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1Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
BLASFÊMIAS E IRREVERÊNCIAS NO BRASIL SETECENTISTA: A TERCEIRA VISITAÇÃO DO SANTO OFÍCIO DA INQUISIÇÃO AO
ESTADO DO GRÃO-PARÁ EM 1763-69
INTRODUÇÃO
Em Portugal, no início da era moderna, a religião católica era um dos
pilares que constituíam a sociedade ibérica. As fortes expressões de fé,
repletas de conteúdo místico e supersticioso eram afirmadas por meio de
fulgurantes manifestações, onde o auto público, segundo o que nos consta
Luiz Nazário, nasce de uma imbricação entre o ódio da massa inclinada a
pogrons e excitada por pregadores e o poder de morte do Estado1.
Na mentalidade lusitana, o crime e o pecado eram observados por
Ordenações e Regimentos Inquisitoriais, onde a máxima era: “aquele
que violenta a lei será violentado por ela”2, já que a coroa e o altar
eram intrinsecamente unidos em uma mesma concepção de poder.
Não obstante, suas colônias eram diretamente influenciadas por
este ditame cultural, sofrendo miscigenações diversas, mas sempre
participantes desta densa atmosfera legislativa e religiosa.
No Brasil, a fé semeada pela Evangelização desde os primeiros
missionários jesuítas constituía um norteador da colônia, perpassando
as mentalidades éticas e morais, para compor a própria compreensão
de existência subjetiva desde os senhores de engenho até os escravos
cristianizados.
Conforme afirma Teodoro Sampaio, para não se “(...) perder
de vista que era esta uma terra de degredo, com uma sociedade
transplantada a regenerar-se”3, a ortodoxia da fé foi observada em três
visitações do Santo Ofício da Inquisição, e dentre elas, última e mais
longa, ao Estado do Grão-Pará, entre os anos de 1763 até 1769, nos
valerá como referência para o desenvolvimento deste trabalho.
Dentre os vários crimes de heresia citados nas atas inquisitoriais
das Visitações, a blasfêmia se destaca significativamente por estar
inserida em um campo de valoração que na história do povo de Deus
é digno de atenção, presente do primeiro ao último livro da Bíblia,
sempre acompanhado de severa proibição.
Blasfêmias e irreverências no Brasil setecentista: A Terceira
Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará em
1763-69 é um estudo sobre o pecado da blasfêmia, até então, somente
empreendido pela ciência teológica, resgatando ideais testamentários
e neo-testamentários, senão, compreendidos a partir da Patrística4
ou por meio de produções atuais de cunho exegético, pastoral ou
doutrinal.
Uma análise do ponto de vista histórico acerca deste pecado explora
um campo ainda pouco visto pela história cultural brasileira, apontando
Autor: Alexandre Ribeiro MartinsOrientador: Geraldo Pieroni
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um indicador de sentido pouquíssimo estudado, capaz de revelar uma
face da identidade colonial setecentista ainda não contemplada.
Para que seja possível tal empreendimento, será de grandiosa
valia a obra de Jean Delumeau, Mentalitès: Histoire des cultures et
des sociétés, 19895, onde o historiador francês faz uma leitura do
cristianismo ocidental e do pecado da blasfêmia em suas diversas
frequências no decorrer dos tempos, correlacionando-a com o
entendimento de lei e de fé próprios a cada contexto.
Outro teórico essencial para elaboração deste estudo é o historiador
Roger Chartier, na obra A beira da falésia. A história entre certezas
e inquietudes, 2002, em especial: O Mundo como representação pp.
61-79, dando instrumentos teóricos para compreender principalmente
o conceito de representação, apontando a realidade como uma
representação intelectual significada a partir do grupo social de
indivíduos que dela participa.
Uma vez iluminados por ambos os teóricos que dão margem
de entendimento da sociedade e seus valores, nos debruçaremos
em Mircea Eliade, uma vez que o campo pelo qual este trabalho
desenvolver-se-á será o da religião.
Para Eliade, na obra O Sagrado e o Profano, 1996, a essência do
homem religioso se dá pela existência de duas realidades norteadoras,
a do sagrado e a do profano6, e é justamente nesta dualidade que
percorre a cultura colonial, quando o pecado situa-se no profano, e
a heresia blasfêmica, em sua representação simbólica a profanação
pública de maior gravidade.
Além da visão dualista proposta por Eliade, na análise dos casos
de confissões e denunciações, será de interessante aplicabilidade
a obra de Mikhail Bakhtin, A Cultura Popular na Idade Média e no
Renascimento – O Contexto de François Rabelais, 1987, uma vez que
o teórico russo afirma haver na negação uma forma de valorização da
religião por meio de uma alegoria popular e do realismo grotesco.
Desta forma, quando lemos o cometimento do pecado da
blasfêmia pelos colonos ultramarinos no Livro da Visitação, a partir
de Jean Delumeau, Roger Chartier, Mircea Eliade e Mikhain Bakhtin,
contamos com uma significação da qual emergem sentidos não
somente apreendidos em uma leitura comum, mas, a possibilidade de
entendermos manifestações simbólicas e materiais que nos remetem a
relações de poder e de cultura existentes no Brasil do século XVIII.
Para tanto, serão utilizadas duas fontes primárias: O livro da
Visitação do Santo Ofício ao Estado do Grão-Pará, 1763-69, onde
encontramos as confissões e denunciações depostas contra os hereges
e pecadores aos inquisidores, e como constituição jurídica e religiosa,
as Ordenações Filipinas, impressas em 1603, e em especial o livro V,
referente aos códigos penais e ao tratamento com os infratores.
As Ordenações Filipinas constituem uma importante fonte na
apreensão de sentido jurídico e religioso, pelas quais poderemos colher
os fundamentos que nos nortearão no entendimento das diversas
situações relatadas nas confissões e denunciações, uma vez que,
além de uma jurisdição complexa, a Igreja passava por um período de
compreensão teológica, dogmática e pastoral próprios da época.
Articulando estas fontes a partir dos instrumentos teóricos
fornecidos pelos autores acima citados, no primeiro capítulo deste
trabalho voltaremos nosso olhar para fé lusitana, a partir de seus
mecanismos contextuais, e em desdobramento, a religiosidade
colonial, abordando as visitações do Santo Ofício e as formas pelas
quais aplicavam seus julgamentos.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 3Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
Para possibilitar este empreendimento, trataremos de conceitos
fundamentais a tal abordagem, como o sentido teológico do pecado
da blasfêmia e sua histórica de significação até a evangelização
portuguesa, e daí, estabeleceremos aproximações entre o pecado e o
crime do ponto de vista jurídico lusitano.
Uma vez alcançado este objetivo, voltaremos nossa atenção, no
segundo capítulo, a Terceira Visitação do Santo Ofício ao Estado do
Grão-Pará, entre os anos de 1763 e 1769, sob a breve justificativa de
entendimento acerca do contexto formal que permeou esta visitação,
para então, tratar especificamente dos pecados aqui denunciados ou
confessados a mesa do Ofício.
Mensurando uma tipologia de pecados e crimes relatados,
nos ateremos especificamente ao pecado da blasfêmia, e mais
especificamente, a blasfêmia pública e oral, presente cinco vezes nas
atas inquisitoriais, e delas, buscaremos colher numa leitura atenta
alguns elementos que nos permitirão alcançar os objetivos propostos,
num estudo do colono a partir se seu crime herético.
1. A FÉ LUSITANA E A RELIGIOSIDADE COLONIAL
Na mesma medida em que o descobrimento da América
apontava para um grande feito do homem europeu que se tornava
matematicamente capaz de desbravar grandes mares com uma
relativa precisão, multidões se dedicavam na Corte com o magismo
e com o maravilhoso em práticas cotidianas de um povo comum e
religioso.
Em especial, Portugal tinha na religião um normatizador que
perpassava a vida social e individual dos católicos ibéricos. A fé
nos dogmas evangélicos e nas sagradas devoções não somente
tangenciava a mentalidade lusitana, como a feria diretamente,
já que o português “(...) não se concebe sem um catolicismo
fervoroso”7.
Arautos do Evangelho, os lusitanos compreendiam a monarquia
como um reflexo do reino celestial, e por isso, por meio da
Inquisição, defendiam e difundiam a fé católica respondendo de
forma zelosa a uma vocação divina.
A figura lusitana do rei era concebida como alguém revestido
de autoridade dada pelo próprio Deus. Em Kantorowicz8,
compreendemos a figura do rei medieval, apontando seu aspecto
duplo, dividido entre a sua existência pública e pessoal. No
que tange a existência pessoal do rei, o autor sustenta numa
primeira instância, a ideia de um homem normal, participante das
efemeridades humanas, repleta de defeitos e infantilidades.
Mas, quando se refere ao aspecto público e político, num
segundo momento, afirma que o rei tem sua imagem transformada
de maneira mística e dogmática, tornando-o eterno, logo, seus
embates jurídicos, filosóficos e religiosos são indiscutíveis.
Segundo o que nos consta Sérgio Buarque de Holanda, herdeiro
desta tradição, o rei de Portugal:
(...) tem seu poder das mãos de Deus, e seu vigário tenente é livre de toda a lei humana. A monarquia, portanto, é a mais importante instituição do Estado português; pelas suas relações com os outros órgãos administrativos e classes sociais é que poderemos ter uma idéia do panorama institucional predominantemente às vésperas da descoberta do Brasil9.
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Foi por meio da instituição do Padroado que a Coroa portuguesa
constituiu-se patrona das missões católicas e instituições
eclesiásticas na África, Ásia e depois da descoberta, no Brasil10.
Uma das respostas concretas ao chamamento de Deus
discernida pelos cristãos ibéricos ao padroado se daria por meio das
navegações, que, além do aspecto religioso, conotava uma busca de
expansão comercial engendrada por fatores políticos diversos.
Arno Wehling e Maria José C. M. Wehling11, reportando-se aos
motivacionais que impeliram os lusitanos a empreitadas marítimas,
partem do pressuposto que é inútil procurar exclusividades,
contudo, dentre os consideráveis, destacam primeiramente os
fatores econômicos, afirmando:
A escassez de ouro na Europa do século XV e sua conseqüente valorização estimularam a busca do ouro africano. Os estabelecimentos pesqueiros controlados pelo rei, pela nobreza e por comerciantes tenderam a expandir-se, beneficiados pelo aumento do consumo. A permanente falta de cereais, sobretudo de trigo, motivou a conquista de Ceuta em 1415, e mais tarde, a colonização de colônias naquelas ilhas. Produtos africanos, como couros e tinturas, além de escravos, eram igualmente valorizados na Europa12.
O cenário político, para os autores, certamente favoreceu a
expansão das navegações, num contexto de: “consolidação da
dinastia de Avis no poder, o emprego da experiência militar da
nobreza, a concorrência do reino de Castela e a própria união,
em 1469, de Castela e Aragão pelo casamento de Isabel e
Fernando”13.
O Império e os lucros somavam-se aos anseios religiosos
inerentes da mentalidade portuguesa. Damião Góis, 1502-1574,
reportando-se à navegação, é um exemplo clássico deste período.
Nós também procuramos – e é lícito confessá-lo – auferir lucros e riquezas, sem os quais a Europa não poderia compensar as despesas enormes que todos os dias fazemos. Merecemos, porém, louvores por não sulcarmos os mares, como outrora fizeram e ainda hoje fazem muitos povos da Itália, da Espanha e da França, quais inermes mercadores em busca só de especiarias, mas com exércitos e armadas, bem apanhadas contra o inimigo, não tanto para a dilatação do nosso Império, como para a expansão de nossas crenças14.
Dando ênfase ao aspecto religioso, imprescindível ao próprio
contexto social português setecentista, temos na Crônica do
descobrimento e conquista da Guiné, em Zurara, a expressão máxima
de um missionário luso comum ao seu tempo:
A quinta razão [das que moveram o infame aos descobrimentos marítimos] foi o grande desejo que havia [o infame] de acrescentar em a santa fé de nosso senhor Jesus Cristo, e trazer a ela todas as almas que se quisessem salvar, conhecendo que todo o mistério da encarnação, morte e paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, foi obrado a este fim, scilicet, por salvação das almas perdidas, as quais o dito senhor queria, por seus trabalhos e despesas, trazer ao verdadeiro caminho15.
Uma vez descoberto o Mundo Novo e instaurado o processo de
colonização, o português define a colônia, como afirma Pero Góis em
1546, escrevendo ao monarca para reclamar do estado caótico em que
se encontrava a Terra Brasilis, pois, “(...) tudo nasce da pouca justiça e
pouco temor de Deus e de Vossa Alteza que em algumas partes desta
terra se faz e há, por onde se, de Vossa Alteza não é provida perder-
se-á todo o Brasil em dois anos”16.
D. João III, três anos depois envia então, como se tivesse ouvido
os apelos de Pero Góis, à colônia Tomé de Sousa e os primeiros
missionários, todos jesuítas, esclarecendo que “(...) a principal causa
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que me moveu a mandar povoar as ditas terras do Brasil foi por que
a gente dela se convertesse à nossa santa fé católica”17 e com isso,
dando início a cristianização em terras tropicais.
Quando os jesuítas chegaram ao Brasil, em 1549, o Concílio de
Trento estava prestes a encerrar sua primeira fase, que, sucedida de
outras duas fases, constituía o Concílio mais longo da história da Igreja,
reafirmando a fé nos dogmas, como resposta à Reforma, conforme
afirma Delumeau, posicionando-se como uma “cidade sitiada”18.
Apesar da descoberta ultramarina representar um trunfo
meridional, o trópico não foi tratado de forma enfática pelo Concílio
da Contra-Reforma, já que “ (...) o concílio foi ecumênico de direito,
não de fato. Representou sobretudo a cristandade (...) da Europa”19.
Não teve nem sequer “(...) um prelado colonial que assistisse às suas
sessões”20.
Conforme afirma Vainfas21, vinculada aos ditames do Concílio de
Trento, a Inquisição ibérica, após meados do século XVI, por meio de
sua abordagem coercitiva, nos permite inseri-la num dos processos
fundamentais da modernidade: a perseguição da cultura e moralidades
populares pela Igreja católica e, nos países protestantes, pelas Igrejas
reformadas articuladas aos poderes civis.
O autor afirma, na obra A heresia dos índios22, a impressão dos
missionários jesuítas com relação aos “selvagens tropicais” numa
gradativa ressignificação, quando numa primeira instância chamaram
alguns rituais indígenas, como os caraíbas, de santidades, para o que
com o passar do tempo considerar-se-iam práticas verdadeiramente
diabólicas, réplicas do sabá europeu, idolatrias rebeldes e heréticas.
Salientam-se desde as primeiras impressões dos missionários com
os nativos a repressão e o rigor no trato com os blasfemadores,
considerando desde as origens a profissão de fé indígena como
blasfêmicas e irreverentes contra Deus.
A Igreja enquanto instituição, não ficaria ociosa com relação a
tal emergência, tomando iniciativas para que na colônia a fé fosse
observada a partir dos mesmos padrões que regiam a Metrópole,
exercendo da mesma forma os mecanismos inquisitoriais para que
assim o fizesse.
1.1 As visitações do santo ofício no Brasil
Degredados para o Brasil, por causa do cometimento do pecado
da blasfêmia, vários cristãos ibéricos uniram-se aos colonos, para
representar uma parcela considerável de crentes distantes de qualquer
tipo de vigilância e observação, devido à imensidade do território
brasileiro e da, ainda, precária estruturação eclesiástica institucional
na colônia.
Fazendo um levantamento histórico acerca dos processos
inquisitoriais na Europa que resultaram no degredo ao Brasil, devido
ao cometimento exclusivo do pecado blasfêmico, situamos: Lisboa,
Coimbra e Évora. Os processos de Lisboa23 em específico são:
processo 746: Francisco de Almeida Negrão; 956: Manuel João; 1491:
João Nunes; 5703: Antônio Luís de Meneses; 8821: Serafim Leite e o
processo 12231: Pero de Carvalhais.
Em Coimbra24, temos o processo 1716: Silvestre da Silva, e em
Évora25: processo 2004: Antônio Pires; 2462: Diogo da Cruz; 2595:
Francisco dos Arcos; 4537: Luís Cabral; 5585: André Vicente; 5649:
Pedro Afonso; 6963: Diogo Pacheco de Mendonça; 7697: Maria Soares
e o processo 11677: Diogo Alfaia.
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Preocupados com as heresias tropicais, os lusitanos estendendo
seus olhares para colônia, enviaram ao Brasil três visitações do Santo
Ofício da Santa Inquisição26, a primeira entre 1591-95, a segunda entre
1618-21 e a terceira entre 1763-69.
Siqueira afirma, referindo-se as denúncias relatadas nas visitações
da Bahia e Pernambuco, que a blasfêmia na colônia foi alvo da
observância inquisitorial, pois:
(...) [nas] visitações, centenas de confissões e de denúncias foram consignadas por escrito e, em meio aos acusados, encontramos muitos blasfemadores. Nas visitações à Bahia e a Pernambuco, 283 faltas foram confessadas, sendo que as que aparecem com mais freqüência são as blasfêmias. Contam-se 68 expressões insultantes que renegam a Deus, zombam dos santos ou colocam em dúvida a virgindade de Maria. Nas de denúncias da Bahia e de Pernambuco, entre as 950 coletadas, 90 são blasfêmias e 177 referem-se a desrespeito a Jesus Cristo, à Virgem, aos santos e aos sacramentos, além de 58 expressões que contêm palavras injuriosas. Um total de 335 casos que representam 34% dos crimes denunciados27.
Logo, embasados nos dados de Siqueira, acima citados,
temos graficamente a seguinte representação acerca dos pecados
confessados em relação à presença da blasfêmia:
A porção de número 2 representa o pecado da blasfêmia,
inserida na porção maior, referente aos demais pecados confessados,
configurando só a blasfêmia uma proporção de 24% do total das
confissões relatadas pelas atas inquisitoriais.
Dentre os pecados denunciados, temos da mesma forma a
constatação gráfica para melhor entendimento do cometimento de tal
crime, segundo o que nos consta:
Neste caso, 30% do total dos casos de pecados denunciados
a mesa inquisitorial nas Visitações, segundo ainda, Siqueira , são
referentes à blasfêmia, direta ou indiretamente, conotando mais uma
vez a frequência com que era cometido.
Assim, o gráfico final que representa estatisticamente esta questão
se constitui da seguinte forma:
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Um total de 34% dos casos relatados tem relação com a blasfêmia,
ao passo que os outros 66% constituem os demais crimes pegos
pela malha inquisitorial. Diante destas estatísticas, fica perceptível
o quanto era frequente o cometimento desta heresia carregada de
sentido simbólico: Mas quais os fatores ou motivos que realmente as
engendraram?
Delumeau nos abrilhanta com a compreensão de que a blasfêmia
é um dos pecados que, quando cometidos com uma certa frequência,
indicam um período de instabilidade mental29, e como não poderia
deixar de ser, no Brasil o impacto da cultura européia na evangelização
sobrepôs-se à cultura tropical e inseriu o colono em um novo campo de
valores, abalando-o em suas estruturas fundamentais.
Ao intitular o cristianismo do século XVI e XVII como “civilização da
blasfêmia”30, o historiador aponta para existência de uma religiosidade
superficial, marcada pela teatralização da fé, esvaziada de seu sentido
originário. Para tanto, afirma que “injúrias e blasfêmias (os termos
não são sinônimos) constituem, sem dúvida, um revelador de um
determinado grupo social e de seus valores aceitos e rejeitados”31.
Reportando a este revelador de valores sociais, afirmado por
Delumeau, de maneira complementar, encontramos em Roger Chartier
a possibilidade de compreensão das identidades sociais nas relações
impostas pelos detentores de poder, mas também, pela atribuição de
importância das representações sociais que cada grupo estabelece.
Para Chartier, a representação é uma configuração intelectual
pela qual a realidade é constituída, num reconhecimento da própria
identidade social dos indivíduos onde se evidenciam significados,
tornando então possível emergirem valores e identidades tanto
individuais quanto sócio-culturais32.
Logo, compreender o pecado da blasfêmia no Brasil setecentista,
é compreender um signo de pensamento teórico que estabelece
possibilidades de entendimento das modalidades variáveis que
discriminam categorias de significados33 próprios dos autóctones,
negros africanos, mulatos brasileiros e brancos portugueses.
Para que se possa entender a blasfêmia colonial inserida neste
ínterim, antes, faz-se necessário a compreensão da legislação
lusitana, que estendida às suas colônias, fundamentava o imaginário
da evangelização e das missões empreendidas, que além de apontar o
cometimento do pecado da heresia em sua instância religiosa, também
significava diretamente um crime previsto pela constituição.
1.2 Os dois braços da justiça: eclesiástico e secular
1.2.1 O Logos e a blasfêmia
No cenário cristão, a palavra tem um significado especial,
principalmente a partir da Patrística, também chamada teologia
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dos Grandes Padres da Igreja, no período Medieval, e cujas raízes
permaneceram por muito tempo, e em especial na Europa cristã, no
sentido hermenêutico e exegético das Sagradas Escrituras.
A própria revelação de Deus nos escritos testamentários aponta
sua relação íntima com a palavra, quando a comunidade trinitária se
torna manifesta pelo Espírito Santo, que no vocabulário original é
citado como: tò pneuma tò hágion34.
A expressão grega pneuma, que pode ser entendida na vernácula
como uma espécie de sopro, um suspiro que emana do interior de
Deus, só se concretiza por meio do Logos, citado desde o livro do
Gênese como palavra criadora, até sua encarnação como o ápice do
plano de Deus, conforme nos atesta o Evangelho de João no primeiro
capítulo, na pessoa de Jesus Cristo35.
Santo Agostinho, referindo-se à gratidão humana que se tornava
uma vocação, afirmava que “a despeito de tudo, o homem, pequena
parcela de vossa criação quer louvar-vos”36, fazendo-o por meio da
palavra, capaz de exprimir o que se encontra no coração37.
Justamente contrária a tal propósito, a blasfêmia configura uma
ruptura com o plano divino e com a própria natureza da criação, por
meio da palavra, denegrindo e ofendendo a Deus e a sua Igreja.
Por essa razão, São Tomás de Aquino afirma que, quando o homem
por livre iniciativa comete um pecado de tamanha gravidade, não é
digno de perdão, pela justificativa de que “quando a vontade se volta
para uma coisa contrária à caridade pela qual estamos ordenados ao
fim último, há no pecado, por seu próprio objeto, matéria para ser
mortal (...)[como] contra o amor a Deus, como a blasfêmia”38.
A própria sagrada escritura confirma a gravidade da blasfêmia,
quando o evangelista Mateus relata o que Jesus disse aos seus
discípulos, que: “se alguém tiver pronunciado uma blasfêmia contra o
Espírito Santo, não lhe será perdoada nem no presente, nem no século
futuro” .
Luiz de Granada no Guia dos pecadores, do século XVI, afirma,
corroborando São Tomás de Aquino e Santo Agostinho que: “Dos
pecados mortais, o mais grave é a blasfêmia, muito próximo dos três
pecados mais graves do mundo que são a infidelidade, a desesperança
e a ira contra Deus, no absoluto o mais grave de todos”40.
A epistemologia da palavra blasfêmia remete-nos a duas palavras
gregas: blaptein (lesar, ferir, danificar) e phème (reputação). Blapto,
estragar, destruir; phain, tornar visível. Consiste basicamente em
danificar a imagem de alguém, de maneira pública, de forma oral
principalmente.
Pieroni, na obra Os Excluídos do Reino, cita, referente a esta
questão, Nicolau Eymerich no trato com os blasfemadores, afirmando
o seguinte: “(...) o caso deles compete ao tribunal da Inquisição? Se
afirmativo, os blasfemadores devem ser considerados como heréticos
ou como suspeito de heresia?”41.
A resposta a tal questionamento é retirada da obra O dicionário
dos Inquisidores, afirmando o seguinte: “Existem dois tipos de
blasfemadores que não se pode confundir, (...) [o primeiro é constituído]
por aqueles que não se opõem aos artigos da fé (...). Mesmo que o
Santo Ofício não se interesse pelos blasfemadores simples, eles deve
ser castigados” .
O segundo tipo de blasfemador, em compensação, é tratado de
maneira severa pela Inquisição, conforme nos consta: “(...) mas há um
outro tipo de blasfemadores que proferem ataques diretos contra os
artigos de fé. Atacam de frente a onipotência divina (...). Por meio
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 9Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
disso, negam o primeiro artigo da fé”, e a estes, “(...) serão tratados
como heréticos, e os inquisidores podem persegui-los”43.
A perseguição inquisitorial, contudo, não se dava de forma aleatória
segundo julgamentos de valores propriamente subjetivos dos juízes, pois,
partia de uma legislação com categorias detalhadas e minuciosas para o
trato de tal irreverência tanto na Metrópole, como na colônia brasileira.
1.2.2 O pecado e o crime
As Ordenações Filipinas, impressas em 1603, constituíram por
muito tempo a legislação lusitana, precedidas pelas ordenações
Afonsinas e Manuelinas, responsáveis pela sustentação jurídica e
religiosa tanto da Metrópole como de suas colônias.
No Brasil colônia, o primeiro bispado criado, contemporâneo à
formação do governo geral, pertencia à capitania da Bahia, subordinada
ao arcebispado de Lisboa. A esse bispado, desmembraram-se duas
prelazias: uma no Rio de Janeiro e outra em Pernambuco.
A prelazia do Rio de Janeiro foi autorizada em 19 de julho de
1575, pelo papa Gregório XIII, compreendendo as capitanias de São
Vicente, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Porto Seguro, e a prelazia
de Pernambuco, instituída pelo papa Paulo V, em 1614, abrangendo
Pernambuco, Paraíba e Maranhão44.
A prelazia, criada em 1614, contudo, teve uma breve duração,
sendo revogada em 1624, e seu território voltou a fazer parte da
diocese de Salvador.
Referindo-se a esta condição, Salgado afirma que a administração
de ambos os prelados era independente da diocese baiana, contudo,
continuavam sujeitos ao bispado de Salvador. 45
Ao final do século XVII, foram criados mais três bispados: o
do Rio de Janeiro, em 1676; o bispado de Olinda, em 1676, e o
bispado do Maranhão, em 1677 , elevando a Bahia a condição de
arcebispado, por iniciativa do papa Inocêncio XI.
Um outro bispado brasileiro foi instituído na capitania do Grão-
Pará, no ano de 1719, subordinado não ao arcebispado da Bahia,
mas ao de Lisboa, desmembrando-se da diocese do Maranhão,
outrora pertencente.
Em nota oficial do arcebispado da Bahia, encontramos
uma justificativa para tal desdobramento entre as dioceses e
prelazias:
O arcebispo da Bahia expõe a V. M. por este Conselho em carta de 24 de janeiro deste presente ano, que por carta de 06 de setembro do ano próximo passado, lhe ordenou V. M. desse o seu consentimento para se erigirem dois bispados naquela América, além dos que já estão eretos e que não somente dá o seu consentimento, mas muitas graças a Deus Nosso Senhor por inspirar a V. M. tão pio e católico zela pela salvação de seus vassalos em querer lhes dar Pastores que de mais perto possam conhecer e remediar as suas ovelhas, visto como as grandes distâncias dos três bispados Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco lhes dificultam e quase impossibilitam as visitas que tanto encomenda o Santo Concílio Tridentino46.
O Brasil, portanto, contava com dois eixos jurídicos, o arcebispado
da Bahia, embasado pelas Constituições Primeiras do Arcebispado
da Bahia47, de 1707, e o Estado do Maranhão e do Grão-Pará,
pertencentes ao arcebispado de Lisboa, e conseqüentemente, regidos
pelas Ordenações Filipinas, diretamente.
Conforme afirma Pieroni, nas Ordenações Filipinas, as punições
impostas aos hereges eram severas, pois:
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A expressão que designa a pena de morte - morra por ello - é freqüente. Mas a sentença morra por ello, bem como a morra por isso, não significa unicamente a morte física, mas pode às vezes significar a morte civil, a qual excluía o condenado de seu meio social por uma condenação ao degredo48.
As Ordenações Filipinas, assim como as Afonsinas e Manuelinas,
e mais tarde, pelas Constituições Primeiras do Arcebispado da
Bahia, eram compostas por cinco livros, aos quais encontravam-se
normatizações tanto civis como religiosas.
Nas Ordenações, em especial no livro V, nos 21 títulos referentes
ao direito e procedimentos penais, consta o tratamento com os hereges
e o que em especial nos interessa, o trato com os blasfemadores.
No título: “Dos Heréticos e dos Apóstatas”, primeira matéria do
livro V das Ordenações Filipinas, a heresia encontra-se no mesmo
âmago de um crime. Herético era, portanto, a pessoa que sustentava
com tenacidade um sentimento errôneo acerca de algum dogma de fé,
afastando-se da religião oficial49, e por isso, fora da lei.
Apontando diretamente para a blasfêmia, as Ordenações, no título
II fazem uma série de observações. “Dos que arrenegão, on blasfemão
de Deos, ou dos Santos”50, é a citação que encabeça o texto, composto
de multas e penas para quem assim o fizesse.
Para tanto, nas Ordenações encontramos a seguinte exortação:
Qualquer que arrenegar, descrer, ou pezar de Deos, ou de sua Santa Fé, ou disser outras bla sfêmias, pola primeira vez, sendo Fidalgo, pague vinte cruzados, e seja degradado hum anno para Africa. E sendo Cavalleiro, ou Scudeiro, pague quatro mil reis, e seja degradado hum anno para Africa.E se fòr peão, dem-lhe trinta açoutes ao pé do Pelourinho com baraço e pregão, e pague dous mil reis. E pola segunda vez, todos os sobreditos incorram nas mesmas penas em dobro.
E pola terceira vez, além da pena pecuniária, sejam degradados trez annos para Africa, e se for peão, para as Galés51.
Evidencia-se neste caso, a partir do que consta nas Ordenações
que as penas para os hereges que arrenegavam a Deus, Jesus ou
a Virgem Maria, eram relativas ao papel social exercido por cada
categoria de indivíduos na colônia, sem deixar de lado o fato de que
todos participavam de um comum resultado: a punição.
Da mesma forma, contudo, com menores penas, as Ordenações
estipulavam o tratamento com os que “descrendo, pezando, ou
dizendo outras blasfemias contra algum Santo”52, com cobrança de
taxas, sem, no entanto, penalizar com morte ou degredo.
O próprio Livro V das Ordenações, apesar de estipular penas
relativas à gravidade das blasfêmias, deixa uma brecha jurídica,
dando liberdade interpretativa aos Julgadores, conforme nos
consta:
Porém, se alguma pessoa de qualquer condição per algumas outras palavras mais enormes e fêas blasfemar, ou arrenegar de nosso Senhor, ou de nossa Senhora, ou da sua Fé, ou dos seus Santos, fique em alvidrio dos Julgadores lhe darem outras maiores penas corporeaes, segundo lhes per direito parecer, havendo respeito à graveza das palavras, e qualidade das pessoas, e do tempo e lugar, onde forem ditas53.
Conjecturamos que Giraldo Joze de Abranches, em 1763, ao
chegar no Estado do “Pará, Maranhão e Ryo negro”54 para a Visitação
do Santo Ofício da Inquisição, comungava e sobretudo, aplicaria,
justamente estes valores presentes nas Ordenações.
Consta na ata de comissão para abertura oficial da Visitação a
delegação de autoridade total em nome da Igreja, para o visitador
Abranches, legitimado da seguinte forma: “Nossas vezes, e damos
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 11Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
inteyro poder. E pella mesma Autoridade Apostolica mandamos em
virtude de Santa Obediência e Sob pena de excomunhaõ”55.
Uma vez revestido de autoridade, a metafórica afirmação de
Souza apresentando a visitação como uma colheita, os visitadores
como os colheitadores que colhiam os frutos dos evangelizadores, que
semearam a palavra56, então se concretiza na colônia.
A efetivação da visitação inquisitorial no Brasil, portanto,
embasada pelos pressupostos teóricos elaborados neste capítulo,
se dará, sobretudo, a partir de confissões e denunciações, dentre as
quais, trataremos com especial atenção os casos relativos à blasfêmia,
analisados no capítulo que se segue.
2. A TERCEIRA VISITAÇÃO DO SANTO OFÍCIO AO ESTADO DO GRÃO-PARÁ
Antecipando a vinda do visitador Giraldo José de Abranches,
enviado a Belém em 1763, o irmão do ministro Sebastião José de
Carvalho e Melo, Francisco Xavier de Mendonça Furtado ocupava o
posto de secretário da Marinha e Negócios Ultramarinos, depois de
governar o Estado do Grão-Pará e Maranhão na década anterior a
Visitação.
Foi Francisco Xavier de Mendonça Furtado, neste mesmo período,
o responsável pela aplicação das reformas pombalinas, determinando
o fim da preeminência das ordens religiosas, em colaboração com os
bispos frei Miguel de Bulhões e, seu substituto, frei João de São José
e Queiroz57.
Na realidade, a reforma pombalina não significou o enfraquecimento
da Igreja na retirada de ordens regulares importantes, mas antes,
conotou a preponderância do papel exercido pelos bispos e pelo clero
secular, reforçando o poderio do diocesano frente às ordens religiosas
que favoreciam a descentralização do poder do Estado58.
Levando em consideração estes fatores sociais e religiosos, situa-
se a Terceira Visitação, como forma de corroborar o poderio régio,
acionando mecanismos eficazes de coerção e controle.
O visitador oficial, outrora Inquisidor Apostólico da Inquisição de
Évora, enviado pela diocese de Lisboa, antes de fixado nos trópicos,
assina uma ata de comissão, expondo a seriedade com que seria
promulgado o Ofício Divino da seguinte forma:
No delicto, E crime de herezia, E apoztazia, no de peccado nefando, ou Em Outro qualquer, que pertença Ao Santo Officio da Inquizicão, tomar aprezentacoens E quais quer denunciacoens e informacoens Testemunhadas Contras ellas E aSim Oz fautores, receptores, a defensores das mesmas E pera que possa fazer, e faca Contra Oz culpados acada hum delles processos imforma descida de Direyto, Sendo necessário Segundo a forma d aBulla da Inquizição e Breves Concedidos ao Santo officio,E pera que possa prender Aos dittos Culpados, e Sentencialos Em final Conforme o regimento, e fazer todas as mais couzas, que ao dito cargo de Inquizidor, e Vizitador do Santo Officio pertençen; E pera todo o Sobre ditto e Suas dependências lhe cometemos, Nossas vezes, a damos inteyro poder59.
Assim, depois da formação de uma outra comissão, mais uma vez
criada para oficializar o envio de Abranches a colônia, ainda, foi necessário
a promulgação de uma “Provizao do Notario60”, com informações do
notário e acompanhante do inquisidor, padre Ignacio Joze Pastana.
Uma vez feito isso, estabeleceu-se uma “Provizaõ de Meirinho”61
para acompanhar o visitador durante sua estadia no Brasil, para o
Estado do Grão-Pará e Maranhão, em 19 de setembro de 1763. Aos
23 dias do mês de setembro do mesmo ano, apresentou-se ao Senado
da Câmara das Provisões e Comissões dos Senhores do Conselho
Geral o Senhor inquisidor Visitador62.
12Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
Finalmente, no dia 25 de setembro 1763, assinaram oficializando o
início da Terceira Visitação da Inquisição, “Giraldo Joze de Abanches,
Custodio Joze da Conceicaõ, p.Ignacio Joze Pastana, Sebastiaõ Vieira
dos Santos e Andre Joze Pinheiro”63, e com isso, observando de modo
oficial os colonos do Arcebispado de Lisboa em terras além mar.
É desta forma que o Brasil recebe um ofício que se torna
santificado, já que seus objetivos visavam eliminar as anomalias sociais
naquilo em que feriam a Igreja Católica como instituição, bem como
sua doutrina e os seus agentes. Para tanto, vários crimes de heresia
foram observados e postos em julgamento, e para melhor entender o
pecado em seu contexto, convém-nos um estudo inicial acerca de sua
diversidade e particularidade.
2.1 Tipologia dos pecados
Nas confissões e denunciações da Visitação do Santo Ofício ao
Estado do Grão-Pará e Maranhão, vários foram os crimes relatados
nas atas inquisitoriais. Analisando os quarenta e seis casos presentes
no Livro da Visitação, constamos a seguinte tipologia de pecados:
Perpassando as mais diversas formas de expressão religiosa, os
pecados cometidos na colônia estabelecem vínculos entre a fé lusitana,
mesclada de elementos populares, com a religiosidade dos escravos
e dos índios, dando ao Brasil exclusividade em vários aspectos, se
comparado aos crimes ultramarinos.
A feitiçaria é um forte indício desta miscigenação, já que, diferente
da Europa, o folclore que circunda o feitiço não está relacionado
diretamente aos ritos demoníacos característicos da Idade Média,
como em várias instâncias constam as atas inquisitoriais de Coimbra,
Lisboa e Évora, mas na grande maioria, no Brasil, estão vinculados
com rituais indígenas ou ainda, com manifestações religiosas dos
escravos64.
A blasfêmia é o crime que aparece com maior frequência, e para
tanto, convém distingui-la em suas instâncias, pois, basicamente,
conforme pude relatar, em suas vinte e duas ocorrências, alterna-se
metodologicamente em três diferentes aplicações.
A primeira se refere a rezas e orações, que feriam diretamente
as verdades da fé da Igreja e seus ensinamentos, cometida doze
vezes, motivada provavelmente pelas mesmas circunstâncias que
engendraram as feitiçarias, resultantes das diversas influências
culturais que sofreu o colono no século XVIII.
O segundo tipo é o de blasfêmias pronunciadas em momentos
de cólera ou furor, ofendendo publicamente a Deus. É justamente na
análise deste tipo específico de blasfêmia que ocorre por cinco vezes,
é que trataremos a seguir, com o intuito de estabelecer aproximações
de compreensão acerca do colono e sua religiosidade, do ponto de
vista histórico e cultural.
Já a terceira e última forma de blasfêmia, seis vezes relatada,
é a que acontece reforçada com o manuseio de objetos sagrados,
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 13Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
também chamados de sacramentais, onde se destacam as heresias
que envolvem o crucifixo ou objetos litúrgicos usados na Missa.
Desta forma, temos a seguinte proporção:
Dentre estes cinco casos, temos três denunciações e duas
apresentações e confissões, configurando um total de 60% de
acusações em relação aos 40% de apresentações e confissões,
conforme nos consta:
Com 22% do total dos casos, as blasfêmias orais denunciadas
(60%) e confessadas (40%) constituem uma fonte de significados
dos quais o cotidiano do colono se revela em suas nuanças próprias,
possibilitando perceber valores que emergem nas particularidades das
circunstâncias apresentadas à mesa do Santo Ofício.
2.2 Análise dos casos
2.2.1 O vômito do monstro
No livro do Apocalipse, a blasfêmia é a besta arrogante, o monstro
disforme cujo vômito em todos os instantes se volta à ofensa contra
Deus. Arrebatado, afirma o apóstolo João: “a fera abriu a boca em
blasfêmia contra Deus, para insultar o seu nome”65.
Tanto nas Sagradas Escrituras quanto no imaginário luso-brasileiro,
o monstro blasfemador deveria ser vencido. Não obstante, ou pelo
poder eclesiástico ou pelo poder laico, não seria aceitável deixar
impune tamanha heresia, assim como Deus não deixara, exterminando
no final dos tempos Satanás66 com um sopro poderoso67.
Nos relatos das confissões e denunciações na Terceira Visitação,
as blasfêmias eram na grande maioria cometidas em atos de cólera ou
de desilusão. Contudo, remetiam a uma simbologia que perpassava os
simples questionamentos ou desabafos, para uma fonte de significados
que, além de conotar a fé e seus deslizes, também possibilita a
compreensão do colono em seu momento de fraqueza, dando brechas
de entendimento da personalidade e subjetividade comum ao seu
tempo.
Assim se deu com padre Miguel Angelo de Morais, de 67 anos,
sacerdote do hábito de São Pedro e cura da Freguesia de Nossa
Senhora do Rosário. Morais dirigiu-se a Giraldo Joze de Abranches
para denunciar o primeiro caso de blasfêmia encontrado nas atas de
14Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
denunciações, registrado aos 10 dias do mês de outubro de 1763.
O denunciado era o Sargento Mor Engenheiro, conhecido como
Gronfelt, que blasfemou por construir uma interpretação teológica e
dogmática de forma depreciativa, afirmando:
Que Deos parecia iniquoo; porque Sabendo que huma alma Se havia peder a errava neste mundo E que aSim o Sentiaõ e diziaõ Os Luteranos que pareciaõ tinhaõ razão dando Outras Muntas68.
Padre Miguel, diante de tamanha heresia, afirma em sua
denunciação que exortou severamente Gronfelt acerca de seu nefando
erro, contudo, relata que o Engenheiro continuava a blasfemar.
Ao proferir sua provocante afirmação chamando Deus de iníquo,
o denunciado, além de contrapor-se à onisciência de Deus, também
feria diretamente uma verdade de fé, o livre arbítrio, defendido por
vários expoentes da doutrina católica como forma de interpretação da
economia da salvação desde Adão e Eva.
Já dizia Santo Irineu, no século II, que “o homem é dotado de
razão e por isso é semelhante a Deus: foi criado livre e senhor de
seus atos”69. Logo, a Igreja entendia que Deus não interferia nos atos
humanos de forma direta, e, portanto, negar em pleno século XVIII
esta realidade, era desconsiderar dezesseis séculos de uma verdade
de fé professada.
Passados aproximadamente dois meses, o padre novamente
se defronta com o Sargento tecendo heresias, desta vez ferindo a
crença e veneração dos santos e suas imagens, dizendo publicamente
que: “Muntos Santos Cujas Imagens Estaõ nos Altares Estaõ ardendo
suas almas nos infernos”70.
Mais uma vez padre Miguel repreende o blasfemador
afirmando que o Papa não erra em seus pronunciamentos e decretos,
num contexto onde a crença na infalibilidade já existia, contudo, só
formalmente oficializada no Concílio Vaticano I no século XIX.
Desde o século XII, a canonização passou a ser proclamada pelo
Papa de forma oficial para culto e veneração. No século XVI, após o
Concílio de Trento, surgiu a exigência da comprovação científica dos
milagres como forma de garantir ainda mais a fidedignidade do santo.
Justamente por isso, a blasfêmia feria não somente ao plano
espiritual com suas audaciosas afirmações, mas atingia diretamente
também, ao dar razão aos luteranos, a Igreja institucional e o Império,
também chamados de “corpo de Cristo”.
Mais umas vez repreendido, o blasfemador não demonstrou
arrependimento, e por isso, não escapou dos olhares inquisidores, já
que seus atos eram inaceitáveis à Igreja setecentista.
A Igreja do século XVIII era marcadamente caracterizada pela sua
forte união com o Estado, ainda mais quando os motivacionais cristãos
no Brasil embasaram-se na “(...) evangelização antes por razões de
Estado do que pelas da Alma”71.
Logo, o intuito de preservar a imagem do Estado era fundamental
para Inquisição tanto quando a preservação da fé, por isso, quando
Deus era chamado “injusto ou iníquo”, na realidade, era ao rei um
possível insulto ou irreverência.
Pieroni acerca da relação da blasfêmia com os poderios laico e
secular, afirma que :
Os esforços das autoridades reais na repressão da blasfêmia encontram-se justificado pela teoria do direito divino. A blasfêmia é considerada atentatória à Majestade Divina e a seu representante no Reino; o rei é o emissário de Deus no território onde reina e, portanto, deve cuidar para que Deus não seja insultado. Nesse sentido, injuriar a Deus é injuriar o próprio rei72.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 15Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
É visando esta vertente interpretativa cujos desdobramentos de
fé poderiam inferir na coroa e vice e versa que as Ordenações tratam
de modo rigoroso qualquer desacato ao poder. No título VII do Livro V,
Dos que dizem mal de-Rey, existe inclusive a inferência de que a pena
diante de tal desacato poderia resultar em morte, “tendo as palavras
taes qualidades, porque a mereça”73.
Sob este viés, o caso do padre Miguel Angelo de Morais ganha
um sentido próprio numa perspectiva temporal e presente ao campo
político, com nuanças complementares acerca da blasfêmia presenciada
e posta em julgamento.
A partir desta mesma perspectiva de análise é que a confissão de
Dionisio de Affonseca, enxertado em húmus diversos, se constitui uma
afronta aos poderios régio e sagrado, apesar de apresentar-se de forma
branda aos olhos desatentos, mas não aos inquisidores.
O jovem de 26 anos, clérigo e capelão Tonsurado, aos sete dias de
abril de 1764, na cidade do Pará, dirigiu-se ao tribunal para confessar sua
blasfêmia proferida em um ato de desconsolo perante sua enfermidade.
Encontrando-se na casa de sua tia Escolastica de Souza, oprimido
de uma grave doença que perdurava há um ano, sofrendo além da febre,
fortes dores no corpo, blasfemou diante de sua tia e de duas irmãs,
quando disse:
Que os diabos o leuasem ja para os infernos = porque janaõ Esperaua Saude, E que Deos o Sepultase tambem nos infernos porque desesperou da Sua Mizericordia, pois estando daquella Sorte de Nada Seruia Neste Mundo, aranhando se pela cabeça E puxando se pellos proprios Cabelos74.
E disse que não muito distante disso, ainda na casa de sua tia,
conversando com Francisco da Costa Barboza, com suas tias e outras
pessoas que ali se encontravam, reparava que:
Deos Nosso Senhor Castigaua a alguns por huma culpa So E naõ Castigaua a Outras que tinhaõ innumeraveis Culpas E alguns destes por hum acto de contriçaõ que fariaõ na hora de Sua morte de Salvaçaõ, e que alguns dos Outros tendo ouvido bem huma culpa So Se perdiaõ .
Poder e justiça, duas palavras subentendidas na confissão e que
ecoavam pelos ouvidos dos visitadores com gravidades simbólicas
que dificilmente não seriam observadas e punidas caso não houvesse
contrição.
Do ponto de vista teologal, São Tomás de Aquino, um dos grandes
nomes que fundamentava a compreensão da Igreja do século XVIII,
acerca desta questão dizia que “em Deus o poder e a essência (...), a
sabedoria e a justiça são uma coisa só e mesma coisa”76, logo, poder
e justiça estavam intrínsecos a própria essência de Deus, e negar tais
valores, era negar a própria ontologia sagrada.
Neste ínterim, outro agravante pesava sobre a mesa da Inquisição,
pois, atribuir ao rei ausência de poder ou justiça, configurava num
crime gravíssimo de julgamento exclusivo, pois, “o que disser mal de
seu Rey, não será julgado per outro Juiz, senão por elle mesmo”77.
Desta forma, tanto no plano espiritual quanto no plano material,
o pecado e o crime deveriam ser tratados com o rigor que imprimisse
seriedade ao julgamento, a fim de guiar o rebanho de Cristo aos retos
caminhos78.
A língua impura que se desviava do aprisco e que atacava
veemente a Deus e sua Igreja, também poderia ser agravada por ações
que moviam a blasfêmia, ou seja, a atos blasfêmicos que aumentavam
o teor da heresia.
É por isso que no Dicionário dos inquisidores, de forma muito
didática existe a seguinte instrução:
16Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
E aqueles que blasfemam por ações? Aqueles que jogam pedras ou excrementos na figura do Nosso Senhor Jesus Cristo, ou sobre a cruz, ou sobre a Virgem Maria, ou sobre qualquer santo, com quais penas serão punidos? Os canonistas explicavam-se a esse propósito. Um fulano joga uma pedra ao acaso. Por acaso, a pedra atinge a imagem de Cristo. Não há crime de lesa-majestade. Ao contrário, há crime de lesa-majestade se a pedra for deliberadamente lançada para tocar a imagem e se ela tocá-la, efetivamente. Aquele que age assim deve ser punido por crime de lesa-majestade e deve morrer (...) pois isso é um ato irreverente .
Blasfemar por ação, ferir objetos de representação religiosa
ou ainda, desrespeitar a Eucaristia, eram os crimes cometidos e
denunciados a mesa inquisitorial no dia 26 de agosto de 1765, na
cidade do Belém do Pará, pelo denunciante encarcerado Luis de Souza
Sylva, residente do presídio da Freguesia de Santo Antonio da Villa de
Campo Mayor do Morumbi, sem ofício, e de idade de 28 anos.
Seis meses depois de sua prisão, Luis afirma que um outro detento,
Francisco Joze, alfaiate natural do Reino era um constante blasfemador
e herético, e que o mesmo testemunharam vários outros detentos.
Dizia Francisco Joze que “(...) naõ há Deos, E que o Deos que ha
o piza debaxo dos pes.”80. Por várias vezes, ainda, quando recebiam a
visita do Santíssimo Sacramento, enquanto os outros presos todos se
punham de joelhos, o dito Joze virava-se de costas, prostrado em pé
dando chutes no chão de ódio e dizendo “Caõ perro”81.
Além disso, denunciava ainda Luis, que Francisco dizia
constantemente não ser ele filho de Deus, mas “Como diabo, que
Com Deos porque Deos Naõ tinha poder algum E Somente o tinha
o diabo”82, não assistindo nem a Missa, ficando de costas quando o
sacerdote celebrava diante da cadeia, rindo em voz alta ou em outras
vezes “Comettendo o abominauel pecado da malicia, o qual pecado
naõ tinha Cometido Somente quando Se Celebraua o Santo Sacrificio
da Missa”83.
Admoestado por praticas pecaminosas a partir dos escritos de
São Paulo, Joze chamou-o de bêbado. Além do mais, não rezava os
terços comuns da noite e nunca foi visto rezando qualquer oração,
sempre rindo e debochando das manifestações de fé dos demais
encarcerados.
Não menos blasfêmico, era seu deboche com a Santa Eucaristia,
uma vez que ele depois da comunhão retirava da boca partículas da
hóstia e colocava no cano de “huma Espingarda como fim de que
Levasem os diabos a Hostia”84.
O veemente ódio do português blasfemador parece provir de uma
revolta acerca da legislação e da religião, já que residia no Brasil e aqui
se encontrava encarcerado, e daí, emergem uma série de possibilidades
interpretativas das quais só podemos conjecturar.
Aventando através de uma leitura de Mikhail Bakhtin, podemos
analisar o caso do Francisco Joze a partir do universo popular, como
possibilidade de uma valorização do sagrado, e não de sua violação. Neste
sentido, transcende-se a visão dualista apresentada por Eliade85, quando
trata do Sagrado e do Profano como instâncias distintas e contraditórias.
Para o teórico russo, a orientação para baixo é própria de todas
as formas de alegria popular e do realismo grotesco. “Tudo o que está
acabado, quase eterno, limitado e arcaico precipita-se para o ‘baixo’
terrestre e corporal para aí morrer e renascer”86.
A associação coprófila em relação às negações bruscas do
blasfemador neste sentido aponta para um positivo renegador,
residindo uma ambivalência de desprezo, contudo, pressupondo um
universo religioso imprescindível ao cristão ibérico.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 17Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
Francisco Joze, neste sentido, apesar de atacar e blasfemar
com atos e com palavras atentando contra Deus e sua Igreja nos
sacramentos, sacramentais e nos santos, e pego pela inquisição, é
uma possibilidade de compreensão da inversão dos valores cristãos,
sem, contudo, deixá-los de lado.
Mesmo os cristãos fervorosos estavam suscetíveis ao cometimento
de um crime blasfêmico, ainda mais quando expostos a situações que
motivassem a tal deslize. Os inquisidores eram conscientes disto, e
justamente por causa desta realidade, afirmavam que : “(...) o blasfemador
sabe a que fúrias o conduz o jogo ou outra coisa, e que impropérios
heréticos vomita. Que se vigie, se quiser evitar a justiça inquisitorial”87.
Vigilância provavelmente não foi o que aconteceu aos nove dias do
mês de março de 1765, com Ignacio Peres Pereyra XV, Sargento Supra
de Gradeyros da Companhia de que foi Capitão Aniceto Francisco de
Carualho, de 27 anos de idade.
Em um jogo de cartas, acompanhado de Jose Luis, lisboeta,
soldado da Companhia do Capitão Jose Antonio Salgado, de 22 anos,
Ignacio, ao perder o jogo disse que lhe parecia não havia inferno nem
demônios “(...) porquanto tendo por dez, ou doze vezes interiomente
dezzejado que o demonio o ajuda-se para ganhar invocando o no Seo
mesmo interior”88.
Jose Luis, percebendo a invocação de Ignacio, confessou a ele
no instante do jogo que também invocava Satanás da mesma forma,
e que mais, desejava encontrar-se com o Demônio, falar com ele,
aparecendo-lhe visualmente, e porque tal desejo nunca fora atendido,
concluíram que não existia nem demônio, nem inferno, já que “Sem
duuida que lhe hauiaõ de apparecer, ou que Ao menos lhe hauiaõ fallar
inuisiuel mente”89.
A invocação ao demônio era considerada numa hierarquia de
valores de gravidade herética, como um dos piores crimes possíveis de
serem cometidos, já que a figura do diabo, anjo que se rebelou contra
Deus, era exaltada.
No século XV, Eymerich, Francisco Peña, em O manual dos
inquisidores, citado por Pieroni90, ao tratarem deste grau de blasfêmia,
constavam que se a blasfêmia for grave e frequente, seja amordaçado
seu autor, colocada nele a mitra da difamação, a famosa carocha, e, nu
até a cintura seja publicamente flagelado.
A figura do diabo era recorrente do imaginário do povo europeu,
propagado nas missões em terras tropicais, e fortemente presente no
vocabulário blasfêmico. Segundo o que nos consta Trevor Roper,
Os povos primitivos da Europa – como de outros continentes – tinham conhecimento de encantamentos e feitiços, e a noção de vôo noturno “com Diana ou Heródias” perdurou nos primeiros séculos cristãos, mas a substância essencial da nova demonologia – o pacto com Satã, o sabbat das feiticeiras, o intercurso carnal com os demônios etc. – e a estrutura hierárquica e sistemática do reino do Diabo constituem produto autônomo do final da IdadeMédia [...]. Uma vez deslanchada, esta mitologia ganhou ímpeto próprio. Estabeleceu-se como folclore, gerando suas próprias evidências, e atuando muito além de seu lugar de origem91.
Recorrendo a satanás enquanto um personagem mítico, dotado
de destreza para ajudá-lo no jogo e, posteriormente, demonstrando
contrição apresentando-se a mesa inquisitorial, Ignacio Peres Pereyra
XV negociou com os dois representantes maiores da pedagogia
utilizada pelo Estado/Igreja, para controle de seus subordinados, o
Diabo e a Inquisição92.
A implantação destes valores, transcendidos dos seus locais
de origem, ganhava sentido na medida em que o cristianismo era
18Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
propagado. Trilhando os mesmos caminhos reservados até então
aos brancos, os negros cristianizados assumiam crenças européias
segundo a sua visão de mundo. No reino do Congo, desde o século
XVI, conforme nos consta Selma Pantoja93, esse processo acontecia
de forma notável.
Enviados ao Brasil, muitos escravos africanos participaram da
mesa inquisitorial, não somente como denunciados, mas muitas
vezes como denunciantes, acusando hereges por desobedecerem
aos ensinamentos da Mater Eclesia.
Assim se deu aos quinze dias do mês de outubro de 1763, na
cidade do Pará, na denunciação de João Vidal de Sam Joze, de 30
anos, nascido no Congo e de ofício de sangrador.
Segundo Elizabeth Belmas94, a blasfêmia é a própria do sexo
masculino, considerada como resultante de uma manifestação de
energia e virilidade. Justamente por isso, é decorrente encontramos
nas denunciações e confissões, homens blasfemadores, contudo,
na denúncia de João Vidal, são as mulheres quem cometem a
torpeza do pecado blasfêmico.
O grupo de mulheres denunciadas era formado por: Constança
Maria, Joanna Mendes, sua cunhada Azeitona, Raimunda
Mameluca e uma vizinha chamada Rosaura.
Na sua denunciação, Vidal afirma que Rosaura atirou o Rosário
que tinha em seu pescoço, rompendo o cordão e jogando ao chão
as contas, pisoteando-as e blasfemando dizendo que: “renegaua
da SantiSima Trindade E da Virgem Maria Nossa Senhora”95.
A piedade medieval do Ocidente desenvolveu a oração do
Rosário como alternativa popular à Oração das Horas e difundiu-
se no século XII com São Bernardo. Ofender a um símbolo que
remete diretamente a Virgem Maria era um crime que constava
no livro V, título II das Ordenações Filipinas, configurando uma
heresia média, mas, como a audaz ofensa de Rosaura se estendeu
até a Santíssima Trindade, seu crime era inegável e sua blasfêmia
era gravíssima.
Constou João Vidal que repreendeu severamente Rosaura,
mas a mesma não se importou, e disse mais, lamentando-se “Não
ter ahi huma imagem do Senhor Crucificado que tinha Em Sua
caza para atirar Com ella Ao meio da Rua pêra que todos Uissem
aquele desacato“96.
Desde o Concílio Ecumênico de Nicéia II, no ano de 787, a
Igreja trata de forma rigorosa o respeito e a veneração à imagem
religiosa como uma forma de indicação direta a pessoa que ela
representa, e neste caso, ao próprio Filho de Deus em sua entrega
máxima na cruz.
Rosaura e suas amigas blasfemadoras atingiam diretamente
a forte representação religiosa da qual comungavam, com gestos
repletos de simbolismo, renegando a fé de forma pública, e por
isso, fitadas pelos olhares dos inquisidores.
Assim, dentre os aspectos analisados, a fé era renegada pela
blasfêmia do colono pelos diversos motivos elencados, levando em
consideração não somente o contexto político, mas, sobretudo, o
contexto religioso que permeava a compreensão de mundo que
tinham. Contritos e arrependidos em confissões e apresentações
ou por desencargo de suas consciências em denunciações,
registraram-se estes crimes, na provável última e mais longa visita
do Santo Ofício da Inquisição ao Brasil, mais especificamente ao
Estado do Grão-Pará e Maranhão, nos anos de 1763 até 1769.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 19Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora não se tratasse do principal objetivo de observância dos
inquisidores na Visitação do Santo Ofício ao Estado do Grão-Pará e
Maranhão, a blasfêmia, recorrente em várias confissões e denunciações
apresenta-se enquanto uma fonte da qual emergem representações
sociais que nos deram possibilidades de conhecer alguns aspectos dos
colonos do século XVIII.
Segundo Robert Muchembled97, a blasfêmia é parte integrante e
obrigatória do cristianismo, um componente ativo da cultura religiosa. No
Brasil católico setecentista, a blasfêmia foi um “crime” cometido por toda
classe de indivíduos, de clérigos consagrados a escravos cristianizados.
Na análise dos casos blasfêmicos apresentados à mesa inquisitorial,
entre 1763 e 1769, fez-se necessário estabelecer um recorte metódico,
para então tratar de três casos denunciados e dois confessados que
envolveram este delito herético verbal especificamente.
Pieroni, citando Jean Chevalier e Alain Gheerbrant no Dictionnaire
des symboles, afirma que a boca “é representada na iconografia
universal tanto pela gorja do monstro quanto pelos lábios dos anjos”,
podendo ser “(...) a porta do Paraíso ou a do Inferno”98, logo, os pecados
verbais remetiam a uma simbologia que se vinculava diretamente a
salvação ou a eterna danação.
Assim, temos como agentes desta trama: padre Miguel Angelo de
Morais denunciando Gronfelt99; a confissão de Dionisio de Affonseca,
clérigo e capelão tonsurado100; o encarcerado Luis de Souza Sylva
denunciando Francisco Joze101; a confissão de Ignacio Peres Pereyra
XV102 e a denunciação de João Vidal de Sam Joze para com um grupo
de mulheres blasfemadoras103.
Em cada um destes casos, foi possível pensar, salvo as devidas
limitações, o colono em seu contexto social e religioso, estabelecendo
vínculos com o pensamento teológico e cultural, em crimes que
afetavam não somente a Igreja enquanto Instituição, mas a harmonia
social como um todo.
O historiador Jean Delumeau, consciente desta relação, afirma
que o blasfemador “(...) não aparece mais somente como aquele que
se arrisca a desencadear a cólera divina que toda a comunidade deverá
suportar. Simboliza também e, sobretudo, aquele que ameaça uma
harmonia social”104.
Visando justamente a esta harmonia social, é que os colonos
buscavam purgar-se de suas consciências, valendo-se da Inquisição
que, conforme afirma Emerych e Peña, na aplicação de seus castigos
e degredos, tinha como finalidade não salvar necessariamente “(...)
a alma do acusado, mas de manter o bem público e de aterrorizar o
povo”105, gerindo sua manutenção nas mentalidades enquanto um
mecanismo dotado de poder normativo, regido pelos interesses da
Igreja e do Estado.
Talvez seja por isto que, ao término de cada denunciação ou
confissão apresentada ao visitador Abranches, questionava-se acerca
do objetivo pelo qual levou o colono a dirigir-se à mesa inquisitorial,
e daí, a resultante de uma resposta comum a quase todos os casos,
afirmando ser: “para descarregar suas consciências”106.
Esta iniciativa vinha de encontro a uma dupla preocupação: a
primeira vinculada à idéia de redimir-se do pecado, reajustando-se aos
padrões sociais ordinários estipulados pela religião, a segunda e não
menos importante, é provavelmente provinda do medo de ser pego
pela Santa Inquisição, uma vez que o pecado blasfêmico analisado
20Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
tinha vínculo direto com ofensas públicas a Deus, portanto, o risco
de ser capturado pelos tentáculos inquisitoriais a qualquer instante
gerava um clima de medo e desconfiança na maioria dos cidadãos.
Na nossa amostra dos casos de blasfêmias tratados nesta
monografia, provavelmente existiram estes dois agravantes
motivacionais, e a partir deles, cada um desenvolveu-se em suas
particularidades, em uma sociedade que, conforme afirma Pieroni,
“está saturada do sagrado, o crente trata espontaneamente Deus e a
corte celeste com grande familiaridade”107.
Uma religião herdada pela colonização, e vivenciada exaustivamente
pelos colonos como constituinte de um horizonte de compreensão, sem
dúvidas seria alvo de constantes ataques, mesmo havendo o medo
pela repressão e correção, agravado pela projeção do reino celeste
ao reino terreno, quando as irreverências a Deus estendiam-se ao
próprio Rei, conotando um aspecto jurídico e criminal, em uma mesma
instância ao religioso.
Devido à complexidade atrelada ao pecado da blasfêmia e ao seu
estudo, que envolve um entendimento teológico, jurídico e cultural,
Jean Delumeau afirma que “o historiador das mentalidades deve utilizar
este revelador. Daí o interesse deste caso”108. Para tanto, procurei ir
além das mentalidades adentrando nas representações para poder
melhor enxergar o significado simbólico das palavras e dos gestos.
Enfim, blasfêmias e irreverências no Brasil setecentista, a partir da
análise dos casos de confissões e denunciações na Terceira Visitação
do Santo Ofício ao Estado do Grão-Pará e Maranhão, constituíram
um estudo em vista a uma abordagem histórico-cultural, acerca dos
gestos, comportamentos, experiências que não podem ser analisados
simplesmente do ponto de vista religioso e dogmático, mas pela
mediação da história cultural, cujos métodos permitiram estabelecer
aproximações com o cotidiano social e religioso do luso-afro-brasileiro
do século XVIII.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 21Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
Notas de Rodapé1 NAZÁRIO, Luiz. Julgamento em Chamas – Autos de fé como espetáculos de massa. In. NOVINSKY, Anita. Inquisição : ensaios sobre
mentalidades, heresias e arte. São Paulo : Edusp, 1987, p. 537.2 DICIONÁRIO DOS INQUISIDORES (Valência, 1494), direção de Louis Sala-Molins, Paris, Galilée, 1981, p. 284.3 SAMPAIO, Teodoro. História da fundação da cidade do Salvador. Bahia : Tipografia Beniditina Ltda, 1949, p.210.4 A Patrística, situada entre os séculos I e VIII, era uma filosofia cristã, representada por grandes nomes como Santo Agostinho e São Tomás de
Aquino, dentre outros.5 Cf. DELUMEAU, Jean. Mentalites: Histoire des cultures et dês sociétés. Paris: Èditions Imago, 1989.6 ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.20.7 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do Reino. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000, p. 203.8 Cf. KANTOROWICZ, Ernert. Os dois corpos do rei: Um estudo sobre a teologia medieval. Rio de Janeiro: Cia das Letras, 2000.9 HOLANDA, Sérgio Buarque de. História geral da civilização brasileira – I. A época colonial. 1. Do descobrimento à expansão territorial. São
Paulo: Bertrand, 1989, p.16.10 SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a terra de Santa Cruz. São Paulo: Companhia das Letras, 1986, p.86.11 Cf. WHELING, Arno, WEHLING, Maria José C. M. Formação do Brasil Colônia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.12 Idem, p. 37.13 Idem, p. 37.14 WHELING, Arno, WEHLING, Maria José C. M. Formação do Brasil Colônia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p.38.15 SOUZA, Laura de Mello e. O Inferno Atlântico: Demonologia e Colonização – Século XVI-XVIII. São Paulo: Companhia das letras, 1993,
p.22.16 Idem., p.23.17 LEITE, Serafim. Cartas dos Primeiros Jesuítas do Brasil. São Paulo: Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo, 1954, p.05.18 VAINFAS, Ronaldo. A heresia dos índios. São Paulo: Companhia das letras, 1997, p.19.19 DELUMEAU, Jean. Un Chemin d’Histoire, Chrétienté et Christianisation. In. THOMAS, Keith. Religião e Declínio da Magia. São Paulo:
Companhia das Letras, 1991, edição inglesa de 1971, p.67.20 BOXER, Charles, O império colonial português. Lisboa: Edições 70, 1981, p.101.21 VAINFAS, Ronaldo. Estudos históricos. Rio de Janeiro: Companhia das letras, 1988, p.173.22 _____. A heresia dos índios. São Paulo: Companhia das letras, 1997, p.14.
22Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
23 ANTT, Conselho Geral do Santo Ofício. Livro 435 - Inquisição de Lisboa, 1540-1778.24 ANTT, Conselho Geral do Santo Ofício. Livro 433 - Inquisição de Coimbra, 1567-1781.25 ANTT, Conselho Geral do Santo Ofício. Livro 434 - Inquisição de Évora, 1542-1763.26 A Visitação da Bahia e Pernambuco (1591-1595); da Bahia (1618) e do Estado do Grão Pará (1763-9). 27 SÔNIA, A. Siqueira. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial, São Paulo: Editora Ática, 1978, p. 227.28 SÔNIA, A. Siqueira. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial, São Paulo: Editora Ática, 1978, p. 227.29 DELUMEAU, Jean. Mentalites: Histoire des cultures et des sociétés. Paris: Editions Imago, 1989, p.09. 30 Idem., p.09.31 Idem., p.11.32 CHARTIER, Roger. A beira da falésia. A história entre incertezas e inquietudes. Porto Alegre: Editora da Universidade, 2002, p.72.33 CHARTIER, Roger. A beira da falésia. A história entre incertezas e inquietudes. Porto Alegre: Editora da Universidade, 2002, p.74.34 Traduz-se como: sopro que vem do interior.35 Bíblia Sagrada, Jô 1,14.36 Sto. Agostinho, Conf. I, 1,1. In. Catecismo da Igreja Católica. Edição Típica Vaticana. São Paulo: Edições Loyola, 2000, p.22.37 Bíblia Sagrada. Lc. 6,45.38 Sto. Tomás de Aquino. S. Th., I-II, 88,2, In. Catecismo da Igreja Católica. Edição Típica Vaticana. São Paulo: Edições Loyola, 2000, p. 497.39 Bíblia Sagrada. Mt. 12,32.40 DIDIEU, Jean-Pierre. Le modele religieux: les disciplines Du langage et de l’action. In. BENNASSAR, Bartolomeo. L’Inquisition espagnole,
France: Hachettep, 1996, p. 242.41 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do reino. São Paulo: Imprensa oficial do Estado, 2000, p. 205.42 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do reino. São Paulo: Imprensa oficial do Estado, 2000, p.205.43 Idem., p.206.44 Cf. QUINTÃO, Antonia Aparecida. Lá vem o meu parente: as irmandades de pretos e pardos no Rio de Janeiro e em Pernambuco (século XVIII).
São Paulo: FAPESP, 2002.45 SALGADO, Graça. Fiscais e Meirinhos. A administração no Brasil Colônia. São Paulo: Ed. Nova Fronteira, 1992, p. 116.46 LISBOA, AHU, BA, Cód. 253 (1704-1724), f. 249, 22/9/1721.47 As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, em 1707, foram feitas e ordenadas por Dom Sebastião Monteiro da Vide, bispo do dito
arcebispado e do conselho de sua majestade, impressa em Lisboa no ano de 1719 e em Coimbra, em 1720, com todas as licenças necessárias,
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 23Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
de conteúdo teológico e pastoral que tinham como objetivo responder aos anseios da fé colonial.48 PIERONI, Geraldo. Revista do Centro de memória do Judiciário, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, volume 1, números 1 e 2, 2001,
p.02.49 LARA, Silvia Hunold. Ordenações Filipinas-Livro V, São Paulo: Companhia das letras, 1999, p.149.50 Idem., p. 150.51 LARA, Silvia Hunold. Ordenações Filipinas-Livro V, São Paulo: Companhia das letras, 1999, p. 150.52 Idem., p.150.53 Idem., p.151.54 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.115.55 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.116.56 Cf. SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a terra de Santa Cruz. São Paulo: Companhia das Letras, 1986, p.140.57 DOMINGUES, Evandro. Resumos expandidos do Simpósio Temático 29 / XXIII SNH, 2001.58 Cf. CARVALHO, Laerte Ramos de. As Reformas Pombalinas da Instrução Pública. São Paulo: Saraiva: Ed. Universidade de São Paulo, 1978.59 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978, p.
117.60 Idem., p.117.61 Idem., p.118.62 Idem., p.119.63 Idem., p.125.64 Cf. VAINFAS, Ronaldo. A heresia dos índios. São Paulo: Companhia das letras, 1997.65 Bíblia Sagrada. Ap. 13, 6-7.66 Bíblia Sagrada. IITes 2,8.67 Conferir simbologia do sopro na página 16.68 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.145.69 Sto. Irineu, Adv. Haer., 4,4,3. In. Catecismo da Igreja Católica. Edição Típica Vaticana. São Paulo: Edições Loyola, 2000, p. 472.
24Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
70 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.145.71 SOUZA, Laura de Mello. O diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das Letras,
1995. p.88.72 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do Reino. Editora Universidade de Brasília: São Paulo, 2000. p. 209.73 LARA, Silvia Hunold. Ordenações Filipinas-Livro V, São Paulo: Companhia das letras, 1999, p. 192.74 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.199.75 Idem., p. 199.76 Sto. Tomas de Aquino, S. Th. I,25,5, ad 1. In. Catecismo da Igreja Católica. Edição Típica Vaticana. São Paulo: Edições Loyola, 2000, p. 81.77 LARA, Silvia Hunold. Ordenações Filipinas-Livro V, São Paulo: Companhia das letras, 1999, p.184.78 Cf. Bíblia Sagrada. Jo. 10.79 MOLINS, Louis Sala. Le dictionnaiere des inquisiteurs,Galilée: Débats, 1981. p.113. 80 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.233.81 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.233.82 Idem., p.234.83 Idem., p.234.84 Idem., p.234.85 Cf. ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. São Paulo: Martins Fontes, 1996.86 BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento – O contexto de François Rabelais. São Paulo: Ed. Hucitec, 1987,
p.325.87 MOLINS, Louis Sala. Le dictionnaiere des inquisiteurs,Galilée: Débats, 1981. p.65.88 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978, p.
230.89 Idem., p. 231.90 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do Reino. Editora Universidade de Brasília: São Paulo, 2000. p. 209.
Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010 25Monografias - Universidade Tuiuti do Paraná | História | 2010
91 TREVOR, Roper. A fobia às bruxas na Europa - Religião e Sociedade, 12/2. Rio de Janeiro: Campus, 1985, p. 33.92 Cf. SOUZA, Laura de Mello. O diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das
Letras, 1995.93 Cf. PANTOJA, Selma. Revista Lusófona de Ciência das Religiões – Ano III, 2004 / n.º 5/6 – pp.117-136.94 MUCHEMBLED, Robert (org). Mentalites – Histoire des cultures et des sociétés – Injures et blasphemes. France: Éditions Imago, 1989,
p.21.95 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.163.96 Idem., p.163.97 MUCHEMBLED, Robert, L’invention de l’homme moderne, Paris : Èditions Imago, 1988, p. 76.98 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do reino. São Paulo: Imprensa oficial do Estado, 2000, p.213.99 LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará 1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978,
p.144.100 Idem., p.198.101 Idem., p.233.102 Idem., p.229.103 Idem., p.162.104 DELUMEAU, Jean. Un Chemin d’HIstoire, Paris: Foyard, 1981, p. 42.105 NAZÁRIO, Luiz. Julgamento em Chamas – Autos de fé como espetáculos de massa. In. NOVINSKY, Anita. Inquisição : ensaios sobre
mentalidades, heresias e arte. São Paulo : Edusp, 1987, p.528.106 Presente a cada finalização de processos. Cf. LAPA, J.R. Amaral. Livro da Visitação do Santo Ofício da Inquisição ao Estado do Grão-Pará
1763-69. São Paulo: Editora Vozes, 1978.107 PIERONI, Geraldo. Os excluídos do reino. São Paulo: Imprensa oficial do Estado, 2000, p.222.108 DELUMEAU, Jean. Mentalites: Histoire des cultures et des sociétés. Paris: Editions Imago, 1989, p.11.