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1 ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAL (7) Professora: Sara Batista Subsistema de Aplicação de Recursos Humanos Os processos de aplicação de pessoas envolvem os primeiros passos na integração dos novos membros na organização, o desenho do cargo a ser desempenhado e a avaliação do desempenho no cargo. Vimos que os processos de provisão de pessoal cuidam de obter as pessoas necessárias no mercado e colocá-las e integrá-las na organização para que esta possa manter sua continuidade. O passo seguinte será sua aplicação como força de trabalho dentro da organização. Isso significa que, uma vez recrutadas e selecionadas, as pessoas deverão ser integradas à organização, posicionadas em seus cargos e avaliadas quanto a seu desempenho. Assim, após os processos de provisão, vêm os processos de aplicação de pessoal. Trataremos dos processos de aplicação de pessoas, cobrindo três capítulos: desenho, descrição e análise de cargos e avaliação do desempenho humano. SOCIALIZAÇÃO ORGANIZACIONAL Após serem recrutadas e selecionadas, as pessoas ingressam nas organizações. Esse ingresso é, portanto, restritivo e seletivo. Somente algumas pessoas têm condições de ingressar nas organizações. E, a partir daí, elas são admitidas como ocupantes de cargos. Antes de aplicá-las em seus cargos, porém, as organizações procuram integrar as pessoas em seu contexto, climatizando-as e condicionando- as através de cerimônias de iniciação e de aculturamento social às práticas e filosofias predominantes na organização e, simultaneamente, de desprendimento dos antigos hábitos e prejuízos arraigados e indesejados que devem ser banidos do comportamento do recém-iniciado É a maneira pela qual a organização recebe os novos escolhidos e os integra a sua cultura, a seu contexto, a seu sistema, para que eles possam comportar-se de maneira adequada às expectativas da organização. A socialização organizacional procura estabelecer junto ao novo participante as bases e premissas através das quais a organização pretende funcionar e como o novo participante poderá colaborar nesse aspecto. Com a socialização, o novo empregado renuncia a uma parcela de sua liberdade de ação ao ingressar na organização: ele concorda em obedecer a um horário de trabalho, a desempenhar determinada

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ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAL (7)

Professora: Sara Batista

Subsistema de Aplicação de Recursos Humanos

Os processos de aplicação de pessoas envolvem os primeiros passos na integração dos novos membros na organização, o desenho do cargo a ser desempenhado e a avaliação do desempenho no cargo. Vimos que os processos de provisão de pessoal cuidam de obter as pessoas necessárias no mercado e colocá-las e integrá-las na organização para que esta possa manter sua continuidade. O passo seguinte será sua aplicação como força de trabalho dentro da organização. Isso significa que, uma vez recrutadas e selecionadas, as pessoas deverão ser integradas à organização, posicionadas em seus cargos e avaliadas quanto a seu desempenho. Assim, após os processos de provisão, vêm os processos de aplicação de pessoal. Trataremos dos processos de aplicação de pessoas, cobrindo três capítulos: desenho, descrição e análise de cargos e avaliação do desempenho humano.

SOCIALIZAÇÃO ORGANIZACIONAL

Após serem recrutadas e selecionadas, as pessoas ingressam nas organizações. Esse ingresso é, portanto, restritivo e seletivo. Somente algumas pessoas têm condições de ingressar nas organizações. E, a partir daí, elas são admitidas como ocupantes de cargos. Antes de aplicá-las em seus cargos, porém, as organizações procuram integrar as pessoas em seu contexto, climatizando-as e condicionando-as através de cerimônias de iniciação e de aculturamento social às práticas e filosofias predominantes na organização e, simultaneamente, de desprendimento dos antigos hábitos e prejuízos arraigados e indesejados que devem ser banidos do comportamento do recém-iniciado É a maneira pela qual a organização recebe os novos escolhidos e os integra a sua cultura, a seu contexto, a seu sistema, para que eles possam comportar-se de maneira adequada às expectativas da organização.

A socialização organizacional procura estabelecer junto ao novo participante as bases e premissas através das quais a organização pretende funcionar e como o novo participante poderá colaborar nesse aspecto. Com a socialização, o novo empregado renuncia a uma parcela de sua liberdade de ação ao ingressar na organização: ele concorda em obedecer a um horário de trabalho, a desempenhar determinada

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atividade, a seguir a orientação de seu superior, a atender a determinadas regras e regulamentos internos, e coisas do ramo. Assim, a organização busca induzir a adaptação do comportamento do indivíduo a suas necessidades e objetivos, marcando fortemente nele suas impressões digitais. Entretanto, o novo participante estará buscando influenciar a organização e seu gerente para criar uma situação de trabalho que lhe proporcione satisfação e alcance de seus objetivos pessoais. Esse processo de personalização entra, muitas vezes, em conflito com as tentativas de socialização feitas pela organização. Na realidade, trata-se de um processo bidirecional, em que cada uma das partes procura influenciar e adaptar a outra.

Trata-se de um processo de duas mãos, em que cada uma das partes tenta influenciar e adaptar a outra a suas conveniências e propósitos. A adaptação, na realidade, é mútua em busca de uma verdadeira simbiose entre as partes. Em outras palavras, além de bidirecional, ela é recíproca, cada uma atuando sobre a outra.

A fase crucial: em geral, o período inicial de emprego — se o primeiro ano ou os primeiros anos de casa — constitui a fase crucial para o desenvolvimento de um relacionamento saudável entre indivíduo e organização. Trata-se de um período lento e difícil adaptação, no qual a rotatividade de pessoal é mais elevada do que nos demais períodos subseqüentes. Em seu decorrer, o novo participante e o gerente devem aprender a se ajustar um ao outro. É uma aprendizagem lenta e demorada. É como se cada uma das partes ficasse analisando e estudando reações da outra, para conhecê-la melhor e reduzir a incerteza a respeito da outra. É a configuração lenta e gradativa do contrato psicológico, como vimos anteriormente.

Métodos para promover socialização

Há uma variedade de meios que as organizações utilizam para promover a socialização de membros novos e antigos. Em algumas organizações, a socialização é feita de maneira contundente, como o trote de calouros nas escolas e universidades. Nas empresas, a socialização organizacional é um processo de aplicação que à criação de um ambiente de trabalho receptivo e favorável durante o período inicial do emprego e que envolve uma variedade de métodos.

Os cinco métodos mais utilizados são:

a) Planejamento do processo seletivo: um esquema de entrevistas de seleção através das quais o candidato possa conhecer seu futuro ambiente de trabalho, a cultura predominante na organização, os colegas de trabalho, as atividades desenvolvidas, os desafios e recompensas em vista, o gerente e o estilo de direção existente etc. Trata-se, antes mesmo de o candidato ser aprovado, de

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permitir que ele obtenha informações e sinta como funciona a organização e como se comportam as pessoas que nela convivem.

b) Conteúdo inicial da tarefa: o gerente pode dar ao novo funcionário tarefas desafiadoras e capazes de proporcionar-lhe sucesso no início de sua carreira na organização, para depois entregar tarefas gradativamente mais complicadas e crescentemente desafiadoras. Novos empregados que recebem tarefas solicitadoras estão mais preparados para desempenhar as tarefas posteriores com mais sucesso. O empregado principiante tende a internalizar altos padrões de desempenho e expectativas positivas a respeito de recompensas resultantes de desempenho excelente. Quando o principiante é colocado em tarefas fáceis, não tem a chance de experimentar sucesso nem a motivação dele decorrente.

c) Papel do gerente: para o novo empregado, o gerente representa a imagem da organização. O gerente pode indicar um supervisor que cuide do novo funcionário como um tutor que o acompanha e orienta durante o período inicial na organização. Se o supervisor realiza um bom trabalho no desempenho de tarefas-chave, a organização passa a ser vista de forma positiva. Se, porém, o supervisor é ineficiente no trabalho com o recém-chegado, a organização será visualizada negativamente. Para tanto, o supervisor deve realizar três funções básicas com o novo empregado: Transmitir ao novo empregado uma descrição clara da tarefa a ser realizada.

Suprir todas as informações técnicas sobre como executar a tarefa. Proporcionar ao novo empregado a retroação adequada sobre a qualidade de seu desempenho. Os gerentes escolhem cuidadosamente os supervisores para garantir que os novos membros sejam bem supervisionados, acompanhados e orientados. Para funcionarem como verdadeiros tutores, os supervisores devem possuir alto grau de segurança pessoal, para que não se sintam ameaçados pela falha ou pelo sucesso dos novos empregados, e ter muita paciência para lidar com os novos e inexperientes recrutas.

d) Grupos de trabalho: o grupo de trabalho pode desempenhar papel importante na socialização dos novos empregados. O gerente pode atribuir a integração do novo funcionário a um grupo de trabalho. A aceitação pelo grupo é fonte crucial de satisfação das necessidades sociais. Além disso, os grupos de trabalho têm forte influência sobre as crenças e atitudes dos indivíduos a respeito da organização e sobre como eles devem-se comportar. O gerente deve também designar os novos empregados para participar de grupos de trabalho que possam realmente provocar impacto positivo e duradouro.

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e) Programas de integração: são programas intensivos de treinamento inicial destinados aos novos membros da organização, para familiarizá-los com a linguagem usual da organização, com os usos e costumes internos (cultura organizacional), a estrutura de organização (as áreas ou departamentos existentes), os principais produtos e serviços, a missão da organização e os objetivos organizacionais etc. Quase sempre, os programas de integração ou de indução constituem o principal método de aculturamento dos novos participantes às práticas correntes da organização. Sua finalidade é fazer com que o novo participante aprenda e incorpore valores, normas e padrões de comportamento que a organização considera imprescindíveis e relevantes para um bom desempenho em seus quadros.

Na realidade, o programa de integração procura fazer com que o novo participante assimile de maneira intensiva e rápida, em uma situação de laboratório, a cultura da organização e se comporte, a partir daí, como um membro que veste definitivamente a camisa da organização. Em algumas organizações, os programas de integração são totalmente desenvolvidos pelo órgão de treinamento, enquanto em outras são apenas coordenados pelo órgão de treinamento, porém executados por gerentes de linha nos diversos assuntos abordados. São programas que duram de um a cinco dias, dependendo da intensidade de integração que a organização pretende imprimir, mas que depois contam com um seguimento a médio prazo do novo participante pelo gerente ou pelo supervisor que funcionam como tutores dos novos participantes e que se responsabilizam pela avaliação de seu desempenho. Nos casos em que o novo membro ocupa posição de destaque, em níveis de gerência ou direção, o programa de integração pode durar meses, com uma agenda que programa sua permanência nas diversas áreas ou departamentos da organização com um tutor permanente (seu gerente ou diretor) e um tutor específico para cada área ou departamento envolvido na agenda.

Métodos de socialização organizacional: A entrada e a socialização constituem o aparato de boas-vindas aos novos participantes. Na realidade, são dois aspectos particularmente importantes para moldar uma boa relação a longo prazo entre indivíduo e organização.

O cafezinho da manhã: Em muitas empresas, existe uma cerimônia de iniciação dos novos empregados. Pode ser um cafezinho pela manhã com todo o pessoal de equipe, na cantina da empresa, ou uma pequena reunião de apresentação aos futuros colegas. Ou ainda um café matinal com o gerente, para troca de idéias e sugestões. Em outras empresas, o presidente da companhia faz questão de compartir um desjejum da manhã com os novos funcionários, em determinados dias do mês. Essa proximidade é importante para estreitar os laços com a empresa.

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A organização como um sistema de papéis

As organizações são intencionalmente criadas para produzir alguma coisa: serviços ou produtos. Para tanto utilizam energia humana e não humana para transformar matérias-primas em produtos acabados ou serviços prestados. Embora possuam coisas inanimadas, como edifícios, máquinas e equipamentos, instalações, mesa arquivos etc., as organizações são, afinal de contas, constituídas por pessoas. As organizações somente pode funcionar quando as pessoas estão em seus postos de trabalho e quando são capazes de desempenhar adequadamente os papéis para os quais foram selecionadas, admitidas e preparadas. Para tanto, as organizações delineiam sua estrutura formal, definem órgãos e cargos e preestabelecem, com maior ou menor volume de regras burocráticas, os requisitos necessários e as atribuições a serem impostas a seus membros. Essa divisão do trabalho e a especialização dela decorrente provocam enorme diferenciação de papéis dentro da organização, que procura então racionalizar a situação preestabelecendo rotinas para diminuir a insegurança dos participantes, aumentar as possibilidades de previsão e centralizar funções e controles. Surge assim a burocratização. A burocratização pode, até certo ponto, trazer alguma eficiência à organização devido a seu caráter racional, mas nem sempre essa eficiência compensa a rigidez e a racionalidade às quais está associada. Ao ingressar em uma organização, as pessoas continuam participando de outras organizações, nas quais desempenham outros papéis sociais. As pessoas vivem em outros ambientes e são também influenciadas e moldadas por eles. Assim, a organização não constitui toda a vida das pessoas, pois ela não é a sociedade inteira nem envolve as pessoas completamente. Por essa razão, as pessoas estão apenas parcialmente incluídas na organização: é a chamada inclusão parcial. Dizendo em outras palavras, a organização não utiliza integralmente o indivíduo, nem ocupa todas suas potencialidades, mas apenas alguns de seus comportamentos mais relevantes para o desempenho do papel. Está aí o maior desperdício dentro das organizações: o desperdício humano, pois apenas certos comportamentos escolhidos dos indivíduos são necessários para o funcionamento da organização. Tais comportamentos específicos são interligados com os de outros participantes e precisam ser claramente transmitidos a todos os participantes para que haja coordenação e integração entre eles, condições básicas para o bom funcionamento da organização. Em sociologia, dizemos que papel é o conjunto de atividades e comportamentos solicitados de um indivíduo que ocupa determinada posição em uma organização. Todas as pessoas ocupam papéis em várias organizações. Alguns papéis podem ser óbvios para o indivíduo, em virtude de seu conhecimento do processo técnico e da tarefa da organização, ou podem ser-lhe comunicados pelos outros membros da organização que solicitam ou dependem de seu comportamento de papel para que possam atender às expectativas de seus próprios cargos ou posições. Dentro dessa visão, podemos considerar a organização um conjunto de papéis ou aglomerados de

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atividades esperadas dos indivíduos e de conjuntos de papéis ou de grupos que se superpõem, cada qual formado de pessoas que têm mais expectativas quanto a determinado indivíduo. Em suma, a organização é um sistema de papéis. As organizações somente começam a funcionar quando as pessoas que devem cumprir papéis específicos e atividades solicitadas tenham ocupado suas posições correspondentes. Um dos problemas básicos de toda organização consiste em recrutar, selecionar e formar seus participantes em função das posições de trabalho, de tal forma que cumpram seu papel com a máxima eficácia. Uma das maneiras de ocupar as diversas posições de trabalho de uma organização consiste em empregar um conjunto de pessoas que possivelmente possuam as competências requeridas. Provavelmente, após as avaliações de desempenho, permanecem somente aqueles participantes que tenham condições de desempenhar com êxito as atribuições de seus cargos. A lógica aparente de um sistema de recrutamento e seleção de pessoal é muito clara: uma organização possui certos postos de trabalho que devem ser ocupados e exige competências necessárias para esses postos, que devem ser especificadas detalhadamente, buscando aqueles indivíduos que possuam tais características. O “modelo de seleção” baseia- se na pressuposição de que as necessidades primárias a que se deve satisfazer pertencem à organização. Nesse sistema de papéis, cada pessoa deve desempenhar um papel que lhe é atribuído pela organização.

Desempenho de papel

Contudo, o desempenho de papel sofre uma porção de influências. Seja, por exemplo, uma relação entre gerente e subordinado, na qual o gerente pretende atribuir um papel ao subordinado. O episódio inicia com o gerente explicando ao subordinado o que este deve fazer (expectativa de papel). O subordinado recebe as explicações e interpreta essa expectativa comunicada, com alguma distorção proveniente do processo de comunicação (papel percebido), e passa a fazer aquilo que lhe foi solicitado, de acordo com sua interpretação pessoal (comportamento de papel). Enquanto isso, o gerente passa a avaliar o desempenho do subordinado (comportamento monitorado) e a comparar esse desempenho com sua expectativa de papel. Assim, o desempenho de papel nem sempre ocorre conforme as expectativas, pois quatro discrepâncias ou dissonâncias podem surgir nesse episódio:

1. Discrepância de expectativa: é a diferença entre a expectativa de papel transmitida pelo gerente e o papel percebido segundo a interpretação do subordinado. Nem sempre aquilo que o gerente explica é perfeitamente entendido pelo subordinado.

2. Discrepância de papel: é a diferença entre o papel percebido pelo subordinado e o comportamento de papel que ele consegue desempenhar.

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Nem sempre aquilo que o subordinado entende que deve fazer ele consegue ou é capaz de fazê-lo efetivamente.

3. Retroação da discrepância: é a diferença entre o comportamento de papel do subordinado e o comportamento monitorado pelo gerente. Nem sempre aquilo que o subordinado faz é adequadamente avaliado pelo gerente.

4. Discrepância de desempenho: é a diferença entre o comportamento monitorado pelo gerente e a expectativa de papel que transmitiu ao subordinado. Nem sempre que o gerente solicita é realmente executado pelo subordinado.

A compreensão do desempenho de papel deve levar em conta todos os aspectos anteriormente enunciados. Embora sejam bem diferentes entre si, para efeito do que será tratado neste livro, é conveniente relacionar os conceitos de papel e de cargo. Doravante deixaremos de falar de papéis e passaremos a falar de cargos.

AVALIAÇÃO DOS PROCESSOS DE APLICAÇÃO DE PESSOAS

Os processos de aplicação de pessoas podem ser avaliados. Na realidade, esses processos podem estar contidos dentro de um continuum que vai desde uma situação precária e incipiente (no canto esquerdo) até uma configuração sofisticada e desenvolvida (no canto direito).

No canto esquerdo do continuum (gerente), os processos de aplicação de pessoas podem caracterizar-se por seu modelo mecânico, quando são baseados em uma visão determinística e mecanicista: a cada causa corresponde um único efeito, a cada ação provoca-se uma única ação. No canto esquerdo, os processos de aplicação de pessoas enfatizam apenas a eficiência, quando se exige que as pessoas executem suas atividades de acordo com o método de trabalho e seguindo os procedimentos e rotinas previamente estabelecidos pela organização. A rigor, as pessoas devem executar e não pensar, já que o método é considerado perfeito e imutável. Ainda no canto esquerdo, os processos de aplicação privilegiam apenas os fatores higiênicos, de acordo com a teoria de Herzberg. Isso significa que se dá muita importância aos salários pagos, aos benefícios oferecidos, ao tipo de supervisão aplicado às pessoas, às políticas internas da organização. Em outros termos, dá-se muita importância aos fatores insatisfacientes e de contexto. Prevalecem o conservantismo, a permanência das atividades e uma certeza de que tudo é definitivo e imutável. No canto direito do continuum (subordinado), os processos de aplicação caracterizam-se pelo modelo orgânico, pela ênfase na eficácia, pela focalização nos fatores motivacionais, pela inovação e criatividade, considerando que os cargos e as atividades organizacionais são mutáveis e sujeitos a melhoria contínua.

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DESENHO DE CARGOS

Quase sempre, as pessoas trabalham nas organizações através dos cargos que ocupam. Quando alguém diz que trabalha em determinada empresa, a primeira coisa que lhe perguntamos é qual o cargo que desempenha. Assim, sabemos o que ela faz na organização e temos uma idéia de sua importância e do nível hierárquico que ocupa. Para a organização, o cargo constitui a base da aplicação das pessoas nas tarefas organizacionais. Para a pessoa, o cargo constitui uma das maiores fontes de expectativas e de motivação na organização. Quando as pessoas ingressam na organização e através de toda sua trajetória profissional, elas sempre são ocupantes de algum cargo. Este capítulo mostra como entender o que os talentos estão fazendo na organização.

CONCEITUAÇÃO DE CARGO

O conceito de cargo baseia-se nas noções de tarefa, de atribuição e de função, a saber:

a) Tarefa: é toda atividade individualizada e executada por um ocupante de cargo. Geralmente é a atividade atribuída a cargos simples e repetitivos (cargos de horistas ou operários), como montar uma peça, rosquear um parafuso, usinar um componente, injetar uma peça etc.

b) Atribuição: é toda atividade individualizada e executada por um ocupante de cargo. Geralmente é a atividade atribuída a cargos mais diferenciados (cargos de mensalistas ou funcionários), como preencher um cheque, emitir uma requisição de material, elaborar uma ordem de serviço etc. Na realidade, a atribuição é uma tarefa um pouco mais sofisticada, mais mental e menos braçal.

c) Função: é um conjunto de tarefas (cargos horistas) ou de atribuições (cargos mensalistas) exercido de maneira sistemática e reiterada por um ocupante de cargo. Pode ser exercido por uma pessoa que, sem ocupar um cargo, desempenha provisória ou definitivamente uma função. Para que um conjunto de atribuições constitua uma função é necessário que haja reiteração em seu desempenho.

d) Cargo: é um conjunto de funções (conjunto de tarefas ou de atribuições) com uma posição definida na estrutura organizacional, isto é, no organograma. A posição define as relações entre o cargo e os demais cargos da organização. No fundo, são relações entre duas ou mais pessoas.

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O cargo é composto de todas as atividades desempenhadas por uma pessoa, que podem ser englobadas em um todo unificado e que ocupa uma posição formal no organograma da organização. Para desempenhar suas atividades, a pessoa que ocupa um cargo deve ter uma posição definida no organograma. Dentro dessa concepção, um cargo constitui uma unidade da organização e consiste em um conjunto de deveres e responsabilidades que o tornam separado e distinto dos demais cargos. A posição do cargo no organograma define seu nível hierárquico, a subordinação, os subordinados e o departamento ou divisão onde está situado. Posicionar um cargo no organograma significa estabelecer essas quatro vinculações ou condições.

Emprego: Cada cargo é representado no organograma por um retângulo com dois terminais de comunicação. O terminal de cima que o liga ao cargo superior retrata a responsabilidade em termos de subordinação. O terminal de baixo que o liga aos cargos inferiores retrata a autoridade em termos de supervisão. Assim, posicionar um cargo no organograma significa indicar qual é seu nível hierárquico (diretoria, gerência, supervisão, execução, por exemplo), em qual área está localizado (em qual departamento ou divisão), a quem se reporta (quem é seu superior imediato), quem supervisiona (quais são seus subordinados diretos) e quais os cargos com quem mantém relações laterais. Ocupante é a pessoa designada para desempenhar um cargo. No fundo, toda pessoa que trabalha na organização ocupa um cargo. Existem cargos que têm um único ocupante — como o diretor-presidente, por exemplo —, enquanto outros exigem vários ocupantes que realizam as mesmas tarefas — como é o caso de operadores de máquinas, escriturários, caixas, balconistas, vendedores, por exemplo. As tarefas ou atribuições constituem as atividades realizadas por um ocupante de cargo. Quando uma pessoa ocupa determinado cargo, espera-se que ela execute as tarefas ou atribuições típicas do cargo, subordine-se a um superior, administre seus subordinados e responda por sua unidade de trabalho.

CONCEITUAÇÃO DE DESENHO DE CARGO

Desenhar um cargo significa estabelecer quatro condições fundamentais: a) O conjunto de tarefas ou atribuições que o ocupante deverá desempenhar (conteúdo do cargo).

b) Como esse conjunto de tarefas ou atribuições deverá ser desempenhado (métodos e processos de trabalho).

c) A quem o ocupante do cargo deverá reportar-se (responsabilidade), isto é, relação com sua chefia.

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d) Quem o ocupante do cargo deverá supervisionar ou dirigir (autoridade), isto é, relação com seus subordinados.

O desenho do cargo é a especificação do conteúdo, dos métodos de trabalho e das relações com os demais cargos, no sentido de satisfazer aos requisitos tecnológicos, organizacionais e sociais, bem como aos requisitos pessoais de seu ocupante. No fundo, o desenho dos cargos representa o modo pelo qual os administradores projetam os cargos individuais e os combinam em unidades, departamentos e organizações. Afinal, quem desenha os cargos nas organizações?

Quase sempre, o desenho dos cargos na organização não é responsabilidade da área de gestão de pessoas, cabendo algumas vezes a um órgão de engenharia industrial (que desenha os cargos tipicamente fabris) ou de organização e métodos (que desenha os cargos típicos de escritório), que se incumbe do planejamento e da distribuição das tarefas e atribuições da maior parte da organização. Os demais cargos — da área administrativa, financeira e mercadológica — são geralmente desenhados pelas respectivas gerências em um processo contínuo de resolução de problemas. Isso significa que os cargos não são estáveis, nem estáticos ou definitivos, mas que estão sempre em evolução, inovação e mudança para se adaptarem às contínuas transformações tecnológicas, econômicas,sociais, culturais e legais. O que está acontecendo agora é uma completa revolução no conceito de cargo em função das exigências do mundo moderno e da globalização da economia.

MODELOS DE DESENHO DE CARGOS

Provavelmente, o desenho de cargo seja tão antigo quanto o próprio trabalho humano. Desde que o ser humano teve de dedicar-se à tarefa de caçar ou pescar, ele aprendeu através de sua experiência acumulada ao longo dos séculos a modificar seu desempenho para melhorá-lo continuamente. E quando a tarefa foi aumentando, exigindo um número maior de pessoas para realizá-la, a coisa se complicou. Mas a situação básica de um homem que desempenha tarefas sob a direção de outro jamais foi realmente alterada, apesar de todas as mudanças sociais, políticas, econômicas, culturais e mesmo demográficas ocorridas durante a longa história da humanidade. Mesmo com a profunda divisão do trabalho implantada a partir da Revolução Industrial, com o surgimento das fábricas, com a interdependência gradativa dos trabalhos, com a invenção da máquina e da mecanização, com o advento da Administração Científica e, posteriormente, com o movimento das Relações Humanas, se o conteúdo do trabalho se alterou, não se alterou a essência da situação de dependência de uma pessoa em relação a outra. Somente a partir da década de 1960 é que um grupo de cientistas do comportamento e consultores de empresas passou a

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demonstrar que as antigas abordagens de desenho de cargos conduzem a resultados contrários aos objetivos organizacionais. A partir daí, começam a surgir novos modelos de desenho de cargos.

Modelo clássico ou tradicional de desenho de cargos

É o figurino utilizado pelos engenheiros pioneiros que iniciaram o movimento da Administração Científica — a primeira das teorias administrativas — no início do século XX. Taylor e seus seguidores, Gantt e Gilbreth, fizeram a primeira tentativa sistemática de aplicar certos princípios para a colocação ótima do indivíduo no cargo. A Administração Científica apregoava que somente por meio de métodos científicos se poderiam projetar cargos e treinar pessoas para se obter a máxima eficiência possível. Enquanto Taylor se preocupava com a cooperação entre a administração e o operariado no sentido de aumentar a produtividade e repartir seus benefícios entre as duas partes, seus seguidores foram bem mais restritivos, concentrando-se exclusivamente em dois principais aspectos: a determinação da melhor maneira de executar as tarefas de um cargo (the best way) e o uso de incentivos salariais (prêmios de produção) para assegurar a adesão aos métodos de trabalhos prescritos, Isso era o que se chamava de racionalização do trabalho. A melhor maneira era obtida de técnicas de estudos de tempos e movimentos que levavam ao método de trabalho a ser seguido pelos operários. Procurava-se uma separação entre pensamento (gerência) e execução da atividade (operariado): os cargos eram projetados segundo o modelo de fazer e não de pensar. O gerente mandava e o operário simplesmente obedecia e executava. O treinamento no cargo era restrito às habilidades específicas necessárias à execução da tarefa. O ponto de vista dominante era o de que quanto mais simples e repetitivas as tarefas tanto maior a eficiência do trabalhador. Daí, a ênfase na fragmentação das tarefas, na exagerada simplificação da atividade e na conseqüente superespecialização do operário. O modelo clássico desenha os cargos a partir das seguintes etapas: 1. O pressuposto básico é o de que o homem é simples apêndice da máquina, um mero recurso produtivo. A racionalidade que se busca é eminentemente técnica. A tecnologia vem antes e as pessoas vêm depois. E a tecnologia (maquinário, ferramentas, instalações, arranjo físico) que se estabelece de base para condicionar o desenho dos cargos. Em outras palavras, o desenho de cargos serve exclusivamente à tecnologia e aos processos de produção. O desenho é ótimo quando atende aos requisitos da tecnologia e dos processos produtivos. A maneira de encarar o desenho é lógica e determinística: a decomposição da tarefa em partes componentes.

2. Em função dos aspectos descritos, o trabalho é dividido e fragmentado em partes fracionadas, para que cada pessoa faça apenas uma subtarefa simples e repetitiva. Cada pessoa recebe uma

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incumbência parcial e fragmentada para executar de maneira rotineira e repetitiva, tendo em vista o tempo padrão para realizá-la e os ciclos de produção que precisam ser atendidos. No conjunto, o trabalho de todas as pessoas deve ser feito de maneira harmoniosa, cadenciada e coordenada.

3. O desenho clássico de cargos repousa na presunção de estabilidade e de permanência a longo prazo do processo produtivo. Isso significa que o desenho de cargos é definitivo e feito para durar sempre. Não se cogita de mudanças.

4. A ênfase reside na eficiência das pessoas. O trabalho é medido por meio de estudos de tempos e movimentos (cronometragem) para definir os tempos médios de execução, que são denominados tempos-padrão. O tempos-padrão representa 100° o de eficiência. A fim de incrementar a eficiência, o desenho de cargos permite prêmios de produção para quem ultrapasse o tempo-padrão, com base no conceito de homo economicus.

O modelo clássico de desenho de cargos visava projetar cargos dentro da seguinte lógica:

1. Segmentar e fragmentar os cargos em tarefas simples, repetitivas e facilmente treináveis.

2. Através do estudo de tempos e movimentos, eliminar as atividades e movimentos desnecessários que produzam fadiga e que não estejam relacionados com a tarefa a ser executada.

3. Definir o método de trabalho para encontrar a melhor maneira para seus ocupantes se moverem, localizarem e lidarem fisicamente com a tarefa.

4. Selecionar científicamente o trabalhador de acordo com as exigências da tarefa.

5. Eliminar tudo o que possa provocar fadiga física, como: arranjar instrumentos e equipamentos de maneira que minimizem o esforço e a perda de tempo e projetar instrumentos para facilitar o trabalho humano, como linhas de montagem, transportadores, seguidores e outras máquinas para reduzir ações e esforços físicos desnecessários.

6. Estabelecer o tempo médio que os operários levam para executar a tarefa, isto é, o tempo-padrão. O tempo-padrão equivale à eficiência igual a 100%. Um operário que trabalha com eficiência de 80% estará produzindo 20% a menos do que normalmente seria solicitado pela tarefa, por razões de seleção, treinamento ou supervisão inadequados. O ideal é obter eficiência igual ou maior do que 100%.

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7. Oferecer planos de incentivo salarial, ou seja, prêmios de produção para os operários que ultrapassem o tempo-padrão para incentivar a máxima eficiência possível, ou seja, obter rendimentos superiores a 100% o dos operários e repartir com eles parte da economia auferida pela organização.

8. Melhorar o ambiente físico da fábrica, de maneira que o ruído, a iluminação, a ventilação e outras facilidades de suporte não produzam fadiga nem reduzam a eficiência. Em outras palavras, projetar as condições físicas e ambientais que favoreçam o trabalho e proporcionem conforto ao trabalhador.

A lógica do desenho clássico

Dentro dessa lógica fria e mecanicista, o resultado esperado é a máxima eficiência. E em decorrência, os lucros aumentarão para a organização e, em função dos incentivos salariais, os salários dos trabalhadores serão maiores. Ambos saem ganhando. Daí, a pressuposição implícita de que o que é bom para a organização é bom também para o trabalhador. O modelo clássico não localiza nenhum conflito básico entre pessoas e organização. Sem dúvida, o esquema utilizado é típico da abordagem de sistema fechado: inclui poucas variáveis no sistema para que funcionem dentro de uma relação determinística de causa e efeito. E a chamada teoria da máquina: a organização e as pessoas são visualizadas como coisas que funcionam dentro de uma lógica muito simples. A idéia subjacente na abordagem clássica é bastante clara: o trabalhador e seu cargo são tratados como máquinas. Aliás, o trabalhador é considerado um apêndice da máquina. A tecnologia vem em primeiro lugar. Os cargos são medidos com o tempo e submetidos ao método, tornando-os simples e repetitivos para atender à tecnologia e não às pessoas. Com isso, desenvolveu-se o conceito da linha de montagem, a grande inovação trazida por essa abordagem em sua época. A maneira clássica ou tradicional de configurar cargos buscava as seguintes vantagens: a) Admissão de operários com qualificações mínimas e salários menores.

b) Padronização das atividades.

c) Facilidade de supervisão e controle, permitindo maior número de subordinados para cada chefe (maior amplitude de controle).

d) Redução dos custos de treinamento.

e) Aplicação do princípio da linha de montagem.

Contudo, a exagerada simplificação dos cargos trouxe problemas e limitações que constituíram sérias desvantagens, como: a) Cargos simples e repetitivos tornam-se monótonos e chatos,

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provocando apatia, fadiga psicológica, desinteresse e perda do significado do trabalho. Em casos mais graves, trazem efeitos negativos, como ressentimento, abaixamento do moral e até resistência ativa dos operários. Esses efeitos negativos produzem maior rotatividade de pessoal, maior absenteísmo e precária dedicação das pessoas. São efeitos que pesam muito na pretendida redução de custos, chegando mesmo a ultrapassá-los em alguns casos.

b) Com a desmotivação pelo trabalho, as pessoas tendem a se concentrar nas reivindicações e expectativas por maiores salários e melhores condições de trabalho como meio de compensar a insatisfação e o descontentamento com a tarefa.

As rápidas transformações sociais, culturais e econômicas mostram que a supersimplificação dos cargos tende a criar ou transferir problemas para o futuro, por quatro razões fundamentais:

1.Os jovens de hoje estão recebendo melhor educação e informação e deverão compor uma força de trabalho futura que certamente desejará cargos significativos e desafiadores, consistentes com seu padrão de formação e de conhecimentos.

2. As atitudes quanto à autoridade estão mudando a cada geração e as pessoas de hoje estão menos propensas do que seus antecessores a aceitar cegamente as ordens dadas por seus superiores.

3. Com o gradual movimento de nossa sociedade em relação ao bem-estar social e à qualidade de vida, existe enorme possibilidade de certos cargos cíclicos e rotineiros serem tachados de indesejáveis, tornando- se necessária a adoção de um complexo de motivadores intrínsecos para captar e reter seus ocupantes.

4. Com o advento da era da informação e da globalização da economia, está havendo verdadeira migração dos empregos industriais para empregos na área de serviços. Enquanto no setor industrial murcham de ano para ano as oportunidades de emprego, crescem as ofertas de trabalho no setor de serviços. Nessa era pós-industrial, as tarefas mecânicas e musculares estão sendo atribuídas a máquinas e equipamentos sofisticados (como os rôbos e equipamentos eletrônicos), enquanto se atribuem novas e crescentes tarefas mentais, intelectuais e complexas às pessoas.

Em resumo, os resultados obtidos pelos pregadores da abordagem clássica não corresponderam às vantagens esperadas, pelo fato de terem apostado em um raciocínio lógico e racionalista que não é consonante com a realidade humana das pessoas. Outro aspecto importante do modelo clássico é que o trabalho deve ser individualizado e isolado, o que conduz ao confinamento social de seu ocupante. Mesmo trabalhando em conjunto com outras pessoas na linha

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de montagem ou na operação da máquina, cada operário tem sua incumbência específica e individual e nenhum contato interpessoal ou social com os colegas. A interdependência é da tarefa e não dos contatos pessoais. As pessoas estão fisicamente juntas, mas socialmente distantes. Por outro lado, a relação de trabalho de cada trabalhador é diádica: cada ocupante relaciona-se exclusivamente com seu superior através do terminal de comunicação de seu cargo com ele. O gerente monopoliza todos os contatos do trabalhador com o restante da organização. Tudo passa por ele e nada ocorre sem sua anuência. Os pouquíssimos contatos com os colegas são formalizados, impessoais e estritamente controlados. A programação e o fluxo seqüencial do trabalho são da responsabilidade do gerente. O trabalhador apenas executa e não pensa. Dentro desse modelo, o trabalhador não está interessado nem é capaz de exercer autodireção e autocontrole. A organização o controla, fiscaliza monitora continuamente seu comportamento. Espera-se apenas que o trabalhador se interesse em executar suas tarefas da maneira como foram impostas e de modo eficiente na medida em que se lhe oferecem uma remuneração e prêmios de produção.

O modelo clássico ficou parado no tempo:Embora tenha provocado avanço no desenho de cargos, o modelo clássico não acompanhou mudanças sociais, culturais e tecnológicas do mundo moderno e ficou preso ao passado, que remonta a quase cem anos. Suas vantagens hoje estão sendo questionadas, enquanto suas desvantagens e limitações são apontadas como um dos entraves ao bom relacionamento entre pessoas e organizações. Embora ainda seja utilizado em muitas organizações, o desenho clássico representa uma abordagem ultrapassada e obsoleta que precisa ser urgentemente atualizada.

Modelo humanístico ou de relações humanas

O modelo humanístico surgiu com a Escola das Relações Humanas no decorrer da década de 1930 em franca oposição à Administração Científica, que representava o figurino administrativo da época. Foi uma reação humanística ao mecanicismo então dominante na administração das empresas. Os fatores considerados decisivos para a Administração Científica foram completamente ignorados e postos de lado pela Escola das Relações Humanas: a engenharia industrial foi substituida pelas ciências sociais, a organização formal foi relegada pela organização informal, a chefia, pela liderança, o comando, pela persuasão, o incentivo salarial, pelas recompensas sociais, a fadiga fisiológica, pela fadiga psicológica, o comportamento do indivíduo, pelo comportamento do grupo, o organograma, pelo sociograma. O conceito de pessoa humana passou do Homo economicus (o homem motivado exclusivamente por recompensas salariais) para o do Homo social (o homem motivado por incentivos sociais). Foi uma verdadeira revolução no sentido de sintonizar a administração com o espírito democrático tipicamente americano. Com a Teoria das Relações Humanas surgem os

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primeiros estudos a respeito de liderança, motivação, comunicações e demais assuntos relacionados com as pessoas. A ênfase nas tarefas (Administração Científica) e a ênfase na estrutura (Teoria Clássica) são substituidas pela ênfase nas pessoas.

O modelo humanista é realmente humanista?

Com toda essa mudança revolucionária de mentalidade e de conceituação, o desenho do cargo não é diferente do modelo clássico. Na realidade, a Teoria das Relações Humanas não se preocupou com o desenho de cargos. Deixou-o fora de suas cogitações e não chegou a oferecer um modelo melhor. A única diferença reside nas implicações humanas, ou seja, o modelo humanista tende a focalizar o contexto do cargo e as condições sociais sob as quais é desempenhado e menosprezar o conteúdo do cargo ou sua execução. O cargo em si é negligenciado, mas o ocupante recebe atenção e consideração quanto às suas necessidades pessoais e não é tratado como máquina. O modelo humanista procura incrementar maior interação entre as pessoas e seus superiores e participação em algumas decisões a respeito das tarefas da unidade, como meio de satisfazer às necessidades individuais e aumentar o moral do pessoal. Todavia, a consulta e a participação não interferem no cumprimento da tarefa nem afetam o fluxo e a seqüência do trabalho. Esses dois aspectos permanecem intactos. O gerente é solicitado a criar e desenvolver um grupo de trabalho coeso e integrado, promover uma atmosfera psicológica amigável e cooperativa independentemente da coordenação do trabalho, a incrementar as atividades no cargo como rotação dos ocupantes entre cargos similares e oportunidades ocasionais de interagir com outras unidades e departamentos. Algumas atividades são consideradas como meios de reduzir a chateza e o aborrecimento da tarefa e incrementar sentimentos de importância, como o lazer e as condições físicas de trabalho, e de conforto. Falou-se muito de contexto do cargo, mas o conteúdo do cargo continua exatamente o mesmo. O modelo humanista não conseguiu desenvolver um desenho de cargos que substituísse o modelo tradicional. Apenas cuidou de seu envolvimento externo. Da cosmética. Digamos, da embalagem e não do produto. Em tempos mais recentes, a Escola das Relações Humanas passou a ser criticada pela limitação do campo de estudos abordado e pela parcialidade em suas conclusões, pela sua concepção ingênua e romântica do trabalhador e, sobretudo, por seu enfoque manipulativo ao favorecer a administração e desenvolver uma estratégia sutil de fazer os operários trabalharem mais e exigir menos da organização.

Da ênfase nas tarefas para a ênfase nas pessoas

Apesar de todas as críticas, o salto tentado pela reação humanística foi o deslocamento da ênfase nas tarefas para a ênfase nas pessoas dentro da teoria administrativa. A idéia de uma administração participativa já estava subjacente na Escola das Relações Humanas,

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mas apenas como uma semente a ser germinada e desenvolvida. E isso somente aconteceria quase no final do século XX com o impacto de outras abordagens mais modernas e abrangentes da administração.

Modelo contingencial

É a abordagem mais complexa e envolvente e que leva em conta duas variáveis: as diferenças individuais das pessoas e as tarefas envolvidas. Daí ser contingencial, isto é, decorrente e dependente da adequação do desenho de cargo a essas duas variáveis. No modelo contingencial, convergem três variáveis: a estrutura da organização, a tarefa e a pessoa que irá desempenhá-la. Na realidade, o desenho de cargos repousa não somente nas presunções a respeito da natureza das pessoas, mas também em um conjunto de presunções implícitas a respeito do ambiente em que os cargos operam. Tanto o modelo clássico como o modelo humanista prescrevem que o cargo deve ser projetado para um ambiente estável e previsível: os métodos e os procedimentos são padronizados e repetitivos porque se baseiam na pressuposição de que a tecnologia utilizada permanecerá constante durante o tempo suficiente para compensar o investimento de tempo e de esforço aplicado à análise e estudo do trabalho. A ênfase dada à estabilidade dos objetivos organizacionais, dos fatores ambientais e tecnologia, mais do que ao grau de complexidade e: fisticação, é intencional, pois a estabilidade do produto e do processo é que serve de restrição ao projeto do cargo nos modelos clássico e humanista. Uma tecnologia estável, duradoura e que não mude é essencial para rotinização das atividades físicas e mentais dos ocupantes e para que o pensar seja separado do fazer, o que permite que os membros possam ser selecionados e treinados para desenvolver conjuntos de tarefas simples, repetitivas e estritamente definidas. Daí o caráter definitivo e permanente dos cargos: a característica típica do desenho clássico. Como se os cargos fossem perfeito não devessem ser modificados ou melhorados.

Preparando para mudar

No modelo contingencial, as prescrições quanto ao desenho do cargo não são baseadas na presunção de estabilidade e permanência dos objetivos e dos processos organizacionais, mas, ao contrário, são explicitamente dinâmico e baseado contínua ampliação do cargo através do enriquecimento de tarefas, como uma responsabilidade básica colocada nas mãos do gerente ou de equipe de trabalho. Assim, o desenho contingencial é mutável em conformidade com o desenvolvimento pessoal do ocupante e com o desenvolvimento tecnológico da tarefa. Em um mundo em que tudo muda, os cargos não podem ser estáticos ou permanentes. Além disso, em mundo onde a forte concorrência exige produtividade e qualidade, a organização precisa alcançar altos

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níveis de desempenho com a melhoria contínua na aplicação dos talentos criativos e da capacidade de autodireção e de autocontrole de seus membros, enquanto proporciona oportunidades de satisfação de suas necessidades individuais. O modelo contingencial supõe a utilização das capacidades de autodireção e autocontrole das pessoas e, sobretudo, objetivos planejados conjuntamente entre o ocupante e o gerente para tomar o cargo um verdadeiro fator motivacional. O gerente deve criar mecanismos por meio dos quais as contribuições das pessoas possam melhorar o desempenho departamental e não simplesmente consultar os subordinados para satisfazer apenas a suas necessidades de participação e de consideração. Essas necessidades passam de fins para meios. A satisfação de necessidades individuais de participação e consideração torna-se um subproduto desejável, mas não o objetivo principal das atividades gerenciais. Além da adoção de fatores tecnológicos, verificou-se que se devem levar em conta certos fatores psicológicos, a fim de obter:

a) Elevada motivação intrínseca do trabalho. b) Desempenho de alta qualidade no trabalho. c) Elevada satisfação com o trabalho. d) Redução das faltas (absenteísmo) e dos desligamentos espontâneos (rotatividade).

Embora exista uma diversidade nos padrões de satisfação no trabalho, sabe-se que a satisfação é um elemento dentro de uma rede de variáveis inter-relacionadas. Essa rede permite entender como os cargos influenciam as pessoas em sua motivação e desempenho, bem como em sua satisfação. Existem muitas pessoas que não estão satisfeitas com o trabalho que executam, porém, as pessoas que executam trabalhos mais interessantes e desafiadores estão geralmente mais satisfeitas com eles do que as pessoas que executam tarefas repetitivas e rotineiras. As oportunidades para obter melhores resultados do pessoal e do trabalho aumentam quando estão presentes três estados psicológicos críticos nas pessoas que executam o trabalho, a saber: a) Quando a pessoa encara seu trabalho como significativo ou de valor. b) Quando a pessoa se sente responsável pelos resultados do trabalho. c) Quando a pessoa conhece os resultados que obtém fazendo o trabalho. Por meio de pesquisas, alguns autores identificaram cinco dimensões essenciais de um cargo e verificaram que, quanto mais um cargo tiver a característica representada por cada uma dessas dimensões, tanto maior será o seu potêncial para criar os estados psicológicos citados anteriormente. A partir daí, surgiu o modelo contingencial segundo o qual cada cargo deve ser desenhado no sentido de reunir cinco dimensões essenciais, a saber:

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a) Variedade: é o número e a variedade de habilidades exigidas pelo cargo. Reside na gama de operações do trabalho ou no uso de uma diversidade de equipamentos e procedimentos para tornar o cargo menos repetitivo e menos monótono. A variedade envolve a intervenção de diversas habilidades e conhecimentos do ocupante, a utilização de diversos equipamentos e procedimentos e a execução de diversas tarefas diferentes. Os cargos com elevada variedade eliminam a rotina e a monotonia e são mais desafiantes, porque as pessoas devem utilizar ampla extensão de suas habilidades e capacidades para completar o trabalho com sucesso. Não há variedade quando o cargo é seqüencial e monótono, quando a pessoa não pode conversar com os colegas, quando seu trabalho é rigidamente programado por terceiros, quando sua área de trabalho é limitada pela gerência, quando os insumos de seu trabalho dependem totalmente do gerente. A variedade é introduzida à medida que o próprio ocupante planeja e programa seu trabalho, supre seus insumos, utiliza diferentes equipamentos, ambientes, métodos de trabalho e diferentes operações, com criatividade e diversidade.

b) Autonomia: é o grau de independência e de critério pessoal que o ocupante tem para planejar e executar o trabalho. Refere-se a maior autonomia e independência que o ocupante tem para programar seu trabalho, selecionar o equipamento que deverá utilizar e decidir que métodos ou procedimentos deverá seguir. A autonomia está relacionada com o lapso de tempo de que o ocupante dispõe para sofrer supervisão direta de seu gerente. Quanto maior a autonomia, tanto maior o lapso de tempo em que o ocupante deixa de receber supervisão direta e maior a auto-administração do próprio trabalho. Ocorre falta de autonomia quando os métodos de trabalho são predeterminados, quando os intervalos de trabalho são rigidamente controlados, quando a mobilidade física da pessoa é restrita, quando os insumos de seu trabalho dependem exclusivamente da gerência ou de outros. A autonomia proporciona liberdade de métodos, de programar o trabalho e os intervalos de repouso, mobilidade física ilimitada e quando a própria pessoa supre os insumos de seu trabalho sem depender da gerência ou de outras pessoas.

c) Significado da tarefa: é o volume do impacto reconhecível que o cargo provoca em outras pessoas. Nada mais é do que a noção das interdependências do cargo com os demais cargos da organização e da participação de seu trabalho na atividade geral do departamento ou da organização toda. Quanto maior o significado das tarefas, tanto maior a responsabilidade experimentada pelo ocupante. Trata-se de aumentar a noção da importância das tarefas executadas e, conseqüentemente, do papel da pessoa dentro da organização. Quando o cargo atende a essa dimensão, o ocupante pode distinguir perfeitamente o que é mais importante e o que é menos importante, o que essencial

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e o que é acidental, o que é relevante e o que é irrelevante, entre as coisa que faz. Mais ainda, o ocupante pode criar condições para adequar o cargo às necessidades do cliente interno ou externo. Há falta de significado das tarefas quando a pessoa recebe apenas ordens lacônicas par serem cumpridas e nenhum esclarecimento sobre sua finalidade ou objetivos de seu trabalho. A significância das tarefas requer uma explicitação completa do trabalho, de seus objetivos, de sua utilidade e importância, de sua interdependência com os demais cargos da organização e, principalmente para qual cliente interno ou externo é direcionado ao trabalho.

d) Identidade com a tarefa: é o grau em que o cargo requer que a pessoa complete uma unidade integral do trabalho. Refere-se à possibilidade de a pessoa efetuar uma peça de trabalho inteira ou global e de poder claramente identificar os resultados de seus esforços. O ocupante do cargo identifica-se com a tarefa à medida que a executa cabal e integralmente como produto final de sua atividade. A montagem total de um produto em lugar da realização de apenas uma simples etapa da operação introduz identidade. Há falta de identidade com as tarefas quando o ocupante executa atividades fragmentadas, seccionadas e incompletas, que ele ignora para que servem, e quando o ambiente de trabalho é totalmente determinado pela gerência. A pessoa aperta parafusos o dia inteiro e não sabe exatamente para que serve todo o seu trabalho. A identidade com as tarefas ocorre à medida que a pessoa executa um trabalho total e abrangente, cujo resultado final é um produto seu, uma realização sua, de forma que ela se sinta “dona” do local do trabalho ou do próprio trabalho realizado, ou seja, quando a pessoa executa um trabalho integral ou um módulo integral do trabalho, que lhe dê uma noção da totalidade, extensão e do objetivo a alcançar.

e) Retroação: é o grau de informação de retorno que o ocupante recebe para poder avaliar a eficiência de seus esforços na produção de resultados. Refere-se à informação de retorno que a pessoa recebe enquanto está trabalhando e que lhe revela como está desempenhando em sua tarefa. A retroação ocorre à medida que o ocupante do cargo recebe informação de retorno sobre como está indo em sua atividade, a qual é proporcionada pelo próprio resultado de seu trabalho. Essa retroação permite-lhe uma contínua e direta auto-avaliação do seu desempenho sem necessidade de julgamento periódico de seu superior. A retroação constitui um problema de informação. Quando a produção do ocupante é misturada com a produção de outras pessoas ou quando a produção é removida ou retirada com frequência, não há possibilidade de conhecimento dos resultados do trabalho pessoal. A retroinformação ocorre apenas quando o ocupante tem conhecimento dos resultados do

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seu próprio trabalho ou quando sua produção horária ou diária é perfeitamente visível e palpável.

Essas cinco dimensões essenciais ou dimensões profundas criam condições para que o ocupante do cargo encontre satisfação intrínseca como resultado do cumprimento da tarefa que realiza. Essas condições permitem que o cargo seja impregnado dos chamados fatores motivacionais ou satisfacientes. A adoção dessas dimensões permite que:

a) A pessoa utilize várias de suas habilidades e competências pessoais na execução das tarefas.

b) A pessoa tenha certa autonomia, independência e autodireção na execução das tarefas.

c) A pessoa faça algo significativo e que tenha certo sentido ou razão de ser.

d) A pessoa se sinta pessoalmente responsável pelo sucesso ou fracasso das tarefas decorrente de seus próprios esforços.

e) A pessoa descubra e avalie seu próprio desempenho enquanto executa o trabalho, sem intervenção de terceiros ou da chefia.

As dimensões essenciais do cargo: As dimensões essenciais afetam intrínsecamente a qualidade dos cargos, produzem satisfação pessoal e envolvimento humano e geram maior produtividade. A nova abordagem de desenho de cargos antecipa-se à mudança e aproveita todos os seus benefícios sob circunstâncias que exijam flexibilidade e adaptação criativa a novos problemas e objetivos, principalmente quando o ambiente é dinâmico e mutável e as mudanças são constantes e intensas. As mudanças desatualizam rapidamente o conteúdo e a estrutura dos cargos e impõem novas posturas e habilidades a seus ocupantes. Daí a necessidade de continuamente redesenhar os cargos e atualizá-los diante das mudanças ocorridas no contexto organizacional e nas características das pessoas. E que também as pessoas sofrem mudanças: elas aprendem novas habilidades, absorvem conceitos novos, desenvolvem atitudes e enriquecem seu comportamento diante do trabalho que executam. Assim, a principal mudança a ser considerada é a modificação permanente do comportamento humano em função da contínua atualização de seu potencial.

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Enriquecimento de cargos

A colocação do problema não é nova. Há mais d 30 anos, McGregor apregoava que a Teoria Y é geralmente aplicada nas empresas por meio de um estilo de direção baseado em uma série de medidas inovadoras humanistas, entre as quais ressaltava a ampliação e cargo para obter maior significação do trabalho. Em vez da superespecialização e do confinamento de tarefas do modelo clássico, a ampliação do cargo requer sua reorganização e extensão de atividades para que as pessoas possam conhecer o significado daquilo que fazem e, principalmente, ter uma idéia da contribuição de seu trabalho pessoal para as operações da organização toda. Mais adiante, Herzberg desenvolveu sua teoria dos dois fatores a respeito da motivação para o trabalho e preconizou o chamado enriquecimento do cargo como a principal forma de obter satisfação intrínseca por meio do cargo. É que o cargo é pequeno demais para o espírito de muitas pessoas. Em outros termos, os cargos não suficientemente grandes para a maioria das pessoa precisam ser redimensionados. E a maneira mais prática e viável para a adequação permanente do cargo ao crescimento profissional do ocupante é o enriquecimento do cargo, também denominado ampliação do cargo. Consiste em aumentar deliberada e gradativamente objetivos, as responsabilidades e os desafios das tarefas do cargo. O enriquecimento do cargo pode ser lateral ou horizontal (com a adição de novas responsabilidade mesmo nível) ou vertical (com adição de novas responsabilidades de nível gradativamente mais elevado). Se o cargo é expandido a fim de que o ocupante faça simplesmente maior variedade de tarefas ou maior número de operações, o cargo recebe um enriquecimento horizontal ou lateral. Se, porém, o ocupante é envolvido com o planejamento, com a organização e inspeção, além da execução de seu trabalho, o cargo recebe um enriquecimento vertical. As evidências indicadas pelas pesquisas sugerem que o enriquecimento de cargos — seja horizontal ou vertical, individual ou grupal — resulta em melhoria do desempenho e, no mínimo, em redução da insatisfação no trabalho. Com todos os seus aspectos positivos e motivacionais, o enriquecimento de cargos pode eventualmente trazer algumas conseqüências indesejáveis. É que as pessoas reagem de maneiras diferentes às mudanças que ocorrem em seu contexto, desde uma sensação de ansiedade e de angústia até o sentimento de serem exploradas pela organização. Também o ambiente de trabalho influencia poderosamente as expectativas das pessoas. Se a organização é tradicional e conservadora em suas políticas e procedimentos, é de esperar que o espírito de mudança e inovação esteja totalmente bloqueado e as pessoas sintam-se inseguras com relação a toda novidade, porque não estão preparadas para ela. Quem vive sempre em organizações conservadoras e voltadas para o passado dificilmente tem condições de criar e de inovar. Ou, como diz Lair Ribeiro, quem vive eternamente em terreno de peru nunca aprenderá a voar como uma águia. E talvez nem saiba que existam águias voando pelo espaço, e que é possível fazê-lo. Assim, o enriquecimento de cargos pode

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eventualmente derrapar em alguns efeitos indesejáveis, principalmente em organizações que privilegiam o status quo (que designa o estado atual das coisas). O principal dilema do enriquecimento de cargos reside na resistência à mudança diante das tarefas e atribuições aumentadas. A ansiedade experimentada pelo temor de falhar e a insegurança quanto à possibilidade de não aprender corretamente o novo trabalho podem criar obstáculos. Os sindicatos também têm explorado a questão do enriquecimento de cargos, acusando certas empresas de o fazerem exclusivamente para proveito próprio, com evidente exploração das pessoas. Quando o enriquecimento é feito de maneira exagerada e com excessiva velocidade, pode provocar intensa concentração do indivíduo no trabalho, reduzindo suas relações interpessoais por falta de tempo ou de condições pessoais.

Mudando as bolas: adequação do cargo ao ocupante

A adequação do cargo ao ocupante permite melhorar o relacionamento básico entre as pessoas e seu trabalho, incluindo novas oportunidades de iniciar outras mudanças na organização e na cultura organizacional e de melhorar a qualidade de vida no trabalho. O que se espera do enriquecimento de cargos é não apenas uma melhoria das condições de trabalho, mas sobretudo um aumento da produtividade e redução das taxas de rotatividade e de absenteísmo do pessoal. Uma experiência desse tipo geralmente introduz novo conceito de cultura e clima organizacional, tanto na fábrica como no escritório: reeducação da gerência e da chefia, descentralização da gestão de pessoas, delegação de responsabilidades, maior oportunidades de participação etc.

Abordagem motivacional ao desenho de cargos

Se as dimensões profundas estão presentes em um cargo, é provável que elas criem três estados psicológicos críticos em seus ocupantes, a saber: 1. Percepção do significado: é o grau em que o ocupante do cargo experimenta seu trabalho como importante, valioso e contribuindo para alguma coisa.

2. Percepção da responsabilidade: é a profundidade com que o ocupante se sente pessoalmente responsável e ligado aos resultados do trabalho desempenhado.

3. Conhecimento dos resultados: é a compreensão que o ocupante recebe sobre como efetivamente ele desempenha o trabalho.

Baseadas nas cinco dimensões essenciais e nos três estados psicológicos críticos foi desenvolvida uma abordagem para sua

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implementação por meio do aumento do volume de cada característica representada pelas cinco dimensões essenciais. A idéia básica era reunir as cinco dimensões essenciais e os três estados psicológicos através do enriquecimento de cargos e de recompensas individuais e grupais em seis conceitos implementadores. Os seis conceitos implementadores das cinco dimensões essenciais e dos três estados psicológicos são:

a) Tarefas combinadas: consistem em combinar e juntar várias tarefas segregadas em uma só tarefa. Enquanto o desenho clássico de cargos preocupava-se em dividir e fragmentar o trabalho em tarefas especializadas menores, a tendência agora está em reunir essas partes divididas em módulos maiores de trabalhos integrados. Tal mudança aumenta a diversidade do trabalho e a identidade com a tarefa. A linha de montagem tradicional é substituída pela montagem de todo o produto por uma só pessoa, que passa a denominar-se generalista ou gerente de tarefa.

b) Formação de unidades naturais de trabalho consiste em identificar diferentes tarefas serem executadas, agrupá-las em módulos significativos e atribuí-las a uma pessoa. Uma unidade natural de trabalho reúne certas partes especializadas funcionalmente de um processo, permitindo uma noção integral do trabalho.

O que as empresas estão fazendo

O Citibank americano modificou o processo de tratar a correspondência referente às “cartas crédito”, que envolvia 30 etapas realizadas por pessoas e que levava 30 dias para ser executada. O novo processo passou a ser realizado por uma pessoa em apenas um dia. A Guardian Life Ins rance Co. tinha um processo de arquivamento no estilo de linha de montagem que envolvia várias pessoas, cada uma delas realizando uma etapa específica do longo processo, sem saber exatamente onde um arquivo estaria sendo processado quando o cliente ligava para tomar conhecimento. O enriquecimento incluiu a criação de um cargo “analista de conta”, que passou a atender um conjunto de clientes em determinado setor, reduzindo totalmente os atrasos e as queixas dos clientes. A formação de unidades naturais de trabalho aumenta o sentimento de propriedade e realça a identidade e o significado da tarefa.

c) Relações diretas com o cliente ou usuário: consistem em estabelecer comunicações diretas entre o ocupante do cargo e os vários usuários internos ou clientes externos de seu serviço, bem como com seus fornecedores. A idéia de dar a cada cargo um cliente é o principal objetivo do enriquecimento de cargo. O cliente pode ser interno ou externo. Se qualidade significa o atendimento das exigências do cliente, então o primeiro item a pesquisar é saber quais são esses requisitos para construir cadeias de qualidade que

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funcionem bem. A capacidade de atender às exigências do cliente é vital, não apenas entre duas organizações diferentes (cliente externo), mas dentro da mesma organização (cliente interno). Para obter qualidade dentro da organização, cada pessoa da cadeia de qualidade, ou seja, cada ocupante de cargo, deve questionar cada interface da seguinte maneira:

Clientes • Quem são meus clientes imediatos? • Quais são seus verdadeiros requisitos e exigências? • Como posso identificar esses requisitos? • Como posso medir minha capacidade de atendê-los? • Será que estou atendendo continuamente tais requisitos?

Fornecedores • Quem são meus fornecedores imediatos? • Quais são meus verdadeiros requisitos? • Como comunico esses requisitos aos meus fornecedores? • Meus fornecedores têm capacidade para avaliar e atender meus requisitos? • Como lhes informo as mudanças em meus requisitos?

Pondo o ocupante em contato com o cliente

Os funcionários da seção de “carta de crédito” do Citibank passaram a controlar todas as transações com o cliente. Também os analistas de conta do Guardian Life Insurance ficaram responsáveis por um conjunto de clientes segurados. Nas organizações, o analista de sistemas e o programador de computador — que são dois cargos em extinção — passaram a ter contatos diretos com os diversos usuários do sistema. O relacionamento direto melhora o trabalho ao proporcionar retroação ao ocupante. Tratar com clientes ou usuários é aumentar a variedade, já que as dúvidas e os problemas passam a ser encaminhados diretamente ao ocupante do cargo para a solução. Isso envolve maior responsabilidade e autonomia. O potencial de tais relações com o cliente aumenta a diversidade de operações e a autonomia, acrescentando outra fonte de retroação.

d) Carga vertical: consiste em uma integração vertical que enriquece o cargo com adição de tarefas mais elevadas ou atividades gerenciais. Corresponde ao enriquecimento vertical do cargo. Aliás, um dos conceitos implementadores mais importantes do enriquecimento de cargo é a ampliação vertical pelo acréscimo de deveres mais elevados, tornando o ocupante um pouco gerente. O ocupante cujo cargo é carregado verticalmente recebe mais autoridade, responsabilidade e critério para planejar, organizar e controlar seu próprio trabalho.

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Isso também pode ser feito com a fixação de objetivos de desempenho, e dando-se ao ocupante a liberdade suficiente para resolver sozinho seus problemas e para tomar decisões sobre como e quando executar as tarefas. A carga vertical aumenta a autonomia da pessoa.

Ampliando o cargo

A Xerox promoveu mudanças nos cargos de representante técnico, introduzindo elementos de planejamento e controle, como pedir peças, estabelecer intervalos de manutenção preventiva, fornecer informação e participar na avaliação de seu próprio desempenho e na determinação de seu mérito. Muitas vezes, a carga vertical pode incluir o estabelecimento de objetivos, o que estimula a motivação e o desempenho.

e) Abertura de canais de retroação: significa proporcionar uma tarefa que permita informação sobre como a pessoa está realizando seu trabalho, em vez de depender da gerência ou de terceiros. Quase sempre, a abertura de canais de retroação é feita atribuindo-se ao próprio ocupante o controle de seu desempenho, criando uma tarefa total e completa, com pleno conhecimento dos resultados. Isso aumenta diretamente o conhecimento dos resultados das atividades do trabalho. Quanto mais diretamente for obtida a realimentação por meio do próprio cargo, ela será mais aceitável do que quando obtida a partir do gerente ou de algum departamento de assessoria.

Abrindo canais de retroação: em alguns casos, quando as operações de montagem são reunidas e os cargos são carregados verticalmente, de modo que as pessoas fiscalizem seu próprio trabalho, é comum colocar-se um adesivo em cada produto, identificando cada pessoa e convidando o cliente a contatá-la na fábrica, se houver qualquer defeito. Em outros casos, o simples estabelecimento de relações diretas com o cliente, como na Guardian Life Insurance ou no Gitibank, significa que o cliente fornece retroação direta ao empregado. A abertura de canais faz fluir a retroação diretamente entre os usuários e os fornecedores, sem a inclusão de gerentes ou de pessoal de assessoria.

f) Criação de grupos autônomos: vários trabalhos individuais podem ser transferidos para grupos interativos ou equipes de trabalho. Pesquisas têm demonstrado que a dinâmica que ocorre dentro dos grupos proporciona maior satisfação, pois o grupo influencia o comportamento individual, criando soluções de trabalho com maior eficácia do que isoladamente. O fundamental na criação de grupos autônomos é a atribuição de um tarefa

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completa, juntamente com boa dose de autonomia para decidir sua execução. O sistema de recompensas deve ser coerente com o desenho grupal. As recompensas devem ser baseadas no desempenho do grupo todo e não no desempenho individual, para que as recompensas externas estejam de acordo com a motivação interna criada pelo próprio desenho de trabalho. Por outro lado deve haver rotatividade das pessoas na execução das várias tarefas envolvidas na tarefa principal, o que proporciona treinamento, visão do todo, variedade e identificação com a tarefa. A eficácia dependerá não somente do desenho da tarefa, mas sobretudo das características do próprio grupo, de seus membros, tipo de comunicação existente, moral interno etc. Alguns tipos de círculos de controle de qualidade (CCQ), equipe transitórias, grupos multifuncionais, célula de produção etc, são bons exemplos dessa abordagem de desenho de tarefas por meio do enriquecimento de cargos e melhoria de qualidade de vida dentro das organizações.

Agrupando as pessoas: em circunstâncias nas quais várias pessoas se relacionam ou podem relacionar-se como um grupo na execução de certos trabalhos, torna-se preferível projetar o trabalho, não apenas como um conjunto de tarefas individuais, mas como um tarefa total dividida entre o grupo. A interação grupal permite recursos sociais capazes de estimilar fortemente a motivação, o desempenho no trabalho e a produtividade. Essas conclusões não são recentes. Elas datam da década de 1960, quando o Instituto Tavistock de Londres fez experimentos com grupos de mineiros de carvão a respeito da produtividade e satisfação no trabalho graças mudanças tecnológicas que conduziram à chamada abordagem sociotécnica.

EQUIPES DE TRABALHO

Uma forte tendência do moderno desenho de cargos é a criação de equipes autônomas ou autogerenciáveis de trabalho. São grupos de pessoas cujas tarefas são redesenhadas para criar alto grau de interdependência e que recebem autoridade para tomar decisões a respeito do trabalho a ser realizado. As equipes de trabalho operam com processo participativo de tomada de decisões, tarefas compartilhadas e responsabilidade por boa parcela do trabalho “gerencial” do nível superior. Um aspecto fundamental é a habilidade multifuncional: cada membro do grupo deve possuir todas as habilidades para desempenhar diferentes tarefas. Os membros são responsáveis pelo alcance de resultados e metas e decidem a distribuição das tarefas entre si, programam o trabalho, treinam uns aos outros, avaliam a contribuição de cada um e são responsáveis pela qualidade do trabalho grupal e pela melhoria contínua.

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Equipes de alto desempenho: os principais atributos de equipes de alto desempenho são geralmente os seguintes:

• Participação: todos os membros estão comprometidos com o empowerment (significa reconhecer aquilo que empiricamente se chama movimento) e auto-ajuda;

• Responsabilidade: todos os membros sentem-se responsáveis pelos resultados do desempenho;

• Clareza: todos os membros compreendem e apóiam os objetivos da equipe;

• Interação: todos os membros comunicam dentro de um clima aberto e confiável;

• Flexibilidade: todos os membros querem mudar e melhorar o desempenho;

• Focalização: todos os membros são dedicados a alcançar as expectativas do trabalho;

• Criatividade: todos os talentos e idéias são usados para beneficiar a equipe;

• Rapidez: todos os membros atuam prontamente sobre os problemas e oportunidades.

ATIVIDADE

Alberto da Silva Sauro, Gerente de Recursos humanos, da Metalúrgica Santa rita S.A, tinha um plano para reestruturar os cargos de seu departamento. Pretendia deixar de lado as antigas abordagens de desenho clássico e humanístico para dedicar-se a uma nova abordagem de desenho contingencial, que proporciona-se motivação intrínseca, elevada satisfação no trabalho e desempenho de alta qualidade no trabalho para seus funcionários. Queria que o trabalho rotineiro e burocrático fosse substituído por um tabalho que comportasse variedade, autonomia, significado da tarefa, identidade com a tarefa e, sobretudo, retroação. Queria que a atividade de sua equipe proporcionasse estados psicológicos como percepção do trabalho como significativo e de valor, peercepção de ser responsável pelos resultados do trabalho realizado e conhecimentos dos resultados do trabalho. Para tanto, convocou todo o seu pessoal e solicitou sua colaboração para tal empreendimento, pois queria que todos participassem ativamente no novo esquema. Como seu pessoal nada conhecia a respeito de desenho de cargos, Alberto queria dar alguns exemplos de tarefas combinadas, de formação de unidades naturais de trabalho, de relações diretas com o cliente ou usuário, de carga vertical, de abertura de canais de retroação e de criação de grupos autônomos. Mas, como fazê-lo?