aula1: teoria e prática da redação...

21
Teoria e Prática da Redação Jurídica Fundamentação do Parecer: técnicas e estratégias argumentativas

Upload: trinhtu

Post on 08-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Teoria e Prática da

Redação JurídicaFundamentação do Parecer: técnicas e estratégias argumentativas

Os argumentos são recursos linguísticos que visam

ao convencimento. O argumento não é uma prova

inequívoca da verdade. Argumentar não significa

impor uma forma de demonstração, como nas

ciências exatas. O argumento implica um juízo do

quanto é provável ou razoável.

ARGUMENTOS

A DEMONSTRAÇÃO (lembrando) Caracteriza-se por ser um “meio de prova, fundado na proposta de uma

racionalidade matemática”, a qual é operacionalizada pela lógica

formal – silogismo.

Usa termos sem qualquer tipo de ambiguidade, definidos de forma

rigorosa.

Usa linguagens formalizadas, com regras estabelecidas para além de

qualquer dúvida.

Estabelece verdades que têm o estatuto de evidência.

É “imune” ao contexto comunicativo

Não se dirige a um auditório

Baseia-se em axiomas que não carecem de discussão (são considerados

evidentes).

Todo leão é um felino

A água, em estado puro, ferve a 100’C.

Os metais são bons condutores.

ARGUMENTO PRÓ-TESE Caracteriza-se por ser extraído dos fatos reais contidos no relatório. Deve ser

o primeiro argumento a compor a fundamentação. A estrutura adequada para desenvolvê-lo seria: Tese + porque + e também + além disso. Cada um desses elos coesivos introduzem fatos distintos favoráveis à tese escolhida.

O hospital foi negligente porque utilizou água contaminada no tratamento de hemodiálise de pacientes renais, e também não comunicou o fato à secretaria de saúde. Além disso, mesmo após ter conhecimento do alto índice de contaminação por bactérias, continuou a utilizá-la, colocando em perigo iminente, pois, a vida dos pacientes.

“Anísio cometeu um crime doloso inaceitável, repudiado com veemência pela sociedade, porque desferiu três facadas certeiras no peito de sua companheira, e também porque agiu covardemente contra uma pessoa desarmada e fisicamente mais fraca. Além disso, ele já estava desconfiado do caso extraconjugal da mulher, o que afastaria a hipótese de privação de sentidos.”

Argumento de autoridade (ab autoritatem) Aquele que invoca o prestígio dos atos ou juízos de uma determinada

pessoa ou grupo. Constituído com base nas fontes do Direito, em pesquisas comprovadas. Deve-se atentar para os conceitos de polifonia, paráfrase e citação. Poderá fazer uso da Legislação, da Doutrina, dos Princípios, das Súmulas e Jurisprudências dos Tribunais.

A simples menção ao dispositivo Legal não funciona como Argumento, sendo imprescindível, relacionar o fato apresentado a norma aplicada.

“A Constituição é muito clara quando diz que a vida é um bem inviolável. Uma sociedade democrática defende esse direito e recorre a todos os meios disponíveis para que a vida seja sempre preservada e para que qualquer atentado a esse direito seja severamente punido. No caso em questão, Teresa foi atacada de maneira covarde e violenta, porque não dispunha de meios para ao menos tentar preservar sua vida. Portanto, o réu desrespeitou a Constituição Brasileira e incorreu no crime de homicídio doloso previsto no artigo 121 do Código Penal Brasileiro”.

Quando se faz citação doutrinária, deve-se:

colocar o excerto entre aspas;

destacar a citação do restante da argumentação (alteração da fonte ou da

paragrafação, por exemplo);

indicar as alterações feitas no trecho (sublinhamos, negritamos, etc.). E, quando

for pular determinada parte, inserir reticências entre parênteses (...) ou escrever

omissis;

nunca inserir ou alterar palavras da transcrição. Se houver erros no excerto

copiado, acrescentar (sic), logo depois do engano, para que se perceba que o erro

está no original;

indicar a fonte de onde foi extraído o trecho. Podem-se utilizar as normas

acadêmicas, ou qualquer outro modelo, desde que a indicação fique precisa, a

ponto de facilitar a localização da obra, por quem quiser conferi-la.

Para combater o argumento de autoridade deve-se, sempre, buscar o local de onde

foi extraída a transcrição, para ver se é exata e se o autor, em outro trecho, não

desdiz aquela afirmação ou ameniza o seu conteúdo. Também se deve procurar

outros autores, de igual renome, para contrapor citação oposta.

ARGUMENTO DE SENSO COMUM

Consiste no aproveitamento de uma afirmação que goza de consenso geral; está amplamente difundido na sociedade.

São raríssimos, em Direito, porque sempre há possibilidade de interpretação divergente. Existem em casos mais genéricos: o juiz deve ser imparcial, por exemplo.

“A sociedade brasileira sofre com a violência cotidiana em diversos níveis e não tolera mais essa prática. Certamente, a violência é o pior recurso para a solução de qualquer tipo de conflito. Uma pessoa sensata pondera, dialoga ou se afasta de situações que podem desencadear embates violentos. Não foi essa a opção de Anísio. Preferiu pegar uma faca e, como um bárbaro, assassinar a mulher, evitando todas as outras soluções pacíficas existentes, como a imediata separação que o afastaria definitivamente de quem o traiu. Aceitar sua conduta desmedida seria instituir a pena de morte para a traição amorosa”.

Introdução de uma perspectiva oposta ao ponto de

vista defendido pelo argumentador, admitindo-o como

uma possibilidade de conclusão, para depois

apresentar, como argumento decisivo, a perspectiva

contrária.

Apoiada no uso dos conectores argumentativos

concessivos e adversativos, essa estratégia permite

antecipar as possíveis manobras discursivas que

formarão a argumentação da outra parte durante a

busca de solução jurisdicional para o conflito,

enfraquecendo, assim, os fundamentos mais fortes da

parte.

ARGUMENTO DE OPOSIÇÃO – concessiva e

adversativa

Estrutura do argumento de oposição concessiva

Operador

argumentativo

Concessivo

Ponto de vista contrário

à tese defendida

Ponto de vista favorável

à tese defendida

Embora ... ...não exista lei que

obrigue alguém a ser pai,

nem que garanta

reaproximações

indesejadas, ...

... a Justiça pode, sim,

fazer valer o direito de

um filho em relação aos

cuidados paternais, por

meio de uma reparação

afetiva.

Conector sintático que

põe em foco a

evidência contrária

Evidência que apóia a

argumentação contrária

à tese em defesa

Argumento decisivo,

contrário à perspectiva

anterior

Conectores argumentativos concessivos (embora, se bem que, ainda que) – antecedem o

argumento que será invalidado

Conectores argumentativos adversativos

(mas, porém, todavia, embora, ainda que, mesmo que, apesar

de) - introduzem um argumento contrário ao enunciado anterior

Estrutura do argumento de oposição restritiva

Ponto de vista

contrário à tese

defendida

Operador argumentativo

adversativo

Ponto de vista

favorável à tese

defendida

Não existe lei que

obrigue alguém a ser

pai, nem que garanta

reaproximações

indesejadas, ...

... mas ... ... a Justiça pode, sim,

fazer valer o direito de

um filho em relação

aos cuidados paternais,

por meio de uma

reparação afetiva.

Evidência que apóia a

argumentação

contrária à tese em

defesa

Conector sintático que

permite uma manobra

discursiva, que

desarticula o

argumento introdutório

Argumento que anula a

proposição inicial do

parágrafo, gerando uma

quebra de expectativa

ExemploArgumento de oposição concessiva

Embora haja quem argumente ser impossível pensar a afetividade como valor jurídico,

pois não existe lei que obrigue alguém a ser pai, nem garanta reaproximações

indesejadas, a Justiça pode, sim, fazer valer o direito de um filho em relação aos

cuidados paternais, por meio de uma reparação afetiva. Essa reparação André Júlio

deve a Alexandre, por sua luta inglória desde quase os sete anos de idade, a fim de

reaver o afeto do pai. Falta de carinho, de atenção e de presença não se quantifica,

mas pode ser compensada para amenizar o sofrimento de Alexandre, por ter tido um

pai ausente.

Argumento de oposição restritiva

Há quem argumente ser impossível pensar a afetividade como valor jurídico, ou seja,

que não existe lei que obrigue alguém a ser pai, nem garanta reaproximações

indesejadas, mas a Justiça pode, sim, fazer valer o direito de um filho em relação

aos cuidados paternais, por meio de uma reparação afetiva. Essa reparação André

Júlio deve a Alexandre, por sua luta inglória desde quase os sete anos de idade, a fim

de reaver o afeto do pai. Falta de carinho, de atenção e de presença não se

quantifica, mas pode ser compensada para amenizar o sofrimento de Alexandre, por

ter tido um pai ausente

Argumento de causa e efeito

Relaciona conceitos de causalidade (os motivos, os porquês) e

efeito (consequência) com o objetivo de evidenciar as

consequências imediatas de determinado ato (retirado das

provas) praticado pelas partes.

Algumas expressões indicadoras de:

causa: por causa de, graças a, em virtude de, em vista de,

devido a, por motivo de, porque.

consequência: consequentemente, em decorrência, como

resultado, efeito de.

Algumas expressões que podem ser usadas para abordar temas

com divergência de opiniões:

- em contrapartida, se por um lado... / por outro... , enquanto

uns afirmam... / outros dizem que...

Para encontrarmos a causa perguntamos: por

quê? Já a consequência pode ser encontrada

pela pergunta: em razão disso o que

acontece?

Muitas pessoas são analfabetas eletrônicas, pois não

conseguem ligar nem um videocassete. (Por quê?) (O que

acontece em razão disso?)

É de fundamental importância a preservação das

construções que se constituem em patrimônio histórico.

(Por quê?) (O que acontece em razão disso?)

Exemplo

as estatísticas demonstram que a criminalidade dita hedionda

não diminuiu, e, pelo contrário, aumentou, depois da Lei 8072;

logo, per efectum se percebe que a imposição de penas cruéis

não reduz a criminalidade.

O réu é acusado de ter praticado um estelionato milionário

contra o erário público, mas hoje, seis anos depois, é um homem

pobre, sem nenhum patrimônio, a ser defendido dativamente:

logo, ab effectis se percebe que não pode ter praticado aquele

crime, porque se o tivesse feito seria rico.

das causas para os efeitos, baseado na razão, na razoabilidade. É

um raciocínio dedutivo, que parte do geral (a regra ou hipótese

abstrata) para o particular (o caso concreto, ou os efeitos).

X é o mais provável suspeito da morte de Y, porque é o único que

tinha motivos para querê-lo morto.

ARGUMENTO DE ANALOGIA - é o argumento que pressupõe que

a Justiça deve tratar de maneira igual, situações iguais. As citações de

jurisprudência são os exemplos mais claros do argumento por analogia, que é

bastante útil porque o juiz será, de algum modo, influenciado a decidir de

acordo com o que já se decidiu, em situações anteriores.

Quando se faz citação jurisprudencial, é importante:

- destacar o trecho citado (conforme recomendação feita acerca do argumento de

autoridade);

- iniciar e terminar a citação com aspas;

- indicar destaques e omissões;

- não alterar, nem corrigir, o trecho citado;

- indicar a fonte (Tribunal, Câmara, Relator, número do recurso, data de publicação e

repertório autorizado, se houver);

- não transcrever trechos muito longos;

- não exagerar na quantidade;

- mostrar, na argumentação, como se aproveita aquela decisão, por analogia;

- quando se tratar de jurisprudência utilizada como paradigma para recursos especial ou

extraordinário, além de mencionar o repertório autorizado, fazer a comparação analítica;

- ler a íntegra da decisão, antes de citá-la e, se possível, juntar a copia à peça.

Exemplos de analogia (a pari)

Se o casamento entre vítima e agressor extingue a

punibilidade do estupro, a pari a união estável entre

ambos deve produzir o mesmo efeito [vide, a respeito,

RSDP 5/38].

Se a instauração de novo processo-crime contra o réu

prorroga o prazo do sursis, a simile deve também

prorrogar o prazo da suspensão condicional do processo [a

respeito vide RSDP 10/42].

Se o aborto é lícito na gravidez resultante de estupro, a

pari é também lícito na resultante de atentado violento

ao pudor.

Argumento ad hominem (contra a pessoa).

Estrutura do argumento

A forma básica de um Argumento ad hominem é a seguinte:

1. A considera B verdadeiro; (o autor X afirma a proposição P)

2. A possui é algo criticável; (há alguma característica negativa em x)

3. então B é falso. (Logo, a proposição P é falsa)

Claramente, B não deixa de ser verdadeiro ou falso dependendo das pessoas que o consideram verdadeiro.

O argumento ad hominem é uma forte arma retórica, apesar de não possuir bases lógicas.

O ataque à pessoa trata-se de um ataque direto à pessoa contra quem se argumenta, colocando em dúvida suas circunstâncias pessoais, seu caráter ou sua confiabilidade.

Tipos ad hominem

Há dois tipos de ataques ad hominem que são mais eficientes:

Argumento ad hominem abusivo: é o ataque direto à pessoa, colocando seu caráter em dúvida e, portanto, a validade de sua argumentação.

Exemplo: As afirmações de Richard Nixon a respeito da política de relações externas em relação à China não são confiáveis pois ele foi forçado a abdicar durante o escândalo de Watergate.?

Argumento ad hominem circunstancial: é o ataque que atinge a circunstante do adversário em um debate. O fato de se tratar de uma pessoa que está sofrendo, no momento, de uma forte raiva pode ser usado para esse tipo de ataque.

Exemplo: A: Foi este o homem que vi roubando aquele carro!

B: Como pode afirmar isso sendo você um conhecido bêbado?

Argumento de fuga

É o argumento de que se vale o advogado para escapar à discussão central, em que seus argumentos provavelmente não prevaleceriam. Apela-se, em regra, para a subjetividade. É o argumento, por exemplo, que o advogado utiliza quando enaltece o caráter do acusado, lembrando tratar-se de pai de família, de pessoa responsável, de réu primário, quando há acusação de lesões corporais (ou homicídio culposo) na direção de veículo. Perceba que qualquer pessoa "de bem" pode, em algum momento, praticar um crime culposo. Se a autoria, a materialidade e a culpabilidade desse crime forem inegáveis, resta ao advogado apenas enaltecer suas qualidades, a fim de conseguir a fixação de uma pena branda, ou - quem sabe -desqualificar o crime a ele imputado.

Argumento a fortiori (com maior razão)

é o argumento que deriva do brocardo "quem pode o mais, pode

o menos". Seu objetivo é conseguir uma aplicação mais extensiva

da lei, para que se aplique à situação fática que, nela, não está

explícita.

Exemplos

Se a lei exige, dos Promotores de Justiça, que, nas Denúncias,

discriminem as ações de cada um dos acusados, com mais razão

deve-se exigir que o Magistrado as individualize na Sentença.

Se a negligência deve ser punida, a fortiori deve ser punido o ato

premeditado [Ferraz]. Se a prova testemunhal foi aceita, a

fortiori deve também ser aceita a prova documental [Nunes]. Se

a oferta de contestação na data da audiência do procedimento

sumário afasta a revelia, a fortiori a entrega da contestação em

cartório, antes dessa data, também a afasta [vide, a respeito,

nosso artigo em RT 737/127].

Joana é professora de uma escola particular e sempre ministra

as suas aulas utilizando-se de um computador portátil. Em um

certo dia um aluno seu veio tirar uma dúvida com ela,

apresentando essa dúvida em um computador igual ao da

professora. No final da aula, Joana acabou pegando o

computador portátil do aluno, pensando que era seu, levando-o

para casa. O aluno Pablo, que era dono do computador, não

percebeu que sua professora tinha pego por engano seu

computador, razão pela qual foi a uma autoridade policial

competente informar o ocorrido. Joana foi denunciada pelo

crime de furto (Art. 155, caput do Código Penal). No decorrer

da instrução criminal, Joana alegou que não sabia que tinha

subtraído um computador portátil de um de seus alunos, tendo

em vista que ele era igual ao que usava para ministrar suas

aulas.

Diante do caso concreto apresente argumentos favoráveis a Ré.