no contm nenhumainformao utilizvel. Mas, ao serem reunidos, de uma maneira e ordemconveniente, podem adquirir uma dimenso reveladora essencial.

    Esta incompreenso faz com que a moa, irritada tambm com ademora em resolver o assunto que a levou at l, pergunte-lhe porque eleno diz logo o que quer, enquanto tenta interpretar os seus desejos comeandoa tirar a sua camisa, escondendo-se por trs de um monte de plumas, com orosto fechado e bravo. O fotgrafo, por sua vez, mantm o seu olhar de

    sempre, virando a cabea lentamente enquanto levanta a sobrancelha esorri levemente em tom de deboche, sua postura mais caracterstica. Caminhaem sua direo, acariciando gentilmente o seu brao esquerdo e..., manda-a se vestir pois vai lhe devolver o filme. Quando sai da cmara escura,apenas pode ver sua perna que surge como uma apario por trs do fundoinfinito lils. Esta perna um convite, que ele aceita ao passar por trs dopapel e a encontrar recostada na parede, esperando, pelo filme, e por ele.Uma msica suave surge ao fundo, vinda de uma vitrola, sendo uma daspoucas que ouvimos no filme, e que contrasta com o som quase totalmentenaturalista11que envolve toda a histria12. Seus braos esto cruzados sobreo peito a esconder o que, ao mesmo tempo, se oferece. Seu olhar agora meigo, suavemente convidativo. evidente que, mais uma vez, Thomas novai fazer o que dele se espera, pois acaba por trocar o filme dando a ela umoutro qualquer. As atitudes que executa exigem que seus atos sejam lidossempre em outra direo do que aparentam mostrar. Ela recebe o filme,pensa um pouco, e vira-se, deixando mostra docemente seus seios, com oleno de pescoo que passa levemente entre eles. Voltando-se em sua direoe passando a mo em seus lbios, d-lhe um beijo suave. Aps um outrobeijo, mais demorado, encaminham-se para o quarto. O filme, to procurado

    e desejado, jogado displicentemente sobre a camisa que ela vestia. Mas,mais uma vez, o acaso interpe-se em sua vida pois ouvem a campainhaque toca. Eles interrompem aquela relao, que ainda nem havia de fatocomeado, para receber a hlice que havia comprado naquela estranhamanh. Aps este interldio forado, ambos tentam retomar o que estavamfazendo. A mulher senta-se novamente, com o olhar terno e finalmenterelaxado, rindo, quando, de repente, olha para seu relgio e, ao perceber ashoras, assusta-se, saindo correndo pois j era muito tarde. Thomas aindapergunta se vai v-la de novo, demonstrando um interesse inusitado einesperado por algum, ao mesmo tempo que tambm parece no demostrar

    ter muita importncia o fato de ela ter realmente decidido ir embora. Comoveio, foi. Mais um gole no copo de vinho e volta ao trabalho, aparentementea nica coisa que lhe interessa de verdade.

    Mas, mesmo aqui, naquilo que parece ser seu nico interesse

    11 O conceito de na-turalismo que estamosutilizando refere-se construo de espaocujo esforo se d nadireo de uma re-produo fiel das apa-rncias imediatas domundo fsico (...)(Xavier, 1984, p. 31).No entraremos aquina polmica do realis-mo de Kracauer (1960)

    e Bazin (1985) porachar suas con-cepesmais distan-tes do quequeremos ressaltar.

    12 No existem msicasinseridas neste filmecom o sentido de co-laborar na construode sentidos ou de sen-timentos. O som a-penas parece acom-panhar o som do queacontece na his-tria,

    os rudos de seus am-bientes. Nenhuma m-sica que venha do nada.Nenhuma trilha sono-ra.

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    consistente, temos uma grande ambigidade. Thomas aparece e sua posturao coloca no filme como um renomado fotgrafo de moda, ao qual todosdevem se curvar. Curiosamente, ao mesmo tempo, passa quase todo o filmetrabalhando nas fotos de seu livro, um ensaio fotogrfico, que ser, tambm,

    a razo de sua ida a parque e de seu testemunho de um crime. Mais umindcio que parece querer nos dizer que temos aqui universos paralelos queprecisam ser desvendados para que consigamos compreender os mltiplossignificados que os vrios caminhos da histria constroem e nos propem,como se estivssemos ns mesmos perdidos no labirinto de Teseu.

    Esta ruptura da nica relao que aparentemente se constituiria,com o conseqente desaparecimento definitivo da mulher, mais uma histriaque se perde no fluxo geral dos acontecimentos que confluem para a tramageral que se desdobra no filme. Com isso, o que podemos ver que a vidade Thomas se compe de um fluxo de tempo absolutamente descontnuo,

    que emerge para ns (e para ele mesmo) nos momentos mais inusitados,levando a histria ao seu sabor para direes cada vez mais inesperadas13.Quando algo parece estar finalmente para acontecer, quando a histria pareceter encontrado seu caminho seguro, algo a faz mudar de direo e uma novahistria, com sua temporalidade prpria, dirige nosso olhar novamente paraoutro lugar diferente daqueles para os quais estvamos olhando. como seThomas fosse a entidade pela qual passa um feixe de outras histrias, cadauma com a sua dimenso prpria, mas aparentemente incongruentes entresi, que se mostram em pedaos desconexos e episdicos aos nossos olhos, eque s podem e vo adquirir sentido por meio do fotgrafo, ao seremreinseridas em sua prpria histria, em sua prpria busca. Histria esta,alm de tudo, que no parece ter uma direo primordial, mas ser umemaranhado de fenmenos que s podem adquirir sentido se forem retiradosde seu fluxo natural e (re)ordenados segundo outros parmetros. Selecionarpara compreender, selecionar para propor significados14. No s para Thomasmas para ns tambm, perdidos que estamos sem saber em que direodevemos olhar para tentarmos compreender do que que o filme realmenteest falando, quais so realmente as questes que ele problematiza e sobreas quais devemos nos debruar.

    Ser somente a partir da ampliao das fotos que ele tirou noparque naquela manh que as coisas parecem comear a querer encontraro seu fio da meada, pois aquele filme fotogrfico, alm de tudo, duplamenterevelador: num primeiro momento, revela-nos o que os olhos no viram;num segundo, desvela o que para ns dever ser significativo nas imagenscomplexas que contemplamos. Thomas comea a ampliar as fotos, emtamanhos cada vez maiores. Ele est s, introspectivo, olhando com vagaras vrias imagens que vai compondo, que vai pendurando lado a lado, tentandoremontar sentidos possveis de uma histria perdida. So sempre imagensdo parque, para as quais a sua ateno se volta sucessivamente, ressaltando

    o seu olhar sempre pensativo. Em si mesmas aquelas fotos contm apenasisso: imagens plcidas de um parque semivazio. De repente, entretanto, algolhe chama subitamente a ateno. Aproxima-se, olha para a foto em que ocasal est de mos dadas, em seguida para outra em que se abraam, volta

    13 Sobre o fluxo de tem-po e sua relao comas imagens cf.Tarkovski (1990).

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    Como gostaria o velhoWeber (cf. em especial,A objetividade doconhecimento nascincias sociais, 1979).

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    para a anterior, aproxima-se ainda mais, olha mais detalhadamente. Suavista comea a selecionar, em cada foto, imperceptivelmente, o que lheparece significativo. Ele amplia apenas um detalhe de uma delas, o casalque se abraa. Pode a perceber, ento, que a moa, enquanto o abraa,

    parece olhar assustada na direo de uns arbustos. Thomas retorna para afoto anterior, tentando recuperar o trajeto daquele olhar e o lugar para ondeele se deslocava. Mais um copo de vinho. Continua olhando para as fotospois algo l parece estar errado, algo o incomoda. Com uma grande lupa namo, como Sherlock Holmes, ele marca um retngulo em algum lugar dosarbustos onde ns, espectadores, no vemos nada. Mais uma ampliao.Agora temos, lado a lado, em sua unicidade temporal e em suadescontinuidade espacial, a moa que olha e o arbusto que est sendo olhado.Podemos vislumbrar, a partir de sua ateno, algo que sem ela continuariaperdido no meio de um monte de informaes desconexas e indecifrveis.

    somente a curiosidade de seu olhar que detona em Thomas a capacidade dever ali, onde no havia nada anteriormente, a imagem pressuposta de umpedao de um rosto que os espreitava pelo meio dos arbustos.

    Ele continua curioso, tentando compreender o que seriam aquelascoisas e onde levariam a sua percepo. Tenta obter ajuda, ao tentar ligarpara a moa, mas percebe que isto impossvel, pois ela havia lhe deixadoum nmero de telefone falso. No adianta pedir ajuda, o significado devesempre brotar de ns mesmos, sujeitos que somos dos sentidos queconstrumos em nossas relaes de interao com os outros, por mais quetais significados estejam sempre dentro dos limites de universos culturaiscompartilhados. Thomas volta, preocupado, a olhar mais detalhadamente aimagem dos arbustos, sobre a cerca. Mais uma ampliao, s um pedao dacerca. Mais uma seqncia de imagens se forma, um discurso se esboa. Ocasal distante de mos dadas. De perto de mos dadas. Abraando-se aolonge. A ampliao deste abrao com o seu olhar assustado. O abrao maislonge de novo, o olhar voltado agora para os arbustos que escondem. Oarbusto de perto para que possamos ver a imagem confusa do rosto que alise esconde. Mais um recorte. Mais de perto, outra direo. Aparece agorauma mo que segura algo que parece ser uma arma. Neste momento

    comeamos a escutar o som do vento nas rvores, como escutvamos nomomento em que Thomas l estava fotografando. Algo de muito importanteest acontecendo. Na imagem e no sentido que elas agora parecem constituircom o olhar de nosso fotgrafo. Retorna novamente para o casal que olha.Para o rosto da moa que demonstra preocupao. Para o homem. Outroclose nela. Depois, com a mo para a frente. Ela, ao fundo, parada perto deuma rvore. Uma ampliao dela parada de costas perto da rvore. Outramais distante. Thomas olha para o lado tentando entender alguma coisa.Completa finalmente a histria: ele evitou um crime. Agora, as coisasfinalmente fazem sentido. S que errado.

    Ouve-se um barulho na porta, e por ela vo entrar aquelas duasjovens de roupas coloridas, para invadir e desviar novamente a sua, e anossa, ateno.

    O que precisamos retirar do fluxo contnuo e incessante de

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    eventos que ocorrem e se superpem sem parar, alguns momentos que,reordenados, podem assim adquirir algum significado. No basta saber paraonde olhar. necessrio reinterpretar o que se olha. E isto se reala, aindamais, em virtude deste artifcio curioso das imagens fotogrficas, que quanto

    mais se permitem aproximar, quanto maiores ficam para ns, mais e maisnos fazem perder a preciso e a definio daquilo que nos dado a olhar.Podemos olhar com mais detalhes, ao mesmo tempo em que estes mesmosdetalhes negam a nitidez que os permitiria defini-los enquanto tal. Podemosver mais, ao mesmo tempo em que vemos menos. Temos que saber ver,para identificar neste menos o significado que os olhos se esforam emdescortinar. Novamente vemos bits de informao, que s se transformaroem algo com significado se reunidos de uma maneira conveniente pelosolhos experientes, pelos olhos que aprenderam a ver, pelos olhos queinvestigam15.

    Nosso fotgrafo retorna para as fotos do mesmo jeito como asdeixou. Enquanto lhe so colocadas as meias, ele muda completamente suaateno, com o olhar fixo para aquelas imagens, para completo espanto dasduas mocinhas que parecem no perceber a (no)conseqncia de suapequena orgia, a inutilidade de seus esforos para assegurar os favores e asfotos de Thomas, pois sua ateno continua totalmente voltada para o mistrioque o instiga. Com o olhar compenetrado, continua imerso nas imagens queaquelas fotos descortinam e em algo que teimam em no desvelar. Algoparece ainda estar fora do lugar. Mas, o que ser que a sua intuio jpercebeu antes mesmo que os seus olhos conseguissem descortinar? Thomasparece dar forma visual quela velha frase de Nietzsche: O pensamento seapresenta quando ele quer, e no quando eu quero (Nietzsche, 1971,DPF #17, p. 35). Novamente pega a lupa, mais ampliaes, ainda maiores,cada vez gros mais estourados, cada vez imagens menos ntidas, e cadavez mais prenhes de um possvel significado. Um ltimo recurso. Refotografaro pequeno pedao de imagem para a qual os olhos se voltaram e no qualnada viram. Ou onde, quando viram, nada compreenderam. Apenas umdetalhe superampliado. Manchas brancas e pretas que se alternam em umapletora de informaes, lembrando-nos dos quadros de Monet16. Thomas

    coloca, ao lado deste fragmento, uma outra foto com a imagem mais distante.E somente agora, na encruzilhada visual destas duas imagens que em simesmas pouco parecem significar, que ele, finalmente, pode dar-se contado engano de sua primeira concluso, da sua no compreenso inicial doque o jogo furtivo das imagens realmente lhe proporcionava. Seu rosto mudade expresso. Est agora aturdido com a sbita revelao daquilo que osseus olhos haviam se furtado a perceber. Quase que no acreditando nanica coisa que para ele se coloca como palpvel, suas prprias imagens,volta ao parque para confirmar com os olhos o que eles j descortinaram deuma outra forma. Vai ao parque para checar a realidade, para compar-la

    com a sua imagem, agora sua realidade primeira. L chegando v o corpo,cado, de olhos abertos. Ajoelha-se e o toca, para ter certeza de que seusolhos no mentem. Olhos nos quais ele parece j no acreditar muito. Estacena poderosamente sintomtica. Ele vai at o parque para ter certeza da

    15Bazin nos diz, em seutexto A ontologia daimagem fotogrfica

    (Bazin, 1985, p. 9- 17),que as fotos so aexpresso da possi-bilidade de se paralisar

    o tempo, um temposubtrado de sua pr-pria corrupo. Paraque possamos perce-ber as fotos neste re-gistro, teramos depens-las como ob-jetos dotados de signi-ficados prprios, inde-pendentes dos olharesque poderiam se de-bruar sobre elas. Co-mo Benjamin nos a-

    ponta (veja-se em es-pecial Pequena his-tria da fotografia,1994b), os sentidosno esto nas fotos emsi, mas nas relaesque elas estabelecemcom aqueles que asolham.

    16 Lembremo-nos aquidas palavras irnicasque Rembrandt dirigiaaos seus crticos, quan-do estes diziam queseus quadros nada maiseram do que man-chase borres colo-ridos.Ele os alertava para nochegarem muito pertode suas telas com onariz, pois o cheiro dastintas fa-talmente osintoxica-riam, numaclara aluso de que asimagens s podem ad-

    quirir sentido se noforem separadas dotodo que as define co-mo so e que lhes dsentido.

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    imagem, para comprovar a sua veracidade, e no o contrrio, pois a imagem agora, na verdade, a sua realidade primeira. Curiosamente, Thomas nosaponta, avant la lettre, para um processo de inverso de referncia entrecoisa e imagem que ir se acentuar de maneira radical at este fim de

    sculo17.Quando volta ao ateli, todas as suas ampliaes desapareceram.

    Est tudo revirado, tudo arrancado, tudo que estava por l agora est sumido.Fotos, filmes, contatos, tudo. Por acaso, sempre o acaso, cada entre duasmquinas, resta uma nica foto, a mais ampliada de todas, do corpo cado nagrama. Ele se sente aliviado. Ou quase. Ao contar a histria para a mulherdo pintor, que ali acabava de entrar, as suas prprias palavras revelam aambigidade daquilo que para ele era uma verdade indelvel. Eu vi umhomem morto esta manh. E, ao ser perguntado como foi que isto haviaacontecido ele responde: No sei, no vi, para seu prprio espanto. E a

    que justamente est o problema. O que foi que ele realmente viu?Rigorosamente falando, nada. O que ele conseguiu ver foram as imagensde um morto. Imagem que ele lhe mostra confiante dizendo que o corpo.Ela olha para aquele papel, mas nada v. Sem as outras referncias, semalgo do qual partir para construir algum significado, aquilo que lhe mostradonada mais do que um monte desconexo de pontos e manchas. Como omundo, um emaranhado de eventos que acontecem ao mesmo tempo e que,como tais, so inapreensveis (cf. Weber, 1979). Um emaranhado deinformaes sem alguma ordem que lhes aporte algum significado. Umgrande nada. Parece uma das pinturas de Bill. Ele concorda, desolado.Que poderia fazer. Para ele tudo to claro. Como eram para Bill os seusquadros.

    Para quem ainda no entendeu onde que esta histria quer noslevar, Antonioni nos brinda no final com a estranha, e aparentementeextempornea, cena do concerto de rock. Tudo muito estranho. um rockviolento, barulhento e agitado. O grupo, vestido com as suas roupasacetinadas, capricha em seu desempenho. At que um dos amplificadorescomea a falhar, para a irritao profunda do guitarrista que o utiliza. Opblico, que lota o ambiente, no se mexe, ouvindo tudo aquilo sem mover

    um msculo. Um ou outro mexe os olhos. O resto nada. Apenas um casaldana, meio deslocado, no meio daquela massa esttica, alm de estarcompletamente fora do ritmo. Em um dado momento, num acesso final deira, o guitarrista comea a quebrar seu instrumento, transformando-o empedaos, terminando por atirar o que restou do brao destrudo bem no meioda platia. Para espanto geral, aquela platia aptica agora entra em delrio.Gritaria, berros, luta18. Todo mundo querendo pegar aquele pedao da guitarrade seu dolo. Faz-se a maior confuso. Thomas consegue agarrar aquelebrao e sai correndo com ele, sendo seguido por uma multido que vaiescasseando pouco a pouco. Ao chegar rua, j sem ser perseguido, ele

    vira-se, olha, e joga o brao da guitarra to ferozmente disputado no cho.Um rapaz que est ali do lado, ao ver o que aconteceu, caminha at aquelepedao de madeira, pega-o, olha-o, e joga displicentemente no cho aquelebrao de guitarra disputado de maneira to feroz. Nada possui mais identidade

    17Marcuse (s./d.) j nosapontava, em 1968,para esta complexarelao entre as ima-

    gens artsticas e a reali-dade. Baudrillard(1995, p. 17), levou is-to s ltimas conse-qncias: O nicosuspense que nos resta o de saber at ondepode o mundo se des-realizar antes de su-cumbir ao seu muitopouco de realidade...

    18 curioso perceber quea platia que v umshow de um conjuntoque existia na poca(os Yardbirds), estpraticamente paralisa-da at o mo-mento emque uma imagem da-quela mesma cena, umduplo da banda quetoca, cai no meio delamaterializado em umbrao de guitarra que-brado. como se o real

    no causasse maisnenhuma reao naspessoas, mas apenas asimagens, agora, suasrealidades primeiras.

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    prpria. Aquele brao como as prprias fotos de Thomas, ou as pinturasde Bill. Se as retiramos do contexto em que adquirem sentido, nada maisso do que um pedao de madeira quebrado, um monte de manchas, ummonte de riscos, um monte de nada19. Sem qualquer significado intrnseco.

    a relao com o nosso olhar que lhes d significado. o nosso olhar quelhes recoloca no fluxo do tempo, no fluxo do nosso tempo pois a nossamemria que os transforma em alguma coisa que tenha sentido. Aqui seressalta tambm um outro detalhe importante, como veremos mais frente.Esta cena reala pela pseudopresena deste real os indcios incontornveisde sua ausncia. O real aparece aqui completamente desvalorizado, pois oque vale o seu duplo expresso por meio de uma guitarra quebrada. eleque faz sentido para a platia que parecia adormecida pelo show. ele (oduplo a imagem) que faz com que todos aqueles que antes apenas olhavamsaiam finalmente de sua compartilhada letargia.

    Uma outra cena, que passa quase despercebida, mostra-nos, soboutras condies, quase a mesma coisa. Na primeira vez em que Thomasvai ao antiqurio, ele aproxima o seu carro da traseira de um caminhopreto. A cena rpida, confusa, e at nos causa um certo mal estar. Seucarro se aproxima20e, no momento em que quase encosta na traseira docaminho, Thomas o desvia para a direita visando ultrapass-lo. Um prdiovermelho, que se ergue sua frente, afasta-se de ns violentamente enquantoo carro continua indo para a frente o que faria com que aquele edifcio,logicamente, aparecesse, ao contrrio, cada vez mais perto. Com este jogodezoom, muito mais rpido que a velocidade do prprio carro, Antonioni nosmostra como todas as imagens dependem de um referencial que lhes demsentido. No tempo, e no espao.

    Aqui se completa o curioso jogo de iluses que o diretor constripara nos mostrar que o que estamos vendo um filme e no qualquer tipode reproduo, representao ou clone do real. Como contraste aonaturalismo de sua diegese, sem nenhum som que possa se distinguir dosom ambiente dos lugares que o filme mostra, Antonioni parece querer brincarcom os espectadores ao propor a eles trs momentos aparentementeheterodoxos em relao linearidade de sua proposio flmica. O primeiro

    deles, relativo sua construo espacial, expressa-se na cena daultrapassagem do caminho preto, que parece uma cena incrustada numdiscurso do qual se distingue e no qual parece no ter sentido, pois em nadacolabora para a compreenso daquilo que estamos vendo. Porm, ao montara cena com esse jogo dezooms, o diretor cria um contraponto naturalizaodas imagens que estamos assistindo pois, independente de todas as abstraesdas descontinuidades de tempo e espao que o espectador tem de fazerpara ver no filme algo semelhante ao real21, movimentos como essesso impossveis de serem vistos fora do mundo das imagens. O segundomomento aquele no qual Thomas est investigando as imagens tiradas no

    parque por meio das ampliaes que olha incessantemente, e no qual comeaa escutar o farfalhar das rvores ao vento, e que se completa com a cenafinal do filme, da bola de tnis. O terceiro o do show de rock, quandoAntonioni introduz no filme um recorte do real e que contraditoriamente

    19 No pensamos aquieste contexto como umcontexto histrico mascomo um contexto dereferncias que possi-bilitasse a proposiode alguma compre-enso ou interpretaosignificativa.

    20 O jogo de imagensaqui to interessantee rpido que temosdificuldade de perceberque os dois veculoscontinuam na mesmadistncia e sua apro-ximao feita sim-plesmente por umzoom na traseira docaminho.

    21 Sobre as inmerasdiferenas entre o queos olhos vem e osfilmes mostram cf.Arnheim (s./d.),

    Carrire (1995), Bazin(1985), Sorlin (1977),Francastel (1983) eKracauer (1960), entreoutros.

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    parece para ns espectadores como um dos momentos mais irreais do filme22.Como dissemos, esta cena s parece adquirir cara de real no momentoem que uma imagem dela mesma entra em cena: o cabo quebrado daguitarra. Nestes trs momentos, cada um com uma insero diferenciada,

    Antonioni parece proceder como procediam Picasso e Braque em suascolagens, quando para contrapor percepo de qualquer ilusionismo emsuas telas acabavam por inserir nelas um pedao verdadeiro do real (recortede jornal, pedao de tecido, areia, etc.)23. Aqui, como l, a insero de umpedao do real na imagem s pode reforar a sua qualidade de imagem eno de real. Ao colocar na tela o real mostramos a todos que a tela sisso: uma tela. Ao colocarmos no filme um conjunto personificando e atuandocomo a si mesmo, deixa-se claro que um filme s isso: um filme, umconjunto de imagens, uma construo que tem como sua nica e verdadeirarealidade a realidade das imagens que nos mostra. Assim, Antonioni parece

    no querer nos deixar esquecer que a nica realidade a que pode aspirar umfilme a sua prpria realidade enquanto filme. Nada mais do que isso.

    Voltando nossa histria, Thomas, por fim, no tem sorte emfazer com que algum compartilhe a sua to profunda descoberta. Ron, seuamigo e editor, com quem ele vai se encontrar na festa, est to chapado como vemos no momento em que se vira e sua mo segura dois cigarros que nada compreende do que Thomas procura lhe contar.

    Mas nosso fotgrafo no desiste. Ao amanhecer, munidonovamente de sua cmera, ele retorna para o parque. O lugar o mesmo, obarulho das rvores o mesmo, mas o corpo no est mais l. Bate amquina no cho em sinal de profunda decepo, enquanto olha para todosos lados para certificar-se de estar mesmo no lugar certo. Checa todas asvistas com relao s fotos que

    havia tirado a escada, os arbustos, a cerca, o gramado. No temmais dvidas, o lugar aquele mesmo. Mas, o seu retorno at l vai provarque na noite anterior ele no havia acreditado em seus prprios olhos. Thomasprecisa da imagem da coisa e no da prpria coisa para ter certeza. Parapoder enfim acreditar, definitivamente e sem nenhuma dvida, na realidadeda imagem.

    As cenas finais terminam o crculo que estamos percorrendo desdeo incio do filme24. Reaparece, nestas imagens, aquela mesma trupe demmicos barulhentos. So tantas pessoas em cima de umjeep que isto porsi s j seria curioso. Dois deles entram na quadra de tnis, enquanto o restose transforma em platia. Neste momento, e pela primeira vez, todos estoem silncio. Os dois movimentam as mos como se jogassem uma bolinhapara cima. Colocam-se cada um de um lado da quadra e comeam a jogar.Seus movimentos recuperam o movimento prprio do jogo, a disputa de umponto, as batidas com as raquetes, os saques, os smashs. Thomas encosta-se em um dos cantos da quadra e observa tudo aquilo silencioso. A cmera

    se volta para os rostos da platia, que movimenta suas cabeas de umlado para o outro acompanhando o jogo e os movimentos daquela bolinha.Em um dado momento, a bola imaginria voa violentamente de encontro aoalambrado. Todos recuam assustados. O jogador pisca o olho e sorri. Pela

    22 Coincidncias, e-ventos improvveis a verdade no sempreconvincente. Sempresoubemos disso. Ocinema, que to fre-qentemente se aven-tura pelo irreal, cons-tantemente renuncia auma realidade que con-sidera difcil de-maisde ser engolida

    (Carrire, 1995, p. 87)23Sobre as colagens cf.o interessante estudode Peter Burger(1984).

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    brincadeira. Um jogando, a outra jogando, a imagem gira pelo ar de um ladopara o outro. At que um deles erra feio a sua raquetada. Todos olham porsobre o alambrado, inclusive Thomas, inclusive ns. A cmera constri estemovimento e nos mostra uma imagem que desce e que desliza pela grama

    verde at ir parando bem devagar. No h nada l, mas ns vemos tudo. Aoser recriado o movimento foi tambm recriado o objeto que o efetua. Mesmoque ele no esteja l. Ou est? Thomas corre para o meio do gramado,abaixa-se, pega a bola(?) com a mo, joga-a duas vezes para cima e a atirade volta para a quadra. Podemos acompanhar o seu movimento (da bola)pelo movimento de seus olhos que a acompanham at o seu destino. Entrandofinalmente no jogo, e completando o seu ciclo, continuamos a ver de perto orosto de Thomas que volta a acompanh-lo. S que, neste momento, tantoThomas como ns mesmos comeamos tambm a ouvir o barulho da bolinhaque pula de um lado para o outro da quadra.

    Ao aceitar a realidade da imagem, Thomas acaba tambm pordissolver a separao entre real e imaginrio, entre imagem da coisa e acoisa em si, que todos os indcios do filme j constituam desde os seusprimrdios. Thomas finalmente realiza o que j vinha realizando com osoutros desde o comeo do filme: uma inverso.

    No incomum se associar a este filme a interpretao de queele um imenso discurso sobre a incomunicabilidade dos homens (cf. Kolker,1983, p. 137-142; entre outros). No nos parece, entretanto, que estainterpretao seja de fato apropriada. Propomos investigar as suas imagensem uma outra direo. Como vimos, Thomas comunica-se com todo mundoo tempo todo, at mesmo quando est dentro do carro. Ele est sempre secomunicando. O problema, portanto, est em outro lugar. O fato de ele secomunicar no quer dizer obrigatoriamente que ele ser compreendido.Vimos exaustivamente como as suas comunicaes parecem cair no vazio.O que vimos tambm foi que a verdadeira testemunha dos acontecimentosque o instigaram foi a sua mquina fotogrfica e as imagens que ela nosportou, mediaes necessrias para se ver alguma coisa nesta novaconfigurao do mundo.

    Alm disso, o show de rock nos mostra um outro caminho

    interpretativo possvel. O problema no est, rigorosamente, na falta decomunicao ou na incomunicabilidade, como tantas vezes se falou, mas namudana do referencial desta comunicao, das palavras e das coisas paraas imagens destas mesmas coisas. O homem no olha mais para um real apartir do qual vai criar determinadas imagens e das quais ele seria o seureferencial primeiro. Agora, o homem olha primeiro as imagens para depoiscompar-las com algo que ainda possui o nome de real mas que no temmais o mesmo estatuto de realidade que possua anteriormente. Agora, oreal serve para medir a perfeio da imagem e no o contrrio. O quecria no mais das vezes a desqualificao mesma deste real em relao s

    imagens que se colocam em seu lugar, que adquirem aqui a capacidadeconcreta de aparecerem como realidades de imagem, finalmente comorealidade primeira. s por isso que ele volta para o parque com a mquinano dia seguinte. Para poder refazer as imagens nas quais acredita e que so

    24 Mas, depois de tudo oque vimos, como nolembrar aqui daquelaspalavras que aparecem

    no filme Antes da Chu-va de Milcho Man-chevski: o tempo noespera, o crculo no redondo.

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    a sua real medida de verdade. Verdade que s pode ser propriamenteverdadeira por ser, e enquanto for, imagem. O problema crucial saber seainda existe alguma outra. Sua entrada fsica no jogo de tnis e o som dabolinha que a acompanha e que todos ns ouvimos parecem nos indicar que

    no, ao mesmo tempo que se exige de ns pelos nossos ouvidos a nossainsuspeita cumplicidade e aceitao. Pois afinal, no somos ns espectadoresparte deste mesmo mundo que o filme descortina? No somos ns mesmosque o construmos atravs de nossas relaes e interaes?

    Podemos por fim entender o que de fato queria nos dizer o nomedado ao filme. No o brasileiro, que no quer dizer absolutamente nada.Mas o original, em ingls, em um filme de um diretor italiano.Blow Upsignifica ampliar, ampliar fotografias em tamanhos enormes como vimosThomas fazer aos montes. Mas significa tambm explodir, no s o grofotogrfico que se expande, at perder qualquer significado, mas, e

    principalmente, explodir as velhas referncias que nos davam a medida e aorientao das coisas. Neste filme e, a partir dele, em todos os lugares, tudoacontece como se as pessoas s passassem a acreditar nas coisas queconseguem olhar enquanto imagens. Se no existe imagem, no existe acoisa, em uma curiosa inverso das palavras de Bazin a respeito do surgimentoda fotografia: a fotografia se beneficia de uma transferncia de realidadeda coisa para a sua reproduo (Bazin, 1985, p. 14). Aqui, essa proposioaparece invertida. Agora, a coisa que se beneficia de uma transfernciaadvinda da realidade da imagem. Se antes medamos a foto pelo modelo,agora medimos o modelo pela foto. Antonioni parece avanar na investigaodo que seria o processo de disseminao das imagens, em grande parteligado expanso generalizada da televiso como meio de comunicao,que se daria primordialmente na dcada de 80. A partir deste momento,antes de se conhecer qualquer coisa, conhecemos as imagens que existeme que se mostram sobre estas mesmas coisas25. como se a partir de entoo real tentasse cada vez mais se aproximar das imagens que dele se faziame pelas quais passava a ser constantemente medido, e desvalorizado. Aqui,ao se colocar como lugar essencial de sua histria aquele parque, situadonaquele bairro londrino, fez-se uma analogia entre a prpria renovao urbana

    e a renovao das formas de se olhar o que at ento se concebia comoreal. Em suas proposies, como tambm nas que Resnais deixar claroem Providence, real e imaginrio26no mais se distinguem um do outro (cf.Deleuze, 1986, p. 15). E se, como diz Virilio(1993), todas as guerras comeamno imaginrio, aqui, nos parece, que uma delas comeou a ser ganha27, aomesmo tempo que uma outra comeava a ser perdida28.

    Recebido para publicao em outubro/2000

    25Em 1994, uma notciano jornal O Estado deS. Paulo dava-nos adimenso trgica destadisseminao. Um ga-roto de 8 anos, sobre-vivente de uma chacinana periferia da cidade,foi entrevistado peloreprter que lhe per-guntava o que que eletinha visto. Sua res-posta foi exemplar: nateleviso, muito maisbonito.

    26 Powell leva isto em

    outra direo. Contra-pondo Real Iluso,chega a dizer queThomas, ao pegar abola, embarca na Ilu-so. Devemos res-saltar que dissolver oreal no imaginrio justamente arrebentar aseparao que colo-cava estes dois con-ceitos como plos o-postos e no como

    momentos indiscer-nveis de uma mes-marelao.

    27A da libertao sexual. 28 A de que por a se

    chegaria revoluosocial.

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    ABSTRACT: This article analyses Blow Up, Michelangelo Antonionis film, so as tounderstand how its visual discourse questions the relationship between the real and theimaginary. Behind a crime we know nothing about and will never know, the search carriedout by the photographer reveals and questions the relationships between the images andthe things whether photographs or films. He proposes meanings for their foundations andpoints of view, that set them apart from interpretations that see them as reproductions orrepresentations of a a real presupposed as being whole and pre-existent .

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