avaliação e alfabetização: um intertexto da...3.3 compreendendo a aprendizagem da leitura e da...

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ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: UM INTERTEXTO PUC – SP 2009

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ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ

AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO:

UM INTERTEXTO

PUC – SP

2009

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ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ

AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO:

UM INTERTEXTO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial

para obtenção do título de Mestre em Educação: Currículo.

Orientação: Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti.

PUC – SP

2009

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FICHA CATALOGRÁFICA

Alfabetização e Alfabetização: um intertexto / Produzido por Roseli da Silva Cordeiro

Ruiz – São Paulo: PUC – SP, 2009.

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ROSELI DA SILVA CORDEIRO RUIZ

AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: UM INTERTEXTO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica

de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em

Educação: Currículo.

Orientação: Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti.

DATA DA APROVAÇÃO: _____/_____/_____

Membros da banca:

Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti (Orientadora) ________________________

Pontifícia Universidade Católica – PUC-SP

Prof.ª Dr.ª Silvia Maria Gasparian Colello ________________________

Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo

Prof.ª Dr.ª Solange Vera Nunes de Lima D’Água ________________________

Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP/ IBILCE

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Dedicatória Ao meu pai, José, por me fazer enxergar a beleza que há na simplicidade. À minha mãe, Eulália, pela sabedoria, por me ensinar que é possível voar quando se acredita no sonho. Ao meu esposo, Francisco, por partilhar do meu sonho e não me deixar desistir. Aos meus filhos, Amanda, Beatriz e Matheus, por entenderem meu afastamento e pelo incessante desejo de me verem feliz. À amiga Maria da Graça, em memória, por ter me despertado para o desejo da pesquisa, tendo sido a grande instigadora para uma interrogação no fazer docente.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que contribuíram para a realização

deste trabalho, especialmente:

À Prof.ª Dr.ª Isabel Franchi Cappelletti, por ter

estado ao meu lado em todos os momentos,

utilizando o ideal de avaliação que persegue como

princípio de suas ações.

Às professoras Dr.ª Silvia Maria Gasparian Colello e

Dr.ª Solange Vera Nunes de Lima D’Água, pelas

preciosas sugestões feitas durante o exame de

qualificação, as quais foram de extrema importância

à construção deste trabalho.

Aos alunos da Faculdade de Itapecerica da Serra,

pelas questões trazidas durante o momento em que

estavam sob minha orientação no Projeto Ler e

Escrever.

Aos amigos da Faculdade Nossa Cidade, em

especial à grande amiga Celiza Zachi, pelo carinho e

apoio para que eu seguisse adiante neste projeto.

Aos colegas da FITO e Fac – FITO, pelo apoio nos

diferentes momentos desta pesquisa.

À amiga Maria Helena Romeo Pereira, pelas falas

carregadas de incentivo.

A todos os alunos que durante esta trajetória

torceram por mim.

À colaboração carinhosa da amiga Esther Santos.

Às minhas irmãs, Maria e Adriana, pelo

companheirismo e apoio.

Às professoras que gentilmente me receberam e

contribuíram com a realização deste trabalho.

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RESUMO

A presente dissertação buscou analisar uma prática curricular: avaliação no contexto da alfabetização, compreendendo o intertexto entre as ações de alfabetizar e avaliar. Teve como objetivo principal identificar na prática de professores que atuam na Escola Pública de São Paulo intervenções significativas à aprendizagem da leitura e escrita. Inicialmente, dedicou-se a uma explanação acerca das principais mudanças ocorridas no cenário da educação brasileira, atentando-se à política dos ciclos, às implicações relacionadas às avaliações institucionais, à compreensão do conceito de avaliação formativa e à formação do professor alfabetizador frente às mudanças propostas pelas políticas públicas. Procedeu com um histórico das principais concepções sobre alfabetização, intercalando em cada uma dessas concepções o ideal de avaliação pertinente. Após a explanação teórica, examinou os dados coletados em entrevista semiestruturada propiciando a interpretação das respostas dadas pelos professores entrevistados. A essência do conteúdo apresentado foi analisada à luz de incongruências entre conceitos e práticas, ao mesmo tempo em que foram propostas inovações no campo da avaliação, resguardando-se práticas de um ideal positivista. Dentre algumas das práticas correntes, evidenciou-se a realização da sondagem como instrumento de avaliação e o registro de evolução de escrita em portfólios. Encerrou-se o trabalho com indicação de alguns avanços na prática alfabetizadora, porém com uma crítica a uma ênfase exagerada em uma atividade mecanicista e reducionista como a sondagem. Apontou para a possibilidade de uma avaliação que deverá ser formativa a partir do momento em que assumir o papel libertador da aprendizagem.

Palavras-chave: avaliação; alfabetização; intertexto; sondagem; libertação.

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ABSTRACT

The purpose of the present work was to analyze a curricular practice: the evaluation in the context of alphabetization, regarding the intertext between the actions of alphabetizing and evaluating. The main goal was to identify significant interventions in the learning of reading and writing in the teachers’ practice in São Paulo state public schools. First, there was an explanation about the main changes in Brazilian educational scenario, concerning the ‘cycles’ system, the implications related to institutional evaluations, the understanding of the concept of formative evaluation and the alphabetization teachers education facing the changes proposed by public policies. A historical approach of the main concepts about alphabetization was developed, and the ideal of evaluation of each period of time was described. Next, the data collected by semi structured interview provided the interpretation of the answers that had been given by the teachers. The essence of the content was analyzed in the light of controversy between concept and practice at the same time evaluation innovations were proposed under positivist ideal. Among the current practices, the ’sondage’ and the registration of writing ability evolution in portfolios were highlighted as evaluation tools. Finally, the work pointed some progress in alphabetization practice, but it also criticized the mechanicist and reductionist approach of ‘sondage’. It showed the possibility of an evaluation which must be formative from the moment it assumes the role of liberating learning.

Keywords: evaluation; alphabetization; intertext; sondage; liberation.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Objetivos propostos pelas avaliações SARESP/ SAEB e Prova Brasil.............................................................................

31

Quadro 2 – Prestação de contas sobre a política de bônus...................... 32

Quadro 3 _ Dados dos entrevistados ........................................................ 78

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CBA Ciclo Básico de Alfabetização

CENP Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas

EF Ensino Fundamental

INAF Indicador de Analfabetismo Funcional

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação

PDE Plano de Desenvolvimento da Educação

SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica

SARESP Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo

SEE/SP Secretaria de Estado da Educação de São Paulo

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Sumário

1 INTRODUÇÃO............................................................................ 11

1.1 Contextualizando a temática: o problema em questão.............................. 12

1.2 Objetivos e fontes da pesquisa ................................................................. 16

1.3 Sujeitos da pesquisa e universo pesquisado ........................................... 17

1.4 Estrutura do texto ..................................................................................... 18

2 PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA LEITURA E ESCRITA NO CENÁRIO BRASILEIRO ............................. .........................

20

2.1 As políticas públicas de avaliação ............................................................ 27

2.2 Compreendendo o ato de avaliar ............................................................. 34

2.2.1 Currículo e Avaliação da Aprendizagem ............................................... 35

2.2.2 Avaliação Formativa: Ação Reguladora de Aprendizagem ................... 39

2.3 Formação do professor para a prática de uma avaliação formativa ........ 42

2.4 A Cultura avaliativa: reflexos nos programas voltados ao ensino da leitura e escrita..........................................................................................

45

3 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO: DA CONCEPÇÃO MECANICISTA À SOCIOPSICOLINGUÍSTICA .... .......

49

3.1 Concepção Mecanicista: compreensão da aprendizagem pautada por métodos ...............................................................................

49

3.1.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de um referencial mecanicista ..........................................................................

53

3.2 A consideração dos processos cognitivos de Aprendizagem: concepção pautada nas pesquisas psicogenéticas e psicolinguísticas ........................................................................................

55

3.2.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de uma concepção construtivista.........................................................................

58

3.2.2 A sondagem como prática avaliativa....................................................... 60

3.3 Compreendendo a aprendizagem da leitura e da escrita sob o prisma da sociopsicolinguística ..................................................................................

62

3.3.1 Alfabetização e Letramento ................................................................. 66

3.3.2 Avaliação como prática de libertação ................................................... 70

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4 OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ........... .... 73

4.1 Proposta Metodológica.............................................................................. 73

4.2 Critério de seleção dos sujeitos ................................................................. 76

4.3 Procedimentos de coleta ........................................................................... 77

4.4 Questões propostas: relevância à pesquisa ............................................. 78

5 AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE DO MATERIAL COLETADO.......................................... .......................................

81

5.1 Avaliando o percurso de aprendizagem: uma interpretação de práticas......................................................................................................

81

5.2 Analisando a prática da sondagem............................................................ 89

5.3 Os diferentes instrumentos de avaliação utilizados por professores alfabetizadores..........................................................................................

100

5.4 Avaliação e alfabetização: desvelando os sentidos de uma imbricada relação......................................................................................................

105

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................. ........................... 111

Referências...................................................................................................... 119

APÊNDICE A – QUADRO REFERENTE ÀS RESPOSTAS DAS PROFESSORAS ENTREVISTADAS....................................

125

ANEXO A - INEP / MEC Resultado SAEB....................................................... 141

ANEXO B - Mapa de avaliações...................................................................... 143

ANEXO C - Registros de avaliações............................................................ 148

ANEXO D - Páginas de portifólios ................................................................... 156

ANEXO E – Ficha de Registro de Avaliação................................................... 161

ANEXO F - Relatório de aluno pesquisador ..................................................... 163

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1 INTRODUÇÃO

Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente ‘lido’, ‘interpretado’, ‘escrito’ e ‘reescrito’. Neste sentido, quanto mais solidariedade exista entre o educador e educandos no ‘trato’ deste espaço, tanto mais possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na escola. (FREIRE, 1998, p.109)

O tema na trajetória pessoal da pesquisadora

A expressão de ideias que permeiam a história de vida das pessoas pode ser

representada por meio de palavras. As palavras ganham sentido pois se carregam

de vida. A exposição de uma temática significativa à presente investigação traz o

indicativo de referência a uma vida, uma vida em que o espaço pedagógico se

constitui como universo principal; sendo assim, a existência ganha sentido quando a

prática interrogativa se faz presente.

Os espaços pedagógicos me formaram como pessoa e como profissional. A

leitura desses espaços apontou para uma das questões que mais estiveram

presentes em minha história, a alfabetização.

Fui alfabetizada em uma escola pública, com palavras de um mundo que não

era o meu. Aquelas palavras deram conta de me alfabetizar; porém, hoje questiono

se as mesmas palavras conseguiram ensinar meus colegas. Todos nós formávamos

uma rica dimensão multicultural. Nesse contexto, a escola da década de setenta,

embasada por uma concepção de ensino tecnicista1,não se ocupou em perceber

que a diversidade humana merecia um modelo de escola diferente da escola

formatada para uma mesma realidade social.

A leitura crítica desse primeiro espaço pedagógico formador foi despertada

quando optei por cursar o Magistério. Durante os anos em que estive me ocupando

em construir os primeiros conceitos acerca da profissão docente, vivenciei, em

1 Por tecnicista, Saviani (2008) explica ser essa uma “pedagogia” planejada de modo a dotar-se de uma organização racional capaz de minimizar as interferências subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência. Para tanto, era mister operacionalizar os objetivos e, pelo menos em certos aspectos, mecanizar o processo.

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função do estágio obrigatório, situações de extremo desconforto. Visualizei

professores que atuavam nas séries iniciais com uma postura de desrespeito às

individualidades, definindo seus alunos como os que conseguiam aprender, ou seja,

que se alfabetizavam, e os demais, uma grande maioria, como os que não

conseguiam ultrapassar a barreira da não aprendizagem.

Durante os anos em que cursei o Magistério, mesmo sem ter uma melhor

abrangência teórica, fui movida por um desejo de investigar a prática presente na

alfabetização, principalmente no que se referia à definição sobre os que sabem e os

que não sabem. Não seria possível restringir essa questão apenas ao propósito de

identificação de quem aprendeu e de quem não aprendeu, mas principalmente por

que alguns aprendiam e outros não. Mais tarde, cursando Pedagogia, tive pela

primeira vez uma disciplina relacionada à avaliação. A aprendizagem nessa

disciplina esteve pautada na elaboração de bons instrumentos de avaliação. Mais

uma vez me interroguei sobre como ser possível um instrumento que atendesse ao

propósito de não somente saber medir quem aprendeu, quanto aprendeu, e

despertei para o desejo de compreender o porquê do não aprender.

Na vida profissional, outros textos pedagógicos foram acrescentados à

formação anterior. Como professora, debrucei-me sobre uma nova forma de ensinar

a partir da leitura de pesquisas pautadas por uma concepção de ensino cognitivista,

e vislumbrei a perspectiva de um ensino capaz de atender às diferenças, em que o

foco central passasse a ser o aluno com sua singularidade.

Nesse contexto, vale ressaltar a dificuldade presente para atender à mudança

proposta. Comecei minha trajetória profissional justamente no momento em que

essa nova forma de pensar o ensino estava sendo proposta nas escolas públicas do

Estado de São Paulo. Identifiquei professores perplexos, cheios de dúvidas,

descrentes do ensino da leitura e escrita sem o apoio de uma cartilha. Os alunos não

seriam reprovados, passariam de série para ciclo. Durante esse primeiro momento,

trabalhei com alunos em processo de recuperação. Eram diversos grupos, atendidos

em períodos diversificados, porém o trabalho era o mesmo, pois não sabíamos como

avaliar a aprendizagem desses alunos; logo, não sabíamos como ensiná-los.

Fiquei apenas um ano atuando com os grupos de reforço. Assumi como

professora do Ensino Fundamental em uma Fundação localizada no município de

Osasco; no mesmo período, fui aprovada como professora de Educação Infantil no

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mesmo município. Durante duas décadas fui envolvida por um texto em que a

alfabetização se fez presente. Atuando como professora nos primeiros anos do

Ensino Fundamental e também na Educação Infantil, jamais deixei de me interrogar

sobre como fazer para a concretização de uma escola em que a aprendizagem da

leitura e escrita fosse garantida a todos os alunos, independente do contexto social.

Acompanhei o processo de democratização do ensino no que se referiu à abertura

das portas das escolas a todos; no entanto, esse ensino só seria democrático

quando a escola conseguisse cumprir seu papel principal, o de formar cidadãos

plenamente alfabetizados.

Em dois mil e quatro, tive a oportunidade de coordenar o Centro de Formação

dos Profissionais da Educação do Município de Osasco. Propus-me a ouvir as

queixas dos professores e suas principais dúvidas. Nesse momento, reconheci-me

em suas falas, pois a maior dúvida residia justamente na Alfabetização. Apesar da

mudança nas práticas, o problema se mantinha. Infelizmente, a interligação entre

teoria e prática não conseguia se concretizar.

Ouvindo os professores e retomando minha trajetória profissional, encontrei

para a compreensão deste texto elementos presentes na alfabetização e na

avaliação que não podem ser reconhecidos separadamente. Concomitantemente, as

leituras feitas, as discussões em diferentes contextos, o reconhecimento da

divulgação de resultados negativos de avaliações convergem para o propósito desta

pesquisa.

Alfabetização e Avaliação, nesse sentido, representam dois textos que devem

ser lidos e interligados. Que este trabalho possa contribuir com alguns dos

elementos existentes nesse elo de complexidades presentes nas duas temáticas.

1.1 Contextualizando a temática: o problema em questão

A partir das últimas décadas do século XX, estudos têm comprovado a

importância da avaliação no processo de ensino e aprendizagem. Muitos são os

autores que propõem um repensar sobre a prática avaliativa. No Brasil, através de

diferentes órgãos e diferentes instâncias administrativas, é lançada ao professor

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uma série de propostas de alteração no trabalho pedagógico, transformando a

escola e, principalmente, trazendo um grande questionamento: o que fazer?

Em geral, o professor tem à sua disposição modelos teóricos de avaliação, evolução histórica das diferentes concepções, enfim, quadros conceituais que desestabilizam o seu credo, mas não orientam o seu fazer. Abalado em sua crença, deixa de praticar a avaliação que conhece e não tem nada para colocar no lugar. (CAPPELLETTI, 2005, p117)

Nesse sentido, a proposta deste trabalho, ao sugerir um intertexto entre

avaliação e alfabetização, será o levantamento de indicadores relacionados aos

problemas que enfrentam professores da rede pública ao fazerem uso da avaliação

para uma intervenção significativa à aprendizagem.

No que se refere à Alfabetização, compreende-se uma série de

condicionantes desse processo. Ensinar a ler e escrever representa muito mais do

que ensinar as letras, ensinar a técnica de juntá-las para formar as palavras. Envolve

compreender que tal processo se insere em uma situação plena de complexidade.

Conclui-se que, à natureza complexa do processo de alfabetização, com suas facetas psicológica, psicolinguística, é preciso acrescentar os fatores sociais, econômicos, culturais e políticos que condicionam. (SOARES, 2004, p23)

Soares (2004) explicita a importância de o professor assumir uma postura

política diante das implicações da alfabetização. Dessa forma, evidencia-se a

necessidade de se especificar uma intenção ao fazer pedagógico; com a clareza

dessa intenção é que se poderá tratar da avaliação a serviço da aprendizagem. O

entendimento da avaliação com o propósito de ajustar a aprendizagem representa

reconhecer, conforme cita Colello (2007), a teia presente no processo de construção

do conhecimento e nas relações com as metas educativas e a prática escolar.

Partindo do princípio de que o processo pedagógico educativo ocorre na

interação entre professor e aluno, cabe a esse profissional, ao reconhecer seu

“inacabamento”, desenvolver-se enquanto trabalhador social, não se colocando em

uma opção de pseudoneutralidade. “Não posso ser professor se percebo cada vez

melhor que, por não poder, ser neutra, minha prática exige de mim uma definição.

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Uma tomada de posição Decisão. Ruptura” (FREIRE, 1998, p15). Ao professor

alfabetizador, tendo em vista o que coloca Freire (1998), cabe uma posição

ideológica. No caso da presente pesquisa, a posição tomada se refere à prática de

avaliação. A ética dessa avaliação deve ser condição para um trabalho diferenciado

em que se possa perceber o momento vivido pelos alunos na aprendizagem, e

então, oferecer situações significativas para a superação das dificuldades.

Como afirma Hadji (2001), a avaliação em um contexto de ensino tem o

objetivo legítimo de contribuir para o êxito do ensino, isto é, para a construção

desses saberes e competências pelos alunos.

Torna-se evidente que a prática de uma avaliação apenas formativa não

resolverá todos os problemas da atuação docente de professores alfabetizadores;

no entanto, este trabalho se ocupa em desvelar entraves colocados pela falta de

subsídios teóricos no processo de avaliar, principalmente quando a prática não se

remete concretamente com abordagens reflexivas de uma práxis transformadora.

Nesse sentido caminha a concepção batizada por Cortella (2006) de otimismo

crítico2. Por meio da compreensão dessa concepção, a escola, sem cair na noção de

neutralidade, é colocada como um instrumento de mudança que, através da prática

construída coletivamente, cria o novo espaço pedagógico.

Muitas dúvidas transitam no universo escolar; no entanto, a reflexão sobre

uma atuação competente que favoreça a dinâmica escolar torna-se cada vez mais

necessária em uma sociedade democrática na qual a apropriação da leitura e escrita

se configura como elemento principal na formação de um ser consciente e capaz de

ler o mundo.

A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais se ‘desvela’ a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta mesma razão, a conscientização não pode existir fora de práxis, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é a inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. Exige que os homens criem sua própria existência

³ Otimismo Crítico é a concepção que indica a natureza contraditória da escola, em que tudo e nada poderá ser feito.

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com um material que a vida lhes oferece (...). A conscientização não está baseada sobre a consciência, de um lado, e o mundo, de outro; por outra parte; não pretende uma separação. Ao contrário, está baseada na relação consciência-mundo. (FREIRE, 1980 Apud, SAUL, 2006, p.55)

Acreditar na educação é acreditar na possibilidade de construção de uma

escola em que se possam encontrar educadores capazes de avaliar para intervir, e

não apenas de tecer julgamentos sobre quem sabe e quem não sabe.

A escola como está, tendo toda uma trajetória histórica com indicação teórica

de construção de um currículo que atenda à aprendizagem de crianças oriundas de

diferentes camadas sociais com uma particular expressão linguística, não está

conseguindo alterar de forma significativa um cenário de fracasso.

Acompanha-se uma grande discussão acerca de mudanças no cenário do

ensino da leitura e escrita. Da mesma forma, em paralelo, as discussões são

também intensas sobre avaliação. Relacionar avaliação e alfabetização será o

grande desafio da presente pesquisa. A pesquisa envolve duas vertentes de

extrema relevância no campo educacional: alfabetização e avaliação.

Para tanto, tendo em vista a proposta de pesquisa relacionada anteriormente,

a problemática percebida para a presente investigação define-se a partir da seguinte

pergunta:

• A avaliação realizada por professores que atuam nas primeiras

séries do Ensino Fundamental está atendendo a um pr opósito

formativo, indicando intervenções significativas na aprendizagem da

leitura e escrita?

1.2 Objetivos e fontes da pesquisa

Esta pesquisa tem por objetivos discutir questões inter-relacionadas ao

universo da escola pública, compreendendo a ação do professor alfabetizador, tendo

em vista verificar como a avaliação realizada por esses professores tem favorecido,

ou não, a aprendizagem da leitura e escrita, bem como analisar criticamente a

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prática da avaliação que permeia a prática alfabetizadora, tendo como critério de

análise a avaliação formativa.

Para o alcance dos objetivos descritos, dados foram coletados a partir de

pesquisa qualitativa realizada em três escolas da rede pública estadual. A

metodologia de pesquisa utilizada foi a entrevista semiestruturada.

Os eixos de relevância para esta investigação envolvem:

• Avaliações utilizadas durante o período de alfabetização.

• Intervenções realizadas durante o processo de ensino e aprendizagem.

• Mecanismos válidos no atendimento à diversidade dos grupos.

O referencial teórico tem como base a análise crítica e reflexiva de textos dos

autores que tratam da avaliação formativa, como Perrenoud (1999), Hadji (2001),

Capelletti (2001, 2002, 2005), Abramowicz (2001) e Saul (2006). Para os estudos da

alfabetização, necessários ao intertexto com a avaliação, são explorados textos de

autores, como Ferreiro (1989, 1993, 2001), Ferreiro; Teberosky (1999, 2000),

Mortatti (2000), Weisz; Sanches (2002), Colello (2004, 2007), Soares (2003, 2004),

Franchi (2008), pois são alguns dos autores que têm marcado a história da

alfabetização brasileira.

1.3 Sujeitos da pesquisa e universo pesquisado

No momento da realização da pesquisa, as escolas da rede pública do Estado

de São Paulo representavam um universo propício para a investigação. O período

coincidiu com a participação da pesquisadora, como professora orientadora no

Projeto Ler e Escrever3. Essa participação desencadeou relevantes análises para

ratificar a justificativa da pesquisa.

A relevância citada anteriormente se deveu ao contato com alunos do ensino

superior que atuam como pesquisadores nas escolas públicas estaduais,

3 Desde o início de 2007, formou-se na Secretaria da Educação de São Paulo um programa voltado à recuperação da aprendizagem das séries iniciais, o Programa Ler e Escrever.

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acompanhando o trabalho de professores alfabetizadores. Participando como

professora orientadora em uma instituição de ensino superior, foi possível um

conhecimento maior acerca do propósito do referido projeto4.

O trabalho proposto aos alunos como pesquisadores, o qual necessitaria de

uma orientação específica, foi uma investigação didática. Para tal investigação, fora

indicado um referencial teórico embasado em teorias cognitivistas 5 .

Durante o período de orientação aos alunos pesquisadores, muitos relatos se

referiam à prática avaliativa dos professores alfabetizadores. Nesse sentido, a

temática em questão passou a se constituir como elemento primordial de

investigação, a qual poderia se pautar pela identificação na avaliação, realizada por

professores alfabetizadores, de elementos norteadores da ação que deveriam

desenvolver durante as intervenções ao processo de aprendizagem.

Participaram da presente pesquisa, por meio das respostas à entrevista semi-

estruturada, oito professoras de três escolas públicas estaduais de São Paulo,

localizadas nos municípios de São Paulo e Carapicuíba.

1.4 Estrutura do texto

A presente dissertação está organizada em seis seções. Na primeira,

Introdução, são apresentados os motivos que justificam a relevância da pesquisa.

Na seção dois, é apresentado o processo de avaliação da leitura e escrita no cenário

4 O histórico do Programa Ler e Escrever, apresentado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo por meio da Fundação para o Desenvolvimento da Educação, indica que o programa está incluído entre as ações destinadas ao cumprimento, até 2010, das 10 metas do plano para a Educação lançado pelo governo paulista em agosto de 2007. O programa promove a capacitação de educadores conjugada às diretrizes, conceitos, formato e materiais de apoio que foram especialmente desenvolvidos para as ações da iniciativa, relacionados à 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries do EF. Para a 1ª série do EF, o Ler e Escrever instituiu o Projeto Bolsa Escola Pública e Universidade na Alfabetização, conhecido como Bolsa Alfabetização, que permite a atuação de um aluno pesquisador nessas classes. Além disso, há o material impresso de apoio específico para a série, e a constante formação dos educadores envolvidos. Os alunos pesquisadores são universitários dos cursos de graduação ou pós-graduação de Pedagogia e Letras, indicados por instituições de ensino superior conveniadas. Eles contribuem com os professores regentes das classes de 1ª série, auxiliando no atendimento às crianças em processo de alfabetização, na organização das aulas e na assistência aos alunos. (SÃO PAULO, 2008) 5 Teorias cognitivistas são teorias de ensino pautadas por um referencial teórico piagetiano. A aprendizagem obedece a diferentes etapas individuais. Para Mizukami (1986), a referida abordagem implica dentre outros aspectos, estudar a aprendizagem como sendo mais que um produto do ambiente, das pessoas ou de fatores que são externos ao aluno.

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brasileiro – fazendo um registro da escola pública seriada e da transição para a

escola em ciclos. Nessa seção, abre-se a discussão sobre a progressão continuada,

principalmente por ter sua indicação originada nos ciclos de alfabetização. Outro

diálogo explorado com diferentes autores analisa a existência de um estado

avaliador e a implantação de algumas políticas públicas que não oferecem formação

ao professor para atuar como avaliador, tendo em vista uma prática de intervenções

significativas à aprendizagem da leitura e da escrita.

Na seção três, é apresentado o referencial teórico de avaliação e

alfabetização. São indicadas diferentes concepções de ensino da leitura e escrita,

identificando nos diferentes momentos o referencial teórico norteador da prática. Em

cada uma das concepções relatadas, são descritas as práticas avaliativas que

permeiam as ideias de ensino e aprendizagem. Essa descrição oferecerá ao leitor

um maior conhecimento sobre a tríade Avaliar – Ensinar – Aprender. O texto trará

uma ênfase à prática da sondagem, principal encaminhamento de avaliação

proposto aos professores da rede pública estadual de São Paulo.

Na seção quatro, são descritos os caminhos metodológicos da pesquisa. São

indicados os procedimentos para coleta dos dados analisados. Nessa seção, são

apontadas as dificuldades para a realização da investigação, além da descrição

pormenorizada da opção pela pesquisa qualitativa e a justificativa das questões

norteadoras que comporão o referencial de análise.

Na seção cinco, é realizada a análise do material coletado e categorizado à

luz da interpretação dos conteúdos existentes na fala das professoras entrevistadas.

O procedimento de análise será complementado com materiais coletados em campo

durante o período de investigação. Todos os dados e informações coletados e

organizados serão interpretados no diálogo com a teoria requerida pelas questões

problematizadas a partir da análise. Na seção seis, são tecidas as considerações

finais.

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20

2 PROCESSO DE AVALIAÇÃO DA LEITURA E ESCRITA NO CENÁRIO BRASILEIRO

A questão que coloca a nós é lutar em favor da compreensão e da prática da avaliação enquanto instrumento de apreciação do que-fazer de sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo. Da libertação e não da dominação. (FREIRE, 1998)

De sistema seriado à organização em ciclos

Na educação brasileira, o uso do termo “ciclo” designando a política de “não

reprovação” surgiu em 1984, com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização

(CBA) na rede estadual de São Paulo (MAINARDES, 2007).

O Ciclo Básico reunia os dois primeiros anos do ensino fundamental, eliminando a reprovação na passagem do 1º para 2º ano, com o objetivo de proporcionar aos alunos mais tempo para aprendizagem e ainda reduzir as taxas de reprovação e evasão. (MAINARDES, 2007, p.67)

Com o objetivo de proporcionarem mais tempo para a aprendizagem, os

ciclos foram adotados com o propósito de permitirem que cada aluno avançasse ao

seu ritmo, usando para tanto o tempo que lhe fosse necessário. Dessa forma, a ideia

de um ensino seriado, programado com tempo único, seria posta de lado.

Em um processo seriado, os diferentes ritmos são submetidos a um único

tempo para aprender. Durante esse tempo determinado, os estudantes devem

dominar o que é ensinado a eles, caso contrário, são reprovados, devendo iniciar

novamente a trajetória de aprendizagem, uma vez que os testes, provas, ou seja, as

avaliações propostas pela escola indicam o fracasso frente às expectativas do

ensino.

Fez-se necessário, então, contrapondo-se ao sistema seriado, o rompimento

com o padrão dessa sistemática de avaliação, como aponta Abramowicz (2001),

uma avaliação marcada pela injustiça da seletividade. O enfrentamento desse

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desafio representou mudar o sistema para não permanecer na trilha da pedagogia

da reprovação.

A reprovação produzida sistematicamente é pensada para peneirar, selecionar, excluir, impossibilitando, aos alunos, avanços aos níveis mais elevados de escolaridade. Nesse sentido, uma sistemática de ciclos, intentando pôr fim à estruturação por séries, buscaria combater a trágica situação de reprovação que vivemos, em uma de suas vertentes. (ABRAMOWICZ, 2001, p37,38)

Vale nesse contexto apontar para o quadro apresentado anteriormente à

implantação dos ciclos. Até os anos 80 do século XX, só o aluno considerado

“alfabetizado” era promovido para a 2ª série. Os dados divulgados pelo Ministério de

Educação, conforme cita Soares (2004), indicam que no Brasil, de cada mil crianças

que ingressaram na 1ª série em 1963, apenas 449 passaram à 2ª série em 1964.

Em 1974, dez anos depois, de cada mil crianças que ingressaram na 1ª série,

apenas 438 chegaram à 2ª série em 19756.

Nesse sentido, a análise do fracasso escolar no que se refere à

aprendizagem da leitura e escrita em uma escola pública seriada indicava um alto

índice de reprovação e, consequentemente, um alto índice de evasão escolar.

A insustentável situação de fracasso escolar e as altas taxas de

analfabetismo, sobretudo, entre crianças pobres brasileiras, apontaram para a

necessidade de uma nova visão do papel da escola pública.

No final do regime militar, o Ciclo Básico emergiu como uma política

inovadora no contexto da redemocratização do país. Em dez dos Estados

brasileiros, com a vitória dos governos nos Estados como São Paulo, Minas Gerais e

Paraná, grupos políticos tidos como progressistas assumiram cargos nas instâncias

públicas; com isso, firmou-se a implantação de mudanças educacionais, como a

política de educação em ciclos.

6 Dados recentes apresentados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, (BRASIL, 2007) mostram que a média do Brasil está abaixo do nível satisfatório que vem ocorrendo em todos os ciclos de avaliação. Em 1995, a média estava a 12 pontos distante dos 200 que se configuram como média mínima satisfatória na escala do SAEB. Em 2003, a 31 pontos. Em 2007, 2,1 milhões das crianças de 7 a 14 anos de idade frequentavam escola e não sabiam ler e escrever (ANEXO A). “Em 2007, o Inaf revela que entre a população brasileira de 15 a 64 anos, 32% são analfabetos funcionais”. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2007)

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Conforme cita Mainardes (2001), o Ciclo Básico nesses Estados constituía em

eliminar a reprovação no final da 1ª série, ampliando o período de alfabetização e

assegurando a continuidade desse processo; consequentemente, a mudança do

enfoque da avaliação deveria centrar-se no processo de aprendizagem, indicando o

percurso do aluno e dando informações sobre as necessidades de reforço e

atendimento de dificuldades específicas.

Além disso, visava oportunizar estudos complementares para alunos que

encontrassem dificuldades de apropriação dos conteúdos, capacitando os

professores que atuavam nessa proposta, alterando a concepção e a prática de

alfabetização pela incorporação de teorias mais avançadas da Psicolinguística,

Sociolinguística, Linguística e Psicologia. Dessa forma, a política dos ciclos

possibilitaria muito mais que a permanência dos alunos no interior da escola, mas

um tratamento pedagógico adequado. A avaliação, apesar de não constar nos

documentos oficiais, já se apresentava, em tese, de maneira mais formativa e

interativa.

O Ciclo Básico de Alfabetização tornou-se uma referência para a expansão do

ciclo para os demais anos do Ensino Fundamental nos anos 1990, bem como para a

incorporação dos ciclos como uma das modalidades de organização do ensino na

LDB de 1996 (MAINARDES, 2007). Os resultados obtidos a partir da implantação

dessa política, após análise de diferentes textos referentes ao resultado do

desempenho de alunos do Ciclo Básico, constataram que, apesar dos esforços, “a

reprovação não foi eliminada no final do ciclo, e a promoção automática trouxe

novas dificuldades, novos desafios a serem enfrentados” (MAINARDES, 2001, p.47).

Dados importantes são registrados e transcritos por Mainardes (2007):

Antes dessa política, a retenção que, na 1ª série, era de 45% e 50%, em São Paulo e Minas Gerais, respectivamente, caiu para 20% após a implementação da proposta No segundo ano do ciclo, a retenção que era de 30% subiu para 40 a 45% a sua implantação. (MAINARDES, 2007, p.84)

A necessidade de haver uma alteração no cenário da educação brasileira,

impulsionando medidas como a implantação do Ciclo Básico, requeria um maior

aprofundamento e reflexão sobre as possibilidades efetivas de sucesso escolar,

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possibilidades estas dependentes das políticas públicas e das concepções de

educação que estavam na base dos ciclos.

Ao se pensar em uma proposta de ciclos e de progressão continuada, busca-se garantir uma aprendizagem significativa sem a sombra constante do medo da reprovação. Renuncia-se a fazer uma seleção excludente que mantém os alunos sob ameaça, em um contrato didático de relações conflituosas, de agressão, buscando-se uma relação de cooperação. (PERRENOUD, 1993, p.176)

A política de ciclos, contrariando a lógica da escola seriada e sua avaliação,

nem sempre poderia ser implantada atendendo a um desejo de mudança e

qualidade educacional. Mesmo sendo implementada com o objetivo transformador,

encontrou resistências e dificuldades na sua organização.

O Projeto Ciclos de Aprendizagem, implantado no município de São Paulo

pelo então secretário Paulo Freire, configurou-se como uma versão progressista dos

ciclos no Brasil. Mesmo com a intenção clara no atendimento às propostas de uma

educação progressista, sofreu entraves, como afirma Cortella (2005):

Quais foram os grandes entraves? Primeiro: dificílimo mudar na rede uma compreensão que estava já instalada. Num momento inicial, os próprios pais reagiam. Tal como fazem hoje, os pais chegavam e conversavam comigo também: ‘Professor, agora que não tem mais nota, como é que eu vou saber como meu filho está?’ Eu dizia: ’E antes, você sabia?’ Ele dizia: ‘Não. Eu sabia se era vermelha ou azul no boletim’. Eu: ‘Veja O boletim é como um termômetro. O termômetro só indica se você tem febre ou não. Ele não diz o que você tem. (CORTELLA 2005, p.55)

Quando se analisam esses entraves, pode-se constatar a dificuldade na

implementação de mudanças decorrentes das políticas educacionais.

A não constatação de um resultado positivo na aprendizagem da leitura e

escrita, a partir da desestruturação do sistema seriado convencional, remete a

identificar que as ações implementadas na organização do ensino em ciclos

requeriam das políticas públicas maiores investimentos: a valorização dos

profissionais da educação, financiamento de pesquisas, implementação de projetos

de formação contínua, procedimentos de avaliação dos processos e da organização

curricular dos resultados. Havia, portanto, a necessidade de um compromisso efetivo

por parte dos gestores em garantir as condições adequadas e necessárias.

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No âmbito do sistema de ensino, a necessidade da avaliação permanente se

justifica a partir do momento em que os resultados possam servir para atuações

consistentes em um planejamento amparado por projetos governamentais. “O que

vale é que qualquer projeto que venha nessa direção não atire para fora da história

uma das ideias mais centrais que se deve ter no cotidiano do trabalho educacional”

(CORTELLA, 2005, p.57).

A implantação do Ciclo Básico de Alfabetização e sua expansão trouxeram

avanços para outros segmentos da escola ao romperem com o padrão de uma

sistemática de avaliação marcada pela injustiça da seletividade. No entanto,

acompanha-se no cenário brasileiro uma série de críticas da sociedade no que se

refere à aprendizagem da leitura e escrita pelos alunos das escolas públicas.

Nesse sentido, ressalta-se que mudanças na avaliação são mudanças na

escola. “Mudar a avaliação significa, provavelmente mudar a escola”, como afirma

Perrenoud (1993). Novas propostas devem ser lançadas na efetivação de uma

qualidade educacional. Estabelecer a continuidade no processo de aprendizagem

aponta para uma mudança na concepção de avaliação vigente na escola, que se

prende, fundamentalmente, a padrões de aprovação e reprovação. Mais que isso,

uma proposta que abre a possibilidade de flexibilização na organização curricular,

nos critérios de agrupamentos de alunos e nos métodos e conteúdos de ensino

exige uma avaliação de outro tipo, de dimensão educativa, capaz de valorizar os

progressos dos alunos, podendo permitir ao professor e à escola a observação e

atuação específica para garantia de aprendizagem.

Dessa forma, a crítica à proposta dos ciclos sobre uma não avaliação é

improcedente. O fato de a proposta ter como princípio a ideia de não reprovação

carrega a falsa concepção de que não deve haver também a avaliação, na cultura

da docimologia7, da medida que aprova / reprova, vigente em nosso sistema de

ensino.

Freitas (2003), em sua análise sobre ciclos, seriação e avaliação, aponta para

a necessidade de apoiar a implantação dessa política, uma vez que não elimina a

avaliação formal, muito menos a informal, mas redefine o seu papel e associa a

avaliação a ações complementares, como por exemplo, reforço ou recuperação

7 Docimologia se insere em um contexto de avaliação entendida como instrumento de medida. Baseia-se em um princípio não aparente de causalidade; é definida como o estudo dos exames.

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paralela. “As possibilidades efetivas de maior sucesso dependem das políticas

públicas e das concepções que estão na base dos ciclos, as quais, por sua vez, são

limitadas pela realidade da organização social vigente” (FREITAS, 2003, p.51).

Ações complementares na implantação dos ciclos devem ser acompanhadas

da formação consistente de professores atuantes e diretamente responsáveis pelo

trabalho pedagógico, e de providências estruturais para que o professor seja

acompanhado nas suas dúvidas, inquietações, uma formação contínua. Além disso,

requerem uma gestão competente na condução de um projeto político pedagógico

compromissado com as necessárias mudanças educacionais.

A proposta pedagógica elaborada e apresentada ao conjunto de professores

como alternativa de alfabetização durante a década de 1980 em nosso contexto

pautou-se, principalmente, em um referencial teórico com formulações de Ferreiro e

Teberosky (1999), que na época causaram profundas resistências. Assim como uma

nova forma de avaliar os alunos, essa nova forma de conceber a alfabetização tinha

em vista promover uma ruptura qualificada nas práticas tradicionais, rompendo com

o uso das cartilhas, substituindo uma escrita escolar por uma escrita social.

A mudança de paradigma vinha de uma escola tradicional arcaica, em que a

reprodução mecânica imperava, para uma escola em que a proposta de

aprendizagem requeria uma mobilidade de saberes e fazeres, um tempo histórico,

político, social e cultural, exigindo predisposição dos envolvidos e um processo de

formação contínua.

A passagem do ensino seriado para os ciclos iniciados pela implantação do

Ciclo Básico de Alfabetização registra resultados poucos animadores.

O problema permanece, a diferença é apenas que, hoje, os alunos não rompem a barreira do 1º ciclo, que substituiu a 1ª série como etapa de alfabetização, ou no caso de sistemas que optaram pela progressão continuada, passam ao ciclo seguinte ainda não alfabetizados.(SOARES, 2004, p.14)

Por mais que os estudos divulgados pelo Sistema de Avaliação Básica do

Ministério de Educação (MEC) apontem para dados alarmantes, não se pode

concluir que isso se deva exclusivamente aos ciclos.

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De fato, o que o ciclo (e a progressão continuada) faz é manter o aluno que não sabe ler na escola, enquanto no regime seriado ele é ‘expulso’. Dessa forma, na escola seriada ele não era detectado nas séries mais avançadas. Entretanto, agora, permanecendo na escola, esse aluno fica dentro do sistema denunciando a qualidade do mesmo. (FREITAS, 2003, p.79)

A cultura classificatória presente na escola brasileira resiste a uma

transformação. Vários estudos têm buscado a compreensão sobre a dificuldade na

implantação da política de ciclos. Sousa e Barreto (2004) fazem um estudo

detalhado dessa questão. Ao registrarem a análise acerca do tema, as

pesquisadoras evidenciam a transformação da avaliação como condição de tornar

realidade uma perspectiva de escola inclusiva, como está posta em uma política de

ciclos.

Tais mudanças devem ocorrer tendo em vista a existência de ações que se

mostrem capazes de promover a qualidade de ensino, como aponta Mainardes

(2001):

[...] sem o esforço conjunto dos gestores do sistema educacional, das unidades escolares educadores e demais profissionais envolvidos, vinculados aos esclarecimentos feitos aos pais e alunos, mudanças tão radicais como a organização em ciclos poderão fragilizar, ainda mais, a estrutura e o funcionamento das escolas, causando prejuízos muito sérios aos processos de aprendizagem e constituição de sujeitos. (MAINARDES, 2001, p.51)

A permanência da prática pedagógica da escola seriada reproduzida na

escola em ciclos faz acreditar em um distanciamento entre a real intenção da

implantação da política e a viabilização de elementos cruciais, como a prática

avaliativa. Há diversos aspectos que podem ser apontados justificando a dificuldade

na implantação de uma política de ciclos, embora a tendência dos estudos seja

evidenciar que pouco se caminhou na efetiva implantação da proposta. Há

referências de aspectos positivos, como a eliminação do rótulo de repetente ao

aluno, como também uma maior permanência desse aluno na escola.

O desafio de se construir uma escola em que o objetivo principal não seja

apenas o de aprovar ou reprovar continua, principalmente tornando uma verdade

colocar a avaliação a serviço da qualidade de ensino que esteja voltada à promoção

de todos.

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2.1 As políticas públicas de avaliação

A leitura sobre a evolução que os alunos apresentam na educação brasileira

torna-se possível a partir do momento em que o Estado faz uso de instrumentos

coerentes de avaliação. Ressalta-se, no entanto, que o uso de uma política pública

de avaliação faz sentido quando diante do resultado apresentado, desenvolve-se um

programa de atendimento aos problemas que possam ser identificados. Partindo do

pressuposto de que avaliar indica o propósito de atender ao que se coloca no retrato

de uma aprendizagem, na política proposta pelo Estado não deveria ser diferente.

No final dos anos oitenta, teve início a preparação de um exame que tivesse

como foco conhecer melhor a educação brasileira. Foi a partir do ano de 1991 que o

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) obteve informações

sobre o desempenho dos alunos brasileiros por meio do Sistema Nacional de

Avaliação da Educação Básica (BRASIL, 2007).

A cada dois anos, é realizado o levantamento de dados do SAEB, os quais

são obtidos com a aplicação de provas para os alunos e de questionários para

alunos, professores e diretores.

Em 1995, o SAEB passou por uma reestruturação metodológica possibilitando

a comparação dos desempenhos ao longo dos anos. Desde a primeira avaliação,

foram fornecidos dados sobre a qualidade dos sistemas educacionais do Brasil como

um todo, das regiões geográficas e das unidades federadas (Estados e Distrito

Federal).

O documento, divulgado a cada dois anos, apresentando os resultados

obtidos desencadeia a oferta de subsídios para a formulação, reformulação e

monitoramento de políticas públicas, contribuindo dessa maneira para a

universalização do acesso e a ampliação da qualidade e da equidade da educação

brasileira.

Vale ressaltar que tal publicação, apesar dos objetivos apontados pelo

instituto de pesquisa (INEP), desconsidera fatores importantes para a análise dos

resultados.

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O SAEB publica basicamente as médias do desempenho dos alunos, estratificadas por diversos fatores, como, por exemplo, a rede de ensino. Esse tipo de análise realizada até o momento desconsidera o fato de que vários fatores agem ao mesmo tempo, e, portanto, esses deveriam ser estudados conjuntamente, para que o possível efeito de suas combinações seja detectado. (SOARES; CESAR; MAMBRINI, 2001, p.122)

No entanto, a leitura a ser feita no presente trabalho, apesar de não

considerar elementos conflitantes na análise dos resultados oficiais, encaminha-se

para a compreensão da situação em que se encontram hoje as escolas brasileiras

em relação às expectativas positivas à aprendizagem da leitura e escrita.

Pesquisas realizadas indicam uma diminuição da evasão dos alunos no

Ensino Fundamental e uma redução dos índices do analfabetismo no país.

Entretanto, a última pesquisa realizada pelo SAEB aponta números alarmantes de

indivíduos que não dominam os processos de leitura e escrita em situações reais.

As medidas do SAEB são apresentadas em escala de proficiência, que varia

entre 0 e 500. Ao se observar a tabela apresentada pela Assessoria de

Comunicação Social do INEP com o resultado do exame de proficiência de

Português dos alunos de escolas urbanas, é possível identificar uma média igual a

175,52, o que representa por volta de 35% na escala prevista para indicar a

proficiência em Língua Portuguesa (ANEXO A).

Gonçalves (2006), em seu artigo sobre a avaliação realizada pelo SAEB em

2001, apresenta elementos de extrema relevância sobre o estágio crítico do

aprendizado da leitura e escrita.

De acordo com os dados do SAEB, na avaliação realizada em 2001 (divulgada em 2003), apenas 4,48% dos alunos de 4ª série possuiriam um nível de leitura adequado ou superior ao exigido para continuar seus estudos no segundo segmento do Ensino Fundamental. Uma parte deles apresentaria um desempenho situado no nível intermediário: 36,2%. Segundo o SAEB, este percentual estaria “começando a desenvolver as habilidades de leitura, mas ainda aquém do nível exigido para a 4ª série”. A grande maioria se concentra, então, nos estágios mais elementares de desenvolvimento: 59% dos alunos da 4ª série apresentariam acentuadas limitações em seu aprendizado da leitura e escrita. Assim, percebemos que cerca de 37% dos alunos estariam no estágio crítico de construção de suas competências de leitura (dificuldades graves para ler) e 22% estariam abaixo desse nível, no estágio muito crítico (não saberiam ler). (GONÇALVES, 2006)

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Comparando-se os dados citados por Gonçalves (2006) com os resultados

divulgados pelo INEP em 2005, percebe-se uma melhora insignificante dos

resultados para se acreditar em uma evolução da aprendizagem.

A análise do desempenho dos alunos também é realizada por meio da Prova

Brasil. A primeira edição desse exame foi realizada em novembro de 2005.

Atualmente, esse exame é considerado a principal avaliação do rendimento das

escolas públicas do país. A criação desse novo recurso de avaliação, conforme

consta em seu histórico, deveu-se à necessidade de tornar a avaliação mais

detalhada, um complemento à avaliação já feita pelo SAEB. A Prova Brasil é

aplicada a todos os alunos; por essa razão, expande o alcance dos resultados,

oferecendo dados a todos os Estados, Municípios e escolas participantes.

Prova Brasil e SAEB passaram a ser operacionalizados em conjunto desde

2007. O INEP, ao relatar o histórico dos dois instrumentos, afirma se tratarem de

duas avaliações complementares; uma não implicou a extinção da outra. As médias

do SAEB e da Prova Brasil não vão de zero a dez para não serem confundidas com

as avaliações tradicionais. As médias são apresentadas em uma escala de

desempenho que vale de 0 a 500, possibilitando a descrição, em cada nível, das

competências e habilidades que os estudantes de 4ª e 8ª séries do Ensino

Fundamental e 3ª série do Ensino Médio demonstram ter desenvolvido.

A Prova Brasil avalia o conhecimento de estudantes brasileiros em Língua

Portuguesa e Matemática. Até a sua última aplicação, a pontuação alcançada pelas

escolas que participaram dessa avaliação não foi adequada em nenhum dos itens

avaliados.

Com relação aos resultados apresentados pelo SAEB, a diferença é muito

pequena, comprovando que o país está longe de atingir padrões estipulados como

sendo de qualidade no que se refere à aprendizagem da leitura e da escrita.

Segundo as considerações de Azevedo (2007 p.8):

Daí as práticas de avaliações externas, com sistemas de avaliação em que os sujeitos que atuam no cotidiano das instituições transformam-se em objetos passivos, sendo os processos de trabalho ignorados, as especificidades dos conteúdos

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desconhecidas. O que dá validade ao trabalho é o produto final, aferido, quase sempre, em limites quantitativos, concentrados, nos resultados, avaliados de fora para dentro.

Outro instrumento de avaliação proposto pelo MEC é a Provinha Brasil. De

acordo com as informações do INEP, a Provinha Brasil foi prevista no Compromisso

Todos pela Educação do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do MEC. O

objetivo fundamental da realização dessa prova é o de ser oferecido aos gestores

públicos e professores informações sobre o nível de alfabetização dos alunos logo

no começo do processo de aprendizagem, com o propósito de diagnóstico.

A dúvida colocada, no entanto, é qual a necessidade de se institucionalizar

em forma de testagem a prática de avaliar a criança no início do processo de

alfabetização. Por meio dos exercícios propostos, serão apresentados todos os

elementos que permeiam a aprendizagem da leitura e escrita? Define-se então o

que o aluno de seis a oito anos precisa saber, entretanto o porquê não sabe,

indicadores fundamentais para ações construtivas de mudança não fazem parte de

tal aferição.

Indagações dessa ordem remetem a se questionar a prática da avaliação

proposta pelas políticas públicas. O conhecimento fica reduzido a dimensões

cognitivas, traduzidas em acúmulos quantitativos, mensuráveis, como se fosse

possível separá-los de todas as facetas que envolvem a instituição escolar.

Saul (2006) apresenta o propósito autoritário de avaliações realizadas

servindo a interesses exclusivamente formais, fazendo parte de uma rotina dos

órgãos que decidem os rumos dos programas educacionais. Os sistemas avaliativos,

com o propósito de divulgação desses resultados, não dão a transparência que a

maioria da sociedade deseja para entender a situação da educação em nosso país,

o que de fato é necessário para uma significativa mudança nas questões conflitantes

apresentadas.

O entendimento da situação exige a compreensão da instituição de um

currículo aliado às práticas avaliativas na própria dinâmica da sala de aula.

Como dar conta da diversidade de uma sala de aula, atender às exigências

instituídas e atingir níveis previstos para a escala proposta por uma avaliação

institucional?

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Nas palavras de Cappelletti (2001), a constatação só tem sentido se for para

mudar para minimizar as consequências, para tentar reverter uma experiência até

então vivida como “paciente” da avaliação. A justificativa para uma prática avaliativa,

como a proposta pelas políticas públicas, respalda-se a partir do momento em que

possam ser corrigidos rumos para se traçarem estratégias que atenuem a situação

de fracasso educacional apresentada.

No Estado de São Paulo, desde o ano de 1996, a Secretaria de Educação

Estadual (SEE/SP) implantou a política de avaliação de sua rede de ensino através

do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo –

SARESP. Além da aplicação do SARESP, o governo paulista participa também do

SAEB e da Prova Brasil. Para o presente trabalho, os dados de maior referência

serão oportunizados por meio dos relatórios apresentados pela Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo, pois o estudo em questão aborda

essencialmente questões relativas a esse universo.

O quadro 1 abaixo, construído por meio de informações obtidas dos

documentos oficiais da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e Ministério

da Educação, mais precisamente o Inep, apresenta os objetivos propostos para a

realização das avaliações utilizadas pelos órgãos oficiais do Estado de São Paulo,

representando instrumentos essenciais para o avanço da qualidade do ensino.

SARESP Prova Brasil e Saeb continua

Verificar o rendimento escolar dos alunos nos diferentes componentes curriculares;

Identificar os fatores que interferem nesse rendimento;

Fornecer ao sistema de ensino, às equipes escolares, às equipes pedagógicas das Diretorias de Ensino e às escolas informações que possam nortear programas de capacitação de professores;

Reorientar a partir dos resultados obtidos, a proposta pedagógica da escola;

Articular os resultados obtidos ao planejamento escolar;

Oferecer subsídios à formulação, reformulação e monitoramento de políticas públicas e programas de intervenção ajustados às necessidades diagnosticadas nas áreas e etapas de ensino avaliadas; Identificar os problemas e as diferenças regionais do ensino; Produzir informações sobre os fatores do contexto socioeconômico, cultural e escolar que influenciam o desempenho dos alunos; Proporcionar aos agentes educacionais e à sociedade uma visão clara dos resultados dos processos de ensino e aprendizagem e das condições em que são desenvolvidos;

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32

SARESP Prova Brasil e Saeb

conclusão Estabelecer metas para o projeto de cada escola, principalmente ao que se refere à correção do fluxo escolar;

Estabelecer nas várias instâncias da SEE, as demais redes de ensino e as escolas para subsidiar a gestão

Desenvolver competência técnica e científica na área de avaliação educacional, ativando o intercâmbio entre instituições educacionais de ensino e pesquisa.

Quadro 1 – Objetivos propostos pelas avaliações SARESP/ SAEB e Prova Brasil Fonte: Elaborado pela autora com dados do Brasil (2007) e São Paulo (2009a)

No início do ano de 2009, após um balanço das medidas tomadas, foram

divulgados pela Secretaria de Educação os resultados apresentados pela educação

no Estado. O quadro 2 foi extraído da síntese descrita por Maria Helena Guimarães

de Castro, até então Secretária de Educação do Estado de São Paulo.

98% das crianças entre 7 e 15 anos estão matriculadas _ 86% dos adolescentes de 15 a 17 estão matriculados _ 74% dos adolescentes de 15 a 17 estão matriculados no Ensino Médio _ São Paulo está na 3a posição no ranking do IDEB/2007 para as redes estaduais. Problemas – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP/ 2008) 4a. Série: 26.7% dos alunos no nível abaixo do básico em Português 39% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 8a. Série: 26% dos alunos no nível abaixo do básico em Português 34,5% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 3a. Série EM: 54,3% dos alunos no nível abaixo do básico em Matemática 32.9% dos alunos no nível abaixo do básico em Português

Conclusão: Segundo resultados do Ideb e Prova Brasil, a educação paulista está melhorando. Mas a

qualidade ainda é baixa; estamos longe de onde queremos chegar.

Quadro 2 – Prestação de contas sobre a política de bônus8 Fonte: Castro (2009)

De acordo com CASTRO (2000), a realização das avaliações dos sistemas

educacionais suscitaria ao país a consolidação, não só de mecanismos de

avaliação, mas de uma cultura avaliativa, entendendo ser essa a forma de o sistema

8 Lei complementar nº 1078, de 17 de dezembro de 2008, instituída de acordo com seu artigo 1º, para bonificação por resultados aos servidores em efetivo exercício na Secretaria da Educação, decorrente do cumprimento de metas previamente estabelecidas, visando à melhoria e ao aprimoramento da qualidade do ensino público.

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de ensino e as escolas ganharem qualidade e oferecerem uma educação melhor

aos alunos.

Todavia, há mais de dez anos estão sendo realizadas tais avaliações. O

cenário visualizado por toda a sociedade não é dos melhores, o que se permite

questionar a forma como está sendo implantada a política de avaliação no país.

A criação de um “Estado Avaliador” para resolver a situação do fracasso

escolar deve ser tratada com cuidado. A constatação do grande número de crianças

que, ao final de um primeiro ciclo de aprendizagem, encontram dificuldades na

leitura e escrita não representa os avanços necessários na educação. Requer,

nesse sentido, que se faça uma ampla análise sobre o papel das avaliações,

colocando-se não a inexistência desses mecanismos, mas uma releitura do que se

avalia, como se avalia e por que se avalia.

A respeito do fracasso escolar, Sacristán (2007) expõe a seguinte

observação:

O fracasso não é senão o reconhecimento de uma falta de êxito, do ponto de vista de quem empreende as ações educativas, entre o referente não questionável do texto curricular e os significados que os alunos demonstram ter adquirido São considerados deficitários, transferindo a responsabilidade do déficit ao destinatário do ensino. (SACRISTÁN, 2007, p 122)

A ação do Estado em avaliar a real situação da educação, ao cumprir com os

objetivos inseridos nas diferentes práticas indicadas, pode se apresentar a favor de

uma mudança no cenário a partir do momento em que possa ser compreendido, no

ato de avaliar, o cumprimento maior do seu papel: utilizar os mecanismos

necessários para oferecer condições para que os alunos dominem as competências

e habilidades requeridas para a série em que estão matriculados. O currículo em que

se baseiam os diferentes instrumentos de avaliação são os propostos pela rede

estadual de São Paulo; no caso do SARESP e nos demais, a base é o currículo

proposto por diferentes redes estaduais e municipais.

Desse modo, uma leitura sobre a avaliação proposta pelas políticas públicas

requer a compreensão do significado de avaliar, principalmente inserindo-se nesse

contexto a relação entre currículo e avaliação e a formação do professor para uma

prática de avaliação que atenda à formação.

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2.2 Compreendendo o ato de avaliar

Muitas são as concepções da ação de avaliar presentes na prática

pedagógica sem que os professores compreendam que tal ação representa uma

forma de existência humana. A compreensão de elementos presentes na prática

avaliativa propicia uma visão ampla de concepções norteadoras do fazer docente,

seja para reprodução de postura ou como possibilidade libertadora.

Ao se observar o panorama histórico da educação, a avaliação está presente

em cada momento, acompanhando a estrutura social e política, atendendo aos

propósitos de um tempo e cumprindo um sentido específico.

Em geral, a avaliação educacional assume diferentes concepções tendo em

vista o ideal de homem, de sociedade e de mundo que se pretende formar.

Encontra-se, assim, em diferentes abordagens de ensino, uma concepção própria

de avaliação. De acordo com Rodrigues (1994), podem ser identificados três

grandes tipos de posturas diferentes, podendo ser designadas como objetivista,

subjetivista e dialético-crítica.

Na abordagem objetivista, em que impera o modelo tradicional, a concepção

de avaliação é pautada por um controle externo. Os critérios de avaliação são

impostos e estabelecidos autoritariamente.

Na abordagem subjetivista, definida por meio de um modelo pedagógico

relativo à escola nova, a avaliação atua como um processo de autorregulação e

autocontrole. O sujeito é fonte de referencial de avaliação; participa ativamente do

processo e dos resultados.

A avaliação assume o papel de construção e reconstrução com o princípio de

transformação na abordagem dialético-crítica. Nessa abordagem, a posição de

avaliar assume um papel emancipador, libertador, com a intenção de regular

aprendizagens e fazer uma avaliação formativa.

Nas diferentes abordagens citadas acima de uma forma sintética, não se

pode restringir a ação de avaliar a um simples ato de verificação de

aprendizagens, e sim, de uma complexidade de ações em que a compreensão

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dessa avaliação também requer um contexto curricular, uma vez que a avaliação

se apoia em conteúdos de relevância propostos em um sistema de ensino.

2.2.1 Currículo e avaliação da aprendizagem

Ao se penetrar na intimidade de uma escola, depara-se com a imagem de

alunos agrupados em classes, onde são encontrados em uma mesma sala alunos

provenientes de diversos contextos históricos e culturais. Essa diversidade muitas

vezes não recebe a devida atenção por parte da instituição, pois não há o

atendimento significativo a essas diferenças, não havendo condições para que a

aprendizagem de conceitos culturalmente relevantes aconteça. Além da definição de

conteúdos relevantes a um currículo multicultural, outra questão colocada é como

oferecer situações de aprendizagem significativas a esses educandos, ou seja, como

oferecer uma gama de conteúdos pertinentes, não apenas nos aspectos de um

currículo cultural, mas que oportunize o saber, contribuindo para a ampliação de

horizontes e perspectivas; para Torres (2001), a pertinência cultural sem o acesso à

ciência pode acabar em um isolamento que consolide o atraso e a dependência.

Uma análise sobre como selecionar esses conteúdos e proporcionar sua

aprendizagem por parte dos alunos indica a necessidade de se compreender o que

se valoriza no universo escolar, ou seja, o que se define como relevante no currículo.

Sobre essa definição é que se caminha para o sentido de avaliar, principalmente

quando o conceito de avaliar está diretamente relacionado ao diálogo presente entre

os processos de ensinar e aprender.

O termo “Currículo” deriva do verbo latim Currere (correr), que significa

pequena caminhada a percorrer. Percorrer uma caminhada, significando um passeio

recheado por ruas, alamedas, pedras impostas, ou selecionadas por uma cultura.

Traçar uma analogia entre um passeio e o currículo requer se pensar sobre os

saberes definidos pertinentes socialmente. Em que princípios é baseada a

supervalorização de algumas habilidades e não de outras? Como definir alguns

conhecimentos como relevantes e não outros?

As inquietações propostas ao se deter no conceito provavelmente da raiz do

termo Currículo são analisadas por curriculistas críticos que, partindo de ideias de

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um currículo pré-ativo, identificam-no como o conhecimento válido a partir de um

interesse social de quem o legitima, surgindo da relevância de uma sociedade

dominante.

Goodson (1995), ao afirmar que Currículo está em constante construção, cita

que uma história do currículo ajuda a ver o conhecimento corporificado, não como

algo fixo, mas como um artefato social e histórico. Dessa forma, atendendo aos

interesses históricos, compreende-se que a prática de avaliar caminhou, e também

caminhou junto a construção de um currículo. “A avaliação é uma prática educativa

social que se integra a um conjunto de práticas, ela se afirma como ação política”

(ALBUQUERQUE, 2004, p.131).

Ao aliar prática e teoria, o professor deve ter clareza de que suas ações em

sala representam a seleção cultural, a predominância de elementos ideologicamente

superiores.

O currículo nunca é simplesmente uma montagem neutra de conhecimentos que de alguma forma aparece nos livros e nas salas de aula de um país. Sempre parte de uma tradição seletiva, da seleção feita por alguém, da visão que algum grupo tem do que seja o conhecimento legítimo. Ele é produzido pelos conflitos, tensões e compromissos culturais, políticos e econômicos que organizam e desorganizam um povo. (APPLE, 1999, p.55)

Conceituar currículo envolve entendê-lo a partir de uma ampla dimensão, não

só dos conteúdos privilegiados para o ensino, mas também aliar a isso diversas

situações envolvendo a realidade escolar. As experiências do indivíduo vão além de

uma sala de aula. Currículo é um organismo vivo, e sua não neutralidade, como fora

analisada por Apple (1999), em contrapartida, dá à avaliação sua dimensão política.

Quando se propõem modelos de reavaliar a avaliação, é preciso esclarecer as possibilidades reais de que os professores assimilem a seus esquemas práticos os mecanismos que implicam esses modelos de comportamento avaliador. (SACRISTÁN, 2000, p.334)

A ideia de um currículo crítico pressupõe compreendê-lo a partir de questões

sociológicas, políticas e epistemológicas. Nesse sentido, tratar a avaliação da

aprendizagem requer relacioná-la em um contexto também social e político no qual a

relação entre os atores envolvidos se configura em uma “não neutralidade”, em que

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“a própria seleção de tarefas que os professores realizam e a forma que estas são

avaliadas refletem os saberes e habilidades que devem ser enfatizados e

valorizados” (SACRISTÁN, 2000).

Entretanto, o que vale ressaltar é: o que se pretende com o ato de avaliar?

Hadji (2001) coloca a avaliação como um ato de confronto entre uma situação

real e expectativas referentes a essa situação. O que vale nessa observação é que

ao avaliar, o professor é conduzido a uma leitura pré-definida por um sistema

escolar. As notas escolares reproduzem práticas e valores dominantes nesse

sistema. Dessa forma, ao proceder o ato de avaliar, quando o professor se depara

com resultados não satisfatórios aos objetivos propostos, fica, então, a expressão

dessa avaliação como o resultante de um fracasso escolar. Compreender apenas

que há um fracasso contraria o desafio existente no ato de avaliar, que é estar a

serviço da aprendizagem e não somente identificar erros, mas sim, através deles

ajudar o aluno a descobrir modos de progredir, tornando dessa forma um processo

dialógico e não apenas final.

Ressalta-se, nesse sentido, que a avaliação com o propósito de atender aos

objetivos pré-estabelecidos por um sistema de ensino assume o modelo de medição.

Tal modelo cumpre o papel de verificação de aprendizagem dos conceitos

selecionados por uma cultura dominante, expressos na elaboração dos planos pré-

definidos seguindo orientações de um currículo pré-determinado. O foco presente

em uma avaliação que satisfaça apenas a um princípio de medição não pode

atender ao propósito formativo de uma mudança.

Esse tipo de avaliação não satisfaz mais os avaliadores porque apresenta uma concepção mecanicista do mundo e inscreve-se na ideologia positivista, sobre tudo porque tende a transformar em dogma a idéia de mono causalidade linear: a causalidade não é mais a explicação suficiente de um fenômeno. Compreender não é mais procurar a causa. A constatação de que nas situações de vida e nas práticas sociais, a explicação pode ser pluricausal e não linear afetou a perenidade desse modelo e sugeriu a necessidade de outras avaliações. (BONNIOL; VIAL, 2001 p.53)

Apesar de a temática sobre a avaliação como medida estar sendo difundida e

questionada há décadas, sabe-se, como indica Sousa (2007), que a avaliação se

caracteriza como instrumento de controle e adaptação de condutas educacionais e

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sociais dos alunos. Trabalha-se com os alunos em direção à adequação e

submissão aos padrões e às expectativas definidas pela escola, que não leva em

conta características do grupo social. Assim, a escola desconsidera elementos

presentes na cultura do aluno.

As concepções presentes na prática do professor avaliador relacionam-se à

avaliação precisa, que verifica a posse de conhecimentos acabados, sem relação

com a experiência, sem a presença de vida. Nesse sentido,

[...] as concepções dos professores adquirem um papel de primeira importância na modelação dos conteúdos e, em geral, todas aquelas perspectivas profissionais que se liguem mais diretamente com as decisões que o professor toma quando realiza uma prática, pois serão, em parte, responsáveis pelos significados que atribua aos componentes do currículo e às formas de desenvolvê-lo, seja qual for o grau de definição com que este lhe seja apresentado. (SACRISTÁN, 2000, p.181)

As teorias vivenciadas pelo professor durante sua formação estão

intimamente ligadas ao ato de avaliar. Há, no entanto, um aluno real em uma escola

real que, por sua vez, requer um professor consciente da sua prática enquanto ação

política, percebendo que tendências podem se reproduzir na educação. Com isso, é

necessária uma ação crítica e reflexiva.

Avaliar a aprendizagem não é o mesmo que avaliar o currículo. São objetos

diferentes do processo avaliativo. No entanto, o resultado do desempenho dos

alunos constitui uma vertente importante na avaliação do currículo. Desse modo,

repensar a avaliação da aprendizagem reflete na reorganização do currículo. O que

se quer com a educação escolarizada? Que saberes devem ser valorizados,

levando-se em conta as individualidades e o momento vivido pelos alunos em um

contexto histórico, político e social?

O caminho que a educação percorrerá, principalmente no que diz respeito à

avaliação, dependerá de onde se quer chegar.

Por isso, como afirma Cortella (2005), quando se trata de política educacional,

deve haver clareza para onde se deseja ir. É necessário repensar e rediscutir certas

questões.

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Domingues (1988), em seu estudo sobre o cotidiano da escola de 1º Grau,

identificou a existência de uma relação autoritária entre professor e aluno nas salas

de aula. Na relação autoritária, em que a função reguladora do ensino está nas

mãos do professor, principalmente quando as práticas são expressas através de

uma determinação curricular previamente definida, é dado a esse professor o direito

de definir regras e de punir quando essas regras não são cumpridas. Nesse sentido,

avaliar caminha na direção da dominação.

Como se concebe o conhecimento, como se ordena, que papel se concebe para sua relação com a experiência do que se aprende, qual é sua transcendência social e sua relação com a vida cotidiana, qual é a sua origem, como se valida, como evolui, a ponderação de seus componentes, como se comprova sua posse, etc são aspectos cruciais sobre os quais se interrogar no modelo de ensino para analisar sua especificidade. (SACRISTÁN, 2000, p.188)

A questão da avaliação da aprendizagem requer uma ampla discussão e

ações voltadas ao desenvolvimento e crescimento do aluno. Se o currículo é

entendido como um organismo vivo, constantemente construído, e não se pensa a

avaliação da aprendizagem para significativas mudanças, está se obstaculizando a

oportunidade da construção de um currículo que atenda às diferenças e que cumpra

o papel na formação do ser integral.

2.2.2 Avaliação Formativa: Ação Reguladora de Aprendizagem

A formação do ser integral compreende, em uma visão educacional

libertadora e democrática, ensino de qualidade. Quando se pensa em qualidade na

ação educativa, não se pode ignorar a importância da prática avaliativa. Qual a

verdadeira intenção ao se proceder à avaliação nas escolas brasileiras?

Como já foi discutido anteriormente, avaliação pode se configurar como

medida, caracterizada como um instrumento de controle das condutas educacionais

dos alunos; no entanto, não indica a verdadeira intenção presente na necessidade

de avaliar, segundo estudos de Cappelletti (2002).

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Avaliação constitui-se em uma investigação crítica de uma dada situação que permite, de forma contextualizada, compreender e interpretar os confrontos teóricos/práticos, as diferentes representações dos envolvidos e as implicações na reconstrução do objeto em questão. Esse processo desencadeia uma intervenção intencional de estudos, reflexões, re-leituras, gerando nas ações/decisões um movimento de problematização e ressignificação na direção de transformações qualitativas de relevância teórica e social (CAPPELLETTI, 2002, p.32).

Na concepção apontada por Cappelletti (2002), a ação avaliativa estaria

diretamente relacionada a uma proposta de intervenção intencional de estudos, e

nessa ação, não vale apenas o que foi aprendido ou não, mas a possibilidade de a

aprendizagem de fato ter sido efetivada.

A ação de ensinar exige a compreensão do compromisso legítimo de atuação.

Significa ter a verdadeira dimensão do que o aluno não aprendeu, visualizando a

real possibilidade do aprender, criando as mais diversas situações para que isso

possa ocorrer.

A mudança de uma prática avaliativa tão necessária na formação de um

professor não é tarefa fácil; ainda mais, quando em sua formação, seja ela

acadêmica ou através da prática, só houver o exercício rotineiro de uma avaliação

quantitativa e empírica baseada no conceito de medição.

A proposta de uma avaliação no sentido da ação significativa não é uma

discussão recente. Segundo Hadji (2001), a noção de avaliação formativa já fora

proposta em 1967, por Scriven. Nessa perspectiva avaliativa, o erro não seria uma

falta a ser reprimida, mas uma fonte de informação da situação do aluno para uma

significativa intervenção do professor.

Vista como uma forma de regulação contínua da aprendizagem, a avaliação

formativa favorece ação e interação contínuas na aprendizagem. Para tanto, para

Perrenoud (1999), requer um professor que compreenda como se dá esse processo,

sendo capaz de construir seu próprio sistema de observação, de interpretação e de

intervenção em função de sua concepção de ensino, dos objetivos, do contrato

didático, do trabalho escolar.

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É formativa toda a avaliação que ajuda o aluno a aprender e a se desenvolver, ou melhor, que participa da regulação das aprendizagens e do desenvolvimento no sentido de um projeto educativo. (PERRENOUD, 1999, p.103)

Não há como desarticular a ideia de uma avaliação formativa com um

procedimento de ensino voltado para mudanças didáticas. A avaliação formativa

implica, por parte do professor, flexibilidade e vontade de adaptação, de ajuste

(Hadji, 2001).

Presente em toda a prática docente, a avaliação precisa cumprir com seu

verdadeiro papel; por isso, é importante a compreensão do que representa a

avaliação formativa.

A prática de uma avaliação formativa pressupõe uma atitude muito além da

verificação de erros, mas um caminho para ações, com o indicativo da superação

das dificuldades por parte do aluno. Segundo Hadji (2001), a análise dos erros não é

construir um fim em si; é um meio oferecido para tornar a avaliação mais informativa

e imaginar melhor a condição didática e/ou pedagógica adequada para a superação

do obstáculo revelado pelo erro.

Em um sistema seletivo como o nosso, a avaliação formativa encontra pouco

espaço. Para sua concretização, o essencial é a formação contínua do professor,

que favoreça uma ampla análise de sua função como agente da aprendizagem do

aluno.

Uma avaliação formativa digna deste nome não produz informações e verificações por simples espírito de sistema ou de equidade para fazer funcionar uma máquina avaliativa ou para tranquilizar quem quer que seja. Ela visa dar nem mais nem menos, informações de que ele necessita para intervir eficazmente na regulação das aprendizagens de seus alunos. (PERRENOUD, 1999, p.124)

O rompimento da prática de uma avaliação como medida para a concepção

formativa requer por parte do professor avaliador uma adequada formação que

deveria possibilitar ao docente uma postura mais democrática, crítica e solidária,

sendo o protagonista informado sobre os pressupostos presentes em uma ação

avaliativa libertadora. Sobre as condições necessárias a essa formação

(FELDMANN, 2004), faz-se necessário se estabelecerem políticas públicas que

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garantam a participação ativa dos professores nas várias instâncias de decisões do

processo educativo, considerando-se a necessidade e o direito à formação

continuada, incluindo o desenvolvimento de melhores condições de vida e de

trabalho.

2.3 Formação do professor para a prática de uma avaliação formativa

A ampla discussão em torno da problemática da avaliação deixa escapar uma

análise acerca do papel do professor frente à possibilidade de uma avaliação

formadora. Identifica-se como formadora uma avaliação que resulte em uma

alteração de resultados, contribuindo para a evolução do aluno.

A alteração implicada na avaliação é também essa: a interferência de um outro (alter [lat] = outro). O resultado pretendido é paradoxal: o outro interfere (hetero-nomia [gr] = o outro é a norma) para que o sujeito seja mais capaz de reconhecer por si mesmo e de dirigir-se a si mesmo, ou seja, auto-determinar-se (auto-nomia). A avaliação heteronômica é um paradoxo também porque só pode efetivar-se na medida em que o sujeito avaliado reconhecer a si mesmo minimamente na representação feita pelo outro. (CASALI, 2007, p.18)

O professor, ao representar o outro na fórmula descrita anteriormente, precisa

se compreender como alguém caracterizado como um agente social, pois representa

concepções ideológicas dominantes em um currículo. Para tal compreensão, deve

ser instituída uma prática pedagógica reflexiva. O processo reflexivo pode acontecer

de diferentes maneiras, dependendo da capacidade de análise e da relação teoria e

prática que se consegue construir. Além disso, dependendo da maneira como se

realiza a reflexão na prática docente, resultados diferentes são alcançados. Schön

(2000) apresenta dois tipos de reflexão: a reflexão-sobre-a-ação e a reflexão-na-

ação.

A reflexão-sobre-a-ação acontece quando pensamos sobre o que fizemos, de modo a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para um resultado inesperado. Podemos proceder dessa forma após o fato, em um ambiente de tranquilidade, ou podemos fazer uma pausa no meio da ação para [...] parar e pensar. (SCHÖN, 2000, p.32)

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Uma ação reflexiva instituindo uma prática avaliativa formativa impõe que se

perceba um fazer pedagógico relativado por uma postura crítica, em que se possa detectar

o propósito relativo à ação, tendo como princípio uma mudança de postura. Nada poderá ser

feito se não houver por parte do professor a competência para retomar trajetos a partir de

uma leitura crítica do seu espaço de ação, indo além do que seja colocado como caminho

único de condução.

O professor não decide sua ação no vazio, mas no contexto da realidade de um local de trabalho, numa instituição que tem suas normas de funcionamento marcadas às vezes pela administração, pela política curricular, pelos órgãos de governo de uma escola, ou pela simples tradição que se aceita sem discutir. (SACRISTÁN, 2000, p.166-167)

Nesse sentido, a mudança na postura do professor, favorecendo a prática da

avaliação formativa, deve ocorrer no contexto da formação docente. A compreensão

dessa formação não pode ficar reduzida a um simples processo de acúmulo de

conhecimentos, desconectados de um contexto histórico, político e social. Para

Feldmann (2004), esse processo deve estar vinculado à concepção e à análise dos

contextos sociais que produzem um conjunto de valores, saberes e atitudes, os

quais imprimem significados ao fazer educativo.

O rompimento de uma prática avaliativa excludente, meritocrática e seletiva

não ocorrerá se os professores continuarem com raízes tão fincadas em uma

concepção reprodutora de diferenças sociais.

No entanto, vale acrescentar a essa afirmação que além de ser um problema

de concepções avaliativas, mais grave ainda é saber que esses professores

iniciaram sua formação antes mesmo da universidade, ou seja, já representam a

consequência de uma educação que sofreu e sofre pelos reflexos de um modelo

excludente de desenvolvimento econômico, modelo esse que nega o sucesso

escolar para todos os cidadãos.

Essa análise requer um pensamento não apenas de consternação, mas,

como cita Sousa (2007), enfrentar o desafio histórico de democratizar a educação

supõe, necessariamente, olhar criticamente a escola. Para além dos condicionantes

de natureza estrutural do Estado brasileiro, o fracasso escolar, há muito evidenciado

e denunciado, é também expressão do modo como a escola está organizada, o que

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impõe olhar criticamente suas regras, rituais, práticas, enfim, o conjunto de relações

e interações que nela se estabelecem.

O professor, como agente em um processo social, teria que ter condições

para o olhar criterioso e crítico de uma situação da qual ele faz parte. A capacidade

de leitura crítica de uma situação não pode ocorrer sem elementos teóricos e

tampouco sem a condição reflexiva para efetivar uma mudança significativa.

A educação conduzida reflexivamente deve capacitar o sujeito para `sair da cultura´, poder estudá-la, refazê-la e melhorá-la, ou seja, distanciar-se para ter perspectiva e poder adotar uma das múltiplas direções possíveis e seguir seu desenvolvimento. (SACRISTÁN, 2002, p.212)

Nessa perspectiva, antes de uma maior discussão sobre a formação do

professor para um redirecionamento na prática avaliativa, faz-se necessária uma

explicitação sobre o conceito de formação.

Mizukami et al.(2002) apresenta dois paradigmas de formação: racionalidade

técnica e racionalidade prática. Pelo modelo de racionalidade técnica compreende-

se a formação adquirida por meio da transmissão de um aparato de conteúdos e

técnicas. O modelo da racionalidade prática indica o desenvolvimento de uma

prática reflexiva.

A mesma autora aponta para a necessidade de o processo de formação ser

contínuo; no entanto, evidencia a necessidade de haver a fomentação dos

processos reflexivos sobre a educação e a realidade social por meio de diferentes

experiências, despertando para a certeza das constantes mudanças e da

provisoriedade do saber científico. No entanto, no que se refere ao saber oriundo de

uma formação inicial, a autora registra:

Assim, se é verdade que a formação inicial sozinha não dá conta de toda tarefa de formar os professores, como querem os adeptos da racionalidade técnica, também é verdade que ocupa um lugar muito importante no conjunto do processo total dessa formação, se encarada na direção da racionalidade prática. (MIZUKAMI, 2002, p.23)

Em se tratando da formação do professor para avaliar, Cappelletti (2007)

aponta para um quadro preocupante: após análise de pesquisas recentes, verificou

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que o tema avaliação educacional raramente tem o espaço necessário na formação

de professores nos cursos de Pedagogia: ou fica restrito a um módulo instrucional,

ou como um tema da disciplina da didática.

A formação que tem sido oferecida aos professores não inclui os saberes necessários para interpretação dos resultados obtidos e principalmente dos erros cometidos pelos alunos. A interpretação envolve um quadro teórico sobre aspectos cognitivos, afetivos e sociais da aprendizagem. Envolve a compreensão de como o aluno aprende e como o professor ensina. (CAPPELLETTI, 2007, p.53)

A criação de um espaço de formação para o professor repensar a avaliação

requer criticidade a uma cultura instalada no sistema de ensino. Não há formação

distanciada de uma profunda análise da configuração da escola como instituição

social.

A instituição escolar é um mecanismo pensado para servir à inserção cultural compartilhando uma série de traços culturais, que se centram no que, em outro momento denominávamos como o núcleo estável e mais valorizado de uma cultura. (SACRISTÁN, 2002, p.223)

Negar a reprodução de uma cultura de avaliação docimológica requer, a

princípio, a compreensão por parte do professor do seu papel como agente de

transmissão e de criação, sendo instrumento de reprodução e, possivelmente, de

mobilização e mudança.

2.4 A Cultura Avaliativa: reflexos nos programas voltados ao ensino da leitura e escrita

A implantação dos ciclos nas escolas brasileiras, como foi apontado

anteriormente, teve na sua fundamentação o propósito de ser uma alternativa de

reorganização do Ensino Fundamental, prevendo a organização do trabalho escolar

em novas bases, supondo o tratamento ao conhecimento como processo em que o

aluno, como sujeito da ação, estivesse continuamente sendo formado, construísse

significados com base nas relações estabelecidas com o mundo e com outros seres

humanos. Conforme cita Sousa (2007),

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O horizonte que se impõe com ciclos é a construção de uma escola de qualidade para todos, para o que também se impõe uma nova organização do trabalho escolar, capaz de provocar uma transformação na cultura classificatória e seletiva dominante no sistema escolar. (SOUSA, 2007, p.35)

O propósito de se retomar a análise referente à questão dos ciclos se deve à

necessária compreensão da mudança nas propostas de Alfabetização que não

foram acompanhadas de uma proposta reflexiva sobre o ato de avaliar.

A primeira proposta concreta apresentada para uma nova organização do

trabalho escolar foi o projeto do Ciclo Básico em São Paulo, no início dos anos de

1980.

O Ciclo Básico de alfabetização (CB) foi a principal medida de um elemento de projetos pedagógicos voltados para a melhoria da qualidade do ensino, ampliação das oportunidades de acesso e permanência na escola pública e busca de maior aproveitamento da comunidade escolar (pais, professores, e alunos) no sistema educacional. Concebido e implantado num cenário sombrio, vinha, todavia, iluminado por grandes esperanças de transformação da realidade escolar brasileira. Pretendia-se, por intermédio dele e à luz das novas concepções a respeito do processo de ensino e aprendizagem, vencer a barreira da repetência logo no início da escolarização, promovendo uma profunda, ainda que gradual mudança no modo de atuar na escola. (MORTATTI, 2000, p.262)

Com o objetivo de romper com a prática do ensino mnemônico da leitura e da

escrita, uma nova teoria respaldou a base dessa mudança, a teoria construtivista

pautada pelo referencial piagetiano. Essa nova compreensão do ensino da

linguagem buscou explicar a aquisição da língua escrita pela criança como um

processo psicogenético que se inicia antes da escolarização e que segue uma linha

regular através de diversos meios culturais de diversas situações educativas.

As pesquisas que embasaram mudanças no ensino brasileiro foram sendo

discutidas ao longo das décadas que se seguiram após a implantação do ciclo

básico, ou seja, dessa nova concepção de aprender a ler e escrever quando se

pensa no processo de construção.

A discussão que se apresenta no momento se refere à trajetória da avaliação

que acompanhou as mudanças metodológicas propostas.

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Sobre a problemática da avaliação, duas décadas após a publicação das

suas pesquisas, as práticas de avaliação continuam autoritárias como a prova,

sendo ainda um instrumento predominante na escola (FERREIRO; TEBEROSKY,

2000).

Aos questionamentos realizados, as estudiosas afirmaram que os professores

não estão conscientes de que avaliação da leitura e escrita deve atender às

diversidades culturais. Outra observação trazida por elas foi a de que as instituições

escolares devem enfrentar o problema da avaliação com uma ampla discussão.

Constataram também um treino dos professores para avaliação, indicando-a não

como avaliação de aprendizagem, mas como objetivo de ensino.

De acordo com o relato, a avaliação não acompanhou certo avanço ocorrido

com relação às propostas metodológicas, tampouco, segundo elas, não se pode

supor que, porque se deu um curso de capacitação ao professor, no ano seguinte

ele tem que ser diferente e, ainda por cima, ter resultados diferenciadores em seus

alunos.

Os aspectos elencados pelas pesquisadoras sobre a problemática da

avaliação indicaram um descompasso entre a metodologia proposta para o ensino

da leitura e escrita e o modo como está sendo realizada a avaliação.

Desde a década de 1980, os professores, no Estado de São Paulo, através

dos diversos programas propostos, estão sendo acompanhados pelos órgãos da

Secretaria de Educação para uma constante atualização das ações didáticas e

metodológicas9.

9 No início da década de oitenta, foi publicado pela Cenp, órgão ligado à Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, um conjunto de materiais impressos com o propósito de discutir, dentre outras questões, as principais concepções de alfabetização, suscitando como princípio a reflexão como elemento de transformação. A Cenp valeu-se, nesse primeiro momento, do discurso e do modelo usado na formação acadêmica, reproduzindo até mesmo textos já publicados em livros e periódicos educacionais. Outros materiais foram produzidos durante a época com o propósito de auxiliar os professores para atuarem sob o contexto de uma nova prática: Isto se aprende com o ciclo básico (São Paulo, 1986); Ciclo Básico em jornada única: uma nova concepção de trabalho pedagógico (1988-1990); Por trás das letras (1992) e Ler e escrever, um grande prazer! (1993). (SÃO PAULO, 2009b)

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48

Fica, porém, a dúvida sobre os impasses existentes para uma maior

qualidade nos processos de ensinar e aprender a leitura e escrita. Até que ponto

uma alteração metodológica se reverte em uma prática libertadora da avaliação? Há,

de fato, uma alteração metodológica do professor para compreensão e aceitação, ou

há ainda uma série de dúvidas, desencontros, impossibilitando uma ação com

intervenções significativas?

Esse contexto que por ora se apresenta requer uma visão criteriosa acerca

das concepções de ensino que embasam a prática de professores alfabetizadores,

assim como a prática proposta de avaliação presente em cada uma das concepções.

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49

3 DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO: DA CONCEPÇÃO MECANICISTA À SOCIOPSICOLINGUÍSTICA

Quando analisamos a prática pedagógica de qualquer professor vemos que, por trás de suas ações, há sempre um conjunto de idéias que orienta. Mesmo quando ele não tem consciência dessas idéias, dessas concepções, dessas teorias, elas estão presentes. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.55)

Durante o percurso histórico da educação brasileira, tem-se acompanhado a

existência de diferentes concepções acerca da alfabetização.

A compreensão do processo de avaliação da alfabetização nesses diferentes

períodos implica uma visão de homem, de sociedade, uma opção teórica sobre a

natureza da linguagem, de sua aquisição e, consequentemente, de intervenções

realizadas em um processo complexo envolvendo o ensinar e o aprender.

3.1 Concepção Mecanicista: compreensão da aprendizagem pautada por métodos

A discussão que se estabelece há muito tempo por educadores nas diversas

partes do mundo se refere à metodologia usada para ensinar a criança a ler e

escrever. Nesse caso, a pauta principal se relaciona a encontrar um melhor caminho

de ajudar a criança a internacionalizar padrões regulares de correspondência entre

som e soletração. Conforme citam Ferreiro e Teberosky (1999):

Tradicionalmente, conforme, uma perspectiva pedagógica, o problema da aprendizagem da leitura e da escrita tem sido exposto como uma questão de métodos. A preocupação dos educadores tem-se voltado para a busca do ´melhor´ ou ´mais eficaz´ deles, levando-se assim, uma polêmica em torno de dois tipos fundamentais: métodos sintéticos, que partem de elementos menores que a palavra, e métodos analíticos, que partem da palavra ou de unidades maiores. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p.21)

Um contexto mecânico de ensinar pressupõe uma aprendizagem realizada

por sujeitos passivos receptores. A ação reflexiva nesse processo é

descaracterizada, tanto para professores, que devem seguir passo a passo o

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previsto pelas referidas propostas, como para alunos, que são submetidos a uma

aprendizagem mecânica, descontextualizada e vazia de sentido.

Mortatti (2000), ao delimitar seu estudo em escolas brasileiras, mais

precisamente no Estado de São Paulo, no período entre 1876 a 1994, apresenta a

concepção mecanicista em três momentos cruciais para análise de posturas

assumidas por professores.

No primeiro momento, sobressaiu a disputa entre os partidários do novo e

revolucionário “Método João de Deus” para o ensino da leitura, baseado na

palavração, e os partidários dos então tradicionais métodos sintéticos que utilizavam

a soletração e silabação, presentes nas primeiras cartilhas brasileiras.

O “Método João de Deus” – português – passou a ser divulgado no Brasil na

década de 1880, por Antonio da Silva Jardim, professor de Português da Escola

Normal de São Paulo, e teve como base o positivismo, que dava suporte às

reformas políticas praticadas até aquele momento. O pensamento de Silva Jardim

representou a primeira geração de novos educadores. Expandiu e divulgou a ideia

de educação positivista, aplicada especialmente à língua materna (MORTATTI,

2000).

Com isso, a divulgação do “Método João de Deus”, contido na Cartilha

Maternal, representou um marco revolucionário para o ensino da língua. Em seu

prefácio,

[...] o autor diz que o aluno, ao aprender por letras ou por sílabas, conduzindo através de elementos inertes do pensamento, reduzi-se a oposição de repetidor de uma cambulhada de miudezas trivialíssimas que não o divertem, nem o instruem, atrofia-lhe o espírito e deixam nele impresso o hábito da leitura mecânica, senão, muitas vezes o selo do idiotismo. (BARBOSA, 1994, p.57)

Apesar de as propostas de “João de Deus” não terem tido acolhimento oficial

num primeiro momento, o combate aos métodos sintéticos e a importância social e

política atribuída ao ensino da leitura fundaram uma tradição que envolvia

necessariamente uma questão de métodos.

No método sintético, a língua é um objeto de conhecimento externo ao

aprendiz que realiza uma análise puramente racional de seus elementos. A

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aprendizagem se dá da seguinte forma: aprende-se, primeiro, letras, depois as

sílabas, as palavras, frases e, finalmente, o texto completo. Há uma regra geral: não

se deve avançar no processo sem que todas as dificuldades da fase anterior estejam

dominadas. No início, a aprendizagem se dá por repetição em coro, soletrando as

letras. Não há preocupação com o valor fonético ou a grafia, só a repetição. Após

esse período, depois da memorização da grafia das letras, o alfabeto é apresentado

e, numa primeira síntese, apresentam-se as sílabas sistematicamente e em ordem

alfabética. Em seguida, são introduzidas as palavras mais simples (monossílabas), e

depois, as mais longas, aquelas que têm a pronúncia considerada mais difícil.

Esse método progride lentamente. O aprendiz demora cerca de quatro anos

para começar a ler um texto completo; após esse período, ele inicia a aprendizagem

da escrita.

Deve ser feita uma observação de que esse método estabelece uma

confusão entre a análise, a língua e o ato de ler.

O referencial para a aprendizagem é a língua oral. A estrutura da matéria

ensinada corresponde a uma lógica adulta e não a uma lógica da criança.

As cartilhas sintéticas - “soletração ou silabação” - partem de elementos não

significantes da língua (a-e-i-o-u; ai-ou-ei-uai).

Combinam-se vogais, trabalham-se os ditongos e tritongos.

Passa-se a seguir para a combinação das vogais com as consoantes,

dirigindo-se o ensino das famílias silábicas (b+a = ba; b+e = be; b+i = bi; b+o = bo;

b+u = bu).

As palavras surgem da combinatória das famílias já conhecidas, passando

para a fase de fixação por meio de exercícios repetitivos. Combinam-se as palavras

até surgirem os textos. As cartilhas sintéticas são as mais tradicionais da

alfabetização.

No início do século XIX, o método sintético mudou a ênfase do seu ensino

pautado no nome das letras para o ensino do seu som. Assim, foi iniciado o método

fônico ou fonético.

A mudança fez com que os mestres conduzissem alunos a associarem o som

das letras a palavras conhecidas juntando gravuras que a ilustravam. Também

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conhecido como psicofônico ou psicofonético, alguns estudiosos recortavam o

alfabeto em massa de biscoito para que as crianças o deglutissem por completo,

reforçando sua aprendizagem pelo estímulo do paladar, ou recortavam em madeira

para acentuarem os efeitos de apelação tátil.

Cita-se como exemplo o método Castilho para o Ensino Rápido e Aprazível

do ler Impresso e numeração do Escrever, proveniente de Lisboa, utilizado no Brasil,

e pautado no método sintético acrescido dessas inovações.

A Revista Pedagógica, distribuída gratuitamente aos professores da rede

pública do ensino primário e aos estabelecimentos públicos de instrução, dentre

outras disposições, continha os atos oficiais relativos à instrução primária. Funcionou

como um dispositivo para padronização administrativa e pedagógica do sistema de

instrução pública no início da República, pautada pelos princípios positivistas: a

construção da ordem e o alcance do progresso no setor da instrução pública.

A história caminhou e as normatizações foram sendo impostas por meio da

adoção oficial de cartilhas, agora, do método analítico. Há relatos de professores

apontando essa obrigatoriedade (TENCA, 1985 apud DEMARTINI; TENCA; TENCA,

1985).

Ah era obrigatório. Tinha que ser o método analítico para alfabetizar E é um método difícil, principalmente para as crianças da roça. Mas era obrigado. Era obrigado seguir uma cartilha analítica. A cartilha analítica era assim: começa com a sentença em vez de começar com a silabação. Em vez de aprender sílabas, tinha que aprender, um tempão, só sentenças Custava para entrar na sílaba, sabe. Então precisava a gente ter muita paciência e muito cuidado Agora, na primeira escola que eu fui ainda não era obrigado, aí eu ainda usava silabação. Aí, eu comecei como analítico, que começava do seguinte modo: Dava-se uma sentença e escrevia-se no quadro-negro. Decompunha-se em palavras e depois em sílabas, depois em letras. Vou dar um exemplo de uma frase que se escrevia no quadro-negro e mandava a criança acompanhar com o ponteiro, que era perigoso, porque o professor às vezes se esquecia e batia na cabeça das crianças: O bebê bebe leite. Então a criança lia: O bebê bebe leite. A professora depois apontava para a frase: o bebê, depois leite, que era decorado. Depois ia para as letras b e l, já são duas letras do alfabeto, que hoje esta diminuindo. Já não tem o Y ou o W e assim foi o método analítico, que ensinou uma geração de brasileiros. Era fácil, ainda mais saindo da Escola Normal que a gente estudava a metodologia, em poucas horas, à noite, até sair para a roça e então desenvolvia o que aprendeu. (TENCA APUD DEMARTINI, TENCA TENCA, 1985, p.69)

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53

Essa situação perdurou oficialmente até 1920, quando foi implantada a

Reforma Sampaio Dória (Lei nº 1750, de 1920). Dentre outros aspectos, garantia

autonomia didática aos professores. Um avanço para a época.

O segundo momento se caracterizou por uma acirrada disputa entre os

partidários do então novo e revolucionário método analítico para o ensino da leitura

e os que continuavam a defender os, agora, tradicionais métodos sintéticos.

Surgiram novas cartilhas, como expressaram os professores no relato anterior.

No terceiro momento, meados da década de 1920, houve uma disputa inicial

entre defensores do método misto (analítico-sintético ou sintético-analítico) e os

partidários do, agora tradicional, método analítico.

O método misto caracterizava-se por explorar todo o significado e as partes

simultaneamente:

a) da palavra, passando para a frase, formando um texto, retirando

novamente a palavra para decompô-la em sílabas;

b) da frase, retirando a palavra para chegar à sílaba;

c) da história, retirando a palavra-chave para depois destacar a sílaba.

Destacou-se naquele momento, e por longos anos, a Cartilha Caminho

Suave, de Branca Alves de Lima.

3.1.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de um referencial mecanicista

A leitura e escrita em uma concepção mecanicista são tratadas como mera

aquisição da técnica de ler e escrever, com ênfase no componente grafofônico da

língua como um fim em si mesma, circunscrita às quatro paredes da sala de aula.

Esses pressupostos irão pautar a prática do professor no processo de avaliação. A

ênfase maior será dada ao produto, o qual deverá reproduzir modelos definidos

externamente ao sujeito aprendente.

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No processo de aprendizagem da alfabetização, o erro é visto como falta

grave; sendo assim, é sempre corrigido com a ideia de que tal correção oportunizará

a progressão da aprendizagem.

A tradição escolar normalmente vê a correção que o professor realiza fora da sala de aula, longe dos olhos dos alunos, como a principal. Compete-lhe marcar no trabalho realizado aquilo que o aluno errou, para que o erro seja corrigido e não fique presente no produto do trabalho do aluno (WEISZ; SANCHES, 2002, p.84).

A teoria empirista, com ênfase na mudança de comportamento, embasa a

ação do professor ao definir aprendizagem como substituição de respostas erradas

por respostas certas. Em tal concepção, o conhecimento está fora do sujeito, sendo

possível definir o que pode ou não se apresentar como produção.

Há de se convir que a avaliação codificada pelo professor sofre um controle

de procedimentos didáticos visando a uma adaptação do professor às regras que

garantam a eficácia ou a regulação do ensino na sala de aula.

Poder-se-ia dizer que a escola define o fracasso e o êxito de modo unívoco porque quer tomar, de maneira unilateral, decisões legítimas. Assim, ela explicita, critérios de êxito e de fracasso que supostamente se aplicam de modo uniforme a todos os alunos que se encontram em uma situação comparável. (PERRENOUD, 1999, p.39)

Avaliar, em uma concepção mecanicista, representa ignorar uma ação

singular, pois a previsão válida passa a ser o que pode ser (considerado)

generalizado. Indicam-se erros e acertos com o pressuposto de que o conhecimento

é externo, dependendo de métodos acertados para a garantia da aprendizagem.

A validação de uma concepção mecanicista por professores alfabetizadores

indica a existência de critérios postos em consonância de uma formatação de

aprendizagem.

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3.2 A consideração dos processos cognitivos de Aprendizagem: concepção pautada nas pesquisas psicogenéticas e psicolinguísticas

Uma nova concepção acerca da aprendizagem da leitura e escrita surgiu a

partir de pesquisas realizadas por Emília Ferreiro com a colaboração de Ana

Teberosky, as quais se pautaram principalmente no entrecruzamento de dois marcos

conceituais - a teoria da linguagem de Chomsky e a teoria da inteligência de Piaget.

Chomsky adotou uma concepção racionalista para explicar os dados

linguísticos. Tal concepção sobre a aquisição da linguagem é proposta em oposição

à noção de imitação proposta pelos behavioristas.

Chomsky ressalta o papel da “criatividade”: a capacidade que as crianças têm de produzir e entender um número indefinidamente grande de enunciados, com os quais não tiveram experiência anterior, dado o caráter produtivo das línguas humanas Ou seja, a capacidade de operar com a língua independentemente de estímulos, a qual se manifesta, todavia, dentro dos limites estabelecidos pela produtividade do sistema lingüístico, regido por regras de adequação gramatical, cujas propriedades formais seriam características da estrutura da mente humana. (BRAGGIO, 2002, p.17)

Ao admitirem para suas pesquisas as teorias de Chomsky, Ferreiro e

Teberosky (1999) trouxeram o foco para a distinção entre competência e

desempenho. Essa distinção representa um caminho contrário ao condutismo, pois

identifica “o saber” a partir de um domínio particular com seu desempenho efetivo

numa situação particular. O fato de alguém não ser capaz de repetir uma palavra

desconhecida não quer dizer que seja incapaz de compreender e de produzir as

distinções fonemáticas próprias de sua língua.

Ferreiro e Teberosky afirmam no capítulo introdutório da Psicogênese da

Língua Escrita não terem sido as primeiras a assinalarem a necessidade de revisão

de algumas ideias sobre aprendizagem da leitura e escrita; no entanto, referem-se à

originalidade de suas pesquisas ao vincularem as perspectivas da psicolinguística de

Chomsky ao desenvolvimento cognitivo, como é visto na teoria da inteligência de

Piaget (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999).

Observa-se nos estudos de Piaget que em nenhum momento de suas

pesquisas, interessou-se por analisar a aprendizagem da linguagem; no entanto,

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56

seus trabalhos apontam para a existência de um sujeito cognoscente que busca

adquirir conhecimento. Conforme afirmam Ferreiro e Teberosky:

O sujeito que conhecemos através da teoria de Piaget é aquele que procura ativamente compreender o mundo que rodeia e trata de resolver as interrogações que este mundo provoca. Não é um sujeito o qual espera que alguém que possui um conhecimento o transmita a ele por um ato de benevolência. É um sujeito que aprende basicamente através de suas próprias ações sobre os objetos do mundo e que constrói suas próprias categorias de pensamento ao mesmo tempo em que organiza seu mundo. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1999, p.29)

Ao se tratar o sujeito como um ser ativo em busca da compreensão do

mundo, faz-se necessário que haja uma atividade estruturante em que seja possível

uma ação sobre o objeto de conhecimento. Apesar de não terem tratado das

questões relacionadas à escrita, as teorias de Piaget foram válidas para que Ferreiro

se ocupasse em utilizá-las para desvelar um processo vivido por um sujeito durante

a aprendizagem da leitura e escrita. Como a própria teoria piagetiana indica a

necessidade de haver uma ação sobre o objeto de conhecimento, para a

aprendizagem da escrita é também necessário ação sobre o objeto a ser conhecido,

pois a escrita não existe no vazio. Segundo Ferreiro (2001),

As superfícies que a cultura construiu para serem portadoras de marcas escritas têm nome e função: chamam-se jornais, livros, calendários, documentos de identidade, dicionários, anúncios, embalagens de alimentos ou remédios, placas com nomes de ruas, indicações para veículos e pedestres, propaganda comercial. A lista é muito longa. (FERREIRO, 2001, p.11)

Compreendendo a existência de um sujeito cognoscente, em uma concepção

psicolinguística, a análise da aprendizagem precisa se desenvolver na atenção às

transformações ocorridas pelos sistemas de assimilação do sujeito e não admitir que

estímulos externos possam controlar as respostas, como acreditam os adeptos de

uma concepção mecanicista.

A partir dessa leitura, Ferreiro (2001) admitiu que a concepção da

aprendizagem (entendida como um processo de obtenção de conhecimento)

inerente à psicologia genética supõe que existam processos de aprendizagem do

sujeito que não dependem dos métodos (processos que, poderia se dizer, passam

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necessariamente pelos métodos). A estratégia enquanto ação específica do meio

pode ajudar ou frear, facilitar ou dificultar, porém, não pode criar aprendizagem.

A aprendizagem entendida pela pesquisadora corresponde a um processo

complexo de construção, sendo a psicogenética o referencial explicativo,

representando uma constante reestruturação de esquemas. A investigação desse

processo complexo trouxe alguns indicativos de extrema importância para a análise

dos erros das crianças; esses, durante o processo de construção, passaram a ser

compreendidos a partir de uma análise pessoal, tendo em vista a singularidade de

tal processo. Assim,

Em uma visão construtivista o que interessa é a lógica do erro: trata-se às vezes de idéias que não são erradas em si mesmas, mas aparecem como errôneas porque são sobregeneralizadas, sendo pertinentes apenas em alguns casos, ou de idéias que necessitam ser diferenciadas ou coordenadas, ou, às vezes, idéias que geram conflitos que por sua vez desempenham papel de primeira importância na evolução. (FERREIRO, 2001, p.82)

Ferreiro, com a participação de Teberosky, construíram o projeto de

experiência com o propósito de descobrir qual era o processo de construção da

escrita, procurando situações em que a criança colocasse em evidência a escrita tal

como ela a visse, a leitura tal como ela a entendesse e os problemas, como fossem

propostos. Suas conclusões apontaram para quatro etapas básicas pelas quais a

criança passa em seu processo de construção e reconstrução da escrita:

a) Nível pré-silábico: caracterizado por uma busca de diferenciação entre as

escritas produzidas, sem a preocupação com as propriedades sonoras da

escrita. Nesse nível, a criança explora tanto os critérios quantitativos

(variar a quantidade de letras de uma escrita para outra para obter escritas

diferentes) quanto os critérios qualitativos (variar o repertório das letras ou

a posição das mesmas sem alterar a quantidade);

b) Nível silábico: caracteriza-se pela correspondência entre representação

escrita das palavras e as suas propriedades sonoras É a descoberta de

que a quantidade de letras com que se vai escrever uma palavra pode ter

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correspondência com a quantidade de partes que se reconhece na

emissão oral;

c) Nível silábico-alfabético: a criança escreve parte da palavra, aplicando a

hipótese silábica de que para se escrever uma sílaba é necessária apenas

uma letra, e parte da palavra analisando todos os fonemas da sílaba;

d) Nível alfabético: caracteriza-se pela correspondência entre fonemas e

grafias. Existe a compreensão de que uma sílaba pode ter uma, duas ou

três letras.

A análise dos resultados coletados pelas pesquisadoras não indicou

procedimentos pedagógicos com que os professores deveriam se ocupar. Em

nenhum momento da pesquisa houve a preocupação em apresentar um suposto

“Método Construtivista”; no entanto, os resultados obtidos conduziram para uma

prática pedagógica pautada por uma compreensão do processo cognitivo de

aprendizagem, pela afirmação de Colello (2004):

As sucessivas hipóteses na conquista da escrita revelam, antes de tudo, o caráter essencialmente criativo da construção do saber. Por trás de cada produção incorreta e aparentemente aleatória, existe uma infinidade de concepções já formadas, de critérios inteligentes e de tentativas tão fecundas que, de algum modo, promovem a evolução. (COLELLO, 2004, p.31)

Pode-se afirmar que as pesquisas pautadas pelo entrelaçamento da

psicolinguística e da psicologia do desenvolvimento, desenvolvidas por Emília

Ferreiro e outros estudiosos da linguagem, representaram um marco divisor na

história da Alfabetização a partir do momento em que a aprendizagem da escrita

pôde ser compreendida como uma construção indicando um processo dinâmico, e

não linear.

3.2.1 Avaliação da aprendizagem da leitura e escrita a partir de uma concepção construtivista

A presença do erro em uma aprendizagem fundamentada pelas teorias

piagetianas passa a ser analisada de uma forma diferente. Ao invés de um

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referencial externo, o que deve ocorrer é a compreensão de que o erro faz parte de

um processo de reconstrução de hipóteses, ou seja, de reconstrução de esquemas

interpretativos.

Quando se estabelece a existência de um saber próprio, construído de forma

individual, acredita-se que o conhecimento possa existir independente da

experiência escolar, principalmente ao ser reconhecida a possibilidade de a

construção da leitura e escrita ocorrer antes mesmo de a criança frequentar uma

instituição de ensino.

Partindo desse princípio, a avaliação consiste em acompanhar um processo,

investigando e explorando ideias e representações presentes durante o jogo da

construção da escrita, conforme explica Colello:

No jogo da construção da escrita, os dados convencionais (aquilo que os professores consideravam como sendo o correto) tornam-se mais ou menos significativos (possíveis), relevantes ou indispensáveis (necessários), ou até contraditórios (impossíveis) à medida que se chocam com imposições de caráter puramente pessoal. (COLELLO, 2004, p.37)

A necessidade existente no reconhecimento de concepções e hipóteses

presentes durante tal processo representa a possibilidade de intervenções do

professor; sendo assim, “avaliar a aprendizagem do aluno é também avaliar a

intervenção do professor, já que o ensino deve ser planejado e replanejado em

função das aprendizagens conquistadas ou não” (WEISZ; SANCHES, 2002, p.95).

Para Weisz e Sanches (2002), o primeiro passo para uma avaliação, dentro

de uma visão construtivista, consiste em saber que conhecimentos os alunos já

possuem; no seu entendimento, trata-se do mapeamento prévio dos alunos. Além

desse instrumento, há a necessidade de o professor buscar outro instrumento para

verificação, reconhecendo que o conhecimento não é construído igualmente, ao

mesmo tempo, e da mesma forma por todos.

Esse instrumento é a avaliação de percurso – formativa ou processual, como muitos a chamam feita durante o processo de aprendizagem Ela serve para verificar se o trabalho do professor está sendo produtivo e se os alunos estão, de fato, aprendendo com situações didáticas propostas. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.94)

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Weisz é uma referência para uma nova concepção de aprendizagem da

leitura e escrita no Brasil. Ao lado de outros autores, ajudou a elaborar orientações

didáticas ao professor alfabetizador, além de assessorar diversos programas de

ensino da língua, como o projeto atualmente implantado pela Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo, o Projeto Ler e Escrever.

A autora, no entanto, enfatiza haver uma distinção clara entre situações de

aprendizagem e situações de avaliação.

[...] por que é tão importante ter claras as diferenças entre situações de aprendizagem e situações de avaliação? Porque, quando não há essa clareza, os professores acabam propondo atividades formatadas como de avaliação pensando que estão ensinando. Dessa forma, não fazem nem uma coisa nem outra. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.95)

Uma observação acerca das afirmações anteriores remete a uma crítica a

partir da forma que fora expressa, pois a referência à necessidade de uma avaliação

formativa contraria seu distanciamento às questões didáticas. Tendo como base o

referencial teórico oferecido por diferentes autores, entre eles, Perrenoud (1999),

Hadji (2001), Saul (2006), Cappelletti (2001) e Abrecht (1994), a avaliação formativa

deveria ser pensada no âmbito da didática, pois dissociar avaliação formativa da

didática representa destituí-la do seu verdadeiro papel, ou seja, de acompanhar

aprendizagens para qualificá-la. Ensinar – Aprender – Avaliar fazem parte de um

mesmo processo de ensino e aprendizagem.

3.2.2 A sondagem como prática avaliativa

Um dos recursos indicados para avaliação em uma perspectiva construtivista

é a sondagem. Assim é chamada a prática de identificação de hipóteses que alunos

não alfabetizados possuem sobre a escrita alfabética e o sistema de escrita de uma

forma geral. De acordo com as orientações para essa prática, esse momento

representa uma oportunidade de os alunos refletirem sobre aquilo que escreveram.

A sondagem é realizada periodicamente; configura-se como atividades de

escrita envolvendo, num primeiro momento, a produção espontânea pelos alunos de

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uma lista de palavras sem apoio de outras fontes escritas, podendo, ou não,

envolver a escrita de frases. São situações de escrita que devem ser seguidas pela

leitura do aluno daquilo que ele escreveu. Por meio da leitura, o professor observa

se o aluno estabeleceu ou não relações entre o que escreveu e o que leu em voz

alta, ou seja, entre a fala e a escrita.

As sondagens avaliativas, pelas orientações propostas, devem ocorrer no

início do ano letivo e ao final de cada bimestre.

O princípio da sondagem avaliativa, de acordo com teóricos que a colocam

como uma prática pedagógica distanciada da didática, não representa a

possibilidade de o professor, a partir da compreensão do que sabe um aluno,

oferecer situações propícias à aprendizagem.

Nesse sentido, avaliar passa mais uma vez a se caracterizar como

certificação e não como indicação de trajeto. A sondagem apenas reproduz uma

prática realizada por uma pesquisa que foi válida para compor um raciocínio

analítico. A análise dos percursos de aprendizagem, tendo em vista um referencial

cognitivo, está distante, no entanto, de se configurar como prática avaliativa,

conforme colocam Weisz e Sanches:

O conhecimento prévio é o conjunto de idéias, representações e informações que servem de sustentação para essa nova aprendizagem, ainda que não tenham, necessariamente, uma relação direta com o conteúdo que se quer ensinar. Conhecer essas idéias e representações prévias ajuda muito na hora de construir uma situação na qual o aluno terá de usar o que já sabe para aprender o que ainda não sabe. (WEISZ; SANCHES, 2002, p.93)

O resultado da sondagem, como a realizada pelos professores da rede

pública do Estado de São Paulo, reflete em um mapeamento das turmas. Nesse

mapeamento, os níveis vivenciados pelos alunos são indicados por cores, conforme

os registros apresentados em anexo. Ao mapear as turmas, a avaliação não atinge o

seu propósito maior de estar a serviço da aprendizagem. Pode-se ver a proposta de

um mapeamento refletindo resultados e não processos (ANEXO B).

Outra consideração a ser feita é sobre a dimensão do que se percebe em

uma sondagem. Há diversos elementos presentes em um processo de

aprendizagem da leitura e escrita que escapam ao ato de verificação de níveis de

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escrita. Ao expressar um pensamento a partir da escrita de palavras ditadas por um

professor, a criança pode limitar seu conhecimento, ou até mesmo bloqueá-lo, em

função do propósito de uma atividade pré-concebida socialmente como parâmetro

de reconhecimento dos níveis adquiridos de aprendizagem por uma turma, uma

escola, uma diretoria de ensino.

A sondagem enfatiza a suposta evolução da escrita, mas não consegue

visualizar questões referentes às várias faces da comunicação, como a linguagem

oral, a interpretação de textos e a utilização de outros recursos linguísticos

envolvidos nesse processo. Muito além do reconhecimento do estágio de evolução

no processo de construção da escrita, o alfabetizador precisa reconhecer

possibilidades de intervenções; para tanto, há de compreender que a aprendizagem

plena não se escreve apenas com as mãos, mas com todo o corpo, com a história

pessoal, com as experiências vividas. Infelizmente, a sondagem não dimensiona

todas as situações envolvidas no jogo do aprender.

3.3 Compreendendo a aprendizagem da leitura e escrita sob o prisma da sociopsicolinguística

A aprendizagem da leitura e escrita entendida a partir de uma concepção

baseada em um modelo sociopsicolinguístico requer compreender o entrelaçamento

das ideias de Vygotsky, Luria, Bakhtin e Freire, como registram os diversos trabalhos

publicados.

O homem é um ser histórico e convive em uma relação social. Nessa

convivência, a linguagem assume papel primordial, não sendo possível

descaracterizá-la do seu contexto sócio-histórico-cultural.

Vygotsky e Luria atuaram em busca da construção de uma psicologia dialética

coerente com os conceitos marxistas. Aliás, a dialética permeia as pesquisas dos

autores citados no início do texto, as quais são referência ao estudo da linguagem

em uma concepção sociopsicolinguística. Nesse sentido, a linguagem, para ser

compreendida, requer pensar no seu significado. Jobim e Souza (2001), ao se

referirem a Vygotsky, registram que por trás de cada pensamento há desejos,

necessidades, interesses e emoções, fazendo com que a compreensão do que se

diz dependa substancialmente da interação do ouvinte com essa base afetivo-

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volutiva, sendo a compreensão o resultado do nível de interação que os indivíduos

conseguem estabelecer entre o verbal e o extraverbal, entre a palavra e o afetivo-

emocional.

Dessa forma, a escrita e a leitura passam a representar um alto grau de

complexidade; a escrita representando o universo oral expressa problemas para sua

aprendizagem, pois a apropriação de seu uso deve compreender as relações

existentes entre o sistema e o mundo. Vygotsky enfatiza que para tal compreensão a

única abordagem possível é a observação da própria história do desenvolvimento

dos signos10.

Luria, inspirado por essa perspectiva de Vygotsky, tem como questão central

a compreensão de como a criança opera por meio dos signos, por uma leitura de

Azenha:

O próprio conceito de signo utilizado por Luria foi cunhado por Vygotsky e mostra a existência de uma dupla face nos signos: uma face externa, materialmente constituída, e uma face interna, de ação sobre o próprio usuário do signo Assim, signo é todo elemento possuidor de significado que artificialmente serve ao sujeito como apoio para funções psicológicas. (AZENHA, 1997, p. 64-65)

A investigação de Luria buscou explicar a face interna do signo, o seu

requisito principal para a utilização da escrita como recurso simbólico. Os signos não

são brotados na consciência; no entanto, a consciência é o resultado da existência

deles. Para Vygotsky, a palavra representa a gênese social da consciência; portanto,

a ideia de consciência passa a ser analisada como um contato do sujeito com ele

mesmo, sendo os signos ferramentas capazes de operar transformações

proporcionadas pela cultura.

Através da mediação existente nas relações humanas, os signos como

instrumentos culturais e sociais organizam processos mentais superiores no

indivíduo. Desse modo, admite-se a função simbólica da palavra. Dessa forma,

10 Entende-se por signo, de forma genérica, toda unidade de texto portadora de sentido, como por exemplo, a palavra. São instrumentos de comunicação.

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O significado é fenômeno do pensamento apenas quando o pensamento ganha corpo por meio da fala, e só é fenômeno da fala na medida em que a palavra está ligada ao pensamento, sendo iluminada por ele. Portanto, a união palavra e pensamento é um fenômeno do pensamento verbal e da fala significativa. (FREITAS, 1994, p.94)

A relação entre pensamento e linguagem estudada por Vygotsky

dimensionaliza a existência do pensamento a partir da existência das palavras.

Especifica para a fala interior uma atividade intelectual afetivo-volutiva, difícil de ser

investigada, sendo operacionalizada pela semântica e não pela fonética. O contexto

dá à palavra um novo conteúdo. Já a fala exterior representa a tradução do

pensamento em palavras. A linguagem é identificada como o mais importante

esquema de mediação do comportamento humano.

Isto tudo significa que o desenvolvimento semântico da palavra está diretamente relacionado ao desenvolvimento da consciência, já que a palavra é o elemento através do qual o homem reflete a sua realidade, nos seus enlaces e relações. Logo, à medida que a palavra evolui, muda também a estrutura da consciência, seu caráter sistêmico, evoluindo, pois é a forma como o homem reflete a sua realidade. (BRAGGIO, 2002, p. 88)

A questão do significado não aparece apenas em Luria e Vygotsky, mas

também em Bakhtin. A análise feita por Bakhtin relaciona-se ao discurso ideológico

das palavras. Representa um questionamento a um contexto sócio-histórico e

ideológico. Na leitura de Freitas (1994):

Toda palavra procede de alguém, como também se dirige para alguém, constituindo o produto da interação do locutor e do ouvinte. Nesse sentido, toda palavra serve de expressão de um em relação a um outro Ao definir-me em última análise, estarei me definindo em relação à coletividade. (FREITAS, 1994, p.140)

Segundo Braggio (2002), Vygotsky, Luria e Bakhtin, a ideia de sentido é

ressaltada ao significado constituído às palavras pelos homens e entre os homens.

Tal concepção de significado conduz à existência de um leitor crítico e homem

consciente.

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A análise que se pode fazer a partir de uma concepção sociopsicolinguística

representa admitir a existência de palavras presentes em relações sociais. Vale

ressaltar que em um contexto educacional, essa concepção prima pela construção

de mecanismos que favoreçam a aprendizagem da leitura e escrita. A ação de ler e

escrever palavras não pode acontecer distante do sentido e de significado.

Nesse aspecto, trazer Freire para esse contexto de discussão, conforme

fizera Braggio (2002), tem grande relevância, pois para o autor, o homem por meio

da palavra muda a si mesmo, dá outra dimensão à sua consciência, justamente

(porque é o homem) porque é capaz de discernir, de reconhecer que não existe um

mundo pronto e acabado, mas que por ele é continuamente criado e recriado. A

palavra é o veículo pelo qual o educando lê o mundo, reflete sobre ele, conscientiza-

se de seu papel.

Dentro da perspectiva sociopsicolinguística, a linguagem do aluno em um

contexto escolar deve ser respeitada. Sua cultura, seu meio social são incorporados

à instrução através da discussão oral ou de atividades escritas. Respeita-se o nível

de desenvolvimento de cada aluno, além de incentivá-lo a usar o que ele já sabe

sobre a linguagem escrita. Para Freire (1996):

Conhecer, na dimensão humana, que aqui nos interessa, qualquer que seja o nível em que se dê, não é o ato através do qual um sujeito, transformado em objeto, recebe, dócil e passivamente, os conteúdos que outro lhe dá ou impõe. O conhecimento, ao contrário, exige uma presença curiosa do sujeito em face do mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma busca constante. Implica em invenção e em reinvenção. Reclama reflexão crítica de cada um sobre o ato mesmo de conhecer, pelo qual se reconhece conhecendo e, ao reconhecer-se assim, percebe o “como” de seu conhecer e os condicionamentos a que está submetido seu ato. (FREIRE, 1996, p.27)

Reconhecer o direito da aprendizagem da leitura e escrita representa

oportunizar a inserção do indivíduo em uma sociedade em que possa se identificar

como sujeito de direitos e com capacidade de leitura de mundo, com possibilidade

de interpretação e reestruturação do mesmo.

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3.3.1 Alfabetização e Letramento

Como foi descrito anteriormente, o processo da língua escrita está vinculado a

uma condição cognitiva e cultural. Há uma estreita relação entre a palavra com

representação social e a compreensão do sentido dessa palavra; para tanto, as

relações sociais favorecem tal compreensão, pois indicam valores presentes a um

contexto.

Nesse sentido, a discussão acerca do letramento torna-se imprescindível para

se analisar a aprendizagem da leitura e escrita em uma concepção social.

Atualmente, há uma grande discussão envolvendo as temáticas de alfabetizar

e letrar. Vários são os autores que discorrem sobre a temática, assim como são

vários os conceitos explorados. No presente trabalho, serão abordados estudos das

autoras Magda Soares, Ângela Kleiman e Silvia Colello. Em seus trabalhos, há

questões que registram pontos de referência para a análise desta pesquisa.

Segundo Soares (1999), as ações de alfabetizar e letrar se completam e

necessitam serem compreendidas separadamente, pois em cada uma dessas

situações, há particularidades que devem ser observadas na ação docente. Dessa

forma:

[...] teríamos alfabetizar e letrar como duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e a escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo alfabetizado e letrado. (Soares, 1999, p.47)

A autora discorre sobre a origem da palavra, definindo-a como uma tradução

para o português da palavra inglesa literacy, “o que significa o estado ou condição

daquele que não só sabe ler e escrever, mas também faz uso competente e

frequente da leitura e escrita” (SOARES, 1999, p.36).

Complementando o seu pensamento:

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[...] a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna alfabetizada – e que passa a fazer uso da leitura e da escrita, a envolver-se nas práticas sociais de leitura e de escrita – que se torna letrada – é diferente de uma pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou, sabendo ler e escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é alfabetizada, mas não é letrada, não vive no estado ou condição de quem sabe ler e escrever e pratica a leitura e escrita. (SOARES, 1999, p. 36)

O simples fato de dominar o código da escrita não significa ler no seu sentido

mais amplo. O desafio posto nesse sentido remete ao fato de a escola se preparar

para a efetivação das duas vertentes analisadas: alfabetizar e letrar.

A aprendizagem do código é extremamente importante em uma sociedade

como a nossa, grafocêntrica; no entanto, como aplicar esse aprendizado? Como

fazer do seu uso condição para a leitura da “palavramundo”, como disse Paulo

Freire? A aprendizagem da leitura e escrita como busca de libertação não encontra

representatividade pelas instituições escolares.

Para Kleiman (1995), por sua vez, letramento pode ser entendido “como um

conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e

enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”. A autora

questiona a prática presente no contexto escolar ao privilegiar uma única forma de

expressão como sendo a percorrida, com o intuito de obtenção de sucesso. Afirma-

se nesse contexto:

Pode se afirmar que a escola, a mais importante das agências de letramento, preocupa-se não com o letramento, prática social, mas com apenas um tipo de prática de letramento, a alfabetização, o processo de aquisição de códigos (alfabético, numérico), processo geralmente concebido em termos de uma competência individual necessária para o sucesso e promoção na escola. (KLEIMAN, 1995, p.20)

Kleiman (1995) cita as pesquisas de Street sobre duas concepções de

letramento: letramento como modelo autônomo e letramento como modelo

ideológico.

O “modelo autônomo” de letramento explicitado pela autora representa a

lógica presente em uma escola tradicional. Nessa escola, o fracasso é de

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responsabilidade do indivíduo que pertence ao grupo dos pobres e marginalizados

nas sociedades tecnológicas. Desconsideram-se, dessa forma, as linguagens

próprias, singulares do sujeito, pois o que se admite é a inserção num padrão único

de linguagem, elitista, em que sua não aprendizagem indica a não aquisição de um

padrão linguístico dominante. A linguagem oral passa a ser desprestigiada por uma

supervalorização do texto escrito. Todos esses fatores desqualificam esse modelo

por ser discriminatório.

Em oposição ao modelo autônomo de letramento, o “Modelo Ideológico”

oferece uma visão menos preconceituosa e mais crítica, destacando o fato de as

práticas de letramento representarem não apenas aspectos da cultura, mas das

estruturas de poder numa sociedade. Tem como base a natureza social e considera

a leitura e escrita como práticas sociais. Kleiman (1995) considera que a leitura e a

escrita fazem parte de atividades sociais, tais como ler um manual ou pagar contas.

Daí a importância de se encarar a leitura e a escrita não só como atividades com um

fim em si mesmas.

Em uma sociedade, encontram-se crianças que ao nascerem se deparam

com um universo rico de estímulos textuais. As manifestações referentes à aquisição

de leitura e escrita são encorajadas pelos seus familiares. Paralelo a esse grupo,

identifica-se outro, contrário, que não se reconhece como portador de identidade,

não é encorajado a inventar histórias ou contá-las. São crianças limitadas na

exploração dos estímulos de leitura e escrita. Quando as crianças de ambos os

grupos chegam à escola, percebe-se a existência de uma grande divisão; no

entanto, essa divisão deve ser compreendida no que se refere aos estímulos

recebidos; por outro lado, devem-se reconhecer nos dois lados quais as

possibilidades existentes para se desencadear a aprendizagem da leitura e escrita

para o encantamento da descoberta do mundo das palavras. Conforme aponta

Colello (2004):

Ao permitir que as pessoas cultivem os hábitos de leitura e escrita e respondam aos apelos da cultura grafocêntrica, podendo inserir-se criticamente na sociedade, a aprendizagem da língua escrita deixa de ser uma questão estritamente pedagógica para alçar-se à esfera política, evidentemente pelo que representa o investimento na formação humana. (COLELLO, 2004, p. 114)

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A proposta de separar as análises sobre alfabetização e letramento

representa a possibilidade de se compreenderem algumas das razões do fracasso

escolar no ensino da língua escrita. Para tanto, a indicação de hipóteses a partir

desses estudos é apresentada por Colello (2004) em três vertentes de análise. A

primeira se refere às práticas letradas de diferentes comunidades, em que

experiências vividas pelos alunos são muitas vezes distantes do enfoque que a

escola costuma dar ao processo de aquisição da leitura e escrita. A segunda

considera a relação do aprendiz com as propostas pedagógicas muitas vezes

autoritárias, artificiais e pouco significativas. A terceira representa o mecanismo de

resistência por parte do aluno ao exercer um processo de negação de um mundo

que para ele não é o seu.

Nesse sentido, pode-se compreender que:

Na prática, a desconsideração dos significados implícitos do processo de alfabetização – o longo e difícil caminho que o sujeito pouco letrado tem a percorrer, a reação dele em face da artificialidade das práticas pedagógicas e a negação do mundo letrado – acaba por expulsar o aluno da escola, um destino cruel, mas evitável se o professor souber instituir em classe uma interação capaz de medicar as tensões, negociar significados e construir novos contextos de inserção social. (COLELLO, 2004, p.118)

Explorar as dimensões presentes na ação pedagógica, compreendendo a

existência das ações de alfabetizar e letrar como intrinsecamente ligadas, respalda a

necessária reflexão no ato de avaliar. Avaliação como ação dialógica representa um

elemento presente na busca de coerência de intervenções significativas.

Franchi (2008) narra em seu livro, “A redação na escola: e as crianças eram

difíceis”, uma experiência ocorrida na década de 1980, em que especifica uma

prática de letrar e alfabetizar quando na época ainda não se propagava, como nos

dias de hoje, esse desafio.

A primeira atitude tomada pela professora foi descobrir quem eram seus

alunos. Nesse momento, confirmou-se a existência de um grupo marcado por um

estereótipo de linguagem desconsiderado pelo universo escolar. A esse aspecto, a

autora relata:

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Como entender a completa ausência de espontaneidade e de originalidade que os fazia quase voltar ao balbucio e os amarrava a esquemas estereotipados, preenchidos por uma dúzia de oraçõezinhas vazias de qualquer conteúdo expressivo? Entre as condições dessa decadência certamente estava a escola, com seus mecanismos repressivos, disciplinadores [...]. Vítimas dos padrões de avaliação dessa escola, os próprios alunos já não valorizam a si próprios: colocavam-se à margem da escola, mesmo dentro dela, sem qualquer estímulo para uma atividade criativa ou produtiva; eles já sabiam que eram “incapazes” ou “casos perdidos” e certamente rejeitavam interagir num sistema que não era para eles e que não tinha qualquer relação com a vida real. (FRANCHI, 2008, p.46)

Ao entender melhor o grupo, a referida professora buscou intervir de forma

significativa, não descaracterizando um modelo característico de linguagem,

tampouco indicando quem aprendia ou não aprendia; ela encontrou possibilidades

de atuar tendo em vista o modelo de aprender de seus alunos.

Neste ponto, devo extrair uma lição para mim mesma. Foi de importância decisiva para meu trabalho ter evitado, mesmo como base para atividades relativas ao desenvolvimento da linguagem escrita, um diagnóstico inicial estritamente (ou estreitamente) linguístico. Em outros termos, foi muito importante para mim não limitar a observação prévia, para o planejamento específico de atividade de linguagem, a uma pesquisa puramente estrutural, seja descrevendo, contrastivamente, diferenças lingüísticas. (FRANCHI, 2008, p.138)

A compreensão acerca da narrativa da professora denota o valor na crença e

na possibilidade do fazer pedagógico transformador, em que avaliar combine melhor

com libertar, libertar o poder de aprender.

3.3.2 Avaliação como prática de libertação

Uma concepção de ensino pautada por fundamentação sócio-histórica requer

se pensar uma prática avaliativa que esteja a serviço da aprendizagem, e que esta

se apresente em um espaço de construção dialógica. Durante a exposição feita até

o momento, o propósito maior foi o de contextualizar a prática de uma avaliação

formativa. Para tanto, tal prática deve ser compreendida como uma ação libertadora,

com o sentido emancipador. Para Saul (2006):

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A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica de uma dada realidade, visando transformá-la. Destina-se à avaliação de programas educacionais ou sociais. Essa está situada numa vertente político-pedagógica cujo interesse primordial e emancipador, ou seja, libertador visa provocar a crítica, de modo a libertar o sujeito de condicionantes deterministas. O compromisso principal desta avaliação é o de fazer com que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas em uma ação educacional escrevam a sua “própria história” e gerem as suas próprias alternativas de ação. (SAUL, 2006, p. 61)

A palavra transformação presente na explicação acerca da avaliação

emancipatória representa o desejo maior dentro de uma concepção que entende o

homem como um ser social, capaz de uma leitura crítica e consciente de seu mundo.

A discussão sobre a possibilidade de transformação não distancia a avaliação

de uma ação pedagógica intencional. Acompanhar o processo de aprendizagem da

leitura e escrita requer que esse acompanhamento seja significativo, que a ação

dialógica presente do ato pedagógico seja constituída do sentido do que fazer. Para

essa discussão, uma concepção teórica valiosa sobre um princípio pautado por uma

atuação pedagógica consciente é encontrada em Cappelletti (2002):

Avaliação constitui-se em uma investigação crítica de uma dada situação que permite, de forma contextualizada, compreender e interpretar os confrontos teóricos/práticos, as diferentes representações dos envolvidos e as implicações na reconstrução do objeto em questão. Esse processo desencadeia uma intervenção intencional de estudos, reflexões, re-leituras, gerando nas ações, decisões um movimento de problematização e re-significação na direção de transformações qualitativas de relevância teórica e social. (CAPPELLETTI, 2002, p.32-33)

Trata-se de não se assistir “de braços cruzados” ao processo de construção

do sujeito aprendente, pois, por vezes, esse processo requer estímulos oferecidos

em uma relação mediatizada por estímulos presentes em uma ação pedagógica

significativa.

Para tanto, o avaliador não deve ser alguém distante de um processo, mas

deve indicar, quando necessário, possíveis caminhos que favoreçam a

aprendizagem. Segundo Calkins (1989):

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É a coisa mais natural do mundo que um professor fique ao lado de um aluno, enquanto este trabalha, para a observação do que o aluno faz e não faz, com o material oferecido Ainda assim, a maioria dos professores é mais capaz de focalizar sua atenção sobre os produtos escritos finais do que sobre sua produção. (CALKINS, 1989, p.176)

A separação de ações como ensinar e avaliar não oferece as condições

necessárias para que professores deixem de apenas focalizar produtos finais. Saber

em que momento do processo de aprendizagem da leitura e escrita o aluno está de

nada adiantará se não se compreender o porquê desse aluno estar em um momento

ou outro; portanto, “como ação educativa inserida no projeto educacional, a

avaliação deixa de ser instrumento de fiscalização e passa a ser problematizadora

da própria ação” (CAPPELLETTI, 2001, p. 26).

A avaliação em uma concepção sociopsicolinguística não pode ser concebida

se não for relacionada a uma prática libertadora.

Nesse sentido, a ação do ensinar não pode estar distanciada do avaliar, e o

avaliar requer a compreensão ampla do como se aprende e, principalmente, o que

fazer para que se concretize de fato o aprender.

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4 OS CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A realização de uma pesquisa atende ao propósito de oferecer a uma

comunidade o resultado obtido por meio de uma criteriosa seleção de passos

compreendidos pelo pesquisador como necessários para desvelar a situação

indicada como problema. Até o momento, a exposição feita nas seções anteriores

objetivou a contextualização da problemática, envolvendo-a na temática da

educação brasileira, mais precisamente, referindo-se à prática de avaliar ocorrida

nas escolas públicas do Estado de São Paulo durante o período de alfabetização.

O referencial teórico abordado embasa a análise realizada atendendo à

referida investigação que foi pautada pela interpretação do conteúdo obtido por meio

dos dados coletados a partir da realização de entrevista semiestruturada.

Os dados interpretados têm como base desvelar na avaliação feita por

professores que atuam nas primeiras séries do Ensino Fundamental as intervenções

realizadas, identificando se tal prática suscitou, ou não, uma ação significativa para a

aprendizagem da leitura e escrita.

4.1 Proposta Metodológica

Com o propósito de uma análise reflexiva da prática de avaliação realizada

por professores alfabetizadores, o presente trabalho foi pautado pelo

desenvolvimento de uma pesquisa qualitativa. O que faz um trabalho interpretativo

ou qualitativo é questão de enfoque e intenção substantivos, e não de procedimento

na coleta de dados, isto é, uma técnica de investigação não constitui um método de

investigação (ERICKSON, 1989, p. 2-3).

A opção por essa categoria de pesquisa representa a possibilidade de

compreensão acerca da ação docente no que se refere ao ato de avaliar. Para tanto,

a simples leitura do que ocorre em uma sala de aula não registra o desvelamento de

ações e o porquê dessas ações.

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Se, de outro lado, o pesquisador supõe que o mundo deriva da compreensão que as pessoas constroem no contato com realidade nas diferentes interações humanas e sociais, será necessário encontrar fundamentos para uma análise e para a interpretação do fato que revele o significado atribuído a esses fatos pelas pessoas que partilham dele. Tais pesquisas serão designadas como qualitativas, termo genérico para designar pesquisas que, usando ou não quantificações, pretendem interpretar o sentido do evento a partir do significado que as pessoas atribuem ao que falam e fazem. (CHIZZOTTI, 2006, p.27-28)

O ato de avaliar permeia qualquer ação docente; no entanto, a investigação

proposta requer a compreensão do uso da avaliação como possibilidade de

intervenções significativas à aprendizagem.

A sala de aula configura-se como um espaço mágico, um dinamismo

constituído através das interações humanas. Não há, portanto, razão para o

pesquisador optar por uma prática de pesquisa que não tenha o propósito de

interpretação dos dados, e esses devem ser coletados a partir da comunicação entre

pesquisador e professor alfabetizador por meio da sua prática pedagógica. Para

tanto, o suporte teórico apontado como referencial para subsidiar a avaliação como

prática libertadora e coerente com ações pedagógicas significativas norteará a

leitura a ser efetuada a partir da pesquisa.

A opção por uma pesquisa qualitativa reforça a ideia de uma relação viva

entre o pesquisador e o universo pesquisado. Os dados coletados estarão

carregados de manifestações emocionais, que deverão ser cuidadosamente

reconhecidas pelo pesquisador em suas análises; “esta relação viva e participante é

indispensável para se apreender os vínculos entre as pessoas e os objetos, e os

significados que são construídos pelos sujeitos” (CHIZZOTTI, 2006, p.84).

Uma prática de pesquisa qualitativa configura-se como uma prática válida e

necessária; de outro modo, seria difícil ao pesquisador encontrar elementos

representativos de ações humanas. Para Chizzotti (2006), os pesquisadores que

optam pela pesquisa qualitativa, ao se decidirem pela descoberta de novas vias

investigativas, não pretendem furtar-se ao rigor e à objetividade, mas reconhecem

que a experiência humana não pode ser confinada aos métodos nomotéticos por

não serem fatores regulares de uma análise sistêmica, tal como ocorre nas ciências

naturais.

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A presente pesquisa envolveu a busca pela descoberta de significados no

fazer pedagógico, tendo em vista ações de avaliar e alfabetizar. A efetiva leitura

acerca de tais ações procedeu a partir da análise de conteúdo, ferramenta utilizada

como uma forma de interpretação dos dados presentes no texto obtido por meio da

entrevista realizada.

Para explicitação dessa leitura ressaltam-se as observações de Chizzotti

(2006):

[...] um texto contém sentidos e significados, patentes ou ocultos, que podem ser apreendidos por um leitor que interpreta a mensagem contida nele por meio de técnicas sistemáticas apropriadas. A mensagem pode ser apreendida, decompondo-se o conteúdo do documento em fragmentos mais simples, que revelam sutilezas contidas em um texto. Os fragmentos podem ser palavras, termos ou frases significativas de uma mensagem. (CHIZZOTTI, 2006, p.115)

Dessa forma, o procedimento utilizado para a interpretação teve como

objetivo extrair o sentido do texto por meio das ideias centrais que transitaram no

universo da investigação. Nesse sentido, a interpretação das respostas remeteu a

uma leitura aprofundada da mensagem emitida pelos sujeitos da investigação, não

se restringindo apenas ao que expressava o texto dito, mas também a partir de uma

leitura subjacente do mesmo, em que elementos de análise puderam ser

compreendidos na composição das categorias identificadas.

A seleção das categorias ocorre com base no entrelaçamento das respostas;

para tanto, vale ressaltar que ela não parte de posições sequenciais, mas envolve

uma teia de possibilidades, principalmente, pela ferramenta de interpretação,

fundamentando-se por uma prática em que o significado extraído resulta de uma

leitura atenta e criteriosa. A opção por uma proposta de pesquisa interpretativa, na

explicação de Erickson (1989), dá-se por três razões: pela abrangência possível, por

evitar a simples conotação quantitativa ou qualitativa e, principalmente, por centrar o

interesse da investigação no significado humano na vida social.

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4.2 Critério de seleção dos sujeitos

O procedimento proposto para a presente investigação buscou a reflexão a

partir das respostas apresentadas pelos entrevistados. Nesse sentido, os

informantes deveriam encontrar liberdade e espontaneidade para expressarem

inquietações a partir de suas próprias práticas. Sendo assim, a entrevista foi pautada

por questões relacionadas ao foco presente na explanação teórica apresentada;

dessa forma, como aponta Triviños (1987),

É útil esclarecer, para evitar qualquer erro, que essas perguntas fundamentais que constituem, em parte, a entrevista semi-estruturada, no enfoque qualitativo, não nasceram a priori. Elas são resultados não só da teoria que alimenta a ação do investigado, mas também de toda a informação que ele já colheu sobre o fenômeno social que interessa, não sendo menos importantes seus contatos, inclusive, realizados na escolha das pessoas que serão entrevistadas. (TRIVIÑOS, 1987, p.146)

Tendo em vista a importância dos entrevistados, a coleta de dados realizou-

se em escolas públicas do Estado de São Paulo, na região que compreende os

municípios de Carapicuíba e São Paulo. Das três escolas escolhidas, foram

entrevistados oito professores que atuam na primeira série do Ensino Fundamental.

A opção por esse universo de análise se deu pelo projeto que embasa o

trabalho dos professores da rede pública do Estado de São Paulo, o Programa Ler e

Escrever.

O Programa Ler e Escrever teve início em 2007. Consta do seu histórico a

capacitação de educadores conjugada às diretrizes, conceitos, formato e materiais

de apoio que foram desenvolvidos para ações da iniciativa.

Sua implantação foi justificada pelo resultado apresentado por diferentes

avaliações realizadas11.

11 Dados obtidos em sistemas de avaliação, como os do Saresp 2005, indicaram que cerca de 20% dos alunos ainda não sabiam ler ao final do Ciclo I do Ensino Fundamental. Outros indicadores, como Inaf ou Pisa, mostraram que os alunos que conseguiram concluir o Ciclo II do Ensino Fundamental apresentavam dificuldades na leitura e compreensão de textos. Intervindo diretamente no cotidiano das escolas e das salas de aula, o Programa Ler e Escrever veio oferecer os instrumentos necessários para a mudança desse cenário (SÃO PAULO, 2008).

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Vale ressaltar que a análise do projeto “Ler e Escrever” não constitui objeto da

presente investigação. O objeto do estudo é o trabalho realizado por professores

alfabetizadores e o modo como esses profissionais estão usando a avaliação como

parte integrante do trabalho pedagógico.

Para uma maior precisão no campo da análise proposta, os entrevistados

deveriam ter um tempo de docência superior a cinco anos; desse modo, poderia ser

explorada de forma mais precisa a dimensão de concepções de ensino e avaliações

realizadas.

As entrevistas ocorreram de forma individual, evitando assim

constrangimentos, e também para que o informante se sentisse à vontade para

expressar seu pensamento referente à avaliação que realiza.

Por se tratar de entrevista semiestruturada, as questões propostas deveriam

desencadear falas espontâneas, sendo extremamente necessário o uso responsável

da entrevista, possibilitando o comprometimento com o retorno aos entrevistados do

material que fora coletado, como também a análise acerca da coleta dos dados à luz

das teorias estudadas. Para o procedimento de análise, coube a classificação,

caracterização, compilação dos dados obtidos por meio do conteúdo expresso na

fala dos professores.

4.3 Procedimentos de coleta

O término do ano letivo é um período em que são realizadas as avaliações

finais. Nesse momento, os professores fazem uma leitura do trabalho realizado. Na

maioria das escolas, esse é um momento para o replanejamento. Partindo desse

pressuposto, talvez fosse esse o melhor momento para a realização da pesquisa,

pois o pesquisador partilharia um momento de reflexão docente. Após contato com

direções de várias escolas públicas localizadas nos municípios citados, apenas três

escolas mostraram-se abertas à realização da pesquisa. Ressalta-se que as

professoras investigadas possuem formação superior, trabalham em escolas com

resultados positivos e estão envolvidas com uma formação contínua.

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O quadro 3 descreve o universo característico da pesquisa:

Quadro 3 – Dados dos entrevistados Fonte: Elaborado pela autora

4.4 Questões propostas: relevância à pesquisa

A entrevista semiestruturada, instrumento escolhido para coleta de dados,

envolveu uma relação pessoal entre pesquisadora e professora. Apesar de se

configurar como uma ação mais livre, não deixou de se pautar por cinco questões

básicas para análise. Ressalta-se, no entanto, que em algumas situações, pela

liberdade na exposição das ideias, outras questões poderiam ser objeto de análise;

porém, para uma melhor interpretação e configuração de um conjunto de ideias, as

questões norteadoras na entrevista foram as seguintes:

A) Como você avaliou seus alunos durante este ano?

A referida questão inseriu-se no contexto maior da pesquisa, quando o

pesquisador teve a concepção de avaliação presente nas ações pedagógicas e as

dimensões linguísticas exploradas pelas práticas.

PROFESSORA TEMPO DE DOCÊNCIA FORMAÇÃO

Professora 1 Mais de 18 anos Pedagogia

Professora 2 3 anos Cursa Pedagogia

Professora 3 Mais de 3 anos Pedagogia

Professora 4 Mais de 20 anos Pedagogia

Professora 5 21 anos Pedagogia

Professora 6 19 anos Superior (PEC)

Professora 7 23 anos Pedagogia

Professora 8 15 anos Pedagogia

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B) Sendo a sondagem uma das formas utilizadas como instrumento de avaliação, como ela pode ser explicada por você?

C) Como são utilizados os resultados da sondagem?

Ao se falar sobre a avaliação aos professores alfabetizadores da rede pública

estadual, de imediato surge a palavra sondagem, pois se trata de uma indicação

metodológica proposta pelos dirigentes; sendo assim, boa parte da entrevista

configurou-se por essa conceituação.

D) Além da sondagem, que outras formas são usadas p ara avaliar?

Os dados coletados através dessa questão serviram como um referencial

valioso para identificação da atitude do professor alfabetizador e de situações de

intervenção que podem ser significativas ou não.

E) O que é avaliar?

A questão foi colocada com o pretexto de estabelecer uma comparação entre

a prática e a concepção teórica que a envolve. A partir das respostas foi possível a

interpretação do fazer pedagógico como um cumprimento de regras ou uma ação

consciente e reflexiva.

A análise das informações recolhidas através das entrevistas realizou-se a

partir da organização das respostas, por questão, na busca por fatos que

desencadearam interpretações discutidas, tendo em vista os objetivos propostos

para a investigação. Para tanto, foram extraídas as ideias centrais das respostas

dadas; logo em seguida, essas ideias foram agrupadas em diferentes categorias de

análise possibilitando a interpretação na intersubjetividade com a teoria.

Alguns documentos coletados durante as entrevistas foram utilizados como

um referencial a mais de análise:

• Mapa de Avaliações ( ANEXO B)

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• Registros de avaliações (ANEXO C);

• Páginas de portfólios (ANEXO D);

• Ficha de Registro de Avaliação (ANEXO E);

• Registro de aluna pesquisadora (ANEXO F).

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5 AVALIAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO: ANÁLISE DO MATERIAL COLETADO

Em razão do término do ano letivo, os professores preparam seus relatórios

finais e fazem o balanço do trabalho realizado; em algumas situações, mostram-se

satisfeitos ou não com os resultados, tornando-se positiva a retomada do percurso.

Sobre essa retomada, vale ressaltar que é do interesse da pesquisa a prática

avaliativa dos professores alfabetizadores, de acordo com o universo explicitado

anteriormente, na seção que descreve a metodologia utilizada.

Em entrevistas semiestruturadas (APÊNDICE A), houve a coleta dos dados a

partir dos quais foi possível a interpretação de alguns aspectos significativos para o

intertexto: avaliação e alfabetização.

Como foi descrito anteriormente, a interpretação do conteúdo presente nas

falas não obedece a uma única ordem. Muitas vezes, encontram-se respostas em

diferentes situações que se cruzam, propiciando um universo amplo de

interpretação, oferecendo a possibilidade de uma análise crítica e favorecendo a

compreensão maior de uma mensagem por uma linguagem polifônica.

5.1 Avaliando o percurso de aprendizagem: uma interpretação de práticas

Como você avaliou seus alunos durante o ano?

As respostas a essa questão ofereceram três categorias para interpretação:

• avaliação como processo;

• avaliação como objeto de intervenção;

• sondagem como instrumento de avaliação.

A interrogação sobre como foi realizada a avaliação dos alunos resultou em

uma resposta comum: avaliar requer analisar o processo. Compreender avaliação

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como processo pode indicar uma possível prática formativa quando se coloca a

avaliação a serviço da aprendizagem.

P 3 - Eu avaliei o processo, todo o processo, os avanços que os alunos têm

no decorrer do ano, sempre procurando fazer intervenções que achava necessário

naquele momento para ele avançar.

P 6 - Pra mim, avaliação é tudo isso. No dia-a-dia, em cada atividade que

você vai dando, à medida que você vai trabalhando, interagindo e ir dando um passo

à frente.

Ao se efetuar uma interpretação mais atenta acerca do discurso da prática de

uma avaliação contínua, deve-se pontuar que o simples fato de a prática de

avaliação ser contínua, não viabiliza a intenção de avaliação com o propósito de

intervenções significativas.

P 1 - Procuro avaliar sempre meus alunos, verificando se o que eu ensinei,

tentei transmitir, foi passado de uma forma que eles compreendessem.

P 4 - Avaliação tem que ser contínua.

Quando as professoras relatam uma forma contínua de avaliar, podem

registrar uma mudança de paradigma sobre avaliação; para tanto, essa ação não

pode se resumir em um momento específico, como um controle técnico, atendendo a

uma definição seletiva.

A avaliação educativa deve ser contínua. Os sistemas avaliativos convencionais acomodaram-se aos ritmos periódicos de avaliação em consequência da racionalidade programática e previsível própria dos sistemas de controle. As avaliações periódicas pressupõem a realidade previsível e programável em toda sua extensão. Por isso perdem o contato e o acesso às imprevisibilidades que, quase sempre, são o que melhor caracterizam os sujeitos, os grupos, as

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instituições. O princípio da avaliação contínua não separa um tempo avaliável de outro não avaliável. (CASALI, 2007, p.20)

A indicação de uma prática contínua de avaliação na alfabetização representa

o rompimento com o “tempo” escolar, priorizando o tempo do sujeito aprendente. A

esse tempo não se estabelecem limites; no entanto, há um saber contínuo e é esse

justamente o que se pode avaliar.

P 3 - Tudo que o aluno faz para mim é progresso, é avanço.

P 6 - Eu avalio assim, eu não vejo o aluno pela prova.

As respostas discutidas até o momento apontam para a direção de uma

avaliação em que o percurso da aprendizagem é considerado. A essa afirmação,

vale à presente discussão uma observação sobre a forma de registro realizada.

Nesse sentido, o uso do portfólio de aprendizagem deve ser trazido ao presente

contexto, pois há um grande contentamento por parte das professoras ao

apresentarem o resultado nessa forma de registro, passando a ser este um recurso

válido para a leitura das aprendizagens.

O termo portfólio deriva do verbo latino portare (transportar) e do substantivo foglia (folha) e tem vindo a designar a pasta que contém desenhos, fotos, textos, pautas de música, seja de profissionais diversos ou de aluno. Emprestado do portfólio do artista, o conceito tem vindo a ser aprofundado e adotado no ensino elementar, secundário e superior. (NUNES; MOREIRA, 2005, p. 53)

Nos portfólios apresentados, há uma sequência de atividades realizadas

durante o ano, as sondagens.

P 6 - Como é o comportamento dele, como é que ele está progredindo. Eu

tenho isso muito firme comigo, então eu faço meu portfólio.

P 6 - Na última reunião, eu pego meu portfólio e dou as folhinhas para os pais

e falo: “Olha, quando a criança nasce, ela passa por vários estágios; ela primeiro

engatinha, depois ela anda, depois começa a andar de bicicleta”.

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Ao ser introduzido o portfólio como instrumento de registro, vê-se a intenção

de acompanhar a evolução de uma aprendizagem; ressalta-se a essa consideração

o fato de os documentos observados apresentarem os resultados encontrados

através das sondagens.

Por meio do portfólio os docentes podem verificar os avanços significativos e as dificuldades; os alunos têm pontos de referência para localizar onde estão, onde podem chegar e como farão para conseguir isto; os pais e a sociedade podem compreender o que se passa na escola para então colaborar e aprender com a instituição. Documentando o que as crianças e os adultos fazem conjuntamente desenvolve-se a consciência e as consequências de suas próprias ações. (SILVA; LORIZOLA, 2007, p.128)

O caminho para uma avaliação formativa inicia-se quando avaliar está

diretamente ligado ao ensinar. A identificação de um processo faz sentido a partir do

momento em que se realizam intervenções significativas.

O segundo elemento extraído das respostas dadas relaciona-se ao sentido da

avaliação como possibilidade de intervenções.

P 1 - Quando eu percebo que a aprendizagem não foi de acordo com o que

eu queria, eu retomo aquilo que eu queria passar para poder avançar.

P 3 - Sempre procurando fazer intervenções que achava necessário naquele

momento para ele avançar.

P 5 - E a partir de observações você pode fazer as intervenções necessárias

no momento certo. Às vezes, você consegue fazer as intervenções com o aluno e

ele acaba entendendo.

Avaliar um processo de aprendizagem na alfabetização precisa ser

acompanhado de um fazer pedagógico que suscite aprendizagem, evolução.

O resultado de uma aprendizagem deve expressar mais do que um registro

periódico, mas um o que fazer diante do resultado. Para Perrenoud (1999), o

diagnóstico será inútil se não der lugar a uma ação apropriada. Uma verdadeira

avaliação formativa é necessariamente acompanhada de uma intervenção

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diferenciada, que pressupõe meios de ensino, de organização do grupo aula, até

mesmo de transformações radicais das estruturas escolares.

P 8 - Os alunos trabalhavam em duplas de acordo com o estágio que se

encontravam: alfabético com alfabético e pré-silábico com pré-silábico.

A mudança na dinâmica das aulas foi favorecida pela avaliação, e por trás

disso, uma intenção clara de se concretizar a aprendizagem.

P 8 - É lógico que é um trabalho árduo, mas desde o princípio, quando recebi

essa sala da coordenação, é que começou o processo (o processo de ensino da

leitura e escrita).

Analisando-se o registro anterior, encontra-se no relato a dificuldade na

realização de uma avaliação formativa, ou melhor, no desdobramento de ações

significativas, tendo em vista os resultados encontrados em uma avaliação. Vale

lembrar que a questão posta nesse momento diz respeito a como se avaliou,

conduzindo algumas respostas diretamente ao avaliar e intervir. A prática em uma

opção de avaliar a serviço da aprendizagem traz dúvidas; encontram-se inúmeras

dificuldades para tal realização:

[...] a avaliação formativa constitui, em si mesma, uma problematização de numerosos e fecundos aspectos do sistema escolar estabelecido. Para poder ser praticada, deve gozar de um certo espaço resultante, por um lado, de uma tomada de consciência, por parte das instituições, da necessidade de certo “jogo” dentro do sistema, indispensáveis à sua própria existência, pois implica pessoas muito diversas; e por outro lado, dispor de iniciativa individual, gosto pela experiência e, poderia até dizer-se, de certa audácia aventureira. Mas tudo isto, para ser realista, à partida que tenhamos perfeita consciência do contexto em que nos encontramos. (ABRECHT, 1986, p.142-143)

Encontrar dificuldades na ação pedagógica representa configurá-la de uma

maneira reflexiva. Propor que aos alunos seja dado o direito de agir a partir do

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objeto de conhecimento pode se caracterizar como um compromisso com uma

educação permitindo uma ação transformadora.

O mérito das práticas que tentam uma mudança na ação pedagógica não

pode impedir que se faça uma análise sobre a ênfase dada à aprendizagem da

escrita. Avaliar aprendizagem durante o processo de alfabetização requer uma

compreensão mais complexa dessa ação.

De qualquer forma, o que fica evidente é a complexidade da construção da escrita que, longe de ser um processo monolítico, de progressão linear, previsível e controlável pela ação pedagógica, constitui-se num emaranhado de funções cognitivas, que avançam sob diferentes aspectos da língua com base em concepções, hipóteses, erros construtivos, conflitos e a assimilação (total, parcial ou mesmo deturpada) de informações. Na progressão erigida pelo fazer e refazer, construir e reconstruir, agir e refletir, o jovem aprendiz é sempre convidado a considerar novos pontos de vista e novas possibilidades de produção ou de interpretação oferecidas pelo desequilíbrio cognitivo e pelo aprendizado. (COLELLO, 2007, p.32)

Definir a aprendizagem da leitura e escrita como um processo natural, como

mostra P8, indica um desconhecimento das complexas estruturas elaboradas

durante a aprendizagem.

P 8 - Eles se autoalfabetizaram. Veja bem que a partir de uma lista, eles

descobriram que conseguiam escrever outras palavras. Muitas vezes, eles nem

precisavam de mim, muitos deles. Eles mesmos olhavam e procuravam o nome dos

colegas. Queriam escrever fruta, “fru”, eu não trabalhei o “fru”, eu dei um texto, eu li

um texto para eles, a gente tem uma coletânea de textos.

O que existe por trás da percepção de uma criança sobre o universo da

aquisição da leitura e escrita? Tal complexidade deve ser compreendida para uma

ação que atenda às diversidades de aprendizagem.

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No universo investigado, uma das professoras fez menção à oralidade; no

entanto, não foi identificado o registro dessa observação nos documentos

apresentados (ANEXO C).

P 7 - O Projeto, esse Projeto Ler e Escrever foi uma coisa que ajudou muito,

porque deu liberdade para estarmos trabalhando com as crianças aquela oralidade,

histórias e muita variedade de textos, foi onde as crianças tiveram aquela

desenvoltura para se expressar.

O documento curricular citado pela professora prevê a inserção de um

trabalho pedagógico que vá além de um modelo de ação apenas circunscrito ao

escrever, ou a uma escrita descontextualizada; a professora relaciona ação de

oralidade aos textos presentes do mundo infantil. Sabe-se, no entanto, que uma

proposta curricular, conforme cita Lerner (2002), supõe tomar decisões que afetarão

muitas escolas – todas as que pertencem a uma jurisdição. Nesse sentido, fazer

propostas que serão colocadas em prática em instituições muito diversas apresenta

problemas diferentes dos que se apresentam ao se orientar o trabalho de uma

escola ou de uma classe específica, já que é inevitável perguntar pela validade das

propostas para essa diversidade de situações, cujas especialidades nem sempre é

possível conhecer de perto.

Acompanhando o raciocínio anterior, tendo como apoio a exposição de Lerner

(2002), observa-se a citação do material de orientação pedagógica como um

avanço; ressalta-se, entretanto, a diversidade de ações a partir do documento

proposto como referência. Um item foi comum em todas as falas, cumprindo com o

proposto pelas orientações curriculares: a avaliação realizada pelos professores

alfabetizadores liga-se à prática da sondagem12.

12 De acordo com o Guia de Planejamento e Orientações Didáticas do programa Ler e Escrever, das Secretarias Estadual e Municipal de São Paulo, a sondagem é descrita como uma atividade que envolve, num primeiro momento, a produção espontânea de uma lista de palavras sem apoio de outras fontes e pode ou não prever a escrita de algumas frases simples. Essa lista deve ser lida pelo aluno assim que terminar de escrevê-la (SÃO PAULO, 2008).

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A prática de avaliação realizada pelos professores envolve a prática da

sondagem. Ao contexto da presente discussão essa ação foi categorizada, pois não

se concebe, de acordo com a proposta indicada, avaliar durante o período de

alfabetização sem a realização da sondagem.

P 2 - Inicialmente, adotamos sondagem mensalmente. As crianças fazem a escrita

de um ditado de palavras e uma frase.

P 4 - Avaliação tem que ser contínua, por quê? Nós damos no mínimo quatro

sondagens por ano. Aquela sondagem obrigatória, para ver como o aluno se

encontra.

Um contraponto no que foi descrito anteriormente relaciona-se ao fato de a

sondagem ter dia e hora marcados, contrariando assim uma prática formativa.

Estabelecer como princípio de ação avaliativa um ritual marcado para identificar

hipóteses de escrita contraria uma ação formativa. Duas questões merecem

atenção: uma é a importância de uma atitude que mostre aprendizagens individuais,

e a outra mostra que só poderá ser efetuada uma leitura de aprendizagens se

houver um procedimento para tal.

P 6 - A cada dois meses tem uma avaliaçãozinha que é minha, eu e ele, cara a cara.

A gente chega, eu dou as palavras pra eles, e eles não têm como copiar de

ninguém, eu e ele, fala para mim como se escreve felicidade. Eu vou saber em que

hipótese a criança está; você começa a trabalhar em cima da hipótese dele.

A sondagem, partindo da exposição anterior, passa a se configurar como um

momento especial para a avaliação. Hadji (2001), ao expor obstáculos à emergência

de uma avaliação formativa, relaciona o fato da presença da certificação como uma

atividade de triagem científica, confirmando o modelo de uma prática pautada por

um propósito operatório. Nesse caso, o essencial é poder determinar tipos de erro; a

análise dos resultados será mais rica e útil se as informações retidas durante a

observação forem capazes de alimentar uma interpretação dos itens, dos erros ou

acertos dos alunos.

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5.2 Analisando a prática da sondagem

Os relatos das professoras entrevistadas registraram a tendência de

privilegiar a prática da realização da sondagem como uma forma acertada de indicar

o aprendizado do aluno.

Curioso nessa questão é que as entrevistadas consideram o instrumento de

avaliação como um avanço, algo que trouxe enriquecimento aos professores

alfabetizadores; percebe-se nas falas uma satisfação por poderem visualizar, por

meio da ação, um crescimento profissional. Dessa forma, tornou-se imprescindível a

identificação de categorias rigorosas para a investigação e a interpretação.

Ao se proceder ao mapeamento das ideias centrais presentes no conteúdo

das respostas, foi possível estabelecer as seguintes categorias de análise:

• realização da sondagem com um formato único: ditado de quatro palavras

e uma frase;

• ação proposta com um propósito de construção;

• utilização dos resultados da sondagem como parâmetro para estratégias

de ensino;

• visualização dos resultados em registros formais: portfólio e mapas com

cores.

Os professores que atuam como professores alfabetizadores nas escolas

públicas do Estado de São Paulo são orientados a realizarem periodicamente uma

atividade avaliativa intitulada sondagem. O Guia de Planejamento e Orientações

Didáticas do programa Ler e Escrever, material publicado pela Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo, considera a sondagem como uma espécie de

retrato do processo do aluno em um determinado momento. As explicações para se

proceder à atividade são colocadas da seguinte maneira:

• As palavras devem fazer parte do vocabulário cotidiano dos alunos, mesmo que eles ainda não tenham tido a oportunidade de refletir sobre a representação escrita dessas palavras. Mas não devem ser palavras cuja escrita tenham memorizado.

• A lista deve contemplar palavras que variam na quantidade de letras, abrangendo palavras monossílabas, dissílabas etc.

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• O ditado deve ser iniciado pela palavra polissílaba, depois pela trissílaba, pela dissílaba e, por último, pela monossílaba. Esse cuidado deve ser tomado porque, no caso de as crianças escreverem segundo a hipótese do número mínimo de letras, poderão recusar-se a escrever se tiverem de começar pelo monossílabo.

• Evite palavras que repitam vogais, pois isso também pode fazer com que as crianças entrem em conflito – por causa da hipótese da variedade – e também se recusarem a escrever.

• Após o ditado da lista, dite uma frase que envolva pelo menos uma das frases da lista, para poder observar se os alunos voltam a escrever essa palavra de forma semelhante, ou seja, se a escrita dessa palavra permanece estável mesmo no contexto de uma frase. (São Paulo, 2008, p.34)

Toda essa orientação para a realização de uma sondagem com o fim de

avaliação transforma essa prática em uma ação mecânica. Citar o ditado de quatro

palavras e uma frase para explicar o propósito da atividade de avaliação desloca o

papel principal que permeia uma prática para uma simples situação corriqueira a

qual precisa cumprir o papel de revelar as hipóteses linguísticas definidas pelo

pensamento de um grupo de crianças.

Observando alguns dos relatos sobre a prática de aplicação da sondagem,

cabem algumas considerações referentes à raiz da sua aplicação, ou seja, como

ocorreu em uma pesquisa científica a tarefa primeira proposta por Ferreiro e

Teberosky de descobrir as hipóteses que a criança põe em jogo quando é desafiada

a pensar sobre sua produção de escrita.

P 1- [...] eu estou chamando cada aluno e verificando dentro de um grupo

semântico de palavras o quanto ele avançou no aprendizado.

P 3 - [...] a gente procura um campo semântico, brincadeiras, aniversário. A

última foi Natal. São palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e

monossílabas.

P 4 - [...] Então nós escolhemos quatro palavras: uma dissílaba, monossílaba,

trissílaba e polissílaba.

P 6 - A sondagem é assim, a gente pensa em quatro palavras. A gente não

pode falar as palavras de forma separada, por exemplo: fe-li-ci-da-de. A gente

fala a palavra no geral para eles e eles têm que escrever uma polissílaba,

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uma trissílaba, uma dissílaba e monossílaba e uma frase com alguma palavra

que eu ditei.

P 7 - Essa sondagem, a gente costuma fazer, por exemplo, assim, um ditado

com o mesmo campo semântico.

Ao serem questionadas sobre a sondagem que realizam, as professoras

frisaram algumas questões julgadas importantes. Por que o campo semântico? Por

que as palavras diferentes na quantidade de sílabas? O que compreendem acerca

das aprendizagens com execução da tarefa? Essas indagações reforçaram a

afirmação sobre a forma mecânica presente nessa ação.

Percebe-se o cuidado das professoras em exporem a regra proposta na

atividade; contudo, não fica claro, pelos relatos apresentados, quanto tal rigor pode

suscitar em significados ao professor para compreender o pensamento de uma

criança frente ao objeto de conhecimento. Outra questão oferecida pelo formato

único da atividade é sua limitação para reconhecer o universo de aprendizagem

necessário para que a sondagem se constitua como uma proposta pedagógica

significativa.

A limitação percebida por meio desta pesquisa justifica-se no momento em

que uma avaliação se restringe a uma atividade formatada de escrita, ignorando, por

exemplo, o que pensa uma criança sobre a relação entre imagem e texto. Colello

(2004), ao definir as sucessivas hipóteses na conquista da escrita, expressa com

propriedade a existência de um caráter criativo presente na construção do saber.

Ainda afirma que:

Por trás de cada produção ‘incorreta’ e aparentemente aleatória, existe uma infinidade de concepções já formadas, de critérios inteligentes e de tentativas tão fecundas que, de algum modo, promovem a evolução. (COLELLO, 2004, p.31)

Qual o propósito de levar uma criança a uma situação especial e lhe pedir

para que proceda à escrita de quatro palavras e uma frase? Como pode pensar um

professor a partir de tal produção desprovida de desejo e magia?

Em nenhum dos relatos foi possível identificar a preocupação das professoras

em perceberem por meio da sondagem a concepção presente em uma produção. Ao

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procederem às suas pesquisas, Ferreiro e Teberosky foram guiadas pela hipótese

de que todos os conhecimentos supõem uma gênese, ou seja:

[...] nos preocupamos em averiguar quais são as formas iniciais de conhecimento da língua escrita e os processos de conceitualização resultantes de mecanismos dinâmicos de confrontação entre as idéias próprias do sujeito, de um lado, e entre as idéias do sujeito e a realidade do objeto de conhecimento, de outro. (FERREIRO, TEBEROSKY, 1999, p.262)

Como foi pontuado anteriormente, não houve a intenção das estudiosas em

apresentar um roteiro de prática ao professor; todavia, suas pesquisas propiciaram o

deslocamento de como se ensina para quem aprende. Sobre quem aprende é o foco

principal da presente pesquisa. Neste momento da análise realizada sobre a prática

da sondagem, a primeira constatação válida como referencial de reflexão crítica é a

limitação da referida atividade de sondagem.

Ferreiro (1993) alerta sobre a utilização de instrumentos que possam refletir

de forma inadequada uma pseudonecessidade institucional de encontrar maneiras

que possam classificar crianças. Em nota de rodapé, a autora fez o seguinte registro:

A utilização dos resultados de pesquisa como ‘testes’ escapa à responsabilidade do pesquisador: eu não fabriquei nenhum teste de ‘quatro palavras e uma frase´; nem de análise das partes de uma oração escrita e, mesmo assim, usam-se no Brasil essas expressões para designar provas com fins diagnósticos. (FERREIRO, 1993, p.75)

O contexto ao qual se referiu Ferreiro (1993) na citação acima não remete à

prática da sondagem avaliativa como a proposta à rede pública do Estado de São

Paulo; porém, sua excessiva ênfase passou a ser questionada neste trabalho,

usando-se assim Ferreiro, por meio de sua citação, para respaldar uma análise.

O propósito de construção permeia a fala das entrevistadas; isso permite

reconhecer na prática de avaliação indicada pela sondagem uma postura

construtivista em que são apontados processos individuais no avanço das

aprendizagens.

P 1 - Todo mês eu faço um diagnóstico da minha sala para saber como anda

o aprendizado deles, no sentido de saber que avanço eles tiveram dentro da

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proposta da Emília Ferreiro, o construtivismo, que é saber onde estão os

níveis de aprendizagem.

As pesquisas realizadas por Ferreiro e Teberosky (1999) tentaram elucidar

um processo singular de construção. Apoiadas pelas teorias piagetianas, elas de

fato apresentaram não simplesmente níveis diferenciados de escrita, mas a

complexidade relacionada a esse processo de construção. Deve-se levar em

consideração, compreendendo-se o processo cognitivo presente nessa construção,

que:

No desenvolvimento da leitura e escrita, considerado como um processo cognitivo, há uma construção efetiva de princípios organizadores que, não apenas não podem ser derivados somente da experiência externa, como também são contrários a ela; são contrários, inclusive, ao ensino escolar sistemático e às informações não-sistemáticas. Uma teoria completa do desenvolvimento infantil da escrita não pode deixar estes problemas sem solução. São exatamente estes problemas que adquirem um significado preciso e definido dentro do marco teórico da teoria de Piaget. (FERREIRO, 1989, p.21)

O valioso na compreensão da aprendizagem como um processo de

construção é justamente transformar a avaliação, ou a sondagem, ou outro nome

que possa ser dado, na possibilidade de entender o que há por trás de uma não

aprendizagem, que situações internas estão desencadeando os entraves da

evolução para a aprendizagem da leitura e escrita. A mesma professora que afirmou

a importância do trabalho como construção, apresentou um relatório em que são

pontuados apenas os níveis de conhecimento da escrita (ANEXO D).

A busca pela compreensão da aprendizagem individual indica, como se

percebe em P 4, um avanço no ensino da leitura e escrita, e é isso que a presente

pesquisa tem como dever pontuar.

P 4 - A sondagem é a que você descobre onde o aluno, em que ele está mais precisando. Por isso é importante a sondagem. Essa sondagem foi o que nos enriqueceu. Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. Por isso, a sondagem é importante, porque através dela, eu sei o que meu aluno está precisando.

Cabe, entretanto, no relato acima, que se façam algumas observações acerca

da sondagem. Como foi visto, a sondagem representa a identificação de níveis

linguísticos diferenciados que as crianças de uma classe apresentam; portanto, as

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marcas de escrita colocadas em uma sala não representam a ampla possibilidade

individual de uma criança. Nas palavras de Ferreiro (1993):

Algo que parece importante ressaltar é que, para mim em particular, e para outros colegas, o dado com o qual trabalhamos não é nunca a página que ficou marcada pelo ato de escrita de uma criança; o dado com que nos parece adequado trabalhar é um dado múltiplo que compreende: as condições de produção, b) a intenção do produtor, c) o processo de produção, d) o produto e e) a interpretação que o autor do produto dá a esse produto, uma vez produzido. [...] Geralmente não se pode dizer quase nada frente a uma única só escrita; é preciso cotejar uma série de produções escritas... (FERREIRO, 1993, p.82)

Quando se depara com a afirmação de Ferreiro (1993), pode-se perceber a

necessidade de ampliar as possibilidades avaliativas da sondagem. A discussão

sobre uma forma individual presente nos trajetos de aprendizagem deve ser

ampliada para outros elementos que não se reduzam apenas à identificação das

hipóteses de escrita, conforme os registros de P 5 e P 6:

P 5 - Os ganhos são que você verifica muito bem em qual hipótese seu aluno está, dentro das hipóteses que você criou a respeito dele através das observações. P 6 - Eu vou avaliar a hipótese dela, se ela está silábica, se está silábica alfabética [...]. Observando-se os registros em anexo (ANEXOS B, C e D), comprova-se uma

visão individual, porém simplificada, de observações. Retomando-se os relatos e

observando-se os registros, é possível encontrar uma avaliação reduzida à

identificação de hipóteses silábicas, o que pode ser visto sob um prisma individual

de avaliação, pois, apoiando-se na fala de uma das professoras entrevistadas, a

leitura realizada sobre a aprendizagem é muito individual; depende da observação

do professor.

P 5 - A sondagem é muito boa num caso desses, para o professor que trabalha ali observando. O professor que trabalha sem essa observação pode errar no conceito. Dessa forma, além de se reconhecer na sondagem sua limitação, pode-se

também encontrar disparidades sobre os resultados demonstrados. Mais uma vez, é

necessário certo cuidado ao se levantar uma posição única acerca da leitura feita

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sobre o resultado apresentado em um mapa ou em um relatório simplificado

(ANEXOS C e E).

Um referencial de análise da construção individual ultrapassa os limites de

caracterização dos níveis de escrita. Nesse sentido, vale insistir para o cuidado de

rever os paradigmas dessa observação, principalmente quando se percebe uma

enorme confusão na definição desses níveis para caracterização de alunos:

P 7 - Aqueles alfabéticos vão fazer brincando, agora aqueles que estão pré-silábico e silábico, eles vão omitir algumas letras. P 8 - Então, geralmente, com os pré-silábicos e com os sem valor, eu ficava uma vez por mês, uma vez a cada quinze dias, eu estava fazendo a sondagem pra ver se eles vão evoluindo.

O aluno não pode ser considerado alfabético ou silábico; é preciso entender

que a expressão cabe à hipótese aceita por uma criança em um determinado

período.

A terceira categoria a ser analisada sobre a prática da sondagem como

instrumento de avaliação refere-se ao fato de as professoras compreenderem a

importância da utilização do resultado dessa prática como elemento precursor para

a organização e reorganização de estratégias de ensino. A definição de que é

possível, a partir da identificação das aprendizagens do grupo, formular atividades

para propiciar os avanços, deve ser entendida como um progresso proveniente da

prática da sondagem, apesar dos indícios de limitação e simplificação, como fora

afirmado anteriormente. Para uma melhor fundamentação nesta análise, vale

conferir fragmentos dos relatos validando um aprofundamento em seus méritos.

P 4 - Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. A partir dali, eu vou trabalhar com meu aluno. Eu não vou chegar ao final do ano e falar assim: “passaram tantos, tantos conseguiram alfabetizar e tantas não conseguiram”, porque agora, com a sondagem, eu sei por que não conseguiram. Por isso, a sondagem é importante, porque através dela, eu sei o que meu aluno está precisando. Eu posso trabalhar.

Pelo relato anterior, fica a certeza de não se separar a avaliação da Didática,

ou seja, o propósito maior de uma situação de avaliação é justamente refletir sobre

uma prática que favoreça a aprendizagem do aluno. No que se refere à

alfabetização, não há uma receita que possa indicar qual o melhor procedimento a

ser adotado; porém,

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[...] considerar os processos cognitivos envolvidos na construção da língua, buscando uma sintonia na relação entre o ensino e a aprendizagem, significa colocar o aluno como centro (meio e meta) da prática pedagógica. (COLELLO, 2007, p.34)

O reconhecimento da possibilidade de um trabalho diferenciado, suscitando a

aprendizagem de um aluno com uma hipótese de ensino mais primitiva, para os

professores entrevistados, só passa a acontecer por admitirem a sondagem como

fator principal na tomada da decisão.

P - 1 Ela serve para mim, para eu estar verificando como anda o aprendizado dentro da minha sala e que tipo de atividade eu tenho que passar, que estar propondo para eles, para poder suprir o que está sendo necessário naquele momento. A supervalorização a partir da realização da sondagem reflete na existência

de uma proposta concreta de ação. Quando a professora relata ser a sondagem dos

conhecimentos do aluno o fator principal para a realização de uma situação de

ensino diferenciada, atendendo às diferenças do grupo, essa situação pode ser

entendida como uma reorganização de funções em uma concepção de ensino

pautada pela construção.

Presencia-se a mudança na concepção de ensino na Escola Pública estadual;

porém, os professores compreendem ser o momento atual, por meio dos cursos e

orientações que recebem, o que está garantindo a aprendizagem para a

compreensão de uma prática que não despreza saberes, mas os respeita com

situações significativas às particularidades existentes.

P 6 - Tem um trabalho diversificado sendo realizado, atende a todos, mas não da mesma forma; cada um vai ao seu passo. Alguns precisam apenas de um tranquinho para ir, mas tem criança que ainda penou, mas teve uma evolução. P 4 - Há uns anos atrás, eu não conseguiria fazer essa sondagem. Hoje, a partir dos cursos que nós temos, dos encontros, das palestras, essa sondagem tornou-se muito importante para mim, para nós professores.

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A dúvida que fica, pela consideração realizada anteriormente, é se realmente

foi a sondagem que mudou o trabalho dos professores ou se foi o entendimento

acerca de uma concepção de ensino.

Os professores são unânimes em afirmar a dificuldade existente no trabalho

que contemple as diferenças do grupo; apesar disso, estavam empolgados com os

registros que mostravam. Sobre tais registros, é que se encontrará mais um

elemento no conteúdo a ser analisado.

Outra mostra de satisfação do trabalho realizado encontra-se na

apresentação dos portfólios. O que contêm esses portfólios? As diversas sondagens

realizadas durante o ano letivo. As sondagens são apresentadas em uma ordem de

datas em que se pode perceber a evolução ou não dos níveis de escrita pelas

crianças.

A maior satisfação encontra-se no fato de se efetivar o registro de ações. A

prática do registro, infelizmente, não contempla o cotidiano das práticas pedagógicas

brasileiras. Professores alegam ser trabalhoso, que também possuem muitas outras

atribuições, não concebendo a ação de registrar; no entanto, ao se depararem com

o registro, pelo menos por meio das sondagens, há uma mostra de satisfação.

P 6 - Aqui eu vou vendo a evolução da criança. Olha que show este aqui!

Todas as professoras entrevistadas citaram os portfólios como mostra de

seus trabalhos. Algumas páginas estão anexadas a esta pesquisa pois representam

elementos valiosos ao presente trabalho. A este ponto, a pesquisa encontrou não na

sondagem o elemento de satisfação, mas na ideia de ver o resultado de um trabalho

ser registrado.

P 8 - Um outro cuidado que eu tinha era escrever como eles estavam; eu tive treze crianças que relacionei no meu relatório final; falta-me entregar o portfólio (para a coordenação); dessas treze crianças, foram essas três que me preocuparam. Quando eu fui olhar bem, com a vivência deles em casa... Um deles, em casa, era imaturidade total; ele acabou de fazer sete anos, então a mãe tem todo aquele mimo com ele, porque o pai acabou abandonando, foi embora, morar com outra pessoa. Ele sai às cinco horas da manhã, volta às nove. Dez horas da noite, ele já está dormindo. Então, ela não tem o contato, ela não tem aquele tempo hábil para poder estar com ele. Então ele ficava o dia inteiro na rua, quando dava meio dia e meia, ele colocava a roupa para vir para a escola.

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Essa fala da professora não aparece em seu registro; tais informações sobre

a criança se perderão. Em seu portfólio, consta um aluno que vivenciou uma

determinada hipótese silábica. No mapa da sala, aparece o nome de uma criança e

uma caracterização de cor. Sobre a prática da professora, a partir de sua

observação, os registros apresentados não poderão se materializar. Weffort (1996),

sobre a importância do registro, faz considerações de extrema importância:

Mediados pelo registro deixamos nossa marca no mundo. Há muitos tipos de registro, em linguagens verbais e não verbais. Todas quando socializadas historificam a existência social do indivíduo. Mediados por nossos registros, reflexões, tecemos o processo de apropriação de nossa história, a nível individual e coletivo. (WEFFORT, 1996, p.41)

Outra observação acerca dos registros se refere ao seu propósito primeiro, ou

seja, comunicar a outro uma informação, porém, que o outro possa ser interlocutor

em um diálogo. Como é bom saber que se mantém uma relação dialógica a partir de

observações, ao contrário de simplesmente se mapearem as informações, utilizando

cores diferentes e encaminhando as informações para a coleta de dados gerais que

podem não ser fidedignos.

P 3 - Eu acredito nessa diferença, você faz a sondagem, você fala, ele está silábico com valor, outro vem e dá outro nível. Eu acho delicado. Não existe uma camuflagem.

A professora, no relato acima, questiona a avaliação feita por considerar

possíveis interpretações a uma mesma produção. Apesar disso, como parte de uma

exigência das políticas públicas do Estado de São Paulo, os professores entregam

os resultados que seus alunos obtiveram à coordenação da escola, que se

encarrega de informar o resultado dos mapeamentos à Diretoria Regional de Ensino,

que, por sua vez, envia os resultados aos órgãos da SEE/SP.

P 6 - Aqui está o mapa da turma, este mapa é meu, mas o que vai pra secretaria é outro. Porque esse é o meu, fica comigo, o outro, eles são iguais. Quem está com a cor vermelha, é pré-silábico, quem está com a cor roxa ele é silábico sem valor, quem está na cor laranja ele é silábico com valor, azul é silábico alfabético e amarelo é alfabético. Como eu sei disso? No primeiro mês eu dei as palavras, ele escrevia... P 7 - [...] nós temos assim registrado (mostra do portfólio). Os alunos, em vermelho, não conseguiram ser alfabetizados. Por quê? Porque não me

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mostraram, não conseguiram memorizar as letrinhas, até as do próprio nome. Por exemplo, a Talita, eu pergunto: “Talita, seu nome começa com o quê?” E foi trabalhado. Foi trabalhado o alfabeto, foram trabalhadas as histórias, parlendas, cantigas, músicas e tudo que você pode pensar. Então, o que aconteceu com ela, ela não conseguiu memorizar as letrinhas, ela não deu valor para essas letrinhas, entendeu?

Não pode ser tão simples apresentar os alunos em vermelho apenas por uma

mostra de cores. O mapeamento por cores restringe a leitura da aprendizagem do

aluno, impedindo o reconhecimento de um pensamento que poderia ser superior ao

que está sendo mostrado, pois simplesmente a utilização do instrumento da

sondagem, na dimensão em que é adotado, não consegue exercer tal

reconhecimento.

Quando a professora tenta tecer uma justificativa para a não aprendizagem

de uma aluna, o registro feito mostra-se ineficiente, pois não consegue o registro

reflexivo de retomadas que poderiam ser realizadas. A simples observação de que

tudo foi feito para que a aluna aprendesse, mas ela não conseguiu memorizar as

letrinhas, mostra uma enorme confusão sobre o processo de construção dessa

criança, que não poderá ser elucidado por simplesmente estar reduzido a um mapa

de cores, fruto de algumas sondagens realizadas por solicitação de uma equipe

gestora. A validade de um documento de classe como instrumento de trabalho

significativo faz sentido quando:

A realização de um documento de classe leva o professor a: perceber quais são os seus critérios de avaliação; perceber que tipo de intervenção dirige a cada criança ou em cada situação (se estimula, facilita, observa o que ocorre etc.); constatar o que vê e conceitualizar (a partir do que sabe sobre as crianças). (TEBEROSKY; CARDOSO, 1993, p.64)

Durante o período em que esta pesquisa foi conduzida, algumas falas das

professoras entrevistadas contrastaram com o relato feito por escrito por uma aluna

pesquisadora13 (ANEXO F). No relato, a aluna registra o momento tenso envolvido

13 Aluno pesquisador é a designação feita aos alunos universitários que participam do Projeto Ler e Escrever. Durante um período, os alunos ficam envolvidos com a situação didática ocorrida em diferentes salas de aula das primeiras séries. Os alunos registram observações que julgam ser relevantes e apresentam ao professor orientador. Vale ressaltar não ser o propósito das investigações didáticas a pesquisa relacionada à avaliação.

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na realização da atividade. O fato de a professora não perceber, pela sondagem

realizada, o progresso de seus alunos, fez com que ela se desesperasse, no caso

apresentado, chegando até mesmo a alterar o resultado para não mostrar um

resultado negativo numa escala que fora citada anteriormente.

O que podem representar os registros utilizados pelos professores

alfabetizadores tendo em vista as sondagens realizadas?

Pela exposição feita com base na leitura atenta do conteúdo presente nos

relatos referentes às questões três e quatro, houve o apontamento de outra situação

a ser analisada: a sondagem não representa o único instrumento de avaliação;

porém, quando as professoras são questionadas a respeito de como avaliaram seus

alunos, a primeira fala presente em todos os relatos é a sondagem.

No decorrer das falas, compreendem-se outras situações nas quais se

apoiam as professoras para suas avaliações; sobre essas formas será a próxima

análise a ser proferida. Para tanto, a questão da sondagem discutida amplamente

até o momento remete a um pensamento crítico acerca de uma prática travestida de

uma concepção de construção; no entanto, como está sendo realizada, pode ser

caracterizada como mecanicista e reducionista. Quanto aos registros, eles podem

ser caracterizados como um avanço, principalmente se forem válidos como

instrumentos de reflexão; registros que serão utilizados para se efetuar um diálogo

construtivo, e não constatações e aferições. Além disso, a ação individualizada em

que se caracteriza a prática de avaliação, seu processo contínuo, denota também

indícios de avanço.

5.3 Os diferentes instrumentos de avaliação utilizados por professores alfabetizadores

A questão norteadora para a presente análise foi obtida a partir das

indagações anteriores. Ao serem questionadas sobre como avaliaram os alunos

durante o ano, as professoras de imediato relacionaram a avaliação realizada com a

prática da sondagem, como fora discutido anteriormente. Apesar de a afirmação ter

sido direcionada principalmente a uma prática em que a sondagem se configura

como instrumento principal, foi necessário o questionamento acerca de outras

formas utilizadas para avaliar, além da sondagem. Com o propósito de identificar, na

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prática avaliativa, questões referentes às intervenções pedagógicas, fez-se

necessário um desvelar de práticas envolvendo o cotidiano da escola pública do

Estado de São Paulo, no caso, nas classes de alfabetização.

As respostas à pergunta sobre outros instrumentos de avaliação utilizados

suscitaram um conteúdo de análise em que podem ser categorizados dois

elementos principais:

• utilização de provas como instrumento de avaliação;

• uso de provas como prestação de contas às famílias.

A primeira das questões levantadas relaciona-se à presença das provas no

cenário das escolas, nas turmas de alfabetização.

Pelos relatos, as professoras apresentaram a aplicação das provas como

sendo um momento necessário à prática pedagógica. Trata-se de uma elaboração

coletiva em que o grupo de professoras reunido pensa nas questões que comporão

a atividade.

P 1 - Fazemos outras atividades elaboradas pela equipe. P 2 - Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os conteúdos do bimestre, usamos um texto de memória. P 3 - Nós fazemos uma prova bimestral, fazemos um provão. Nos reunimos, as colegas e montamos. P 4 - [...] tem também as provinhas, todos nós professores sentamos ali, montamos também essa provinha. A gente nem conta muito, porque é primeira. P 6 - A provinha é mais pra mostrar pra comunidade, o que interessa pra gente não é aquela provinha. P 8 - Não há provas, até teve, mas foi uma questão assim, como teve o SARESP; eu não faço, mas tenho colegas que fazem. Elas fazem questão de fazer a avaliação bimestral.

Os motivos podem não ser os mesmos; no entanto, a primeira análise a ser

feita diz respeito à importância que ainda assume o momento da prova durante o

período de avaliação. O que se cobra nessa atividade? Pelo relato de uma das

professoras, todo o conteúdo do bimestre. As mesmas professoras que

anteriormente citaram a sondagem como uma prática de construção aceitam a ideia

da realização das provas com muita naturalidade.

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A lógica presente em uma escola que insiste na utilização de uma prova como

momento de avaliação é a mesma lógica proveniente do ambiente conservador em

que são perpetuadas práticas que remontam à história da educação. Como afirmam

Ronca e Terzi (1991):

Inserida neste monótono processo, a prova é, sem dúvida, um dos exemplos que temos. Ainda insistentemente vista como cobrança, ela passa a ser ocasião em que o professor, exercendo o papel de ‘dono’ de determinado conteúdo dado, vai simplesmente verificar o que o aluno aprendeu. Tal processo ocorre assim: o professor [...] dá o conteúdo durante o mês... o aluno o recebe... e na hora da prova o ‘devolve’ ao professor. Pronto, ponto final! Um fragmentado momento, sempre isolado e, principalmente, indicador do final de um processo. (RONCA; TERZI, 1991, p.15)

Ao se realizarem as provinhas, como afirmam as professoras, fica clara a

necessidade de um instrumento capaz de realizar a verificação de aprendizagem. A

questão maior não é a realização dessa atividade, mas por que, diante de tantas

mudanças, ainda prevalecem práticas que pouco contribuem para uma mudança na

concepção do aprender. Persiste nas escolas a imagem de que avaliação deva estar

contemplando um momento privilegiado no contexto das aulas. Apesar de não ser

colocada como prioridade, as professoras entrevistadas sentem a necessidade de

reunir o grupo para pensar nessas atividades. Para Perrenoud (1999), “o sistema

tradicional de avaliação oferece uma direção, um parapeito, um fio condutor;

estrutura o tempo escolar, mede o ano, dá pontos de referência, permite saber se há

um avanço na tarefa, portanto, se há cumprimento de seu papel”.

Confirmando-se a presença das provas como um momento privilegiado dentro

do período letivo, serão identificados, por meio dos relatos, os motivos presentes nas

justificativas das professoras: a prestação de contas às famílias e, em um deles, a

exigência colocada pelos exames do SARESP. Apesar de não ter permeado todas

as falas das entrevistadas, esse modelo de prova é um dos testes que atende aos

propósitos de avaliação indicados pelas políticas públicas; configura-se com uma

das preocupações para elaboração das provas como uma forma de treinar os alunos

para tal prática, como registra P 8:

Nós fizemos um simulado para o SARESP, eu fiquei apavorada. Faz de conta... Não viu a prova do SARESP? Então nós ficamos em cima do que contém o SARESP do ano passado, nós pegamos o conteúdo e pedimos para eles em forma de um simulado, de uma avaliação. Nós fizemos

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exatamente a troca dos alunos, um com o outro. A professora A ficou na minha sala, a professora B na outra, etc. Na hora da avaliação teve aluno que chorou e não queria fazer. Veja bem, se for avaliar só por aquele aluno que ficou nervoso, porque a professora dele não estava ali, não tem como avaliar.

Como mudar uma prática, repensar uma ação, se há uma pressão imposta ao

professor causando uma ansiedade capaz de pensar na hipótese de treino para

realização de uma prova, a qual se traduzirá em um resultado que será mapeado

juntamente a outros instrumentos e, por último, irá se constituir em um gráfico

colocando a escola e, por sua vez, seus professores, em um ranking. Perrenoud

(1999) atrela a mudança da avaliação à mudança da escola; segundo ele,

transformar a avaliação radicalmente é questionar um conjunto de equilíbrios frágeis,

os quais não podem ser mexidos, pois se corre o risco de se desestabilizarem

práticas e funcionamentos, ocasionando para muitos uma confusão pedagógica.

Entre esses “muitos” citados por Perrenoud (1999) estão os professores; por

se sentirem presos aos fios de uma trama pedagógica histórica, apoiam suas ações

na ação de avaliar como sendo uma justificativa que devem aos pais.

P 4 - A gente nem conta muito, porque é primeira série, mas é bom porque a mãe gosta de ver como está na escrita, na produção na leitura, o que ele conseguiu aprender, a mãe gosta disso. Se a mãe chegar e achar uma provinha do aluno, é maravilhoso. As provas estão presentes na história de cada um, e não seria diferente com

as famílias. Uma prestação de contas sobre o trabalho realizado. Configura-se, para

muitos professores, como um tranquilizante aos pais sobre o trabalho realizado. No

entanto, fica muito claro que, se para os professores se trata de uma prática

necessária, como não seria para os pais. P 8 encontra uma forma diferenciada para

tratar o momento de reunião de pais:

Como eu vou avaliar só naquela prova? Não é desnecessário, mas eu não a uso como meio de avaliação, jamais usei, mesmo em uma terceira ou quarta série, nunca usei. Eu conto trabalhos, atividades que você está fazendo em sala de aula, como o aluno está desenvolvendo em sala de aula. Eu vou desse lado.

A professora, ao romper uma prática, não rompe o diálogo com as famílias,

mas busca uma mudança dentro do que considera ser um sentido que favoreça a

construção formativa da avaliação. Esse sentido pleno da avaliação da

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aprendizagem, como afirma Luckesi (1998), “só será possível na medida em que se

estiver efetivamente interessado na aprendizagem do educando, ou seja, há que se

estar interessado em que o educando aprenda aquilo que está sendo ensinado”.

Outras situações presentes na ação de avaliar também devem ser

consideradas nesta análise; porém, as situações citadas não aparecem nos registros

de avaliação; fazem parte de uma fala que tende a supervalorizar a prática da

sondagem ou até as provas, e não expõe tão claramente a avaliação que possa

ocorrer nas discussões sobre as histórias, nos desenhos e gestos em que se

expressam conhecimentos além de letras, ou nas palavras soltas.

P 4 - Tem outras situações, por exemplo, contamos uma história, eles falam oralmente, então fazemos uma avaliação. Por exemplo, tem aluno com um vocabulário maravilhoso, inventa história, enriquece, expõe as idéias bem claras pra turma, ele sabe guardar os mínimos detalhes da história. Tem também as produções que nós pedimos para eles fazerem, as produções de texto, eles produzem.

Há produções dos alunos, como a professora afirma: “eles produzem”. As

produções não devem ser distanciadas da avaliação. Separar a didática da

avaliação deixa a impressão de que o fazer diário pouco ou nada vale para se

reconhecer o processo de aprendizagem dos alunos. Insistir em um período

privilegiado de avaliação representa a lógica.

Por muito tempo, a didática foi entendida como a “arte de ensinar”.

Compreendendo-se o processo de construção presente na ação de aprender, tendo

em vista a diversidade com a qual o professor tem que trabalhar, a didática deixa de

ser a simples arte de ensinar para se compreender como a “arte de ensinar e

aprender”. Para tanto, atender ao princípio de uma prática pedagógica em que

ensinar e aprender estejam interligados requer que uma lógica positivista14 de

avaliar seja ultrapassada. Para que essa prática seja ultrapassada, os professores

devem não apenas atender às decisões das políticas públicas de avaliação, mas

agir em conformidade com a crença de avaliar para ensinar, e não avaliar para

apenas efetuar um registro atendendo a um formato hierarquicamente definido por

uma instância superior.Como deixar de atender à lógica presente em uma política de

avaliação que insiste em caminhar na contramão de uma prática formativa, em que

14 Para Ronca e Terzi (1991), o positivismo admite unicamente o critério de verdade cientificamente provado, da experiência, dos fatos positivos, visíveis, sensíveis. Enredada nesse processo, surge a necessidade de prova objetiva, clara, mensurável ou quantificável.

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os resultados são superiores ao processo; atendendo a essa lógica, professores

insistem em acreditar num processo com o pressuposto de eliminação de

camuflagens:

P 6 - Eu tenho que chegar para a criança e não posso falar para classe inteira. “Gente, vamos fazer a sondagem e cada um, pegue um papelzinho e vamos escrever o que eu falar”. Desta forma, eu não tenho o controle, não vou saber se o João copiou da Maria. Eu não vou saber. Eu tenho o controle se eu checar.

A análise feita sobre outros instrumentos utilizados pelas professoras

entrevistadas, além da sondagem, traz questões conflitantes, como a necessidade

de fazer uso de instrumentos com o pretexto de apenas verificar; há, no entanto,

indícios de uma prática diversificada caminhando para além da sondagem; porém,

uma forte pressão de diversas ordens impõe um constante retorno ao uso de provas

e outras formas de checagem. Nas palavras de Cappelletti (2005), “é preciso ir além

refletindo com os professores aspectos avaliativos da própria atividade e do

processo de aprendizagem”.

5.4 Avaliação e alfabetização: desvelando os sentidos de uma imbricada relação

A última questão feita às professoras entrevistadas foi como definir

avaliação, depois de todas as observações feitas. Pode parecer estranho que,

depois de outros questionamentos sobre como se avaliou, os instrumentos

utilizados, a pesquisadora ainda busque mais uma vez ouvir das entrevistadas uma

fala sobre avaliação. Na presente pesquisa, a questão permeia o interesse por

desvendar concepções presentes em uma ação muito imbricada aos processos de

ensino e aprendizagem envolvidos na alfabetização, independente da postura

tomada, mas o que está envolvido entre o acreditar e o fazer.

É indiscutível a presença da avaliação no contexto de sala de aula; porém,

por que e como se avalia? Qual a dimensão possível identificada pelos professores

ao procederem a essa ação? Avaliar, na medida em que se propõe um julgamento

sobre um fazer, não se distancia de um posicionamento singular. Não há

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neutralidade nessa ação, nas palavras de Casali (2007): “em todo processo

avaliativo o sujeito avaliador está implicado, e com inevitável poder de indução”.

Para uma maior compreensão acerca do ideário de avaliação, perpassam

dois elementos de análise:

• avaliação como reavaliação de trabalhos;

• avaliação para certificação de aprendizagens.

Para Weisz e Sanches (2002), “avaliar a aprendizagem do aluno é também

avaliar a intervenção do professor, já que o ensino deve ser planejado e replanejado

em função das aprendizagens conquistadas”. Quando as autoras tecem tal

afirmação, colocam na atuação do professor a responsabilidade por administrar sua

proposta de ensino e dar conta de viabilizar a aprendizagem dos alunos.

Vale ressaltar que o professor, ao assumir certa postura frente à avaliação,

não o faz de forma individual, tendo em vista seu próprio desejo. Por trás de uma

ação pedagógica há uma série de questões que devem ser levantadas, ou seja, em

que contexto histórico e político se dá determinada ação. Sem contar que uma ação

pedagógica, incluindo a ação de avaliar, está ligada a crenças, ideias concebidas

por um professor ao longo de sua história. Em síntese, prever uma avaliação com o

foco voltado a uma análise de posturas de ensino requer um entendimento muito

além do que possa estar sendo mostrado. Analisando o relato abaixo, é possível um

melhor esclarecimento sobre essa questão:

P 1 - Avaliar para retomar o que não foi atingido dentro dos meus objetivos. Avaliar o trabalho que faço, uma avaliação do que meu aluno aprendeu para verificar o que eu não consegui passar da forma que deveria ter sido passado. Não aprenderam da maneira que eu gostaria, às vezes, optar por um determinado conteúdo, vejo o que a sala não pegou, vou ter que refazer isso, de uma outra forma para poder atingir os meus objetivos.

A palavra objetivos aparece várias vezes no relato. Infelizmente, não está

claro a que objetivos a professora está se referindo. Trabalhar avaliação tendo em

vista objetivos pode ser visto como um modelo que fora proposto por Tyler. Para

esse autor, conforme relatam Boniol e Vial (2001), a avaliação consiste

essencialmente em determinar em que medida são alcançados os objetivos do

currículo. Os objetivos gerenciam o que se quer, o visível esperado, atendendo

dessa forma a uma visão comportamentalista. Entretanto, identifica-se na fala da

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professora um pensamento próximo a uma ação formativa. Há uma reflexão sobre o

fazer pedagógico, sobre o dever de ajudar na aprendizagem do aluno. Há o

reconhecimento de que a escolha por um procedimento de ensino pode ser revista

quando estiver equivocada. Os objetivos que são transcritos pela fala certamente

acompanham o ideal de um alfabetizador, ou seja, a aprendizagem competente da

leitura e escrita.

Caminhou-se muito para se entender que a aprendizagem ocorre de forma

individualizada para o cumprimento de um determinado planejamento tendo em vista

uma e que a medida tomada para ensinar pode não ser a mais assertiva; nesse

sentido caminha o desejo da professora em questão. No entanto, o conteúdo do

relato a seguir apresenta uma forte tendência proposta curricular ideal. A professora

querer rever seu trabalho não é o problema, mas sim, a cultura pedagógica que foi

introjetada por um modelo em que a garantia do ensino se efetiva quando são

alcançados os mínimos previstos por valores culturais dominantes expressos em um

planejamento.

P 7- Saber se ele aprendeu a ler, escrever e interpretar toda a linguagem nossa que a gente fala, os textinhos, ler e escrever, não fluentemente, mas o aluno saber interpretar aquilo que você propôs pra ele, você não elaborou uma proposta curricular? Um planejamento? Poxa vida, ele atingiu aquilo, às vezes ele tem o mínimo, ele não vai sair de uma primeira série sem escrever o nome, o nome da mãe, o próprio nome: “Eu sou fulano”.

Observando-se a fala de P 7 sobre seu conceito de avaliação, entende-se

bem o que representa avaliar para uma cultura pedagógica dominante, atingir um

mínimo. Mínimo de qual referencial? Para que sociedade esse aluno está sendo

formado? Encontra-se na fala uma boa vontade, porém, acenando para um

propósito de continuidade, e não de transformação, em que seja possível uma

investigação crítica, como propõe Cappelletti (2002), desencadeada por uma

compreensão e interpretação de uma situação problema, propiciando uma

intervenção intencional de estudos, reflexões, releituras.

P 2 - Avaliar não é bicho de sete cabeças, faz parte do processo de ensino, serve para reavaliar nosso trabalho.

A fala incisiva de P 2 remete a avaliação ao ato de ensinar, eliminando a ideia

de complexidade que a avaliação possa ter. A complexidade pode existir a partir do

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momento em que se enxerga a avaliação relacionada à aprendizagem humana. A

esse respeito, como cita Perrenoud (1999):

[...] quando se fala de aprendizagens humanas:- não se dispõe nem de mapas completos, nem de teorias suficientemente fundamentadas para descrever o equivalente de uma ‘trajetória’, - menos ainda para calculá-la com precisão; não se sabe muito bem quem é o piloto: o aluno? O professor? Sempre há um piloto? – o objetivo está longe de ser sempre claro e estável, por não ser com freqüência objeto de consenso; - é raro perseguir um único objetivo de cada vez; [...] não é tão simples quanto em Astronáutica saber se o objetivo está verdadeiramente próximo, nem mesmo demonstrar que foi atingido... (PERRENOUD, 1999, p. 91-92)

Avaliar pode não se configurar como algo provido de certa dificuldade; no

entanto, para se reavaliarem as práticas, é preciso ter clareza do que representa

uma ação capaz de se inserir em uma complexa teia representada pela natureza

humana.

P 8 - Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se ele aprendeu. Quando eu estou avaliando.

A relação entre a ação de avaliar e a de ensinar pode ser percebida na fala

das entrevistadas. Na análise processada até o momento, a partir da quinta

interrogação feita durante esta pesquisa, ficou clara essa relação. Contraria um

pouco se a essa afirmação forem ligadas falas anteriores que previam um momento

especial, como no caso da sondagem. A possibilidade de se reverem práticas na

ação de avaliar, conforme cita Freire (1998), “implica numa prática docente crítica,

resultante do pensar certo, envolvendo o movimento dinâmico, dialético, entre o

fazer e o pensar sobre o fazer”.

O pensar sobre o fazer pedagógico na ação de avaliar a aprendizagem da

leitura e escrita apresenta um desejo por conhecer o que o aluno aprendeu, como

mostra P 2:

Nós gostamos de avaliar, a gente quer saber quando os alunos aprendem. Acabamos fazendo antes, pela ansiedade. Avaliar é você observar a criança no dia-a-dia, para você saber o que deu certo, o que deu errado. Não tem um dia.

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A professora admite a importância de avaliar a todo o momento, afirmando

que o faz antes pela ansiedade, o que representa a necessária ligação entre avaliar

e ensinar, contrapondo o modelo de uma avaliação com data prevista. A professora,

em sua ansiedade, admite que avalia a todo o momento, independente do que é

previsto pela instituição. Por que avaliar? Não para mapear simplesmente, mas para

ensinar.

A leitura feita pela análise dos conteúdos expressos pelos relatos denota um

desejo de acompanhar a aprendizagem dos alunos, conseguindo ajustar as

aprendizagens para que de fato elas possam se constituir:

P 5 - Tem muito a ganhar com avaliação, você descobre como seu aluno aprende, como você tem que chegar junto dele, onde você garanta que ele aprende, isso é muito valioso para mim. Eu acho muito fantástico isso, porque eu sei como eu vou ensinar, quando eu quero atenção dele. Como minha avaliação é assim contínua, direta, então, por exemplo, eu falo “Gui”, presta atenção na comanda que a professora vai dar. Pelo olhar dele eu já entendi se ele conseguiu ou não. P 8 - Avaliar é o dia-a-dia, é poder ver o que o aluno está conseguindo desenvolver.

Em qual ponto ele está com dificuldade? A partir daí poder ajudá-lo. Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se ele aprendeu. Quando eu estou avaliando. Mas eu vou avaliar só uma vez? Não. Eu vou avaliando constantemente. Todo dia, qualquer tipo de atividade que eu dou, estou avaliando o aluno. Eu acho, tenho quase certeza que eu faria dessa forma. Avaliação, ensino, aprendizagem, um complementa o outro, eles não podem ficar separados.

Questionar o sentido da avaliação em uma prática pedagógica propicia uma

aproximação entre o querer e o fazer. Pode-se sentir a vontade expressa em uma

das falas citadas pensando avaliação com pretensão de acompanhar o

desenvolvimento do aluno; porém, a avaliação pode ser reduzida a uma prática

corrente no processo de alfabetização, a sondagem, quando esta deve ser um dos

instrumentos que poderão ser utilizados durante a avaliação, e não um sinônimo de

avaliar:

P 6 - Para me nortear no que vou fazer, pra saber como é que eu vou agir com aquela criança, essa sondagem pra mim é fundamental. Se eu não tiver essa sondagem como eu vou saber se a criança progrediu no próximo mês?

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A referência à sondagem como sentido da avaliação mais uma vez denota um

reducionismo por não ser possível um pensar que vá além de um ditado de quatro

palavras e uma frase. O que é o mundo do sujeito que aprende? Desvelar diferentes

situações refletidas pela produção de alguém requer em primeiro lugar:

Respeitar a leitura de mundo do educando significa tomá-la como ponto de partida para a compreensão do papel da curiosidade, de modo geral, e da humana, de modo especial, como um dos impulsos fundantes da produção do conhecimento. (FREIRE, 1998, p.139)

O respeito à leitura de mundo do educando não se distancia da avaliação

refletida por uma prática reflexiva e transformadora. Foi justamente a compreensão

de como a avaliação pode se aliar a uma prática transformadora na alfabetização

que a presente pesquisa com base nos dados coletados tentou desvelar. Algumas

ponderações acerca da análise realizada serão pontuadas nas considerações finais.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi convencido disto que, desde jovem, sempre marchei de minha casa para o espaço pedagógico onde encontro os alunos, com quem comparto a prática educativa. Foi sempre como prática de gente que entendi o que fazer docente. De gente inacabada, de gente curiosa, inteligente, de gente que, não podendo passar sem ética se tornou contraditoriamente capaz de transgredi-la. Mas, se nunca idealizei a prática educativa, se em tempo algum a vi como algo que, pelo menos, parecesse com um que-fazer de anjos, jamais foi fraca em mim a certeza de que vale a pena lutar contra os descaminhos que nos obstaculizam de ser mais. (FREIRE, 1998, p. 164)

O espaço pedagógico, o texto...

Ao iniciar este trabalho, chamei a atenção para a leitura de um texto

pedagógico. O procedimento para a realização de tal leitura teve como pressuposto

compreender e interpretar duas situações presentes a esse contexto: avaliação e

alfabetização.

O texto pedagógico é um organismo vivo; para entendê-lo, é necessário que

se entenda a formação humana. A formação humana que constrói esse texto não

sobrevive ao imobilismo, sofre pelo dinamismo desenfreado; mesmo sem a plena

percepção do movimento, há uma construção que se acomete pelas mudanças, sem

poder freá-las.

Sendo assim, o texto formado e que teve seus elementos desvelados

envolveu o cenário da prática de avaliação ocorrida durante o processo de

alfabetização. O entendimento sobre ações relacionadas às intervenções realizadas

teve em vista a avaliação da aprendizagem.

Retomando o que fora descrito anteriormente, esse texto se forma com

humanos, no caso, os professores, que, em suas atuações, são invadidos por um

processo que se impõe frente a uma engrenagem que teima em não parar. Por não

parar, surpreende, assusta; porém, por ser viva, não para.

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O espaço pedagógico: lendo e compreendendo o texto. ..

Para se proceder à leitura do texto formado, foi necessário um

aprofundamento em questões de relevância teórica para dar sustentação à

interpretação e reflexão crítica que fora sendo conduzida por meio de uma pesquisa

de campo.

Nada teria sido possível sem o referido procedimento investigativo teórico,

pois não há compreensão no vazio. A leitura deve ser precedida de um mergulho

pleno em palavras traduzidas de sentido, para que possa servir de referência para

se proceder à ação dialógica. O diálogo entre a teoria e a pesquisa de campo

ofereceu sustentação para responder à seguinte indagação:

• A avaliação realizada por professores que atuam nas primeiras séries

do Ensino Fundamental está atendendo a um propósito formativo

indicando intervenções significativas na aprendizagem da leitura e escrita?

O primeiro passo a ser dado quando se está diante de um texto é

compreendê-lo. O referido texto foi compreendido a partir de um levantamento das

questões principais envolvidas na sua constituição. Essas questões ratificam a

ordem de movimento que persegue a realidade educacional, seja qual for a temática

proposta. De uma escola seriada, passou-se a uma escola em ciclos. De uma escola

de reprovação, passou-se a uma escola de progressão continuada. De um trabalho

cômodo no universo de uma sala de aula, passou-se a ver um “Estado Avaliador”

que impõe uma política pública que, dentre outras questões, ocupa-se em analisar

índices de aprendizagens.

Acompanhando essas mudanças, outras tantas foram apresentadas. Ensinar

a ler e escrever deixou de ter o apoio de uma cartilha com métodos mnemônicos

para se formar um ambiente alfabetizador, devendo este ser rico em possibilidades

de construção. Nesse percurso, em que foram propostas tantas mudanças,

encontra-se a avaliação. O que de novo pode oferecer uma prática tão necessária à

aprendizagem? A reconstrução de uma prática de avaliação redefiniu-se a partir do

dinamismo presente no contexto social, o que, para Franco (1993):

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A redefinição da avaliação educacional deve ter como unidade de análise o vínculo indivíduo-sociedade numa dimensão histórica. Para isso, em primeiro lugar, é necessário conhecer a realidade social, e em especial a realidade brasileira; isso significa partir da descrição e identificação das desigualdades sociais decorrentes das diferenças de equilíbrio, nas quais se apresentam tanto para a totalidade de nossa estrutura sócio-econômica como para um de seus setores.(FRANCO, 1993, p.22)

Qualquer questão interpretada nesse texto deve ser analisada tendo o viés da

inserção de uma mudança no cenário da educação, no caso, na alfabetização.

Nesse cenário está o professor que, diante de tantas mudanças, exerce seu papel

com o desafio da concretização de um ensino de qualidade, com o pleno domínio de

competências envolvidas na leitura e escrita. Sem esquecer o dever de atentar às

questões inseridas em um universo da diversidade social, ele deve entender a

escola para a formação humana em um contexto que atenda às diferenças.

A realização da pesquisa de campo se deu em escolas públicas do Estado de

São Paulo. A escolha desse universo de análise validou-se por representar o cenário

de uma proposta pedagógica que se norteia por um Projeto que fora instituído tendo

em vista a “urgência em solucionar as dificuldades apresentadas pelos alunos de

Ciclo I com relação às competências de ler e escrever, expressas nos resultados do

SARESP 2005”, o Programa “Ler e Escrever”.

Deflagraram-se, por meio das avaliações institucionais, resultados negativos

de aprendizagem. O professor, um dos atores nesse processo, vê-se diante das

exigências colocadas para que os problemas possam ser resolvidos.

A leitura do texto formado mostrou professores com um discurso de avanço no

campo educacional, porém com práticas que, em algumas situações, transgrediam a

essência da teoria.

A proposta pedagógica apresentou aos professores uma ação alfabetizadora

que respeitasse as individualidades na aprendizagem, oferecendo o instrumento da

sondagem como prática de avaliação. Os professores atenderam exatamente ao

solicitado; realizaram o ditado de quatro palavras e uma frase. Ficaram felizes por

apresentar um registro, mostraram satisfeitos seus portfólios. Esse foi o texto, objeto

da leitura proposta.

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O espaço pedagógico: interpretando o texto...

Utilizando-se o referencial teórico citado no início desta pesquisa,procedeu-se

à interpretação do texto formado pela prática docente envolvendo alfabetização e

avaliação.

A interpretação dessa leitura desencadeou o registro de uma situação em que

há uma confusão entre o que se quer fazer, o que se sabe fazer, o que se deve

fazer. Foi possível identificar o reconhecimento de uma prática alfabetizadora

embasada por uma tendência de construção. Quando os professores referem-se à

aprendizagem, a palavra processo é muito citada; no entanto, há uma ênfase

exagerada no contexto da escrita; são desprezadas, para efeito de avaliação,

situações relacionadas a outros elementos linguísticos, como leitura e oralidade. Há

um desconhecimento das diversas faces da alfabetização. O mais importante é

aplicar uma sondagem de escrita para mapear estágios de sua evolução.

Nessa situação, a fala que registra a aprendizagem processual limita a

possibilidade de entender a abrangência que permeia o processo. Não se registram,

por exemplo, situações que possam mostrar o desconhecimento ou conhecimento

dos alunos sobre a palavra, seu sentido, os possíveis desdobramentos ao se

aplicarem essas palavras em uma situação textual.

Fala-se muito em uma avaliação contínua; contudo, existe um momento

especial reservado ao ditado bimestral, assim como há o momento das provas

periódicas. Sendo assim, foi possível entender que para a concretização da prática

de uma avaliação formativa, é necessário entender melhor o sentido dessa

avaliação. Prega-se uma avaliação contínua; porém, nas palavras de Casali (2007):

Os sistemas avaliativos convencionais acomodaram-se aos ritmos periódicos de avaliação em conseqüência da racionalidade programática e previsível própria dos sistemas de controle. As avaliações periódicas pressupõem a realidade humana como realidade previsível e programável em toda sua extensão. Por isso perdem o contato e o acesso às imprevisibilidades que, quase sempre, são o que melhor caracterizam os sujeitos, os grupos, as instituições. O princípio da avaliação contínua não separa um tempo ‘avaliável’ de outro ‘não avaliável’. (CASALI, 2007, p.19-20)

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Sobre o tempo avaliável, fica clara a sua existência, ao mesmo tempo em que

também se prioriza o elemento avaliador para uma autoavaliação do professor, que

teria sua importância se não fosse tão grande o receio de um resultado negativo por

parte do mesmo, por entender a presença do Estado Avaliador com seus indicativos

desencadeando medidas limitativas, como a própria premiação pelos resultados.

Mapeia-se o resultado do desempenho dos alunos após a realização da

sondagem, porém os mapas oferecem uma leitura não muito verdadeira. A verdade

sobre um estágio de evolução de escrita pode ser contestada; não há como, a partir

da realização de uma sondagem, ter um referencial exato para essa definição.

A sondagem, “vedete” da prática avaliativa, pode ser caracterizada como uma

prática reducionista e mecanicista nos moldes em que ela é realizada pelos

alfabetizadores das escolas públicas do Estado de São Paulo. A crítica não pode ser

entendida como a necessária realização da avaliação como diagnóstico de

aprendizagem, nem dos registros que devem ser procedidos, mas da forma como

está sendo desencadeada essa atividade.

A importância nessa prática de avaliação reside no fato de o professor

compreender o momento da aprendizagem do sujeito aprendente, identificando qual

a melhor atitude pedagógica a ser tomada a partir de tal compreensão. No entanto,

se a prática se configura como reducionista na leitura sobre as aprendizagens, não

suscitará situações que sejam de fato significativas.

A aprendizagem conseguirá ser significativa quando atender ao propósito do

reconhecimento de trajetórias individuais. Nesse aspecto,

A avaliação no contexto de uma aprendizagem significativa deveria ocorrer no próprio processo de trabalho dos alunos, no dia-a-dia da sala de aula, no momento das discussões coletivas, da realização de tarefas em grupos ou individuais. É nesses momentos que o professor pode perceber se os alunos estão ou não se aproximando dos conceitos e habilidades que considera importantes, localizar dificuldades e auxiliar para que elas sejam superadas através de intervenções, questionamentos, complementando informações, buscando novos caminhos que levem à aprendizagem. (SMOLE, 2009)

A interpretação do texto em que avaliação e alfabetização se fazem presentes

ofereceu a possibilidade da identificação de elementos primordiais que permeiam a

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prática dos professores; porém, esses elementos precisam ser utilizados como

princípios de alteração, favorecendo a ação em consonância com o desejo e a

compreensão.

Escrevendo e reescrevendo o espaço pedagógico

Após a interpretação do texto proposto, algumas considerações devem ser

tecidas para a concretização de sua reescrita.

Em primeiro lugar, cabe explicitar o ideal de avaliação previsto pela presente

pesquisa, ou seja, o ideal de uma avaliação formativa. A presença de uma avaliação

que se suponha ser formativa deve ser emancipatória, libertadora. A prática de

libertação é possível quando é defendido o direito de aprender, aprender como

prática de transformação, de compreensão dos sentidos.

Os sentidos são diferenciados; dessa forma, para se compreender a

necessidade de uma avaliação libertadora, deve ser ampliada a dimensão da

aprendizagem da leitura e escrita. É necessário que a prática de uma sondagem

seja ampliada para além de quatro palavras e uma frase. Que essa atividade não se

restrinja a alguns momentos privilegiados no universo da ação docente. Que possa

ser concretizada a situação dialógica da aprendizagem. O diálogo pedagógico deve

ocorrer entre o sujeito que ensina e o sujeito que aprende a partir do momento em

que o âmbito de aprendizagem é formado por um encontro em que se reconhece no

outro o próprio ser, o ser pleno de possibilidades, reconhecendo no outro as

diferenças que possam torná-lo pleno na dimensão humana.

A segunda consideração se refere à identificação do desejo dos professores

de registrarem as aprendizagens dos alunos através dos portfólios que exibem com

tanta satisfação. Cabe à existência desse registro seu aspecto relevante; no entanto,

precisam ser redimensionados para um papel de intercâmbio de práticas; que as

marcas deixadas sobre as possibilidades do aprender sejam colocadas em um

formato mais reflexivo para a retomada de fato das práticas que suscitem um fazer

progressista.

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Em terceiro lugar, requer-se entender o texto da avaliação como um intertexto

para a alfabetização. São textos que não se separam; um está diretamente

imbricado no outro. A separação dos dois contextos empobrece a prática docente,

transformando-a em uma prática esvaziada de sentido, como se pudesse orquestrar

uma série linear de ações, desprezando a rede existente nas relações de ensinar e

aprender.

A reconstrução desse texto poderá se concretizar com a verdadeira

compreensão do para que se aprende a ler e escrever.

O cotidiano da sala de aula representa um cenário em que se apresenta uma

diversidade cultural significativa para ser analisada pedagogicamente. Questionar o

ensino da leitura e escrita nesse contexto significa compreender o que se faz, para

quem se faz. A singularidade existente no ato de aprender indica o dever docente de

aproximar a aprendizagem da leitura e escrita ao encantamento, pelo fato de ser

desveladora dos muitos mundos existentes.

Quando se pensa um tempo da aprendizagem de uma criança, pensa-se em

um tempo para o professor repensar suas concepções, refletir sua ação à luz de

estudiosos que oferecem a possibilidade na formação do ser-leitor, escritor, que se

descobre, cria, retroage, interage com um mundo. Mundo que poderá ser lido por um

universo superior aos privilegiados do sistema escolar.

Aos olhos de muitos, essa é uma utopia. Ao se pensar a escola como a

possibilidade de ensinar a ler e escrever pela magia da linguagem, arquitetando uma

escola aberta aos desafios de um novo tempo, não se pode pensar que será utopia.

Acreditar na possibilidade do docente de aprender a enxergar o outro como alguém

que vive um processo único ao efetuar suas produções de leitura, escrita e tantas

outras.

Enquanto se acredita na incompletude do humano, visualiza-se a ação

docente com a propositura da criação de uma ação dialógica no ato de ensinar, em

que ensinar a ler e escrever não representará tão somente o ensino de regras que

poderão ser medidas por um avaliador; ler e escrever representará a possibilidade

de entender o mundo, desvendando o movimento das palavras vivas.

As marcas deixadas em um papel sob o formato de letras, palavras, textos, só

terão valor a partir do momento em que representarem marcas vivas. O que são

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marcas vivas? A expressão manifesta de alguém. Transportar a outro algo que se

configura como o próprio autor por ser parte dele.

Entender a alfabetização como experiência significa oportunizar ao aluno o

direito de se representar como sujeito vivo, encontrando espaço através das

palavras, podendo trazer palavras para além de um artificialismo sem sentido.

Partindo desse princípio, é possível reconhecer na aprendizagem da leitura e

escrita um diálogo vivo. A ocorrência desse diálogo se deve ao fato de o homem se

constituir como um ser de encontros, estando num mundo em contato constante com

diversos elementos carregados de sentidos. A descoberta desses sentidos favorece

um crescimento pessoal. Não se pode existir em um mundo sem se interrogar sobre

ele, sobre si, sobre o outro.

A interpretação das interrogações é favorecida a partir das experiências

reversíveis, o ir e vir humano. A busca por uma verdade, desvelada a partir de um

encontro que possa se constituir com a prática de uma avaliação formativa,

libertadora. O reconhecimento no outro do ser de quem avalia.

Ensinar e aprender são processos vivos. A relação estabelecida através

dessa complexa rede de significações pressupõe oferecer o direito ao ser

aprendente da compreensão dos sentidos presentes em um uma realidade social,

histórica e cultural. Para tanto, há de se compreender nessas realidades a

possibilidade de uma vida plena, em que o direito de existir signifique um pensar

consciente sobre a presença do outro, sobre a existência do outro, a importância na

existência do outro, o reconhecimento da própria existência a partir da existência do

outro. O olhar o outro como um olhar de plenitude, de autorreconhecimento, de

alfabetização e de libertação.

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APÊNDICE A - QUADRO REFERENTE ÀS RESPOSTAS DAS PROFESSORAS

ENTREVISTADAS E RESPECTIVAS INTERPRETAÇÕES

Questão 1: Como você avaliou seus alunos durante o ano?

RESPOSTA IDEIA CENTRAL

P 1 - Procuro avaliar sempre meus alunos, verificando se o que eu

ensinei, tentei transmitir, foi passado de uma forma que eles

compreendessem. Quando eu percebo que a aprendizagem não

foi de acordo com o que eu queria, eu retomo aquilo que eu queria

passar, para poder avançar.

P 2 - Inicialmente, adotamos sondagem mensalmente. As crianças

fazem a escrita de um ditado de palavras e uma frase. A lista deve

pertencer ao mesmo campo semântico, uma polissílaba, trissílaba,

dissílaba, e monossílaba.

Durante as primeiras sondagens, as crianças ficam inseguras, nas

próximas elas ficam mais confiantes, não se sentem pressionadas,

ficam livres, não fazem a atividade sob pressão.

P 3 – Eu avaliei o processo, todo o processo, os avanços que os

alunos têm no decorrer do ano, sempre procurando fazer

intervenções que achava necessário naquele momento para ele

avançar. À medida que eu fazia a sondagem, eu observava que

ele ainda não tinha atingido, ou que faltava, se ele tivesse alguma

dúvida, quanto à escrita dele. A sondagem me dá condições pra

fazer novas intervenções, pra que eu programe algumas

sequências didáticas, para que ele possa estar avançando.

Sempre assim, indo e vindo, buscando passar, voltando, fazendo

novas intervenções, eu ia avaliando nesse ir e vir. Tudo que o

aluno faz para mim é progresso, é avanço.

P 4 - Avaliação tem que ser contínua por quê? Nós damos, no

mínimo, quatro sondagens por ano. Aquela sondagem obrigatória,

para ver como o aluno se encontra.

P 5 - Avaliação consiste em muitas coisas; primeiro, não só como

você está trabalhando com eles, verificando se eles deixam de

fazer uma certa atividade que você dá para eles, e sim,

Sempre verifica se o aluno aprendeu.

Retoma o que não foi aprendido.

Adota uma sondagem mensal.

Escrita de um ditado de quatro palavras

e uma frase.

Nas primeiras sondagens, as crianças

ficam inseguras; com o tempo, sentem-

se confiantes.

Avalia todo o processo.

Faz intervenções quando acha serem

necessárias.

Utiliza o procedimento de sondagem,

pois consegue condições para

intervenções e para programar

sequências didáticas.

Tudo que o aluno faz é considerado

progresso e avanço.

Avaliação contínua.

No mínimo, quatro sondagens por ano obrigatórias.

Avaliação consiste em muitas coisas:

• Como o professor trabalha

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fazer uma certa atividade que você dá para eles, e sim,

observando e muito o desenvolvimento deles durante o ano todo.

Analisar questões como: se eles têm memorização, ou se eles

conseguem entender o que você está explicando. Cada aluno é

muito particular. Eu até comento com as meninas que professor da

1ª série é um professor fenomenal, pois tem que estar antenado

sempre, o tempo todo. Por exemplo, se eu explico uma atividade,

eu vou observar como vão esses alunos, porque hoje você tem

que observar uns e amanhã outros. De acordo com as atividades,

do que eu vou propor a eles, você vai observando se eles estão

entendendo, se estão interagindo, se está difícil, se não está. E a

partir de observações você pode fazer as intervenções

necessárias no momento certo. Às vezes, você consegue fazer as

intervenções com o aluno e ele acaba entendendo.

Pra mim, avaliação é tudo isso. No dia-a-dia, em cada atividade

que você vai dando, à medida que você vai trabalhando,

interagindo e ir dando um passo à frente.

P 6 - Eu avalio assim, eu não vejo o aluno pela prova. A gente dá

uma avaliaçãozinha pra ele, para mostrar para o pai, para

comunidade, pra mostrar pra escola que a gente trabalhou aquilo

naquele bimestre. Mas avaliar a criança é no dia-a-dia. Tanto é,

que a nota da prova não significa nada pra mim; aquele dia que

ele veio fazer a prova, podia ou não estar bem, com dor de

barriga, passando mal. Eu vou dar nota por aquela prova? Não. Eu

avalio diariamente. Como é o comportamento dele, como é que ele

está progredindo. Eu tenho isso muito firme comigo, então eu faço

meu portfólio. A cada dois meses tem uma avaliaçãozinha que é

minha, eu e ele, cara a cara. A gente chega, eu dou as palavras

pra eles, e eles não têm como copiar de ninguém, eu e ele, fala

para mim como se escreve felicidade. Eu vou saber em que

hipótese a criança está; você começa a trabalhar em cima da

hipótese dele. Tanto é, que eu estava com um alfabético no

começo do ano; no final do ano, eu tava com vinte e oito

alfabéticos e nenhum pré-silábico. Eu gosto dessa evolução, de eu

perceber o que antes eu não percebia, eu chegava no final do ano,

eu via que eles estavam bem, aí eu falava: “Meu Deus, como é

que eu vou fazer pra saber como foi a evolução? É como uma

mulher que está grávida: percebe a barriga crescer, mas não sabe

como está a criança. Comecei então a pensar e tive a idéia de

fazer um portfólio”.

Na última reunião, eu pego meu portfólio e dou as folhinhas para

os pais e falo: “Olha, quando a criança nasce, ela passa por vários

• Como o aluno trabalha

A partir das observações você pode

fazer intervenções.

Avaliação é no dia-a-dia, a cada

atividade que está sendo trabalhada, na

interação.

O aluno não é visto pela prova.

Avaliar é no dia-a-dia.

Uso do portfólio como registro de

aprendizagem.

Avaliação cara a cara, evitando o risco

de cópia dos outros.

Saber a hipótese de escrita do aluno.

Identificar evolução.

Apresentação do portfólio aos pais.

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estágios; ela primeiro engatinha, depois ela anda, depois começa

a andar de bicicleta. Não tem os estágios que ela passa? Tem

criança que passa do primeiro estágio para o terceiro, tem criança

que segue todos à risca. Eu estou mostrando para vocês como é

que a criança chegou aqui e como é que ela está saindo”. O pai

tem uma visão clara de como é isso. Minha avaliação com relação

à criança é diariamente, principalmente nessa época de

sondagem.

P 7 - O Projeto, esse Projeto Ler e Escrever foi uma coisa que

ajudou muito, porque deu liberdade para estarmos trabalhando

com as crianças aquela oralidade, histórias e muita variedade de

textos; foi onde as crianças tiveram aquela desenvoltura para se

expressar. Aqueles textos que eles fazem de memória, as

cantigas.

P 8 - Eu avalio como nota dez, se não fosse nota dez, que nota eu

daria para eles? Porque eles se autoalfabetizaram. Veja bem que

a partir de uma lista eles descobriram que conseguiam escrever

outras palavras. Muitas vezes eles nem precisavam de mim,

muitos deles. Eles mesmos olhavam e procuravam o nome dos

colegas. Queriam escrever fruta, “fru”, eu não trabalhei o “fru”, eu

dei um texto, eu li um texto para eles, a gente tem uma coletânea

de textos. Se ele queria escrever, ele ia até o texto, na lista, se ele

não achasse na listinha dos nomes dos colegas, ele ia olhar na

lista de frutas, então automaticamente, se você olhar na sala, tem

os cartazes. Automaticamente, eles iam olhar na lista, eles

memorizavam onde estava a sílaba “cho”, por exemplo, a lista de

frutas, a lista dois. Eles iam lá e começavam: “lista de frutas”, eles

já sabiam como iam escrever as palavras. É lógico que é um

trabalho árduo, mas desde o princípio, quando recebi essa sala da

coordenação, é que começou o processo. Nós saíamos roucas,

você fala o tempo todo com eles, é o tempo todo falando, o tempo

todo, eles em duplas, eles não fazem atividades sozinhos, aquela

questão da atividade produtiva, ou seja, não adianta pegar um pré-

silábico e colocá-lo com um alfabético. O alfabético não tem

paciência, ele vai fazer, pra falar: “vai lá e leva pra professora ver

que está pronto”.Então, os pré-silábicos eu deixava juntos.

Avaliação é realizada diariamente.

Projeto Ler e Escrever oferece condições

para as crianças desenvolverem a

oralidade.

Uso de histórias, textos, cantigas.

Alunos se autoalfabetizaram.

Os alunos têm liberdade de procurar

fontes com palavras que querem

escrever.

Um trabalho árduo.

Atividade produtiva.

Os alunos trabalhavam em duplas de

acordo com o estágio em que se

encontravam: alfabético com alfabético

e pré-silábico com pré-silábico.

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Questão 2: A sondagem é uma das formas utilizadas c omo instrumento de

avaliação. Como ela pode ser explicada por você?

RESPOSTA IDEIA CENTRAL

P 1 -Todo mês eu faço um diagnóstico da minha sala para saber como

anda o aprendizado deles, no sentido de saber que avanço eles

tiveram dentro da proposta da Emília Ferreiro, o construtivismo, que é

saber onde estão os níveis de aprendizagem.

É um trabalho individual, entre professor e aluno, eu elaboro a

atividade pra sala no geral e vou pegando um por um. Naqueles

momentos em que eles estão fazendo uma cópia, alguma coisa que os

mantenham ocupados, eu estou chamando cada aluno e verificando

dentro de um grupo semântico de palavras o quanto ele avançou no

aprendizado.

É um diagnóstico.

P 2 - A sondagem não tem o sentido de avaliação; é um momento

especial. Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os

conteúdos do bimestre, usamos um texto de memória.

P 3 - É individual, são palavras, a gente procura um campo semântico,

brincadeiras, aniversário. A última foi Natal, tem um campo semântico.

São palavras polissílabas, trissílabas, dissílabas e monossílabas.

P 4 - Na maioria das vezes, nós seguimos um roteiro que a gente deve

trabalhar com os alunos. Então nós escolhemos quatro palavras: uma

dissílaba, monossílaba, trissílaba e polissílaba. Não importa se o aluno

sabe escrever ou não. Ele sabe que já tem que estar dominando

alguma coisa. Depois uma frase com uma das palavras. Nós vamos

ver; fazemos a primeira avaliação.

A sondagem é a que você descobre onde o aluno, em que ele está

mais precisando. Por isso é importante a sondagem. Essa sondagem

foi o que nos enriqueceu.

Há uns anos atrás, eu não conseguiria fazer essa sondagem. Hoje, a

partir dos cursos que nós temos, dos encontros, das palestras, essa

sondagem tornou-se muito importante para mim, para nós professores.

Através dela, nós descobrimos a necessidade de cada aluno. A partir

dali, eu vou trabalhar com meu aluno. Eu não vou chegar ao final do

ano e falar assim: “passaram tantos, tantos conseguiram alfabetizar e

Diagnóstico mensal.

Saber níveis de aprendizagem.

Proposta de Emília Ferreiro,

construtivismo.

Trabalho individual entre aluno e

professor.

Atividade geral para sala.

Verificação dentro de um campo

semântico.

Diagnóstico.

Sondagem não tem sentido de

avaliação.

Também faço avaliação bimestral com

texto de memória.

Atividade individual entre aluno e

professor.

Palavras polissílabas, trissílabas,

dissílabas e monossílabas.

Sigo um roteiro e escolho quatro

palavras.

Não importa se o aluno sabe escrever.

Depois uma frase com uma das

palavras.

A sondagem é importante porque você

descobre o que o aluno está precisando.

Nos enriqueceu.

Aprendi a realizar a sondagem com

cursos, encontros, palestras.

Descobrimos a necessidade de cada

aluno.

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tantas não conseguiram”, porque agora, com a sondagem, eu sei por

que não conseguiram. Por isso a sondagem é importante, porque

através dela, eu sei o que meu aluno está precisando. Eu posso

trabalhar. É mais complicado, é mais difícil? É. Mas eu acho assim,

educador não é só a nota da prova. Tem que dar uma atividade, ver o

que pode ser melhorado. Educador é estar somando tudo que veio a

partir do aluno, tudo que o aluno consegue aprender. Para nós é um

presente, porque no final do ano a gente fica com um sorriso assim.

Quase todos terminaram o ano alfabetizados. A sala tem trinta e seis

que foram. Tenho o caso de inclusão, é impossível, impossível assim,

tenho de trabalhar mais alguns anos. Assim de imediato, ele conseguiu

avançar. Por isso que eu estou feliz, porque eu descobri a necessidade

dele, onde buscar o recurso pra que ele avançasse, então trinta e dois

ficaram alfabetizados, com esse caso de inclusão, e dois casos que

vieram transferidos agora de fora, que fiquei impossibilitada e de...

lógico, eles melhoraram, mas é isso, por isso a gente fala que a

sondagem é fundamental. Para o professor é cansativo porque você

tem que pegar uma criança, levá-la para sua mesa e falar para ela:

“Olha, presta atenção! Você vai escrever do jeito que sabe, não precisa

achar que está, do jeito que você está”. Aí você percebe que a criança

tem confiança, ela coloca o eu dela pra fora e escreve. A partir dali,

você vai usar sua estratégia pra que ela chegue ao final alfabetizada.

P 5 - Os ganhos são que você verifica muito bem em qual hipótese seu

aluno está, dentro das hipóteses que você criou a respeito dele através

das observações. Eu acredito muito que essa sondagem não é

suficiente para você avaliar se o seu aluno é bom ou não.

Eu comento muito com as meninas que nós fazemos a sondagem

individual de um aluno; então o aluno está lá, não faz nada na sala,

brinca não quer fazer nenhuma atividade mesmo você estando lá

trabalhando com ele. Aí, você chama o pai, chama a mãe, conversa e

explica, fala das regras dentro da sala de aula, as normas que tem e

diz que o aluno insiste em não fazer as atividades propostas. Na hora

da sondagem, este aluno se apresenta alfabético, ele lê e escreve,

mas não faz nada. Quando você apresenta seu mapa, dá a entender

que é uma criança alfabetizada, porém isso não condiz com o

comportamento dele em sala de aula.

Às vezes, existem alunos assim, são excelentes alunos observadores.

Tudo o que você propõe ele desenvolve. O professor trabalha como

eu, observando. A gente sabe se esse aluno só copiou, se faz uma

Com a sondagem sei por que não

conseguiram.

Educador não é só nota da prova.

Dar atividade, ver o que pode ser

melhorado.

É um presente.

Quase todos terminaram o ano

alfabetizados.

Tenho um caso de exclusão. Estou feliz

porque descobri a dificuldade dele.

Para o professor é cansativo, tem que

pegar uma criança e falar para ela:

escreva do jeito que sabe.

A criança coloca o eu dela para fora.

Você vai usar sua estratégia pra que ela

chegue ao final alfabetizada.

Você verifica em qual hipótese seu aluno

está.

A sondagem não é suficiente para você

avaliar se o seu aluno é bom ou não.

O aluno insiste em não fazer nada na

hora da sondagem; este aluno se mostra

alfabético, ele lê, escreve, mas não faz

nada.

Você apresenta seu mapa, dá a

entender que é uma criança

alfabetizada, mas não condiz com o

comportamento em sala.

O professor trabalha como eu,

observando.

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letra bonita, porém, na questão dele estar ele mesmo mostrando, ele

não consegue. A sondagem é muito boa num caso desses, para o

professor que trabalha ali observando. O professor que trabalha sem

essa observação pode errar no conceito.

No meu caso não, porque eu sei exatamente. Como eu falo na reunião

de pais, não é porque o caderno do seu filho está lindo que ele é um

excelente aluno, porém se ainda está nessa fase, precisa melhorar. Eu

acompanho muito e acho muito bom porque você pode observar, eu

faço gráfico das minhas atividades.

P 6 - A sondagem é assim, a gente, pensa em quatro palavras. A gente

não pode falar as palavras de forma separada, por exemplo: fe-li-ci-da-

de. A gente fala a palavra no geral para eles e eles têm que escrever

uma polissílaba, uma trissílaba, uma dissílaba e monossílaba e uma

frase com alguma palavra que eu ditei. Eu tenho que chegar para a

criança e não posso falar pra classe inteira. “Gente, vamos fazer a

sondagem e cada um, pegue um papelzinho e vamos escrever o que

eu falar”. Desta forma, eu não tenho o controle, não vou saber se o

João copiou da Maria. Eu não vou saber. Eu tenho o controle se eu

checar. Demoro uma semana fazendo isso; cada dia eu pego três ou

quatro, vou chamando: “Vem cá, Beatriz” e a Beatriz vai e eu digo:

“Escreve seu nome para mim”, ela pega e escreve. “E a data, como é

que é?” Ela pega e coloca, então eu dito brigadeiro, coxinha, ela vai e

escreve, a outra não lembro, a última é pão, ela vai e coloca. Eu vou

avaliar a hipótese dela, se ela está silábica, se está silábica alfabética,

então a partir dessa eu começo a planejar como é que eu vou trabalhar

com isso daqui até a próxima sondagem. Tem crianças que dão pulos

enormes, que estavam pré-silábicas na primeira sondagem e na

segunda, já estavam alfabéticas. Uma coisa deliciosa de ver.

P 7 - Essa sondagem, a gente costuma fazer, por exemplo, assim, um

ditado com o mesmo campo semântico. Todos os alunos participam.

Aqueles alfabéticos vão fazer brincando, agora aqueles que estão pré-

silábicos e silábicos, eles vão omitir algumas letras.

P 8 - Veja bem, eu procuro chamar um por um quando eu quero

avaliar. Então, enquanto eles estão fazendo um outro tipo de

observando.

A sondagem é boa para o professor que

trabalha ali observando. O professor que

trabalha sem observação pode errar no

conceito.

Eu acompanho muito bem meus alunos,

faço gráfico das minhas atividades.

A gente pensa em quatro palavras. Não

pode falar as palavras de forma

separada.

A gente fala uma polissílaba, uma

trissílaba, uma dissílaba e uma

monossílaba e uma frase.

Não posso falar para classe toda. Desta

forma eu não tenho o controle. Eu tenho

o controle se eu checar.

Demoro uma semana fazendo isso, cada

dia eu pego três ou quatro.

Eu vou avaliar a hipótese dela, se ela

está silábica, se ela está silábica

alfabética. Eu começo a planejar como é

que eu vou trabalhar até a próxima

sondagem.

Têm crianças que dão pulos enormes;

estavam pré-silábicas na primeira

sondagem e na segunda, estavam

alfabéticas.

Ditado com o mesmo campo semântico.

Alfabéticos vão fazer brincando, aqueles

que estão pré-silábicos e silábicos vão

omitir algumas letras.

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131

avaliar. Então, enquanto eles estão fazendo um outro tipo de

atividade...o que ajuda bastante é o aluno pesquisador. Enquanto eles

estão fazendo uma atividade de cantiga, ou poema, que eles vão pegar

num textinho, ou mesmo de banco de palavras, eu dou banco de

palavras para terminar a cruzadinha. Enquanto eles estão fazendo

isso, eu estou fazendo a sondagem separada, do mesmo campo

semântico, com eles lá. Então, geralmente, com os pré-silábicos e com

os sem valor, eu ficava uma vez por mês, uma vez a cada quinze dias,

eu estava fazendo a sondagem pra ver se eles vão evoluindo. Um

outro cuidado que eu tinha era escrever como eles estavam; eu tive

treze crianças que relacionei no meu relatório final, falta-me entregar o

portfólio (para a coordenação); dessas treze crianças, foram essas três

que me preocuparam. Quando eu fui olhar bem, com a vivência deles

em casa, um deles em casa, um era imaturidade total, ele acabou de

fazer sete anos, então a mãe tem todo aquele mimo com ele, porque o

pai acabou abandonando, foi embora, morar com outra pessoa. Ela sai

às cinco horas da manhã, volta às nove, dez horas da noite, ele já está

dormindo. Então, ela não tem o contato, ela não tem aquele tempo

hábil para poder estar com ele. Então ele ficava o dia inteiro na rua,

quando dava meio dia e meia, ele colocava a roupa para vir para a

escola.

Eu procuro chamar um por um quando

eu quero avaliar.

Enquanto eles estão fazendo uma

atividade, eu estou fazendo a sondagem.

Com os pré-silábicos e com os sem valor

eu ficava uma vez por mês, uma vez a

cada quinze dias, eu estava fazendo a

sondagem para ver se eles estavam

evoluindo.

Outro cuidado que tinha era escrever

como eles estavam.

Relacionei em meu portfólio.

Quando fui olhar bem, com a vivência

em casa: um era imaturidade total, a

mãe não tem tempo para ficar com o

aluno.

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Questão 3: Como são utilizados os resultados da son dagem?

RESPOSTA IDEIA CENTRAL

P 1 - Esse ano, esse resultado foi mensal; antes eram passadas as

minhas anotações para a escola. Agora eu faço isso, anteriormente à

escola pedir. O ano passado, não era pedido mensalmente, mas eu

faço mensalmente. Na outra escola que eu trabalho, que é da

prefeitura, é pedido semestralmente, mas eu faço mensalmente. Ele

serve para mim, para eu estar verificando como anda o aprendizado

dentro da minha sala e que tipo de atividade eu tenho que passar,

que estar propondo para eles, para poder suprir o que está sendo

necessário naquele momento.

P 2 - Mesmo se não houvesse a solicitação da SE, nós faríamos,

pois dá uma visão de avanço.

Os pais ficam inseguros, eu posso apresentar o resultado aos pais,

oriento os pais para fazer o trabalho.

P 3 - Eu acredito nessa diferença, você faz a sondagem, você fala:

ele está silábico com valor, outro vem e dá outro nível. Eu acho

delicado. Não existe uma camuflagem

No geral, na sala 95% de tudo. Todos avançam, alguns mais

lentamente outros mais rápidos. Avaliação serve para refletir a

prática. Seguimos o material “ler e escrever” orientações pra avaliar.

P 4 - É muito importante você trabalhar com agrupamento. Você faz

dupla, escolhe a dupla adequada. Tento colocar uma hipótese

silábica próxima da outra para que o aluno desenvolva. Muita leitura,

roda de conversa, roda de biblioteca. Avaliação da primeira série,

você está sempre ao lado. Não tem aquela avaliação específica. Não

existe. Na primeira série, eles estão vindo de um mundinho que é

brincar, brincar e brincar. O que a gente procura fazer? Sempre

ensinar, prepará-los para ir para uma série sequente, nunca

Esse ano o resultado foi mensal.

O ano passado, não era pedido

mensalmente, mas eu faço.

Ele serve para eu verificar como anda o

aprendizado dentro da minha sala e que

tipo de atividade eu tenho que propor para

eles, para suprir o que está sendo

necessário...

Senão houvesse a solicitação, nós

faríamos.

Apresento o resultado aos pais.

Eu acredito nessa diferença.

Você faz a sondagem e fala: ele está

silábico com valor, outro vem e dá outro

nível.

Todos avançam.

Avaliação serve para refletir a prática.

Seguimos as orientações pra avaliar do

material “Ler e Escrever”.

Trabalhar agrupamento. Hipótese silábica

próxima da outra para o aluno desenvolver.

Avaliação da primeira série você está

sempre ao lado.

Não tem avaliação específica. Eles vêm de

um mundinho só de brincar.

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esquecer aquele lado que a gente deve ter: é babá, é mãezona, é

professora, psicóloga, porque você tem que analisar um por um, nós

fazemos as avaliações assim, as diagnósticas.

P 5 - Quando eu vou aplicar uma atividade que contempla cinco tipos

de atividades, a primeira atividade eu aplico para todo mundo, a

segunda, a terceira, a quarta e a quinta. Quando eu vou corrigir eu

anoto, fico pontuando para mim mesma, quantos conseguiram e

quantos não conseguiram.

Quem conseguiu, quem não conseguiu, pra onde eu poder retomar,

entendeu? Dali para frente tem a um, a dois e a três e eu tenho que

retomar. É complicado. Eu trabalho variação de atividade, o mesmo

objetivo, mas com várias propostas de atividades, eu sei

exatamente, o “fulano” ia conseguir, o beltrano também, às vezes eu

achei que o fulano não ia, o fulano melhorou e eu falei nossa, que

bom. Que bom! Dentro disso eu vou entendendo o processo.

P 6 - Aqui está o mapa da turma; este mapa é meu, mas o que vai

pra secretaria é outro. Porque esse é o meu, fica comigo, o outro,

eles são iguais. Quem está com a cor vermelha, é pré-silábico, quem

está com a cor roxa, ele é silábico sem valor, quem está na cor

laranja, ele é silábico com valor, azul é silábico alfabético e amarelo

é alfabético. Como eu sei disso? No primeiro mês, eu dei as

palavras, ele escrevia.

(apresentação do portfólio)

Aqui eu vou vendo a evolução da criança. Olha que show esse aqui!

(anexo)

A maioria das crianças veio pré-silábica e eu comecei a trabalhar

conteúdos que dessem mais ênfase no pré-silábico, e como ele foi

mais além (um aluno apresentado), ele foi por conta própria.

Tem um trabalho diversificado sendo realizado, atende a todos, mas

não da mesma forma, cada um vai ao seu passo. Alguns precisam

apenas de um tranquinho para ir, mas tem criança que ainda penou,

mas teve uma evolução.

É gratificante chegar depois de um mês. Se eu não tivesse o

registro, eu iria chegar no próximo mês, mas como essa criança

estava, não ia saber.

P 7 - A gente tem um portfólio. Eu faço uma sondagem daquele

aluno que está silábico, do silábico alfabético, porque numa sala, ela

Você tem que analisar um por um.

Aplico atividades variadas que contemplam

cinco dificuldades, com o mesmo objetivo.

Quando eu vou corrigir, eu anoto, pontuo

para mim mesma, quantos conseguiram e

quantos não conseguiram.

Quem conseguiu, quem não conseguiu,

pra onde eu vou retomar.

Dentro disso eu vou entendendo o

processo.

Este mapa é meu, o que vai para secretaria

é outro. Eles são iguais.

Quem está com a cor vermelha é pré-

silábico, quem está com a cor roxa é

silábico sem valor, quem está na cor

laranja é silábico com valor, azul, silábico

alfabético e amarelo é alfabético.

Conteúdos com ênfase aos pré-silábicos.

Um aluno foi além por conta própria.

Trabalho diversificado que atenda a todos.

Se eu não tivesse o registro, não ia saber

como essa criança estava.

A gente tem um portfólio.

Faço sondagem porque a sala é

heterogênea.

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é heterogênea, você vai ter aqueles que estão com mais

dificuldades, tem uns cinco ou seis alunos que não vão acompanhar,

um por outro motivo qualquer, eles têm mais dificuldade; às vezes,

ele não tem sete anos completos, então ele vai ficar defasado.

Exatamente, nós temos assim registrado (mostra do portfólio). Os

alunos em vermelho não conseguiram ser alfabetizados. Por quê?

Porque não me mostraram, não conseguiram memorizar as letrinhas,

até as do próprio nome. Por exemplo, a Talita, eu pergunto: “Talita,

seu nome começa com o quê?” E foi trabalhado. Foi trabalhado o

alfabeto, foram trabalhadas as histórias, parlendas, cantigas,

músicas e tudo que você pode pensar. Então, o que aconteceu com

ela, ela não conseguiu memorizar as letrinhas, ela não deu valor pra

essas letrinhas, entendeu? Para o tipo de som que ela produz, como

é que começa cachorro? Começa com CA; qual o outro nome que

também começa com CA, nome de pessoa, nome próprio CAIO,

nome do coleguinha de classe. Então, você vai puxando com o

aluno, indagando com ele.

Mesmo assim, a criança não conseguiu.

Essa criança e esse outro, ele ficou silábico, uma hora ele está

silábico, outra hora ele está pré. Ele também tem dificuldade em

memorizar.

heterogênea.

Os alunos em vermelho não conseguiram

ser alfabetizados porque não conseguiram

memorizar as letrinhas.

Ela não deu valor pra essas letrinhas, para

o tipo de som que elas produzem.

Você vai puxando com o aluno, indagando

com ele; mesmo assim, ele não conseguiu.

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Questão 4: Além da sondagem, que outras formas são usadas para avaliar?

P 1- Fazemos outras atividades elaboradas pela equipe.

P 2 - Avaliamos com letras móveis, atividades em dupla.

A sondagem não tem o sentido de avaliação, é um momento especial.

Também fazemos a avaliação bimestral que contempla os conteúdos

do bimestre; usamos um texto de memória.

P 3 - Nós fazemos uma prova bimestral, fazemos um provão. Nos

reunimos, as colegas e montamos.

Ele tem oportunidade de pôr em jogo tudo que ele sabe. É uma

oportunidade; tudo que a gente dá para alguns, é avaliado. Tem os

projetos.

P 4 - Tem outras situações, por exemplo, contamos uma história, eles

falam oralmente, então fazemos uma avaliação. Por exemplo, tem

aluno com um vocabulário maravilhoso, inventa história, enriquece,

expõe as idéias bem claras pra turma, ele sabe guardar os mínimos

detalhes da história. Tem também as produções que nós pedimos para

eles fazerem, as produções de texto, eles produzem. A todo instante

nós temos que estar avaliando; além das produções de textos, tem

também as provinhas; todos nós professores sentamos, ali montamos

também essa provinha. A gente nem conta muito, porque é primeira

série, mas é bom porque a mãe gosta de ver como está na escrita, na

produção na leitura, o que ele conseguiu aprender, a mãe gosta disso.

Se a mãe chegar e achar uma provinha do aluno, é maravilhoso. Mas a

nossa avaliação tem que ser nos fragmentos do dia-a-dia do aluno, por

exemplo, olha ele leu tal livro na biblioteca; agora, na roda de leitura,

na roda da biblioteca, você vai explicar assim o que entendeu desse

livro, o foi a história que você leu, lógico, não pode.Tem a aula de

Informática que está muito rica, foi uma idéia formidável que o governo

fez, porque ajudou bastante, porque também serviu como uma

avaliação, pra gente avaliar, porque tem aluno que não consegue

escrever, não consegue fazer as coisas e através da aula de

Informática, ele foi se desenvolvendo. Eu tenho um aluno que ele é

Utiliza atividades realizadas pela

equipe.

Avalia com atividades em dupla.

As avaliações bimestrais contemplam

os conteúdos do bimestre.

Faz uma prova bimestral reunida com

colegas.

Tudo que é dado para alguns é

avaliado.

Avalia através da oralidade, após as

histórias contadas.

Utiliza as produções escritas.

A todo instante tem que estar

avaliando.

Tem também as provinhas que são

elaboradas pelos professores.

Pra a mãe é maravilhoso achar uma

provinha.

Avaliação nos fragmentos do dia-a-dia.

Aula de Informática também serviu

como avaliação.

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incluso e eu percebi que na aula de Informática ele se desenvolvia. O

que eu fiz? Eu falei para a mãe olhar como ele está ótimo na aula de

Informática.

Ele estava:

- Professora, falta isso aqui, professora.

Aí eu falei: - Já sei! Se esse menino tivesse um laptop, poderia ser de

brinquedo, ele iria se desenvolver.

A prova que entreguei para coordenadora já mostrou avanços deste

aluno. Ele melhorou bastante, enriqueceu, ajudou. Eu falei pra mãe

“você tem condições?” Ela falou: “lógico que tenho, professora”. Esse

menino era incluso.

Avaliação tem que ser contínua, esta, se feita lado a lado com o aluno,

é só ganho. Ela dá mais ganhos do que a que você faz por

determinações. Você descobre no dia-a-dia o aluno e o crescimento

dele.

P 5 - Eu faço atividade para os alunos, de todas as atividades. Eu

ponho no caderno para o pai poder acompanhar. Quando chega a

época de fazer reuniões, eu faço algumas atividades para o pai

observar porque existem pais que não olham para o caderno de jeito

nenhum. Então, na minha reunião de pais, os pais vão, eu falo sobre

todas as atividades que eu propus a eles nesses quinze dias e vou

falando com eles, nessa atividade a proposta era essa... Os pais da

minha sala são pais muito diferenciados, eles gostam que você mostre

o que você trabalhou e ver se seu filho conseguiu. Eu não dou nota,

então eu falo para eles, mas você já sabe que seu filho está

acompanhando ou não está acompanhando, se ele teve dificuldade ou

não.

P 6 - A provinha é mais pra mostrar pra comunidade, o que interessa

pra gente não é aquela provinha. A gente sabe como o aluno está, a

gente sabe quando o aluno vai bem e no dia da prova, de repente, ele

não vai bem. Eu tenho que fazer essa provinha, mas para o pai chegar

à reunião e a gente mostrar para ele. Só que na minha reunião, não é

assim. Na minha reunião, eu pego a minha prova, eu leio a prova

todinha com os pais. Eu pergunto para eles como seus filhos foram em

tal questão. Pergunto também o que seus filhos deixaram de fazer.

Explico para eles quais são as hipóteses silábicas, onde que o filho

dele está pra no final do ano ele chegar e saber cobrar do professor.

Então, eu chego e falo pra eles, se os filhos estão saindo silábicos

alfabéticos e que no ano que vem eles devem perceber se as crianças

estão andando ou não. Devem ver se há alguma coisa errada. Não

Tem aluno que na aula de Informática

se desenvolve.

A prova que mostrou para a diretora

apresenta os avanços do aluno de

inclusão.

Avaliação feita ao lado do aluno é só

ganho, dá mais ganhos do que a que

fazer por determinações.

Quando chega época de reunião, faz

atividades para mostrar aos pais.

Não dá nota.

A provinha é para mostrar para a

comunidade.

Lê a prova toda para os pais e os

questiona sobre o desempenho dos

filhos.

Explica aos pais as hipóteses

silábicas.

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estão andando ou não. Devem ver se há alguma coisa errada. Não

pode matar o trabalho do professor da primeira na segunda. Na

segunda, o professor chega de repente, a gente sabe que é até feio

falar, mas existe. Chega no fim do ano, a professora chega lá e passa

textos, textos e textos. A gente sabe que o silábico alfabético vai só

copiar.

P 7 – Essa avaliação não é uma coisa, como posso falar pra você,

rígida, entendeu? Que nem no tradicional. Sabe, sabe, não sabe, não

aprendeu. A nota dele é assim, eu vou dar uma nota um. Não porque

ele vai ver ainda esse ciclo; primeira, segunda, ele vai deslanchar. Não

vai? A primeira e a segunda não são dois anos, ele não tem um prazo.

Se ele conseguiu dominar isso daí, por exemplo, colocando qualquer

coisinha que ele sabe de cor: “batatinha quando nasce, esparrama pelo

chão”, são coisas do dia-a-dia, não é? A mãe sempre ensina, se ele tá

conseguindo isso, imagina na segunda, ele vai deslanchar. Só ficaram

dois alunos porque têm problemas! Estão fazendo fono e psicólogo.

Não é um problema meu, eles não conseguiram memorizar, alguma

coisa tem com eles que eu não estou conseguindo detectar, os outros

não mesmo os silábicos. Ele não deslanchou agora aquela parte da

escrita fluentemente todinha, mas ele tem a 2ª série, na 2ª série ele vai

desenvolver, quando menos se espera, qualquer tipo de texto, de

parlenda. Aquela revista recreio, eles pegam aquilo lá e leem de cabo a

rabo, o texto. Então tem toda uma diversidade de texto, eu falo rígido

pra você, é assim, aquela nota, nota, entendeu?

P 8 – A oral, atividade oral. Quando eu dava a atividade oral, se ele

estava participando. Não há provas, até teve, mas foi uma questão

assim, como teve o SARESP; eu não faço, mas tenho colegas que

fazem. Elas fazem questão de fazer a avaliação bimestral. Eu pego

todas as atividades que eles foram fazendo durante o mês, coloco tudo

junto na pastinha e dou para os pais.

Nós fizemos um simulado para o SARESP, eu fiquei apavorada. Faz

de conta... Não viu a prova do SARESP? Então nós ficamos em cima

do que contém o SARESP, do ano passado, nós pegamos o conteúdo

e pedimos pra eles em forma de um simulado, de uma avaliação. Nós

fizemos exatamente a troca dos alunos, um com o outro. A professora

A ficou na minha sala, a professora B na outra, etc. Na hora da

avaliação teve aluno que chorou e não queria fazer. Veja bem, se for

avaliar só por aquele aluno que ficou nervoso, porque a professora

dele não estava ali, não tem como avaliar.

O aluno X, na hora, ficou tão nervoso que ele quebrou o lápis em

várias partes e não ia fazer. Como eu vou avaliar só naquela prova?

Os pais devem perceber se no

próximo ano vai ocorrer alguma coisa

errada. O trabalho do professor da

primeira não pode ser morto na

segunda.

Avaliação não é rígida como a

tradicional, com nota.

A primeira e segunda séries não são

dois anos.

Considera qualquer coisinha que o

aluno saiba de cor, pois na segunda

série, ele deslancha.

Ficaram dois alunos, pois têm

problemas, não considera ser culpada.

Tem toda uma diversidade de texto

para o aluno se desenvolver.

Avalia atividades orais a partir da

participação do aluno.

Não há provas, mas já teve. Outras

colegas fazem, porém a professora

opta por colocar as atividades que os

alunos fizeram e colocá-las em uma

pasta para entregar aos pais.

Ficou apavorada com a simulação

realizada para o SARESP.

A prova não é desnecessária, mas não

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várias partes e não ia fazer. Como eu vou avaliar só naquela prova?

Não é desnecessário, mas eu não a uso como meio de avaliação,

jamais usei, mesmo em uma terceira ou quarta série, nunca usei. Eu

conto trabalhos, atividades que você está fazendo em sala de aula,

como o aluno está desenvolvendo em sala de aula. Eu vou desse lado.

usa como avaliações; nunca usou.

Avalia atividades realizadas em sala.

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Questão 5: Como você define avaliação?

RESPOSTA IDEIA CENTRAL

P 1 – Avaliar para retomar o que não foi atingido dentro dos

meus objetivos. Avaliar o trabalho que faço, uma avaliação do

que meu aluno aprendeu para verificar o que eu não consegui

passar da forma que deveria ter sido passado. Não aprenderam

da maneira que eu gostaria; às vezes, optar por um determinado

conteúdo, vejo que sala não pegou, vou ter que refazer isso, de

uma outra forma para poder atingir os meus objetivos. Então,

algumas vezes, eu faço duas vezes, a mesma coisa, porque na

verdade, avaliação é mais minha, porque eu preciso saber se o

que estou ensinando está realmente sendo absorvido pelos

alunos. É uma retomada.

Ao final do ano, observa-se que você está com quase todos

alfabéticos.

Todos, alguns com questões de ortografia.

P 2 – A avaliação, quando acontece todo o dia, a gente sabe

como os alunos estão e quais as atividades são para contemplar

as deficiências dos alunos; em cima disso, preparo as próximas

atividades.

Não senti dificuldade em avaliar.

Avaliar não é bicho de sete cabeças, faz parte do processo de

ensino, serve para reavaliar nosso trabalho.

Nós gostamos de avaliar, a gente quer saber quando os alunos

aprendem. Acabamos fazendo antes, pela ansiedade.

Avaliar é você observar a criança no dia-a-dia, para você saber

o que deu certo, o que deu errado. Não tem um dia.

P 5 – Tem muito a ganhar com avaliação; você descobre como

seu aluno aprende, como você tem que chegar junto dele, onde

você garanta que ele aprende, isso é muito valioso para mim. Eu

acho muito fantástico isso, porque eu sei como eu vou ensinar,

quando eu quero atenção dele. Como minha avaliação é assim

contínua, direta, então, por exemplo, eu falo “Gui, presta

Avaliação para retomada de objetivos.

Avaliação do próprio trabalho.

Para saber se o que ensina está sendo

absorvido pelos alunos.

Ao final do ano quase todos alfabetizados.

Avaliação acontece todos os dias.

Avaliar não é um bicho de sete cabeças; faz

parte do processo de ensino; serve para

reavaliar trabalhos.

Faz avaliação antes para ver se os alunos

aprendem.

Observar a criança no dia-a-dia.

Há muitos ganhos.

Saber se o aluno aprendeu.

Saber como ensinar.

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atenção na comanda que a professora vai dar”. Pelo olhar dele

eu já entendi se ele conseguiu ou não. Para mim é desgastante,

porque você tem trinta e seis alunos e todos aprenderem, do

mesmo jeito, da mesma forma. Quando eu aplico uma atividade

e atinjo a metade da sala eu já estou satisfeita, porque no

restante eu tenho que trabalhar um por um.

P 6 – Para me nortear no que vou fazer, pra saber como é que

eu vou agir com aquela criança, essa sondagem pra mim é

fundamental. Se eu não tiver essa sondagem, como eu vou

saber se a criança progrediu no próximo mês?

P 7- Saber se ele aprendeu a ler, escrever e interpretar toda a

linguagem nossa que a gente fala, os textinhos, ler e escrever,

não fluentemente, mas o aluno saber interpretar aquilo que você

propôs pra ele, você não elaborou uma proposta curricular? Um

planejamento? Poxa vida, ele atingiu aquilo, às vezes ele tem o

mínimo, ele não vai sair de uma primeira série sem escrever o

nome, o nome da mãe, o próprio nome: “Eu sou fulano”.

P 8 - Avaliar é o dia-a-dia, é poder ver o que o aluno está

conseguindo desenvolver.

Em qual ponto ele está com dificuldade? A partir daí, poder

ajudá-lo. Avaliar para mim é isso. Eu diria na questão da

continuidade, no desenvolvimento da atividade que eu vou estar

inserindo os três em um só, por exemplo, como eu vou ver se

ele aprendeu. Quando eu estou avaliando. Mas eu vou avaliar

só uma vez? Não. Eu vou avaliando constantemente. Todo dia,

qualquer tipo de atividade que eu dou, estou avaliando o aluno.

Eu acho, tenho quase certeza que eu faria dessa forma.

Avaliação, ensino, aprendizagem, um complementa o outro, eles

não podem ficar separados. Não há somente uma vez.

Pelo olhar sei se o aluno aprendeu.

É desgastante.

Quando atinge a metade da sala fica satisfeita.

Outra metade deverá ser trabalhada

individualmente.

Para nortear.

Sem a sondagem como saber se o aluno

progrediu no próximo mês.

Saber se o aluno aprendeu a ler, a escrever e

interpretar toda linguagem.

Atingir a proposta curricular.

Avaliar é o dia-a-dia.

Verificar o ponto que o aluno apresenta

dificuldade.

Avaliar constantemente.

Em qualquer atividade está avaliando.

Avaliação, ensino e aprendizagem, um

completa o outro.

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ANEXO A – INEP / MEC

Assessoria de Comunicação Social

Tabela 1 - Proficiência de Português dos alunos de escolas urbanas, sem federais – 1995 – 2005

1995 1997 1999 2001 2003 2005

Continua

Brasil 191,57 187,81 172,34 168,34 173,13 175,52

Norte 174,96 172,00 160,21 156,87 161,71 163,79

Rondônia 175,28 173,46 162,53 160,46 162,18 166,63

Acre 167,95 163,25 154,24 148,66 159,64 172,50

Amazonas 178,34 176,91 169,02 162,36 163,27 163,00

Roraima 181,71 161,83 166,55 156,99 165,19 165,90

Pará 174,52 171,12 158,22 156,54 160,73 163,49

Amapá 167,90 167,82 164,37 155,83 156,31 159,59

Tocantins 174,32 172,78 151,08 147,63 165,02 162,12

Nordeste 182,59 179,53 159,71 151,67 157,95 159,08

Maranhão 167,71 176,14 158,61 150,31 152,24 155,67

Piauí 191,69 182,17 156,59 155,77 160,59 156,86

Ceará 185,46 186,09 158,73 152,78 160,41 163,76

Rio Grande do Norte 182,24 174,13 156,28 144,96 150,06 150,82

Paraíba 185,13 180,57 169,53 158,56 158,01 158,59

Pernambuco 181,40 176,56 158,43 151,50 161,41 162,32

Alagoas 178,11 171,31 157,27 153,18 154,75 154,53

Sergipe 186,26 176,80 160,82 155,19 160,52 163,84

Bahia 186,38 181,30 160,66 149,48 158,99 159,06

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1995 1997 1999 2001 2003 2005

Conclusão

Sudeste 197,10 194,46 180,40 179,68 182,46 185,24

Minas Gerais 204,93 213,19 181,00 179,65 185,08 190,54

Espírito Santo 184,21 177,45 173,77 170,22 176,79 180,44

Rio de Janeiro 194,66 183,61 182,46 179,81 183,43 183,69

São Paulo 196,19 191,01 179,90 180,35 181,36 183,72

Sul 195,85 192,41 179,10 175,95 179,95 182,53

Paraná 200,42 195,04 179,55 173,11 175,80 183,78

Santa Catarina 193,43 197,71 180,86 176,56 182,46 181,18

Rio Grande do Sul 191,65 186,78 177,65 178,72 182,97 181,97

Centro Oeste 195,51 184,59 170,74 165,21 174,02 176,75

Mato Grosso do Sul 194,06 187,65 173,04 160,57 166,82 172,80

Mato Grosso 176,87 172,78 159,37 152,21 161,18 167,38

Goiás 198,63 187,83 174,10 167,29 176,33 176,34

Distrito Federal 205,93 186,96 174,09 185,65 194,12 193,58

Fonte: Elaboração com base nos dados do Saeb – Inep/MEC

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ANEXO B - Mapa de avaliações

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ANEXO C - Registros de avaliações

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ANEXO D - Páginas de portfólios

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ANEXO E – Ficha de Registro de Avaliação

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ANEXO F - Relatório de aluno pesquisador

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