através da barreira do tempo: um estudo sobre a precognição da física moderna

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DANAH ZOHAR ATRAVÉS DA BARREIRA DO TEMPO

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Dana Zohar

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Page 1: Através da barreira do Tempo: Um estudo sobre a precognição da física moderna

DANAH ZOHAR

ATRAVÉS DA BARREIRA DO TEMPO

UM ESTUDO SOBRE A PRECOGNIÇÃO E A FÍSICA MODERNA

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Série publicada com base nas pesquisas realizadas pela Society for Psychical Research", sob a orientação de BRIAN INGLIS

TraduçãoBEATRlZ SIDOU

EDITORA PENSAMENTOSão Paulo

1982

PARA IAN

"Se a previsão é realmente um fato, ela será um fato que acabará por completo com as bases de todas as nossas hipóteses anteriores sobre

o universo.”J.W.DUNNE

"Para nós, os físicos de fé, esta separação entre passado, presente e futuro tem o valor de simples ilusão, apesar de bastante persistente...”

ALBERT EINSTEIN

SUMÁRIO

Lista das ilustrações Prólogo Introdução

Primeira Parte: A PRECOGNIÇÃO EXISTE?

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1. A precognição no mito, na lenda e na história pré-moderna 2. Sonhos precognitivos 3. Experiências precognitivas em estado de Vigília 4. Estudos experimentais de precognição

Segunda Parte: QUEM TEM A PRECOGNIÇÃO?5. A precognição nos animais6. A psicologia da precognição 7. A teoria da sincronicidade de Jung

Terceira Parte: O QUE É A PRECOGNIÇÃO?8. O tempo na teoria da relatividade 9. A física quântica: incerteza sem o sentido do tempo 10. A consciência e os fenômenos quânticos 11. Teorias físicas da precognição 12. A precognição e a questão do livre-arbítrio

Conclusão 

PRÓLOGO

Por volta do ano de 1873, recordaria mais tarde Frederic Myers, em seu Human Personality, um pequeno grupo de amigos, em Cambridge, que chegara à conclusão de que nem a religião nem o materialismo haviam proporcionado respostas satisfatórias às questões que os intrigavam:

Nossas atitudes mentais, de certa maneira, eram diferenciadas; pelo menos no meu modo de ver, ficou a impressão de que jamais se fez alguma tentativa no sentido de determinar que há algo a aprender em relação ao mundo invisível. Se houvesse algo a ser conhecido sobre esse mundo, de tal maneira que a Ciência pudesse adotar e sustentar

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esse conhecimento, seria algo prestes a ser descoberto não por uma análise tradicional ou pela manipulação da metafísica, mas simplesmente pela experimentação e observação, pela simples aplicação dos mesmos métodos de investigação exata, deliberada e desapaixonada, que ajudaram a construir todo o nosso conhecimento atual do mundo que podemos ver e tocar, e dos fenômenos que ocorrem dentro e em torno de nós.

Junto com seus companheiros - os principais dentre eles eram Henry Sidgwick e Edmund Gurney -, Myers tornou-se um dos membros-fundadores da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, formada em 1882 para colocar em prática essas idéias. O presente volume é o primeiro de uma série de livros a ser publicada visando assinalar o centenário da Sociedade.Os fenômenos do "mundo invisível" a que Myers se referia foram distribuídos de início em cinco categorias, por conveniência, e organizou-se urna comissão a fim de investigar cada uma dessas categorias: a telepatia, a hipnose, os "sensitivos", as aparições e "os vários fenômenos físicos normalmente chamados de espiritualistas". Através dos anos, houve um recuo, sobretudo em relação à hipnose, que foi descartada na época como uma ilusão ocultista, a ponto de ser aceita corno realidade; desta maneira, ela deixava de estar do lado psíquico da cerca. Mas, falando-se de maneira geral, os fenômenos sob investigação permanecem os mesmos, e as maneiras como têm sido investigados ainda estão conforme os planos de Myers.Mas a terminologia mudou, e com bastante freqüência, o que deu lugar a uma certa confusão. O próprio Myers introduziu a "telepatia", pois "leitura do pensamento" seria uma expressão ambígua. Poderia referir-se às maneiras como Sherlock Holmes apreendia o que estivesse na mente de Watson pela observação de sua expressão facial. "Supra-normal", que Myers havia considerado preferível a supernatural para descrever a classe dos fenômenos com os quais a Sociedade iria lidar, foi desde então substituída por "paranormal"; "parapsicologia" tem sido usada no lugar de "pesquisa psíquica",

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embora alguns pesquisadores prefiram restringir seu uso ao trabalho de laboratório, deixando "psíquica" como adjetivo de pesquisa sobre fenômenos espontâneos. "Psi" também tornou-se uma expressão que serve a qualquer fInalidade a fim de descrever ou identificar as forças envolvidas; por exemplo, para distinguir um acontecimento normal de um paranormal.Se faltasse alguma evidência para a "paraciência" (como pode , ser descrita hoje, de modo mais abrangente, pois o enfoque da pesquisa recentemente tem mudado da psicologia para a física), ela poderia ser encontrada na composição da Sociedade, desde seu início. Poucas organizações atraíram tantos membros ilustres. Entre os físicos, estiveram Sir William Crookes, Sir John Joseph Thomson, Sir Oliver Lodge, Sir William Barrett e dois Lords Rayleigh - o terceiro e o quarto barão. Entre os filósofos: o próprio Sidgwick, Henri Bergson, Ferdinand Schiller, L. P. Jacks, Hans Driesch e C. D. Broad. Entre os psicólogos: William James, William McDougall, Sigmund Freud, Walter Franklin Prince, Carl Jung e Gardner Murphy. Junto com estes, muitas personalidades eminentes em diversos campos: Charles Richet, um Prêmio Nobel de Fisiologia; o conde de Balfour, primeiro-ministro da Grã-Bretanha de 1902 a 1906, e seu irmão, Gerald, primeiro-secretário da Irlanda nos anos de 1895-1896; Andrew Lang, polímata; Gilbert Murray, catedrático de Grego em Oxford e autor do primeiro Projeto da Liga das Nações; seu sucessor em Oxford, E. R. Dodds; a sra. Henry Sidgwick, reitora do Newnham College em Cambridge; Marie Curie; a honorável sra. Alfred Lyttleton, delegada à Assembléia da liga das Nações; Camille Flammarion, o astrônomo; F. J. M. Stratton, Presidente da Royal Astronomical Association (Sociedade Astronômica Real); e Sir Alister Hardy, professor de zoologia em Oxford.Uma lista como esta, indicava Arthur Koestler em The Roots of Coincidence, bastaria para demonstrar que a pesquisa PES "não é diversão para excêntricos supersticiosos". Ao contrário, os padrões de pesquisa em geral têm sido rigorosos - bem mais rigorosos, como os psicólogos já tiveram a oportunidade de admitir, do que os da

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psicologia. A razão pela qual os resultados não vêm sendo aceitos é porque fundamentalmente eles não são aceitáveis: a percepção extra-sensorial e a psicocinese permanecem fora do campo da ciência, apesar das evidências. E, embora o preconceito contra a parapsicologia esteja começando a romper-se e ela comece a ser admitida como disciplina acadêmica nas universidades, ainda está muito distante de garantir para si uma base sólida no mundo acadêmico.Os céticos propagaram diligentemente a noção de que os pesquisadores psíquicos acreditam em PES, PK, aparições e por aí afora, porque eles querem acreditar ou porque necessitam acreditar. Qualquer um que tenha estudado as Revistas e as Atas da Sociedade, ou que tenha estado presente, em seus encontros, poderá testemunhar que se trata de um equívoco absurdo. Muitos dos mais assíduos e capazes dentre os pesquisadores foram atraídos, a princípio; exatamente por sua descrença - digamos, por um desejo de expor um médium à fraude. E também deve-se lembrar que muitos, e possivelmente a maioria dos membros tiveram e ainda mantêm o desejo de sustentar que as manifestações ditas paranormais são naturais e podem ser explicadas cientificamente - embora se admita que não pelos estreitos cânones da ciência materialista, que, de qualquer modo, já se demonstraram falaciosos para os físicos nucleares.Não; até onde se pode dizer que uma Sociedade com tão diversificado conjunto de pessoas tem uma identidade coletiva, digamos cética; mas, com toda certeza, racional, como esta série de livros pretende demonstrar. Racional não, embora, racionalista. Infelizmente os racionalistas, na determinação de purgar a sociedade de suas inclusões religiosas e ocultistas, deixaram muitas vezes de fazer uma distinção entre superstições e fenômenos observados que a elas deram origem - o que os levou a armadilhas como a recusa em aceitar a existência de meteoritos, por causa da associação aos raios de Júpiter. Até hoje eles têm uma inclinação a deslizar em apoio a dogmas rígidos, mal-fundamentados em suas bases, como quaisquer

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dos das Igrejas. Se esta série de livros não conseguir nada mais, pelo menos mostrará o quão racionalmente - usando esta expressão em seu sentido mais adequado - os autores examinaram e apresentaram as evidências.Até um tempo relativamente recente a existência da precognição, ou previsão, como costumava ser chamada, era considerada verdade, mesmo sem razões objetivas para isso. O Velho Testamento contém dezenas de profecias e sonhos (como o do Faraó, interpretado por José) que prediziam o futuro. Os gregos do período clássico tinham seus oráculos; os romanos, seus adivinhos. Até o século XVIII era raro o ceticismo sobre a possibilidade de visões do futuro. Mas com a ascensão do racionalismo científico, colocou-se a previsão pelo lado do supranatural das coisas, junto com outras manifestações do miraculoso. Quando apareciam casos, eles eram considerados como presciência, coincidência ou imaginação. Embora na primeira metade da existência da SPP tenham sido recolhidas muitas provas que indicavam a realidade da precognição, esta não foi levada a sério até a publicação, ao final da década de 20, do livro An Experiment with Time, de J. W. Dunne. O relato de seus sonhos precognitivos, apesar de não ter a necessária independência de testemunho capaz de impressionar os membros da Sociedade, mostrou-se um sucesso junto ao público. Desde então, a precognição passou a gozar de certo respeito mesmo por parte de pessoas geralmente céticas quanto à realidade dos fenômenos psíquicos.Esses que fazem objeções, no entanto, continuaram a argumentar que a percepção extra-sensorial desta ou daquela espécie contraria tudo o que se conhece sobre as leis da natureza. Os físicos de hoje já não são tão dogmáticos a respeito dessas leis; na verdade, eles preferem usar uma expressão menos desgastada como "modelos", o que implica que sejam no máximo uma aproximação da realidade.Danah Zohar, uma física, examinou os testemunhos históricos e contemporâneos da precognição, pretendendo verificar se poderiam ser reconciliados com os atuais modelos da física - muito à maneira como Pauli e Jung haviam explorado a possibilidade de uma

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reconciliação semelhante em relação à Teoria da Sincronicidade de Jung. Como ela sublinha, ainda não chegou o tempo em que se tenham respostas claras às inúmeras questões que permanecem sobre a PES. Mas tenho certeza de que muitos dos leitores que compartilham da minha dificuldade em compreender quase tudo sobre a física mais elementar ficarão gratos pela notável clareza de sua exposição, que torna as coisas técnicas mais legíveis.Brian Inglis

INTRODUÇÃO

Todos temos uma compulsão em falar sobre o Tempo. A mesma necessidade profunda que induzia o homem primitivo a consultar feiticeiros que diziam ler o futuro na configuração do fluxo de sangue da ferida de um leitãozinho sangrado, ou a que fazia os antigos gregos irem em dura peregrinação ao Parnaso buscar aconselhamento do Oráculo em Delfos, hoje ainda leva as pessoas à leitura das previsões da meteorologia e das cartas de maré ou das pesquisas de opinião pública em vésperas de eleições.Com a sabedoria da compreensão trazida pelo tempo, observamos que os antigos podem ter sido supersticiosos, porém seus métodos arcaicos nem sempre estavam inteiramente longe da verdade. Muito da visão outrora atribuída aos mágicos poderes de "profetas" e "videntes" deveu-se muitas vezes a primitivas, mas não menores, capacidades de analisar acontecimentos passados e de projetar seus padrões no futuro. Atualmente, é provável que chamemos nossos profetas e videntes de cientistas e psicólogos; seus métodos de previsões são muito sofisticados, mas eles preenchem a mesma função necessária em nossas vidas. De certa maneira, todos eles nos ajudam a olhar para o futuro.Só o mais obstinado empirista seria capaz de negar o valor e a validade de predições baseadas em óbvias inferências de acontecimentos passados ou de dados reunidos cuidadosamente;

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mas seria necessário também um pragmático muito resistente que não estivesse querendo procurar mais nada. A maioria das pessoas, em algum momento de suas vidas, gostaria de simplesmente poder atravessar a barreira do tempo e dar uma espiada mais ampla naquilo que o futuro lhes reserva. Por toda a história se atribuiu a algumas pessoas esse poder, e o assunto do presente , volume é a série de relatos de tais experiências.Presciência, previsão, ou "precognição", a capacidade de ver o futuro como se diz comumente hoje, é um assunto difícil, tanto para o pesquisador psíquico com prática quanto para o leigo. Conforme escreveu Gardner Murphy em The Challenge of Psychical Research, "entrar em contato com aquilo que ainda não existe é, para muitos, uma contradição de palavras, um paradoxo filosófico, uma afronta ou, então, pode chegar a ser colocado na categoria de 'impossibilidade'''. Assim, essa mesma capacidade misteriosa que nos atormenta com sua promessa de concessão de uma boa posição de partida na corrida do destino, ao mesmo tempo nos ofende com suas reivindicações afrontosas e "impossíveis" - e bem mais do que qualquer outra capacidade psíquica.Enquanto a telepatia e a psicocinese continuam problemáticas pela ausência de qualquer prova firme e de peso quanto à sua existência, o aparecimento de tal evidência não iria trazer nenhum desafio mais devastador à nossa maneira já aceita de encarar o mundo. A transferência de pensamento de uma mente para outra ou a influência física da mente sobre a matéria exige no máximo a descoberta de alguma força física ou de alguma capacidade do cérebro humano ainda não detectada. Poderia coexistir pacificamente junto às forças e capacidades que já conhecemos. Mas não acontece o mesmo em relação à precognição. A prova firme de que algumas pessoas realmente tenham feito previsões de acontecimentos futuros iria, desafiar os princípios mais fundamentais do bom senso e da física clássica.Todo o ritmo de nossas vidas diárias conscientes é vivido contra o pano de fundo da "passagem do tempo", uma sucessão de momentos

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subdividida em passado, presente e futuro. Nessa estrutura familiar, o "agora" deve sempre preceder o "então". Aliada a isso está a lei da causalidade, uma das leis fundamentais da natureza, que diz que uma causa sempre deve preceder um efeito. E um efeito "agora" não poderia ser necessariamente o resultado de uma causa "então" - e é justamente nisso que temos de acreditar se aceitarmos que algumas pessoas podem ver agora acontecimentos futuros, embora as causas que levem a eles ainda não tenham ocorrido -, o cadáver de uma pessoa antes que ela tenha sido assassinada, a manchete de um jornal antes que este tenha ido ao prelo, uma cidade arrasada antes que o terremoto que a destruiu tenha começado a dar sinais, como os tremores de advertência. Nada disso é possível de acordo com a ciência, como a entendemos."A previsão do futuro, do tipo minucioso como o indicado em algumas das narrativas que chegaram até nós", escreveu Frank Podmore, um dos membros fundadores da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, em 1908, "provocaria o abalo de todo o edifício da ciência. Se as coisas relatadas em algumas dessas narrativas realmente aconteceram, devemos nos preparar para construir um novo céu e uma nova Terra." Mas, embora uma reconstrução universal dessas talvez fosse uma tarefa ambiciosa demais para um pesquisador psíquico vitoriano, ela logo foi assumida pela nova espécie de cientistas do século XX, cujo trabalho alterou de maneira impressionante todo o quadro conceitual, para os termos em que se pode encarar a precognição nos dias de hoje. A Teoria da Relatividade de Einstein e a nova física quântica forjaram mudanças radicais em nossas noções da ciência e do bom senso da realidade, e, cada uma à sua maneira, manteve à frente nossa noção convencional de Tempo.No mundo da relatividade, não há uma seqüência absoluta de momentos, e assim, não há maneira objetiva de ordenar os acontecimentos no tempo. Realmente, se algumas das interpretações da Relatividade Geral estão corretas, o tempo poderá ser circular e os passeios no passado ou no futuro poderão ser teoricamente possíveis. Com os avanços da física quântica, que nos leva ao sombrio

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micromundo das partículas elementares que compõem o átomo, a noção de qualquer ordenação temporal dos acontecimentos se torna ainda menos sustentável. O próprio Tempo torna-se um conceito ilusório com um significado impreciso, como a causalidade.De uma forma bastante curiosa, enquanto aqueles que pesquisam sobre a precognição ainda se mostram embaraçados por seu visível desafio às leis da causalidade, os físicos quânticos já aprenderam a conviver com a não-causalidade como uma conseqüência natural de suas teorias físicas. As velhas categorias de causa e efeito deram lugar amplamente, no nível quântico, a discussões sobre relacionamentos não-causais que podem transcender a distância e o tempo. Mesmo a outrora espectral noção de "ação à distância", pela qual corpos físicos podem influenciar uns aos outros apesar de não haver um evidente intercâmbio de força ou energia entre si, foi recentemente demonstrada em laboratório. As disseminadas implicações dessa ruptura para a compreensão de questões como a telepatia, a psicocinese e a precognição ainda estão para ser melhor estudadas.O século passado testemunhou um consistente esforço para se trazer os benefícios da ciência em apoio a questões que preocupam os pesquisadores psíquicos. A própria Sociedade para a Pesquisa Psíquica foi fundada em 1882 por um grupo de ilustres eruditos que via a disciplina da ciência como uma ferramenta através da qual seria possível, de uma vez por todas, sujeitar as águas do oculto, tão cheias de segredos, à investigação rigorosa e objetiva. A nova "ciência" da parapsicologia, que tenta proceder a um estudo dos fenômenos psíquicos em condições de laboratório, é um resultado de seus esforços; outro, são as inúmeras tentativas de se compreender a física dos fenômenos psíquicos. Se, a longo prazo, tais abordagens técnicas irão nos dizer mais sobre os fenômenos psíquicos do que a paciente coleta metódica de evidências de casos espontâneos que a Sociedade para a Pesquisa Psíquica também continua a reunir, é algo que ainda está por se verificar. Exemplos desses casos encontram-se nas páginas a seguir, para ajudar o leitor a julgar por si mesmo.

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Aqueles que se sintam especialmente próximos dos aspectos levantados no antigo debate que envolve o problema mente-corpo poderão perturbar-se com a grande ênfase colocada na física da precognição, no presente volume. Como observou J. B. Rhine em muitas ocasiões, o fato de se acreditar que a precognição ou qualquer outra forma de "percepção extra-sensorial" seja realmente extra-sensorial (ou seja, não-física) desempenha um papel-chave no fundo emocional de grande parte da pesquisa psíquica, parecendo prometer alguma evidência para a sobrevivência de alguns aspectos da personalidade após a morte. Certas idéias da física moderna algum dia poderão nos ajudar a compreender o mecanismo pelo qual o cérebro humano é capaz de perceber um acontecimento que ainda não ocorreu; no entanto, parece haver uma insuficiência de provas nesta compreensão para que se argumente que desta maneira o materialismo terá a última palavra no dualismo. Nós entendemos exatamente como o olho pode ver a maçã em cima da mesa, mas isso não quer dizer que devamos entrar cegos no mundo seguinte; isso apenas nos diz como utilizar um órgão de nosso corpo vivo enquanto estamos neste mundo. Com tudo o que sabemos, a física do pós-vida pode muito bem operar a partir de princípios inteiramente diferentes.Outro aspecto que preocupa muitos parapsicólogos profissionais e aqueles que estudam cuidadosamente as questões levantadas na pesquisa psíquica é a amplitude em que a precognição pode se distinguir como faculdade isolada, se é que ela possa ser de algum modo diferenciada de faculdades como a telepatia (a comunicação direta entre duas mentes), a clarividência (conhecimento direto de alguma fonte física exterior) ou mesmo a psicocinese (a mente afetando a matéria). Muitos sustentam que são diferentes aspectos de um mesmo fenômeno desconhecido. Mesmo assim, apesar dos sólidos argumentos de pesquisadores experimentais como Louisa E. Rhine para nivelar a precognição e a clarividência, nos últimos capítulos demonstrar-se-á que uma equação destas gera dificuldades para se explicar de que forma a precognição poderia funcionar

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realmente. Essas dificuldades, no entanto, não colocam obstáculos aos que possam querer nivelar a precognição com a telepatia ou a psicocinese.É bem possível acontecer que a visão aparentemente precognitiva de algum acontecimento futuro seja realmente apenas uma forma de comunicação telepática com alguém que já tenha o conhecimento desse acontecimento. Ou então, pode ser que aquilo que realmente ocorre na precognição é que a mente "vê" algo (sonha, imagina, deseja isso) e então, a seguir, age sobre os acontecimentos no mundo com a psicocinese para realizar o fruto de suas próprias expectativas. Cada uma das duas principais teorias físicas da precognição discutidas no Capítulo 11 interpreta a faculdade dessa maneira - uma, em termos de telepatia, a outra, em termos de psicocinese.Não há uma resposta segura para qualquer dessas sugestões alternativas, e parece que não haverá até o dia em que se tenha muito mais provas disponíveis sobre a precognição e até que a física real desta faculdade tenha sido inteiramente compreendida. Neste livro assumiu-se que pelo menos a telepatia (e talvez a psicocinese) está muito proximamente relacionada à precognição, e mencionam-se casos de telepatia em que matérias relacionadas a eles possam ajudar a lançar alguma luz sobre a natureza e o funcionamento da própria precognição.Dessa maneira, os estudos psicológicos destinados a determinar se crianças são mais telepáticas que adultos parecem indicar muito bem que o mesmo pode acontecer com a precognição, e assim incluiu-se a evidência trazida por tais estudos. E há, também, apesar de haver muito pouca informação disponível sobre a capacidade precognitiva de animais, numerosos testemunhos de que eles possuem essa capacidade, e esses testemunhos foram incluídos por acreditar-se que sejam relevantes para a compreensão da precognição.Enfim, é importante dizer algo sobre a qualificação dos testemunhos citados para casos de visível ou alegada precognição discutidos no presente volume. Variam do extremamente sutil, na maior parte do Capítulo 1; onde quaisquer fatos que possam ter

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realmente existido são de há muito interpretados à luz de temas míticos ou literários, ao rigorosamente profundo, como nos casos de estudos de laboratório sobre a precognição, descritos no Capítulo 4. A maior parte dos casos discutidos depende da corroboração de testemunhas confiáveis cujos relatórios foram diligentemente registrados por funcionários da Sociedade para a Pesquisa Psíquica ou, algumas vezes, por psiquiatras. Como ainda é verdade que, apesar dos demorados esforços na pesquisa de muitos gêneros diferentes, ainda não existam sólidas e firmes provas sobre a precognição que possam convencer um júri independente de cientistas desinteressados, achei melhor incluir uma ampla variedade de casos que tenham contribuído para discussões sobre a precognição no decorrer desses anos todos. Com exceção dos mitos e lendas do primeiro capítulo, a cada um dos casos citados pelo livro segue-se alguma argumentação sobre os testemunhos em que se baseia.Gostaria de agradecer a meu marido por sua ajuda paciente e incalculável durante a elaboração deste livro, e sobretudo por suas numerosas idéias a respeito da possível física da precognição. Inúmeras conversas com o professor David Bohm ajudaram a aperfeiçoar minha compreensão como, por exemplo, quanto às implicações da não-localidade quântica e do Teorema de Bell. Além disso, ele foi muito gentil em ler o manuscrito original, vetando algumas partes onde entrava a física direta.Finalmente estou grata à Sociedade para a Pesquisa Psíquica por ter me permitido fazer uso de sua biblioteca e de seus arquivos.

PRIMEIRA PARTEA PRECOGNIÇÃO EXISTE?

1. A PRECOGNIÇÃO NO MITO, NA LENDA E NA HISTÓRIA PRÉ-MODERNA

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Se você consegue ver nas sementes do tempoE dizer qual irá brotar e qual não irá,

Conte para mim...Banquo, Macbeth

Este desejo de Banquo de ter alguma visão que pudesse proporcionar-lhe informações sobre seu futuro incerto é pelo menos tão antigo quanto a história que se conhece, e até muito pouco tempo atrás havia uma crença generalizada de que tais desejos pudessem ser satisfeitos. Os mitos e as lendas de todas as culturas humanas estão cheios de histórias de xamãs, feiticeiros, oráculos, profetas e homens santos a quem se atribuía o dom de ver o futuro. Geralmente esses visionários constituíam determinada parte da ordem social estabelecida, e suas experiências míticas ou de êxtase foram um fator importante para o desenvolvimento e a manutenção das tradições míticas no mundo. Seus serviços contavam com a confiança de líderes da sociedade, da mesma maneira que os políticos de hoje buscam a inspiração divina em orações ou em consultas a adivinhos remunerados. As feiticeiras a quem Banquo fazia o seu apelo eram um exemplo óbvio dessa afIrmação.Embora as "estranhas irmãs" da peça shakespeariana tenham sido até certo ponto coloridas por sua imaginação, havia duas famosas feiticeiras escocesas que viviam junto ao barão de Glamis, na fronteira entre os condados de Elgin e Forres, e dizia-se que o verdadeiro Macbeth costumava ir consultá-Ias sobre as muitas intrigas que caracterizaram seu problemático reinado. Foi a conselho delas que construiu o castelo de Dunsinane, dentro do qual elas previram que ele e sua família estariam a salvo até que "a floresta de Birnham chegasse a Dunsinane" - uma profecia que ele interpretou fatidicamente com o significado de eternidade.Por sua reputação confiável na previsão do futuro, as feiticeiras desempenharam um papel muito importante no cotidiano do reinado de Macbeth, como fizeram muitas de suas iguais em outros tempos e outras culturas. Dois mil anos antes, Saul, o primeiro rei de Israel,

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também recorreu às previsões de uma feiticeira. Disfarçado como pastor, ele viajou até uma aldeia da Palestina ocidental para consultar a feiticeira de Endor, uma mulher conhecida por seus dotes mediúnicos.Naquela época, Israel estava sendo atacado pelos filisteus e Saul fora abandonado por Deus e seus profetas, por sua inimizade ao jovem guerreiro Davi e por não obedecer às ordens de Deus. Ao ser indagada por Saul sobre o que aconteceria naquela crise, a feiticeira de Endor invocou o espírito do profeta Samuel e através dele previu que no dia seguinte Israel iria cair sob os filisteus, que Saul seria morto e que Davi o sucederia no trono:

... pois o Senhor tomou o reino de tuas mãos e o entregou a teu vizinho Davi...

Além do mais, o Senhor também irá entregar Israel e a ti mesmo às mãos dos filisteus; amanhã tu e os teus filhos deverão estar comigo; o

Senhor também entregará o povo de Israel nas mãos dos filisteus.(I Samuel 28:7)

Na batalha que se seguiu, os três filhos de Saul foram mortos e "os homens de Israel degolados". O próprio Saul, atingido por uma seta enquanto combatia no monte Gilboa, atirou-se sobre sua espada, para não ser torturado pelos filisteus triunfantes. Logo Davi foi sagrado rei da Judéia e mais tarde, de Israel.Toda a história de Israel, conforme a narrativa do Velho Testamento, está tão ligada ao espírito das profecias que os casos narrados são numerosos demais para serem mencionados. Dezoito dos trinta e nove livros do Antigo Testamento são conhecidos pelo subtítulo "O livro do Profeta"; na verdade, há pouquíssimos momentos na história de Israel que não comecem com as palavras: "E o Senhor falou através de seus servos, os profetas, dizendo..." e não terminem com: "... e assim foi".Em I Reis, ficamos sabendo que a rainha Jezebel mantinha nada menos que 850 profetas à sua mesa, enquanto o rei Davi escolheu,

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como profetas oficiais da corte, Gad e Natan. No Êxodo, Moisés é servido por um profeta, seu irmão Aarão, através do qual Deus advertiu o Faraó sobre as Sete Pragas que Ele iria enviar ao Egito caso os filhos de Israel não fossem libertados de sua escravidão.É o Gênesis que proporciona talvez o exemplo mais claro dos tempos bíblicos dos reis, e certamente um dos mais citados hoje quando se fala da precognição: o de José e seus sonhos. José, que atribuía seu dom à providência divina, como outros profetas de Israel, interpretou com exatidão o simbolismo dos sonhos do Faraó (as sete vacas gordas, devoradas por sete vacas magras, as sete espigas de milho boas devoradas por sete espigas de milho ruins) predizendo que sete anos de fome se seguiriam a sete anos de abundância.Com sua previsão, José salvou da ruína o reino do Faraó e obteve, junto à família, uma posição de grande poder e influência como havia previsto em dois sonhos tidos na infância.

Ouvi, peço-vos, este sonho que tenho sonhado: eis que estávamos juntando feixes no campo e meu feixe elevou-se e manteve-se ereto, e

vossos feixes se puseram em torno e prestaram obediência ao meu.(Gênesis 37:6, 7)

Foi para evitar que isso acontecesse que os irmãos de José, enciumados, o venderam à escravidão do Egito, um gesto que mais tarde os levou ao destino ao qual haviam pretendido escapar.

O tema do Destino que deliberadamente se pretendeu evitar e se torna realidade reaparece constantemente na lenda e na literatura e, claro, encontra-se no âmago das discussões sobre a precognição e o livre-arbítrio, conforme ilustra ainda mais a lenda do rei Édipo.Uma vez que um oráculo havia previsto sua morte pelas mãos do filho que acabara de nascer, Laio, rei de Tebas, mandou que abandonassem o pequeno Édipo à beira de um abismo para que ele morresse. Mas a criança é salva. Levada para Corinto e criada em segurança por pais adotivos, ela acredita ser aquela sua família

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verdadeira. Em sua juventude, Édipo, perturbado por rumores de que aqueles não são seus pais verdadeiros, decide visitar o Oráculo de Delfos para obter mais informações sobre o assunto. O Oráculo parece desinteressado de seu problema, mas diz que Édipo matará seu próprio pai e se casará com sua mãe. Horrorizado com a perspectiva de tal profecia tornar-se realidade, Édipo foge de Corinto, indo para a distante Tebas. No caminho, ele mata seu pai verdadeiro, que toma por um estrangeiro mal-encarado; depois de chegar a Tebas, casa-se com sua mãe, Jocasta. Assim, as profecias do Oráculo para Laio e Édipo tornam-se realidade, como na sombria previsão do vidente cego, Tirésias, a quem o ainda desavisado rei Édipo convocou a Tebas na esperança de retirar a maldição que pesava sobre a cidade, descobrindo-se o nome do verdadeiro assassino de seu pai.

Uma terrível maldição em dobro,Vinda de seu pai e sua mãe, irá levá-Io

Para fora desta terra, com a escuridão em seus olhos...E este dia irá mostrar seu nascimento e irá destruí-Io.

Sófocles, Édipo Rei

O Oráculo de Delfos foi o mais famoso local da profecia na tradição grega. Situado na base do monte Parnaso, no lugar que Zeus havia indicado ser o centro da Terra, o Oráculo dominou a vida política e religiosa da Grécia desde os tempos dos povos minoanos até o advento da cristandade.Poucos gregos daquela época tomariam qualquer decisão importante sem antes fazer uma peregrinação a Delfos em busca da orientação do Oráculo. Os oráculos eram dados por uma jovem sacerdotisa (Pítia) em estado de transe, durante o qual Apolo, o Deus da Verdade, lhe concedia uma visão do futuro do peregrino. Algumas pessoas que estudam o Oráculo afirmam que a sacerdotisa entrava em estado de transe graças à inalação de alguns vapores que saíam de uma fenda na rocha sobre a qual ela se sentava; outros dizem tratar-se de auto-

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sugestão. A maneira pela qual ela entrava neste estado, não vem ao caso no momento, mas de acordo com os dados modernos sobre percepções precognitivas - a maioria das quais ocorre em sonhos ou semitranses - evidencia-se o fato de que as visões em Delfos ocorriam num estado alterado de consciência.A controvérsia envolve a validade das profecias feitas em Delfos, em parte, porque costumavam ser expressas em linguagem cifrada, de maneira a estarem abertas a quaisquer interpretações e, em parte, porque o Oráculo se havia tornado o ponto central da religião vigente naquela época. Há boas razões para se acreditar que muitas das "profecias" fossem, na verdade, pequenos conselhos oferecidos por sacerdotes que muitas vezes atuavam como intermediários na interpretação das mensagens da sacerdotisa. Entretanto, nem todos os oráculos de Delfos citados na história antiga e na literatura poderiam ser rejeitados com tanta simplicidade. Um exemplo registrado por Heródoto e que envolve Creso, o rei da Lídia, é mencionado em geral como um desses casos.Preocupado com a crescente militarização da Pérsia, Creso planejou consultar um oráculo, mas, sendo um tanto cético, resolveu "testar" diversos oráculos, a título de experiência. (Provavelmente, como observou Whately Carrington, trata-,se do primeiro exemplo concreto e documentado de pesquisa psíquica.) Creso enviou sete mensageiros a sete oráculos diferentes, instruindo cada um deles para que, no centésimo dia a contar de sua partida, fosse perguntado ao oráculo: "O que está fazendo agora o rei Creso, o filho de Alíates?" Os mensageiros deveriam então trazer a resposta por escrito.A resposta vinda de Delfos, e a única correta, dizia:

Posso contar os grãos de areia, posso medir os mares;Escuto o silêncio e posso dizer o que o mudo falou;

Oh! Surpreendo-me com o cheiro de uma tartaruga coberta com uma carapaça;

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E cozinhando agora num fogo com a carne de um carneiro em caldeirão

Há bronze na panela por baixo, e bronze na tampa em cima.

Na verdade, como "teste" Creso decidira fazer algo tão absurdo, no dia determinado, que seria impossível alguém conceber aquilo com a pura e simples imaginação ou através de um raciocínio normal. Ele havia cortado uma tartaruga e um carneiro, e deixou cozinharem juntas as carnes, num caldeirão de bronze, que estava coberto com uma tampa de bronze - um gesto que reproduziu as palavras do oráculo com tamanha precisão que dispensou qualquer interpretação.O Oráculo de Delfos era de longe o mais famoso e institucionalizado canal através do qual Apolo expressava seu espírito profético, mas os exemplos de videntes individuais abençoados (ou amaldiçoados) com o dom da previsão são tão numerosos na mitologia da Grécia antiga quanto no Antigo Testamento hebraico. Dois desses exemplos exerceram enorme fascínio na imaginação de escritores e poetas no decorrer dos séculos. Por isso, é necessário mencioná-Ios aqui: Cassandra, a infortunada filha de Príamo, o rei de Tróia, e a terrível Sibila de Euboean Cumae presente com tanto destaque no Livro VI da Eneida, de Virgílio.Cassandra aparece pela primeira vez na llíada, mas Homero nada fala a respeito de seus poderes proféticos, deixando esse tema para ser desenvolvido alguns séculos mais tarde por Píndaro e Ésquilo. Na Oresteia , vemos Cassandra receber de ApoIo a "dor da cruel profecia verdadeira", destinada a nunca ser ouvida e aceita porque ela desagradara ao deus recusando-se a dar-lhe filhos. Cassandra previu a queda de Tróia (incluindo a visão de soldados gregos escondidos dentro do cavalo de madeira), e, mais tarde, previu a morte de Agamenon e a sua própria pelas mãos da traiçoeira Clitemnestra, que por sua vez cairia sob a cólera vingativa de Orestes:

Devemos morrer os dois; mas não morreremos sem a vingança dos deuses.

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Pois virá alguém que nos vingará, alguém nascido para matar sua mãe e para vingar a morte pelo sangue de seu pai.

Ésquilo, Agamenon

Depois da queda de sua cidade, o herói troiano Enéias levantou velas com o remanescente de seu exército e aportou nas praias da Itália. Após tocar a costa em Euboean Cumae (uma colônia grega não muito distante da Nápoles de hoje), foi logo para as montanhas.

Às alturas onde o grande Apolo tinha seu trono,E à residência bem escondida da tenebrosa Sibila,

Uma enorme caverna; ali o profeta de DelosInspirou nelas o poder espiritual,

Com sua mão poderosa, revelando coisas que estavam por vir.Eneida VI

Enéias tem a esperança de saber através das enlouquecidas falas da Sibila se ApoIo anularia a maldição que previra a destruição de Tróia e se emprestaria seu dom divino aos seus planos para a conquista da Itália. Na descrição de Virgílio do que aconteceu a seguir, temos um dos retratos mais vívidos do estado de demência que os antigos muitas vezes acreditavam acompanhar as visões proféticas. Enquanto falava, a Sibila espumava pela boca:

Os cabelos levantavam em sua cabeça, sua cor mudava,Palpitavam-lhe os seios, ela caiu em transe.

Parecia crescer, falava numa voz não mortal...De uma caverna saíram centenas de vozes

Que derramavam em torrentes as respostas proféticas da Sibila.

Entre essas respostas, ela previu a conquista da Itália por Enéias, suas guerras naquele país, seu refúgio temporário à margem do Tibre (no lugar da futura Roma) com o arcádio exilado, o rei Evandro, e a nova calamidade que iria cair sobre os troianos por causa de "outra

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noiva estrangeira" (Lavínia). Ela também explicou a Enéias como penetrar no submundo utilizando um raminho da Árvore Dourada; pouco antes de cair em silêncio, ainda previu a morte de Miseno. grande amigo de Enéias:

Enquanto isso (oxalá não soubesses), sem vida,O corpo de teu amigo não enterrado contamina

Toda a tua frota com o cheiro da morte, enquantoVens à minha porta em busca de oráculos.

Voltando à praia, Enéias descobre que Miseno se afogara e jazia sobre areia, sendo lavado pelo mar.

Comparado à rica e sutil cultura grega, que contava com uma grande quantidade de poetas e escritores de peças teatrais, o mundo romano em geral é visto como sendo mais pragmático, mais racional. Mas os romanos também tinham seus profetas e videntes e levavam a sério quaisquer presságios voltados a prever o futuro, o que está claro tendo como base os inúmeros relatos de acontecimentos que envolveram o assassinato de Júlio César.Segundo Plutarco (Vidas Paralelas), "antes que isso acontecesse, dizem que estranhos sinais foram mostrados e que estranhas aparições foram vistas". Luzes e sons desconhecidos enchiam o ar; viu-se uma multidão de homens "todos em fogo" passando pelo local onde havia o mercado; viu-se também a mão de um soldado escravo levantando altas chamas, e quando estas se extinguiram a mão do escravo não estava queimada; além disso, quando o próprio César ia fazer o sacrifício de um animal, descobriu-se que o animal a ser sacrificado não tinha coração. ("Um presságio muito ruim, realmente", observou Plutarco, "pois, segundo a lei natural, nenhum animal pode existir sem um coração.")Suctonus (Os doze Césares) acrescenta entre os "inequívocos sinais de advertência a César quanto a seu assassinato", o seguinte: um grupo dos veteranos enviados pelo imperador para colonizar

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Cápua violou o antigo túmulo do fundador da cidade, Cápis, encontrando uma placa de bronze com uma advertência escrita em grego:

Perturbai os ossos de Cápis e um homemda raça de Tróia será morto por um de seu grupo,e mais tarde vingado, a um alto preço para a Itália.

E, segundo Ovídio (Metamorfoses), pouco antes de os conspiradores entrarem, foram ouvidos no céu trombetas e o clamor de armas, o sol esteve sombrio e gotas de sangue caíram com a chuva enquanto milhares de estátuas choravam.Mas as duas profecias mais conhecidas que predisseram o iminente destino de César foram as da vidente Spurina (ela alertou o imperador que estivesse em guarda contra um perigo que o esperava não muito depois dos idos de março) e a visão que apareceu a Calpúrnia na noite anterior ao assassinato.De acordo com Plutarco, enquanto César e sua mulher dormiam, as portas e janelas do quarto "abriram-se inteiramente, de repente". César acordou com o barulho, mas Calpúrnia continuou dormindo, falando e resmungando algo. "Na verdade, àquela hora, ela estava sonhando que segurava em seus braços o corpo assassinado e chorava sobre ele.”A narrativa de Suetônio difere um pouco. Segundo ele, na noite que antecedeu o assassinato, o próprio César sonhou estar flutuando acima das nuvens, apertando as mãos de Júpiter, enquanto Calpúrnia sonhava que o ornamento de um beiral de telhado que parecia o de um templo - um cujas honras (segundo Lívio) haviam sido votadas a César pelo Senado - havia caído e que então César jazia inerte em seus braços. Esta versão termina assim: "Ela despertou subitamente e a porta do quarto abriu-se por si mesma".Seja qual for o relato que preferirmos aceitar sobre os muito estranhos presságios e visões que antecederam a morte de César, não restam

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dúvidas de que, na mente dos romanos, este foi um acontecimento inteiramente ligado às forças dos presságios e das profecias.

Atribuía-se também a "segunda visão" aos antigos celtas. Com relação a eles, a previsão muitas vezes era descrita como mais uma peculiaridade racial, da mesma forma que o cabelo vermelho e a cara em forma de lua cheia. Dizia-se que os sacerdotes druidas transmitiam as profecias com tanta facilidade e tão naturalmente que não precisavam recorrer ao estado de êxtase ou a drogas, usados por alguns povos para estimular essa faculdade. Dizia-se também que os druidas, que passavam anos de aprendizado junto a mestres aperfeiçoando a arte da adivinhação, podiam ler o futuro no vôo de pássaros, na forma das nuvens ou das raízes das árvores, com a ajuda de um osso adivinhatório (usando uma omoplata direita de um animal, limpa) ou de varinhas de sorva. O vidente druida mais conhecido de todos foi o mítico mago Merlin.Muito se escreveu sobre Merlin pelo importante papel que desempenha na lenda do rei Artur, e as inúmeras profecias atribuídas a ele na história são criativamente contadas e recontadas por Geoffrey de Monmouth e Sir Thomas Malory (e, com mais humor, na trilogia escolar de T. H. White, The Once and Future King). Nunca houve nenhuma prova histórica sobre a existência de Merlin, mas seus legendários poderes de previsão são uma grande contribuição aos mitos que envolvem a precognição.Segundo Malory, Merlin foi responsável, antes de todos, pela concepção do rei Artur. Quando o rei Uther Pendragon, o pai de Artur, apaixonou-se por Lady Igrayne, esposa do duque de Tintagel, Merlin fez com ele um trato. Em troca de um encanto que permitiria a Uther ser tido como o duque de Tintagel, ganhando assim o acesso ao quarto da senhora, Merlin exigiu que o menino que eles iriam conceber naquela noite (Artur) "deveria ser entregue a mim para ser alimentado, então cuidarei dele..." (O rei Artur e seus Cavaleiros, I). Doravante, Merlin está sempre ao lado do futuro rei, como educador, conselheiro e profeta.

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Entre suas profecias arturianas, Merlin prevê que Mordred, o filho do encontro incestuoso de Artur com sua meia-irmã: Morgause, "será a destruição de todo este reino", e, mais tarde, adverte Artur de que será perigoso ele se casar com Guinevere, porque um dia Lancelot se apaixonará por ela e ela por ele.De acordo com a História de Geoffrey de Monmouth, Merlin, enquanto criança, previu através da alegoria de um combate entre dois dragões a conquista da Inglaterra pelos saxões e sua derrota pelas mãos do rei Artur. Se essa foi ou não uma profecia de Merlin, como afirma Geoffrey, ou, se deveria ser creditada, como mais parece, à imaginação do próprio Geoffrey, os acontecimentos que ela descreve têm um certo halo de exatidão histórica. No relato de Geoffrey sobre a profecia, Merlin entrou em transe e disse:

Ai do Dragão Vermelho, pois seu fim se aproxima. Seu antro cavernoso será ocupado pelo Dragão Branco que representa os saxões que atraístes. O Dragão Vermelho representa o povo da

Bretanha, que será esmagado pelo Branco: as montanhas e os vales da Britânia serão nivelados e correrá sangue em seus rios.

O culto da religião será destruído completamente e o fim das igrejas estará claro para todos.

A raça oprimida deverá prevalecer no final, pois ela irá resistir à selvageria dos invasores.

O Javali da Cornualha acabará com esses invasores, pois ele esmagará seus pescoços debaixo de seus pés.

História dos reis da Bretanha

As profecias de Merlin não se limitavam ao espaço de tempo da própria vida do rei Artur e seu reinado. Segundo Malory, pouco antes da despedida final de Merlin da corte de Artur, com a donzela que se mostraria ser sua ruína, ele "... disse ao rei muitas coisas que iriam acontecer". E muitas dessas previsões são detalhadas por Geoffrey de Monmouth num capítulo de sua História intitulado "As profecias de

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Merlin". Intérpretes modernos dessas profecias (por exemplo, 26, pp. 45-8) dizem que Merlin previu a primeira invasão dinamarquesa à Bretanha durante o reinado do rei Cadwallo e, a segunda, durante o reinado de Ethelred - previu também que Ethelred iria pagar em gelt aos dinamarqueses porque seria covarde demais para lutar. Os dinamarqueses realmente pediram - e receberam - 10.000 libras e, posteriormente, mais 40.000, de Ethelred.Atribui-se também a Merlin a previsão da coroação de James I, as Cruzadas e o rompimento de Henrique VIII com Roma; mas talvez a mais fantasticamente exata predição dentre as atribuídas a ele seja a relacionada a Ricardo I (Ricardo Coração de Leão). Feita setecentos anos antes do reinado de Ricardo, a profecia de Merlin dizia:

O Coração de Leão contra o sarraceno se levantará e, às custas de muitos, um prêmio glorioso obterá...

Mas, enquanto essas grandes façanhas se realizam fora, tudo em casa desordem será.

Preso e engaiolado o Leão estará, mas, depois de muito sofrimento, a libertação ... e, por fim, com uma lança envenenada, morrerá o Leão.

Ricardo I realmente lutou com os sarracenos e, durante uma de suas últimas campanhas, foi capturado e libertado. Morreu três dias depois, ferido por uma flecha envenenada, durante a conquista do Castelo de Limoges.

Até este ponto, as histórias sobre predição e premonição discutidas estiveram completamente envolvidas pelas muitas camadas isoladas do tempo, da lenda e do mito. Sem dúvida, cada uma delas é uma expressão irrefutável de alguma corrente na cultura de onde se origina, mas não temos meios de afirmar, de nossa perspectiva atual, se qualquer uma delas tem realmente algum fundamento. Nem os visionários nem os videntes ou as feiticeiras a que se atribuíram estas antigas previsões nem, em muitos casos, os acontecimentos que eles previram terão existido necessariamente - ou, se existiram ou

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aconteceram, é bem provável que não o foram nas circunstâncias coloridas que enriqueceram sua existência legendária.Nos dois casos a seguir, entretanto, há um pouco mais de evidência para avaliação. Tanto a santa francesa Joana D' Arc quanto o médico francês Nostradamus viveram em épocas recentes o bastante para que haja registro de alguns fatos incontestáveis sobre eles, e cada um deles fez previsões sobre acontecimentos que a história confirma realmente terem ocorrido.

Joana D'Arc

Diz-se que havia muitas profecias antecipando a carreira de Joana D'Arc antes de seu nascimento em 1412; atribui-se uma delas a Merlin. Entre suas predições sobre "coisas que viriam a acontecer", Merlin incluía uma "donzela maravilhosa que virá do Nemus Canutum para a salvação de nações". Nemus é a palavra latina para "bosque" e Canutum é latim medieval, significando "branco" ou, "encanecido" (muito antigo). Santa Joana nasceu numa casa situada à beira do Bois Chesnu, em Domrémy Bois, naturalmente significa "bosque", e Chesnu é uma palavra, arcaica francesa que significa "branco" ou "encanecido".Embora seja lembrada na história como um dos grandes libertadores da França, Joana D'Arc é legendariamente mencionada em sua qualidade de profeta e visionária. Por toda sua breve e brilhante carreira militar, escutou vozes e teve visões através das quais percebia o que devia fazer e o que o futuro reservava para ela e para seu país. As vozes e as visões começaram depois de seus treze anos de idade.Numa tarde em que corria por um campo para juntar-se a outras crianças que brincavam, Joana escutou uma voz que lhe falava de uma nuvem. Segundo uma carta escrita por Percival de Boulan-Villiers ao duque de Milão, a voz dissera a Joana que "...ela deveria realizar feitos maravilhosos. Ela fora escolhida para ajudar ao rei da

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França, deveria usar roupas de homem, pegar em armas... Ela deveria se tornar um comandante na guerra". A carreira militar de Joana realmente iniciou-se aos dezessete anos e também foi acompanhada por uma visão. Na época, ela insistia em levar adiante sua missão muito depressa, pois, tenho muito pouco tempo. Um ano ou pouco mais, dizia. Daquele momento até sua captura passaram-se exatamente treze meses.Uma das primeiras profecias registradas de Joana refere-se à de um estranho que ela encontrou pouco depois de se alistar. Joana contou o incidente a seu professor, Pasquerel. Próximo ao castelo de Chinon ela encontrou um homem a cavalo que a insultou e praguejou contra ela. Retrucou-lhe, dizendo: "Em nome de Deus, você pragueja tão perto de sua morte?" Uma hora depois desse encontro o homem caiu no fosso do castelo e afogou-se.Durante o cerco de Tourelles, Joana previu seu próprio ferimento por uma flecha. "Mantenham-se perto de mim", disse a seus camaradas, "porque amanhã terei muito o que fazer, mais do que jamais tive, e o sangue correrá de meu corpo, acima de meu coração." E novamente Pasquerel confirma que ela fez a predição um dia antes de ser atingida.No auge de seu triunfo militar em 1430, logo depois de haver liberado a passagem do Sena e aberto a campanha no Oise, as vozes de Joana advertiram-na de que seu tempo terminara. Logo depois ela foi capturada, e no espaço de tempo que demorou seu julgamento, muitos meses mais tarde, fez algumas profecias. Entre elas, uma predição de que os ingleses brevemente perderiam sua mais crucial batalha contra a França:

Sei que antes que sete anos se tenham passado os ingleses terão perdido um combate maior que o de Orléans (em 1429, quando as

tropas lideradas por Joana os derrotaram) e perderão o domínio sobre a França que hoje têm. Eles sofrerão uma perda como jamais tiveram

antes por causa de uma grande vitória que Deus concederá aos franceses.

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No ano de 1436, os ingleses perderam Paris, e, em 1439, perderam a Normandia, na batalha de Formigny.

Nostradamus

Três quartos de século depois da execução de Joana, nasceu em Saint Rémy, Provence, um outro francês que talvez seja o mais associado a profecias e previsões que qualquer outro na mente popular: Michael de Nostredame ou "Nostradamus". Seu alegado dom extraordinário de predizer coisas que ainda estão por acontecer permanece uma lenda viva (e um tanto assombrosa) em nosso século. Entre suas profecias perturbadoras estão algumas que parecem haver previsto a Revolução Francesa, a ascensão de Napoleão e, talvez, o domínio de Hitler.Astrólogo, médico e profundamente enraizado na tradição mística judaica (era um judeu convertido), o jovem Nostradamus conquistou desde cedo uma grande reputação, graças a seus brilhantes trabalhos médicos durante a eclosão da praga no sul da França. O êxito no tratamento da praga deveu-se amplamente à sua insistência sobre a importância do ar fresco e do desinfetante no combate à doença, embora nenhum dos dois (e nem mesmo a existência dos germes) tenha sido reconhecido de maneira generalizada até o século XIX.As mais famosas profecias de Nostradamus relacionam-se a fatos que ocorreram depois de sua morte, mas ainda em vida ele teve uma grande reputação por ser dotado da capacidade de antever acontecimentos: importantes personalidades públicas e monarcas reinantes recorriam a ele para que elaborasse seus horóscopos ou os de seus filhos. A maioria das predições de Nostradamus chegou até nós com a publicação de suas Centúrias, mas há uma história que se refere a algo ocorrido em sua juventude. Durante uma viagem à Itália, teve a oportunidade de encontrar um guardador de porcos que se

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havia tornado monge, chamado Felix Peretti. Nostradamus imediatamente caiu de joelhos e dirigiu-se a Peretti como "Sua Santidade". Anos depois da morte de Nostradamus, Peretti se tornou o Papa Sixto V.As Centúrias, publicadas pela primeira vez em 1555, são quadras agrupadas em centenas e perfazem um total de 966. Atribui-se a cada uma destas quadras a visão de algum acontecimento futuro. Estão escritas de maneira estranha, muitas vezes cheias de um obscuro simbolismo enigmático. Seu caráter extremamente vago deixa-as abertas a interpretações mais amplas - e esta é a principal acusação contra as predições de Nostradamus, vinda de pessoas que supõem que um intérprete bastante hábil seria capaz de ler qualquer coisa nelas. Por outro lado, Colin Wilson em The Occult chama a atenção para o fato de que, considerando-se as Centúrias como um todo, a grande quantidade de "acertos" diretos confirmados em suas predições à luz de acontecimentos históricos posteriores é impressionante.Nostradamus era um francês de boa educação, versado nos caprichos da política de seu país e bem-situado na sociedade de seu tempo, e não é de surpreender que entre as mais obviamente significativas e exatas de suas previsões estejam muitas visões de acontecimentos ocorridos posteriormente na história da França. Várias falam diretamente sobre a Revolução - embora esta só tenha acontecido dois séculos depois da morte de Nostradamus.Duas quadras costumam ser citadas freqüentemente como presságios da Revolução. Uma diz:

Os Iíderes da cidade em revolta,Em nome da liberdade,

Trucidarão seus habitantes sem distinguir idade ou sexoE haverá gritos, choros e tristes visões em Nantes.

Os estudiosos de Nostradamus são quase unânimes em opinar que essa quadra é, com toda probabilidade, uma previsão do sádico

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derramamento de sangue e dos afogamentos que o louco Carrier ordenou em Nantes em 1793, sob os auspícios do Comitê Revolucionário de Segurança Pública. Entre as Vítimas de Carrier estavam muitas mulheres e crianças de colo e, quando os pescoços dos bebês se mostraram muito pequenos para a guilhotina e o instrumento revelou-se por demais lento para o massacre, Carrier mandou que os infelizes condenados fossem colocados às centenas em barcos que então eram deliberadamente afundados.A segunda "quadra Revolucionária", aceita em geral como a previsão das mortes de Luís XVI e Maria Antonieta, é sinistra em seu detalhamento.

Pela noite virão através da floresta de ReinesDuas pessoas casadas, por indireta via; Herne, a pedra branca,

O monge negro em cinza entraram em Varennes,Eleito capeto, causa tempestade, fogo, sangue e cortes.

Em junho de 1791, Luís XVI e Maria Antonieta tentaram fugir de Paris disfarçando-se - ele, com uma roupa cinza, ela de branco - e escapando pelos apartamentos da rainha. Chegaram até Chalon, antes de serem reconhecidos pelo chefe dos correios da aldeia. Foram levados presos a Varennes, mantidos ali durante a noite e devolvidos a Paris para serem decapitados. Luís XVI costumava ser descrito como um homem de aparência "monacal", e foi o primeiro rei francês a ser eleito pela Assembléia Constituinte em vez de valer-se da lei do Direito Divino.Nostradamus escreveu três quadras que são atribuídas à profecia da ascensão de Hitler e todo o derramamento de sangue que seu governo determinou. A mais citada talvez seja esta:

Bestas famintas enlouquecidas farão as correntes tremer;a maior parte da Terra estará sob Hister.

Numa gaiola de ferro o grande será arrastado.quando o filho da Alemanha observa o nada.

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Embora sujeitas a controvérsias, suas "quadras de Hister" parecem próximas da verdade o suficiente para qualquer um que aceite a validade dos poderes proféticos de Nostradamus.Muitas das profecias de Nostradamus parecem referir-se a acontecimentos que ainda estão por se realizar, em um tom perturbador. Uma, à qual se costuma atribuir a previsão do fim do mundo, é assim:

Como o grande rei de Angoulêrne,no ano de 1999, no sétimo mês,

o Grande Rei do Terror irá descer do céu,e, nessa época, Marte reinará pela boa causa.

Enquanto inúmeros estudiosos acreditam que o Grande Rei de Angoulême deve referir-se a Gengis Khan, pois Nostradamus aponta freqüentemente os mongóis como os "de Angoulême", as opiniões se dividem entre os que consideram que a quadra em seu todo seja a previsão de uma grande guerra com bombas de hidrogênio, a tomada do mundo pelos orientais ou uma invasão de Marte. Talvez ainda presenciemos isso.Mas, forçada pela maioria dos estudiosos de Nostradamus, que procuram demonstrar que suas profecias estão relacionadas aos acontecimentos da Revolução Francesa ou à Segunda Guerra Mundial (ou ainda até a um futuro distante), há uma nova e importante tradução (para o inglês) crítica das Centúrias, questionando toda esta abordagem ao trabalho de Nostradamus.Em seu The Prophecies and Enigmas of Nostradamus, o historiador francês Liberté Le Vert sugere que, na verdade, muitos dos acontecimentos a que se referem as quadras das Centúrias sejam alusões a fatos que sucederam durante o período de vida do próprio Nostradamus - a retirada do imperador Carlos V (em vez do exílio de Napoleão em Elba), as rebeliões políticas na Bretanha do século XVI (em vez dos graves acontecimentos que envolveram a posterior

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execução de Carlos I na Bretanha) ou acontecimentos ligados ao rio Danúbio (o "Hister" a que se atribuem as "quadras de Hitler"). Le Vert argumenta que sempre que Nostradamus tentou profetizar acontecimentos mais distantes "ele geralmente esteve equivocado".De acordo com a notável estudiosa, senhora Frances Yates, o novo trabalho de Le Vert prestou um grande favor à história e a Nostradamus, ao "proporcionar pela primeira vez um texto e uma tradução confiáveis das poesias de Nostradamus, varrendo as desprezíveis interpretações que séculos de exploração de baixo nível haviam deixado encobertas". Ela acredita que só Le Vert conseguiu desvendar o verdadeiro Nostradamus.

O I Ching

O último dos exemplos sobre o qual faremos considerações no sentido de exemplificar como a precognição é vista no mito e na lenda vem do Oriente e realmente deve ser encarado como um caso à parte. O Livro das mutações chinês ou I Ching é uma das mais notáveis criações (ou descobertas?) do espírito humano. Em geral, as pessoas referem-se a ele como a um oráculo, e certamente ele funciona como tal, mas essa maneira de encará-Io como simples bola de cristal entre duas capas é uma extrema simplificação do que o I Ching representa. É pelo misterioso acesso ao futuro que ele proporciona que este livro deve ser mencionado aqui.O I Ching foi compilado há mais de quatro mil anos e desde então tem sido utilizado por filósofos, políticos, homens de negócios e simples camponeses que desejam uma compreensão e uma orientação sobre ações futuras. O livro contém toda a sabedoria do Taoísmo e do Confucionismo reunida, bem como a de sábios anteriores, e não se limita a satisfazer aos que o procuram com respostas simples a perguntas sobre o presente ou o futuro. Mais do que isso, ele situa as questões que lhe são colocadas num contexto mais amplo do que o próprio indagador poderia imaginar que fosse

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importante; apresenta nuanças de uma situação que não estejam em sua mente consciente e oferece conselhos sobre a melhor maneira de enfrentar a situação que antevê.Devemos à meticulosa tradução de Richard Wilhelm e ao profundo interesse de Jung o fato de essa obra ser agora tão conhecida no Ocidente. A reação imediata de Jung, como a de todos os ocidentais ao conhecerem o livro, foi de assombro, ante a pertinência das respostas do I Ching às suas perguntas. Sua perspicácia e discernimento eram tão precisos que ele teve de confessar a si mesmo estar prestes a acreditar no mito chinês de que havia uma inteligência viva, com quem se podia conversar realmente, dentro de suas páginas."Segundo a antiga tradição", explica ele no prefácio à tradução de Wilhelm, "são 'agentes espirituais', atuando de forma misteriosa, que fazem (o I Ching) proporcionar uma resposta significativa. Esses poderes formam, por assim dizer, a alma viva do livro. E como este último, desta maneira, se torna um ser vivo, a tradição presume que se possam fazer perguntas ao I Ching, e receber respostas inteligentes". Mais tarde, Jung tentou explicar os misteriosos trabalhos do I Ching em termos de sua Teoria da Sincronicidade, sobre o que farei considerações no Capítulo 7. Mas seu sentimento de espanto maravilhado nunca se abateu.O I Ching consiste em sessenta e quatro hexagramas numerados, que, no todo; incorporam as leis e a natureza do universo e os ritmos da vida dentro dele. Cada hexagrama descreve algum elemento quase-arquetípico da vida e vem acompanhado por comentários que extraem o significado das linhas individuais. Chega-se às linhas que compõem o hexagrama jogando três moedas (ou deixando cair quarenta e nove varinhas) por seis vezes. A cada vez deve-se anotar a maneira como elas caem. Enquanto isso é preciso manter uma profunda concentração sobre a questão para a qual se busca uma resposta através do oráculo.A maioria dos ocidentais que fazem uma consulta ao I Ching em geral não consegue ultrapassar uma certa incredulidade (que algumas

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vezes chega a uma profunda indignação intelectual) quanto a seu funcionamento real. Jung teve muita sensibilidade, quando indagou se iria colocar sua reputação em risco ao escrever um prefácio para o livro.

Devo confessar que naturalmente não me senti muito bem ao escrever este prefácio, pois, como alguém provido de algum senso de

responsabilidade em relação à ciência, não tenho o costume de reafirmar algo que não possa provar ou pelo menos apresentar como aceitável à razão. Foi uma tarefa realmente duvidosa esta de tentar

apresentar a um público crítico moderno uma coleção de "encantamentos" arcaicos, tendo em vista torná-los mais ou menos

aceitáveis.

Parece impossível que uma pessoa jogando umas moedinhas possa fazer sua pergunta atravessar os quatro mil anos da experiência passada do I Ching e receber alguma resposta significativa sobre algum fato que ainda esteja por acontecer. Ainda assim, ele continua a responder, satisfatoriamente, por vezes repetidas aos que o abordam com perguntas sinceras.O fato de que o I Ching deve ser estudado e analisado e que a maioria das suas respostas envolve quem o procura num complexo diálogo sutil consigo mesmo me leva a citar dois exemplos bastante simplistas dos poderes "precognitivos" do livro e isso poderá parecer uma tentativa de torná-Io trivial, mas eles servirão para ilustrar o ponto onde parece haver um acesso misterioso ao conhecimento de acontecimentos futuros; isso será o suficiente para o meu objetivo.No outono de 1978, um casal londrino estava preocupado com a compra de uma nova casa. Todo o processo de discussão de preço, de determinação de uma data para a saída do morador anterior e da aprovação do documento de hipoteca estava entravado por complicações e atrasos. O casal começou a pensar se, no mínimo, a compra iria afinal acontecer e perguntou ao I Ching: "Nossa intenção de comprar a casa em (dado o endereço) será bem-sucedida?”

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A resposta do livro foi o hexagrama 28: A preponderância do grande. Diz o seguinte:

A PREPONDERÂNCIA DO GRANDEA viga-mestra verga no ponto de sustentação.

Infortúnio.

O comentário acrescentava: "O peso do grande é excessivo. A carga é pesada demais para a força de seus suportes. A viga-mestra, sobre a qual todo o teto repousa, verga no ponto de sustentação, porque seus apoios são fracos demais para o peso da carga que suporta" .Poucos dias depois o casal recebeu uma carta da companhia construtora, dizendo que não poderiam aprovar sua aplicação de hipoteca sobre aquele imóvel em particular pois ele sofrera danos devido a um afundamento, e o supervisor da companhia havia descoberto grandes rachaduras em suas paredes de sustentação.O segundo exemplo refere-se a um sentimento de grande mau agouro que sobreveio a um membro da Sociedade para a Pesquisa Psíquica na noite que antecedia um vôo que seu irmão e sua cunhada deveriam fazer à Turquia. Essa mulher ficou tão preocupada sobre a segurança dos parentes naquela viagem aérea que levantou-se no meio da noite e perguntou ao I Ching se seria seguro eles viajarem naquele vôo. A resposta vinha em dois estágios, pois seu primeiro hexagrama continha algumas "linhas mutantes" - linhas que indicam a situação mostrada no primeiro hexagrama que darão lugar a outra mostrada no segundo.A primeira parte da resposta era o hexagrama 3: Dificuldade no início. Dizia o seguinte:

DIFICULDADE NO INÍCIO traz sublime sucesso,favorecendo através da perseverança.

Nada deverá ser empreendido.É melhor indicar ajudantes.

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A segunda parte da resposta estava no hexagrama 18: O trabalho sobre aquilo que se deteriorou. Diz o seguinte:

O TRABALHO SOBRE AQUILO QUE SE DETERIOROUTem um supremo êxito.

É favorável atravessar a grande água.Antes do ponto de partida, três dias,depois do ponto de partida, três dias.

O comentário dizia: "Aquilo que se deteriorou por erro do homem pode voltar a estar bom pelo trabalho do homem. Não é um destino imutável..." .Uma semana depois, a mulher recebeu uma carta de Istambul em que sua cunhada contava que a partida do aeroporto de Londres fora retardada por muitas horas porque, enquanto o avião taxiava na pista, para decolar, uma luz no painel havia advertido sobre um defeito e o avião teve de retornar ao terminal para reparos.

2. SONHOS PRECOGNITIVOS

Parecia haver um silêncio mortal à minha volta... e então ouvi soluços contidos, como se muitas pessoas estivessem chorando. Achei que tinha saído de minha cama e estava andando no andar térreo. Ali o

silêncio era rompido pelos mesmos soluços ressentidos, mas as pessoas enlutadas não podiam ser vistas. Fui a todos os cômodos;

não havia ninguém dentro de nenhum deles, mas o mesmo som lastimoso de aflição chegava até mim enquanto eu ia passando... Fiquei intrigado e alarmado. O que poderia significar tudo isso?

Cheguei à Sala Leste, onde entrei. A surpresa pelo que havia ali me fez passar mal. Diante de mim estava um catafalco sobre o qual

repousava um corpo envolto em roupas de funeral. Ao redor havia soldados postados, em guarda; um grande número de pessoas

encontrava-se na sala, algumas olhavam enlutadas para o corpo, cujo

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rosto estava coberto, outras choravam penalizadas. Perguntei: "Quem morreu na Casa Branca?" "O Presidente... ele foi assassinado...”

Essas foram as palavras de Abraham Lincoln a seu biógrafo Ward Hill Laman em março de 1865, para descrever um sonho que o havia perturbado muito. Ele disse: "Não consegui mais dormir naquela noite e, desde então, fiquei estranhamente incomodado". Algumas semanas mais tarde, o Presidente foi assassinado por John Wilkes Booth.Diferente do material das lendas antigas, bastante exótico para nossos padrões atuais - envolvendo profetas, feiticeiras e outros do gênero -, o sonho de Lincoln toca um acorde com o qual estamos mais familiarizados. Muita gente pode lembrar-se de sonhos muito reais e, a julgar pelo testemunho de alguns dos grandes psicanalistas do século passado e pelos volumosos arquivos da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, muitos desses sonhos parecem haver previsto acontecimentos ainda por ocorrer. Tais sonhos - cuidadosamente registrados e confirmados, sempre que possível, pelos testemunhos de terceiros, a quem teriam sido relatados antes que o acontecimento previsto realmente ocorresse - constituem o maior conjunto de casos que podem ser considerados uma evidência para a realidade da precognição.

Milhares de sonhos visivelmente precognitivos foram narrados à SPP desde sua fundação há cem anos, mas a maioria deles teve de ser desconsiderada, por serem muito vagos ou generalizados demais ou, então, pela ausência de um testemunho de apoio adequado. Das muitas centenas que permaneceram, de longe as maiores proporções referem-se a sonhos que parecem antever algum episódio traumático - uma morte, um acidente ou um desastre geral -, embora alguns fossem apenas sonhos que descreviam, com detalhes realistas, a clara previsão de algum acontecimento trivial do dia-a-dia. Seria impossível contar aqui cada um desses sonhos detalhadamente, mas uma seleção deles poderá mostrar o que os pesquisadores psíquicos julgaram valer uma reflexão.

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Incidentes "Triviais”

Segundo seu biógrafo (Forster, 1874), Charles Dickens certa vez sonhou estar recebendo a visita de uma mulher que usava um xale vermelho e que se apresentou como ''Miss Napier"."Por que Miss Napier?", ele se perguntou ao acordar. "Não conheço Miss Napier alguma..." Mas, poucas horas depois, dois amigos bateram à sua porta, acompanhados de uma estranha a quem desejavam apresentar-lhe. Seu nome era Napier. Era a Miss Napier, e estava usando um xale vermelho (9, p. 179).

Resumindo material coletado pela SPP durante os primeiros cinqüenta anos de sua atividade, o escritor H. F. Saltmarsh cita muitos outros exemplos de sonhos precognitivos "triviais" como os que apareceram nos primeiros números das Atas da Sociedade. Num deles, uma certa sra. Mackenzie sonhou estar sentada na sala de visitas com vários convidados, incluindo um certo sr. J. Ela desculpou-se por um momento para ir inspecionar o jantar e, ao voltar, notou muitas manchas escuras em seu tapete novo. O sr. J. sugeriu que as manchas provavelmente fossem tinta, mas a sra. Mackenzie replicou: "Eu sei que foi queimado e contei cinco furos".Na manhã seguinte, um domingo, a sra. Mackenzie contou o sonho à família na hora do café; em seguida foram todos à missa. Ao sair da igreja, o sr. J. reuniu-se à família Mackenzie e voltou com eles para casa, para o almoço, algo que ele nunca fizera antes. Enquanto a família conversava com o sr. J. na sala de visitas, a sra. Mackenzie foi à cozinha para inspecionar o almoço e, ao voltar à sala, notou uma mancha no tapete. O sr. J. garantiu que possivelmente seria um pouco de tinta e apontou para outras manchas iguais. Nesse momento, a sra. Mackenzie exclamou: "Meu sonho! Meu tapete novo está queimado!" O tapete realmente havia sido queimado, como se verificou, em cinco

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lugares, por uma empregada que descuidadamente deixara cair algumas brasas ao acender a lareira da sala de visitas.

Em outro caso semelhante, a sra. Atlay, esposa do bispo de Hereford, sonhou que enquanto seu marido estava fora, a trabalho, ela incumbiu-se de ler as preces matinais na sala do palácio episcopal. Depois disso, dirigiu-se para a sala de jantar onde encontrou um enorme porco entre a mesa de jantar e o aparador. Ela achou o sonho tão engraçado que o contou a seus filhos e à governanta na manhã seguinte, antes de começar a ler as preces. Depois, foi para a sala de jantar. E ali, entre a mesa ela aparador, exatamente como em seu sonho, estava um enorme porco, que havia escapado do chiqueiro durante as orações e conseguira entrar na casa.Embora o próprio Saltmarsh tenha tomado precauções, como parte de seu exame para a evidência da precognição, expondo todas as explicações alternativas razoáveis. em cada sonho estudado, há uma possibilidade que ele pode ter deixado passar. No caso da sra. Atlay, é possível que seu sonho tenha se concretizado através de uma brincadeira por parte de seus filhos. Eles poderiam ter deixado o porco solto, na cozinha da casa, uma vez inspirados pelo relato de um sonho tão engraçado. Trata-se, na verdade, de um tipo de tentação à qual a maioria das crianças não resiste.

Sonhos Premonitórios de Morte

Quando estava com seus vinte e tantos anos, Samuel Clemens (Mark Twain) teve a experiência de um sonho que o marcou por toda a vida. Trinta anos depois, ele escreveu um longo artigo sobre a "telegrafia mental", contando detalhes das muitas experiências semelhantes que tivera durante a vida. A partir de 1886 até 1903, seu interesse pelos fenômenos psíquicos era tal que ele se tornou membro da SPP. Contou a seu biógrafo oficial, Albert Bigelow Paine, o seguinte sonho.

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Clemens e seu irmão mais novo, Henry, estavam empregados a bordo do vapor Pennsylvania, no rio Mississipi. Certa noite, em que o vapor se encontrava atracado em Saint Louis, Clemens dormiu na casa de sua irmã e sonhou que Henry estava morto. Viu o corpo de Henry deitado num caixão, apoiado em duas cadeiras, na sala de visitas. Sobre o peito de Henry havia um buquê de flores brancas, com um único botão vermelho no centro. O sonho pareceu tão real que, na manhã seguinte, ao acordar, Clemens acreditou ser verdade e, depois de se vestir, foi à sala de visitas para ver a urna de seu irmão. Ficou tomado de alegria ao encontrar a sala vazia e ao perceber que fora apenas um sonho mau. Contou o sonho à irmã e, a partir disso, fez o que pôde para esquecer o assunto.Poucas semanas mais tarde, devido a problemas com a tripulação no Pennsylvania, os dois irmãos foram separados numa das viagens pelo Mississipi abaixo. Henry, como sempre, ia no Pennsylvania, e Samuel seguiu, dois dias depois, no Lacey. Quando o Lacey atracou em Greenville, no Estado de Mississipi, Clemens ouviu uma voz na praia gritando as notícias: "O Pennsylvania explodiu logo abaixo de Mênfis, na Ilha do Navio. Cento e cinqüenta mortos!”De início, acreditou-se que Henry havia sobrevivido sem ferimentos, quando quatro das oito caldeiras do Pennsylvania explodiram; porém, soube-se depois que ele estava muito queimado e que a sua morte era esperada. No momento em que o barco do irmão chegava a Mênfis, Henry estava sendo carregado para o necrotério.Quando Samuel Clemens foi ver o irmão, encontrou-se numa sala na qual haviam sido reunidos os caixões de todas as vítimas. Mas, enquanto todos os dos outros eram de madeira simples e sem pintura, Henry Clemens fora colocado num caixão de metal que as mulheres de Mênfis haviam comprado com um fundo de sessenta dólares especialmente levantado. Fizeram isso porque o rosto admirável do rapaz havia despertado especial interesse. Estava Clemens de pé, olhando o corpo de seu irmão, pensando no quanto a cena era semelhante ao sonho, exceto pela falta do buquê sobre o peito de Henry, quando, nesse momento, uma senhora idosa de Mênfis foi até

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o caixão e lá depositou um. Era um buquê de flores brancas, com uma única rosa vermelha no centro.Em 1812, um homem da Cornualha, chamado Williams, sonhou estar sentado no saguão da Câmara dos Comuns quando um sujeito vestindo um casaco marrom escuro e decorado com "botões característicos" atirou no Ministro da Fazenda. Clemens Carlyon testemunha o sonho de Williams em suas memórias, dizendo que ele acordou, contou o sonho à esposa e adormeceu outra vez. Mas, enquanto dormia, teve o sonho novamente e acordou tão perturbado que se sentiu no dever de advertir o Ministro. Entretanto, alguns amigos o convenceram a não comunicar coisa alguma, e ele esqueceu o assunto até oito dias mais tarde, quando soube que Spencer Perceval, o Ministro da Fazenda, fora assassinado no saguão da Câmara dos Comuns. Mais tarde, quando Williams viu o desenho de um artista sobre o crime, percebeu que o assassino fora retratado vestindo-se exatamente como em seu sonho.No dia 16 de dezembro de 1897, o ator britânico William Terriss foi esfaqueado e morto na entrada do Teatro Adelphi, em Londres, por um membro da companhia que fora despedido e que contra ele nutria queixas. O substituto de Terriss, Frederick Lane, teve o seguinte sonho na noite anterior ao crime:

Sonhei que via o falecido William deitado num estado delirante ou inconsciente nos degraus que levavam aos camarins do Teatro

Adelphi. Estava rodeado de pessoas que trabalhavam no teatro, entre as quais a srta. Millward e um dos funcionários que cuidavam da

cortina; e vi os dois poucas horas depois na cena da morte. O peito dele estava nu e, ao lado, as roupas rasgadas. Todos à sua volta

tentavam fazer algo para socorrê-lo ... Meu sonho foi o mais realista que já tive, parecia mesmo verdade e representava exatamente a

cena que vi à noite.

Frederick Lane contou o sonho a Frank Podmore, o principal investigador da Sociedade para a Pesquisa Psíquica e reconhecido

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cético a respeito de qualquer assunto relacionado a alguma alegada precognição. Podmore tomou o cuidado de interrogar dois colegas de teatro de Lane, e os dois juraram que Lane lhes havia contado o sonho na hora do almoço no mesmo dia do assassinato, muitas horas antes de o fato acontecer. Podmore comentou em seu relatório: "parece-me que o sonho-visão apresentou um quadro bastante preciso e minucioso dos acontecimentos. Não era um sonho comum e é difícil deixá-Io de lado como simples coincidência". Mas, ao mesmo tempo que, estava convencido de que o sonho de Lane era autêntico, Podmore não se mostrava muito certo de que também fosse precognitivo."Parece-me possível", sugeriu ele, "que o ator principal na tragédia se tenha comunicado inadvertidamente com alguma outra mente, que por acaso tivesse sensibilidade para a recepção, transmitindo o esboço do quadro em que ele incorporava seu objetivo desesperado." Ou, para resumir, Podmore achou que o sonho de Lane poderia ser explicado por telepatia, entre Lane e o assassino de Terriss, em vez de ser uma visão precognitiva por parte de Lane. Esse tipo de comunicação telepática é uma hipótese alternativa comum a casos de uma aparente precognição, embora seja difícil verificar que papel ela poderia ter desempenhado no próximo caso, muito mais recente.No dia 9 de abril de 1975, a sra. Lickness, uma experiente assistente social de Hull teve o seguinte sonho sobre um homem (o sr. G.) a quem ela não via há dezesseis anos. Ela o relatou da seguinte maneira a Brian Nisbet, um pesquisador da Sociedade:

Havia muito pouco em meu sonho, estava muito claro. Eu estava de pé num dos lados de uma sala não muito ampla; havia uma parede lisa à minha frente. Era muito clara, clara como uma cor de vidoeiro

prateado. A cabeça do sr. G. aparecia nitidamente como se ele estivesse dormindo. Não notei nenhum detalhe em cima dela. Havia

alguém à minha esquerda, mas eu não podia ver quem era, no sonho. Falei, dizendo: "Oh! Veja! Dennis G. está onde meu pai está agora". E

é só isso que posso lembrar.

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Na manhã seguinte, a sra. Lickness acordou sentindo-se um tanto perplexa com o sonho (ela não conhecera o sr. G. diretamente, só o tinha visto a uma certa distância, uns dezesseis anos antes, quando ele fora apanhar sua esposa, uma das clientes da sra. Lickness) e o contou a seu marido. Logo depois, ela saiu em seu carro para visitar uma amiga, a sra. F. No trajeto, ela parou numa esquina para permitir que um carro elegante entrasse na rua principal e ficou surpresa ao ver o sr. G. ao volante. Logo que chegou à casa da sra. F., contou-lhe o sonho e falou sobre o inesperado encontro com o sr. G. na estrada, naquela manhã. A sra. F. também conhecia o sr. G. Uma amiga da sra F., diretora de uma escola, estava presente e ouviu também a história da sra. Lickness. As três acharam que o aparecimento do sr. G. naquela manhã, vivo e bem de saúde, significava que o sonho não tinha importância nenhuma.Mas, infelizmente, como a sra. Lickness disse em seu relatório a Brian Nisbet, não foi daquela forma que tudo acabou.

Despedindo-me (das amigas), continuei minhas visitas daquele dia, e, ao chegar em casa, encontrei um recado pedindo-me para entrar em contato com minhas amigas. Liguei e fiquei sabendo que logo depois

que eu deixei o carro do sr. G. entrar na estrada, saindo de uma ruazinha lateral, ele havia continuado até a cidade. Ao parar num sinal

vermelho, no centro da cidade, ele sofrera um ataque cardíaco, morrendo instantaneamente.

Muitas pessoas testemunharam a respeito de diversas particularidades deste caso e todas assinaram declarações para a Sociedade para a Pesquisa Psíquica.

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Sonhos Premonitórios de Doenças ou Acidentes

O sonho que vem a seguir poderia parecer um bom candidato para servir de apoio à hipótese de Podmore de que a comunicação telepática pode ser uma explicação para determinadas experiências aparentemente precognitivas. Trata-se do sonho de um médico russo, registrado no conceituado livro de Medard Boss, The Analysis of Dreams (9, p. 182). Boss foi um importante psicanalista existencialista, professor de Psicoterapia na Universidade de Zurique, conhecido por suas cuidadosas investigações sobre a fenomenologia do sonho.

Costumo tomar uma refeição às três da tarde e depois vou dormir por uma hora, e meia. Em julho de 1888, fui me deitar, como faço normalmente, e adormeci lá pelas três e meia. Sonhei que a

campainha tocava e que alguém vinha me apanhar para levar-me a um paciente. Entrei numa sala pequena forrada com papel de parede

escuro. Ao lado direito da porta havia um móvel com gavetas e um estranho candelabro ou uma lâmpada em cima. Fiquei interessado,

muito interessado, por aquele objeto curioso. Jamais tinha visto nada parecido antes. Do lado esquerdo da porta havia uma cama onde uma

mulher estava sangrando abundantemente. Não sei como, mas eu sabia do que se tratava...

Dez minutos depois de acordar (do meu sonho), a campainha tocou e fui solicitado para visitar um paciente. Ao entrar na casa, fiquei

completamente perplexo. Era idêntica ao cômodo do meu sonho. Havia uma esquisita lamparina de querosene sobre o móvel com

gavetas à direita da porta; a cama estava à esquerda. Meio aturdido, me aproximei da paciente e perguntei: "A senhora teve uma

hemorragia violenta?" "Sim", disse ela. "Como é que o senhor sabe?”

Neste caso, o próprio dr. Golinsky se perguntou se teria sido um sonho premonitório ou se a paciente teria comunicado a ele por algum

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meio telepático, durante a sesta, o seu estado. Ele a interrogou a respeito e ficou sabendo que a hemorragia havia começado à uma hora da tarde e que ela ficara preocupada com a gravidade do fato lá pelas duas horas; às quatro, resolvera mandar chamar o médico. Portanto, a cena que o médico viu em sonho estava ocorrendo enquanto ele dormia e, embora não necessariamente, a telepatia poderia ser uma explicação alternativa em vez da precognição, no caso do seu sonho.

O sonho de Golinsky lembra outro muito mais recente narrado pelo escritor Andrew MacKenzie, à SPP (42, pp. 105 -06), embora nesse caso a atenção da pessoa que sonhou estivesse focalizada em algo que o sujeito do sonho aparentemente desconhecia; e existe a interessante possibilidade de que o sonho premonitório tenha feito o sonhador agir de maneira a fazer com que no futuro acontecesse o que ele havia previsto.Ao entardecer de um sábado de 1964, um ilustre cirurgião, a quem MacKenzie se refere como dr. Donald Wilson (pseudônimo), sonhou que via um paciente em seu consultório na manhã da segunda-feira seguinte. O primeiro paciente a entrar na sala foi uma mulher com uma grande mancha na nádega direita. O dr. Wilson não podia ver o rosto da paciente, apenas suas nádegas, mas tinha certeza de que era uma mulher que nunca vira antes. O sonho o impressionou, porque o médico não se lembrava  de haver sonhado antes com nenhum paciente.O dr. Wilson esperou ansioso para ver o que iria acontecer em seu consultório na segunda-feira, mas ficou um tanto desapontado quando a primeira paciente daquele dia foi uma enfermeira do hospital. "Não tem nada a ver com meu sonho", pensou ele. No entanto, a enfermeira não tinha marcado hora para ver o dr. Wilson naquela manhã, apenas aproveitara um intervalo justamente naquele momento. Sua primeira paciente foi, na verdade, uma outra mulher que ele jamais vira e, enquanto ela estava deitada sobre o lado esquerdo para ser

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examinada, o médico percebeu uma grande mancha de tumor em sua nádega direita."Ora, é um pouco abaixo do local onde eu havia pensado que era!", exclamou em voz alta - embora sua exclamação soasse de forma estranha à paciente, já que tinha marcado a consulta devido a outro problema. Era muito raro um tumor daquele tipo aparecer na nádega e isso, aliado ao sonho, levou o dr. Wilson a concluir: "Trata-se de algo muito significativo para não querer dizer nada". Dois dias depois, ele removeu o tumor, que foi diagnosticado maligno."Se eu não o tivesse removido - comentou mais tarde -, a mulher teria morrido.”

Premonição e Prevenção

Há muitos sonhos premonitórios registrados que parecem ter prevenido sobre alguma coisa terrível prestes a acontecer, como o do dr. Wilson, agindo como um sinal de advertência. Nos três sonhos que seguem, a própria pessoa que sonhou salvou-se graças a seu sonho premonitório.Por volta do final do século passado, a conhecida sufragista americana, Susan B. Anthony, foi salva de um incêndio por um sonho. O incidente está registrado no diário de sua amiga Elizabeth Cady Stanton desta forma:

Esperávamos que a srta. Anthony viesse nos visitar dentro de alguns dias. Ela tivera um sonho muito estranho. O médico havia lhe

recomendado que fosse da Filadélfia para Atlantic City cuidar da saúde. Estando nessa última cidade, ela teve um sonho muito realista

certa noite. Sonhou que ia sendo queimada viva num dos hotéis, e, quando levantou pela manhã, disse à sobrinha o que havia sonhado.

"Temos de voltar à Filadélfia", disse. E assim fizeram. No dia seguinte, o hotel em que haviam estado e mais outros dez hotéis e boa parte de

toda a área tinham sido destruídos pelo fogo.

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Outro caso desse tipo foi narrado à SPP britânica no início deste século:

O sr. Brighton, dormindo a bordo de um iate ancorado, sonhou que uma voz o advertia quanto ao perigo de ser abalroado por outro barco. Acordou e foi para o convés, mas encontrando tudo em ordem, apesar da neblina que havia surgido, voltou a deitar-se. O sonho se repetiu e ele acordou outra vez e retornou ao convés. Havia ficado tão ansioso com o sonho e com a neblina, que dessa vez resolveu subir à ponte de comando; fez isso exatamente a tempo de ver, acima da neblina,

um outro barco que vinha em sua direção. Gritou para o capitão daquele barco, que girou todo o leme, evitando assim a colisão.

Trata-se de um sonho muito citado dentro da literatura sobre a precognição. Mesmo havendo uma boa evidência para se considerar este como um legítimo caso de premonição, um escritor importante no campo, Saltmarsh, achou interessante levantar uma hipótese possível. Brighton, sendo um homem do mar experiente, tinha um aguçado sentido de audição (muito desenvolvido em geral entre os navegantes) e poderia ter percebido, inconscientemente, a quase imperceptível alteração de som que ocorre quando a neblina baixa e, da mesma forma, o som distante do barco que se aproximava; as duas coisas poderiam ter-lhe sido comunicadas em sonho, parecendo "uma voz de advertência".

Finalmente, temos o caso de uma inglesa visivelmente salva da morte, quando da queda de um avião, graças a um sonho que fez com que ela não embarcasse naquele vôo. O sonho foi contado no jornal londrino Evening Standard e duplamente checado por Andrew MacKenzie.No dia 10 de abril de 1973, um avião Vanguard que fazia um vôo charter caiu na encosta de uma montanha nas proximidades de Basiléia, Suíça, durante uma tempestade de neve. Essa queda

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marcou especialmente na Inglaterra porque entre a maioria dos 107 passageiros mortos estavam donas de casa de quatro aldeias da região de Somerset, em viagem de um dia à Suíça. Três semanas antes do acidente, uma das mulheres que deveria ter estado na viagem, Marian Warren, esposa de um agricultor da aldeia de Churchill Green, teve um sonho que mais tarde descreveu assim:

Estava tudo muito claro em meu sonho. Vi o avião passar por cima de algumas árvores e cair na neve. Havia muitos corpos de minhas

amigas em volta. Era tudo muito real e horrível. Senti frio o dia inteiro, apesar de estar sentada diante do fogo na lareira.

Marian ficou tão perturbada pelo sonho que devolveu a passagem para a viagem que se aproximava ao organizador, apesar de receber como devolução apenas a metade do preço que havia pago. Antes do desastre, ela contou o sonho apenas para uma amiga íntima e a mais ninguém, acrescentando: "pensei que ninguém acreditaria em mim”.

É comum grande parte das pessoas, cujos sonhos sejam possíveis previsões de desastres iminentes, não falarem a respeito; quer pelo receio de que ninguém acredite no que estão dizendo, quer, muitas vezes, pela relutância em acreditarem em si mesmas. E, se alguma vez chegam a contar alguma coisa, fazem-no de uma maneira superficial e, em geral, com escrúpulos. Há o caso registrado (42, p.48) de um homem, com passagem marcada no infortunado Titanic, que sonhou duas noites seguidas com o afundamento do navio. Ele via a si mesmo como uma das vítimas. Mesmo assim, embora "sentindo-se muito deprimido e impotente", não conseguia decidir-se a cancelar a passagem. Somente quando sua companhia telegrafou de Nova Iorque pedindo, por questões de negócios, para adiar a viagem, é que ele conseguiu tomar a decisão. Só então se sentiu aliviado. Mas, quantos sobreviventes como este existem, cujas vidas possivelmente seriam salvas por sintomas premonitórios?

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No início da década de 60, um parapsicólogo americano chamado William Cox fez um interessante levantamento que traz algumas respostas a essa pergunta. Durante anos, Cox recolheu dados estatísticos para descobrir se as pessoas tinham ou não uma tendência a evitar viagens em trens que estivessem a ponto de sofrer algum tipo de acidente. As estatísticas de Cox comparavam o número total de pessoas que viajavam em determinado trem na hora do acidente e o número total de pessoas que viajavam no mesmo trem nos sete, quatorze, vinte e um e trinta e dois dias que precediam o acidente. Os resultados obtidos mostraram que em todos os casos havia menos passageiros nos vagões danificados ou descarrilhados de um trem que estivesse destinado a sofrer um acidente do que o número que seria de se esperar para um outro trem naquela mesma hora. A diferença entre o número real de passageiros e o número esperado nestes casos era significativa, maior que a proporção de probabilidade de que o acidente ocorresse - maior do que 1 para 100.Infelizmente, o levantamento de Cox é o único no gênero já publicado até agora. Toda a questão a respeito de se saber se as pessoas realmente conseguem evitar a morte ou ferimentos através de avisos premonitórios é de uma importância crítica para sustentarmos posteriormente uma discussão sobre a compatibilidade ou incompatibilidade da precognição com a existência do livre-arbítrio, e uma discussão dessas poderia resultar muito mais enriquecida se atendida por um número maior de estatísticas sérias como a realizada por Cox.

Sonhos Precognitivos de Desastres

Nos casos que acabamos de examinar, em cada exemplo o sonho premonitório parecia antever algum infortúnio iminente à pessoa que sonhava, dando-lhe assim uma oportunidade de agir conforme desejasse, de acordo com o sonho. Há um outro grande grupo de

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sonhos em que algum desastre mais generalizado é previsto, algum desastre que não envolve a pessoa que sonha e que, além disso, não lhe dá condições de avaliar ou de agir antes que seja tarde demais - em geral, toma conhecimento do fato através da leitura de um jornal ou pela televisão.Antes da II Guerra Mundial, um ilustre investigador da Sociedade Americana para a Pesquisa Psíquica, o dr. Walter Prince, mantinha um registro por escrito de todos os seus sonhos. Entre eles, havia o seguinte:

Pela manhã, sonhei que olhava para um trem, cuja parte de trás saía de um túnel ferroviário. E, de repente, para meu horror, outro trem

bateu nele. Vi os vagões se retorcendo e se empilhando e, da massa de ferros, saíam gritos lancinantes de agonia das pessoas feridas.

Apareceram nuvens de fumaça ou vapor muito densas, e ainda mais gritos agonizantes se seguiram. Nesse ponto fui acordado por minha

mulher, pois eu fazia ruídos que indicavam enorme tensão...

Quatro horas depois de o dr. Prince contar este sonho à esposa e voltar a dormir, o trem do Expresso Danbury, das 8h 15min para Nova Iorque, estava parado à entrada do túnel da Park Avenue -, com a parte da frente meio para fora do túnel e a traseira dentro - quando foi atingido por trás, pela locomotiva de um trem local, com tamanha violência que o impacto foi ouvido a mais de um quilômetro de distância. Houve muitos mortos, e grande número de pessoas ficaram presas nas ferragens, conforme a narrativa de um jornal: "E, para aumentar ainda mais o horror, o vapor sibilante da máquina destruída encurralava os infelizes e subia em nuvens pela abertura do túnel".

Um sonho do mesmo gênero foi relatado ao físico inglês, professor John Taylor, em meados da década de 70, na manhã seguinte ao desastre de Moorgate, em Londres, um dos piores acidentes já verificados na história daquela cidade, envolvendo trens de metrô. Um metrô em alta velocidade atravessou a plataforma de embarque, e as

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duas composições da frente foram esmagadas, no impacto, contra a parede do túnel. Muitas pessoas morreram, houve grande número de feridos graves e centenas ficaram presas no túnel escuro por muitas horas. A pessoa que contou o pesadelo ao professor via a si mesma num túnel cheio de fumaça. O local estava mal-iluminado mas ela conseguiu sair por entre pontas retorcidas, e podia ouvir pessoas gritando e chorando. Antes de conversar com o professor Taylor, a mulher narrou seu pesadelo ao marido logo que acordou. Taylor observou que as palavras que ela usou mais tarde para descrever o acidente eram semelhantes às usadas pelos sobreviventes do desastre.Neste caso, porém, como não houve um registro do relato antes do acidente, tais semelhanças podem ter surgido depois do fato; na narração, as imagens do sonho podem ter sido influenciadas pelas descrições muito realistas do acidente que apareceram em toda a imprensa no dia seguinte.

Há uma documentação mais ampla à disposição para consubstanciar o sonho de uma outra inglesa, no qual ela aparentemente previu detalhes do pior acidente aéreo da Inglaterra. No dia 18 de junho de 1972, um jato Trident da British European Airways que se dirigia a Bruxelas caiu alguns minutos depois de sua decolagem do aeroporto de Heathrow em Londres, matando todas as 118 pessoas a bordo. Na noite anterior, Monica Charke, de Letchworth, uma cidade no distrito de Hertfordshire, teve o sonho narrado a seguir; ela o contou a seu marido e a sua filha. Depois do acidente, a família Clarke relatou o sonho a Andrew MacKenzie.

Sonhei que estava com uma amiga sentada no campo, mas, não muito longe dali, havia edifícios altos. De repente, o céu ficou escuro e opressivo. Sem mais nem menos, houve uma espécie de relâmpago

muito claro e um avião que saiu de algum lugar pareceu cair num campo muito perto de onde estávamos. Depois de alguns segundos,

ele pareceu explodir em chamas. Antes disso não houve nenhum som

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da máquina de um avião. Neste ponto, acordei, muito perturbada e apavorada...

Pode parecer uma coincidência, mas é significativo que no sonho de Monica "não houve nenhum som da máquina de um avião". O Trident, na realidade, caiu do céu como um pássaro silencioso por causa de um problema em sua máquina: os motores haviam deixado de funcionar durante a ascensão.

Por fim, o desastre de Aberfan. Às 9h15min da manhã do dia 21 de outubro de 1966, Gales sofreu o pior desastre de minas em sua história, Um veio de carvão situado na encosta de uma montanha fora da aldeia de Aberfan deslizou subitamente, abatendo-se sobre a Pantglas Junior School (uma escola primária). Morreram 144 pessoas, 128 das quais alunos da escola, parcialmente destruída na avalanche.O desastre de Aberfan comoveu a Inglaterra de um modo que poucos desastres naturais já fizeram antes, talvez porque tantas de suas vítimas tenham sido crianças. Pessoas de todos os cantos do país relataram o horror sentido e muitas o compararam aos bombardeios noturnos alemães; outras disseram haver sentido como que uma curiosa espécie de perda pessoal, ainda que nenhum conhecido seu estivesse entre os mortos ou feridos. Tendo notado que muitas vezes os sonhos associam-se a relatos registrados de visível precognição, o dr. J. C. Barker, do Hospital Shelton em Shrewsbury, perguntava-se se este também teria sido assim. Resolveu tentar verificar isso e procedeu, então, a um dos mais completos levantamentos jamais realizados sobre como a precognição pode estar relacionada com acontecimentos violentos de conhecimento público.No dia seguinte à tragédia de Aberfan, que havia sido o principal assunto de toda a imprensa inglesa, o dr. Barker fez um apelo através do correspondente de ciências do jornal Evening Standard de Londres, pedindo que as pessoas que julgassem ter tido algum aviso premonitório sobre o desastre lhe escrevessem. Das setenta e seis cartas recebidas, sessenta lhe pareceram merecer uma investigação

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mais aprofundada (entrevistas pessoais, pedidos de alguma prova mais corroborativa) e trinta e seis dentre estas últimas, afinal, foram julgadas satisfatórias para seus critérios, como sendo casos de legítima precognição.O dr. Barker registrou cuidadosamente as trinta e seis experiências visivelmente precognitivas e classificou-as segundo as quantidades de detalhes previstos e a idade dos perceptivos, sexo, e se a premonição havia surgido em sonho, acordado ou em transe. A grande maioria foi em sonhos, alguns dos quais realmente bastante detalhados.Um desses casos de Barker envolvia o sonho de uma aluna de dez anos de idade da própria escola, Eryl Mai Jones, que morreu no desastre. Duas semanas antes, a garota havia falado à sua mãe sobre a morte, dizendo: "Mamãe, eu não tenho medo de morrer". No dia anterior ao acidente, a garota insistiu que sua mãe ouvisse um sonho que tivera durante a noite. Quando a mãe protestou, dizendo que estava muito ocupada, a menina continuou: "Não, mamãe, você tem de escutar. Eu sonhei que tinha ido à escola e não tinha nenhuma escola ali. Alguma coisa preta tinha caído por cima dela!”Deve-se dizer sobre esse sonho em particular que, embora ninguém em Aberfan esperasse que o veio carbonífero pudesse cair tão subitamente, ou pelo menos da maneira como aconteceu, o perigo que o veio apresentava era uma preocupação geral da cidade e havia sido discutido muitas vezes. É possível que essa jovem vítima soubesse de tais discussões e que elas tenham tomado conta de sua imaginação, afetando seus sonhos. Se foi isso, o sonho da menina pode ter sido apenas uma ansiedade geral ligada apenas por coincidência ao desastre real.No entanto, uma explicação alternativa como essa não pôde ser encontrada em outros casos descobertos por Barker. Com exceção da menina, que foi uma das vítimas, nenhum outro dos exemplos citados no estudo de Barker envolvia pessoas que tivessem algo a ver com o acidente ou que vivessem nas proximidades. Isso era verdade no caso de Grace Eagleton, de Kent. Ela testemunhou nada menos que o seguinte:

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Nunca estive em Gales e nem possuo uma televisão. Na noite de 14 de outubro, tive um sonho horrível e muito real com um desastre numa aldeia de minas de carvão. Era um vale com um grande edifício cheio de crianças pequenas. Montanhas de carvão e água estavam caindo sobre o vale, enterrando a escola. Os gritos das crianças eram tão reais que eu também gritei. Tudo aconteceu muito rápido. E depois

tudo ficou negro.

Nem Grace Eagleton nem Mary Hennessy, de Barnstaple, em North Devon, jamais tiveram alguma ligação com Aberfan ou com aldeias de mineração. Mas o sonho de Mary Hennessy continha detalhes ainda mais realistas que correspondiam ao desastre propriamente dito:

Na noite anterior ao acidente, sonhei com uma porção de crianças em duas salas. Depois de algum tempo, algumas das crianças se

juntaram a outras numa sala comprida e ficaram em grupos diferentes. No final da sala havia peças muito compridas de madeira, ou barras de madeira. As crianças estavam tentando subir ou passar por entre as barras. Tentei avisar alguém gritando, mas antes que eu pudesse fazer isso, uma criança pequena simplesmente desapareceu de meu campo de visão. Eu mesma não estava em nenhuma das salas, mas observava do corredor. Em seguida, no meu sonho, vi centenas de

pessoas correndo para o mesmo lugar. O olhar no rosto das pessoas era horrível. Algumas gritavam e outras seguravam lenços contra seus

rostos. Fiquei com tanto medo que acordei em seguida.

Mary Hennessy ficou muito perturbada com o sonho, pois tinha duas netinhas. Por isso, chamou seu filho para contar o sonho. Ela conclui: "Disse a ele que não eram as nossas meninas, pois me pareciam mais que fossem crianças de escola". Mary ficou sabendo do desastre de Aberfan mais tarde, às 17h15min.

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Depois de analisar os resultados de seus levantamentos sobre a premonição em Aberfan, o dr. Barker ficou bastante impressionado com o número de casos que ele revelara, perguntando a si mesmo se uma visível precognição de desastres generalizados como esta não, poderia ser classificada como um "sistema de aviso prévio". Barker foi o responsável pela organização de um Escritório de Premonições da Inglaterra em 1967 e, mais tarde, de um Registro Central de Premonições em Nova Iorque. A idéia de tais escritórios era a de registrar todos os casos (coletados por telefone) de sonhos, visões etc. que parecessem premonitórios e, então, compará-los com desastres reais que ocorressem mais tarde.Nos primeiros seis anos de operação, o Escritório de Premonições da Inglaterra recebeu 1.206 chamados aparentes de premonição, alguns dos quais pareceram corresponder a fatos ocorridos posteriormente (o que provocou a indignação do primeiro-ministro Harold Wilson: a morte de quatorze crianças no incêndio de uma casa para retardados mentais, a morte por sufocação de dois gêmeos encontrados presos numa geladeira fora de uso), mas não surgiu nenhum padrão muito claro a partir desses dados. Jamais houve alguma repetição entre a torrente de premonições associadas a um único acontecimento, como o que caracterizou o estudo do caso de Aberfan.

Sonhando com Ganhadores

É comum todos os anos surgirem notícias na imprensa popular a respeito de algum apostador de sorte que ganhou dinheiro no Derby (famosas corridas de cavalo, muito populares na Inglaterra ou no Grande Prêmio Nacional). Mais comum ainda é o fato de o ganhador ou ganhadora afirmar ter sonhado com o nome do cavalo vencedor na noite anterior à corrida. Histórias assim fazem parte da mitologia da precognição e dessas corridas clássicas que tanto excitam a imaginação popular; no conjunto, entretanto, elas desempenham um

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papel muito pequeno nas reflexões de pesquisadores sérios que tentam examinar cuidadosamente o caso da precognição. Frank Podmore comentava nos primeiros tempos da SPP que não é difícil imaginar que as grandes esperanças colocadas naquelas corridas possam provocar tantos sonhos de maneira que de vez em quando um vá coincidir com os fatos, enquanto muitos outros passam desapercebidos. Mas há um certo grupo de sonhos registrados, relacionados a corridas, que merecem nossa atenção.Em 1946, Lord Kilbracken, que ainda era o sr. John Godley, estudante do Balliol College (uma das faculdades da Universidade de Oxford), teve uma série de sonhos que pareciam ser a previsão dos vencedores de diversas corridas. Na época, ele compartilhou sua informação com um grupo de colegas; todos ganharam dinheiro e testemunharam sobre o assunto quando interrogados pelos pesquisadores da SPP. E assim, os sonhos, que são excepcionais nos detalhes, estão também bem fundamentados.Em seu relatório para a SPP, Godley escreveu:

Na sexta-feira à noite do dia 8 de março de 1946, sonhei o que muitos gostariam de sonhar: que eu estava vendo os resultados das corridas do dia seguinte, com todos os vencedores e cotações por completo.

No sonho, notei que os dois cavalos que haviam vencido eram os em que eu havia apostado sem sucesso na sua última corrida, e lembro de ter ficado aborrecido no sonho por haver perdido desta vez. Os nomes dos cavalos eram Bindal e Juladin, e em meu sonho eles

estavam pagando 7 por 1.Quando acordei, lembrava do sonho, mas de todos os resultados que

sonhara só pude recordar estes dois nomes: Bindal e Juladin. Não pensei mais sobre isso até a tarde daquele dia, quando por acaso dei

uma olhada no jornal e, para minha surpresa, descobri que os dois iriam correr naquela mesma tarde. Contei para alguns amigos meus, e todos me aconselharam a apostar neles, alguns apostaram também...Bindal foi o primeiro a correr. Comprei meu jornal à noite e a primeira parte de meu sonho se realizara. Então, rapidamente coloquei tudo o

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que ganhara em Juladin, que (como em meu sonho) participava da última corrida. Passei uma ou duas horas impaciente, esperando uma

nova edição do jornal Quando ele chegou, eu estava um tanto confiante de que iria ganhar: claro, Juladin tinha sido o vencedor. Os dois cavalos haviam começado em 5 por 4 e 5 por 2, de maneira que a proporção para a dupla era 7/8 por 1, um número muito próximo do 7 por 1 de meu sonho. Meus amigos e eu ganhamos mais de trinta

libras entre nós.

Godley afirmou que se sentiu tão animado com o resultado de seu sonho, que durante a semana seguinte dormiu com lápis e papel ao lado da cama, na esperança de que fosse acontecer outra vez, mas sem sucesso. "Depois de algum tempo", conta ele, "esqueci todo o incidente e desisti da esperança de que fosse acontecer de novo." Mas, duas semanas mais tarde, duas noites antes do Grande Prêmio Nacional (3 de abril de 1946), ele sonhou:

Sonhei novamente estar vendo os resultados das corridas. Mas, dessa vez, ao acordar, só podia me lembrar de um dos vencedores:

Tubermore. No dia seguinte, não havia um cavalo com este nome correndo. Mas, dois dias depois, na primeira corrida em Aintree, tinha um cavalo chamado Tuberose; os dois nomes eram tão parecidos que

resolvi tentar a sorte. Com meu irmão e minha irmã, coloquei três libras em cada tipo de aposta; Tuberose ganhou pagando: 100 por 6. Nós três juntos ganhamos mais de 60 libras... e eu nunca ouvira falar de Tuberose antes daquele dia. Tratava-se de um estranho que nem

era levado em consideração. Prestei atenção em suas corridas depois, mas ele nunca mais ganhou outra.

O último dos sonhos de Godley dessa série (que foi de dez sonhos, em oito dos quais ele sonhou com os vencedores) aconteceu no dia 28 de julho de 1946. Ele contou:

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Dessa vez foi diferente. Eu estava em Oxford na época e, no sonho, fui a determinado hotel para telefonar para meu bookmaker. Tenho o costume invariável de ler os resultados das corridas no jornal da noite quando estou interessado neles, mas, em meu sonho, decidi comprá-Io ao entrar em contato com meu bookmaker. Eu fumava um cigarro e o posto telefônico estava abafado. Quando consegui entrar, disse ao

homem que me atendeu: "Aqui é Godley. Eu gostaria de saber se você já tem o resultado da última corrida". Sua resposta foi: "Claro:

Monumentor, 5 por 4". E acordei...Quando fui olhar o jornal durante o café da manhã, descobri que o favorito para a última corrida daquele dia era um cavalo chamado

Mentores... O nome, embora quase igual, era diferente do meu sonho. Resolvi que, já que no sonho eu havia ligado para meu bookmaker, eu

teria que fazer o mesmo na realidade. E às cinco horas fui ao hotel, esperei até a hora do resultado das corridas.

Às 5h10min acendi um cigarro. Fui então para a cabine e liguei para Londres. Estava muito abafado na cabine. Mas prossegui.

"Aqui é Godley", disse eu. "Você poderia me dizer o resultado da última corrida?”

"Claro," respondeu ele. "Mentores, 6 por 4.”

O caso Godley continua sendo o melhor fenômeno registrado de uma pessoa que pareceu haver sonhado com vencedores, mas talvez seja discutível afirmar que se tratasse de sonhos premonitórios. Quando jovem, ele era profundamente interessado por corridas e apostava sempre, com uma freqüência suficiente para justificar o fato de ter uma conta por telefone com um bookmaker. Quem poderia dizer que tipo de informações ele teria inconscientemente retido ao ler os retrospectos quando eles apareceram como "prognósticos" em seus sonhos, ou então quantos sonhos ele poderia ter tido e esquecido sobre cavalos vencedores? Houve pelo menos mais um sonho de que se lembrava durante aquele período prolífico, e que enviou para a SPP para possível investigação posterior, mas ela nunca foi realizada.

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Godley e seus amigos com certeza julgaram estar indo muito bem em seus sonhos, mas, para azar deles, estes sofreram uma brusca interrupção. Ele ainda teve mais uma experiência dessas em 1947 e nenhuma outra durante anos. Em 1956, recebeu uma carta inesperada de um astrólogo (antes desconhecido para ele) que expunha com detalhes a razão, por que e quando seus sonhos precognitivos haviam parado e predizendo que iriam recomeçar outra vez no ano seguinte. Na verdade, não houve mais sonhos até a primavera de 1958, quando eles começaram a se manifestar novamente. Godley sonhou com êxito o nome do vencedor do Grande Prêmio Nacional daquele ano, Mr. What, e este foi seguido por outros sonhos precisos de corridas. Mas pelo menos um sonho deixado previamente com a SPP (predizendo que um cavalo chamado Neat Turn venceria o Grande Prêmio Nacional em 1972) não se mostrou correto. Este cavalo nem chegou a entrar na corrida. *

* O próprio Godley explicou mais tarde que o sonho na verdade referia-se a um cavalo chamado Gyleburn, que se pronuncia "Gill-burn".

3. EXPERIÊNCIAS PRECOGNITIVAS EM ESTADO DE VIGÍLIA

Em 1956, O dr. John Peters (um pseudônimo) era um jovem estudante do segundo ano, prestando seu exame de bioquímica na Escola de Medicina de Charing Cross, em Londres. Uma das questões feitas pelos examinadores era uma descrição da síntese dos ácidos gordurosos incluindo uma prova experimental das diferentes etapas dos processos bioquímicos , intermediários envolvidos. Os ácidos gordurosos são um dos produtos finais da digestão humana e um processo de bloqueio básico da gordura do corpo.Em sua resposta o dr. Peters descrevia muitas experiências, cada uma das quais ilustrava algum estágio do processo da síntese. Entre

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elas havia uma decisiva mostrando que o primeiro passo na síntese era a reunião de unidades separadas da molécula acetil-CoA (CH3COO-CoA). Essa experiência, acrescentava ele, havia proporcionado a prova conclusiva de que o acetil-CoA era realmente o material que inicia todo o processo (a partir de certo número de candidatos adequados) através do emprego de uma dupla técnica de classificação: um dos átomos de carbono (C) no acetil-CoA, que fora denominado carbono-14 radioativo, e um dos átomos de hidrogênio (H), classificado com o deutério (hidrogênio pesado). Sem a dupla classificação, resumia ele, teria sido impossível determinar qual das muitas possíveis moléculas de 2-carbono que apareciam como um primeiro estágio na digestão seria a que atuava como substância provocadora da síntese dos ácidos gordurosos.O dr. Peters ficou muito surpreso ao receber de volta seu exame com a nota, verificando que, embora ele tivesse recebido elogios por sua imaginação criativa, o professor havia escrito em tinta vermelha ao lado de sua descrição da experiência da dupla classificação: "Esta experiência pode ser muito boa, mas nunca foi realizada. Ainda não há provas de que o acetil-CoA seja a substância provocadora da mesma"."Mas veja aqui", disse ele ao professor, apontando para suas anotações de aula. "O senhor descreveu essa experiência em suas aulas durante o semestre. Eu anotei no meu caderno!”E realmente havia uma descrição detalhada da experiência da dupla classificação e sua prova conclusiva sobre o papel do acetil-CoA. Apesar disso, o professor garantiu ao dr. Peters mais uma vez que ele não poderia ter dito uma coisa dessas durante suas aulas porque essa experiência jamais fora realizada. Havia, disse ele, uma experiência em que o átomo de carbono fora classificado com um carbono-14 radioativo e uma outra em que o hidrogênio fora classificado com o deutério, mas nenhuma dessas experiências era conclusiva e os bioquímicos ainda estavam no escuro a respeito de qual das muitas possíveis moléculas de 2-carbono seria realmente a substância que provocava a síntese dos ácidos gordurosos.

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O dr. Peters ficou se sentindo muito esquisito na época."Eu não costumava ter alucinações", disse ele, "e, de qualquer maneira, ali estava tudo escrito em meu caderno. Mas acabei esquecendo o assunto.”Oito anos mais tarde, sua memória foi estimulada e ele se sentiu ainda mais estranho."Eu estava lendo um artigo sobre a síntese dos ácidos gordurosos e havia um relatório a respeito da experiência da dupla classificação que eu descrevera enquanto estudante... - e a conclusão de que isso demonstrava, além de qualquer dúvida, que o acetil-CoA era a substância que provocava a síntese. Mas tratava-se do relatório de uma experiência que acabara de ser realizada pela primeira vez e reivindicava proporcionar a primeira prova jamais obtida antes sobre o papel essencial desempenhado pelo acetil.CoA!”Atualmente o dr. Peters é um membro da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, mas nunca relatou sua experiência estudantil aos encarregados das pesquisas da Sociedade."Eu não poderia satisfazer seus critérios de comprovação", explica ele, "pois não guardei o caderno e nem me ocorreu na época que eu poderia necessitar de algum testemunho a respeito. Mas tenho absoluta certeza desses fatos, não é o tipo de coisa que eu iria esquecer...”O caso do dr. Peters seria de precognição? À primeira vista, tudo indica que sim. Seus elementos básicos - um jovem cientista "sonhando acordado" durante uma aula numa escola de medicina anota em seu caderno como fatos os detalhes e resultados de uma experiência que só seria feita oito 'anos mais tarde - são coisas que lembram muitos casos de psicografia ou previsão em transe, que vêm sendo registrados e testemunhados há anos. Esses casos são apenas uma pequena porcentagem do todo, se comparados com o total do grande número de sonhos normalmente citados como possível evidência para a realidade da precognição; mas, os aparentes vislumbres do futuro que mostram são muitas vezes mais precisos ou

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exatos, não contendo o simbolismo e desvios de situações que freqüentemente caracterizam os sonhos.

O Afundamento do "Titanic"

No dia 15 de abril de 1912, o Titanic afundou em sua viagem inaugural a Nova Iorque. Cerca de 1.500 de seus 2.207 passageiros e tripulantes perderam a vida. O desastre foi um choque, não apenas pelas muitas mortes mas por causa da declarada insubmergibilidade do navio. Por suas numerosas e modernas características de projeto e construção, dizia-se que o navio não poderia afundar.Não sendo uma surpresa, se visto à luz da pesquisa em torno do desastre das minas de Aberfan, o incidente com o Titanic também parece haver sido previsto através de diversas visões precognitivas. Muitas eram sonhos, algumas eram visões em transe ou simples "pressentimentos" de que algo sinistro iria acontecer ao navio. Com certeza, o caso mais curioso é o de um romance escrito, aparentemente sobre o desastre, quatorze anos antes que ele ocorresse.Em 1898, um escritor americano, Morgan Robertson, escreveu uma novela chamada Futility, cuja história se passava em torno do afundamento de um suposto gigante da navegação a vapor chamado Titan. No romance de Robertson, o Titan encontra seu destino no Atlântico Norte, durante o mês de abril, numa colisão com um enorme iceberg. O Titan levava 3.000 passageiros e tripulação, grande parte dos quais se perderam porque o navio trazia um número insuficiente de salva-vidas a bordo: apenas 24 (o Titanic tinha vinte, o que também foi considerado bastante inconveniente). Havia outras semelhanças. O Titan viajava a 25 nós no momento da colisão, o Titanic, a 23 nós; o deslocamento do Titan era de 75.000 toneladas, o do Titanic, de 66.000; o Titan tinha 800 pés de comprimento, o Titanic, 882,5; os dois navios tinham três motores de propulsão.

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Escritores especializados em assuntos psíquicos já fizeram muitas especulações sobre a misteriosa. correlação de detalhes que apareciam na novela de Robertson e nos fatos envolvendo o afundamento real do Titanic. Um deles chega ao ponto de afirmar que Robertson fora um marinheiro sem nenhuma educação e que Futility fora "ditado" a ele enquanto estava em estado de transe; um "companheiro astral escritor" o teria ajudado a datilografar o romance. Outras declarações são mais cautelosas.O dr. Ian Stevenson, professor de Psiquiatria na Universidade da Virginia e antigo presidente da Associação Parapsicológica, fez um estudo completo das experiências aparentemente paranormais (dezenove ao todo) associadas ao afundamento do Titanic, entre as quais o caso do romance de Robertson. Ao reconhecer que, à primeira vista, os muitos pontos de correspondência entre detalhes do romance e do acontecimento real sugerem com muito vigor uma certa consciência precognitiva da parte de Robertson, Stevenson argumenta que, como alternativa, muito disso poderia ser atribuído a uma interferência inteligente. Depois de observar que na década de 1890 se falava muito sobre a nova era dos grandes navios de passageiros a vapor, ele diz:

Graças a uma perspicaz consciência da crescente e cada vez mais exagerada confiança do homem na engenharia naval, uma pessoa criativa poderia fazer deduções suplementares sobre detalhes da

tragédia por acontecer. Um grande navio provavelmente teria grande potência e grande velocidade; o nome Titan tinha uma conotação de

força e segurança há muitos séculos; uma confiança excessiva levaria a uma negligência quanto à necessidade de botes salva-vidas; a

imprudência poderia conduzir o navio através de áreas do Atlântico Norte cobertas de icebergs, que se movimentam para o sul (partindo

da região polar) durante a primavera do hemisfério Norte, fazendo com que abril seja o mês ideal para colisões... Chegando-se a esta conclusão geral sobre a probabilidade de um desastre como este,

deduções como as que sugeri poderiam suprir o detalhamento para

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uma correspondência que assim teria a aparência de uma precognição, mas que deveríamos, a meu ver, considerar apenas

como deduções muito bem-sucedidas e nada mais...

G. W. Lambert, antigo presidente da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, concorda com esta avaliação de Stevenson, oferecendo ainda a informação complementar de que o autor de Futility estudara noções da ciência náutica e tinha conhecimento suficiente a respeito de projeto naval que lhe permitiriam especular sobre futuros progressos nesse campo.Outros dois exemplos do que parecem ser experiências precognitivas, em estado desperto, associados ao desastre do Titanic não podem ser rejeitados tão facilmente. Um, é uma "visão" e o outro, um "pressentimento" .Em 10 de abril de 1912, o dia em que o Titanic deixou as docas do porto de Southampton para sua viagem à América do Norte, a esposa do sr. Jack Marshall olhava do terraço de sua casa a passagem do navio através do estreito canal que separa a Inglaterra da ilha de Wight. De súbito, ela virou-se para seus familiares, que estavam com ela, e disse, em estado de grande agitação:

Esse navio vai afundar antes de chegar à América!... Não fiquem aí parados olhando para mim! Façam alguma coisa! Seus loucos. Eu

estou vendo centenas de pessoas lutando nas águas geladas! Vocês estão tão cegos que vão deixar todos se afogar?

Embora todos da família lhe assegurassem que era impossível o Titanic afundar, Mrs. Marshall não conseguiu acalmar-se e permaneceu nesse estado de agitação até cinco dias depois, quando se verificou que sua visão correspondia à realidade.Um "pressentimento" associado ao afundamento do Titanic foi o presságio forte o bastante para fazer com que um jovem abandonasse a perspectiva de uma carreira melhor, preferindo não seguir no navio em sua viagem inaugural, o que salvou sua vida. Colin Macdonald, um

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engenheiro naval de 33 anos, foi convidado para o posto de segundo engenheiro no novo e portentoso navio, mas, apesar de o convite representar uma considerável promoção, Colin recusou-o. O oferecimento foi repetido três vezes, mas ele recusou as três com firmeza. O homem que aceitou o posto acabou perdendo a vida quando o navio afundou.

Previsão numa Sessão Espírita

Muitas das experiências paranormais associadas com o Titanic estudadas pelo dr. Stevenson em seu levantamento manifestaram-se em "sensitivos" ou clarividentes que "viram" um navio afundando ou algum desastre no mar poucos dias antes da tragédia. Pessoas com este dom costumam ser citadas em relação a experiências de precognição, em estado desperto, e muitas vezes também realizam suas previsões em sessões preparadas com esse objetivo. Frank Podmore, embora achando inconclusiva a credibilidade de muitas sessões, relatou um caso que sentia estar particularmente bem documentado.Uma inglesa chegada há pouco tempo em Boston, identificada como sra. P., foi levada para visitar uma médium clarividente pelo famoso abolicionista, William Lloyd Garrison. Segundo a sra. P., aconteceu o seguinte:

Embora eu houvesse chegado a Boston no dia anterior, os guias do médium logo reconheceram que eu viera por mar e desvendaram não apenas minha vida passada, mas boa parte do futuro. Disseram que

eu trazia comigo uma fotografia de minha família, e quando a apresentei, a médium me disse (em transe) que dois de meus filhos estavam no mundo dos espíritos. Além disso, apontando para um de meus filhos no grupo, disse mais: "Este logo estará lá também, ele

morrerá de repente... mas você não deverá chorar por ele: ele estará a salvo de um mal que estaria por acontecer. Em geral não devemos

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dizer essas coisas, mas estou vendo que é melhor para você, que você pode ficar sabendo que não é por acidente.“

Estive fora de casa por muitas semanas, e só quando voltei é que soube que meu filho, um rapaz forte de dezessete anos, morrera num

jogo de futebol.

Casos modernos de previsões feitas durante sessões espíritas surgem de tempos em tempos em livros e jornais especializados em questões psíquicas, mas tantos médiuns já foram apanhados em atos fraudulentos e tão poucos consentiram numa rigorosa investigação de suas práticas, que se deve ter alguma reserva antes de aceitar seus prognósticos como prova de qualquer capacidade ou dom precognitivo.

Previsões em Estado de Transe

Quando Goethe tinha 22 anos e acabara de se separar de Fredericka Brion, por quem estava apaixonado, ele parece haver entrado espontaneamente no tipo de transe normalmente associado a médiuns; no tempo em que ficou nesse estado, ele teve o que poderia ser considerada uma visão precognitiva. Contou a experiência em Dichtung und Wahrheit.

Eu agora estava a cavalo, pela trilha que leva a Drusenheim, quando uma das mais estranhas experiências sucedeu comigo. Não com os

olhos do corpo, mas com os do espírito, eu via li mim mesmo, montado a cavalo, e vindo em minha direção por algum caminho, vestido com uma roupa de um gênero que nunca usei, de uma cor

cinza-pálido com alguma coisa dourada. Quando saí do devaneio, a forma desapareceu. Mas o estranho é que oito anos depois eu me encontrei de volta àquela mesma trilha para visitar Fredericka mais

uma vez e estava usando a roupa que havia sonhado - e isso não fora planejado, mas aconteceu por acaso... Seja como for, o estranho

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fantasma teve uma influência tranqüilizadora em meus sentimentos, nos momentos que se seguiram à separação.

Naturalmente, nesse caso de Goethe, só existe sua palavra de que ele tenha tido a visão narrada e não há meios de agora se estabelecer que papel possa ter desempenhado qualquer memória subconsciente na escolha de uma roupa para usar nesse seu encontro com Fredericka Brion. Desde a fundação da Sociedade para a Pesquisa Psíquica muitas visões semelhantes foram relatadas, uma boa parte delas corroboradas por testemunhos independentes e investigadas minuciosamente.Frank Podmore contou o caso de certa senhora de Glasgow, a sra. McAlpine, que talvez tenha tido uma visão precognitiva em aparente estado de transe. Esperando um trem em Castleblaney, a sra. McAlpine sentou-se numa pedra, próximo de águas correntes, entregando-se inteiramente à apreciação do vigoroso pôr-do-sol e à da beleza da paisagem ao redor. Mas seu estado idílico logo foi perturbado:

Não havia um som ou movimento algum, a não ser o suave rumorejar da água na areia a meus pés. Senti um arrepio gelado percorrendo

meu corpo e uma estranha rigidez em meus braços e pernas e eu não conseguia me mexer, embora desejasse fazê-lo. Senti um temor, mas

era como se estivesse presa naquele ponto, e como se algo me compelisse a olhar para as águas à minha frente. Aos poucos, uma

nuvem negra pareceu subir, e no meio dela vi um homem alto, vestido numa roupa de tweed, pular na água e afundar.

Logo depois a escuridão se foi, e em seguida voltei a sentir o calor e a luz do sol, mas estava assustada e sentia algo "misterioso".

Poucos dias depois da visão da sra. McAlpine, um bancário suicidou-se, pulando nas águas exatamente onde ela estivera sentada, mas Podmore faz uma advertência sobre quais as conclusões a serem extraídas dessa cadeia de fatos. Como no sonho aparentemente

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precognitivo de Frederick Lane na noite anterior ao assassinato de William Terriss, citado anteriormente, Podmore acha que a visão supostamente premonitória da sra. McAlpine poderia ter sido um caso de telepatia, mais do que de precognição - levando-se em consideração a grande possibilidade de o bancário suicida ter estado pensando sobre seu próprio fim durante alguns dias antes.A possibilidade de que a telepatia possa servir para explicar muitos fatos espontâneos que à primeira vista parecem precognitivos costuma ser levantada pelos escritores sérios especializados neste campo e deveria estar sempre em mente (com a dedução subconsciente) como hipótese alternativa para provar a existência da precognição. Mas sempre existem casos em que, se tão bem fundamentados quanto deixam parecer, não cabem em nenhum desses modelos alternativos. Alguns dos que estão associados ao desastre das minas de Aberfan ilustram isso.No dia 21 de outubro de 1966, o dia anterior ao desastre, Constance Milder, de Devon, disse ter visto o desastre numa visão em estado desperto.

Primeiro, eu "vi" uma escola velha num vale e depois um mineiro do País de Gales, e só então uma avalanche de carvão deslizando por um lado da montanha. No sopé da montanha onde caía a avalanche barulhenta havia um garotinho com uma franja comprida, que parecia

apavorado. E depois, por um bom tempo, "vi" equipes de resgate começando a agir. Tive a impressão de que o garotinho fora deixado para trás e salvo. Ele parecia tomado pelo sofrimento, nunca poderei esquecê-lo... Junto com ele estava um dos homens encarregados do

resgate, que usava um boné com uma pala bastante incomum.

Constance Milder contou sua visão a seis testemunhas num encontro do Círculo Privado de sua Igreja Espírita e também falou sobre ela à vizinha, antes que qualquer uma dessas pessoas tivesse visto as notícias que falavam do desastre na televisão. Na verdade, certos

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detalhes daquele noticiário trouxeram à luz uma característica interessante da visão de Constance."E o que é ainda mais estranho", escreveu ela ao dr. Barker ao contar-lhe a visão, "é que enquanto eu assistia 'A montanha que deslizou' na televisão, domingo à noite, vi o garotinho aterrorizado falando com um repórter e o homem que fazia o resgate, os mesmos que estavam em minhas 'visões'". Barker notou que muitos dos casos confirmados de visível precognição contados a ele permitiam que o perceptivo fosse este um sonhador ou um visionário - pudesse captar imagens de suas experiências precognitivas na televisão ou em fotografias de jornais que mais tarde narravam o desastre. Outros pesquisadores também comentaram a respeito da correspondência que freqüentemente havia entre as imagens precognitivas e as publicamente difundidas por rádio, televisão ou jornais que mais tarde apareceram. Essa correspondência entre tais imagens poderá ser importante em tentativas posteriores para a compreensão de como funciona a precognição.Duas semanas antes do desastre de Aberfan, outra espírita, uma senhora de Coventry, levantou-se durante uma reunião de um Círculo de Desenvolvimento Espiritual no Lar, resmungando, angustiada e. agitando as mãos, dizia:

... uma coisa vinda do chão... terra... corpinhos queridos... estou escutando água... muito, muito frio... jamais aconteceu antes... vocês vão ficar chocados... nunca mais deverá acontecer... aqueles homens

que ficam mexendo com a natureza... eles não estão entendendo o mal que fazem... vai abalar todo o país.

A mulher encontrava-se num estado de transe profundo quando emitia essas palavras, mas outras que estavam presentes as relataram ao dr. Barker e tinham a certeza de que se relacionavam com os fatos de Aberfan.

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Textos Premonitórios

Este último caso do estudo de Aberfan era menos articulado e continha menos detalhes definidos do gênero que normalmente distinguem os sonhos ou visões precognitivas. Parece, a partir deste fato, ter havido uma previsão do acontecimento em Aberfan, devido a certas frases atormentadas ("corpinhos queridos", "mexendo com a natureza"), mas o seu caráter vago e aberto para uma interpretação lembra mais alguns dos oráculos de Delfos ou as profecias de Nostradamus do que a maioria dos casos modernos de visão precognitiva. Isso também é verdadeiro quanto a determinados tipos de "psicografia" que neste século foram entregues à SPP de tempos em tempos. Apesar de vagos e de algumas vezes cheios de simbolismo, contêm em geral imagens, palavras ou frases-chave, que os tornam merecedores da mais séria consideração como possíveis exemplos de precognição.O caso da sra. Verrall é citado com freqüência na literatura da pesquisa psíquica. Era uma professora de letras clássicas em Cambridge e fazia parte de um grupo de pessoas ilustres que no início do século esteve associado a um projeto conhecido como "Correspondências cruzadas", que estudava a possibilidade de comunicação com os mortos. (O dr. Alan Gauld discute os resultados dessas pesquisas em outro livro desta série, Mediumship and Survival: A Century of Investigations.) Ela era notável pelo dom da psicografia: transcrevia mensagens em estado de transe, que seriam ditadas por alguma pessoa que tinha algum objetivo e já havia morrido. No dia 11 de dezembro de 1901, a sra. VerralI escreveu:

Nada significam também as ajudas menores, dá confiança. Por isso, Frost e uma vela na luz imperceptível. Marmontel. Ele estava lendo num sofá ou numa cama... e só havia a luz da vela. Ela certamente

lembrará disso. O livro foi emprestado - ele falou sobre isso.

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No dia 17 de dezembro, ela escreveu:

Marmontel está certo. Era um livro francês, acho que um livro de memórias. Passy pode ajudar, lembranças de Passy ou Fleury.

Marmontel não estava na capa... o livro estava encadernado e foi emprestado... dois volumes numa encadernação e numa impressão antiquadas. Não está em nenhum documento. .. é uma tentativa de

fazer alguém lembrar... um incidente.

Dois meses e meio depois, o sr. Marsh, um amigo da sra. VerralI, veio para jantar. Ele mencionou casualmente durante a conversa que recentemente (dias 20 e 21 de fevereiro) havia estado lendo Marmontel's Memoirs durante uma viagem a Paris. Disse haver tomado o livro, um dos três volumes, emprestado da Biblioteca de Londres e que em Paris o havia lido deitado (no dia 20 de fevereiro na cama, no dia 21, em duas poltronas), à luz de uma vela. Não havia gelo em Paris, mas contou que estava muito frio. Como a maioria das obras da Biblioteca de Londres, o livro estava encadernado, e não numa encadernação moderna, e o nome Marmontel aparecia no verso. E quando a sra. Verrall perguntou ao sr. Marsh se "Passy" ou "Fleury" tinham alguma coisa a ver com sua leitura de Marmontel, ele pôde lembrar que certa passagem que havia lido dia 21 de fevereiro continha uma descrição de uma cena em Passy e que a cena estaria ligada a uma história em que Fleury tinha importante participação.Embora haja poucas discrepâncias entre os detalhes descritos no texto da sra. VerralI e os realmente ligados à leitura do sr. Marsh em Paris, seu texto parece conter alguma previsão misteriosa da leitura. Ela havia enviado o texto para uma pesquisadora independente, a sra. Sidgwick, da SPP, antes de encontrar o sr. Marsh para jantar e ficar sabendo de sua leitura. A escritora e autora teatral Dame Edith Lyttelton também era membro da SPP e, escrevendo sob o pseudônimo "sra. King", submeteu muitos textos de psicografia à avaliação de um grupo de intérpretes que incluía o segundo Conde de

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Balfour, o físico Sir Oliver Lodge e J. G. Piddington, Secretário Adjunto da SPP. Atribuindo seus relatos a quem estava em comunicação, Dame Edith escreveu textos que pareciam prever coisas como o afundamento do Lusitania (torpedeado por um submarino alemão em 1915, o que causou a morte de 1.200 pessoas), o Tratado de Munique, que abria a Tchecoslováquia à invasão alemã no início da II Guerra Mundial e o início da própria guerra, com uma referência indireta a Hitler.Em fevereiro de 1914, Dame Edith escreveu: "O Lusitania faz espuma e fogo... mistura a chaminé - em arcos dobrados..." E em maio daquele ano, acrescentou: "... abram seus ouvidos ao desconhecido: o medo é o arquiinimigo. Lusitania." O Lusitania foi afundado em maio de 1915, por um único torpedo a estibordo, logo abaixo da ponte. No impacto, o torpedo detonou a carga de 4.200 caixas de munição para rifles que o navio carregava, deixando-o em fogo e formando uma grande nuvem de fumaça sobre a chaminé.Andrew MacKenzie estudou detalhadamente esse caso, buscando alguma correspondência entre o texto de Dame Edith e o afundamento real do navio, embora não pudesse encontrar nenhuma coincidência mais definida além da menção de "fogo" e "chaminé". Ele observa que as palavras "o medo é o arquiinimigo" costumam ser interpretadas como referência à desnecessária perda de vidas pelo pânico a bordo quando o torpedo bateu no navio, mas oferece uma outra sugestão. Em geral, no meio deste tipo de psicografia, mensagens que parecem vir de alguma pessoa morta são inseridas a título de aguilhão ou reforço moral à pessoa que transmite a mensagem: não tenha medo de ouvir esta comunicação, não receie parecer maluco etc., e esse pode ser o caso de "o medo é o arquiinimigo" a que o texto de Dame Edith se refere, sendo esse medo da pessoa receptora o arquiinimigo do "morto" que tenta comunicar-se.Um dos "textos da Segunda Guerra" de Dame Edith, embora um tanto suspeito pelo cifrado, contém frases atormentadoras, uma das quais possivelmente uma referência a Hitler:

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Carnificina nos campos do Ocidente... marchas... a vinha nas colinas... a época da vindima... vôo... agora anote isso... por trás das cortinas da

escuridão há uma luz, nunca ponha isso em dúvida... esteja em boa disposição.

A mão estendida para ficar em Bechtesgaden - Markovitch.

O texto foi escrito em maio de 1915, em meio a toda a carnificina da I Guerra Mundial, e assim as referências a "carnificina", "campos" e "vôo" podem muito bem ser um simples reflexo das preocupações de Dame Edith quanto aos horrores da guerra de seu tempo, antes de uma guerra futura. Da mesma forma, "por trás da escuridão há uma luz" poderia ser uma antecipação da preocupação que a levou a tornar-se uma voz ativa na Liga das Nações. Mas e o "Bechtesgaden"?"Berchtesgaden" era o nome do refúgio de Adolf Hitler nas montanhas, perto da fronteira austríaco-alemã e onde se desenrolaram os fatos que levaram à II Guerra Mundial, mas era também um recanto turístico popular na Alemanha, cuja menção ocorria naturalmente de tempos em tempos na imprensa. Estaria o texto de Dame Edith simplesmente refletindo alguma leitura recente sobre Berchtesgaden ou sua mão teria sido realmente guiada para anunciar o papel a ser desempenhado pelo refúgio? Esta última possibilidade, tênue como se possa considerar, é a razão pela qual o texto é citado tantas vezes como um possível exemplo de precognição.

Durante o conflito russo-polonês logo depois da I Guerra Mundial, uma médium auditiva polonesa, conhecida como Madame Przybylska, ouviu mensagens que pareciam dar detalhes sobre os futuros desenvolvimentos nos respectivos destinos dos exércitos russo e polonês e na situação política da Polônia. Suas mensagens foram gravadas durante uma série de sessões espíritas particulares com amigos nos meses de junho e julho de 1920 e aparentemente relacionavam-se a acontecimentos de julho e agosto de 1920.

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A primeira mensagem de Madame Przybylska foi ditada num período em que o exército polonês tinha a supremacia em todas as frentes e os bolcheviques estavam em desonrosa retirada. Mas ela afirmou:

O Conselho dos Ministros ainda não foi constituído, mas, mais cedo ou mais tarde, se ouvirá falar de Witos.

Que azares! Que infelicidade! Quantos mortos em seus campos de batalha! Um desastre para suas tropas...

Durante este mês haverá uma grande mudança no Conselho. Witos será o primeiro-ministro.

Um homem maior que seus ministros dará uma ajuda a vocês. Em agosto tudo irá mudar. Um estrangeiro chega, a quem Pildsudki irá

pedir conselhos, ele será muito influente.As greves sistemáticas chegarão ao fim. Em meados de agosto vocês

verão seus azares mudarem. [10 de junho de 1920]

Como aconteceu, os bolcheviques começaram uma ofensiva geral inesperada na frente norte da guerra no dia 28 de junho e o exército polonês viu-se obrigado a se retirar de Munique, Vilna e Lida. A própria Varsóvia foi ameaçada, embora, conforme previsão de Madame Przybylska, a cidade nunca tenha sido invadida. No dia 12 de julho, ela dizia a seu pequeno auditório particular das personalidades da sociedade de Varsóvia:

O poder de Lênin cresce. Uma certa multidão de homens invade o seu país, vocês abandonam os campos. Mas não tenham medo, eu abençôo sua cidade, o desastre só acontecerá na margem direita do Vístula e tudo mudará para melhor... Varsóvia não está na margem direita. Eles não entrarão em Varsóvia.

O interessante das mensagens de Madame Przybylska é que, ao contrário dos textos cifrados de Dame Edith Lyttelton, elas estão cheias de detalhes muito específicos e bastante precisos. Não apenas

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aconteceu a inesperada inversão inicial na sorte do exército polonês, mas também foi verdade que essa mesma inversão iria inverter-se novamente em meados de agosto: os poloneses foram capazes de proclamar a vitória no dia 15 de agosto. Além do mais, esse eventual êxito da Polônia deveu-se muito à intervenção de um estrangeiro, o general Weygand, que chegou para aconselhar Pildsudki e também foi verdade que Witos, um político antes desconhecido, chegou ao posto de primeiro-ministro. Outras "mensagens" faladas durante esses meses de verão eram da mesma forma precisas, predizendo locais e resultados de batalhas. Por exemplo, dia 12 de julho, ela disse: "Minsk, Kowel e Vilna estão perdidas. Próximo a Kowel muitas pessoas ricas serão fuziladas. Notícias terríveis vêm da província. Mas dentro de um mês tudo mudará".Nas semanas seguintes, Minsk, Kowel e Vilna foram perdidas, embora tenham sido recapturadas na vitória de 15 de agosto.

Precognição Auditiva

Às 8h30min da manhã do dia 3 de junho de 1964, a falecida Lady Juliet Rhys Williams, ativo membro do Partido liberal da Inglaterra, vice-presidente do Conselho de Pesquisa Econômica e uma ex-diretora da BBC, juntou-se a suas duas filhas para o café da manhã em sua casa no bairro de Belgravia, em Londres. Como por acaso, contou a elas a notícia de que o senador Barry Goldwater havia acabado de derrotar o governador Nelson Rockefeller nas eleições primárias da campanha presidencial na Califórnia. Explicou ter ouvido a notícia no rádio ao acordar, entre às 6h30min e às 7h30min daquela manhã.Contando as notícias do rádio, Lady Rhys Williams lembrava haver ouvido o locutor dizer que a votação se encerrara na noite anterior e que o resultado pôde ser divulgado tão rapidamente porque pela primeira vez numa eleição o processo de contagem dos votos era inteiramente computadorizado, o que jamais acontecera no mundo. O

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governador Rockefeller havia admitido a derrota antes de ir para casa. Ela ouviu os ruídos de muita gente numa sala grande enquanto o comentarista dizia que "estavam indo para a Califórnia" para uma reportagem; reconheceu típicas vozes americanas na sala e escutou ainda o comentarista dizer que o senador Goldwater não poderia chegar até o microfone porque havia deixado o escritório de sua campanha para ir a um barbeiro, fazer a barba e lavar o cabelo antes de ir para casa.Não há nada de anormal na irradiação das notícias que Lady Rhys Williams ouviu, a não ser o fato de que a primeira transmissão a irradiar a vitória de Goldwater foi da rede CBS americana, que transmitiu a notícia às 10h39min da manhã, no horário de Nova Iorque (15h39min em Londres), sete horas depois que Lady Rhys Williams mencionou a notícia irradiada a suas filhas durante o café da manhã. A primeira transmissão da BBC sobre as eleições aconteceu às 17h30min do mesmo dia e nela a BBC ainda dizia que Rockefeller não admitia á derrota.Este caso é interessante não só porque Lady Rhys Williams parece ter tido algum legítimo conhecimento precognitivo do resultado das eleições antes de ele ter sido anunciado, mas também porque ela escutou sua "visão" precognitiva. A grande maioria dos casos relatados de aparente precognição gira em torno de alguma espécie de imaginário visual - em sonhos ou visões acordadas. Casos auditivos como este são bastante raros, embora aparentemente não na vida de Lady Rhys Williams.Seis meses depois de sua experiência de "escutar" a irradiação da vitória de Goldwater, ela teve uma experiência semelhante de "pré-audição" que contou em detalhes à SPP inglesa. Dessa vez, ela estava em sua casa de campo em Gales e resolveu ligar o rádio, às 4 horas da manhã do dia 17 de janeiro de 1964, para escutar uma transmissão da "Voz da América" que anunciava sérias violências raciais em Atlanta, na Geórgia, quando explodiu uma luta entre membros da Ku Klux Klan e uma grande multidão de negros. Como tinha muito interesse nessas questões, ela sintonizou a BBC mais

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tarde naquele dia, procurando em vão também pela imprensa inglesa para saber maiores noticias sobre as desordens em Atlanta. Não havia nenhuma e ela comentou com as duas filhas e uma vizinha, achando estranho que um caso tão grave fosse mencionado apenas uma vez numa única transmissão por rádio.Quando Lady Rhys Williams voltou a Londres no dia 26 de janeiro, ouviu uma notícia na BBC sobre gravíssimas agitações raciais em Atlanta, mas dessa vez havia reportagens que iam acompanhando o caso na imprensa inglesa e na americana. Estando agora muito curiosa quanto às agitações noticiadas na manhã de 17 de janeiro, Lady Rhys Williams escreveu para a "Voz da América" em Washington a fim de indagar a respeito de transmissões anteriores. Eles confirmaram que houvera uma explosão anterior das agitações no dia 20 de janeiro e que o primeiro prenúncio do problema que viria fora uma perturbação em Atlanta ao anoitecer do dia 18 de janeiro, quando a polícia teve de ser chamada. A "Voz da América" havia irradiado essa agitação anterior, só que a transmissão ocorrera cerca de 48 horas depois que Lady Rhys Williams escutou pela primeira vez a notícia.

Jogadores Precognitivos

O caso de John Godley, hoje Lord Kilbracken, discutido no capítulo anterior, é o melhor caso registrado de alguém que tenha sonhado com êxito os resultados de corridas de cavalos antes de elas acontecerem. Há muitos outros exemplos registrados de alguém que tenha feito apostas em determinado cavalo ou em determinado número por ter tido um "pressentimento" logo antes de fazer a aposta (e estando inteiramente acordado), mas o caso que vem a seguir parece ter outros aspectos mais definidos que o tornam interessante. É ao mesmo tempo um caso de precognição em estado desperto e particularmente a maneira pela qual aconteceu a maioria dos "Iampejos" (como ela os chama) precognitivos da jogadora é que o

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torna relevante a ponto de destacá-Io para tentativas que faremos mais tarde (no Capítulo 12) de aplicar modelos da mecânica quântica ao problema da precognição.Este caso não foi registrado antes, e, embora a jogadora em questão estivesse querendo cooperar nas tentativas de corroborar suas experiências, a natureza destas tornaria isso bem difícil na maioria dos casos. Se os ganhos foram obtidos da maneira que ela descreve, depende de seu próprio discernimento e honestidade. Ela agora é membro da SPP, mas garante que não tinha nenhum interesse em fenômenos psíquicos antes de começarem suas estranhas experiências no jogo. Ela escreveu o relatório abaixo, assinando apenas "srta. H. R.":

Tive meu primeiro "lampejo" em 1973, pouco antes do Grande Prêmio Nacional Eu não sabia nada sobre corridas de cavalos e jamais havia estado em nenhuma casa de apostas, mas todo o rebuliço em torno

desta corrida (a srta. H. R. é canadense) me deu vontade de apostar. Olhei para a lista dos cavalos, afixada na parede da loja de apostas, e Red Rum simplesmente saltou na minha direção. Apostei a 15 por 1 nele e, claro, ganhei. Foi a primeira vitória de Red Rum no Grande

Prêmio Nacional, e naquele ano ele não era o favorito.No ano seguinte, apostei em Red Rum no Grande Prêmio, mas foi só um caso de uma decisão com base no retrospecto. Em 1975, 1976 e 1977, tive a mesma experiência com o nome de um cavalo (e duas

vezes o de um relativamente desconhecido) "pulando" na minha direção enquanto eu espiava a lista dos cavalos na loja de apostas.

Nestes anos ganhei com L'Escargot, Rag Trade e Red Rum. Até hoje não sei nada sobre "retrospectos" e não me interessei mais por

corridas a não ser o Grande Prêmio.A primeira vez que entrei num cassino, fui levada por um amigo, há três anos. Eu nunca estivera em nenhum outro e nada sabia sobre jogos de cassino mas fiquei encantada com a roleta e resolvi tentar

minha sorte ali. Eu só tinha três libras comigo e apostando no vermelho ou no preto, fui conseguindo chegar a 23 libras antes de

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parar. Coloquei toda essa minha sorte na conta da "sorte do iniciante" e não pensei mais no caso durante meses.

Foi então que perdi meu emprego. Estava desesperada com o pouco dinheiro. Foi quando voltei ao cassino e notei pela primeira vez que o

fenômeno iria acontecer de novo toda vez que eu precisasse de dinheiro por alguma razão muito legítima, como pagar o aluguel, ou

pagar alguma conta. Notei que, de vez em quando, eu tinha um sentimento muito "forte" sobre um determinado número, e que este

número saía.Jogava na roleta muitas vezes, desde que me dei conta desse

"palpite” que tinha com os números e pude notar um padrão nos palpites. O que realmente acontece quando tenho o "palpite" é que minha atenção é atraída de repente para um número no pano da

roleta e não na roda. Simplesmente noto que meus olhos ficam presos nele. E quando isso acontece é quase sempre bem em cima daquele

segundo antes do crupiê dizer "jogo feito", embora já tenha acontecido de minha atenção ter sido atraída no instante em que a roda

começava a girar. Nunca tive um lampejo antes de a bolinha haver deixado a mão do crupiê.

Esses lampejos precognitivos não acontecem todas as vezes que a roda começa a girar, mas ocorrem com freqüência suficiente para

garantir que quase sempre eu saia bem numa rodada do jogo. Uma vez ou outra o lampejo é um "quase" em vez de um acerto direto -

quer dizer, minha atenção é atraída para um número na mesa, mas, na verdade, é o número ao lado que sai.

Há dois outros aspectos de minhas experiências na roleta que talvez tenham alguma importância. Quando tenho esses lampejos minha

concentração é tanta que fico numa espécie de transe e quase esqueço de tudo ao meu redor. Fico mental e fisicamente exausta

depois de uma hora dessa concentração e preciso de um dia inteiro para recuperar a capacidade de concentração normal de meu cérebro.

A outra coisa é que se fico ávida, tentando ganhar mais dinheiro do que realmente preciso, ou se vou para o cassino por simples

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divertimento, não tenho os lampejos: tenho a mesma sorte de qualquer outro jogador em volta da mesa.

Como veremos mais adiante, em discussões sobre a mecânica da precognição, em sua possível relação ao fenômeno quântico e em relação às tentativas para sua investigação sob condições de laboratório, os aspectos mais interessantes das experiências da srta. H. R. na roleta são as seguintes:1. o fato de ela ter seus lampejos apenas uma fração de segundo antes que a bolinha caia em alguma posição na roleta;2. que de vez em quando ela tenha um "quase" em seu lampejo, em vez do número a que foi atraída; e 3. que isso exige uma concentração mais profunda que a normal para os lampejos surgirem.Sua incapacidade de ganhar dinheiro quando não precisa dele realmente para uma necessidade urgente está dentro da tradição do oculto, de que a capacidade psíquica é um dom que não seria bem empregado se voltado para o simples lucro. Essa mesma tradição aparece registrada em outro caso de “jogo psíquico".Em sua coleção de visões e premonições, Johann Jung-Stilling, um físico e professor que acreditava no sobrenatural e era amigo de Goethe, conta a história de um farmacêutico de Berlim, o dr. Christopher Knape. Quando aprendiz, Knape sonhava com exatidão o número vencedor na loteria federal e ganhava uma pequena importância em dinheiro. Poucos anos depois, ele sonhou com números de loteria mais uma vez, mas só conseguiu lembrar dois dos cinco dígitos, e com alguma incerteza; jogou muito cautelosamente e conseguiu ganhar apenas o equivalente a vinte dólares. Mas, no ano seguinte, ele sonhou com tal clareza que resolveu apostar tudo o que tinha. Investiu pesadamente só para descobrir que teria de receber o dinheiro de seu investimento de volta, porque todos os bilhetes com aquele número já tinham sido vendidos. O número ganhou a loteria daquela vez, mas o dr. Knape não ganhou nada por seu sonho.

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4. ESTUDOS EXPERIENTAIS DE PRECOGNIÇÃO

A maioria dos casos de previsão ou precognição discutidos até agora, como a maioria dos casos de PES em geral, foram espontâneos: simplesmente aconteciam. Sem nenhuma provocação ou advertência, e muitas vezes com efeitos inquietantes, pessoas muito comuns no dia-a-dia mais simples de suas vidas têm, de vez em quando, previsões de acontecimentos futuros, comunicações telepáticas, sons de coisas que "surgem no meio da noite" e diversos outros tipos de acontecimentos ainda mais estranhos que constituem o conjunto dos chamados "fenômenos psíquicos".As vantagens de se estudar casos espontâneos de PES é que existem muitos deles, e muitas vezes os que estão registrados "são uma boa leitura". A desvantagem é que os casos espontâneos são imprevisíveis, incontroláveis (e assim, abertos a muitas interpretações) e, com certa freqüência, inacreditáveis - às vezes até para as próprias pessoas que passaram pela experiência.Por volta do final do século passado, tornou-se claro para investigadores sérios que se esses fenômenos devessem ser compreendidos - ou pelo menos verificados - teriam de ser observados sob condições experimentais controladas. Para isso, fundou-se, em 1822, a Sociedade para a Pesquisa Psíquica. O objetivo dos membros fundadores era voltar a luz desapaixonada do método científico rigoroso para as até então obscuras águas dos, fenômenos psíquicos. Seus sucessores foram bem sucedidos - a ponto de, hoje em dia, a parapsicologia chegar a ser quase mais científica que a própria ciência. Computadores, quadros estatísticos e técnicos de laboratório que repetem, pacientemente, por milhares de vezes, experiências monótonas já substituem o mundo colorido dos médiuns e dos que lêem a sorte. Enquanto seus colegas físicos no laboratório vizinho gozam dos prazeres de uma Alice no país das maravilhas diante de uma especulação desenfreada sobre a

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aparentemente infinita proliferação de sempre novas partículas subatômicas, no laboratório de parapsicologia é comum tentar invalidar uma experiência interessante. De maneira obstinada, a coisa maçante tornou-se a medida para o sucesso na parapsicologia experimental.Mas este lado experimental da parapsicologia - a tentativa de induzir o fenômeno psíquico no laboratório, sob pressão e em condições controladas - é apenas um ramo dos esforços de pesquisa do século passado. Fora do laboratório, muitos membros da SPP continuam em sua tarefa de anotar e investigar cuidadosa e escrupulosamente fenômenos espontâneos que ainda acontecem à sua maneira. E assim, voluntários da Sociedade muitas vezes se prestam a permanecer numa casa que dizem ser assombrada, esperando pela aparição residente, ou entrevistam com toda paciência quaisquer pessoas a quem um sonhador receptivo tenha contado os detalhes de algum sonho aparentemente precognitivo antes que suas previsões aconteçam.Talvez por ironia, o primeiro estudo experimental e realmente sistemático tenha sido empreendido por uma pessoa que não era filiada à Sociedade para a Pesquisa Psíquica e que dizia-se gozar de um relacionamento "frio e infrutífero" com a Sociedade mesmo em seu melhor período. Trata-se de J. W. Dunne. Com sua obra An Experiment with Time, hoje um clássico, pode-se dizer com justiça que ele "colocou a precognição no mapa.”

O "Deslocamento no Tempo" de J. W. Dunne

Dunne, um engenheiro aeronáutico nascido em 1875, era um homem quase em guerra com o Tempo - pelo menos com a noção convencional que temos dele. Dedicou grande parte de sua vida ao projeto de provar que a precognição é um fato a ser levado em consideração. E não se pode dizer que ele tenha sido tão

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malsucedido. "Se a previsão é um fato, é um fato que destrói toda a base de nossas suposições anteriores sobre o universo.”Embora o estudo experimental da precognição de Dunne consistisse apenas num meticuloso registro de seus próprios sonhos e depois numa comparação com fatos posteriores para medição, An Experiment with Time, publicado em 1927, foi na verdade o primeiro estudo que tratava a precognição como assunto sério. Ele usou a precognição como prova contra certa visão de tempo que ele sabia (consciente como era pelo menos das mais amplas implicações dos trabalhos de Einstein) desnecessariamente estreita e antiquada, e escreveu a respeito de maneira a incitar a imaginação de pessoas que não poderiam chegar a essa nova visão do Tempo através das equações, na época quase incompreensíveis, de Einstein.Dunne expunha sua própria Teoria do Tempo Seriado que tinha como ponto de partida a característica óbvia de uma consciência de si mesmo bastante reflexiva. Por exemplo: se X tem a consciência das palavras impressas na página de um livro, existe também um aspecto de X que está consciente de sua consciência sobre estas palavras, e assim por diante. Ele sugeria o mesmo para a estrutura do Tempo.Em sua Teoria do Tempo Seriado, Dunne sugere a existência de muitas dimensões do Tempo, que têm um caráter idêntico às numerosas camadas potenciais de consciência de si mesmo, de maneira que algo que estivesse acontecendo na dimensão A do Tempo por sua vez poderia ser visto a partir da perspectiva da dimensão B do Tempo, que por sua vez poderia ser visto a partir da perspectiva da dimensão C do Tempo e assim por diante em infinito retrocesso a algum Tempo Absoluto de onde todo o universo está exposto de um ponto de vista de Deus. Além disso, Dunne também propõe a idéia de que, enquanto nossa vida acontece na dimensão A do Tempo, quando adormecemos e sonhamos temos acesso às dimensões mais elevadas do Tempo. E assim, quando estamos sonhando, seria perfeitamente natural que um fato que parece ainda não haver acontecido na perspectiva da dimensão A do Tempo seria visível ao nível da consciência que o estivesse abordando da

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perspectiva da dimensão B do Tempo. Ao acordar, pensaríamos haver sentido um "acontecimento futuro", porque ele realmente está no "futuro" em relação à limitada dimensão de Tempo em que estamos acordados.A Teoria do Tempo Seriado de Dunne é rejeitada universalmente como especulação metafísica um tanto confusa. Ela não tem base alguma em ciência e, como teoria de como funciona a precognição, ainda tem o ponto fraco suplementar de poder lidar apenas com os sonhos precognitivos e não com todo o espectro de casos registrados. Mas An Experiment with Time terá sempre um lugar na prateleira dos pesquisadores psíquicos pelas questões que levanta e pela aplicada catalogação feita por Dunne de sonhos precognitivos - em grande parte bastante mundanos (e talvez, até por isso mesmo, tanto mais acreditáveis).O método que ele usou foi, a princípio, muito simples. Levando a sério a preocupação de Frank Podmore sobre o uso de material de sonhos como prova para qualquer tipo de capacidade precognitiva, porque as ''impressões ilusórias" de nossos sonhos são esquecidas prontamente ou então parcialmente lembradas e depois enfeitadas conforme a nossa , realidade quando despertos. Dunne recomendava a seus leitores que, dormissem com um bloco de anotações e um lápis debaixo do travesseiro. Então "imediatamente ao acordar, até mesmo antes de conseguir abrir os olhos, ponha-se a lembrar o sonho, que tende a desaparecer tão depressa". Infelizmente para Dunne e seu trabalho, ele esqueceu de tomar a precaução - também muito simples - de fazer com que seu bloco de anotações de sonhos fosse testemunhado a cada dia por alguma outra pessoa, o que fez com que perdesse a confiança da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, que exige esse tipo de testemunho como padrão de prática.Dunne, entretanto, descreveu na íntegra muitos dos sonhos que registrava tão meticulosamente e depois colocava essas descrições ao lado de suas continuações aparentemente positivas. Por exemplo, em 1901, adoentado durante a Guerra dos Boers e descansando num lugarejo próximo de Cartum, sonhou com três homens vestidos com

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roupas cáquis desbotadas que vinham chegando da África do Sul, visivelmente a pé. Achando estranho que alguém viesse caminhando de tão longe, foi interrogá-los e um deles disse: "Viemos desde o Cabo (andando a pé)". No dia seguinte, na hora do café da manhã, Dunne leu a seguinte manchete no jornal: DO CABO PARA O CAIRO, A EXPEDIÇÃO DO DAILY TELEGRAPH EM CARTUM. A matéria começava com as palavras: A expedição do Daily Telegraph chega em Cartum depois de magnífica viagem...Em 1902, acampado com a 6ª. Infantaria Montada no Estado livre de Orange, na África do Sul, Dunne sonhou com uma ilha que corria o iminente perigo de uma erupção vulcânica. Ele viu as pequenas fissuras abrindo-se nas encostas do vulcão, os jatos de vapor jorrando. Dunne "sabia" tratar-se de uma ilha sob domínio francês e tinha plena consciência de que se as autoridades não agissem rapidamente, evacuando os nativos, 4.000 pessoas poderiam perder a vida. Poucos dias depois, quando o regimento recebeu a correspondência e os jornais, ali estava: DESASTRE VULCÂNICO NA MARTINICA, CIDADE VARRIDA DO MAPA, AVALANCHE DE CHAMAS, PERDA PROVÁVEL DE MAIS DE 40.000 VIDAS. (Os 4.000 estavam errados, faltava um zero; mas Dunne insistia ter lido errado a reportagem do jornal e durante muito tempo achou que teriam sido 4.000 e não 40.000 as vítimas.)Outros sonhos de Dunne eram mais corriqueiros. Sonhou com uma combinação de segredo, e, no dia seguinte, viu aquela combinação num livro; sonhou com uma pilha de moedas em cima de um livro, e, no dia seguinte, viu exatamente a mesma pilha naquela mesma posição; sonhou com uma porção de faíscas vindo em direção a seu rosto de uma ponta de cigarro (como ele julgou), e, no dia seguinte, enquanto soprava um fogo, uma porção de faíscas veio em direção a seu rosto. E assim por diante...Quando percebeu pela primeira vez que sonhava com pedaços do futuro antes que acontecessem, Dunne ficou perturbado. "Ninguém poderia sentir algum prazer especial partindo do princípio de ser um

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maluco", escreveu. Começou a alimentar a noção de que deveria ser portador de alguma anormalidade mental:

Aparentemente eu estava sofrendo de algum defeito muito extraordinário em minha relação com a realidade, alguma coisa tão estranhamente errada que me compelia a perceber, em períodos de tempo intermitentes, grandes blocos de experiências pessoais que

seriam perfeitamente normais se não estivessem deslocadas de suas posições certas no Tempo. Que coisas assim pudessem acontecer já era algo muito interessante, mas, infelizmente, em circunstâncias tais que elas só poderiam ser sabidas por uma única pessoa. Eu mesmo.

No entanto, como veremos, encarar uma faculdade semelhante à capacidade precognitiva como aberração mental é uma explicação colocada de lado por alguns psicólogos que já a encontraram alguma vez. O próprio Dunne logo abandonou a idéia de ser anormal. J. B. Priestley concorda com isso. Em seu Man and Time, descreve Dunne como "tão distante da idéia do vidente, do sábio, do excêntrico ou do maluco quanto se possa imaginar... Pertencia à seção militar da velha classe aristocrática inglesa e tinha sua maneira de falar aos saltos e não muito articulada. Ele parecia e se comportava como um velho estereótipo de oficial misturado com um matemático e um engenheiro.”Para seu grande alívio, Dunne logo descobriu que outras pessoas falavam de sonhos precognitivos e já ia começando a acreditar que todo mundo tivesse, consciente ou inconscientemente, essa experiência. Todos os sonhos, concluía, são uma mistura de imagens do passado e imagens do futuro, e certo conhecimento do futuro é um aspecto de nossa constituição mental.Além do papel que seu livro desempenhou para tornar a precognição aceitável a um público mais amplo do que de outra forma aconteceria, o trabalho de Dunne é importante em outro aspecto. Esse seu catálogo de sonhos proporcionou material escrito bastante detalhado, o que tornou possível analisar até certo ponto a natureza

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de seu conteúdo precognitivo. Agindo assim, ele observou que muitas vezes suas previsões focalizavam coisas como páginas de livros ou manchetes de jornais. Isso levantava a suposição de que o que quer que ele tivesse visto antes não seriam realmente acontecimentos futuros, mas suas próprias percepções futuras daqueles acontecimentos. Uma tal possibilidade tem importância nas diversas tentativas para se levar adiante uma teoria física de como funciona a precognição.O lastimável sobre o excelente trabalho de Dunne (não fora por isso) é essa ausência de testemunhos que o teria colocado acima de qualquer suspeita. Em 1933, a Sociedade para a Pesquisa Psíquica tentou repetir a experiência de Dunne sob as condições necessárias de testemunhos. Um total de 430 sonhos foram ouvidos e registrados, mas o resultado de sua comparação com quaisquer acontecimentos reais revelou-se bastante pobre - simplesmente não se encontravam correspondências dignas de nota entre os materiais de sonhos registrados e os fatos que aconteciam em estado desperto.

As Experiências em Laboratório de Sargent & Harley

Muito recentemente (em 1981), pesquisadores da Universidade de Cambridge elaboraram uma variação das experiências com sonhos de Dunne obtendo um aparente êxito. Trabalhando no laboratório de psicologia, o dr. Carl Sargent (o primeiro PhD em parapsicologia de Cambridge de todos os tempos) e seu colega Trevor Hadey fizeram 44 experiências em laboratório para testar a precognição; vinte foram experiências com pessoas sonhando e 24 com pessoas que se submeteram a uma forma suave de privação sensorial chamada "estado de Ganzfeld".No estado de Ganzfeld, todos os canais sensoriais normais associados ao pensamento comum ficam bloqueados. O indivíduo a ser pesquisado relaxa numa cadeira reclinada enquanto seus olhos são cobertos com meias bolas de pingue-pongue que permitem que

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uma espécie de neblina branca uniforme passe a afetar a retina; seus ouvidos são cobertos com fones pelos quais um "ruído puro" é transmitido. O ruído puro (uma combinação de todas as freqüências auditivas) tem um som como o de um suave chiado de fritura contínua e tende a dispersar pensamentos organizados.No caso das experiências com sonhos, o método da equipe de Cambridge era pedir a algumas das pessoas pesquisadas que fizessem um registro por escrito de seus sonhos imediatamente ao acordar. Os sonhos assim transcritos eram então "comparados" por um pesquisador para observar qualquer semelhança com uma de quatro possíveis fotos impressas num conjunto de cartões. (Havia um total de duzentos cartões, com cinqüenta de cada foto.) As semelhanças entre os sonhos relatados e os cartões eram assinaladas pela ordem de preferência, conforme a correspondência de cada foto e o conteúdo dos sonhos, sendo essa ordem anotada.No dia seguinte, depois de feita a comparação e a anotação pela ordem, outro cartão (usando tabelas de números também aleatórios) era selecionado ao acaso de um pacote de duzentos, por uma máquina, e então Sargent e Hadey comparavam o cartão selecionado e as correlações do dia anterior entre a imagem dos sonhos e a do cartão. A expectativa de risco de que houvesse alguma correlação entre a imagem do sonho e a do cartão que estivesse em cima (pois havia quatro tipos diferentes) seria de 1 para 4, ou 25%. Mas, na verdade, Sargent e Harley acabaram descobrindo haver urna correlação bem mais elevada: 40% das pessoas que sonhavam viam em seus sonhos algo parecido com a foto do cartão do dia seguinte (e 41,7% das pessoas com privação sensorial também).

As Experiências de J. B. Rhine

Em termos de método e conteúdo, o trabalho de laboratório de Cambridge, realizado na década de 80, tão diferente da abordagem de "estudo doméstico" de Dunne, fora antecipado em meio século pelo

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trabalho pioneiro de J. B. Rhine. Atuando quase sozinho Rhine foi o responsável pela criação de toda a nova ciência da parapsicologia. Somente depois de ele haver oficialmente fundado a primeira unidade de pesquisa acadêmica em 1932 - seu Laboratório Psicológico na Duke University - é que a parapsicologia tornou-se uma significativa pesquisa sistemática.Embora ainda haja discussão sobre o valor desse empreendimento e controvérsia a respeito do real significado de seus resultados dentro e fora dos círculos de pesquisa psíquica, muitas universidades pelo mundo inteiro incluem hoje em seus currículos programas de PES; proliferam jornais e revistas profissionais e semiprofissionais, e até mesmo os governos entraram nesse campo. Estados Unidos e União Soviética parecem estar preparados para incluir a parapsicologia no arsenal de armas em potencial em seu estoque para a grande corrida armamentista.As pesquisas de J. B. Rhine, inicialmente na Duke University, foram dirigidas para desenvolver testes de laboratório com o objetivo de provar de uma vez por todas a existência da telepatia; e nisso ele foi extraordinariamente bem-sucedido. Desenvolveu um programa de experiências de reconhecimento de um cartão em que uma pessoa deveria adivinhar, de maneira telepática, qual de cinco possíveis desenhos em cartão estaria sendo manipulado por um técnico do laboratório. Os resultados atingidos estavam bem acima de qualquer expectativa. Ironicamente, foi em resposta direta a estas experiências telepáticas que surgiu o primeiro estudo realmente metodizado sobre a precognição jamais levado a efeito em condições de laboratório, o que aconteceu acidentalmente.

As Experiências de Soal-Shackleton

Em 1934, S. G. Soal, um professor-adjunto de matemática no Queen Mary College de Londres e membro do Conselho da Sociedade para a Pesquisa Psíquica (mais tarde, seu presidente), tinha a esperança de

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conseguir duplicar os impressionantes resultados telepáticos na adivinhação dos cartões obtidos por Rhine e seus colegas na Duke University. Colocou um anúncio em vários jornais londrinos solicitando pessoas que se dispusessem ao teste; oferecia uma recompensa para qualquer uma que pudesse adivinhar corretamente doze de cada 25 cartões.Os cartões de Soal, como os usados por Rhine, eram cartões de Zener com desenhos de círculos, quadrados, sinais de somar, linhas onduladas e estrelas. Cada pacote de 25 cartões continha cinco cartões com cada um dos símbolos e, segundo a expectativa do acaso, uma pessoa poderia ser capaz de adivinhar corretamente 20% do total da experiência ou seja, teria uma capacidade de adivinhar corretamente cinco cartões. A proporção para a pessoa que preenchesse as exigências de Soal, de adivinhar corretamente doze em cada 25, é de mil por um.Na experiência, a pessoa sentava-se de um lado de um painel opaco, e o dr. Soal sentava-se do outro lado, virando os cartões um a um enquanto eles iam sendo selecionados por um processo de embaralhamento automático. Da mesma forma que Rhine, Soal anotava meticulosamente as respostas da pessoa comparando-as com os resultados que deveriam ter sido obtidos pelo acaso.Mas, ao contrário de Rhine, Soal parece não ter tido nenhum êxito na demonstração da existência da telepatia. Durante quatro anos, 160 pessoas e 128.350 adivinhações em separado não produziram mais que os resultados esperados pelo acaso. Comunicou sua frustração a Rhine, cuja esposa, Louisa, comentou:"Ele estava a ponto de chegar à conclusão de que ou as pesquisas americanas eram falsas ou os ingleses não têm PES...”Whately Carington, um amigo de Soal e seu colega na pesquisa PES, expôs uma possível explicação diferente para o fato. Em suas experiências com a telepatia, Carington notou um "deslocamento no tempo" nas adivinhações das pessoas, e supôs que o mesmo devia ter acontecido com os dados de Soal. Sugeriu que Soal fizesse uma nova análise de seus resultados, desta vez observando não as

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adivinhações diretas mas as que se relacionassem diretamente com o próximo cartão. Esta análise representa resultados completamente diferentes. No caso de uma pessoa em particular, o fotógrafo Basil Shackleton, essa nova maneira de analisar a experiência produziu resultados tão impressionantes, que a possibilidade de ter acontecido por acaso era de bilhões por um. Sem pretender isso, Soal havia aparentemente obtido uma prova experimental devastadora para a precognição: enquanto Shackleton mostrara uma paupérrima incapacidade telepática para a adivinhação do cartão que acabara de ser virado, ele parecia demonstrar um notável talento para adivinhar precognitivamente o cartão que estava por ser virado ainda. Nem Soal nem seus ajudantes poderiam saber do cartão com antecedência, pois o pacote era embaralhado automaticamente por máquina e, assim, a ordem em que os cartões sairiam só era "conhecida" por aquela máquina.Soal ficou tão impressionado com a nova interpretação de seus dados que preparou outra série de experiências adivinhatórias com cartões, mais prolongada, para usar com Shackleton; este sabia, dessa vez, que o cientista procurava uma prova para a precognição em vez da telepatia. Soal era assistido por sua colega, sra. K. M. Goldney, e por muitos cientistas respeitados da Sociedade para a Pesquisa Psíquica inglesa. Os resultados do novo teste foram semelhantes: Shackleton demonstrou capacidades precognitivas muito além de qualquer coisa que pudesse ser explicada pelo acaso. Em conseqüência disso, percebeu-se, o "bicho-papão" da pesquisa PES deveria ser investigado a sério, embora poucos daqueles que conduziam essa pesquisa gostassem da idéia. Como dizia Rhine: "A precognição simplesmente não pode ser física em qualquer sentido que a palavra tenha hoje! Realmente, o simples antagonismo que ela apresenta em relação à seqüência causal em que normalmente vemos as coisas acontecerem na natureza faz dela ao mesmo tempo uma glória e um proscrito da ciência". Mas, fascinado por este "proscrito da ciência", e ciente de suas implicações notáveis, Rhine devia tratar de testar isso

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com a maior assiduidade e o maior rigor científico de que sua equipe fosse capaz.O método foi alterado, pois se haviam levantado objeções a qualquer método conhecido de administração dos testes. Embaralhadores humanos de cartões substituíram as máquinas, e as tabelas de números casuais da matemática foram utilizadas para gerar seqüências inteiramente ao acaso para o posicionamento dos cartões no pacote. Mas, não importando as sofisticações que tenham sido acrescentadas no laboratório de Rhine e em muitos outros dos Estados Unidos e da Inglaterra, as adivinhações precognitivas das pessoas continuaram a ser registradas com êxito que ia muito além do acaso. Em 1948, Rhine chegou à conclusão de que, afinal de contas, se a telepatia fosse possível (no que ele acreditava sem a menor sombra de dúvida), daí se seguia que a possibilidade da precognição não era tão imprevista:

A evidência que obtivemos no outono de 1933, referente à relação entre a percepção extra-sensorial e o mundo físico, faz da PES de

acontecimentos futuros um corolário razoável, quando não, logicamente necessário. A concepção de que a mente possa

transcender as limitações do tempo aparece como uma conseqüência natural de testes de distância com a PES. Pois, se a PES é livre no

espaço, ela também deve ser livre no tempo dentro de nosso universo espaço-tempo da física. O tempo é uma função de mutação espacial,

ou seja, o movimento físico no espaço exige tempo, portanto estar fora do espaço também é estar fora do tempo. A percepção de

acontecimentos passados ou futuros estaria também alinhada com a percepção de acontecimentos distantes.

Mas há uma estranha ironia na transposição de Rhine, que surgiu como que através do trabalho realizado em resposta aos resultados, visivelmente impressionantes das experiências de Soal com Basil Shackleton. Ao final da década de 70, veio à luz uma nova evidência que sugeria que os últimos resultados de Soal-Shackleton podiam ter

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sido falseados. Sem dúvida, essa nova evidência demonstrava que no mínimo Soal havia manipulado seus dados experimentais de maneira a deixar que o desempenho de Shackleton parecesse mais definitivo do que teria sido na verdade.A controvérsia envolvendo essa descoberta ainda continua e talvez nunca se consiga determinar de uma vez por todas que Shackleton não tinha nenhuma capacidade PES e assim toda a experiência seria uma mentira, ou se Soal apenas "enfeitou" seus dados, para apresentar um quadro regular e consistente quando, na verdade, Shackleton - um homem de humores imprevisíveis - teria sido irregular em seu rendimento na PES. Qualquer interpretação que se adote, entretanto, deixará o trabalho de Soal debaixo de uma permanente sombra de dúvida; ainda assim, talvez tenha sido este mesmo esforço fraudulento que inspirou o trabalho muito mais confiável realizado a seguir por Rhine e outros.Existem muitos outros projetos sobre a pesquisa da precognição que poderiam ser mencionados, a maioria dos quais utilizando alguma variação da adivinhação de cartões. Este trabalho experimental multiplica-se por si mesmo, no sentido de que, quanto mais provas são reunidas sobre a precognição, mais cientistas e psicólogos se sentem impelidos a submetê-las ao exame minucioso de laboratório. Mas existem ainda três exemplos de pesquisa especialmente interessantes, por serem diferentes do teste padrão de adivinhação de cartões e porque talvez possam ajudar a lançar alguma luz sobre como a precognição - se é que existe funciona realmente.

As Experiências de Stanford

Afastando-se radicalmente do trabalho de adivinhação de cartões, Russell Targ e Harold Puthoff, dois físicos do Instituto de Pesquisas de Stanford, apresentaram alguns resultados impressionantes de suas pesquisas sobre visão precognitiva em situações da vida real.

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Entre 1976 e 1977, Targ e Puthoff fizeram quatro experiências envolvendo uma pessoa com capacidade precognitiva (Hella Hammid), que permanecia dentro do laboratório enquanto companheiros pesquisadores eram enviados a localidades por eles anteriormente desconhecidas em veículos motorizados. A finalidade da experiência era verificar se a pessoa no laboratório poderia descrever, antecipadamente, detalhes visuais do lugar a ser visitado pelos assistentes da pesquisa em viagem.Como parte dos "controles" internos das experiências Targ-Puthoff, os assistentes viajantes não tinham a menor idéia antecipada do destino para onde iriam. O objetivo de mantê-los na ignorância desse detalhe era excluir qualquer possibilidade de telepatia entre eles e a pessoa no laboratório. Em vez disso, os assistentes saíam do laboratório carregando dez envelopes selados, cada um contendo instruções de viagens para algum lugar diferente. Os envelopes haviam sido selecionados de um conjunto muito maior de envelopes idênticos por meio de sorteio de números aleatórios.Quinze minutos antes que os pesquisadores viajantes abrissem um de seus dez envelopes (cada um dos quais seria escolhido também por um sorteio de números aleatórios), pedia-se à pessoa no laboratório que descrevesse ou desse algum detalhe visual que ela pudesse "pegar" dos lugares para onde os pesquisadores estavam prestes a ir. Trinta minutos depois de ela ter feito as adivinhações e apenas quinze minutos depois de saber seus próprios destinos, os pesquisadores chegariam a algum desses pontos pré-selecionados.Mais tarde, pedia-se a cientistas que não tivessem nenhuma relação prévia com a experiência que comparassem detalhes das descrições precognitivas da pessoa no laboratório e detalhes fotográficos dos lugares realmente visitados. Uma detalhada correspondência entre as descrições precognitivas e os lugares reais (a marina de Palo Alto, o Stanford University Hospital Garden, uma área de recreação para crianças, e a Prefeitura de Palo Alto) estava muito acima de qualquer coisa que pudesse ser explicada por sorte ou por alguma

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"coincidência" e pareceu, satisfazer aos rigorosos critérios dos envolvidos, demonstrando que houvera uma autêntica precognição.O mesmo tipo de pesquisa precognitiva, como a planejada por Targ e Puthoff, foi desde então realizada no Mundelein College em Chicago por uma equipe de psicólogos, com resultados semelhantes visivelmente bem-sucedidos, embora o prof. John Taylor tenha levantado alguma dúvida sobre o significado destes testes a longa distância, baseado no fato de que a comparação feita por uma terceira pessoa sobre um dado local e a descrição que a pessoa fizera do mesmo por si só envolveria um grau muito elevado de avaliação subjetiva. Essa mesma crítica foi levantada por dois pesquisadores da Nova Zelândia, D. Marks e R. Kammann, numa carta para a revista Nature questionando alguns dos experimentos de Stanford e mostrando que o que sentiam ser uma prova, em pelo menos um caso, o pesquisador havia proporcionado pistas exteriores que podem ter ajudado às terceiras pessoas a comparar as descrições com os locais visados.Respondendo a essa crítica, Targ, Puthoff e seu colega Charles Tart prepararam as transcrições em questão, para remover todas as pistas em potencial mencionadas por Marks e Kammann em sua carta. Depois submeteram toda a série preparada a um novo júri independente que ainda assim conseguiu juntar sete em cada dez das descrições "a longa distância" com os lugares reais. Isso levou a equipe de Stanford a concluir o seguinte:

... Com base num teste empírico realizado de maneira independente, consideramos sem valor as conjecturas de Marks-Kammann de que o êxito do primeiro estudo publicado sobre a visão a distância devesse ser atribuído a pistas em vez de a verdadeiras correlações entre as

descrições e os locais.

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Experiências de Nível Quântico no Texas

Na que é talvez a mais interessante e promissora variação da técnica de adivinhação de cartões até hoje planejada para a pesquisa da precognição, o físico dr. Helmut Schmidt - que foi diretor do laboratório de Rhine na década de 70 e hoje trabalha na Fundação para a Ciência da Mente, em San Antonio, Texas - elaborou uma série de -experiências envolvendo luzes disparadas por processos subatômicos. Como essa técnica utiliza acontecimentos em nível quântico gerados pelo processo de diminuição fortuita de radiação de átomos, é de longe a pesquisa mais importante hoje disponível para as tentativas de se explicar o funcionamento da precognição.O trabalho de Schmidt exigiu o projeto de um novo aparelho eletrônico, uma caixa com quatro lâmpadas ligadas a botões para ligar/desligar. Os botões estavam ligados a um gerador de números ao acaso que poderia decidir arbitrariamente ligar a lâmpada 1,2,3 ou 4, e o próprio gerador estava ligado, por meio de um circuito complexo, a um tipo de diminuidor de radiação ionizante ativado por estrôncio-90. Assim, o único controle possível sobre qual das quatro lâmpadas na caixa de Schmidt seria acesa a seguir era o processo de diminuição radioativa inteiramente fortuito do estrôncio-90. Sua experiência consistiu em pedir a um indivíduo pesquisado que adivinhasse qual das lâmpadas iria acender da próxima vez, e anotar sua resposta apertando o botão que estivesse ligado àquela lâmpada.

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Nas experiências de Helmut Schmidt, o imprevisível processo de diminuição radioativa do estrôncio-90 é usado para gerar um sinal casual que irá acender arbitrariamente uma das quatro lâmpadas.

Pede-se ao indivíduo que está sendo pesquisado que diga qual das quatro lâmpadas será a próxima a acender, apertando um dos quatro

botões ligados às lâmpadas e seu erro ou acerto é registrado no contador à direita.

Os resultados da experiência de Schmidt parecem - e muitos para-psicólogos assim consideram - uma prova conclusiva de que algumas pessoas podem realmente ver um fato antes que ele aconteça. Em 7.600 tentativas feitas com um único indivíduo, um físico, ele acertou qual lâmpada seria a próxima a acender 37,7% das vezes (e as proporções contra o acaso de um tal resultado seriam de 10 bilhões para 1) quando a expectativa do caso seria de que ele pudesse ter acertado apenas 25% das vezes (porque havia quatro lâmpadas). Mas quando a experiência foi ampliada, incluindo três indivíduos que responderam 63.000 vezes, o nível de acerto caiu para 26,1 % - um

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pouco acima do acaso, mas não muito. Em outra experiência, onde três indivíduos responderam um total de 20.000 vezes para quatro séries de tentativas, seu índice de êxito foi de apenas 0,25%. Então, o que estaria acontecendo? Chegaremos à conclusão de que os aparentemente impressionantes resultados de Schmidt na verdade nada representariam num exame mais minucioso? Verificar essas questões poderá lançar alguma luz sobre o que fazer com o conjunto global de resultados obtidos na parapsicologia experimental e também esclarecerá uma razão pela qual todo o campo ainda é tão controverso, apesar de todas as armadilhas científicas.Na última experiência discutida acima, em que Schmidt fazia os indivíduos responderem que luz iria acender-se a seguir num total de 20.000 vezes, na verdade a experiência falhou em quatro tentativas separadas de 5.000 perguntas cada uma. Em duas dessas experiências, as pessoas responderam acertadamente numa significativa proporção acima da expectativa do acaso; nas outras duas, as respostas acertadas estavam significativamente abaixo do acaso. Assim, em cada uma dessas tentativas consideradas em separado, algo notável poderia ter parecido acontecer, embora os fatos notáveis fossem um tanto irregulares e até opostos em seus efeitos - e isso devido à natureza irregular da maioria dos resultados obtidos em laboratórios de parapsicologia, onde os pesquisadores confiam tanto em quadros elaborados através de médias estatísticas. E assim, enquanto as médias estatísticas individuais de cada uma das quatro tentativas de Schmidt, se vistas em separado, podem parecer impressionantes, quando os resultados das quatro tentativas são somados essa aparência significativa tende a desaparecer.E tudo isso nos leva de volta à espinhosa questão do muito importante instrumental das estatísticas, que estaria sendo utilizado pelos parapsicólogos para apresentar a verdade sobre grandes séries de experiências individuais irregulares (como os adeptos da parapsicologia experimental poderiam reivindicar), ou se, de fato, as médias estatísticas estão sendo manipuladas (talvez não

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intencionalmente) de maneira a fazer com que resultados insignificantes pareçam importantes.Um matemático de Oxford, G. Spencer Brown, manifestou-se afinal sobre o assunto, argumentando que, de seu ponto de vista, dados "estatisticamente significantes" de pesquisas psíquicas não são mais significativos que um indicador geral daquilo que os pesquisadores possam estar visando. Ele sente que as experiências parapsicológicas que pretendem estudar a comunicação extra-sensorial "degeneraram, na maioria dos casos, em experiências da mais simples probabilidade", e dedica uma boa parte de sua análise aos equívocos de raciocínio que estão por trás de noções como as condições de acaso e médias estatísticas.Brown observa que, por trás do aparentemente importante aspecto de "médias estatísticas significativas" como as apresentadas por Schmidt, existem sempre e apenas os constantes fluxos de novos fenômenos irregulares, e nunca (com raras exceções) resultados autenticamente repetitivos, que são um critério padrão para qualquer experiência científica de boa qualidade.Poder-se-ia argumentar, naturalmente, que todo o padrão de repetitividade e boa parte de outros parâmetros experimentais, tão importantes para a corrente predominante da ciência, são inadequados para os fenômenos com os quais o parapsicólogo deve lidar. Neste caso, seria melhor se mais parapsicólogos experimentais admitissem isso (como muito poucos já fizeram). Este reconhecimento aberto - embora possa disseminar ainda mais controvérsias - pelo menos teria a vantagem de liquidar com a bastante comum acusação de céticos que argumentam que a parapsicologia experimental finca pé deliberadamente numa "confusão pseudocientífica".

Levantamento do Fator Tempo na Precognição

Numa pesquisa de um gênero muito diferente, mais para estudar do que para demonstrar a precognição, um psicólogo clínico inglês, J. E.

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Orme, do Serviço Psicológico da região de Sheffield, tomou a iniciativa de compilar um levantamento de 148 casos isolados de precognição espontânea. Ele tinha a esperança de poder observar algumas tendências ou direções a partir de um número tão grande de casos.A pesquisa de Orme enfatiza algumas tendências úteis para a classificação de experiências precognitivas segundo o conteúdo da experiência ou o estado (sonho, transe, visão em estado desperto etc.) do sensitivo. Mas o impulso mais importante de seu levantamento foi a medição do fator tempo no fenômeno precognitivo - a quantidade de tempo que se passava entre a visão precognitiva e o acontecimento real do fato previsto. Seus resultados constituem uma das mais sólidas contribuições no sentido de proporcionar uma base para a compreensão da verdadeira mecânica da precognição.Orme retirou seus exemplos de precognição de quatro fontes, todas consideradas clássicas neste campo: tomou 48 das experiências descritas por Dunne em seu An Experiment with Time, 41 do estudo de Barker sobre o desastre de Aberfan, 30 de Some Cases of Prediction de E. Lyttelton e 29 de Foreknowledge de H.F.Saltmarsh. Todas, menos as experiências de Dunne, foram confrontadas com provas corroborativas de testemunhas e as narrativas de Dunne em geral são vistas como honestas - quando por nenhuma outra razão, pelo simples fato de serem tão corriqueiras. (Se ele fosse inventar experiências precognitivas, segundo a argumentação, certamente teria inventado coisas mais interessantes!)Das 148 experiências estudadas por Orme, 57 (ou 38,5%) aconteceram dentro de 24 horas a partir do momento da previsão, 14 (9,5%) nas 24 horas seguintes e o resto ia gradualmente caindo conforme aumentava a distância entre a previsão e o fato. Apenas 42 aconteceram no espaço de uma quinzena da previsão, e somente 7 mostravam um intervalo de tempo de mais de um ano.

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Orme fez um mapeamento do fator Tempo em 148 casos de precognição espontânea e os resultados estão ilustrados de maneira notável em forma condensada nesta tabela que demonstra que o maior número de precognições ocorreu dentro de um espaço de tempo muito pequeno antes do previsto.Em espaços de tempo mais longos entre a previsão e o fato acontecido, cada vez menos precognições são registradas. (Tabela do Journal of the Society of Psychical Research, vol. 47, no. 760.)

No estudo de Orme, experiências precognitivas em sonhos ou em estado desperto dependiam do tempo, e estas últimas eram obviamente mais numerosas. Isso corrobora relatos de duas outras fontes. Em seu The Roots of Coincidente, Arthur Koestler menciona que as experiências de adivinhação de cartões de Soal com Basil Shackleton e as previsões feitas por este último (se não fossem todas elas falsificadas) seriam mais exatas se o intervalo entre os acertos e as respostas fosse de 2,6 segundos. Se o índice de tempo para virar

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as cartas fosse o dobro, proporcionando intervalo de tempo de apenas 1,4 segundo, Shackleton mostraria então uma tendência para acertar qual a carta que seria virada após duas viradas. Esse resultado implica uma constância ou um período mais favorável do espaço de tempo entre a previsão e o fato, o que não necessariamente está de acordo com a tese de que as precognições são mais freqüentes em intervalos mais curtos; mas, dada a natureza suspeita dos dados de Soal, não é possível saber se essa constância era real ou inventada no caso de Shackleton.Também é verdade que no exemplo das predições na roleta da srta. H. R., ela contava que seus ''lampejos'' de previsão sempre ocorriam no muito breve intervalo de tempo entre o instante em que a bola deixava a mão do crupiê e sua parada em determinada fresta, "geralmente naquele rasgo de segundo que vem logo antes de o crupiê gritar jogo feito". Assim, o caso dela, se válido, iria apoiar a conclusão de Orme de que "a precognição se refere a acontecimentos próximos no tempo em vez dos que estão distantes...”Da mesma forma a reivindicação de Orme de que "a natureza muito próxima entre a incidência e a distância no tempo poderia muito bem sugerir que esta característica indica algo fundamental sobre a natureza da precognição", é verdade também que poderia ser melhor apreciada depois de se observar suas possíveis ligações entre acontecimentos precognitivos e acontecimentos subatômicos como os que a física quântica descreve (ver Capítulo 12).

SEGUNDA PARTEQUEM TEM A PRECOGNIÇÃO?

5. A PRECOGNIÇÃO NOS ANIMAIS

No início de seu clássico estudo sobre coincidências significativas, Jung conta a expressiva história da morte de um paciente, aparentemente prevista por um bando de aves.

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Suspeitando que seu paciente apresentava leves sintomas cardíacos, Jung recomendou-lhe consultar um especialista. Pouco depois de o homem sair de casa para esse encontro, sua esposa percebeu, alarmada, que um enorme bando de aves pousara no telhado de sua residência. A chegada dos pássaros parecia-lhe agourenta pois a morte de sua mãe e de sua avó haviam sido anunciadas por semelhantes bandos de pássaros, que permaneceram como que em vigília do lado de fora da câmara da morte. Horas depois, apesar de o médico ter emitido um atestado de saúde, o homem teve um colapso na rua e foi levado morto para casa.Histórias como essa não são incomuns. Um psicanalista americano conta um incidente semelhante em relação a seu jardineiro. Certa tarde, enquanto os dois conversavam no jardim da mãe do jardineiro, um tordo despencou do céu, bateu na capota de um automóvel e caiu morto a seus pés. O jardineiro viu nisso um presságio e saiu correndo para casa, apenas a tempo de ver sua mãe morrer.Escrevendo logo depois da fundação da Sociedade para a Pesquisa Psíquica, Frank Podmore conta a história da filha de um médico que durante muitos dias antes de uma morte na família viu um passarinho estranho, esguio e gracioso, com uma cabecinha muito pequena, cinza-azulado. Durante essas visitas, o passarinho batia na janela da casa e sujava o vidro da janela com suas patas. Depois da morte, o passarinho continuou suas visitas até o enterro e depois nunca mais voltou.Plutarco nos conta que um dia antes da morte de César "espécies de pássaros solitários começaram a voar dentro do fórum", e Suetônio nos pinta um quadro ainda mais vivo narrando que ''um passarinho, chamado pássaro-rei voou para dentro do palácio de Pompéia com um raminho de louro em seu bico, seguido por um bando de pássaros diferentes provenientes de um bosque vizinho, e o partiram em pedaços ali mesmo”. Ovídio também escreve a respeito: "Em mil lugares a coruja-torre deu um aviso agourento e os cães uivaram durante a noite".

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Existe pelo menos uma história relacionada aos momentos que precederam a morte de Abraham Lincoln: o cachorro do presidente teria começado a correr por dentro da Casa Branca, "como que em delírio e uivando continuamente de modo fúnebre". Antropólogos que trabalharam entre os aborígines australianos contam que eles acreditam que o primeiro sinal da morte de um parente é a visão de um pássaro ou um animal que seria o espírito-guia (totem) da pessoa.Na verdade, em toda a literatura, alguns dos mais vivos e impressionantes relatos sobre capacidades precognitivas e outras supostas faculdades de PES referem-se ao comportamento de animais, pássaros e insetos; há mesmo um ponto de vista amplamente difundido segundo o qual tais criaturas muitas vezes são dotadas de uma "segunda visão". Essa convicção é tão antiga quanto a história de nossa espécie. Nos mitos e lendas do homem primitivo e nas histórias de fadas de nossa infância, esse dom dos animais costuma ser creditado como uma participação ou mesmo inteiramente explicativo dos poderes proféticos de nossos videntes humanos.Segundo a lenda céltica de Conn-eda, o mítico herói rei da Irlanda, ele deverá fazer uma viagem perigosa e aparentemente impossível ao reino das fadas para capturar três maçãs douradas, um corcel negro e um cão de caça que pertencem ao rei das fadas. Conn-eda vai a um grande druida para pedir conselho, mas o druida admite que nem mesmo ele tem poderes suficientes para ajudar Conn-eda numa tarefa como aquela. Mas, diz ele, "existe um pássaro com cabeça humana escondido numa floresta. Essa criatura estranha é conhecida por seu saber sobre o passado, o presente e o futuro". Conn-eda procura o pássaro, que, falando numa "crocitante voz humana", conta-lhe tudo o que precisa saber e prevê seu êxito.Segundo Heródoto, pássaros são muitas vezes associados aos oráculos. Ele conta que uma das versões sobre a fundação dos oráculos de Dodona na Grécia e Amon na Líbia é que duas pombas negras voaram do templo de Tebas no Egito - uma foi para Dodona, pousou num carvalho e falando com voz humana disse ao povo que

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ali deveria ser construído um local para o oráculo de Zeus; a outra voou para a Líbia e instruiu aos líbios da mesma forma.Entre as tribos paleolíticas e neolíticas da Ásia, Indonésia e América do Norte (e ainda hoje sobrevivem alguns remanescentes isolados dessas culturas primitivas), a crença na previsão animal estava incorporada aos rituais e tradições das religiões xamanísticas orientadas para a criatura. O xamã - o médico da tribo - podia curar a doença, trazer a chuva, guiar a caça ou profetizar acontecimentos futuros; muitas vezes ele obtinha estes poderes mágicos em comunicação com um espírito animal que o orientava.Cada xamã deveria ter um animal-mãe ou uma origem animal (alce, tigre, urso etc.) que incorporava seu dom profético, ou então um pássaro ou animal "familiar" para lhe dar assistência. Depois de ficar por si mesmo em transe estático que lhe permitiria deixar o corpo, o espírito do xamã podia vagar livremente por todo o universo entrando em contato com outros espíritos, animais auxiliares cujos poderes visionários o capacitavam a penetrar no passado e no futuro.Um grupo de "xamãs" dos dias de hoje na China moderna - os sismologistas - já não deixam mais seu corpo quando querem espiar o futuro. Eles trocam seus instrumentos técnicos pelo mais avançado meio de prever terremotos: a observação do comportamento irregular de muitos pássaros, animais e insetos, durante horas (e às vezes dias) antes que qualquer tremor de terra seja registrado no mais sensível dos aparelhos sismográficos.Os chineses sofrem a mais elevada média anual de tremores de terra sérios (acima de 6 na escala Richter) de todos os países do mundo, e mesmo assim eles têm sido muito bem-sucedidos em reduzir o número de vítimas de terremotos. Ainda assim, seus cientistas continuam a desenvolver sofisticadas técnicas artificiais de alarme prévio, medindo os sons do interior da Terra e as flutuações no nível das águas e do campo magnético. No entanto, o salvamento de tantas vidas humanas e a transformação do sistema de previsão de terremotos da China num modelo para sérios estudos de equipes

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geofísicas internacionais, são atribuídos à sabedoria acumulada de seus livros de história.Há muitas gerações os chineses observaram que as criações e os animais de estimação ficavam inquietos horas antes de um terremoto. "Cavalos normalmente calmos empinavam e saíam correndo, cães uivavam, peixes saltavam nas águas e animais raramente vistos, como cobras e ratos, de repente surgiam de seus esconderijos em grandes quantidades".Outras pesquisas inspiradas no exemplo chinês para verificar se este comportamento anormal dos animais seria observado em outros países resultaram numa impressionante coleção de dados. Antes do terremoto de 1963 em Montana, grandes bandos de pássaros evacuaram a área horas antes do primeiro tremor. E horas antes do terremoto de 1964 no Chile, todas as gaivotas voaram muitos quilômetros na direção do mar alto. Várias horas antes do terremoto de 1969 em Tashkent (na União Soviética), leões e tigres no zoológico local teimaram em dormir fora do abrigo e as cabras montanhesas não foram para seu aprisco. Uma hora antes do terremoto, as formigas abandonaram os formigueiros levando as pupas com elas. Na noite anterior ao terremoto de 1971 na Califórnia, observaram-se ratos correndo furiosamente pelos meios-fios das ruas de San Fernando.O mesmo tipo de comportamento anormal dos animais foi observado antes de outros desastres naturais: erupções vulcânicas, furacões, tornados, avalanches etc., e ninguém compreendeu ainda perfeitamente as curiosas capacidades de previsão das espécies em questão. É bem possível que esses animais e pássaros tenham algum tipo de capacidade de precognição psíquica, e estamos num terreno ainda não delineado de alguns tipos de comportamento animal que J. B. Rhine, escrevendo no início dos anos 50, achou mais conveniente abordar com prudência.Depois de apontar que ilustres zoólogos como Sir Alister Hardy, Sir Julian Huxley e F. B. Sumner haviam todos chegado à conclusão de que alguma espécie de percepção extra-sensorial deveria ser considerada quando da tentativa de explicar mistérios como o retorno

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migratório do salmão muitos quilômetros rio acima, ou as migrações a longa distância e outras capacidades notáveis para o retorno à casa de pássaros, Rhine advertia que muito do que parece estranho no comportamento dos animais poderia um dia ser explicado normalmente quando se soubesse mais sobre seus sentidos. A experiência já lhe deu razão inúmeras vezes.A pesquisa biológica nos últimos vinte e cinco anos apresentou uma grande quantidade de explicações científicas simples para muitos comportamentos animais antes envoltos em mistério.Sabemos hoje que os morcegos voam tão bem no escuro por serem sensíveis às vibrações supersônicas no ar; que os peixes podem utilizar ecos sensores no fundo do mar; que as abelhas e as formigas usam a luz polarizada para monitorar a direção; que os pássaros e os peixes orientam-se usando o ângulo do Sol (ou das estrelas). Recentemente cientistas fizeram a importante descoberta de que os pássaros e até mesmo o homem são sensíveis às linhas de força magnética que a Terra emite, e que seguindo estas linhas de força eles podem orientar-se em qualquer direção, mesmo em escuridão total ou de olhos vendados.Assim, como sugerem alguns escritores, as capacidades de previsão de desastres de muitas espécies animais tendem mais a ser um caso de percepção "supersensorial" do que "extra-sensorial". Segundo o naturalista Ivan Sanderson, "este aguçado conhecimento pode descobrir furacões em aproximação por alterações no nível da água ou por quedas na pressão barométrica. Sons muito leves ou uma elevação da temperatura podem anunciar avalanches. Erupções vulcânicas e terremotos são precedidas por grandes tensões no campo magnético da Terra. Os animais captam os tremores de terra menores e pequenos terremotos.O parapsicólogo experimental John Randall admitiu que, na verdade, as até agora desconhecidas faculdades sensoriais "ultra-sensíveis" e aguçadas têm sido um campo de estudos para os céticos que preferem rejeitar qualquer exemplo aparente de PES como remanescente da mais simples ignorância, de modo que muitos

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biólogos "encaram a expressão 'percepção extra-sensorial' como simples reconhecimento de nossa ignorância, argumentando que quanto mais o conhecimento biológico se expande, mais diminuirá o número de casos de PES". A mesma argumentação é feita quanto às supostas capacidades PES no homem - alega-se que um dia compreenderemos serem parte de nossa estrutura biológica normal.No entanto, como observa Randall, da mesma forma que Rhine e outros antes dele, existem muitos exemplos de PES registrados em animais , que fornecem bons fundamentos para se supor que a tese dos "sentidos não descobertos" pode ser deficiente, e estes se tornaram campos frutíferos de estudo para os parapsicólogos experimentais na década passada. A maioria tem a ver com casos de precognição animal visível ou algum gênero de telepatia entre homem e animal.O mais antigo e bem documentado caso de alegada telepatia entre um animal doméstico e seu treinador é o clássico exemplo do século passado, de Clever Hans, o cavalo de circo que, supostamente, sabia contar, resolver problemas aritméticos e ler as letras de um alfabeto em blocos de madeira. A possibilidade de que Clever Hans fosse na verdade um animal superinteligente, capaz de raciocinar sobre problemas de matemática ou de soletrar palavras quando colocados à sua frente, foi posta de lado assim que se descobriu que ele não conseguia dar uma resposta correta a não ser que tivesse a seu lado um ser humano que também soubesse a resposta. Então levantou-se a hipótese da telepatia, logo descartada graças a uma descoberta que provocou muitos trabalhos subseqüentes sobre a suposta telepatia entre animais e homens. O segredo da habilidade de Clever Hans, como o de Lady, "um cavalo que lia a mente", investigado por Rhine e sua esposa, acabou sendo descoberto. Tratava-se de uma destreza especial para captar sutis pistas sensoriais nos seres humanos à sua volta.Muito desse mesmo mecanismo de interpretação sensorial seria verificado no caso de Lady. Lady, como Clever Hans, parecia "apanhar" aqui e ali, telepaticamente, as respostas a diversas

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questões matemáticas e alfabéticas colocadas por Rhine e sua esposa - mas eles acabaram percebendo que na verdade o animal interpretava sinais de movimentos sutis de seus corpos.Embora existam muitos outros casos registrados de animais que demonstram capacidades telepáticas ou clarividentes, o único que ainda proporciona talvez alguma base para considerações é o de Chris, o cachorro maravilhoso - submetido a testes rigorosos no laboratório de parapsicologia da Duke University nas décadas de 50 e 60.Depois de verificar que os primeiros resultados promissores de Chris na solução de problemas ainda não eram explicáveis através das pistas sensoriais, o pessoal do laboratório deu ao cão a tarefa de adivinhar o cartão retirado de um pacote embaralhado de cartões PES fazendo com que ele batesse a pata uma vez para um círculo, duas vezes para um quadrado, e assim por diante. Quando Chris acertava acima da proporção do acaso nesse teste, ele tinha de resolver o problema mais difícil de adivinhar quais cartões estavam encerrados em envelopes opacos. De uma série de quinhentas tentativas, o cão acertou numa proporção de 1000 por 1, contra o acaso, embora em testes posteriores seu índice de acertos fosse bem menos espantoso.J. G. Pratt, colega de Rhine, trabalhou com Chris durante algum tempo e não conseguia refutar de nenhuma maneira conclusiva o fato de o cão realmente não ser clarividente. Mas Pratt manteve uma postura cautelosa e alertou que deveria necessariamente haver alguma outra possível explicação. Levantou a hipótese, por exemplo, de que, na verdade, as pessoas que trabalhavam com Chris é que tinham a capacidade PES, e, assim, a informação era passada ao cachorro por meio de pistas sensoriais.

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Reunindo todos os casos espontâneos e testes de laboratório em relação a uma suposta telepatia do tipo leitura da mente entre animais e seres humanos, o experimentalista Robert Morris comenta: "O caso de Chris é o melhor do gênero. Os outros são um tanto impressionantes em termos coletivos, mas individualmente estarão sempre sujeitos à dúvida de que as pistas sensoriais e a influência do experimentador teriam sido eliminadas adequadamente".Existe ainda uma espécie de telepatia entre o animal e o homem para a qual parece não haver nenhuma explicação alternativa. São os exemplos do que Rhine e sua fIlha, Sarah Feather, apelidaram de "psi-rastreio", casos em que "um animal, separado de alguém, uma pessoa ou o companheiro a que tenha se apegado, segue o companheiro que partiu num território inteiramente desconhecido e consegue fazer isso numa época e em condições tais que não permitiriam o uso de nenhuma pista sensorial". As distâncias que os exemplos suspeitos de psi-rastreio envolviam iam de 50 km até viagens de 5.000 km, e há registros de uma boa quantidade desse tipo de casos.O caso de Tony, um cão vira-lata que pertencia à família Doolen nos Estados Unidos, é um dos mais documentados e citados. Os Doolen viviam em Aurora, no Estado de lllinois, e quando se mudaram para Lansing, no Michigan, a 500 km de distância, resolveram deixar Tony para trás, com um vizinho. Seis semanas depois, o cachorro estava na soleira de sua casa em Lansing; ele percorrera todos aqueles quilômetros sem nenhuma ajuda e localizara a família em lugar onde jamais estivera antes. Tony ainda usava a licença de lllinois, com seu nome, e a família com quem foi deixado confirmou que ele não estava mais lá.Smoky, um gato persa com um raríssimo tufo de pêlos vermelhos debaixo do queixo, foi separado da família numa parada de beira de estrada no Oklahoma a uns 30 km de casa. Numa semana o gato encontrou o caminho do lar, mas a família havia se mudado para o Tennessee. Depois de ficar perambulando por sua antiga vizinhança

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durante muitas semanas, Smoky desapareceu - e um ano mais tarde surgiu na casa nova de sua família, no Tennessee, a 500 km de distância.Sugar era outro gato persa, com um calo ósseo característico na anca. Quando a família saiu da Califórnia e se mudou para o Oklahoma, deixou Sugar com os vizinhos. Duas semanas depois ele desapareceu e voltou a aparecer na soleira da porta de sua primeira família quatorze meses mais tarde, tendo viajado 2.500 km. Mas até essa enorme distância chegou a ser duplicada no caso mais bem-documentado de psi-rastreio em gatos: um gato que pertencia a um veterinário nova-iorquino. O gato foi deixado para trás quando seu dono, promovido para um novo cargo, mudou-se para a Califórnia. Muitos meses depois, o bichinho conseguiu chegar até a nova casa do veterinário, a 5.000 km de distância. O gato pôde ser identificado por um crescimento ósseo na quarta vértebra da cauda que fora causado por um ferimento anterior.Em seu rigoroso levantamento feito no ano de 1963 sobre casos de psi-rastreio, Rhine e Sarah analisaram cuidadosamente a enorme quantidade de relatos colecionados na Duke University durante muitos anos, e selecionaram por fim 25 casos que satisfaziam seus critérios pelas provas de identificação, credibilidade dos menores detalhes e dados de apoio com a corroboração de testemunhas. Os 25 casos compreendiam dez cachorros, doze gatos e três passarinhos. Todos eles haviam conseguido chegar a seus donos em novas casas a distâncias de centenas de quilômetros.Até hoje, não se teve a oportunidade de fazer testes rigorosos para estudar o psi-rastreio sob condições de laboratório. Já nos anos 20, psicólogos e parapsicólogos experimentais fizeram testes de campo para medir os índices de êxito de vários animais - gatos, cães e camundongos - em encontrar o caminho de casa percorrendo lugares desconhecidos. Tais experiências têm sido repetidas há meio século e os animais testados demonstraram grande facilidade em voltar para casa a partir de distâncias entre 5 e 15 km; no entanto, tendo em vista a mais profunda compreensão científica que temos atualmente das

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faculdades sensoriais dos animais (ou seja, sua sensibilidade ao magnetismo, a sensibilidade à luz polarizada e as capacidades auditivas), estes feitos provavelmente terão muito pouco a ver com a PES.Em 1962, Rhine e Sarah fizeram um levantamento de histórias que sugeriam a PES em animais, além dos dados coletados relativos ao psi-rastreio que mereceram maior atenção; todas envolviam alguma forma de precognição animal - uma reação que evitou perigo para o animal ou seu proprietário, o pressentimento da morte do dono ou a excitação na expectativa de um retorno antecipado do dono.Já se contaram muitas histórias com exemplos de animais que parecem ter previsto a morte iminente ou tiveram outros tipos de precognição. Existem casos de cachorros que latiam ou se recusavam a deixar carros estacionados minutos antes que alguma catástrofe natural, como a queda de uma árvore, ocorresse no lugar onde seus donos iriam passar. Um gato que normalmente dormia ao lado do aparelho de televisão, certa noite deu um pulo, ficou olhando firme para o aparelho e procurou sair da sala... minutos depois o tubo da televisão explodiu, espalhando fragmentos de vidro por todo o ambiente.Durante a Segunda Guerra Mundial, muitos ingleses confiavam em seus gatos para saber quando ir procurar abrigo de um reide de bombardeiros alemães. Minutos antes que os bombardeiros da Luftwaffe pudessem entrar nas telas dos radares fazendo soar os alarmes, os gatos se arrepiavam e conta-se que lideravam as corridas para os abrigos. Muitos desses gatos salvadores de vida foram agraciados com a Medalha Dickin que traz a gravação "Nós também servimos".O mais bem-pesquisado destes muitos casos de vidas salvas por animais com a aparente faculdade de previsão foi constatado por Andrew MacKenzie e envolve uma cadela cocker-spaniel chamada Merry, que pertencia à família Baines, de Wimbledon, zona sul de Londres.

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No início da guerra, a família havia procurado refúgio dos bombardeios alemães num abrigo subterrâneo escavado no quintal. Mas, de 1941 até meados de 1944, o abrigo do quintal fora abandonado por sua umidade, em troca de outro, reforçado com aço, dentro da casa, cujo acesso abria-se embaixo da mesa da cozinha. Durante esses quatro anos, a família e um vizinho que morava a duas casas dali haviam dormido a salvo em seu abrigo interno e não viam razão para mudar esse hábito até que um dia foram forçados a isso por Merry .Em 30 de junho de 1944, doze horas depois que uma bomba alemã caíra sobre casas a um quarteirão de distância, arrebentando as janelas da casa da família Baines, Merry desapareceu. Depois de muita busca, ela foi encontrada no abrigo abandonado do quintal. A filha dos Baines, Audrey, pegou a cadela e arrumou de novo a pilha de tábuas que impedia o acesso ao abrigo do quintal, mas Merry conseguiu voltar ali mais três vezes naquele dia e parecia relutante em sair. Afinal, por razões que eles mais tarde admitiram impossíveis de justificar racionalmente, os Baines resolveram seguir o aviso de Merry. Limparam o abrigo do quintal, colocaram objetos limpos, arrumaram os beliches e, naquela noite, acompanhados pelo vizinho dormiram ali, dentro de suas paredes protetoras.Às 2h50min da madrugada uma bomba caiu sobre a casa dos Baines, destruiu e incendiou os canos de gás da rua, e demoliu aquela e muitas outras da vizinhança. Se a família houvesse dormido no abrigo interno, todos teriam morrido.A partir das narrativas de muitas testemunhas visuais recolhidas por MacKenzie do pessoal do sistema de alarme aéreo local, junto a membros da própria família e de alguns vizinhos, parece não haver dúvida de que o comportamento de Merry tenha realmente salvo a vida de toda a família e do vizinho. Mas, seria este um caso de precognição legítima por parte de Merry? Resta a explicação alternativa opcional de que o bombardeio da noite anterior, que arrebentou as janelas da casa e rachou o teto de gesso, tenha sido demais para a tranqüilidade de Merry, e que muito bom senso e a

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memória de uma segurança anterior tenham levado a cadela simplesmente a decidir mudar para o abrigo do quintal, que seria melhor proteção contra bombas futuras.Não há um meio definitivo de se responder â questão de PES em todas essas numerosas histórias que envolveram, além de seres humanos, também animais; daí a impaciência dos parapsicólogos experimentais em testar essas faculdades em condições laboratoriais. Enquanto muitos casos escapam a qualquer espécie de verificação em laboratório, os que envolvem a precognição de animais em perigo iminente se prestam a uma resposta experimental controlada. O dr. Robert Morris da Sociedade para a Pesquisa Psíquica planejou os primeiros desses testes em 1967, com resultados moderadamente bem-sucedidos.Sabendo que ratos expostos ao perigo "gelam", Morris criou um cenário experimental que poderia indicar o índice de atividade dos ratos numa situação de "campo aberto" (uma área não restrita) dez minutos antes que certa quantidade deles fosse morrer. Morris liberava, um por um, dezenove ratos na área de campo aberto e media quantos ladrilhos quadrados cada um poderia cobrir durante um espaço de dois minutos. Dez minutos depois, um assistente do laboratório arbitrariamente matava os que haviam sido marcados por um número qualquer, indicado por um gerador de números aleatórios.Ao verificar os índices de atividade de todos os ratos, comparando os dados sobre aqueles que haviam sido selecionados para morrer, Morris realmente encontrou uma correlação acima do acaso entre os que "gelavam" e os que morreram, demonstrando assim uma visível ligação precognitiva entre a atividade reduzida dos ratos e sua morte iminente. Mas ainda deve-se manter alguma prudência antes de se chegar a conclusões definitivas com esses resultados. Quando Helmut Schmidt pretendeu repetir os testes de Morris em seu próprio laboratório no Texas, não conseguiu obter nenhum resultado significativo. E quando os canadenses James Craig e William Treurinet repetiram, por sua vez, os mesmo testes, obtiveram uma correlação maior que o acaso entre os ratos que "gelavam" e os que

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continuariam vivos, ou seja, um resultado exatamente oposto ao de Morris.Mais uma vez fizeram-se experiências precognitivas visivelmente bem-sucedidas num laboratório na França, com ratos que iriam receber um leve choque elétrico. O objetivo era saber se os ratos evitariam ou não entrar em determinada parte da gaiola onde poderiam receber um choque no futuro. Só que qual viria a ser esta parte seria determinado aleatoriamente por sorteio. Os franceses (que preferem identificar-se pelos pseudônimos "Duval" e "Montredon") obtiveram resultados positivos em proporção maior que 1.000 por 1 contra o acaso em seus testes. Acontece que o único trabalho em que se repetiu este teste com sucesso foi o de Walter Levy, nos laboratórios da Duke University. Algum tempo depois, entretanto, J. B. Rhine e outros consideraram o trabalho de precognição aparentemente bem feito em camundongos, feito por Walter Levy, fraudulento. A fraude de Levy é um dos piores casos de vigarice verificados na psicologia experimental.Assim, embora possa haver algo promissor em estudos de laboratório sobre a precognição animal, ainda não existe uma pesquisa realmente sólida, que tenha sido repetida de maneira consistente, de forma a proporcionar alguma prova experimental capaz de realmente chamar a atenção quanto à existência do fenômeno. Restam histórias da vida diária que sugerem que, às vezes, animais apresentam uma ou outra faculdade PES, mas ainda não temos provas de que eles as possuam com maior freqüência ou de maneira mais confiável do que os seres humanos. Em 1974, John Beloff, psicólogo da Universidade de Edimburgo e antigo presidente da SPP, resumiu o estado atual do conhecimento experimental dizendo, um tanto depreciativamente: "As provas sobre animais que tenham faculdades PES são muito exíguas mesmo se comparadas com a ocorrência dessas faculdades nos seres humanos e parecem ocorrer de maneira excepcional e tão marginal em seus efeitos, tanto em homens quanto em animais".

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6. A PSICOLOGIA DA PRECOGNIÇÃO

Enquanto alguns parapsicólogos têm estado ocupados tentando definir a existência ou não de fenômenos como a precognição, outros concentraram-se mais na psicologia do assunto: quem tem a precognição? E sob quais circunstâncias emocionais ou mentais?Os dois gigantes da psicologia moderna, Freud e Jung, envolveram-se em determinado momento na pesquisa parapsicológica, publicando muitos documentos sobre o assunto. Mas, enquanto esse interesse surgiu natural e quase que apaixonadamente para Jung no início da carreira (sua primeira dissertação para obtenção do diploma médico era um estudo da "Psicologia e patologia do chamado fenômeno oculto"), Freud entrou neste campo quase que involuntariamente, como um recruta forçado que tivesse tentado fugir por todos os meios possíveis.Em sua autobiografia, Memórias, sonhos e reflexões, Jung conta a história de um incidente ocorrido ao viajar a Viena em 1909 para saber a opinião de Freud sobre a precognição e outras questões parapsicológicas. À simples menção do assunto, Freud veio com um discurso contra "a maré negra da porcaria do ocultismo" e não queria ouvir mais nada sobre tal questão. Como Jung contou:

Enquanto Freud continuava a falar desse modo, tive uma curiosa sensação. Era como se meu diafragma fosse de ferro e estivesse ficando vermelho pelo calor. Uma caixa incandescente. Naquele

instante houve uma detonação muito alta na estante que estava a nosso lado, de tal modo que nos assustamos, achando que a coisa ia

cair por cima de nós. Eu disse a Freud:- Eis aí: um exemplo do chamado fenômeno de exteriorização

catalítica.- Ora, vamos! - exclamou ele. - Isto é pura besteira.

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- Não é - repliquei. - O senhor está enganado, Herr professor. E para provar o que lhe digo, posso predizer que dentro de um instante

vai haver outra detonação como aquela!Mal eu acabara de proferir essas palavras, a mesma detonação veio

da estante.Até hoje não sei o que pode ter me dado aquela certeza. Mas eu tinha

absoluta certeza de que a detonação iria acontecer de novo. Freud apenas ficou olhando horrorizado para mim. Não tenho a menor idéia do que se passava em sua cabeça ou do que poderia significar seu

olhar. De qualquer maneira, o incidente levantou sua desconfiança em relação a mim. Nunca mais discuti o incidente com ele.

Enquanto o impulso de Jung foi o de evitar prosseguir uma discussão sobre o fenômeno psíquico com Freud depois do incidente da estante, o próprio Freud referiu-se ao assunto outra vez, e logo depois, numa carta paternalista para Jung. Depois de explicar jovialmente os ruídos que haviam emanado da estante durante aquele encontro, admoestou seu jovem protegido sobre o interesse pelo "ocultismo", aconselhando-o a "manter a cabeça fria, sendo preferível não entender uma coisa que exige tão grande renúncia por amor à compreensão".Não ficou muito claro se a preocupação de Freud era a de que Jung estaria sacrificando sua reputação ou sua sanidade mental (ou ambas) ao dedicar-se ao oculto. Mas as próprias experiências clínicas de Freud trabalharam contra essa sua obstinada resistência em relação à parapsicologia. Ocorrências telepáticas entre ele e seus pacientes eram numerosas demais, e, por mais que quisesse, ele não conseguia explicá-Ias. Ele ficou mais aberto à pesquisa que se fazia nesse campo, e, ao tomar conhecimento das experiências que o professor Gilbert Murray - que ele sabia ser um ilustre professor em Oxford - vinha fazendo, Freud teve de se entregar. Declarou numa carta entusiasmada a Ernest Jones: "Confesso que a primeira impressão foi tão forte que... estaria disposto a fornecer o apoio da psicanálise quanto à questão da telepatia". Jones, mais conservador, ficou preocupado com esta sugestão, pois estava certo de que isso iria

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destruir a reputação da psicanálise; mas já não havia como deter o mestre agora. Em 1911, ele tornou-se membro da Sociedade para a Pesquisa Psíquica inglesa e da americana, e publicou seu primeiro (de muitos outros) ensaio sobre a telepatia no ano de 1922.A preocupação maior de Freud eram as condições psicodinâmicas que permitiam o surgimento das experiências psíquicas, e o encontro de algum espaço para estas em sua teoria geral da personalidade. Afinal, ele chegou à conclusão de que havia faculdades arcaicas e regressivas originárias de um período muito anterior ao desenvolvimento do ser humano:

A telepatia deve ter sido o meio arcaico original pelo qual as pessoas se entendiam, um meio que ficou para trás no decorrer do

desenvolvimento fIlogenético, por um método de comunicação melhor que apareceu, ou seja, por sinais percebidos pelos órgãos sensoriais.

Entretanto esses antigos meios de comunicação podem ter sobrevivido na obscuridade e ainda se manifestam sob determinadas

circunstâncias.

Em seu estudo sobre a precognição, H. F. Saltmarsh sugeria quais poderiam ser essas condições: "Em minha opinião, as precognições só acontecem quando o indivíduo está em estado de dissociação, quer dizer, elas são coisas da mente subliminar ou inconsciente". Com toda certeza, existem muitas provas para essa opinião.Os profetas xamãs do período neolítico guardavam os lampejos de suas imagens previsionárias meditando sobre as asas giratórias de uma suástica, símbolo que ao receber um impulso de rotação na direção dos ponteiros do relógio acreditava-se liberar as forças do inconsciente. Os dervixes rodopiantes do Islã, as sacerdotisas de Delfos e todos os primeiros profetas bíblicos se colocavam em estado de êxtase ou de demência com a música ou vapores de drogas, de maneira a realçar seus talentos proféticos através de um contato maior com seus próprios egos não racionais. E Platão, no Timaeus, refletia que era este o plano da Natureza. Os autores de nossos

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corpos, concluía ele, haviam localizado o dom profético no fígado, porque este órgão encontrava-se na parte mais baixa do organismo e a adivinhação era um poder corretamente atribuído às ordens mais inferiores de nossa natureza:

Nenhum homem, em seu juízo, atinge a verdade e a inspiração profética, mas quando recebe a palavra inspirada sua inteligência

estará adormecida ou ele estará enlouquecido por algum desequilíbrio ou possessão... Por isso, é costume determinar-se intérpretes que

sejam juízes de inspirações verdadeiras (que sejam) os comentadores de visões e ditos sombrios.

Timaeus, 71c, 72b

Essa visão geral de que os poderes PES provenham de retrocessos primitivos, subconscientes ou arcaicos está refletida no trabalho de muitos psiquiatras que, referindo-se às vozes e visões dos doentes mentais, em especial os esquizofrênicos, argumentam que tais faculdades são sinais de alguma aberração mental. "A menos que se tenha tido um contato pessoal com gente que diz ter passado por experiências psíquicas", observou o prof. D. J. West em seu amplo levantamento de casos espontâneos de precognição, "poderá ser difícil imaginar-se o que a insanidade possa ter a ver com a questão". E "não é de maneira alguma desconhecido para os funcionários da SPP ter de lidar com pessoas que os chamam com os olhos revirados para dizer estarem em constante relação telepática com algo ou com alguém... Hoje existem milhares de pacientes (dentro e fora) de asilos; na maioria dos casos a característica principal da doença é uma obsessão por entidades psíquicas imaginárias". West, no entanto, concorda que a insanidade em si, em que as pessoas estejam sofrendo ilusões de experiências psíquicas mais do que estarem abertas à legítima experiência psíquica, é o lado menos interessante de como a faculdade PES possa estar relacionada com a insanidade mental. A tese de que uma faculdade autêntica possa, por si mesma,

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ser sintomática de um colapso em certas faculdades protetoras normais que a maioria das mentes possui é mais correta.Esta noção de "faculdades protetoras" vem de um trabalho do filósofo Henri Bergson; ele propunha a idéia de que nosso sistema nervoso tenha sido planejado como um filtro elaborado, que permite deixar passar essas energias e "radiações" úteis para o desenvolvimento de nossas faculdades intelectuais mais elevadas, afim de nos ajudar a enfrentar as experiências. O "filtro" de Bergson é semelhante às categorias da percepção e da compreensão de Kant. Os dois filósofos sugerem que a realidade, além dessas categorias (ou filtros), contém todos os gêneros de coisas a nós inacessíveis, com a estrutura que temos.A visão de "faculdades primitivas" de PES sugerida por Freud  e apoiada pelo trabalho clínico do psicanalista Jan Ehrenwald, que demonstrou haver uma correlação muito elevada entre a capacidade psíquica e os primeiros sinais de uma emergente esquizofrenia ou outra forma de psicose - aceita a hipótese de que faculdades como a telepatia e a precognição tenham sido sacrificadas em nome da evolução. A consciência da realidade gerada por tais faculdades ancestrais "é obscura e incerta", como explica Ehrenwald, "e sujeita a equívocos de refração, provocados pelas perambulações da camada inconsciente da mente pela qual ela tem de passar". Para que nossas capacidades lingüísticas e lógicas mais precisas pudessem desenvolver-se (e talvez mesmo para que nossa sobrevivência como espécie pudesse estar assegurada), essas percepções difusas precisaram ser bloqueadas de nossa consciência na vida diária. Sir Cyril Burt, professor de Psicologia no University College de Londres, descrevia esta posição num discurso para a Sociedade para a Pesquisa Psíquica inglesa no ano de 1968 da seguinte maneira:

"Ó", disse o cocheiro para Tom Brown, "a melhor coisa para gente simples assim que nem você e eu é usar antolhos, de modo que a

gente só possa enxergar o que está bem na frente". A natureza parece haver funcionado muito dentro desse mesmo princípio. Nossos

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sentidos e nosso cérebro funcionam como uma espécie de filtro muito complexo que limita e dirige os poderes clarividentes da mente, de modo que em condições normais a atenção esteja concentrada nos

objetos e situações que tenham importância biológica para a sobrevivência do organismo e da espécie... Como regra geral, a mente rejeita idéias de outra mente, assim como o corpo rejeita enxertos de

outros corpos.

Ainda que afirmando a provável necessidade de uma tal abordagem limitada à realidade, Burt acrescentou rapidamente: "Acreditar que partindo de tal base possamos construir um quadro completo que tudo inclua do universo é o mesmo que supor que um mapa das ruas de Roma possa dizer como parece exatamente a Cidade Eterna quando ali estamos".A opinião de que faculdades extra-sensoriais como a telepatia e a precognição sejam um retrocesso primitivo é unânime. Outros psicólogos discordam inteiramente, argumentando que a PES é uma parte natural, embora negligenciada, de nossa constituição psíquica normal, ou ainda, que é algum novo "sexto sentido" cujo domínio estamos desenvolvendo. Frederic Myers, um dos fundadores da SPP, escreveu no final do século passado que essa nova faculdade poderia expandir nossa consciência para muito além dos limites da experiência humana normal. Cinqüenta anos depois, o controverso filósofo C. E. M. Joad argumentava que ela era "uma primeira intimação hesitante de um novo impulso para a frente de parte de uma força de vida muito útil".

A Pesquisa na Psicologia da PES

Se a PES é realmente alguma faculdade regressiva que vai até eras obscuras de nosso passado primitivo, algo antigo e ultrapassado, embaraçoso e sinal de instabilidade mental, ou se é um sintoma de um novo amanhã resplandecente, é uma discussão que modelou

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grande parte da pesquisa psicologicamente orientada na parapsicologia experimental nesses últimos 25 anos. Os pesquisadores sustentam a esperança de que, se pudessem chegar a acumular dados suficientes sobre os tipos de pessoas (idade, estado mental, grau de educação etc.) que costumam passar por experiências PES e as condições físicas e psicológicas que predispõem a estas experiências, a questão estaria resolvida de uma vez por todas.A tese de Freud de que a PES é um fenômeno atávico mais apropriado à vida selvagem do que à das pessoas altamente desenvolvidas (o homem civilizado) deu origem a três alvos evidentes para a pesquisa experimental: os animais, aqueles poucos "povos selvagens" que ainda existem dispersos em áreas remotas da África e do sudeste da Ásia, e nossas crianças, antes que alcancem a maturidade intelectual.Se a PES é uma faculdade em desaparecimento que pertence aos degraus inferiores da escala filogenética, raciocinaram alguns psicólogos, certamente iríamos encontrá-Ia dominante entre os animais inferiores; e, realmente, as histórias sobre alegadas faculdades psíquicas de animais selvagens e domésticos são abundantes. Mas, em todas as tentativas, os experimentalistas na verdade obtiveram muito poucas e frágeis provas de que os animais possuam a telepatia ou a precognição. E assim, a evidência para a tese de Freud deveria estar em outra parte, e a antropologia parecia um campo promissor para que se tentasse verificar.

A Pesquisa Antropológica

Da mesma maneira como os mitos e lendas dos primeiros estágios de nossa cultura eram dominados por histórias de feiticeiras e videntes investidos de poderes extraordinários para a leitura da mente das pessoas, a previsão, a levitação etc., parte do conhecimento antropológico no início de nosso século era bastante inspirado por

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narrativas sobre "médiuns selvagens" que apareciam nas histórias de viagens dos exploradores. Os antropólogos fizeram viagens para pesquisa de campo a lugares como Bornéu, Haiti, Cidade do Cabo e Congo, voltando carregados de histórias sobre sessões mediúnicas, ritos extáticos de vudu em que a levitação ocorria normalmente, e miraculosas narrativas sobre importantes informações que viajavam através das selvas, por entre as matas, quase instantaneamente.Conta-se que um adivinho na África do Sul previu corretamente que uma cabra negra grávida, com a qual um antropólogo estava preocupado, iria dar à luz em breve a um filhote branco e um cinza. O adivinho de Tembu (Cidade do Cabo), Solomon Baba, teria acertado corretamente que, antes de ir visitá-Io de uma distância de 100 km, o psiquiatra sul-africano Laubscher havia enterrado uma bolsinha embrulhada em papel pardo, que por sua vez fora coberta por uma pedra cinza. Meia hora antes do terremoto de 1907 na Jamaica, uma garota mulata teria explodido em soluços convulsivos e saíra correndo pelas ruas gritando: "Uma coisa horrível está para acontecer!" Durante o devastador furacão de 1951, também na Jamaica, pessoas desprovidas de quaisquer meios normais para a comunicação à distância teriam entrado em contato umas com as outras através da ilha por algum meio "natural e misterioso", enquanto certa mãe teria enviado com sucesso uma mensagem a seus filhos em perigo a 16 km pelos bons ofícios de um algodoeiro.O denominador comum em todas essas histórias é que a prova é o fato, e quem as contava eram os nativos, que invariavelmente se descobria acreditarem na veracidade de suas próprias faculdades psíquicas, ou nas de seus ancestrais. Muitos dos primeiros antropólogos descaradamente consideravam esses testemunhos bons o suficiente. Como Robert Lowie dizia:

As narrativas de experiências ocultas feitas por pessoas que de outra forma seriam inteligentes e confiáveis não poderão ser simplesmente postas de lado. Elas têm a aparência de verdade sejam quais forem suas interpretações de visões ou audições. Como disse meu melhor

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intérprete, Crow: "Ao escutar os velhos falando de suas experiências misteriosas, devemos apenas acreditar neles".

A alta consideração que Lowie tinha por crença tão disseminada era compartilhada por Ralph Linton, que escreveu:

Fui tomado de surpresa em minha experiência com grupos primitivos ao verificar a uniformidade de suas histórias sobre o que chamaríamos

de "fenômenos psíquicos". Crenças a respeito desses fenômenos vindas de grupos que não teriam qualquer possibilidade de contato

são tão semelhantes que sugerem uma grande limitação da imaginação humana ou a presença de uma base comum para os fatos

observados.

Os que estudam a moderna pesquisa psíquica poderiam reconhecer esta linha de argumentação: "Se tantos acreditam, é porque deve ser verdade"; mas também sabem que os ativistas mais críticos no campo exigem modelos de evidências mais objetivas. E assim tem sido entre os antropólogos nos últimos trinta anos.Um psicólogo holandês, o dr. M. Pobers, aproveitou um simpósio internacional sobre a percepção extra-sensorial para criticar (em termos talvez propositadamente tendenciosos) a credulidade, muitas vezes ingênua, de antropólogos e psicólogos que estudaram rituais e crenças de povos primitivos, e apelou para a aplicação de técnicas de estudo mais objetivas, e, se possível, mais experimentais. Ele não foi o primeiro a notar que pesquisadores que participam de encontros com nativos dentro da selva, onde seus sentidos são submetidos ao incessante bater ritmado de tambores e à inalação de pesadas fumaças intoxicantes, se tornam emocionalmente envolvidos nos processos. Durante um encontro desses a que ele esteve presente no Haiti, uma mulher possuída por um espírito saltou dois metros do chão no ar e depois suspendeu-se por muitos minutos num raio de luz.

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''O mesmo fenômeno visto de um ângulo ligeiramente diferente", comenta Pobers, "poderia ser descrito como levitação", e ele deixa implícito que essa era exatamente a intenção. Mas isso significará, por exemplo, que os feiticeiros haitianos possam manter vivo o mito do selvagem psíquico, pelo menos em parte, por meio de todos aqueles tipos de simulação e fraude que às vezes já acabaram com os espetáculos psíquicos públicos em nossa cultura? A julgar pelo testemunho de um desses feiticeiros, assim parece."Na terra de vocês", disse o haitiano a Pobers, "o dinheiro leva ao poder. Aqui, é o poder que leva ao dinheiro. Um adivinho não pode se permitir 'acertos e erros' em suas práticas. Até mesmo se os poderes que tem forem autênticos, ele terá de ser um mestre da simulação e da fraude. Esta é sua garantia de emprego".Para evitar o problema de ser passado para trás por esse tipo de simulação ou pela mais inocente, mas igualmente equívoca, fé cega que os grupos primitivos tendem a manter sobre seus poderes psíquicos, Pobers apelou para o teste do gênero laboratório de campo para o nível real das faculdades psíquicas entre os povos primitivos. Foram feitos uns poucos estudos desse tipo.Em 1949, Ronald e Lyndon Rose viajaram até a colônia aborígine de Woodenbong, Nova Gales do Sul (Austrália), para fazer uma série de experiências-padrão sobre PES com a adivinhação de cartões junto aos nativos. Os aborígines lhes haviam dito que a comunicação telepática era uma experiência confiável e bastante comum em situações de crise, como a morte ou doença grave de um parente próximo. Mas em seus testes de Rhine (um total de 296), em que se pedia a 23 aborígines de todas as idades para adivinhar qual dos cinco possíveis tipos de cartões estaria sendo selecionado no pacote de 25, os resultados foram inconclusivos. Uma senhora idosa de 77 anos, aborígine, acertou muito acima da possibilidade do acaso, mas dezoito das pessoas não passaram da expectativa da sorte e outras apresentaram apenas uma variação um tanto quanto marginal. Os dois pesquisadores pediram também ao mesmo grupo de indivíduos que tentassem uma experiência de psicocinese, em que teriam de

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usar suas mentes para procurar influenciar a maneira como alguns dados iriam cair depois de agitados; essa experiência também não obteve resultados além da expectativa do acaso. Os aborígines disseram-lhes que não se podia esperar outra coisa da experiência com os dados, pois ''somente homens muito sabidos podem fazer coisas desse tipo".Ronald e Lyndon Rose tentaram os testes de cartões PES com nativos em Samoa, sem resultados acima do acaso, e também um outro antropólogo, Jeffrey Mason, que experimentou os testes em tribos da Libéria, não obteve resultados significativos.Em 1968 e 1974, Robert L. Van de Castle fez, com um total de 461 alunos adolescentes, índios cuna, da ilha de San Blas, ao longo da costa do Panamá, uma série de testes para verificar as faculdades PES, usando um conjunto de cartões especialmente desenhados com símbolos como tubarões, jaguares e canoas, pois esses objetos significavam mais para aquelas pessoas que os símbolos-padrão dos cartões Zener. As 96 garotas que fizeram o teste acertaram muito pouco acima da expectativa do acaso e os 365 garotos, muito pouco abaixo dessa expectativa. No caso dos dois sexos, garotos mais jovens testados mais de uma vez tendiam a acertar ainda mais próximo do acaso, embora olhando para sua série de testes como um todo, Van de Castle tenha considerado seus resultados significativos o bastante para merecer maior investigação.Dessa maneira, testes PES à ocidental, mesmo quando praticados com indivíduos oriundos de grupos primitivos diversos, embora potencialmente significativos, não foram impressionantes o bastante para que se possa dizer que ''selvagens'' são mais psíquicos que o homem civilizado. É possível tirar algumas poucas conclusões desses testes. Considerando-se que os aborígines testados pelos Rose, por exemplo, haviam dito que suas faculdades telepáticas seriam mais bem demonstradas em situações de crise, pode muito bem ser que eles tenham achado as experiências com os cartões por demais aborrecidas ou diferentes da maneira de fazer deles, para que pudessem ter um bom desempenho. O "fator aborrecimento" com

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certeza desempenhou um papel importante na diminuição dos resulta-dos de pessoas submetidas a experiências monótonas e repetitivas de séries de cartões a adivinhar.

Pesquisa com Crianças

Na Inglaterra, Ernesto Spinelli, que fez uma ampla pesquisa para sua tese de doutorado na Universidade de Surrey sobre a questão de se as crianças em nossa cultura seriam mais telepáticas do que os mais velhos, tentou contornar o problema de o aborrecimento ou a alienação terem uma influência negativa em resultados da PES procedendo a suas experiências numa atmosfera de festa. Deixou que as crianças usassem um "chapéu de pensar" com aspecto engraçado enquanto rivalizavam umas com as outras para vencer o jogo da adivinhação"; os mais sábios ganhavam a recompensa de um punhado de balas. Quase cinqüenta anos antes, Louisa Rhine havia pensado em algo semelhante ao inventar um jogo de PES para crianças pequenas (obtendo muito bons resultados).A noção de que as crianças pequenas poderiam ser mais vulneráveis à percepção extra-sensorial poderia ser um resultado da tese de Freud de que a PES é um fenômeno atávico, e isso parece ter sido confirmado pelo trabalho clínico com crianças desde então. C. D. Broad achava que alguma forma de telepatia, pelo menos, seria em parte responsável pelas habilidades intuitivas especiais demonstradas pelos pequenos durante aqueles primeiros anos em que têm tanto a aprender de seus pais e professores. E Jan Ehrenwald, que concordou com a opinião de que existe, no mínimo, uma dessas faculdades como parte da comunicação normal entre mãe e filho, percebeu que seu trabalho com crianças pequenas com perturbações proporcionava uma prova mais vigorosa ainda da vulnerabilidade aos fenômenos extra-sensoriais. Ele notou, repetidas vezes, que as crianças de três e quatro anos pareciam ter em funcionamento um conhecimento de pensamentos e símbolos

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(sobretudo sexuais) mais próprios de adultos, e que o tipo de coisa que enchia a cabecinha dessas crianças em geral estava muito proximamente relacionado com o que estivesse na base dos problemas de suas mães perturbadas.

Rita, com três anos de idade, sofria de uma neurose obsessiva que parecia duplicar a maioria dos sintomas de uma neurose semelhante encontrada em sua mãe, que incluía implicações sexuais (do gênero

de adultos) ocultas... Peter, três anos de idade, sofria também de uma neurose com toda a parafernália de simbolismo sexual do adulto... A

mãe de uma garota retardada mental com dezesseis anos passou por um tratamento psicológico, e, à medida que a análise da mãe fazia

progressos satisfatórios, a condição mental da filha parecia melhorar.

"Entretanto, no decorrer do desenvolvimento gradual e da consolidação da personalidade da criança em crescimento, essa susceptibilidade à telepatia e influências relacionadas com isso vão recuando cada vez mais para o fundo", Ehrenwald observou.E foi para testar essa espécie de idéia clínica que Spinelli começou a avaliar as crianças através de seus métodos experimentais.Para proceder a seus testes, Spinelli selecionou crianças de creches e escolas primárias locais com idades de três anos para cima, e as testou em pares. Cada criança recebia uma caixa com cinco botões, um para cada uma das cinco figuras possíveis mostradas num cartão. Quando uma criança escolhia e indicava sua escolha apertando um botão, a outra (sentada em frente e sem poder ver o que seu parceiro fazia) devia adivinhar qual a figura escolhida pelo parceiro e registrar sua adivinhação também apertando um botão em sua caixa. A cada adivinhação correta, soava uma campainha para parabenizar e encorajar a criança.Em cada sessão (Spinelli realizou 1.200 no total, durante cinco anos), verificavam-se alterações de turno das crianças que tinham de adivinhar qual dos cinco símbolos a outra teria escolhido numa série de vinte. Os próprios cartões eram arrumados numa ordem que seguia

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a referência de uma tabela de números aleatórios e registrava-se eletronicamente cada adivinhação num gráfico a fim de eliminar trapaças ou erros do experimentador. Os resultados foram impressionantes e parecem dar uma grande contribuição com prova experimental sólida para a tese de Freud de que a faculdade PES pertence a um estágio anterior do desenvolvimento humano.Dividindo as crianças em quatro grupos etários - 3 -3 e 1/2 anos, 4 e 1/2-5 anos, 5-7 anos e acima de 8 anos - e testando a comunicação telepática entre as próprias crianças em cada grupo, o que era medido pela margem de acertos nas figuras dos cartões, Spinelli pôde estabelecer que à medida que as crianças crescem e as faculdades conceituais de seus cérebros amadurecem, a capacidade de se comunicar por telepatia aparentemente vai sendo reduzida.Assim, nos testes do grupo mais jovem, as crianças de 3-3 e 1/2 anos, o acerto foi 27% acima do acaso. No grupo de 4 e 1/2-5 anos de idade, essa margem caiu para 15%; entre os de 5- 7 anos, para 4%; e de 8 anos para cima, a margem de acertos estava dentro das expectativas normais do acaso. Tais resultados, semelhantes a um estudo anterior com crianças holandesas em idade escolar mas um pouco mais velhas, e de certa maneira também obtidos pelo dr. Michael Winkleman da Universidade da Califórnia, poderão ajudar a lançar mais luzes ao desenvolvimento mental humano e à natureza da capacidade PES.

A pesquisa por EEG (eletroencefalograma) dos últimos vinte anos demonstrou com clareza a existência de quatro padrões de ondas elétricas isoladas e associadas ao cérebro humano: as ondas alfa, beta, teta e delta. Cada uma está associada a diferentes funções cerebrais. Na maioria dos cérebros adultos normais, as ondas beta, associadas ao pensamento conceitual, organizado, dominam o padrão do EEG nas horas despertas. As ondas delta são encontradas quando o cérebro está em estado de sono profundo e sem sonhos; as teta, quando há sonhos, e as ondas alfa, em estado de profundo

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relaxamento, quando o cérebro está plenamente desperto, mas sem enfocar nenhuma idéia em particular.Desde o último estágio fetal até por volta da idade de três anos, o cérebro humano infantil mostra um padrão de EEG dominado por ondas delta muito lentas. Entre os três e os cinco anos, o cérebro de uma criança pequena emite principalmente ondas teta, com proporções crescentes de ondas alfa aparecendo na maturidade. Entre as idades de cinco e oito anos, esse equilíbrio entre as ondas teta e alfa recua para uma supremacia das ondas alfa, e, no final da escala, as ondas beta, características do pensamento adulto, começam a aparecer.Dessa maneira, entre as idades de três e oito anos, quando as crianças dos grupos pesquisados por Spinelli mostravam uma acentuada faculdade de PES, suas ondas cerebrais estariam dominadas por uma mistura de ritmos teta e alfa. E, significativamente, esses mesmos ritmos cerebrais mais lentos dominavam os EEG de estados cerebrais de adultos em geral associados à capacidade de PES - o sonho (ondas teta), estados de transe e estados meditativos, como os alcançados através da MT (meditação transcendental). Quase todos os casos de precognição espontânea citados anteriormente aconteceram quando a pessoa em questão sonhava ou estava em algum estado anormal de transe - e isso poderá ser uma indicação de que a presença dd ondas alfa e teta seja, de alguma forma, a pista para a natureza da capacidade de PES.

Pesquisa com Adultos

No laboratório psicológico da Universidade de Cambridge, o dr. Cad Sargent andou investigando se a capacidade de PES aumentaria nos adultos pelo bloqueio do gênero de pensamento normalmente associado às ondas beta - o pensamento conceitual e concentrado. No fundo, o trabalho de Sargent é semelhante à pesquisa realizada por Charles Honorton no laboratório de sonhos do Hospital

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Maimonides de Nova Iorque sobre a PES e a hipnose, onde uma elevada correlação entre os estados hipnóticos e o desempenho da PES foi demonstrada com sucesso. Mas Sargent submeteu os sujeitos adultos à Técnica de Ganzfeld. Como Spinelli, Sargent também trabalhou com indivíduos em pares. Enquanto um estava deitado na câmara de privação sensorial de Ganzfeld, o outro encontrava-se sentado numa sala diferente do laboratório olhando para alguma imagem visual selecionada ao acaso. A experiência consistia em pedir ao parceiro em relaxamento que descrevesse sua imagem e então verificar se ela parecia, de alguma forma, com o símbolo ou a fotografia que estava sendo vista pelo parceiro ativo. Em 302 sessões, utilizando cem assuntos diferentes, Sargent encontrou uma correlação entre as descrições e os cartões 14,3% acima da expectativa do acaso.Sargent descreve a técnica de privação sensorial de Ganzfeld como o aumento do ''processo primário de pensamento" - as imagens casuais e espontâneas encontradas com mais freqüência na infância. Estudos com EEG do estado Ganzfeld são até agora rudimentares, mas poderia se dizer que ele aparentemente faz com que o cérebro emita números maiores de ondas alfa. Sargent acha que estudos com EEG a serem realizados ainda mostrarão a presença de ondas teta.Relacionando os resultados com a privação sensorial de Sargent a suas próprias descobertas com as crianças, Spinelli diz: "Eu mesmo passei pela Técnica de Ganzfeld. Ela bloqueia todos os caminhos normais por onde os adultos estruturam a experiência com pensamentos, e induz a uma espécie de consciência sonhadora. Acho que é assim que as crianças pequenas se sentem a maior parte do tempo".Finalmente, e no que poderia considerar uma extensão do trabalho de Spinelli com as crianças e do de Sargent com a câmara de privação sensorial, alguns parapsicólogos experimentais tentaram demonstrar, através de testes, quais - se é que existe algum - traços específicos da personalidade são mais compatíveis com a capacidade de PES. Em seu laboratório em Cambridge, Sargent observou que algumas

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pessoas que se submetiam aos testes saíam-se muito bem ao demonstrar a telepatia em seus experimentos de privação sensorial, enquanto outras se saíam muito mal.Ele se perguntava por que razão isso acontecia; se, de fato, alguns. tipos de pessoas poderiam ser mais ou menos capazes de ter experiências de coisas como a telepatia e a precognição, devido a suas personalidades.A partir de seu trabalho clínico com pacientes psiquiátricos, Jan Ehrenwald havia firmado o ponto de vista de que pessoas com tendência à psicose (esquizofrenia) estavam mais abertas à informação extra-sensorial do que pessoas que tinham um senso muito forte de sua própria identidade pessoal ("força de ego elevada"). Mas, nestes últimos anos, os psicólogos andaram questionando se poderia haver alguma prova experimental repetitiva da observação de Ehrenwald, ou se a mesma se aplicaria à neurose. Em outras palavras: uma pessoa muito ansiosa ou uma pessoa obsessiva seria mais ou menos aberta à PES? Teria alguma importância se a pessoa fosse audaciosa (extrovertida) ou tímida (introvertida), se ela acreditasse em PES ou se achasse que tudo isso é o cúmulo do absurdo?Para encontrar respostas a questões como essas, pesquisadores como Gertrude SchmeidIer e John Palmer nos Estados Unidos, K. R. Rao na Índia e Sargent na Inglaterra, todos tentaram procurar elos experimentais conectados entre esses e outros traços de personalidade e a capacidade de uma pessoa passar de maneira estável em testes da PES. Em cada caso, eles utilizaram o teste de Cattell, hoje um padrão para medir os traços de personalidade, ou, no caso de Sargent, uma variação levemente diferente do teste de Cattell.O teste de Cattell, usado em escolas ou em centros de testes psicológicos para medir o QI e o tipo da personalidade, faz uma série de perguntas às pessoas, perguntas elaboradas para determinar se a pessoa é ansiosa ou calma, extrovertida ou tímida, confiante ou desconfiada, e assim por diante. A variação de Sargent acrescentava

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umas poucas perguntas para determinar se as pessoas estavam inclinadas a acreditar ou não na PES e se elas conseguiam ou não lembrar de sonhos, ou ainda se eram capazes de guardar uma boa descrição de coisas em suas cabeças.Reunidos, os dados coletados pelos diversos pesquisadores sugerem que uma pessoa capaz de lembrar seus sonhos, de fazer uma descrição em sua cabeça, que é calma, extrovertida, confiante e inclinada a acreditar em PES aparentemente tem maior capacidade de passar por essas experiências (PES) do que a pessoa que não se lembra com freqüência de seus sonhos ou que não é capaz de fazer descrições em sua cabeça, é ansiosa, tímida e desconfiada. O problema com essas descobertas, entretanto, é que as pessoas são naturalmente muito complicadas e muito pouca gente, provavelmente, combina de forma adequada em suas personalidades todos os traços PES positivos ou PES negativos com os quais os pesquisadores concordaram.Assim, enquanto uma pessoa ideal, cuja personalidade seja uma combinação de todos os traços "certos" e "errados", poderia ser considerada capaz de se sair muito bem ou muito mal num teste de PES, na verdade esse teste para descobrir sujeitos ideais com a PES acabou sendo bastante inconcIusivo. E mais: o isolamento de certos traços de personalidade que parecem compatíveis com a capacidade de PES tende a ajudar a compreensão do que seja exatamente esta capacidade. Assim, o uso desse tipo de testes de personalidade para encontrar pessoas com boa PES, apesar de não ser à prova de equívocos, parece eliminar certas dores de cabeça em termos de imprevisibilidade na parapsicologia experimental.

QUESTIONÁRIO Por favor, responda a TODAS as perguntas; é muito importante. Obrigado.

A B C 1. Eu me lembro dos meus sonhos:

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(a) menos que uma vez por semana; (b) uma ou duas vezes por semana; (c) mais que duas vezes por semana. 0 1 2

2. Num feriado, eu preferiria ir para:(a) uma cidade agitada de turismo; (b) alguma coisa entre (a) e (c); (c) uma cabana em lugar sossegado. 2 1 0

3. Se eu fechar os olhos e tentar me concentrar na imagem visual de alguém:(a) não consigo; (b) consigo com muita dificuldade; (c) consigo facilmente. 0 1 2

4. Não sou muito dado a piadas e a contar histórias engraçadas:(a) verdade; (b) mais ou menos; (c) falso. 0 1 2

5. Tenho tendência a criticar o trabalho dos outros:(a) sim; (b) às vezes; (c) não. 0 1 2

6. Mudanças de clima em geral não afetam minha eficiência ou meu humor:(a) sim; (b) mais ou menos; (c) não. 2 1 0

7. Eu aceito a possibilidade de que a percepção extra-sensorial possa ocorrer:(a) sim;

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(b) não tenho certeza; (c) não. 2 1 0

8. Muitas vezes sinto um grande cansaço ao levantar de manhã:(a) sim; (b) mais ou menos; (c) não. 0 1 2

9. Se sei que uma pessoa está raciocinando por linha errada, inclino-me a:(a) ficar quieto; (b) mais ou menos; (c) digo logo. 0 1 2

10. Aceito a possibilidade de que eu possa ser capaz de usar a percepção extra-sensorial de alguma forma:(a) sim; (b) não tenho certeza; (c) não. 2 1 0

11. Quando vou tomar um trem, sinto-me um pouco apressado, tenso ou ansioso, embora haja tempo:(a) sim; (b) às vezes; (c) não. 0 1 2

12. Geralmente lembro de pedaços de sonhos, em vez do sonho inteiro:(a) sim; (b) mais ou menos; (c) não. 0 1 2

13. Se eu tentar lembrar de parte de uma música, acharia isso:(a) fácil;

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(b) mais ou menos; (c) difícil ou impossível. 2 1 0

14. Gosto de conversar e acho fácil iniciar uma conversa com um estranho:(a) verdade; (b) mais ou menos; (c) falso. 2 1 0

Há uma ligeira variação entre as perguntas selecionadas por Sargent e as do teste de personalidade de Cattell. As perguntas 5, 6, 8 e 11 são teste para ansiedade; 2, 4, 9 e 14, para a extroversão; 3, 12 e 13, para imagem visual; 7 e 10, para crença na PES. Se a pessoa fez 0 pontos numa pergunta, a resposta sugere capacidade de PES negativa; mas se fez 2 pontos, a resposta  sugere capacidade de PES positiva.Sargent então pedia às pessoas que respondiam a este teste que fizessem outro teste de PES e descobriu que os que haviam feito mais pontos no teste de personalidade também obtinham mais no teste de PES.

7. A TEORIA DA SINCRONICIDADE DE JUNG

Muitos psiquiatras e psicólogos da primeira metade deste século contentavam-se em colecionar provas da PES e em deslindar sua psicodinâmica, na esperança de conseguir colocar qualquer fenômeno observado em seu lugar certo, enquanto Jung impunha-se uma tarefa bem mais difícil. Já convicto desde seus tempos de principiante na carreira médica de que coisas como a telepatia, a precognição e a psicocinese existem, ele queria entender como elas funcionam. O resultado desse trabalho, publicado quase no final de sua vida, foi a Teoria da Sincronicidade.

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Por "sincronicidade" Jung queria dizer aquilo que a maioria das pessoas chama de "coincidência" - a tendência de coisas semelhantes ocorrerem inesperadamente e ao mesmo tempo, ou de coisas que acontecem em grupos. Mas logo de saída ele faz uma distinção decisiva entre as "coincidências simplesmente casuais", agrupamento arbitrário de coisas superficialmente semelhantes, e as "coincidências significativas", grupos de coisas ou acontecimentos não-arbitrários, que, ao contrário, partilham um mesmo significado comum.Como exemplo de coincidência casual ele cita uma pessoa que toma um ônibus para ir ao teatro, descobrindo que não apenas a entrada do teatro tem o mesmo número da passagem do ônibus, mas que as duas também têm a mesma série de números que resultam no número de telefone de uma pessoa que ela encontra pela primeira vez no saguão do teatro naquela noite."(Tais) agrupamentos ou séries", diz Jung, "pelo menos para a nossa maneira de pensar atual, não parecem ter significado algum, e entram como regra geral dentro dos limites da probabilidade. Mas existem incidentes cuja 'casualidade' parece dar margem a dúvidas." Trata-se dos incidentes que ilustram o que ele chama de coincidências significativas e provavelmente existem poucas pessoas para quem coisas assim não tenham  acontecido de vez em quando.Pensamos numa pessoa a quem não temos visto ou em quem não pensamos há anos e, de repente, a pessoa aparece à nossa frente. Um físico teórico está escrevendo um ensaio sobre a unidade entre o observador e aquilo que ele observa na física quântica; quando ele vai remexer em livros na biblioteca pública com sua mulher e ela escolhe arbitrariamente um livro de um guru indiano de quem nenhum dos dois ouviu falar, o livro cai aberto numa página que diz: "Não há diferença entre o observador e o observado". Uma escritora envia os originais de seu livro a um editor através de seu agente literário e vai a uma conferência em outra cidade onde descobre que ela e o editor haviam sido convidados para coquetéis por uma terceira pessoa que nada sabia dos originais e a quem nenhuma das pessoas poderia adivinhar

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que conhecesse a outra. Todas coincidências, mas do tipo que Jung chama de "significativas".Entre os médicos, Jung fala da "duplicação de casos", dizendo que é um outro fenômeno familiar que ele acha que também ilustra sua teoria. Ele dá o exemplo de um jovem médico que faz o diagnóstico de uma doença tropical extremamente rara, num paciente; o tipo da doença que os médicos só encontram nos livros ou, no máximo, uma vez em toda a carreira. Animado por sua descoberta, o jovem médico vai contá-Ia a seu professor, que comenta:"Humm, do jeito que essas coisas acontecem, não me espantaria se aparecesse outro caso logo em seguida...”E certamente o jovem médico, nos próximos quinze dias, acaba encontrando um segundo caso da mesma doença rara. Os dois pacientes não se conheciam e não havia a menor chance de que pudessem ter contaminado um ao outro.Em outro tipo de exemplo, desta vez ligado à estranha maneira como objetos parecem "encontrar o caminho de volta" para seus donos, Jung escreve sobre o caso muito famoso de uma mãe alemã que havia tirado uma foto de seu filho na Floresta Negra em 1914, pouco antes do início da I Guerra Mundial. Ela deixou o filme com um fotógrafo para ser revelado, mas o início da guerra tornou impossível ir buscá-Io. Finalmente, ela teve a certeza de que nunca mais iria vê-Io.Em 1916, a mesma mulher comprou um filme na loja de um fotógrafo, dessa vez em Frankfurt; ela queria fotografar sua filhinha, ainda bebê. Depois da mandar revelar esse segundo filme, ele voltou com uma dupla exposição; as fotos de cima eram as que ela havia tirado da filha, mas por baixo estavam as fotos que ela tirara de seu filho em 1914. O filme antigo havia voltado à circulação de alguma forma, fora embalado novamente e, "por coincidência", fora comprado pela mesma pessoa duas vezes.Finalmente, num exemplo do tipo de coincidência que poderia ser descrita como precognição, Jung conta a história de uma jovem paciente sua que, na noite antes de ir consultá-Io, sonhou que alguém lhe havia dado um escaravelho dourado. Sentado em seu estúdio de

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costas para a janela enquanto ouvia a jovem descrever seu sonho, Jung escutou um barulhinho atrás de si. Quando olhou para trás, viu um pequeno inseto batendo contra o painel da janela e, ao abri-Ia, o inseto voou para dentro. Ele o apanhou na mão e verificou tratar-se de um besouro do tipo escarabeídeo - o equivalente mais próximo do escaravelho dourado que se poderia encontrar na Suíça."Devo admitir", escreveu ele, "que nada parecido jamais me aconteceu antes ou depois e que o sonho da minha paciente permaneceu uma experiência única, mas continuei fazendo ligações que eu simplesmente não poderia explicar como agrupamentos casuais ou 'passagens'.”E assim, foi em sua própria vasta experiência clínica (estimulada pelos impressionantes resultados sobre a telepatia e a precognição obtidos por J. B. Rhine em suas experiências de adivinhação de cartões PES) que Jung encontrou seu principal impulso para desenvolver alguma explicação em relação a um grupo de fenômenos para o qual não apenas não existia conhecimento algum, mas manifestamente também não havia explicação alguma. As leis da natureza, ele sabia, repousavam firmemente sobre leis da causalidade (segundo a qual cada efeito deve ter uma causa e a causa deve preceder o efeito), mas ainda assim ele se perguntava: num mundo supostamente dominado pela lei da causalidade, poderia haver algum fenômeno que violasse essa lei? Sua resposta foi duvidar, não da veracidade do fenômeno, mas da validade universal da lei:"Logo no início, algumas dúvidas surgiram em meu íntimo sobre a ilimitada aplicabilidade do princípio causal na psicologia... A causalidade é só um princípio e a psicologia não pode ser fundamentalmente esgotada apenas por métodos causais." Se a lei da causalidade não podia abrigar a existência de determinados fatos associados ao trabalho da mente, entre os quais a telepatia e a precognição, então, argumentava Jung, essa lei deve estar distorcida ou, no máximo, deve refletir parcialmente a realidade, e ela mesma estaria necessitando ser repensada.

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Em sua rebelião intuitiva contra a causalidade, Jung foi encorajado pelo que havia vislumbrado dos novos avanços da física no século XX. Ele sabia que a Teoria da Relatividade de Einstein desafiara e perturbara todas as velhas noções de espaço e tempo que eram parte do quadro da causalidade; além disso, os fatos subatômicos, extremamente curiosos e manifestamente anárquicos, descritos pela física quântica pareciam-lhe ainda mais diretamente importantes para a compreensão das mecânicas da psique. Sentiu que, se alguma vez o universo tivesse de ser inteiramente compreendido, isso seria uma tarefa para ser atingida pela física e pela psicologia, transcendendo os grilhões de suas próprias limitações disciplinares e caminhando juntas, compartilhando as descobertas.

Depois de reunir experiências psicológicas de muitas pessoas e de muitos países durante cinqüenta anos, duvido que uma abordagem exclusivamente psicológica possa fazer justiça aos fenômenos em

questão. Não apenas as descobertas da parapsicologia, mas minhas próprias reflexões teóricas... levaram-me a certos postulados que

tocam o reino da física nuclear e o conceito do espaço-tempo contínuo. E isso abre toda a questão da realidade transpsíquica

imediatamente na base da psique.

Com a esperança de desenvolver uma exposição mais rigorosa de suas próprias intuições psicológicas, Jung tomou corno professor de física moderna o prêmio Nobel Wolfgang Pauli, um físico quântico. Jung via a parapsicologia como uma ponte natural entre a física e a psicologia, e Pauli, que concordava com esse ponto de vista, esperava que, trabalhando com Jung, poderia encontrar um caminho para expressar em maior escala, no nível da realidade cotidiana, alguma extensão natural do fenômeno da mecânica quântica que ajudara a descobrir.Em 1952, Jung e Pauli publicaram o trabalho feito em colaboração: A interpretação da natureza e da psique. O livro continha um ensaio de Jung intitulado "Sincronicidade: um princípio de associação acausal" e

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um outro de Pauli com o título "A influência de idéias arquetípicas nas teorias científicas de Kepler". Os dois ensaios expunham a idéia de que existe um cosmos absolutamente sem espaço e sem tempo em que se manifestam a alma (ou psique) e o universo material. Pauli argumentava que esse cosmos tinha sua própria ordem, independente da vontade humana, de categorias humanas perceptivas ou de nossas supostas leis da causalidade. Nele, todos os limites aceitos entre o conhecedor e o conhecido são rompidos, e a mente e a matéria são vistas como extensão uma da outra.Jung chamou a esta um tanto mística e absoluta de "realidade transpsíquica". E também argumentava que ali, num reino além da nossa psique consciente, com suas divisões entre mente e matéria e suas percepções causais manifestadas no espaço e no tempo, há uma unidade sem tempo, onde o passado, o presente e o futuro se fundem, e onde a matéria e a psique não passam de manifestações de uma única realidade. Sua Teoria da Sincronicidade provinha do que ele via como um "inesperado paralelismo entre acontecimentos psíquicos e físicos", uma espécie de paralelismo espelhado no nível quântico pela tendência de partículas fundamentais (elétrons, prótons etc.) comportarem-se, às vezes, como ondas e, às vezes, como partículas.Como já foi dito, a teoria de Jung baseia-se na existência de coincidências significativas, e para ele "significado" era a palavra-chave, que proporcionava a dinâmica do fenômeno sincrônico. Ele sentia muito intensamente que os pensamentos ou acontecimentos que tinham algum significado comum (meu pensamento num amigo ausente há muito tempo e a proximidade física desconhecida desse amigo, o ardente interesse do físico sobre a questão do conhecedor e do conhecido, e um livro que tem esse problema como um de seus temas principais) eram atraídos um para o outro quase como ímãs, embora não seja necessário haver nenhum relacionamento ortodoxo causal entre eles. Tais significados compartilhados, acreditava Jung, poderiam ocasionalmente reunir-se no nível da realidade consciente cotidiana (como coincidência, telepatia ou precognição), porque "mais

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abaixo", no nível da realidade transpsíquica, onde todas as mentes estão ''ligadas'' na mesma fonte, todos os significados compartilhados se encontram ligados sincronicamente. Toda a Teoria da Sincronicidade está intrinsecamente relacionada à Teoria do Inconsciente Coletivo e dos Arquétipos de Jung.A noção básica em todo o trabalho de Jung é a de que, como espécie, os seres humanos compartilham memórias e experiências comuns, e que todos esses tesouros raciais reunidos estão armazenados no inconsciente coletivo. Mas as memórias e experiências que preenchem o inconsciente coletivo são de um gênero especial: elas existem como arquétipos, ou modelos formais da energia psíquica que estrutura o sentido compartilhado do significado para a humanidade como um todo. Os arquétipos de Jung no nível psicológico são aproximadamente equivalentes às Formas de Platão no nível conceitual e, como Platão em relação, ao pensamento, Jung argumenta que tudo em nossa vida inconsciente (sonhos, impulsos, mitologias, nossa criatividade artística, e assim por diante) espelha o mundo dos puros arquétipos, extraindo sua energia psíquica dele e difundindo seus modelos através de nossas personalidades e de nosso comportamento.Os modelos de energia psíquica centrados nos arquétipos estão na raiz da tentativa de Jung para explicar a dinâmica da telepatia e da precognição. Nos momentos em que possuímos tais faculdades, experimentamos, diz ele, não a percepção de acontecimentos no mundo exterior dos objetos arranjados na ficção do espaço e do tempo; mas, antes, nos vemos em contato com algo profundamente arraigado dentro de nós mesmos. A psique precognitiva relaciona-se com seu próprio eu ampliado pelo inconsciente coletivo sem espaço e sem tempo. Ali, atraído para algum padrão de energia arquetípica - como átomos numa solução sendo atraídos para uma bolha de cristal que irá reuni-los e dar-lhes uma forma - a psique reúne alguns dos significados (imagens, pensamentos, cenas de acontecimentos) relevantes para a emoção que primeiro a colocou em contato com esse arquétipo em particular. Esses significados podem vir de muito

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longe, de outros séculos ou de outros continentes, mas a psique os encontra juntos no turbilhão do arquétipo, e "em tempo" irá comunicá-los ao seu eu inconsciente como acontecimentos "no futuro".Uma descrição tão abstrata da dinâmica da sincronicidade pode ser difícil de acompanhar, mas Jung a ilustra com muitos exemplos. Um dos melhores é o do paciente cuja morte manifestamente fora predita à sua mulher por um bando de pássaros no telhado de sua casa (ver p. 99). "À primeira vista", diz. Jung, "a morte e o bando de pássaros parecem incompatíveis um com o outro. Entretanto, considerando-se que no Hades babilônio as almas usavam uma 'roupa de penas' e que no antigo Egito a ba, ou alma, era imaginada como um pássaro, não será artificial demais supor que algum simbolismo arquetípico esteja em funcionamento. Se esse incidente tivesse ocorrido em sonho, a interpretação seria justificada pelo material psicológico comparativo".No caso da paciente que sonhou receber o escaravelho dourado, Jung vê outra associação arquetípica. Essa mulher, explicou ele, estava presa em sua terapia e não conseguia ir além de um grave bloqueio emocional. O sonho do escaravelho, junto com o aparecimento do animal no dia seguinte, no consultório, tiveram o efeito de romper suas defesas racionais e levaram a uma fase toda nova de crescimento em seu tratamento. Relacionando isso com os arquétipos, Jung diz: "Qualquer mudança essencial de atitude significa uma renovação psíquica, geralmente acompanhada por símbolos de renascimento nos sonhos e fantasias do paciente. O escaravelho é o exemplo clássico de um símbolo de renascimento. O Book of What Is in the Netherworld do Egito antigo descreve como o deus-Sol, morto, transforma-se numa décima hierarquia em Khepri, o escaravelho, e, então, na décima segunda hierarquia, sobe à barca que leva o deus-Sol rejuvenescido para o céu da manhã". Dessa maneira, foi a grande necessidade emocional da paciente de irromper ("renascer") que a colocou em contato com um símbolo arquetípico de renascimento, e então conduziu-a ao sonho manifestamente precognitivo do escaravelho.Jung também achava que a sincronicidade podia ajudar a explicar o mistério do I Ching. Ele, e milhares de outras pessoas que recorreram

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ao livro com sucesso, tinha um profundo respeito, que beirava a inquietude, pelo "estranho fato de uma reação que faz sentido resultar de uma técnica que aparentemente exclui qualquer sentido logo de saída".Como o simples ato de jogar arbitrariamente três moedas no ar poderia extrair de uma inescrutável coleção de hexagramas escritos há milhares de anos respostas significativas a perguntas feitas hoje? A sugestão de Jung era de que cada um dos sessenta e quatro hexagramas do I Ching representa uma situação arquetípica de vida sincronicamente relacionada pelo significado com o momento em que o hexagrama foi moldado e o momento em que o consulente mais tarde joga três moedas procurando um aconselhamento.

Em outras palavras, seja quem for que tenha inventado o I Ching, estava convencido de que o hexagrama proporcionaria determinado resultado em certo momento que coincidiria com o momento anterior em qualidade e (não menos) em tempo. Para ele, o hexagrama era o expoente do momento em que foi modelado - até mais que as horas

do relógio ou as divisões do calendário considerando-se que o hexagrama era compreendido. como um indicador da situação

essencial que prevalecia no momento da sua origem.

Dessa maneira, o significado na pergunta do consulente seria irresistivelmente atraído para o significado que estivesse no âmago do mais pertinente dos 64 hexagramas do I Ching: Mas, como acentuou Jung, é importante que a pessoa só se dirija ao I Ching em momentos de sinceridade, com uma profunda concentração para melhor encorajar a comunicação sincrônica da mente com o hexagrama adequado.Jung sempre relaciona o fenômeno da sincronia com a emoção, enfatizando seu parecer de que as pessoas estarão mais predispostas a uma consciência precognitiva (ou telepática) em estados altamente emocionais, porque essa emoção rompe o limite da consciência normal, deixando a psique mais aberta às "mensagens" do

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inconsciente coletivo. "Todo estado emocional", escreve ele, ''produz uma alteração na consciência.... o que significa que há um certo estreitamento da consciência, correspondente a um reforço do inconsciente.”Jung achava que a maioria dos casos de precognição tinha que ver com acontecimentos traumáticos acompanhados por uma emoção violenta, tais como a morte, acidentes fatais, crises, catástrofes ou doenças mentais iminentes. Certamente isso ocorreu em muitos exemplos documentados de precognição espontânea, o melhor dos quais é o estudo de Barker sobre o acidente das minas de Aberfan. Parece também ser este o caso dos estados de transe associados aos oráculos ou aos dons proféticos dos médicos feiticeiros. Mas será isso uma verdade generalizada?Pelo contrário, muitos dos exemplos registrados de uma precognição espontânea parecem prever acontecimentos desconcertantemente triviais. Os sonhos de J. W. Dunne são casos assim. J. E. Orme observou, em seu levantamento de 148 casos cuidadosamente pesquisados de precognição espontânea: "Outro aspecto característico das experiências precognitivas é que acontecimentos relativamente desprovidos de importância, corriqueiros até, muitas vezes são considerados avisos de morte ou de acidentes".Existe, entretanto, um padrão geralmente aceito como ligação do tipo de emoção violenta, capaz de romper as defesas normais da mente e a experiência precognitiva. É verdade que os sonhos precognitivos parecem uma mistura do significativo e do corriqueiro, e que sonhos como estes constituem a maioria dos casos de precognição registrados; mas também é verdade que, nos casos em que a experiência premonitória ocorre como visão desperta, geralmente ela é associada a algum acontecimento carregado de significado emocional. A idéia de Jung de haver uma correspondência entre o torvelinho emocional e a consciência precognitiva levou-o a unir forças ao campo da psicologia, que encara esses fenômenos como "regressivos". Ele sentia que a capacidade para a experiência psíquica prevalecia mais no homem primitivo, com seu menor desenvolvimento

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lógico e num limiar inferior de organização da consciênCia. Baseado nisso, observou que as crianças costumam apresentar um dom considerável para passar por experiências de fenômenos de PES, que vão diminuindo (e desaparecem na maioria dos casos) à medida que elas crescem.A Teoria da Sincronicidade de Jung, principalmente intuitiva em sua abordagem para explicar a dinâmica da PES, não deixa de assinalar um momento crítico em toda nossa abordagem ao assunto. Ele se aferrou à pertinência dos últimos progressos da física do século XX e tinha razão ao pensar que a parapsicologia era uma ponte natural entre a física e a psicologia, desde que os fenômenos nela implícitos pudessem ser verificados. A partir da década de 60, tornou-se quase um axioma o fato de que alguém que pretenda fazer um trabalho sério em parapsicologia deva travar conhecimento com os princípios da física moderna; as mais recentes teorias psicológicas sobre a precognição refletem essa consciência de seus autores. Analisaremos essas teorias mais tarde; antes é necessário dar uma espiada nos aspectos da Teoria da Relatividade, da física quântica e da fisiologia do cérebro que pesaram mais diretamente na formação das novas tendências no pensamento e na pesquisa parapsicológica.

TERCEIRA PARTEO QUE É A PRECOGNIÇÃO?

8. O TEMPO NA TEORIA DA RELATIVIDADE

Albert Einstein disse certa vez brincando que deveria ter sido fabricante de relógios. Essa parece uma estranha fantasia profissional de um homem cujo trabalho teórico iria mudar para sempre toda a nossa compreensão sobre a seriedade com que devemos tratar as coisas que um relógio resolva nos dizer. A publicação, em 1905, da sua Teoria Especial da Relatividade assinalou um momento crítico radical no pensamento humano, depois do que muitos de nossos

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conceitos mais elementares jamais voltariam a ser os mesmos - assim como a nossa compreensão de tempo.Até o início deste século, a visão comumente aceita de que o tempo fosse uma seqüência ordenada de momentos, um seguindo-se ao outro, era exatamente a da descrição científica proporcionada pelos físicos clássicos. Segundo Newton, “o tempo absoluto, matemático e real, em si e por sua própria natureza, flui da mesma maneira, sem relação com qualquer fato externo". O mesmo ele dizia do espaço: ''O espaço absoluto, por sua própria natureza, sem relação com nenhum fator externo, permanece igual e imutável...”Esses absolutos newtonianos dominaram o pensamento científico e filosófico por mais de duzentos anos, e pareciam a muitos literalmente escritos na trama do universo. Dentro de um enquadramento em que os fatos em separado são vistos como pedras lançadas para que se atravessassem as areias do tempo, seria inconcebível sugerir-se que uma pessoa dotada de faculdades perceptivas pudesse vislumbrar o acontecimento C antes dos acontecimentos anteriores A e B. Daí, a incompatibilidade conceitual entre a precognição, a física clássica e o bom senso.O revolucionário ponto de partida de Einstein iria indicar que a ordem pontilhada de acontecimentos em manifesta seqüência não é fixa e absoluta; ela é apenas a simples maneira de se encarar as coisas. Dado o ponto de vista de qualquer pessoa, poderia ser válido dizer-se, da mesma forma, que C tenha ocorrido antes de A, ou B ocorrido depois de C (cuidando-se que não sejam acontecimentos ligados por acaso). Em outras palavras: o uso de expressões como antes ou depois, mais cedo ou mais tarde, dizia ele, muitas vezes é um questão relativa. Einstein chegou a essa conclusão depois de pesar o espantoso resultado de uma experiência que tinha finalidades completamente diferentes.A hoje conhecida experiência da Michelson-Morley, que constituiu o primeiro passo para a Teoria Especial da Relatividade de Einstein, pretendia apenas ser uma "reorganização" da física clássica. Desde os tempos da primitiva ciência grega, os homens haviam acreditado

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que o espaço era permeado por um éter "estacionário" e os cientistas do século XIX achavam que esse éter poderia ser utilizado como quadro de referência para medir o espaço absoluto de Newton. Michelson e Morley haviam apenas iniciado a medição da "curvatura do éter" enquanto a Terra se movimentava através desse Absoluto estacionário.Eles lançaram dois raios de luz em ângulos diretos - um, "para dentro da curvatura" e outro, "através da curvatura" - na expectativa de que houvesse um retardamento de tempo entre a chegada dos dois raios de volta à fonte. Mas nenhuma demora no tempo pôde ser medida: os raios de luz necessitavam exatamente do mesmo tempo para voltarem a ser refletidos de novo na plaqueta de captação, independentemente da direção em que houvessem ido. Dessa maneira, não poderia ter havido nenhum efeito visível exercido pelo éter estacionário.Em sua Teoria Especial da Relatividade, Einstein afirmava que não poderia existir nada como um quadro absoluto de referência.Argumentava ele que qualquer quadro de referência, em si, é tão válido como qualquer outro. E também não existe, dizia ele, coisa alguma como o espaço absoluto ou o tempo absoluto. Se um é impossível, o outro também é, porque nenhum dos dois pode ser descrito separadamente. O movimento é movimento através do espaço, e o movimento através do espaço leva algum tempo. Dessa maneira, em vez do espaço absoluto tridimensional de Newton e do espaço absoluto de tempo numa dimensão, Einstein apresentou aos aturdidos físicos clássicos um continuum espaço-tempo quadridimensional relativo em que as coordenadas de espaço e tempo deveriam ser reajustadas constantemente para levar em consideração o ponto de vista de cada um.O fator-chave na Teoria da Relatividade para a definição do ponto de vista de um observador é a velocidade em que ele viaja em relação ao ponto de vista de outro. Segundo Einstein, do ponto de vista de um observador estático, um corpo em movimento é submetido a uma singular tríade de efeitos colaterais tais que, enquanto sua velocidade se aproxima da constante e inacessível velocidade da luz, seus

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processos de tempo se estendem (o tempo se retarda), o espaço através do qual ele se movimenta encolhe e sua massa (uma função inversa desse espaço que diminui) aumenta até o infinito. Dada a natureza relativa de todo o movimento, um observador que estivesse em cima, montado nesse corpo em movimento, não perceberia as distorções que outros (em repouso) veriam em torno dele. De seu próprio ponto de vista, ele está apenas ali sentado enquanto o mundo corre de maneira bastante característica.Afora seu importante papel ao demonstrar a inadequação da nossa percepção comum do tempo, a Teoria Especial da Relatividade de Einstein tem pouca relação direta com a precognição. Como em nenhum dos casos discutidos em capítulos anteriores se falou de pessoas que estivessem girando rapidamente pelo universo a velocidades próximas à da luz, as estranhas distorções de tempo que se sabe acompanharem tais velocidades não poderão servir para explicar seu evidentemente precoce acesso ao futuro. Alguns pensadores sérios que esperavam resolver o problema da precognição, entretanto, encontraram algumas idéias mais importantes para isso na Teoria Geral da Relatividade, publicada onze anos depois, em 1916.Onde a Teoria Especial da Relatividade se restringia a descrever as propriedades de corpos (ou sistemas) viajando em linha reta numa velocidade constante, a Teoria Geral da Relatividade, muito mais abrangente, leva em conta que todos os objetos estão sujeitos a acelerações e seguem trajetórias curvas que se devem à presença de outras massas e são geralmente descritas como efeito da gravidade. A teoria geral descreve as causas e efeitos da força gravitacional do universo e, assim, desafia nossas noções comuns de espaço e tempo a um ponto quase inconcebível.Para nossos objetivos, a única descoberta mais importante a extrair da Teoria Geral é a percepção de que o espaço é curvo. A influência de qualquer massa, demonstrou Einstein, é tal que tende a "curvar" o espaço em sua proximidade, e a proporção dessa curvatura equivale a um corpo gravitacional. O espaço em torno da Terra é levemente

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curvo, mas essa curvatura revela-se tão infinitesimalmente pequena a ponto de ser quase impossível detectá-Ia. Entretanto, a massa do Sol, consideravelmente maior que a da Terra, é grande o suficiente para mostrar um efeito visível calculável, como se pode ver pela deflexão dos raios de luz que chegam das estrelas até nós.Ao considerar o espaço ocupado pelo universo como um todo, as opiniões divergem quanto à extensão da curvatura. As equações da relatividade nos permitem muitas soluções diferentes, cada uma das quais levando a um diferente modelo cosmológico do universo. Um desses modelos, o mais apropriado quando se considera a precognição, foi proposto pelo matemático Kurt Gödel em 1949, sugerindo haver no universo massa suficiente para curvar o espaço imediatamente em torno de si - de maneira que o universo como um todo pode ser visto como uma esfera em rotação sobre si mesmo. Na Teoria Especial, demonstrava-se que as antigas categorias de espaço e tempo eram inadequadas, e, em lugar do espaço tridimensional e do tempo unidimensional, Einstein colocou o continuum espaço-tempo quadridimensional em que espaço e tempo eram funções integrais um do outro. Esse continuum é transportado para a Teoria Geral da Relatividade e, assim, compreende-se que qualquer curvatura no espaço exija que o tempo também seja curvo. Um modelo cosmológico como o de Gödel, que postula que o universo seja uma esfera em rotação sobre si mesmo, também nos diz que o tempo se curva ao redor de si mesmo; em outras palavras, o tempo é circular. Essa formulação, naturalmente, levanta muitos problemas para o bom senso e não poucos para os físicos.Por exemplo, se o tempo se movimenta em círculo, como poderemos. falar de "antes" e "depois"? Como chegaremos a dizer qual ponto num círculo precede o outro? Na Teoria Geral da Relatividade, esses "antes" e "depois" não têm nenhum significado. É como o eminente físico francês Olivier Costa de Beauregard resumia a transformação provocada pela Teoria da Relatividade:

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Na [física] newtoniana, a separação entre passado e futuro é objetiva, no sentido de que era determinada por um único instante do tempo

universal - o presente. Isto já não é verdadeiro para a [física] relativista... Já não pode haver mais qualquer divisão objetiva e

essencial (ou seja, não arbitrária) de espaço-tempo entre "acontecimentos que já tenham acontecido" e "acontecimentos que

estejam por acontecer”.

Einstein disse: "Para nós, os físicos crentes, essa separação entre passado, presente e futuro tem o valor de uma simples ilusão, por mais firme que seja". E Olivier de Beauregard acrescentava (quase como que numa resposta tardia!): "Nisso tudo existe, inerente, uma pequena revolução filosófica".Se todos os eventos forem observados dentro do contexto da Teoria Geral da Relatividade, tornam-se fenômenos atemporais no espaço-tempo quadridimensional, estendidos ao longo do contorno curvado de nossa existência esférica como um todo estático, imutável. Esse quadro implica que tudo o que "será" agora "é", ou seja, que o futuro já está escrito e que é tão fixo quanto o passado. Num modelo como esse, toda a história de um acontecimento qualquer pode ser graficamente representada como uma curva estacionária (uma "linha do universo"), cada "momento no tempo" sendo um ponto naquela curva, e a sucessão conhecida de acontecimentos, que é parte de nossa percepção temporal diária normal, é levada em conta pelo movimento ordenado de consciência ao longo dessa curva. Assim, como passageiros numa nave espacial olhando para um universo cheio de acontecimentos (e todo o seu conteúdo), nos tornamos cientes de uma sucessão de acontecimentos, um a um, enquanto transitamos pelos pontos em separado ao longo dessa curva.Para que a precognição seja conceitualmente sustentável num quadro como esse, apenas se deve imaginar que algumas pessoas tenham a capacidade de "saltar à frente" em sua percepção, podendo assim dar uma espiada no tempo mais adiante na curva estacionária (de

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acontecimentos), mais do que a maioria de nós poderia normalmente chegar perto no curso ordinário do progresso consciente ao longo da curva. A implicação de que isto seria possível num universo relativista em que o tempo está esquematizado num círculo sem início ou fim real foi sugerida a Einstein por diversos colegas.Por que, perguntou-se, alguém não poderia dar um salto à frente no tempo e voltar para nos comunicar o que viu ali? Ou, de maneira alternativa, por que alguém não poderia fazer uma viagem recuando ao longo da curva de acontecimentos e assim revisitar seu próprio passado armado com seu conhecimento sobre o futuro? De acordo com o que Gödel afirmou, seria perfeitamente possível conceber "determinado passado, presente e futuro cosmológico, e recuar de novo, exatamente como é possível em outros mundos viajar a distantes porções do espaço".Gödel sugeria que para viajar ao futuro temos apenas de voar na direção da rotação do universo, e para viajar para o passado, temos de voar no sentido contrário. E, talvez, com uma divertida olhadela para The Time Machine, de H. G. Wells, ele chegou a calcular a quantidade de combustível necessária e a velocidade que nossa nave espacial precisaria desenvolver para realizar esta viagem: ela deveria viajar a pelo menos 70% da velocidade da luz.O próprio Einstein sempre se sentiu filosoficamente pouco à vontade em relação a essas noções de hipotética viagem no tempo efetuada em sibilantes idas e vindas pelas linhas curvas de espaço-tempo do mundo, e durante muito tempo insistiu sobre sua impossibilidade. "Não podemos enviar mensagens telegráficas ao passado", declarou com firmeza em 1928, argumentando que uma linha do mundo jamais poderia ter uma intersecção consigo própria, ou seja, que jamais seria possível circunavegar o universo ao longo da curva estacionária que descreve a vida de cada um, de maneira a poder coincidir com sua própria história ou atingir seu próprio futuro. A possibilidade de fazer isso, dizia ele, violaria um princípio essencial da Teoria da Relatividade - a idéia de que qualquer acontecimento pode ser verdadeiramente simultâneo apenas com ele mesmo.

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Mas, quando Gödel publicou sua controvertida solução às equações da relatividade em 1949, que demonstravam que a matemática da Teoria da Relatividade realmente permitia a possibilidade de linhas de universo que se interceptassem e, assim, que um momento "agora" pudesse ter simultaneidade em relação a um outro momento no "futuro" ou a algum no "passado", Einstein fez uma crítica surpreendentemente simpática ao ensaio. Talvez, admitia ele, a irreversibilidade do tempo já não fosse tão inviolável como supusera antes. Modificando a visão sustentada anteriormente sobre a comunicação entre passado e futuro, disse:

É impossível enviar mensagens telegráficas ao passado (no nível da realidade diária), mas isso não será necessariamente verdadeiro para os fenômenos subatômicos que parecem reversíveis... Se admitimos

como Gödel a possibilidade de linhas de mundo entrecruzadas na imensa escala cósmica... então a relação de sucessão torna-se

relativizada - pois, numa linha circular de mundo, dizer que A precede B, em vez de vice-versa,é apenas uma questão convencional.

A possibilidade da reversibilidade do tempo no nível subatômico foi algo que Einstein teve de aceitar mesmo de má vontade, em conseqüência das descobertas na física quântica. Daremos uma olhada nestas descobertas e em suas implicações no próximo capítulo. Em resposta à sugestão de Gödel de que o tempo pudesse voltar atrás no nível cósmico, ele mantinha a esperança de que isso ainda viesse a ser provado como um lamentável equívoco."Seria interessante", dizia, "examinar cuidadosamente a possibilidade de que esses (modelos cósmicos) não devam ser excluídos em bases físicas.“Os acontecimentos mostraram que ele estava errado.Mais tarde, a suposição de que os buracos negros (micro-universos em rotação dentro do nosso universo nos quais a força da gravidade em tomo de uma certa massa aumentou até o ponto de

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atrair o espaço-tempo em volta de si mesmo) proporcionassem a base física definitiva para esses modelos cosmológicos, veio confirmar a validade da solução de Gödel para as equações da relatividade. A noção da natureza dos buracos negros que se tem hoje realmente permite especulações sobre viagens para trás ou para a frente no tempo - mesmo que possa nos parecer uma coisa de ficção científica.Os buracos negros são chamados assim porque a força da gravidade que há em torno deles é tão poderosa, que uma vez que alguma coisa tenha sido sugada dentro de um deles jamais poderá sair de novo; e isso inclui os raios de luz. Por essa razão, nunca podemos ver os buracos negros, apenas sua força de atração indireta sobre outros corpos.A gravidade na superfície de um buraco negro, que é o que se considera seu "horizonte de acontecimentos" , é tão forte que ali o próprio tempo permanece parado - ou pelo menos é isso que pareceria a uma pessoa que estivesse do lado de fora olhando para dentro (ou a alguém que estivesse dentro, olhando para fora). Se alguém caísse dentro de um buraco negro, nós que estamos do lado de fora teríamos a impressão de que a pessoa levaria uma infinidade de tempo para isso, embora para ela o tempo parecesse passar normalmente - mais ou menos o mesmo efeito que a Teoria da Relatividade previa acontecer para os viajantes do espaço que se aproximassem da velocidade da luz.A pessoa que caísse no buraco negro estaria então caindo em direção ao nosso futuro. Se pudesse comunicar-se conosco, ela realmente estaria nos enviando "mensagens ao passado". O astrofísico John Gribbin, ao discutir a possibilidade um tanto fantasiosa de uma viagem através do tempo por uma passagem pelo horizonte dos acontecimentos de buracos negros, conta como seria uma história dessas:

Dentro de um buraco negro, o tempo como o conhecemos (e também o espaço, como o conhecemos) deixa de existir... E assim, um objeto extremamente compacto e maciço, como o buraco negro, com forte

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campo gravitacional em torno de si, iria permitir ao intrépido viajante do espaço dar um salto ao futuro - e não apenas uma só vez, mas

repetidas vezes... Simplesmente mergulhando uma nave espacial na região de forte gravidade e saindo dela pelo outro lado, o astronauta

iria ver o tempo no universo lá fora correndo, com milênios (ou intervalos maiores até) passando em torno dele nas poucas semanas que ele passasse manobrando sua nave em torno do buraco até sair

outra vez.

Naturalmente, é impossível qualquer comunicação de uma pessoa dentro de um buraco negro, pois a própria definição de um buraco negro diz que nada pode escapar dele - e nisso estaria incluída qualquer espécie de radiação eletromagnética que pudesse conduzir alguma mensagem. Mas existem ainda outras objeções para que se possa ser carregado por estas fantasias especulativas de viagens no tempo quando se considera a possível física da precognição.Mesmo que fosse possível comunicar-se com pessoas que houvessem caído nesses buracos negros, ou que se pudesse viajar em cruzeiros em torno do universo em velocidades próximas à da luz, isso tem muito pouco que ver com nossa experiência terrena e nada que ver com os casos conhecidos de suposta precognição. Para quaisquer finalidades práticas, tais possibilidades poderão ser vistas no máximo como cogitações malucas de um escritor de ficção científica muito criativo, embora elas tenham algum valor conceitual para o teórico da precognição.Antes da Teoria da Relatividade e das fantásticas distorções de tempo nela latentes, a irreversibilidade do tempo era sagrada e considerava-se qualquer sugestão de acesso ao futuro um absurdo. O clima intelectual da época posterior a Einstein repudia muito menos a simples possibilidade da precognição do que o período da física clássica ou o bom senso. Ainda está por se saber se os avanços na física quântica poderão trazer mais luz sobre como realmente funciona a precognição.

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9. A FÍSICA QUÂNTICA: INCERTEZA SEM O SENTIDO DO TEMPO

Nestes últimos vinte anos, os parapsicólogos passaram a examinar cada vez mais as idéias e as descobertas da física quântica tanto para apoio intelectual, como na esperança de descobrir alguns dos verdadeiros mecanismos pelos quais possam funcionar os fenômenos psíquicos. Mas ainda que uma pessoa tivesse a esperança de tirar uma faculdade como a precognição do reino das bolas de cristal e fosse olhar para ela em meio às nuvens de vapor de uma câmara de neblina de Wilson, não seria menos misteriosa e a pessoa ficaria bastante desapontada. A física moderna, em especial a física quântica, parece melhor equipada para exacerbar nosso sentimento de incredulidade, em vez de diminuí-Io.A maioria dos escritores e físicos acha impossível discutir os processos subatômicos esboçados pela teoria dos quanta sem cair em adjetivos como estranho, esquisito, excêntrico e mágico para descrever as fantasmagóricas partículas que estão logo abaixo da superfície de nosso mundo cotidiano. Poucos, portanto, se surpreendem com o fato de parapsicólogos que tentam explicar processos de pensamento separados do corpo e objetos que se movem durante a noite terem uma afinidade natural por um ramo da ciência que poderia muito bem ter sido o sonho de Lewis Carroll. Na verdade, essa afinidade vai muito mais a fundo que o simples compartilhar de uma excentricidade.Dois princípios muito importantes da física sempre foram a objeção principal à precognição tanto por parte de físicos como de filósofos, mas esses dois princípios acabaram sendo derrubados pelas descobertas da física quântica. O primeiro é o da unidirecionalidade do tempo, em que o "agora" deve necessariamente preceder o "depois". O segundo é o da causalidade, que diz que um efeito não pode preceder sua causa. No entanto, dentro do minúsculo

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microcosmo do átomo, nem o tempo nem a causalidade têm qualquer significação no sentido aceitável.No capítulo anterior vimos como, numa escala cósmica, a Teoria da Relatividade permite a possibilidade do tempo circular e da reversibilidade do tempo, o que destrói as leis da causalidade, mas a precognição que se registra na vida cotidiana não ocorre num sentido cósmico de pessoas viajando a velocidades próximas à da luz. Os críticos de qualquer tentativa de se explicar a precognição em termos da teoria quântica argumentam que o comportamento irregular dos processos subatômicos tem muito pouco que ver com os acontecimentos que ocorrem no nível da vida cotidiana; porém tais objeções estão no mínimo cheias de controvérsia.Veremos em capítulos posteriores que existe alguma prova de que o cérebro humano é sensível no nível dos fenômenos quânticos e os teóricos da precognição encaram esta sensibilidade como um elo possível entre alguns processos quânticos e a consciência humana. Nesse contexto, três aspectos da teoria quântica merecem ser examinados com algum detalhamento: o Princípio da Incerteza de Heisenberg, os estados práticos dos quanta e a não-localização quântica (ou "ação à distância").

O Princípio da Incerteza

Nenhum trabalho humano poderia nos ter levado mais diretamente a encarar a destruição que a teoria quântica trouxe ao reino da causalidade do que o do físico alemão Werner Heisenberg. Ele provou que todas as bases de nosso universo apóiam-se apenas em imprevisíveis acontecimentos subatômicos inteiramente fortuitos, e ganhou, por isso, o prêmio Nobel de 1931. A seus colegas da física quântica coube a tarefa de redefinir completamente a realidade física, embora tenha provocado o protesto de Einstein de que esta visão era. "tão contrária ao meu instinto científico que não posso prosseguir a busca por uma concepção mais completa".

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Respondendo diretamente às implicações das idéias de Heisenberg, resumidas no Princípio da Incerteza, Einstein fez sua famosa declaração de que "Deus não joga dados com o universo". Foi, sem duvida alguma, uma reação apaixonadamente religiosa, muito mais que uma fria declaração científica, embora Einstein tenha passado os últimos 25 anos de sua vida científica envolvido numa tentativa (infrutífera) de desenvolver uma teoria que levaria a física muito além das regras do cassino.Paradoxalmente, é do próprio Einstein a formulação de que a luz, e todas as outras formas de energia, provém de pré-pacotes de energia quanta, o que levou à evolução do princípio de Heisenberg. A teoria atômica dizia que os átomos consistem principalmente de espaço, com um centro maciço (o núcleo) rodeado de camadas de elétrons em órbita - algo que pode ser imaginado como o sistema solar: o núcleo sendo o próprio Sol e os elétrons, os planetas. Foi um importante avanço da teoria quântica demonstrar que cada uma das órbitas que um elétron pode ocupar enquanto circular em torno do núcleo atômico representa um determinado estado de energia, e que os elétrons podem se movimentar de uma órbita para outra.No entanto, a teoria quântica dizia que se um elétron fosse deixar uma órbita (estado de energia) e mudar para outra, ele antes deveria absorver ou liberar alguma energia, precisando fazer isso em unidades de quanta descontínuos. E, como a energia a ser absorvida ou liberada só existe em unidades descontínuas, acontece que os movimentos dos elétrons de órbita para órbita seriam representados como uma série de saltos descontínuos em vez do que se poderia supor em qualquer modelo que a física clássica pudesse oferecer (que sustentava que todo movimento se dava ao longo de curvas contínuas).Essa nova descrição de movimento como uma série de saltos descontínuos foi uma das mudanças conceituais mais fundamentais trazidas pela teoria quântica. Era algo mais ou menos como substituir-se o movimento na vida real pelos bruscos estágios de cada quadro em separado de um filme de cinema. A teoria quântica realmente

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mostrava que todo movimento é estruturado como nos sucessivos quadros de um filme - com a complicação adicional de que, exatamente como um filme poderia ocasionalmente dar um salto, passando por cima de alguns quadros, as partículas subatômicas também poderiam saltar para "vários quadros à frente", deixando de fora os passos intermediários, que tenderiam a parecer mais naturais.

* Um quantum é a unidade mais elementar e indivisível (de energia x tempo) necessária para que qualquer processo subatômico aconteça. Qualquer determinado processo poderá exigir um único quantum ou muitos quanta, daí o nome "teoria quântica".

O Princípio da Incerteza de Heisenberg surgiu da questão de se tentar acompanhar e descrever o movimento real de uma partícula subatômica em seu caminho descontínuo. Durante essa tentativa os físicos se defrontaram com uma dificuldade fundamental: a teoria quântica previa que quanto mais se tentasse analisar os movimentos de uma partícula subatômica, mais ilusório este movimento se tornaria. Pela mecânica do movimento quântico, o simples ato de dar um enfoque à partícula seria o suficiente para perturbá-Ia.Se, por exemplo, um físico desejasse observar o movimento de um elétron em torno de um núcleo atômico, ele poderia tentar localizá-lo com um microscópio muito poderoso. Mas a visão depende da emissão de luz de um objeto para o olho, de maneira que, para produzir essa emissão de luz, ele deveria dirigir pelo menos um fóton de "luz" no elétron. Mas acontece que um fóton de luz é um quantum de energia, e quando ele atinge o elétron, irá perturbá-lo, fazendo com que mude sua direção e velocidade - seu impulso.Na esperança de contornar esse problema da perturbação do impulso do elétron, o físico poderia tentar dirigir uma luz de freqüência mais baixa para o elétron. E como Einstein havia demonstrado, a freqüência de qualquer radiação é diretamente proporcional à quantidade de energia que ela carrega, de maneira que uma luz de freqüência mais baixa iria carregar menos energia e assim não deveria perturbar o

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elétron. Mas tão logo tenta isso, o físico se depara com um problema diferente. Descobre que sua luz de freqüência mais baixa não provoca uma imagem diferente. Uma onda de luz de baixa freqüência teria um comprimento de onda muito longo e isso iria produzir um quadro impreciso e aproximado que não permitiria localizar onde está o elétron.Assim o físico que esperava medir o movimento de um elétron ver-se-ia na situação de ter de escolher entre conhecer o impulso e não saber exatamente a posição do elétron, ou conhecer sua posição e não saber muito bem qual o impulso; ele jamais poderia saber as duas coisas, embora precisasse conhecer impulso e posição para poder dizer algo de significativo sobre o movimento do elétron. Essa é a essência do Princípio da Incerteza: em determinado nível de realidade chegamos a uma barreira além da qual é impossível tomar qualquer conjunto de medições exatas, e por isso torna-se impossível saber exatamente como se comportam os elementos que constituem a matéria.Segundo Heisenberg,essa incerteza é uma configuração característica do universo e não uma decorrência do uso de instrumentos ou meios inadequados. Ao descrever os movimentos das partículas, explicava ele, teríamos sempre de nos contentar com aproximações. Dada uma "série" de medições longa o bastante, as aproximações iriam formar uma espécie de quadro (conforme as leis da probabilidade), mas esse quadro seria mais o resultado de uma tendência estatística do que a descrição objetiva e exata de qualquer movimento de elétron.Max Bom, colega de Heisenberg, expressou-se assim: "A física está na natureza do caso indeterminado e, portanto, é um caso para a estatística". Isso não é o pior. Tirando as implicações dessa indeterminação, Max Bom continua dizendo:

... se jamais se pode determinar a não ser uma das duas propriedades (de uma partícula) [ter uma posição definida e um impulso definido], e se, quando uma é determinada, não se pode estabelecer nada sobre a

outra propriedade naquele mesmo instante, até onde chegou nossa

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experiência, não temos justificativa para concluir que a "coisa" em exame possa realmente ser descrita como sendo uma partícula no

sentido comum da expressão.

Mas, e se o elétron não for uma partícula "no sentido comum", o que será ele? A questão nos leva a outra descoberta revolucionária da física quântica: que a matéria em si não é necessariamente material no sentido normal desta expressão. Ou antes, pelo menos no nível subatômico, a matéria tem uma tal natureza dualista que as partículas elementares podem ser descritas com a mesma validade, comportando-se como ondas ou como partículas.Se um elétron colide com outro elétron, por exemplo, ele se comporta como uma partícula, e a colisão dessas duas partículas deixaria pistas conhecidas numa câmara de neblina de Wilson. Mas acontece que se um elétron é atingido estando contra uma tela que tenha duas fendas, em vez de escolher passar através de uma ou da outra, como uma partícula o faria, ele pode assumir de repente as propriedades de uma onda, passar pelas duas fendas, e interferir em si mesmo! "As partículas elementares", disse Sir William Bragg, "parecem ser ondas às segundas, quartas e sextas, e partículas às terças, quintas e sábados".Resumindo, nunca se pode ter realmente a certeza de quando ou sob quais circunstâncias um elétron (ou qualquer outra "partícula" subatômica) irá comportar-se como uma onda ou como partícula, e assim os físicos quânticos desistiram das descrições muito simplistas de partícula ou onda e, em vez disso, falam de "ondas de matéria".As ondas de matéria são entidades matemáticas complexas que expressam as possíveis manifestações da natureza dualista do elétron (e, na verdade, todas as suas outras possíveis propriedades, como posição ou estado de energia) e representam a solução intermediária da teoria quântica para o problema de como descrever uma realidade que sai de foco a cada vez que se tenta olhar para ela.Com o "Princípio da Complementaridade", a teoria quântica estabelece que, enquanto não se puder ter a certeza de se estar

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lidando com um elétron em sua forma de onda ou de partícula, as duas possibilidades são complementares entre si, de maneira que se pode pelo menos descrever os movimentos e interações do "pacote" (a onda de matéria), obtendo assim um quadro aproximado da realidade. Mas esse quadro aproximado - e este é ponto da teoria quântica que feriu a sensibilidade de Einstein - nunca é mais que uma distribuição das probabilidades que, sob quaisquer conjuntos de circunstâncias, iriam fazer a onda de matéria se expressar de um modo ou de outro e, até que ela resolva fazer isso, deve-se dizer que a própria realidade (a realidade daquele elétron) consiste de probabilidades. Ondas de matéria geralmente são descritas como "ondas de probabilidade".Tirando-se todas as implicações do Princípio da Incerteza de Heisenberg, pode-se dizer que, segundo a teoria quântica, a realidade em seu nível mais elementar consiste não de quaisquer realidades fixas que possamos conhecer, mas de todas as probabilidades das várias realidades fixas que poderíamos conhecer. Evidentemente, alguma proporção dessas probabilidades em algum estágio se torna realidade, a que o mundo de nossa experiência cotidiana presta testemunho. Mas, de que maneira? Em que estágio, e por que, uma ou outra das inúmeras possibilidades da natureza se fixa no mundo das "coisas reais" e que papel desempenham todas as "probabilidades perdidas" ao atingir seu estado de coisas final?

Os Estados Práticos

Na verdade, o fato de a teoria quântica demonstrar que não existe e jamais poderá existir qualquer espécie de resposta satisfatória para a maioria dessas últimas perguntas representou um efetivo ataque às leis da causalidade, há tempos tão respeitadas.Quando se substituiu a clássica noção de movimento contínuo por um caminho preestabelecido pela visão quântica de bruscas transições de um estado de energia para outro através de saltos quânticos

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descontínuos, a brecha estava aberta. Logo tornou-se evidente que se um sistema atômico é perturbado (interna ou externamente), as conseqüentes transições do elétron ocorrerão de maneira inteiramente casual.Por exemplo, poderá acontecer uma transição a qualquer hora e sem qualquer causa atribuível. E, subitamente, sem qualquer aviso prévio, sem nenhuma razão aparente, um átomo que estava antes "calmo" pode passar por um caos em seus elétrons, e jamais se pode prever quando isso irá acontecer com qualquer dos átomos. É só uma questão de oportunidade. Além disso, e esta é a razão pela qual se diz que há reversibilidade do tempo no nível quântico - um elétron pode, e com a mesma probabilidade, sofrer uma transição de um estado de energia elevado para um inferior, ou de um estado de baixa energia para um de alta energia.Assim, não é possível falar de uma "sucessão de acontecimentos" em nenhum sentido conhecido, como se alguma coisa tivesse necessariamente levado a outra. Seria mais exato dizer que um acontecimento estaria relacionado com outro, mas seria muito errado descrever um como causa e outro como efeito. Simplesmente eles "acontecem da forma que acontecem". E o pior, o que nos traz de volta à questão das "probabilidades perdidas", durante os estágios anteriores de sua perturbação, as transições do elétron que se verificam dentro de um sistema atômico excitado ocorrem simultaneamente em todas as direções de uma só vez. Quer dizer, um elétron excitado comporta-se como se "estivesse cobrindo todo um amplo espaço".Se um elétron é atingido por um fóton, ele terá adquirido energia do fóton e assim já não poderá mais continuar normalmente circulando em volta do núcleo na órbita que havia ocupado antes de maneira tão estável. Deverá sair procurando uma outra órbita mais adequada a seu novo estado de excitação. Mas, uma vez que nada é determinado na física quântica, existem muitas outras órbitas em que ele pode se instalar. Embora apenas uma certa proporção dessas novas órbitas ofereça ao elétron um lar estável e permanente, como poderia ele

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saber qual, a menos que experimentasse todas? Pois é exatamente isso que ele faz.Um elétron excitado, disfarçado de onda de probabilidade, aplica todos os seus "sensores" temporariamente, enquanto vai procurando seu lugar, em todas as possíveis acomodações. Até ele decidir se estabelecer em alguma localização permanente, ele realmente estará vivendo em todas as possibilidades temporárias.Na teoria quântica, esses "endereços temporários" são chamados de "transições virtuais", e o endereço final, o ''permanente'', chama-se "transição real". Mas, como adverte o físico quântico David Bohm, não devemos nos deixar enganar com o uso destas expressões "real" e "virtual":

Às vezes as transições permanentes (ou seja, as que conservam energia) são chamadas de transições reais, para distingui-Ias das chamadas transições virtuais, que não conservam a energia e que devem portanto reverter ao estado anterior antes que tenham ido

longe demais. Trata-se de uma terminologia infeliz, pois implica que as transições virtuais não tenham efeitos reais. Ao contrário, muitas

vezes elas são da maior importância, pois muitos processos físicos são resultado destas chamadas transições virtuais.

A situação se parece um pouco com a de uma pessoa muito modesta que acaba de ganhar na loteria. A nova riqueza faz com que ela ache inconveniente continuar morando num apartamentinho de dois quartos na mesma rua de sempre. Todo um mundo de novas possibilidades se abriu para essa pessoa e ela pretende realizar seu maior desejo: possuir a casa de seus sonhos. No "mundo real" (o mundo da realidade diária), naturalmente, ela teria que explorar todas essas possibilidades uma por uma, talvez tendo que se mudar umas oito ou dez vezes até ter a certeza de haver encontrado exatamente a casa certa.Mas no mundo da quântica, o ganhador simplesmente mora em todas as suas possíveis casa novas, e em todas ao mesmo tempo. Se o

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corretor quisesse obrigá-lo a assinar o contrato de compra, essa seria uma tarefa impossível (pois ele estará morando em todas as casas) e seria preciso enviar duplicatas para cada um dos endereços. Se estas casas fossem o bastante perto umas das outras, o ganhador até poderia estar em cada uma das varandas acenando para si mesmo.Afinal, tendo explorado inteiramente todas as suas possibilidades, o ganhador iria se estabelecer de modo permanente apenas numa casa, mas não sem haver deixado "traços" de sua presença nas diversas vizinhanças onde estavam suas casas temporárias. Os vizinhos poderiam lembrar-se de tê-Io visto, imaginando algo como: "O que será que aconteceu com aquela pessoa que desapareceu tão de repente?" Alguns desses vizinhos podem até ter mudado seus próprios hábitos em conseqüência do vencedor estar residindo em suas proximidades temporariamente. ("... pois muitos processos físicos são resultado destas transições virtuais".)Conquanto o caso do ganhador da loteria do mundo quântico possa parecer um tanto forçado, não precisamos ir mais longe que a evolução biológica para observar resultados na vida real de coisas muito parecidas com as transições quânticas virtuais. Como sugere Bohm, entre outros: "De muitas maneiras o conceito de uma transição virtual se parece com a idéia da evolução biológica, que afirma poderem surgir todos os gêneros de espécies em mutações, mas apenas algumas espécies sobreviverão indefinidamente; e serão aquelas capazes de satisfazer determinadas exigências para a sobrevivência no meio ambiente específico que rodeia a espécie".

* Na verdade, para a física quântica não faria muita diferença a distância em que estejam as casas, porque as transições virtuais de uma partícula podem interferir umas nas outras a qualquer distância.

As inúmeras espécies que surgem de repente por meio de mutações podem ser vistas como as diversas possibilidades (estados virtuais) sendo exploradas pela natureza como novas maneiras pelas quais ela poderia expressar seu potencial. As possibilidades menos viáveis,

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como diz Bohm, acabam sendo postas de lado mas, em geral, não sem antes deixar algum traço de si mesmas que irá se tornar parte do sistema da vida. Duas mutações condenadas, por exemplo, poderiam, antes de desaparecer, fazer um cruzamento que formaria uma terceira mutação bastante capaz de sobreviver indefinidamente (uma transição real). Foi mais ou menos assim que a espécie humana surgiu - uma bem-sucedida mutação secundária de alguma forma de vida obscura que se conhece apenas como "o elo perdido".

A Não-localização ou "Ação à Distância”

É em conseqüência direta do significado dos estados virtuais, pelo qual a função de onda de uma partícula elementar é "espalhada por uma enorme região no espaço", que a teoria quântica faz sua predição mais forte e mais revolucionária: pode haver ligações e correlações entre acontecimentos , muito distantes na ausência de qualquer força ou sinal intermediário, e  essa "ação à distância" será instantânea.Esse "Princípio da Não-localização" (segundo o qual alguma coisa pode ser afetada na ausência de qualquer causa local) está bem claro no Teorema de Bell - e parte necessariamente da natureza essencialmente indeterminada da realidade, como é sugerido pelas equações de onda da teoria quântica.A teoria quântica indica que não existem coisas como partes isoladas da realidade, mas, antes, apenas fenômenos muito intimamente relacionados e tão ligados entre si como se fossem inseparáveis. Essa visão sustenta que nosso mundo físico "... não é uma estrutura feita de entidades não analisáveis de existência independente, mas uma rede de relacionamentos entre elementos cujos significados se elevam totalmente de seus relacionamentos ao todo".Essa visão, com suas nuances evidentemente místicas, vai diretamente contra não apenas o bom senso e a física clássica, mas também contra a Teoria da Relatividade - todas baseadas no princípio

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intuitivo de que os fragmentos de que esta realidade se compõe são inerentemente separados e de que não há nenhum efeito testemunhado num pedacinho específico que tenha uma causa detectável proveniente de algum outro fragmento, atuando como intermediário por meio de alguma força ou sinal detectável localmente.Einstein acrescentou mais um elemento a essa doutrina de "causas locais", afirmando que nenhum sinal poderia ir de um fragmento da realidade (uma causa) para outro (um efeito) mais depressa que a luz, e assim não haveria empecilhos em relação ao que diz a teoria quântica, de que uma influência pode ser instantânea. Foi por causa de sua defesa de uma "ação à distância" instantânea que Einstein insistia em que a teoria quântica tinha de ser uma descrição incompleta da realidade e se dispôs a ilustrar isso no famoso Paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen - o Paradoxo EPR, publicado em 1935.A essência do Paradoxo EPR pode ser compreendida imaginando-se o destino de um hipotético par de gêmeos, que nasceu em Londres. Os dois foram separados desde o dia em que nasceram: um deles continuou morando em Londres e o outro foi para Nova Iorque. Os gêmeos jamais se encontraram, nenhum dos dois sabe que tem um irmão gêmeo e nunca houve nenhuma forma de comunicação entre eles. Portanto, em condições normais, eles viveram vidas inteiramente separadas. Mas, apesar do desconhecimento e da falta de comunicação entre ambos, um psicólogo que estuda os gêmeos percebe uma estranha semelhança em seus comportamentos e suas circunstâncias. Cada um dos dois adotou o apelido de "Scotty"; os dois escolheram entrar para a força policial e ambos chegaram ao posto de Detetive-Inspetor; os dois se vestem quase exclusivamente de azul; os dois casaram no mesmo ano com uma morena chamada Mary, e assim por diante. Como se explica tudo isso?O teórico da quântica não teria problema com essas aparentemente inexplicáveis correlações entre as vidas dos dois gêmeos, pois suas equações sempre o deixaram esperando por algo assim - e desde que suas previsões matemáticas se tenham tornado realidade, ele não

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está muito preocupado com o porque. Mas Einstein não ia deixar a coisa dessa maneira e achava que o fato de os teóricos da física quântica não se importarem com esse tipo de coisa era uma prova de que a teoria quântica estava incompleta.Em primeiro lugar, Einstein não podia abandonar sua fé (já abalada pelo Princípio da Incerteza) de que uma teoria física completa deveria ser capaz de explicar o "porquê" das coisas e dizer algo definido sobre a natureza da realidade. Em segundo lugar, ele não podia aceitar que não houvesse alguma explicação "respeitadora da lei" por trás de quaisquer uma das correlações entre as vidas obviamente separadas dos gêmeos.

Pode-se fugir desta conclusão (de que a teoria quântica está incompleta) somente se assumirmos que ou a medida de S1 (um dos

gêmeos) muda telepaticamente a situação real de S2 (o outro gêmeo), ou se negarmos situações reais (vidas) independentes como coisas

que estão separadas em termos espaciais uma da outra. Essas duas alternativas me parecem completamente inaceitáveis.

De maneira que, para evitar cair de volta na telepatia ou na possibilidade de alguma ligação misteriosa entre situações distantes, Einstein propunha uma terceira saída: a de que haveria algum fator em comum na própria natureza das situações que poderia ser levado em conta nesse comportamento correlacionado.Em nosso exemplo dos gêmeos, esse fator comum poderia ser ilustrado dizendo-se que eles devem ser gêmeos idênticos, compartilhando material genético. Einstein diria então que, se as vidas dos gêmeos transcorreram por linhas semelhantes, conforme previa a teoria quântica, era simplesmente porque eles haviam sido programados para isso desde o início, por aquele fator genético comum, profundo em sua natureza. E assim não existe nenhuma, telepatia e nenhuma "ação à distância" em seus estilos de vida semelhantes, e sim um fator comum que a teoria quântica deve deixar

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de levar em conta por sua recusa em estabelecer qualquer coisa sobre a natureza da realidade subjacente. Durante muitos anos, a prova sugerida por Einstein de que a teoria quântica está incompleta foi deixada de lado, num estado quase de esquecimento junto com as previsões de não-localização. Os poucos físicos que pensaram sobre o Paradoxo EPR não pensaram de maneira alguma que pelo menos essa solução do "fator comum" (as variáveis ocultas) fosse compatível com quaisquer previsões da teoria quântica, e assim parecia de certa forma um tanto abstrato que Einstein estivesse certo ao dizer que tais previsões poderiam ser explicadas em relação a uma realidade subjacente. Mas tudo isso mudou com a publicação do Teorema de Bell em 1964.Bell, um físico dos laboratórios CERN em Genebra, provou matematicamente que ou Einstein estava certo, e existe uma realidade fundamental no mundo físico por baixo da indeterminância da física quântica e assim a teoria quântica está equivocada, ou o próprio Einstein estava inteiramente errado ao supor que haja uma realidade subjacente e a teoria quântica está correta ao prever uma autêntica ação à distância. Bell estabeleceu este ou-ou baseado numa prova de que a idéia de Einstein e a teoria quântica levariam não às mesmas previsões em determinadas situações experimentais, como se havia pensado, mas a outras completamente diferentes. Embora o Teorema de Bell por si mesmo seja extremamente matemático, pode ser expresso através do exemplo dos gêmeos.Suponhamos que o psicólogo que observou os gêmeos tenha notado que ambos têm inclinação a acidentes. Cada um dos dois feriu-se jogando futebol com a idade de 16 anos, cada um bateu com o carro aos 25 anos, e assim por diante. Numa situação como essa, Einstein diria que essa tendência a acidentes deveria ser um traço herdado e que essas respectivas pinceladas do azar dos gêmeos estavam programadas para acontecer. O teórico da quântica diria que nada sabe sobre genética, mas que suas equações demonstram que se um acidente sobrevém a um gêmeo, um acidente semelhante deve sobrevir ao outro. O que Bell fez foi provar que existe uma espécie de

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acidente capaz de demonstrar de uma vez por todas que a tendência a acidentes dos gêmeos seria realmente um traço herdado.Bell sugeriria que o gêmeo que morava em Nova Iorque fora empurrado num lance de escadas de maneira a quebrar a perna. E agora, já que ninguém iria argumentar que alguém poderia herdar a tendência a ser empurrado escada abaixo por algum estranho hostil, se acontecesse um acidente semelhante ao gêmeo de Londres Einstein possivelmente não poderia argumentar que isso acontecera por causa de algum fundo genético em comum. Se os dois gêmeos caíram em um lance de escadas (e só o de Nova Iorque foi empurrado por alguém) e cada um dos dois acabou com uma perna quebrada, deveria então haver alguma espécie de telepatia funcionando entre os dois. A teoria quântica estaria vingada.Mas se, por outro lado, o gêmeo de Londres continuasse a caminhar são e salvo em cima de suas duas pernas e o gêmeo de Nova Iorque estivesse com sua perna quebrada engessada, então Einstein estaria certo. Ele poderia dizer que todas as semelhanças observadas baseavam-se em características herdadas (as variáveis ocultas) e que, em situações que as características herdadas não abrangessem, não se poderia esperar semelhanças (ou, correlações).As alternativas esboçadas pelo Teorema de Bell foram testadas em laboratório no ano de 1974, quando dois físicos de Berkeley, Stuart Freedman e John Clauser, conseguiram realizar uma experiência de correlação bem-sucedida em fótons polarizados. Freedman e Clauser determinaram, acima de qualquer suspeita, que as misteriosas correlações ocorrem conforme prevê a teoria quântica, e sua capacidade para fazer isso registrando efeitos macroscópios (ou seja, efeitos visíveis no nível da realidade do cotidiano) na aparelhagem de seu laboratório ainda vai mais longe, até mostrar que o Teorema de Bell e a "ação à distância" têm implicações muito além do nível subatômico da realidade. Segundo colocação de um físico quântico:

O importante no Teorema de Bell é que ele coloca o dilema imposto pelos fenômenos quânticos muito claramente no reino dos fenômenos

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macroscópicos (nível do cotidiano)... (e) mostra que nossas idéias comuns sobre o mundo são profundamente deficientes mesmo no

nível macroscópico.

Em seu estudo sobre a Teoria Especial da Relatividade, David Bohm assume o mesmo ponto de vista dos físicos relativistas a respeito desses desafios conceituais sugerindo que onde os conceitos relativistas de tempo e espaço colidem com nossa percepção normal do mundo, pode ser que essa colisão se deva ao fato de nossas percepções do cotidiano estarem baseadas em "nossa limitada e inadequada compreensão do campo da experiência comum, em vez de ocorrer por qualquer inevitabilidade inerente em nosso modo habitual de apreender este campo".Poderia parecer que uma objeção muito freqüente dos que se opõem ao fato de a parapsicologia ficar extraindo paralelos entre os estranhos acontecimentos da física quântica e as também estranhas ocorrências da pesquisa psíquica - de que o que acontece no nível subatômico nada tem a ver com a maneira como as coisas acontecem no mundo cotidiano (macroscópico) - não seja necessariamente válida. Com o Teorema de BeIl, sabemos agora que pelo menos é teoricamente possível dar uma espiada em fenômenos quânticos de relevância quando se tenta explicar qualquer fenômeno psíquico comprovado que pesquisadores possam realizar.Muito interessante é o hipotético exemplo dos gêmeos aqui utilizado para ilustrar os efeitos de correlação no nível quântico, e o Teorema de Bell poderia estar muito próximo de algum exemplo real de "ação à distância" ou telepatia no nível macroscópico. Nestes últimos anos, os psicólogos que estudam grupos de gêmeos que foram separados desde o nascimento notaram o tipo de correlações misteriosas do exemplo hipotético - adotar o mesmo estilo de penteados, preferências por roupas semelhantes e semelhantes ocupações, casamentos quase simultâneos e com mulheres parecidas, e assim por diante. Isso naturalmente levou à especulação de quantas dessas similitudes poderiam ser explicadas pelos laços genéticos e quantas deveriam ser

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postas na conta de alguma espécie de telepatia. Apenas um desses estudos introduzia um fator semelhante ao desafio do Teorema de Bell - um terrível acidente que aconteceu a um gêmeo, e seu efeito ou a ausência desse efeito no outro.Quatro psicólogos japoneses fizeram um estudo profundo em três pares de gêmeos idênticos. Em cada um desses pares, um dos gêmeos fora exposto à bomba atômica e outro não. Estudos sociais e psicológicos realizados sobre esses gêmeos, anos depois da guerra mostravam notável semelhança em estilo de vida, rendimentos, personalidade básica e relacionamentos familiares, embora em cada um dos pares o gêmeo exposto à bomba mostrasse um nível mais elevado de ansiedade em resposta a certos testes de cores de Rorschach, e os não expostos à bomba apresentassem muito pouca sensibilidade a isso. Essa mistura de semelhanças e dessemelhanças é, de certa forma, inconclusiva e a amostragem do teste resulta muito pequena, mas indica o caminho para outras pesquisas que poderiam estabelecer a existência ou não de ligações telepáticas entre gêmeos. Os resultados japoneses em si devem ser considerados como indicação levemente negativa.

"Ação a uma Distância Temporal”

Embora o Teorema de BeIl e as experiências da não-localização de Freedman e Clauser tendam a ter muito grandes implicações para a telepatia, poder-se-ia argumentar que têm muito pouca relação direta com o problema da precognição. As experiências de Freedman e Clauser referem-se a dois fatos que acontecem simultaneamente mas em lugares diferentes, quando o principal fator na precognição é o de que dois fatos que aconteçam em tempos diferentes (um ainda no futuro) pareçam ter um efeito sobre o outro.Mas existe - e, estranhamente, pouco se fala nisso - um grupo de experiências realizadas pelos físicos da Universidade de Rochester, R. L. Pfleegor e L. MandeI em 1967, que demonstram exatamente

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esse efeito: uma correlação não-local entre dois fatos que aconteceram no mesmo lugar, mas em, tempos diferentes.A experiência Pfleegor e Mandel, como a de Freedman e Clauser, trabalha com fótons e apresenta suas implicações em linguagem matemática extremamente complexa, mas a essência da experiência também pode ser resumida numa analogia.Suponhamos que existem dois funcionários trabalhando num mesmo escritório; no entanto, um deles (A) entra no turno da manhã e o outro (B) entra no da tarde. Do lado de fora da porta do escritório há dois cabides reservados para o uso de A e B.Até pouco tempo atrás, A e B sempre haviam trabalhado no mesmo turno e, nessa época, notou-se que era inteiramente casual quem usava qual cabide. Nenhum dos dois havia determinado nada a respeito do uso de um ou outro cabide. Mas agora que eles estavam trabalhando em turnos diferentes, esse acaso na escolha de qual dos cabides usar continuava, só que com uma diferença bem grande. Quando A chegava para seu turno matinal, ele escolheria por acaso qualquer um dos dois cabides, e quando B chegava para seu turno ã tarde também escolheria qualquer um dos dois cabides que A não tivesse usado. Dessa maneira, embora A e B estivessem trabalhando em horas diferentes, eles continuavam a pendurar seus casacos de maneira que dava a impressão de que ambos estivessem presentes. O comportamento de ambos mostrava-se misteriosamente ligado, através de alguma lacuna no tempo que havia entre os dois, de maneira a estar sempre correlacionado.As correlações demonstradas na experiência de Pfleegor e MandeI eram sempre tão exatamente simétricas que não faria sentido dizer que A escolheu um determinado cabide prevendo que B iria usar o outro, ou que B tenha escolhido o seu por alguma consciência telepática sobre qual cabide A teria escolhido antes. Tudo o que se pode dizer é que eles mostraram como dois acontecimentos podem estar um tanto relacionados através do tempo de uma forma que garante que eles estarão sempre correlacionados, e qualquer tentativa

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de se colocar uma relação de causa e efeito entre os dois não teria significado algum.No gênero de relacionamentos não-locais de "ação à distância" que ocorrem na física quântica, não existem nem o tempo nem o espaço no sentido comum que se dá de uma "distância entre lugares" ou "distância entre momentos". Na experiência de Freedman e Clauser que testava as alternativas do Teorema de Bell, os fótons se comportavam como se estivessem "cobrindo uma grande região no espaço". Na experiência de Pfleegor e Mandel, era como se estivessem cobrindo uma grande porção de tempo. Em qualquer dos casos, a distância é substituída pelo relacionamento.Disso pode -se concluir que se a precognição fosse vista como manifestação macroscópica do tipo de efeitos de tempo não-locais demonstrado por Pfleegor e MandeI, já não haveria mais fundamento para dizer que há um paradoxo filosófico sobre a causalidade. Onde a distância espacial e temporal é substituída pelo relacionamento, a causa e o efeito já não têm mais qualquer significado. Também se pode concluir que a partir de um tal modelo quaisquer objeções ao fato de a precognição implicar a impossibilidade do livre-arbítrio também teriam de ser vistas sob uma nova luz - mas esses casos serão discutidos no Capítulo 12.

10. A CONSCIÊNCIA E OS FENÔMENOS QUÂNTICOS

Para alguém que esteja procurando seriamente uma explicação física para os fenômenos psíquicos, a teoria quântica oferece muitas possibilidades espantosas. Pelo menos em termos conceituais mais amplos, a maioria das objeções filosóficas e materiais aparentemente insuperáveis à mais singela possibilidade da existência de coisas como a psicocinese, a telepatia e a precognição já foram derrubadas pela nova física.O Princípio da Complementaridade estabeleceu que a matéria e a energia são dois lados de uma mesma moeda e se, como também

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parece, a própria consciência é alguma espécie de energia mental, então já não pareceria mais tão artificial considerar-se que a mente possa exercer alguma influência sobre a matéria (psicocinese). Esse ponto de vista é ainda mais reforçado pela maneira com que a teoria quântica retirou quaisquer distinções mais estáveis entre o observador e o observado ao demonstrar que aparentemente a consciência tem um papel ativo na determinação dos resultados de experiências realizadas para estudar o fenômeno quântico. As experiências sobre o Teorema de Bell estabeleceram que as estranhas influências acausais que transcendem as limitações de tempo e espaço ligam partículas elementares no nível quântico da, realidade de uma maneira muito sugestiva à suposta capacidade da mente em transcender a distância (telepatia) ou tempo (precognição) no nível macroscópico.Mas, se qualquer um desses efeitos quânticos muito promissores pode ser considerado como tendo uma importância direta para explicar a mecânica real de coisas como a precognição, não bastará mostrar que eles ocorrem entre partículas elementares reagindo no vácuo em condições de laboratório. Deve-se encontrar alguma prova de que existe uma ponte natural entre os fenômenos quânticos e a consciência humana, de maneira que nossos pensamentos e percepções na vida diária possam ser influenciados pelo estranho comportamento das partículas elementares. E a questão mais importante no momento é saber se há algum mecanismo conhecido no cérebro que permita que nossa consciência dos fatos que ocorrem no mundo possa formar-se pelo menos parcialmente em resposta aos fenômenos do nível quântico - e especialmente em resposta à indeterminância quântica.

A Indeterminância Quântica no Cérebro

O cérebro humano consiste essencialmente de 10 mil milhões (10 elevado a 10) de células nervosas chamadas "neurônios" e esses neurônios, como também células nervosas em outras partes do

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organismo, são sensíveis ao estímulo de influências externas. O cérebro é muitas vezes comparado a um computador por haver alguma semelhança entre a complexidade da maneira pela qual seus feixes de neurônios estão organizados e o emaranhado de fios que compõem o circuito elétrico de um computador.Como as "células nervosas" de um computador, os neurônios do cérebro também são uma espécie de fiação elétrica que deixa fluir impulsos eletroquímicos passando mensagens diversas para dentro e para fora. Exatamente como a fiação elétrica de qualquer máquina, que terá maior ou menor eficiência dependendo da condutibilidade dos fios e da força dos impulsos elétricos transmitidos, os neurônios do cérebro transmitirão mais ou menos informações dependendo de sua própria condutibilidade e da força dos estímulos que atinjam o neurônio.No tecido vivo, as concentrações químicas (de hormônios, metabolitos, drogas, sais etc.) que circundam as junções (sinapses) entre os neurônios determinam a eficácia com que eles conduzirão os impulsos elétricos, e, por conseguinte, a informação. Se um neurônio está rodeado por uma concentração química de algumas substâncias importantes que seja fraca, será preciso uma entrada elétrica muito grande para estimulá-Ia à ação; se a concentração química em volta é forte, o neurônio irá disparar sob a influência de um impulso elétrico muito mais fraco. A quantidade de estímulo elétrico necessária para fazer um neurônio disparar (ou seja, responder ao estímulo e passar adiante qualquer informação) é chamada de "limiar de estímulo".No caminho normal da percepção, os neurônios são continuamente excitados, além ou dentro da faixa do limiar de estímulos, pelos impulsos elétricos muito fortes gerados pelo ambiente circundante. Nós enxergamos porque os raios de luz estimulam os neurônios ópticos, ouvimos porque ondas de som estimulam os neurônios auditivos, e assim por diante. Mas a questão de a capacidade do cérebro reagir ao nível dos fenômenos quânticos é saber se um processo quântico poderia gerar um impulso elétrico com força

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suficiente para disparar neurônios, excitando-os no nível mínimo de seus limiares de estímulo.Já se sabe há algumas décadas que o córtex visual do cérebro humano é sensível o bastante para registrar um único fóton de luz, o que equivale dizer que ele registra um único processo quântico - a passagem de um elétron de um estado mais elevado de energia. dentro de um átomo para um estado de energia inferior. Esses processos quânticos singulares naturalmente estão sujeitos ao Princípio da Incerteza e são a localização para o tipo de efeitos não-locais discutidos no capítulo anterior. Antes de se estabelecer finalmente em seu estado mais estável (e assim emitir um fóton), o elétron se espalha pelo espaço e tempo em milhares de transições virtuais, interferindo consigo mesmo e com outros elétrons em flagrante menosprezo à causalidade ou temporalidade.A questão de o cérebro poder adaptar-se à indefinição das transições virtuais continua sendo a mais séria dos teóricos da precognição, mas experiências realizadas já na década de 40 haviam determinado que neurônios corticais (do cérebro) singulares estão sujeitos a um Princípio de Incerteza próprio e que a indeterminância quântica está funcionando no próprio cérebro, através de variações casuais nas concentrações químicas que envolvem as sinapses dos neurônios.Como é indicado pelo fato de que um único fóton (um quantum de luz) irá excitar o nervo óptico, as sinapses dos neurônios são tão finas e tão sensíveis que a semelhança de seus disparos (seu limiar de estímulo) varia segundo as flutuações quânticas no fluido iônico circundante. Como essas flutuações são inteiramente casuais, não é possível dizer exatamente quando algum neurônio irá disparar mais do que será possível predizer quando qualquer elétron irá se excitar. Testes de laboratório em neurônios isolados provam que seus limiares de estímulo variam segundo uma lei estatística definida, como qualquer outro processo quântico.Nem todos os neurônios corticais estão sujeitos à indeterminância quântica. Apenas aqueles que já estão estimulados ou muito próximos de seus limiares de estímulo terão uma sensibilidade no nível quântico

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de excitação dos fluidos circundantes. Se o estímulo chega em nível mais alto, como acontece na percepção normal, ele irá abafar os estímulos no nível quântico, muito mais delicados. Mas, dos 10 (elevado a 10) neurônios que se supõe existirem no cérebro, os dados experimentais sugerem que cerca de 10 (elevado a 7) estão sendo estimulados ou se encontram muito próximos do limite marginal da sensibilidade quântica a qualquer momento. Em contrapartida, existem aproximadamente 10 (elevado a 6) neurônios no nervo óptico, de maneira que a entrada do nível quântico no cérebro é pelo menos dez vezes maior que a entrada visual.Em estados de atividade cerebral reduzida, como durante o sono ou em estado de meditação ou de transe, a proporção de neurônios sujeitos ao estímulo marginal limite aumenta, aumentando assim a suscetibilidade ao estímulo por fenômenos quânticos indeterminados nesses estados. O interessante é que em estados de relaxamento há uma predominância de ondas alfa registradas em padrões EEG, e, como já foi discutido antes, as ondas alfa podem muito bem estar associadas a uma capacidade mais elevada de PES.

A Indeterminância Quântica e o Pensamento Consciente

Até agora estivemos discutindo a sensibilidade de neurônios corticais em relação à indeterminância quântica microscópica, e tudo o que já dissemos é fato científico estabelecido. Não há dúvida de que no nível mais básico os elementos que constituem o cérebro sejam afetados por processos quânticos. Mas, embora possa ser encorajador encontrar-se no cérebro qualquer elemento em funcionamento que esteja voltado para os fenômenos quânticos, o comportamento isolado de neurônios singulares ainda está a uma grande distância dos modelos conexos (sincrônicos) de disparos de milhões de neurônios que constituem nossa consciência desperta normal. Se essa coerência macroscópica (manifestada como consciência desperta)

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tem qualquer fundamento quântico mecânico ainda é uma simples questão especulativa - embora quase todas as teorias físicas da precognição possam afirmar que ela existe.Ondas cerebrais conexas certamente existem, como já foi bastante demonstrado em padrões de EEG, e quanto mais elevado o grau de consciência que estiver sendo acompanhado, maior a disseminação dessa conexão. Um cérebro profundamente adormecido registra muito poucas ondas cerebrais conexas; um cérebro em atividade normal desperta, um pouco mais; um cérebro muito concentrado em algum trabalho criativo, mais ainda; e um cérebro envolvido em algo como a meditação transcendental apresenta o mais elevado nível de conexão. Estudos por EEG do cérebro de Einstein mostraram um padrão consistente de ondas alfas conexas a maior parte do tempo!As ondas cerebrais conexas, por todas as suas perturbadoras ligações com a consciência mais elevada, são produzidas no nível dos neurônios, por milhares de neurônios reagindo em fase, e não existe nenhuma ligação comprovada entre esse tipo de conexão (macroscópica) e o tipo de conexão (microscópica) de funções de onda quântica encontrado nesses fenômenos, como a superfluidez ou a supercondutividade. Ainda assim, alguns físicos quânticos interessados em determinar a física da consciência fazem especulações de que alguma coisa como a supercondutividade esteja por baixo da base do processo consciente e muitos acreditam que numerosas semelhanças entre os processos conscientes e os processos da mecânica quântica sejam misteriosas demais para se tratar de uma simples coincidência. David Bohm coloca a questão nos seguintes termos:

Podemos muito bem nos perguntar agora se a analogia muito aproximada entre os processos quânticos e nossas experiências interiores e processos de pensamento é simples coincidência... a

notável analogia ponto por ponto entre os processos de pensamento e os processos quânticos poderia sugerir que uma hipótese relativa a ambos tenha possibilidade de mostrar-se frutífera. Se uma hipótese

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como essa pudesse ser verificada, ela iria explicar de maneira natural, muitos aspectos de nosso pensamento.

A analogia entre os processos do pensamento e os processos quânticos que Bohm tinha em mente era tríplice e traçava um paralelo entre o Princípio da Incerteza e determinados aspectos da consciência. O dogma central do Princípio da Incerteza fala na impossibilidade de se fixar um acontecimento quântico com muita exatidão, pois o simples fato de se olhar para ele (tentando medir sua posição e seu impulso) muda o que se esperaria ver. Bohm observa que o mesmo é verdadeiro para o pensamento. "Se alguém tenta observar o que estiver pensando no momento exato em que estiver refletindo sobre um assunto qualquer, de maneira geral aceita-se a idéia de que a pessoa estará introduzindo mudanças imprevisíveis e sem controle na maneira como seus pensamentos estavam indo antes disso".Em segundo lugar, os relacionamentos não-locais que partem do Princípio da Incerteza implicam que diferentes aspectos de um processo quântico não podem ser repartidos em fragmentos separados, um afetando ao outro pelas leis causais, mas antes o sistema todo deve ser encarado em termos de sua indivisibilidade, sua conexão, cada parte só fazendo sentido em termos do todo. E assim é com o pensamento: "... o significado de um processo de pensamento parece ter uma espécie de indivisibilidade. Se uma pessoa tenta aplicar a seu pensamento elementos cada vez mais definidos, ela tentará chegar a um ponto em que qualquer análise ulterior não poderá ter sequer algum significado. Parte do significado de cada elemento de um processo de pensamento parece, portanto, ter origem em suas ligações in divisíveis e completamente sem controle em relação a outros elementos".Por fim, Bohm traça um paralelo entre o papel dos conceitos clássicos, que tornam possível descrever o mundo cotidiano de objetos em separado e as relações causais que revestem e são o limite dos processos quânticos, e o papel dos conceitos lógicos na estruturação

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da natureza fluente e "indeterminada" dos processos de pensamento. "Sem o desenvolvimento do pensamento lógico, não teríamos qualquer maneira definida de expressar os resultados de nossos pensamentos e de verificar sua validade. Assim, da mesma forma que a vida que conhecemos seria impossível se a teoria quântica não tivesse seu limite clássico atual, o pensamento pomo o conhecemos seria impossível a menos que pudéssemos expressar seus resulta dos em termos lógicos". Além dessas analogias entre o processo de pensamento e a indeterminância quântica mencionada por Bohm, existe pelo menos mais uma, particularmente importante para o tema da precognição: um paralelo entre o papel da fantasia no desenvolvimento psicológico e o papel das transições virtuais na evolução dos processos quânticos.O mecanismo da fantasia parece ter sido projetado para lançar os ''sensitivos'' em direção ao futuro. Temporariamente, em nossas mentes, vivemos uma possível situação futura para ver se ela nos serve ou não. Algumas fantasias parecem tão artificiais, chegando à improbabilidade ("Imagine se eu ganhasse na loteria, na semana que vem!?''), sendo assim, postas de lado. Outras são bastante possíveis, e assim, mais prováveis ("Sábado que vem vou nadar, talvez vá jogar tênis, talvez visitar um amigo...") e podem condensar-se num comportamento futuro real.Essas fantasias a respeito do futuro são particularmente importantes para as crianças, um meio de experimentarem suas perspectivas para a vida adulta. A criança imagina que é um vaqueiro, um bombeiro, um médico etc. e é muito comum que mantenha conversas entre seus vários egos fantasiosos - um correlato dos padrões de interferência que podem ser observados quando as ondas de probabilidades da mesma partícula elementar se intersectam.Resumindo, não faltam boas analogias entre a mecânica do pensamento e a mecânica do processo quântico, e estas estão entre as muito perturbadoras razões para se supor que a própria consciência seja um fenômeno quântico. Mas ainda se pode achar que esteja faltando o elo mais importante capaz de demonstrar como

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acontecimentos quânticos microscópicos isolados (que resultam no disparo de neurônios individuais) poderiam ser ampliados para produzir uma conexão quântica macroscópica. Na ausência de um tal mecanismo, o elo entre a teoria quântica e a consciência deve permanecer hipotético. Mas, como diz Bohm: "Se fosse verdade que os processos do pensamento dependem principalmente de elementos da mecânica quântica, então poderia se dizer que os processos de pensamento proporcionam o mesmo tipo de experiência direta dos efeitos da teoria quântica que as forças musculares proporcionam para a teoria clássica". A maioria das teorias que vêm a seguir funcionam baseadas nessa hipótese.

11. TEORIAS FÍSICAS DA PRECOGNIÇÃO

Depois de observar a Teoria da Sincronicidade de Jung, no Capítulo 7, deixamos de tentar compreender de que forma a precognição pode realmente funcionar. O próprio Jung chegou a perceber que os progressos na Teoria da Relatividade e na física quântica teriam de ser levados em consideração em qualquer tentativa de se explicar a precognição, embora seu esforço para fazer isso tenha sido principalmente intuitivo. Contudo, Jung foi o primeiro a dar ênfase a essa importante questão que era saber se as leis da nova física não poderiam ser aplicadas à consciência humana de maneira a explicar o fenômeno físico. E a própria questão em si representava uma grande inovação nas maneiras tradicionais de pensar sobre o assunto. A maioria das teorias físicas da precognição que apareceram depois partiram de onde Jung havia parado.Tentar compreender a mecânica real da precognição coloca realmente duas perguntas distintas a serem respondidas e o êxito de qualquer teoria física será julgado pela capacidade em propiciar respostas satisfatórias às duas perguntas.

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Em primeiro lugar, de que modo, em termos das teorias físicas atuais, podemos compreender o futuro já presente, uma vez que existe até a possibilidade de se ter acesso a ele?Em segundo lugar, uma vez compreendido o que pode significar o fato de o futuro, de alguma forma, existir realmente agora, por quais meios poderíamos ter acesso a ele, ou seja, a qual mecanismo físico em nossos cérebros poderíamos atribuir a consciência precognitiva?

A Natureza do Acontecimento Precógnito

Ao tentar responder à primeira pergunta, é importante deixar claro que a precognição é uma precognição de. O dom da previsão, se autêntico, implica que, em algum sentido, certos aspectos do futuro devem existir "agora". Se existem pessoas que realmente vêem fatos se revelando antes que aconteçam, então depreende-se que deve haver alguma coisa que elas possam estar vendo. A natureza dessa coisa abre-se a duas interpretações diferentes, cada uma com sua própria noção de tempo e cada uma sugerindo suas próprias teorias de como a precognição deve funcionar realmente.Na primeira interpretação, o acontecimento visto na experiência precognitiva deve ser um acontecimento real que se verificou ou que, definitivamente, irá se verificar, embora no que diz respeito à consciência humana ainda "esteja por acontecer". Isso sugere uma visão de tempo em que o futuro está totalmente revelado ou, pelo menos, descrito. O elenco, o cenário e todas as ações que abrangem o futuro já estão ali agora (ou pelo menos estão esperando nos bastidores), se apenas tivermos olhos para vê-Ios.Essa é a tradicional visão do acontecimento precógnito, e a noção de tempo nela implícita não é um problema para a física moderna. Como já foi discutido antes (ver o Capítulo 8), é perfeitamente compatível com a Teoria Geral da Relatividade e com a noção de Einstein de um continuum de espaço-tempo quadridimensional.

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Na segunda interpretação do conteúdo real de uma visão precognitiva, o precógnito não é um acontecimento futuro real, mas antes a percepção futura, que alguém tem de um possível acontecimento futuro. Esse conceito um tanto tortuoso sugere à primeira vista que uma pessoa manifestamente envolvida com uma previsão está, na verdade, prevendo o futuro estado de sua própria mente, ou seja, ela, de alguma forma, conseguiu ter um contato telepático com uma futura manifestação de si mesma e assim está vendo "agora" aquilo que seu futuro eu estará percebendo "então". A ênfase não está naquilo que será, mas antes naquilo que pode ser visto. Isso não implica que o futuro já esteja determinado, mas sugere haver uma série de possíveis futuros e que, de alguma forma, sejamos capazes de perceber essas possibilidades.Tal interpretação inclui uma noção de tempo compatível com a física quântica e está no âmago daquelas teorias físicas da precognição que acabarão recorrendo de uma ou outra maneira às implicações do Princípio da Incerteza. Se verdadeira, essa é a interpretação preferida pela maioria dos modernos teóricos da precognição porque contorna os problemas levantados sobre a existência do livre-arbítrio na precognição (que será discutido no Capítulo 12) e porque está muito mais de acordo com os detalhes conhecidos dos casos mais evidentes de precognição espontânea. Certamente ela está de acordo com os casos citados anteriormente neste livro, em que as pessoas que tiveram a experiência precognitiva pareciam estar vendo alguma coisa que iriam ver mais tarde na "vida real". Não existem casos registrados na história mais recente (com exceção de alguns de psicografia) em que a pessoa que teve a visão precognitiva não tenha participado mais tarde do acontecimento previsto ou tido algum registro visual dele.J. W. Dunne, por exemplo, em seu An Experiment with Time, observou que o material precognitivo na maioria de seus sonhos parecia ser de coisas impressas numa página de um livro ou em manchetes de um jornal que ele estivesse destinado a ler alguns dias mais tarde. Em seu estudo dos 35 casos de precognição ligados ao desastre de

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Aberfan, John Barker observava que "muitas das pessoas que sonharam alegavam ser capazes de localizar exatamente as cenas de seus sonhos nas fotos do desastre de Aberfan que apareceram nos jornais ou na televisão". E no caso do jogo de roleta da srta. H. R., ela dizia que seus olhos eram sempre atraídos para um número no pano da roleta (ou seja, no lugar onde ela estaria vendo o crupiê colocar o taco quando o número saía), e não em algum número na própria roda da roleta em si (onde aconteceria o fato real no futuro).Encarar a precognição como a previsão de um possível acontecimento futuro em vez de um acontecimento real também está de acordo com casos registrados e ajuda a explicar certos casos difíceis onde uma suposta precognição "dá errado", quando o acontecimento previsto se materializa, mas com alguns aspectos importantes alterados.Por exemplo, havia uma série de casos citados no Capítulo 2, em que um possível acontecimento futuro foi sonhado e evitado por causa de um sonho: o caso de Susan B. Anthony que sonhou com o incêndio de um hotel em que poderia ter morrido; o sonho da sra. Warren sobre a queda do Vanguard que a fez cancelar a passagem no vôo condenado; o passageiro que se recusou a viajar no Titanic e assim por diante.As estatísticas de batidas de trem feitas por William Cox, que mostraram que menos pessoas viajaram em trens em risco do que nos que não tiveram problemas, sugerem que essas experiências precognitivas (ou premonitórias) podem ser bem comuns e trata-se, obviamente, de experiências que se referem não a um futuro real que acontece depois, mas antes a possíveis futuros que poderiam ter acontecido.

A Precognição e as Transições Virtuais

A primeira teoria física realmente detalhada da precognição a ser proposta tentava desenvolver a noção de uma percepção futura de um possível acontecimento futuro (a telepatia precognitiva) reunindo o que

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se sabia sobre o indeterminismo quântico no cérebro com análises das transições virtuais da teoria quântica que então fazia a ligação de um mecanismo perceptivo conhecido com um nível de realidade onde "possíveis futuros" existem como coisas naturais. A teoria foi apresentada em 1960 pelo dr. Ninian Marshall, um jovem psiquiatra que havia sugerido antes uma base mecânica quântica para a telepatia.A teoria de Ninian Marshall lembra que um sistema subatômico, em qualquer espaço de tempo determinado, é sempre a mistura de possibilidade e atualidade, uma tendendo a dar lugar à outra numa amplitude de probabilidades. Uma partícula elementar dentro do sistema, como um elétron, ao ser perturbada tende a lançar "sensores" em direção a seu próprio futuro quando está diante do problema de ajustar-se a algum novo grau de energia. Esses "sensores em direção ao futuro" (suas transições virtuais) cobrem simultaneamente todos os possíveis estados de energia que a partícula possa realmente decidir ocupar, ou seja, eles atuam de maneira simultânea todos os possíveis futuros da partícula.Cada transição virtual é exatamente um mergulho no futuro, um futuro de onde a partícula então "retorna" para ir em qualquer um dos estados reais que ela tenha escolhido para instalar-se. A premissa em que Marshall baseou sua teoria e a de que a precognição poderia ser explicada se houvesse maneira pela qual o cérebro pudesse "sintonizar" um desses mergulhos virtuais no futuro, e ele via o provado indeterminismo quântico erigido sobre os disparos de neurônios singulares como uma possível chave para esse processo.A essência da teoria de Marshall era fazer a transição da comprovada capacidade de neurônios singulares para responder a processos quânticos singulares elaborando hipóteses que eram:1. um meio pelo qual acontecimentos singulares no nível quântico (transições virtuais) podem associar-se para construir um padrão, e mais;2. um meio pelo qual o cérebro pudesse ampliar esses padrões quânticos microscópicos em percepções macroscópicas. Ele

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chamou esses processos de ampliação e de formação de modelos de "fenômenos de ressonância" e os comparou ao tipo de efeitos de ressonância que existem entre objetos em oscilação, como diapasões musicais ou vidraças de janela vibrando em "harmonia" com linhas de uma via férrea chacoalhando. Expressando sua teoria como uma Lei da Ressonância, ele afirmava: "Quaisquer duas estruturas exercem influência uma sobre a outra, o que tende a torná-Ias mais parecidas. A força dessa influência aumenta com o produto de sua complexidade e diminui com a diferença entre seus padrões".E assim, se houver alguma semelhança entre formações de padrões no cérebro e os padrões construídos nas transições virtuais dos fenômenos quânticos, a tendência crescente a um determinado padrão entre as transições virtuais (diz a teoria) estará criando uma crescente semelhança nos padrões em construção nos circuitos em reverberação do cérebro. Esse conceito de ressonância é semelhante, de muitas maneiras, à noção de sincronicidade de Jung, em que "o igual atrai o igual". Um acontecimento (subatômico neste caso) deverá agir como um ímã, atraindo outros para suas próprias "vibrações" e assim construindo um padrão que reflete a si mesmo como um espelho.Como um processo quântico sobrevive a si mesmo, seus estados virtuais se deslocam do possível para o mais provável e depois para o real, uma transição verdadeira, que é o produto final. Se, conforme sugere Marshall, o cérebro é sensível a estímulos do nível quântico, isso quer dizer que num determinado ponto crítico o processo quântico se aproxima de uma probabilidade bastante elevada de estabelecer a formação de um padrão; dessa forma ele irá provocar um padrão de ressonância semelhante nos circuitos em reverberação dos neurônios do cérebro marginalmente estimulados, criando assim a imagem precognitiva que reflete a crescente probabilidade de algum padrão de acontecimento quântico. Então, a proporção dessas imagens precognitivas em relação aos acontecimentos reais que ocorrem será a mesma proporção entre a probabilidade de um padrão de transição virtual e a formação final de uma transição real no nível quântico.

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Marshall propõe assim uma teoria física da precognição baseada na suposta capacidade do cérebro de se adaptar a estados de probabilidade de transições virtuais quânticas e de experimentar, através da ressonância, a formação de um padrão que possa espelhar, num nível acessível à consciência, quaisquer tipos de formações de padrão entre os prováveis acontecimentos quânticos, se é que estes existem. Entretanto, os críticos podem argumentar muito simplesmente que se trata de um "se" muito amplo, que em si mesmo quase pressupõe a existência dos fenômenos precognitivos; ainda assim, a abordagem de Marshall tem inúmeras vantagens.Ela se presta a uma simples explicação da mecânica quântica de como uma futura "qualquer coisa" pode ser vista agora, mesmo não tendo ainda acontecido; ela se adapta ao que se conhece sobre o funcionamento do cérebro, e também pode oferecer uma explicação convincente para a característica casual e a imprecisão que acompanha tantos dos casos de manifesta precognição.Os conteúdos das visões precognitivas tendem em seu todo a ser vagos, sendo uma ilusória mistura de detalhes muito precisos em alguns aspectos combinados com sugestões indistintas de uma realidade futura e partes que não têm relação alguma com o verdadeiro acontecimento final. Um quadro tão confuso como este é o que se deve esperar com base na teoria das transições virtuais, pois, se é possível a percepção futura que está sendo prevista na precognição, deveríamos esperar que houvesse muita indeterminância envolvida. Uma vez que uma transição virtual só pode ser descrita como uma onda de probabilidade, qualquer precognição que saia de um acontecimento no nível quântico tão indeterminado assim estaria inclinado a refletir essa indeterminância.Além do mais, existem muitos casos registrados de precognição do tipo "quase erro" em que a visão precognitiva (espontânea ou produzida em condições de laboratório) expõe uma imprevisÍvel tendência a "mudar" algumas das características do acontecimento real final. Nas experiências Soal-Shackleton com os cartões de adivinhação, por exemplo, muitas vezes os dados indicavam que

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Shackleton não havia adivinhado o próximo cartão, mas antes um que vinha depois deste, ou, em certos casos, o cartão que havia precedido aquele.Da mesma forma, nas experiência de visão à distância de Targ e Puthoff na Universidade de Stanford, os indivíduos muitas vezes descreviam as localidades que os assistentes teriam ido visitar se tivessem aberto o envelope seguinte ao que seria fornecido pelo gerador de números aleatórios. Targ e Puthoff descreveram esses interessantes casos de erros como "efeitos de deslocamento". No caso do jogo de roleta da srta. H. R. ficou evidente que ela, muitas vezes, sentia seu olhar ser atraído por um número adjacente ao número que realmente saía, como se ela se ''sintonizasse" com os números mais prováveis de serem selecionados, mais do que se ela estivesse sabendo quais seriam.Todos esses efeitos de "quase erro" são o que se poderia esperar se a precognição viesse de uma percepção de uma série de futuros possíveis pelo contato com as transições virtuais quânticas, e assim não chegam a ocasionar nenhum embaraço para os pesquisadores psíquicos. Nessa teoria, os fenômenos do quase erro são no mínimo (se não, no máximo) tão válidos quanto os fenômenos do "acerto direto" para a compreensão da base física da precognição.

As Teorias de Observação

O físico americano Evan Harris Walker publicou em 1974 a primeira do que veio a ser toda uma série de teorias físicas da precognição, que passaram a ser conhecidas como "as teorias de observação". A primeira teoria de observação de Walker foi comentada, alterada e acrescentada por outros físicos, entre os quais Helmut Schmidt. O próprio Walker publicou inúmeras edições revisadas da teoria. Como a teoria das transições virtuais de Marshall, às teorias de observação têm seu ponto de partida na física quântica e, reunidas, elas

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dominaram a discussão sobre o funcionamento da precognição da década passada.O principal para as teorias de observação vem daquilo que os teóricos da quântica chamam de "problema de mensuração", ou seja, a questão de como, de alguma forma, é possível que todas as diversas possibilidades descritas na função de onda de um fenômeno quântico "caiam" num único acontecimento mensurável. Como será que essa possibilidade se torna realidade? Por que é que existe um mundo cheio de objetos concretos em vez de um simples oceano amorfo de possibilidades infinitas?A própria teoria quântica não tem respostas para o problema da mensuração, contentando-se em afirmar que a equação da onda de Schrödinger descreve todas as possibilidades associadas a um fenômeno quântico, e que todas essas possibilidades continuam viáveis (o fenômeno está disseminado no espaço e no tempo) até o instante em que olhamos para o fenômeno com nossos instrumentos de medição. O próprio ato de medição em si, por alguma razão desconhecida, determina casualmente aquilo que é medido. Gary Zukav escreveu o seguinte em seu The Dancing Wu Li Masters:

Sem a percepção (a medida), o universo continua, pela equação de Schrödinger, a gerar uma infinita profusão de possibilidades. Mas o efeito da percepção é imediato e dramático. Todas as funções de

onda representando o sistema observado desmoronam, com exceção de uma parte, que se materializa em realidade. Ninguém sabe o que

faz com que uma determinada possibilidade se realize e o resto desapareça. A única lei que governa esse fenômeno é estatística. Em

outras palavras: é um caso de oportunidade.

Mas, apesar do frio contentamento com o formalismo da estatística e da matemática por parte dos teóricos da quântica da linha dura (a escola de Copenhagen), o problema da medição continua a importunar os filósofos da física e aqueles físicos quânticos que esperam um dia compreender a natureza da realidade subjacente.

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Uma das hipóteses que tem dominado a questão foi sugerida pelo físico Eugene Wigner, do Instituto de Tecnologia de Michigan: segundo ele, a consciência desmantela a função de onda, ou seja, a consciência é responsável pelo mundo como o conhecemos, em virtude de seu papel na transmutação da possibilidade em realidade.Segundo Wigner, é o próprio observador consciente, mais que seus instrumentos de medição, que desempenha o papel mais importante em provocar aquilo que ele observa. As teorias de observação da precognição se originam essencialmente da hipótese de Wigner, embora elas acrescentem sua própria característica vinculada a uma espécie de causalidade retroativa.A teoria da precognição de Walker sugere que o ato consciente de antever um "acontecimento futuro" tem o efeito de criar de maneira retroativa o próprio acontecimento previsto. A consciência, diz ele, tem o poder de, através de uma causação retrógrada, desmoronar a função de onda proporcionando assim a comprovação da existência de sua "previsão". O que é previsto acabará sendo aquilo que foi dessa forma criado.Infelizmente, como as teorias de observação sempre são apresentadas de uma forma muito complexa e técnica, seus pontos mais apurados não são facilmente acessíveis a outros que não os físicos profissionais.Mas é possível compreender seu modelo básico, traçando um relacionamento entre elas e as experiências de precognição no nível quântico com o estrôncio-90 radioativo realizadas por Helmut Schmidt (ver Capítulo 4).Os indivíduos testados por Schmidt deviam apertar um de quatro botões que havia na aparelhagem experimental; qualquer dos botões que apertassem representaria a adivinhação de qual de quatro luzes iria acender-se pelo estrôncio-90 enfraquecido. Se adivinhassem corretamente em mais de 25% das vezes, Schmidt considerava que eles possuíam alguma capacidade precognitiva.Segundo as teorias de observação, a mecânica real de uma adivinhação precognitiva correta no conjunto experimental de Schmidt

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baseava-se na influência que o indivíduo tivesse tido no próprio processo de enfraquecimento do estrôncio-90 (ou no gerador de números aleatórios a ele associado) depois de ver qual luz havia acendido por esse processo. Em outras palavras: primeiro o indivíduo via a resposta de sua adivinhação (a luz que acendia) e depois "determinava" o processo de enfraquecimento de maneira retroativa para produzir o resultado por ele previsto (ver o diagrama). Esse mecanismo sugere que o processo que chamamos de precognição é, na verdade, uma psicocinese retroativa, a mente trabalhando para trás no tempo para influenciar forças materiais de modo a poderem produzir o resultado já observado.

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Walker amplia o seu trabalho teórico sobre as teorias de observação chegando a especular como deveria ser a natureza da consciência humana para ser compatível com essas teorias. No fundo, ele descreve a consciência como um estado mecânico quântico, semelhante ao que existe dentro dos supercondutores, e diz, então, que o cérebro do observador se liga ao mundo exterior através de

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seus sentidos para formar um sistema mecânico quântico. Afora o fato de ser muito hipotética, essa formulação nos leva ao problema de que, segundo a principal corrente da teoria quântica, um sistema quântico não pode desmoronar a função de onda de um outro nem a sua própria. Para contornar isso, Walker parece sugerir que a "vontade" funciona como um deus ex machina, permitindo que o observador destrua a função de onda de um acontecimento observado segundo seu humor ou sua intenção.Embora as diversas teorias de observação tenham dominado as discussões teóricas sobre a precognição entre os pesquisadores psíquicos que tendiam à física durante a última década, certamente elas não agradaram a todos. A literatura já publicada dos críticos ultrapassa bastante em número a dos que a apóiam. Segundo o filósofo americano Stephen Braude, "as bases conceituais das teorias de observação são no melhor dos casos fracas demais e as teorias em si parecem muito desprovidas de sentido e sem nenhuma força explicativa". John Beloff, de Edimburgo, depois de salientar que a causa e o efeito nas teorias de observação "dão caça um ao outro em círculo temporal, como um cão tentando morder seu próprio rabo", continua dizendo que a necessidade de haver um apelo à "vontade" para explicar a queda da função de onda (que é redução de muitas possibilidades futuras para uma no presente real) significa que elas na verdade não são teorias físicas de maneira alguma.

Lembrando o Futuro

No Congresso Internacional de Física Quântica e Parapsicologia que houve em Genebra em 1974, o físico americano Gerald Feinberg apresentou um documento-ensaio sob o título "A lembrança das coisas futuras". Ele partia de uma simetria nas equações de eletromagnetismo de Maxwell que sugere que - pelo menos em teoria - seria possível receber informações tanto do futuro quanto do passado; sua finalidade era comparar as propriedades comuns da

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precognição, como estava registrada, e a memória recente, na esperança de que uma pudesse lançar alguma luz sobre a outra.Essas comparações entre a precognição e a memória recente estão se tornando cada vez mais comuns entre os pesquisadores cujo trabalho faz uma ponte sobre as lacunas existentes entre a parapsicologia e a física, e a parapsicologia e a psicologia. Encarar a precognição como uma espécie de "memória ao contrário" pode não ser de muita valia para arranjar algumas das questões mais espinhosas na física da precognição, mas poderá ajudar a esclarecer o mecanismo fisiológico real pelo qual essa capacidade funciona.A memória é algo que todos utilizam. como parte da vida cotidiana, embora nem a mais recente pesquisa sobre a fisiologia do cérebro tenha conseguido fornecer uma explicação completa do modo pelo qual ela realmente funciona. Mas, apesar de todas as divergências, os teóricos da memória concordam num ponto essencial: existe uma clara e importante distinção entre a memória recente, ou memória de curto prazo e a memória de longo prazo. Felizmente, para nossas finalidades, a memória recente é a mais bem compreendida dessas duas.A memória de longo prazo é a capacidade de reunir dados durante um longo período de tempo. Memórias da infância, memórias do ano passado, da semana passada e até de uma hora atrás seriam classificadas como sendo memórias de longo prazo. Não há nada de conclusivo que já tenha sido compreendido sobre como o cérebro retém e recompõe estes trechos de informação distantes.Por outro lado, a memória recente refere-se aos trechos de informação disponíveis para relembrar por não mais que alguns minutos, e sabe-se que essa função atua mais como um mecanismo de processamento do que como um banco de dados. Esses trechos de informação que o cérebro capta e é capaz de reter por alguns minutos ou são permanentemente arquivados no banco de memória de longo prazo ou são perdidos para sempre.A distinção entre a memória de longo prazo e a memória recente tornou-se clara depois de se observar pessoas cujos cérebros haviam

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sofrido danos temporários do tipo que interrompia o funcionamento normal. Pessoas que haviam sofrido concussão cerebral, ataques epiléticos ou tratamento de choque. Em cada um desses tipos de casos descobriu-se que a pessoa em questão já não tinha nenhuma memória dos minutos que haviam imediatamente precedido o choque em seu cérebro; no entanto a memória de acontecimentos de um passado mais distante (a memória de longo prazo) não fora afetada.No caso que estabeleceu mais claramente a distinção entre as memórias de curto e de longo prazo, parte do cérebro de um epilético foi removida numa tentativa de interromper os curtos-circuitos elétricos que provocavam os ataques. O inesperado resultado foi que depois disso o paciente nunca mais conseguia ir além de "ontem".Tal fato tornou evidente que a memória de longo prazo do paciente fora deixada intacta, assim como a memória recente, mas ele era incapaz de transferir qualquer informação vinda de alguma experiência nova para seu banco de memória de longo prazo. Qualquer nova informação recebida era simplesmente esquecida no dia seguinte - como foi ilustrado por um exemplo em que lhe mostraram repetidamente o mesmo jornal, dia após dia, e a cada dia ele o lia e relia com um interesse ávido, sempre achando que o conteúdo era novo.Vendo-se como funciona o mecanismo real dos canais de processamento da memória recente, voltamos às mesmas questões levantadas no Capítulo 10, quando se perguntava como o cérebro poderia processar as percepções precognitivas. Por exemplo, como é que o cérebro capta trechos de informação do mundo exterior e os transforma em padrões que possam ser retidos como imagens ou pensamentos? A vantagem evidente de se encarar a questão em termos de memória é que, desde que a memória recente e a precognição podem muito bem trabalhar de maneiras semelhantes, muito mais pesquisas já foram realizadas sobre a memória. Por razões que logo serão discutidas, a memória também seria um candidato mais confiável para estudos do que a precognição, mesmo que se pudesse produzir uma consciência precognitiva para instruí-la.

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Como já se discutiu antes, o cérebro é um mecanismo complexo de bilhões de circuitos elétricos. A informação é levada ao cérebro quando algum estímulo externo provoca um impulso elétrico que dispara esses circuitos, compostos de neurônios. A informação que entra é passada para o cérebro enquanto o impulso elétrico viaja de neurônio a neurônio pelas pequenas cargas elétricas que viro sendo disparadas entre as sinapses (os  terminais dos nervos) dos neurônios em separado.A chave para a compreensão de que esses impulsos elétricos que vão passando pelos circuitos dos neurônios estão na raiz da maneira como opera a memória recente seria encontrada na natureza desses incidentes que apagam a memória recente - concussões, ataques epiléticos, tratamento de choque elétrico etc. Todos são fenômenos que interrompem o funcionamento normal do circuito elétrico do cérebro. Se esses "curtos-circuitos" elétricos podiam destruir o conteúdo da memória recente, depreende-se que os impulsos elétricos que passavam pelos neurônios deviam ser os  blocos que constroem essa memória.Uma vez que tais impulsos eram a chave para o funcionamento da memória recente, restava ainda a questão de como se formariam os modelos de imagem ou pensamento a partir de tais dados. Cada impulso elétrico proveniente de um estímulo externo não dura mais que dois milionésimos de segundo, mas os pensamentos e imagens que constituem o conteúdo da memória recente duram pelo menos alguns segundos ou talvez muitos minutos. Assim, o cérebro deve necessariamente ter algum meio para formar padrões a partir desses impulsos de milionésimos de segundos.O mesmo problema da constituição de padrão surgiu ao se discutir a forma pela qual os estímulos precognitivos no nível quântico em separado poderiam reunir-se para formar uma imagem precognitiva. E agora é geralmente aceito o fato de que padrões de memória recente na verdade operam por linhas de um mecanismo bastante semelhante ao que foi discutido quando analisamos a teoria dos padrões de ressonância do cérebro de Ninian Marshall em termos da precognição,

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ou seja, que esses padrões se formam por reverberação (vibrações padronizadas) ao longo dos circuitos do cérebro ressonante.Como a pequena ondulação num lago cujos círculos partem do ponto em que a água foi perturbada num conjunto de ondas padronizadas,  os pensamentos e imagens se formam no mecanismo de memória recente do cérebro através de padrões de ressonância postos em ação pelo estímulo elétrico original, refletindo e ampliando sua mensagem enquanto um número cada vez maior de circuitos elétricos do cérebro vibram em "sintoma" com ela. Se também existem estímulos do futuro à disposição, esses efeitos de ressonância sugerem um modelo do cérebro inundado por todos os lados pelas ondas padronizadas da memória e da precognição.

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Se a precognição é realmente uma espécie de "memória do futuro", podemos imaginar o cérebro sendo inundado por informações recebidas do passado e do futuro. Aqui, o indivíduo precognitivo pode lembrar-se do Titanic navegando a salvo "ontem" e prever seu

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afundamento "amanhã", e essas duas imagens encontram-se presentes em seu cérebro "hoje".

Vale a pena fazer algumas considerações sobre certas semelhanças e distinções entre a memória recente e a precognição. A vasta pesquisa realizada sobre a memória recente já mostrou, por exemplo, que a capacidade de relembrar diminui rapidamente com o tempo; na verdade, ela diminui no mesmo índice logarítmico que foi descoberto pelo psicólogo de Sheffield, J. E. Orme, em seu estudo do fator tempo em experiências precognitivas. No levantamento realizado por Orme sobre este fator em 148 casos de precognição espontânea, os exemplos registrados apresentavam um evidente relacionamento inverso entre o número de precognições registradas e o tempo que havia separado a visão precognitiva do acontecimento real.Mas, enquanto a memória recente se torna cada vez mais difusa com a passagem do tempo, até que, em determinado ponto crítico, os dados desaparecem inteiramente a menos que tenham sido registrados de modo permanente, a memória não apresenta a mesma flagrante imprecisão e imprevisibilidade que aflige a consciência precognitiva. Se os mecanismos são basicamente os mesmos, sendo a precognição simplesmente a memória invertida, por que essa diferença?Uma resposta óbvia apresenta-se por si mesma se lembrarmos a natureza probabilística dos dados com que a percepção precognitiva tem de lidar: Enquanto a memória é uma compilação de acontecimentos ou impressões reais, a precognição é mais provavelmente uma "pré-compilação" de possíveis acontecimentos ou impressões.O cérebro, como já vimos, está sujeito às indeterminâncias de nível quântico, e, assim, aberto à estimulação dos estados virtuais quânticos de todos os acontecimentos possíveis. Desse modo, se as abordagens da mecânica quântica ao assunto estão corretas, a precognição (nossa memória do futuro) iria conter necessariamente uma incerta mistura de "memórias" de acontecimentos reais e

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"memórias" de possibilidades perdidas. Essa abertura aos estados virtuais quânticos que, através de ressonâncias dos neurônios podem constituir um padrão semelhante ao elaborado pelos circuitos reverberadores na memória recente através de ressonâncias nos neurônios, estaria inclinada a deixar a "memória do futuro" (a precognição) menos exata que a memória do passado. E em muitos aspectos, os dois mecanismos parecem muito semelhantes.

12. A PRECOGNIÇÃO E A QUESTÃO DO LIVRE-ARBÍTRIO

Outros sentavam-se afastados numa colina, recolhidos em pensamentos mais elevados; muito discutiram sobre a Providência, a

presciência, o livre-arbítrio e o destino.Determinavam de forma absoluta o destino, o livre-arbítrio, a

paciência, sem acharem nenhum fim, vagueando perdidos em labirintos.

Milton

A questão do livre-arbítrio sempre aparece nas discussões sobre a precognição, atuando como uma das principais objeções filosóficas para que se aceite que possa existir uma tal faculdade. Essa mesma possibilidade de se ver o futuro antes que ele aconteça não implicaria a impossibilidade de atuar como um agente livre com relação a este futuro? Eis a pergunta habitual. Por outro lado, como é possível conceber a existência de um futuro já determinado, se acreditamos na possibilidade de o homem agir , como senhor de seu destino? E, se o futuro não está ali para ser visto, o que pode significar "presciência" ou "previsão"?Até muito recentemente essas perguntas levaram os que pensavam nelas a "se perderem em labirintos de devaneios", sem escapatória visível para se poder fazer uma escolha decidida entre a liberdade e a previsão. Nenhum argumento lógico ou físico parecia oferecer

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quaisquer alternativas. Depois de tanta discussão durante as últimas duas décadas sobre os mecanismos verdadeiros da precognição, agora talvez seja possível ir além desse impasse, encontrando-se um espaço para a precognição e o livre-arbítrio.Antes que os estudos da precognição se tenham ligado tanto às complexidades da física moderna como em nossos dias, em geral achava-se que, se a previsão fosse possível, sua própria existência deveria emprestar um peso esmagador ao argumento do determinismo. Esse ponto de vista parecia tão axiomático que os advogados do livre-arbítrio rejeitavam completamente qualquer testemunho da precognição, a menos que estivessem dispostos a aceitar o que parecia ser a prova definitiva para os partidários do determinismo. O prof. J. B. Rhine resumiu o que muitos julgavam um abismo inevitável:

Se a precognição fosse ou pudesse ser 100% precisa, o conhecimento desse fato iria afetar tão profundamente nossa filosofia

de vida que as implicações seriam de arrepiar. Isso é verdade em especial se, ainda por cima, todos os tipos de acontecimentos num

certo ponto no tempo fossem previsíveis, pois, se o fossem, obviamente seriam todos determinados e inevitáveis. Eles deveriam

estar determinados para poderem ser previsíveis. Não haveria realmente uma liberdade de escolha. Mesmo que uma pessoa

soubesse que ia estar num desastre de trem, ela não poderia evitá-lo. Num caso desses, de que valeria a precognição para o homem? O

testemunho de uma precognição, sem a menor dúvida, implicaria um fatalismo a partir do qual nenhuma decisão estaria totalmente livre.

Assim, a liberdade volitiva e a previsibilidade perfeita são irreconciliáveis.

Naturalmente, aquele "se" no início das observações de Rhine, como ele mesmo indica, é uma condição muito abrangente. Pois, se a precognição realmente deve selar a vontade humana de uma vez por todas, ela deveria ter no mínimo um potencial teórico de 100% de

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exatidão. Mas, até agora, nenhum testemunho de casos espontâneos já registrado, nem tampouco qualquer dado recolhido em experiências de laboratório nos estudos da precognição sugeriram esse grau de precisão perfeita. Ao contrário, pelo que se sabe, a precognição é uma faculdade tão imprecisa e tão imprevisível que dá aos céticos boas razões para questionar sua existência.No entanto, quando se avalia a extensão em que a precognição pode ser uma ameaça ao livre-arbítrio, a questão não é a conhecida falta de unidade das experiências precognitivas mas, antes, se algum dia essa faculdade precognitiva poderia ser desenvolvida e controlada para resultar em previsões que atingissem 100% de exatidão. E não há uma resposta certa para isso. Grande parte da pesquisa experimental hoje realizada sobre a precognição, testemunhada em condições de laboratório, tem em mente essa questão do potencial de exatidão, mas, até que a verdadeira física dessa faculdade venha a ser inteiramente compreendida, é muito improvável que se possa chegar a alguma conclusão definitiva. Ainda é preciso encarar essas conseqüências do livre-arbítrio nos termos de duas únicas possibilidades: uma, que há um potencial de que a precognição é precisa em qualquer caso - bastando apenas sabermos como ver; outra de que a precognição jamais poderá ser 100% exata e que geralmente estará sujeita a erros.Sugeriu-se antes que existem dois caminhos muito diferentes para se interpretar a natureza dos fenômenos precognitivos. Por um lado, o que está sendo previsto poderá muito bem ser um futuro acontecimento real. Por outro lado, a precognição seria antes uma previsão das possíveis futuras percepções do próprio perceptivo. Cada uma dessas interpretações presta-se a uma diferente explicação física sobre o funcionamento da precognição e também a uma conclusão diferente sobre a relação entre precognição e livre-arbítrio.Se alguém que tem uma visão precognitiva prevê um futuro acontecimento real, sua previsão deveria mais provavelmente ser melhor explicada em termos da interpretação estática do tempo que a Teoria da Relatividade propõe. No continuum espaço-tempo

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quadridimensional de Einstein, toda a história do acontecimento já existe e cada estágio dessa história em separado está representado por um ponto numa curva estacionária. É como explica o físico Costa de Beauregard:

... a relatividade é uma teoria onde tudo já está "escrito" e onde a mudança só é relativa ao modo de perceber dos seres vivos. Os seres humanos e as outras criaturas... são levados a explorar aos poucos o

conteúdo das quatro dimensões (tempo), enquanto cada um vai atravessando, sem parar ou voltar para trás, uma trajetória de tempo

no espaço-tempo.

Se se devesse interpretar a precognição em termos de uma teoria de tempo assim como essa, evidentemente sobraria muito pouco espaço para se extraírem conclusões de alguma importância com relação ao livre-arbítrio. Deste ponto de vista, a previsão e o destino estão ligados pelo mesmo determinismo inflexível que existe por trás do fatalismo dos antigos gregos. Como acontecia com eles, o indivíduo não teria liberdade para dar forma a seu próprio futuro, não poderia se intrometer nos "arquivos do destino, maciças placas de bronze e ferro sólido", tão inalteráveis que "você poderá ver o destino de seus descendentes gravado em eterno diamante" (Ovídio, As metamorfoses).Naturalmente, como já vimos no último capítulo, o tempo estático da Teoria da Relatividade não é a única explicação disponível sobre o funcionamento da precognição. Chega-se a um quadro bem mais dinâmico unindo aquela faculdade com a física quântica, e, sobretudo, com as oportunidades inerentes da realidade fundamental que estão no Princípio da Incerteza de Heisenberg. Um modelo de precognição que esteja baseado na teoria quântica (por exemplo, na teoria das transições virtuais de Marshall ou nas teorias de observação), em que a precognição em si é interpretada como uma previsão das possíveis percepções futuras da própria pessoa, não deixaria muito campo para

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o determinismo, e o panorama do livre-arbítrio seria então completamente diferente. O filósofo J. R. Lucas comentou a respeito:

A mecânica quântica lança dúvidas sobre todas as velhas hipóteses... (O Princípio da Incerteza de Heisenberg) chamou muita atenção. Alguns acham que ele demonstra que até os elétrons têm o livre-

arbítrio; falando-se mais seriamente, se ele foi interpretado de forma correta, abala toda a base da física em relação ao determinismo.

A razão fundamental pela qual a mecânica quântica abala a base física em relação ao determinismo. vai direto ao âmago da preocupação de Rhine, de que se a precognição fosse 100% exata, ela necessariamente entraria em conflito com as exigências do livre-arbítrio e afastaria qualquer preocupação a respeito disso. Isso porque um modelo de precognição baseado no princípio da incerteza de Heisenberg jamais poderia ser algo 100% preciso em suas predições de futuros acontecimentos, simplesmente porque os próprios acontecimentos futuros estão totalmente indeterminados até que sejam fixados na realidade do presente.Segundo a teoria quântica, o único futuro ao qual uma faculdade como a precognição poderia ter acesso seria um futuro indeterminado e provável, consistindo de todos os "poderia ser" reunidos nas equações de onda de Schrödinger. E assim, a imprecisão observada nos casos registrados de precognição estaria apenas refletindo o fato de que, na própria realidade, existe uma ampla liberdade para qualquer quantidade de alternativas na direção que os acontecimentos futuros poderiam tomar.Existe, por exemplo, o caso muito conhecido registrado por Rhine do homem que planejava viajar de trem em certo dia; na noite anterior à viagem, ele teve um sonho em que via seu trem sofrendo um acidente e via a si mesmo gravemente ferido. O sonho fez com que mudasse seus planos de viagem e ele não se feriu; mais tarde, leu no jornal que o trem que pretendia tomar havia realmente se acidentado. O caso é muito citado para ilustrar um dos principais paradoxos que se

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levantam das imprecisões da precognição imaginária: uma vez que o sonho não chegou a realizar-se pelo desdobrar dos acontecimentos posteriores, como se poderia dizer que se tratou de alguma forma de precognição?Um modelo de precognição na mecânica quântica poderia contornar esse paradoxo indicando que, em primeiro lugar, existem milhares de possibilidades inerentes à situação descrita: o homem poderia ter simplesmente ignorado o sonho, ter tomado o trem e se ferido no acidente, o trem poderia não ter batido ou, o que realmente aconteceu, o homem ficou tão assustado com o sonho que retardou sua viagem. Qualquer uma dessas possibilidades, segundo a teoria quântica, seria válida da mesma forma, até que algo real ocorresse.Esse âmbito de possibilidades, que não apenas é compatível mas necessário para um modelo da mecânica quântica da precognição, revela-se perfeitamente compatível com o livre-arbítrio. Na verdade, o testemunho de inúmeros casos registrados de precognição espontânea "imprecisa" chega a sugerir que a precognição poderia estar desempenhando um papel ativo num aumento de nossa capacidade para exercer o livre-arbítrio, acrescentando ao nosso conhecimento mais opções de alternativas para o futuro. No caso citado por Rhine daquele possível viajante, tendo em vista seu sonho precognitivo, ele era livre para decidir se arriscaria o aparente perigo da viagem ou se desistiria de seus planos de viagem para aquele dia. Sem o sonho, é mais provável que ele apenas fosse uma vítima do seu "destino". Existe ainda outra questão mais sutil associada ao modelo de precognição da mecânica quântica, que sugere uma ação recíproca entre a visão precognitiva e a livre administração do próprio destino de uma pessoa, uma questão que tem tanto a ver com a natureza da personalidade humana quanto a natureza dos acontecimentos físicos. Isto, em relação ao que é "provável" em oposição ao que é "possível".Na física quântica, quando um elétron em movimento ao redor do núcleo atômico num estado de energia estável é perturbado, ele tem, por assim dizer, "todo um futuro diante de si". Há uma ilimitada

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quantidade de novos estados de energia possíveis e disponíveis para ele, e o elétron poderá instalar-se em qualquer um deles. Desse modo, se estivéssemos preocupados com o livre-arbítrio dos elétrons, poderíamos dizer que, na determinação de seu próprio destino (um futuro estado de energia), um elétron tem um ilimitado livre-arbítrio. Mas o interessante é: até que ponto o elétron pode realmente exercer toda toda liberdade de escolha?A resposta: até um ponto bastante restrito.Ligada a toda a concepção das ondas de probabilidade como expressões de acontecimentos quânticos, está implícito que, enquanto continuam os processos no nível quântico, os modelos de comportamento tendem a desenvolver possibilidades tiro amplas que rapidamente dão lugar à probabilidade. Um elétron totalmente livre para escolher entre infinitas opções de estados de energia na verdade irá escolher a opção mais confortável, ou seja, o estado de energia em que precise usar o menor esforço para continuar suas voltas em torno da órbita do núcleo. E só muito poucos de seus possíveis estados de energia poderiam prometer uma "vida tão fácil", e apenas esses poucos estarão entre seus novos destinos prováveis. Assim, a teórica liberdade de escolha ilimitada do elétron ver-se-á restrita por uma inclinação à preguiça!Essa mesma distinção entre o provável em oposição ao possível poderá ser vista em termos de um exemplo tirado do nível da realidade cotidiana. O princípio da incerteza poderia sugerir que é perfeitamente possível a xícara de café de um escritor de repente levantar vôo da escrivaninha, sair voando pela sala e ir se colocar em cima da lareira, mas é muito improvável que ela algum dia vá fazer isso (por causa da enorme quantidade de energia que um tal feito exigiria). E realmente a coisa é tão improvável, que o escritor não precisa sequer se preocupar em levar em conta essa possibilidade.Se pensarmos a respeito, parece muito provável que o comportamento também seja governado por alguma coisa semelhante às funções da probabilidade. Exatamente como os movimentos dos elétrons perturbados revelam uma tendência padronizada a procurar

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estados de energia repousantes que possam atender sua preferência por uma vida de baixo dispêndio de energia, limitando a que seria de outra forma uma liberdade irrestrita de opções, a personalidade humana também é constituída por, uma série de padrões de comportamento baseados em atitudes, neuroses, hábitos etc., em geral planejados para facilitar nosso caminho pela vida com o menor gasto possível de energia. Trilhar caminhos já conhecidos, apegar-nos a velhos hábitos é muito mais confortável do que ficar realizando descobertas inéditas, e é preciso levar em conta a influência dessa disparidade para que se possa estabelecer o relacionamento real entre a visão precognitiva e o desenvolvimento do livre-arbítrio.Embora continue sendo inteiramente possível que um ser humano que tenha tido uma advertência precognitiva possa alterar a direção de algum acontecimento futuro por um ato de sua vontade, é importante que nos perguntemos se isso é provável. Para tomarmos um exemplo óbvio, é possível que um alcoólatra possa desistir de repente do conforto de sua garrafa depois de ter tido um sonho em que via sua mulher morta num acidente provocado por estar ele dirigindo embriagado. Mas é provável que ele faça isso? Infelizmente nossos hábitos perceptivos e cognitivos só permitem que muito pouca gente leve a sério um sonho desse tipo, podendo usar a energia necessária para mudar, a tempo, hábitos numa ação preventiva. .Dada a existência destes padrões de probabilidade no comportamento humano, o famoso lembrete de Cassius a Brutus - "o problema, meu caro Brutus, não está em nossas estrelas, mas em nós" -, menos parece uma expressão de fé na existência do livre-arbítrio e mais uma descrição dos limites de liberdade pela tendência do homem a comportar-se de maneira muito padronizada, e, portanto, previsível. Com muito raras exceções, os seres humanos - e os elétrons - dificilmente exercem o direito de escolher com liberdade entre a imensa gama de possibilidades abertas para eles por Deus ou pelo princípio da incerteza.

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CONCLUSÃO

Nas primeiras páginas deste livro dizíamos que não existe nenhuma prova definitiva para a existência da precognição, nenhum testemunho que pudesse convencer um grupo de cientistas independentes e desinteressados. Uma negação dessas poderá parecer curiosa agora, quando colocada ao lado da apresentação de tantas páginas do que poderia ter sido tomado como um testemunho bastante volumoso do gênero muito convincente, mas isso é o menos necessário. Cada sonho ou caso espontâneo desperto, ou as experiências relatadas nos capítulos que vieram a seguir, certamente teria seus defensores, mas um cético poderia argumentar, até com certa razão, que nenhum desses casos, não todos em conjunto, preenche os critérios bastante rigorosos exigidos para uma sólida prova científica de que algumas pessoas realmente são privilegiadas de tempos em tempos com informações antecipadas sobre o futuro.Deve-se admitir também que a questão da precognição não está muito reforçada cientificamente pelas analogias com certos efeitos apresentados, na física quântica ou na Teoria da Relatividade - por mais interessantes que eles possam parecer. Com toda certeza é uma verdade que a revolução intelectual produzida no século XX reduziu a prevenção contra a precognição e pode até ser possível utilizar-se determinados aspectos dessa física para postular o funcionamento da precognição - mas a prova de que alguma coisa seja possível não é uma prova de que ela exista. O único critério científico aceitável para isso seria a produção controlada de dados sobre a precognição sob repetidas condições experimentais - e até agora não se conseguiu reunir tais dados.Mesmo que sejamos forçados a admitir que ainda não existe uma prova científica convincente sobre a precognição, estaríamos nós condenando por isso, automaticamente, todo o material das páginas anteriores ao reino da fraude ou do faz-de-conta? Seria realmente

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verdade que em cada um dos inúmeros exemplos diversificados de uma alegada precognição o perceptivo em questão é culpado - num conluio com sua testemunha - de mentir ou delirar? A maioria dos parapsicólogos iria responder com um não a uma sugestão dessas, pelo menos por duas razões.Primeiro, pode-se argumentar que a ausência de qualquer prova científica para a existência da precognição não garante, por si só, que nunca haverá uma prova dessas. Se existe, a precognição não seria a única de nossas faculdades que ainda desafia o rigor científico. Com todos os seus progressos conceituais, os cientistas ainda sabem muito pouco sobre a consciência ou o cérebro humano. O mecanismo completo da percepção comum, o funcionamento da memória de longo prazo e a relação entre "mente" e "corpo" ainda estão muito além do âmbito da explicação científica.Muito mais importante é que inúmeros parapsicólogos se perguntem se critérios estritamente científicos, como o controle e a repetitividade, serão realmente padrões adequados pelos quais se possa fazer julgamentos sobre a existência ou não de faculdades psíquicas como a precognição. Os que têm uma convicção dualista iriam responder negativamente, baseados no fato de esses critérios serem físicos e as faculdades psíquicas, por definição, extrafísicas. Outros, mesmo estando numa posição materialista, diriam que essas faculdades estão, sem a menor dúvida, ligadas a um estado de espírito ou estado psicológico de uma pessoa, e que até agora muito pouco se compreende sobre esses parâmetros psicológicos em mutação constante para se planejar experiências científicas adequadas que possam ser levadas em consideração: Num pequeno ensaio sobre o problema de se estabelecer um parâmetro para os dados precognitivos, Jung ainda propõe uma outra razão pela qual a ciência não é o instrumento adequado para se lidar com estes assuntos:

Qualquer pessoa que mantenha uma expectativa de obter respostas sobre a questão da verdade parapsicológica irá desapontar-se. O

psicólogo aqui está muito pouco preocupado com o gênero de fatos

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que possam ser estabelecidos num sentido convencional... Naturalmente, nossa era científica quer saber muito se esse tipo de

coisas (como as premonições, a precognição, a segunda visão, assombrações, fantasmas, retorno dos mortos, feitiços, magia,

encantamentos etc.) são "verdadeiras", sem levar em consideração qual seria a natureza de uma prova para isso ou como se poderia

obtê-la. Para tanto, deve-se encarar muito honesta e sobriamente os acontecimentos em questão - e geralmente acontece que as histórias mais interessantes se volatilizam no ar... Ninguém pensa em fazer a

pergunta essencial: qual é a verdadeira razão pela qual essas mesmas velhas histórias se repetem indefinidamente sem perder nada

de seu prestígio inicial?

A resposta de Jung é que essas histórias estão necessariamente muito além dos limites desinteressados da ciência porque representam "fatos psíquicos", mas como tal, para ele, elas não são menos "verdadeiras" num sentido psicologicamente mais importante do que seriam quaisquer outros fatos objetivos da ciência convencional. Assim para Jung, a questão de a precognição deixar de ser algum dia cientificamente provada ou chegar a ser completamente explicada em termos científicos não tem a menor importância para que se estabeleça sua verdade e sua importância psicológica. Essa importância não vem de dados repetidos mas antes de uma constante repetição, no decorrer "dos séculos", de relatos individuais onde houve uma experiência precognitiva. Toda essa repetição, argumenta ele, propicia uma existência independente à precognição na psicologia do inconsciente - seja lá o que a ciência possa dizer.Tendo em vista seu menosprezo por dados científicos frios, em  favor da experiência pessoal espontânea, não é de admirar muito que Jung acreditasse que "a mais grandiosa e a mais importante parte da pesquisa parapsicológica estará na minuciosa exploração e numa descrição qualitativa" dos acontecimentos espontâneos". Muitos dos pesquisadores psíquicos do velho estilo, afastados pela abordagem muitas vezes técnica demais da parapsicologia experimental, sem

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dúvida estariam inclinados a concordar com ele. Ao mesmo tempo, seria bom que eles lembrassem que, em sua Teoria da Sincronicidade, Jung achava a física quântica muito próxima do que ele via como a poesia da alma. Tanto a física quanto o paciente de experiências espontâneas provavelmente irão desempenhar um papel muito importante nos futuros estudos sobre a precognição.