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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ FRANCISLAINE HASPER BEBETECAS: UM ESPAÇO DE MEDIAÇÃO DO LITERÁRIO COM CRIANÇAS PEQUENAS Itajaí (SC) 2017

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

FRANCISLAINE HASPER

BEBETECAS: UM ESPAÇO DE MEDIAÇÃO DO LITERÁRIO COM CRIANÇAS

PEQUENAS

Itajaí (SC) 2017

1

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura

Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE Curso de Mestrado Acadêmico em Educação

FRANCISLAINE HASPER

BEBETECAS: UM ESPAÇO DE MEDIAÇÃO DO LITERÁRIO COM CRIANÇAS

PEQUENAS

Dissertação apresentada ao colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação – área de concentração: Educação – (Linha de Pesquisa - Cultura, Tecnologia e Processos de Aprendizagem). Orientadora: Prof.ª Dr.ª Adair de Aguiar Neitzel.

Itajaí (SC) 2017

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UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

Vice-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGE

Curso de Mestrado Acadêmico em Educação

CERTIFICADO DE APROVAÇÃO

FRANCISLAINE HASPER

BEBETECAS: UM ESPAÇO DE MEDIAÇÃO DO LITERÁRIO COM CRIANÇAS

PEQUENAS

Dissertação avaliada e aprovada pela Comissão Examinadora e referendada pelo Colegiado do PPGE como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação. Itajaí (SC), 12 de julho de 2017.

Membros da Comissão:

Orientadora: _______________________________________ Prof.ª Dr.ª Adair de Aguiar Neitzel Membro Externo: _______________________________________ Prof.ª Dr.ª Marynelma Camargo Garanhani (Universidade Federal do Paraná) Membro representante do colegiado: ______________________________________ Prof.ª Dr.ª Valéria Silva Ferreira

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3

Dedico este trabalho à minha filha, Livia, e ao meu esposo, Roger.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço a Deus pela força, pela paz, pela superação. Obrigada!

À minha família, que, além de serem incentivadores, ajudaram-me

diariamente, possibilitando que estivesse ausente em relação aos cuidados com a Livia.

Ao meu querido esposo, Roger, que sempre sonhou junto comigo,

incentivando cada escolha com seu o amor e tempo, para esta tão intensa jornada. Te amo!

A você, Livia, minha princesa, que deixei horas e horas do nosso brincar, do

nosso aconchego, para me envolver com os livros. E você, que artista! Desenhou e deixou o trabalho da mamãe ainda mais belo. Agradeço-te por

entender o tempo que estive por horas ausente, mas, certamente, lhe mostrando, nessa ausência, a importância do foco e da dedicação para com

os estudos! Dentre tantas falas, fico com esta - “Mamãe, agora você tem que estudar, não é?”.

À minha querida e admirável orientadora, Adair de Aguiar Neitzel, que tanto me ajudou. Quantas foram as correções, quanta paciência teve comigo. Tudo

isso permitiu que eu evoluísse! A você, agradeço imensamente, pelo sorriso espontâneo, pelo abraço caloroso, deixando-me tranquila, pelo olhar sensível,

pois, certamente, não teria realizado este grande sonho, pois foi você quem me escolheu. Imensamente, meu muito obrigada!

Às professoras Valéria, Mônica, Carla, Verônica, Regina e Cássia, que

privilégio conhecê-las e aprender ainda mais. Muito obrigada!

À banca examinadora, Prof.a Dr.a Marynelma Camargo Garanhani e Prof.a Dr.a Valéria Silva Ferreira, agradeço imensamente pela disponibilidade em participar da

pesquisa e pelas sugestões relevantes que tornaram o estudo ainda mais consistente.

Aos amigos que encontrei no Mestrado. Quantos trabalhos; quantos

encontros, uns com choros, outros com risadas; quantas alegrias; quantas mensagens; quantos cafés e almoços, até viagens e passeios; quantas

parcerias desfrutamos juntos. A vocês agradeço o privilégio de ter conhecido e vivido, quantas novas amizades!

Às amigas do coração, Tatiane, Karina e Ana Cláudia, mesmo de longe

estavam presentes, incentivando e vivendo este sonho. A vocês o meu muito obrigada!

Às bebetecas do CEI Darlan Dotto Wiersinski, do CMEI Padre Livio Donati, e tantas outras as quais visitei, sem a recepção e a disponibilidade do acesso

ao espaço e às informações nada seria possível! Meu muito obrigada!

5

À Secretaria Municipal de Educação de Itapema, por conceder-me a licença para poder envolver-me ainda mais com o trabalho. Esse incentivo impulsionará minha carreira profissional e possibilitará que eu esteja ainda

mais capaz para exercer a função.

Muito obrigada a todos!

6

A deslizar sereno sob o céu Luminoso, o barco deriva na

Idílica tarde de verão, ao léu...

Crianças ali perto aninhadas, Espertas, ouvidos atentos, esperam

Pela história que lhes será contada...

Lá no alto do céu há muito empalideceu, Ecos declinam, lembranças perecem. A friagem do outono, o verão varreu.

Senão que, espectral, ela segue a me obsedar,

Alice a percorrer estranhas terras Nunca vistas por quem não sabe sonhar.

Crianças que queiram esta história ouvir,

Espertas, ouvidos curiosos e Lúcidos, deve pertinho se reunir.

Imaginário País das Maravilhas percorrem,

Devaneando enquanto os dias passam, Devaneando enquanto os verões morrem.

Encantadas, pela corrente se deixam levar...

Lentamente sucumbindo ao fascínio da Lenda... Que mais é viver senão sonhar?

Lewis Carroll (2009, p. 316).

7

RESUMO

Esta pesquisa, vinculada à linha de pesquisa Cultura, Tecnologia e Processos de Aprendizagem do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) e do grupo de pesquisa Cultura, Escola e Educação Criadora, teve uma proposta de abordagem qualitativa. A temática é a bebeteca, um espaço proposto para a mediação do literário com crianças pequenas. Discutem-se duas realidades de espaço de bebetecas, sendo uma na cidade de Itajaí (SC), o Centro de Educação Infantil (CEI) Darlan Dotto Wiersinski; e outro espaço na cidade de Castro (PR), o Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) Padre Lívio Donati. A questão problema que norteou este estudo foi: Como ocorre a mediação do literário nas bebetecas? Assim sendo, o objetivo geral foi analisar como ocorre a mediação do literário nas bebetecas. Os objetivos específicos foram: apresentar concepções de bebetecas; identificar bebetecas no Brasil; discutir sobre os acervos literários das bebetecas do CEI Darlan Dotto Wiersinski e do CMEI Padre Lívio Donati; identificar as condições dos espaços físicos das bebetecas dos Centros de Educação Infantil, que foram foco desta pesquisa; identificar como as professoras interagem com a crianças durante os encontros literários nos dois Centros de Educação Infantil pesquisados. A coleta de dados foi feita por meio dos seguintes instrumentos: observação, entrevista, diário de bordo, documentos e fotos. A análise dos dados pautou-se na triangulação dos dados da observação, da entrevista e dos documentos. Os aportes teóricos que nortearam esta pesquisa foram: Escardó i Bás (1999), Instituto Espantapájaros (2014), Senhorini e Bortolin (2008), Pereira (2014), Barros e Santos (2009), os quais apresentam o conceito de bebeteca; Petit (2012, 2013a, 2013b), Reyes (2010, 2012, 2013, 2015, 2016), Reis (2014), Martins e Neitzel (2016), os quais tratam da importância de propor às crianças pequenas alimentos culturais literários, que lhes permitirão construir uma relação estética com o livro de literatura, para que elas comecem a apreciar a leitura e sintam-se afetadas por ela. Além desses autores, contou-se com Duarte Jr. (2010), que reflete sobre os primeiros encontros sensíveis dos sujeitos com a arte; Martins (2012a, 2012b, 2014), a qual traz a ação propositora como uma mediação provocada que gera experiências estésicas. Como resultados, indica-se que a mediação do literário proposta no interior das bebetecas é feita por objetos propositores como os livros, os adereços, os fantoches, por professores, pelas próprias crianças pequenas e pela família. A mediação é possibilitada, também, pela curadoria educativa, que transforma o espaço em um ambiente de aprendizagem, de trânsito e de encontros entre a criança, os professores e a família, favorecendo a educação estética. A concepção de mediação do literário nas bebetecas permite inferir que, para as professoras, a mediação se estabelece como trocas, diálogos, momentos que dão voz às crianças pequenas. É uma aprendizagem que explora a ludicidade e permite descortinar o livro como brinquedo. Com relação aos espaços, identificou-se que, no CEI Darlan Dotto Wiersinski, apesar de ser um espaço adaptado, ela possui estantes com livros, alguns na altura das crianças, e tapete no chão onde as crianças manuseiam os livros e ouvem histórias. Nesse espaço, há trânsito de pessoas, mas é um lugar onde ocorrem mediações. Já o CMEI Padre Livio Donati apresenta uma sala própria para bebeteca, com estante na altura das crianças, tapetes e almofadas que lhes permitem ficar em uma posição confortável no chão, com boa iluminação e paredes com os personagens das histórias. O acervo de ambas as bebetecas é bem variado, contemplando o gênero narrativo e lírico. Todos os livros estão à disposição das crianças podendo ser

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manuseados sem restrições. O trabalho desenvolvido pelas bebetecas permite uma educação estética das crianças pequenas, porque elas são educadas para apreciar os livros como objeto artístico e estético. A postura sensível das professoras possibilita que o movimento literário propicie momentos de troca, de interação, de afeto e de formação mútua. Esta pesquisa compreende a bebeteca como uma ação de aproximação das crianças com o livro, independentemente do espaço físico, seja uma sala, um canto ou mesmo uma cesta com livros, desde que, nesse espaço, haja a intenção de aproximar os livros das crianças pequenas, isto é, que seja produto de um projeto que pode ser construído e que seja de conhecimento de todos os docentes que fazem parte da Instituição. Outro aspecto importante trata-se da concepção do livro, que ele seja visto como um brinquedo, que possa estar nas mãos das crianças pequenas, para que elas possam entender sua função social. Palavras-chave: Bebeteca. Mediação cultural. Formação de leitores.

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ABSTRACT

This research, linked to the research line Culture, Technology and Learning Processes of the Postgraduate Program in Education of the University of Vale do Itajaí (UNIVALI) and the group of research Culture, School and Creative Education, had a qualitative approach proposal. The theme is ‘bebeteca’, a space proposed for mediation of the library literary collection with young children. Two realities of ‘bebetecas” are discussed, one in the city of Itajaí (SC), the Center for Early Childhood Education Darlan Dotto Wiersinski; and the other in the city of Castro (PR), the Municipal Center for Early Childhood Education Padre Lívio Donati. The problem question that underpinned this study was: How does the mediation of the literary in the ‘bebetecas’ occur? Thus, the main objective was to analyze how the literary mediation occurs in the ‘bebetecas’. The specific objectives were: present conceptions of ‘bebetecas’; identify ‘bebetecas’ in Brazil; discuss the literary collections of the ‘bebetecas’ of the Center for Early Childhood Education Darlan Dotto Wiersinski and the Municipal Center for Early Childhood Education Padre Lívio Donati; identify the conditions of the physical spaces of the ‘bebetecas’ of these Child Education Centers, which were the focus of this research; identify how the teachers interact with the children during the literary encounters in the two surveyed Child Education Centers. Data collection was conducted through the following instruments: observation, interview, journal, documents and photos. The data analysis was drawn from the triangulation of the interview, observation and document data. The theoretical contributions that guided this research were: Escardó i Bás (1999), Instituto Espantapájaros (2014), Senhorini and Bortolin (2008), Pereira (2014), Barros and Santos (2009), who present the concept of ‘bebeteca’; Petit (2012, 2013a, 2013b), Reyes (2010, 2012, 2013, 2015, 2016), Reis (2014), Martins and Neitzel (2016), who deal with the importance of proposing to young children literary cultural feeding, which allow them to build an aesthetic relationship with the literature book so that they begin to enjoy reading and are affected by it. In addition to these authors, we counted on Duarte Jr. (2010), who reflects on the first sensitive encounters of subjects with art; Martins (2012a, 2012b, 2014), who brings the proposed action as a provoked mediation that generates aesthesic experiences. As results, we indicate that the mediation of the literary proposed within the ‘bebetecas’ is made by propositional objects such as books, ornaments, puppets, by teachers, by the young children themselves and by the family. Mediation is also proposed by educational curatorship, which transforms the space into an environment of learning, transit and encounters between the child, teachers and family, favoring the aesthetic education. The conception of mediation of the literary in the ‘bebetecas’ allows to infer that, for the teachers, the mediation is established as exchanges, dialogs, moments that give voice to the young children. It is a learning that explores playfulness and allows to see the book as a toy. Regarding the spaces, we identified that, in the Center of Education Darlan Dotto Wiersinski, despite being an adapted space, it has shelves with books, some at the height of the children, and carpet on the floor where the children handle the books and listen to stories. In this space, there are people passing by, but it is a place where mediations take place. The Center of Education Padre Livio Donati has its own ‘bebeteca’, with a bookshelf on the same height of the children, carpets and cushions that allow them to be in a comfortable position on the floor, with good illumination and story characters on the walls. The collection of both ‘bebetecas’ is varied, contemplating the narrative and lyrical genre. All books are available to the children and can be handled without restrictions. The

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work developed by the ‘bebetecas’ allows an aesthetic education of young children because they are educated to appreciate the books as an artistic and aesthetic object. The sensitive posture of the teachers permits the literary movement to provide moments of exchange, interaction, affection and mutual education. This research comprehends the ‘bebeteca’ as an action of approximation of the children with the book, regardless of the physical space, whether it is a room, a corner or even a basket with books, provided that, in this space, there is the intention to bring the books closer to the small children, in other words, that is the product of a project that can be built and that is known to all the teachers who are part of the Institution. Another important aspect is the conception of the book, which should be seen as a toy that can be in the hands of the small children, so that they can understand its social function. Keywords: ‘Bebeteca’. Cultural mediation. Reader education

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Nuvem de palavras 1 31

Figura 2 - Demonstrativo da origem da palavra bebeteca 32

Figura 3 - Corpus da pesquisa - as sete bebetecas 38

Figura 4 - Pontos de observação 40

Figura 5 - Pontos observados sobre o espaço da bebeteca 40

Figura 6 - Pontos observados sobre o acervo da bebeteca 41

Figura 7 - Documentos analisados da bebeteca 41

Figura 8 - Instrumentos para coleta de dados 43

Figura 9 - Nuvem de palavras 2 102

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 - Bebeteca CEI Darlan Dotto Wiersinsk 46

Imagem 2 - Bebeteca CMEI Padre Lívio Donati 48

Imagem 3 – Livros expostos na bebetecas 63

Imagem 4 - Biblioteca intinerante 64

Imagem 5 - Encontro de pais no CEI Darlan Dotto Wiersinsck 66

Imagem 6 - Mediação do literário 71

Imagem 7 - Experiências com o livro 73

Imagem 8 - Diálogo durantes as histórias 74

Imagem 9 – Crianças do CEI escolhendo seus livros 76

Imagem 10 - Leitura livre 77

Imagem 12 - Personagens do Sítio do Picapau amarelo 84

Imagem 11 - Casa da Cuca na Bebeteca 84

Imagem 13 - Alguns materiais que compõem o espaço da bebeteca 85

Imagem 14 - Acervo da bebeteca do CMEI Padre Lívio Donati 88

Imagem 15 - Aproximação com o livro 90

Imagem 16 - Caracterização da professora 91

Imagem 17 - Encontros literários 94

Imagem 18 - Manuseio dos livros 96

Imagem 19 - Bolsa de histórias 98

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Demonstrativo das pesquisas encontradas no banco de dados da CAPES e da BDTD 19

Quadro 2 - Demonstrativo das pesquisas encontradas no banco de dados da CAPES e da BDTD 21

Quadro 3 - Pesquisas encontradas com a palavra-chave “bebeteca” 26

Quadro 4 - Bebetecas no estado de Santa Catarina 36

Quadro 5 - Bebeteca no estado do Rio Grande do Sul 36

Quadro 6 - Bebetecas no estado do Paraná 36

Quadro 7 - Bebeteca no estado do Rio de Janeiro 36

Quadro 8 - Bebeteca no estado de Minas Gerais 36

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SUMÁRIO

1 O LIVRO EM MINHA VIDA, O PERCURSO COMO PESQUISADORA 15

1.1 A PRIMEIRA DESCOBERTA: LITERATURA PARA CRIANÇA PEQUENA 27

1.2 EM BUSCA DE ESPAÇOS DE LEITURA 35

1.3 OS ENCONTROS NAS BEBETECAS GERANDO DADOS 37

1.4 OS ENCONTROS DA PESQUISA 39

1.5 ANÁLISE DE DADOS 43

2 CONTEXTOS DA PESQUISA: BEBETECA EM AÇÃO 45

2.1 CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DARLAN DOTTO WIERSINSKI 46

2.2 CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PADRE LÍVIO DONATI 48

3 POR QUE LER PARA AS CRIANÇAS PEQUENAS? 50

4 ENCONTROS NA BEBETECA: CEI DARLAN DOTTO WIERSINSKI 60

4.1 O ESPAÇO 60

4.2 O ACERVO 67

4.3 A CRIANÇA PEQUENA E O LIVRO 70

4.4 A CRIANÇA PEQUENA, O LIVRO E A FAMÍLIA 76

5 ENCONTROS NA BEBETECA: CMEI PADRE LÍVIO DONATI 81

5.1 O ESPAÇO 83

5.2 O ACERVO 86

5.3 A CRIANÇA PEQUENA E O LIVRO 89

5.4 A CRIANÇA PEQUENA, O LIVRO E A FAMÍLIA 97

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 100

REFERÊNCIAS 100

APÊNDICES 115

15

1 O LIVRO EM MINHA VIDA, O PERCURSO COMO

PESQUISADORA1

Juntos naquela tarde dourada Deslizávamos em doce vagar,

Pois eram braços pequenos, ineptos, Que iam os remos a manobrar,

Enquanto mãozinhas fingiam apenas O percurso do barco determinar.

Lewis Carroll (2009, p. 10).

Foi assim, bem devagar fechei os olhos e comecei a

relembrar qual foi o início da leitura em minha vida. Nesse

voltar ao passado, surgiu o livro As Aventuras de Alice no

país das maravilhas. Ele vem ao encontro dos momentos da

minha infância, da leitura ao ser contada pela minha mãe em

nossa casa. O contato com a leitura deu-se apenas com esse

livro, que não acontecia com frequência. No entanto, recordo

que essa história se fez presente. Petit (2013a, p. 17) discute

que “[...] talvez toda pessoa que trabalha com a leitura

deveria pensar em seu próprio percurso como leitor”, para

compreender como se forma um leitor e como pode mediar

a leitura do literário. Meu percurso de leitora iniciou-se com

Lewis Carroll e, hoje, aqui trago minha experiência como

pesquisadora sobre formação de leitor.

Quando pequena, sempre fui fascinada pelos livros

infantis, apesar de eles não terem feito parte dos meus

brinquedos. Meu contato maior com outras obras eram

possibilitadas nos momentos de contação de histórias que

ocorreram no contexto escolar. Lembro-me da voz suave da

professora ao contar, que me seduzia envolvendo com o

1 Muitas foram as vezes que estive acompanhada de minha filha Livia Hasper Waltrick Melnick em meus momentos de estudo. Dentre tantos livros sobre a mesa, um em especial lhe chamou a atenção - o conto As aventuras de Alice no país das maravilhas. Esse livro a acompanhou por muitos dias, esteve entre suas brincadeiras, fez leituras para suas bonecas, andou de bicicleta com o livro na cestinha, guardou em sua bolsa; enfim, circulou pela casa com o livro. Algumas vezes, ela explicava aos seus colegas: “Esse livro é da mamãe, não posso tirar as fitas, mas ela me empresta”. Um dia, como tantos outros, quando ela me acompanhava em minhas escritas, algo em especial aconteceu: Livia, ao observar as imagens impressas no conto de Alice, resolveu fazer os seus próprios registros

MELNICK, 5 anos. MELNICK, 5 anos.

16

enredo da história, bem como do movimento das mãos ao folhear cada página. Por

falar em páginas, estas ainda estão na minha memória: folhas finas e lisas com cores

bem expressivas. A cada conto ouvido, mais e mais aguçava o meu interesse e o

prazer em ouvi-los. Essas histórias passaram a fazer parte da minha infância, sendo

apreciadas e vividas na escola.

Com o passar dos anos, os livros infantis foram sendo substituídos pelos livros

didáticos, e a literatura foi sendo esquecida; poucos livros literários lembro-me de ter

lido. Minhas leituras, além dos livros didáticos, partiam de revistas, de jornais, o que

realmente minha família costumava ler. Raros foram os encontros na biblioteca.

Realmente, esse espaço teve sentido para mim na universidade, pois foi ali que,

inúmeras vezes, tive contato com novas obras, mas todas destinadas aos conteúdos

explorados pelas disciplinas. A literatura continuava ausente.

A escolha pela profissão de professora aconteceu por volta dos dezesseis

anos. Em uma conversa informal, duas colegas que estavam ingressando no curso

do Magistério convidaram-me para participar de uma aula experimental. Já, no

primeiro dia, fiquei interessada e motivada a continuar a frequentar as aulas. Ao

término do curso do Magistério, iniciei o curso de Pedagogia. Naquele mesmo ano,

ingressei no campo profissional, com uma turma de primeira série do Ensino

Fundamental. Nesse grupo, um dos objetivos principais trabalhados foi a

alfabetização.

No segundo ano profissional, percebi que as turmas das crianças pequenas

faziam mais sentido para mim, pois, nos momentos que tinha oportunidade de estar

com os pequenos, eu tinha vontade de ficar ali, brincando e interagindo com eles.

Assim, no ano de 2000, iniciei um novo desafio: trabalhar com a turma de berçário,

com as crianças pequenas de um ano.

Os momentos de leituras sempre estiveram presentes na rotina proposta em

minhas aulas. Diariamente, proporcionava encontros - eu convidava as crianças

pequenas para ouvirem e manusearem livremente os livros, porém, na maioria das

vezes, com o enfoque pedagógico. Ao ler uma história, envolvia uma ação pedagógica

das personagens que mais lhe chamaram a atenção: Alice e o coelho. Certamente, esses registros não poderiam ser esquecidos, pelos momentos que juntas desfrutamos. Assim, os desenhos impressos no início de cada capítulo desta dissertação e na dedicatória são uma forma de agradecimento - uma companhia que, apesar de pequena, compartilhou horas e horas deste trabalho.

17

como: culinária, dobradura, pintura, imitação das personagens, fantoches, máscaras,

entre outros, não me permitindo apenas a leitura - eu estava sempre condicionada às

atividades. Era o que sabia e aprendi a fazer.

Nesse percurso como professora, acompanhada de minha paixão pelas

histórias infantis resgatadas da infância, levaram-me a idas às livrarias - encanto que

me acompanha até os dias atuais, fazendo parte da minha vivência, pois sempre que

posso procuro adquirir novos livros. Possuo uma pequena biblioteca composta por

volta de cem livros de literatura infantil. A ausência das obras literárias em minha

infância instigou-me a tê-las para minha filha, compensando minha limitação de

leituras no passado. Com esse acervo, oportunizo momentos agradáveis de leituras,

repetindo minha experiência maternal, como uma tradição de acalento ao fazê-la

dormir. Sento-me ao lado dela na cama e, ali, aninhadas, lemos e lemos mais

histórias. Esse é um ritual vivido por nós. Pennac (2008, p. 31) aponta: “Sem saber,

descobríamos uma das funções essenciais do conto e, mais amplamente, da arte em

geral, que é impor uma trégua ao combate entre os homens. O amor ganhava pele

nova. Era gratuito”. Esse momento de troca de amor, pela arte de ler, revela o elo

gratuito entre mãe e filha. Pelo ouvir as histórias, cela uma nova história no livro da

intimidade, do afeto e das lembranças, A obra literária situando-se como objeto

estético propõe um encontro maternal sensível, repercutido em outra geração.

Após quinze anos exercendo a função de professora com crianças de um a três

anos, senti a necessidade de retornar à academia e pesquisar sobre a formação do

leitor nessa fase da vida. Ao ser escolhida e poder participar do grupo de pesquisa

Cultura, Escola e Educação Criadora, percebi, desde o início, o quanto minha prática,

com relação à literatura, tinha novos desafios a serem superados. A cada novo

encontro, novos conhecimentos na busca de melhorar o contato com os livros e as

crianças pequenas. O desafio era deixá-los manusear livremente as obras.

Durante as disciplinas do Mestrado, participei do seminário Leitura do Literário,

no qual tive a oportunidade de ler três clássicos da literatura, Madame Bovary, de

Flaubert; Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis; e Dom Quixote

de La Mancha, de Miguel Cervantes. Um título no qual me permiti a releitura foi As

Aventuras de Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll, de forma a resgatar as

memórias da infância. Assim, a mediação provocada pela professora apresentou-me

a outras obras literárias, ampliando meu repertório de literatura infantil para literatura

18

adulta nunca antes lida por mim, mostrando-me a importância de conhecer os

clássicos, de como mediar e se perder neles.

Kupiec, Neitzel e Carvalho (2016, p. 24) falam sobre a mediação cultural nos

espaços educativos, pois esses espaços “[...] são também responsáveis por estimular

o contato com a arte e, nessa interação, pode-se levar os sujeitos a serem capazes

de perceber, ver, sentir, apreciar e produzir, percebendo-se atores de sua história”.

Foi essa sensação que senti, muitas vezes. Durante esse período, perguntei-me:

“Onde estive nesse tempo todo que não procurei dedicar-me a esse prazer, em

deliciar-me com uma boa história?”. Confesso que, por vezes, tive vergonha do grupo,

mas, ao mesmo tempo, agradecida por estar ali tendo a experiência de poder ler e

conhecer o mundo literário adulto e gostar ainda mais dos livros. Petit (2013a, p. 62)

afirma que “[...] para transmitir o amor pela leitura, e em particular pela leitura de obras

literárias, é preciso tê-lo experimentado”. Nesse sentido, envolver-me com as histórias

literárias fez e tem feito toda diferença para mim, pois o contato com o objeto estético

livro e a mediação oportunizam um novo espaço no cotidiano.

Uriarte, Neitzel e Carvalho (2016, p. 188) apontam que a educação estética

se constitui pelas aprendizagens que ocorrem pelas experiências cognitivas, pelos

sentidos e pelos afetos. As autoras evidenciam que se ocupar “[...] com a estética, a

partir do século XVII, é lidar com o mundo sensível, isto é, com possibilidades de

aprender o mundo pelas vias sensoriais, pela percepção, participando de diferentes

manifestações de acontecimentos do mundo”. Com minhas vivências com o objeto

estético, durante os seminários, novos livros foram adquiridos, novas leituras foram

realizadas e o prazer de ler, contemplar e refletir sobre a obra e sobre a vida tomou

sentido. As autoras afirmam que a educação do sensível é um movimento

contemplativo que não se dá apenas na subjetividade, mas, principalmente, no

pensamento reflexivo, pois razão e sensibilidade são complementares.

Nos seminários, novos questionamentos quanto a minha prática foram

surgindo, dentre eles a importância de escolher uma boa obra para ser lida para as

crianças pequenas. Assim, fiz uma busca dentre os livros infantis que possuía, no

intuito de saber quais deles tinham uma boa história, que tivessem desdobramentos

e permitissem deslocamentos, qualidade estética imprescindível que contribui para

formar leitores que pensam e sintam o deleite da obra.

19

Dentre as obras que possuo em minha biblioteca pessoal, alguns títulos podem

ser trabalhados com as crianças pequenas. Percebi que alguns livros possuem a

hipertextualidade, elemento muito discutido quando se trata da qualidade de um livro

de literatura. Martins e Neitzel (2016, p. 44) ressaltam que a hipertextualidade “[...]

permite ao leitor no ato da leitura conectar, efetuar combinações e permutações de

diferentes textos que convivem na mesma narrativa”. Para tanto, esse tipo de obra

oferece aberturas, entrecruzamentos; são livros que provocam o leitor. Dos cem livros

que possuo, trinta e oito possuem características que se aproximam do que as autoras

propõem a respeito de hipertextualidade.

Com o desejo de ampliar meu olhar, de fortalecer e de revelar estudos já

existentes no contexto de Educação Infantil, que pudessem orientar os colegas

professores que também trabalham nessa área, procuramos (a partir de agora minha

orientadora e eu) concentrar leituras que priorizassem as mediações de leituras com

crianças pequenas. Buscamos nos sites da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações

(BDTD), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),

nos últimos anos, pesquisas brasileiras que contemplassem a palavra-chave “bebê

AND leitura”. Nos portais, encontramos quatro pesquisas brasileiras que envolviam o

tema em questão. A seguir, o Quadro 1 mostra as pesquisas selecionadas com os

respectivos títulos, autores e o ano de defesa.

Quadro 1 - Demonstrativo das pesquisas encontradas no banco de dados da CAPES e da BDTD com o tema “bebê AND leitura” no período de 2011 a 2017

AUTOR PESQUISA PORTAL ANO Liliane Resende

Laviano

Apresentação de um programa de formação de professores de educação infantil em desenvolvimento de linguagem (Dissertação).

CAPES 2015

Nivia Barros Escouto

A formação do leitor-literário na educação infantil (Dissertação).

BDTB 2013

Marcela Souza de Almeida

Leitura de histórias infantis em UTI neonatal: uma estratégia voltada para a relação mãe jovem bebê (Dissertação).

BDTB CAPES

2013

Rosele Martins Guimarães

Encontros, cantigas, brincadeiras, leituras: um estudo acerca das interações dos bebês, crianças bem pequenas e o objeto livro numa turma de berçário (Dissertação).

BDTB

2011

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados da pesquisa.

A pesquisa de Laviano (2015), intitulada Apresentação de um programa de

formação de professores de educação infantil em desenvolvimento de linguagem,

desenvolveu um programa de formação para os professores da Educação Infantil, no

20

intuito de ter como elemento de reflexão o desenvolvimento da linguagem. O estudo

apontou que a formação de professores possibilita transformações nas práticas dos

professores, no que tange à autonomia para planejar, para determinar os objetivos e

para observar as crianças.

Em se tratando de mediação do literário, dois trabalhos estão relacionados a

essa temática, sendo eles: A formação do leitor- literário na educação infantil, de

Escouto (2013), e Encontros, cantigas, brincadeiras, leituras: um estudo acerca das

interações dos bebês, crianças bem pequenas e o objeto livro numa turma de berçário,

de Guimarães (2011)2. Escouto (2013) evidenciou que as ações desenvolvidas

oferecem condições e elementos para que a formação se institua e se consolide.

Nesse sentido:

A formação do leitor-literário passa, pela relação entre as palavras das crianças e as dos outros que participam da construção da história de leitura da criança e lhe possibilitam a aprendizagem e o desenvolvimento do que se refere à produção literária e a outros enunciados próprios desse campo de conhecimento. (ESCOUTO, 2013, p. 9).

Guimarães (2011, p. 8), em um de seus resultados, apontou que não basta o

bebê ter apenas o acesso aos livros, o bebê precisa, também, de “[...] uma mediação

lúdica, livre de regras reguladoras, mas repletas de experiências criativas, que

potencializem o desejo e as formas de uso do livro”. A autora evidencia a importância

de o livro ser uma ferramenta que vem a possibilitar adultos e bebês em uma nova

cultura dos livros.

A pesquisa de Almeida (2013), Leitura de histórias infantis em UTI neonatal:

uma estratégia voltada para a relação mãe jovem bebê, apresenta o projeto Biblioteca

viva, onde mães e recém-nascidos da UTI neonatal têm a oportunidade de aproximar-

se e estar em contato com os livros. Almeida (2013, p. 8) apresenta, entre seus

resultados, que o momento de contação de histórias na UTI neonatal, que tem por

objetivo “[...] aproximar mãe e bebê, possibilita para esse par um momento em que o

foco principal não seja relativo ao adoecimento e vem a somar às propostas de

atenção a essa clientela e às estratégias de aproximação da dupla mãe-bebê”. Ao

analisarmos as quatro pesquisas, evidenciamos que, apesar de três pesquisas

estarem em um ambiente educacional e uma estar em um hospital, a mediação do

2 Esta pesquisa apresenta-se com ambas as palavras-chave bebê AND leitura / Criança pequena AND leitura.

21

literário, o encontro da criança pequena com o livro, acontece com a presença de um

adulto.

Para continuar a pesquisa nos bancos de dados, utilizamos a palavra-chave

“criança pequena AND leitura”. Com ela, encontramos trabalhos, brasileiros, nos sites

da BDTD e da CAPES. Selecionamos dez pesquisas que abordam a faixa etária das

crianças de até três anos de idade, dos últimos seis anos, que tratam especificamente

sobre o tema em questão. O Quadro 2, a seguir, mostra as pesquisas selecionadas

com os respectivos títulos, autores e o ano de defesa.

Quadro 2 - Demonstrativo das pesquisas encontradas no banco de dados da CAPES e da BDTD

com o tema “criança pequena AND leitura” no período de 2011 a 2017

AUTOR PESQUISA PORTAL ANO Ana Carolina de Azevedo Mello

Bibliotecas públicas e escolares da cidade de Cornélio Procópio - PR: desafios dos mediadores de leitura para a formação de leitores (Dissertação).

CAPES 2016

Eritania Silmara de Brittos

A importância dos contos de fadas para o desenvolvimento psicossexual da criança: o que pensam, o que dizem e o que fazem as professoras? (Dissertação).

CAPES 2016

Priscila de Oliveira Dornelles Machado

A Creche UFF e sua Flor de papel: uma análise sobre a produção de conhecimento de uma Biblioteca Escolar Infantil (Dissertação).

CAPES 2016

Renata de Almeida Torres Vilhena

Literatura na Educação Infantil: práticas pedagógicas e a formação da criança pequena (Dissertação).

BDTB CAPES

2014

Gesiele Reis

Literatura para os pequenos: experiências de San Miniato (Dissertação).

CAPES 2014

Daniela Gaspar Pedrazzoli Bagnasco

Leitura de histórias na educação infantil: como se desenvolve? (Dissertação).

BDTB 2014

Luciano Eiken Senaha

Quais as contribuições neurocientíficas para o letramento emergente na educação infantil em crianças de 0 a 5 anos de idade? (Dissertação).

BDTB CAPES

2013

Cinthia Silva de Albuquerque

Os acervos, os espaços e os projetos de leitura em instituições públicas de educação infantil do Recife (Dissertação).

BDTB 2012

Keyla Andrea Santiago Oliveira

A experiência estética na educação da infância: uma crítica no contexto da indústria cultural (Tese).

BDTB 2012

Rosele Martins Guimarães

Encontros, cantigas, brincadeiras, leituras: um estudo acerca das interações dos bebês, crianças bem pequenas e o objeto livro numa turma de berçário (Dissertação).

BDTB 2011

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados da pesquisa.

Foi possível subdividir essas pesquisas em temas relacionados, a saber:

políticas públicas, mediação de leitura, estética e espaços. Evidenciamos três

pesquisas, sendo elas de Albuquerque (2012), Brittos (2016) e Mello (2016), as quais

apontam políticas públicas de investimentos.

22

A pesquisa de Albuquerque (2012) - Os acervos, os espaços e os projetos de

leitura em instituições públicas de educação infantil do Recife - aborda sobre os

investimentos públicos nos espaços e nos acervos da Educação Infantil. Albuquerque

(2012) evidencia a fragilidade do espaço da biblioteca nas instituições de Educação

Infantil que foram analisadas, bem como poucos cantinhos de leituras nas salas de

aula. A pesquisadora sinaliza que as instituições possuem livros de literatura infantil

com qualidade, porém, pela ausência do espaço, os livros ficam guardados nos

armários, dificultando o acesso das crianças aos livros. Quanto à mediação de leitura,

a autora pontua que a mediação, pela grande parte das instituições, fica a cargo da

professora de sala. A pesquisa apresenta três elementos fundamentais, que são as

ações articuladas as quais envolvem “[...] os espaços organizados para ler, o acervo

e a mediação de leitura” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 8). Em seus resultados, a autora

evidencia a importância dos investimentos públicos para “[...] oferecer condições

básicas para concretizar com qualidade a formação de crianças leitoras desde a

Educação Infantil” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 8).

Em se tratando de políticas públicas de investimentos para formação de

professores, a pesquisa de Brittos (2016) - A importância dos contos de fadas para o

desenvolvimento psicossexual da criança: o que pensam, o que dizem e o que fazem

as professoras? - aponta que o trabalho com os contos de fadas possibilitou olhar para

a primeira infância. Entretanto, a pesquisadora evidencia a necessidade de formação

em educação sexual emancipatória para os professores de Educação Infantil do

município de Francisco Beltrão (PR).

Mello (2016), em seu trabalho Bibliotecas públicas e escolares da cidade de

Cornélio Procópio - PR: desafios dos mediadores de leitura para a formação de

leitores, investiga os mediadores de leituras que atuam nas bibliotecas públicas

escolares da cidade de Cornélio Procópio. Os resultados apontam que existem

dificuldades nas instituições analisadas. A autora sinaliza que poucos mediadores

realizam práticas de leituras sistematizadas, suas ações são mais intuitivas. Mello

(2016) evidencia que os profissionais que atuam nas bibliotecas não possuem

conhecimento sobre a existência de políticas públicas na esfera municipal, estadual e

federal, que possam orientar em suas ações para a formação de leitores.

As palavras-chave “criança pequena AND leitura” levaram-nos a três trabalhos

que evidenciam a importância da mediação de leitura proposta pelo professor para

23

que a criança pequena tenha contato com os livros. Guimarães (2011), em Encontros,

cantigas, brincadeiras, leituras: um estudo acerca das interações dos bebês, crianças

bem pequenas e o objeto livro numa turma de berçário, apresenta a mediação lúdica

do professor como forma de aproximar as crianças, de uma turma de berçário, do

objeto livro3. Outra autora que aponta a ação do professor é Bagnasco (2014), em sua

pesquisa Leitura de histórias na educação infantil: como se desenvolve? O estudo

apresenta o papel importante do professor ao promover a prática de leitura de história

com as crianças. Há evidencias da influência da ação das professoras quando as

crianças desenvolvem as suas próprias leituras. Estas imitam as professoras fazendo

gestos, bem como, segundo Bagnasco (2014, p. 8), “[...] apropriam-se de forma

inventiva das histórias e dos suportes, atribuindo a estes outros usos”.

A pesquisa de Vilhena (2014) trata do uso da literatura infantil nas práticas

pedagógicas com as crianças pequenas. Em seus resultados, a autora evidencia a

[...] importância do desenvolvimento de atividades de linguagem, oral e escrita, junto à criança pequena - inserida na primeira etapa da educação básica - e explicita-se o necessário cuidado e planejamento com o contexto, espaços e tempos destinados à implementação da ação pedagógica que, evidentemente, se dá em determinada cultura. (VILHENA, 2014, p. 8).

O estudo busca contribuir com a prática de leitura, para que a criança pequena,

desde cedo, interaja com o mundo letrado. A autora apresenta uma educação para a

liberdade como ação pedagógica que possibilita as crianças pequenas exercitarem a

“[...] sua capacidade de análise de textos e contextos, de criatividade e de abertura

para novos olhares” (VILHENA, 2014, p. 8).

A pesquisa de Senaha (2013), intitulada Quais as contribuições neurocientíficas

para o letramento emergente na educação infantil em crianças de 0 a 5 anos de

idade?, aponta a necessidade de novos estudos, novas reflexões e teorias que

abordem e “[...] fundamentem o encadeamento da perspectiva biológica às

perspectivas culturais do letramento emergente, principalmente naquela que a

investiga de forma multidisciplinar” (SENAHA, 2013, p. 7-8). A pesquisa aponta para

a fragilidade em estudos nessa área e que o tipo de abordagem teórica, baseada em

evidências acadêmico-científicas, possibilita fundamentar a prática dos educadores

das famílias e as políticas públicas.

3 O trabalho Encontros, cantigas, brincadeiras, leituras: um estudo acerca das interações dos bebês, crianças bem pequenas e o objeto livro numa turma de berçário também consta no Quadro 1.

24

Os espaços da biblioteca na Educação Infantil foram abordados por Machado,

P de O. D. (2016) na pesquisa A creche UFF e sua Flor de papel: uma análise sobre

a produção de conhecimento de uma Biblioteca Escolar Infantil. O estudo buscou

investigar a relação da criança com o livro e a literatura, em espaços específicos como

a biblioteca, pensada e organizada para receber crianças de um a cinco anos. A

pesquisa apontou que a biblioteca escolar aproxima a criança da literatura infantil e é

um espaço que produz experiências de infância e de culturas, de forma que as

crianças

[...] criam e recriam livremente suas vivências e interações com os livros, com seus pares e com os adultos além de afirmar a identidade da Biblioteca Flor de Papel como um ambiente da educação infantil que visa contribuir para a formação dos pequenos leitores e produz conhecimento sobre as crianças e a infância no contexto da leitura e da literatura infantis. (MACHADO, P de O. D., 2016, p. 8).

Ao analisarmos as pesquisas mapeadas, identificamos que duas aparecem

relacionadas à educação estética. Oliveira (2012), com a pesquisa intitulada A

experiência estética na educação da infância: uma crítica no contexto da indústria

cultural, busca evidenciar que a educação estética é possível. A autora discute que a

educação estética proposta para o ambiente educacional infantil contrapõe a

concepção de obra de arte. Ela salienta que a obra de arte é explorada no viés do

comércio, com a “[...] ideia de naturalidade, de fuga da existência do duro cotidiano,

entretenimento barato”. Nesse sentido, o estudo traz como proposta “[...] o respeito

pela arte, respeito que se estende às crianças, à infância e a uma educação estética

possível”. Outra autora que discute a temática na infância é Reis (2014) em sua

pesquisa Literatura para os pequenos: experiências de San Miniato. A pesquisadora

aponta que a literatura em San Miniato, Itália, não parte de projetos; são os projetos

que partem da literatura. A literatura é possibilitada às crianças para que elas apreciem

e sintam-se afetadas por ela, pelo viés estético.

Os Quadros 1 e 2, mostrados anteriormente, apontam a fragilidade em número

de pesquisas na área que envolvem crianças pequenas e leitura. Ao observarmos os

anos das pesquisas, há uma ordem crescente, pois, no ano de 2011, havia uma

pesquisa, a qual aparece com ambas as palavras-chave. Já, no ano de 2016, foram

encontradas três pesquisas, o que evidencia um crescimento. Apesar desse

crescimento, há necessidade de aprofundar os estudos.

25

Assim, nas pesquisas do Grupo Cultura, Escola e Educação Criadora, surgiu o

assunto “bebetecas”, pouco discutido e que despertou nossa curiosidade. Decidimos,

dessa forma, pesquisá-lo. Aceitamos o desafio em conhecer esse espaço destinado

a leituras para a criança pequena. Com as pesquisas apontadas nos Quadros 1 e 2,

selecionamos, principalmente, a dissertação de Reis (2014), pois a autora

desenvolveu seu trabalho de pesquisa em um local que tem uma concepção de

literatura. A autora discute sobre a experiência literária para os pequenos em San

Miniato. A pesquisadora não aborda o tema “bebeteca”, mas evidencia a importância

da literatura para os pequenos em sua rotina, da existência de projetos de formação

de leitores e sobre a relação estreita entre criança, professores e, em especial, a

família.

Em seus resultados, Reis (2014) aponta-nos que a literatura em uma escola de

San Miniato é experiência de ações do dia a dia da criança, sendo ela entrelaçada

com outras atividades, tanto na esfera educacional como familiar. As crianças veem o

livro como um brinquedo, o livro é percebido como um objeto estético, e os projetos

da escola partem da literatura. A mediação é provocada pelos professores com vistas

a envolver as famílias e as crianças na creche. O contato com o livro é permitido à

criança de forma livre, a criança manipula a obra no momento que sente vontade, o

que “[...] contribui para o estabelecimento de uma relação afetiva com o livro e,

consequentemente, na construção de um leitor. [...] em San Miniato há uma rotina

transdisciplinar em que a literatura é um instrumento de apreciação inferindo a

educação para o sensível” (REIS, 2014, p. 7). A autora traz a presença forte da

literatura no ambiente escolar e nas mais variadas possibilidades cotidianas em que

as crianças lidam com o livro de forma espontânea, bem como a presença da família

junto aos professores, envolvendo-se no processo de educação para o sensível.

Outro critério para a escolha da pesquisa de Gesiele Reis (2014) foi a

participação da autora no mesmo grupo de pesquisa do qual participamos. Existiu,

desse modo, uma afinidade nas concepções e no aporte teórico. Além disso, as

experiências da pesquisadora em San Miniato trouxeram reflexões importantes para

o contexto desta pesquisa. Assim, apropriamo-nos delas para discuti-las nas próximas

páginas.

Partimos, então, em busca de trabalhos, já existentes no país, com a palavra-

chave “bebeteca” nos sites da BDTD, da CAPES e da Scientific Electronic Library

26

Online (SCIELO), nos últimos anos - entre 2008 e 2016. As pesquisas encontradas

estão no Quadro 3 que segue.

Quadro 3 - Pesquisas encontradas com a palavra-chave “bebeteca” Autores Título Ano Local de

busca

Mariana Senhorini Sueli Bortolin

Bebeteca: uma maternidade de leitores (Artigo).

2008 CAPES

Alessandra Barros Ana Paula Souza dos

Santos

Incentivo da leitura e atividades lúdicas a crianças de 0 a 3 anos de idade: bebeteca e brinquedoteca uma oportunidade no desenvolvimento e hábito pela leitura (Artigo).

2009 CAPES

Fernanda Rohlfs Pereira

Práticas de leitura literária na educação infantil: como elas ocorrem em turmas de uma UMEI em Belo Horizonte? (Dissertação)

2014

CAPES

Fernanda Rohlfs Pereira

Práticas de leitura literária na educação infantil: como elas ocorrem em turmas de uma UMEI de Belo Horizonte? (Dissertação)

2014

BDTD

Renata Junqueira de Souza

Juliane Francischeti Martins Motoyama

Bebeteca: espaço e ações para formar o leitor (Artigo).

2016 CAPES

Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados da pesquisa.

Como podemos perceber, em nove anos, apenas cinco pesquisas – sendo

duas a mesma - foram encontradas envolvendo a palavra-chave “bebeteca”. Isso

evidencia o pequeno volume de pesquisas brasileiras referentes ao tema em questão.

Mediante esse dado, justifica-se o desenvolvimento desta pesquisa para dar mais

visibilidade na necessidade de ampliar-se os espaços de leitura para crianças

pequenas.

Assim sendo, esta dissertação está organizada em cinco capítulos. No primeiro,

O livro em minha vida, o percurso como pesquisadora, trouxemos a formação leitora

da pesquisadora, as atuais pesquisas que sustentam o tema em questão, dentre os

quais citamos Escardó i Bás (1999), Instituto Espantapájaros (2014), Senhorini e

Bortolin (2008), Pereira (2014), Barros e Santos (2009), que apresentam o conceito

de bebeteca. Também abordamos a metodologia da pesquisa, no intuito de revelar o

caminho percorrido da pesquisa e a questão problema que norteia toda a pesquisa:

Como ocorre a mediação do literário nas bebetecas?

No segundo capítulo, Contextos da pesquisa: bebeteca em ação, apresentamos

os sujeitos e os espaços desta pesquisa, sendo um o CEI Darlan Dotto Wiersinski, na

27

cidade de Itajaí, Santa Catarina, e o outro o CMEI Padre Livio Donati, em Castro,

Paraná. Não temos interesse em comparar os espaços de leitura, mas sim conhecer

o perfil dos ambientes educativos nos quais foram coletados os dados para a análise

da pesquisa.

No terceiro capítulo, Por que ler para as crianças pequenas?, trazemos

reflexões a respeito da literatura, cujo referencial está pautado em Eco (2003), que

aponta as funções da literatura, entre elas a “gratia sui”, leitura para puro deleite.

Buscamos, em Reyes (2010), entender como ela aborda os encontros com a leitura

ao intitulá-los como triângulo amoroso (adulto, criança, livro). Em Barthes (2013),

procuramos evidenciar o conceito de texto fruição que se difere do texto de prazer.

Com Petit (2013b), procuramos entender sobre a importância da familiaridade precoce

com os livros.

O quarto capítulo, Encontros na bebeteca: CEI Darlan Dotto Wiersinski,

apresenta a análise da bebeteca desse CEI, seu espaço, o projeto bebeteca, a

qualidade do acervo e a mediação da professora. Para tal análise, contamos com

autores como: Reyes (2010, 2012, 2013), Martins e Neitzel (2016), Reis (2014),

Duarte Jr. (2010) e Martins (2012a, 2012b).

No quinto capítulo, Encontros na bebeteca: CMEI Padre Lívio Donati, fazemos

a mesma abordagem, mais focada no CEI. A intenção é debater o projeto da bebeteca,

o espaço, a qualidade dos livros e como ocorrem as mediações na bebeteca. A análise

está pautada nos autores: Reyes (2010, 2012, 2015, 2016), Martins e Neitzel (2016),

Reis (2014), Duarte Jr. (2010) e Martins (2012a, 2012b, 2014). No sexto capítulo,

trazemos algumas considerações a respeito do conceito de bebeteca que entendemos

ser o mais próximo à realidade brasileira na intenção de formar leitores.

Para entender como começou esse espaço de leitura, convidamos, você

leitor(a), a conhecer as primeiras descobertas referentes ao tema bebeteca.

1.1 A PRIMEIRA DESCOBERTA: LITERATURA PARA A CRIANÇA PEQUENA

E como iria reunir outras criancinhas à sua volta e tornar os olhos delas brilhantes e impacientes com muitas

histórias estranhas, talvez até com o sonho do país das maravilhas de tanto tempo atrás.

Lewis Carroll (2009, p. 149).

28

Pela pesquisadora ser professora de Educação Infantil, por apreciar os

momentos vivenciados com as crianças pequenas, em que a literatura se faz

presente, momentos como estes no conto de Lewis Carroll configuram a receptividade

positiva das crianças pelas histórias. Passamos, assim, a pesquisar sobre esse

espaço de leitura denominado “bebeteca”. Após lermos algumas pesquisas já

existentes, selecionamos algumas para entender e discutir o conceito desse espaço.

Segundo Escardó i Bás (1999), a bebeteca é um:

Servicio de atención especial para la pequeña infancia (de O a 6 años) que incluye, además de un espacio y un fondo de libros escogidos para satisfacer las necesidades de los más pequeños y de sus padres, el préstamo de estos libros, charlas periódicas sobre su uso y sobre los cuentos, asesoramiento, y una atención constante por parte de los profesionales de la biblioteca hacia sus usuarios4. (ESCARDÓ I BÁS, 1999, p. 10).

Considerar que a bebeteca oferece um atendimento especial para a criança

pequena que precisa de um espaço próprio já é um grande avanço, tendo em vista

que, nem sempre, se considera que os pequenos necessitam de uma bebeteca, pois

subestima-se a sua capacidade de compreensão. “Especial” significa que ela está

focada na criança pequena de forma que ela se identifique com o material, que ela

tenha mais acesso. Diante dessa concepção, evidencia-se que a bebeteca precisa de

um espaço próprio e adequado na acolhida dos livros e das crianças pequenas, onde

haja uma mediação, que pode ser dos bibliotecários, dos professores ou dos pais. A

intenção é aproximar os pequenos dos livros, pelo manuseio livre das obras ao tocá-

las; pela escuta; pelas trocas ao compartilhar; pelo observar ao olhar; enfim,

possibilitar aos pequenos afetar-se pelos livros.

Em se tratando das pesquisas analisadas, Pereira (2014) apresenta o conceito

de bebeteca discutido por Escardó i Bás (1999). Já Senhorini e Bortolin (2008, p. 129)

conceituam bebeteca como “[...] uma biblioteca especialmente destinada para os

bebês, seus pais ou responsáveis em trabalhar todas as possibilidades de leitura e

envolvendo a criança e o mundo lúdico, despertando primeiramente, o prazer e a

paixão pela leitura”. Esse conceito traz, dessa forma, a bebeteca como lugar

especializado para os bebês, para os pais e para os responsáveis. Pontuamos a

4 “Serviço de atenção especial à primeira infância (de 0 a 6 anos), que inclui, além de um espaço e uma coleção de livros escolhidos para atender às necessidades dos mais pequenos e seus pais, o empréstimo desses livros, conversações periódicas sobre as histórias, conselhos e atenção constante de profissionais de biblioteca aos seus usuários.” (ESCARDÓ I BÁS, 1999, p. 10, tradução nossa).

29

importância em cultivar esse laço com a leitura em família, sendo a família também

leitora e partícipe desse momento da mediação do literário com a criança pequena.

As autoras relacionam o livro com o mundo lúdico, concepção que nos permite

relacionar o livro com o brinquedo. Entretanto, sinalizamos que, para o livro ser visto

pela criança pequena como um brinquedo, ele necessita ser explorado de forma livre,

contínua e apreciativa. Defendemos, portanto, um explorar em que a criança pequena

possa realmente construir uma relação de intimidade com o livro. Essa relação

demanda toque, cheiro, sabor, brincadeira. Assim, evidenciamos a importância do

brincar nesse processo, pois ele é inerente ao ser criança. A brincadeira é uma

estratégia de trazer a criança para o livro, que pode dar-se pela exploração do

momento de leitura em voz alta pelo adulto. Brincar e ler podem ser atos

complementares presentes na rotina da criança, nos encontros na bebeteca, pois o

manusear e o ouvir histórias são ações que aguçam o imaginário da criança, o faz de

contas e são requisitos importantes para a formação do pequeno leitor.

Senhorini e Bortolin (2008) apontam que cabe à bebeteca despertar o prazer e

a paixão; assim como Pennac (2008, p. 108) que compara a leitura prazerosa com o

ato de enamorar “[...] eu, nunca tive tempo para ler, mas nada, jamais, pôde me

impedir de terminar um romance de que eu gostasse”. É nesse mesmo viés que

defendemos que o livro seja possibilitado à criança pequena, não como obrigação,

aprisionamento, mas que as crianças pequenas se sintam afetadas pelo livro, como

elas são pelo brinquedo.

Barros e Santos (2009) apresentam a bebeteca como

[...] um local propício para crianças de oito a três anos iniciarem o primeiro contato com os livros. Um local pequeno, com livros adequados, almofadas pelo chão, com o objetivo de fazer com que as crianças se sintam bem, e a professora ou bibliotecária possa realizar suas atividades da melhor maneira possível, alcançando os objetivos desejados”. (BARROS; SANTOS, 2009, p. 49).

As autoras afirmam ser um espaço destinado às crianças pequenas, um

espaço que tem a preocupação em desenvolver atividades com os livros. Essa

compreensão implica em atividades de mediação que envolvem os livros e permitam

que a criança pequena se sinta afetada.

O Instituto Espantapájaros (2014), na Colômbia5, entende que a bebeteca é

5 Projeto cultural que incentiva a leitura e a expressão artística, promovendo um encontro criativo com literatura e arte. Disponível em: <http://espantapajaros.com/>. Acesso em: 20 abr. 2017.

30

[...] una biblioteca especializada en literatura para la primera infancia, del jardín infantil, de la librería y de los talleres para niños y adultos, construimos alternativas pedagógicas para que los niños crezcan como lectores, escritores y sujetos de lenguaje desde el comienzo de lavida 6. (INSTITUTO ESPANTAPÁJAROS, 2014, s/p).

Nesse espaço da bebeteca, uma vez por semana, acontece o “cuento em

panãles” (contos em fraldas) - uma oficina literária para os bebês a partir de oito

meses. Os bebês vão acompanhados de sua mãe, de seu pai, de seus avós, para que

possa “[...] tocar, ver y morder libros de imágenes; escuchar y moverse al ritmo de

poemas, rimas y canciones; sentir la arena y la grama entre sus deditos”7. É, também,

uma definição que propõe a bebeteca como um espaço especializado para a criança

pequena, mostrando a sua importância para aproximar a criança dos livros.

Concordamos com a concepção do Instituto Espantapájaros de desenvolver

mediações de leituras para a criança pequena no intuito de aproximarem os futuros

leitores do material literário. Uma bebeteca precisa ser um espaço que acolha a

criança pequena, desenvolvendo mediações de leituras, possibilitando que a família

faça parte desse momento, pois ela conhece o pequeno leitor e tem uma relação de

intimidade, o que lhe assegura confiança em estar em um ambiente social e cultural

onde outras pessoas também fazem parte. As mediações de leituras desenvolvidas

em “cuento em panãles”8 possibilitam que a família esteja junto à criança pequena,

momento que ambos ouvem e leem histórias e podem manusear as obras. São

nesses encontros com o livro que são alimentados os sentidos dos pequenos. A

bebeteca é conceituada, portanto, como um espaço de trocas e de manuseio de livros,

de contação de histórias, de colo, de escolhas, de intimidade, de conversas e de

balbucios, de olhares mútuos, onde o afeto ganha espaço e o pequeno leitor possa

vivenciar e apreciar esteticamente o momento literário.

Tendo em vista esses conceitos, sintetizamos as concepções apresentadas por

meio de uma nuvem de palavras (Figura 1) organizadas por uma rede semântica de

acordo com seis categorias, a saber:

6 “[...] uma biblioteca especializada em literatura para a infância, do jardim de infância, da biblioteca e das oficinas para crianças e adultos, construímos alternativas pedagógicas para que as crianças cresçam como leitores, escritores e sujeitos de linguagem desde o início da vida” (INSTITUTO ESPANTAPÁJAROS, 2014, s/p, tradução nossa). 7 “[...] tocar, ver e morder os livros ilustrados; ouvir e mover-se ao ritmo de poemas, rimas e canções; sentir a gama de livros entre os dedos” (INSTITUTO ESPANTAPÁJAROS, 2014, s/p, tradução nossa). 8 Disponível em: <http://espantapajaros.com/cuentos-en-panales/>. Acesso em: 10 maio 2017.

31

espaço sujeitos ações na bebeteca recursos e materiais

provocações objetivos da bebeteca

Figura 1 - Nuvem de palavras 1

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Assim, buscamos conhecer e identificar espaços de bebetecas no território

brasileiro. Embora pouco conhecida e apontada em pesquisas, a bebeteca é um

campo que sutilmente está ganhando espaço em terras brasileiras, o que inspira

novas pesquisas sobre a formação de leitores no viés da leitura literária para crianças

pequenas. Dessa forma, antes de conhecer tais espaços, realizamos uma revisão de

literatura para conhecer o que está sendo pesquisado e discutido sobre esse espaço

de leitura. Para tanto, procuramos conhecer qual foi a primeira bebeteca a ser

constituída.

De acordo com Escardó i Bas (1999, p. 9), sobre a V Conferência Europea de

Lectura, na cidade de Salamanca, em julho de 1987,

[...] escuché por primera vez en francés, de la voz de Georges Curie, la palabra mágica: Bebètheque. Esta palabra y las explicaciones que la acompañaban disiparon todas mis dudas sobre los primeros intentos de acercar a los libros que realizábamos con niños que aún no habían empezado su aprendizaje de lectura. 9 (ESCARDÓ I BAS, 1999, p. 9).

9 “[...] escutei pela primeira vez em francês, da voz de Georges Curie, a palavra mágica: Bebetheque. Essa palavra e as explicações que a acompanham dissiparam todas as minhas dúvidas sobre as

32

Outra autora que também comenta sobre essa conferência é Baptista (2012)

que, em seu artigo Leitura literária na primeira infância: a experiência da bebeteca

Can Butjosa em Barcelona, afirma que Georges Curie, palestrante, fez o uso do termo

Bebétheque com o objetivo de discutir sobre a importância de aproximar os livros das

crianças menores antes de elas aprenderem a ler e a escrever. Curie fez menção a

práticas que promoviam a leitura para as crianças inicialmente em creches e não em

uma biblioteca exclusiva para eles.

Assim, da V Conferencia Europea de Lectura à prática, foi na Espanha, em 3

de maio de 1991, que surgiu o primeiro espaço denominado “bebeteca”, traduzido

para a língua espanhola. Esse espaço foi estruturado junto ao ambiente de uma

Biblioteca - a de Can Butjosa. A bebeteca foi organizada pela iniciativa da bibliotecária

Mercè Escardó i Bas. Facchini (2010, p. 3) reflete sobre o significado da palavra

espanhola “bebeteca” (Figura 2).

Figura 2 - Demonstrativo da origem da palavra bebeteca beba ninã, chiquilla, criatura...

beteca bibliotecário, biblioteca pública.

Bebeteca - espaço de leitura para bebês na biblioteca

Fonte: Facchini (2010, p. 3).

Da Espanha para o território brasileiro, a primeira bebeteca (como aqui é

denominada, mas cuja palavra ainda não está dicionarizada) a ser mencionada em

sites brasileiros,10 em espaço educacional, foi no ano de 2005, na cidade de Castro,

no Paraná, no Centro de Educação Infantil Cavalinho de Pau11. A Secretaria de

Educação oferece esse espaço de leitura em todos os Centros Municipais de

Educação Infantil, com a intenção de que as crianças tenham acesso aos livros desde

a mais tenra idade.

Nas primeiras leituras de Facchini (2010), Senhorini e Bortolin (2008), Baptista

(2012), Barros e Santos (2009), percebemos que a Bebeteca é um espaço que vem

primeiras tentativas de trazer livros que realizávamos com crianças que ainda não tinham começado a sua formação de leitura” (ESCARDÓ I BAS, 1999, p. 9, tradução nossa). 10 Para conhecer mais sobre a primeira bebeteca em espaço educacional, no Brasil, acesse: <http://smedinfantilcastro-nanci.blogspot.com.br/2010/10/bebeteca.html>. Acesso em: 10 jan. 2017. 11 Para conhecer mais sobre a primeira bebeteca em espaço educacional no Brasil, acesse: <http://www.adeepra.org.ar/congresos/Congreso%20IBEROAMERICANO/FOMENTOLECTURA/R1932FAcc.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2017.

33

auxiliando as instituições de Educação Infantil a empreender os seus primeiros gestos

embrionários em leituras com crianças pequenas. Embora algumas bebetecas

atendam crianças de até seis anos, o foco para este estudo são as crianças de quatro

meses a três anos. Assim, nesta pesquisa, consideramos como crianças pequenas as

crianças de quatro meses a três anos. Escolhemos essa etapa da infância por

entender que oportunizar momentos de leitura às crianças pequenas é, antes de tudo,

respeitá-las, isto é, possibilitar que elas tenham o direito de os livros fazerem parte de

suas vidas, assim como as brincadeiras.

Quanto mais cedo a criança pequena estiver em contato com os livros, quanto

mais a leitura tenha espaço em suas vivências, maiores serão as chances de o livro

repercutir em suas vidas, em aguçar sua vontade de ler, em terem experiências de

leitura. Segundo Petit (2012),

[...] as primeiras bolas que são lançadas à criança são fundamentais: delas dependerá, em grande medida, seu desenvolvimento. Todos os grandes especialistas nessa idade assinalaram a importância, para o despertar sensível, intelectual e estético das crianças, das trocas precoces com a mãe (ou a pessoa que representa) tem com o bebê. (PETIT, 2012, p. 52).

Nessa perspectiva, para que essas experiências ocorram, as crianças

pequenas necessitam das interações com o adulto. São nas interações, nas

experiências vivenciadas pela criança que aos poucos ela constrói significados e se

desenvolve. As experiências de manuseio livre que a criança possui com o livro junto

ao adulto, quando mediadas de forma adequada, podem possibilitar que ela construa

uma concepção do livro não apenas como objeto utilitário, de conhecimento, mas,

sobretudo, como objeto artístico e estético, uma relação que se constrói pela

afetividade e pela percepção sensorial.

Por termos escolhido a criança pequena, muitas inquietações foram surgindo,

entre elas: Como contar histórias para a criança pequena? Como pode ser o espaço

de mediação do literário na bebeteca? Quais são os melhores livros literários que

podem ser oferecidos à criança pequena? Como ocorrem os encontros literários nas

bebetecas? Muitas perguntas surgiam, mas um questionamento se repetia: Qual a

importância do contato com o livro na vida do homem desde criança? Petit (2012, p.

123) aponta “[...] o quanto é importante, desde a mais tenra idade, propor aos bebês

alimentos culturais, contar-lhes histórias e ler para eles”. A autora afirma que ler é

possível para as crianças pequenas, e elas têm potencialidades para receber esses

34

alimentos culturais. Tais inquietações permitiram que a pesquisa fosse sendo

desenhada, com a proposta de refletir sobre a bebeteca, tendo como questão

problema:

Mediante essa questão, delineamos o seguinte objetivo geral:

Para alcançar esse objetivo, traçamos os seguintes objetivos específicos:

Ø Apresentar concepções de bebetecas.

Ø Identificar bebetecas no Brasil.

Ø Discutir sobre os acervos literários das bebetecas do Centro de Educação

Infantil Darlan Dotto Wiersinski e do Centro Municipal de Educação Infantil

Padre Lívio Donati.

Ø Identificar as condições dos espaços físicos das bebetecas dos Centros de

Educação Infantil que são foco desta pesquisa.

Ø Identificar como as professoras interagem com as crianças durante os

encontros literários nos dois Centros de Educação Infantil pesquisados.

Esta é uma pesquisa que nasceu junto ao Grupo de Pesquisa Cultura, Escola

e Educação Criadora. Em se tratando do aporte teórico, esta pesquisa traz Escardó i

Bás (1999), Instituto Espantapájaros (2014), Senhorini e Bortolin (2008), Pereira

(2014), Barros e Santos (2009), que apresentam o conceito da palavra bebeteca. Petit

(2012, 2013a, 2013b) discute sobre a mediação de leitura e o papel do mediador; Petit

(2012), Reis (2014), Reyes (2010, 2012, 2013, 2015, 2016) e Martins e Neitzel (2016)

ressaltam a importância de propor às crianças pequenas alimentos culturais que lhes

permitirão construir uma relação estética com o livro de literatura, de forma

Como ocorre a mediação do literário nas bebetecas?

Analisar como ocorre a mediação do literário nas bebetecas.

35

a apreciarem a leitura e afetarem-se por ela. Duarte Jr. (2010) aponta a importância

de iniciar, desde cedo, a educação do sensível; Martins (2012a, 2012b, 2014) traz

como ação propositora uma mediação provocada que gere experiências estésicas.

Trazemos, também, as pesquisas de nosso Grupo de Pesquisa Cultura, Escola

e Educação Criadora, que apresentam trabalhos direcionados sobre essa temática,

entre elas: Borba (2016), com a pesquisa intitulada Mediação cultural em bibliotecas,

discute como as bibliotecas se constituem em espaços de mediação cultural. A autora

evidenciou a biblioteca como um espaço de encontros e mediação cultural para

educação dos sentidos; Weiss (2016), com A leitura do literário e a sala de aula,

mediações em/de leitura, apontou, entre seus objetivos, as estratégias de leituras

mais adequadas na concepção de leitura fruitiva; Reis (2014), como já apontado,

discute sobre a experiência literária para os pequenos em San Miniato – Itália; Neitzel

e Carvalho (2016), ao organizarem o livro Mediação Cultural, formação de leitores &

educação estética, apresentam várias pesquisas que foram desenvolvidas pelo GP

Cultura Escola e Educação Criadora sobre mediação, leitura e educação do sensível.

A escolha por esses autores ocorreu por eles compreenderem a mediação

cultural como fundamental no processo de ensino e aprendizagem. Por meio desse

aporte teórico, compreendemos que a leitura pode ser proposta às crianças pequenas;

que a bebeteca é um espaço de trânsito, que permite encontros sensíveis com a arte

literária; e que os primeiros contatos com a obra literária ocorrem pela mediação de

um adulto, que pode estar na família ou na escola.

1.2 EM BUSCA DE ESPAÇOS DE LEITURA

Gostaria de não ter chorado tanto!

Disse Alice, enquanto nadava de um lado para outro, tentando encontrar uma saída.

Lewis Carroll (2009, p. 28).

Como Alice, que tanto nadou em busca do caminho para a saída, não nadamos,

mas muitas foram as andanças à procura de espaços de bebetecas. Iniciamos

investigando por meio das secretarias de Educação da região do Vale do Itajaí e das

bibliotecas públicas a existência desse espaço de leitura. Logo seguimos para outros

estados na intenção de encontrar mais espaços. Muitos foram os desafios no que se

refere às localizações, porém estas foram identificadas por meio dos sites e e-mails

36

enviados às secretarias12. Os Quadros 4 a 8 a seguir mostram as bebetecas

encontradas em 5 estados.

Quadro 4 - Bebetecas no estado de Santa Catarina

ESTADO DE SANTA CATARINA BEBETECAS CIDADE

NEI Sonhos de infância Balneário Camboriú CEI Darlan Dotto Wiersinski Itajaí Biblioteca Pública Dom Daniel Hostins Gaspar

Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.

Quadro 5 - Bebeteca no estado do Rio Grande do Sul ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

BEBETECA CIDADE Núcleo de Educação Infantil Caic Luizinho De Grandi Santa Maria

Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.

Quadro 6 - Bebetecas no estado do Paraná

ESTADO DO PARANÁ BEBETECAS CIDADE

CMEI Ciranda do saber Castro CMEI Cavalinho de Pau Castro CMEI Rivadávia de Gracia Lara Castro CMEI Padre Lívio Donatti Castro

CMEI Rubens José Quintiliano Castro CMEI Pequeno Reino Castro CMEI Nosso Lar Castro

CMEI Marly Rolim Castro CMEI Leda Maria Torres Pereira Castro

CMEI João Paulo II Castro CMEI Elizabet Macedo Kugler Castro

CMEI Turma do Pererê Castro CMEI Despertar para o mundo Castro

Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.

Quadro 7 - Bebeteca no estado do Rio de Janeiro ESTADO DO RIO DE JANEIRO

BEBETECA CIDADE Biblioteca Parque Estadual Rio de Janeiro

Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.

Quadro 8 - Bebeteca no estado de Minas Gerais

ESTADO DE MINAS GERAIS BEBETECA CIDADE

12 Realizamos buscas, no Brasil, em sites, blogs e aplicativos como Facebook, Instagram, com a palavra bebeteca. Encaminhamos e-mails para algumas secretarias de educação da região (Florianópolis, Blumenau, Gaspar, Balneário Camboriú, Itajaí, Itapema) do estado de Santa Catarina. Como algumas secretarias não responderem aos e-mails, também usamos o recurso do telefone para entrar em contato.

37

Faculdade de Educação da UFMG Belo Horizonte Fonte: Elaborado pela autora para fins de pesquisa.

A partir desse mapeamento, selecionamos algumas para visitação. A seleção

deu-se tendo em vista a aproximação das bebetecas com a região onde a

pesquisadora reside.

1.3 OS ENCONTROS NAS BEBETECAS GERANDO DADOS

Uma grande roseira crescia junto à entrada do jardim; suas flores eram brancas,

mas três jardineiros estavam à sua volta, pintando-as de vermelho.

Alice achou aquilo curiosíssimo e se aproximou para observá-los Lewis Carroll (2009, p. 92).

Como no conto de Alice, a curiosidade foi o sentimento que caminhou junto aos

momentos de observação, um movimento de perguntar, de conhecer e de

compartilhar algumas horas ao lado das crianças e dos mediadores de leitura.

Transitar por esses caminhos desconhecidos e ter a oportunidade de indagar e poder

conhecer a prática e a teoria. Compartilhamos a sensação de contentamento em

poder observar como é este espaço de leitura para pequenos e como ocorre a

mediação do literário. Borba (2016, p. 56-57) afirma que, na mediação de leitura, “[...]

o objeto estético é a obra que incita os sujeitos e os leva a repercussões sensíveis por

meio das relações estabelecidas entre a obra/o sujeito/o mediador e, posteriormente,

podem ser alimentadas cotidianamente”. Entendemos que, pela mediação do literário,

nas interações, nas vivências com o livro, o mediador pode possibilitar à criança

pequena sentir outras sensações, sentidos e percepções que potencializam a

educação estética.

Para observar o objeto de pesquisa, assim como fez Alice, tivemos de

aproximarmo-nos dele, sendo necessário escolher alguns espaços para observação.

Nessa etapa, selecionamos sete bebetecas, as quais fizeram, assim, parte do corpus

desta pesquisa, tendo em vista dois critérios:

a) Santa Catarina, por ser onde reside a pesquisadora e onde ela exerce a função

de professora. Há facilidade, assim, quanto à entrada na rede e, também,

oportunidade em conhecer a realidade de mediação do literário com crianças

pequenas na região.

38

b) Paraná, em Castro, devido à cidade ser pioneira em duas situações:

Ø desenvolver espaços de bebetecas em Instituições de Educação Infantil;

Ø ser a primeira cidade no Brasil a oportunizar o acesso da criança ao

jardim de infância. Segundo Cardoso Filho (2006, p. 1683), a professora

Emília Faria de Albuquerque Erichsen iniciou “[...] na cidade de Castro,

Paraná, em 1862, o primeiro jardim de infância no Brasil, segundo

métodos pedagógicos derivados das obras do educador alemão

Frederich Froebel”.

Valemo-nos da Figura 3 a seguir para ilustrar as sete bebetecas escolhidas,

com as datas das visitas e o número de horas passadas no espaço das bebetecas.

Figura 3 - Corpus da pesquisa - as sete bebetecas

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Após a seleção das sete bebetecas, a pesquisadora fez uma visita in loco para

conhecer os espaços e decidir sobre quais bebetecas a pesquisa iria debruçar-se.

Para coleta de dados, escolhemos uma bebeteca da cidade de Itajaí - o CEI Darlan

Dotto Wiersinski, e a outra bebeteca da cidade de Castro - o Centro Municipal de

Educação Infantil (CMEI) Padre Lívio Donati. A escolha dessas duas deu-se tendo em

vista que ambas atendem crianças de quatro meses a três anos de idade, isto é,

trabalham com a criança pequena.

NEI Municipal

Sonhos de Criança

( Balneário Camboriú,

SC)

- 6/05/2016

- 13/10/2016

(8 HORAS)

CEI Darlan Dotto

Wiersinski

(Itajaí, SC)

-22/09/2016

-29/09/2016

-21/10/2016

- 6/04/2017

(12 HORAS)

Biblioteca

Pública Dom Daniel Hostin

(Gaspar, SC)

3/08/2016

(2 HORAS)

CMEI Ciranda do

Saber

(Castro, PR)

13/09/2016

(2 HORAS)

CMEI Rubens José Quintiliano

(Castro, PR)

12/09/2016

(3 HORAS)

CMEI Leda Maria Torres

Pereira

(Castro, PR)

13/09/2016

(2 HORAS)

CMEI Padre Lívio Donati (Castro, PR)

14/09/2016

(4 HORAS)

39

As bebetecas possuem funcionamentos diferentes (a de Castro tem um

professor contratado para mediação na bebeteca; e, em Itajaí, ela ocorre pela

mediação do próprio professor regente da turma). Ambas possuem o projeto de

bebeteca, os espaços diferenciam-se e há evidências em mediação do literário.

1.4 OS ENCONTROS DA PESQUISA

“Poderia me dizer, por favor, que caminho devo tomar para ir embora daqui?” “Depende bastante de para onde quer ir”, respondeu o Gato.

“Não importa muito para onde”, disse Alice. “Então não importa que caminho tome.” disse o Gato.

“Contando que eu chegue a algum lugar”, Alice acrescentou à guisa de explicação. “Oh, isso certamente vai conseguir”, afirmou o Gato, “desde que ande o bastante.

Lewis Carroll (2009, p. 76-77).

Alice intriga-nos com a não certeza do caminho para ir embora. Qualquer um

para ela poderá ser, desde que a levem. O Gato afirma que não importa o destino que

se tome, desde que caminhe bastante. A pesquisa inicia-se, assim, com muita

caminhada. Temos uma temática que queremos pesquisar, mas o caminho parece

incerto, por isso todo processo deve ser pensado e desenhado com cautela e

objetividade, para que saibamos lidar com o previsto e os imprevistos na pesquisa. A

escolha metodológica mostra-nos os caminhos a serem percorridos, as escolhas a

serem feitas, os encontros a serem realizados e, com isso, os resultados obtidos.

Optamos pela pesquisa qualitativa, pois, segundo Creswell (2010, p. 52), “[...]

uma das principais razões para se conduzir um estudo qualitativo é que o estudo é

exploratório”, pois ele permite observar os sujeitos envolvidos na pesquisa, e, com

base nos sujeitos, desenvolver a sua compreensão para com o objeto pesquisado.

Esse método possibilita ser flexível na escolha dos instrumentos que serão utilizados

na coleta os dados. Silverman (2009, p. 51) afirma que “[...] o ponto forte da pesquisa

qualitativa é que ela usa dados que ocorrem naturalmente”. Assim, a intenção foi

observar as bebetecas, com vistas a tornar mais explícito o cenário, como um todo,

seja o espaço arquitetural, com os elementos que o compõem, sejam as obras e a

mediação que ocorre entre os sujeitos (criança pequena, professor, família)

envolvidos nesse espaço de leitura. A pesquisa qualitativa permitiu coletar os dados

do contexto, de forma aberta, de forma a verificar os detalhes ocorridos durante a

observação. Também é possível os pesquisadores fazerem o uso de mais de uma

forma de dados, entre elas a “entrevista, observações e documentos” (CRESWELL,

40

2010, p. 208). Nesta pesquisa, os instrumentos escolhidos para a coleta de dados

foram:

ü Observação, que possibilitou obter as reais informações do momento que elas

aconteceram, no próprio campo da pesquisa. Investigamos vários pontos de

observação, sinalizados na Figura 4 a seguir.

Figura 4 - Pontos de observação

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

No espaço físico da bebeteca, observamos os pontos mostrados na Figura 5

que segue.

Figura 5 - Pontos observados sobre o espaço da bebeteca

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Quanto ao acervo da bebeteca, observamos os elementos apresentados na

Figura 6 a seguir.

Espaço

Documentos

Mediação literária

Acervo

literário

gu

O espaço permite o

acesso livre das crianças pequenas?

O mobiliário é acessível à altura das crianças

pequenas?

paço

é Quais as

condições do ambiente (arejado,

iluminado, há poluição visual nas paredes)?

ual ?

Como são as bebetecas?

41

Figura 6 - Pontos observados sobre o acervo da bebeteca

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Em se tratando dos documentos, os escolhidos foram os trazidos na Figura 7.

Figura 7 - Documentos analisados da bebeteca

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Nos encontros literários, procuramos observar como as crianças se relacionam

com os livros e como as professoras medeiam as atividades literárias. Alguns

questionamentos nortearam as observações, tais como:

Ø As crianças pequenas podem manusear livremente as obras?

Ø Durante a contação, as crianças pequenas se mantêm atentas? Conversam?

Interagem com seus pares?

Ø Como as crianças pequenas se comportam durante a contação de história?

Dividem descobertas com os colegas? Elas se mantêm em silêncio? Balbuciam

imitando a contação da professora?

Ø Qual a frequência dos encontros?

Ø Ao contar histórias, as professoras fazem o uso de outro objeto ou recurso além

do livro? Qual?

Ø Como as professoras fazem a roda de leitura13?

Ø Como as professoras contam a história com o livro?14

13 Roda de leitura: momento que os livros estão à disposição das crianças pequenas para que elas manuseiem de forma livre. 14 Contação de histórias com o livro: é uma ação que envolve o contador que conta a história com a presença do livro para a criança pequena.

Quantidade de livros

Estado de conservação

GênerosMateriais dos

livros

Projeto bebeteca

Planejamento

42

Ø As professoras permitem as crianças pequenas participarem da história, a

questionarem, a falarem durante a contação?

Ø Como as professoras medeiam a escolha dos livros?

Além da observação, utilizamos outros instrumentos para coleta de dados:

Ø Fotografias: para registrar e recolher informações vistas durante o processo de

observação nas bebetecas. Com elas, registramos os detalhes que foram

percebidos, bem como as utilizamos para recordar informações que

complementaram a análise dos dados.

Ø Diário de bordo: foram registrados fatos vistos, perguntas ou questionamentos

de forma aberta que pudessem, no ato da observação, surgir. Em alguns

momentos das observações, a pesquisadora fez algumas perguntas às

professoras para melhor entender como realizam os encontros na bebeteca.

Assim, os momentos dos encontros foram observados e registrados. Creswell

(2010, p. 214) afirma que é possível o pesquisador realizar anotações sobre o

comportamento e as ações desenvolvidas pelos sujeitos no campo da pesquisa.

Ø Entrevista: com a intenção de levantar informações que auxiliam a compreensão

sobre como as professoras trabalham a literatura com as crianças pequenas.

Entrevistamos as professoras no intuito de refletir sobre a sua concepção de

literatura. Para a entrevista, foi enviado um e-mail às professoras das bebetecas

com a seguinte pergunta: - “Para que serve este bem imaterial que é a

literatura?” (ECO, 2003, p. 9). Outra característica relevante da pesquisa

qualitativa é que permite coletar várias fontes de dados na pesquisa. Assim, a

entrevista é mais um instrumento que agregou informações para a

fundamentação e a discussão teórica do trabalho.

Ø Documentos (projeto da bebeteca e planejamento): possibilitou uma análise

mais concreta do objeto de pesquisa, bem como contribuiu para conhecer ainda

mais o retrato do corpus da bebeteca.

Em síntese, os instrumentos para a coleta de dados foram os mostrados na

Figura 8.

43

Figura 8 - Instrumentos para coleta de dados

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

1.5 ANÁLISE DE DADOS

[...] lera muitas historinhas divertidas sobre crianças que tinham ficado queimadas e sido comidas por animais selvagens e outras coisas desagradáveis,

tudo porque não se lembravam das regrinhas simples que seus amigos haviam ensinado. Lewis Carroll (2009, p. 19).

Para que não cometamos os mesmos erros de Alice, por não se lembrar das

regrinhas básicas, é importante o registro cuidadoso e detalhado da coleta de dados,

assim como uma análise rigorosa. Essa análise foi combinada com o entrecruzamento

da observação, dos documentos e da entrevista. Para Creswell (2010, p. 236), “[...] a

análise dos dados é um processo contínuo durante a pesquisa”, a qual envolveu

analisar as informações coletadas pelos envolvidos. Escolhemos essa metodologia

tendo em vista que ela permite ser realizada durante todo o processo do trabalho de

pesquisa. O método de triangulação, que podemos chamar, segundo Silverman

(2009, p. 261), de “métodos múltiplos”, é a “[...] combinação de muitas teorias, muitos

métodos, observadores e materiais empíricos, para produzir uma representação mais

acurada, abrangente e objetiva do objeto de estudo”. Os instrumentos da coleta de

dados foram utilizados para que fosse possível, com a triangulação, analisar os dados

coletados sobre o objeto de estudo no intuito de responder à questão problema que

é: Como ocorre a mediação do literário nas bebetecas?

Instrumentos

Fotografias

Diário de bordo

EntrevistasDocumentos

Observação in loco

44

A seguir, fazemos um levantamento sobre as características das Instituições

de Educação Infantil, onde as bebetecas estão inseridas, com o objetivo de conhecer

como se configuram tais espaços e quem são os sujeitos que ali vivenciam o encontro

com a leitura.

45

2 CONTEXTOS DA PESQUISA: BEBETECA EM AÇÃO

A lagarta e a Alice ficaram olhando uma para a outra algum tempo em silêncio.

Finalmente a lagarta tirou o narguilé da boca e se dirigiu a ela numa voz

lânguida, sonolenta. “Quem é você?” perguntou a lagarta.

Lewis Carroll (2009, p. 55).

Como na fala da lagarta, no conto de Alice, o começo

de uma conversa inicia-se por conhecer o outro, o

desconhecido, o sujeito que está a sua frente - “Quem é

você?”. Adentramos, como Alice, um campo desconhecido;

neste caso, o cotidiano de dois ambientes educativos: o

Centro de Educação Infantil Darlan Dotto Wiersinski e o

Centro Municipal de Educação Infantil Padre Lívio Donati.

Cada um possui suas próprias particularidades, mas ambos

possuem o espaço da bebeteca, que é o tema desta

pesquisa. Assim sendo, o intuito foi conhecer esse espaço de

leitura e, sobretudo, como ocorre a mediação do literário na

bebeteca.

Os espaços escolhidos para o campo da pesquisa

estão inseridos no ambiente educacional. Tanto um quanto o

outro atendem crianças de quatro meses a três anos. Seus

trabalhos envolvendo a leitura nas bebetecas iniciaram no

ano de 2016. Ambas possuem um projeto de bebeteca, seus

projetos são diferentes, mas o intuito da proposta é aproximar

a criança pequena dos livros. Não estávamos interessadas

em comparar os espaços de leituras, mas sim compreender

a concepção das bebetecas, identificar como é seu espaço

físico, discutir o acervo e perceber como as professoras

interagem com a criança pequena durante os encontros

literários.

MELNICK, 5 anos.MELNICK, 5 anos.

46

2.1 CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL DARLAN DOTTO WIERSINSKI

O Centro de Educação Infantil (CEI) Darlan Dotto Wiersinski (Imagem 1) está

localizado na cidade de Itajaí, no bairro São Vicente. Sua inauguração foi em julho de

2005. Segundo a Secretaria Municipal de Educação de Itajaí, o município possui 57

Centros de Educação Infantil. Contudo, esse é o único que possui um espaço

destinado à bebeteca. Esse espaço de leitura foi inaugurado no mês de junho do ano

de 2016.

Imagem 1 - Bebeteca CEI Darlan Dotto Wiersinsk

Fonte: Acervo da autora.

O Centro é situado em uma comunidade em que o comércio local é variado.

Há várias lojas, supermercados, escolas públicas e privadas, entre outros

estabelecimentos comerciais. Muitas famílias trabalham nesse comércio local ou se

deslocam para outros bairros para exercer suas funções. O CEI é adaptado, não foi

construído mediante um planejamento arquitetônico para uma instituição de Educação

Infantil. Foi estruturado e organizado dentro de um projeto já concebido de uma casa,

sua estrutura apresenta-se com um espaço físico pequeno. Ele é composto por uma

sala de professores, uma cozinha, um refeitório - cujo ambiente é dividido pela

bebeteca -, banheiros, quatro salas de aula, um parque de areia, um pequeno espaço

coberto para brincar na parte interna, um pequeno jardim e uma sala de direção e

coordenação pedagógica.

O CEI atende cerca de cinquenta e três crianças pequenas entre a idade de

quatro meses a três anos, que frequentam a unidade em período integral. Nessa

47

instituição, atuam uma coordenadora, uma secretária, cinco professoras e oito

agentes de atividade de educação e mais quatro funcionários. As turmas são

subdivididas em Berçário I, Berçário II, Maternal I e Maternal II. O próprio CEI é o

responsável em realizar as matrículas das crianças, respeitando a data corte de trinta

e um de março.

O Centro possui um Projeto Político Pedagógico, que foi reestruturado em julho

de 2015. Nele constam informações sobre o calendário anual, as ações

desenvolvidas, os eventos realizados, as atividades com as crianças, o horário da

alimentação e o cardápio, os profissionais que ali atuam, a filosofia, os objetivos

propostos pelo CEI, entre outras informações. Salientamos que, no momento da

coleta de dados, não constava no PPP o projeto Bebê também lê (ITAJAÍ, 2015), pois

esse projeto foi organizado pelos docentes do CEI, após a reformulação do PPP.

Segundo entrevista junto à professora, o movimento de início do projeto Bebê também

lê iniciou-se tendo em vista o número de livros de literatura infantil que o CEI recebeu

do Plano Nacional de Bibliotecas da Escola (PNBE) 15. Assim, o objetivo inicial foi

construir um espaço no qual os livros pudessem ter destaque de forma que todos

tivessem acesso aos livros. Logo houve a necessidade também em compartilhar os

livros não só entre crianças pequenas e docentes, mas com a família também.

Para a organização do espaço, o CEI teve o apoio do Programa Institucional de

Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)16, que é um programa de estágio para as

futuros professores. O programa do PIBID contribuíu com suas ações, na organização

do espaço - pintura das caixas, onde são colocados os livros, e confecção do tapete.

Na bebeteca são os próprios regentes da turma que fazem as mediações do

literário e levam as crianças pequenas até o espaço. Para analisar as ações

desenvolvidas nesse CEI, com relação ao espaço da bebeteca, escolhemos uma

turma de maternal II para observar os momentos de mediação do literário. A escolha

por essa turma veio ao encontro da sugestão da própria coordenadora, devido à

mediação do literário provocada pela docente para as crianças pequenas.

15 Desde o ano de 1997, o PNBE desenvolve ações que “[...] tem por objetivo, promover o acesso à cultura e o incentivo à leitura nos alunos e professores por meio da distribuição de acervos de obras de literatura, de pesquisa e de referência” (BRASIL, 1997, s/p). Ele atende a todas as escolas de Educação Infantil, porém desde que estas estejam cadastradas regularmente no censo escolar. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/programas/biblioteca-da-escola/biblioteca-da-escola-apresentacao>. Acesso em: 10 jan. 2017. 16 Para conhecer o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), acesse <http://portal.mec.gov.br/pibid>.

48

A professora trabalha quarenta horas semanais com o grupo. Sua carreira

profissional na área educacional é de vinte anos. Formada no curso superior de

Pedagogia, ela tem especialização em Ludopedagogia. Também é professora

supervisora do PIBID da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). A turma de

maternal II é formada por dezesseis crianças pequenas de dois a três anos, das quais

quatorze são meninos e duas são meninas. Todos frequentam o CEI em período

integral. Com essa turma, atuam a professora regente e uma agente de atividade de

educação. A bebeteca está inserida no mesmo espaço do refeitório do CEI, não

havendo uma sala destinada apenas para essa função.

2.2 CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PADRE LÍVIO DONATI

O CMEI Padre Lívio Donati (Imagem 2) é localizado na cidade de Castro, no

estado do Paraná. Segundo a Secretaria Municipal de Educação de Castro, o

município possui treze unidades de Educação Infantil, e, em todas, há uma sala

destinada somente à bebeteca.

Imagem 2 - Bebeteca CMEI Padre Lívio Donati

Fonte: Acervo da autora.

O CMEI Padre Lívio Donati atende cerca de cento e vinte e oito crianças

pequenas de quatro meses a três anos, que frequentam o ambiente educativo em

período integral. Está localizado em um bairro onde há muitos comércios, como:

padarias, supermercados, unidade de saúde, lojas, farmácias, oficinas, entre outros.

49

Nesses comércios, alguns pais das crianças pequenas que frequentam o CMEI

exercem suas funções profissionais.

Houve reformas e sua inauguração ocorreu no dia 24 de maio de 2016, porém

algumas obras continuam sendo realizadas. Estão sendo construídas mais seis salas

de aula, mas o desenrolar dos trabalhos com as crianças segue normalmente.

O espaço físico do CMEI é amplo, sendo composto por uma sala de

professores, uma cozinha, um refeitório, uma sala de bebeteca, banheiros, seis salas

de aula, um parque externo e um pequeno espaço para brincar na parte interna, uma

sala de orientação, uma secretaria e uma sala de direção e coordenação pedagógica.

As turmas são subdivididas em Creche I, Creche II e Creche III. A Secretaria

Municipal de Educação é responsável em realizar as matrículas das crianças,

respeitando a data corte de trinta e um de março. Além disso, as famílias normalmente

escolhem o CMEI mais próximo de seus domicílios.

Na Proposta Curricular do Município, consta o projeto Bebeteca berço de

futuros leitores (2007), o qual é apresentado, também, no Projeto Político Pedagógico

de cada CMEI. Contudo, cada um atende as suas peculiaridades que cada espaço

requer, mas seguindo os objetivos nele propostos. Na Bebeteca, quem atua é apenas

uma professora, exclusiva para essa função, a qual trabalha quarenta horas

semanais, atendendo a todas as crianças pequenas do CMEI. Sua formação é em

Magistério e, está cursando o curso superior de Pedagogia. Sua trajetória profissional

é de dois anos.

Outro projeto realizado pelos professores da rede é o projeto Valorizando

Trajetórias. Esse projeto foi desenvolvido por toda Rede Municipal de Ensino. Ele

consiste na apresentação de todos os projetos pedagógicos desenvolvidos no

decorrer do ano letivo. O professor que atua na bebeteca também participa desse

projeto. No ano de 2016, o projeto completou 10 anos.

No próximo capítulo, discutimos por que ler para as crianças pequenas. O

referencial teórico está pautado em Eco (2003), Reyes (2010), Petit (2013b) e Barthes

(2013). Trazemos, também, extratos das entrevistas, referentes ao posicionamento

das professoras que atuam nas bebetecas analisadas com relação à: “Para que serve

este bem imaterial que é a literatura?” (ECO, 2003, p. 10).

50

3 POR QUE LER PARA AS CRIANÇAS PEQUENAS?

Alice estivera olhando por cima do ombro dela com certa curiosidade. “Que relógio engraçado!” observou.

“Marca o dia do mês, e não marca a hora!” “Por que deveria?” resmungou o Chapeleiro.

“Por acaso o seu relógio marca o ano? Lewis Carroll (2009, p. 87).

O conto de Alice encanta-nos pela ficcionalidade nele

entranhada, com seus personagens insólitos, como o

Chapeleiro, mas, principalmente, pelos cruzamentos

hipertextuais que poderão ser percebidos pelas conforme

elas vão se ambientando com o texto literário. Essa

percepção das crianças pequenas amplia-se à medida que

ela mantém uma relação fruitiva com o livro, e este passa a

ser percebido não só como um brinquedo, mas também como

um objeto estético, para sua apreciação. Isso já responde à

pergunta: Para que ler para os pequenos? No entanto, essa

resposta não basta. Vamos, assim, buscar outras respostas

a esse questionamento.

Então, por que ler para a criança pequena? Essa foi

uma das perguntas direcionadas à pesquisadora em uma

visita informal à Biblioteca Pública Municipal de Itapema, por

um profissional que atua nesse ambiente de leitura. Muitas

respostas vieram à tona – trazemos, aqui, uma delas: “Ler

para que as crianças sejam mais felizes, mais humanas!”.

Essa resposta traz à baila a concepção de que, por meio da

literatura, pode-se promover momentos de prazer, de alegria,

de experiências “gratia sui”. Eco (2003, p. 9) define uma das

funções da literatura como “gratia sui”, colocando a leitura na

esfera do deleite, um texto fruitivo que, além de informar,

sensibiliza e possibilita momentos estéticos.

Para começar a discutir sobre as concepções,

trazemos o questionamento de Eco (2003): “Para que serve

este bem imaterial que é a literatura?”. Endereçamos esse

MELNICK, 5 anos.

MELNICK, 5 anos.

51

questionamento as duas professoras que trabalham nas bebetecas selecionadas para

coleta de dados.

Para a professora do CEI Darlan Dotto Wiersinski:

A professora do CMEI Padre Lívio Donati afirma:

As professoras defendem as obras literárias como forma de comunicação, de

imaginação, de interpretação livre e de possibilidade de viajarmos nas histórias. Além

disso, uma delas propôs que a literatura permite momentos de devaneio. As

considerações das professoras permitem refletir um pouco mais sobre o por que ler

para as crianças pequenas.

Eco (2003), como apontado anteriormente, define que uma das funções da

literatura é ser “gratia sui”. Contudo, a literatura ao adentrar os ambientes escolares,

ao ser vivenciada pelo público mirim, ao ser contada, pode ser estabelecida uma

postura que diferencie de uma leitura de um texto funcional (que só tem o objetivo de

informar). Ambas as professoras das bebetecas do CEI Darlan Dotto Wiersinski e do

CMEI Padre Lívio Donati, em suas reflexões, enfatizaram as funções da literatura -

elas destacaram a literatura para informar, ampliar vocabulário e ser instrumento para

comunicação. Entendemos que a literatura vai muito além de informar; ela sensibiliza,

ela toca o leitor. Entretanto, para que o texto se diferencie de um texto informativo, ele

precisa de um ritmo ao ser lido. Nesse sentido, o mediador de leitura, quando lê um

texto literário para a criança pequena, precisa utilizar um ritmo ao narrar, tentando

expor o encantamento do texto. Reyes (2013, p. 24) destaca que “[...] ler um manual

de instruções para instalar um forno, não é o mesmo que ler um poema”. Segundo a

“A literatura é alimento que energiza a alma com prazer, envolve a imaginação fazendo-a percorrer viagens únicas onde o mesmo enredo apreciado por pessoas diferentes leva cada uma delas a criar suas cenas particulares baseadas em referências já experienciadas. A literatura são

devaneios registrados e compartilhados que levam leitores e apreciadores a submergirem nas mais surpreendentes histórias e assim de lucro, além do prazer envolvente, leitores e escritores

ampliam seus vocabulários, aguçam seus gostos, desenvolvem a criatividade, elevam seus intelectos, ampliam suas capacidades comunicativas entre outros benefícios.”

“As obras literárias nos convidam à liberdade de interpretação, pois podemos viajar nas

histórias, em seu tempo ou em outros, sem mesmo termos saídos do seu lugar. A literatura é um instrumento de comunicação e de interação social, ela conduz o leitor a mundos

imaginários.”

52

autora, se a escola não conseguir ter a delicadeza de ler um poema, todos os textos

serão tidos com a “mesma postura”, serão vistos com o mesmo olhar, e a criança

pequena não conseguirá sentir as ressonâncias que o texto literário tem a oferecer.

As professoras das bebetecas mencionaram a literatura como forma de

possibilitar a liberdade de interpretação. Concordamos com elas pois entendemos que

a obra literária leva muito mais além do que perguntas sobre o enredo do texto, “[...] a

literatura trabalha com toda a experiência vital” (REYES, 2013, p. 22), que não pode

ser medida e calculada, ela reflete na subjetividade do sujeito leitor. Trazemos Eco

(2003) que discute sobre o “[...] exercício de fidelidade e de respeito na liberdade de

interpretação”. Para o autor, a leitura é passível de muitas interpretações, permitindo

ao leitor certa autonomia em entrar no contexto da obra, interpretar e refletir sobre ela,

compreender, dando sentido e se permitindo sentir o que talvez nem mesmo o autor

pudesse ter pensado no momento da sua criação. Eco propõe que o texto literário

permite várias interpretações, mas, mesmo existindo esse convite à liberdade de

interpretação, em que para cada geração as leituras das obras literárias são lidas de

modo diversificado, é necessário estar movido pelo profundo respeito à obra. Eco

(2003, p. 13) chama esse respeito de “intenção do texto”. No texto literário, há marcas

que indicam o que não podemos colocar em dúvida e adotar como interpretação livre.

Isso nos faz refletir sobre a mediação do literário realizada na Educação Infantil.

Em se tratando da criança pequena, ao ouvirem as histórias, podem ser

mobilizadas pelo mediador na intenção de tentar decifrar e entender o texto contado,

por meio das conversas, desafiando os pequenos a expor seus sentimentos, sejam

em suas falas (balbucios), em seus gestos, em seus olhares; enfim, podem despertar

a sua imaginação. Desse modo, a criança pequena experimenta nas histórias a

fantasia, por meio da troca de papéis - ora a criança pequena pode imitar um rei, um

dragão, um lobo, um pássaro, uma princesa, saindo da realidade vivida. Sobre esse

envolvimento, Petit (2013b, p. 179) destaca ser importante, pois “[...] o imaginário não

é algo com que se nasce. É algo que se elabora se desenvolve, se enriquece, se

trabalha ao longo dos encontros”. São nesses encontros, com a arte literária, que a

criança pequena envolve seu corpo, brinca, sente e dialoga expressando o que sente.

As experiências literárias ajudam a ampliar essa dinâmica, ler e ouvir as histórias e

brincar com a imaginação. “[...] ler não nos separa do mundo. Somos introduzidos nele

de uma maneira diferente” (PETIT, 2013a, p. 55), o que permite que a criança pequena

53

aprenda a olhar a realidade, agregando-lhe novos sentidos a fim de conhecer um

pouco mais de si. Com o passar do tempo, com as experiências vivenciadas com um

mediador de leitura, elas passam a entender e a perceber o mundo.

Para defender essa aproximação dos livros já com a criança pequena,

trazemos Reyes (2010). Para a autora, os primeiros livros são aqueles sem páginas,

aqueles que “[...] escrevem na pele, no ritmo do jogo, nos olhares, na voz [...]”

(REYES, 2010, p. 41). Quando o adulto escolhe uma história para ser lida, ele

incentiva a criança pequena ao prazer de ouvir e torna familiar esse momento de

afetividade entre criança pequena e adulto. Reyes (2012) intitula esse momento de

“triângulo amoroso”17 (adulto, criança e livro). Nesse sentido, refletimos sobre esse

momento de leitura, por tratar-se de crianças pequenas, pois elas possuem algumas

particularidades que precisam ser respeitadas, dentre elas está a dependência dos

cuidados de alguém, que oportuniza a segurança e o aconchego.

No momento da leitura, isso não ocorre de forma diferente, pois, se o pequeno

se sentir inseguro, se ele “[...] não se sente acolhido em uma leitura ou em uma

contação de histórias, pode sentir-se incomodado com esse momento e começar a

chorar; então, o que era para ser um momento de interação, torna-se um incômodo

para o bebê” (REIS, 2014, p. 34). Para que isso não aconteça, o contador de histórias,

além de planejar a escolha do título do livro que irá contar, precisa estar atento às

crianças pequenas durante o processo da história narrada, dando ênfase à presença

amorosa, ao aconchego no ato de contar a história e ao interagir com os pequenos.

Neitzel e Carvalho (2016, p. 152) afirmam que o contador de histórias é aquele que

“[...] pode mobilizar o leitor a entrar no universo literário”. As autoras evidenciam a

possibilidade de enredar o leitor. Em se tratando de crianças pequenas, concordamos

com as pesquisadoras, pois são nas vivências de leitura que o contador de histórias

se utiliza da presença do livro em conjunto à oralidade, ao ritmo das palavras, da

musicalidade, dentre outros elementos para envolver a criança pequena, seduzindo-

as, afetando-as no sentido de desejarem estar com os livros.

Entendemos que o livro literário precisa circular nas mãos da criança pequena

desde os primeiros anos de vida, pois o livro é percebido como um brinquedo, que a

criança pequena manuseia, gira, folheia, observa as cores e as imagens, empilha uns

17 No link a seguir, há uma entrevista com a autora Yolanda Reyes. Nela a autora fala sobre o Triângulo amoroso na primeira infância: <http://www.revistaemilia.com.br/mostra.php?id=237>. Acesso em: 30 fev. 2017.

54

sobre os outros, formando torres. Ela deita sobre eles, mostra as imagens apontando-

as, esconde os livros e os mostra. Enfim, são inúmeras as possibilidades de brincar

que nos apontam que o livro é um objeto que pode ser manuseado pelos pequenos.

O livro é um objeto a ser apreciado, mas também tocado, uma aproximação que é

possível. Essa aproximação depende da mediação do adulto quando possibilita o

encontro da criança pequena com o livro. Assim, mais uma triangulação de Reyes

(2012) é apontada.

Muitas são as obras literárias existentes no mercado, e um tipo de obra que

está ganhando espaço e abarca o público infantil de 0 a 3 anos são os livros chamados

“livros-brinquedos”. Estes se diferenciam dos tradicionais devido ao seu formato, à

sua textura e à sua sonoridade. Para Silva e Chevbotar (2016, p. 71), esses livros, ao

ultrapassarem as barreiras da leitura, “[...] convidam à experimentação, à vivência

sensória e emocional, exatamente como os bebês e crianças pequenas necessitam

em seus primeiros anos de vida”. São livros que vão além da leitura, eles permitem

que as crianças pequenas experimentem outra sensação pelo toque, justamente pelo

tipo de material que possibilita a criança morder, molhar, encaixar (quando são

compostos por peças), dobrar, ouvir os sons - são inúmeras as formas possíveis de

aproximar e envolver o pequeno no brincar.

Entretanto, é importante salientar que esses livros-brinquedos não substituem

os livros tradicionais e os momentos ricos de contação de histórias narradas em voz

alta por um adulto, mas se completam ao serem ofertados ao público mirim.

Defendemos que o livro esteja nas mãos das crianças pequenas como um brinquedo;

que ele não seja percebido como algo sagrado, que não pode ser tocado. Um livro-

brinquedo não é um livro mais fácil ou com menor conteúdo. Ele é um conceito que

utilizamos para lembrar a importância de a criança pequena brincar com o livro para

manter uma relação estética com ele desde pequena. O livro como um brinquedo,

conforme abordamos, é um conceito não um objeto. Como conceito, ele sinaliza que

qualquer livro pode estar nas mãos das crianças, assim como o brinquedo está para

a experiência.

Petit (2013b, p. 140) reflete sobre a “[...] importância da familiaridade precoce

com os livros, de sua presença física na casa, de sua manipulação”. É fundamental o

movimento de folheá-lo, antes de ter o livro como um objeto de leitura, para que as

crianças se tornem, mais tarde, leitoras. Nessa intimidade com o livro, no contato

55

precoce com o objeto estético, nos encontros com a cultura literária é que se vai

construindo uma relação fruitiva, estética e sensível entre o livro e a criança pequena.

A mediação do adulto nas leituras narradas e nas conversas tecidas possibilita nutri-

la emocional e cognitivamente, inserindo-a nas experiências de leitura. À medida que

essa familiaridade com os livros acontece, ela percebe que junto aos livros está a

presença de um adulto, que é possível envolvê-lo nas folhas dos livros, no ato de

contar histórias, vozes que são repetidas infinitas vezes que tocam e envolvem a

criança pequena. Uma relação de afeto vai sendo tecida e surge, então, o “conte mais

uma vez”.

Entendemos que as histórias narradas quando articuladas com a presença do

livro contribui para a formação do leitor, visto que, nas histórias oralmente contadas,

em que há ausência do livro, a criança pequena não experimenta o movimento do ler,

mas sim apenas o ouvir. Neitzel e Carvalho (2010, p. 175) afirmam que um dos

princípios da leitura do literário é que o livro esteja sempre à mão, mesmo que o texto

tenha sido memorizado, para que, assim, o leitor visualize a origem da fonte, para que

ele observe o livro. Com a criança pequena essa prática não se diferencia, visto a

importância de os pequenos já estarem envolvidos com os contos narrados com a

presença física do livro, para que possam entender que as histórias estão organizadas

em um espaço, ou seja, neste caso nas páginas do livro.

O adulto tem a virtuosa capacidade de convidar a criança pequena para esse

encontro com a literatura, não com a intenção de destacar do texto as principais ideias,

mas para oportunizar o acesso a uma linguagem artística. São esses momentos que

possuem função estética. Essas experiências, se bem conduzidas esteticamente,

possibilitam a educação do sensível. Duarte Jr. (2010) discute que isso necessita ser

iniciado com os pequenos, incentivando as maneiras de sentir e conhecer o mundo,

naturezas distintas, mas que se complementam e são essenciais.

Para Duarte Jr. (2010), o sensível diz respeito a como sentimos o mundo, e o

conhecer diz respeito ao conhecimento inteligível, que é a forma pela qual pensamos

o mundo. É importante evidenciar que esses saberes andam juntos e, quando

vivenciados desde criança, possivelmente repercutirão em um adulto mais sensível,

perante os sentimentos e as percepções da realidade vivida. São nas experiências

que são possibilitadas à criança pequena, com o contato com um vasto acervo literário

que, possivelmente, se pode despertar o encantamento pela leitura. Esse acesso cabe

56

ao mediador de leitura. Para tanto, Reyes (2013) reflete sobre o papel do mediador, o

que ela denomina de “tarefa”, propondo que

[...] o objetivo fundamental de um professor é o de acompanhar seus alunos nesta tarefa, criando, ao mesmo tempo, um clima de introspecção e condições de diálogo, para que, em torno de cada texto, possam ser tecidas as vozes, as experiências e as particularidades de cada criança de cada jovem de carne e osso, com seu nome e sua história. (REYES, 2013, p. 28).

Esse envolvimento com a leitura dependerá da forma com a qual ela é ofertada

à criança pequena pelo mediador. Essa oferta depende da concepção que temos do

texto literário. Esses encontros com o livro são com vistas a conceber a literatura como

arte, explorar sua função estética implica em oferecê-la para deleite, fruição, sem

compromisso com estratégias que visem a exploração do texto, ou seja, como

pretexto para ensino de determinados conteúdos. O manuseio dos livros e a contação

de histórias são, por si só, atividades, conteúdos que ensinam pelo viés artístico, que

possibilitam aos pequenos momentos de puro deleite em que a sensibilidade e o

inteligível não estejam separados da aprendizagem. Daí também se dá a importância

de eleger obras de qualidade literária. Nessa dinâmica, os encontros para leituras,

com obras de qualidade, oportunizam a criança pequena sentir a leitura, afetá-la pelas

obras e mobilizá-la a perceber que o ato de ler faz parte de sua vida. Mello (2016, p.

45) afirma que “[...] o amor aos livros, a necessidade da leitura são produtos da

experiência vivida, ou seja, são apreendidos e formados socialmente”.

Carvalho e Neitzel (2008) discutem essa mesma relação da literatura pelo viés

da experiência estética, pelo contato com a obra de forma fruitiva. As autoras afirmam

que “[...] não podemos pensar em uma literatura focada somente no aprender, a

literatura ensina pela via da fruição; o aprender se dá através da experiência e na

literatura não se dá de forma diferente” (CARVALHO; NEITZEL, 2008, p. 769). A arte

requer apreciação e sensibilização estética. Nesse sentido, quando um adulto faz a

leitura de um conto a criança pequena, ao mediar, ao provocar o desejo e a

curiosidade de conhecer, ele oferece possibilidades de entradas no texto e circular

por diferentes lugares e contextos ao mesmo tempo. O texto literário possibilita a

criança pequena aprender no devaneio, permitindo a ele deixar levar pela imaginação.

Barthes (2013) conceitua fruição diferentemente do prazer. Para ele, a fruição

é um texto “[...] que põe em estado de perda, aquele que desconforta (talvez até um

certo enfado), faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor”

57

(BARTHES, 2013, p. 20). Um texto que desafia o leitor, que questiona, faz o leitor

pensar e sair de sua zona de conforto, impulsionando-o a novas leituras, permitindo

abrir novos horizontes e conhecer saberes diversos. Weiss (2016) questiona: “Como

a fruição pode acontecer?”. A autora evidencia o papel do mediador nas escolhas da

obra a ser trabalhada nos momentos de leitura literária, enfatizando que essa escolha

é decisiva para o processo da fruição. Entendemos que a escolha por obras para

serem lidas para a criança pequena certamente é fundamental para potencializar a

fruição, visto que os textos precisam ser textos provocativos que estimulem a atenção,

a curiosidade e a participação da criança pequena. Aqui mais um triângulo amoroso

de Reyes (2012) é sinalizado: a criança, o livro e o adulto.

Barthes (2013) evidencia o texto de prazer como aquele que o leitor lê de forma

confortável, tudo está impresso nas linhas escritas, não permitindo novas aberturas

ao leitor, pois tudo está ali, do início ao fim da história, ou seja, o texto é legível, com

início, meio e fim, estruturados de forma linear, com poucas ou nenhuma abertura

para leituras intertextuais, por exemplo. Barthes (2013, p. 20) afirma que esse texto

“[...] contenta, enche, dá euforia”. Por tratar-se de criança pequena, não defendemos

somente esses textos, mas sim todos os tipos de textos, que sejam oportunizados aos

pequenos. Contudo, entendemos que, da gama diversa de textos que permeiam o

cotidiano da Educação Infantil, a literatura que apresenta o texto fruitivo pode ter

espaço, ser ofertada como leitura que ultrapasse os momentos de puro prazer, que

leve a criança pequena à reflexão sobre si e o outro.

Nossas crianças pequenas estão imersas em um cotidiano embrutecido, em

uma cultura em que o tempo e o ritmo de vida são direcionados pela pressa. São

poucas as oportunidades em encontrar um espaço e um momento de refúgio de pausa

para si. Nesse sentido, defendemos esses momentos que podem significar uma pausa

no ritmo frenético de vida e das instituições. Não entendemos esse momento de pausa

como passividade, somente de escuta, mas de ação de interação com a obra, com o

leitor ...enfim, parada para reflexão, conexão, buscas de sentidos. Os encontros com

textos literários, além de informar, movimentam todo o corpo, as formas de ser, de

sentir, de fazer...com o que a vida oferece, com o que temos de potencial .... afeta o

interior do leitor, o que permite ao leitor de conectar-se consigo mesmo. “[...] a

literatura deve ser lida - vale dizer: sentida” (REYES, 2013, p. 26).

58

Pensando nesse ritmo de vida que nossas crianças pequenas estão imersas,

Pennac (2008, p. 130) discute que a leitura nos torna um pouco mais “humanos”, pois

ela pode levar a preocuparmo-nos com nossos pares e ser um pouco menos

embrutecidos. Essa leitura que tende a emancipar parte do princípio da potência que

todos temos, especialmente nessa relação educacional na qual estamos inseridos.

Larrosa (2016) aponta as discussões do “Mestre ignorante” (RANCIÈRE, 2013) como

importante ponto de reflexão acerca das relações educacionais que embrutecem ou

que emancipam os sujeitos por meio do diálogo e da igualdade da inteligência, ou

seja, “[...] a partir da potência comum de ver, de sentir, de falar e de pensar”

(LARROSA, 2016, p.160) dos sujeitos envolvidos.

Petit (2012, p. 93) afirma que, em situação de crise, a literatura tem um papel

privilegiado, um modo decisivo, pois ela permite “[...] dar forma aos lugares onde viver,

a se lançar e a abrir caminho”. Pennac (2008) e Petit (2012) afirmam que a literatura

possibilita ao leitor tornar-se ainda mais sensível; ela toca o leitor em seu íntimo,

possibilitando-o estar mais atento aos sujeitos iguais ou opostos, que vivenciam

conosco o elo da humanidade. Para Reyes (2004):

De ahí que la experiencia del texto literario y el encuentro con esos libros reveladores que no se leen sólo con los ojos o con la razón, sino con el corazón y el deseo, sean hoy más necesarios que nunca como alternativas para ir construyendo esas casas o palacios interiores.18 (REYS, 2004, s/p).

Nesse viés, por meio da literatura, além de ser apreciada e sentida, pelas suas

ressonâncias, podemos aprender a compreender o que está em nossa volta, a olhar

para si e para o outro com mais sensibilidade, percebermo-nos como parte de um

grupo, sermos mais sensíveis e humanos.

Retornando à pergunta inicial - Por que ler para as crianças pequenas? -, dentre

tantas finalidades e possibilidades que o texto literário abriga em suas linhas, a

literatura permite a criança pequena estabelecer relações fruitivas, estésicas com o

livro. Além disso, o que não observamos nas reflexões das professoras das bebetecas

e que consideramos ser muito importante é que a literatura permite uma conexão

emocional com o adulto, de troca, de colo, de afeto, de olhar, de voz; que pode

potencializar a sensibilidade para com a vida - itens valorosos da literatura. Enfim,

18 “Daí a experiência do texto literário e o encontro com esses livros reveladores que não são lidos somente com os olhos ou com a razão, mas com o coração e o desejo, são hoje mais necessários do que nunca como alternativas a fim de construir essas casas ou palácios interiores” (REYS, 2004, s/p, tradução nossa).

59

refletir sobre a formação do leitor mirim é defender encontros estéticos da criança

pequena com o objeto livro - encontros que exploramos no capítulo a seguir.

60

4 ENCONTROS NA BEBETECA: CEI DARLAN DOTTO WIERSINSKI

“ Oh, Alice sua tola!”, respondeu a si mesma.

“como vai poder estudar as lições aqui? “Ora, mal há lugar para você,

que dirá para os livros!” Lewis Carroll (2009, p. 46).

Ao conhecermos o espaço educativo, a primeira

pergunta que nos veio foi: Como este lugar tão pequeno

conseguiu organizar uma bebeteca? O desafio, as

conversas, as trocas entre os envolvidos certamente foram

muitas. O CEI Darlan Dotto Wiersinski, sem sombra de

dúvida, é um caso a ser analisado, pela maneira com a qual

organizou a sua estrutura de forma adaptada. O conto de

Alice faz-nos refletir sobre as possibilidades de um espaço

onde “[...] mal há lugar para você, que dirá para os livros!”

(CARROLL, 2009, p. 46). Assim, iniciamos nossa conversa,

questionando como esse espaço de leitura adaptado

desenvolve seus encontros literários.

Inseridas no mesmo ambiente do refeitório, já, de

início, perguntamo-nos: É possível promover encontros com

os livros no mesmo espaço no qual outras funções ocorrem?

Será que o livro nesse espaço ganha destaque? Será que a

crianças pequenas se interessam pelas obras? É o que

discutimos a seguir.

4.1 O ESPAÇO

“[...] poderiam me dizer”, perguntou Alice, um pouco tímida, “por que estão pintando essas rosas?

Lewis Carroll (2009, p. 93).

Como Alice, fazemos muitas perguntas tentando

desvendar os mistérios do conto de Lewis Carroll. Nesta

pesquisa, esse movimento de inquietações surge como um

MELNICK, 5 anos. MELNICK, 5 anos.

61

desafio a ser superado a cada nova etapa. Ao conhecermos o novo, muitas perguntas

vêm à tona. Assim, ao pensarmos sobre a organização do ambiente de leitura, fomos

em busca de referências na intenção de desvendar sobre como esse espaço interfere

nas vivências literárias das crianças pequenas.

Reyes (2012), ao falar do ambiente da casa, afirma que “[...] não é só o espaço

físico, embora ele ajude. O principal é a disponibilidade: ser um corpo que canta”

(REYES, 2012, s/p). López (2009, p. 3-4) defende a mesma proposta:

Claro que también es importante la presencia de espacios especialmente diseñados para eso, pero creo que es muy valioso también aprovechar los contextos cotidianos de los bebés y niños pequeños, convirtiéndolos en sitios de encuentro con los libros. 19 (LÓPEZ, 2009, p. 3-4).

As autoras concordam sobre a importância do espaço da bebeteca, mas

evidenciam que eles não são primordiais para os encontros cotidianos com o livro.

Perrotti (2015, p. 136) compartilha da mesma ideia, defendendo que o espaço de

leitura pode ser “[...] um canto ou uma pequena sala de leitura, seja uma biblioteca

ampla, com diferentes e variados ambientes e recursos, há que se considerar,

sempre, a qualidade estética do lugar”. Sinalizamos que o espaço da bebeteca pode

configurar-se em uma sala (apenas para finalidade bebeteca), um canto com livros ou

um cesto com livros. Contudo, evidenciamos que, além do espaço físico, é importante

ser um espaço que tire os livros do armário, um ambiente de aprendizagem que

acolha, que os objetos estejam dispostos no intuito de levar a criança pequena à

autonomia, tanto ao pegar o livro (segurar em sua mão), quanto na escolha dos livros

(fazendo a sua própria seleção). Que seja um ambiente planejado, onde a criança

pequena possa construir seus significados pela experiência vivida com os livros. É

fundamental, portanto, que a bebeteca tenha um projeto que oriente as ações do

mediador, tanto na organização do ambiente quanto nas mediações, as quais

possibilitem, nas mais diversas formas, a criança pequena experimentar os livros.

No espaço da bebeteca do CEI Darlan Dotto Wiersinski, a professora organiza,

em seus encontros, momentos que são produtivos e geradores de grandes

experiências. Por meio destas, é possível aferir a minimização da perda de um espaço

apropriado, pois há certa fragilidade, com relação, por exemplo, às interferências

19 “Claro que também é importante a presença de espaços especialmente concebidos para isso, mas acredito que é muito valioso, também, aproveitar os contextos cotidianos dos bebês e das crianças pequenas, convertê-los em locais de encontro com os livros” (LÓPEZ, 2009, p. 3-4, tradução nossa).

62

acústicas (ruídos). Schafer (1991) fez um estudo referente aos sons agradáveis e

desagradáveis. Para o autor, o “[...] ruído é o som indesejável” (SCHAFER, 1991, p.

68), pois este interfere no que estamos ouvindo, ou seja, no que queremos ouvir.

Salientamos que, como as mediações que a professora opera são muito interativas e

adequadas, apesar dos ruídos presentes no ambiente, o contato com o livro dá-se e

a relação que a criança pequena estabelece com o livro é fruitiva e educa

esteticamente.

O CEI apresenta, na bebeteca, um pequeno espaço que abarca tantas outras

funções que envolvem as rotinas vivenciadas na creche, como o lanche. Nesse

espaço, muitas são as oportunidades possibilitadas às crianças pequenas para terem

encontros estéticos com o livro literário. Nessas vivências, são envolvidos: a criança

pequena, o docente e a família.

Ao organizar uma bebeteca, é indispensável discutir sobre o seu projeto, visto

ser este um planejamento que precisa ser pensado, sendo o espaço um dos

elementos que aparecem no projeto analisado. Nessa perspectiva, entendemos que

esse espaço não visa ser apenas aquele para guarda de livros, mas sim para

encontros da criança pequena com o livro. Alguns detalhes, portanto, são pensados

no intuito de compor um ambiente aconchegante e atrativo, com a intenção de ser um

ambiente que oportunize experiências contemplativas, apreciativas e fruitivas. No

projeto da bebeteca, destacamos um dos seus objetivos no que diz respeito a esse

espaço de leitura:

Tão importante quanto garantir que as crianças tenham acesso a bons livros desde bem pequenas, é organizar ambientes convidativos,

aconchegantes e singulares para que elas possam usufruir das histórias em situações prazerosas de interação com os colegas, professores e famílias. A iniciativa de construir uma biblioteca itinerante bem como um espaço para as

crianças fazerem leituras bem como a retirada pelo pais destes livros para levarem para casa, constitui-se uma excelente oportunidade para fomentar o

contato das crianças com os livros, criar lugares mágicos, cheios de identidade, e realizar rodas de leituras.

Projeto do CEI Darlan Dotto Wiersinski- Bebê também lê (2015, p. 1).

63

Um espaço convidativo, em que as crianças pequenas estejam envolvidas com

os livros, os colegas, os professores e os familiares, é o pilar principal que poderia

destacar do objetivo dessa bebeteca. As escolhas foram pensadas no intuito de

melhor oportunizar o contato com as obras, atendendo às necessidades das crianças

pequenas que requerem cuidados e atenção.

São muitos os questionamentos que surgem quando se pensa em um espaço

adequado para a criança pequena, que vão desde os móveis, à iluminação, à acústica,

à temperatura e às cores. Todos eles são subsídios que complementam o espaço em

conjunto à disposição dos objetos, com a finalidade de, nesse espaço de leitura,

acontecerem encontros estéticos, pois é nesse espaço organizado pelo curador que

se propõe potencializar o encontro da criança pequena com o livro.

O espaço adaptado, dentro do refeitório, que configura a bebeteca, possui

cento e vinte livros expostos na parede em caixas (Imagem 3). A exposição desses

livros dá-se em um encostado no outro, com as capas escondidas, aparecendo

apenas a lombada do livro. O ideal seria que os livros estivessem com as capas

voltadas para a criança pequena, assim elas poderiam famililiarizar-se com os livros

e poderiam melhor fazer suas opções.

Imagem 3 – Livros expostos na bebetecas

Fonte: Acervo da autora.

Essas caixas estão fixadas na parede, algumas estão no mesmo nível de visão

das crianças, porém há algumas que não. Há, também, um carrinho (biblioteca

64

intinerante), com rodas para transportar os livros pelas salas ou por outro espaço

(Imagem 4). É um espaço esteticamente organizado, simples, mas convidativo à

exploração das crianças.

Imagem 4 - Biblioteca intinerante

Fonte: Acervo da autora.

Há uma curadoria educativa que evidencia a possibilidade de levar às crianças

a autonomia e a experimentação. Martins (2012b) afirma que os professores também

podem ser curadores quando “[...] ativam culturalmente as obras” (MARTINS, 2012b,

p. 63) . A autora pontua o papel de curadoria exercido pelos professores. Martins aqui

se refere à curadoria de uma exposição, mas a lógica do argumento pode ser também

usada para a organização dos espaços. Um espaço que não venha apenas receber

as crianças pequenas, mas ser um ambiente de aprendizagem que venha nutrir

esteticamente os envolvidos. Essa postura de quem organiza o espaço tende a ser

vista como um espaço para guarda de livros, mas não somente isso, ser também um

espaço de encontros, de diálogos, de movimentos, de afetamentos e de trocas.

No projeto Bebê também lê, dois objetivos iniciais foram propostos para a

organização desse ambiente de leitura, no qual todos os docentes do CEI, o PIBID e

algumas famílias organizaram a bebeteca. Compreendemos que muitos são os

benefícios de ter-se um espaço apropriado, visto que ele permite o convite às crianças

a se envolverem no ambiente e a possibilidade de as crianças aprenderem ainda mais.

Apesar de ser um espaço pequeno, podemos inferir o interesse dos envolvidos na

65

organização, na disponibilização dos objetos, no intuito de possibilitar a aproximação

da criança com os livros e para que esse espaço não seja apenas um ambiente

organizado para expor os livros.

As ações propostas no projeto que foram desenvolvidas pelos docentes e pelas

famílias do CEI são:

O projeto Bebê também lê (ITAJAÍ, 2015) traçou algumas ações para envolver

a família, uma delas foi a confecção de um tapete pelos pais e pelas crianças para ser

usado em contação de histórias. Na escola, cada família recebeu um pedaço de tecido

para desenhar junto ao seu filho. Essa ação que envolve trazer os pais para o

ambiente escolar permitiu discutir sobre o espaço de leitura, sobre a importância do

envolvimento dos pais em levar os filhos na bebeteca, sobre escolher um livro para

ser levado para casa e sobre como as famílias também podem aproximar o livro da

criança pequena.

Como expemplo dessa experiência envolvendo a aproximação das famílias nas

ações desenvolvidas no CEI Darlan Dotto Wiersinski, trazemos o trabalho de pesquisa

de Reis (2014) intitulado: Literatura para os pequenos: experiências de San Miniato.

A autora relata que a rede de San Miniato (Itália) propõe que “[...] projetos envolvendo

a leitura de textos literários terão um êxito ainda mais satisfatório se as famílias forem

envolvidas, porque é evidente que não basta apenas o contato físico com o livro”

(REIS, 2014, p. 47). Essas ações possibilitam tanto ao CEI quanto à família

compartilhar informações sobre as experiências com o livro vividas pela criança, bem

como aproximam as famílias do ambiente educativo. Para tanto, San Miniato

O grupo da escola organizará um lugar onde os livros ficarão expostos e acessíveis às crianças. Faremos um carrinho utilizando caixotes de madeiras com rodinhas, uma vez que poderão ser transportados de um lugar para outro. Projeto do CEI Darlan Dotto Wiersinsk - Bebê também lê (ITAJAÍ, 2015, p. 1).

Construiremos um tapete com as crianças. O objetivo principal é fazer com que o tapete tenha "a identidade" delas, uma vez que servirá como um indicador dos momentos de leitura, iniciando assim um ritual próprio da turma. Projeto do CEI Darlan Dotto Wiersinsk Bebê também lê (ITAJAÍ, 2015, p. 1).

66

desenvolve ações de empréstimo de livros, mas evidencia a importância de um

trabalho com a família para que esta “[...] reconheça o real significado desta ação”

(REIS, 2014, p. 47).

Compreendemos que transmitir o conhecimento às famílias sobre a mediação

do literário realizada no espaço educativo e a possibilidade de as famílias também

serem mediadoras de leituras são requisitos que potencializam a aproximação da

criança com o livro. Nesse sentido, Casanova e Ferreira (2015) afirmam ser

[...] imprescindível registrar a responsabilidade da creche em revelar às famílias suas ações fundamentadas em conhecimentos. Tanto professores quanto familiares podem e precisam conhecer o porquê, como e para que as atividades existem dentro da creche e qual é o seu verdadeiro papel. (CASANOVA; FERREIRA, 2015, p. 89).

Constatamos que o CEI Darlan Dotto Wiersinski desenvolveu ações que

fortalecem a aproximação e a interação das famílias na bebeteca (Imagem 5).

Imagem 5 - Encontro de pais no CEI Darlan Dotto Wiersinsck

Fonte: Acervo do CEI Darlan Dotto Wiersinski.

67

No primeiro encontro entre pais, docentes e PIBID, foi possível revelar às

famílias o espaço que estava sendo organizado e quais seriam as ações realizadas

na bebeteca. A pintura do tapete e a discussão sobre a bebeteca evidenciam-nos que

essas ações permitem às famílias conhecerem o motivo pelo qual o espaço está

sendo organizado e sua finalidade. Em se tratando da finalidade desse espaço,

Kupiec, Neitzel e Carvalho (2016, p. 25) propõem que a “[...] experiência vivida dá-se

no trânsito dos espaços e as relações pessoais são marcadas por essa

transitoriedade”. As autoras comentam sobre a possibilidade de possibilitar ao sujeito

espaços que estimulem o contato com a arte, no intuito de estabelecer relações entre

os sujeitos e o mundo em seu etorno. Concordamos com as autoras, visto que o

movimento de encontro com o livro de literatura, no espaço da bebeteca desenvolvido

no CEI, estimula o contato com a arte e permite que as crianças pequenas e seus

familiares sejam tocados pela experiência vivida, desde que essa experiência

possibilite o deslocamento, seja entre os espaços, entre as artes, entre as pessoas

envolvidas nesse movimento. Enfim, as relações estabelecidas no espaço da

bebeteca, nas ações de mediação do literário, que, aqui, também chamamos de

encontro, tendem a provocar um movimento efêmero que corrobora com a

compreensão de si e do outro.

4.2 O ACERVO “[...] um gato pode olhar para um rei”, disse Alice.

“Li isso em algum livro, mas não me lembro qual.”

Lewis Carroll (2009, p. 101).

O livro no conto de Lewis Carroll é apresentado pela personagem Alice como

fonte de outras histórias. “Um gato pode olhar para um rei” - revela o livro como

poderosa ferramenta de interlocução com outras obras. A ideia de um livro dentro de

outro livro mostra-se aqui, pois As aventuras de Alice no país das maravilhas

apresenta características de uma literatura hipertextual, segundo o conceito

apresentado por Martins e Neitzel (2016). Essa declaração de Alice coloca o livro em

relevo e, assim, acontece no espaço da bebeteca - o livro ocupa espaço prioritário,

sendo ele um objeto que ganha força pela própria mediação, por ser um objeto

propositor. Para Martins (2012a, p. 26), “[...] a obra, assim, é sua própria mediadora”.

Nesse sentido, o livro sendo um objeto propositor, estando nas mãos das crianças

68

pequenas, propõe a mediação, isto é, ele próprio medeia. Borba (2016, p. 48) afirma

que, para o objeto propositor: “Não há necessariamente a necessidade da presença

física de um sujeito mediador, pois a relação entre obra e fruidor se constrói pelo

afetamento que ocorre entre um e outro, e este com ou sem a presença do mediador”.

Em se tratando de crianças pequenas, a presença física do mediador no espaço é

fundamental, uma vez que são pequenos e precisam de cuidados e atenção, do olhar

do mediador. Contudo, é importante pontuarmos que a mediação entre criança

pequena e livro pode ocorrer mesmo sem a interferência direta por parte do mediador,

pois, como já afirmamos, o livro próprio medeia.

No CEI Darlan Dotto Wiersinski, constatamos a real possibilidade de mediação

com o manuseio livre dos livros pelas crianças pequenas. Nessa ação, os livros são

manipulados, mordidos e sentidos com os cincos sentidos. São nas experiências com

o livro que a criança pequena irá desenvolver saberes sobre o livro, podendo ele ser

apreciado, tocado, ao invés de ser rasgado. Duarte Jr. (2010, p. 101) afirma que o

toque com “[...] as mãos parecem ser a extensão natural de nossos olhos”, é com o

toque que compreendemos o conhecimento inicial dos nossos olhos. O autor afirma

que “[...] o tato se compraz com a descoberta de formas e texturas, num complemento

da visão, estabelecendo, de certo modo, uma relação ‘amorosa’ com o objeto”

(DUARTE JR., 2010, p. 101, grifo do autor). Para que essa relação aconteça, o acesso

às obras é fundamental para que as crianças pequenas as toquem, brinquem com

elas, as sintam e as experienciem.

O livro, dessa forma, é objeto propositor que faz a própria mediação na roda de

leitura, sendo um momento que a criança pequena está livre para tocar o livro, trocar

os livros com seus pares, imitar o professor e estabelecer uma relação com ele. Tendo

em vista que o livro também medeia, é importante que a bebeteca seja composta por

vários gêneros textuais. A bebeteca do CEI abarca vários gêneros textuais, entre eles:

contos clássicos, mitos, fábulas, contos modernos, parlendas, advinhas, músicas. Os

materiais dos livros caracterizam-se por: livros de pano, plásticos, papel cartonado,

papel mais fino, EVA, entre outras texturas. O aspecto das obras estão com aparência

de bem manuseados, pois muitos apresentam fitas adesivas. As obras são adquiridas

pelos recursos do próprio CEI, principalmente os livros de pano e plástico, mas

69

recebem livros da Secretaria de Educação, do Programa Nacional de Bibliotecas na

Escola (PNBE)20, bem como do Programa do Banco Itaú21 (Eu leio para uma criança).

Muitos dos livros disponíveis na bebeteca são os livros-brinquedo, livros que

possuem características que possibilitam a criança pequena explorá-los das mais

variadas formas, permitindo intimidade entre a criança pequena e o livro. Silva e

Chevbotar (2016, p. 72) afimam que esse tipo de livro convoca “[...] os pequeninos a

momentos de prazer, descoberta e aproximação. São um convite para pulsões, afetos,

sentimentos e prazer sensorial dos pequenos”. No entanto, é importante sinalizarmos

que muitos livros-brinquedo esquecem que sua função se completa por meio da

palavra ou da imagem e que um bom livro, que tem qualidade estética, é aquele que,

além do seu layout atrativo e de material adequado, possui conteúdo que permita

muitas provocações e produções de sentido a partir de sua leitura.

Martins e Neitzel (2016) convidam-nos a ampliar essa discussão sobre a

escolha das obras. Segundo as autoras, o livro é um objeto estético, é arte, e sua

finalidade, que é a apreciação, já define sua característica estética: ele provoca

sensações, os sentidos, e sua função pedagógica (que pode ser o ensino) se realiza

pelo viés estético e artístico, desprovido de finalidade prática. Nessa lógica, um dos

critérios na escolha do livro seria as possibilidades de abertura da obra, de ampliação

de sentidos, mesmo quando o público são crianças pequenas. Uma boa história deve

produzir efeitos mais impactantes na formação das crianças do que uma história

previsível, que subestima a capacidade da criança. Com o tempo e mais idade, as

crianças poderão perceber os hipertextos, entre outras funções possíveis que

permeiam uma obra com características hipertextuais.

Entendemos que a escolha possa partir dos textos que aguçam a curiosidade

e o desejo de ouvir; textos que provoquem as crianças pequenas, que as levem a

experimentar sensações diversas, não só pelo ouvir, mas com o corpo, pois as

crianças pequenas ao experimentar nas ações com os livros entram em contato com

o mundo simbólico, que favorece a apropriação de novos conhecimentos. Nesse

sentido, a escolha dos títulos, a familiarização do mediador com as obras e o

entendimento de que a literatura é arte, e que ela “tem uma potência estética”, como

sinalizam Uriarte, Neitzel e Carvalho (2016, p. 187), são elementos fundamentais para

21 Para conhecer o Programa, acesse: <https://www.itau.com.br/crianca/pratique/>. Acesso em: 10 jan. 2017.

70

quem organiza o espaço, seleciona os livros, bem como para quem atua na mediação

de leitura. Weiss (2016, p. 64) afirma que o “[...] livro pode ser uma porta a mais que

se abre em busca da experiência estética, e das significações de vida. Porém a

escolha deles pode ser atentamente acompanhada, mediada, sendo este o papel do

professor, do bibliotecário, da família”.

Compreender que o livro de literatura é um objeto estético é possibilitar a

entrada das crianças pequenas ao encontro com a obra. Um encontro que pode

possibilitar o envolvimento pela curiosidade, pelo imaginar e fantasiar, descobrir

prazer nas histórias e nos encontros, entre outros sentimentos e sensações possíveis

de uma experiência estética.

4.3 A CRIANÇA PEQUENA E O LIVRO

“Conte-nos uma história!”, disse a Lebre de Março. “Conte por favor!”, implorou Alice.

“E trate de ser rápido”, acrescentou o Chapeleiro”. Lewis Carroll (2009, p. 87).

O conto de Lewis Carroll surge como um convite à contação de uma história.

As personagens evidenciam o desejo por ouvi-la. Assim acontece com as crianças

quando a história é bem contada. Uma história provocativa incentiva a aproximação

com o livro. O encontro literário na bebeteca acontece com frequência - duas vezes

por semana as agentes recebem as crianças nesse espaço quando chegam ao CEI

no início da manhã. Além desses encontros com as agentes, as professoras regentes

fazem as mediações de leituras em outros momentos da rotina. No planejamento da

professora regente, a qual escolhemos para observar as mediações de leitura, consta

ação de leitura a ser desenvolvida no espaço da bebeteca, como uma ação de rotina.

Essa ação pode acontecer com o momento do conto, cuja história pode ser escolhida

pela professora bem como pelas crianças, seguido do momento livre de

experimentação das obras (Imagem 6).

71

Imagem 6 - Mediação do literário

Fonte: Acervo da autora.

Na hora do conto, as crianças são convidadas a ouvirem a história que, por

vezes, é escolhida pela professora como também pelos próprias crianças, que, por

conhecerem alguns títulos, dão suas sugestões. Ao contar a história, a professora

oportuniza momentos de diálogo sobre a história lida, pois, no momento da história, é

permitida a participação das crianças - elas fazem gestos, imitam as personagens,

bem como conversam sobre a história a ser contada. A professora dialoga sobre o

enredo e convida os leitores mirins para manusearem as obras em um processo de

nutrição estética. Picosque e Martins (2012, p. 36) afirmam que a nutrição estética

significa ela ser “[...] ofertada para ser saboreada como um delicioso almoço que

fazemos a alguém”. Para as autoras, o importante é levar os aprendizes a “saber-

perceber” pela experiência do olhar, do ouvir, do tocar. Entretanto, para isso, podemos

mostrar o objeto sem pressa, para que o “[...] corpo possa coletar as impressões e ser

levado a estesia, pelo saber sensível”.

A bebeteca ideal é aquela que permite um ambiente que perpassa as vozes da

leitura. Um espaço em que a criança pequena possa se expressar, interagir e se

72

relacionar com o livro literário, sendo este um movimento que possibilita o desejo pela

aproximação com a obra. Esse espaço de leitura indicou-nos que a mediação

provocada pela professora ao envolver os pequenos na história desafia-os a entrar e

sair da história, abrindo espaço para as falas das crianças. A contação empregada

pela professora oportuniza que ela faça questionamentos dirigidos aos pequenos.

Esse espaço para o diálogo convida as crianças a serem também contadores.

Duarte Jr. (2010, p. 22) discute que é por meio da arte que o ser humano

representa mais de perto o seu encontro primeiro com o mundo. Assim, defendemos

a importância de a criança pequena ter encontros com a arte, em especial com o

objeto livro, desde pequenas, no intuito de possibilitar sentir e perceber o mundo.

Uriarte, Neitzel e Carvalho (2016, p. 191) afirmam que a “[...] educação estética tem

como elemento fundante o sensível a estesia”. Nesse sentido, entendemos que a

estética não está restrita a espaços como os museus, por exemplo. As vivências que

envolvem o ato de um adulto ler, seja uma leitura para si ou uma leitura narrada,

possibilitam a criança observar, sentir e conhecer as funções do livro. É nesse

vivenciar o livro de forma apreciativa que a criança pequena tem experiências

estésicas que são produtoras de sentidos, e a produção do eu é nutrida pela

experiência no mundo vivido (DUARTE JR., 2010).

Durante a contação da história, as crianças escolhem seus lugares, umas

deitadas outras sentadas. Confortavelmente, elas encontram o melhor jeito de

aconchegarem-se no espaço, para assim poderem ouvir. A cada folha sendo contada

muitas falas vão surgindo, os pequenos demonstram gostar de ouvir, bem como têm

afinidade com o enredo da história.

A professora medeia a participação das crianças nas histórias, dando voz aos

pequenos, bem como deixando-os se posicionar perante o texto. São nesses diálogos

que percebemos as intertextualidades presentes nas conexões das histórias

estabelecidas pelas crianças. Durante a contação da história do livro do Urso verde

– pequenos gigantes, as crianças fizeram conexões com a história dos três

porquinhos, apresentando o lobo mal, bem como com outras histórias que permitem

experiências vividas (Imagem 7). Duarte Jr. (2010) constitui como saber sensível a

aprendizagem que ocorre pelo mundo vivido por meio da sensibilidade e da

percepção.

73

Imagem 7 - Experiências com o livro

Fonte: Acervo da autora.

Uma história quando bem contada seduz a criança pequena, permitindo-a que

participe desse momento, retornando a lembranças já ouvidas e vividas. Reyes (2013,

p. 28) propõe que a função do professor de literatura é ser “uma voz que conta”, uma

voz que evidencia as essências das linhas do texto, traçando nelas os caminhos entre

o texto e o leitor. Para a autora, a função do professor é ler, e, nessas leituras,

envolver-se com conversas que são tecidas entre as vozes das crianças e da

professora durante as linhas lidas. A autora impulsiona-nos a pensar que “[...] é

urgente, sobretudo, aprender a conversar” (REYES, 2013, p. 29). É visível os

momentos ricos e privilegiados de conversação e de vivências entre os que ali vivem.

Durante a contação, algumas crianças dispersam-se, se movimentam,

levantando do espaço sem dar tanta atenção à história contada. Contudo, a

professora segue contando a história sem criar situação de aprisionamento para a

criança pequena. Garanhani e Nadolny (2014, p. 66) afirmam que o “[...] movimento

é um recurso utilizado pela criança, para o seu conhecimento e do meio em que se

insere, para expressar seu pensamento e também experimentar relações com

pessoas e objetos”.

Entendemos que são nessas situações em que a professora respeita a entrada

e a saída das crianças pequenas que ela possibilita o aprender pelo brincar, pelo

74

movimentar, estabelecer outras relações, agregando novos significados a realidade

da criança pequena pela fantasia vivenciada nas histórias. Na contação, algumas

crianças saem, movimentam-se, experimentam, brincam, mas logo retornam para

ouvi-la.

O momento da contação de história é uma experiência empregada na

mediação do literário. Pela experiência com o texto por meio do contador, possibilita-

se à criança pequena tecer relações com outras histórias, com os colegas, com o

livro, com a vida, o que a nutre esteticamente e a educa a apreciá-la (Imagem 8). Um

contador de histórias, para Neitzel e Carvalho (2016, p. 155), “[...] é este sujeito que

tocado pela literatura não se cala, sai a cantar e contar o que lê, porque acredita

nisso”.

Imagem 8 - Diálogo durantes as histórias

Fonte: Acervo da autora.

Evidenciamos que as falas de Neitzel e Carvalho ecoam no CEI, pois a

professora desenvolve momentos de contação possibilitando que a criança pequena

estabeleça uma relação de intimidade com os livros. Esses momentos de contação

dão-se em vários espaços do CEI Darlan Dotto Wiersinski e em vários tempos,

-Tem lobo lá?

- A minha casa é

‘amalelo’!

- A minha casa é azul!

- A minha casa é

marrom e é de

madeira!

75

inclusive durante o lanche. A professora senta para conversar com os pequenos e

questiona sobre o que querem ler. Durante a observação, constatamos a participação

das crianças na escolha das histórias, voltadas a alguns personagens já conhecidos

por elas, bem como por títulos já lidos pela professora. Para Machado, M. Z. V. (2012,

p. 19), os leitores mirins gostam muito de ouvir as mesmas histórias por diversas

vezes, pois a história, para a autora, não é só a história, mas sim o momento de

encontro comum ou compartilhado com alguém. Os pequenos demonstram já

conhecer o enredo das histórias, o que comprova que a professora mantém uma rotina

de contação.

Outra forma de contato com a obra é a roda de leitura, uma oportunidade de

as crianças pequenas vivenciarem experiências estésicas com o livro de literatura. É

deixá-las explorarem os livros livremente, brincando, manuseando-os. Reis (2014)

afirma:

O manuseio do livro pelas crianças, que deve ser uma atividade cotidiana, é uma motivação à leitura, principalmente quando a criança vê e ouve um adulto ler uma história de um livro para ela, ou simplesmente quando a criança vê um adulto lendo silenciosamente um livro. (REIS, 2014, p. 34).

O mediador é que dará espaço ao contato com o livro, para que as crianças

pequenas possam sentir, interagir e aprender. Ao privilegiar a autonomia dos

pequenos, por meio de ações propositoras de encontro contínuo com o livro, as

crianças pequenas poderão se sentir à vontade para manipulá-los, conversarem

sobre as histórias (uma conversa que pode ir além das páginas) e estarem mais

próximas do livro. A ação propositora do professor mediador é vista “[...] não como

ponte entre quem sabe e quem não sabe, entre a obra e o espectador, mas como

um ‘estar entre’” (MARTINS, 2012b, p. 62, grifo da autora). Entendemos que esse

estar entre demanda de muita observação e escuta do mediador para que ele

consiga traçar ações que levem a criança pequena à apreciação estética.

Reyes (2010, p. 47) afirma que, para que a criança pequena “[...] possa

entreter-se lendo sozinha, foi necessário que uma figura íntima lhe revelasse, não

uma, e sim muitas vezes, o truque mágico de como olhar e interpretar os objetos

planos e estáticos pinçados entre as páginas”. Essa ação demanda do mediador,

dessa figura íntima, que posssibilite à criança pequena, em suas ações contínuas,

descobrir o prazer impresso nas páginas dos livros. O interesse da criança pequena

em querer manusear, folhear, apreciar e brincar com o livro aponta que no CEI as

crianças ouvem histórias e têm o livro como objeto presente em sua rotina.

76

4.4 A CRIANÇA PEQUENA, O LIVRO E A FAMÍLIA

“Alice! Recebe este conto de fadas E guarda-o, com mão delicada,

Como a um sonho de primavera Que à teia da memória se entretece,

Como a guirlanda de flores murchas que A cabeça dos peregrinos guarnece.”

Lewis Carroll (2009, p. 11).

Alice recebe um conto de fadas, um sonho de primavera. São imagens dos

livros que ficam na memória, são vividas na infância e podem ser relembradas na fase

adulta. Uma lembrança de um momento feliz, de profundo contentamento. Assim

como a pesquisadora que, em meio a muitas vivências da infância, relembra esse

conto, As aventuras de Alice no país das maravilhas - um livro como objeto propositor,

que promove um encontro feliz entre pesquisadora, livro e figura materna.

A bebeteca como um espaço cultural abre portas às famílias para o encontro

com a criança pequena e o livro. A criação de oportunidades, propostas pelo CEI, ao

envolver os pais durante as sextas-feiras, quando as famílias junto aos seus filhos

escolhem um ou mais livros para serem levados para casa (Imagem 9), geram desejos

dos envolvidos a querer participar.

Imagem 9 – Crianças do CEI escolhendo seus livros

Fonte: Acervo da autora.

Fonte: Acervo da autora

77

Casanova e Ferreira ( 2011, p. 61), em uma pesquisa intitulada Famílias de

crianças e escola: relações em foco, afirmam “[...] que todos os estudos que tratam

da relação família-creche carregam consigo a validade desta relação como

indispensável para o desenvolvimento tanto da escola quanto das famílias, mas

principalmente das crianças”. Constatamos que essa ação, ao envolver a família e o

CEI no intuito de compartilhar experiências com o empréstimo dos livros, reflete

positivamente nas crianças pequenas, visto que foi possível ver a alegria dos

pequenos ao escolher as obras e levá-las.

As crianças pequenas sozinhas posicionavam suas mochilas no canto da

parede e dirigiam-se rapidamente à bebeteca. Nela, pais e filhos estavam

familiarizados com as obras, fizeram suas escolhas e conversavam sobre os títulos já

levados para casa. Essa mediação proposta com a criança pequena ao escolher os

livros (Imagem 10) incentiva a autonomia.

Imagem 10 - Leitura livre

Fonte: Acervo da autora.

Mejiá (2010) afirma que

[...] os espacios significativos deben interpretarse no sólo como los lugares físicos sino además como aquellas situaciones construidas por un agente educativo para propiciar experiencias potencialmente educativas. Podrían

78

tomarse como sinónimo de ‘ambiente de aprendizaje estructurado, generador de experiencias’.22 (MEJIÁ, 2010, p. 875).

É nessa perspectiva que entendemos ser um ambiente de aprendizagem, um

ambiente que privilegie a autonomia das crianças pequenas para que elas possam se

movimentar e aprender por si mesmas, estabelecendo relações com outras crianças,

com adultos e com objetos, nesse caso o livro. Que esse espaço seja um ambiente

que ofereça experiências significativas para as crianças pequenas, para que ele possa

ser lembrado como um espaço feliz vivido entre os livros, e que os pequenos tenham

vontade de retornar e poder vivenciar novas experiências.

Mejiá (2010) afirma que o espaço é muito mais que um simples lugar físico, ele

é mediador. Assim, é fundamental a escolha de sua organização para que ele permita

que as ações de leitura e de manuseio dos livros aconteçam de forma natural, de

maneira que as crianças pequenas consigam explorar o ambiente de forma autônoma.

Este conjunto de condições favoráveis para a leitura necessita ser prioridade nas

Instituições de Educação Infantil: o espaço para a bebeteca, um mediador leitor que

faça mediações adequadas que estimulem os sentidos e os livros de qualidade, sendo

eles os objetos propositores. Esse conjunto forma a tríade que envolve a criança na

experiência literária, que contribuirá para a educação dos sentidos e a memória leitora

das crianças pequenas.

A professora do CEI Darlan Dotto Wiersinski relatou que as crianças costumam

escolher as mesmas obras para serem levadas para casa. Esse relato provoca-nos a

pensar sobre a releitura e a relação de intimidade que essa ação de escolher as

mesmas obras podem promover entre os leitores mirins envoltos em projetos de leitura

como estes em debate, por exemplo. Pennac (2008, p. 137) corrobora com essa

reflexão quando propõe que “[...] relemos sobretudo gratuitamente, pelo prazer da

repetição, a alegria dos reencontros, para pôr a prova a intimidade”. Reyes (2010), em

sua pesquisa, aponta que as crianças têm preferências e as sinalizam de diferentes

formas. Um fato curioso que a autora apresenta são os livros preferidos das crianças:

os “mais mordidos”. Desse modo, quando pequenas, elas já sinalizam suas

preferências.

22 “Os espaços significativos devem ser interpretados não só como lugares físicos, mas também como situações construídas por um agente educacional para promover experiências potencialmente educativas. Eles poderiam ser tomados como sinônimo de ‘ambiente de aprendizagem estruturado, gerador de experiências’” (MEJIÁ, 2010, p. 875, tradução nossa).

79

Esse movimento proposto pelo CEI possibilita, por meio da mediação

empregada, a autonomia das crianças pequenas. As Diretrizes Curriculares Nacionais

de Educação Infantil (BRASIL, 2010, p. 26) propõem que se “[...] possibilitem

situações de aprendizagem mediadas para a elaboração da autonomia das crianças

nas ações de cuidado pessoal, auto-organização, saúde e bem-estar”. A

intencionalidade do trabalho com a mediação do literário exercido ao propor a

liberdade da criança pequena escolher as obras pode ser vista como uma nutrição

infantil, oferecendo a criança pequena a possibilidade de fazer seus primeiros ensaios

ao selecionar os livros. Essa nutrição e essa vivência contínua potencializam o

desenvolvimento de sua autonomia.

Os mediadores de leitura precisam estar abertos para dialogar e observar,

atentos ao que os pequenos têm a dizer, respeitando, sobretudo, a escolha da criança

pequena pelo livro. Ao mediar a intenção não é discursar, ou seja, explicar as crianças

pequenas quais são os melhores livros, mas envolver e seduzir os pequenos em

leituras encantando-os. Nessa dinâmica, o mediador lê com paixão e gosto e daí

contamina os envolvidos, para que, assim, as crianças pequenas também queiram ler

o livro. Essa obra torna-se, portanto, objeto de desejo dos pequenos que ampliam seu

rol de leituras por meio do acesso aos livros.

Para a professora do CEI, um dos objetivos desse momento é a aproximação

do objeto estético livro com as famílias e as crianças:

“[...] ao ler para a sua criança estreita laços, ambos desfrutam de um momento de afeto, cumplicidade e de fantasia. O livro infantil ou narrativa pode ser destinado às crianças, mas os bons enredos envolvem leitores de todas as idades, mexendo com seu humor, sentimentos e lembranças, bem como despertando as mais diferentes sensações. A espera para a chegada da sexta-feira, a lembrança de ir até a bebeteca buscar um livro com a criança e o cuidado ao escolher um livro com ela é a mostra de que as famílias procuram formas de se aproximarem das ações do CEI e estão interessadas em fazer a diferença na educação dos pequenos. Isso me leva a refletir sobre a possibilidade de dialogar com as famílias para termos uma devolutiva e a sua visão em relação ao projeto”. (Professora do CEI Darlan Dotto Wiersinski).

O relato da professora sinaliza o compromisso da família com o projeto e as

perspectivas dessa ação produzir desdobramentos, outras ações que podem ajudar a

encantar as crianças pequenas, de forma a promover leituras fruitivas, estreitar o

encontro com o livro e a criança pequena, tornar o CEI um espaço de trânsito, que

valoriza o vínculo estabelecido com as famílias, um espaço de oportunidade de

80

diálogos. As vozes tecidas entre as crianças pequenas envolvidas durante as ações

nas bebetecas demonstram como esse momento as nutre esteticamente. A seguir,

tratamos dos encontros na bebeteca do Centro Municipal de Educação Infantil Padre

Lívio Donati.

81

5 ENCONTROS NA BEBETECA: CMEI PADRE LÍVIO DONATI

Como iria reunir outras criancinhas à sua volta e

tornar os olhos delas brilhantes e impacientes com

muitas histórias estranhas, talvez até com o sonho do

País da Maravilhas de tanto tempo atrás...

Lewis Carroll (2009, p.149).

A epígrafe de Lewis Carroll surge como um

questionamento ao papel do mediador. O que motiva as

crianças a estarem com seus olhos brilhantes e impacientes

com as histórias? O mediador que conta a história é um dos

grandes responsáveis por essa motivação. Vale lembrar

que o processo de contação de histórias, as possibilidades

de trocas e de experiências entre pessoas dependem da

concepção de leitura do literário do mediador. A mediação

é dependente da concepção do literário, por isso, para

entender como o professor medeia o literário, é preciso

conhecer as concepções que fundamentam essa mediação.

Em Castro (Paraná), adentramos um novo ambiente de

leitura, um espaço que foi pensado segundo os princípios

estabelecidos no projeto Bebeteca, berço de pequenos

leitores.

Rosa e Santos (2007, p. 2), autoras do projeto,

justificam o seu objetivo: “[...] expressar, antes de tudo, um

convite a todos os profissionais envolvidos com a educação

dos pequenos a refletirem e a experimentarem o espaço

literário denominado bebeteca, sensibilizando-os da

importância do contato com os livros a partir dos primeiros

meses de vida para a formação de futuros leitores”.

Poderíamos elencar muitas outras questões quando

pensamos em projetos sobre bebetecas, mas defendemos

que, por meio deles, os profissionais que ali atuam tenham

clareza de como as mediações de leituras adequadas são

MELNICK, 5 anos.

82

fundamentais, questionando-se sobre o motivo pelo qual estão realizando ou como

podem realizar as ações em um espaço de leitura.

O projeto Bebeteca, berço de pequenos leitores consta na proposta curricular

da Secretaria Municipal de Educação de Castro, bem como no Projeto Político

Pedagógico do CMEI Padre Lívio Donati. Carvalho, C. da M. (2012, p. 82) sinaliza que

“[...] o importante é que a biblioteca esteja presente no projeto político- pedagógico da

escola como lugar mais apropriado para o desenvolvimento de determinadas

atividades de leituras”. Para tanto, comecemos por analisar o objetivo quanto à

organização do espaço da bebeteca explícito no projeto:

Esse objetivo do espaço, do ambiente organizado, aponta para a potência da

literatura para a criança pequena, o de estimular a leitura por meio de ouvir e contar

histórias, a importância de o espaço da bebeteca ser um espaço físico adequado às

peculiaridades das crianças pequenas, ser um espaço de trânsito, um espaço de

encontros que possibilitem mediações do literário entre professor, familiares e

crianças, um espaço que eles tenham vontade de retornar. Isso nos auxilia a entender

que essa bebeteca tem por finalidade não ser uma sala destinada somente para

guarda dos livros. Nela há uma preocupação em ser um espaço adequado, um

ambiente de aprendizagem que busca atrair os sentidos das crianças para o livro.

A bebeteca deverá promover um ambiente físico e social adequado às crianças que possuem oito meses

a cinco anos de idade e necessitam de cuidados específicos. Deve possibilitar o relacionamento com

outros bebês, crianças, educadores e familiares. Todas as atividades desenvolvidas neste espaço

deverão estimular o ato de ler, ouvir e contar histórias. (ROSA; SANTOS, 2007, p. 20).

Esta ambientação pretende cativar o bebê e fazer com que as crianças ao entrarem na bebeteca, sintam-se

familiarizadas com as cores, móveis, tapetes, almofadas, brinquedos e principalmente pela

diversidade de livros. Com isto pretende-se que futuramente essas crianças sintam vontade e prazer ao

frequentarem bibliotecas tornando-se usuários assíduos. (ROSA; SANTOS, 2007, p. 20).

83

Assim, a finalidade é oferecer às crianças a oportunidade de experimentarem o livro,

pelo ler, pelo ouvir e pelo contar histórias, alimentando os sentidos.

5.1 O ESPAÇO

“A essa altura havia entrado num quartinho bem-arrumado, com uma mesa à janela e, sobre ela (como esperava),

um leque e dois ou três pares de minúsculas luvas brancas de pelica.” Lewis Carroll (2009, p. 44).

Alice apresenta o quarto do Coelho como um espaço bem-arrumado, com

seus objetos dispostos como já se esperasse por ela. Assim é o espaço da bebeteca,

que se apresenta com um ambiente organizado que possibilita momentos de

encontros, dividido em dois ambientes: em um, há uma televisão e um DVD; e, no

outro, a casa da Dona Benta. No primeiro ambiente, há um tapete grande e algumas

almofadas, um armário baixo de fácil acesso às crianças para manusear os livros, o

qual fica na parede da sala que dá acesso aos dois ambientes. No segundo ambiente,

está a casa da Dona Benta, com tapete, almofadas, um pneu para as crianças

sentarem e um painel decorativo com as personagens do sítio e uma gruta da cuca.

O ambiente é bem arejado, com janelas que possibilitam a circulação do ar, a

iluminação é bem clara, possui mais de uma lâmpada. É importante destacar que, em

todas as unidades escolares da Rede Municipal de Educação Infantil de Castro, há

uma sala destinada somente a essa finalidade. A organização do espaço é feita pela

própria professora, que, no contexto da proposta do projeto Valorizando trajetórias,

faz o entrecruzamento das obras e dos materias existentes no espaço.

O projeto Valorizando Trajetórias, desenvolvido pela professora da Bebeteca,

é referente ao tema: “Sítio do Picapau amarelo viajando e encantando as crianças”

(Imagens 11 e 12 a seguir). Esse projeto é realizado com todas as turmas do CMEI

Padre Lívio Donati. A sala é decorada pela professora, a qual utilizou a temática do

projeto. Em se tratando de murais, Souza e Motoyama (2016, p. 30) propõem que

estes “[...] sejam sempre construídos com o auxílio das crianças pequenas para que

aquilo tenha significado para elas”. Para as autoras, essas experiências vividas no

espaço para criança pequena tornam-se ainda mais significativas, quando há

participação das crianças pequenas. Assim, em toda decoração e organização do

espaço, o livro precisa ser visto como objeto principal do ambiente, pois “[...] os livros

são “as estrelas” (SOUZA; MOTOYANA, 2016, p. 30).

84

Fonte: Acervo da autora.

A curadoria educativa para a organização do espaço e a disposição dos objetos

podem ser pensados para ampliar os sentidos da criança, sua formação estética, de

forma a potencializar as experiências que exploram os sentidos. Assim, o espaço da

bebeteca foi organizado com diferentes objetos propositores. É claro que o livro é o

objeto principal e está em destaque, mas alguns outros objetos tornam esse espaço

ainda mais aconchegante e atrativo.

A bebeteca apresenta algumas peculiaridades para o público infantil, visto que,

em sua composição, sinalizamos: mobiliário baixo, dispostos no campo de visão da

criança pequena, com formas arredondadas nas pontas; tapete emborrachado (para

melhor higienização); aparelho de som; prateleiras com livros expostos de forma que

as crianças pequenas possam visualizar a capa, outros aparecendo apenas a

lombada; pneu; televisão; almofadas; cestos com livros; bichos de pelúcia, entre

outros (Imagem 13).

Imagem 11 - Personagens do Sítio do Picapau amarelo Imagem 12 - Casa da Cuca na Bebeteca

85

Imagem 13 - Alguns materiais que compõem o espaço da bebeteca

Martins (2014) discute sobre a ação propositora, que requer a quem atua no

espaço uma ação de curadoria educativa. Essa ação envolve a escolha e a disposição

dos objetos que fazem parte do ambiente. É importante, assim, a escolha dos

elementos que compõem o espaço de forma a propor uma educação estésica (sem

muita poluição visual, por exemplo), com móveis adequados à convivência das

crianças pequenas, para que elas tenham a oportunidade de experimentarem

situações diversas com o livro (para que elas possam se locomover, ter a autonomia

para pegar os objetos), com luminosidade e aquecimento adequado, além da escolha

das obras literárias. Apesar de evidenciar os benefícios que um espaço apropriado

pode promover para a educação estésica, é fundamental que a mediação do adulto

estabeleça vínculos com a criança pequena para que, nesse espaço, ela vivencie e

experimente o processo de estesia, e que as relações e as interações sejam

alimentadas continuamente, contribuindo para essa educação estética.

A educação estética são os afetamentos vivenciados no dia a dia, as

experiências no sentido atribuído por Larrosa (2002); assim, os espaços apropriados

são fundamentais. Segundo Bachelard (1998, p. 62), “[...] o espaço habitado

transcende o espaço geométrico”. Dessa forma, consideramos importante ter um

Fonte: Acervo da autora.

86

espaço apropriado, um espaço onde a criança pequena entre e tenha vontade de ficar,

para ali ter a oportunidade de experimentar encontros sensíveis, não só com a arte,

mas com a vida, que, possivelmente, poderão ser lembrados na fase adulta, como

espaço vivido, espaço sentido.

Partimos do pressuposto de que a organização do espaço é algo que enriquece

a mediação do literário e a apreciação do livro para criança pequena. Soares e Paiva

(2014, p. 14) apontam esse espaço de local de leitura, interação e experimentação

como “[...] referência de cultura e conhecimento para o leitor iniciante”. As autoras

mencionam na introdução no PNBE a palavra biblioteca, mas entendemos que o

espaço da bebeteca também se configura como um ambiente cultural, um local de

trânsito.

O espaço é organizado a fim de possibilitar autonomia das crianças pequenas.

Há uma intenção na disposição dos objetos, no intuito de provocar a curiosidade nos

pequenos e a vontade de tocar e conhecê-los ainda mais, bem como para traçarem

suas preferências delineando as escolhas pelas obras. Aí se dá a nutrição estética

que é a “[...] forma de aflorar as associações decorrentes da experiência particular de

cada um, que vai apresentando novas formas de conhecer algo” (MARTINS;

PICOSQUE, 2012, p. 37). Um ato que alimenta os sentidos, nutrindo esteticamente

pela experiência que o momento atribui, um encontro de interação e contato com a

arte, nesse caso o livro de literatura.

5.2 O ACERVO Alice nunca estivera num tribunal antes,

mas lera sobre eles em livros, ficando muito satisfeita ao descobrir que sabia de quase tudo ali.

Lewis Carroll (2009, p. 127).

Tamanha é a riqueza dos livros que eles nos levam a lugares imaginários. Alice

deu-nos um belo exemplo de um caminho nunca antes visto, pois, mesmo sem ter

saído do lugar, o conhecia por meio dos livros. Assim adentramos o espaço de leitura,

no qual o livro literário é percebido como objeto estético, pois ele não só possibilita

que o leitor mirim conheça novas existências e maneiras de ser, mas também os

auxilia a nutrir seu olhar para com o mundo, inspirando-os a serem no futuro leitores

mais conhecedores e quem sabe pessoas mais sensíveis. Senhorini e Bortolin (2012,

p. 148) defendem o livro propondo-o como foco principal do espaço. As autoras

87

sugerem que o espaço seja organizado com uma “[...] decoração discreta para que a

atenção dos bebês esteja voltada exclusivamente para os textos ali comunicados,

estando eles numa linguagem impressa, imagética, fílmica, cênica, midiática, etc.”. O

livro é o protagonista do espaço, e, por meio dos encontros, das leituras, das

conversas tecidas, do manuseio das obras pelas crianças, pode-se ampliar a nutrição

estética delas quando o acervo possui características hipertextuais.

Martins e Neitzel (2016), em sua pesquisa sobre narrativas hipertextuais

infantis, discutem a importância, desde cedo, de expormos as crianças a um acervo

literário fruitivo. Para as autoras, a literatura infantil contemporânea apresenta, hoje,

diversos recursos que ampliam a percepção do leitor mirim. Segundo as

pesquisadoras, o livro de literatura quando posto em destaque, a sua qualidade

estética pode ser um elemento artístico que auxilia no processo de formação estética.

Por qualidade estética, as autoras compreendem um conjunto de fatores que

envolvem o layout do livro, a ilustração, os materiais com os quais são feitos, assim

como o conteúdo.

As autoras evidenciam a importância de os livros serem selecionados pelos

professores tendo em vista, principalmente, seu conteúdo, isto é, obras que instiguem

e provoquem as crianças por meio das histórias abertas, plurissignificativas, que

ofereçam possibilidades de questionamentos (em contrapartida às fábulas que são

produzidas para moralizar, para uniformizar ideias).

O acervo do CMEI Padre Lívio Donati é composto por, aproximadamente, cem

livros de variados gêneros literários, que incluem: poesias, fábulas, contos modernos,

lendas, cantigas, entre outros (Imagem 14). Eles foram adquiridos pela Secretaria

Municipal de Educação, com recursos próprios do CMEI, por meio do PNBE e do

programa do Banco Itaú. O aspecto dos livros está em bom estado, mas com

características de usados, pois alguns livros apresentam dobras e fitas coladas, sinal

de que já foram restaurados.

88

Imagem 14 - Acervo da bebeteca do CMEI Padre Lívio Donati

Fonte: Acervo da autora.

A composição que abarca os variados gêneros textuais é um dos critérios que

entendemos ser fundamentais para garantir a qualidade estética do acervo. Essa

qualidade, segundo Martins e Neitzel (2016), também pode ser alimentada pela

escolha de livros que não subestimem a capacidade da criança, textos provocativos,

que estimulem a curiosidade delas. As autoras partem do princípio da “narrativa

hipertextual”, pois, para elas, esse tipo de obra contribui para a formação do leitor

mirim, visto ser uma obra inovadora, que convida o leitor para o texto, provocando-o

e instigando-o. Uma obra que, por suas características, se aproxima do conceito de

objeto estético, que foi construída pelo autor na intenção de ser uma obra aberta, a

qual permite ao leitor fazer as suas interferências.

Assim como Martins e Neitzel (2016), Reyes (2015) afirma: “Eu gosto da

complexidade. Me parece que as crianças vão crescendo em complexidade, que um

bom leitor infantil, cultivado desde a primeira infância, é um leitor que acessa muitas

possibilidades interpretativas e que não podemos subestimar os bebês”. Martins e

Neitzel (2016) discutem, também, sobre a escolha das obras que podem permear a

mediação do literário para crianças pequenas, as quais devem ser desafiadoras, que

89

tenham uma estrutura hipertextual, multilinear e plural. No caso das crianças

pequenas, é importante o papel do mediador. Um mediador que desenvolva

experiências de leituras com livros de qualidade, que não se limite a escolher livros

que não desafiem os pequenos, mas sim elegendo obras que agucem a curiosidade

e gerem expectativas no intuito de motivar os leitores mirins a desejarem brincar com

os livros, construindo sentidos.

5.3 A CRIANÇA PEQUENA E O LIVRO

“[...] todos para os seus lugares!” esbravejou a Rainha, e foi um corre-corre de gente para todo lado,

uns tropeçando nos outros, em um ou dois minutos, porém, estavam a postos e o jogo começou.

Lewis Carroll (2009, p. 98).

Diferentemente do conto de Alice, em que a rainha esbraveja solicitando que

todos estivessem a postos para o jogo começar, acontece nos encontros na bebeteca.

Ao chegarem à bebeteca, as crianças, com tranquilidade, sem tropeços e sem corre-

corre, circulam pelo espaço, escolhendo a forma mais confortável para se aconchegar

e aproveitar os encontros literários. Esses encontros acontecem uma vez na semana

com cada turma. Há um caderno de planejamento a ser seguido, no entanto a história

escolhida é contada para todas as turmas. No planejamento, é registrado o título do

livro, os objetivos propostos com a história e como será realizado, bem como se será

utilizado outro objeto propositor para o momento da contação. Nos momentos dos

encontros, a professora leva as crianças à bebeteca, dividindo as turmas em

pequenos grupos, pois, conforme a proposta do trabalho aponta, faz-se necessário

pequenos grupos23. A professora relatou-nos que ela segue a proposta, envolvendo

pequenos grupos, com a intenção de estabelecer vínculos entre a criança, o livro e a

professora. Sinalizamos que a professora opera em suas mediações o que a proposta

anuncia, o que configura que as ações seguem pautadas no projeto da bebeteca.

Quanto ao número de crianças pequenas, compreendemos que a proposta possibilita

um encontro mais íntimo, em que mediador e crianças pequenas podem compartilhar

23 Projeto Bebeteca, berço dos futuros leitores - Rosa e Santos (2007, p. 22) afirmam que “[...] para eficácia deste trabalho, é preciso que o número de bebês e crianças seja limitado, a fim de atender à necessidade e característica individual de cada uma, bem como estabelecer um vínculo maior com os livros e a bebetecária”.

90

do ambiente com mais tranquilidade, bem como a atenção do mediador para com a

criança pequena pode ser ainda mais eficaz. Nos encontros, a proposta é a contação

de histórias e o momento livre para o manuseio das obras (Imagem 15).

Imagem 15 - Aproximação com o livro

Fonte: Acervo da autora.

Para contar histórias, por vezes, a professora apresenta-se sem nenhuma

caracterização; por outras, ela faz uso de fantasias, adereços, chapéus, capas,

óculos, entre outros (Imagem 16). A professora mencionou que “[...] estar com algo

diferente atrai ainda mais a atenção das crianças para o momento da contação da

história”. Os objetos propositores, neste caso os acessórios, são elementos que

podem enriquecer o momento de contação, envolver as crianças pequenas e ampliar

suas vivências com o livro, estabelecendo outras conexões, além das páginas dos

livros. Segundo Souza e Motoyama (2016, p. 30), as “[...] contações com adereços e

objetos desenvolvem o simbolismo dos pequenos, pois o objeto usado para contar a

história, pode trazer a eles outros significados”.

91

Imagem 16 - Caracterização da professora

Fonte: Acervo da autora.

O contador de histórias desempenha o papel de afetar, sensibilizar e mobilizar

a curiosidade dos ouvintes. Evidenciamos a importância do mediador criar este

vínculo de afeto com as crianças pequenas para que, ao contar a história, além de

aproximar para o momento da contação, consiga estreitar a relação da criança

pequena com o livro. Pensando nessa aproximação do livro por meio da contação de

história, Neitzel e Carvalho (2016, p. 153) afirmam que a ação do contador, antes de

evidenciar a literatura como arte, seu valor literário, propõe que o contador seduza o

leitor mirim pela obra, “[...] colocá-lo frente ao texto para degustá-lo”.

Consideramos importante que o contador proponha o acesso à obra como jogo,

que o livro não seja imposto como uma obrigação, mas que, no ato de contar, o

contador consiga exprimir o que está impresso nos livros a fim de contagiar, de afetar

92

e de envolver os pequenos com o livro. Nesse mesmo viés, no projeto Bebeteca, berço

de futuros leitores, Rosa e Santos (2007) afirmam que

[...] a arte de contar histórias requer um profissional cuja doação seja intensa e conquiste seu público infantil sendo este seduzido pela sua linguagem artística. O professor deve estar sensibilizado a sensibilizar, seduzido para seduzir, portanto a história a ser contada deve primeiro apaixonar o narrador. (ROSA; SANTOS, 2007, p. 16).

Conhecer o texto que será contado faz toda diferença, pois facilita ao contador

estar mais envolvido com o texto bem como permite que ele consiga narrar com

segurança, estreitando a relação do livro com a criança pequena. Assim sendo, como

podemos contagiar as crianças pequenas para esse momento de contação de

histórias? Caroline Carvalho, professora e atriz, em 20 de agosto de 2016, ministrou

no Serviço Social do Comércio (SESC), no Departamento Regional de Santa Catarina,

a oficina Contar Histórias: O livro e a formação do leitor. Dentre suas falas, Carvalho,

C. ( 2016) destacou: “A contação de histórias através do livro”, enfatizando a postura

do contador de histórias. Ela propôs, assim, algumas dicas para esse momento,

dentre elas:

ü o contador pode criar seu próprio “convite”, pois ele convoca a criança

pequena e remete à lembrança dos pequenos para o momento de ouvir

histórias e para a roda de leitura. Para Carvalho, C. (2016), um objeto ou

uma música pode ser esse “motivador [...] porque ele é aquele que motiva

as crianças a se organizarem para o momento de ouvir histórias e a roda

de leitura”;

ü escolher uma posição para o contador ficar, que pode ser em pé ou

mesmo sentado, posicionando o livro de forma que as crianças possam

observá-lo;

ü no momento da leitura, o contador pode posicionar o livro para si e depois

mostrar as imagens para os pequenos;

ü em alguns momentos, o contador pode fazer movimentos com braços e

pernas, mas ter o cuidado para não ser o tempo todo, para não chamar

mais atenção para os movimentos do corpo do que para a história do livro

que está sendo contada;

ü a criança pequena pode, também, sentar-se no colo do contador com as

páginas do livro viradas para ambos.

93

Carvalho, C. ( 2016) pontuou a importância desse momento ser diário, que é o

que efetiva o leitor, a compreensão de que a literatura é parte de seu dia a dia. Como

também evidenciou que a contação de histórias é tão importante quanto a roda de

leitura, que é outro momento após a contação. Ela é o momento que ocorre a leitura

livre, pois, por meio da roda de leitura, a criança pequena passa a compreender que

ela encontra no livro as mesmas histórias incríveis que acabou de ouvir.

Pontuamos que a criança pequena se aproxima do livro quando vivencia o

encontro em mediações contínuas, que podem ser pela contação de histórias, pela

leitura, pela roda de leitura ou, simplesmente, pelo manuseio livre dos livros, entre

outras mediações possíveis que possibilitem a criança pequena observar, ouvir, tocar,

sentir, envolver-se com o livro.

Na bebeteca do CMEI, o espaço é organizado para oferecer mais estesia às

crianças. Há um tapete e almofadas. A professora mostra o livro, identifica o nome da

história, seu autor e ilustrador. Ao ler, faz uso da voz fazendo ondulações e gestos em

algumas situações. O rítmo de leitura é tranquilo, com uma voz suave que embala

toda a história. Para Reyes ( 2010):

A ênfase no ritmo e na prosódia e a carga melódica impressa pela voz adulta quando se dirige aos bebês demonstra que carregamos, como bagagem evolutiva da espécie, uma cadência que transcede o uso utilitário da linguagem e transmite uma experiência estética, além do significado literal das palavras. (REYES, 2010, p. 25).

Pelo encantamento criado pela professora, as crianças ouvem todo o conto.

Esse movimento de leitura, o qual envolve a contação e o manuseio livre do livro, feito

em todas as bebetecas dos CMEIs de Castro, apresenta-se como ponto forte

observado.

Em se tratando de crianças pequenas, os mediadores de leituras oferecem as

primeiras ações leitoras às crianças. Assim, são eles que possibilitam o encontro com

o livro. Para Reyes (2012), um momento que oportunize um clima de introspecção é

fundamental, permitindo às crianças condições de diálogo, para que, em torno dos

textos, as vozes sejam tecidas, as experiências e as peculiaridades de cada criança

sejam partilhadas (Imagem 17).

94

Imagem 17 - Encontros literários

Fonte: Acervo da autora.

Nesse sentido, por meio dos encontros literários que evidenciem o momento

estético, a relação estabelecida com o livro e com o mediador pode possibilitar à

criança pequena experiências para que ela possa interagir, conversar e expor as suas

emoções, que a leve à reflexão e à autonomia, ampliando, assim, a sua educação

estética. Uriarte, Neitzel e Carvalho (2016, p. 191) afirmam sobre a educação estética

que não é, portanto, “[...] um sentir espontâneo ou involuntário, mas um ato

contemplativo, reflexivo e, por isso, de empoderamento de sua própria posição no

mundo. Essa tomada de consciência promove sua autonomia”.

Em visita ao Brasil, especificamente em Florianópolis, no evento organizado

pela Universidade Federal de Santa Catarina, intitulado Seminário de Literatura Infantil

e Juvenil, no dia 26 de setembro de 2016, tivemos a oportunidade de ouvir Yolanda

Reyes, escritora e educadora, umas das fundadoras de Espantapájaros24. É também

diretora dessa instituição sobre a qual falou um pouco. Na roda de perguntas, foi

apresentada a seguinte questão: “Como trabalham a leitura na bebeteca, no Instituto

Espantapájaros e [...] como os professores atuam como mediadores neste espaço de

leitura?”. A Professora respondeu:

24 Para conhecer o Instituto, acesse: <http://espantapajaros.com/>. Acesso em: 10 maio 2017.

- A dona Benta vai “tá” lá?

- No sítio vai ter pomba?

95

Nos estudos, temos visto, nas conversas, todo o movimento da leitura constitui-se na primeira infância. Então o que fazemos com um bebê de oito meses? Nada de especial! Colocamos os livros para eles. Ensinamos os adultos a lerem para as crianças. Todos sabem que ler não precisa de muito esforço. E todo este trabalho é: escolher os livros, colocar na frente. E todas as crianças começam a subir no braço de alguém que está contando, começam a morder os livros, a movimentar as páginas e contamos contos e fazemos que os livros estejam sempre presentes na vida das crianças. (REYES, 2016, tradução nossa).

Reyes evidencia, com sua experiência no Instituto Espantapájaros, que não

há nada de muito especial para desenvolvermos um movimento de leitura, mas o

importante é a presença do livro e as ações adequadas do mediador. As palavras de

Reyes ecoam no CMEI Padre Lívio Donati, porque é assim que acontece nos

encontros literários na bebeteca. A postura do mediador é vista como um estar junto

às crianças;, em alguns momentos, ele apenas observa as crianças explorarem o

ambiente de aprendizagem; já, em outros, a ele interage com as crianças. As

crianças monstram-se muito à vontade no ambiente. Ao término da história e dos

diálogos tecidos entre as crianças e a professora, as crianças ficam livres para brincar

com os livros, folhearem as páginas, trocar os livros quantas vezes sentirem interesse.

As crianças são bem livres no espaço, podem brincar na gruta da Cuca e na casa da

Dona Benta. A professora medeia as crianças convidando-as a pegarem os livros e

a escolher as obras do armário, bem como faz leituras individuais dos livros escolhidos

por ela e pelos pequenos. Um momento no qual podemos identificar mais um triângulo

amoroso apontado por Reyes (2012).

No CMEI, as obras estão à disposição das crianças pequenas para

manusearem. Segundo a professora, “[...] sempre é destinado um tempo para livre

acesso das crianças às obras”. Elas têm autonomia para experimentarem os livros,

além de sentirem-no ao morder, ao cheirar, ao tocar e ao folhear, brincam com o corpo

em movimento, tendo o livro como um brinquedo.

A roda de leitura promove uma experiência rica que vai refinando o gosto

pessoal de cada criança pequena, uma oportunidade de estar mais próximo do livro e

de construir com ele uma relação como objeto estético, mediadas pelo adulto que,

nesse caso, pode ser o professor ou alguém da família. O contato dos pequenos com

os livros constrói-se acompanhado da liberdade ao acesso, permitindo-os

experimentarem as obras conforme o que já se é esperado pela idade, como: o

morder, o rasgar, o jogar, o brincar, entre outros. Essas ações são percebidas pelo

mediador como um movimento que pode acontecer pela idade das crianças, porque

96

estão respaldadas pela concepção do livro como um brinquedo, por isso é permitido

que as crianças explorem o livro, brinquem com o objeto, sem se preocupar tanto com

o “CUIDADO”. Nesse sentido, como afirmam Hasper et al. (2017), o importante é que

o mediador nos encontros com a leitura promova uma “[...] profunda relação de afeto

dos envolvidos, o mediador tende a ser aquele que desafia o bebê ao alcance de

novas etapas, pois tudo começa com um encontro, neste caso, que gerem

afetamentos positivos e permitam avançar novas etapas” (HASPER et al., 2017, p.

46). Assim, com o passar das novas experiências, ao ver o adulto lendo, a criança

pequena passa a entender e perceber as funções do livro. Tudo isso só é possível se

o mediador permitir encontros que possibilitem a criança pequena escolher a obra,

manuseá-la e senti-la com os sentidos.

Imagem 18 - Manuseio dos livros

Fonte: Acervo da autora.

As crianças pequenas demonstraram afinidade com a obra, mesmo sem saber

ler convencionalmente. Fizeram uso da ponta dos dedos imitando a professora ao

realizar a leitura, mostraram as imagens relatando e apontando, viraram as páginas,

trocaram os livros entre os pares, bem como escolheram as próprias obras. Essas

ações indicam que esse espaço de leitura oportuniza experiências fruitivas, que os

permitirão perceber o livro de literatura como arte.

No ambiente de aprendizagem as crianças pequenas movimentaram-se,

respeitando os colegas, agindo de forma organizada. Elas selecionaram os livros e

os colocaram novamente na estante. Borba (2016) afirma que

97

[...] as pessoas ao entrarem em uma biblioteca podem ser acolhidas por um espaço de desaceleramento, seja pelos profissionais que lá trabalham, pela arte, pelo ambiente esteticamente organizado, pelas ações que corroboram com o contato sensível do ser humano com a realidade, com sua cultura. (BORBA, 2016, p. 132).

A autora evidencia o espaço da bibloteca como um espaço de

desacelaremento. Isso propõe refletir sobre a bebeteca, visto que as ações realizadas

na bebeteca convidam as crianças a outro tipo de atividade, em que o espaço, os

objetos e o mediador corroboram para o encontro sensível entre a criança pequena

e o livro. Ao interagir com o livro, as crianças pequenas partilham do mesmo ambiente

com tranquilidade. São experiências vividas com o livro, em que são tecidas relações

de afeto entre os envolvidos, que permitem os pequenos nutrirem os sentidos.

5.4 A CRIANÇA PEQUENA, O LIVRO E A FAMÍLIA

Alice observou o Coelho Branco enquanto ele revirava a lista, muito curiosa para saber quem seria a próxima testemunha,

“ ...pois ainda não reuniram muitas provas”, disse para si mesma. Qual não foi sua surpresa quando o Coelho Branco leu,

forçando ao máximo sua vozinha esganiçada, o nome “Alice”! Lewis Carroll (2009, p. 136).

Alice fica curiosa para saber quem será a próxima testemunha do julgamento.

A curiosidade é uma das características das crianças pequenas, e ela as impulsiona

a descobertas. Com o projeto, as professoras mantêm a curiosidade das crianças

pequenas sobre os livros da bebeteca. Quem será o próximo colega que levará a

bolsa de leitura para casa? A escolha pela criança pequena que levará o livro se dá

pela sequência da chamada; assim, todos os dias, duas crianças pequenas de cada

turma levam para casa um boneco personagem do Sítio do Picapau amarelo (Imagem

19) e um livro de histórias, no intuito de mediar a leitura. Junto ao livro vai um caderno

de registro, no qual as famílias sinalizam aspectos da história lida e as percepções,

sendo a professora a que escolhe o título das obras.

98

Imagem 19 - Bolsa de histórias

Fonte: Acervo da autora.

Em relação a essa atividade de leitura que envolve a família e a criança

pequena em levar a bolsa de leitura para casa, temos o exemplo semelhante do

trabalho de Reis (2014). A autora relata o projeto denominado “Presta libro”, o qual

envolve as crianças e as famílias. A intenção do projeto é a criança levar o livro para

casa. Sem data determinada, o livro vai para casa e retorna para a creche. Reis (2014,

p. 55) aponta que o “[...] importante não é o tempo que esse livro ficará em casa, mas

o contato da criança e da família com a literatura e as relações que ela pode

proporcionar entre a criança pequena e a família em casa”. O livro vai para casa em

uma sacola de tecido cru. Essa sacola foi confeccionada pelas avós costureiras, e as

personalizações foram feitas pelos pais. Cada criança possui uma bolsa literária e são

as próprias crianças que escolhem as bolsas. A autora evidencia a importância da

autonomia, visto as crianças terem a liberdade para escolher as sacolas e o livro que

será levado para casa. Reis (2014, p. 55) afirma que as “[...] sacolas, assim como da

escolha do livro que irá para casa com a criança dentro da sacola, instiga uma relação

de carinho com o livro”.

As ações envolvendo a ida do livro para casa em Castro e em San Miniato

acontecem de formas parecidas, mas algumas diferenças nos fazem refletir. Em

Castro, a participação das famílias acontece quando os pais têm interesse em visitar

o espaço, embora não ocorra nenhuma programação envolvendo as famílias nesse

ambiente, além do empréstimo dos livros. Já, em San Miniato, Reis (2014) sinaliza

99

que há uma programação envolvendo as famílias, em um projeto no qual envolve: a

apresentação do projeto, a formação com as famílias, a participação na confecção

das bolsas de leituras, o momento do empréstimo do livro para casa e o cuidado com

os livros.

Outra diferença existente nas ações são o tempo em que o livro fica no

ambiente familiar. Em San Miniato, o livro permanece com a criança o tempo que

achar necessário. Já, em Castro, o livro vai para casa e, no outro dia, precisa retornar

para o CMEI para que outra criança também possa levá-lo para casa. Como são

apenas duas bolsas de leituras por turma, o tempo de espera para a criança pequena

levar o livro novamente para casa é maior. Dessa forma, o ideal seria que cada criança

pequena tivesse sua própria bolsa de leitura, para que as oportunidades de

aproximação do livro com a família acontecessem com mais frequência.

Em Castro, a bolsa de leitura é confeccionada pela própria professora, sua

caracterização segue a representação dos personagens que envolvem o projeto o

qual está sendo trabalhado no contexto da bebeteca. A mediação do literário

desenvolvida na bebeteca envolvendo o empréstimo dos livros está em aproximar o

livro da criança pequena. Nesse sentido, o livro passa a ser fruído como arte e uma

relação estética vai sendo tecida. Essa parceria entre escola e família é fundamental,

pois, apesar de os pais não estarem presentes nesse ambiente de leitura, a bolsa de

histórias, hoje, é o recurso que as bebetecas de Castro escolheram para lançar o livro

no ambiente familiar.

A seguir, sinalizamos o conceito de bebeteca que compreendemos ser o mais

adequado à realidade brasileira, a partir das pesquisas de Escardó I Bás (1999),

Instituto Espantapájaros (2014), Senhorini e Bortolin (2008), Pereira (2014), Barros e

Santos (2009) e algumas considerações sobre as duas bebetecas investigadas.

100

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

[...] foi assim que, bem devagar, país das maravilhas foi urdido,

Um episódio vindo a outro se ligar – E agora a história está pronta,

Desvie o barco, comandante! Para casa! O sol declina, já vai se retirar.

Lewis Carroll (2009, p. 11).

Chegamos à parte na qual o trabalho se apresenta

como forma de fortalecer as forças e rever tudo aquilo que

nos acompanhou durante todo o caminho percorrido. Os

capítulos foram tomando forma, consistência, descobertas

foram apresentadas e, na busca por desvelar inquietações,

objetivos alcançados. Diferentemente do conto de Alice, em

que a história foi urdida, esta pesquisa apresenta-se como

forma de divulgar esse espaço de mediação do literário,

dando início a outras pesquisas que possam vir a discutir

sobre esse espaço de leitura denominado bebeteca.

Uma das inquietações foi identificar as bebetecas no

Brasil. Pensar em um espaço destinado à leitura para as

crianças, em bebetecas, ainda é uma novidade, visto tratar-

se de um ambiente que, aos poucos, está ganhando espaço

em terras brasileiras. Nesta pesquisa, encontramos

dezenove bebetecas, mas, para análise, escolhemos duas:

uma bebeteca em Itajaí (SC), o CEI Darlan Dotto Wiersinski;

e a outra em Castro (PR), o CMEI Padre Lívio Donati. Como

o objetivo principal pautou-se em analisar como ocorre a

mediação do literário nas bebetecas, o estudo focou em

conhecer os espaços educativos que possuem uma

bebeteca. Para compreendê-las, foi necessário visitá-las,

conhecer cada ambiente e acalmar as inquietações para dar

lugar a outras.

Nesse processo de desvelo de inquietações, surgiu a

discussão sobre o conceito de bebeteca. Para entender um

pouco esse conceito, pesquisamos trabalhos já existentes.

MELNICK, 5 anos.

MELNICK, 5 anos.

101

Sinalizamos as pesquisas de Escardó I Bás (1999), Instituto Espantapájaros (2014),

Senhorini e Bortolin (2008), Pereira (2014), Barros e Santos (2009). A partir dos

conceitos desses pesquisadores e dos dados coletados nas bebetecas analisadas,

construímos um conceito de bebeteca que se adequa à realidade brasileira e ao

objetivo da formação de leitores: a bebeteca como uma ação de aproximação da

criança com o livro, independentemente do espaço físico, seja uma sala, um canto ou

mesmo uma cesta de livros, desde que, nesse espaço, haja a intenção de aproximar

os livros da criança pequena, isto é, que seja produto de um projeto que pode ser

construído e que este seja de conhecimento de todos os docentes que fazem parte

da Instituição. Outro aspecto importante trata-se da concepção do livro, que ele seja

visto como um brinquedo, que possa estar nas mãos das crianças pequenas, para

que elas possam entender sua função social.

Compreendemos, dessa forma, que a mediação do literário proposta na

bebeteca pode ser feita por objetos, por professores, pela família, entre as crianças

pequenas e pelo próprio livro. Com os pequenos, a mediação do adulto tem algo

especial que é a relação amorosa que está em volta, é um estar junto (MARTINS,

2014), é um oferecer a leitura, variada e diversa, um texto que alimenta os sentidos,

um texto fruitivo que possa levar a criança pequena à autonomia e à reflexão. Esse

encontro demanda do mediador um olhar especial em relação à criança pequena. O

adulto compartilha de um mesmo livro que pode ser no colo ou não, sua voz como um

convite para ouvir um conto, elucidando uma troca de livro que possibilita ampliar o

repertório literário, de ter uma história preferida e o desejo de estar rotineiramente com

os livros. Nesse sentido, defendemos que a bebeteca seja um ambiente de

aprendizagem, um lugar de trânsito e de encontros, que possibilite a educação

estética.

Tendo em vista o conceito de bebeteca, a Figura 9 a seguir aponta questões

que consideramos fundamentais para que a bebeteca se constitua como um espaço

propício para a formação dos futuros leitores, de forma que ela impacte na formação

estética dos pequenos. As palavras compõem uma rede semântica que sinalizam o

conceito de bebeteca. Cada cor indica um aspecto que é essencial na formação desse

conceito.

102

espaço sujeitos projeto educação estética

livro mediação do literário

Figura 9 - Nuvem de palavras 2

Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

Dentre essas questões, evidenciamos a existência de um projeto. Ambas as

bebetecas selecionadas para este estudo possuem um projeto que norteia as ações

desse espaço cultural. Entendemos que a existência do projeto de bebeteca visa a

ser um documento fundamental, norteador, pois fundamenta as reais intenções com

o espaço e com as mediações de leitura que se pretende desenvolver, bem como

esclarece e agrega conhecimentos aos docentes e à família sobre o papel desse

espaço de leitura. Constatamos que os projetos em si são diferentes, porém o objetivo

principal de ambos é aproximar a criança pequena dos livros no espaço da bebeteca.

Organizar um projeto de bebeteca pode não ser uma tarefa fácil. Dentre as

muitas dificuldades em sua realização, está o espaço disponível nas Instituições de

Educação Infantil para essa finalidade, algo que pode limitar ou tirar os livros do

armário. Dessa forma, faz-se necessário pontuar exemplos significativos de bebeteca:

um espaço próprio, o que seria ideal ter em todas as Instituições de Educação Infantil

103

do Brasil, sendo uma sala destinada apenas para as mediações de leituras.

Compreendemos que esse ideal depende de políticas públicas, mas, também, de um

olhar dos gestores das instituições de Educação Infantil de perceberem o livro como

um importante objeto para o desenvolvimento cultural da criança pequena. Nesse

sentido, esta pesquisa trouxe um CEI que, apesar de não ter um espaço criado para

esse fim, sem as condições ideais, produziu e executou o projeto de implantação de

uma beteteca.

Outro aspecto importante que buscamos evidenciar ao longo desta pesquisa

se trata da concepção do livro, que ele seja visto como um brinquedo, que possa estar

nas mãos das crianças pequenas, para que elas possam entender sua função social.

O livro é um objeto propositor e, como tal, pode despertar na criança pequena

percepções diversas, as quais podem, com a ajuda da mediação de um adulto,

tornarem-se ao longo de sua infância fundantes para sua formação leitora. Quando

abordamos o livro brinquedo, não estamos falando do livro-brinquedo (com

dobradoras, sons ou outros recursos), com uma estrutura própria para criança

pequena experimentar. Defendemos que o livro de qualidade estética esteja nas mãos

da criança como brinquedo para que ela possa experimentá-lo, mordê-lo, cheirá-lo,

tocá-lo, jogá-lo e até ter o direito de rasgá-lo quando ainda não estiver familiarizada

com ele; afinal, são situações naturais que poderão ocorrer pela idade em que a

criança se encontra. A rotina atribuída ao contato com os livros possibilita que a

criança possa vir a entender as funções sociais dos livros, pois a criança pequena não

aprenderá sobre o livro se alguém falar dele para ela, mas sim se ela o experimentar.

Contudo, não é qualquer livro. É preciso atentar-se para a qualidade estética

desse livro. Não podemos subestimar a capacidade intelectual da criança pequena;

ao contrário, é necessário colocá-la em contato com variados gêneros literários, assim

como selecionar aqueles que aguçam sua criatividade e refinam seu gosto. Muitos

são os títulos existentes no mercado para o público infantil, mas cabe ressaltar a

importância da Instituição de Educação Infantil, ter critérios bem definidos de escolha

dos livros, critérios que garantam a seleção de livros com qualidade textual da obra,

pois não é qualquer obra literária que proporciona aos leitores deslocamentos. Assim,

é preciso que as crianças pequenas tenham acesso a obras literárias que nutrem os

sentidos, que alarguem as experiências vividas com o objeto livro. É muito importante

que os encontros com os livros possam acontecer de forma contínua, pois eles iniciam

104

as crianças pequenas no universo literário. Quando esse processo é bem mediado,

ocorre uma relação de fruição que pode ser deflagrada, pois a formação de um leitor

é algo que se conquista a cada dia, pela experiência e pelo contato com os textos, por

ouvir o mediador contando e por sua própria leitura. Os bons livros são aqueles que

possuem riqueza estética, mas que também possibilitam às crianças pequenas

interagirem, brincarem, sentirem o ritmo do jogo de linguagens, dentre tantas outras

riquezas, quando compartilham com o adulto ou com seus pares momentos de afeto,

com a presença dos livros, nutrindo-se esteticamente.

A presença do livro na rotina dos pequenos nas bebetecas do CEI Darlan Dotto

Wiersinski e do CMEI Padre Lívio Donati ocorreu de forma contínua, pois ele é um

objeto que está em volta a tantos outros. Dessa forma, o intuito das bebetecas é que

o livro seja visto como um brinquedo, como qualquer outro, que esteja realmente

circulando nas mãos dos pequenos, que ele não venha a provocar medo ao ser

tocado, mas sim liberdade e vontade de brincar com ele.

Uma inquietação que nos perseguiu ao longo desta pesquisa foi sobre as

condições dos espaços físicos das bebetecas. A bebeteca do CEI Darlan Dotto

Wiersinski, ao desenvolver um espaço com poucos recursos, possibilitou-nos refletir

sobre o espaço ser importante, porém não só ele, visto que a mediação é tão

importante quanto o espaço quando o objetivo é aproximar a criança pequena do livro.

Defendemos, dessa forma, que a bebeteca necessita ter um espaço próprio, um

ambiente arejado, com iluminação artificial e natural, com móveis na altura das

crianças pequenas, com elementos para ampliar o conforto das crianças como

almofadas. Um espaço apropriado sinaliza a importância que uma escola dá a este

objeto cultural, que é o livro, e possibilita interações que um espaço adaptado inibe.

Um espaço adequado requer uma curadoria educativa (MARTINS, 2012b), que inicie

por uma organização arquitetônica que busque auxiliar no desenvolvimento da

autonomia das crianças pequenas e permita a exploração da curiosidade, isto é,

possibilitar um ambiente de aprendizagem em que as crianças pequenas possam

escolher os seus próprios livros, sem depender tanto do adulto. A bebeteca é um

espaço que se configura para além da guarda de livros, um lugar para viver e brincar.

O exemplo do CEI Darlan Dotto, no entanto, pode ser visto como uma

motivação aos profissionais que trabalham em ambientes educativos que não

possuem uma sala destinada à bebeteca, mas tem interesse em desenvolver um

105

espaço como esse. Ao discutir como os espaços das bebetecas do CEI Darlan Dotto

Wiersinski e o CMEI Padre Lívio Donati interferem na mediação do literário, buscamos

apontar que os professores podem potencializar os livros, por meio da organização

do espaço bebeteca, de forma a possibilitar o interesse dos pequenos a

experimentarem o livro como brinquedo. Essas são ações de curadoria educativa que

propõem evidenciar o livro como objeto propositor em destaque no ambiente.

Retornando à questão problema que norteou este estudo - Como ocorre a

mediação do literário nas bebetecas? –, compreendemos que a mediação do

literário constitui-se pela visão dos docentes em perceber a potência desse espaço, a

potência das crianças pequena e do literário. A bebeteca um espaço não somente

para guarda de livros, mas sim sua organização necessita primar por uma ação

propositora, que passe pela curadoria educativa, ação esta que potencializa o

encontro entre a criança pequena e o livro, sendo este um ambiente de aprendizagem

para as crianças pequenas por meio de encontros com os livros. Além de ser um

espaço que atende as crianças pequenas os encontros nas bebetecas observadas

são mediados por meio de contações de histórias - são momentos que os livros são

escolhidos tanto pelas professoras como pelas crianças para serem lidos ao grupo. É

um um momento de mediação do literário compartilhada, com a possibilidade de a

criança pequena vivenciar as funções do livro pela voz do mediador.

Uma das formas de mediação do literário é a contação de histórias, além de

seu poder de encantamento, propiciada pelo momento agradável com a presença do

livro, pode ser vista como uma mediação que amplia o contato com o objeto propositor,

pois convida a criança pequena a experimentar histórias narradas, levando-a a

perceber (ou não) que são dos livros que as histórias surgem. Assim, ela pode ser

afetada e envolvida pela obra. Dessa forma, sinalizamos que é muito importante a

presença física do livro durante a mediação, como forma de a criança pequena

perceber que é de dentro dele que vem a história que está sendo contada.

Outra ação que amplia as possibilidades de mediação do texto literário é a roda

de leitura, presente nos encontros na bebeteca. Nesse momento ocorrem manuseio

livre dos livros, as crianças brincam, interagem, trocam de livros com seus pares,

conversam, balbuciam, movimentam-se no espaço de aprendizagem. Enfim, exploram

a liberdade de acesso aos livros. Momento que as professoras medeiam a escolha

das obras, fazem leituras individuais para as crianças que as solicitam, conversam

106

sobre as histórias, dando voz às crianças, colocando-se na mesma posição de diálogo

dos pequenos, desafiando-os a fim de ampliar o interesse dos pequenos pelos livros

e a participação dos pequenos nas conversas. As professoras das bebetecas do CEI

Darlan Dotto Wiersinski e do CMEI Padre Lívio Donati propõem encontros em que o

livro seja visto como um brinquedo, que ele esteja nas mãos das crianças, permitindo

experiências aos pequenos que possam alimentar os sentidos. Quando essas ações

de mediação ocorrem de forma contínua com a criança pequena, de vivência e de

presença do livro em suas vidas, esta poderá perceber aos poucos a função social do

livro.

Outro ponto importante evidenciado nesta pesquisa foi que a família é vista

como mediadora de leitura. Isso foi observado na bebeteca do CEI Darlan Dotto

Wiersinski, onde o espaço é aberto para os familiares experimentarem a leitura junto

aos seus filhos e escolherem obras para empréstimo. Em casa, com a família, um

irmão, o pai ou a mãe, propõe-se a mediação por meio de uma brincadeira prazerosa,

sem cobranças, momento no qual são estabelecidos vínculos de afeto, entre o adulto,

a criança e o livro. Na bebeteca do CMEI Padre Lívio Donati, o espaço é aberto às

famílias para visita caso tenham interesse. Há uma ação de leitura que faz uso de

outros objetos propositores, a bolsa literária, um caderno de registro e um

personagem, para que a criança leve o livro para casa e conte com a ajuda da família

para mediar. No dia seguinte, esses objetos precisam retornar para que outra criança

pequena também possa participar da ação mediadora. Essa foi uma ação que a

bebeteca encontrou para ampliar as possibilidades de contato da criança com os

livros.

Envolver a família em um ambiente leitor é uma oportunidade interessante de

propor o encontro com os livros além dos muros do ambiente educacional. Um espaço

de leitura familiar que possibilita à criança pequena imergir na cultura dos livros desde

cedo. Quanto mais cedo as crianças envolverem-se em um ambiente de

aprendizagem que gerem experiências estéticas literárias, maiores serão as

possibilidades de serem adultos leitores. A mediação proposta pela bebeteca é a

oportunidade e o direito do contato da criança com a leitura do literário. A qualidade

dos encontros são a chance de promover experiências sensíveis que poderão

provocar e afetar as crianças por meio das relações de apreciação e fruição com o

livro. O trabalho desenvolvido pelas bebetecas permite uma educação estética das

107

crianças pequenas devido ao fato de elas serem educadas para apreciação do livro

como objeto estético. E a postura sensível das professoras nesses momentos pode

possibilitar que o movimento literário se converta em momentos de troca, de interação,

de afeto e de formação mútua.

Diante desse cenário de bebetecas, parcerias precisam ser estabelecidas entre

o gestor e os docentes da instituição de Educação Infantil. A eficácia do trabalho

exercido em projetos como esse em questão pode ser articulada com estratégias para

organização, recursos, definição, conversas e, acima de tudo, um trabalho de equipe,

que tenha como propósito a mediação do literário com a criança pequena.

Nesse movimento, a pesquisa revelou a ação do professor e do gestor como

fundante para a mediação cultural. A mediação nesse contexto deu-se: a) pela ação

propositora no ambiente da bebeteca, que se refere a oferecer o livro de literatura nos

encontros para as crianças pequenas; b) pela curadoria educativa, que organiza o

espaço; C) pelos objetos propositores, pois vimos que o ambiente de aprendizagem,

que é um espaço que proporciona provocações estéticas, também possibilita

experiências apreciativas e fruitivas com a presença do livro. Vimos que esses critérios

corroboram com a nutrição estética das crianças pequenas, sendo essa a forma como

são alimentados os sentidos das crianças pequenas durante os encontros, com

pensamentos, percepções que levem a reflexões. A ação propositora, a curadoria

educativa, os objetos propositores e a nutrição estética (MARTINS, 2011) são os

elementos que vimos como primordiais na ação do professor mediador.

Trazemos as Aventuras de Alice no País das maravilhas, a qual nos

acompanhou durante toda esta pesquisa. Na obra, Alice estava dormindo e vivendo

um sonho. Como Alice, vivemos uma grande aventura, mas diferentemente da

experiência dela, que vivenciou um sonho, experimentamos a realidade de pesquisar.

Viver a rotina de pesquisadora, às vezes, não é tão fácil assim, mas aprendi a superar

as dificuldades e, com elas, refletir, na busca de vencer os obstáculos. Ser

pesquisadora também proporcionou experiências singulares, quanta curiosidade,

como passou rápido, quantos momentos intensos e estésicos, que fizeram me tornar

uma pessoa melhor, muito mais sensível!

Esta pesquisa não se encerra aqui, ela é só o começo de um movimento em

torno do direito da criança pequena ao livro, para que outros pesquisadores também

possam pesquisar e revelar outros achados voltados à criança pequena. Por fim,

108

buscamos compreender a mediação do literário nas bebetecas e viver essa realidade,

tão intensa, e que pode ser percebida como o sonho curioso e maravilhoso de Alice...

“Acorde, Alice querida!” disse sua irmã. “Mas que sono comprido você dormiu!”

“Ah, tive um sonho tão curioso!” disse Alice, e contou à irmã, tanto quanto podia se lembrar delas,

todas aquelas estranhas aventuras que tivera e que você acabou de ler; quando terminou, a irmã a beijou e disse:

“Sem dúvida foi um sonho curioso, minha querida; agora vá correndo tomar seu chá, está ficando tarde.”

Alice então se levantou e saiu correndo, pensando, enquanto corria o mais rápido que podia, que sonho maravilhoso tinha sido aquele”

Lewis Carroll (2009, p. 146).

Acorde, Francislaine, acorde! O sonho maravilhoso da bebeteca se realiza!

109

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115

APÊNDICES

116

LISTA DE APÊNDICES

Apêndice A: Consentimento de participação dos alunos 117

Apêndice B: Termo de Consentimento Livre e Esclarecimento para os pais 118

117

Apêndice A - Consentimento de participação dos alunos

Eu,____________________________________, RG________________________,

CPF ______________________ abaixo assinado, concordo com a participação dos

meus alunos da Educação Infantil como sujeitos do presente estudo. Fui devidamente

informada e esclarecida sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim

como os possíveis riscos e benefícios decorrentes da participação das crianças

do................................................................................ Foi-me garantido que posso

retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer

penalidade aos nossos alunos.

Itajaí, ........de .....................................de .............

Nome:

________________________________________________________________

Assinatura da diretora do CMEI: _______________________________________

Telefone para contato: __________________________________

118

Apêndice B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecimento para os pais

Convidamos seu filho(a), aluno(a)

do..............................................................................................................................

para participar, como voluntário(a) de uma pesquisa. Após os esclarecimentos e

informações a seguir, no caso de aceitar, pedimos a gentileza de assinar ao final deste

documento. Em caso de recusa ninguém será penalizado de forma alguma.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:

TÍTULO: ___________________________________________________________

MESTRANDA:_____________________________________________________

ORIENTADORA: Professora Dra. Adair de Aguiar Neitzel

PROBLEMA DA PESQUISA

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

Ø Apresentar concepções de bebetecas.

Ø Identificar bebetecas no Brasil.

Ø Discutir sobre os acervos literários das bebetecas do Centro de Educação

Infantil Darlan Dotto Wiersinski e do Centro Municipal de Educação Infantil

Padre Lívio Donati.

Ø Identificar as condições dos espaços físicos das bebetecas dos Centros de

Educação Infantil que são foco desta pesquisa.

Ø Identificar como as professoras interagem com a crianças durante os encontros

literários nos dois Centros de Educação Infantil pesquisados.

CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO

Eu,____________________________________________,RG__________________

____, CPF ______________________ abaixo assinado, concordo com a participação

de meu/minha filho(a) como sujeito do presente estudo. Fui devidamente informado

(a) e esclarecido(a) sobre a pesquisa e os procedimentos nela envolvidos. Foi-me

Como ocorre a mediação do literário nas bebetecas?

119

garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto

leve a qualquer penalidade ao meu/minha filho(a).

Itajaí, ......de ...................................de 2015.

Nome: _________________________________________________

Assinatura do Responsável: ________________________________

Telefone para contato: ____________________________________