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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4 GRUPO II – CLASSE I – Segunda Câmara TC 030.349/2008-0. Natureza: Recurso de Reconsideração. Entidade: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Recorrente: Nasser Fadalallah Hassan Zakr (CPF 058.721.558-59). Representação legal: Paulo Luiz de Toledo Piza (OAB/SP 110.031). SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECIMENTO. ELEMENTOS RECURSAIS INSUFICIENTES PARA ELIDIR AS IRREGULARIDADES. OCORRÊNCIA DA BOA-FÉ. PROVIMENTO PARCIAL. REJEIÇÃO DAS ALEGAÇÕES DE DEFESA E FIXAÇÃO DE NOVO E IMPRORROGÁVEL PRAZO PARA O RESSARCIMENTO DO DÉBITO. AUTORIZAÇÃO DO PARCELAMENTO. CIÊNCIA. RELATÓRIO Examina-se recurso de reconsideração interposto por Nasser Fadalallah Hassan Zakr contra o Acórdão nº 2.608/2014, prolatado em Sessão Ordinária da Segunda Câmara. 2. Transcrevo a seguir a instrução de mérito elaborada por auditor da Serur, entretanto contestada pelos dirigentes da unidade técnica: “INTRODUÇÃO 1. Trata-se de recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr (peça 30, com as razões adicionais de peça 38), ex-bolsista do CNPQ, contra o Acórdão 2.608/2014–2ª Câmara. 1.1. A deliberação recorrida apresenta o seguinte teor (peça 26): 9.1. considerar revel o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, nos termo do art. 12, § 3º, da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992; 9.2. julgar irregulares as contas do Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, nos termos dos arts. 1º, inciso I, e 16, inciso III, alíneas ‘a’ e ‘b’, da Lei nº 8.443, de 1992, condenando-o ao pagamento da importância de Cr$ 544.133.987,25 (quinhentos e quarenta e 1

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4

GRUPO II – CLASSE I – Segunda CâmaraTC 030.349/2008-0.Natureza: Recurso de Reconsideração.Entidade: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).Recorrente: Nasser Fadalallah Hassan Zakr (CPF 058.721.558-59).Representação legal: Paulo Luiz de Toledo Piza (OAB/SP 110.031).

SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECIMENTO. ELEMENTOS RECURSAIS INSUFICIENTES PARA ELIDIR AS IRREGULARIDADES. OCORRÊNCIA DA BOA-FÉ. PROVIMENTO PARCIAL. REJEIÇÃO DAS ALEGAÇÕES DE DEFESA E FIXAÇÃO DE NOVO E IMPRORROGÁVEL PRAZO PARA O RESSARCIMENTO DO DÉBITO. AUTORIZAÇÃO DO PARCELAMENTO. CIÊNCIA.

RELATÓRIO

Examina-se recurso de reconsideração interposto por Nasser Fadalallah Hassan Zakr contra o Acórdão nº 2.608/2014, prolatado em Sessão Ordinária da Segunda Câmara.2. Transcrevo a seguir a instrução de mérito elaborada por auditor da Serur, entretanto contestada pelos dirigentes da unidade técnica:

“INTRODUÇÃO1. Trata-se de recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr (peça 30, com as razões adicionais de peça 38), ex-bolsista do CNPQ, contra o Acórdão 2.608/2014–2ª Câmara.1.1. A deliberação recorrida apresenta o seguinte teor (peça 26):9.1. considerar revel o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, nos termo do art. 12, § 3º, da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992;9.2. julgar irregulares as contas do Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, nos termos dos arts. 1º, inciso I, e 16, inciso III, alíneas ‘a’ e ‘b’, da Lei nº 8.443, de 1992, condenando-o ao pagamento da importância de Cr$ 544.133.987,25 (quinhentos e quarenta e quatro milhões, cento e trinta e três mil, novecentos e oitenta e sete cruzeiros e vinte e cinco centavos), atualizada monetariamente e acrescida de juros de mora desde 29/4/1993 até a efetiva quitação do débito, fixando-lhe o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da notificação, para que comprove, perante o Tribunal, o recolhimento do valor devido aos cofres do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, nos termos do art. 23, inciso III, alínea ‘a’, da citada Lei;9.3. autorizar, desde logo, o parcelamento do débito, caso requerido, em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais e sucessivas, com amparo no art. 26 da Lei nº 8.443, de 1992, c/c o art. 217 do RITCU, esclarecendo que a falta de pagamento de qualquer parcela importará no vencimento antecipado do saldo devedor, de acordo com o § 2º, do art. 217, do RITCU;

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9.4. autorizar, desde logo, nos termos do art. 28, inciso II, da Lei nº 8443, de 1992, a cobrança judicial da dívida, caso não atendida a notificação; e9.5. enviar cópia do presente Acórdão, bem como do Relatório e do Voto que o fundamenta, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (grifos acrescidos).HISTÓRICO2. Cuida-se de Tomada de Contas Especial instaurada pelo CNPQ contra o ex-bolsista Nasser Fadalallah Hassan Zakr, por não apresentar documentação comprobatória de conclusão de curso relativo à bolsa de estudos concedida pelo CNPQ na modalidade ‘Doutorado no exterior’, no período de 1/1 a 30/12/1992, e por não retornar ao Brasil após o encerramento das atividades relacionadas com a referida bolsa de estudos, dentro do prazo estipulado.2.1. No curso deste processo, houve três deliberações deste Tribunal:

a) O Acórdão 6.075/2010–TCU–2ª Câmara, em que, o responsável não acorreu aos autos, sendo revel. Assim, houve a prolação da seguinte deliberação (peça 4, p. 26):9.1. com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alínea ‘b’, 19 e 23, inciso III, da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992, c/c os arts. 1º, inciso I, 209, incisos II e IV e § 6º, 210 e 214, inciso III, do RITCU, julgar as presentes contas irregulares e em débito o responsável, Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, condenando-o ao pagamento da quantia de Cr$ 544.133.987,25 (quinhentos e quarenta e quatro milhões, cento e trinta e três mil, novecentos e oitenta e sete cruzeiros e vinte e cinco centavos), atualizada monetariamente e acrescida de juros de mora desde 29/4/1993 até a efetiva quitação do débito, fixando-lhe o prazo de 15 (quinze) dias para que comprove, perante o Tribunal, o recolhimento da referida quantia aos cofres do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico;9.2. autorizar, desde logo, o parcelamento do débito, caso venha a ser requerido, em até 24 (vinte e quatro) parcelas mensais e sucessivas, com amparo no art. 26 da Lei nº 8.443, de 1992, c/c o art. 217 do RITCU, esclarecendo que a falta de pagamento de qualquer parcela importará no vencimento antecipado do saldo devedor, de acordo com o que estabelece o § 2º do art. 217 do Regimento Interno;9.3. autorizar, desde logo, nos termos do art. 28, inciso II, da Lei nº 8.443, de 1992, a cobrança judicial da dívida, caso não atendida a notificação;

b) o Acórdão 8.365/2012–TCU–2ª Câmara, que declarou nula a citação do recorrente e, por via de consequência, anulou o Acórdão 6.075/2010–TCU–2ª Câmara. Eis o seu teor (peça 3, p. 51):9.1. com fundamento no art. 33 da Lei nº 8.443/92 combinado com o art. 285 do Regimento Interno do TCU, conhecer do presente recurso, por atender aos requisitos de admissibilidade previstos para a espécie, para, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de declarar a nulidade da citação do responsável e, por consequência, do Acórdão nº 6.075/2010 – Segunda Câmara;9.2. restituir os presentes autos ao gabinete do relator da deliberação recorrida, para a adoção das providências que entender de direito.

c) a deliberação ora recorrida (Acórdão 2.608/2014–2ª Câmara), cujos dispositivos encontram-se na introdução desta instrução.EXAME DE ADMISSIBILIDADE3. Reitera-se o exame de admissibilidade contido na peça 32, em que se propôs o conhecimento do recurso. O Excelentíssimo Senhor Ministro Aroldo Cedraz, mediante despacho de peça 36, concordou com a Serur, suspendendo-se os efeitos em relação aos itens 9.2 e 9.4 do Acórdão 2.608/2014 – TCU – 2ª Câmara, nos termos dos artigos 277, II, e 278, caput e § 1º, do Regimento Interno do TCU.MÉRITO4. Delimitação4.1. Constitui objeto do presente recurso definir se:

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a) houve a incidência da prescrição;b) o presente processo tramitou em instância incompetente;c) houve citação válida;d) o processo deve ser arquivado entre o longo tempo decorrido até a instauração desta TCE;e) os juros só poderiam ser computados a partir da citação válida do ora requerente;f) as presentes contas devem ser julgadas regulares.

5. Da prescrição5.1. Defende-se a incidência da prescrição neste processo, com base nos seguintes argumentos:5.2. A pretensão de ressarcimento aos cofres públicos encontra-se inequivocamente fulminada pela prescrição, quer em se considerando a obrigação subjacente como tendo natureza tributária, quer em se considerando sua natureza como sendo a de uma obrigação civil.Análise:5.3. Não cabe a alegação de prescrição dos débitos, em face da imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, nos termos do art. 37, § 5º, da Lei Maior. Sobre o tema, impende trazer à colação a tese defendida pelo preclaro Ministro-Substituto Marcos Bemquerer Costa do Tribunal de Contas da União, apresentada na Sessão de 27/1/2005 da 2ª Câmara, mediante voto revisor, no processo TC-005.378/2000-2:9. Não obstante essa discussão, entendo que o TCU não deve aplicar o Código Civil subsidiariamente, com a finalidade de definir qual o prazo de prescrição a ser adotado nesta Corte de Contas, uma vez que as ações de ressarcimento ao patrimônio público são imprescritíveis, ex vi do art. 37, § 5o, da Constituição Federal, in verbis:‘Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento’ (grifos acrescidos).10. Ressalto, por oportuno, que essa já foi a tendência do entendimento deste Tribunal, consoante se infere, por exemplo, do parecer do Ministério Público emitido no TC-674.018/1985-0 (Acórdão 124/1994, Ata 50/1994-Plenário).11. Vê-se, da leitura atenta do parágrafo 5o do art. 37, que foram estabelecidos dois gêneros de ações à disposição do poder público:11.1 – a 1a parte do parágrafo – ‘prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário’ – que estabelece as ações relativas às punições ao agente que cause dano ao erário;11.2 – a 2a parte do parágrafo – ‘ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento’ – que estabelece serem imprescritíveis as ações tendentes a determinar o ressarcimento dos danos causados pelos agentes a que alude o subitem anterior.12. Nesse sentido preleciona José Afonso da Silva (in Curso de Direito de Constitucional Positivo, ed. Malheiros, 22a edição, 2003, página 653):Se a Administração não toma providência à sua apuração e à responsabilização do agente, a sua inércia gera a perda do seu ius persequendi. É o princípio do art. 37, § 5o, [da CF] que dispõe: (...). Vê-se, porém, que há uma ressalva ao princípio. Nem tudo prescreverá. Apenas a apuração e a punição do ilícito, não, porém, o direito da Administração ao ressarcimento, à indenização, do prejuízo causado ao erário. É uma ressalva constitucional e, pois, inafastável, mas, por certo, destoante dos princípios jurídicos, que não socorrem quem fica inerte

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(dormientibus non sucurrit ius). Deu-se assim à Administração inerte o prêmio da imprescritibilidade na hipótese considerada.13. Da mesma forma opina Celso Antonio Bandeira de Mello (in Curso de Direito Administrativo, ed. Malheiros, 12a edição, 2000. página 124):(...) por força do art. 37, § 5o, da Constituição Federal, são imprescritíveis as ações de ressarcimento por ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário.14. E ainda, Uadi Lamêgo Bulos (in Constituição Federal Anotada, ed. Saraiva, 4a edição, 2002, página 615):Esse dispositivo prevê duas situações distintas: uma relativa à sanção pelo ato ilícito, outra relacionada à reparação do prejuízo. No primeiro aspecto, fica a lei ordinária encarregada de fixar os prazos prescricionais; no segundo, garantiu-se a imprescritibilidade das ações - medida considerada imprópria, mas que veio consagrada na Constituição de 1988.15. Também o Superior Tribunal de Justiça entende que as ações de ressarcimento ao patrimônio público são imprescritíveis, por força do aludido art. 37, § 5o, da Constituição Federal, consoante se observa de recentes julgados, exempli gratia: 15.1 – RESP 403.153/SP – Relator Ministro José Delgado (1a Turma, Diário da Justiça de 20.10.2003, página 181): Ementa: ‘(...) É imprescritível Ação Civil Pública visando à recomposição do Patrimônio Público (art. 37, § 5o, CF/1988)’; e 15.2 – RESP 328.391/DF – Relator Ministro Paulo Medina (2a Turma, Diário da Justiça de 2.12.2002, página 198):Ementa: (...) Demais disso, conforme a mais autorizada doutrina, por força do disposto no § 5o

do art. 37 da Constituição Federal, a ação regressiva é imprescritível.16. Ante o que expus, concluo que as medidas desta Corte de Contas tendentes a promover o ressarcimento ao patrimônio público são imprescritíveis, ex vi do art. 37, § 5o, da Constituição Federal, não havendo de se cogitar de aplicação subsidiária do novo Código Civil. 5.4. Entende-se que a aludida tese, pela sua pertinência e por estar amparada na melhor doutrina e na jurisprudência pátrias, deve ser acolhida. Nessa vereda, merece destaque que o Tribunal de Contas da União, ao resolver incidente de uniformização de jurisprudência (TC 005.378/2000-2, Acórdão 2.709/2008-Plenário), firmou exegese no sentido de: deixar assente no âmbito desta Corte que o art. 37 da Constituição Federal conduz ao entendimento de que as ações de ressarcimento movidas pelo Estado contra os agentes causadores de danos ao erário são imprescritíveis, ressalvando a possibilidade de dispensa de instauração de tomada de contas especial prevista no § 4º do art. 5º da IN TCU nº 56/2007 (grifos acrescidos).5.5. Nessa ordem de ideias, entende-se que o argumento apresentado pelo recorrente não merece prosperar.6. Do trâmite em instância competente6.1. Defende-se que o presente processo tramitou em instância incompetente, com base nos seguintes argumentos:6.2. O processo tramitou injustificadamente perante a Secex-RO, sendo que o recorrente nunca teve domicílio ou residência nesse estado da federação brasileira. Assim, o presente processo vem tramitando perante instância incompetente.Análise:6.3. À peça 1, p. 17, consta o endereço funcional do recorrente como sendo Rua Alameda do Ipê, 3.425 – setor 1 – estado de Rondônia. Daí o presente feito ter tramitado perante a Secex-RO. Mas o que é importante ressaltar é que, independentemente da secretaria por onde tenha

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tramitado este processo, a competência para o seu julgamento é de Órgão Colegiado deste Tribunal, no caso a sua 2ª Câmara.6.4. Por conseguinte, deve-se rejeitar o argumento apresentado.7. Da citação válida 7.1. Defende-se que não houve citação válida, com base nos seguintes argumentos:7.2. O edital que o CNPQ teria publicado para notificá-lo, em razão de não o ter localizado, não foi providenciado dentro dos rigores processuais exigidos, à medida que não se esgotaram os meios prévios de diligência voltados à sua notificação pessoal. Antes de tudo, porque era conhecido do CNPQ o endereço do ora recorrente na França, para fins dessa notificação.7.3. O mesmo sucedeu, no âmbito do TCU, com o edital de 1/7/2013, que se entendeu de publicar, não obstante o requerente tivesse endereço certo em Guiné Bissau. Houvesse feito adequadamente a citação do requerente em Bissau, este não poderia optar entre pagar o suposto débito ou defender-se, mas não lhe foi franqueado o exercício deste direito constitucional à ampla defesa.7.4. No que tange à citação endereçada à pessoa do advogado do recorrente, o referido causídico, mediante arrazoado de peça 14, aduziu que os poderes contidos na cláusula ad juditia et extra juditia não compreendem o poder especial para receber citação (CPC, art.38). Este poder deveria necessariamente ser outorgado de maneira especial - e, no caso, vale insistir, esse poder para receber citação não lhe teria sido outorgado.Análise:7.5. O recorrente argui que houve nulidade no processo em razão da ausência de contraditório junto ao órgão instaurador, na denominada fase interna da tomada de contas especial, em virtude da nulidade de citação. Sobre o tema, vem à balha a doutrina de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes:Tem suscitado bastante dúvida a necessidade ou não de se proceder à citação na fase interna da TCE.A origem da controvérsia repousa no fato de que a Constituição Federal estabelece como princípio fundamental que, aos ‘litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes’.Sustenta, por isso, uma corrente, que qualquer juntada de documento na TCE, mesmo que esteja na fase interna, para a validade do procedimento, deverá render oportunidade aos interessados contraditarem o conteúdo, a forma ou meio de obtenção. Por essa razão, a constituição válida da TCE obriga a citação preliminar do envolvido, sob pena de nulidade. De igual modo, se um servidor litiga com a Administração, para assegurar a ampla defesa impõe-se a sua citação.Em posição diametralmente oposta, assere outra corrente de pensamento que, na fase interna, a TCE não encerra litígio, motivo pelo qual a citação – que é o chamamento ao processo para se defender – ainda é descabida.Desde o início, deixamos assentado a relevância da distinção entre a fase interna e a fase externa, oportunidade em que demonstramos o acerto da segunda corrente acima.Por esse motivo, inexistindo partes e antagonismos de interesse nessa fase, a ausência de citação ou de oportunidade de contradição dos documentos juntados não enseja nulidade. Para a defesa, haverá momento próprio na fase externa, sempre assegurada pelo Tribunal de Contas.Como sugestão, porém, sempre que os indícios da autoria do fato irregular estiverem presentes, temos recomendado que o envolvido seja notificado e que a comissão receba suas ponderações e as responda fundamentadamente. Vislumbramos, em tal providência, singular oportunidade de se ir promovendo o saneamento dos autos, com grandes vantagens para a

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elucidação da verdade material. Frise-se, porém: como regra, é apenas recomendável, mas não obrigatória ou causadora de nulidade a ausência de defesa e contraditório nessa fase (in Tomada de Contas Especial, 2ª Edição, Brasília: Brasília Jurídica, 1998, p. 301/2).7.6. Existe, pois, distinção entre fase interna e fase externa de uma tomada de contas especial. Na fase interna, aquela promovida no âmbito do órgão público em que os fatos ocorreram, não há litígio ou acusação, mas apenas verificação de fatos e apuração de autoria. Constitui procedimento inquisitório de coleta de provas assemelhado ao inquérito policial, no qual não se tem uma relação processual constituída nem há prejuízo ao responsável. O estabelecimento do contraditório nessa fase não é obrigatório, pois há mero ato investigatório sem formalização de culpa. Como não existem partes nem antagonismos de interesse nessa fase, a ausência de citação ou de oportunidade de contradição dos documentos juntados não enseja nulidade.7.7. A garantia ao direito à ampla defesa e ao contraditório se dá, nos termos do devido processo legal, na fase externa da tomada de contas especial, que se inicia com a autuação do processo junto a este Tribunal e finda com o julgamento. Esse é o entendimento desta Corte de Contas, conforme consignado nos acórdãos 1.540/2009-1ª Câmara, 2.329/2006-2ª Câmara e 2.647/2007-Plenário.7.8. Posta assim a questão, ad argumentandum tantum, ainda que não tenha havido a citação válida na fase interna desta tomada de contas especial, não há que se falar em nulidade, vez que o exercício do contraditório e da ampla defesa restou assegurado na fase externa. É dizer: entende-se que a citação do indigitado realizada pelo TCU, mediante a Secretaria de Controle Externo competente, supre eventuais falhas na sua notificação na fase interna desta TCE.7.9. No que tange à última citação realizada por este Tribunal, observa-se que foi feita:a) ao advogado do recorrente, mediante o Ofício 0183/TCU/Secex-RO, de 25/3/2013 (peça 12), com Aviso de Recebimento (peça 13);b) ao recorrente, mediante o Ofício 0225/2013-TCU/Secex-RO, de 12/4/2013 (peça 15), no endereço indicado por ele em sua peça primeira peça recursal (peça 4, p. 3);c) por edital, Edital 0006/2013-TCU/SECEX-RO, de 24 de junho de 2013 (peça 18).7.10. Observa-se que o Regimento Interno do TCU assim dispõe:

Art. 179. A citação, a audiência ou a notificação, bem como a comunicação de diligência e de

rejeição de alegações de defesa, far-se-ão:I – mediante ciência da parte, efetivada por servidor designado, por meio eletrônico, fac-símile, telegrama ou qualquer outra forma, desde que fique confirmada inequivocamente a entrega da

comunicação ao destinatário;II – mediante carta registrada, com aviso de recebimento que comprove a entrega no endereço do destinatário;

III – por edital publicado nos órgãos oficiais, quando o seu destinatário não for localizado.§ 1º A citação, a audiência, a comunicação de diligência ou a notificação determinada, conforme o caso, pelo relator, pelo Presidente, pelas câmaras ou pelo Plenário será expedida pela unidade técnica competente da Secretaria do Tribunal.§ 2º No caso de adoção de medida cautelar pelo Tribunal, pelo Presidente, ou pelos relatores, as comunicações poderão ser efetivadas pelo meio mais célere possível, entre os previstos no inciso I do caput, observado o § 4º do art. 276.§ 3º As notificações ao responsável para pagamento de débito ou de multa, efetivadas nas formas previstas nos incisos I e II do caput, serão acompanhadas de cópia do documento de

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arrecadação, devidamente preenchido com dados que não sofrerão modificações até a data indicada.§ 4º Supre a falta da citação ou da audiência o comparecimento espontâneo do responsável, desde que havido após a determinação do Tribunal ou do relator prevista no inciso II ou III do art. 202.§ 5º Ato normativo próprio do Tribunal disciplinará a elaboração, a expedição e o controle de entrega das comunicações.§ 6º Estão abrangidas no conceito de audiência as comunicações processuais da oitiva prevista no art. 250, inciso V, e no conceito de notificação, todas as comunicações processuais não caracterizadas por citação, audiência ou diligência.§ 7º Quando a parte for representada por advogado, a comunicação deve ser dirigida ao representante legalmente constituído nos autos. 7.11. Destarte, como o recorrente não foi localizado no endereço por ele indicado à peça 4, p. 3, foi realizada a sua citação por edital, nos termos do item III supra. Ademais, o seu advogado foi comunicado da citação de seu cliente, o que atende ao disposto no § 7º supracitado. 7.12. Quanto à a alegação atinente aos poderes do advogado para ser citado, oportuno mencionar que, não obstante no âmbito do poder judiciário se exija poderes especiais para a citação, este não é o caso de processos que tramitam no TCU, porquanto há expressa previsão normativa, inserida no § 7º, art. 179, do RITCU, para que as comunicações processuais sejam dirigidas ao advogado legalmente constituído, como é o caso vertente. Ademais, o próprio advogado que ora busca a anulação do feito havia anteriormente comparecido ao processo, logrando êxito na anulação de acórdão por falhas na citação do responsável, que não fora localizado em seu endereço no exterior, vindo a ser chamado por edital. Nessa linha, não se vislumbra a nulidade aventada, qual seja, ausência de poderes para receber citação, mormente em razão de haver previsão normativa para o encaminhamento da aludida comunicação ao causídico legalmente constituído.7.13. Nessa ordem de ideias, não há falar-se em nulidade da citação.8. Do arquivamento deste processo8.1. Defende-se o arquivamento deste processo, com base nos seguintes argumentos:8.2. Tem sido determinação deste Tribunal, que igualmente haveria de ter sido adotada no presente caso, o arquivamento dos processos de tomada de contas especial em andamento cuja instauração tenha ocorrido, como no presente caso, após 10 anos do fato gerador.8.3. Importa aduzir que, mesmo em não pretendendo este Tribunal reconhecer como fulminada a pretensão pela prescrição, considerados os princípios da racionalidade administrativa, da economia processual e do tratamento não discriminatório, não haveria, contudo, de deixar de reconhecer como forçoso o arquivamento dos presentes autos, em razão da morosidade do CNPQ na instauração desta TCE.Análise:8.4. É de mister observar que, apesar do longo tempo decorrido entre a ocorrência do dano ao Erário (1992) e a presente data, não houve superação do prazo de dez anos a que se refere a IN 71/2012, art. 6º, II, haja vista as trocas de correspondências entre o recorrente e o CNPQ (peça 1, p. 23 e seguintes).8.5. Assim, não há como se acolher o argumento do recorrente.9. Da data a partir da qual deveria incidir juros de mora9.1. Defende-se no recurso que os juros de mora deveriam incidir apenas após a citação válida, com base nos seguintes argumentos:9.2. Não se podendo falar em dívida líquida, os juros só poderiam ser computados a partir da citação válida do ora requerente para defender-se nos autos deste processo de tomada de contas.

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Análise:9.3. O recorrente tinha até 90 dias para retornar ao Brasil após o término das atividades em 30/12/1992, mais 30 dias, a partir do retorno, para comunicar seu regresso e prestar informações sobre a bolsa de estudos concedida, conforme item 7.4 da Resolução Normativa - CNPq 36/1991. 9.4. Logo, em 29/4/1993, expirou o prazo que dispunha para se manifestar acerca da conclusão do curso no exterior e comprovar seu retorno ao país, sendo esta a data de referência para fins de atualização do débito e incidência de juros de mora, na hipótese de não ser afastada a imputação de débito ao responsável, pelo fato de não conter nos autos o momento exato do recebimento dos valores pelo ex-bolsista.9.5. Nessa vereda, opina-se pela rejeição do argumento apresentado.10. Da regularidade das presentes contas10.1. Defende-se no presente processo a regularidade das presentes contas, com base nos seguintes argumentos:10.2. A bolsa de estudos em discussão foi concedida pelo CNPQ para a realização de pesquisa de doutoramento na Universidade de Paris, somente pelo prazo de 1 ano, de 1/1/1992 a 31/12/1992. Após esse período, como ainda havia o recorrente de ficar no exterior para a conclusão dos trabalhos de doutoramento programados pelo seu orientador, o recorrente pleiteou a renovação da bolsa, a qual, todavia, lhe foi negada.10.3. Não se poderia exigir que o recorrente abandonasse o curso, deixando para trás todo o investimento feito, na sua grande parte, aliás, às suas próprias expensas. Isto seria não apenas violação de direitos individuais, como também frustração do próprio objetivo da concessão dessas bolsas-auxílio para brasileiros estudarem no exterior. Como demonstram os documentos anexados, o recorrente perseverou, concluindo os estudos em questão, a muito custo, às próprias expensas. Seja como for, seria absurdo pretender que o requerente retornasse ao Brasil antes da conclusão de suas tarefas regulamentares na pós-graduação no exterior.10.4. Só não voltou ao Brasil imediatamente após a vigência da bolsa de estudos porque isso não lhe era possível, não se podendo, ademais, dizer que os recursos repassados haveriam de ser devolvidos, simplesmente porque o bolsista não conseguiu concluir a redação da tese de doutoramento. Não bastasse isto ter sido decorrência da falta de recursos para tanto (especialmente à vista da negativa do CNPQ de renovar-lhe a bolsa, deixando-lhe literalmente ‘na mão’), o requerente, em contrapartida, trabalhou em escritórios de advocacia no Brasil, depois foi contratado pelas Nações Unidas para exercer funções de cunho humanitário, as quais ele vem desenvolvendo até hoje. Essa foi uma saída de vida ao recorrente, que já não tinha mais como sustentar-se, durante a fase de redação final de sua tese, sem prejuízo da publicação de inúmeros trabalhos na área do direito internacional, como resultado dos conhecimentos por ele adquiridos na pós-graduação na Universidade de Paris. 10.5. E, não bastassem os serviços que vem prestando à causa humanitária, o recorrente, depois de concluído seus referidos estudos e pesquisas na França, não deixou de retornar ao Brasil, onde permaneceu por período superior a dois anos, ao longo do qual pôde, de maneira ininterrupta, como advogado, aplicar os conhecimentos adquiridos no exterior.10.6. Assim, não haveria razão para, simplesmente pela ausência da apresentação da sua tese de doutoramento, julgar irregulares as presentes contas. Mesmo porque, em diversas outras situações símiles, não foi outro o entendimento deste Tribunal (e.g., Acórdão 1.851/2007-2ª Câmara, Acórdão 352/2006-2ª Câmara, Acórdão 280/2007 – 2ª Câmara.)10.7. Esclareça-se, a propósito, que o recorrente não deixou de obter, junto à Universidade de Paris, seu DEA – Diplôme d’Études Approfondis em Direito Internacional econômico. Depois, prosseguiu seus estudos desenvolvendo pesquisas voltadas à redação final de sua tese,

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para o que contou apenas por um período com bolsa do CNPQ, redação essa, todavia, que, por diversas razões, inclusive de cunho financeiro, não lhe foi possível concluir.10.8. Não seria demais repisar, aqui, a respeito da exigência de apresentação da tese de doutoramento, que ela é, em si, absurda. Constasse ela de lei ou norma regulamentar, não se haveria senão de reputá-la abusiva, à medida que, por uma série de razões, inclusive razões de relevante ordem pessoal, e por uma série de problemas, inclusive problemas de adaptação em países estrangeiros, não fossem muitas vezes os problemas burocráticos e financeiros, o estudante, bolsista ou não, fica sem condições de levar a termo, definitivamente, sua graduação ou pós-graduação.10.9. Não custa repisar, uma vez mais que, independentemente disso tudo, o requerente exerceu o ofício de advogado no Brasil, na área específica em que realizou seus estudos de pós-graduação, para, somente depois, engajar-se definitivamente na ONU, organização da qual o Brasil é membro, onde, até o presente, exerce munus de inegável interesse público nacional e internacional.Análise:10.10. O recorrente foi citado (peça 15) em virtude do descumprimento dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução Normativa 36/1991, do CNPQ (peça 1, p. 14), por não apresentar documentação comprobatória de conclusão de curso relativo à bolsa de estudos concedida pelo CNPQ na modalidade ‘Doutorado no exterior’, no período de 1/1 a 30/12/1992, e por não retornar ao Brasil após o encerramento das atividades relacionadas com a referida bolsa de estudos, dentro do prazo estipulado.10.11. Atendo-se à interpretação literal e gramatical dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução Normativa 36/1991 (peça 1, p. 14), poder-se-ia chegar à conclusão precipitada de que, como o interessado não apresentou cópia do diploma de doutor, bem como não retornou ao Brasil em até 90 dias após o encerramento das atividades relacionadas com a bolsa, deveria ser imputado em débito nos termos do acórdão ora recorrido.10.12. No entanto, por sete razões, entende-se que as presentes contas devem ser julgadas regulares, com o afastamento do débito que foi imputado ao recorrente.10.13. A uma, porque obtempera Estêvão Mallet:Na verdade, o apego excessivo à palavra somente evidencia reduzido avanço científico do Direito. Esse apego, lembra Jhering, ‘est un de ces phénomènes qui, dans le droit comme partout ailleurs, caractérisent le défaut de maturité du développement intellectuel ‘. Daí a tranquilidade com que, evoluindo o Direito, passa o intérprete a admitir a superação do que literalmente se contém na norma (in Prática de Direito do Trabalho, São Paulo: LTr, 2008, p. 53).10.14. Nesse mesmo sentido, é de mister ter presente a doutrina de Carlos Maximiliano:O Direito não é uma escolástica; é uma face da vida social. O fim prático (teleológico) vale mais do que a Lógica Jurídica. O homem não é feito com os princípios; os princípios é que são feitos para o homem. Muitas vezes o próprio dispositivo, intencionalmente ou não, vai além, ou se detém aquém do fim para que foi promulgado.’ (grifos acrescidos) (in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 15ª Edição, Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 155)[...] o fim para que foi inserto o artigo na lei sobreleva a tudo. Não se admite interpretação estrita que entrave a realização plena do escopo visado pelo texto. Dentro da letra rigorosa dele procure-se o objetivo da norma suprema; seja este atingido, e será perfeita a exegese. (grifos acrescidos) (o.c., p. 313/4)10.15. Destarte, dada a importância de se perquirir a finalidade da norma (o elemento teleológico), é de rigor considerar o ensinamento do Ministro Augusto Nardes, por ocasião da apreciação do TC 005.061/2001-7 (Acórdão 1.971/2006-1ª Câmara):

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Como é cediço, a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a concessão de bolsa de estudos visa a beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e serviços (v.g., Decisão 231/2001-2ª Câmara e Acórdão 343/2002-Plenário).Esse benefício se dá com o retorno ao país, de modo que o bolsista aplique os conhecimentos obtidos com a capacitação custeada com recursos da sociedade.10.16. Ora, consta nos autos (peça 4, p. 41-54, peça 5, p. 1-75, peça 6, p. 1-50, peça 7, p. 1-35 e peça 38, p. 3-4) que o recorrente:a) no período de 1/3/1994 a 31/8/1994, trabalhou em escritório de advocacia no Brasil, comprovado mediante anotação em carteira de trabalho (peça 4, p. 44);b) no período de 1/9/1994 a 31/5/1996, integrou os quadros de escritório de advocacia, tendo atuado na área consultiva, fundamentalmente na área securitária, financeira e de investimentos internacionais (peça 4, p. 45);c) entre os anos de 1996 até 15/8/2014, comprovou vínculo profissional com a Organização das Nações Unidas (peça 4, p. 46-54, peça 5, p. 1-5 e peça 38, p. 3-4);d) publicou os seguintes artigos em revistas especializadas (peça 5-7):

d1) La responsabilité du supérieur hiérarchique devant les tribunaux pênaux internationaux;

d2) Les aspects institutionnels de la Cour pénale international;d3) La portée de la responsabilité pénale individuelle dans le droit international;d4) La responsabilité pénale individuelle devant le Tribunal penal international pour le

Rwanda;d5) Analyse spécifique du crime de génocide dans le Tribunal penal international pour le Rwanda;

d6) Approche analytique du crime contre l´humanité em droit international;10.17. Assim, entende-se que, apesar de não ter concluído sua tese de doutorado, o recorrente atingiu a finalidade da concessão de sua bolsa de estudos (proporcionou, e ainda proporciona, benefícios à população brasileira e mundial, vez que trabalhou em escritórios de advocatícia no Brasil durante mais de 2 anos, trabalha na ONU e publicou diversos artigos em revistas especializadas). Assim, este é o primeiro argumento que sustenta o entendimento de que as presentes contas devem ser julgadas regulares, com a exclusão do débito que foi imputado ao recorrente.10.18. A duas, ressalta-se que, apesar do entusiasmo inicial dos bolsistas de doutorado no exterior, nem todos conseguem vencer as barreiras que advém dos estudos aprofundados, seja por razões alheias às suas forças, seja por limitações próprias. O que é relevante, do ponto de vista da análise da regular aplicação dos recursos públicos federais repassados durante o período de concessão da bolsa de estudos, é saber se houve boa-fé do bolsista, bem como a comprovação do seu empenho em prosseguir os seus estudos.10.19. Nesse sentir, observa-se que o recorrente comprovou a sua regular inscrição na Université Paris I, Panthéon-Sorbonne, durante os anos de 1992 e 1993 (peça 30, p. 27-31), sendo que, durante o ano de 1993, sem a ajuda financeira do CNPQ. Demais disso, o seu orientador emitiu a seguinte declaração (peça 30, p. 32-33):O Senhor ZAKR efetuou sob a minha orientação a tese ‘O Regime Jurídico e Fiscal dos Investimentos Estrangeiros no Brasil’ para a obtenção do título de Doutor da Universidade de Paris I.Esta pesquisa se encontra presentemente em estágio avançado de elaboração. Eu já tive a oportunidade de ler (e comentar com o seu autor) passagens representativas de seu manuscrito, que me deram satisfação. Esta fase de redação se encontra em ritmo plenamente satisfatório. O Senhor ZAKR estará apto a sustentar sua tese no final de 1993 perante a Universidade de Paris

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10.20. Assim, entende-se que o recorrente, durante os seus estudos de doutorado, agiu com lealdade, probidade, honestidade e sinceridade de propósitos. De salientar que, durante o ano de 1993, o recorrente não obteve ajuda financeira do CNPQ para concluir seus estudos, apesar de seu orientador ter enfatizado que, no final do aludido ano, estaria apto a sustentar a sua tese de doutorado.10.21. Nessa ordem de ideias, registra-se o magistério seguro do douto Procurador Júlio Marcelo de Oliveira, por ocasião da apreciação do TC 005.061/2001-7, o qual foi acolhido por este Tribunal (Acórdão 1.971/2006 da 1ª Câmara):

‘(...)A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a concessão de bolsa de estudos visa a beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e de serviços, considerando que o CNPq tem por objetivo promover investimentos voltados ao crescimento do País via desenvolvimento científico e tecnológico, o que se dá fundamentalmente pela concessão de bolsas de estudo para capacitação de recursos humanos nos mais diversos graus, desde a iniciação científica, na graduação, passando pelo mestrado, doutorado e pós-doutorado, entendimento esse que restou assente, entre outras deliberações, na Decisão nº 231/2001 - 2ª Câmara (Ata 33) e no Acórdão nº 343/2002 - Plenário (Ata 35).Com efeito, não se pode admitir que os escassos recursos do país sejam destinados a financiar a formação de mão-de-obra altamente qualificada para outros países. Daí que a concessão de bolsas para estudo no exterior são sempre condicionadas ao compromisso de retorno e permanência do bolsista no Brasil por prazo compatível com a duração da bolsa recebida.Isso não quer dizer, contudo que o bolsista terá de restituir o valor da bolsa acaso sua empreitada no curso de mestrado, doutorado ou pós-doutorado seja mal sucedida, nomeadamente se o insucesso decorrer de razões alheias à vontade do bolsista.A concessão da bolsa é como um contrato de risco, é uma aposta que o governo brasileiro faz na capacitação científica de um cidadão para aumentar na sociedade brasileira o número de profissionais com alto nível de qualificação científica. Naturalmente, nem todos que ingressam em um curso qualquer lograrão completá-lo. Isso é natural e as razões podem ser e são de toda ordem.O que se há de exigir do bolsista custeado com recursos da sociedade é lealdade, probidade, honestidade, sinceridade de propósitos. Assim o bolsista que abandona o curso e não comunica esse fato imediatamente ao CNPq, continuando a receber a bolsa, age desleal e desonestamente. Da mesma forma aquele que conclui o curso, mas não regressa ao país para difundir seu aprendizado e contribuir com a sociedade brasileira, optando por oportunidades profissionais no estrangeiro, lesa seu país e tem o dever de indenizá-lo.Ao ver do Ministério Público, não é o caso destes autos. No caso presente, verifica-se que a conduta do responsável é reveladora de inegável interesse, esforço pessoal e dedicação ao curso de doutorado para o qual recebeu bolsa apenas parcial e que infelizmente não concluiu a contento.

(...)Há que se considerar que em todo curso, sobretudo nos mais exigentes, há sempre uma parcela de alunos que, embora se dediquem ao curso, não obtém o grau almejado. Isso é da natureza mesma dos cursos de pós-graduação stricto sensu. Aliás, advém desse alto nível de dificuldade o prestígio que o título oferece a quem o ostenta.Não parece razoável que o CNPq possa esperar e exigir que todos os bolsistas obtenham os títulos por eles almejados quando se inscreveram nesses difíceis e concorridos cursos e solicitaram o apoio financeiro do órgão. Esperar e exigir isso é desconsiderar a natureza mesma das coisas, a ontologia dos cursos de pós-graduação stricto sensu. Evidentemente, no momento da inscrição e pedido de auxílio, há um elevado nível de comprometimento, engajamento e expectativa de sucesso do pós-graduando em relação à sua empreitada.

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Infelizmente, nem todos são bem sucedidos e há que se avaliar em cada caso concreto as circunstâncias do insucesso, até porque, ao ver do Ministério Público, o insucesso pessoal de um bolsista na obtenção do título não configura necessariamente o insucesso do investimento de fomento científico-tecnológico feito pelo CNPq nesse bolsista, especialmente quando há o seu regresso ao Brasil com atuação profissional em atividades conexas com o curso frequentado, o que, sem dúvida, propicia a aplicação dos conhecimentos auferidos, ainda que o bolsista não ostente o título e ainda que suas atividades profissionais não sejam de docência.Com efeito, estão presentes os requisitos para tanto: a inegável lealdade do bolsista demonstrada por seu engajamento no curso e o proveito do Brasil com o investimento feito em sua qualificação profissional, haja vista seu retorno ao país e as atividades por ele exercidas.Em caso análogo e nessa mesma linha de entendimento, a 2ª Câmara desta Corte de Contas, mediante o Acórdão 352/2006, acolheu as considerações feitas por este representante do Ministério Público no processo TC 002.288/2005-0.Destarte, o Ministério Público manifesta-se pela regularidade das presentes contas, com outorga de quitação plena ao sr. Raul Nobre Martins Júnior, nos termos dos artigos 1º, inciso I; 16, inciso I; 18 e 23, inciso I, da Lei 8.443/1992’ (grifos acrescidos).10.22. Mutatis mutandis, a Segunda Câmara, em situação semelhante ao do caso em apreço, acolheu voto do preclaro Ministro Lincoln Magalhães da Rocha nos seguintes termos (TC 002.288/2005-0, Acórdão 352/2006-2ª Câmara):‘Nos presentes autos, discute-se a necessidade de ressarcimento à União de valores percebidos por cidadã agraciada com bolsa de estudo do CNPq para a realização de programa de doutorado em instituição no exterior.2. Conforme ressaltado pelo representante do parquet especializado, este Tribunal têm reiteradamente decidido que, ‘...em última instância, a concessão de bolsa de estudos visa beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e serviços...’ (Decisão n.º 231/2001 - 2ª Câmara, Acórdão n.º 343/2002).3. Com efeito, noto que, embora a responsável não tenha concluído o doutoramento, conseguiu obter o certificado de mestrado na George Washington University, o que em minha opinião demonstra que não foi em vão o investimento realizado pela nação brasileira em sua formação.4. Ademais, ressalto que, conforme descrito pelo analista instruinte do feito: ‘...quanto à obrigatoriedade de retorno ao Brasil, observa-se que a responsável regressou ao país após concluir os créditos do seu doutorado, voltando a exercer suas atividades no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA por mais de sete anos, no período de 01/03/1996 a 31/08/2003 (fls. 174).’5. Assim, entendo que os ensinamentos adquiridos pela responsável com o mestrado conseguido na George Washington University tiveram a devida aplicação em órgão brasileiro, demonstrando que a responsável cumpriu com sua obrigação de retornar ao país após concluir os seus créditos de doutorado, não havendo como falar em financiamento de mão-de-obra altamente qualificada para outros países, o que seria inadmissível, frente aos parcos recursos brasileiros que são utilizados para tal mister.6. Destarte, penso ser descabida a multa proposta pela Unidade Técnica, por entender que, conforme demonstrado nos autos, a responsável, além de tentar dar continuidade aos estudos de doutorado iniciados na instituição estrangeira por meio de admissão em Programa de Doutorado em Economia na Universidade de Brasília, graduou-se em mestrado na George Washington University.7. Dessa feita, entendo que o país beneficiou-se do investimento efetuado na formação da responsável, conforme bem destacado pelo nobre representante do parquet especializado.

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Ante o exposto, pedindo vênias à Unidade Técnica e acolhendo na íntegra o pronunciamento do MPTCU, voto no sentido de que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto ao descortino deste Colegiado.’10.23. Entendendo pertinente o fundamento supracitado, a 2ª Câmara julgou regulares as contas da Sra. Luíza Maria Borges de Oliveira, expedindo-lhe quitação plena.10.24. Como se depreende do exposto, a Primeira Câmara (Acórdão 1.971/2006) e a Segunda Câmara (Acórdão 352/2006), em situações semelhantes ao caso em testilha, deliberaram no sentido de se afastar o débito e julgar as contas regulares.10.25. Ora, não existem cidadãos iguais, sem iguais decisões administrativas para casos semelhantes. Assim, firmada a exegese pela Primeira e Segunda Câmaras, urge o mesmo tratamento ao caso em análise, sob pena de se violar o princípio da igualdade. Pois só observando os referidos precedentes é que se dará para situações semelhantes o mesmo tratamento jurídico. Este é o segundo argumento pelo qual se entende que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.10.26. A três, a interpretação meramente literal dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução 36/1991 pode levar a uma decisão injusta. Afinal, summum jus, summa injuria – ‘do excesso de direito resulta a suprema injustiça’. Sobre o tema, não se pode relegar ao oblívio a lição de Carlos Maximiliano:‘Não pode o Direito isolar-se do ambiente em que vigora, deixar de atender às outras manifestações da vida social e econômica; (...)’‘Prefere-se o sentido conducente ao resultado mais razoável, que melhor corresponda às necessidades da prática, e seja mais humano, benigno, suave.’

(...)‘O Direito suscita de modo indireto e diretamente ampara a atividade produtiva, tutela a vida, facilita e assegura o progresso; não embaraça o esforço honesto, o labor benéfico, a evolução geral. Nasce na sociedade e para a sociedade; não pode deixar de ser um fator do desenvolvimento da mesma. Para ele não é indiferente a ruína ou a prosperidade, a saúde ou a moléstia, o bem-estar ou a desgraça. Para isso, até mesmo no campo do Direito Privado, encontra hoje difícil acolhida, tolerada apenas em sentido restrito, nos casos excepcionais de disposições claríssimas, a antiga parêmia, varrida há muito do Direito Público e filha primogênita da exegese tradicional, rígida, geométrica, silogística - Fiat justitia, pereat mundus: ‘Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça’.’

(...)‘O Direito é um meio para atingir os fins colimados pelo homem em atividade; a sua função é eminentemente social, construtora; logo não mais prevalece o seu papel antigo de entidade cega, indiferente às ruínas que inconsciente ou conscientemente possa espalhar.’‘A justiça deve ser eqüânime; concilie, sempre que for possível, a retidão com a bondade em toda a acepção da palavra.Colocado em posição diametralmente oposta, Jorge Gmelin chega à mesma conclusão; e não é de admirar, porque a verdade prevalece sempre, cedo ou tarde, e é universal, não constitui privilégio de escola ou seita.Hoje a maioria absoluta dos juristas quer libertar da letra da lei o julgador, pelo menos quando da aplicação rigorosa dos textos resulte injusta dureza, ou até mesmo simples antagonismo com os ditames da equidade. Assim, vai perdendo apologistas na prática a frase de Ulpiano – durum jus, sed ita Lex scripta est – ‘duro Direito, porém assim foi redigida a lei’ – e prevalecendo, em seu lugar, o summum jus, summa injuria – ‘do excesso de direito resulta a suprema injustiça’.‘Membro eminente da judicatura alemã dá o seguinte conselho aos seus pares: ‘Nós, magistrados, que do povo saímos, precisamos ficar ao lado do povo, ter cérebro e coração atentos aos seus interesses e necessidades. A atividade do juiz não consiste, de modo algum,

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em simples esforço intelectual. Ela exige, em igual medida, são e ardente sentir, grandeza d’alma, tato, simpatia.

[...]Em conclusão: o Direito prevê e provê; logo não é indiferente à realidade. Faça-se justiça; porém salve-se o mundo, e o homem de bem que no mesmo se agita, labora, produz’ (grifos acrescidos) (o.c., fls. 157, 165, 168/70).’10.27. Em virtude dessas considerações, é de se inferir que o caso em apreço não pode ser julgado com o coração empedernido, mas, isto sim, deve ser examinado com ardente sentir, grandeza d’alma, tato e empatia, requerendo do magistrado a sua inserção no seio da família do recorrente para ouvir a sua voz interior, a humanidade que emana de sua pessoa. É nesse sentido a orientação de Georges Durry e Michelle Gobert:‘[...] Il sera encore nécessaire qu’ils oublient qu’ils sont juges, pour s’intégrer dans les familles et y faire entendre leur voix, non pas du dehor par la vertu de leur autorité de magistrat, mais comme du dedans par l’humanité émanant de leur personne’ (in Revue Trimestrielle de Droit Civil, Tome Soixante-Quatrième, Paris, Année 1966, p. 36). 10.28. Afinal, o julgamento deste processo não pode ser considerado como mais um, dentre os milhares que são julgados anualmente por esta Corte de Contas, mas, isto sim, deve ser tido como um dos acontecimentos mais significativos da vida do recorrente (his day in Court). Assim, deve-se observar que foi varrida há muito do Direito Público a antiga parêmia, filha da exegese literal e silogística, - Fiat justitia, pereat mundus: ‘Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça’. Este é o terceiro argumento pelo qual se entende que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.10.29. A quatro, porque o singelo método literal não é a regra hermenêutica mais apropriada para o caso vertente, mas, isto sim, a lógica do razoável. Sobre a importância da ‘lógica do razoável’, discorre com precisão o jurisconsulto Luís Recaséns Siches:‘La lógica tradicional pura – en cualquiera de sus manifestaciones –, es el instrumento adecuado para tratar com las ideas puras a priori – tales como los axiomas lógicos, las leyes del silogismo, los princípios matemáticos, etc. – y para la aprehensión de los hechos de la naturaleza. Por eso se la suele llamar lógica físicomatemática.

(...)Ahora bién, la lógica tradicional o físico-matemática no es adecuada para tratar la vida humana ni sus problemas prácticos; por consiguiente, tampoco para los menesteres jurídicos, entre los cuales figura la interpretación del Derecho. Para todo cuanto pertenezca a nuestra humana existencia - incluyendo la pratica del Derecho - hay que emplear un tipo diferente del logos, que tiene tanta dignidad como la lógica tradicional, si es que no es superior a la de ésta: hay que manejar el logos de lo humano, la lógica de lo razonable, la cual es razón, tan razón como la lógica lo racional, pero diferente de ésta. La lógica de lo humano o de lo razonable es uma razón impregnada de puntos de vista estimativos, de critérios de valoración, de pautas axiológicas, que, además, lleva a sus espaldas como aleccionamiento las enseñanzas recibidas de la experiência, de la experiencia propia y de la experiencia del prójimo, a través de la historia’ (grifos acrescidos) (in Tratado General de Filosofia del Derecho, Vigésima Edición, México: Editorial Porrúa, 2010, p. 642).10.30. Assim, é de mister a utilização da ‘lógica do razoável’, que tem tanta dignidade quanto a lógica tradicional pura, porém uma lógica impregnada de pontos de vista estimativos, de critérios de valoração e de pautas axiológicas. 10.31. Vem à baila a doutrina de Alípio Silveira:‘Recaséns Siches, ao considerar os vários métodos modernos esboçados nos primeiros capítulos – método teleológico, método histórico-evolutivo ou progressivo, método da ‘vontade da lei’, nos mostra que cada um deles encerra uma parte da verdade, mas que a sua síntese final, em cada caso concreto, será dada pelo ‘logos do razoável’. Mal comparando, a

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operação interpretativa se assemelha à execução de uma partitura musical. Vários são os instrumentos – no caso os métodos de interpretação – mas eles devem formar um conjunto harmônico, sob a batuta do maestro, no caso, o logos do razoável, o qual, como veremos em breve, corresponde à idéia básica do bem comum’ (grifos acrescidos) (in Hermenêutica no Direito Brasileiro, vol. I: São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968, p. 83).10.32. É nesse mesmo sentido a doutrina de José Frederico Marques:Tendo em vista os critérios de justiça, segurança ou oportunidade, o intérprete adotará o método que lhe pareça mais acertado para o caso. Não há sistemas rígidos de interpretação. O entendimento mais razoável é o que deve prevalecer, pouco importando que tenha sido deduzido da interpretação exegética, da sistemática ou da teleológica. O logos del razonable, como destaca RECASÉNS SICHES, é que deve orientar o intérprete, visto que na aplicação do direito não se depara com a uniformidade lógica do raciocínio matemático e sim com a flexibilidade ou compreensão razoável a norma do ius scriptum. Com essa orientação pautou-se precedente do Superior Tribunal de Justiça, em cuja mente oficial se assentou que ‘a melhor interpretação da lei é a que se preocupa com a solução justa, não podendo o seu aplicador esquecer que o rigorismo na exegese dos textos legais pode levar a injustiças’ (grifos acrescidos) (apud Mauro Schiavi, in Manual de Direito Processual do Trabalho, 4ª Ed., São Paulo: LTr, 2011, p. 120)10.33. De mais a mais, ensina José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva:Em conclusão, Recaséns Siches propõe que ‘a única proposição válida que pode ser emitida sobre a interpretação é a de que o juiz, em todos os casos, deve interpretar a lei precisamente do modo que conduza à solução mais justa para resolver o problema apresentado à sua jurisdição’. De modo que o exercício do logos de lo razonable ou de lo humano, ‘aplicado à interpretação jurídica, supera a pluralidade de métodos’ de interpretação. Diante de qualquer caso, fácil ou difícil, o juiz deve proceder com bom-senso, verificando a realidade e o sentido dos fatos, buscando os valores nos quais se inspira o ordenamento jurídico positivo, ou até mesmo complementando esses valores, com a produção de outros, em harmonia com o referido sistema. E, assim, conjugando todos esses princípios, chegar a uma solução satisfatória, considerando-se como tal a decisão no sentido ‘do que o ordenamento jurídico considera como senso de justiça’. O cerne da questão está, pois, em compreender que o conteúdo jurídico das normas prescritivas, proibitivas ou permissivas não pertence ‘ao pensamento regido pela lógica de tipo matemático, pelo racional’, mas a outro campo do pensamento, que está regido por outro tipo de lógica, pela lógica de lo razonable, de lo humano ou da razão vital e histórica.Com efeito, na individualização da norma geral e abstrata, para solucionar o caso concreto, o juiz deve aplicar a lógica do razoável, de acordo com o senso de justiça. Se a norma conduz a uma solução justa, deve ser aplicada, e, em caso contrário, o juiz deve criar a norma jurídica particular, sem se preocupar com os métodos doutrinários de interpretação, aplicando a lei sempre de forma a solucionar a questão da maneira mais justa possível (grifos acrescidos) (in Magistratura e temas atuais do Direito: São Paulo: LTr, 2011, p. 138-139)10.34. De tal arte, vale dizer que, na interpretação e aplicação do Direito, deve-se atentar sempre para a flexibilidade do entendimento razoável do ordenamento jurídico, em síntese, para a ideia básica do bem comum.10.35. Nesse diapasão, ensina Manoel Antônio Teixeira Filho:(...) o juiz não é um monólito, um burocrata, um convidado sem alma, a quem a lei não consinta, em nenhum instante, contribuir com suas experiências da vida, suas sensações, sua consciência sobre a finalidade social das normas legais e, também, sobre as circunstâncias dramáticas que, porventura, estejam a assinalar o caso concreto, de sorte a poder adotar, diante desse quadro, uma atitude menos dogmática e mais vanguardeira, na busca de uma efetiva realização da justiça – esse ideal imarcescível, que habita o coração do homem e

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contra o qual os sistemas jurídicos, submissos a certas ideologias políticas cruéis, insistem em conspirar (in A Sentença no Processo do Trabalho, 4ª Ed., São Paulo: LTr, 2010, p. 24).10.36. Por conseguinte, aplicando a lógica do razoável e utilizando-se as ideias supra como fachos iluminadores à compreensão do caso concreto, entende-se que se deve fazer justiça, porém atentando-se para o fato de que se deve julgar as contas de responsável que, pelo que consta nos autos, produziu a favor da população brasileira (ao atuar como advogado no Brasil) e, atualmente, labora em prol da humanidade (ao trabalhar para a ONU). Este é o quarto argumento pelo qual se entende que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.10.37. A cinco, o caso em apreço atrai a incidência do sentido grego do termo equidade. Sobre o tema, traz-se à colação a doutrina de Maurício Godinho Delgado:Essa figura jurídica tem sido compreendida segundo duas concepções relativamente distintas na História do Direito, originárias ambas da Antiguidade Clássica.De acordo com a primeira de tais concepções (de matriz grega, em especial fundada na teorização de Aristóteles), equidade (epiqueia) traduz a retificação das distorções da lei, corrigindo as injustiças do comando abstrato perante a situação fática concreta. Corresponde ao processo de adequação e atenuação do preceito normativo – sempre naturalmente amplo e abstrato – em face das particularidades inerentes ao caso concreto ventilado apenas genericamente pela norma. A equidade (epiqueia) emerge, pois, como como critério adequador a ser observado no momento da aplicação final da norma: em síntese, um ‘critério de aplicação das leis, o qual permite adptá-las a cada caso particular e temperar-lhes o rigor com a adequação.

(...)A moderna concepção de equidade, incorporada hegemonicamente pela cultura jurídica nacional, identifica-se com a vertente grega aristotélica (epiqueia) acima exposta, não se confundindo com a noção de fonte normativa (embora a palavra equidade derive, obviamente, do vocábulo latino aequitas). A equidade significa, pois, a suavização do rigor da norma abstrata, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso concreto posto a exame judicial. A lei regula uma situação-tipo, construindo uma norma fundada nos elementos mais globalizantes dessa situação: o intérprete, pela equidade, mediatiza o comando abstrato, ao torná-lo concreto (in Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho, 3ª Ed., São Paulo: LTr, 2010, p. 163-164).10.38. É nesse mesmo sentido a lição de Carlos Maximiliano:(...) fora da equidade há somente o rigor de Direito, o Direito duro, excessivo, maldoso, a fórmula estreitíssima, a mais alta cruz. A equidade é o direito benigno, moderado, a justiça natural, a razão humana (isto é, inclinada à benevolência) (o.c., p. 172).10.39. Demais disso, vem à balha a doutrina de José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva:No tocante à função na interpretação das normas, a equidade pode significar uma de duas situações, a saber: 1ª) o predomínio da finalidade da lei sobre o seu texto, de modo a adaptá-la ao fato social, buscando-se o escopo da norma e não o teor de sua letra fria, o que está consagrado no art. 5º da LIDB; ou 2ª) a preferência pela interpretação mais benigna e humana, dentre as várias possíveis, no exame da norma (grifos acrescidos) (o.c., p. 84).10.40. Assim, aplicando-se o sentido grego do termo equidade ao caso concreto, vale dizer que, atentando-se à finalidade da concessão de bolsas de estudos no exterior (beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e de serviços, o que foi atendido pelo tempo que o recorrente advogou no Brasil após a conclusão de seus estudos em Paris), e à solução mais benigna e humana, é de se opinar pelo julgamento pela regularidade das presentes contas. Este é o quinto argumento pelo qual se entende que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.

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10.41. A seis, entende-se que o caso em apreço requer o exercício do lado direito do cérebro, nos termos preconizados pelo Excelentíssimo Senhor Ministro Carlos Ayres Britto, em discurso por ocasião de sua posse como Ministro Presidente do Pretório Excelso. Acerca do argumento, traz-se à colação o entendimento do Conselheiro Domingos Augusto Taufner do Tribunal de Contas do Estado do espírito Santo, ao examinar o processo TC-8324/2009 (Acórdão TC-057/2013):Em minhas atuações neste Plenário, tenho incansavelmente buscado, um ângulo que me permita ter uma visão do TODO (dados gerais da instituição) para analisar com maior precisão a PARTE (irregularidades encontradas). Quando só enxergo a parte sem o todo, ou o todo sem a parte, concluo ser hora novamente de esquadrinhar os autos.Da mesma forma tenho, tão incansavelmente quanto, buscado equilibrar minhas decisões entre duas esferas: a (i) RACIONAL operação do direito no plano teórico e conceitual, seguindo categorias lógicas, estruturadas a partir de métodos rígidos, concebidos segundo o modelo Cartesiano e a (ii) EMOCIONAL estimulação da percepção e do sentimento , cujo impulso nos leva ao universo dos valores da JUSTIÇA e da ÉTICA .Não observar num julgamento o equilíbrio entre as duas esferas seria o mesmo que imortalizar a injustiça material. Segundo Tobias Barreto ‘Direito não é só uma coisa que se sabe, mas também uma coisa que se sente’. O orgulho de pensar e o medo de sentir podem provocar incomensuráveis prejuízos ao indispensável e desafiador exercício da interpretação dos fatos.A própria origem da palavra ‘sentença’ vem de ‘sentir’ e para aclarar tal conceituação destaco alguns trechos do discurso de posse na presidência do STF, do ministro Carlos Ayres Britto. Para ele os julgadores devem:‘(i) Abrir as janelas dos autos para o mundo circundante, a fim de conhecer a particularizada realidade dos seus jurisdicionados e as expectativas sociais sobre a decisão objetivamente justa para aquele tipo de demanda. Juiz não é traça de processo, não é ácaro de gabinete, e por isso, sem fugir das provas dos autos nem se tornar refém da opinião pública, tem que levar os pertinentes dispositivos jurídicos ao cumprimento de sua, pouco percebida, mediata ou macro-função de conciliar o Direito com a vida. Não apenas de sua imediata ou micro-função de equacionar conflitos entre partes nominalmente identificáveis, exigindo-se-lhe, no entanto, fundamentação rigorosamente científica.’‘(ii) Manejar o lado direito do cérebro, no qual se aloja o sentimento, a geração da energia a que chamamos de intuição, contemplação, imaginação, percepção. É o nosso lado emocional, feminino, artístico, amoroso, sensitivo, corajoso, por saber que quem não solta as amarras desse navio de nome coração corre o risco de ficar à deriva é no próprio cais do porto. Já o lado esquerdo, lócus do pensamento. Matriz de uma outra modalidade de energia vital, designada por ideia, conceito, silogismo, teoria, doutrina, sistema e todo o gênero de abstrações que estamos aptos a fazer como seres dotados de razão. O pensamento é sinônimo de inteligência racional ou lógica ou intelectual ou reflexiva ou cartesiana, responsável por um tipo de conhecimento que se obtém, não de chapa, não de estalo, como um raio que espoca no céu, porém por metódicas aproximações de um objeto necessariamente isolado ou fechado em si mesmo.’Para o Ministro Ayres Britto, o hemisfério esquerdo é aquele que nos leva a idolatrar a segurança, enquanto o direito nos conduz efetivamente à justiça (grifos acrescidos).10.42. Não é por acaso que justiça é uma palavra feminina, ao passo que o direito é uma palavra masculina. É dizer: o caso em apreço requer que se utilize o lado direito do cérebro, o lado emocional, feminino, artístico, amoroso, sensitivo e corajoso, para se fazer justiça. Afinal, o juiz moderno não é um convidado de pedra no processo. De fato, ensina Lídia Reis de Almeida Prado que:

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o juiz deve proferir a sentença com sentimento e não se reduzir a um mero burocrata repetidor de decisões alheias, com a finalidade de aderir à maioria (grifos acrescidos) (in O juiz e a emoção: aspectos da lógica da decisão judicial, 6. Ed., São Paulo: LTr, 2013, p. 44).10.43. Nesse sentir, e este é o sexto argumento, mediante o uso do lado do cérebro mais sanguineamente irrigado, o lado direito, na busca de valores mais elevados (a bondade, a ética, a verdade e a justiça), entende-se que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.10.44. Alfim, a sete, observa-se que a regra geral a ser seguida é a de que os bolsistas do CNPQ, em cursos de doutorado no exterior, devem retornar ao Brasil e apresentar o diploma de doutor à referida autarquia. As exceções, como o caso em apreço, devem ser cuidadosamente examinadas com o intuito de, sempre, saber se a população brasileira foi, ou não, beneficiada com o custeio dos referidos estudos. Sobre o tema, transcreve-se o ensinamento do Excelentíssimo Senhor Ministro Eros Grau, ao apreciar a Reclamação 5.588/SP:[...] 5. Daí porque, até para ser coerente como que tenho reiteradamente afirmado nesse Plenário, eu haveria de votar no sentido de se dar provimento ao agravo. Ocorre, no entanto, que a situação de fato de que nestes autos se cuida consubstancia exceção. Com efeito, estamos diante de uma situação singular, exceção, e, como observa CARL SCHMITT, as normas só valem para as situações normais. A normalidade da situação que pressupõem é um elemento básico do seu ‘valer’. [...]6. O estado de exceção é uma zona de indiferença entre o caos e o estado da normalidade, uma zona de indiferença capturada pela norma. De sorte que não é a exceção que se subtrai à norma, mas ela que, suspendendo-se, dá lugar à exceção – apenas desse modo ela se constitui como regra, mantendo-se em relação com a exceção. A esta Corte, sempre que necessário, incumbe decidir regulando também essas situações de exceção. Ao fazê-lo, não se afasta do ordenamento, eis que aplica a norma à exceção desaplicando-a, isto é, retirando-a da exceção.7. Permito-me, ademais, insistir em que ao interpretarmos/aplicarmos o direito – porque aí não há dois momentos distintos, mas uma só operação – ao praticarmos essa única operação, isto é, ao interpretarmos;/aplicarmos o direito não nos exercitamos no mundo das abstrações, porém trabalhamos com a materialidade mais substancial da realidade. Decidimos não sobre teses, teorias ou doutrinas, mas situações do mundo da vida. Não estamos aqui para prestar contas a Montesquieu ou a Kelsen, porém para vivificarmos o ordenamento, todo ele. Por isso o tomamos na sua totalidade. Não somos meros leitores de textos – para o que nos bastaria a alfabetização – mas magistrados que produzem normas, tecendo e recompondo o próprio ordenamento (grifos acrescidos) (apud José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, o.c., p. 139).10.45. Noutro falar, a situação em apreço deve ser considerada como exceção à regra geral imposta pelo CNPQ, vez que a norma só vale para as situações normais. É este o sétimo argumento pelo qual se entende que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado.10.45. Sabatinando-se a tessitura do raciocínio desenvolvido em páginas transatas, à luz da teleologia da Resolução 36/1991 do CNPQ, do magistério seguro do douto Procurador Júlio Marcelo de Oliveira, de precedentes jurisprudenciais do TCU, do princípio da igualdade, da incidência do apotegma summum jus, summa injuria, da lógica do razoável, do sentido grego do termo equidade, do exercício do lado direito do cérebro, com o adminículo doutrinal de Estêvão Mallet, Carlos Maximiliano, Georges Durry, Michelle Gobert, Luís Recaséns Siches, Alípio Silveira, José Frederico Marques, José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, Manoel Antônio Teixeira Filho, Maurício Godinho Delgado, Lídia Reis de Almeida Prado e da lição do Excelentíssimo Senhor Ministro Eros Grau, opina-se no sentido de que se dê provimento ao recurso do recorrente, julgando-se regulares as suas contas, com o afastamento do débito que lhe foi imputado.

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CONCLUSÃO11. Das análises anteriores, conclui-se que:a) não houve a incidência da prescrição;b) o presente processo tramitou em instância competente;c) houve citação válida;d) este processo não deve ser arquivado;e) os juros de mora, na hipótese de desprovimento do presente recurso, devem ser praticados a partir de 29/4/1993;f) as presentes contas devem ser julgadas regulares, com o afastamento do débito que foi imputado ao recorrente.11.1. Com base nessas conclusões, propõe-se o provimento do recurso, com o julgamento pela regularidade das contas do recorrente.PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO12. Ante o exposto, submetem-se os autos à consideração superior, propondo-se, com fundamento nos artigos 32, inciso I, e 33 da Lei 8.443/1992, c/c o art. 285 do Regimento Interno do TCU:a) conhecer do recurso interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr contra o Acórdão 2.608/2014–TCU–2ª Câmara, para, no mérito, dar-lhe provimento, a fim de julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado;b) dar ciência do acórdão que for prolatado, bem como do relatório e voto que o fundamentarem, ao recorrente e aos demais interessados”.

3. Divergindo do exame do auditor, o Secretário da Serur ratifica o exame realizado pelo Diretor, que foi lavrado nos seguintes termos:

“Por intermédio do Acórdão 2.608/2014 – TCU – 2ª Câmara, este Tribunal julgou tomada de contas especial instaurada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) em face do Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, em razão de não apresentar documentação comprobatória de conclusão de curso relativo à bolsa de estudos para a realização de doutorado no exterior, no período de 1/1 a 30/12/1992, e por não retornar ao Brasil após o encerramento das atividades relacionadas com a referida bolsa, nos termos entabulados na Resolução CNPQ nº 36/1991, pela qual o ora recorrente se obrigou.2. Nessa etapa processual o recorrente comparece aos autos, por meio de recurso de reconsideração, alegando, em síntese, que:

- operou-se a prescrição da pretensão punitiva;- a Secex/RO é instância incompetente para processar o feito;- a citação restou inválida, porquanto encaminhada para advogado sem poderes para

tanto;- o processo deve ser arquivado dado o longo tempo para a instauração da TCE;- os juros somente devem ser computados após a citação válida; e- O TCU não exige, necessariamente, a conclusão do curso, devendo as contas serem

julgadas regulares.3. Quanto às alegações trazidas, aquiesce-se as análises empreendidas pelo Auditor Federal, sintetizadas no item 11 (onze) da instrução, no sentido de que não incidiu a prescrição, o processo tramitou em instância competente, houve a citação válida, o processo não deve ser arquivado, assim como não há incorreção quanto a data de referência para fins de atualização do débito e incidência de juros. Todavia, rejeita-se a conclusão propugnada para o derradeiro ponto, qual seja, o julgamento pela regularidade das contas com o consequente afastamento do débito.4. Tal entender deriva do fato de que o afastamento do débito em situações como a que ora se analisa somente pode ser levada a efeito quando há motivos suficientes a demonstrar a

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impossibilidade de conclusão do curso, o que não restou evidenciado nos presentes autos. Esta é a inteligência do Acórdão 2.058/2014 – TCU – Plenário, oportunidade em que o Ministro Raimundo Carreiro, assim conduziu seu voto:

‘O dispêndio de recursos públicos para custear a realização de cursos de pós-graduação no exterior tem o objetivo de promover o desenvolvimento científico nacional. Para isso, é preciso que o bolsista conclua seu curso e aplique no país os conhecimentos obtidos no exterior. Ao receber esses valores o beneficiário assume esse compromisso e, uma vez não cumprido, sem a existência de motivos suficientes para tal, faz-se necessário a devolução dos recursos recebidos.

5. Não há, assim, uma cláusula geral de dispensa do ressarcimento. É preciso avaliar existência de justificativas suficientes para elidir, no caso concreto, a obrigação de indenizar que é ínsita a esse tipo de ajuste. Caso contrário, deve prevalecer a obrigação de ressarcir o que foi livremente pactuado entre as partes. 6. Várias outras decisões mais recentes que as indicadas na instrução partem desse mesmo pressuposto, de que o ressarcimento se impõe sempre que não houver justificativas satisfatórias para o inadimplemento da obrigação assumida, como evidenciam os excertos de ementa ou de fundamentação dos seguintes julgados:

1. A contribuição financeira concedida pela União a estudantes e pesquisadores não é gratuita nem objetiva o atendimento de interesse puramente particular, ficando o beneficiário devedor dos recursos recebidos enquanto não cumprir a contrapartida assumida para aproveitamento da bolsa. (...)3. O beneficiário de bolsa para estudo ou pesquisa que deixar de cumprir as obrigações a que se comprometeu para uso dos recursos, dentro do prazo estabelecido, terá suas contas julgadas irregulares, com condenação em débito’. (Acórdão 291/2010-TCU-1ª Câmara)‘É dever de todo agraciado com bolsa de estudos no exterior, custeada por recursos públicos oriundos de toda a sociedade, prestar contas das atividades desenvolvidas’. (Acórdão 3.801/2010-TCU-2ª Câmara). O descumprimento de termo de compromisso firmado em virtude da obtenção de bolsa de estudos no exterior, custeada com recursos federais implica na irregularidade das contas e na imputação de débito ao bolsista’. (Acórdão 1.927/2011-TCU-2ª Câmara)

7. Situação similar ao dos presentes autos foi apreciada recentemente pelo Tribunal, por meio do Acórdão 3.553/2014-TCU-2ª Câmara. Na oportunidade restou assentado na decisão que a ex-bolsista não apresentou ao CNPQ, nem ao Tribunal, a documentação exigida pelas normas aplicáveis para a comprovação da correta aplicação dos recursos da bolsa de estudos no exterior, em especial, o certificado de conclusão do curso e o exemplar da tese, tal como na hipótese em exame. 8. Nesse outro processo, a ex-bolsista apresentou justificativas para a não conclusão do curso: ‘reforma administrativa implementada pelo governo estadual’, ‘falecimento do orientador de sua tese’, mas em momento que ‘coincide com o término da prorrogação excepcionalmente concedida pelo CNPQ’; ‘instabilidade funcional e os problemas de saúde’, mas que ‘teriam ocorrido em período posterior àquele estabelecido para a entrega do certificado de conclusão do curso e do exemplar da tese defendida’. Em suma, foram apresentadas justificativas, mas baseadas em eventos que, segundo o Tribunal, não puderam ‘servir como justificativas para a não conclusão do curso de doutorado, tampouco para a impossibilidade de defesa da tese, no prazo pactuado com o CNPQ’.9. No caso presente, salvo dificuldades financeiras, não foram trazidas outras justificativas para a não conclusão da tese e obtenção da titulação financiada pelo CNPQ.

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10. Exsurge dos autos carta enviada ainda em 1993, oportunidade em que se menciona expressamente que seria possível concluir o curso (págs. 24-25, peça 1). Todavia, a partir daí, nenhuma satisfação foi dada, restando como fato incontroverso a não conclusão da tese.11. Há nos autos comprovantes de que o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr retornou ao país. Ora, postura de lealdade e boa-fé, esperada seria ter comunicado ao CNPQ seu retorno e ter permanecido à disposição do órgão repassador para esclarecer os fatos. No entanto, o recorrente optou pelo silêncio. 12. Depois, novamente, deixou o país. Mais uma vez a postura de lealdade e boa-fé exigiria que, no mínimo, deixasse com o órgão endereço ou forma com que poderia ser comunicado (telefone, e-mail, endereço de um representante no país – enfim, um meio que permitisse o diálogo). Ao contrário, o que se vê no processo todo é a enorme dificuldade enfrentada tanto pelo CNPQ quanto por este Tribunal para se comunicar com o ex-bolsista, nos vários momentos em que buscou esclarecer a situação.13. De concreto, o que há nos autos é o não atingimento do objetivo pactuado, sem que se saiba concretamente as razões que levaram ao insucesso da empreitada pela qual o recorrente se obrigou. Desse modo, a situação versada ajusta-se mais adequadamente aos precedentes acima indicados, no sentido de se justificar a responsabilização do bolsista, pois a elisão dessa responsabilidade fica na dependência de justificativas bastantes, ausentes no caso concreto.14. Outro ponto que merece destaque quanto à atuação do recorrente nos autos relaciona-se à suposta ausência de poderes do advogado constituído para receber citação. Assim, considerando que referido argumento é por vezes utilizado em recursos que tramitam nessa Secretaria, mostra-se pertinente acrescentar algumas considerações em reforço ao exame empreendido na instrução.15. Na hipótese, observa-se que o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr comparecera aos autos devidamente assistido por seu advogado, pleiteando a anulação do julgamento anterior (Acórdão 6.075/2010 – 2ª Câmara), afirmando a invalidade de sua citação por edital. Reconhecida pelo Tribunal a nulidade (Acórdão 8.365/2012 – 2ª Câmara), a citação foi refeita na pessoa do advogado, observando-se, para tanto, os termos do art. 179, § 7º do Regimento Interno do TCU.16. A alegação, pelo advogado, de ausência de poderes expressos para receber essa nova citação não merece prosperar, ainda que se aplique ao processo de controle externo, por analogia, a previsão contida no art. 38 do CPC, que assim estabelece:

Art. 38. A procuração geral para o foro, conferida por instrumento público, ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação inicial, confessar (...).

17. Essa citação inicial a que se refere o art. 38 do CPC é apenas e tão somente aquele ato com que, pela primeira vez, o responsável ou interessado passa a ter ciência da demanda proposta, em todos seus termos, tornando-se parte no processo a partir de então.18. Como bem leciona Cândido Rangel Dinamarco (Vocabulário do Processo Civil, São Paulo, Malheiros, p. 89), ‘citação é o ato pelo qual o demandado recebe ciência da demanda proposta em face dele e se torna parte no processo. Dar ciência e integrar ao processo são, pois, as duas funções da citação’. Tudo quanto passar da mera ciência da demanda proposta e integração ao processo está fora do conceito de citação inicial, que é dirigida à própria parte até porque ela ainda não tem advogado constituído nos autos.19. Assim, uma vez ciente da existência do processo, conhecendo as irregularidades que lhe são atribuídas e estando regularmente representada por advogado constituído nos autos, os demais atos ordinários de desenvolvimento do processo (tal como a convocação para oferecer defesa, realizada no curso do processo) podem ser validamente dirigidos ao advogado constituído, nos exatos termos do RI/TCU, art. 179, § 7º, porque tais atos qualificam-se como de desenvolvimento do processo, e não mais como citação inicial.

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20. Em suma, salvo quanto à citação inicial, os demais atos típicos do desenvolvimento do processo são, sim, de responsabilidade do advogado constituído, sendo suficiente a procuração com poderes gerais, tal como estabelecido na parte inicial do art. 38 do CPC.21. Ademais, na hipótese em concreto, o responsável comparecera aos autos exatamente para arguir a nulidade da citação anterior, procedida por edital. Essa situação é expressamente regulada pelo art. 214, § 2º, do CPC, que estabelece:

Art. 214. Para a validade do processo é indispensável a citação inicial do réu.http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm - art214

§ 2o Comparecendo o réu apenas para arguir a nulidade e sendo esta decretada, considerar-se-á feita a citação na data em que ele ou seu advogado for intimado da decisão.

22. Veja-se, portanto, que há regramento específico para a hipótese dos autos: comparecendo o réu para arguir nulidade e sendo esta decretada – exatamente como ocorreu nestes autos –, o CPC até mesmo dispensa nova citação, apenas preconiza acerca da necessidade de reabertura de prazo para defesa, assim que a parte ou seu advogado forem intimados da nova decisão. 23. O art. 214, portanto, constitui uma aplicação prática da regra geral contida na parte inicial do art. 38 do CPC, no sentido de que ‘a procuração geral para o foro’ habilita o advogado constituído nos autos a praticar todos os atos ordinários de desenvolvimento do processo (como o é a convocação, no curso do processo, para prestar esclarecimentos sobre irregularidades atribuídas à parte representada), sendo perfeitamente válidas as comunicações e intimações que, com esse fim, lhe forem dirigidas. 24. Sendo esse o contexto, considerando que o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr não carreou justificativas suficientes a demonstrar a justa causa para o não atingimento dos objetivos pactuados junto ao CNPQ, alvitra-se pela negativa de provimento ao recurso. 25. Por todo o exposto, com as vênias por divergir quanto ao mérito da instrução precedente, eleva-se os autos à consideração superior com a seguinte proposta:

a) conhecer do recurso de reconsideração e, no mérito, negar-lhe provimento;b) dar ciência à parte e aos órgãos/entidades interessadas do teor da decisão que vier a

ser adotada”.

3. O Ministério Público junto TCU pronuncia-se, em parecer subscrito pela Subprocuradora-Geral Cristina Machado da Costa e Silva, de acordo com os dirigentes da unidade técnica:

2. Embora tenha recebido uma bolsa mensal do CNPq para custear os estudos no ano de 1992, o responsável não comprovou a conclusão do curso tampouco retornou ao Brasil no prazo avençado, motivo pelo qual, após se manter silente quando instado a comparecer nos autos, foi condenado pelo TCU por intermédio do acórdão recorrido.3. Conhecido o recurso, a Unidade Técnica é uniforme quanto à rejeição das razões recursais, exceto no que se refere a uma das razões recursais de maior relevo, a exigência ou não da conclusão do curso, para fins de eventual aprovação das contas pelo TCU. 4. O auditor instrutor conclui a sua análise pelo afastamento do débito, considerando que o responsável, embora não tenha concluído o curso, atingiu a finalidade da concessão de sua bolsa de estudos quando retornou ao Brasil, em 1994, e retribuiu o custeio de sua pós graduação por meio de trabalhos desempenhados a partir de então (peça 40).5. Por outro lado, o titular da subunidade da Serur conclui, com a anuência do Secretário, pela impossibilidade de afastamento do débito, por não terem sido apresentados motivos suficientes para que a não conclusão do curso pelo responsável (peça 41 e 42).6. Com as devidas vênias ao auditor da Serur, alinhamo-nos ao posicionamento do corpo diretivo daquela Unidade Técnica.

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4

7. O Diplôme d'études approfondies (DEA), que seria o título a ser adquirido pelo Senhor Nasser Fadalallah Hassan Zakr ao final do curso, exigia que, no período de um ano, o aluno defendesse uma tese, equivalente à tese de doutorado.8. Em declaração datada de 18/5/1992, o orientador do Senhor Nasser Fadalallah Hassan Zakr atesta que as pesquisas do bolsista estavam avançadas. Porém, além de ser a única evidência de que o responsável estava desenvolvendo seus estudos, a aludida declaração informa que o doutorando inexplicavelmente só estaria apto a sustentar a tese ao final de 1993, mas não de 1992, embora se tratasse de um curso de um ano (peça 30, p. 32-33).9. O que restou evidente nos autos, posteriormente, é que o responsável buscou, infrutiferamente, a extensão de sua bolsa em mais um ano, tendo se inscrito novamente no curso em 1993 e em 1994 (peça 30, p. 28-31). Contudo, em nenhum momento foi devidamente comprovado que o ex-bolsista esteve apto a concluir o curso e obter o DEA.10. Dessa forma, não é possível admitir, com razoável grau de certeza, que o Senhor Nasser Fadalallah Hassan Zakr empreendeu, ao longo do ano de 1992, o esforço individual necessário para se obter o título de doutor, de modo a fazer jus ao recebimento da bolsa durante o período. Ademais, a ausência da apresentação de um diploma ou certificado de conclusão de curso também não valida a hipótese de essa dedicação ter ocorrido em momento posterior ao acordado com o CNPq.11. Feitas essas considerações, esta representante do Ministério Público manifesta-se por conhecer do recurso de reconsideração para, no mérito, negar-lhe provimento, dando ciência às partes, conforme o art. 144, do Regimento Interno do TCU”.

É o relatório.

VOTO

Conforme se verifica no relatório precedente, cuidam os autos, nesta fase processual, de recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr contra o Acórdão nº 2.608/2014-TCU-Segunda Câmara.2. Por meio da referida decisão o Tribunal considerou revel o recorrente, julgou irregulares as suas contas condenando-o ao pagamento do valor que especifica, além das providências processuais decorrentes.3. O fundamento factual da condenação consta do voto do relator a quo nos seguintes termos:

“9. Lembro que não restou comprovado que o ex-bolsista ofereceu contrapartida à sociedade brasileira em razão dos estudos que lhe foram financiados com recursos federais, configurando o descumprimento aos itens 5.10 e 5.11 da Resolução Normativa CNPq n.º 4, de 6/3/1990 (Peça 1, fl.15), vigente à época do pedido e da concessão da bolsa”.

4. Consta, igualmente, do referido voto, que, após ser beneficiado com a bolsa de estudos para participação em programa de doutorado na França, o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr descumpriu o termo de compromisso por ele assinado junto ao CNPq, uma vez que não observou a obrigatoriedade de retorno ao Brasil e permanência no país após o encerramento dos estudos para aplicação dos conhecimentos adquiridos com sua formação, além de não ter apresentado a documentação comprobatória de conclusão do curso de doutorado.5. A Serur sugere o conhecimento da peça recursal e no exame de mérito mostra-se dividida: enquanto o auditor instrutor do feito propõe o provimento e o julgamento pela regularidade das contas do responsável com afastamento do débito imputado, a instância diretiva da unidade técnica propõe negar-lhe provimento, posição endossada pelo Ministério Público junto ao TCU (MP/TCU), em parecer da lavra da eminente Subprocuradora-Geral Cristina Machado da Costa e Silva.

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6. Tal divergência, entretanto, mostra-se pontual (exclusivamente no que tange à tese de que “as presentes contas devem ser julgadas regulares, pois o TCU não exige, necessariamente, a conclusão do curso”), uma vez que há convergência no que tange aos demais elementos manejados pelo recorrente, a saber: i) ausência de citação válida, porquanto encaminhada para advogado sem poderes para tanto; ii) prescrição da pretensão de ressarcimento aos cofres públicos; iii) a Secex/RO é instância incompetente para processar o feito; iv) o processo deve ser arquivado dado o longo tempo para a instauração da TCE, em virtude da morosidade do CNPq gerando prejuízo ao exercício da ampla defesa; e v) os juros somente devem ser computados após a citação válida.7. O auditor da Serur alinhava sete razões, que sumario a seguir, pelas quais considera que as presentes contas devem ser julgadas regulares com o afastamento do débito imputado ao recorrente:

“a) apesar de não ter concluído sua tese de doutorado, o recorrente atingiu a finalidade da concessão de sua bolsa de estudos (proporcionou, e ainda proporciona, benefícios à população brasileira e mundial, vez que trabalhou em escritórios de advocatícia no Brasil durante mais de 2 anos, trabalha na ONU e publicou diversos artigos em revistas especializadas);b) o recorrente, durante os seus estudos de doutorado, agiu com lealdade, probidade, honestidade e sinceridade de propósitos. De salientar que, durante o ano de 1993, o recorrente não obteve ajuda financeira do CNPQ para concluir seus estudos, apesar de seu orientador ter enfatizado que, no final do aludido ano, estaria apto a sustentar a sua tese de doutorado;c) a interpretação meramente literal dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução 36/1991 pode levar a uma decisão injusta. Afinal, summum jus, summa injuria – ‘do excesso de direito resulta a suprema injustiça’;d) aplicando a lógica do razoável e utilizando-se as ideias supra como fachos iluminadores à compreensão do caso concreto, entende-se que se deve fazer justiça, porém atentando-se para o fato de que se deve julgar as contas de responsável que, pelo que consta nos autos, produziu a favor da população brasileira (ao atuar como advogado no Brasil) e, atualmente, labora em prol da humanidade (ao trabalhar para a ONU);e) aplicando-se o sentido grego do termo equidade ao caso concreto, vale dizer que, atentando-se à finalidade da concessão de bolsas de estudos no exterior (beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e de serviços, o que foi atendido pelo tempo que o recorrente advogou no Brasil após a conclusão de seus estudos em Paris), e à solução mais benigna e humana, é de se opinar pelo julgamento pela regularidade das presentes contas;f) mediante o uso do lado do cérebro mais sanguineamente irrigado, o lado direito, na busca de valores mais elevados (a bondade, a ética, a verdade e a justiça), entende-se que se deve julgar regulares as contas do recorrente, com a exclusão do débito que lhe foi imputado;g) observa-se que a regra geral a ser seguida é a de que os bolsistas do CNPQ, em cursos de doutorado no exterior, devem retornar ao Brasil e apresentar o diploma de doutor à referida autarquia. As exceções, como o caso em apreço, devem ser cuidadosamente examinadas com o intuito de, sempre, saber se a população brasileira foi, ou não, beneficiada com o custeio dos referidos estudos”.

8. Os dirigentes da Serur, todavia, acompanhados pelo MP/TCU, rejeitam a proposição de julgamento pela regularidade das contas e o consequente afastamento do débito imputado por considerarem que não foram evidenciados nos autos motivos suficientes a demonstrar a impossibilidade de conclusão do curso. Manejam, em defesa de sua tese, diversos precedentes da Corte, especialmente no sentido da responsabilização do bolsista no caso de não apresentação de justificativas para a não conclusão do curso.9. Aduzem, ainda, que, no presente caso, salvo dificuldades financeiras, não foram trazidas outras justificativas para a não conclusão da tese e obtenção da titulação financiada pelo CNPq.

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10. No que tange à admissibilidade, os recursos de reconsideração devem ser conhecidos, uma vez presentes os requisitos previstos nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei nº 8.443, de 1992, e no art. 285 do Regimento Interno do TCU.11. No mérito, acolho de pronto o exame da Serur naquilo em que foi unânime e recebeu aval do MP/TCU; na parte divergente, considero que o feito merece deslinde diverso dos pareceres apresentados, nos termos que especifico neste voto.12. Com efeito, não merecem prosperar os argumentos do recorrente que menciono no item 6 deste voto, e o exame da Serur sobre esses aspectos não merece reparos de minha parte, pelo que incorporo integralmente aqueles argumentos às minhas razões de decidir.13. No que tange especificamente à discussão sobre o mérito do julgamento das presentes contas, peço vênias aos autores dos pareceres precedentes para apresentar os elementos a seguir, que me conduzem a um encaminhamento alternativo, de rejeição das alegações de defesa do Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr e abertura de novo e improrrogável prazo para o recolhimento do débito, nos exatos termos do § 2º do art. 12 da Lei nº 8.443/1992 c/c os §§ 3º e 4º do art. 202 do Regimento Interno desta Corte.14. Inicialmente, adentrando nos autos, constato que assiste razão parcial ao recorrente quando alega que as normas referidas no acórdão condenatório são inaplicáveis à espécie, porquanto à época da concessão da bolsa de estudos a legislação vigente era outra.15. De fato, o Acórdão nº 2.608/2014-TCU-2ª Câmara aponta como fundamento normativo o descumprimento dos itens 5.10 e 5.11 da Resolução Normativa CNPq nº 4, de 6/3/1991 (item 9 do voto, acima reproduzido) enquanto a norma vigente à época da concessão da bolsa era a Resolução CNPq nº 36, de 5 de setembro de 1991 (peça 1, fls. 8/16), elemento que ademais constou da última citação do responsável (peça nº 15), verbis:

“O débito é decorrente do descumprimento dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução Normativa nº 36/1991, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, por não apresentar documentação comprobatória de conclusão de curso relativo à bolsa de estudos concedida pelo CNPq na modalidade ‘Doutorado no Exterior’, no período de 1/1 a 30/12/1992, e por não retornar ao Brasil após o encerramento das atividades relacionadas com a referida bolsa de estudos, dentro do prazo estipulado”.

16. Neste ponto, tendo em vista o encaminhamento que sugiro para o feito, que configura um benefício facultado pela Lei Orgânica ao responsável de boa-fé, considero desnecessário aprofundar o exame de eventual impacto dessa inconsistência formal do acórdão condenatório no desenvolvimento regular do processo, conforme pleiteia o recorrente, no sentido de que que seja promovida revisão ou nova anulação da decisão. Contudo, sem prejuízo de registrar que a ocorrência não prejudica o processamento do feito, uma vez que, conforme jurisprudência pacífica nesta Corte, o responsável deve responder sobre o fato em si e não sobre a capitulação legal que lhe foi atribuída.17. De outro lado, a par das irregularidades atribuídas ao recorrente frente a todos os elementos que conformam a situação fática, e em busca da decisão mais justa, concordo com o auditor da Serur, quando afirma que “a interpretação meramente literal dos itens 7.3, 7.4 e 7.5 da Resolução 36/1991 pode levar a uma decisão injusta. Afinal, summum jus, summa injuria – ‘do excesso de direito resulta a suprema injustiça’ e que “é de mister a utilização da ‘lógica do razoável’, que tem tanta dignidade quanto a lógica tradicional pura, porém uma lógica impregnada de pontos de vista estimativos, de critérios de valoração e de pautas axiológicas”.18. Concordo ainda com a peça instrutiva quando aduz que o caso em apreço atrai a incidência da equidade, no sentido de suavização do rigor da norma abstrata, tendo em vista as circunstâncias específicas do caso concreto posto a exame. 19. Isso não obstante, não esqueço que a responsabilidade pelo estado das coisas, neste feito, deve ser atribuída ao Sr. Zakr, que se manteve incomunicável durante quase todo o período após haver demandado a prorrogação da bolsa de estudos, sem que haja nos autos informação de qualquer

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providência de sua parte para regularizar as pendências apontadas pela concedente, senão seu pronunciamento último, antes do julgamento do feito, em 10/12/1993.20. Essa situação foi consignada no parecer do Diretor da Serur nos seguintes termos:

“11. Há nos autos comprovantes de que o Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr retornou ao país. Ora, postura de lealdade e boa-fé, esperada seria ter comunicado ao CNPQ seu retorno e ter permanecido à disposição do órgão repassador para esclarecer os fatos. No entanto, o recorrente optou pelo silêncio. 12. Depois, novamente, deixou o país. Mais uma vez a postura de lealdade e boa-fé exigiria que, no mínimo, deixasse com o órgão endereço ou forma com que poderia ser comunicado (telefone, e-mail, endereço de um representante no país – enfim, um meio que permitisse o diálogo). Ao contrário, o que se vê no processo todo é a enorme dificuldade enfrentada tanto pelo CNPQ quanto por este Tribunal para se comunicar com o ex-bolsista, nos vários momentos em que buscou esclarecer a situação”.

21. A afirmativa decorre do fato, evidenciado nos autos e admitido pelo recorrente, de que o Sr. Zakr deixou de cumprir disposições normativas que regulavam a concessão da bolsa, visto que não apresentou comprovação da conclusão da tese de doutoramento e não retornou ao Brasil no prazo estabelecido no termo de compromisso firmado com o CNPq.22. Por outro lado, encontram-se elementos comprobatórios de que retornou ao Brasil, ainda que intempestivamente, aqui atuando profissionalmente por período superior ao previsto na norma de regência, sendo posteriormente contratado pela Organização das Nações Unidas, onde comprova a prestação de serviços até 15/8/2014, item 10.16 da instrução original da Serur:

“a) no período de 1/3/1994 a 31/8/1994, trabalhou em escritório de advocacia no Brasil, comprovado mediante anotação em carteira de trabalho (peça 4, p. 44);b) no período de 1/9/1994 a 31/5/1996, integrou os quadros de escritório de advocacia, tendo atuado na área consultiva, fundamentalmente na área securitária, financeira e de investimentos internacionais (peça 4, p. 45);c) entre os anos de 1996 até 15/8/2014, comprovou vínculo profissional com a Organização das Nações Unidas (peça 4, p. 46-54, peça 5, p. 1-5 e peça 38, p. 3-4)”.

23. Entretanto, examinando essas informações não tenho como concluir que o recorrente, durante a atuação nos escritórios de advocacia privada, efetivamente aplicou os conhecimentos auferidos no período da bolsa em benefício da sociedade brasileira, em sintonia com a tese que defendi ao relatar o Acórdão nº 1.971/2006-TCU-1ª Câmara, mencionado na primeira instrução da Serur (item 10.15 da peça instrutiva):

“Como é cediço, a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a concessão de bolsa de estudos visa a beneficiar a população brasileira com melhor qualidade de bens e serviços (v.g., Decisão 231/2001-2ª Câmara e Acórdão 343/2002-Plenário).Esse benefício se dá com o retorno ao país, de modo que o bolsista aplique os conhecimentos obtidos com a capacitação custeada com recursos da sociedade”.

24. Outrossim, é de se ponderar, em benefício do recorrente, posto que se reflete positivamente na imagem do Brasil no exterior eventualmente como resultado da formação subsidiada, a informação documentada de que o responsável é funcionário da Organização das Nações Unidas, segundo diz, prestando serviços de caráter humanitário, em diversas missões ao redor do mundo, havendo atuado junto ao Alto Comissariado para Direitos Humanos, à Missão das Nações Unidas e ao Tribunal Criminal Internacional em Ruanda; junto à missão das Nações Unidas na Bósnia e Herzegovina; junto à Missão das Nações Unidas no Kosovo; junto à missão das Nações Unidas na Libéria, entre outras.25. Nesse contexto factual, pondero todos esses elementos para verificar se o descumprimento das disposições normativas do CNPq pelo Sr. Zakr, ante os argumentos de que teria demonstrado o

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cumprimento da finalidade da bolsa concedida, tem potencial suficiente para que o Tribunal mantenha o julgamento pela irregularidade das contas e o condene ao ressarcimento do débito atualizado monetariamente e com juros de mora, conforme consta do acórdão recorrido.26. Considero que não, porém não tenho elementos para isentar totalmente o Sr. Zakr da responsabilidade que lhe cabe, uma vez que essas irregularidades somadas à sua omissão perante o CNPq ao final da bolsa deram causa à presente TCE, na qual se discutem questões que até os dias atuais o recorrente não logrou êxito em elidir, restando, portanto, caracterizado o potencial dano ao erário.27. Entretanto, entendo que os elementos apresentados pelo recorrente nessa fase processual são suficientes para demonstrar que não atuou de má-fé, havendo o procedimento adotado pelo CNPq – que na condição de concedente da bolsa de estudo demorou consideravelmente na cobrança de providências por parte do beneficiário – contribuído para a situação final do processo e, em certa medida, para a omissão do Sr. Zakr, o que mitiga, na minha percepção, a reprovabilidade da sua conduta.28. Sobre esse aspecto, discorro, a seguir, brevemente, sobre o trâmite deste processo na fase interna da TCE, para sublinhar, conquanto considere inabalável a análise da Serur de que não houve a superação do prazo de dez anos a que se refere a IN-TCU nº 71/2012, minha sensibilidade ao argumento do recorrente quanto a possíveis prejuízos ao exercício da ampla defesa e do contraditório, uma vez que foi citado inicialmente pelo Tribunal em agosto de 2009 (que veio a se aperfeiçoar processualmente por meio de citação editalícia em 19/10/2009), portanto, quinze anos após uma efetiva interlocução do concedente com o beneficiário. Lembro, por oportuno, que consta dos autos notificação do CNPq nos anos de 2001 e 2004, sem a presença do responsável aos autos.29. Verifico que a bolsa foi deferida em 6 de dezembro de 1991 e vigeu no período de 1/1/1992 a 30/12/1992 (peça 1, fls. 19/20), havendo o CNPq notificado o recorrente em 14/10/1993 (peça 1, fl. 23) para que esclarecesse acerca da sua permanência no exterior bem como para o envio imediato dos seguintes documentos: cópia da tese; certificado de conclusão do curso; cópia do diploma e bilhete de passagem utilizado para retorno ao Brasil.30. Consta, ainda, dos autos (peça 1, fls. 24/25), resposta do Sr. Zakr, datada de 10/12/1993, informando que:

“Embora a tese esteja em estado já bastante adiantado, as inúmeras mudanças no sistema legal de investimento estrangeiro do Brasil - tema central de minha tese - tem exigido constante atualização e revisão do plano de trabalho ver em anexo 1. Esta dificuldade tem tornado o processo de redação mais lento do que originalmente previsto.Aproveito a ocasião para solicitar-lhe a emissão da passagem de retorno ao Brasil, previsto para 15 de fevereiro de 1993, visto que faz parte imprescindível de minha reinserção no território nacional. Prossegui até o momento, pois tive obrigações de caráter cientifico, como:Revisão do meu plano de trabalho, de acordo com o meu orientador, em anexo (1);Frequentação de colóquios, congressos, etc ...Tempo para pesquisa.Quero destacar que continuo o compromisso firmado junto ao CNPq, e estou dando prosseguimento ao meu trabalho de minha tese”.

31. Consta, também, peça 1, fls. 27, Ofício CNPq SBEX1/SHS/S Nº 94, de 19/10/1994, de seguinte teor:

“Solicitamos a V.Sa. esclarecimentos quanto a sua permanência no exterior e envio imediato dos documentos assinalados abaixo:Relatório Técnico período FinalParecer do Orientador sobre seu desempenho no cursoCópia da TeseCertificado de Conclusão do curso

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Cópia do DiplomaLembramos-lhe que quando não efetivada o retorno ao país, o bolsista deverá ressarcir ao CNPq os valores correspondentes aos benefícios recebidos durante a vigência da bolsa”.

32. Em seguida, identifico nos autos o Ofício CNPq OF.COOPI/CGEFO-076/01, de 19/2/2001, no qual se reiteram as demandas acima e se alerta:

“Finalmente, cabe lembrar-lhe que os bolsistas do CNPq têm o dever de retomar ao Brasil e aqui permanecer no mínimo, por período igual ao da duração da bolsa, comunicando semestralmente ao CNPq o seu domicílio durante esse período e comprovando o exercício de atividades ligadas aos estudos realizados”.

33. Por fim, (peça 1, fls. 31/37), novo ofício de notificação, desta feita da Auditoria Interna do CNPq, datado de 1º/10/2004, para regularização das pendências sob pena de instauração da Tomada de Contas Especial e subsequente notificação por edital após infrutífera tentativa de notificação pelos correios do Brasil.34. Do exposto, posso concluir que após as gestões em 1993 e 1994 o CNPq apenas voltou a demandar providências do recorrente em 2001 e, finalmente, em 2004 por ocasião da instauração deste processo de Tomada de Contas Especial.35. No âmbito do Tribunal, o recorrente foi considerado revel por ocasião da instrução do feito, em duas oportunidades, o que equivale a dizer que não teve a possibilidade, naquela fase processual, de ver o Tribunal examinar, efetivamente, a ocorrência da boa-fé na sua conduta, como determina o art. 12 da Lei nº 8.443/199236. E, desta feita, em fase recursal, a despeito de considerar não elididas as irregularidades que lhe são apontadas, concluo, ante os elementos que carreia aos autos, que o recorrente atuou de boa-fé, ao haver, ainda que intempestivamente, retornado ao Brasil para cumprir o compromisso assumido, mesmo não tendo apresentado comprovação de conclusão do curso de doutorado, e tampouco, até os dias atuais, justificativa aceitável para a sua não conclusão.37. Assim, como não apresentou justificativa razoável para a não conclusão do curso, concordo parcialmente com o Diretor da Serur e concluo pela impossibilidade de afastamento do débito, em consonância com o Acórdão 2.058/2014 – TCU – Plenário, oportunidade em que o Ministro Raimundo Carreiro, assim conduziu seu voto:

“O dispêndio de recursos públicos para custear a realização de cursos de pós-graduação no exterior tem o objetivo de promover o desenvolvimento científico nacional. Para isso, é preciso que o bolsista conclua seu curso e aplique no país os conhecimentos obtidos no exterior. Ao receber esses valores o beneficiário assume esse compromisso e, uma vez não cumprido, sem a existência de motivos suficientes para tal, faz-se necessário a devolução dos recursos recebidos”.

38. Reforça essa minha convicção o fato de também não identificar nos autos um motivo de força maior, a justificar a não conclusão da tese de doutorado do responsável, enquanto estava plenamente ciente desse seu compromisso com a concedente.39. Nesse contexto, conquanto não logre elidir as irregularidades que lhe foram imputadas considero que o recorrente atuou de boa-fé em relação à bolsa de estudos concedida pelo CNPq, o que lhe permite auferir o benefício constante dos parágrafos 1º e 2º do art. 12 da Lei Orgânica do Tribunal, segundo os quais:

“§ 1° O responsável cuja defesa for rejeitada pelo Tribunal será cientificado para, em novo e improrrogável prazo estabelecido no Regimento Interno, recolher a importância devida.§ 2° Reconhecida pelo Tribunal a boa-fé, a liquidação tempestiva do débito atualizado monetariamente sanará o processo, se não houver sido observada outra irregularidade nas contas”.

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4

40. Nessa hipótese, conforme reza o §4º do art. 202 do Regimento Interno/TCU, o recolhimento tempestivo do débito atualizado monetariamente, portanto sem incidência de juros de mora, saneará o processo e o Tribunal julgará as contas regulares com ressalva e dará quitação ao responsável.41. Essas as razões pelas quais propugno pelo provimento parcial do recurso em tela, tornando insubsistente o acórdão recorrido, emitindo-se novo pronunciamento do Tribunal pela rejeição das alegações de defesa do responsável e fixação de novo e improrrogável prazo para recolhimento da quantia devida, que deverá ser atualizada monetariamente excluídos os juros de mora, nos termos consignados nos §§ 3º e 4º do art. 202 do Regimento Interno do Tribunal.42. Registro que tal encaminhamento funda-se em lição colhida do Acórdão nº 6.045/2013-TCU-2ª Câmara, processo de minha relatoria em cujo voto revisor majoritário o Ministro Raimundo Carreiro descortinou proposta na mesma linha da que ora sugiro ao nobre Colegiado.43. Encontrando-se o feito em meu Gabinete, o Sr. Zakr, por meio do representante legal, apresenta novo documento de defesa (peça nº 45), desta feita tendo em conta o pronunciamento regimental do representante do Ministério Público nos autos. Embora tal peça não acrescente novos elementos, como de resto acontece com a peça de nº 43, apresentada posteriormente ao pronunciamento da unidade técnica, as informações nelas constantes foram ponderadas no meu exame.44. Por fim, verifico que o recorrente pleiteia, em sede de pedido sucessivo, renovação do prazo para a efetivação do pagamento e a manutenção da autorização para o parcelamento do débito. Tais pedidos podem ser deferidos, o primeiro como consectário lógico da decisão que ora submeto ao Colegiado, após a suspensão da deliberação original por força do conhecimento do presente recurso de reconsideração em seu efeito suspensivo intrínseco, e o segundo, ante as expressas disposições da Lei Orgânica (art. 26) e do Regimento Interno (art. 217) que facultam tal parcelamento em qualquer fase do processo, em até 36 parcelas, incidindo sobre cada uma delas, corrigida monetariamente, os correspondentes acréscimos legais.

Ante o exposto, com as vênias de estilo por acolher apenas parcialmente os pareceres do auditor da Serur, dos dirigentes da unidade técnica e do MP/TCU, VOTO por que seja adotada a deliberação que ora submeto a este Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 1 de dezembro de 2015.

Ministro JOÃO AUGUSTO RIBEIRO NARDESRelator

ACÓRDÃO Nº 11231/2015 – TCU – 2ª Câmara

1. Processo nº TC 030.349/2008-4. 2. Grupo II – Classe de Assunto: I - Recurso de Reconsideração (Tomada de Contas Especial) 3. Interessados/Responsáveis/Recorrentes:3.1. Interessado: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (33.654.831/0033-13)3.2. Responsável: Nasser Fadalallah Hassan Zakr (058.721.558-59)3.3. Recorrente: Nasser Fadalallah Hassan Zakr (058.721.558-59).4. Órgão/Entidade: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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Page 30: bibliotecadigitalsetcecnpq.files.wordpress.com€¦  · Web view9.2. julgar irregulares as contas do Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, nos termos dos arts. 1º, inciso I, e 16,

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4

5. Relator: Ministro Augusto Nardes5.1. Relator da deliberação recorrida: Ministro-Substituto André Luís de Carvalho.6. Representante do Ministério Público: Subprocuradora-Geral Cristina Machado da Costa e Silva.7. Unidades Técnicas: Secretaria de Recursos (SERUR.8. Representação legal: Paulo Luiz de Toledo Piza (OAB/SP 110.031).

9. Acórdão:VISTOS, relatados e discutidos estes autos em que se aprecia recurso de reconsideração

interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr contra o Acórdão nº 2.608/2014-TCU-Segunda Câmara. ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 2ª Câmara, diante das razões expostas pelo Relator, em:

9.1. conhecer, com fundamento nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992, do recurso de reconsideração interposto pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr para, no mérito, dar-lhe provimento parcial, tornando insubsistente o Acórdão nº 2.608/2014-TCU-Segunda Câmara;

9.2. rejeitar, com fundamento nos arts. 12, §§ 1º e 2º, e 22, parágrafo único, da Lei nº 8.443, de 1992, c/c o art. 202, § 3º, do Regimento Interno, as alegações de defesa apresentadas pelo Sr. Nasser Fadalallah Hassan Zakr, fixando-lhe novo e improrrogável prazo de quinze dias, a contar da ciência, para que efetue e comprove perante este Tribunal o recolhimento do valor original de Cr$ 544.133.987,25 (quinhentos e quarenta e quatro milhões, cento e trinta e três mil, novecentos e oitenta e sete cruzeiros e vinte e cinco centavos) aos cofres do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), atualizada monetariamente a partir de 29/4/1993, até o dia do efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor;

9.3. cientificar o responsável que a liquidação tempestiva do débito, atualizado monetariamente, saneará o processo e as respectivas contas poderão ser julgadas regulares com ressalvas, dando-se-lhe quitação, nos termos do § 2º do art. 12 da Lei nº 8.443/1992 c/c os §§ 3º e 4º do art. 202 do Regimento Interno deste Tribunal;

9.4. autorizar, com amparo no art. 26 da Lei nº 8.443, de 1992, c/c o art. 217 do RI/TCU, o

parcelamento do débito, em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais e sucessivas, esclarecendo que a falta de pagamento de qualquer parcela importará no vencimento antecipado do saldo devedor, de acordo com o § 2º do art. 217 do RI/TCU; e

9.5. enviar cópia do presente Acórdão, bem como do Relatório e do Voto que o fundamentam ao recorrente e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

10. Ata n° 42/2015 – 2ª Câmara.11. Data da Sessão: 1/12/2015 – Ordinária.12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-11231-42/15-2.13. Especificação do quorum: 13.1. Ministros presentes: Raimundo Carreiro (Presidente), Augusto Nardes (Relator) e Ana Arraes.13.2. Ministro-Substituto convocado: Augusto Sherman Cavalcanti.13.3. Ministro-Substituto presente: André Luís de Carvalho.

(Assinado Eletronicamente)RAIMUNDO CARREIRO

(Assinado Eletronicamente)AUGUSTO NARDES

Presidente Relator

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 030.349/2008-4

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)CRISTINA MACHADO DA COSTA E SILVA

Subprocuradora-Geral

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