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Banco de Artigos Trabalhando com Homens Jovens Elaboração de texto: ECOS/Instituto PROMUNDO/PAPAI/Salud y Género. Apoio: Fundação MacArthur [email protected] Em nossa sociedade as desigualdades entre homens e mulheres são fortemente atribuídas às distinções de sexo. Todos nascemos com algumas características biológicas que são específicas para homens e para mulheres, um exemplo é a capacidade das mulheres de procriar e amamentar. Estas diferenças provocaram divisão de trabalho baseada em padrões masculinos e femininos, apresentando uma tendência praticamente universal de separação da vida social entre esfera pública, associada ao homem, à política e ao mercado de trabalho, e esfera doméstica, privada, associada à mulher e vinculada à reprodução e ao cuidado das crianças. Ou seja, a diferença entre gênero masculino e feminino levou a situações de desigualdade de poder, quase sempre favorecendo os homens. Para reverter esta desigualdade, as ações voltaram-se basicamente para as mulheres, priorizando seu acesso a saúde, educação, crédito, iniciativas de geração de emprego e renda, bens e serviços públicos. No entanto, em muitos aspectos notou-se que esta ação voltada para as mulheres não era suficiente para alterar as relações entre os gêneros. Eram necessárias ações que alterassem a maneira de os homens encararem as mulheres e as atividades socialmente delegadas às mulheres. Os anos 90 foram marcados por uma tentativa de uma nova construção social da masculinidade. Hoje, constata-se que a compreensão das práticas masculinas são fundamentais, por exemplo, para melhorar os resultados sobre a saúde de mulheres e de crianças, sobre a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e no planejamento familiar, no controle da violência de gênero. Tanto assim, que o principal objetivo das políticas de saúde sexual e reprodutiva tem sido o de aumentar a responsabilidade masculina em todas as áreas relativas à formação da família, à reprodução humana e à sexualidade. Essa empreitada não é simples, pois para se obter uma maior participação dos homens é preciso superar as diversas barreiras culturais e ideológicas, que se somam às desigualdades sociais e econômicas. Uma das estratégias que a prefeitura pode adotar é favorecer a criação de programas que trabalhem especificamente com os homens jovens, na perspectiva do relacionamento com as mulheres, e elaborar políticas públicas que considerem suas demandas. NECESSIDADES ESPECÍFICAS Por muito tempo, assumiu-se que os homens adolescentes tinham menos necessidades do que as mulheres adolescentes em termos de saúde. Outras vezes, pensava-se que trabalhar com jovens era difícil, que eles eram agressivos e não se preocupavam com nada. Freqüentemente, eram vistos como violentos - contra outros jovens, contra si mesmos e contra as meninas. Nos últimos anos, houve um aumento considerável no reconhecimento dos custos de alguns aspectos tradicionais Para mais informações ou sugestão de outros artigos entre em contato com o CECRIA. [email protected] .br

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Banco de Artigos

Trabalhando com Homens Jovens

Elaboração de texto: ECOS/Instituto PROMUNDO/PAPAI/Salud y Género. Apoio: Fundação MacArthur [email protected]

Em nossa sociedade as desigualdades entre homens e mulheres são fortemente atribuídas às distinções de sexo. Todos nascemos com algumas características biológicas que são específicas para homens e para mulheres, um exemplo é a capacidade das mulheres de procriar e amamentar.

Estas diferenças provocaram divisão de trabalho baseada em padrões masculinos e femininos, apresentando uma tendência praticamente universal de separação da vida social entre esfera pública, associada ao homem, à política e ao mercado de trabalho, e esfera doméstica, privada, associada à mulher e vinculada à reprodução e ao cuidado das crianças. Ou seja, a diferença entre gênero masculino e feminino levou a situações de desigualdade de poder, quase sempre favorecendo os homens. Para reverter esta desigualdade, as ações voltaram-se basicamente para as mulheres, priorizando seu acesso a saúde, educação, crédito, iniciativas de geração de emprego e renda, bens e serviços públicos. No entanto, em muitos aspectos notou-se que esta ação voltada para as mulheres não era suficiente para alterar as relações entre os gêneros. Eram necessárias ações que alterassem a maneira de os homens encararem as mulheres e as atividades socialmente delegadas às mulheres. Os anos 90 foram marcados por uma tentativa de uma nova construção social da masculinidade. Hoje, constata-se que a compreensão das práticas masculinas são fundamentais, por exemplo, para melhorar os resultados sobre a saúde de mulheres e de crianças, sobre a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e no planejamento familiar, no controle da violência de gênero. Tanto assim, que o principal objetivo das políticas de saúde sexual e reprodutiva tem sido o de aumentar a responsabilidade masculina em todas as áreas relativas à formação da família, à reprodução humana e à sexualidade. Essa empreitada não é simples, pois para se obter uma maior participação dos homens é preciso superar as diversas barreiras culturais e ideológicas, que se somam às desigualdades sociais e econômicas.

Uma das estratégias que a prefeitura pode adotar é favorecer a criação de programas que trabalhem especificamente com os homens jovens, na perspectiva do relacionamento com as mulheres, e elaborar políticas públicas que considerem suas demandas.

NECESSIDADES ESPECÍFICAS

Por muito tempo, assumiu-se que os homens adolescentes tinham menos necessidades do que as mulheres adolescentes em termos de saúde. Outras vezes, pensava-se que trabalhar com jovens era difícil, que eles eram agressivos e não se preocupavam com nada. Freqüentemente, eram vistos como violentos - contra outros jovens, contra si mesmos e contra as meninas. Nos últimos anos, houve um aumento considerável no reconhecimento dos custos de alguns aspectos tradicionais da masculinidade tanto para homens adultos quanto para os rapazes - o pouco envolvimento com o cuidado com as crianças; maiores taxas de morte por acidentes de tráfego, suicídio e violência do que as meninas, assim como o consumo de álcool e drogas. Pesquisas recentes e novas perspectivas chamam a atenção para um entendimento mais apurado de como os rapazes são socializados, do que eles necessitam em termos de um desenvolvimento saudável e o que os educadores de saúde e outros profissionais podem fazer para atendê-los de forma mais apropriada.

A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD, 1994) e a IV Conferência Mundial sobre Mulheres em Beijing (1995) enfatizaram a importância de se incluir os homens nos esforços de melhorar a situação de mulheres e meninas. O Programa de Ação do CIPD, por exemplo, procura "promover a equidade de gênero em todas as esferas da vida, incluindo família e comunidade, levando os homens a assumir sua parcela de responsabilidade por seu comportamento nas esferas sexual e reprodutiva, bem como por

Para mais informações ou sugestão de outros artigos entre em contato com o CECRIA.

[email protected]

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seus papéis social e familiar".Em 1998, a Organização Mundial de Saúde (OMS) decidiu prestar mais atenção às necessidades dos homens adolescentes, reconhecendo que muitas vezes não houve um olhar muito cuidadoso por parte dos programas de saúde sobre as questões específicas dos rapazes. A UNAIDS dedicou a campanha de AIDS 2000-2001 aos homens, incluindo os homens jovens e reconhecendo que o comportamento deles constitui um fator que os coloca em situações de risco, bem como às suas parceiras. É necessário engajá-los de forma positiva tanto na prevenção do HIV/AIDS quanto do suporte para aqueles que vivem com AIDS.As origens de muitos dos comportamentos dos homens e rapazes - a negociação ou não do uso de preservativo, o cuidado ou não dos filhos, a utilização ou não da violência para solução de conflitos com sua parceira - muitas vezes são encontradas na forma como os meninos foram socializados. Por vezes, assume-se que determinados comportamentos são da "natureza do homem" ou que "homem é assim mesmo".

Aplicar a perspectiva de gênero no trabalho com homens jovens significa engajar os homens na discussão e reflexão sobre hierarquia nas relações entre homens e mulheres; significa olhar para as necessidades específicas dos jovens em termos de saúde e desenvolvimento decorrente de seu processo de socialização, ajudando-os a entender por que se sentem pressionados a se comportar desta ou daquela maneira.

Além disso, significa também reconhecer os direitos de cada um, independentemente de gênero, classe, raça, origem étnica, crença religiosa, deficiência física ou mental, idade ou orientação sexual.

PRINCÍPIOS

Algumas experiências bem sucedidas - e que podem nortear ações da prefeitura neste campo - têm partido do princípio de que estes jovens devem ser vistos como aliados - atuais ou em potencial - e não como obstáculos. Os rapazes, ainda aqueles que por vezes tenham sido violentos ou que não tenham demonstrado respeito por suas parceiras, têm potencial para serem respeitosos e cuidadosos com elas, para negociar em suas relações com diálogo, para assumir responsabilidades por seus filhos, e para interagir e viver de forma harmoniosa ao invés de uma forma violenta.

Tanto pesquisas como a experiência de vários grupos têm demonstrado que os rapazes respondem segundo as expectativas que se tem deles. Se esperamos rapazes violentos, se esperamos que eles não se envolvam com o cuidado com seus filhos e que não participem de temas ligados à saúde sexual e reprodutiva de uma forma respeitosa e comprometida, cria-se uma espécie de profecia auto-cumpridora.

É preciso começar a perceber o que os homens jovens fazem de positivo e humano e acreditar no potencial de outros homens jovens de fazerem o mesmo. Se os espaços de troca de idéias e experiências com os homens jovens conseguirem abordar efetivamente os temas de equidade de gênero, sexualidade, prevenção de violência, saúde mental e prevenção da AIDS, pode-se mudar a forma como estes jovens passam a se relacionar consigo mesmos, com outros homens e, principalmente, com as mulheres.

Pode-se, por exemplo, estimular algumas atitudes e comportamentos que levem os jovens a acreditar no diálogo e na negociação em vez de violência para solucionar conflitos nas relações interpessoais; a respeitar as pessoas de diferentes contextos e estilos de vida; a respeitar seus parceiros em suas relações íntimas e que estas sejam baseadas na equidade e no respeito mútuo; a conversar com seu parceiro ou parceiros sobre a prática do sexo seguro; a entender que cuidar de outros seres humanos é também atributo de homens; a acreditar que os homens também podem expressar outras emoções além de raiva, e que também podem buscar ajuda - seja de amigos, seja de profissionais - quando for necessário para questões emocionais, de saúde em geral e também de saúde mental; saibam cuidar de seus próprios corpos e da própria saúde.

PROJETOS EM AÇÃO

No Brasil, há vários grupos trabalhando com o tema da Masculinidade. Um desses projetos, é a série Trabalhando com

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Homens Jovens, uma iniciativa do Instituto Promundo (RJ) em parceria com a ECOS (SP), PAPAI (PE) e Salud y Gênero, uma organização não-governamental mexicana. A proposta contempla um material específico para se trabalhar com homens jovens (cadernos e vídeo) e a elaboração de oficinas a partir de cinco temas: Sexualidade e Saúde Reprodutiva; Da Violência para a Convivência; Paternidade e Cuidado; Razões e Emoções; Prevenindo e Vivendo com HIV/AIDS.

Seja em escolas ou em grupos na comunidade, estas oficinas são desenvolvidas por educadores capacitados para discutir e refletir com os jovens sobre a necessidade de mudar certas atitudes e valores associados à masculinidade e gênero que os tornam mais vulneráveis em relação às doenças sexualmente transmissíveis e à AIDS, à violência e ao uso de drogas, dentre outros. Uma metodologia participativa possibilita uma atuação efetiva dos jovens no processo educativo e permite também que eles se sintam valorizados na medida em que não são colocados na condição de "receptores" de conhecimentos e experiências, mas agentes ativos, envolvidos na discussão, identificação e busca de soluções para seus problemas.

É importante se ter claro que simplesmente trabalhar com homens jovens em grupo não basta. Mudar o comportamento de alguns homens jovens requer mais do que uma participação por um período de tempo determinado em algumas técnicas de grupo. Além disso, toda proposta de ação deve estar comprometida com a reflexão.

Neste sentido, desde 1995 a ECOS investe em estudos, seminários, pesquisas e intervenções sobre gênero e masculinidade, para criar novas concepções e repertórios em torno de práticas sexuais e reprodutivas dos homens, jovens e adultos, pois considera que pequenas mudanças no cotidiano podem contribuir para a construção de relações humanas mais solidárias e prazerosas, promovendo o bem estar individual e coletivo. Em particular, ECOS mantém um espaço de reflexão denominado GESMAP - Grupo de Estudos sobre Sexualidade Masculina e Paternidade, no qual temas e metodologias inovadoras são exploradas. Atualmente o grupo está se dedicando ao tema da violência e vulnerabilidade da juventude.

Fonte: http://www.polis.org.br/publicacoes/dicas/052259.html