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Athylla Borborema

Infância Violentada

Primeira edição – 2015

São Paulo

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Copyright©2015 Athylla Borborema Cardoso

Capa: Deejay Designer Revisão: A. Zarfeg

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ________________________________________________

C268 CARDOSO, Athylla Borborema, 1970– Infância Violentada / Athylla Borborema

Cardoso. São Paulo: PerSe, 2015 175p.

ISBN 9978-85-464-0008-9

1. Jornalismo brasileiro. I. Título

CDD: 070.8161

________________________________________________ Catalogação na publicação

PS AUTOPUBLICAÇÃO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS LTDA

– Rua Turiassu, 390 – Conj. 86 - Perdizes - São Paulo –

CEP: 05005-000 – CNPJ: 11.053.820/0001-68 Contato: [email protected]

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PREFÁCIO

Neste livro-reportagem essencial, Athylla Borborema

– um dos jornalistas do Brasil mais premiados de sua

geração – resgata do esquecimento um dos capítulos mais

trágicos da nossa história recente: a barbárie e a

desumanidade praticadas contra crianças e adolescentes que

perderam a vida na inocência da infância para o instinto

predador de psicopatas cruéis. Ele traz relatos dos últimos

25 anos de pessoas que vivem numa escuridão que dura

para sempre e sofrem a violência do abuso sexual durante a

vida inteira. A literatura é uma arte à qual se atribuem

diversas funções, dentre elas denúncia e crítica social.

Conhecer relatos de iniquidade, desrespeito e dor não é

agradável. Toda forma de violência é criminosa e, portanto,

deve ser denunciada e combatida.

Athylla Borborema é um repórter que luta contra o

esquecimento. Persistente em transformar em história o que

era silêncio absoluto, é um construtor de memórias. Tem no

currículo mais de 60 prêmios regionais, nacionais e

internacionais, entre eles 22 prêmios Imprensa Regional

Bahia, Sebrae de Jornalismo, Expresso Nacional Judiciário de

Jornalismo, Banco do Brasil de Jornalismo, Prêmio Vladimir

Herzog de Jornalismo, Global Investigative Journalism

Network, Pacto Global da ONU e três prêmios Visão

Mundial de Jornalismo.

Mesmo atuando distante dos grandes centros,

conseguiu reconhecimento para o seu trabalho de repórter

investigativo. E o respeito conquistado em razão da

honestidade e da credibilidade deixa-o à vontade para

circular nas variadas versões dos acontecimentos, o que traz

como resultado ser sempre ele o autor da melhor história,

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tanto que escolheu uma carreira profissional na qual poderá

envelhecer e continuar trabalhando. E devo assinalar que

jornalista é igual vinho – quanto mais velho, melhor.

Aprendeu a contar histórias complexas por meio de um

discurso simples e de fácil entendimento, tanto nas massas

populares como na patente intelectual.

Como se verá neste livro, Athylla Borborema entrega

ao público o resultado de duas décadas e meia de esforço

jornalístico e dedicação pessoal em um encontro de

ensinamentos e relatos impressionantes.

Por outro lado, orgulho-me que esta obra tenha

nascido dos longos anos de experiência no jornalismo

policial que o autor adquiriu com sabedoria e extraordinária

competência. Hoje, tenho a certeza de que se trata de

profissional com profundo conhecimento da matéria,

especialmente após ter efetuado a leitura desta notável obra.

Avalio o presente fruto literário como um marco que brilha e

brilhará, como um farol, orientando e dirigindo os pais sobre

o destino dos seus filhos. É o maior do conhecimento que o

jornalismo criminal pode oportunizar às famílias brasileiras.

Jornalistas como Athylla Borborema – que escolhem ter lado,

não importa onde estejam – acabam tendo comportamentos

muito parecidos: sofrem as mesmas pressões, lutam pelos

mesmos princípios, são éticos, verdadeiros e ajudam a

promover justiça.

Concluímos nossas breves palavras recomendando

este extraordinário trabalho, cuja leitura e aprendizado serão

de grande valia àqueles que buscam uma base sólida na

história do jornalístico policial e, sobretudo, em um assunto

que machuca, instiga, faz refletir, mais é real. Uma história

que muitas vezes coloca o criminoso, o político e a Lei do

mesmo lado da cerca.

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Nesta obra, Athylla Borborema não pretende

questionar a ordem jurídica vigente no Brasil, nem os

métodos e resultados do trabalho policial e social, mas a

verdade é sempre uma faca afiada. “Infância Violentada” dá

voz a um grito que, no Brasil, só se faz calar. Unem-se a

tantos outros títulos que diligenciam episódios trágicos de

nossa história, produtos de um estado de confusão e

violência, cujos ruídos se abafam em meio ao volume de

nossas ocupações cotidianas. Trata-se, portanto, de uma

obra de relevante valor forense que certamente terá a

merecida atenção do leitor.

______________________

Rubens Floriano Santos

Radialista, jornalista especialista em comunicação social e

ciências humanas, vice-presidente da Fundação Mamãe

África de Caravelas e coautor do livro “Francistônio Pinto –

O Perfil de um Matuto”.

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AGRADECIMENTOS

Quero homenagear as lideranças da sociedade civil

baiana, que nunca se deixaram acuar pelo terrorismo do crime organizado, compartilharam seu conhecimento e o patrimônio valioso de sua experiência, e jamais fugiram à luta pelos direitos humanos e pela democracia. E sempre conseguiram uma maneira de ajudar a empurrar o processo civilizado na direção democrática saudável e salvar nossas heroínas do esquecimento.

Tenho que agradecer muito por meus pais, Maria Borborema da Silva e João Neves Cardoso (em memória), pois me deram referências de integridade, amor e família, sem as quais não seria o que sou hoje.

Depois agradecer, na condição de filho único, pelas centenas de primos carnais e outras centenas de primos de segundo grau, duas dezenas de tios que Deus me deu, cada um com sua particularidade, pois é com eles que sempre dividi meus espaços e pude crescer. É neles que sei poder confiar eternamente. Ou seja, agradeço a minha família pela paciência e pelo apoio inestimáveis, aos meus leitores e amigos, pelo incentivo e pela crença no meu trabalho.

Este livro é dedicado a milhares de mulheres, crianças e adolescentes brasileiros que perderam a vida ou a liberdade na inocência da vida e do amor.

Finalmente, agradeço a Deus por não me fazer sonhar muito alto. Assim, todas as conquistas pequenas ficam enormes. Hoje acho que tenho muito mais do que sempre sonhei. Enfim, a Deus, porque sem Ele nada posso. __________________ Athylla Borborema

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SUMÁRIO

Prefácio, 07

Agradecimentos, 10

Não gosto de tirar a roupa na frente deles, me dá um nó

na garganta, 13

Jovens brincam de ser adultos, 21

O perfil dos estupradores, 29

Quando é bom ser muito perigoso?, 37

Agiotagem de menores, 51

O circuito turístico do sexo de aluguel, 61

Meninas obrigadas ao sexo com traficantes em troca das

dívidas dos pais, 79

Tomei nojo de homem, 85

Infância Interrompida, 93

Eu queria gritar, mas o grito não saía!, 103

Drogas e rede de prostituição: meninas iniciam vida

sexual aos 12 anos, 109

Não sei quem é o pai, 115

O perigo está dentro de casa, 129

O instinto predador de violentar e matar crianças, 149

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Em obediência ao que determina o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990)– todos os nomes das vítimas são fictícios e a maioria dos autores também; as referências familiares e os endereços das pessoas vitimadas foram omitidos. Já os fatos, os nomes das vítimas atingidas mortalmente e dos autores condenados, relatos, locais das ocorrências, datas e nomes das autoridades são 100% verdadeiros.

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NÃO GOSTO DE TIRAR A ROUPA NA FRENTE DELES, ME DÁ UM NÓ NA GARGANTA

Prostituição infantojuvenil, violência em casa, doença, drogas, a molecada perto do perigo, a corrupção policial e as ligações comerciais com os grandes cartéis do tráfego internacional de drogas numa rede de exploração sexual de meninas brasileiras, onde a impunidade protege o uso de corpos de crianças na busca de lucros aéticos e imorais. Tudo isso num livro que você não vai conseguir parar de ler, mostrando o perfil dos abusos e maus-tratos a crianças e adolescentes que vem causando danos irreversíveis à formação do caráter.

É a mais completa devassa no submundo da prostituição infantojuvenil, onde o poder se exerce pela força dos milhões de dólares trazidos ao Brasil pelos estrangeiros em busca de circuito turístico do sexo infantil. Este livro-reportagem é também a mais importante análise histórica e sociológica da violência infantojuvenil nas pequenas e grandes cidades brasileiras.

A infância violentada não é um caso de polícia. É um câncer político. Mas não um tumor que se extirpe. A omissão, incompetência e interesse dos políticos que governam e governaram o Brasil, deixaram o tumor virar metástase, enraizado em todo o tecido social.

Durante seis anos na década de noventa recolhi depoimentos, opiniões, informações oficiais e estudei 160 processos de cinco Estados brasileiros – São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e Rio Grande do Norte – sobre o perfil da prostituição infantojuvenil no Brasil. Houve momentos em que foi necessário descer ao submundo para ouvir uma história original. Foi preciso andar pelas favelas e ruas escuras, olhar e conviver de perto com o comportamento de crianças nos prostíbulos.

Comissões e entidades vêm pregando a necessidade de o Brasil não abrandar a fiscalização sobre as denúncias de exploração de menores e adolescentes. Isso é a realidade da

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omissão e convivência da sociedade, que muitas vezes trata o problema como assunto privado, como obstáculos ao combate eficaz a esse tipo de violência.

Os maus-tratos, o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes constituem um fenômeno complexo, causadas por fatores socioeconômicos, históricos, culturais e éticos, que envolvem as relações de indivíduos com a sociedade. Crianças e adolescentes vitimizadas sofrem um grave processo de violência e humilhação, que pode causar danos morais, sociais e emocionais comprometedores do seu desenvolvimento, muitas vezes provocando sequelas irreversíveis. A intervenção nesse fenômeno enfrenta dificuldades em todo o mundo, enquanto a falta de uma legislação severa para punir os agressores, além de dificultar o combate a essa violência, termina até fazendo com que vítimas e testemunhas se sintam ameaçadas e culpadas.

O desafio de enfrentar tal problema implica a coragem de assumir ações de natureza legal, econômica, social, política e ética, capazes de dar visibilidade ao fenômeno.

Maconha, cocaína, crack, ácido... Se você é adolescente e vive em qualquer cidade razoavelmente grande, é praticamente impossível que você não tenha tido pelo menos um papinho animado sobre alguns dessas drogas. Drogas... O nome lhe diz alguma coisa? Mas diz o quê, afinal? Quer dizer, de um lado, você vê um monte de filmes com traficantes bem-sucedidos, com seus carrões e mulherões. De outro, você é bombardeado com uma propaganda maciça que diz que a droga mata. Será que todo “junkie” fica bonitão feito Matt Dillon? Será que você vai cair duro e morto na hora que experimentar um baseado?

Essas pessoas podem parecer meios bobocas, mas é natural que elas passem pela cabeça de uma geração procedida por “viajantes” de LSD e cocainômanos bem vestidos. Foi justamente pensando nisso que o engenheiro civil Carlos Herculano decidiu batalhar para conseguir incluir uma matéria sobre substâncias entorpecentes nos

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currículos das escolas baianas, como acontece, por exemplo, em São Paulo. Quem primeiro topou a ideia foi o Colégio Antônio Pedreira, que oferece aulas quinzenais com Herculano, que dá dicas e tira dúvidas dos estudantes do colegial.

A receptividade da galera nessa primeira tentativa na escola tem sido bem legal. “Adoro esse tipo de aula em que a gente conversa”, diz Rebeca, 15 anos; “principalmente porque se conversa coisas que não dá pra conversar em casa”, completa Sandra Vivas, 16.

Esse lance de conversar em casa, aliás, pode definir um monte de coisas. Primeiro, porque o nível de desinformação é muito grande. Uma das meninas, por exemplo, achava que “qualquer droga deve ter o mesmo efeito quando se fuma a primeira vez”. Mas Herculano está lá para explicar que nem toda droga é de fumar e que os efeitos podem variar muito, uma informação que nem todos os pais têm. Bem que ajudaria se as famílias explicassem, por exemplo, que, apesar de legal, o álcool é tão droga quanto a maconha ou a cocaína.

As nossas estatísticas mostram que 70% de todos os internamentos de viciados são causados pelo alcoolismo. A maior parte dos adolescentes e (adultos também) pensa que um gorozinho, de vez em quando, não faz mal a ninguém. Que nem o Vitor, 16, que usa um clichê tão batido que já virou piada: “só bebe pra ficar alegre, nunca pra cair”.

Falando assim parece que todo mundo está mesmo condenado a uma vida de eterna caretice. “Só que é justamente esse sentido tedioso da expressão ficar careta” que Herculano quer evitar em suas aulas quinzenais. Como é que ele faz essa mágica? Contextualizando o problema da droga, que, afinal, faz parte da vida.

Assim, ele fala de morte, religião, comunicação, violência, medo, profissão ou qualquer outra coisa que esteja interessando seu “público”. O negócio, segundo ele, é dar ao adolescente o máximo de informação sobre tudo, para que ele próprio possa fazer escolhas mais adequadas. “A