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106 www.backstage.com.br ÁUDIO NAS IGREJAS Aldo Soares trabalha há 19 anos com áudio, é operador de PA, engenheiro projetista e educa- dor de áudio. [email protected] Áudio Áudio nas igrejas omo trabalhei a ainda trabalho nesses universos diferentes vis- lumbro claramente essas diferenças. Trabalhar com áudio operando PA ou monitor de um artista é poder traba- lhar com equipamentos de primeira linha; mesas, periféricos e caixas que nas igrejas brasileiras não encontra- mos. Trabalhar para uma empresa de locação também é diferente, o técni- co precisa atender outro técnico, este operador do artista, e com toda a es- trutura de equipamentos da empresa que lucra com o aluguel dos equipa- mentos, também é bem mais “fácil” que nas igrejas. Já na igreja isso não acontece. Faze- mos o som com o que temos, e na maioria das vezes isso é extremante limitado e, em alguns casos, fazemos de forma realmente precária. Do ponto de vista pessoal, para o técni- co, dependendo de sua experiência, isso é bom, como muitas vezes brin- camos e nos orgulhamos “é de pedra que se tira leite”, porque “tirar leite de vaca é natural”. Mas, brincadeiras à parte, não é fácil trabalhar com som nas igrejas. É um trabalho dife- rente e que muitos encaram como serviço voluntário. Bom, então vamos às igrejas. As igrejas no Brasil vêm crescendo de forma vertiginosa, principalmente as evangélicas. A todo instante abre uma nova igreja ou congregação em nossas cidades. A maioria absoluta dessas novas igrejas é pequena, geral- mente iniciam com duas ou três famíli- as, começam em casas ou em pequenas lojas comerciais. São igrejas que repre- sentam uma boa parte do total. Muitas delas crescem rapidamente, passando de poucos membros a algumas dezenas em poucos meses. Uma parte destas, passam de dezenas a centenas no pri- meiro ano e assim, uma boa parte das C É com imenso prazer que começo a colaborar para a revista Backstage. Sou leitor desde as primeiras edições e fico muito feliz em poder contribuir. Escrever com o foco em igrejas é pessoalmente muito gratificante. Por mais que o áudio tecnicamente na igreja seja o mesmo do teatro e do show, as peculiaridades e o operacional são diferentes Trabalhar com áudio operando PA ou monitor de um artista é poder trabalhar com equipamentos de primeira linha; mesas, periféricos e caixas que nas igrejas brasileiras não encontramos

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106 www.backstage.com.br

ÁUDIO NAS IGREJAS

Aldo Soares trabalha há 19 anos com áudio, é

operador de PA, engenheiro projetista e educa-

dor de áudio.

[email protected]

ÁudioÁudionas igrejas

omo trabalhei a ainda trabalhonesses universos diferentes vis-

lumbro claramente essas diferenças.Trabalhar com áudio operando PA oumonitor de um artista é poder traba-lhar com equipamentos de primeiralinha; mesas, periféricos e caixas quenas igrejas brasileiras não encontra-mos. Trabalhar para uma empresa delocação também é diferente, o técni-co precisa atender outro técnico, esteoperador do artista, e com toda a es-trutura de equipamentos da empresaque lucra com o aluguel dos equipa-mentos, também é bem mais “fácil”que nas igrejas.

Já na igreja isso não acontece. Faze-mos o som com o que temos, e namaioria das vezes isso é extremantelimitado e, em alguns casos, fazemosde forma realmente precária. Doponto de vista pessoal, para o técni-co, dependendo de sua experiência,isso é bom, como muitas vezes brin-

camos e nos orgulhamos “é de pedraque se tira leite”, porque “tirar leitede vaca é natural”. Mas, brincadeirasà parte, não é fácil trabalhar comsom nas igrejas. É um trabalho dife-rente e que muitos encaram comoserviço voluntário.

Bom, então vamos às igrejas.

As igrejas no Brasil vêm crescendo deforma vertiginosa, principalmente asevangélicas. A todo instante abreuma nova igreja ou congregação emnossas cidades. A maioria absolutadessas novas igrejas é pequena, geral-mente iniciam com duas ou três famíli-

as, começam em casas ou em pequenaslojas comerciais. São igrejas que repre-sentam uma boa parte do total. Muitasdelas crescem rapidamente, passandode poucos membros a algumas dezenasem poucos meses. Uma parte destas,passam de dezenas a centenas no pri-meiro ano e assim, uma boa parte das

CÉ com imenso prazerque começo acolaborar para arevista Backstage.Sou leitor desde asprimeiras edições efico muito feliz empoder contribuir.Escrever com o focoem igrejas épessoalmente muitogratificante. Por maisque o áudiotecnicamente na igrejaseja o mesmo doteatro e do show, aspeculiaridades e ooperacional sãodiferentes Trabalhar com áudio operando PA ou monitor de

um artista é poder trabalhar com equipamentosde primeira linha; mesas, periféricos e caixas que

nas igrejas brasileiras não encontramos

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igrejas, segue esse ciclo de crescimentovertiginoso a que temos assistido noBrasil nos últimos anos.Os evangélicos, por exemplo, quecorrespondem à maioria absoluta

nesse quesito de crescimento segun-do o IBGE, representavam 9% da po-pulação em 1991; em 2000 esse per-centual cresceu para 15,4%. Hoje, aestimativa é de que esse percentualesteja acima de 20% da população, oque corresponde a mais de 37 milhõesde brasileiros. E mais, essas igrejas sãocaracterizadas pela forte presençamusical em seus cultos. As cerimôni-as litúrgicas tradicionais vêm sofren-do fortes alterações em suas estrutu-ras. A música passou a ocupar um es-paço grande nos cultos. Mesmo as pe-quenas congregações são caracteriza-das por essa forte presença musicalem seus cultos.Só que agora o áudio dessas igrejas ga-nhou uma outra dimensão, deixou deser meramente o amplificador da voz,agora tem um conjunto musical in-teiro também. Os estilos musicais to-cados nessas igrejas não são os mes-mos, o gospel brasileiro anda de mãosdadas com o pop. O nível de exigênci-as sobre os equipamentos de áudio

está em outro patamar. O áudio daigreja passou a ser um foco constantede investimentos, e o grande desafiodos líderes e responsáveis técnicos éde pensar no futuro, o que ao mesmotempo é um grande tabu, principal-mente por sermos brasileiros, cultu-ralmente educados, ou não, a não pla-nejarmos a longo prazo.

PLANEJAMENTONão é fácil planejar as nossas vidas.Realmente a vida nos ensina muitasvezes que nem sempre as coisas cami-nham como planejamos ou esperáva-mos. Entretanto, mesmo assim, mui-tos de nós continuamos seguindonossos passos pessoais e replanejandoos mesmos, mesmo que inconscien-temente. Há também uma boa parteque cede aos desamores da vida e sim-plesmente não planeja, vive em cadadia, um dia.A arte do planejamento bem-sucedi-do é conciliar entre o possível, o quasepossível e o impossível, ou o provável,o possível e o muito difícil. Porque co-locar no papel é uma coisa, executar éoutra bem diferente. Exige tambémuma imensa parcela de perseverança ecompromisso com o planejado.Claro que como o assunto é igreja,ainda podemos adicionar aí a fé, quenesse caso é fundamental.O futuro também pode representarum outro tabu, pelo menos para osque viveram tempos de inflação.Essa palavra, futuro, longo prazo,nunca existiu, e isso é um fato contrao qual temos que lutar. Hoje vivemosoutros tempos, outro mundo, é pos-sível pensar a longo prazo, e quandodigo longo prazo estou falando decinco, dez anos ou até mais, depen-dendo do caso.

Vejamos alguns exemplos que você,

querido leitor, pode ou não conhecer.

Uma igreja que foi fundada há poucosanos vem crescendo de uma formamuito boa durante esse período ehoje, depois de vários investimentosfinanceiros, alguns, inclusive, pesa-dos, ainda não resolveu seus proble-mas básicos com som. O som aindanão está bom, faltam equipamentos einfra-estrutura. Só que, quando sepensa em todo dinheiro aplicado du-rante esse tempo, uma constataçãofica clara: “Se tivéssemos aplicadoesse dinheiro de uma forma melhor,hoje não estaríamos da forma comoestamos. Parece que não investimostanto”. Essa é a conclusão de muitospastores e líderes. O pior é que a mai-oria absoluta das igrejas está dessaforma. Eu pessoalmente já presencieivárias igrejas assim, para não afirmarque foram quase todas.

A liderança da igreja e os responsá-veis técnicos devem pensar mais adi-ante. Devem parar de tentar resolveros problemas do som da igreja para opróximo evento ou congresso e pen-sar de fato nos problemas de uma for-ma geral. Pensar, não para o evento deamanhã, que pode muito bem ser com

As cerimôniaslitúrgicas tradicionaisvêm sofrendo fortesalterações em suas

estruturas. A músicapassou a ocupar umespaço grande nos

cultos

A arte doplanejamento bem-sucedido é conciliarentre o possível, oquase possível e oimpossível, ou o

provável, o possível e omuito difícil

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equipamento alugado, cedido ou em-prestado, ou até mesmo como tem sido,mas, pensar em resolver a questão.Os problemas são grandes, os desafiossão maiores ainda e a única coisa que épequena é o orçamento. Porém, quan-do pensamos em longos prazos, peque-nos orçamentos podem se tornar umgrande orçamento, um orçamento su-ficiente para resolver definitivamenteo problema do som da igreja. É claroque hoje, as igrejas também precisampensar em iluminação e vídeo, mas,tudo isso pode ser encaixado dentro deum planejamento maior.

Só para exemplificarmos melhor aquestão, vamos falar de um orçamen-to para uma pequena igreja de 150membros, por exemplo, com, aproxi-madamente, 250m2 de área (ressaltoque esse valor sugerido não é necessa-riamente o ideal, pode ser menor oumaior, depende da realidade de cadaigreja, trata-se de um exemplo mera-mente didático). Se essa igreja separarR$ 500,00 mensais para esse planeja-mento ela terá R$ 6.000,00 no ano eR$ 30.000,00 em cinco anos. E issopode ser algo bom para uma igrejadesse porte. Se ela dividir o plano deexecução desse planejamento em eta-pas, é só conciliar essas etapas com oorçamento. E, ao mesmo tempo, cin-co anos foi o tempo que se passou emmuitos casos, e o problema persiste.A questão fundamental é a consciên-

cia da importância de que somentepor meio de um bom planejamentograndes desafios poderão ser venci-dos com pequenos orçamentos.Na primeira fase dessa coluna, vamosfalar sobre a acústica das igrejas, asonorização e todos os detalhes rela-cionados ao áudio da igreja, seja a par-te de monitoração, seja a parte deinfra-estrutura, cabeamento e ener-gia elétrica. Vamos fazer uma aborda-gem geral de todos esses tópicos.Agora, para isso vamos tomar umaigreja como modelo, dimensões, tama-nho de palco, músicos e seus instru-

mentos, quantidade de assentos, enfim,todos os detalhes de uma igreja real, sóque nesse caso, uma igreja fictícia.Nesse nosso modelo, vamos trabalharnos baseando na realidade da maioriadas igrejas em relação à acústica e àsonorização existentes. Vamos traba-lhar soluções acústicas que sejam sim-ples e baratas para execução, e tratarde vários detalhes sobre a sonorizaçãoque podem melhorar e muito o rendi-mento dos equipamentos em geral.Agora, quero contar com você, leitor,para decidir sobre o tamanho e os de-talhes dessa igreja. Mande os seus e-mails com sugestões. No próximomês já vamos falar sobre os conceitose as soluções acústicas.

Os problemas são grandes, os desafios são maiores aindae a única coisa que é pequena é o orçamento. Porém,

quando pensamos em longos prazos, pequenosorçamentos podem se tornar um grande orçamento,

suficiente para resolver definitivamente o problema dosom da igreja