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95 Saúde, Batatais, v. 6, n. 2, p. 95-106, jul./dez. 2017 Avaliação do equilíbrio nutricional de pratos do menu kids oferecidos em redes fast-food em um shopping de Ribeirão Preto/SP Paula Cristina GALATI 1 Isabela Bolson PEREIRA 2 Giseli Cristina Galati TOLEDO 3 Cyntia Aparecida Montagneri AREVABINI 4 Resumo: O objetivo deste trabalho foi avaliar a composição nutricional de pratos do menu kids em restaurante tipo fast-food em um shopping na cidade de Ribeirão Preto/SP. Para tanto, foi realizada a determinação do conteúdo energético total, nitrogênio total, lipídios, fibras, carboidrato e sódio de seis refeições prontas, no laboratório de Análise e Tecnologia dos Alimentos do Curso de Nutrição da UNAERP. Os dados foram comparados com as diretrizes do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e com a Pirâmide Alimentar para Crianças. Os resultados mostraram que nenhuma amostra apresentou adequação na proporção de macronutrientes e fibras, sendo em média hiperproteicas e hipercalóricas. Duas amostras apresentaram quantidade de sódio acima do recomendado pelo PNAE. Observou-se a oferta de 3,1±0,9 porções de cereais e 2,9±0,3 poções de carnes. Apenas duas refeições continham hortaliças e três não ofereciam leguminosas. Quase todas as amostras continham fritura. Desta forma, pode-se concluir que as refeições avaliadas oferecidas para população infantil são inadequadas do ponto de vista nutricional. Palavras-chave: Composição Centesimal. Alimentação Infantil. Qualidade de Restaurante. 1 Paula Cristina Galati. Mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto (SP). Especialista em Nutrição Clínica pelo Grupo de Nutrição Humana (Ganep). Graduada em Nutrição e Metabolismo pela Universidade de São Paulo (USP). E-mail: <[email protected]>. 2 Isabela Bolson Pereira. Graduada em Nutrição pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). E-mail: <[email protected]>. 3 Giseli Cristina Galati Toledo. Doutora e Mestra em Ciências Médicas pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto (SP). Especialista em Nutrição Clínica pelo Grupo de Nutrição Humana (Ganep). Graduada em Nutrição pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal). Professora do curso de Nutrição do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>. 4 Cyntia Aparecida Montagneri Arevabini. Mestra em Biotecnologia pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Especialista em Docência na Educação Superior pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Graduada em Nutrição pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Docente no curso de Nutrição da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Docente no curso de Nutrição Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.

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Avaliação do equilíbrio nutricional de pratos do menu kids oferecidos em redes fast-food em um shopping de Ribeirão Preto/SP

Paula Cristina GALATI1 Isabela Bolson PEREIRA2

Giseli Cristina Galati TOLEDO3 Cyntia Aparecida Montagneri AREVABINI4

Resumo: O objetivo deste trabalho foi avaliar a composição nutricional de pratos do menu kids em restaurante tipo fast-food em um shopping na cidade de Ribeirão Preto/SP. Para tanto, foi realizada a determinação do conteúdo energético total, nitrogênio total, lipídios, fibras, carboidrato e sódio de seis refeições prontas, no laboratório de Análise e Tecnologia dos Alimentos do Curso de Nutrição da UNAERP. Os dados foram comparados com as diretrizes do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e com a Pirâmide Alimentar para Crianças. Os resultados mostraram que nenhuma amostra apresentou adequação na proporção de macronutrientes e fibras, sendo em média hiperproteicas e hipercalóricas. Duas amostras apresentaram quantidade de sódio acima do recomendado pelo PNAE. Observou-se a oferta de 3,1±0,9 porções de cereais e 2,9±0,3 poções de carnes. Apenas duas refeições continham hortaliças e três não ofereciam leguminosas. Quase todas as amostras continham fritura. Desta forma, pode-se concluir que as refeições avaliadas oferecidas para população infantil são inadequadas do ponto de vista nutricional.

Palavras-chave: Composição Centesimal. Alimentação Infantil. Qualidade de Restaurante.

1 Paula Cristina Galati. Mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto (SP). Especialista em Nutrição Clínica pelo Grupo de Nutrição Humana (Ganep). Graduada em Nutrição e Metabolismo pela Universidade de São Paulo (USP). E-mail: <[email protected]>.2 Isabela Bolson Pereira. Graduada em Nutrição pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). E-mail: <[email protected]>.3 Giseli Cristina Galati Toledo. Doutora e Mestra em Ciências Médicas pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto (SP). Especialista em Nutrição Clínica pelo Grupo de Nutrição Humana (Ganep). Graduada em Nutrição pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal). Professora do curso de Nutrição do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.4 Cyntia Aparecida Montagneri Arevabini. Mestra em Biotecnologia pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Especialista em Docência na Educação Superior pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Graduada em Nutrição pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep). Docente no curso de Nutrição da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Docente no curso de Nutrição Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.

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Nutritional evaluation of the balance of dishes from the kids menu offered in fastfood networks in a shopping of Ribeirão Preto/SP

Paula Cristina GALATI Isabela Bolson PEREIRA

Giseli Cristina Galati TOLEDO Cyntia Aparecida Montagneri AREVABINI

Abstract: The objective of this work was to evaluate a nutritional composition of children’s dishes in a fastfood-type restaurant at a purchase in the city of Ribeirão Preto/SP. For that the total energy content, total nitrogen, lipids, fiber, carbohydrate and sodium of six ready meals were carried out in the Food Analysis and Technology Laboratory of the UNAERP Nutrition Course. Data were compared with the guidelines of the National School Feeding Program (PNAE) and with a Food Pyramid for Children. The results showed that no sample presented adequacy in the proportion of macronutrient and fiber, being on average hyperproteic and hypercaloric. Two samples had sodium content above that recommended by PNAE. Find an offer of 3.1 ± 0.9 servings of cereals and 2.9 ± 0.3 servings of meats. Only two meals contained vegetables and three do not require legumes. Almost all samples contained frying. In this way, it can be concluded that the evaluated meals offered by mall restaurants for children are not nutritionally adequate.

Keywords: Centesimal Composition. Infant Feeding. Quality Restaurant.

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1. INTRODUÇÃO

Devido a intensas urbanização e industrialização, ocorridas durante os anos 1950 e 1960, associa-das à inserção da mulher no mercado de trabalho e à elevação do nível de vida e de educação, tem-se observado uma mudança na gestão de tempo aplicado à alimentação nos últimos anos. Essa busca pelo ganho de tempo aumentou o número de refeições feitas fora do domicílio (LEAL, 2010). No Brasil, os dados sobre gastos com alimentação indicam que 31% foram destinados à alimentação fora do domicílio em 2008-2009, contra 24% em 2002-2003 (CLARO; LEVY; BANDONI, 2009).

Estudos sobre o padrão alimentar fora de casa têm recebido especial atenção, uma vez que os alimentos vendidos em restaurantes e lanchonetes se caracterizam por elevado conteúdo energético, de gordura total, gordura saturada, açúcar e sódio, cujo consumo habitual está associado à obesidade e a outras enfermidades crônicas, como as doenças cardiovasculares (BEZERRA et al., 2013; RAMOS et al., 2012).

Considerando que o contexto familiar foi modificado pela inserção da mulher no mercado de trabalho, pela busca da otimização do tempo e pela industrialização dos alimentos, o aumento na frequ-ência de refeições realizadas fora de casa atinge as pessoas de todas as idades. Dessa forma, as crianças têm sido expostas cada vez mais cedo a esse padrão alimentar, o que contribui com um menor consumo de frutas, legumes e verduras, favorecendo o aparecimento de doenças crônicas não transmissíveis cada vez mais cedo (MARINHO; HAMANN; LIMA, 2007).

Machado et al. (2016) afirmam que, para haver promoção à saúde, deve-se salientar a importância da alimentação saudável para prevenir e tratar as doenças crônicas não transmissíveis. A infância é uma fase crucial no processo de formação do comportamento alimentar e ele depende do comportamento da família, das tradições e valores que passam ao longo das gerações.

Nos últimos anos, a prevalência de obesidade infantil tem apresentado índices alarmantes no Bra-sil, o que nos leva a refletir sobre o atual padrão de alimentação dessa população. Assim, visto que o consumo alimentar fora de casa também tem crescido e tem um papel importante na vida das crianças, torna-se fundamental que haja estudos avaliando a composição das refeições fornecidas a esse público. O objetivo deste estudo foi avaliar a composição nutricional de pratos kids em restaurante tipo fast-food em um shopping na cidade de Ribeirão Preto/SP.

2. METODOLOGIA

Foram coletadas e analisadas seis refeições prontas direcionadas a crianças entre seis e dez anos de restaurantes localizados na praça de alimentação de um shopping de Ribeirão Preto/SP, contendo como seu prato principal frango ou carne bovina. O estudo foi realizado no período de 29 de abril de 2015 a 20 de junho de 2016. As análises da composição química dos alimentos foram realizadas no laboratório de Análise e Tecnologia dos Alimentos do Curso de Nutrição da UNAERP/SP. A composição das refeições encontra-se na Tabela 1.

Tabela 1. Cardápios de seis restaurantes localizados na praça de alimentação de um shopping de Ribei-rão Preto/SP.

RESTAURANTE ALIMENTOSA Arroz primavera, purê de batata, filé de frango empanado, batata frita.B Arroz branco, feijão, cubos de frango, salada de alface americana e tomate.C Arroz branco, feijão, isca de frango, purê de batata.D Arroz branco, tiras de carne, batata sorriso frita.E Arroz branco, tiras de carne, batata palito frita.F Arroz branco, feijão, filé de carne, batata palito frita.

Fonte: elaborado pelas autoras.

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As amostras foram classificadas em A (Figura 1), B (Figura 2), C (Figura 3), D (Figura 4), E (Fi-gura 5) e F (Figura 6), formados por um prato principal (proteína), prato-base (arroz branco e feijão) e uma guarnição (gordura/alimentos fritos).

Figura 1. Composição da refeição A do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

Figura 2. Composição da refeição B do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

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Figura 3. Composição da refeição C do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

Figura 4. Composição da refeição D do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

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Figura 5. Composição da refeição E do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

Figura 6. Composição da refeição F do restaurante tipo fast-food.

Fonte: acervo das autoras.

As amostras foram selecionadas segundo os seguintes critérios: ser uma refeição preparada na hora, pertencer ao cardápio kids do estabelecimento, cardápios contendo como prato principal carne bovina ou ave e conter arroz branco.

A análise centesimal das refeições foi realizada em triplicata no laboratório de Análise e Tecnolo-gia dos Alimentos do Curso de Nutrição da UNAERP/SP. Tais análises foram baseadas nas determina-ções de métodos físico-químicos para análises de alimentos do Instituto Adolf Lutz (IAL, 2008).

O teor de umidade foi determinado pelo método de secagem das amostras até peso constante, em estufa a 105 °C (IAL, 2008).

A Determinação de Cinzas Totais foi realizada em Mufla a 550 ºC. Esse método é fundamentado na perda de peso que ocorre quando um produto é incinerado a 500-550 ºC, com destruição da matéria orgânica, sem apreciável decomposição dos constituintes do resíduo mineral ou perda por volatilização (IAL, 2008).

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O teor de nitrogênio total foi determinado segundo o método de Kjeldahl e, a partir do resultado encontrado, calculou-se o teor de proteína total, multiplicando-se o valor do nitrogênio total por 6,25 (IAL, 2008).

Os lipídios foram determinados pelo teor de substâncias solúveis em éter etílico, por meio do aparelho de Soxhlet (IAL, 2008).

A determinação do teor de fibras foi realizada pelo método enzimático-gravimétrico, que se fun-damenta no duplo ataque ácido/alcalino da amostra (INSTITUTO ADOLFO LUTZ, 2008).

O valor de carboidrato de cada uma das amostras foi obtido por meio de diferença, ou seja, a partir da somatória dos valores encontrados para umidade, cinzas, proteínas, fibra e lipídios, subtraindo-se o resultado do percentual de 100% (IAL, 2008).

Para quantificação de sódio das refeições, utilizou-se o medidor de sódio Laquatwin, modelo B-712.

Para o cálculo do valor calórico, foram empregados os fatores de conversão de quatro calorias para cada grama de carboidrato, quatro calorias para cada grama de proteína e nove calorias para cada grama de lipídio.

A análise dos dados foi feita com auxílio do programa Microsoft Office Excel® 2010. Em seguida, foram comparados com as diretrizes do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE (BRASIL, 2012) e com a Pirâmide Alimentar para Crianças (SBP, 2012).

3. RESULTADOS

Os resultados obtidos na análise da composição centesimal das diversas refeições encontram-se na Tabela 2.

Tabela 2. Resultados da Composição Centesimal (g/100g) das refeições A, B, C, D, E e F de restauran-tes tipo fast-food, Ribeirão Preto, 2016.

COMPOSIÇÃO CENTESIMAL (g/100g)

Refeições Umidade Cinzas Fibras Proteínas Lipídios

A 64,79 ±2,14 1,49 ±0,17 0,95 ±0,14 10,84 ±0,78 6,18 ±0,07

B 73,46 ±0,34 1,47 ±0,02 0,59 ±0,13 12,02 ±0,44 1,86 ±0,01

C 71,30 ±0,06 1,86 ±0,05 2,53 ±0,42 9,46 ±0,17 1,02 ±0,12

D 57,78 ±0,13 1,74 ±0,03 2,87 ±0,28 11,97 ±0,09 3,87 ±0,29

E 64,13 ±0,08 1,27 ±0,03 2,69 ±0,08 9,33 ±1,20 2,17 ±0,02

F 64,70 ±0,43 1,66 ±0,03 2,87 ±0,12 8,99 ±0,34 4,08 ±0,03

Fonte: elaborado pelas autoras.

Ao comparar os dados obtidos das refeições analisadas com a recomendação proposta pelo PNAE para escolares (6 a 10 anos), considerando a oferta de uma refeição, pode-se observar que nenhuma amostra apresentou adequação na quantidade de todos os macronutrientes concomitantemente (Figura 7).

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Figura 7. Comparação dos valores nutricionais encontrados na análise da composição centesimal das refeições A, B, C, D, E e F dos restaurantes tipo fast-food com a recomendação do PNAE para crianças de 6 a 10 anos que recebem uma refeição escolar por dia.

Fonte: elaborado pelas autoras.

Do mesmo modo, ao avaliar a composição das refeições em termos de calorias fornecidas e pro-porção de macronutrientes em relação ao valor calórico total (VCT) da refeição (Tabela 3), pode-se observar inadequação em relação ao proposto pelo PNAE, o qual estabelece que uma refeição para uma criança do Ensino Fundamental deve oferecer 300 kcal, sendo 65% do VCT de carboidrato, 12,5% do VCT de proteína e 22,5%do VCT de lipídeo.

Apenas a refeição B proporcionou um valor calórico adequado, entretanto a composição de ma-cronutrientes apresentou-se desbalanceada.

Pode-se observar que as refeições do menu kids oferecidas pelos estabelecimentos avaliados são, em média, hiperproteicas e hipercalóricas em relação à recomendação proposta pelo PNAE para a oferta de uma refeição.

Tabela 3. Resultados dos valores nutricionais em gramas e quilocalorias encontrados na análise da com-posição centesimal da refeição A, B, C, D, E e F dos restaurantes tipo fast-food.

REFEIÇÕESVALOR

CALÓRICO (KCAL)

CARBOIDRATO (% VCT)

PROTEÍNA (% VCT)

LIPÍDEO (% VCT)

A 750,8 38,9 26,8 34,3

B 328,63 39,5 44,9 15,6

C 611,9 48,3 42,7 9

D 528,01 51,2 28,2 20,5

E 450 65,5 29,9 15,7

F 1020,97 49,3 25,1 25,6

Média ± DP 570 ± 223,6 48,8 ± 8,8 29,1 ± 7,8 18,1 ± 8,1

Fonte: elaborado pelas autoras.

Em relação à quantidade de sódio das refeições, pode-se observar que somente duas amostras (C e F) apresentaram quantidade superior ao recomendado pelo PNAE para uma refeição (400mg).

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Ao comparar o número de porções de cereais e carne das refeições oferecidas com a recomen-dação da pirâmide alimentar para crianças, pode-se verificar que as amostras analisadas ofereciam, em média, 3,1±0,9 porções do grupo dos cereais, o que corresponde a 65% da porção recomendada para o dia inteiro desse grupo de alimentos. E, em relação ao grupo das carnes, verificou-se que, em média, eram oferecidas 2,9±0,3 porções, correspondendo a 140% da porção recomendada para consumo de um dia inteiro para uma criança em idade escolar (Tabela 4).

Tabela 4. Número de porções do grupo dos cereais e das carnes contidos na refeição A, B, C, D, E e F dos restaurantes tipo fast-food.

REFEIÇÕESNÚMERO DE PORÇÕES

DO GRUPO DOS CEREAIS

NÚMERO DE PORÇÕES DO GRUPO DAS CARNES

A 2,9 3,2B 1,7 2,4C 3,5 2,9D 3,1 3,1E 3,7 2,9F 4,6 2,7

Média ±DP 3,1 ± 0,9 2,9 ± 0,3*Recomendação 6 2

* Pirâmide alimentar: Departamento de Nutrologia, Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP, 2012).

Fonte: elaborado pelas autoras.

Por fim, ao avaliar a qualidade da refeição oferecida, pode-se observar que, das 6 amostras avalia-das, apenas duas continham alimentos do grupo das hortaliças e metade não oferecia alimentos do grupo das leguminosas. Além disso, quase todas as amostras continham fritura e mais de um tipo de alimento do grupo dos cereais.

4. DISCUSSÃO

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 15% das crian-ças com idade entre 5 e 9 anos estão acima do peso (IBGE, 2010). A prevalência de sobrepeso vem atingindo estatísticas alarmantes em crianças dessa faixa etária, mostrando a importância da promoção de hábitos alimentares saudáveis, por intermédio de refeições seguras e nutricionalmente balanceadas (ALBIERO; ALVES, 2007).

O consumo alimentar relaciona-se à obesidade quanto ao volume e à composição das refeições. Neste estudo, observou-se que os pratos do menu kids de restaurantes de uma praça de alimentação são inadequados para a faixa etária a que são destinados, tanto do ponto de vista qualitativo quanto do quantitativo. A oferta de pratos hipercalóricos, hiperproteicos e com porções exageradas, como foi ob-servado, pode incentivar o consumo alimentar além da saciedade e necessidade, colaborando para um aumento de peso em longo prazo.

Do mesmo modo, Ramos et al. (2012) encontraram refeições hipercalóricas e desbalanceadas em relação à oferta de macronutrientes ao analisar a composição nutricional de pratos do menu kids.

Ao avaliar o consumo alimentar de crianças escolares na cidade de Campinas-SP, Danelon (2007) constatou que 65% dos participantes apresentavam inadequação no consumo de macronutrientes e que alimentos de origem animal (fonte de proteína) tiveram participação expressiva no consumo alimentar dos escolares estudados.

Pela pirâmide alimentar brasileira, recomenda-se, para crianças em idade escolar, seis porções de pães e cereais, quatro porções diárias de frutas e de hortaliças, uma porção de leguminosas, duas de

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carnes e ovos, três de leite e derivados, duas de açúcar e doces e uma de óleo e gordura (SBP, 2012). No presente estudo, verificou-se que a quantidade de porções de carnes oferecidas em apenas uma refeição ultrapassa a quantidade preconizada pela pirâmide alimentar para o dia inteiro. Além disso, se uma criança, além de almoçar, jantar nesses estabelecimentos, a ingestão de alimentos fonte de carboidrato (grupo dos cereais) será excedida em apenas duas refeições diárias.

Novaes, Franceschini e Priore (2007), ao comparar os hábitos alimentares de crianças eutróficas e com sobrepeso, identificaram que a quantidade de alimentos ingeridos por elas é elevada, evidenciando a necessidade de se trabalhar o tamanho das porções dos alimentos destinadas a essa população. É im-portante ressaltar que o excesso de proteína animal e consumo calórico está associado ao aumento do risco de obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares (RAMOS et al. 2012)

Em relação à qualidade das refeições avaliadas, pode-se observar que consistiam em pratos monó-tonos, pouco atrativos do ponto de vista sensorial e pobres em legumes e hortaliças. É importante ressal-tar que o consumo alimentar fora do domicílio pode refletir nas preferências e hábitos alimentares das crianças, uma vez que a família, os fatores sociais e os ambientais podem influenciar o padrão alimentar dessa população (ROSSI; MOREIRA; RAUEN, 2008).

A intervenção na promoção de uma alimentação saudável deve incidir com maior ênfase na infân-cia, para que permaneça ao longo da vida (ROSSI; MOREIRA; RAUEN, 2008). As práticas alimentares e o preparo do alimento influenciam o consumo alimentar da criança. Elas precisam de estímulos para se interessar por frutas, verduras e legumes, por isso, os cardápios voltados para esse público devem ser coloridos, criativos e atraentes (PAIVA et al., 2012). Uma alimentação colorida vai ao encontro do objetivo de ofertar uma refeição nutricionalmente equilibrada, proporcionando diversidade de vitaminas e minerais (BRASIL, 2006).

Para uma criança ter uma vida mais saudável e uma alimentação equilibrada, é necessário que a composição do prato nas refeições principais esteja em harmonia e na quantidade necessária para a criança de acordo com cada faixa etária e sua necessidade energética, evitando frituras, alimentos gor-durosos e uma alta quantidade de comida (INSTITUTO DANONE, 2000).

Dessa forma, o presente estudo nos mostra que as refeições analisadas não visam à saúde do con-sumidor, uma vez que oferecem, em sua maioria, alimentos fritos, como filé de frango empanado, e ba-tata frita presente em todas as refeições avaliadas. Além disso, é notável a ausência de saladas, verduras e legumes na maioria dos pratos estudados.

A quantidade de sódio presente em alimentos de redes fast-food constitui outra preocupação para saúde das crianças, uma vez que o consumo excessivo desse nutriente está associado a doenças cardio-vasculares (COSTA; MACHADO, 2010). Neste estudo, foram baixos valores de adição de sal, signi-ficando pouca quantidade, de acordo com o instrumento utilizado, o que demonstra uma preocupação dos estabelecimentos com a elaboração dos pratos kids. Entretanto, deve-se salientar que os estabeleci-mentos analisados oferecem livremente blisters de sal, o que pode incentivar o seu consumo excessivo.

5. CONCLUSÃO

Os achados deste estudo demonstram que as refeições oferecidas por restaurantes de shopping para população infantil não são adequadas do ponto de vista nutricional, uma vez que a composição de macronutrientes e energia, a qualidade dos alimentos e o tamanho das porções oferecidas não condizem com as necessidades nutricionais de uma criança e nem estimulam práticas alimentares saudáveis que priorizam a saúde da população envolvida.

Por fim, fica evidente que esses estabelecimentos deveriam contar com a ajuda de um nutricio-nista para um adequado planejamento dos cardápios do menu kids, para que pudessem ofertar refeições balanceadas e atraentes, atendendo, dessa forma, o interesse do comércio sem deixar de lado a saúde do consumidor.

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REFERÊNCIAS

ALBIERO, K. A.; ALVES, F. S. Formação e desenvolvimento de hábitos alimentares em crianças pela educação nutricional. Nutrição em Pauta, v. 15, n. 82, p. 17-21, jan./fev. 2007. Disponível em: <http://www.nutricaoempauta.com.br/lista_artigo.php?cod=554>. Acesso em: 1 fev. 2018

BEZERRA, I. N. et al. Consumo de alimentos fora do domicílio no Brasil. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 47, supl. 1, p. 200s-211s, fev. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003489102013000700006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 30 nov. 2017.

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Data do recebimento: 29/11/2017.

Data de aprovação: 18/12/2017.