atividade hemaglutinante do extrato aquoso dos estigmas de … · 2017-05-29 · na década de...

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159 Revista Interdisciplinar em Saúde, Cajazeiras, 4 (1): 159-170, abr./jun. 2017, ISSN: 2358-7490. artigo - article ATIVIDADE HEMAGLUTINANTE DO EXTRATO AQUOSO DOS ESTIGMAS DE MILHO (Zea mays) SUGERE PRESENÇA DE LECTINA HEMAGLUTINANT ACTIVITY OF THE AQUEOUS EXTRACT OF CORN STIGMA (Zea mays) SUGGESTS PRESENCE OF LECTIN Luan Evangelista Carlos 1 Francielly Negreiros de Araújo 2 Thaise de Abreu Brasileiro Sarmento 3 Carlos Alberto de Almeida Gadelha 4 Tatiane Santi Gadelha 5 Vanessa Erika Ferreira Abrantes 6 RESUMO: Objetivo: O presente trabalho tem como objetivo discutir a presença de uma possível lectina em extratos dos estigmas de Zea mays através de testes de atividade hemaglutinante e inibição por açúcares. Métodos: Os estigmas de milho foram coletados de uma plantação orgânica na cidade de Umari - CE, Brasil, entre as coordenadas (latitude: -3.26667, longitude: -40.11673° 16′ 0″ Sul, 40° 7′ 0″ Oeste). A coleta dos estigmas ocorreu no mês de junho de 2016. Para a obtenção dos extratos, os estigmas foram secos em estufa à temperatura de 37ºC por 5 dias consecutivos, em seguida triturados em moinho elétrico em temperatura ambiente para a obtenção da farinha fina necessária para a realização da extração proteica. A amostra foi submetida a uma coluna de afinidade de Sephadex® G-50, com matriz de Glicose e Manose, equilibrada com solução de NaCl 0,15M, deixando-se em refluxo durante 16 horas. Para realização dos testes de atividade hemaglutinante (AH) foram utilizadas suspensões de hemácias de coelhos do tipo albino obtidas no Departamento de Biologia Molecular da UFPB. Foram feitos teste de inibição da AH utilizando-se soluções dos açúcares Glicose, Manose, Sacarose e Frutose, todas a 0,5M. A eletroforese foi feita seguindo a metodologia descrita por Laemmili (1970), adaptada para o uso de géis de separação em placas de vidro. As placas utilizadas mediam 10,5 x 10 cm com espaçadores de 1,0 mm, e após o preparo, foram transferidas para cuba vertical. A determinação da concentração de proteínas 1 Bacharel em Biomedicina pela Faculdade Santa Maria - FSM, Cajazeiras - PB. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular pela UFPB, João Pessoa - PB. 3 Bacharel em Medicina e professora da Faculdade Santa Maria, Cajazeiras - PB. 4 Professor doutor da Universidade Federal da Paraíba e coordenador do BioGeR - Lab. 5 Professora doutora da Universidade Federal da Paraíba e coordenadore do BioGeR - Lab. 6 Mestre em Biologia Celular e Molecular pela UFPB. Professora da Faculdade Santa Maria, Cajazeiras - PB.

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159 Revista Interdisciplinar em Saúde, Cajazeiras, 4 (1): 159-170, abr./jun. 2017, ISSN: 2358-7490.

artigo - article

ATIVIDADE HEMAGLUTINANTE DO EXTRATO AQUOSO DOS ESTIGMAS DE MILHO (Zea mays) SUGERE PRESENÇA DE LECTINA HEMAGLUTINANT ACTIVITY OF THE AQUEOUS EXTRACT OF CORN STIGMA (Zea mays) SUGGESTS PRESENCE OF LECTIN

Luan Evangelista Carlos1 Francielly Negreiros de Araújo2

Thaise de Abreu Brasileiro Sarmento3 Carlos Alberto de Almeida Gadelha4

Tatiane Santi Gadelha5 Vanessa Erika Ferreira Abrantes6

RESUMO: Objetivo: O presente trabalho tem como objetivo discutir a presença de uma possível lectina em extratos dos estigmas de Zea mays através de testes de atividade hemaglutinante e inibição por açúcares. Métodos: Os estigmas de milho foram coletados de uma plantação orgânica na cidade de Umari - CE, Brasil, entre as coordenadas (latitude: -3.26667, longitude: -40.11673° 16′ 0″ Sul, 40° 7′ 0″ Oeste). A coleta dos estigmas ocorreu no mês de junho de 2016. Para a obtenção dos extratos, os estigmas foram secos em estufa à temperatura de 37ºC por 5 dias consecutivos, em seguida triturados em moinho elétrico em temperatura ambiente para a obtenção da farinha fina necessária para a realização da extração proteica. A amostra foi submetida a uma coluna de afinidade de Sephadex® G-50, com matriz de Glicose e Manose, equilibrada com solução de NaCl 0,15M, deixando-se em refluxo durante 16 horas. Para realização dos testes de atividade hemaglutinante (AH) foram utilizadas suspensões de hemácias de coelhos do tipo albino obtidas no Departamento de Biologia Molecular da UFPB. Foram feitos teste de inibição da AH utilizando-se soluções dos açúcares Glicose, Manose, Sacarose e Frutose, todas a 0,5M. A eletroforese foi feita seguindo a metodologia descrita por Laemmili (1970), adaptada para o uso de géis de separação em placas de vidro. As placas utilizadas mediam 10,5 x 10 cm com espaçadores de 1,0 mm, e após o preparo, foram transferidas para cuba vertical. A determinação da concentração de proteínas 1 Bacharel em Biomedicina pela Faculdade Santa Maria - FSM, Cajazeiras - PB. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular pela UFPB, João Pessoa - PB. 3 Bacharel em Medicina e professora da Faculdade Santa Maria, Cajazeiras - PB. 4 Professor doutor da Universidade Federal da Paraíba e coordenador do BioGeR - Lab. 5 Professora doutora da Universidade Federal da Paraíba e coordenadore do BioGeR - Lab. 6 Mestre em Biologia Celular e Molecular pela UFPB. Professora da Faculdade Santa Maria, Cajazeiras - PB.

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solúveis no extrato foi realizada através do método de Bredford. Resultados: A cromatografia realizada apresentou boa leitura do pico II (1.300 - 0,306), que é o pico retido, mostrando que o extrato apresentou afinidade pela matriz da coluna. A eletroforese em gel de poliacrilamida em presença de SDS e 2-mercaptoetanol (PAGE-SDS) dos extratos de Zea mays revelou várias bandas de diferentes pesos moleculares. Através do ensaio de bradford foi possível calcular qual é a concentração de proteínas solúveis no extrato obtido a partir de Zea mays e NaCl 0,15M, como sendo 0,66 mg/ml. Conclusão: A partir dos resultados encontrados na pesquisa, é possível afirmar que no extrato bruto com NaCl 0,15M de estigmas de Zea mays possua uma provável lectina, pois houve detecção clara de atividade hemaglutinante, desfeita através de contato com alguns açúcares, assim como afinidade por coluna de cromatografia. Palavras-chave: Aglutinação. Zea mays. Lectina de Ligação a Manose. ABSTRACT: Objective: This paper aims to discuss the presence of a possible lectin in extracts of the Zea mays stigmas, through hemagglutinating activity and inhibition tests for sugars. Method: The maize stigmas were collected from an organic plantation in the Umari-CE, Brazil, between the coordinates (latitude:-3.26667, longitude:-40.11673° 16/51.883° n 40° 0.5″ South 7/51.883° 0.1″ West). The collection of the stigmata occurred in June/2016. For obtaining the extracts, the stigmata were dried in an oven at a temperature of 37ºc for 5 consecutive days, then crushed in electric mill at room temperature to obtain flour needed for the protein extraction. The sample was subjected to an affinity column of Sephadex ® G-50, with the gel base of glucose and mannose, balanced with solution of NaCl 0, 15 M, leaving at reflux for 16 hours. To test of hemagglutinating activity (HA), red blood cells suspension from albino rabbits obtained Molecular Biology Department of Federal University of Paraiba were used. HA Inhibition test were made using solutions of sugars glucose, mannose, sucrose and fructose, all to 0,5M. Electrophoresis was carried out following the methodology described by Laemmili (1970), adapted for the use of glass plates. The boards used measured 10.5 x 10 cm with 1.0 mm spacers. The concentration of soluble proteins in the extract was determined using the Bredford method. Results: the chromatography performed in column of Sephadex-G50 presented the retained peak II (1,300-0.306), showing that the extract exhibits affinity for the column array, consisting of glucose and mannose sugars. The polyacrylamide gel electrophoresis in the presence of 2-mercaptoethanol and SDS (SDS-PAGE) of Zea mays samples revealed several bands of different molecular weights. Through the Bradford assay it was possible to calculate the concentration of soluble proteins in the extract obtained from Zea mays and 0.15M NaCl, being 0.66 mg / mL. Conclusion: the results found in the search, it is possible to affirm that the crude extract with NaCl 0, 15 M of Zea mays stigma has a possible lectin, since there was clear detection of hemagglutinating activity, undone by contacting some sugars, as well as by affinity chromatography column. Keywords: Agglutination. Zea mays. Mannose-Binding Lectin.

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INTRODUÇÃO

A primeira evidência das lectinas ocorreu em meados de 1888, quando Petter

Hermann Stillmark estudava fatores de toxicidade em extratos de mamona (Ricinus

communis) em sua tese de doutorado, apresentada à Universidade de Dorpart

(BARONDES, 1988). Ele observou que esses extratos continham uma substância

com capacidade de aglutinar eritrócitos.

À essa substância Stillmark deu o nome de “ricina” (PEUMANS; VAN

DAMME, 1998). Hoje sabe-se que o que ele chamou de ricina era, na verdade, uma

mistura de substâncias tóxicas e lectinas não tóxicas (BOLETI, 2003).

Em 1919, James B. Summer, da Universidade de Cornel, isolou uma lectina

de sementes de Canavalia ensiformes e a chamou de concavalina A (conA). Em

1936, Summer e Howell relataram que conA aglutinava células, como hemácias e

precipitava glicogênio. Mostraram que a aglutininação por conA foi inibida por

sacarose, demonstrando especificidade por açúcar (SHARON; LIS, 2004).

Na década de 1940, William C. Boyd, da Universidade de Boston e Karl O.

Renkanen, da Universidade de Helsinki, Finlândia, descobriram a especificidade de

hemaglutininas por determinados grupos sanguíneos (SHARON; LIS, 2004). Por

possuírem capacidade de se ligar reversivelmente a carboidratos, essas proteínas

foram chamadas “lectinas”, do latim lego (escolher, selecionar) (BOYD;

SHAPLEIGH, 1954). O termo “aglutinina” foi sugerido por Peumans e Van Damme

em 1995, devido à habilidade dessas macromoléculas de aglutinarem eritrócitos e

outras células.

Lectinas podem ser definidas como (glico) proteínas com capacidade de

ligarem-se de forma reversível e específica a mono ou oligossacarídeos sem alterar

a estrutura do sítio de ligação (PEUMANS; VAN DAMME, 1995).

As lectinas podem ser encontradas em diversos organismos, como o corpo

humano, animais, plantas e até microorganismos, estando envolvidas em diversos

processos celulares que envolvem reconhecimento de carboidratos, como

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interações hospedeiro-patógenos, direcionamento de proteínas dentro das células e

interação célula-célula (ELGAVISH; SHAANAN, 1997).

Com relação aos vegetais, a maior quantidade de lectinas estudadas se

encontra na família das leguminosas, relacionando entre si tanto a caracterização

química, físico-química e biológica, como do ponto de vista estrutural (SHARON;

LIS, 2004).

A espécie Zea mays (Figura 1) é um cereal muito utilizado em nossa região

como fonte de alimento humano ou ração animal, conhecido popularmente como

Milho, este pertence à família Poaceae, originária da América Central.

Quimicamente ele possui diversas substâncias ativas, dentre elas estão os

flavonoides, saponinas, taninos, alcaloides, carboidratos, vitaminas, proteínas,

cálcio, potássio, magnésio, sódio, etc (ARORA et al., 2015).

Neste contexto, o presente trabalho tem como objetivo discutir a presença de

uma possível lectina em extratos dos estigmas de Zea mays através de testes

iniciais.

Figura 1: POACEAE Zea mays L.

Fonte: Disponível em:

http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/herbarioVirtual/ConsultaPublicoHVUC/ConsultaPublico

HVUC.do Acesso em 08/04/2017.

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MATERIAIS E MÉTODOS

Os estigmas de milho foram coletados de uma plantação orgânica na cidade

de Umari - CE, Brasil, entre as coordenadas (latitude: -3.26667, longitude: -

40.11673° 16′ 0″ Sul, 40° 7′ 0″ Oeste). A coleta dos estigmas ocorreu no mês de

junho de 2016. O material foi coletado manualmente, sendo possível removê-lo do

vegetal sem causar danos. Em seguida o mesmo foi embalado e transportado até o

Laboratório de Bioquímica, Genética e Radiobiologia (BioGeR) da Universidade

Federal da Paraíba (UFPB), em João Pessoa, PB.

Para a obtenção dos extratos, os estigmas foram secos em estufa à

temperatura de 37ºC por 5 dias consecutivos, em seguida triturados em moinho

elétrico em temperatura ambiente para a obtenção da farinha fina necessária para a

realização da extração protéica. Foram obtidos 19g de farinha do total de estigmas

utilizados. Para a preparação do extrato salino, foi utilizada a proporção 1:10

(farinha/NaCl 0,15M). A amostra foi submetida à agitação magnética constante por 3

horas para a obtenção do extrato bruto, o qual passou pelo processo de

centrifugação a 5000 rpm por 30 minutos a 4ºC. O precipitado foi descartado e o

sobrenadante, denominado de extrato bruto, foi filtrado em papel filtro e armazenado

em temperatura de -20ºC para análises posteriores. Em seguida a amostra foi

submetida a uma coluna de afinidade de Sephadex® G-50, com gel a base de

Glicose e Manose, equilibrada com solução de NaCl 0,15M, deixando-se em refluxo

durante 16 horas.

Para realização dos testes de atividade hemaglutinante (AH) foram utilizadas

suspensões de hemácias de coelhos do tipo albino obtidas no Departamento de

Biologia Molecular da UFPB. Foram feitos testes de AH com suspensões de

hemácias de coelho nativas, sem tratamento com enzimas proteolíticas, seguindo a

metodologia descrita por (CORREIA; COELHO, 1995). O material coletado foi lavado

cinco vezes utilizando-se solução de NaCl 0,15M. Em cada lavagem, utilizou-se

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centrífuga a 2.600 r.p.m. por 5 minutos. Em seguida, o sobrenadante (plasma) foi

retirado e descartado.

Foram feitos teste de inibição utilizando-se soluções dos açúcares Glicose,

Manose, Sacarose e Frutose, todas a 0,5M. O teste de inibição da AH foi

determinado de acordo com a metodologia descrita por (MOREIRA; PERRONE,

1977). Foram adicionados 100µL das soluções de carboidratos simples e dessas

soluções foram feitas diluições seriadas em NaCl 0,15M, em seguida foram

adicionados 100µL da amostra. Os tubos foram levados à estufa de 37°C por 30

minutos.

Após esse período, adicionou-se 200µL da suspensão de hemácias de coelho

a 2%. A mistura foi deixada em estufa a 37°C por mais 30 minutos e, em seguida,

foram feitas leituras macroscópicas dos resultados.

O pico I ou pico não-retido foi retirado da coluna de Sephadex® G-50

utilizando-se o mesmo tampão de equilíbrio. Após a completa retirada do pico I,

realizou-se a retirada do pico retido ou pico II através de mudança brusca de pH com

tampão glicina 0,9M pH 9,0 contendo NaCl 0,15M. Foram coletadas alíquotas de 3

mL por tubo e feita a leitura da absorbância (ʎ =280 nm).

A eletroforese foi feita seguindo a metodologia descrita por (LAEMMILI, 1970),

adaptada para o uso de géis de separação em placas de vidro. As placas utilizadas

mediam 10,5 x 10 cm com espaçadores de 1,0 mm, e após o preparo foram

transferidas para cuba vertical.

O gel de concentração foi feito contendo 3,5 % de poliacrilamida e foi

montado em tampão tris-HCl 0,5M pH 6,8 e SDS a 10%. O gel de separação

contínuo foi montado com um percentual de 12,5% de poliacrilamida em tampão tris-

HCl 3M pH 8,8, contendo SDS a 10%.

A eletroforese foi realizada com o extrato bruto e o extrato diluído para

comparação dos padrões apresentados pelas duas amostras.

As amostras foram aplicadas junto com tampão tris-HCl 0,0625M pH 8,3,

contendo SDS a 2%, glicerol a 10% e β-mercaptoetanol a 5%. Nos poços do gel

foram aplicadas 20 µL das amostras e 20 µL do tampão Tris-HCl. A corrida foi feita

num período de 2 horas a uma corrente constante de 20 mA. Ao término da corrida,

o gel foi retirado da placa, fixado em ácido tricloroacético (TCA) a 10% por 10

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minutos. Em seguida, o gel permaneceu em contato com o corante Coomassie

Brilliant Blue R-250 0,05%, diluído numa mistura contendo metanol, ácido acético

glacial e água (1:3,5:8, v/v/v) por 12 horas aproximadamente, retirando-se o excesso

com a mesma solução na ausência do corante.

Para melhor visualização das bandas do gel de eletroforese, foi utilizada a

revelação com prata. Inicialmente desidratou-se o gel três vezes com uma solução

de álcool etílico numa concentração de 50% de álcool para 50 % de água. Cada

lavagem teve duração de 20 minutos. O gel foi colocado, sob agitação constante, em

contato com uma solução de tiossulfato de sódio (numa concentração de 0,2mg/ml

de H2O). Em seguida, foi feita lavagem rápida do gel três vezes consecutivas com

água destilada. O gel foi colocado em uma solução de nitrato de prata (AgNO3),

contendo 2 mg de AgNO3+ 0,74 µl de formaldeído para cada ml de água destilada. O

gel ficou em contato com essa solução durante 20 minutos.

Foi feita novamente a lavagem do gel com água destilada por três vezes

seguidas e adicionou-se a solução reveladora, composta por carbonato de cálcio

(0,06g/ml) e formaldeído (0,05 µl/ml) + tiossulfato de sódio (0,2mg/ml). Para cessar a

revelação foi usado ácido acético absoluto por cerca de 2 minutos. Em seguida, o

ácido foi retirado e substituído por água destilada.

A determinação da concentração de proteínas solúveis no extrato foi realizada

através do método proposto por Bradford em 1976, que consiste na interação do

corante Comassie Brilliant Blue G-250 com a determinada proteína. Após uma breve

incubação, foi realizada a leitura do produto aniônico sob absorbância de (ʎ =595

nm).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A cromatografia realizada em coluna de Sephadex-G50 apresentou o pico II

(1.300 0,306) como retido, mostrando que o extrato apresenta afinidade pela matriz

da coluna, composta por Glicose e Manose, o que é confirmado pela leitura da

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absorbância em comprimento de onda (ʎ =280 nm) no espectrofotômetro para

detecção de aminoácidos aromáticos.

O estudo desenvolvido por (GRANGEIRO et al., 1997) nos apresenta uma

clássica lectina, isolada de sementes de Canavalia brasiliensis, denominada de

ConBr. Assim como a possível lectina presente no extrato bruto do estigama de Zea

mays, esta também possui afinidade pelos carboidratos Glicose e Manose, o que

possivelmente nos dará indícios de quais funções biológicas essa lectina dos

estigamas de milho, se essa se fizer presente, possa apresentar.

As amostras obtidas de Zea mays apresentaram atividade hemaglutinante

(AH) quando diluídas em solução tampão glicina 0,1M com NaCl 0,15M, pH 2,6 e

glicina 0,1M com NaCl 0,15M com pH 9,0 (Figura 2). Todas as diferentes soluções

testadas apresentaram hemólise com diferentes intensidades conforme prosseguia

com as diluições.

As lectinas são estudadas devido à sua particularidade de ligação aos

carboidratos. Sendo assim, um dos métodos para comprovar sua existência em uma

determinada amostra é realizando o teste de inibição por açúcar em um extrato que

apresentou AH. Se a AH for inibida na presença do açúcar significa que a lectina

teve afinidade pelo carboidrato testado e desligou-se daquele presente na

membrana da hemácia. Complementando o teste, também pode ser observado por

qual açúcar a lectina tem mais afinidade, o que facilita em uma possível purificação

da mesma. No teste de inibição por açúcar, a hemaglutinação não foi inibida

significativamente na presença de Frutose 0,5M e Sacarose 0,5M, mas foi inibida

com Glicose 0,5M e Manose 0,5M.

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Figura 2: Teste de atividade hemaglutinante. É possível perceber a formação de

coágulos nos tubos de ensaio, causados devido à presença do extrato de Zea mays.

Fonte: CARLOS, 2017.

Tabela 1: Teste de inibição por açúcares.

Resultado do Teste de Inibição por açúcares

Açúcares Estigmas + NaCl 0,15M

D- Glicose 0,5M Inibiu D- Manose 0,5M Inibiu D- Frutose 0,5M Inibição Fraca D- Sacarose 0,5M Inibição Fraca

Fonte: CARLOS, 2017.

A eletroforese em gel de poliacrilamida (Figura 3) em presença de SDS e 2-

mercaptoetanol (PAGE-SDS) das amostras de Zea mays não apresentou nenhuma

banda proteica ao ser corada com Comassie Brilant Blue, conforme protocolo

rotineiro, o que tornou necessário utilizar coloração em Nitrato de Prata, onde foram

reveladas várias bandas de proteínas, mostrando que o extrato de Zea mays

apresenta moléculas com diversos pesos moleculares, dentre elas uma possível

lectina, já que obteve êxito nos testes de AH e inibição por alguns açúcares.

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Figura 3: Eletroforese em gel de Poliacrilamida corada com Nitrato de Prata. É

possível observar o extrato bruto e o extrato diluído, da esquerda para a direita,

respectivamente. As bandas mais escuras marcam presença de proteínas com

diferentes pesos moleculares. Fonte: CARLOS, 2017.

Através do ensaio de Bradford foi possível calcular qual é a concentração de

proteínas solúveis no extrato obtido a partir de Zea mays e NaCl 0,15M, como sendo

0,66 mg/ml. A figura 4 mostra claramente a presença de diversas proteínas através

de uma reação colorimétrica vista macroscopicamente.

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Figura 4: Reação colorimétrica do método de Bradford, onde a cor azulada mostra a

presença de proteínas solúveis dos estigmas de Zea mays (tubo da esquerda), diferente do

controle (à direita). Fonte: CARLOS, 2017.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados encontrados na pesquisa, é possível afirmar que a

atividade hemaglutinante apresentada pelo extrato de estigmas de Zea mays com

NaCl 0,15M pode ser devida à presença de uma lectina na planta, pois de acordo

com a literatura e características individuais dessa proteína, os testes aqui

realizados deram positivos para sua possível presença, uma vez que a

hemaglutinação foi revertida na presença de açúcares. Os dados obtidos são

insuficientes para constatar com certeza que se trata de uma nova lectina, fazendo-

se necessários novos estudos e experimentos mais específicos para uma melhor

confirmação. Tratando-se de uma lectina, o foco principal será o isolamento,

caracterização e suas respectivas atividades biológicas em diferentes organismos.

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170 Revista Interdisciplinar em Saúde, Cajazeiras, 4 (1): 159-170, abr./jun. 2017, ISSN: 2358-7490.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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