assentamentos humanos v.5 nº1

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ASSENTAMENTOS HUMANOS ISSN 1517-7432 Vol.5 Nº 1 Out.2003 Revista da Faculdade de Engenharia, Arquitetura e Técnologia Universidade de Marília Marília SP Assentamentos Humanos Marília v5 nº1 Pg. 1- 2003

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Page 1: Assentamentos Humanos V.5 nº1

ASSENTAMENTOSHUMANOS

ISSN 1517-7432Vol.5 Nº 1 Out.2003

Revista da Faculdade de Engenharia, Arquitetura e TécnologiaUniversidade de Marília

Marília SP

Assentamentos Humanos Marília v5 nº1 Pg. 1- 2003

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Ficha Catalográfica preparada pelaBiblioteca Central da Universiade de

Marília - UNIMAR

Assentamentos Humanos: revista da Faculdade de Engenharia,Arquitetura e Tecnologia da Universidade de Marília. v.5, nº1(Out. 2003) - ...Marília: FEAT/UNIMAR, 2002- V.5:il.;27cm.

Semestral

ISSN 1517-7432

1. Arquitetura e Urbanismo - Periódicos. 2.Assentamentos Humanos.I.Faculdade de Engenharia, Arquitetura e Tecnologia daUniversidade de Marília.II. Universiade de Marília.

Distribuição:Sub-Comissão de Pós-Graduação

Planejamento e Projeto dos Assentamentos HumanosFEAT - UNIMAR

Av. Higyno Muzzy Filho, 1001. Fone: (014) 421-4044www.unimar.br

Os artigos são de responsabilidade de seus autores.Aceita-se permuta.

O projeto gráfico é fundamentado num modelo da autoria da DesignerCassia Leticia Carrara Domiciano.

A capa, a identidade visual e a editoração foram realizadas pelo diagramador Edson Camargo e o Designer Anthony R.J. Nicholl.

CDD 720

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UNIVERSIDADE DE MARÍLIA

Reitor

Dr. Márcio Mesquita Serva

Vice-Reitora

Profª. Regina Lúcia Ottaiano Losasso Serva

Pró-Reitor de Pós-Graduação

Prof. Dr. Sosígenes Victor Benfatti

Diretora Administrativa

Bel. Sinara Mesquita Serva

Pró-reitor de Graduação

Prof. José Roberto Marques de Castro

Pró-Reitora de Ação Comunitária

Profª. Maria Betriz de Barros Morães Trazzi

FACULDADE DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E TECNOLOGIA

Diretor

Prof. Ms. Odair Laurindo Filho

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Correspondência e artigos para publicação deverão ser encaminhados a:Correspondence and articles for publication shoud be adress to:

Assentamentos Humanos

Sub-Comissão de Pós-GraduaçãoFaculdade de Engenharia, Arquitetura e Tecnologia - Unimar

CEP 17500-000 - Marília - SP -Brasil

E-mail: [email protected]

Comissão Editorial

Irajá Gouvêa

Jorge Benaque Ruppert

Lúcio Grinover

Maria Alzira Loureano

Paulo Kawauchi

Renato Leão Rego

Conselho Consultivo

Akemi Ino (EESC-USP)

Alexandre Kawano (POLI-USP)

Bruno Soerensen Cardoso (IPETEC-UNIMAR)

Doris C.C.K. Kowaltowski (FEC-UNICAMP)

Élide Monzéglio (FAU-USP)

Jair Wagner de Souza Manfrinato (FEBa-UNESP)

José Carlos Plácido da Silva (FAAC-UNESP)

Mario Duarte Costa (UFPe-Recife)

Natálio Felipe Koffler (FAAC-UNESP)

Otávio Yassua Shimba (UEL-Londrina)

Rosalvo T. Ruffino (EESC-USP)

Sérgio Murilo Ulbricht (UFSC-Florianópolis)

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APRESENTAÇÃO

A diversidade temática tem sido o paradigma desta revista, já em sua5ª edição. Pode-se perceber no seu conteúdo o anseio acadêmico pelaprodução de conhecimentos aqui apresentados pelos professores –pesquisadores da FEAT –UNIMAR e colaboradores convidados de outroscentros universitários.

Nesta edição, abrimos novo espaço para publicação de obrasarquitetônicas e de design de interesse essencialmente acadêmico.Assim, nesta oportunidade, inserimos o projeto de uma clínica altamenteespecializada C.C.C. ( Centro do Célebro e Coluna), sediada na cidadede São José do Rio Preto, cuja coordenação executiva do projeto foi doarquiteto Ésio Glacy de Oliveira. Essa obra apresenta uma contribuiçãoimpar à produção arquitetônica pelas características espacias, visuais,estéticas e funcionais que chamam a atenção do público em geralAinda nesta edição, publicamos pesquisas realizadas na FAAC –UNESP,que tratam da ergonomia aplicada nos setores de embalagens emobiliários sob orientação acadêmica dos designers: José Carlos Plácidoe Luís Carlos Paschoarelli.

No campo da informática, três temas de pesquisas são abordadoscom muita pertinência à atualidade: “onde os paradigmas tornam-seobsoletos e já não são mais capazes de atender as novas exigênciasculturais das sociedades” e “o impacto das novas tecnologias informacionaisno contexto da arquitetura” abrem novos caminhos à representação datécnica gráfica. (Autores: Arq. Sérgio F. M. Alves e Samir H.T. Gomes).Registramos com destaques a contribuição com matérias para esta edição,não menos importantes dos autores: Arquitetos Irajá Gouvêa, WalnyceScalise, Cléia Rubia de Andrade Castro e do Biólogo Antônio F. N. Junior.Tenham todos uma boa leitura.

Odair Laurindo Filho e Paulo Kawauchi

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SUMÁRIO

Esio Glacy de Oliveira

A arquitetura e suas explicação.

Sérgio F. Miquelette Alves

Direito de acesso à informçãopública: Legislação urbana nainternet.

Cristiane A. Almeida Zerbetto

Análize ergonômica do manuseiodas embalagens alimentícias detomate.

Cléia R. de Andrade Castro

A estrutura morfológica da cidadee suas transformações.

Francisco Crivelaro

O uso de mobilário doméstico noespaço habitacional: Parâmetros deusabilidade para o projeto de sofas.

Samir Hernandes Tenório Gomes

O impacto das novas tecnologiasinformacionais no contexto daarquitetura e representação gráfica.

Samir Hernandes Tenório Gomes

A atuaçnao das bibliotecas e doscentros de informação no contex-to das demandas telemáticas einformacionais.

Walnyce Scalise

Projeto urbano, espaço público ecidadania.

Irajá Gouvêa

Elementos para um ordenamentoterritorial.

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A ARQUITETURA E SUA EXPLICAÇÃO

1 Arquitetos da ACH (Arquitetura de Clínicas e Hospitais S/C Ltda)

Esio Glacy, Ivany Bellini, Gisela Toledo,Paulo Jordão 1

Glacy,E.; Bellini,I.; Toledo,G.; Jordão,P. AArquitetura e sua explicação. RevistaAssentamentos Humanos, Marília, v5, n.1, p11-15, 2003

No diálogo com o cliente, na análise

do entorno e no conhecimento das técnicas é

que se encontram os caminhos da

arquitetura e o potencial da criatividade. O

arquiteto consciente não vislumbra, de

antemão, a forma ou a fachada de seu

edifício. Os arroubos de imaginação, as

idéias geniais, as soluções prontas, são mais

artifícios para impressionar do que soluções

competentes e corretas.

As propostas apressadas que nascem

de um “estalo”, são sempre repetições de

coisas que estão na moda ou de soluções já

vistas. A arquitetura não deve entrar na

moda, pois esta é efêmera e passageira e a

arquitetura perdura por longos anos, quase

sempre mais que o próprio arquiteto que a

concebeu. Arquitetura com estilo ou é cópia

do passado, pois os críticos ainda não

identificaram e nem poderiam identificar o

“estilo” contemporâneo, ou representam

soluções regionais (de outros lugares ou

países), ambas inadequadas para nós.

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A verdadeira arquitetura é aquela

que nasce da análise criteriosa das

necessidades do cliente/usuário (porém na

perspectiva de sua transitoriedade), da

análise das condições do local e da correta

aplicação das técnicas construtivas visando

a estabilidade da construção, o conforto do

usuário, a conservação da energia, a

sustentabilidade do meio ambiente, etc. Na

consideração de todos estes fatores é

impossível acontecer soluções prontas e o

resultado final torna-se uma surpresa não

somente para o cliente mas também para o

próprio arquiteto.

O edifício da clínica do C.C.C. –

Centro do Cérebro e Coluna, localizado na

avenida José Munia, é resultado desse

processo de projeto. Não se partiu de

nenhuma idéia pré-concebida. A solução

final foi objeto de intenso diálogo com o

cliente e somente após a elaboração e

apresentação de nada menos que 14

(quatorze) estudos preliminares é que se

obteve seu aval para levar a cabo o

desenvolvimento do projeto.

A solução marcante da arquitetura

do C.C.C. qual seja a grande placa da

fachada, curva e solta no ar, constitui-se na

simples e necessária proteção solar e visual

dos ambientes internos. O grande jardim

interno justifica-se pela necessidade

primeira de iluminar a ventilar os

ambientes. As cascatas produzidas pelas

águas das chuvas no jardim interno foram

criadas em conseqüência da simplificação

das calhas da cobertura (que se

concentram em torno do jardim central) e

da eliminação dos condutores verticais das

águas pluviais.

A grande marquise de alumínio foi

projetada pela absoluta necessidade de

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proteger os pacientes do sol e da chuva

no acesso à clinica. A eliminação de todo

e qualquer degrau nos acessos visou sua

adequação universal ao deficiente. O

piso “ecológico” recoberto de grama foi

uma resposta às exigências dos órgãos

públicos para manter a permeabilidade

do solo naquela região da cidade visando

a diminuição das enchentes. O uso das

divisórias em gesso acartonado

assentadas diretamente sobre o piso de

granito natural atendeu à necessidade de

flexibilizar o uso dos espaços internos e

evitar a construção de vigas baldrames

para suportar paredes de alvenaria. O

fechamento em policarbonato, no jardim

Planta Baixa1. Recepção / 2. Espera /3. Café / 4. Jardim interno/5. Consultórios /6.Administração /7. Caixa d’àgua/escada/elevador/ 8.Estacionamento

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interno, buscou aproximar o verde,o espelho d’água e os chafarizes dospacientes da espera. O amploespaço da espera prevê suautilização eventual como auditórioou local para reuniões. A localizaçãodos consultórios possibilitou oacesso privativo dos médicosdiretamente do estacionamento semcruzar com os pacientes da espera.As curvas das fachadas e areentrância curva da luminária doteto da sala de espera (que étambém a junta de dilatação doforro de gesso) pretenderamquebrar a rigidez da volumetriaretilínea do edifício. A estruturamodular (1,00 m x 1,00 m) doedifício visou a padronização doscomponentes e a racionalização daconstrução.

Como se vê, na arquiteturanão deve haver soluções semjustificativa. Para cada solução háque existir uma explicação. Se oarquiteto não consegue explicar émelhor recomeçar.

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FICHA TÉCNICACLÍNICA MÉDICALocal São José do Rio Preto,SPData do projeto 1999Data da conclusão da obra 2001Àrea do terreno 6 145,52 m2Àrea construída 1 072,32 m2Arquitetura e interiores ACH - EsioGlacy, Ivany Bellini, Gisela Toledo e PauloJordão (autores); Marcos Dinardi, AndréCeron, Vlamir Simões, Regina Landiosi eLarayne Barbeiro (colaboradores)Paisagismo Adelaide MedinaProgramação visual Beta SoubhiaLuminotécnica VialightElétrica e hidráulica K&OFundações ZacarinEstrutura Rui Giorgi EngenhariaAr condicionado Inter-ArConstrução Dilson de Paula OliveiraFotos Paulo BertonFornecedores Arcomtemp (ar-condiciona-do); Projesp (marquise); Multitec MGD(drywall); Vidrotil (pastilhas); Granitex(piso de granito); Moviterra (terrapla-nagem); Iteo (impermeabilização);CenterBox, Vidraçaria Sotello (esquadrias e vidrostemperados); Metalsilva (cobertura);Lacerda Móveis, Florence, Moviflex, MarisaPrado (mobilário); Casa & Lar (per-sianas);Concretic (piso externo); Vialight(luminárias)

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Sérgio Fernando Miquelette Alves2

Alves,S.F.M. Direito de acesso à informaçãopública: Legislação urbana na internet.Revista Assentamentos Humanos, Marília,v5, n.1, p17-24, 2003

INTRODUÇÃO

Vivemos atualmente uma situaçãohistórica onde os paradigmas vigentes tor-nam-se obsoletos e já não são maiscapazes de atender as novas exigênciasculturais das sociedades .Segundo Guerra(2002), isto se mostra mais claramentequando observamos questões emergentescomo a genética, a ecologia e a informáti-ca. Na área da genética, manipulações epesquisas são acompanhadas porcalorosos debates éticos. Quando falamosem ecologia, observamos que a consciên-cia de que os recursos naturais e a própriahumanidade não são infinitos colocoudefinitivamente em pauta o pensamentovoltado para o equilíbrio entre o homem eseu meio-ambiente. Já a nova tecnologiainformática, associada às novas tecnolo-gias de comunicação, cada vez mais fazemparte do cotidiano, tornando muitas vezesdesnecessária a presença física na pro-dução e circulação de bens. A dissemi-nação da tecnologia da informação vemtransformando as relações e os modelossociais, econômicos e políticos . Redemundial de comunicação informatizada, aInternet, que se apresenta como novoparadigma de circulação e disseminaçãoda informação, marca junto com a multi-mídia interativa a mudança nos modos deacesso ao conhecimento.

DIREITO DE ACESSO À INFORMAÇÃO PÚBLICA:LEGISLAÇÃO URBANA NA INTERNET 1

1 Trabalho desenvolvido dentro da disciplina “Aspectos jurídicos da informação eletrônica”, ministrada pelo Dr.Juan Carlos Fernández Molina no curso de pós-graduação em Ciência da Informação da UNESP - UniversidadeEstadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências- Campus de Marília.

2 Arquiteto, professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Marília, mestrando do curso depós-graduação em Ciência da Informação, linha de pesquisa: Informação e Tecnologia da UNESP - UniversidadeEstadual Paulista, Faculdade de Filosofia e Ciências- Campus de Marília., sob orientação da Doutora Maria HelenaT. C. de Barros.

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Nos campos da Arquitetura e doUrbanismo, os avanços da informática,entre outros, vem transformando radical-mente as formas de representação.Observamos hoje simulações gráficas quecada vez mais podem ser assimiladaspelos sentidos de maneiras mais próxi-mas do real. Além das novas configu-rações do espaço, as novas tecnologias deinformação e comunicação estão possibi-litando acesso a uma quantidade imensade informações. Para Baltazar (2001, p.5) a “tecnologia digital chega para aarquitetura como um novo paradigma,além da representação, propiciandodiversas investigações e pesquisas tantono processo de projeto quanto na pro-dução do espaço.”

No contexto do nosso trabalho, aciência da informação aparece comocatalisadora dos estudos sobre fenô-menos informacionais, e as novas tec-nologias de informação e comunicaçãoaparecem como instrumento para reorga-nização do trabalho intelectual, permean-do as atividades e os processos dedecisão nas sociedades profissionais, nocaso, a dos arquitetos.

Enfocaremos aqui a questão dodireito de acesso à informação pública,especificamente a legislação urbana ànível municipal e sua disponibilização naInternet, considerando que :• Este tipo de informação é fatorestratégico na atuação desses profissio-nais.• A Internet seria um meio “democrático”de disseminação dessas informações.• Se evitariam os casos de ocultação emanipulação de informação.

A INFORMAÇÃO COMO INSUMO

Devemos aqui analisar rapidamenteas atividades e os processos de decisão nasociedade profissional dos arquitetos paraenquadrarmos o uso da informação, especi-

ficamente da legislação urbana à nívelmunicipal, no processo de elaboração deprojetos arquitetônicos.

Segundo Neves (1989), que em suaobra enfoca essencialmente projetos de edi-ficações, a elaboração de um projetoarquitetônico é composto por dois impor-tantes momentos criativos : o primeiro seriaa formulação da idéia básica preliminar doedifício, denominado de partido arquitetôni-co; o segundo seria o desenvolvimento dessaidéia até sua transformação em projeto.Ainda, segundo o autor, para se proceder àformulação do partido arquitetônico sãodefinidas duas etapas : 1.Coleta e análisedas Informações Básicas - trabalha-se aquicom as informações referentes às variáveisteóricas (conceito do tema, caracterização daclientela e das funções, programaarquitetônico, relações do programa, pré-dimensionamento)e as de natureza físico-ambiental (escolha do terreno, planta do ter-reno, forma e dimensões, conformação dorelevo, orientação quanto ao sol, orientaçãoquanto aos ventos, acessos, relações com oentorno, legislação pertinente). São obtidasde várias maneiras: entrevista e discussãocom o cliente, bibliografia disponível, dis-cussão com especialistas, visitas a organiza-ções similares, análise de projetos de edifí-cios com finalidades similares, entre outras ;2. Adoção do Partido Arquitetônico - aqui setranspõe para a linguagem própria do desen-ho a solução arquitetônica correspondente àformulação conceitual do projeto.

Segundo Lemos (1989), os principais condicio-nantes ou determinantes da fase de formulaçãoda idéia básica de um projeto arquitetônicoseriam : a técnica construtiva, o clima, ascondições físicas e topográficas do local daintervenção, o programa de necessidades, ascondições financeiras do empreendedor e a leg-islação regulamentadora.

Enquadram-se neste perfil, entreoutras, as legislações urbanas à nívelmunicipal denominadas Código de Obrase Edificações e a Lei de Zoneamento eUso do Solo.

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Toda e qualquer construção, reformae ampliação de edifícios efetuada a qualquertítulo no território do município, é reguladapelo Código de Obras e Edificações. É umalei municipal que tem como objetivos, entreoutros: 1.orientar os projetos e a execuçãode edificações no município, 2.assegurar aobservância de padrões mínimos de segu-rança, higiene, salubridade e conforto dasedificações, e 3.adotar e efetivar a execuçãode normas que garantam nas edificações ascondições de acesso, circulação e uso, porparte das pessoas portadoras de deficiência,dos idosos e gestantes.

Outro exemplo é a Lei deZoneamento e Uso do Solo. Zoneamento é adivisão do município em zonas distintas,segundo sua específica vocação e finalidade,objetivando o desenvolvimento harmônicoda comunidade, assegurando sua qualidadede vida. São considerados parâmetros paraa classificação e definição das zonas erespectivos usos: a densidade populacionaldas regiões, suas características e tendên-cias, afinidades, hierarquização das vias,elementos físicos predominantes, cadastra-mento dos equipamentos públicos e infra-estrutura urbana, entre outros.

Ao considerarmos informação comoinsumo de conhecimento, e este como basepara nossa visão de mundo, entendemosque o conjunto de conhecimentos que com-põe nosso acervo intelectual e espiritual,portanto nosso repertório cultural, adquireum caráter dinâmico a partir do momentoque cada informação que nos é comunicadapode modificar esta visão. Portanto, paraque nas atividades e nos processos dedecisão da sociedade profissional os arquite-tos possam fazer uso da informação comoinsumo de conhecimento, especificamenteda legislação urbana à nível municipal noprocesso de elaboração de projetosarquitetônicos, devemos considerar se estainformação esta sendo comunicada.

INFORMAÇÃO, CONHECIMENTO ECOMUNICAÇÃO

A história mostra que a informaçãosempre foi, desde as mais remotas épocas,e ainda é, fator estratégico como matériaprima das transformações sociais e cultur-ais. Uma palavra, uma música, um objetoou uma paisagem, tudo enfim, pode serportador de informação. Porém, para que ainformação possa ser utilizada sem limi-tações de espaço e tempo, alcançandomaior número de pessoas, considera-seque tenha sido registrada. Segundo Smit(1999, p.21) “o registro torna a informaçãomenos volátil e mais portátil”.

Podemos adotar a definição de LeCoadic (1996, p.5) que define informaçãocomo “um conhecimento inscrito (gravado)sob a forma escrita (impressa ou numérica),oral ou audiovisual” , onde conhecer seria acapacidade de formar a idéia de algumacoisa, e complementar esta definição com acolocação de Barreto (1994, p.3) que quali-fica a informação como “um instrumentomodificador da consciência do homem e deseu grupo”, porém este alerta para o fato deque a produção de conhecimento “só se efe-tiva a partir de uma ação de comunicaçãomutuamente consentida entre a fonte (osestoques) e o receptor. Porém, a produçãodos estoques de informação não possui umcompromisso direto e final com a produçãodo conhecimento” (BARRETO, 1994, p.4).

Considerando que nossa percepçãodo mundo esta ligada a nosso repertório deconhecimento, para avançarmos a um novoestado de conhecimento necessitamos tra-balhar cognitivamente com informações.Podemos concluir que a simples disponibi-lização da informação não é suficiente paraefetivar este novo estado de conhecimento;é necessário que esta informação cheque aténós de modo que possa ser trabalhada etransformada em novo conhecimento.Portanto, é necessário que ela seja comuni-cada. Concordamos com Smit (1999, p.30)quando diz que “a disponibilização da infor-

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mação não eqüivale ao exercício do dever deinformar, se tomarmos as palavras ao pé daletra... O dever de informar remete ao deverde criar condições adequadas para a cons-trução do conhecimento”.

Informar e comunicar não se con-fundem. Segundo Le Coadic (1996, p.13) acomunicação é “o processo intermediárioque permite a troca de informação entre aspessoas [...] a comunicação é um ato, umprocesso, um mecanismo, e que a infor-mação é um produto, uma substância, umamatéria”. Falamos aqui de informaçãocomo insumo de conhecimento, portanto,base para nossa visão de mundo, e comu-nicar seria tornar este insumo comum a umou vários atores distintos.

Bowditch; Buono (1992) explica queembora não haja um modelo único decomunicação humana, todos os modelosincluem uma fonte de informação, umamensagem, um receptor e uma interpre-tação da mensagem; e para entendermos oprocesso de comunicação é preciso consi-derar : quem está comunicando a quem, alinguagem ou os símbolos usados para acomunicação, o canal da comunicação (ouo meio empregado), o conteúdo da comu-nicação, as características interpessoais dotransmissor e as relações interpessoaisentre o transmissor e o receptor , e por fim, o contexto no qual a comunicação ocorre.

O USUÁRIO DE INFORMAÇÃO E ASNOVAS TECNOLOGIAS

As novas tecnologias de comuni-cação e informação permitem hojeampla disseminação de informações,numa escala nunca vista, numa veloci-dade não imaginada. Há cada vez menostempo para coletar, tratar e utilizar ainformação na tomada de decisões. No“panorama atual das redes eletrônicas,a informação hoje disponibilizadareveste-se de múltiplas funções e é

tanto estocada como organizada edisponibilizada numa variedade de insti-tuições e por uma variedade de profis-sionais”.(SMIT, 2000, p. 130).

Por tecnologias de comunicação einformação compreende-se um conjuntocompreensivo de componentes utiliza-dos para viabilizar o tratamento deinformações, envolvendo computadores,softwares, redes de comunicaçãoeletrônicas, redes digitais de serviços,tecnologias de telecomunicações, proto-colos de transmissão de dados, etc. (DIAGUSTINI, [s.d.], p. 1).

Resultado da junção das tecnolo-gias da comunicação e computação, aInternet aparece como um sistemaímpar de geração, armazenagem,processamento e transmissão da infor-mação, uma verdadeira revolução nouniverso informacional. “A rede é, antesda tudo, um instrumento de comuni-cação entre pessoas, um laço virtual emque as comunidades auxiliam seusmembros a aprender o que queremsaber.” (LÉVY, 1998, p. 3)

Na relação informação-usuáriodestacam-se aqui as transformaçõesassociadas à interatividade e à inter-conectividade.

A interatividade representa apossibilidade de acesso em tempo realpelo usuário a diferentes estoques deinformação; às múltiplas formas deinteração entre o usuário e às estruturasde informação contidas nestes esto-ques”, e a interconectividade “se refe-rencia à possibilidade que tem o usuáriode informação em deslocar-se, nomomento de sua vontade, de um espaçode informação para outro espaço deinformação. De um estoque de infor-mação para um outro estoque de infor-mação. (BARRETO, 1997, p. 2)

A Internet aparece aqui comomeio ideal para disponibilizar e acessar

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a legislação urbana à nível municipal,eliminando problemas de deslocamentofísico, limitações de horário de atendi-mento ao público nas prefeituras, eprincipalmente como forma de se evitaros casos de ocultação e manipulação deinformação.

A PESQUISA

Para nos apropriarmos de algunsdados reais sobre o panorama atual,procedemos uma pesquisa nas páginasWeb oficiais das prefeituras municipaisda Região Administrativa Estadual deMarília – Estado de São Paulo, que é

composta por 51 municípios. Foramselecionados apenas os dez municípioscom mais de vinte mil habitantes.

A pesquisa analisou, em novem-bro de 2002, quais destes municípiosdisponibilizava na sua página daInternet informações referentes a legis-lação urbanística do município. Das dezprefeituras objetos da pesquisa, umadelas (Paraguaçu Paulista) sequer man-têm uma página na Internet.

Das nove páginas na Internetpertencentes a prefeituras, em oitodelas (Assis, Cândido Mota, Garça,Marília, Ourinhos, Palmital, Santa Cruzdo Rio Pardo, Tupã) não há nenhuma

informação disponível à respeito de le-gislação urbana. Em apenas uma delasesta disponibilizada alguma informaçãoreferente a legislação urbanística: napágina da Prefeitura Municipal de Bastosencontramos a Lei n.º 1.357/98 (de 20de Maio de 1998) que dispõe sobre oincremento da indústria no Município deBastos, o parcelamento e a ocupação doNúcleo Industrial em setores e regula oparcelamento, uso e ocupação do solo.Porém referente ao restante da área dacidade nenhuma legislação foi encontra-da. A disponibilização desta lei explica-se na página de abertura: o DistritoIndustrial de Bastos está oferecendoterrenos para empresários.

DIREITO DE ACESSO A INFORMAÇÃOPUBLICA

Está na Constituição Federal(BRASIL, 1988):

Marco Legal/Direito de Acesso aInformação Pública· Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil, de 1988. Capítulo dos Direitos e GarantiasFundamentais:“Art. 5º. Todos são iguais perantea lei, sem distinção de qualquernatureza, garantido-se aos

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Fonte: ERPLAN- Escritório regional de planejamento do estado de São Paulo.

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brasileiros e aos estrangeiros re-sidentes no país a inviolabilidadedo direito à vida, à liberdade, àigualdade, à segurança e à pro-priedade, nos termos seguintes:...XIV - é assegurado a todos o aces-so à informação e resguardado osigilo das fontes, quandonecessário ao exercício profissio-nal;...XXXIII - todos têm direito a rece-ber dos órgãos públicos infor-mações de seu interesse particu-lar, ou de interesse coletivo ougeral, que serão prestadas noprazo da lei, sob pena de respon-sabilidade, ressalvadas aquelascujo sigilo seja imprescindível àsegurança da sociedade e doEstado;” ...

Capítulo da Administração Pública:“Art. 3º. É assegurado o direito deacesso pleno aos documentospúblicos, observado o dispostoneste Decreto e no art. 22 da Lein.º 8.159 de 8 de janeiro de1991.” “Art. 37. A administração públicadireta e indireta de qualquer dosPoderes da União, dos Estados, doDistrito Federal e dos Municípiosobedecerá aos princípios de lega-lidade, impessoalidade, morali-dade, publicidade e eficiência, etambém, ao seguinte:...§3º - A Lei disciplinará as formasde participação do usuário naadministração pública direta eindireta, regulando especial-mente:......II - o acesso dos usuários a re-gistros administrativos e a infor-mações sobre atos de governo,observado o disposto no art. 5º, Xe XXXIII.”· Legislação relativa ao acesso aarquivos públicos: Lei 8.159, de 8 de janeiro de1991, dispõe sobre a políticanacional de arquivos públicos eprivados e dá outras providências.

Art. 7º. Os arquivos públicos sãoos conjuntos de documentos pro-duzidos e recebidos, no exercíciode suas atividades, por órgãospúblicos de âmbito federal, esta-dual, do Distrito Federal e munici-pal em decorrência de suasfunções administrativas, legislati-vas e judiciárias.Art. 22. É assegurado o direito deacesso pleno aos documentospúblicos.”Decreto 2.134, de 24 de janeirode 1997, dispõe sobre a categoriados documentos públicos sigilosose o acesso a eles e dá outrasprovidências.

Apesar do direito legal constitu-cional de qualquer cidadão estar bemdefinido como vimos acima, são muitos oscasos de ocultação e manipulação de infor-mação, inclusive no âmbito das adminis-trações municipais.

Silveira (2001, p.81,82) apresentaalgumas reflexões sobre a utilização daInternet para ações do governo brasileiro:

O Programa Sociedade daInformação, lançado em 1999 pelogoverno federal, pretende estabele-cer as bases para uma inserçãocompetitiva do Brasil na sociedadeglobal da informação e tem porfinalidade integrar e coordenar odesenvolvimento e a atualização deserviços avançados de computação,comunicação e informação e suasaplicações. [...]Deve ser percebido o valor daInternet como parte estratégica noprocesso de posicionamento com-petitivo, e não apenas como maisuma “modernidade”.[...]Nesse sentido, o referido programaapresenta, como um dos objetivossetoriais, o desenvolvimento de sis-temas para integrar e ampliarações de governo em benefício dacidadania, no novo “paradigma dasociedade da informação”. Os con-teúdos disponibilizados pelos go-

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vernos (federal, estadual e munici-pal) devem, progressivamente,facilitar o exercício da cidadania.Segundo o documento de apresen-tação do programa (1999), existemtrês tipos de presença de organiza-ções públicas na Internet:a) oferecimento apenas de infor-mações institucionais;b) prestação de serviços relevantesde download (cópia apartir de um computador remoto)de informações para ousuário;c) prestação de serviços públicosem tempo real e de formainterativa com o cidadão.

Relativo a nossa pesquisa,podemos buscar um paralelo comque o autor (SILVEIRA, 2001,p.85,89) conclui:

O planejamento de sítios em orga-nizações públicas deve incorporar abusca pelo interesse e necessi-dades dos cidadãos, e não apenas aredução de custo por transação.Jardim (1999) ainda ressalva queas organizações públicas devem iralém da disponibilização de umsimples folder eletrônico.[...]Em suma, o desafio a ser vencido émanter a simplicidade e, ao mesmotempo, a funcionalidade, tendosempre em vista que o interessecentral é o atendimento das neces-sidades do cidadão, não a pro-moção da organização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O poder da informação e dacomunicação pode ser em parte explica-do pela capacidade de produzirem jun-tas a transformação do nosso repertóriocultural e técnico.

A que se destacar as experiênciasbem sucedidas de algumas prefeituras comrelação à informação, comunicação etransação via Internet, principalmente degrandes cidades e capitais. Porém a cons-

tatação é que as cidades de médio epequeno porte por nós pesquisadas man-têm páginas Web desprovidas de um pro-jeto, raramente atingindo o objetivo decriar novos conhecimentos, sendo amaioria delas meramente voltadas aomarketing político. Simplesmente nãocomunicam a informação pública, o míni-mo que se esperaria de uma instituiçãopública, numa situação de estagnação,acomodação e ineficiência. Para Smit(2000, p.129) :

“a finalidade social dos estoquesinformacionais deve ser enunciadaem termos de retorno para asociedade, ou seja, em termos deefeitos causados pela circulação, outransferência, da informação. Oestoque informacional, nessa lógi-ca, só se justifica porque, a partirda sua existência é possível alteraralgo (um estado de conhecimento)na sociedade ou nos indivíduos”.

No séc. XXI “as instituições não sejustificam do ponto de vista estático (aexistência do estoque), mas de um ponto devista dinâmico (o fluxo de informações e asalterações geradas pelo mesmo no estadode conhecimento)”. (SMIT, 2000, p.129).

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Cristiane Affonso de Almeida Zerbetto1

José Carlos Plácido da Silva 2

Zerbetto,C.A.A. e Silva,J.C.P. Análize ergonômi-ca do manuseio das embalagens alimentícias demolho refogado de tomate.Revista Assentamentos Humanos, Marília, v5,n.1, p25-32, 2003

Keywords: package, ergonomics, gripThis article presents an ergonomic analysisrelated to the handling of the food pack-ages of fried tomato sauce. With basis inthe results obtained in this research it couldbe established a comparative with the datafound in the bibliography and prove thetheory’s veracity.

Palavras-chaves: embalagem, ergono-mia, manejoEste artigo apresenta uma análiseergonômica relacionada ao manuseio dasembalagens alimentícias de molho refoga-do de tomate. Com base nos resultadosobtidos nesta pesquisa, pôde-se estabele-cer um comparativo com os dados forneci-dos pela bibliografia e comprovar a veraci-dade da teoria.Introdução

INTRODUÇÃO

Neste artigo será apresentadoparte dos resultados de uma pesquisarealizada na cidade de Londrina (PR),cujo o objetivo foi verificar a eficiênciade alguns aspectos que envolvem a

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ANÁLISE ERGONÔMICA DO MANUSEIO DASEMBALAGENS ALIMENTÍCIAS DE MOLHO REFOGADO

DE TOMATEErgonomics Analysis of the Handling of the Food Packaging of Fried Tomato Sauce

1 Mestre – Universidade Norte do Paraná – UNOPAR - Londrina2 Doutor – Universidade Estadual Paulista – UNESP - Bauru

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usabilidade das embalagens alimentíciasde molho refogado de tomate, fabri-cadas em folha-de-flandres. Entre estesfatores destacam-se o conforto emrelação às dimensões do corpo e datampa das embalagens e a segurança aomanusear o produto.

O experimento contou com acolaboração de 50 indivíduos, com idadesentre 18 e 64 anos, apresentando funçõesmotoras normais. Foi utilizada umaamostragem estratificada não propor-cional, que consiste na seleção de umaamostra em cada subgrupo da populaçãoconsiderada; sendo que o tamanho decada subgrupo na amostra não precisaser proporcional ao mesmo na populaçãode interesse, caracterizando-se como nãoprobabilística.

Estes sujeitos foram divididos em05 subgrupos, tendo como variáveis aidade e o sexo. Com relação à idade, usou-se como base a divisão das tabelas deantropometria dos autores Panero & Zelnik(1984), a qual é amplamente utilizada porergonomistas; esta consiste no seguinte:sujeitos de 18 à 24 anos, 25 à 34 anos, 35à 44 anos, 45 à 54 anos e 55 à 64 anos.Quanto ao sexo, a porcentagem usada foi50% de mulheres e 50% de homens.

Os sujeitos foram testados indi-vidualmente, no Supermercado Viscardi,localizado na Avenida Inglaterra, nº505, na cidade de Londrina (PR), simu-lando situações reais de uso das emba-lagens selecionadas.

Foram selecionadas para o ensaiotrês embalagens alimentícias fabricadas emfolha-de-flandres (FF) utilizadas paramolho refogado de tomate, a saber a EasyOpen, a Full Open-top e a Sanitária, asquais possuem sistemas totalmente dife-renciados de abertura, possibilitando assimuma análise ideal em relação aos aspectosergonômicos e à usabilidade das pegas eempunhaduras das mesmas.

Foram usados os seguintes equipa-mentos para o experimento: uma ficha deinstrução para explicar os objetivos do testeaos sujeitos; um abridor de latas, uma facae uma colher para que os indivíduospudessem abrir as embalagens; uma vasilhapara conter parte do conteúdo das embala-gens; uma máquina fotográfica digital pararegistrar o posicionamento das mãos naspegas das embalagens; um questionáriopara a verificação da eficiência das pegas nomanuseio das embalagens, e dos problemasencontrados na usabilidade das mesmas; ummicrocomputador Pentium II, 350 Mhz, 64Mb RAM, HD 6.4 Gb, para registrar os resul-tados do ensaio e uma impressora HP 695C,para reproduzir os dados do mesmo.

ENSAIO

O ensaio envolvendo os aspectosergonômicos e a usabilidade das emba-lagens foi efetuado usando o método deobservação sistemática e de inquiriçãoda tarefa. O primeiro é indicado segundoMoraes & Mont’ Alvão (2000), como umatécnica científica eficiente na etapa dediagnóstico, durante a análise da tarefa,quando dos registros comportamentaisdas atividades da tarefa-posturasassumidas. Trata-se de uma técnica rea-lizada em condições controladas, com oobjetivo de se obter respostas a propósi-tos pré-definidos, a mesma necessita deplanejamento e de operações específi-cas, instrumentos e documentos particu-lares.

O método de inquirição da tarefafoi aplicado com o intuito de fornecersuporte ao primeiro, pois o mesmo con-siste na busca metodológica de infor-mações e quantificação dos resultados,podendo se utilizar de vários instrumen-tos. No caso específico desta pesquisafoi aplicado o questionário, com pergun-tas fechadas, contendo alternativasdicotômicas e hierarquizadas.

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É importante salientar que após oquestionário pronto, foi realizado umpré-teste com 05 sujeitos, sob a super-visão da pesquisadora. Estas pessoasforam escolhidas de forma a representaros 05 subgrupos quanto a variável idade.De acordo com Gil (1991), o pré-testetem por objetivo avaliar o(s) instrumen-to(s) de pesquisa, constatando se exis-tem falhas no decorrer do(s) mesmo(s).Após a sua aplicação foi possível corrigiralgumas falhas na formulação de certasperguntas, estando os outros aspectoscoerentes, como a ficha de instrução, aordem e a quantidade de perguntas.

Por meio da aplicação destasmetodologias, pôde-se verificar as difi-culdades apresentadas no manuseio dasembalagens (segurar, abrir e fechar).

Paralelamente a este procedimen-to, foram realizadas observações sis-temáticas diretas quanto ao posiciona-mento das mãos (descrição cinesiológi-ca) em relação às ações executadas, uti-lizando como instrumento a máquinafotográfica digital.

TABULAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

A partir dos os dados obtidos,elaborou-se tabelas cujas freqüênciasforam comparadas com as freqüênciasesperadas (teóricas), através da provado Qui ao quadrado (Chi ao quadrado).Este método foi usado com o objetivode comparar as proporções entre asembalagens.

Neste método estatístico tem-se n= amostra (50 sujeitos) e p = nível des-critivo (probabilidade de igualdade entreas respostas comparando-se as trêsembalagens). Quando o valor de p formenor que 0,05, significa que a opiniãodos sujeitos em relação aos três tipos deembalagens é estatisticamente significa-tiva (FONSECA & MARTINS, 1996).

Sentiu desconforto ao pegar a embala-gem, segundo opinião dos entrevistados

É importante salientar antes decomentar esta tabela, que devido ao fatodo corpo da embalagem possuir um con-torno geométrico, este possibilita aousuário uma maior variação de pega semcomprometer tanto as diferençasantropométricas existentes entre osentrevistados. Este dado se confirmaquando a grande maioria dos sujeitosrespondeu que o produto não lhes cau-sou nenhum desconforto (IIDA, 1998;LEWIS & NARAYAN, 1993; PECE, 1995).

Apesar disso, pode-se notar que,ao perguntar sobre o desconforto napega do produto, eles provavelmentetenham associado ao desconforto causa-do pelo manuseio de cada sistema deabertura das embalagens, o que é confir-mado pela variação entre o número depessoas que responderam que sentiramdesconforto, número este que aumentapercentualmente em uma proporçãomuito relevante, visto que o nível des-critivo (p) é de 0,0037. Chama-seatenção para este dado, pois não deveriater havido diferença entre as embala-gens nesta questão, já que as mesmastem o mesmo corpo.

Deve-se lembrar que as três embalagenspossuíam texturas no corpo (área depega).

Devido ao manejo geométrico,pode-se afirmar que a embalagemcumpre com um fundamento bastanteimportante para o bom funcionamentode um produto, que é o de evitarposições extremas ou inadequadas àsarticulações (esta afirmação só é válidapois aqui se questiona o conforto ao

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Tabela 1 – Desconforto ao pegar a embalagem

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pegar a embalagem e não ao manuseá-la, entendendo-se por pega o envolvi-mento dos extremos dos dedos ao redordos componentes de um equipamento ouproduto) (BULLINGER & SOLT, 1979 apudPASCHOARELLI & COURY, 2000).

Opinião dos entrevistados, sobre o tama-nho da pega do corpo das embalagens

O comprimento de pega ou empu-nhadura de uma embalagem não deve serinferior a 100mm, pois haverá redução donúmero de dedos envolvidos na execuçãoda tarefa, o que diminui a força transmitidae a segurança. No entanto, constatou-seque o comprimento das embalagens inves-tigadas é de 95mm, estando levementeinferior ao ideal (100mm), não oferecendoprejuízos ao usuário (IIDA, 1998).

A forma ideal para se empunhareste produto é por meio da utilizaçãodos 5 dedos para não fatigar os dedosanular e mínimo, já que estes são fracosna geração de força de pinçamento. Apega com 5 dedos mais natural é a queocorre com o produto de diâmetro de75mm, que é o caso das embalagensselecionadas para esta pesquisa. Nota-se pela tabela, que as embalagenspesquisadas corresponderam aos dadosergonômicos existentes, atendendoassim as necessidades reais dosusuários, em se tratando das medidasdo diâmetro e do comprimento do corpodas embalagens, o que é comprovadodevido a diferença percentual entre ostrês tipos de lata, sendo esta insignifi-cante do ponto de vista científico(KINOSHITA et al, 1996).

Opinião dos entrevistados, sobre o tamanho

da pega da tampa das embalagens

A embalagem Sanitária não possuitampa, não sendo atribuída esta questãona tabela para este tipo de embalagem.

O resultado apresentado na tabelanão indicou um problema tão significativoem relação à embalagem Full Open-top,contudo sabe-se que os 26% dos entrevis-tados que acharam o tamanho da pegapequena têm razão, sendo esta colocaçãofundamentada a seguir.

A embalagem do tipo Full Open-top,a qual apresenta um anel para extração datampa, esta ergonomicamente incorreta, oque pode ser confirmado segundo a lite-ratura, que indica como diâmetro para apassagem do dedo indicador um espaçolivre de 35mm e, a embalagem apresentasomente 19mm de diâmetro no anel,estando totalmente fora dos padrõesergonômicos recomendados. Mesmo quan-do se utilizam tabelas antropométricas, nocaso com medidas brasileiras, o percentil95 corresponde, respectivamente, paraprimeira e segunda falange do dedo médioe primeira e segunda falange do dedo indi-cador, uma medida de 23 e 22mm; sendopossível observar que o anel realmente nãopossui um diâmetro suficiente para a rea-lização da tarefa (CONTRERAS, 1996;PECE, 1995; PHEASANT, 1996 apudPASCHOARELLI & COURY, 2000).

Com relação à embalagem Easy Openo diâmetro da pega da tampa está correto,apenas os usuários reclamaram da altura dalateral da tampa, a qual deveria ser um poucomaior para aumentar a área de contato esta-belecida entre os dedos e a tampa, melhoran-do assim a segurança ao manuseá-la.

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Tabela 2 – Tamanho da pega do corpo das embalagens

Tabela 3 – Tamanho da pega da tampa das embalagens

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Opinião dos entrevistados, sobre o pesodas embalagens

Percebe-se através do resultadodesta questão que o peso destas emba-lagens não apresenta problema, sendoeste 340g. Este dado é confirmadodiante do valor do nível descritivo (p), oqual foi maior que 0,005, portantoconsiderado pelo método como não sig-nificativo.

Este resultado se deve em parte aomanejo grosseiro da embalagem e às dimen-sões da mesma, fatores estes que acabamproporcionando maior força ao usuáriodurante a empunhadura do produto.

Deve-se destacar que este valordo peso (340 g) foi favorável para indiví-duos de 18 anos à 64 anos (universo dapesquisa), sendo que estes últimos jáapresentam menor força devido aredução na secção transversal do mús-culo. Sabe-se que o ponto máximo daforça alcançada por homens e mulheresocorre na faixa etária dos 25 aos 35anos, e quando estes atingem a faixados 50 aos 60 anos, esta força é reduzi-da em 25% (GRANDJEAN, 1998).

Opinião dos entrevistados, quanto asegurança ao manusear a embalagem

A partir destes resultados nota-seque o manuseio em geral da embalagemEasy Open praticamente não oferece pro-blemas, porém a sanitária é uma emba-lagem que não cumpre com os requisitosde usabilidade, ficando muito aquém doideal.

É interessante ressaltar o fato de que aúnica diferença entre estas três embalagens éo sistema de abertura e “fechamento” dasmesmas, podendo-se perceber o quanto estedetalhe influencia no conceito geral dosusuários em relação às embalagens.

A embalagem causa dor nas mãos, segun-do a opinião dos entrevistados

Observa-se nos dados coletados que aembalagem do tipo Sanitária foi a maior cau-sadora de dores nas mãos dos usuários, com34 respostas, representando 68% do total. Aembalagem do tipo Full Open-top obtevesomente 10 respostas (20%), enquanto que aEasy Open foi citada por apenas 4 entrevista-dos (8%). Tais queixas se devem às posturas

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Tabela 5 – Manuseio das embalagens

Tabela 4 – Peso das embalagens

Tabela 6 – Dor nas mãos

Figura 1 – Manuseio dos três tipos de embalagens

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Figura 2 – Movimentos das mãos durante a abertura daembalagem do tipo Sanitária

ou movimentos inadequados assumidos paraa execução da ação de abrir a lata, provocan-do tensões mecânicas nos músculos, ligamen-tos e articulações, ocasionando por fim dores,ou até mesmo, traumas nas partes envolvi-das. Esta afirmação é feita pois as três emba-lagens possuem o mesmo formato e tamanhode corpo, o qual permite uma boa pega com 4ou 5 dedos, estando a diferença apenas nossistemas de abertura.

Nas imagens podem ser observadosos movimentos de flexão dorsal e palmar, edesvio ulnar e radial empregados para a aber-tura da embalagem do tipo Sanitária, estaação repetitiva acaba causando uma tensãomecânica nos nervos e tendões envolvidos natarefa, resultando o número da pesquisa.

As embalagens Full Open-top e EasyOpen quase não foram criticadas quanto aeste aspecto, pois as mesmas não exigemmovimentos repetitivos para abri-las e opunho se mantêm praticamente na posiçãoneutra para a execução da ação, aspectoeste muito positivo na usabilidade de umproduto (DUL & WEERDMEESTER, 1995;LEWIS & NARAYAN, 1993; PECE, 1995; RIO& PIRES, 2001; SPERLING et al, 1993).

Usou algum tipo de ferramenta paraabrir/fechar a embalagem, segundoentrevistados

A faca foi a ferramenta mais uti-lizada para auxiliar na abertura dasembalagens, sendo que, das 23 pessoasque utilizaram ferramentas, 21 usaram afaca e 02 o abridor. A embalagem EasyOpen é responsável por 30% do resulta-do, e a Full Open-top por 16%.

CONCLUSÃO

É importante salientar, após osresultados apresentados neste artigo, oquanto o sistema de abertura e fechamen-to de uma embalagem pode influenciar naconceituação de um produto por parte dousuário, podendo muitas vezes contribuirpara a venda do conteúdo que esta emba-

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Figura 3 – Posição neutra assumida pelo punho durante aabertura das embalagens Full Open-top e Easy Open

Tabela 7 – Uso de ferramenta para abrir / fechar aembalagem

Figura 4 – Uso de ferramentas para abrir as embalagensEasy Open e Full Open-top

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lagem contém, como acabar com a vida-de-prateleira da mesma.

O designer, como um dos profissio-nais responsáveis pelo sucesso de um pro-duto, deve estar atento a detalhesergonômicos fundamentais para a perfeitausabilidade do mesmo. Estes fatoresenglobam, por exemplo, o posicionamentoneutro das articulações envolvidas na tare-fa, as incapacidades físicas, o usuáriodestro e canhoto, texturas que contribuempara melhor aderência do corpo ao produ-to, as diferenças sexuais, a idade, o este-riótipo popular, entre outros.

Conclui-se, portanto, que o designé uma ciência sem limites, pode ser com-parado ao sonho, onde a cada dia é pos-sível o surgimento de algo novo, sendoque os designers precisam estar sempreatentos às novas tecnologias, para quealiados a elas possam não apenas proje-tar, mas tornar a vida das pessoas o maisprática e independente possível.

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CONTATOS

Cristiane Affonso de Almeida Zerbetto –[email protected]

José Carlos Plácido da Silva – [email protected]

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Cléia Rubia de Andrade Castro 1

Antônio Fernandes Nascimento Júnior 2

Castro, C.R.A e Junior, A.F.N. A estrutura

morfológica da cidade e suas

transformações. Revista Assentamentos

Humanos, Marília, v5, n.1, p33-51, 2003

RESUMO

A cidade é um fenômeno tãoambíguo quanto o homem, pois representa amaterialização e o produto de um contínuo ecumulativo processo. No decorrer dosséculos, conforme um novo elementopassava a fazer parte de seu universo, estafoi adquirindo característicasurbanísticas diferenciadas, tornando-segradualmente um complexo conjuntoem constante transformação. Partindodo pressuposto que somente oconhecimento das experiências passadaspossibilita a idealização de padrõesapropriados para os espaços urbanos dopresente e do futuro, por meio da análise dosdiversos modos de ocupação territorialbuscou-se mostrar a participação doselementos naturais e também dosconstruídos na definição da forma e noprocesso de estruturação espacial da cidade.Ao mesmo tempo, o estudo dos aspectosmorfológicos mais singulares e maispresentes na cidade ao longo da História,contribuiu para a identificação da influênciados principais elementos responsáveis pelasua configuração.

A ESTRUTURA MORFOLÓGICA DA CIDADE E SUASTRANSFORMAÇÕES

1Mestre em “Planejamento Urbano e Regional: Assentamentos Humanos” pela Universidade Estadual Paulista –

UNESP, campus de Bauru. E-mail: [email protected]

Professor da Área de Pós-Graduação em “Planejamento Urbano e Regional: Assentamentos Humanos” daUniversidade Estadual Paulista – UNESP, campus de Bauru.

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ABSTRACT

The city is as ambiguous aphenomenon as the man himself, it repre-sents both the materialization and theproduct of a continuous and cumulativeprocess. Over the centuries, a new elementhas become part of its universe, it hasacquired peculiar urban features, becominggradually a complex group in constantchange. Assuming that only the knowledgefrom past experiences makes it possible toidealize suitable patterns for the urbanspaces of the present and of the future, wetry, via the analysis of the several mannersof territorial occupation, to show the rolesplayed by both the natural elements andthose elements built along the form defini-tion and the process of spacial structuringof the city. At the same time, studying themost peculiar and most frequent morpho-logical aspects over history has contributedto the identification of the influence of themain elements responsible for its configu-ration.

Key Words: City History; UrbanStructuring; Space Configuration.

Palavras-chave: História da Cidade;Estruturação Urbana; ConfiguraçãoEspacial.

INTRODUÇÃO

Assim como no decorrer dosséculos a eclosão de cada um dos trêsperíodos de evolução da base técnicarepresentou expressivas transformações naestrutura e nas formas de organização social,política e econômica estes momentostambém foram deixando suas marcasimpressas no espaço da cidade. Isto significaque sua singularidade e vitalidade são frutosdo equilíbrio e da harmonia gerados por suasdiferenças e contradições, entre as quais, sedestacam as resultantes da interação entre ovelho e o novo e também, das variações nasrelações de contigüidade.

Por outro lado, são diversos oselementos morfológicos que ao longo dotempo vem se consolidando como objetosestruturadores da forma urbana. Estespertencem a dois grandes grupos, o primeiroé o dos componentes do suporte físiconatural, onde os acidentes físico-geográficossão notadamente os principais responsáveispela estruturação da malha e também pelaconfiguração espacial da cidade. O segundo éo dos artefatos construídos pelo homem, noqual, dentro ou fora da cidade, a Arquiteturacomo elemento físico e reflexo daexperiência, entre todas as outras, épossivelmente a mais representativaconstrução humana.

Neste universo, aconsolidação da identidade, bem como, oestabelecimento das dimensões simbólicas,ou seja, a eclosão e/ou a atribuição dossignificados, acontece por meio dastransformações físicas que tem comoobjetivo alcançar a melhor solução no que serefere à adequação dos espaços de usocoletivo às formas de apropriação e usocontemporâneos. Portanto, este trabalhotem como objetivo compreender a lógica damaterialização dos ideais e conflitoshumanos no espaço urbano, já que esta setornou condição fundamental para aelaboração de políticas, planos, programasou projetos que minimizem os principaisproblemas da cidade e promovam aqualidade de vida e a identidade entre ohomem e o espaço que habita.

A ARQUITETURA E A ESTRUTURAÇÃODA FORMA URBANA

O fato de um númerosignificativo de exemplares arquitetônicoster resistido por séculos à ação dos maisdiversos agentes, em muito tem auxiliado aCiência na compreensão da trajetória dohomem. Em meio a outros aspectos é,sobretudo através de sua configuração edas técnicas construtivas utilizadas que ospesquisadores vêm identificando eestudando algumas das principais

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peculiaridades de diferentes culturas,formas de apropriação e uso, bem como,costumes e tradições dos mais remotosperíodos da História.

Por sua vez, ao fornecerem ossubsídios sobre os mais diversos modos desociabilidade humana, estes estudos têmcapacitado os profissionais à “criar lugares”em vez de simplesmente “projetar espaços”.Apesar de vulgarmente empregados comosinônimos ambos os termos tem um sentidoindependente. Enquanto “projetar espaços”consiste num processo onde são priorizadosbasicamente os aspectos físico-funcionais,prestando-se atenção insuficiente àsatividades e experiências vivenciadas, “criarlugares” é uma arte, significa conceber umacondição de harmonia entre os elementosmorfológicos suficiente para estimular aconsolidação de laços emocionais afetivos, ouseja, de solidificar a identidade (SIME, 1986).

Segundo ZEVI (1978, p.17),“o caráter essencial da arquitetura – o quefaz distingui-la de outras atividadesartísticas – está no fato de agir com umvocabulário tridimensional que inclui ohomem”. Este acredita que tudo que nãotem espaço interior não se constitui emArquitetura. É o que defende, ao afirmar quesua essência está condicionada à existênciae ao tipo do ambiente criado peladelimitação de planos (piso, teto e paredes),ao qual o homem dá sua realidade integral.Contudo, ele não quer dizer que aArquitetura seja definida unicamente peloespaço interno de um edifício, que o seuinvólucro, “o volume arquitetônico”, não sejaum dos elementos da experiência espacialarquitetônica. Ao contrário, no seu entender,em conjunto com os outros itens dapaisagem (pontes, monumentos, árvores,etc.), estes compõem os limites do espaçoexterior, ou seja, do espaço urbanístico. Emoutras palavras, “a experiência espacialprópria da arquitetura prolonga-se nacidade, nas ruas, nas praças, nos becos eparques, nos estádios e jardins, onde querque a obra do homem tenha limitado vazios,isto é, tenha criado espaços fechados”(ZEVI, 1978, p. 25).

Como a produção do lugar estádiretamente relacionada à forma do serhumano se identificar com o meio físico edele se apropriar, é fato que o espaçoexerce um papel fundamental naArquitetura. Entretanto, seria um erroafirmar que a experiência arquitetônica selimita à relação do homem com o espaço,apesar de ser ele seu elemento vital. Sema atuação de outras categorias como aestética, a social e a tecnológica, não secompõem a Arquitetura e o Urbanismocomo grandes infra-estruturas dasociedade. No entender de CARON, apudCRICHYNO (1991, p. 21), ao se interagir,essas categorias que devem ser parte dabagagem cultural do Arquiteto, completamo amplo círculo de abrangência daArquitetura, pois,

“o campo estético trabalha comquestões de forma e seusignificado, da teoria e dafilosofia da arquitetura. Ocampo social, com questões dahistória, da política e dosconceitos sociológicos. Otecnológico, com questõesinstrumentais das ciênciasexatas encaminhadas ao mundoconstruído”.

Isto significa que aArquitetura materializa todas asminúcias e peculiaridades do estágiocultural e de desenvolvimentotecnológico da coletividade que aconcebeu. Segundo HERSKOVITZ apudSERRA (1987, p. 55) “toda sociedadedesenvolve uma cultura material e umatecnologia destinada a extrair do espaçonatural os recursos para o atendimentode suas necessidades”. Além de sedistinguir como a “chave dainterpretação correcta e global dacidade como estrutura espacial”(LAMAS, 1992, p. 41), se caracterizanum fenômeno cultural que participa doprocesso de organização da sociedade eda produção da paisagem. SUBIRATS(apud SILVA, 1994, p. 181), afirma que,

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“essa relação entre aarquitetura e a cultura possui,na história da arquitetura emgeral [...], um duplo aspecto. Aarquitetura constitui, por umlado, uma força ordenadora darealidade social e individual. Elaé um artefato, um instrumentode manipulação da realidade.Mas, ao mesmo tempo, aarquitetura visualiza essarealidade da cultura e dadominação, mostra-a comorepresentação espacial, põe-naem evidência como valorsimbólico. Ambos os aspectossão complementares e definemaquela dimensão artísticagraças a qual a arquitetura seconverte, para lá doconstrutivismo e do tectônico,[...] em símbolo de umacivilização e em memóriahistórica”.

Se classificados conforme anatureza de sua autoria, a forma singular quea maioria expressiva dos lugares vêmadquirindo ao longo do tempo, se caracterizana concretização de um processo natural edinâmico de modificação e renovação espacialque, em grande porcentagem é resultado daprodução popular, ou seja, não foi idealizadopor um Arquiteto ou por outro profissionaligualmente reconhecido pelos mecanismosoficiais.

Mesmo diante destecontexto, estes espaços foram ignoradosou depreciados por um longo tempo. Érecente o princípio de conscientizaçãosobre seu real valor nos universos daarquitetura, do urbanismo e da dinâmicaurbana. Tradicionalmente eramreconhecidos e qualificados comoarquitetônico ou urbanístico somenteambientes projetados e/ou planejados poragentes institucionalizados. Isto significaque apenas uma pequena parcela doslugares passava efetivamente a fazer parteda “História Oficial da Arquitetura e doUrbanismo”. De acordo com KOHLSDORF(1996, p. 18-19), “esta abordagem tem

dividido as cidades e seus edifícios em‘planejados’ e ‘espontâneos’. [...] Noprimeiro caso, os lugares são considerados‘legais’, ‘oficiais’, ‘formais’; no segundo, são‘informais’, ‘ilegais’”.

No entanto, como sãoocupados conforme a realidade cultural decada indivíduo e da comunidade, os espaços“informais”, da mesma forma que os“planejados”, também materializamimportantes aspectos das lutas e dasconquistas humanas alcançadas por váriasgerações. Se confrontadas como artefatosda paisagem, a principal diferença percebidaentre a obra dos Arquitetos e a dos não-arquitetos reside no fato da posturaprofissional resultante da especialização,conferir à obra do Arquiteto que é “refletidae artístico-científica”, um caráter distinto daarquitetura das massas, que é identificadapor seu aspecto de “emergente e utilitária”(MEIRA, 1992, p. 82).

Ainda assim, foi apenas nasúltimas quatro décadas que esta forma deexpressão arquitetônica, denominada porSILVA (1994, p. 128), “arquiteturavernácula, ou arquitetura-sem-arquiteto”começou a ser vista e valorizada como umtipo de produção que não poderia serignorada, ou seja, como um “rico territóriode realizações que independe da posse eutilização de um conhecimentosistematizado”. Desde então, deu-se início aum período em que surgiu uma série denovos paradigmas que buscam proporcionarmaior sustentação ao conceito de espaçoarquitetônico. Entre estes se destaca o deKOHLSDORF & AZEREDO (apudKOHLSDORF, 1996, p. 19), que

“definem a arquitetura e seuobjeto a partir do trabalhohumano e seu processo deprodução, afirmando que acaracterística fundamentaldos mesmos é sua‘intencionalidade’: o que fazas ações serem humanas é ofato de conterem umaestratégia de atendimento aobjetivos conscientes.Portanto, é arquitetônico

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q u a l q u e r e s p a ç ointencionalmente produzido, etoda construção social é,efetivamente projetada”.

Enfim, é justamente o fatode a cidade ser “produto de muitosconstrutores que constantementemodificam sua estrutura por razõesparticulares” (LYNCH, 1996, p. 12), queconfere a cada um dos espaçosarquitetônicos que a compõem,características físicas distintas, onde semanifestam diferentes padrões decomportamento, emoções e formas deapropriação e uso, conseqüentemente, sãomuitos os significados atribuídos a cada umdestes (CASTRO & NASCIMENTO JÚNIOR,1996). Isto significa que o físico e oabstrato se misturaram de maneiraindissociável, conferindo um caráter únicoao espaço humanizado.

O SUPORTE FÍSICO E ACONFIGURAÇÃO DO ESPAÇO DA

CIDADE

Desde os primórdios o suportefísico vem se destacando entre os principaiselementos estruturais que determinam aforma da cidade. ROSSI (1995, p. 147) citacomo exemplo que, “a escolha do lugar,tanto para uma construção como para umacidade, tinha um valor preeminente nomundo clássico: a ‘situação’, o sítio, eragovernado pelo ‘genius loci’, pela divindadelocal, uma divindade de tipo intermediárioque presidia tudo o que ocorria naquelelugar”. Esta importância de sua atuaçãotambém foi colocada em evidência porVILLAÇA (1998) quando analisou odesenvolvimento das metrópoles brasileiraspor meio da comparação dos modelossimplificados de desenvolvimento de suasestruturas espaciais.

Por outro lado, os impactosgerados pelas características formais dosuporte físico sobre a estruturaçãourbana e o cotidiano da cidade têm

significativa semelhança com aquelesque a configuração territorial produz navida, na integração social e cultural, nodesempenho político e econômico, bemcomo na consolidação da identidadenacional. Em seus estudos geopolíticos,RENNER apud BRASIL (1992), constatouque a forma do território pode atuarcomo um agente positivo e/ou negativo,influenciando vários aspectos, emespecial, os modos de apropriação e uso,os costumes e a própria cultura.Selecionando quatro tipos de forma queele considera as principais, esclareceque, enquanto a figura compactanormalmente é favorável à integração e acoesão, a alongada é propensa a gerargrandes problemas de diferenciaçãoentre grupos. Por sua vez, os formatosrecortado e fragmentado oferecem asdesvantagens de colaborar tanto para adescontinuidade territorial como para amaterialização da segregação.

A influência do suporte físicoé tão acentuada que mesmo “quando seutilizam modelos idênticos em sítiosdistintos, a diversidade dos lugaresconferirá identidade própria a cada um”(LAMAS, 1992, p. 64). SegundoKOHLSDORF (1985a, p. 166), um únicotipo de sítio também pode oferecer “váriaspossibilidades para usos urbanos”resultando em diferentes configurações.Neste contexto, uma das principaisparticularidades do suporte físico é suaflexibilidade a mudanças e adaptações. Emsuas pesquisas ela verificou que “oselementos do meio natural do DistritoFederal comparecem de maneiras distintasna paisagem dos assentamentos”.

Contrariando a dinâmica daregião do Distrito Federal onde é aparentea maleabilidade do suporte físico, hálugares em que sua hegemonia comoagente ordenador da forma urbana éincontestável. Em seus estudos, REISFILHO (1968) concluiu que elementosnaturais como o relevo e os cursos d’água,bem como, primitivos caminhos, que naépoca eram os meios mais eficazes decomunicação e acesso, foram decisivos na

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escolha do sítio dos mais antigos núcleosbrasileiros. Segundo ele, uma das maiorespeculiaridades desta situação é o fato dorelevo exercer significativa influência“sobre a aparência do conjunto e dosedifícios, e sobre o traçado” (1968, p. 124).É o que acontece em Coronel XavierChaves, localizada na mesoregião centro-leste do Estado de Minas Gerais, que sedistingue pelo modo singular e categóricoque cada um dos elementos naturaisdesempenhou na definição da atualconfiguração urbana.

Na escolha do sítio, trêsobjetos exerceram influência preeminente,ou seja, a proximidade da água, que secaracterizava no meio essencial àsubsistência, a topografia menos acidentadado fundo de vale, que viabilizava aimplantação do núcleo e a primitiva Estradada Mata, que garantia a comunicação e oacesso aos povoados vizinhos e a“metrópole”. De acordo com CASTRO &NASCIMENTO JÚNIOR (1996), além de serelemento fundamental para a escolha dosítio, o relevo também atuou comodelimitador do crescimento urbano dacidade, A expansão não se estendeu além-morro, isto é, não ultrapassou o alcance docampo visual, sendo desviada para outrossentidos ao atingir os pontos mais altos.

Do mesmo modo que orelevo, os cursos d’água também foramfundamentais na organização espacial nãoapenas ao delinear o traçado primitivo, masao definir divisas e áreas viáveis à ocupação.A Estrada por sua vez, além de atuar comofator determinante do traçado do núcleoprimitivo, ou seja, da região central,consolidou a função de eixo de ligação entre-bairros e entre a cidade e os Municípiosvizinhos. Neste caso em especial, aArquitetura, ou seja, a Igreja Nossa Senhorado Rosário, encontrada no local pelospioneiros, também exerceu forte influênciana escolha do sítio e desempenhou o papelde agente centralizador ao interferir nadisposição das residências que têm suasfachadas voltadas para ela.

Por sua vez, o elementotempo nunca deixou de exercer

significativa influência no processo dedefinição e estruturação da forma urbana.Segundo MUMFORD (1991, p, 567), “oaumento das terras aráveis, oaperfeiçoamento da agricultura, a difusãodemográfica e a multiplicação de cidadesverificaram-se lado a lado, no decorrer daHistória”. Isto significa que cada momentohistórico pode ser reconhecido, entreoutros fatores, pelo grau dedesenvolvimento tecnológico e pelaconformação espacial que produziu. Operíodo atual confere ao homem o poder detransformar os elementos naturais segundoseus interesses. Deste modo, o suportefísico se torna sujeito a sucessivasmudanças e adaptações, se caracterizandonum objeto de grande fragilidade, podendodesempenhar um papel secundário noprocesso de definição da forma urbana.Assim sendo, outras unidades morfológicastendem a se destacar, assumindo o papelde elementos estruturadores eorganizadores da configuração espacial.

De acordo com LAMAS (1992,p. 82), no caso de Nova York, emconseqüência do conflito de interesses que sematerializou em acirrada disputa pelo solourbano, gerando acentuado processo deespeculação imobiliária, a forma da cidade éresultante da “exasperação dos elementosmorfológicos: os edifícios”. Segundo ele, “éatravés dos edifícios que se constitui o espaçourbano e se organizam os diferentes espaçosedificáveis e com ‘forma própria’: a rua, apraça, o beco, a avenida ou outros espaçosmais complexos e historicamentedeterminados” (1992, p. 84).

Em síntese, mesmo com asignificativa influência dos elementos do sítiofísico, “a forma da cidade corresponde àmaneira como se organiza e se articula a suaarquitectura” (ROSSI apud LAMAS, 1992, p.41). Qualificando-a como o “objetivo final detoda concepção”, LAMAS (1992, p. 44),afirma que a mesma “está em conexão como desenho, quer dizer, com as linhas,espaços, volumes, geometrias, planos ecores, a fim de definir um modo de utilizaçãoe de comunicação figurativa que constitui a‘arquitetura da cidade’”.

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O TRAÇADO DA CIDADE E AORGANIZAÇÃO DE SEUS ELEMENTOS

MORFOLÓGICOS

A c o m p l e x i d a d eestrutural, própria da cidadecontemporânea, não se caracteriza emum produto concluído ou numaidealização recente. Ao contrário, é frutodo contínuo aprimoramento de uma obracumulativa, que ao longo da História,vem materializando e incorporando assucessivas etapas da evolução da basetécnica. Segundo SANTOS (1996, p. 47),a concretização desta dinâmica estáfundamentalmente condicionada àexistência da apropriação e do uso datécnica porque

“há uma idade científica dastécnicas, a data em que, numlaboratório elas são concebidas.[...] E, ao lado dessa idadecientífica, há uma idadepropriamente histórica, a data emque, na história concreta, essatécnica se incorpora à vida de umasociedade. Na realidade, é aqui quea técnica deixa de ser ciência paraser propriamente técnica”.

Entreas particularidades queconferem grande complexidade e tambémum caráter único a este processo deapreensão, destaca-se o fato de em cadalugar, ele ocorrer em momento específico,ter um ritmo e uma forma característica dese manifestar. Contudo, o que lhe asseguraa individualidade e viabiliza a consolidaçãoda identidade, é a propriedade dos agentesenvolvidos influenciarem-se mutuamente,ou seja, ao mesmo tempo em que oslugares redefinem as técnicas, estas porsua vez, tem o poder de realizar profundasmudanças tanto na estrutura e nos valoresda sociedade que delas se apropriou, comono espaço que edificou. Isto significa que“cada objeto ou ação que se instala, se

insere num tecido preexistente e seu valorreal é encontrado no funcionamentoconcreto do conjunto. Sua presençatambém modifica os valores preexistentes”(SANTOS, 1996, p. 48).

Em síntese, ao longo daHistória, os modelos de ocupação, bem comoas configurações espaciais, foram seredefinindo a partir do momento que umnovo artefato passava a fazer parte dodinâmico conjunto da cidade. Assim, eraestabelecida uma nova ordem que conferiaao espaço uma forma única, particular. Nestecontexto, os modos de crescimento que nodecorrer dos tempos vem sendo utilizadossimultaneamente, de forma a resultar emdiferentes configurações de malhas urbanas,são classificados por autores comoMUMFORD (1991), LAMAS (1992), MORRIS(1992) e KOHLSDORF (1996), em duascategorias, ou seja:

•Orgânico: segundo as regrasde espontaneidade – seestruturam em geometriassemelhantes às das formasvivas (simetria e assimetria,relações entre linhas diferentes

de 900, grande número deelementos básicos decomposição e presença de linhascurvas e complexas);•Racionalista: segundo planoou idéia previamente traçada –correspondem à formação sobleis geométricas primárias(simetria, paralelismo,ortogonalismo, predominânciade linhas retas e poucoselementos básicos decomposição) (KOHLSDORF,1996, p. 143).

Em seus estudos, LAMAS(1992, p. 134), concluiu que exceto na“cidade moderna”, regida por outrospadrões de concepção, em ambos osmodelos de malha urbana, “os elementosmorfológicos são utilizados de modosensivelmente idêntico: quarteirão, lote,edifício, fachada, rua, praça,monumento, etc.”. Para ele, existe

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heterogeneidade no pormenor porque “asregras morfológicas foram constantes,mas serviram a diferentes objetivosculturais, estéticos, programáticos efuncionais” (LAMAS, 1992, p. 136).

A ORGANIZAÇÃO ESTRUTURAL DACIDADE ANTIGA

Ao se analisar as modificaçõesda forma urbana ao longo do tempo,observa-se que apesar do importante legadoque deixaram para a civilização, são escassosos remanescentes da pré-história quecontribuem com informações significativassobre a configuração espacial dos lugares,bem como, a respeito de suas formas decrescimento. De acordo com MUMFORD(1991, p. 73), isto acontece porque “não sedispõe de nada semelhante a um registroconsecutivo dos primeiros quatro mil anos daexistência da cidade”. GOITIA (1996, p. 41),afirma que das “culturas, – egípcia,mesopotâmica, indostânica – conhecemospoucos restos de cidades, visto que o quepermaneceu foram os gigantescosmonumentos religiosos e fúnebres ou,quando muito, alguns palácios de monarcasdivinizados”.

Deste período, entre osresquícios de organização habitacional queforam descobertos, possivelmente o maisantigo que se tem conhecimento é o doprimitivo conjunto egípcio de Illahun, atualKahun. Como foi planejado para abrigar osoperários que trabalhavam nas obras dapirâmide de Sesóstris II, é qualificado porGALANTAY (1977, p. 70) como “elantepasado directo de la ciudad industrialplanificada”. Mesmo que de maneirarudimentar, neste aglomerado de grandesimplicidade estrutural, já se fazempresentes indícios de organização dealguns dos elementos morfológicoscaracterísticos da cidade. Entre estes, sedestaca o traçado geométrico das estreitasruas, dividindo o núcleo em blocosretangulares de habitações que sedistribuem em torno de pátios internos.

Por outro lado, um dosexemplares mais documentados destafase histórica ancestral é a cidade deMohenjo-daro, localizada no Vale do Indo,construída aproximadamente em 1700a.C. Conforme GALANTAY (1977), a regu-laridade do traçado e a presença de vestí-gios da malha ortogonal, ou seja, do sis-tema de tabuleiro de xadrez, comumenteencontrado nas primitivas cidadesromanas, helenísticas, gregas e assírias,constitui-se num dos principais enigmasdo núcleo. Igualmente se destacam comoparticularidades do conjunto, os resquí-cios de um dinâmico sistema de esgotosque foi descoberto em suas ruas eavenidas que, por sua vez, dividem amalha em doze setores. Como em Kahun,suas edificações, que em termos constru-tivos também são consideradasavançadas para a época, estão voltadaspara pátios no interior das quadras.

Estabelecendo uma analogiaem relação a Kahun e Mohenjo-daro,constata-se que é através da configuraçãoespacial, que confere uma singularidadeímpar à paisagem das cidades gregas, quese identifica uma expressiva mudança naforma do homem se relacionar com o meio,ou seja,

“na Grécia antiga, a paisagem jáexprimia alguns progressos dohomem no controle de seuambiente e de seu destino. [...]A essência da paisagemrevelava que toda a arquiteturafosse templo, teatro, praça ouhabitação, deveria harmonizar-se com o ambiente circundante,lançando mão, na maioria doscasos, de encantadorescontrastes para ressaltar abusca da harmonia” (PEREIRALEITE, 1994, p. 32).

Esta busca grega porharmonia atingiu seu ápice ao sematerializar em duas formas antagônicasde estrutura urbana, ou seja, “em grandeparte espontânea, irregular, ‘orgânica’, nocontinente grego e nas suas ilhas, mais ou

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menos sistemática e rigorosa nas ‘polis’da Jônia, na Ásia Menor”, onde, “noprimeiro caso, o espírito da acrópoledominava e no segundo, o da ágora”(MUMFORD, 1991, p. 210). De acordocom HAROUEL (1990, p. 13), as cidadesgregas provenientes de um crescimentoorgânico “se apresentam na forma debairros habitacionais com ruas estreitas etortuosas, fechadas sobre si mesmas, oudispersas, estendendo-se ao pé ou aolado de uma colina íngreme onde seencontra uma acrópole”.

A análise da configuraçãoespacial de seus núcleos centrais mostraque sua estrutura urbana foi organizadapela locação estratégica da arquitetura deforma a deixar em evidência os elementosurbanísticos que materializavam seus doismaiores valores, ou seja, a democracia ea religião. Contudo, composição estruturalsimilar não é encontrada nas áreasresidenciais. Ao contrário das regiõescentrais, onde se localizam os espaçospúblicos, estas são organizadas comgrande singeleza. Não se identifica nestessetores a monumentalidade nem sequer apreocupação com um tratamento especialdos espaços. LAMAS (1992, p. 139),afirma que “a arquitectura da rua é degrande simplicidade. O tecido habitacionalé uniforme e é ordenado sem pretensõestanto por traçados reguladores erepetitivos como por traçados irregularese orgânicos”.

Enquanto este tipo deconfiguração dominava a paisagem dascidades do continente e das ilhas, na Jônia,começou a dividir espaço com um novomodelo de organização urbana, o traçadoortogonal. Foi o momento em que a cidadepassou a ser objeto de um planejamentosistematizado, fruto da evolução dopensamento filosófico grego. A princípio, otabuleiro de xadrez foi adotado comodesenho padrão para a reconstrução dosnúcleos devastados pelas guerras,posteriormente, este se espalhou por todaa Grécia e suas colônias. Gradualmente setornou “habitual tanto para a fundação denovas cidades quanto para a expansão e

planejamento das cidades existentes”(HAROUEL, 1990, p. 15). SegundoGALANTAY (1977) a partir desta época autilização do sistema ortogonal começou ase consolidar como uma marca distintivadas cidades coloniais planejadas.

Durante muito tempo, omérito pela concepção desta forma deorganização urbana foi atribuído ao filósofo earquiteto grego Hipódamo de Mileto. Seuemprego num período anterior somente foiconstatado com a descoberta das primitivascidades de Harapá e Mohenjo-daro, queexibiam alguns vestígios de regularidade edo traçado ortogonal. Apesar disso, pelamaneira sistematizada como desenvolveu eimplementou suas teorias, proporcionandoao sistema reticulado o “status” deimportante instrumento de urbanização, estecontinua sendo reconhecido como o primeiromito da História do Urbanismo. Entre osprincipais representantes da doutrina deHipódamo, pode-se mencionar o plano dereconstrução da cidade de Mileto, iniciadapor volta de 479 a.C.

Observando seu trabalho,constata-se que em meio a outrosaspectos, ele se preocupou com aespecialização das funções urbanas, ouseja, criou zonas específicas, de acordocom o uso e, além disso, instituiuhierarquia para a estrutura viária edimensionou ruas e avenidas. Em síntese,Hipódamo não se limitou ao simples uso dotraçado regular, ao contrário, concebeuuma teoria racional e criteriosa da cidade,pensando na dinâmica de seufuncionamento e também em suacomposição estético-formal.

Com o passar do tempo, ospreceitos urbanísticos gregos não caíramno esquecimento, não aconteceu a ruptura,mas a continuidade. Durante a supremaciado Império Romano, sua maneira peculiarde estruturar a forma urbana foi assimiladae adaptada a uma nova ordem, ou seja,

“no mundo romano, os princípiosde urbanismo helenístico foramlevados além e misturados aoutros elementos urbanos,

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p r o v e n i e n t e s d emunicipalidades mais remotas daÁfrica e da Ásia. [...] Da cidadehelenística, os romanosreceberam um padrão de ordemestética que se apoiava numabase prática; e a cada uma dasinstituições do urbanismo milésio– o ágora formalmente cercado,com suas estruturas contínuas, arua ininterrupta, ladeada deedificações –, os romanos deramu m e n c a m i n h a m e n t ocaracterístico próprio, superandoo original em ornato eimponência” (MUMFORD, 1991, p.225-229).

Isto significa que foijustamente em conseqüência de ter sematerializado como fruto da combinação dehábitos e costumes de várias culturas, quea urbanística romana adquiriu asqualidades peculiares que lhe assegurarama identidade. Entre os mais preponderantesindicadores da implementação dos seuspreceitos de urbanismo e, sem dúvida, umde seus maiores legados para a cidademoderna, se sobressai a tradiçãoritualística de demarcar os dois eixosviários principais segundo orientaçãopredefinida por um sentido místico. Emoutras palavras, a maioria significativa desuas cidades era posicionada de “este aoeste – no sentido do nascer ao pôr do sol–, interligando-se a uma ordem cósmica euniversal. Os dois eixos principais – o‘Decumanus maximus’, O/E; e o ‘Cardus’,N/S – encontram-se no centro, lugargeométrico da área construída” (LAMAS,1992, p. 144). Neste ponto de intersecçãodas vias estava situado o “forum”, oelemento de maior importância na cidaderomana, ou seja, o local de encontro epermanência, símbolo da união dasculturas, onde se realizavam as atividadescotidianas essenciais.

No que se refere àconfiguração espacial, há um grandecontraste entre a complexidade do traçadoorgânico da cidade de Roma, resultante desua expansão desordenada e o de suas

colônias, onde foi sistemática a utilizaçãoda malha ortogonal. Segundo MUMFORD(1991, p. 228), eram cidades que “emparte por motivos religiosos, em parte porconsiderações utilitárias, tomavam a formade um retângulo”, delimitado por umamuralha. Fora desta muralha, que nacultura romana atuava ao mesmo tempocomo elemento de defesa contra invasões eagente de segregação sócio-cultural, ossubúrbios apareciam espontaneamente,sem um desenho pré-estabelecido. Um dosmais significativos exemplares da aplicaçãoincondicional dos paradigmas daurbanística romana em seu momento deápice é a cidade de Timgad, colôniaconstruída na Argélia, aproximadamenteno ano 100 d.C.

Mais um fator de importânciaímpar para a estruturação da forma dacidade romana foi à grandiosidade de suaArquitetura, dominada pela concepção“escultórica” de edificações como, entreoutras, o fórum, o templo, o anfiteatro, osbanhos e os lavatórios públicos. A evoluçãoda técnica também permitiu amplasrealizações na área da Engenharia, entre asquais, a construção de “arcos do triunfo”,de residências com mais de um pavimento,bem como, a execução de monumentaisobras de infraestrutura utilitária comopontes, aquedutos e canais. Por outro lado,foi em Roma que pela primeira vez oscódigos urbanísticos para a minimizaçãodos problemas de falta de higiene econforto, resultantes da expansãodesordenada, se consolidaram comoprática urbana. HAROUEL (1990, p. 29)afirma que “o tratado de urbanismo deVitrúvio, intitulado ‘De architectura’, é aobra mais completa que neste domínio nosfoi legada pela Antiguidade”.

OS CONDICIONANTES DAESTRUTURAÇÃO DA CIDADE NA IDADE

MÉDIA

Com a lenta queda doImpério Romano, deu-se início no século V,

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a um período marcado por uma série deinvasões e saques que, por sua vez,provocaram um gradual e ininterruptoprocesso de desurbanização. Este quadroperdurou até o princípio do século XI,quando, especialmente em decorrência doaumento da produção de excedentes, quegerou a reativação do comércio, passou aexistir a cidade medieval propriamentedita. Segundo PEREIRA LEITE (1994, p.17), ela “começou como uma praça forte,em uma via de tráfego principal, em tornoda qual se agrupavam os comerciantesambulantes em busca de proteção”.

Nesta época, a muralha seconsolidou como um artefato indispensávelpara a garantia da segurança, encontrando-se presente em praticamente todas ascidades. Assim, a cidade medieval seestruturou como um “espaço fechado, amuralha a define” (LE GOFF, 1998, p. 71). Eratão grande a importância atribuída à muralha,que esta atuou de maneira incontestávelcomo um dos principais elementos decomposição da forma urbana, tanto que,conforme as cidades cresciam, eramsucessivamente construídos novos cinturõesfortificados, envolvendo a periferia.

Por outro lado, associada aouso da muralha, tornou-se freqüente aopção por lugares de difícil acesso para aimplantação das cidades, entre os quais,“colinas ou sítios abruptos, ilhas eimediações de rios, procurandoprincipalmente as confluências ousinuosidades, de modo a utilizar os leitosfluviais como obstáculos para o inimigo”(GOITIA, 1996, p. 88). Deste modo, abusca pela adequação da estrutura dascidades da Idade Média a sítios detopografia acidentada se distinguiu entre oscondicionantes da formação de uma malhaorgânica, composta por um labirinto deruas estreitas e tortuosas. De acordo comHAROUEL (1990, p. 39), adotando estesprincípios como parâmetros básicos, até oséculo XII,

“o nascimento e o crescimentodas cidades se efetua segundodois grandes processos:

desenvolvimento linear ao longode uma estrada ou de um rio, ouatração por um núcleo urbanoou por um edifícioi m p o n e n t e ( c a s t e l o ,monastério, igreja), que éprogressivamente envolvido porconstruções novas”.

No entender de PEREIRALEITE (1994, p. 36), “do ponto de vistada paisagem, a Idade Média foi umperíodo histórico de transição, rico noreexame de antigas idéias, na adaptaçãode velhas técnicas a novas situações, umaera de busca de novos caminhos”. Nestecontexto, a cidade medieval sematerializou com uma paisagem única,análoga a da pintura da cidade italiana deSiena, feita por Lorenzetti, que équalificada por MUMFORD (1991), como a“cidade histórica arquetípica de todos ostempos”. Parcela significativa destasingularidade da paisagem é decorrentedo fato da cidade ser “guarnecida detorres, torres das igrejas, das casas dosricos e da muralha que a cerca” (LE GOFF,1998, p. 71).

No que se refere àestruturação urbana, observa-se que aarquitetura desempenhou um papel degrande relevância, sobretudo nas cidadesque tiveram como procedência burgos,santuários cristãos, cidades romanas oualdeias. O núcleo central

“era sempre ocupado pelacatedral ou templo, pelo que acidade adquiriu uma importânciaespiritual de primeira ordem. Amesma praça onde seencontrava a catedral serviahabitualmente também para asnecessidades do mercado, e eranela que se erguiam os edifíciosmais característicos daorganização da cidade” (GOITIA,1996, p. 89).

Isto significa que na maioriaexpressiva destas cidades a participação donúcleo central como elemento de

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organização espacial também foiessencialmente importante. Através dacapacidade de atrair para si as atividadescotidianas vitais, foi o responsável pelosurgimento de um novo padrão de tecidourbano, o traçado radiocêntrico que, nestecaso em especial, tinha como peculiaridadesua configuração orgânica, resultante deum crescimento espontâneo. Deste modo,o sistema de malha radial passou a sedistinguir entre as principais heranças dourbanismo medieval. LAVEDAN (apudMUMFORD, 1991, p. 330), afirma que “ofato essencial do urbanismo medieval é aconstituição da cidade de tal maneira quetodas as linhas convergem para um centroe que o contorno é usualmente circular”.

Por outro lado, a despeito dopredomínio da malha de desenho irregularresultar em sua categorização entre osarquétipos de configuração espacial dacidade medieval, no século XII, com acriação das “bastides”, que “foramfundadas como bases comerciais emilitares, a partir de um plano geométricopredeterminado” (LAMAS, 1992, p. 151),houve a reintrodução do emprego dotraçado ortogonal. No entanto, mesmoservindo-se da regularidade como um dospreceitos básicos, tanto nas novas“bastides” como nas implementadas apartir de núcleos preexistentes, a malhaortogonal não possuía padrões de simetriatão rígidos como nas cidades gregas ouromanas, onde predominavam quarteirõesde contornos retangulares e quadrados.Algumas características das cidades decrescimento orgânico foram incorporadasao traçado de várias “bastides”, entre asquais, Kinston-upon-Hull, resultando numacomposição harmônica de formasgeométricas variadas.

Se comparada a suasantecessoras, também se destaca o fato deter sido na cidade medieval que oquarteirão “deixou de ser apenas um meiode loteamento e divisão cadastral do solo,para se constituir também como elementomorfológico do espaço urbano” (LAMAS,1992, p. 151). Foi especialmentediferenciado o seu papel no processo de

estruturação da forma da cidade e tambémna configuração espacial da paisagem.Como os edifícios eram posicionados noslimites das quadras, no alinhamento darua, ao mesmo tempo em que definiam otraçado das vias, estabelecendo os limitesentre o público e o privado, liberavam ointerior das quadras para o cultivo dehortas e jardins. Assim sendo, os jardinsdesta época “tinham como característicacomum o espaço fechado, íntimo,emparedado, fortemente defendido contrao mundo exterior” (PEREIRA LEITE, 1994,p. 34-36).

Outro fator que marcou aheterogeneidade da organizaçãomorfológica medieval em relação asanteriores é que esta ultrapassou asfronteiras do velho mundo, sendoincorporada às estratégias de colonizaçãoeuropéia. Sobretudo em colôniasportuguesas como o Brasil, num primeiromomento, esta forma de disposiçãoespacial se materializou numa série deimplementações urbanísticas, isto é, “osantigos núcleos urbanos brasileiros foramconstituídos segundo o modelo dascidades do Medievo português”(KOHLSDORF, 1985b, p. 16). Seu legadotraduz tanto, que para LE GOFF (1998, p.25), “a cidade contemporânea, apesar degrandes transformações, está maispróxima da cidade medieval do que estaúltima da cidade antiga”.

A ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DACIDADE NA ÉPOCA MODERNA

Foi entre o princípio doséculo XV e o final do XVIII, ao longo daÉpoca Moderna ou Era Pré-Capitalista, quea desgastada ordem medieval viveu umirreversível processo de decadência que, aocontrário do que seria lógico imaginar, nãoocasionou o desaparecimento de sua formade organização espacial. Marcada pelacoexistência de símbolos e valoresantagônicos, esta se caracterizou numa“fase intermediária na qual o novo e oantigo se misturaram, [...] foi apenas nas

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cidades recentemente fundadas [...] que asinstituições pós-medievais criaram umaordem rigorosa e lógica inteiramenteprópria” (MUMFORD, 1991, p. 376-378).Em síntese, aconteceu uma lenta eininterrupta etapa de modificaçõesestruturais que afetou todos os aspectos davida urbana européia simultaneamente aum processo de renovação e adaptação dospadrões medievais ao novo contexto.

Em parte, este panorama detransformações foi estimulado pelapropagação das idéias do movimentoHumanista que, de maneira gradativa, seconsolidou como o alicerce da concepção deuma nova mentalidade intelectual eartística. No âmbito cultural, amaterialização do advento dos temposmodernos aconteceu na Itália ainda noséculo XV com a eclosão do Renascimento.Conforme LAMAS (1992, p. 167) e MORRIS(1992, p. 175), enquanto na História doUrbanismo, o período Renascentista seestende do início do século XV ao final doXVIII, por toda a Época Moderna, na Históriada Arquitetura, considerando apenas osaspectos cultural e estético, não asdiferenças cronológicas e as particularidadesem cada país ou região, este é dividido emquatro momentos distintos:

•P r ime i r o Renasc imen to :restrito à Itália (1420-1500);•Renascimento Tardio: (1500-1600);•Barroco: (de 1600 aaproximadamente 1765) e;•Rococó e Neoclássico: (1750-1900).

Assim como no Humanismo,um dos princípios básicos doRenascimento era a busca nos valores, naprodução cultural e nas ruínas urbanas daAntiguidade Clássica por respostas paraos questionamentos e também pormodelos passíveis de serem adaptados ouincorporados à nova situação. De acordocom PEREIRA LEITE (1994, p. 17), a novaconjuntura ideológica em eclosão erapropícia à formação de uma “atitude

capaz de influenciar a organização doespaço, ligada, não mais às relações dohomem com seu entorno imediato, mas,principalmente, às relações do homemcom o universo como um todo”.

Entretanto, apesar dastransformações ideológicas, sócio-econômicas e culturais, bem como dodesenvolvimento de teorias, desenhos etratados urbanísticos, no plano dasrealizações concretas, as construçõesurbanas do início deste período detransição foram insignificantes secomparadas às arquitetônicas oucenográficas. Isto levou alguns autores,entre os quais MUMFORD (1991), aafirmar que não existe propriamente umacidade renascentista. Segundo SERRA(1987, p. 17), “há, contudo uma idéiaclara de como ela deveria ser e,principalmente, de como não deveria ser”.Em outras palavras, uma das maiorespeculiaridades desta fase é que “o espaçourbano persegue, uma idéia formalcontida no desenho, e se comprometemais com o ‘projeto’, com um momentoabstrato da criação anterior à construção”(BRANDÃO, 1991, p. 60).

Neste universo em que adimensão intelectual estabeleceu adistinção entre a produção do arquiteto e ado artesão, o emprego dos paradigmas epreceitos da Antiguidade Clássica foiincondicional, “o desenho de arquitectura,as teorias estéticas e os princípios deurbanismo irão obedecer a idéiassemelhantes – sendo a principal o desejode ordem e disciplina geométrica” (LAMAS,1992, p. 168). Entre as relíquias clássicasutilizadas como fonte de inspiração para asutópicas tentativas de concepção da cidadeideal renascentista, os fragmentos da obrade Vitruvio descobertos em 1412 epublicados em 1521, “adquiriram umsignificado cultural e místico” (LAMAS,1992, p. 167), tornando-se referênciaobrigatória para os tratadistas.

Assim sendo, aliada àspreocupações militares com segurança edefesa, sobressaiu-se como requisitobásico para a definição do desenho da

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muralha que circundaria o núcleo urbano,o cuidado de Vitruvio em resguardar acidade da ação dos ventos dominantes,que no entender dos estudiosos eram emnúmero de oito. Conseqüentemente, “foiaprovada como idealmente perfeita acidade poligonal de oito ou mais lados,que tende, em última análise para umaorganização circular, possuindo, portantoum centro” (GOITIA, 1996, p. 104). Parao planejamento do traçado e locação damalha urbana foram adotados doiscaminhos diferenciados. Enquanto atentativa de dissipar a força dos ventosdominantes por meio do posicionamentodas ruas em ângulos estratégicos fez comque alguns tratadistas procurassemadaptar uma planta regular, em tabuleirode xadrez, ao interior de uma formapoligonal, a lógica geométrica motivououtro grupo a optar por um traçadoradial. Posteriormente, houve também abusca pela conciliação das “vantagens dotraçado rectilíneo às do radioconcêntrico”(GOITIA, 1996, p. 106).

No entanto, a despeito detodas as realizações projetuais, na prática,as implementações urbanísticas dosséculos XV e XVI, não foramsuficientemente expressivas para alterarradicalmente a configuração espacial quena maioria significativa das cidades dovelho mundo, havia se consolidado aolongo da Idade Média. Estas se limitaram aintervenções localizadas, restritas a pontosespecíficos da malha urbana, caracterizam-se em “trechos de ordem renascentista,espaços abertos e clarificações quemodificam belamente a estrutura da cidademedieval” (MUMFORD, 1991, p. 379).Segundo LAMAS (1992, p. 168) e MORRIS(1992, p. 176), esta se distinguiu comouma fase do Renascimento em que oplanejamento dos espaços urbanos ficourestrito especialmente a cinco campos deatuação, ou seja:

•Construção de sistemas defortificações;•Modificação de zonas da cidadecom a criação de espaços

públicos ou praças earruamentos rectilíneos;•Reestruturação de cidades pelorasgamento de nova rede viáriaprincipal;•Construção de novos bairros eexpansões urbanas,u t i l i z a n d o q u a d r í c u l a sregulares;•Criação de um número limitadode novas cidades.

De acordo com BRANDÃO(1991, p. 60), no que se refere àconfiguração da paisagem, asparticularidades que conferem identidade àurbanística Renascentista como um todo,distinguindo-a como um conjunto, sãoespecialmente, “a destacada presença daarquitetura civil, centralização,homogeneidade, ideal de forma pura,geometrismo e perspectivismo dacomposição”. Em outras palavras, nesteperíodo em que

“a Renascença artística dominatoda a Arquitetura e a ArteUrbana se confunde com oPlanejamento Urbano, a igrejaou catedral [...] passa a terdestaque especial em grandespraças ajardinadas. Fontesesculturais, estátuas, colunas eobeliscos decoram as praças.[...] As construções, de carátermonumental, são salientadaspelas perspectivas de ruaslargas, confluindo para elas”(FERRARI, 1991, p. 225).

Adotando como referência àperiodização da História da Arquitetura, foisomente na fase Barroca, que emconseqüência das intensas transformaçõespolíticas e econômicas, estas tendênciasf u n d a m e n t a i s d a o r d e mRenascentista se fizeram inteiramentevisíveis e passaram a dominar a paisagemurbana. MORRIS (1992, p. 175), afirma queentre todas, esta é a única fase com especial“relevancia em la historia de la formaurbana”, ou seja, foi o momento em que o

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espaço da cidade adquiriu uma novadinâmica. Como reflexo e símbolo do podercentralizado, “a cidade passa a ser olhada,sobretudo como espaço político, como umcentro de decisão poderoso, de grandeimportância estratégica” (FERRARI, 1991, p.225). A recém criada Capital se transformanuma “condensação localizada dosinstrumentos políticos exigidos pelo Estado”(GOITIA, 1996, p. 129).

A diversidade em relação àsetapas anteriores acontece, sobretudo nogênero de tratamento dado a um de seusprincipais elementos morfológicos, aArquitetura. Neste período em que noplano das realizações concretas, ospreceitos renascentistas de composiçãoatingem um amplo sentido de unidade é,especialmente por meio da valorização euso da perspectiva, que o princípiobarroco de “criar uma cidade como obrade arte da percepção visual imediata”(GOITIA, 1996, p. 135), confere aArquitetura o “status” de monumento.Deste modo, esta se converte num dosprincipais artefatos estruturadores daforma e paisagem da cidade. Estatendência dos monumentos quesimbolizam o poder, ou seja, dos edifíciospossuidores de valor e significação social,política ou religiosa ostentarem cuidadono desenho e organização das fachadas eserem posicionados ao redor de umapraça, fechando um eixo de perspectivamonumental dominou “todo o períodoclássico até à urbanística formal do séculoXX, mergulhando ainda no MovimentoModerno” (LAMAS, 1992, p. 184).

Ao longo do Renascimentoos espaços verdes, antes restritos aambientes fechados, foram incorporadosà paisagem da cidade, começando a fazerparte do grupo de elementos morfológicosde composição urbana. Ambientes como orecinto arborizado, o parque, o jardim opasseio e a alameda, passaram aconstituir uma nova categoria tipológica,propícia ao lazer e práticas sociais(FERRARI, 1991, LAMAS, 1992, GOITIA,1996). Outro elemento morfológico que,nesta época, assumiu configurações no

mínimo semelhantes às contemporâneasfoi o quarteirão. Este

“torna-se uma figuraplanialtimétrica delimitada porvias e que se subdivide em lotese edificações – cumprindo adivisão fundiária do solo – eorganização geométrica doespaço urbano. O quarteirão vaiassumir formas, dimensões ev o l u m e s d i f e r e n t e s ,c o n s o a n t e o s e uposicionamento na estruturaurbana. [...] Nas cidades novasde colonização anglo-saxônica efrancesa na América do Norte,ou de colonização portuguesa eespanhola na América do Sul, oquarteirão é aí um elemento daquadrícula repetível com amesma geometria e dimensão –seguindo a tradição de Mileto. Éuma unidade-base elementarque, por repetição e extensão,formará a cidade” (LAMAS,1992, p. 188).

Em síntese, foi noRenascimento que os princípios básicos dedesenho e composição estrutural da formaurbana fundamentados em elementosmorfológicos como o quarteirão, o lote, omonumento, o edifício, a rua e a praça,adquiriram os contornos que perduramaté os dias atuais.

A CIDADE E A NOVA DINÂMICAIMPOSTA PELA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Com o brusco rompimentona ordem econômica esocial que aconteceu simultaneamenteao “colapso da tradição humanista, quedominava o pensamento europeu”(PEREIRA LEITE, 1994, p. 43), apaisagem da urbana ainda viveu o últimoe possivelmente o mais contundentemomento de transformação sucedido atéentão. O espaço da cidade se tornou palcopara o desenvolvimento de estruturas

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espaciais que sucessivamente iam seincorporando ao conjunto e compondonovos modelos tipológicos. Todavia, asistemática de estruturação e composiçãoda forma urbana conservou a dinâmicapreviamente estabelecida, “a rupturamorfológica que se processa no séculoXIX é de dimensão, escala e forma geralda cidade” (LAMAS, 1992, p. 203).

Notadamente desencadeadapela implementação de profundasmudanças nos modos de produção, aalteração radical no tradicional equilíbrioentre cidade e campo foi um dosprimeiros fenômenos a se concretizar.Acontecendo ao mesmo tempo em que aexpansão do mercado e estimulada porum acelerado desenvolvimento industrialfundamentado na divisão do trabalho,esta modificação na forma de distribuiçãopopulacional no território deu origem aum crescimento demográfico semprecedentes (BENEVOLO, 1994). Este porsua vez, provocou a expansãodesordenada das cidades e foiresponsável pelo aumento expressivo desua complexidade estrutural. Nesta novadinâmica imposta pela RevoluçãoIndustrial, os antigos limites definidospelas muralhas foram ultrapassados pelasáreas urbanizadas que se distribuíram demaneira descontínua e indiscriminadapelo território dando origem, por um lado,à indefinição dos perímetros urbanos epor outro, ao aparecimento daespeculação fundiária.

“É neste período que surgemgrandes extensões deloteamentos que repetemquadrículas até à exaustão,sem preocupações urbanísticasou estéticas. [...] Os interioresd o s q u a r t e i r õ e s s ã odensificados. Aparecem as‘ilhas’ e ‘vilas’ comoaproveitamento do solo, paraconstrução de casas para asc l a s s e s o p e r á r i a s m a i sdesfavorecidas. A cidadedesenvolve-se por extensão deloteamentos e construções, e

não pela organização do espaçourbano” (LAMAS, 1992, p. 208).

Entre os artefatos que setransformaram em elementos morfológicosde composição e estruturação espacial dacidade, a fábrica foi o primeiro a gerarmudanças, influenciar a organização física ese destacar na paisagem. Principalmente apartir da invenção da máquina a vapor em1775, as fábricas, que eram movidas àenergia hidráulica e precisavam serinstaladas às margens de correntes fluviais,passaram a ser implantadas em espaçosdefinidos, próximas umas das outras,produzindo alta concentração industrial, bemcomo, favorecendo e incrementando aprodução em massa. Como a “divisão dotrabalho, a mecanização e a possibilidade deobter fontes de energia, também odesenvolvimento dos meios de transporte foioutro factor fundamental para que oindustrialismo prosperasse e, com ele, osgrandes centros fabris” (GOITIA, 1996, p.157). Já no final do século XIX, quando “aprática construtiva se desloca da arquiteturapara a engenharia e a técnica sobrepõe-se àarte”, o homem supera seus antigos limites(FERRARI, 1991, p. 229). Foi o momento emque ao se firmar como o último artefato aentrar para o grupo dos elementosmorfológicos que dão forma a paisagem, oarranha-céus consolidou o processo demudanças que definiu e estruturou acomposição espacial básica da cidadecontemporânea.

Esta seqüência de fatos quegerou profundas transformações em todos osníveis do cotidiano foi responsável por umasubstancial redução na qualidade de vida,sobretudo das camadas populares. SegundoFERRARI (1991, p. 230), a realizaçãomáxima deste processo foi “a dicotomiaprodução-consumo que originou nas cidadesdois grupos antagônicos: ‘trabalhadores’residindo em cortiços, favelas centrais ouperiféricas e proprietários dos meios deprodução (burgueses) em bairrosresidenciais” que se distinguiam napaisagem, entre outros fatores, pela baixadensidade, luxo das habitações e presença

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de áreas verdes. Em síntese, a novaconjuntura, baseada na economia capitalistaproduziu uma cidade ao mesmo tempoburguesa e industrial, mergulhada emnumerosos problemas estruturais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Independentemente daparte física da cidade habitualmente serassociada aos elementos estruturais doambiente, enquanto a abstrata érelacionada, sobretudo aos aspectosconceituais, emocionais, históricos esimbólicos, é evidente que o equilíbrio e aharmonia na interação entre ambascaracterizam-se em condições básicaspara a consolidação das relações deidentidade e para a atribuição designificados. Isto significa que além deencontrar-se subordinada àscaracterísticas dos elementos estruturais,a definição da forma está igualmentecondicionada a fatores como os materiaisdisponíveis no local ou nas proximidades,as tecnologias aplicadas, a cultura e asnecessidades socialmente definidas.

Assim, à medida que cadainovação tecnológica é apropriada pordeterminada sociedade, vai deixando seusreflexos nas formas de organização social,política e econômica das sociedades e, porconseguinte imprimindo suas marcas noespaço físico das cidades. Entretanto, adespeito das expressivas variações naconfiguração da paisagem ao longo dostempos, não aconteceram mudanças nomodo tradicional dos elementosmorfológicos estruturais, ou seja, doquarteirão, lote, edifício, fachada, rua,praça, monumento, etc., se relacionar.

Por outro lado, enquanto noaspecto geral a configuração espacial dacidade aparentemente conserva suasprincipais características, no pormenorpermanece em constante transformação,não podendo ser vista como um produtoacabado. Logo, cada elemento morfológicoque atua na configuração espacial dacidade não revela apenas a história de uma

época, estilo e idéia, traz consigo um modode conceber a vida em sociedade.Caracteriza-se ao mesmo tempo emsímbolo e materialização de sonhos,ideologias e aspirações. Neste contexto,especialmente em conseqüência dosavanços tecnológicos, o suporte físico quepor longo tempo se destacou como oprincipal elemento estruturador da formada cidade se torna vulnerável atransformações, ficando sujeito a exercerum papel secundário no processo dedefinição da configuração espacial, quepassa a ter como elementos estruturaisartefatos construídos pelo homem, isto é, aArquitetura.

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Francisco Crivelaro 1

Luis Carlos Paschoarelli 2

José Carlos Plácido da Silva 3

Crivelato, Francisco; Pachoarelli,L.C eSilva,J.C.P. O uso de mobiliário doméstico noespaço habitacional: Parâmetros de usabilidadepara o projeto de sofas. Revista AssentamentosHumanos, Marília, v5, n.1, p53-60, 2003

RESUMO

O estudo do espaço habitacionalenvolve a análise de suas funções eatividades, as quais são influenciadas peladisponibilidade, dimensionamento evariabilidade dos equipamentos emobiliários domésticos, sendo um reflexoda organização sócio-econômica e culturalde seus usuários. Observa-se nas últimasdécadas uma evolução dos conceitos dehabitação, caracterizada pela diminuiçãodo espaço habitacional e aumento nademanda de novos equipamentos emobiliário. Esse quadro indica a ausênciade estudos que verifiquem esses problemase apresentem parâmetros para o projetodesses equipamentos e mobiliários. Osobjetivos desse trabalho foram analisar ouso e desempenho da “sala de estar”, seusequipamentos e mobiliários; e apresentarparâmetros de usabilidade para o design desofás, o qual desempenha as funções maisimportantes desse ambiente. Foramanalisados 31 apartamentos residenciais nacidade de Bauru (SP), junto comentrevistas com os residentes, objetivandocompreender a respectiva percepção deuso e ocupação do espaço. Os resultados

O USO DE MOBILIÁRIO DOMÉSTICO NO ESPAÇOHABITACIONAL: PARÂMETROS DE USABILIDADE PARA

O PROJETO DE SOFAS

1Graduado em Desenho Industrial; DDI – FAAC / UNESP; [email protected] Mestre em Desenho Industrial; DDI – FAAC / UNESP; [email protected] Livre-docente; DDI – FAAC / UNESP; [email protected]

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apontaram novas atividades no ambientede estar, exigindo a utilização de novosequipamentos e mobiliários; além daelevada dimensão dos sofás, se comparadoa sua função. Constata-se assim, que asexigências da habitação não estão sendoconsideradas no projeto arquitetônico e nodesign dos equipamentos e mobiliário,sendo necessário à aplicação deparâmetros de usabilidade para o projetodesses ambientes, equipamentos emobiliário domésticos.

Palavras-chaveespaço habitacional; design de mobiliário;usabilidade

Key-wordshabitational space; furniture design;usability

ABSTRACTThe study of the habitational space

it involves the analysis of its functionsand activities, which are influenced by theavailability, sizing and variability of theequipment and furniture, being a conse-quence of the social-economic and cul-tural organization of its users. An evolu-tion of the concepts of habitation, charac-terized for the reduction of the habita-tional space and increase in the demandof new equipment and furniture isobserved in the last decades. This sceneindicates the absence of studies that ver-ify these problems and present parame-ters for the project of these equipmentand movable. The objectives of this workhad been to analyze the use and perform-ance of “living room”, its equipment andmovable; e to present parameters ofusability for design of couch’s, whichplays the functions most important of thisenvironment. 31 residential apartmentsin Bauru city (SP), together had beenanalyzed with interviews with the resi-dents, objectifying to understand therespective perception of use and occupa-tion of the space. The results had pointednew activities in the environment living

room, demanding the equipment use newand movable; beyond the raised dimen-sion of the couch’s, if compared its func-tion. One evidences thus, that therequirements of the habitation are notbeing considered in the project architec-tural and design of the equipment andfurniture, being necessary the domesticapplication of parameters of usability forthe project of these environments, equip-ment and furniture domestic.

1. INTRODUÇÃO

O estudo do espaçohabitacional envolve uma série de fatoresfísicos, psicossociais e culturais quedevem ser considerados no projetoarquitetônico e no design deequipamentos e mobiliário domésticos.Assim, a análise das exigências, funçõese atividades desse espaço pode serconsiderada o princípio e afundamentação a qualquer discussãonesse sentido.

As principais variáveis dessaanálise são influenciadas peladisponibilidade, dimensionamento evariabilidade dos equipamentos emobiliário domésticos, sendo essainfluência um reflexo da organização social,econômica e cultural de seus usuários.

O estudo do espaço da atividadesempre foi uma preocupação no projeto dearquitetura, embora também direcionadapara o projeto de mobiliário eequipamentos domésticos (BOUERIFILHO,1994a). De acordo com BOUERIFILHO (1994b) e KLEIN (1980), dentro deuma adequada política habitacional, deve-se levar em consideração, além de dadosantropométricos; as funções e atividadesexercidas em cada espaço; os hábitospessoais na utilização do ambiente,equipamentos e mobiliário; as dimensõesdo mobiliário; e também a evolução emutação dentro da organização social,cultural e econômica.

As necessidades mínimasespaciais foram definidas entre os séculos

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XVIII e XIX, mas tem sido sucessivamenteequacionadas de acordo com a evolução etransformação das necessidades familiares.PORTAS (1966, apud PASCHOARELLI &BOUERI FILHO, 1999) enumeram trêsmodificações significativas responsáveispor mudanças nos projetos de arquiteturae equipamentos: 1. “modificação do papelda mulher na casa” - decorrente dainstrução e trabalho profissional, havendo anecessidade de se racionalizar o projeto decozinha e estar, integrando-se num únicoespaço, alem de criação de novosequipamentos mecânicos para execução departe das refeições, arranjos da casa, etc.2. “intensificação da vida ativa no lar” -graças ao aumento do tempo livre e maiorpermanência em casa com o consumo demeios de comunicação (notadamente atelevisão), aumento de reuniões informaisentre amigos, além de utilização doambiente doméstico como local de trabalhoe aumento do conjunto de equipamentos emobiliários. 3. “novo equilíbrio entreprivacidade e vida social” - havendo anecessidade de separação e comunicaçãoentre os espaços interiores e exteriores,zonas intimas e sociais.

No Brasil, o custo elevado dasconstruções e o reduzido orçamentofamiliar reflete diretamente no problemade dimensionamento de ambientes comáreas mínimas, uma vez que nãoconsidera o arranjo dos espaços eequipamentos utilizados no ambiente emquestão (BOUERI, 1994b). Entretanto, deacordo com PORTAS (1969), essaproblemática não deve resultar em áreashabitáveis aquém dos espaços mínimosabsolutos, uma vez que a reduçãoexcessiva do espaço habitado e dosequipamentos influi diretamente noconforto fisiológico, aumentando aprobabilidade de surgir entre oshabitantes, problemas neurológicos dedelinqüência, de doenças físicas e fadiga.

Segundo BOMM et al. (2003) aminiaturização dos espaços da habitação,ocasionada principalmente pelo fatoreconômico, leva a formação de ambientesque não consideram a posição, as

dimensões e as características deutilização destes equipamentos. Paraevitar tal prejuízo, é preciso terconhecimento dos usuários do espaço edas atividades normalmente exercidas,além de fazer um levantamento doequipamento doméstico destinado aodesenvolvimento das atividades.

O ambiente de estar,popularmente denominada “sala” (funçãoestar/receber/reunião) agrupa umavariabilidade de atividades muito grande,que segundo PORTAS (1969) são:conversar, jogar, descanso, leitura, escritaindividual, ouvir radio, ver tv, atividades debricolagem, tocar musica, atender telefone,etc. Esse autor lista como mobiliáriosutilizados: sofá, cadeiras, mesa baixa,estante e bar/escrivaninha/costura. Mas,dada a diversidade que caracteriza ahabitação atual e a própria alteração doshábitos, estas correspondências não seencontram já da mesma forma.

BOUERI (1994b) sugere comodimensionamento para a sala, a áreamínima de 15.00 m2, sendo 3.00 m adimensão linear mínima. E ainda faz aseguinte classificação: >18 m2 (ótimo),

18 a 15 m2 (bom), 15 a 12 m2

(satisfatório), 12 a 9 m2 (regular), 9 a 6m2 (precário) e <6 m2 (péssimo).

Ao considerar a planta damaioria dos apartamentos brasileiros nofinal do século XX, observa-se umadiminuição das áreas úteis, onde a cozinhae a sala passaram a compartilhar de ummesmo espaço, despensa e dormitório deempregada foram extintos e os escritóriosestão cada vez mais presentes. Aconfiguração familiar já não é a mesma,uma vez que há uma tendência aindividualização (solteiros, casais semfilhos e pais separados). Segundoarquitetos, construtores e pesquisadoresda área de arquitetura, o futuro apontapara um morador sozinho, que trabalha adistancia e se comunica virtualmente(CRUZ, 1998 e FLORESTA, 1998).

Dada a evolução e mudançassociais, econômicas e culturais (econseqüentemente mudanças nas

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necessidades, funções e atividadesdomésticas) a proposição de um espaçomínimo para uma sala, não tem nenhumsentido se não considerar odesenvolvimento de novas funções nesseambiente. Daí a necessidade de umestudo atual das funções e atividadesexercidas na habitação, particularmenteno ambiente de estar, o que deveresultar em parâmetros para odimensionamento e projeto desse espaçoe dos mobiliários e equipamentosutilizados no mesmo.

O objetivo desse trabalho foianalisar o uso, função e desempenho dosequipamentos e mobiliários no espaço dasala de estar de pequenosapartamentos, visando apresentarparâmetros de usabilidade(dimensionais) para o design de sofás,uma vez que esse mobiliário é o maiscaracterístico desse ambiente.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. Objeto de estudoForam definidos como objeto de estudo31 (trinta e um) apartamentos e seusresidentes, em edifícios com até quatrop a v i m e n t o s , s e l e c i o n a d o saleatoriamente dentro de 3 regiões commaior concentração de edifícios (Altosda cidade / Centro / Higienópolis) nacidade de Bauru (SP).

2.2. InstrumentosForam utilizados os seguintesinstrumentos: protocolo para execução daentrevista, Trena 4m – Steel Tape China eMáquina fotográfica – Canon EOS 3000.

2.3. ProcedimentosA abordagem deu-se nos finais de semana(sábado e domingo) entre as 16:00 e 19:00 h,por um período aproximado de 20 minutospor visita. Os dias e horários foram escolhidosem função da maior disponibilidade pelosentrevistados, já que a maioria trabalha

durante a semana. A abordagem aosresidentes foi prescindida por umaidentificação do entrevistador, justificativa daentrevista bem como finalidade do estudo e oporquê da escolha do entrevistado. Foram coletados dados sobre o número deresidentes, número de dormitórios noapartamento, área da sala, atividadesrealizadas na sala, número e tipo deequipamentos e móveis encontrados nasala de estar, tipo de sofá, condição físicados sofás, problemas apontados pelosresidentes no uso do sofá, tempo médio deuso do sofá além de sugestões para odesenho do sofá. Em alguns apartamentosforam realizados registros visuais atravésde máquina fotográfica.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir dos dados coletados etabulados, foram encontrados váriascondições que apontam para asproposições descritas na introdução desseestudo. No que refere ao número deresidentes, 48% dos abordados residemsozinho (Figura 1), o que confirma atendência de individualização apontada porCRUZ (1998) e FLORESTA (1998).

Nota-se que os edifíciosa n a l i s a d o s t e m c o m ocaracterística principal apartamentoscom apenas um dormitório (52%),resultado da própria miniaturização do

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Figura 1 – Porcentagem de residentes por apartamento.

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espaço urbano e da pequena área totalocupada. Além disso, a maioria dosapartamentos visitados possui salascom espaços muito reduzidos (Figura2). Se considerarmos a classificação deBOUERI FILHO (1994B), apenas 26%das salas podem ser consideradassatisfatórias, enquanto que 42%podem ser consideradas com uma árearegular e 32% com uma área precária.

Quanto às atividades realizadasna sala, constatou-se uma grandevariabilidade das mesmas, onde sedestacam o ato de assistir TV (87%), arealização de refeições (45%) e a reuniãocom visitas (42%), entre outras atividades.Observa-se assim que a sala se tornou ocentro de quase todas as atividadesdomésticas, desde informais como visitas(42%), lazer (19%) e ouvir música (16%),até formais como leitura (23%) e estudos(26%), caracterizando assim avariabilidade descrita por PORTAS (1969).Além disso, constatou-se também que amaioria das atividades realizadas dependedo uso do sofá.

Mesmo diante do reduzidoespaço da sala, nota-se o uso de váriosoutros móveis na sala, além da alteração dealguns móveis em decorrência de novasnecessidades. Os cinco móveis maisencontrados, além do sofá, foram: raque,mesa para refeição, mesa de centro, estantee mesa de computador (Figura 3). Devido àspequenas dimensões das cozinhas eintegração da mesma com a sala, 52% dosapartamentos possuem a mesa pararefeições no ambiente sala.

Devido à diminuição do espaçoda sala, a maioria dos apartamentosapresenta ou sofá com 2 lugares (55%)ou sofá com 3 lugares (77%). Notou-seainda que vários sofás sofreram algumtipo de interferência: foram reformados /encapados em 13% dos apartamentos; eatualmente 10% deles possuem umacapa, decorrente de problemas nadurabilidade do tecido e dificuldade demanutenção (limpeza).

Outro aspecto interessante éque 10% dos moradores possuem sofásmodulares; e 13% apresentam braçoscom largura maior ou igual a 30cm, o queaumenta a ocupação física do espaço.Quanto aos problemas no uso do sofá, umgrande número de insatisfações foiapontada, destacando-se o desconforto(32%) e problema com o tecido (32%).Observou-se uma relação entre queixasde desconforto e tempo de permanênciano sofá. Além disso, as principais queixassão decorrentes da elevada altura eprofundidade do assento, dificultando oapoio dos pés no chão e a posição corretadas costas. Quanto aos problemas com otecido, destacam-se a pouca durabilidade,sujeira e difícil limpeza. A elevadadimensão dos sofás (23%) acabaocasionando outros dois problemas: opeso elevado (19%) e a difícilmovimentação do mesmo (23%).

Quanto ao tempo depermanência no sofá, 32% dosentrevistados disseram permanecer nosofá mais de 4 horas, significando que o

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Figura 02 – Porcentagem de salas de acordo com faixas deárea em m2.

Figura 3 – Porcentagem de apartamentos que apresentamoutros equipamentos/ mobiliários além do sofá,

encontrados na sala.

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seu uso é bastante expressivo. Váriassugestões de melhoria do “desenho” dosofá foram apontadas pelos usuários,destacando-se: apoio para pés,possibilidade de realização de refeições eaplicação de rodízios e gavetas, entreoutros. Percebe-se que todas asrespostas são resultantes de expectativasdo usuário quanto a um melhor conforto ecomodidade durante o uso. Além disso,confirma-se a realização de atividadesdiversas sendo realizadas no sofá.

A alternativa de modularidadedo sofá é preferida pela maioria dosusuários (48%), uma vez que possibilita ouso em diversos arranjos (lay-outs) noambiente, além da facilidade demovimentação. 28% dos entrevistadosmanifestaram o gosto em alterar adisposição dos móveis, mas não o fazemdevido às instalações (posição das tomadase fios) além das elevadas dimensões dosmóveis e reduzido espaço do ambiente.

4.RECOMENDAÇÕESERGONÔNICAS PARA O DESIGN DE

SOFÁS

Conforme análise dos dadoslevantados, nota-se uma grandeporcentagem de insatisfações relacionadasao projeto arquitetônico dos ambientesanalisados e ao desenho dos equipamentose mobiliários utilizados. Dentre essesmobiliários, destacou-se a análise do uso edesempenho dos sofás; e nestes sentido,além dos problemas técnicos derevestimento e estrutura, constataram-seindicações de desconforto durante o uso domesmo, causados principalmente pelo nãoatendimento às recomendações deusabilidade (dimensionais eantropométricas) no projeto dessesprodutos. Assim, apresentam-se a seguir,algumas recomendações baseado naliteratura especializada, que poderãosubsidiar designer e arquitetos, nodimensionamento preliminar dessesprodutos.

4.1. Largura do assentoSegundo IBV (1992, p.103) a

largura mínima dos assentos em sofás deveser de 55 cm, uma vez que acomoda alargura dos cotovelos dos indivíduos depercentil 95º da população masculina. Jápara PANERO & ZELNIK (1989, p.134), alargura do assento deve considerar asdimensões da largura máxima do corpo dapopulação masculina de percentil 95º, ouseja, 71,1 cm. Entretanto esta dimensãodeve incluir no mínimo, o espaço para osapoios de um braço. Considerando dadosantropométricos da população brasileira(INT, 1988 p. 87), mais precisamente alargura cotovelo / cotovelo (sujeito sentado),população masculina e percentil 95º, tem-seo valor de 53,1cm. Nesse sentido, podemosconsiderar que a largura mínima livre de umassento de sofá deve ser de 55 cm; e quandoconsiderarmos a inclusão da largura do apoiode braço, esta dimensão não necessita sermaior que 71,1cm.

4.2. Altura do assentoSegundo IBV (1992, p. 101) o

assento deverá ser baixo, quando a funçãode descanso for preponderante,possibilitando que o usuário estire as pernas,já que estas se estendem quando o ânguloassento/encosto aumenta. Assim,recomenda-se a altura entre 38 – 40 cm paraângulos menores que 150º ; e 36 – 38cmquando o ângulo for maior que 150º. ParaPANERO & ZELNIK (1989, p.79 e 95) a alturado assento é definida pela altura poplítea dapopulação 5º percentil que é 35,8 cm,acomodando tanto usuários de menor comode maior altura poplítea. A altura popliteal(sujeito sentado) da população brasileira 5ºpercentil (INT, 1988, p.66) é de 39,0 cm.

Em se tratando o sofá de umassento de descanso, porém com posturasmenos relaxadas e utilização de ânguloassento/encosto < 150º, a dimensão daaltura do sofá deve estar entre 38 – 40cm.

4.3. Profundidade do assentoIBV (1992, p. 102) recomenda

para profundidade do assento algo entre 45– 48 cm, dimensões baseadas na

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profundidade poplítea da população depercentil abaixo da média, devido autilização por todos os usuários, inclusiveos baixos. PANERO & ZELNIK (1989, p.134) recomenda o uso de dados dapopulação de 5º percentil, que é de 43,2,já que essa medida acomodará o máximonúmero de usuários, tanto os de menorcomo os de maior profundidade poplítea.

A profundidade poplítea (sujeitosentado) da população brasileira de 5ºpercentil é de 43,5 cm. (INT, 1988, p73).Assim, pode-se considerar que aprofundidade do assento deve estar entre45 e 48 cm, atendendo assim ao maiornúmero de usuários.

4.4. Altura e largura apoio para osbraços

A dimensão do apoio para osbraços (IBV, 1992, p.107) varia segundo oângulo do encosto. Para pequena inclinaçãono encosto (100º - 110º) a altura do cotoveloestará entre 21 e 23 cm. A largura útil dorepousa braços deverá ser no mínimo 5 cm.Segundo PANERO & ZELNIK (1989, p.78) nodimensionamento da altura do apoio dosbraços, deve ser utilizado dados referente àaltura do cotovelo em repouso, aconselhandoo uso de dados relativos à população de 50ºpercentil - 23,6 a 24,6 cm. Já para odimensionamento da largura, recomenda 7,6– 15,2 cm. A altura do cotovelo (sujeitosentado) da população brasileira 50ºpercentil, segundo INT (1988, p.61) é 23 cm.Conclui-se que a altura do apoio para osbraços deve ter no mínimo 23 cm.

4.5. Altura do encostoIBV (1992,p. 107) sugere para

poltronas de descanso o encosto comdimensões entre 55 - 60 cm, devendo apoiardesde a zona lombar até os ombros. Paracadeiras multiuso adota 42 - 45 cm,dimensão que comporta o suporte torácico.

PANERO & ZELNIK (1989, p 129)também faz recomendações de altura doencosto apenas para cadeiras de multiuso,ficando entre 43,2 – 61,0 cm. A altura dotórax (sentado) da população brasileirapercentil 50º é 42,5 cm. Em se tratando o

sofá de um assento com funções múltiplas edevido a ausência de dados para tal, deveser adotado no mínimo 42,5 cm, dimensãoque acomoda a região torácica.

4.6. InclinaçõesIBV (1992, p.105), faz

recomendações de inclinações paracadeiras multiuso e poltronas, segundoatividades realizadas e posturasutilizadas. Para postura de descansointermediária, utilizada no sofá (entrepostura de descanso e postura erguida)aponta um ângulo de 115º. PANERO &ZELNIK (1989, p.128) também apontaângulos de assento / encosto somentepara cadeiras multiuso e poltronas -105º. Baseado nessas informações,concluiu-se que o ângulo assento encostodeve estar entre 105º e 115º.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise das funções eatividades desenvolvidas no espaçohabitacional caracterizam-se como umprocedimento metodológico próprio paraindicar os problemas de uso edesempenho do ambiente, equipamentose mobiliários, principalmente quando aevolução dos conceitos de habitação éum fato verificado.

Os resultados desse estudoapontam que as exigências espaciais dahabitação não estão sendo consideradasno projeto de arquitetura do ambiente edesign dos equipamentos e mobiliário,sendo necessário uma atuação conjuntaentre arquitetos e designers na definiçãode projetos da habitação e seusequipamentos domésticos e mobiliários,o que pode resultar na melhoria eotimização do uso do espaço, bem comona qualidade de vida de seus usuários.

6. BIBLIOGRAFIA

BOMM, R.T., BINS ELY, V.H.M. e SZÜCS,C.P. Adequação dos espaços mínimos da

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Samir Hernandes Tenório Gomes 1

Gomes,S.H.T. O impacto das novas tecnologiasinformacionais no contexto da arquitetura e darepresentação gráfica.Revista Assentamentos Humanos, Marília, v5,n.1, p61-70, 2003

RESUMOEste trabalho estuda os

impactos das novas tecnologiasinformacionais no âmbito da Arquitetura,principalmente, nos conceitos relacionadosà representação gráfica e seus elementosde interação no contexto projetual. Apesquisa avança, no estudo do processo devirtualização e digitalização que se têmconectado em todas as áreas daArquitetura, mais especificamente, nasnovas possibilidades alcançadas no campoda representação gráfica do projetoarquitetônico. Essa reflexão, não pretendeser um fato conclusivo e fechado, masoportunamente, criar um sentido apuradona crítica e na discussão desses novosparadigmas que a Arquitetura têmenfrentado no começo de um novo milênio.

PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura einformação; Representação gráfica;Virtualização e Arquitetura.

Key words : Architecture and information;Graphical representation; Virtual andArchitecture

ABSTRACT

This work studies theimpacts of the new information technolo-gies in the scope of the Architecture,

O IMPACTO DAS NOVAS TECNOLOGIASINFORMACIONAIS NO CONTEXTO DA ARQUITETURA E

DA REPRESENTAÇÃO GRÁFICA

1 Mestre em Ciência da Informação/UNESP e Doutorando do Programa de Pós-Graduação da FAUUSP - Professor naFaculdade de Engenharia e Arquitetura da UNIMAR

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mainly, in the concepts related to thegraphical representation and its elementsof interaction in the project context. Theresearch advances, in the study of theprocess of virtual and digital that if haveconnected in all the areas of theArchitecture, more specifically, in the newpossibilities reached in the field of thegraphical representation of the projectarchitectural. This reflection, does notintend to be a conclusive and closed fact,but opportunely, to create a refined direc-tion in the critical one and the quarrel ofthese new paradigms that theArchitecture have faced in the start of anew milenium.

INTRODUÇÃO

Planificar a atuação dainformação na área da Arquitetura,aparentemente é tarefa ainda muito poucoexercida por arquitetos, comunicadores oudesigners . A maneira recente como tem-sedesenvolvido a recente produção científicano país, no âmbito da informação, e maisespecificamente, com os reflexos das novastecnologias da informação junto àArquitetura , parece até agora ter geradopouco volume de produtos informacionaisna área da representação gráfica. Por outrolado, a interatividade de todos os camposdo conhecimento científico tem aberto umcaminho enorme de novas possibilidadesde investigações.

A Arquitetura tem sidodefinida como maneira de organizar oespaço; dessa maneira, decorrem osconceitos de organização e de espaço e,sobretudo, as conseqüências das relaçõesentre eles. Organizar supõe estabelecerum sistema de ordem entre elementosque naturalmente apresentam-sedesordenado. Toda organização exige umamediação, um elemento ou forma. Exigeum signo que demonstra e indica a formade organizar; portanto, toda organizaçãoé lógica, é linguagem produzida atravésde signos, que por sua vez sãorepresentações desta organização.

Em conseqüência, essa“tradução” faz com que se entenda alinguagem da Arquitetura como submissaaos veículos expressivos usados, nopresente e no passado, para a comunicaçãodas soluções projetivas; assim, passa-sedo croqui ao desenho técnico, da maqueteaos recursos infográficos. Nos anos 80,esta formulação começa a ganhar maisespaço, chegando à sua consolidaçãofinalmente nos anos 90 . O suporte digitalna Arquitetura já é uma realidade. Ainformação agora não só configura suaatuação nos suportes convencionais, masse estabelecem nos novos suportesinformáticos. Lévy (1996, p.67 ) destacaesta mudança dizendo :

Nos laboratórios de química desíntese, nos departamentos deengenharia de arquitetura, deurbanismo ou de construçãomecânica, onde sãoconcebidos os novos circuitoseletrônicos de alta velocidade,utilizam-se sistemas deconcepção assistida porcomputador (CAD).

A Arquitetura, estudada comolinguagem, é fluida e mutante como a cidadee essa mutação caracterizam o repertóriocultural que transita do emissor arquiteto aousuário-receptor, para fazer conviverquantidade e qualidade de informação; é ,sobretudo para ambos, uma constanteexigência de escolha entre alternativas.

O estudo da Arquitetura,como linguagem, propõe o estudo do espaçoconstruído e habitado nas suasrepresentações e no diálogo histórico queestabelece entre maneiras de pensar etransformar o espaço. Entender aArquitetura como linguagem é assumi-lacomo instrumento de intervenção cultural,interagindo arquiteto e usuário.

A constituição paulatina deuma imensa rede de comunicação modificoutotalmente a nossa relação com o espaço e oacesso à informação tornou-se uma atitudefundamental em nossa atividade humana.

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Até bem pouco tempo atrás, seria difícilpensar que o processo cumulativo destarevolução informacional poderia de, umacerta forma, influenciar a Arquitetura e arepresentação gráfica.

VIRTUALIZAÇÃO E ARQUITETURA

Orciuoli (2000) abre umareflexão sobre a Arquitetura inseridanum cenário que pode ser chamado deglobalizado, imáterico ou digital,sugerido pelas novas tecnologiasinformacionais. Portanto, um olharoblíquo do estudo das práticas urbanas eda Arquitetura, em processos deglobalização e informatização vividospela experiência contemporânea,estabelece novos conceitos e modos devida, a partir da revolução tecnológica. Aminiaturização,a desmaterialização e aaceleração dos fluxos de informação sãofenômenos atuais que fazem com que osuporte físico tenha cada vez menosimportância. Novas possibilidades do“ser e estar” nos levam a ambientesregidos pela cibernética e pelavirtualidade.

Mas , de que maneirapercebemos estas e outras alterações, emnosso dia-a-dia ?. Algumas modificaçõessão realmente evidentes e trazem, à nossavista, elementos impressionantes eparadigmáticos de nossa vivência urbana.A invasão dos computadores pessoais emnossas atividades bancárias ou aintercomunicação entre as pessoas pormeio da Internet gera, a cada instantenova informações que são incorporadas emtoda essa rede mundial de comunicação.

Esclarecendo sobre estasmodificações, Novak (1999) nos diz :

Após um século de surpresas, aArquitetura depara-se com amaior de todas elas : odesenvolvimento de uma formasem precedentes de espaçodigital urbano e arquitetural, umespaço público global e sem

existência física. Embora asinfra-estruturas deste domíniopúblico não-local se encontremjá em fase adiantada deconstrução, carecem ainda daatenção de um discursoarquitetural informado e crítico.

O processo de digitalizaçãotem afetado consideravelmente todos ostipos de mídias tradicionais, como opapel, as artes gráficas, o rádio e atelevisão, e tem feito com que esteselementos migrem rapidamente para amídia digital, capaz de portar os maisvariados suportes informacionais. Atecnologia da informação tem permitidoesta digitalização em considerávelmedida, junto aos artefatos culturais,provocando no âmbito das manifestaçõesculturais, um turbilhão de mudanças. Épreciso atentar para a definição queNegroponte (1996, p. 234) faz destep r o c e s s o : “ d i g i t a l i z a r s i g n i f i c atransformar uma determinadainformação em seqüência ordenada debits, capazes de serem interpretados ereproduzidos pelos computadores.”

Quando utilizamos ainformação contida em um livro, osuporte físico deste funciona comoessencial para que a informação seja decerta forma manipulada, armazenada oucomercializada. Ao digitalizarmos,deflagramos um processo onde ocomputador funcionará como ummediador entre o usuário e ainformação. A informação digitalizadapode então assumir a idéia do nãoterritório , de um lugar não definido noespaço, podendo ser distribuída viaredes telemáticas, como por exemplo naInternet, onde a informação pode sercompartilhada de forma global. Lévy(1996, p. 49) evidencia esse processo,dizendo : “(...) a digitalização estabeleceuma espécie de imenso plano semântico,acessível em todo lugar , em que todospudessem ajudar a produzir, a dobrardiversamente, a retomar, a modificar, adobrar de novo...”

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A digitalização está colocadaapenas como um elemento importante emtodo este movimento maior que é avirtualização. Neste sentido, temos umadefinição de Lévy ( 1996, p. 70 ), quantoaos seus sujeitos mais importantes navirtualização do espaço e das coisas :

A virtualização não é umad e s r e a l i z a ç ã o ( atransformação de um real emum conjunto de possíveis),mas uma mutação deidentidade, um deslocamentodo centro de gravidadeontológico do objetoconsiderado : em vez dese definir principalmente poratualidade (uma “solução”), aentidade passa a encontrar asua consistência essencialnum campo problemático.Virtualizar uma entidadequalquer consiste em descobriruma questão geral à qual elase relaciona, em fazer mutar aentidade em direção a essainterrogação e em redefinir aatualidade de partida comoresposta a uma questãoparticular.

Os processos informáticosrepresentam, como técnica, o principalmeio de potencialização do virtual ou davirtualização. A informática permite avirtualização da inteligência, porque fazcom que ações complexas sejamdigitalizadas e reproduzidas. Podemosentão dizer que a digitalizaçãodesvincula a informação da sua mídiat r a d i c i o n a l , d e s v i n c u l a n d o a“inteligência” da personalidade eeliminando o sujeito desterritorializado.

O u t r o e l e m e n t obastante importante, que conecta todosesses conceitos pertinentes ao processo devirtualização na sociedade, é ociberespaço. Como nos afirma Orciuoli(2000), a partir da popularização do termociberespaço, com a publicação da novela

ciberpunk Neuromante , escrita por WilliamGibson em 1984, o sufixo ciber entrou novocabulário contemporâneo descrevendo-ocomo um universo entendido mais além deuma simples questão física, estabelecendointer-relações com as formas de condutada sociedade digital, que se convencionoualcunhar como ciberespaço. Segundodescreve Gibson, é o mundo criado enascido da justaposição entre a mentehumana e a cibernética. O artigo remontaaos princípios da cibernética, descrito porseu criador, Norbert Wiener. Kybernetes,em grego, significa timoneiro ougovernador, e foi aplicada pela primeiravez, em 1948, à teoria dos mecanismos decontrole da mensagem.

O traço contundente desteciberespaço se refaz em todos os níveisculturais, artísticos, afetuais e econômicos.Sabemos que as alterações radicais nosmais diversos referenciais perceptivos eestéticos provêm de um fenômeno bastantecomplexo em que se insere a cibercultura.Neste sentido, Virilio (1993, p. 15)esclarece, de maneira clara e fecunda, arelação estreita que se estabelece entre ainformação e a Arquitetura dizendo :

Definitivamente o debate emtorno da modernidade pareceparticipar de um fenômeno dedesrealização que atinge, deuma só vez, as disciplinas deexpressão, as formas derepresentação e deinformação. A atual polêmicaem relação ao midias, quesurge aqui e ali em função dedeterminados acontecimentospolíticos e de sua comunicaçãosocial, envolve igualmente aexpressão Arquitetura, quenão pode sera d e q u a d a m e n t edesvinculada do conjunto desistemas de comunicação, namedida em que está sempresofrendo a repercussão diretaou indireta dos diversos“meios de comunicação”(automóvel, audiovisual, etc.).

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ORGANIZAÇÃO ESPACIAL EVIRTUALIDADE

No final do século XIX ecomeço do século XX, os meios deprodução e representação tiveram papelfundamental de transformação naArquitetura. A invenção dos carros, aviõese sobretudo os trens, trouxeram para aArquitetura, um sentido de movimento evelocidade através de suas formasgeométricas. Nesse primeiro momento, aArquitetura tomaria conta da necessidadede se criar em mecanismos dedeterminação de percursos, roteiros eimagens em movimento. Ou seja, a idéiado movimento “real”, representado pelosmeios de transportes, foi crucial para que aArquitetura passasse por um processo detransformação. Este exemplo pode sermuito bem visualizado no desenho dacidade de Brasília, projeto dos arquitetosLúcio Costa e Oscar Nyemeier, onde acidade é símbolo da presença do carro,baseada em eixos de grande fluxo viário,apesar do projeto original estilizá-lo com afigura de um avião.

O conceito de formaçãoespacial da cidade sofreu transformaçõesradicais nas últimas três décadas no que serefere à organização urbana como um todo.A cidade se estruturava como uma espéciede introversão urbana, onde seus limitesterritoriais eram bem definidos e claros;cada aglomeração urbana funcionava comoum polo centralizador e único, fazendo dacidade um espaço restrito e fechado; aforma arquitetural do prédio traduzia maisa personalidade individual do Arquiteto, doque uma sensação de conjunto espacial.

Nesta perspectiva, a cidadedeixa de ser uma porta de entrada ou umarco do triunfo, para transformar-se em umsistema de audiência eletrônica, onde seususuários são menos habitantes , residentesprivilegiados, para se tornar em agentesdesmaterializados (usando o conceito deLévy). As tecnologias avançadas dociberespaço através de mutações

sucessivas, organizam e reorganizam omeio urbano, dando a ele aspectos dedissolvente e interativo.

Por outro lado, com ainterface da tela (televisão, computador,teleconfêrencia...), o que até então existiacomo elemento privado, passa agora aexpressar uma visibilidade face a face,desaparecendo as antigas confrontaçõesterritoriais, e o ato arquitetônico passa aestar desterritorializado, envolvido em umaaura eletrônica, desprovido de dimensõesespaciais e imerso no ciberespaço. Ousuário humano não pode mais considerara separação por barreiras físicas; hoje elaé resultante de um espaço urbanoparticipante de uma configuraçãoeletrônica, na qual o esquema do ponto devista visual e a trama da imagem digitalrenovam a noção de urbe. O esquema doespaço público/privado desaparece, dandolugar a uma nova relação arquitetural. Oque muda é uma nova planificação, muitasvezes imperceptível na interfacehomem/máquina, que toma lugar nasfachadas dos imóveis das cidades. Dessemodo, as informações, representadas nasuperfície da tela como imagens, não estãomais restritas a um espaço único, masestão sempre em permanente mutação eintercâmbio. Todas estas informações/imagens que temos disponíveis na tela,estão em constante processo develocidade, refletindo em cada espaçourbano, sua aplicabilidade espacial.

Confrontam-se aí doisprocedimentos participativos queinfluenciam este processo. O primeiro, dizrespeito aos elementos físicos econstrutivos; o outro elemento, o imaterial,que representa as imagens e mensagensque não possuem qualquer localizaçãofísica ou estabilidade espacial. É este tipode abordagem subjetiva do imaterial, quemuitas vezes fica “escondido” por detrásdas aparências mais claras. Os eixos elimites das cidades, das muralhas, ruas,edifícios, que ora existem- enquantosuperfície/imagem e ora se apagam,sofrem constante manipulação no universoinformacional. A revisão deste ponto de

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vista determina a mudança radical dapercepção do mundo, ajustando as técnicasinfográficas a um reajuste do real e daforma de representação da cidade e dosedifícios.

Uma outra maneira deavaliarmos o impacto da virtualização naArquitetura é assistirmos a uma produçãoda realidade sensível, na qual aspercepções diretas e mediatizadas seconfundem, para construir umarepresentação instantânea do espaçoarquitetônico. Esta observação direta podeainda ser chamada por um tipo deteleobservação do ambiente, transferindoseu resultado para o suporte digital. Aquelavisão euclidiana (um único ponto de vista)passa agora necessariamente por umdiluição espacial, onde um meta-conjuntode percepções se desmaterializam. Oespaço subverte-se a uma espécie deteleconquista das aparências e deredirecionamento espacial. Os novosveículos de comunicação e informaçãoultrapassam o modo tradicional de ação,produzindo a “videoperformance” datransmissão de imagens e representaçãoinstantânea dos dados. Como resultadodesta súbita mudança de visão, desapareceo componente dimensional volumétrico eemerge a transparência como forma dereorganização espacial.

A Arquitetura, consciente ouinconscientemente, passa por um processode fratura morfológica, diante de umasociedade informacional em constantemudança. A propriedade da transmissãoeletrônica, ao mesmo tempo em que criauma transparência dos objetosconstrutivos e renova as aparências físicasdos materiais , também altera aconfiguração morfológica da Arquitetura.Hoje, tratamos muito mais de estabeleceruma interface virtual, do que nosdeslocarmos espacialmente nos ambientes.Esta “desconstrução” dos elementosarquitetônicos pode ser notada nas grandesestruturas metálicas dos edifícios,valorizando muitas vezes o aspecto dovidro, concedendo a ele imagem detransparência e fluidez natural.

O GRUPO ARCHIGRAM

No começo da década de 70,

o grupo denominado Archigram1 começavaa antever o potencial que a tecnologia dainformação exerceria sobre a Arquitetura,nas suas mais variadas situações. Em1967, o Archigram montou uma exposição

em Londres, com propostas nadaconvencionais , onde o tema era “Viverem 1990”, e propunham uma casa em quetudo pudesse ser reduzido, ampliado,transformado de mil maneiras, onde osafazeres domésticos seriam função de umrobô e os materiais empregados em suaconstrução seriam diferentes dos usuais,indo desde partes de avião até perfis dealumínio. Mais de trinta anos depois, já nocomeço do século 21, ainda não vemosrealizadas por completo todas as previsõesanunciadas pelo Archigram mas, comcerteza, a tecnologia tem ocupado cadavez mais tempo e espaço na Arquitetura.Archigram procurou refletir sobre acidade através de seus mínimos detalhes,apresentando soluções inusitadas ecriativas, sempre implantando atecnologia a serviço destes ideais. A noçãode movimento na cidade, para o grupo, eraexplicada como os fluxos de alta, médias ebaixas velocidades do tráfego deautomóveis, de pessoas e carros quecompõem a vida urbana.

O processo de comunicaçãona cidade também desempenhava um papelextremamente importante nas idéias que ogrupo difundia. As redes de comunicaçãorepresentavam a principal estrutura urbana.Conforme estes postulados, Archigramcolocava em cheque o formato urbanotradicional das cidades, contrapondo-se àimensa rede de satélites que circundam aTerra, e disponibilizava um permanentecontato com centros comuns de distribuiçãoinstantânea de informações.

O grupo também pesquisouexperimentos em alguns equipamentos quecomporiam as unidades habitacionais

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projetadas. Entre eles, destacavam-serobôs, que eram programados paraexecutar diversas funções dentro da casa.Um dos elementos arquitetônicos da casaera uma parede de serviços, conectada auma rede metropolitana de serviçostelemáticos, que, a qualquer momento,poderia ser acessada pelos moradores.Essa idéia concretizava a oportunidade deum ambiente intercambiavel e mutável,através da inserção de serviços deinformação e comunicação dentro docontexto da cidade. Neste sentido, osobjetos arquitetônicos eram colocadoscomo interface informacional entre am á q u i n a / h o m e m , r e s u l t a n d oprofundas transformações espaciais.

Outro traço importanteproposto pelo grupo Archigram,direcionava a possibilidade da criação demalhas informacionais que conectassem aspequenas cidades do interior às grandesmetrópoles. Esta grande rede decomunicação e informação, já vislumbradapor este grupo, colocava em atividade TVs,sistemas audiovisuais, máquinas deentretenimento e jogos de iluminação, emum grande ambiente conectivo. Com isso, acidade seria uma grande teia de troca deinformações, mediada pelos novos meiosda tecnologia da informação e dacomunicação. Neste sentido, o grupoArchigram foi extremamente revelador einovador, trazendo a discussão deidentificar como a tecnologia de informaçãopoderia transformar o ambiente construído,de forma atuante e concreta.

Trata-se aí de umacontecimento importante para a Arquitetura,afetando basicamente seus princípiosorganizativos de espaço e colocando para asubstância arquitetônica novos pólosrepresentativos da essência da construção. AArquitetura, a partir de então, não se remetemais aos conceitos construtivosconservadores de paredes, tetos e coberturas,mas se apoia num ambiente carregado devirtualizações possíveis, repleto deinformações infográficas, tecnologiasc o m p u t a c i o n a i s e i n t e r f a c e smultidirecionais.

NOVAS POSSIBILIDADES EMREPRESENTAÇÃO GRÁFICA

Um exemplo bastante vivodas novas possibilidades em representaçãográfica é a utilização da informática nosprojetos auxiliados por computador(CAD) ea f a b r i c a ç ã o a u x i l i a d a p o rcomputador(CAM). Normalmente sãoprodutos realizados em softwares deauxílio de computador, como o AutoCad, eposteriormente texturizados e animadosem outros softwares , como o 3D Studio,entre outros. Hoje, um fato extremamentecomum, é encontrarmos publicações arespeito da “Arquitetura virtual”. Nosescritórios de Arquitetura, a invasão doscomputadores foi realmente muito grande.O abandono de algumas etapas naconcepção dos projetos, foi de grande valiapara diminuir o tempo considerável nodesenvolvimento projetual. Maquetesvirtuais são produzidas de formarelativamente simples, possibilitando aintervenção dos clientes e usuários comimagens digitais. Na fabricação auxiliadapor computador, a redução drástica dosciclos de “concepção-fabricação” écomprovada por todos aqueles queoptaram por estes sistemas.

A ferramenta de simulaçãono computador, na área da Arquitetura,vêm propiciando a sintetização de umasérie de imagens e percursos do objetoarquitetônico antes impossível de se fazer.A simulação é o passo seguinte; com ela,conseguimos aplicar as variações aosmodelos, colocando sob diferentes pontosde vista e diferentes possibilidades decondições “físicas”, as infinitaspotencialidades do modelo virtual. Comisso, podemos entender a simulação dasimagens sintéticas, não só como imagensfinais e acabadas, mas como uma “teia” deimensas correlações e extrapolações queo objeto pode adquirir.

O universo virtual e sintéticonão está além ou aquém do mundo “real”,mas estabelecido em um universo

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intermediário. Baseado em modelos lógico-matemáticos, este universo pode sertransformado em simulação “real”,vivenciada pelos usuários, por meio dasatividades sensoriais e intelectuais.

Diferentemente do queacontece com os suportes de capturaanalógica como a fotografia, o cinema oumesmo o vídeo, as imagens numéricas sãoconstruídas totalmente pelos homens.Esses projetos apresentam vistas eperspectivas dos edifícios de uma maneiramuito mais rápida e eficaz do que antes,quando eram feitas por desenhistas em umtempo muito mais longo. Esta integraçãovia computador, antecipa o produto finalpara os testes de amostragem efabricação. Mesas “captam” desenhosoriginais das pranchetas e migram para oambiente digital, formando assim imagensdigitalizadas e virtuais.

Esta interface amadurecea relação homem-máquina, na medidaem que substitui numerosas relaçõesmatemáticas de verificação. Podemosconcluir que o enquadramento do pontode vista dos projetistas na tela docomputador, não tem mais nada emcomum com o dos espectadores etelespectadores, ou a referência darepresentação gráfica e fotográfica, namedida em que a interface atingida poreste suporte digital possibilita umconjunto enorme de virtualizaçõesprováveis para seus usuários.

A confluência entre aArquitetura e as novas tecnologiasinformáticas trouxeram um pontoimportante de aplicação : o uso da tela docomputador para que, mediante arepresentação analógica do projeto, estepossa ser analisado. A tela, com oprograma correspondente, permite todotipo de manipulação : contemplar osinteriores a partir de pontos de vistasmutantes, comprovar que produzemdiferentes sistemas de iluminação,calcular a estrutura, estudar o processode realização da obra, ver o futuro edifícioem uma representação de seu contextourbano. A tela se converte, em definitivo,

numa representação diferente daspossibilidades de realidade que o desenhotem. A virtualização na Arquitetura e suaspossibilidades no campo digital,estruturam um novo conceito na feiturado projeto, refazendo assim etapas docaminho arquitetural.

Nesse momento, começaa acontecer o desdobramento da visão,ou seja, surge uma segunda ótica : ateleótica. Hoje é possível realizar umateleconferência entre São Paulo e Paris,em tempo real. A Guerra do Golfopossibilitou assistir ao vivo obombardeio de cidades e pessoas, emuma guerra eminentemente eletrônica.Vemos, pouco a pouco, o declínio deimportância da ótica geométrica, ou aótica passiva do espaço. A introdução dateleótica que vincula o sinal do vídeo,refaz a questão da digitalização destesinal, reconhecida por todos em todas asáreas, principalmente na utilizaçãorecente de espaços de realidade virtual.A superação da perspectiva geométricatradicional por uma perspectivaeletrônica gera, por assim dizer, umavisão de tempo real, pela recepçãoinstantânea dos sinais de áudio e vídeo.Este desdobramento da visão e do tempoafeta consideravelmente nossas relaçõesespaciais e até mesmo filosóficas.

Na realidade virtual, o usodo capacete (VPL) e da vestimentatransmissora de dados (Data Suit) nodomínio do espaço virtual(Ciberespaço),provoca um primeiro desdobramento dapessoa, entre atual e virtual. Oteleoperador, graças aos progressosrecentes da teletactilidade , faz com queo alto relevo do toque à distância venhacompletar a alta fidelidade sonora evisual. Tecnologias fazem surgir um novotipo de profissional na área daarquitetura, trabalhando exclusivamentecom esta teleótica do desdobramentohumano. Além de ampliar a nossa noçãode espaço, refazemos todas as nossaspercepções sensorio-motoras em todas asatividades desenvolvidas pela realidadevirtual. A criação de ambientes virtuais

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está bastante ligada ao realismo visual eà interação, usando os outros sentidos.Assim, assuntos como computaçãográfica em 3D , modelagem gráfica, einteração homem-máquina constituemuma parte fundamental na elaboração deambientes virtuais. Em bem poucotempo, poderemos experimentar estenovo meio de expressão na Arquitetura,de forma bastante disseminada, a partirdo momento em que essa tecnologiapermita a imersão e a interatividade noespaço.

Como nos apresenta Duarte(1999), as tecnologias digitaispossibilitaram a construção, a divulgação ea experimentação de ambientes em redesde informação. O computadorpotencializou, pelas linhas telefônicas, umuniverso incessante e multidirecional dainformação na sociedade contemporânea.Podemos citar, como exemplo destasaplicações, as possibilidades que vêmsendo exploradas com as tecnologias desimulação digital, no levantamentohistórico e na análise de edifíciosimportantes para a história que não maisexistem há décadas. Este trabalho dereconstrução vêm sendo principalmentedesenvolvido em escolas de Arquitetura,em diversos lugares do mundo, utilizandocomo ferramentas de trabalho, os modelose as imagens digitais desses prédios. Nessecompartilhamento entre informação eArquitetura, as relações com os espaçospúblicos ou privados, de certo modo, vêmoperando e expressando novas práticas nasociedade contemporânea, e atingindo aprodução de novos projetos, novas cidadesou novas instalações, num espaçoeminentemente digital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje em dia, a ComputaçãoGráfica tem um papel importante eminúmeras áreas, por exemplo: criação degráficos em negócios, ciência eeconomia, realização de mapas emcartografias, elaboração de desenhos de

novos produtos na área industrial,visualização de simulação e controle deanimação para simuladores de vôo ourealização de vinhetas em programas detelevisão.

Uma questão que seapresenta nesse novo quadro, descritoacima : de que forma o profissional deArquitetura e Urbanismo tem seposicionado frente às novas tecnologiasinformacionais, na aplicação direta narepresentação gráfica do projeto deArquitetura. Ou ainda, trazendo para ocampo das questões relacionadas aotema pergunta-se : quanto e de quemaneira o processo de representaçãográfica, na área da Arquitetura, tem-semostrado satisfatoriamente receptivo àsnovas tecnologias informacionais,diante da velocidade de produção etransferência da informação no mundomoderno?

Diante destas questões,é válido dizer que os profissionais deArquitetura, têm-se posicionado a favorda utilização das novas tecnologiasinformacionais no âmbito daArquitetura; mesmo dem a n e i r a m o d e s t a , t ê macrescentado novas responsabilidadese habilidades às tarefas que envolvamas conexões significativas inovadoras.Porém, o maior desafio, encontra-se nafalta de articulações estratégicascoerentes na representação gráfica, naárea de Arquitetura, que, a par dosmecanismos viabilizadores detransferência de informação, parecemnão qualificá-la como ferramenta dedesenvolvimento a todos os usuários.Dessa maneira, cabe ao profissional deArquitetura buscar o lugar naArquitetura na interface com os meioseletrônicos e digitais e se transformarnum catalisador de formas esignificações.

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BIBLIOGRAFIA

DUARTE, Fábio. Arquitetura etecnologias de informação. SãoPaulo: UNICAMP, 1999. 245 p.

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VIRILIO, P. A bomba informática. SãoPaulo: Ed. Estão Liberdade, 1999. 142 p.

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Samir Hernandes Tenório Gomes 1

Gomes, S.H.T. A atuação das bibliotecas e doscentros de informação no contexto dasdemandas telemáticas e informacionais. RevistaAssentamentos Humanos, Marília, v5, n.1, p71-82, 2003

RESUMO

Neste projeto de pesquisa,objetivamos propor o estudo analítico dasnovas possibilidades de atuação dasBibliotecas e dos Centros de Informação naárea da Arquitetura, considerando ocontexto das demandas Telemáticas eInformacionais, especificamente, no estudodas dimensões do espaço arquitetônico edo plano urbanístico. A verificação de umprocesso de convergência cada vez maisavançado centrado nas novas tecnologiasinformacionais e comunicacionais, noâmbito das cidades, tem provocado novassituações e intensas mudanças sociais,alargando sobremaneira, a problemáticados processos urbanos tradicionais. Aproposta deste trabalho, além de destacaros impactos e as propostas da informaçãoe da Telemática como instrumentossubsidiadores de desenvolvimento na áreada Arquitetura e da Sociedade, tambémanalisa e avalia a dimensão prática do usodas bibliotecas e centros de informação,aplicando os conceitos e os métodos daAvaliação Pós-Ocupação (APO), na medidaem que o ambiente construído dessesespaços tem afetado o comportamentohumano ou vice-versa nas relações doespaço arquitetural. A aplicação dessametodologia , especificamente relacionadaàs questões do ambiente e docomportamento, sugere destacar as

A ATUAÇÃO DAS BIBLIOTECAS E DOS CENTROS DEINFORMAÇÃO NO CONTEXTO DAS DEMANDAS

TELEMÁTICAS E INFORMACIONAIS

1 Mestre em Ciência da Informação/UNESP e Doutorando do Programa de Pós-Graduação da FAUUSP - Professor naFaculdade de Engenharia e Arquitetura da UNIMAR

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transformações latentes e suasrepercussões no território, principalmentea partir do papel das novas tecnologiasinformacionais nos centros urbanos e suasregiões. No contexto da proposta, osespaços e os serviços tradicionais dasbibliotecas e dos centros de informação dasnovas tecnologias informacionais, orearranjo, a flexibilização e /ou a expansãodesses espaços de ambientes na áreaestudada poderiam absorver novosrecursos e meios Telemáticos eInfográficos, possibilitando assim, noambiente construídos para maioradequação das funções exercidas.

PALAVRAS-CHAVES: Bibliotecas; MeiosTelemáticos e Infográficos; NovasTecnologias Informacionais

WORD-KEY: Libraries; Means Telematicand Infographics; New technologiesInformation

ABSTRACT

In this research project, we objectified topropose the analytic study of the new pos-sibilities of performance of the Librariesand of the Centers of Information in thearea of the Architecture, considering thecontext of the demands Telematic andInformation, specifically, in the study of thedimensions of the architectural space andof the plan urban. The verification of a con-vergence process more and more advancedcentered in the new technologiesInformation and communication, in theambit of the cities, they have been provok-ing new situations and intense socialchanges, enlarging excessively, the prob-lem of the traditional urban processes. Theproposal of this work, besides highlightingthe impacts and the proposals of the infor-mation and of Telematic as instrumentsdevelopment in the area of the Architectureand of the Society, it also analyzes and itevaluates the practical dimension of theuse of the libraries and centers of informa-tion, applying the concepts and valuationPowder-occupation’s methods (APO), in the

measure in that the built atmosphere ofthose spaces has been affecting the humanbehavior or in the relationships of the spaceurban. The application of that methodolo-gy, specifically related to the subjects ofthe atmosphere and of the behavior,he/she suggests to highlight the latenttransformations and its repercussions inthe territory, mainly starting from thepaper of the new technologies Informationin the urban centers and its areas. In thecontext of the proposal, the spaces and thetraditional services of the libraries and ofthe centers of information in the studiedarea could absorb new resources andmeans Telematic and Infographics, facili-tating like this, in the atmosphere of thenew technologies Information, I rearrangeit, the and /or the expansion of thosespaces of atmospheres built for largeradaptation of the exercised functions.

INTRODUÇÃO

As últimas décadas forammarcadas por transformações quecambiaram significativamente o panoramamundial. As mudanças advindas destasalterações provocaram, de certa forma,modificações extremamente profundas nointer-relacionamento das atividadessociais, políticas e econômicas dasociedade humana. Elementos que outrorapovoavam apenas livros de ficção científica,agora fazem parte de nossa vida de umaforma muito mais concreta e palpável.Emritmo exponencial, que permite umatransmutação rápida, as estruturas sociaisespelharam de maneira coincidente, novosmodelos de organização social e política,colocando em jogo estigmas e valores denossa trajetória histórico-social. A raçahumana experimentou assim, umaprofunda mudança em suas basesestruturais, revendo de formacontundente, uma série de paradigmas econceitos pré-estabelecidos.

Neste contexto detransformação e mudança, poderíamosafirmar com certeza, o registro de uma

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revolução informacional processada demaneira avassaladora em todahumanidade, revertendo quadros,alterando signos e colocando em ação apossibilidade da (re) invenção de umanova estrutura, no contexto de nossacivilização. No âmbito da informação,novas tecnologias de informação ecomunicação despontaram como asgrandes produtoras de alternativas e

recursos da meta-informação1.Redes de telecomunicação, combinadascom recursos de telemática e demultimídia, voltaram-se para ooferecimento de serviços de comunicação(texto, dados, imagem, som), informação,educação e entretenimento público. Ainformação, outrora monopolizada por umapequena elite de intelectuais, agora revertea sua potencialização junto aos coletivoshumanos e nos remete a umaspecto dimensional completamentedinâmico e vivo. É difícil imaginar o serhumano sobrevivendo nesta sociedadeatual, sem que ele possa utilizar-se dainformação como elemento presente emseu dia-a-dia. De repente, as organizaçõese as instituições se deram conta destecaráter urgente que a informaçãoimprime junto aos coletivos corporativos.

Até então,a compreensãode uma sociedade unilateral e setorizada,retratada junto a um universo bastanterestrito, possibilitou aos poucos, aelaboração de um pensamento global deatuação: a sociedade dainformação. A referência informacional,a g l u t i n a d a c o m o p ó l ogerador do aspecto social, referendouessa afirmação. Em todas as áreas doconhecimento, a importância dainformação como insumo estratégico egerador de decisões, qualificou-a comosupo r t e nece s sá r i o e r e l e van t e ,indispensável para o desenvolvimentodas mais variadas vertentes da sociedade.

Podemos destacar, dentre asvárias manifestações do conhecimentoracional humano, da arte e da cultura, aArquitetura, que emerge como uma dasprincipais protagonistas dessa

transformação, participante ativa nesteprocesso rico e ininterrupto doconhecimento científico. Posicionada dentrode um aspecto de complexidade e deabrangência, o universo arquitetural gerouem si, características extremamentediversificadas e complexas, remetendo àreal necessidade de tratamento ecruzamento de informações.Planificar aatuação da informação na área daArquitetura, aparentemente é tarefa aindamuito pouco exercida por arquitetos,comunicadores ou cientistas dainformação. A maneira recente como setem desenvolvido a recente produçãocientífica no país, no âmbito da informação,e mais especificamente, com os reflexosdas novas tecnologias da informação juntoà Arquitetura, parece até agora ter geradopouco volume de produtos informacionaisnesta área de atuação.

Nesse contexto dedemandas telemáticas, informacionais ecomunicacionais, objetivamos propor nessapesquisa, o estudo analítico das novaspossibilidades de atuação das Bibliotecas edos Centros de Informação na área daArquitetura, verificando seus desdobramentosno estudo das dimensões do espaçoarquitetônico e do plano urbanístico.Entendendo a importância dos impactos dainformação e da telemática comoinstrumentos subsidiadores dedesenvolvimento científico-cultural na área daArquitetura, também analisaremos eavaliaremos a dimensão prática do uso dasbibliotecas e dos centros de informação,verificando hoje no panorama brasileiro, a realsituação desses edifícios quanto a inclusão datelematização dos serviços tradicionaisexistentes no armazenamento, tratamento edisseminação da informação da área.

PROBLEMÁTICA

Nossa problemática emergeem torno das questões ligadas aosencaminhamentos das demandas dasnovas tecnologias da informação e dacomunicação no âmbito da Arquitetura e

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Urbanismo, reafirmando no cotidiano denossas cidades, a reconfiguração dosnovos elementos da Urbanização Virtuale dos Serviços Urbanos Telemáticos. Valedestacar que a importância daproblemática levantada, cada vez maispresente na discussão e nodesenvolvimento dos projetos dearquitetos e urbanistas, remete aurgente necessidade no aprofundamentodas questões e das influências dessesnovos meios tecnológicos no campoarquitetônico.

Mas, de que maneirapercebemos estas e outras alterações, emnosso dia-a-dia ?. Algumas modificaçõessão realmente evidentes e trazem, à nossavista, elementos impressionantes eparadigmáticos de nossa vivência urbana.A invasão dos computadores pessoais emnossas atividade bancárias ou aintercomunicação entre as pessoas pormeio da Internet geram, a cada instante,novas informações que são incorporadasem toda essa rede mundial decomunicação.Estamos vivendo acivilização da imagem e do audiovisual. Aleitura convencional tende a diminuir entreas novas gerações, verificando-se que otempo de assistir à televisão ou jogar umvideogame não pára de crescer. Sãomudanças significativas ? A superficialidadedos relacionamentos humanos tende aaumentar, produzindo uma geração daimagem e do espetáculo.

O processo de digitalizaçãotem afetado consideravelmente todos ostipos de mídias tradicionais, como o papel,as artes gráficas, o rádio e a televisão, etem feito com que estes elementosmigrem rapidamente para a mídia digital,capaz de portar os mais variados suportesinformacionais. A tecnologia dainformação tem permitido estadigitalização em considerável medida,junto aos artefatos culturais, provocandono âmbito das manifestações culturais,um turbilhão de mudanças. É precisoatentar para a definição que Negroponte(1996, p. 234) faz deste processo :“digitalizar significa transformar uma

determinada informação em seqüênciaordenada de bits, capazes de sereminterpretados e reproduzidos peloscomputadores.”

Outro aspecto importante dadigitalização, é que ela muda a nossaperspectiva quanto à elaboração doproduto cultural produzido pela sociedade,na medida em que permite a replicaçãodigital, desaparecendo o conceito de cópiae origem. A reprodutibilidade técnicapassa então por um processotransformativo, tendo nadesterritorialização seu ponto central.

A Arquitetura, conscienteou inconscientemente, passa por umprocesso de fratura morfológica, diante deuma sociedade informacional em constantemudança. A propriedade da transmissãoeletrônica, ao mesmo tempo em que criauma transparência dos objetosconstrutivos e renova as aparências físicasdos materiais , também altera aconfiguração morfológica da Arquitetura.Hoje, tratamos muito mais de estabeleceruma interface virtual, do que nosdeslocarmos espacialmente nos ambientes.Esta “desconstrução” dos elementosarquitetônicos pode ser notada nas grandesestruturas metálicas de edifícios,valorizando muitas vezes o aspecto dovidro, concedendo a ele imagem detransparência e fluidez natural.

A ferramenta de simulaçãono computador, na área da Arquitetura,vêm propiciando a sintetização de umasérie de imagens e percursos do objetoarquitetônico antes impossível de se fazer.A simulação é o passo seguinte; com ela,conseguimos aplicar as variações aosmodelos, colocando sob diferentes pontosde vista e diferentes possibilidades decondições “físicas”, as infinitaspotencialidades do modelo virtual. Comisso, podemos entender a simulação dasimagens sintéticas, não só como imagensfinais e acabadas, mas como uma “teia” deimensas correlações e extrapolações que oobjeto pode adquirir.Diferentemente doque acontece com os suportes de capturaanalógica como a fotografia, o cinema ou

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mesmo o vídeo, as imagens numéricas sãoconstruídas totalmente pelos homens.Esses projetos apresentam vistas eperspectivas dos edifícios de uma maneiramuito mais rápida e eficaz do que antes,quando eram feitas por desenhistas em umtempo muito mais longo. Esta integraçãovia computador, antecipa o produto finalpara os testes de amostragem efabricação. Mesas “captam” desenhosoriginais das pranchetas e migram para oambiente digital, formando assim imagensdigitalizadas e virtuais.

A confluência entre aArquitetura e as novas tecnologiasinformáticas trouxeram um pontoimportante de aplicação: o uso da tela docomputador para que, mediante arepresentação analógica do projeto, estepossa ser analisado. A tela, com oprograma correspondente permite todotipo de manipulação: contemplar osinteriores a partir de pontos de vistasmutantes, comprovar que produzemdiferentes sistemas de iluminação, calculara estrutura, estudar o processo derealização da obra, ver o futuro edifício emuma representação de seu contextourbano. A tela se converte, em definitivo,numa representação diferente daspossibilidades de realidade que o desenhotem. A virtualização na Arquitetura e suaspossibilidades no campo digital, estruturamum novo conceito na feitura do projeto,refazendo assim etapas do caminhoarquitetural.

Analisando os elementosespaciais e urbanos, principalmente acrescente constituição das redes de cidades,viabilizando uma nova estrutura mundial, e naótica urbana, uma necessidade urgente deremodelar as cidades sob uma infra-estruturaque permita a inserção e a locação das novasformas de produção social, bem como odelineamento de serviços urbanos concebidosa partir dos novos modelos informacionais ecomunicacionais. Nessa perspectiva, ourbano especificamente, tem sido induzido esuportado a agregar novos serviços temáticosno âmbito das dimensões regionais, urbanas earquitetônicas tradicionais.

JUSTIFICATIVA

O pouco estudo naArquitetura e Urbanismo, conceituando aconvergência e aplicação das novastecnologias da informação e comunicação,principalmente, nos edifícios definidoscomo bibliotecas e centros de informaçãoimplantados no âmbito de nossas cidades,poderiam vislumbrar melhores os novosconteúdos e propostas realmentesignificativas face às necessidades dohomem-usuário contemporâneo. À medidaque esses novos meios tecnológicos seinserem nos ambientes construído,revertendo quadros e alterando osprocessos arquitetônicos dos espaços,novas necessidades e condições seapresentam aos pesquisadores envolvidosnessa problemática.

Queremos destacar algumaspremissas importantes na justificativa depropor um estudo analítico das novaspossibilidades de atuação das Bibliotecas edos Centros de Informação no âmbito dacidade, considerando principalmente, ocontexto das demandas das NovasT e c n o l o g i a sI n f o rmac i o na i s /Comun i c a c i o na i s ,especificamente, no estudo das dimensõesdo espaço arquitetônico e do planourbanístico demonstrando que:

Na confluência dos novosparâmetros apresentados pela chamada“Urbanização Virtual” em nossa sociedade,principalmente, seus reflexos sentidos naconfiguração dos elementos do espaçourbano tradicional, constatamos de fato, anecessidade de encontrarmos propostas econdições gerais nas questões relativas àconcepção, produção e operação de serviçosurbanos telemáticos, incluindo nessavertente, os serviços estratégicos dasBibliotecas e dos Centros de Informação.

O volume crescente deinformações produzidas no contexto detoda sociedade, incluindo os profissionais

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d e A r q u i t e t u r a ,localizadas nas faculdades, associações,entidades e editoras especializadas, têmconfigurando um cenário propício aoaumento no fornecimento de produtos eserviços informacionais. Esse quadrointroduz novos serviços informacionaistelemáticos tanto na área da Arquiteturacomo em todos os setores da sociedade,produzindo assim, novos hábitos urbanas enovas abordagens espaciais. É importantenotar que a demanda informacional na áreade Arquitetura e urbanismo não ocorresomente em nível de imagens, mas emdiferentes outros suportes e aspectos :técnicos , teóricos , históricos, estatísticos,bibliográficos , entre outros. Isso temevidenciado a falta de uma produção críticaem Arquitetura, que supere os limitespróximos do “quase conhecimento” e opereações mais concretas de desenvolvimento.

O descaso do Estado notocante ao apoio a programas queincentivem a disseminação e aestruturação da informação na Arquitetura,através do acesso a novos serviçostelemáticos urbanos, bem como nofornecimento de projetos e planos quepermitam a criação de ambientescognitivos e comunicacionais, somenteagora têm acenado para algum tipo deapoio do governo brasileiro. Um acordo decooperação técnica e tecnológica foiassinado, em dezembro 1999, entre oConselho Nacional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico (CNPq), a AgênciaBrasileira de Cooperação (ABC) e Programadas Nações Unidas para o Desenvolvimento(PNUD), visando apoiar a estruturação emontagem das equipes gestoras internas eexternas e a elaboração do DocumentoBásico do Programa Sociedade daInformação. Na área da Arquitetura, osestudos têm se concentrado em realizar ummapeamento das possibilidades epropostas existentes, relativas ao ambientecidade e o potencial empreendedor, comoinfra-estrutura, parceiros, recursos einformações disponíveis para implantar eexpandir as iniciativas da área, acenando

com benefícios imediatos e concretos.

Outro ponto a se destacar,esclarece a carência de espaços físicos ede recursos equipamentais no âmbito dasBibliotecas e dos Centros de Informaçãoonde possam gerenciar adequadamente ainformação produzida na área daArquitetura e das áreas correlatas. Estaquestão diz respeito até agora à discretadisponibilização de locais, equipamentos eoutros recursos que garantam um serviçode informação eficaz e possibiliteinstrumentos estratégicos dedesenvolvimento na área. Os poucosexemplos destes espaços geralmentelocalizam-se em grandes centros urbanos,deixando de lado uma grande quantidadede localidades e de regiões brasileiras semacesso aos acervos informacionais eculturais. Evidentemente que essepanorama coopera não só no discretodesenvolvimento dos novos serviços deinfra-estrutura telemáticas, comotambém, no fraco desempenho dosserviços existentes, onde na maioria dasvezes, fica restrito a um campo deatuação menor que o previsto.

Com a introdução dosconceitos da Avaliação Pós-Ocupação(APO), combinada ou não com a AvaliaçãoPré-Projeto (APP) no âmbito daArquitetura, sempre na tentativa deotimizar decisões de projeto, acompreensão da complexidade dos efeitosdiretos e indiretos do ambiente construídono comportamento dos novosparâmetros telemáticos na arquitetura,poderá responder satisfatoriamente noestudo das dimensões do espaçoarquitetônico e do plano urbanísticodemonstrado das Bibliotecas e dos Centrosde Informação no contexto das redestelemáticas. Esse ajuste mais harmônico emais adequado dos ambientes, sobretudodaqueles construídos e alterados pelohomem, poderão estabelecer um processode comunicação mais fluido entre osdiversos gestores do processo de produçãodesses espaços telemáticos de informação.

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OBJETIVOS

Neste Projeto de Pesquisa,objetivamos propor o estudo analítico dasnovas possibilidades de atuação dasBibliotecas e dos Centros de Informação,suportados no contexto das demandas dasNovas Tecnologias Informacionais eComunicacionais no âmbito das cidades.Também analisa e avalia, a dimensãoprática do uso desses espaços, aplicandoos conceitos e os métodos da AvaliaçãoPós-Ocupação (APO), na formação de uminstrumento eficaz de propostas de novosrecursos e meios Telemáticos daUrbanização Virtual. Assim sendo, essametodologia procurará garantir umapossível aceitação, por parte da populaçãousuária, de uma eventual modificação doambiente construído desses espaços, compesquisas fundamentadas e possíveisintervenções espaciais apoiadas naAvaliação Pós-Ocupação (APO).

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Este projeto pretende:

Aprofundar o estudo sistemático dasquestões relativas aos impactosdas Novas Tecnologias Informacionais noâmbito da Arquitetura e do espaçoconstruído, revelando um instrumentoeficaz de entendimento das discussões edas tendências arquitetônicas no contextodo século XXI, na análise de temas comoUrbanização Virtual, Serviços UrbanosTelemáticos, Ambientes Virtuais eAmbientes Cognitivos.

Estudar as interfacestelemáticas e informacionais no ambienteconstruído das Bibliotecas e dos Centros deInformação, verificando suaspotencialidades e suas novas formas deatuação no ambiente construído e virtualdo contexto da cidade.

Direcionar os conceitos e os

métodos da Avaliação Pós-Ocupação (APO)na área da Urbanização Virtual, podendoservir como novos insumos e diretrizespara projetos de Bibliotecas e Centros deInformação que agreguem o parâmetroespacial dos Serviços Telemáticos.

Discutir a importância dainformação e comunicação no contexto dasociedade e suas ligações entre asdimensões de conjuntura e identidade noâmbito da Arquitetura, estudando o papelrelevante da informação na área, comoprocesso subsidiador de desenvolvimentocientífico e cultural.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

No presente projeto depesquisa apresentaremos comoprocuremos alcançar os objetivospropostos, descrevendo a estrutura dapesquisa e os procedimentosmetodológicos empregados na busca dosresultados.

ESTRATÉGIA DA PESQUISA

O primeiro procedimentoestará em verificar a bibliografia existentesobre o assunto, selecionando as basesbibliográficas referentes ao tema,identificando, categorizando e analisandoos aspectos positivos e negativos daproblemática levantada. Essa etapa visalevantar e destacar impactos das NovasTecnologias Informacionais no âmbito daArquitetura e do espaço construído,principalmente, na exemplificação dastransformações espaciais no âmbito dasBibliotecas e Centros de Informação. Oentendimento das discussões e dastendências arquitetônicas no contexto doséculo XXI, na análise de temas comoUrbanização Virtual, Serviços UrbanosTelemáticos, Ambientes Virtuais eAmbientes Cognitivos, nessa fase dapesquisa, garantiram confiabilidade econhecimento relativo ao assunto, na

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medida que não esquece a visão ampla ecomplexa do tema.

Como foi apresentadoanteriormente, o estudo proposto deatuação das Bibliotecas e dos Centros deInformação, suportados no contexto dasdemandas das Novas TecnologiasInformacionais e Comunicacionais noâmbito das cidades, será aplicada ametodologia da Avaliação Pós-Ocupação(APO), buscando os resultados que serelacionam com a participação, na própriapesquisa, dos diversos agentes envolvidosna produção e uso do ambiente em foco.Os resultados poderão ser usados comonovos insumos e diretrizes para futurosprojetos com características semelhantes,ou no apoio de reformas e reorganizaçãoespacial desses espaços.

DEFINIÇÃO DOS OBJETOS DE ESTUDO

Neste trabalho de pesquisa,o objetivo será o desenvolvimento daavaliação das Bibliotecas e dos Centros deInformação inseridos nos impactos dasNovas Tecnologias Informacionais. Nessecontexto, o trabalho terá como objeto deestudo as Bibliotecas e os Centros deInformação distribuídos na cidade deMarília/SP. Tendo em vista o contínuoprocesso de desenvolvimento nessesúltimos anos na cidade, principalmente, nocrescente número de instituições e cursosna área da educação, verifica-se aimportância de se iniciar urgentemente,avaliações sistemáticas em larga escaladestes ambientes construídos, aplicando osconceitos da APO. O estabelecimento deum parâmetro científico de realimentaçãopara futuros projetos, bem comoinstrumentos para estabelecimento deprogramas de manutenção das própriasBibliotecas e Centros de Informação. Portanto, é de suma importância que adefinição da abrangência dos objetos deestudo da pesquisa sejam explicitados ecorretamente alocados. Neste caso, osobjetos de estudo serão divididos emquatro áreas de atuação desses espaços:

Bibliotecas PúblicasBibliotecas Universitárias Bibliotecas Privadas Centros de Informação

MANEIRA DE SELECIONAR A AMOSTRAE SUA CARACTERIZAÇÃO

Análise Ambiental dosobjetos de estudo diz respeito a analisar oambiente enquanto projeto, suasdimensões, situações em plantas,fachadas, cortes e perspectivas, ou seja,como linguagem de arquitetura dosespaços das Bibliotecas e dos Centros deInformação analisados. Nesse aspectobusca-se identificar os vários elementos epressupostos arquitetônicos conforme àscaracterísticas de seus usuários,tecnologias empregadas, necessidadesespaciais, quesitos de conforto ambiental eelementos do comportamento ambiental.Conforme nos apresenta Ornstein (1992),as técnicas de observação e medição nocaso da APO aplicada em ambientesconstruídos, são de fundamentalimportância no entendimento das questõesreferentes aos aspectos técnicos doprocesso de produção e uso destesespaços.É importante destacar que aavaliação técnica do ambiente, previstanesta etapa da pesquisa, ganhaimportância quando vinculada e apoiadajunto ao levantamento de usuários e dasanálises decorrentes da amostra. Nestecaso, a verificação de problemasconstrutivos e da inadequação do partidoarquitetônico dos ambientes estudados,revelam o desacordo do funcionamento doambiente construído, prioritariamente, naaplicação dos conceitos e diretrizes dasNovas Tecnologias Informacionais noespaço das Bibliotecas e Centros deInformação.

Conforme nos apresenta omodelo de Roméro (1992), dividiremos oprocesso de avaliação física em trêscategorias:

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• Fatores físicos;• Fatores funcionais;• Fatores comportamentais. (diz respeitoao levantamento junto aos usuários)Nesse sentido, esses fatores descritos elevantados, poderão atuar em três níveisdo ambiente físico:• Nível espacial-macro: o edifício seráanalisado como um todo;• Nível espacial-micro: o edifício seráanalisado particularmente;• Nível dos equipamentos: analisará àsquestões relativas ao mobiliário e fatoresergonométricos.

Objetiva-se analisar e avaliarprincipalmente nessa etapa da pesquisa, oquanto e de forma, os aspectos técnicosrelativos as demandas das NovasTecnologias Informacionais eComunicacionais tem afetado e impactadoos ambientes das Bibliotecas e Centros deInformação, no âmbito do trabalhoproposto. Isso poderá ser checado, porexemplo, o posicionamento no edifício dasestruturas físicas preparadas ou não nofornecimento de serviços telemáticos,hipertextuais e computacionaiscomprometidos ao suporte dos usuários.

DESCRIÇÃO DOS INSTRUMENTOS

Nessa etapa, asobservações e as verificações realizadasserão comparadas qualitativamente comos levantamentos realizados junto aosusuários. Portanto, o primeiro passo seráter em mãos as plantas atualizadas dosespaços escolhidos, realizando visitasexploratórias, através da coleta de dadosreferentes aos elementos técnicoslevantados. Somente desta forma é queserá possível identificar e levantar osprincipiais pontos conflitantes doambiente construído, aliado já nessafase, de possíveis recomendações ealterações projetuais.Vale lembrar queesse trabalho exploratório poderá sercomplementado através da troca deinformações com outros técnicos e

especialistas, diretamente envolvidosnas etapas de produção e uso doambiente construído. Vários problemasprovenientes de outras áreas correlatasàs questões arquitetônicas, poderão sercruzados e analisados, com vistas a ummelhor aproveitamento técnico dasvisitas exploratórias.

Outro instrumento bastanteútil nessa etapa, será a utilização dafotografia e do vídeo. Esse método serevelará útil, na medida em que poderádescobrir como certas funções espaciais,condição técnico-funcional e estruturas decomportamento humano aliadas aoambiente construído afetaram a organizaçãodos espaços. Os resultados aplicadospoderão servir de base tanto nesta faseinicial de avaliação como também nasconderações e propostas finais.

LEVANTAMENTO E TABULAÇÃO DEDADOS PESQUISADOS JUNTO AOS

USUÁRIOS

Essa etapa do trabalho,objetiva levantar e tabular as informaçõese dados referentes aos usuários queutilizam o espaço dos ambientesescolhidos. Além de fixar a seleção dosambientes a serem analisadas, descritasanteriormente, a entrevista e a seleção e aseleção da amostragem representativa dosusuários ganha importância nessa segundafase. Portanto, é imprescindível que olevantamento seja divido em trêsmomentos:

SUBSÍDIOS

Trata-se de levantar apopulação amostral dos ambientesanalisados, definindo o universorepresentativo dos usuários. Destaforma, o levantamento dessasinformações servirá de base noagrupamento das categorias de usuários.

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ELABORAÇÃO DOS QUESTIONÁRIOS EENTREVISTAS

A elaboração destesquestionários e entrevista poderá serdefinida a partir de um pré-teste, no qualserá avaliada a estrutura e a compreensãodas questões a serem levantadas. Aaplicação e análise dos resultados doquestionário pré-teste, permitirá ajustes emodificações no questionário definitivo.Portanto, a construção desses seguirá osseguintes critérios:

• Quanto à relação do usuário frente àsdemandas das Novas TecnologiasInformacionais nos ambientes dasBibliotecas e Centros de Informaçãoanalisados, no sentido do aprimoramentodo binômio arquitetura-informação;• Quanto ao uso adequado das ferramentasde hipermídia e informação no contexto deEquipamentos, mobiliários e desenhoespacial;• Quanto à introdução do recursotecnológico das Novas TecnologiasInformacionais na contribuição edesenvolvimento do usuário no âmbitosocial;• Quanto aos problemas espaciaisenfrentados pelo usuário frente às NovasTecnologias Informacionais;• Quanto às potencialidades de atuação dosrecursos de Hipermídia e Telemática nocontexto do usuário/ambiente construído

TABULAÇÃO

Esta etapa final da pesquisavisa analisar e avaliar todo o conjunto dedados levantados nas fases anteriores,objetivando o diagnóstico e asrecomendações na definição dos espaçosde Bibliotecas e Centros de Informação,suportados principalmente pelas NovasTecnologias Informacionais eComunicacionais. Constitui no cruzamentode cada item da Análise Ambiental, daopinião dos usuários e técnicos e

interpretação dos questionários e dasentrevistas aplicados. Esse trabalho poderáser subdividido em quatro etapas:

• Procedimentos adotados na escolha dositens a serem intervindos• Resultados da Avaliação Ambiental• Resultados da Avaliação junto aosusuários• Elaboração das propostas a seremapresentadas

Dessa maneira, ao términoda pesquisa, será possível direcionar osconceitos e os métodos da Avaliação Pós-Ocupação (APO) na área da UrbanizaçãoVirtual, podendo servir como novosinsumos e diretrizes para projetos deBibliotecas e Centros de Informação queagreguem o parâmetro espacial dosServiços Telemáticos. Assim, como nosapresenta Ornstein (1995), um conjunto demétodos aplicados aos estudos dasrelações do ambientecons t ru í do / compor tamen to , cu josresultados estão relacionados diretamentecom a participação, na própria pesquisa,dos diversos agentes envolvidos naprodução e uso do ambiente em estudo,poderão responder positivamente comparâmetros projetuais na organização,adaptação e renovação desses espaços.

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Walnyce Scalise1

Scalise, W. Projeto Urbano, espaço público ecidadania. Revista Assentamentos Humanos,Marília, v 5, n.1, p83-93 , 2003.

ABSTRACT

The following paper intends to realize someappreciations about the citizenship’s exer-cise in the contemporary society. With theglobalization and the new technologies isdifficult to distinguish the “being citizen”and feeling like a citizen. Concepts asurban project, public space, public and pri-vate area and his possibilities, will also bediscussed.

Key Words: urban project, public space,private space, urban spaces, citizenship,city.

Palavras-Chave: projeto urbano, espaçopúblico, espaço privado, espaços urbanos,cidadania, cidade.

INTRODUÇÃO

No atual contexto de reflexão sobrecidades, a sua problematização encontra-se num momento de reformulaçãoanalítica. Existe a crise dos paradigmasexplicativos e a chamada “questão urbana”surge na origem dessa reformulação,representando transformações dasmorfologias sociais e urbanas, decorrentesde mudanças significativas do quadroeconômico, dos estilos de vida e dos modosde governância urbana, que implicam numquestionamento permanente. Percebendo acidade como um projeto “em construção”, a

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PROJETO URBANO, ESPAÇO PÚBLICO

E CIDADANIA

1 Arquiteta e urbanista pela FAUUSP, Mestre em Comunicação, Professora de Paisagismo e Projeto do Curso deArquitetura e Urbanismo da Universidade de Marília – UNIMAR.

“...a cidade é o espaço público, é o espaço da solidariedade”.

Edgar Graef, arquiteto‘La ciudad es la mejor oportunidad de innovación política’Jordi Borja

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partir do qual se procura tecer umadiscussão crítica sobre a dimensão culturale sobre a condição urbana, surgem trêstemas fundamentais: ambiente urbano,patrimônio urbano e espaço público, quebuscam sustentar um conjunto dereflexões sobre “cidadania urbana”.

O presente artigo trabalha umconjunto diversificado de reflexões sobre: aimportância do espaço público comoelemento que estrutura a vida social dacidade, estimula a cultura urbana e criacidadania; o projeto urbano comoconstrutor de cidades que responde àsnecessidades atuais, e a cidadania, suaimportância e a humanização que elaestimula quando se manifesta em gestoscívicos planejados, nas diferentes escalas enos acontecimentos espontâneos, criandouma rica diversidade de vida urbana.

As cidades continuam sendo ospólos demográficos contemporâneos, porfacilitar o trabalho, além de servirem aodesenvolvimento cultural. São centros decomunicação, aprendizado e complexosempreendimentos comerciais, além deabrigar enorme concentração de famílias,polarizar e condensar energia física,intelectual e criativa. Representam lugaresde uma vasta diversidade de atividades efunções tais como: exibições,apresentações, bares, catedrais, lojas,teatros, museus, entre outras. Aarquitetura em sua configuração urbanadeve contribuir para favorecer as relaçõessociais, a conexão do diverso, além depermitir que os diferentes usos mantenhamuma continuidade e que tornem possível asensação de fazer parte de algo maior.

Atualmente, a qualidade do espaçopúblico é condição fundamental para aaquisição da cidadania. O espaço públicoexerce funções urbanísticas, sócio-culturais epolíticas. No nível da cidade apresentafunções como: promover ligação, darcontinuidade aos diversos territórios urbanose proporcionar uma imagem de identidade emonumentalidade. Na escala do bairro é o

lugar da vida social e da relação entreedificações, pessoas e atividades.

O espaço público, acessível epolivalente, pode atender a populações etempos diversos. Atualmente, faltamespaços públicos de refúgio, detransgressão, além de espaços de festa ede manifestação. O espaço público deve sero lugar do convívio e da tolerância, damesma forma que deve ser o lugar doconflito e das diferenças. Na mesmaintensidade que a família e a escola, osespaços públicos são considerados lugaresde aprendizagem da vida social, dedescobrir os outros, do sentido da vida.

A cidade e o território são espaçosque contêm o tempo e o lugar dospatrimônios: natural e cultural. Reconheceros patrimônios, a paisagem, a arquitetura,a história, as manifestações sociais, aspessoas e as atividades que se seguem, fazparte do processo de aquisição dacidadania, da construção das identidadespessoais e coletivas.

Descobrir e conhecer a cidade emsuas múltiplas dimensões significaconhecer-se e conhecer os outros, assumir-se como indivíduo e membro de diversosgrupos. Passa a perceber-se como múltiploenquanto identidade e pertencimento, oque auxilia no melhor entendimento dadiversidade da sociedade contemporânea.

Viver a dialética local-global éfundamental para a inclusão, quando seassumem as identidades de proximidadee as relações, se obtêm os meios paraexercer a cidadania e interpretar omundo. No espaço público os valores eas culturas se encontram, podendoconviver e se relacionar. Os direitosculturais dos cidadãos devem garantirtanto a preservação e odesenvolvimento das identidadesindividuais e coletivas, quanto asrelações entre elas.

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A CIDADE E SEUS ESPAÇOS Nos últimos séculos, a cidade foi

submetida a um ritmo muito rápido detransformações, evidentes tanto no planofísico como econômico, social, cultural eambiental. Nas últimas décadas, ocontraste com a paisagem é imenso,caracterizando-se por uma enormemobilidade das populações e dos bens deconsumo, pela rapidez e continuidade daconstrução, pela falta de planejamento doespaço público e de melhoria da qualidadeda vida urbana. A cidade atual vive umadiversidade de problemas cuja origem estáassociada à crise que invade a sociedade,atingida por migrações vindas das zonasrurais para as cidades maiores ou doscentros urbanos para as periferias.

As sociedades periféricas possuemoutra fisionomia urbana, onde a maioria deseus habitantes não é cidadã, mas“residente”. Essa população, de formadiferente dos habitantes das áreas centrais,nunca pode usufruir serviços sociaisamplos. Os que podem comprar os bens eserviços se consideram cidadãos, a maioriaque não pode entrar nesse mercado, quesubstitui o espaço público, aprende asobreviver nesta selva urbana.

A garantia da mobilidade socialatravés do acesso universal aos benspúblicos, de viver dignamente, ter acessoa saúde, educação, transporte,segurança e lazer, mostra-se comocondição para que uma sociedade sejademocrática, no sentido de favorecer oexercício da cidadania. A paisagemurbana destas sociedades chama aatenção, no seu aspecto mais geral, porseu caráter quase homogêneo.

As diversas formas de descobrir acidade permitem articular e multiplicarpossibilidades de troca, proporcionandooportunidades de integração e socialização.Elas representam um espaço de liberdade ede civilidade para os cidadãos, pois odespertar da consciência da cidade significa

preservar sua história, sua cultura, seupatrimônio, sua paisagem, além dareconquista do espaço público para usocoletivo, da constituição de redes deespaços verdes e abertos, pressupondorecuperação e revalorização das áreasurbanas marginalizadas, degradadas emono- funcionais. Significa, ainda, arevitalização do uso do sistema detransportes coletivos, das infraestruturasurbanas, da qualidade estética, doselementos de referência do ambiente, daidentidade dos lugares, da criação dascondições de segurança, do reforço doslaços locais, da compatibilização e parceriade interesses públicos e privados.

Garantir a qualidade de vida aoscidadãos e o desenvolvimento sustentáveldo território são as principais funções dacidade. Uma ação eficaz, buscando o bemestar, exige uma nova definição dos papéis,dos atores, dos objetivos, das estratégias edos meios necessários para assegurar osseus fins. Para isso, uma das tarefas dapopulação é refletir e participar nasdecisões sobre o se que se pretende aoslugares que em que se habita.

A questão do espaço público vemsendo debatida, desde os anos 60, porespecialistas de diversas áreas. Ao mesmotempo novos tipos de espaços semi-privados ou semi-públicos aparecem comoo cenário da vida urbana familiar eprofissional como os shoppings, os espaçosde lazer de condomínios privados, entreoutros. Pode-se dizer que, em grandeparte, a preocupação com a perda devitalidade dos espaços públicos tradicionaisdeu-se paralelamente a uma crítica àspropostas do urbanismo modernista esobretudo à utilização do zoneamentocomo instrumento de racionalização doespaço urbano.

Na década de 60, escritos como osde Kevin LYNCH e de Jane JACOBS

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levantaram a questão da necessidade deespaços de convivência e de significadosimbólico. Os debates estavam longe deapontar para um consenso, pois algunsestimavam que o problema era de naturezameramente econômica, uns (poucos)arquitetos acreditavam no poder do espaçoem criar interações sociais, enquantooutros acreditavam na capacidade dasconfigurações urbanas em gerar oupossibilitar formas de interação social maisou menos válidas.

O fato é que, primeiramente,assistiu-se nos Estados Unidos a todo ummovimento preocupado em re-urbanizar aarquitetura para logo em seguida chegar-sea uma certa perspectiva de retorno aocentro da cidade, em parte estimulada pelomovimento do New Urbanism. O padrão deu r b a n i z a ç ã o n o r t e - a m e r i c a n o ,predominantemente suburbano, diferebastante do padrão europeu de moradiaurbana, inclusive no centro das cidades,mas, mesmo assim, observou-se emcidades européias um fenômeno deintervenções como a criação do Fórum LesHalles e do Centro Cultural GeorgesPompidou, em Paris, entre outros, quelançaram paradigmas de estratégias derevitalização de áreas degradadas.

Percebe-se que, apesar dadiversidade dos padrões de urbanização, asiniciativas norte-americanas e européiasrevelam um processo semelhante derequalificação e revalorização das áreasurbanas, atravessado pela segregação, fatoque no Brasil surge com mais evidênciaperante a escala de desigualdade social,além de tornar difícil aplicar às cidadescontemporâneas essa definição de espaçode convivência, pois toda a lógica deapropriação do território brasileiro ocorre apartir da visão privada, desde as capitaniashereditárias. Torna-se complexo reverteressa lógica que incorporou elementos àarquitetura urbana tais como: muros altos,grades, guaritas e lanças metálicas,mostrando-se obras da população acuada,que começou a cercar de grades não

apenas residências, mas também igrejas,colégios e cinemas, imagens agoratotalmente integradas à paisagem urbana.

Paralelamente, têm-se situaçõescomo a ocupação dos espaços públicospor camelôs, o apartheid prometido porcondomínios de luxo, as formasdiferenciadas de apropriação de espaçospela população, decorrentes de propostasarquitetônicas, como a do Sesc Pompéia,em contraste com os espigões defachadas envidraçadas da AvenidaBerrini, em São Paulo.

ESPAÇO PÚBLICO E PRIVADO

A sociedade atual foi condicionada aentender espaços fechados, a se protegerem mundos isolados e a compreender deuma maneira unilateral o que é fora e o queé dentro. Edificam-se, cada vez mais,espaços de convivência artificiais(shoppings, praças de alimentação) querepresentam atualmente, sem dúvida, osespaços públicos das cidades, ao mesmotempo em que as praças e os parques,sendo fechados com grades, tornam-seespaços inatingíveis. O que se percebe é acrescente privatização dos espaçospúblicos em todos os âmbitos da sociedadecontemporânea. “O espaço público que, étido como espaço aberto a todos, tem sidona verdade palco de práticas excludentespor questões de raça, classe social, etc”GHIRARDO.

O declínio do espaço público começoua ocorrer com a ascensão da burguesia noséculo XVIII, e o processo foi acelerado pelaemergência da sociedade de massas doséculo XX, fenômeno que tem relação com odesenvolvimento do mercado e vice-versa:“o declínio da esfera pública permitiu que omercado aumentasse a sua influência,enquanto que a incursão do mercado emnossas vidas contribuiu para o eclipse daesfera pública” ELLIN.

A cidade que se constitui tendo porbase grandes contradições, com o centrofinanceiro e a classe alta isolando-se,

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acaba por produzir espaços, quedeveriam ser públicos (parques, ruas,locais de lazer ou transporte urbano),“desvalorizados, enquanto bem estarsocial, redefinidos como problemas deplanejamento que deveriam sereliminados ou privatizados” DAVIS.

Tendo em conta as inúmerasinsistências e discursos a respeito danecessidade de revalorizar o espaçopúblico, parece óbvio que um novo conceitode público já começa a surgir. Os atuaisconceitos de público e privado distanciam-se do conceito tradicional que o associavaao conceito jurídico de propriedade: ruas epraças, instituições governamentais,administrativas ou de oferta de serviços,justamente na medida em que novosespaços privados ou semi-públicosparecem assumir a função de abrigo davida coletiva urbana. Esses espaçosabertos ao público, localizados no interiorde áreas comerciais (shopping centers) oumesmo residenciais (condomínios) são,atualmente, o palco de grandes eventosprofissionais e familiares.

Enfim, o espaço público convivenas cidades com os espaços privados,onde o acesso coletivo é facilitado ou nãode acordo com os interesses específicosde seus proprietários. Diversos espaçosprivados: shopping- centers, clubessociais, estádios, grandes conglomeradosde shows e eventos, cumprem hojefunções equivalentes aos exercidos peloespaço público ao longo da história. O quese tem é, novamente, a dissociação deâmbitos distintos do homemcontemporâneo e suas qualidades decontribuinte-consumidor e de cidadão.

O que caracteriza o espaço público éa sua posse pela comunidade e o equilíbrionecessário ao bom funcionamento dessapropriedade compartilhada onde ocorremfenômenos, como a violência urbana, máadministração, leis inadequadas,desigualdade social, má educação coletiva,etc., que geram abandono e degradação.

Nestas condições, paga-se pela qualidadedo espaço público, em locais livres dasujeira e do perigo, por não serematendidas parte de suas necessidadescomo contribuintes. Segundo GUERRA, asnovas e luxuosas “catedrais da diversão edo consumo” consolidam-se comoespaços da exclusão, onde osprivilegiados que podem pagar peloacesso abandonam voluntariamente oespaço público. Com isso, abdicam de suacondição de cidadão, assumindounilateralmente seu lado consumidor.

A desigualdade social é alarmantee o espaço público, local onde a cidadaniase efetiva, vê-se cada vez mais relegadoa um segundo plano, além de serconsiderado como potencialmenteperigoso e de uso de classes menosfavorecidas. Enquanto isso, a elite seauto-segrega em um novo tipo de espaçopúblico moldado para atender àsnecessidades de quem pode pagar parausufruí-lo. Ocorrendo, assim, a “reduçãoda noção cívica de participação aoconsumo” GHIRARDO.

Eduard RELPH, o geólogocanadense, considera que a paisagemurbana é a expressão do que se é, umespelho da existência cotidiana. No mesmosentido pode-se dizer que, como espaço devida cívica, o espaço urbano é um bempúblico, e como tal, seu tratamento deveser considerado no mesmo nível dosserviços e equipamentos básicos.

Os novos espaços urbanos devemcelebrar a combinação de raças, idades,culturas e atividades, a mistura decomunidade e anonimato, familiaridadee surpresa, devem exaltar tanto osgrandes espaços como o entusiasmo quesimples bares e cafés ao ar livre trazemà ruas, a vivacidade informal das praçaspúblicas, a mistura de locais de trabalho,lojas e residências que constroembairros cheios de vida.

A crise da qualidade de vida não éapenas contemporânea, mas longamente

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germinada, intrínseca à própria formaçãodas sociedades modernas e se traduz naprogressiva restrição do espaço público,tanto no nível físico, quanto nos níveis éticoe político. Contudo, pensar a questão daqualidade de vida e da mobilização socialenquanto coisa pública, impõe constituirum espaço e uma mentalidade pública quevai adiante, e muitas vezes se contrapõeàquilo que se mostra mais adequado a umamentalidade restrita ou a um espaçoparticular. A questão mais radical a serabordada não é a solução dos problemasmais imediatos, mas um ponto quegeralmente não é evidente, que é a perdade sentido da dimensão e do espaçopúblico da existência.

A crise dos ambientes em que se vivenão é uma questão de planejamento etécnica, mas uma crise ou mesmo umaincapacidade de “habitar”. SegundoBRANDÃO, o verbo “habitar” remonta aolatim habere, haver-se, ter-se, conquistar-se, construir-se, compreender-se, tomarposse de si (e não das coisas), portanto,habitar um lugar é identificar-se com ele,promover no local que habitamos apossibilidade de que ele nos conduza a umavida feliz e nos leve a conferir sentido àsnossas vidas. O maior problema das cidadese, talvez, o cerne dos demais problemas, énão ser mais percebida como lugar que dásentido à existência, lugar que educa epermite construir a identidade pessoal.Perdeu-se a capacidade de habitar o mundo,de ter nas cidades o lócus familiar eadequado ao aprimoramento do corpo,e doespírito, além dos usos e hábitos atuais.

Portanto, melhorar a qualidade devida das cidades implica, em primeirolugar, reabilitá-las enquanto espaçopúblico e não como área de colisão dosinteresses particulares, mesmo porqueno jogo desses interesses a maior partedos cidadãos não são jogadores, maspeças jogadas, que não se identificamcom esse jogo, não se interessam por elee não se mobilizam, mas sãomobilizados, são alienados desse jogo e

não conseguem ver a cidade comoespaço habitável, não lhes parecepúblico, nem resultado de interessescomuns. Esse espaço público onde estãocompetindo o interesse de gruposisolados e os capitais, não desperta ocuidado e o movimento de ninguém.

O ESPAÇO PÚBLICO E A MODERNIDADE

Partindo do conceito jurídico,observa-se que o espaço público é umespaço submetido a normas específicas porparte da Administração Pública, que possuio domínio do solo e garante seu acesso atodos além de fixar as condições de suautilização e de instalação de atividades. Oespaço público moderno surge daseparação formal (legal) entre apropriedade privada urbana e apropriedade pública, que reserva este sololivre de construções (exceto equipamentoscoletivos e serviços públicos) para destiná-lo a usos sociais característicos da vidaurbana como o lazer, as manifestações, amobilidade, as atividades culturais, etc..

O espaço público possui tambémuma dimensão sócio-cultural por ser umlugar de relação e de identificação, decontato e de animação urbana. A dinâmicada cidade e dos comportamentos pode criarespaços públicos que juridicamente não osão, ou que não foram previstos assim,podendo ser abertos ou fechados: umafábrica, edificações abandonadas, espaçosresiduais, acessos, caminhos, praças, pátiose também áreas reservadas para obraspúblicas ou de proteção ecológica. Nessescasos,o que define a natureza do espaçopúblico é o uso e não o estatuto jurídico.

O urbanismo moderno reconstruiucidades após a Segunda Guerra mundial,focalizando no funcionalismo, dotado deum instrumental que separou mais queintegrou (el zoning) modelo acentuado pelacompartimentação das AdministraçõesPúblicas e alguns profissionais. O

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resultado, na maioria das vezes, tem sido aaplicação de políticas setoriais ao invés depromover atuações que articulem adiversidade e a complexidade dasdemandas urbanas.

O funcionalismo desqualificou oespaço público ao atribuir-lhe usosespecíficos. Em alguns casos, seconfundiu com a circulação, em outros sesubmeteu às necessidades do poderpúblico. Em propostas bem sucedidasforam priorizadas a monumentalidade e oembelezamento urbano, ou aindaapareceram vinculados a atividadescomerciais ou culturais. No entanto,houveram situações onde foram utilizadoscomo mecanismo de segregação social.

A crítica feita à cidade modernistarefere-se ao fato de não perceber o real sig-nificado da sociabilidade nos espaços de ruase praças, relegando estes espaços a umsegundo plano ou chegando até mesmo a serdesconsiderados. Quanto à importância queas práticas contemporâneas tem dado a estafalta de sociabilidade do urbanismo moder-nista, do desejo “comum às teorias urbanaspós-modernas, de recuperar a riqueza simbó-lica das formas urbanas tradicionais, basea-das na maior variedade possível de articula-ções feitas entre tecido urbano, espaçospúblicos e construções” o que está sendoobservado? (SANTOS & DEL RIO, 1998:8).

O espaço público supõe domíniopúblico, uso social coletivo emultifuncionalidade, além de caracterizar-se por sua acessibilidade, o que o torna umfator de centralidade. A qualidade doespaço público pode ser avaliadaprincipalmente pela intensidade e pelasrelações sociais que facilita, por sua forçade mesclar grupos e comportamentos e porsua capacidade de estimular a identificaçãosimbólica, a expressão e integraçãoculturais. Por isso, convém que o espaçopúblico contemporâneo tenha qualidadesformais tais como: a continuidade dodesenho urbano e sua facilidade deorganização, a generosidade de suasformas, de sua imagem, de seus materiais

e apresentar possibilidades de adaptaçãoaos diferentes usos através dos tempos.

O PROJETO URBANOOs projetos urbanos caracterizam o

urbanismo atual. Entende-se por projetosurbanos as atuações estratégicas dediferentes escalas, que vão desde umapraça até grandes intervenções, que secaracterizam pelas respostas a váriasdemandas ou por cumprir diversas funções,provocando dinâmicas transformadorasem seus entornos. As transformaçõesnesses locais ocorrem por apresentarobjetivos de competitividade e de ligaçãosocial, porque combinam em seudesenvolvimento o setor público e aparticipação de atores privados ou, ainda,porque promovem uma melhoria naqualidade de vida na cidade ou n o bairro.

O urbanismo atual deve darrespostas relativamente rápidas aosdesafios de competitividade e coesão,tirando partido das oportunidades e, senecessário até, inventá-las, pois os grandesprojetos somente são viáveis utilizando-seuma série de circunstâncias favoráveis, oque só ocorre quando se pode contar comas vontades de um conjunto de atorespúblicos e privados.

Analisando as novas dinâmicasurbanas percebe-se que na elaboração derespostas aos desafios que são colocadosestão: a atenção ao espaço público e arelação entre sua configuração e o exercícioda cidadania, entendida como o estatutoque permite exercer um conjunto dedireitos e deveres cívicos, políticos esociais. Segundo BORJA, o espaço públicointeressa principalmente por que é onde semanifesta, com maior intensidade, a crisede “cidade” ou de “urbanidade”, é o pontopara atuar quando se pretende impulsionarpolíticas de “fazer cidade” na cidade.Interessa também, porque as novas

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realidades urbanas, principalmente as queocorrem nas periferias da cidade existente,pretendem dar novos caminhos ao espaçopúblico: a mobilidade individualgeneralizada, a multiplicação e aespecialização de “novas centralidades” e aforça das distâncias que parecem impor-seàs tentativas de dar continuidade formal esimbólica aos espaços públicos.

Os projetos urbanos somente seapresentarão como construtores de cidadese fizerem parte de uma política coerente,que se propõe a elevar a escala da cidadee articular a cidade existente. Isso requeralguns instrumentos: os planosestratégicos, de ordenação urbana,programa de grandes intervençõespensadas a partir de objetivos fixos, planossetoriais que possam integrar variasdimensões. Os projetos urbanos cidadãosdevem ser parte de um projeto de cidadedotado de legitimidade, de base legal, deacordo político e um consenso com osdiversos atores urbanos.

Considerar os espaços públicos nosgrandes projetos urbanos apresenta-secomo fundamental para sua capacidade decriar de cidade e para tanto, BORJA citaalgumas razões:

a. por que o espaço público é umimportante meio para facilitar amultifuncionalidade dos projetosurbanos, permitindo diversidadede usos no espaço e adaptabilidadeno tempo.

b. o espaço público é o mecanismoque pode garantir a qualidade nasrelações de um projeto urbano, tantopara os usuários, como para orestante dos cidadãos, cujo potencialdeve ser confirmado pelo desenho,verificado e desenvolvido pelo uso.

c. o espaço público é uma possívelresposta ao desafio de articular obairro, a cidade e a região. A

continuidade dos grandes eixos deespaço público surge como condiçãode visibilidade e de acessibilidadepara aos diversos fragmentosurbanos e fator essencial deintegração cidadã.

A nova ordem urbana faz-se para ecom os cidadãos, que direta ouindiretamente, se especializam ediversificam em vários domínios,contribuindo para ajudar a compreender esuperar as causas dos problemas e a sugerirsoluções que promovam o interesse comum.A cidade precisa renascer, se revitalizar,estar dirigida a todos os grupos sociais e, oespaço público, como lugar democrático eacessível a todos, surge como o lugar porexcelência para desenvolver os programasou edificar os equipamentos de carátersocial, cultural, e recreativo.

A explicação pedagógica sobre a suaestratégia, em matéria de progressoeconômico, social, cultural ou ambiental, éum dever público. Só explicando e fazendocompreender os caminhos projetados parao futuro, suas ligações, assim como seusnovos papéis é que se tornará possível tera participação interessada de todos osatores e tornar-se mais humana. Tornar aatribuir à cidade o papel de integrar edinamizar, para que se possa desenvolverno território outro tipo de ofertas e decompetências é fornecer parte dasrespostas necessárias para preparar ocaminho do futuro desejado.

As exigências do progresso, dacomplexidade das realizações urbanas,do aparecimento de novas atividades,do avanço de novas tecnologias,provocaram grandes mudanças nascidades, transformando-as emterritórios de máxima concentração deinformação e de objetos que dificultam asua compreensão. Portanto, asintervenções neste imenso territóriourbano, que mantenham a sua naturezaestrutural e aceitem as suas múltiplasfunções, devem ser feitas a partir do

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desenho dos espaços coletivos,garantindo uma qualidade urbana real.

A cidade caracteriza-se pelos seusespaços coletivos, uma vez que asfachadas perderam a sua condição delimite entre o domínio privado e público,entre a intimidade e a terra de ninguém.Esta continuidade impõe a qualidade e oconforto do espaço público como uma dasexigências da própria cidadania, fato quedeve ser recíproco, pois o espaço públicodeve guiar-se pelos mesmos critériosadotados para os edifícios e estesinfluenciar-se pelo espaço público ondeestão inseridos.

Para decidir as intervenções noespaço público é essencial a definiçãoprévia e criteriosa de prioridades que levamem consideração o futuro, o longo prazo, enão apenas resoluções imediatistas doproblema, com soluções encontradas natentativa de conceber espaços “abertos”,autônomos e reguláveis. Seria fundamentalretornar para a importância dos espaçospúblicos e para o significado de morar, dehabitar e de ter o prazer de se sentir emcasa, mesmo nos espaços públicos.

A FUNÇÃO EDUCATIVA DOS ESPAÇOSURBANOS

A cidade, segundo BOHIGAS, podeser vista como um sistema ecológico, deuma ecologia cultural ou social, emconstante e progressiva evolução. Para queo sistema funcione é fundamental que aparticipação humana seja controlada pordiversos graus de consciência coletiva. Éimportante que entre a cidade e seushabitantes ocorra um processo derealimentação, onde os cidadãostransformem a cidade a partir do coletivo eque possam interpretar a transformação dacidade como um exemplo para sua própriatransformação. Tanto deve ser vista porconter as funções reais como por incitarformas de vida orientadas por pressupostos

mais ou menos programados, que sedefinem por uma idéia política da cidade, aqual deveria ser a do progressocomunitário, da liberdade e igualdade. Nadefinição das formas urbanas e suasligações existem três elementosfundamentais: a legibilidade, a identidadee a inovação cultural, que são veículos deconvivência e instrumentos educadores.

Cidadania tem relação com aconquista da qualidade de vidapreservando a dignidade da vida, anatureza e o meio ambiente, formarcidadãos é formar indivíduos capazes departilhar a sociedade, suprindo suasnecessidades vitais, culturais, sociais epolíticas, contribuindo para a construção deuma nova ordem social. A implementaçãode uma política educacional orientada paraa formação da cidadania supõe mais do queuma dimensão instrumental, de previsão edestinação de recursos para viabilizarações concretas. Implica considerar, ainda,uma importante dimensão cultural, paraque se garanta o acesso ao conhecimento eaos valores relevantes e básicos numaorganização democrática.

A escola não é a única fonte deformação de cidadania, o desenvolvimentodos indivíduos e da sociedade dependecada vez mais da qualidade e da igualdadede oportunidades educativas. Formarcidadãos supõe instituições onde se possaresgatar a subjetividade inter -relacionadacom a dimensão social do ser humano,onde a produção e comunicação doconhecimento ocorram através de práticasparticipativas e criativas.

A forma urbana deve ser legível,interpretável e de fácil utilização por todos.Para isso deve estruturar-se com espaçose percursos compreensíveis onde ainformação e a acessibilidade sejammanejadas de forma coerente. Este tipo decompreensão do tecido urbano é muitoclaro nas cidades tradicionais. Alguns dosantigos povos conservam esta unidadeformal e continuam sendo magníficoscentros de vida coletiva, mas com o

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surgimento das grandes aglomerações esuas periferias, a continuidade de leituraformal foi interrompida e o espaço públicoperde o status de protagonista paraconverter-se em residual e disforme.Nestes locais, a cidade perde sua utilidadee sua capacidade educadora.

Algumas cidades têm realizadograndes esforços de reurbanização emuitas voltaram-se à recomposição formaldo espaço público, sendo que apreocupação de alguns projetos aplicam-se, com sucesso, em áreas periféricas.Outro ponto é o caso das intervençõesmuito bem sucedidas, ou até mais radicais,nas regiões centrais. Isso se deve ao fatoque as periferias não podem sermelhoradas apenas com intervençõesatuais que, apesar de importantes, devemestar associadas à recomposição física deruas, praças, instalação de infra-estruturae serviços e potencialização dasidentidades de bairro. No âmbitourbanístico é fundamental unir a periferiaao centro, estabelecendo umacontinuidade residencial e comercialpossível. Só assim se conseguirá que ohabitante das periferias se beneficie daurbanidade. “Para que a cidade seja útil eeducadora deve ser uma continuidade naqual se possam impor princípios deigualdade” BOHIGAS.

A cidade não é só o espaço (urbs),mas também o conjunto de pessoas quevivem em comunidade (civitas), portanto acidade ideal é aquela que otimiza asoportunidades de contato, que aposta nadiversidade, na mistura funcional e socialalém de multiplicar os espaços de encontro.A cidade costuma aparecer como lugar dasoportunidades, das iniciativas e dasliberdades tanto individuais quanto coletivas,além de ser o lugar da privacidade e daparticipação política. A cidade, que deveriaser o local a que todos teriam direitos, nãooferece todos os meios para que issoaconteça, pois nem todos podem utilizarsuas oportunidades de formação,informação, trabalho e cultura. É necessário,

antes de tudo, a discussão dos valores queorientam as ações, os objetivos e modelos devida urbana propor à cidadania.

Se a política é pedagogia, comoalguns colocam, e a cidade é política,parece possível comentar a dimensãopedagógica do urbanismo, “tratando aestratégia urbana como um grande projetoeducativo” BOHIGAS.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cidade democrática deve levar emconta todas as pessoas que a integram. Aparticipação cidadã na organização doterritório, na concepção e gestão dosespaços públicos é sinal de identidade nomodelo de cidade que deve ser entendidacomo cidade de encontro e civismo. Acidade é um produto cultural bastantecomplexo e carregado de significadosrecebidos através da história, quediariamente é construída e destruída portodos. Esta complexidade não ocorre pelaconcentração de pessoas, nem pelo volumede suas atividades econômicas, mas porsuas possibilidades de intercambio.

È o espaço da participação cidadãque promove demandas e propostas, alémde deveres e responsabilidades para ofere-cer alternativas, criticar, conduzir progra-mas e projetos sociais, culturais e de des-envolvimento comunitário. JORDI comentaque a responsabilidade de fazer cidadaniatambém pertence aos profissionais dourbanismo, pois sua ética e técnica, aliadasao conhecimento dos avanços do urbanis-mo, das experiências contemporâneas, epor sua criatividade, devem elaborar edefender propostas com convicção. “Lareinvención de la ciudad ciudadana, delespacio público constructor-ordenador deciudad y del urbanismo como productor desentido no es monopolio de nadie” BORJA.

De modo inventivo, os espaços deconvivência social devem transformar-se

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em espaços preferenciais de intervençãosocial e ação cultural. É preciso, portanto,encontrar as metodologias de intervençãono espaço público, não apenas com oobjetivo de preencher os espaços vazios dacidade, mas buscando uma coerência queesteja acima de uma simples justaposiçãode funções urbanas. A cidade deve serrepensada de forma global, sem esquecerque a intervenção no espaço público ésempre pontual e que é de sumaimportância deixar claro que os espaçospúblicos foram pensados de formaintegrada, em harmonia uns com os outros.

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Arquiteto Ms. Irajá Gouvêa1

Gouvêa, I.Elementos para um OrdenamentoTerritorial. Revista Assentamentos Humanos,Marília, v5, n.1, p95-100, 2003

ResumoEste trabalho tem como principal objetivolevantar e explicar os vários elementos quecompõem o meio ambiente e que irãoembasar um futuro ordenamento territorial.Através do seu conhecimento, analisandosuas particularidades e suas relações, ogestor público e sua assessoria deplanejamento passam a visualizar oordenamento territorial como um conjunto defatores a serem analisados e diagnosticados,procurando determinar de maneira maisampla e conclusiva os fatores de interferênciadentro do planejamento territorial.

AbstractThis work hás as main objective to raiseand explain the several elements that com-pose the environment and that will go tobase a future territorial order. Through itsknowledge, analyzing its particularities andits relations, the public manager and itsadvisory board of planning start to visual-ize the territorial order as a set of factors tobe analyzed and diagnosed, trying to deter-mine in ampler and conclusive way theinterference factors inside the territorialplanning.

Palavras-chavesOrdenamento territorial, meio ambiente,planejamento

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ELEMENTOS PARA UM ORDENAMENTO TERRITORIAL

1 Professor da Faculdade de Engenharia Arquitetura e Tecnologia da UNIMAR

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INTRODUÇÃO

O planejamento de uma cidade e deseu município deve considerar antes de tudoo uso e a ocupação do solo, levando para omeio político as diretrizes racionais e técnicasde maneira clara e objetiva de modo asubsidiar soluções rápidas e precisas.

O uso e ocupação do solo são semsobra de duvida parte integrante doordenamento territorial, preocupando-secom a expansão da área urbana e rural demaneira ordenada, este instrumento podese caracterizar :

A. através de sua especificidadepara cada município ou regiãoadministrativa;

B. através de suas diretrizesincluídas no plano diretor;

C. através de sua legitimidade comoinstrumento democrático, político eadministrativo.

Para que se estabeleçam diretrizesclaras e objetivas do uso e ocupação do soloem municípios de pequeno porte deve-seconsiderar, portanto, a especificidade da áreado município, estudando todos os elementosque compõem o meio ambiente, suascaracterísticas e suas interferências nopróprio meio e sua relação com o homem.

Consideram-se também, para quese estabeleça o uso e ocupação do solo, asdiretrizes determinadas no plano diretor,dando assim um encaminhamento a curto,médio e longo prazo para a ocupaçãohumana. Finalmente, a legitimidade de leisque forneçam democraticamente regras eimposições para o melhor modo de seocupar os espaços pré-estabelecidos.

ELEMENTOS DO MEIO AMBIENTE

A ordenação territorial somentepode ser compreendida e implantadaquando se tem consciência de todos oselementos que compõem o meioambiente, suas interferências e suasconseqüências. Cabe ao poder públicoatravés de seu departamento deplanejamento, detectar e analisar estes

elementos antes de se criar normatizaçõespara um ordenamento territorial. Em setratando destes elementos podemosdestacar :

Elementos Físicos:1. Água

Zoneamento das micro-bacias – Paradar subsídios ao ordenamentoterritorial é fundamental que se façaum levantamento e estudo dasmicrobacias do Município, a fim deaferir os recursos, potenciais eproblemas a serem sanados. Através dozoneamento, pode-se ter uma visãogeral do comportamento dasmicrobacias da região, bem como docomportamento das micros emacrobacias do entorno, gerando comisso, uma visão mais ampla e demaneira integrada, as regiõescircunvizinhas. Áreas de proteçãoambiental serão estabelecidas em todoo território, criando-se assim odelineamento para um crescimentoordenado no município.Águas superficiais – Através dolevantamento dos recursos hídricossuperficiais, tais como: nascentes,riachos, rios, lagos e lagoas, pode-seestabelecer potenciais diversos para ocrescimento econômico e social domunicípio. Como conseqüência destelevantamento, leis são criadas para darsuporte ao ordenamento territorial.Fatores como inundação eassoreamento podem ser previstos eevitados de maneira a preservar o bemestar da população.Hidrogeologia – Através do estudo elevantamento dos aqüíferos, pode-seestabelecer de maneira ordenada suaexploração e gestão, levando a umcadastramento das explorações jáexistentes, bem como, leis municipaisque venham a complementar aregulamentação atual. Além disso, aose estabelecer domínio sobre oconhecimento aqüífero regional, ficamais fácil para seu gerenciamento,evitando através de um

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monitoramento, sua poluição. Lixões,aterros sanitários e esgotos podem serplanejados de modo a evitaremconfronto com estes recursos. O usoindiscriminado de agrotóxicos próximosaos recursos em questão deve sermonitorado de maneira precisaevitando uma contaminação direta.

Elementos Biológicos:2. Relevo e Solo

Relevo – Através de levantamentosaltimétricos e fotoaéreos, pode-seestabelecer um conhecimento geral detoda a área em que será praticado oordenamento, seja urbano ou rural,evitando antecipadamenteassentamentos humanos em áreas deprocesso erosivo acentuados ou eminício de desgaste ou evitando o manejoagrícola em áreas degradadas porprocessos erosivos já iniciados.Voçorocas também podem sermonitoradas, visando estabelecer seucrescimento e possíveis conseqüênciasque advirão de sua existência.Solo – Seu uso na agricultura, pecuáriaou expansão urbana pode ser dirigidaatravés de análise, devendo darprioridade segunda à potencialidadeconhecida. Em áreas degradadas comopedreiras, depósitos naturais derecursos minerais ou em áreas jámodificadas pelo homem, deve-seestabelecer normatizações para suapossível revitalização e utilização.Riscos geológicos – Através de mapasgeotécnicos é possível detectar áreasfrágeis onde existem riscos em suautilização e neste caso, a ordenaçãopoderá ser implementada seguindorecomendações técnicas de maneiraclara e objetiva.

3. ArPoluição – monitorando todas asqueimadas, estabelecendonormatizações para os lixões e aterrose informações sobre o próprio clima daregião, pode-se estabelecerinformações vitais para o processo de

ordenamento territorial local. Indústriascomo curtumes entre outras devem serestudadas para que haja umconhecimento profundo e assim,fornecer melhores elementos sobresuas atividades para um ordenamentoterritorial adequado.Poluição sonora – ruídos de naturezaexploratória como: minas, madeireirase indústrias podem ser detectadosgerando subsídios para formulação denovos elementos gestores para oordenamento. O próprio tráfego urbanoexistente pode e deve ser consideradocomo agente poluidor, devendo serestudado de maneira criteriosa comoagente de interferência no meioambiente.Poluição por radiação e eletromagnética– Usinas hidroelétricas, redes detransmissão e distribuição de altavoltagem, torres de transmissão detelevisão e telefones celulares devemser de conhecimento do poder público elevantadas para que possam processarinformações prévias, evitando assimentraves no processo de ordenamento.

4. FaunaFauna remanescente – Ao se obterinformações sobre a fauna existente naregião, pode-se prever dentro doordenamento, áreas com característicase dimensões próprias para manutençãodos animais existentes, podendo seassim, tirar proveito desta iniciativaevitando assim o processo de extinçãode várias espécies animais. Pode-setambém reintroduzir animais extintosda região através de projetosambientais através de ummonitoramento constante.Repovoamento dos rios – A pisciculturacomo qualquer atividade ligada à faunaé outro elemento de interferência paraum projeto amplo de ordenamentoterritorial, uma vez que se poderepovoar rios, lagos e lagoas domunicípio como fonte de exploraçãoeconômica e de lazer, gerandointerferências de aspectos amplos naadministração do município.

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5. FloraFlora remanescente – assim como afauna, a flora nativa pode fornecerinformações sobre a região, podendo-se prever dentro do ordenamento,áreas de repovoamento de espéciesvegetais, que em parceria com orepovoamento de espécies animais,produzirá um ecossistema natural eequilibrado .Preservação e Recuperação – Atravésde viveiros e bancos genéticos deespécies vegetais, é possível acelerar oprocesso de repovoamento, interagindocom a iniciativa privada eimplementando o trabalho de replantenão só nas áreas determinadas mastambém em áreas particulares,principalmente em áreas depreservação ciliar.

Elementos Antrópicos6. Patrimônio Cultural

Preservação do patrimônio artístico-cultural – cabe ao poder público juntoao setor privado, incentivar e monitorartoda e qualquer manifestação depreservação do patrimônio artístico-cultural visando ainda que, em faseembrionária, uma tradição evalorização do aspecto histórico de seuselementos culturais. Estes elementosassim que levantados passam aproduzir interferência como qualqueroutro elemento no ordenamentoterritorial.Paisagem natural e criada – através delevantamentos e estudos, o poderpúblico deve adotar medidas queimpeçam a poluição visual, bem como,a destruição da paisagem natural,gerando uma preservação visual emtodo seu território de maneira a facilitaro ordenamento.

7. Questões SociaisMeio ambiente X Habitação – A moradiaé um elemento importantíssimo para oordenamento territorial, cabe ao poderpúblico através de seus gestores,estabelecer políticas paraassentamento da população de maneira

ordenada sem produzir desequilíbrio dequalquer natureza. A habitação, antesde tudo, é um elemento formador doespaço urbano, porém não está só,devendo compartilhar o espaço comoutros elementos urbanos, sendo estes: sociais, culturais, de serviços,comerciais e industriais. Oordenamento territorial deverádeterminar esta tênue linha entre omeio ambiente e a habitação.Crescimento demográfico – Amovimentação humana através demigrações e o próprio crescimentodemográfico é outro fatorimportantíssimo para o ordenamentoterritorial. O poder público nãoconsegue deter este avanço ouretrocesso, porém pode assegurar demaneira objetiva que asmovimentações demográficasaconteçam dentro de uma previsãojustificada e ordenada.

8. Educação AmbientalEducação, Ambiente e Sociedade –cabe ao poder público o processo deagilização da aculturação da sociedade,buscando uma interação mais rápidaentre o homem e o meio ambiente. Istose consegue através da educação econscientização de toda a sociedadepara a importância da interação entre ohomem e a natureza, mesmo estandoaquele em meio urbano.Reciclagem – Recursos humanos – cabeao poder público o encargo de viabilizarno meio social a reciclagem e dinamizaras mudanças sociais que geralmentesão lentas. Através da iniciativagovernamental, entidades sociais eculturais produzirão condições paraagilização desta atualização deconhecimento e compreensão.

PROPOSTA PARA UMAORDENAÇÃO TERRITORIAL

O ordenamento territorial deve serdividido em rural e urbano, sendo que orural possui objetivos muito amplos e de

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diversos tipos, assim, pode-se propor comoordenamento territorial rural :

a. criação de sistema rodoviário deligação de toda a zona rural com osdistritos e a sede do município,considera-se aí os elementos domeio ambiente tais como: físicos(zoneamento das microbacias, águassuperficiais , hidrogeologia) ebiológicos ( relevo e solo);

b. fixação dos usos do solo, definindo asáreas urbanas, de expansão urbana erural, conforme os diversos usos,inclusive os de floresta e de valorpaisagístico, consideram-se aí oselementos do meio ambiente taiscomo: físicos (zoneamento dasmicrobacias, águas superficiais ,hidrogeologia ) e biológicos ( relevo,solo, flora remanescente epreservação e recuperação deespécies vegetais);

c. a setorização e o equipamento dasáreas rurais, através da organizaçãodos ¨centros rurais de equipamentos¨,dos ¨centros cooperativos rurais ¨ ouainda ¨centros comunitários rurais ¨,consideram-se aí : escolas, centroreligioso, centro recreativo, posto deass i s tênc ia méd ico-san i tá r ia ,entreposto de produção, centro deabastecimento, centro distribuidor deenergia elétrica, posto de correio eposto telefônico, moradias em núcleoshabitacionais estrategicamenteimplantados ao longo de toda a zonarural.

Embora o ordenamento urbano sejarestrito a uma área física menor que orural, pode-se observar uma complexidademuito maior, assim podemos propor comoordenamento territorial urbano:

a. A distribuição do uso e ocupação dosolo de forma compatível com o meioambiente, considera-se aí oselementos do meio ambiente taiscomo: físicos (zoneamento dasmicrobacias, águas superficiais ,hidrogeologia ) e biológicos (relevo,solo, flora remanescente epreservação e recuperação de

espécies vegetais);b. A recuperação das margens dos

cursos d´água para a melhoria daqualidade ambiental, considera-se aíos elementos do meio ambiente taiscomo: físicos (águas superficiais ,hidrogeologia) e biológicos (relevo esolo);

c. Ampliação das possibilidades deacesso à terra urbana e à moradiapara as populações de renda média ebaixa, considera-se aí os elementosdo meio ambiente antrópicos (meioambiente X habitação, crescimentodemográfico, educação, ambiente esociedade);

d. Implantação de um sistema viárioestrutural que libere as áreas centraisdo tráfego de passagem e assegure apopulação um satisfatório padrão deacessibilidade, considerando-se aí oselementos do meio ambiente taiscomo: físicos (águas superficiais ,hidrogeologia) e biológicos (relevo esolo);

e. Preservação de edifícios e espaçosurbanos de valor histórico-cultural,considera-se aí o elemento do meioambiente antrópico (preservação dopatrimônio artístico-cultural);

f. Preservação de locais de valorambiental e paisagístico, considera-se aí os elementos do meio ambiente:antrópicos (paisagem natural criada)e biológicos (flora);

g. Criação de mecanismos de atuaçãoconjunta entre o setor público com osetor privado tendo em vista astransformações urbanísticas,considera-se aí o elemento do meioambiente antrópicos (educaçãoambiental e reciclagem).

CONCLUSÃO

Ao se analisar uma formulação deordenamento territorial, ainda que sejaincompleto ou parcial em sua estrutura,pode-se perceber com clareza que suaorigem vem de um meio comum, ou seja,estrutura-se através de elementos

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levantados no meio ambiente, servindo esteselementos como bases e indicativos paraformulação dos ditames do ordenamento.

Sejam físicos, biológicos ouantrópicos, os diversos elementos vãofornecer dados e orientação para que seestabeleça uma normatização, onde oresultado, dentro do planejamentourbano e regional é o próprioordenamento territorial.

Cabe portanto, ao planejador, antesde iniciar um ordenamento, buscarinformações através destes elementos paraum perfeito entendimento dos problemasregionais que envolvem o meio ambiente, ohomem e o instrumento de ordenamentocaracterizado pelo poder público.

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Sobre a Revista

Formato:210 x 270mm

Mancha:33.5 x 46.6 paicas

Tipologia:Verdana/ Fujiyama

Papel:Report - 75/gm2 (miolo)

Impressão:Avalon Gráfica Rápida /HP

Acabamento:Avalon Gráfica Rápida /Baby Binder

Tiragem:500 exemplares

Produção:Paulo Kawauchi