assemblÉia legislativa do estado do rio de janeiro 1

56
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1 MECANISMO ESTADUAL PARA PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA Ofício MEPCT/RJ 092/2012 Rio de Janeiro, 06 de dezembro de 2012. Do: Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro Para: Exma. Sra. Coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro Exma. Sra. Coordenadora, O Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro (MEPCT/RJ) vem, pelo presente, encaminhar relatório elaborado em virtude de visitas às unidades de saúde da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária em conformidade com o inciso IV do Art.8º da Lei 5.778/10. Por oportuno, informamos que exemplares do referido relatório serão igualmente apresentadas: ao Exmo. Sr. Cel. César Rubens Monteiro de Carvalho – Secretário de Estado de Administração Penitenciária; Exmo. Sr. Sérgio Côrtes – Secretário de Estado de Saúde; Ilmo. Sr. Moisés Sub-Secretário Adjunto de Saúde Penitenciária; Exma Anabelle Macedo – Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Tutela Coletiva do MP/RJ; Coordenação Nacional da Política de Saúde Penitenciária do Ministério da Saúde; Comitê Nacional para Prevenção à Tortura; Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária; Subcomitê para Prevenção da Tortura das Nações Unidas. Aproveitamos o ensejo para renovar protestos de elevada estima e consideração, colocando-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários. Atenciosamente,

Upload: phamtram

Post on 09-Jan-2017

220 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

1

MECANISMO ESTADUAL PARA PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA

Ofício MEPCT/RJ 092/2012 Rio de Janeiro, 06 de dezembro de 2012.

Do: Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro Para: Exma. Sra. Coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro Exma. Sra. Coordenadora,

O Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro (MEPCT/RJ) vem, pelo presente, encaminhar relatório elaborado em virtude de visitas às unidades de saúde da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária em conformidade com o inciso IV do Art.8º da Lei 5.778/10.

Por oportuno, informamos que exemplares do referido relatório serão igualmente

apresentadas: ao Exmo. Sr. Cel. César Rubens Monteiro de Carvalho – Secretário de Estado de Administração Penitenciária; Exmo. Sr. Sérgio Côrtes – Secretário de Estado de Saúde; Ilmo. Sr. Moisés Sub-Secretário Adjunto de Saúde Penitenciária; Exma Anabelle Macedo – Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Tutela Coletiva do MP/RJ; Coordenação Nacional da Política de Saúde Penitenciária do Ministério da Saúde; Comitê Nacional para Prevenção à Tortura; Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária; Subcomitê para Prevenção da Tortura das Nações Unidas.

Aproveitamos o ensejo para renovar protestos de elevada estima e consideração,

colocando-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários.

Atenciosamente,

Page 2: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

2

RELATÓRIO DE VISITA ÀS UNIDADES DE SAÚDE DA SEAP/RJ

O presente relatório está dividido nos seguintes itens: I - Apresentação; II – Do

Relatório; III – Política de Saúde para População Prisional; IV – Das Visitas; V –

Considerações Gerais; VI – Recomendações .

I – APRESENTAÇÃO.

O Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro

(MEPCT/RJ) é um órgão criado pela Lei Estadual Nº 5.778 de 30 de junho de 2010,

vinculado à Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro que tem como objetivo

planejar, realizar e conduzir visitas periódicas e regulares a espaços de privação de

liberdade, qualquer que seja a forma ou fundamento de detenção, aprisionamento,

contenção ou colocação em estabelecimento público ou privado de controle, vigilância,

internação, abrigo ou tratamento, para verificar as condições em que se encontram

submetidas as pessoas privadas de liberdade, com intuito de prevenir a tortura e outros

tratamentos ou penas cruéis, desumanos e degradantes. Segundo o Protocolo Facultativo à

Convenção contra a Tortura, os Mecanismos também têm como atribuição recomendar

medidas para a adequação dos espaços de privação de liberdade aos parâmetros

internacionais e nacionais e acompanhar as medidas implementadas para atender às

recomendações.

Como prevenção da tortura e de outros tratamentos ou penais cruéis, desumanos e

degradantes entende-se “desde a análise de instrumentos internacionais de proteção até o

exame das condições materiais de detenção, considerando políticas públicas, orçamentos,

regulações, orientações escritas e conceitos teóricos que explicam os atos e omissões que

impedem a aplicação de princípios universais em condições locais”.1 Para tanto, o

1 Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura: manual de implementação. (p.73). San José, Costa Rica: Associação para Prevenção à Tortura e Instituto Interamericano de Direitos Humanos, 2010.

Page 3: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

3

propósito fundamental do mandato preventivo é o de “identificação do risco de tortura”2 e,

a partir da ação proativa de monitoramento de centros de privação de liberdade, prevenir

que as violações aconteçam. O enfoque preventivo do MEPCT/RJ se baseia na premissa de

um diálogo cooperativo com as autoridades competentes para coibição da tortura e outros

tratamentos degradantes e cruéis à pessoa privada de sua liberdade. Desta forma, como

expressa o inciso II, do art. 2º da lei que o institui, busca-se a “articulação, em regime de

colaboração, entre as esferas de governo e de poder, principalmente, entre os órgãos

responsáveis pela segurança pública, pela custódia de pessoas privadas de liberdade, por

locais de longa permanência e pela proteção de direitos humanos” (Lei 5778/2010).

O Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro

(MEPCT/RJ) resulta do processo de estabelecimento, pelo Estado Brasileiro, das diretrizes

contidas no Protocolo Facultativo à Convenção contra Tortura e Outros Tratamentos ou

Penais Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações Unidas, ratificado

pelo país no ano de 2007. O referido Protocolo decorre do acúmulo estabelecido na

Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU realizada em 1993 na qual se declarou

firmemente que os esforços para erradicar a tortura deveriam primeira e principalmente

concentrar-se na prevenção, designando para tanto, o estabelecimento de um sistema

preventivo de visitas regulares a centros de detenção.

Além disso, a construção de Mecanismos Preventivos de monitoramento dos locais

de privação de liberdade integra as prerrogativas do “Plano de Ações de Integradas para a

Prevenção e o Combate à Tortura no Brasil”, de 2006, bem como o Plano Nacional de

Direitos Humanos 3 da Secretaria de Direitos Humanos. Neste sentido, o Estado do Rio de

Janeiro coloca-se em posição de pioneirismo na Federação, salientando o compromisso

com a implementação do Plano de Ações Integradas para a Prevenção e Combate à Tortura

no Brasil, com a defesa dos direitos humanos e a consolidação dos princípios democráticos.

2 Declaração do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU ao apresentar o segundo relatório anual do SPT ao Comitê contra a Tortura. Vide “Committeeagainst Torture meetswithSubcommitteeonPreventionof Torture”, Comunicado de imprensa de 2 de maio de 2009, disponível em: www.unog.ch.http://www.unog.ch/80256EDD006B9C2E/(httpNewsByYear_en)/02A16C255B95E900C12575B40051FA5A?OpenDocument

Page 4: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

4

O Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro

(MEPCT/RJ) deu início às suas atividades em julho de 2011 após a nomeação de seus

membros pelo presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, conforme

atribuição do inciso II do 5º parágrafo da Lei 5778/10.

Cabe registrar que embora a nomeação dos membros do MEPCT/RJ tenha ocorrido

no mês de junho de 2010, o órgão ainda não dispõe de uma infra-estrutura operacional

mínima para execução de suas atividades. Neste momento, os membros do Mecanismo se

situam, provisoriamente, em uma sala gentilmente cedida pela Ordem dos Advogados do

Brasil Seccional do Rio de Janeiro (OAB/RJ) e não possuem veículo para efetuar

deslocamentos.

II. DO RELATÓRIO.

O relatório ora apresentado tem o intuito de diagnosticar as políticas de saúde

existentes no âmbito do sistema prisional no Rio de Janeiro e as condições observadas para

o tratamento de pessoas privadas de liberdade deste estado. Sua finalidade é a de prevenir e

combater as condições de tortura através de recomendações que estabeleçam harmonia com

os padrões nacionais e internacionais de cuidados em saúde.

Como prevenção da tortura e de outros tratamentos ou penais cruéis, desumanos e

degradantes entende-se “desde a análise de instrumentos internacionais de proteção até o

exame das condições materiais de detenção, considerando políticas públicas, orçamentos,

regulações, orientações escritas e conceitos teóricos que explicam os atos e omissões que

impedem a aplicação de princípios universais em condições locais”.3 Para tanto, o

propósito fundamental do mandato preventivo é o de “identificação do risco de tortura”4 e,

a partir da ação proativa de monitoramento, buscar prevenir que as violações aconteçam.

3 Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura: manual de implementação. (p.73). San José, Costa Rica: Associação para Prevenção à Tortura e Instituto Interamericano de Direitos Humanos, 2010. 4 Declaração do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU ao apresentar o segundo relatório anual do SPT ao Comitê contra a Tortura. Vide “Committeeagainst Torture meetswithSubcommitteeonPreventionof

Page 5: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

5

No que se refere às pessoas reclusas, o direito a saúde deve ser prioritário. Segundo

Bent Sorensen5, um nível de atenção à saúde inadequado pode se transformar rapidamente

em tratamento desumano, cruel e degradante, enquanto uma boa assistência à saúde tem

impacto positivo tanto na vida do preso como na do corpo funcional6 das unidades de

privação de liberdade.

III – INTRODUÇÃO: POLÍTICAS DE SAÚDE PARA POPULAÇÃO PRISIONAL.

III.1) Sistema Único de Saúde e Saúde Prisional.

No Brasil, um importante marco histórico na definição da concepção de

saúde/doença deu-se na VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, que reforçou no país

o movimento de Reforma Sanitária. Nela, define-se a saúde, em seu sentido mais

abrangente, como “resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda,

meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, acesso e posse da terra e acesso a

serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da

produção, as quais podem gerar dificuldades nos níveis de vida” (1986,VIII Conferência

Nacional de Saúde7).

Também neste ano de 1986 é realizada em Ottawa (no Canadá), a I Conferência

Internacional sobre Promoção da Saúde, que considera como condições necessárias para a

existência de saúde: paz, educação, habitação, alimentação, renda, ecossistema estável,

recursos sustentáveis, justiça social e eqüidade. Neste aspecto, as concepções atuais

demarcam que a saúde não está ligada exclusivamente às manifestações físicas nos corpos Torture”, Comunicado de imprensa de 2 de maio de 2009, disponível em: www.unog.ch.http://www.unog.ch/80256EDD006B9C2E/(httpNewsByYear_en)/02A16C255B95E900C12575B40051FA5A?OpenDocument 5 Perito integrante do Comitê Europeu para Prevenção à Tortura. 6 Saúde e Direitos Humanos nas Prisões, organizadora Tânia Kolker, Rio de Janeiro, 2001. Publicação do Ministério da Justiça. 7 Relatório da 8a Conferencia Nacional de Saúde . Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/8_CNS_Relatorio%20Final.pdf. Página acessada 05 de Janeiro de 2012.

Page 6: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

6

dos indivíduos, mas também às relações sociais, sendo, portanto, um reflexo da interação

com suas vidas. A saúde não se mede exclusivamente pela ausência de doenças, reforçando

a idéia de que a saúde é um direito humano fundamental para qual a prevenção e a atenção

primária a saúde passaria a ter papel basilar.

No que diz respeito à saúde mental, amplo movimento pela reforma psiquiátrica8

desaguou, em 2001, na aprovação da Lei 10.216, colocando em xeque a lógica tutelar,

asilar e manicomial.

A saúde da população privada de liberdade foi objeto, em particular, da Portaria

Interministerial nº 1777/GM em 9 de setembro de 2003, quando os Ministros de Estado da

Saúde e da Justiça, no uso de suas atribuições, consideraram:

“a importância da definição e implementação de ações e serviços, consoantes com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde – SUS –, que viabilizem uma atenção integral à saúde da população compreendida pelo Sistema Penitenciário Nacional (...); a estimativa de que, em decorrência de fatores de risco a que está exposta grande parte dessa população, ocorra um número significativo de casos de DST/Aids, tuberculose, pneumonias, dermatoses, transtornos mentais, hepatites, traumas, diarréias infecciosas, além de outros problemas prevalentes na população adulta brasileira, tais como hipertensão arterial e diabetes mellitus; a necessidade de ações de promoção da saúde e de prevenção de doenças nos presídios; a importância da realização de estudos de abrangência nacional que revelem o perfil epidemiológico da população presidiária brasileira; a heterogeneidade, entre as unidades federadas, da assistência à saúde prestada às pessoas presas, e as recomendações da Comissão Interministerial, criada pela Portaria Interministerial MS/MJ N.º 2035, de 8 de novembro de 2001, com a atribuição de formular propostas destinadas a viabilizar a atenção integral à saúde dessa população”9.

A partir desta portaria resolve-se aprovar o Plano Nacional de Saúde no Sistema

Penitenciário e estabelecer que as Secretarias de Estado da Saúde e da Justiça – ou

Administração Penitenciaria – deverão formular os Planos Operativos Estaduais. No Rio de

Janeiro, o Plano Estadual de Saúde Penitenciária encontra-se em um impasse desde que o

8 Nos aprofundaremos nesse tema mais abaixo, no item III.3: “Reforma Psiquiátrica e Medidas de Segurança”. 9 Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/resources/ses/perfil/profissional-da-saude/grupo-tecnico-de-acoes-estrategicas-gtae/saude-das-populacoes-privadas-de-liberdade/sau

Page 7: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

7

repasse financeiro dos anos 2004-2007 não teve suas contas prestadas. No seminário

organizado pelo Fórum de Saúde do Sistema Prisional “Rumos da saúde no sistema

penitenciário do rio de janeiro: para onde vamos?”, realizado em Setembro de 2012, a

representante do Ministério Público apresentou iniciativas tomadas para investigar a

utilização do Fundo Estadual de Saúde destinado ao Plano Nacional de Saúde do Sistema

Penitenciário (PNSSP), pelos gestores da SEAP e da SES. Já o representante do Ministério

da Saúde apresentou o mapeamento dos estados brasileiros nos quais o plano está em

funcionamento e os que ainda faltam ser efetivados, bem como a proposta do Ministério da

Saúde de transformar o Plano em uma Política Nacional pautada nos princípios do Sistema

Único de Saúde (SUS).

Recentemente, em 11 de abril de 2012, o Departamento Penitenciário (DEPEN)

divulgou a criação do Grupo de Trabalho Interministerial de Saúde no Sistema Prisional,

que visa transformar o Plano em Política Nacional de Saúde no Sistema Prisional. O Grupo

de Trabalho decorre desta parceria entre os Ministérios da Saúde e Justiça e, segundo

divulgado por estes: “serão desenvolvidas também ações de prevenção, promoção e

tratamento nas áreas de saúde bucal, saúde da mulher, doenças sexualmente

transmissíveis, HIV/Aids e hepatites virais, saúde mental, controle da tuberculose,

hipertensão e diabetes, hanseníase, imunizações, coletas de exames laboratoriais e

utilizando a assistência farmacêutica básica, com foco na atenção integral.”10

A adequação da saúde prisional aos parâmetros do SUS e das reformas sanitária e

psiquiátrica constitui-se, ainda, numa necessidade premente. Se por um lado avançou-se

muito no que diz respeito ao marco regulatório e nas diretrizes nacionais de atendimento,

no que tange ao atendimento em saúde no sistema prisional há ainda uma carência notável

na implantação do SUS nas unidades prisionais, e nas relações interinstitucionais e

intergestores. Apesar do direito à saúde estar garantido no ordenamento jurídico

internacional e nacional, a distância entre a doutrina legal e a prática é explícita.

10 “Governo elabora Política Nacional de Saúde no Sistema Prisional”, Portal Brasil, publicado em 11 de abril de 2012. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/noticias/arquivos/2012/04/11/governo-elabora-politica-nacional-de-saude-no-sistema-prisional

Page 8: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

8

III.1.a) Sistema Único de Saúde e Saúde Prisional no Rio de Janeiro

O ano de 2012 foi marcado, no rio de janeiro, por embates no que diz respeito ao

tema da saúde nas prisões. Se é fato que o sistema de saúde prisional deste Estado tenha

sido sempre uma referência no âmbito nacional e um exemplo de boas práticas – tendo

sido o primeiro a ter convênio com o SUS ainda na década de 1990 – um desmonte das

condições de trabalho e atendimento vem assolando, aceleradamente, as condições de

prestação deste serviço. Além disso, a iminência de privatização da gestão e contratação de

servidores via Organizações Sociais (OSs) também se fez presente, e foi pautada nos

debates públicos sobre o tema no ano de 2012.

Há mais de 10 anos sem reajustes salariais e sem novas contratações, os

profissionais de saúde da SEAP assistiram, nos últimos anos, à quase duplicação do efetivo

carcerário e à deterioração de sua condição de trabalho. Tal fato foi objeto de uma

audiência pública na ALERJ realizada em Abril de 2012, aonde foi anunciada a

precarização derradeira do atendimento em saúde no sistema frente ao ingresso de mais 5

mil presos no sistema prisional oriundos do fechamento das carceragens, fato que

consolidou a situação de superlotação na maior parte das unidades da SEAP – Secretaria de

Estado de Administração Penitenciária.

A ausência de plano de cargos e salários para os profissionais da área de saúde, a

carência de profissionais, a falta de condições estruturais de atendimento e as condições

insalubres das unidades prisionais calharam num quadro de grave expansão da tuberculose

e da AIDS nos presídios: “A vulnerabilidade dessas pessoas pode ser explicada pelas

condições insalubres das prisões, a assistência inadequada, o contexto de violência e a

falta de conscientização dos detentos e dos agentes de saúde...o índice de casos da

tuberculose nos presídios é 36 vezes maior que o da média da população e um dos

principais motivos para isso seria a redução no número de médicos nos presídios – em

Page 9: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

9

2005, o Sanatório Penal tinha 11 profissionais para o atendimento dos presos e, este ano,

conta com apenas dois”11.

Em apresentação12 de dados na audiência pública demonstrou-se que, enquanto em

1995 haviam 20 unidades prisionais com entorno de 9.000 internos, no ano de 2011 já eram

41 unidades com quase 29.000 internos e, em 2012, mais de 30.000 presos custodiados no

rio de janeiro.

Eram sete os hospitais penitenciários: três hospitais psiquiátricos, um hospital geral,

um para tuberculose, um para AIDS e mais um para doentes crônicos. O ponto de apoio era

o Hospital Central, que ficava no Complexo Frei Caneca (no centro da cidade do rio de

janeiro) e tinha várias especialidades com alta taxa de resolutividade. O Hospital Central foi

fechado quando foi desativado o Complexo Frei Caneca e transferido para Bangu sem

chegar, sequer, a ter centro cirúrgico. O mesmo foi fechado pelo Ministério Público em

meados de 2008/2009. O Hospital Penal de Niterói também possuía tratamento

especializado para pacientes com HIV e AIDS e altas taxas de cura de várias patologias.

Este hospital foi fechado em 2008 pelo Ministério Público por falta de profissionais

médicos. Os demais hospitais são os hospitais psiquiátricos (Heitor Carrilho, Roberto de

Medeiros e Henrique Roxo), Sanatório Penal e Hamilton Augustinho – que teve a

implementação, desde agosto de 2011, de uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento) em

seu anexo. Esta Unidade de Pronto Atendimento passou a ser ponto de referência para

atendimento das emergências. No entanto, além de não ter centro cirúrgico, a UPA se

encontra muito distante das unidades que não fazem parte do Complexo Penitenciário de

Bangu.

11 Fala da Doutora ALEXANDRA SANCHEZ responsável (à época) pelo Programa de Controle da Tuberculose da SEAP e assessora técnica do Fundo Global Tuberculose Brasil, em audiência pública na ALERJ no dia 17/04/2012.

12 Baseado na fala da Dra. Lúcia Lutz, médica do sistema desde 1994 e presidente da Associação dos Servidores das Áreas de Saúde e Assistência Penitenciária, na audiência pública realizada na ALERJ no dia 17/04/2012.

Page 10: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

10

Em maio de 2012 eram 709 servidores efetivos/concursados; 119 servidores cedidos

da área de saúde; e 151 servidores contratados/temporários, lotados nos hospitais e nos

ambulatórios do sistema penitenciário. Em sua apresentação, a presidente da ASSAP

atribuiu dois motivos principais para evasão que ocorreu entre os nossos profissionais de

saúde, em especial os médicos: aposentadorias e exoneração – esta última por salários e/ou

condições de trabalho. O salário dos médicos, que em 1995 estava entorno de dez salários

mínimos, atualmente está próximo de três salários mínimos e, além disso, a equipe de saúde

não tem para onde encaminhar um doente. Nota-se o desencadear de um efeito dominó: a

redução dos técnicos junto com a superpopulação carcerária cria uma grande dificuldade

para atingir metas, levando a uma ainda maior evasão de profissionais.

A conseqüência da falta de profissionais de saúde e de equipe técnica são várias:

falta de atendimento nas unidades, diminuição da eficácia de vários programas, fechamento

de hospitais, redução de número de internação necessária, diminuição das taxas de detecção

de doença, e, conseqüentemente, maior dificuldade no tratamento. Tal dificuldade aponta

para um clima de tensão nas unidades, fator que facilita, ainda mais, a criação de condições

para o crime de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes – na medida

em que se trata de um crime de oportunidade.

Ressaltou-se, ainda, na audiência, a não consolidação da meta 11 do Plano Diretor

do Sistema Penitenciário (DEPEN), já que esta indica a necessidade de “Criação e

instituição de carreiras próprias de agentes penitenciários, técnicos de pessoal

administrativo, bem como a elaboração e implantação de um plano de carreira”. A

primeira etapa da implantação dessa meta dar-se-ia entre dezembro de 2007 e fevereiro de

2008, quando deveria ter sido elaborado um anteprojeto de lei criando um plano de

carreiras para todos os servidores da SEAP a ser submetido ao Governador do Estado e à

Assembléia Legislativa. Essa etapa foi feita parcialmente posto que, em dezembro de 2008,

foi aprovado um plano de carreiras e salários apenas para os inspetores penitenciários,

ficando a área técnica de saúde e o pessoal administrativo num plano à parte, que está

sendo elaborado desde o final de 2008. Esse plano se encontra na Secretaria de

Page 11: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

11

Planejamento, desde março de 2011. Na atualização do Plano Diretor do Sistema

Penitenciário13, indica-se, sobre a meta 11:

A aprovação do plano apenas para os inspetores penitenciários criou uma dualidade

nos salários entre os técnicos. Um profissional que ingressar na carreira de inspetor

penitenciário, com nível de ensino médio, terá um vencimento inicial de três mil e duzentos

reais. Enquanto isso, técnicos de nível superior que trabalham na Secretaria de

Administração Penitenciária de 15 anos a 18 anos, tem (em março de 2012) um vencimento

de 1.686 reais, que, contando os triênios chegaria a um total de dois mil reais.

Por outro lado, os profissionais médicos da UPA de Bangu, são contratados pela

FIOTEC e tem outro tipo de vencimento. Isso gera, além de uma grande variação de

salários, uma variedade de contratos de trabalho e a possibilidade de competição entre os

próprios servidores. Além disso, o quadro de funcionários contratados temporariamente não

13 Disponível em: http://portal.mj.gov.br/main.asp?View=%7BE7CD13B5-D38A-44D1-8020-EB9BF0F41E93%7D&Team=&params=itemID=%7B2AC5EC2A-C783-4C72-9B14-65BE75D88371%7D;&UIPartUID=%7B2868BA3C-1C72-4347-BE11-A26F70F4CB26%7D

Page 12: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

12

cria vínculos tão fortes com seu ambiente de trabalho tal qual é possível observar-se no que

diz respeito aos funcionários de carreira.

No que diz respeito a tal temática, o Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária, na resolução 08 de 2002, recomenda a “rejeição de qualquer proposta

tendente à privatização do sistema penitenciário”. Neste parágrafo único ainda ressalta-se:

Os serviços técnicos relacionados ao acompanhamento e à avaliação da individualização da execução penal, assim compreendidos os relativos à assistência jurídica; médica, psicológica e social, por se inserirem em atividades administrativas destinadas a instruir decisões judiciais, sob nenhuma hipótese ou pretexto deverão ser realizadas por empresas privadas, de forma direta ou delegada, uma vez que compõem requisitos da avaliação do mérito dos condenados. (CNPCP, Resolução 08 de 09 de dezembro de 2002).

No entanto, aponta-se a tendência, no Rio de Janeiro, da gestão e contratação de

servidores através de Organizações Sociais. Tal fato foi explicitado em reunião do Fórum

de Saúde do Sistema Prisional em 26 de novembro de 2012, aonde foi anunciada a

contratação de novos servidores temporários, já via OS, para todo o Complexo

Penitenciário de Gericinó em 2013. O Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura já

alertou os motivos de sua preocupação frente a esse fato em todos os seus relatórios e

reuniões públicas. No item Considerações Gerais deste relatório, voltaremos a debater esse

assunto.

III.3) Reforma Psiquiátrica e Medidas de Segurança

No que diz respeito à reforma psiquiátrica, a diretriz de desinternação e tratamento

em liberdade é cabalmente ferida se levarmos em conta a realidade dos manicômios

judiciários. Uma rápida análise dos tratados internacionais que versam sobre a medida de

tratamento a partir do internamento, permite concluir que os princípios da

excepcionalidade, brevidade e incompletude institucional da internação nortearam a visão

contemporânea dos legisladores em todo o mundo e permitiram a adoção, pela Assembléia

Geral da ONU, em 1991, dos “Princípios para a Proteção das Pessoas Acometidas de

Page 13: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

13

Transtorno Mental e para a Melhoria da Assistência a Saúde Mental”, além de leis

nacionais que reorientaram a atenção à saúde mental no âmbito de Estados Nacionais. Entre

tais princípios, cabe destacar o item um (1) e quatro (4) do princípio nove (9), que versa

sobre o “tratamento”, indicando que: “Todo usuário terá direito a ser tratado no ambiente

menos restritivo possível, com o tratamento menos restritivo ou invasivo, apropriado às

suas necessidades de saúde e à necessidade de proteger a segurança física dos outros”; e

“O tratamento de cada usuário deverá estar direcionado no sentido de preservar e

aumentar a autonomia pessoal.”

Dez anos após a promulgação dos Princípios, a Organização Mundial da Saúde

lança o relatório “Saúde Mental: Nova Concepção, Nova Esperança”, coadunando com já

reconhecidas críticas ao modelo manicomial mundo afora14. Neste documento a

Organização Mundial de Saúde afirmava:

O malogro dos manicômios é evidenciado por repetidos casos de maus-tratos aos pacientes, isolamento geográfico e profissional das instituições e do seu pessoal, insuficiência dos procedimentos para notificação e prestação de contas, má administração e gestão ineficiente, má aplicação dos recursos financeiros, falta de treinamento do pessoal e procedimentos inadequados de inspeção e controle de qualidade.

A promulgação do SUS pela Constituição Federal de 1988 e sua regulamentação

pelas Leis Orgânicas da Saúde n.º 8080/90 e nº 8.142/90, tornam obrigatório o atendimento

público a qualquer cidadão, de forma universal. No ano de 1989, é dada entrada no Projeto

de Lei que propõe a regulamentação dos direitos da pessoa portadora de sofrimento mental

e a extinção progressiva dos manicômios no país, marcando o inicio desta luta no campo

legislativo e normativo. O marco legal da Reforma Psiquiátrica seria aprovado, no entanto,

no dia 6 de Abril de 2001, a partir da aprovação da Lei 10.216, que “Dispõe sobre a

14 Em 1973 o Serviço Hospitalar de Trieste, na Itália, dirigido por Franco Basaglia, foi considerado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como referência mundial para reformulação da assistência à saúde mental. Em seguida, a Lei 180 de 1978 estabeleceu a abolição dos manicômios na Itália. Basaglia se tornaria um dos grandes expoentes intelectuais da reforma psiquiátrica.

Page 14: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

14

proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o

modelo assistencial em saúde mental”.

No bojo desta discussão internacional e nacional, enfrentar-se-ia a mudança de

paradigma do cuidado, indicando que os serviços de base comunitária poderiam favorecer

intervenções precoces e combater o estigma associado aos usuários dos serviços de saúde

mental; por conseguinte, os grandes hospitais psiquiátricos, de tipo carcerário, deveriam ser

substituídos por serviços que organizassem o cuidado com base na comunidade. Ainda

assim, seria necessário um processo bem coordenado de desinstitucionalização

fundamentado em três componentes essenciais: “prevenção das admissões impróprias em

hospitais psiquiátricos, mediante o fornecimento de serviços comunitários; regresso à

comunidade dos doentes institucionalizados à longo prazo que tenham passado por uma

preparação adequada; estabelecimento e manutenção de sistemas de apoio comunitário para

doentes não institucionalizados”. É nesse período que a Reforma Psiquiátrica se consolida

como política oficial do Ministério da Saúde.

A Política Nacional de Saúde Mental tem por objetivo qualificar, expandir e

fortalecer a rede extra-hospitalar formada por uma rede de serviços e equipamentos

variados tais como: os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), os Serviços Residenciais

Terapêuticos (SRT), os Centros de Convivência e Cultura e os leitos de atenção integral

(em Hospitais Gerais, nos CAPS III), e o Programa de Volta para Casa, que oferece bolsas

para egressos de longas internações em hospitais psiquiátricos.

No ordenamento jurídico brasileiro, as pessoas com transtornos mentais que

cometem crimes são consideradas inimputáveis, ou seja, “isentas de pena”, pois,

consideradas como “incapazes” não teriam a compreensão do caráter ilícito do fato

cometido e autodeterminação para executá-lo. Sendo assim, são submetidas à medida de

segurança, espécie de tratamento compulsório, cuja principal conseqüência foi a

segregação por longo período, através da internação em hospitais de custódia. No caso das

medidas são considerados pacientes de longa permanência exclusivamente aqueles com

Page 15: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

15

oito anos de internação ou mais, contrastando com o critério utilizado em hospitais

psiquiátrico sob a gestão direta da saúde, onde a mesma está estabelecida aos 06 meses.

Se a inimputabilidade deveria implicar na não condenação do réu, na prática ele

sofrerá uma dupla condenação: a interseção entre louco e infrator. Afinal, a legislação

vigente pode imputá-los apenas dois tipos de medidas: ambulatorial – que é raramente

prescrita – e de internação em manicômio judiciário, que não se suspende enquanto não for

considerada cessada a periculosidade mediante pericia médica.

No Rio de Janeiro, em reconhecimento ao fato de que a legislação dava margem

para internações abusivas, iniciou-se o “Programa de Reinserção Social Assistida” nos

anos 90. De certo, sua existência foi fundamental e ocasionou avanços concretos, como, por

exemplo, o cessar do critério de avaliação da periculosidade e o condicionamento da

desinternação à “remissão da sintomatologia e ao apoio sócio-familiar”. Importantes

diagnósticos foram concretizados como estudos sobre o perfil clínico, jurídico e

socioeconômico dos pacientes e visitas experimentais às famílias, todos desembocando nos

“Estudos para formulação de um programa de desinstitucionalização e reinserção social

assistida dos Pacientes Internados em Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico do

Rio de Janeiro” pela SEAP, coordenado por Tânia Kolker e Márcia L. Carvalho. Como

resultado, elaborou-se um conjunto de propostas para reestruturação do modelo de atenção

em saúde mental da SEAP pela Coordenação de Gestão em Saúde Penitenciária, que se

propunha ao desafio de adequação das medidas de segurança à lei 10216, como sugere a

resolução do CNPCP número 05 de 2004. Nela, ficam propostas diretrizes que apontam

para adequação do tratamento de portadores de transtornos mentais inimputáveis à

finalidade permanente de “reinserção social do paciente em seu meio (art. 4º, § 1° da Lei

nº 10.216/01), tendo como princípios norteadores o respeito aos direitos humanos, a

desospitalização e a superação do modelo tutelar”.

Nas visitas realizadas pelo MEPTC aos Hospitais de Custódias e Tratamento foi

possível perceber que diversos itens dessa resolução vêm servindo de norte para

Page 16: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

16

readequação desses serviços, fato que debateremos com maior propriedade no item das

Considerações Gerais desse relatório.

IV. DAS VISITAS

IV.1) Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo

Data da Fiscalização: 19 de Setembro de 2012.

Endereço: Rua Professor Heitor Carrilho, sem número.

Telefone de contato: 27172842 e 27172925

O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Henrique Roxo é um

estabelecimento inscrito no CNES15 sob o número 0012823 (Anexo 1), com última

atualização em 07 de outubro de 2012. Trata-se de um hospital de custódia para pessoas

privadas de liberdade que cumprem medida de segurança, seja para tratamento em

transtornos psiquiátricos, seja para o tratamento de uso de álcool e outras drogas. No

momento da visita a clínica abrigava 127 pacientes, tendo capacidade para 140.

IV.1.a. Recepção e Conversa com a Direção da Unidade

A equipe de inspeção foi recepcionada pelo diretor da unidade, o psiquiatra José

Augusto Viegas Martins, que acompanhou toda a inspeção. Também se fez presente o

subdiretor Gerson Vieira e o chefe de segurança Marcio Felipe Pomo Siqueira, além da

chefe de clínica Dra Teresa Cristina. O diretor da unidade assumiu o cargo em maio de

2012.

Na conversa o diretor da unidade explicitou que o Henrique Roxo é o único hospital

que recebe pacientes em medidas de segurança do sexo masculino, já que o hospital Heitor

Carrilho é atualmente basicamente um abrigo de pessoas que já cumpriram suas medidas e

15 Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Saúde,

Page 17: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

17

estão em processo de desinstitucionalização. Segundo ele, o Hospital Roberto de Medeiros

recebe pessoas em acautelamento provisório e atendimento ambulatorial para mulheres e

homens e as emergências psiquiátricas são todas atendidas pela UPA do Complexo de

Gericinó, mesmo aquelas oriundas de Niterói, Japeri e locais equidistantes da Capital –

como Evaristo de Moraes e Ary Franco. O Henrique Roxo é referência para o tratamento

ambulatorial de Niterói e algumas outras unidades do interior.

Segundo informações do diretor sua equipe divide-se em áreas geográficas distintas

para acompanhar e realizar um projeto individualizado dos pacientes. Este projeto se dá

desde o momento que ingressam no Henrique Roxo até o momento em que estão em

extinção de medida e desinstitucionalização. A equipe rosa, azul e prata são responsáveis

pela região Metropolitana 1, 2 e 3, enquanto a equipe verde responsabiliza-se pelas demais

regiões do estado – baixada litorânea, centro-sul fluminense, médio paraíba, noroeste

fluminense, região serrana e b. da Ilha Grande. Mais informações sobre a forma como está

organizado o trabalho da equipe serão dadas no item ¨Equipe Técnica¨.

O diretor destacou alguns aspectos de mudança no perfil dos ingressos no hospital.

Segundo nota-se, há uma predominância maior de pacientes oriundos do Roberto de

Medeiros que tinham como perfil o uso abusivo de álcool e outras drogas, que se distingue

dos pacientes com transtornos mentais. Atribui a mudança do perfil à reorganização

recentemente realizada pela SEAP, mas também ao processo de adequação dos manicômios

judiciários aos preceitos da reforma psiquiátrica.

Segundo o diretor, há um projeto de que as pericias sejam também em breve

realizadas no Henrique Roxo, aguardando-se a apenas o envio de verbas para que seja

viabilizada essa logística. Ainda segundo ele, alguns internos já perderam suas pericias por

terem que ficar cumprindo a pauta do carro do SOE, o que fortalece ainda mais o desejo de

que ao menos a equipe de pericia já possa se deslocar para o Henrique Roxo para cumprir a

pauta dos internos dessa unidade.

Outro aspecto destacado pelo diretor foram os projetos que são oferecidos no

hospital, como o Projeto Vida, que trabalha com a perspectiva da redução de danos e o NA

Page 18: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

18

– Narcóticos Anônimos – que voltou a fazer atividades no HCTHR na semana em que o

MEPCT realizou visita à unidade. Além disso, há um projeto de geração de renda que é

custeado com a verba arrecadada na cantina que esta sob responsabilidade da terapia

ocupacional da unidade. Com essa renda já foi possível investir em equipamentos, materiais

para atividades, ventiladores dentre outros.

IV.1. b. Dos Espaços Físicos

O Henrique Roxo é composto por uma longa área administrativa em um prédio

próprio, que fica interligado por um corredor com o espaço de custodia dos internos. A área

administrativa é bem conservada e equipada. No seu segundo andar há um grande auditório

com capacidade para em torno de 200 pessoas, muito bem estruturado. Ao passar por esse

corredor, uma grade dá acesso a outro corredor que se subdivide em duas partes – ao lado

esquerdo acessa-se a enfermaria de contenção e de observação, a farmácia da unidade e a

entrada para Galeria A – onde se encontram 04 celas, as enfermarias individuais também

em número de 04; ao lado direito encontra-se o espaço em que os funcionários realizam

suas refeições, a sala da equipe técnica da terapia ocupacional e a sala de aula. A equipe

visitou a sala de observação aonde se encontravam dois internos.

Na farmácia a equipe do MEPCT encontrou um remédio fora de validade, fato que

causou estarrecimento do diretor e sua equipe. Segundo os mesmos, isso não ocorre com

frequência e fazia muito tempo que não esbarravam com esse problema.

As grades da galeria A ficam abertas durante o dia quase todo – de 9h às 19h – o

que merece elogio. As enfermarias individuais alojam presos de outras unidades em

cuidado ambulatorial e alguns presos que não podem ficar no convívio coletivo.

No andar de cima estão as galerias onde se encontra a maioria dos presos. As celas

são grandes, no entanto, as galerias mostravam carecer de limpeza. As grades também se

encontram abertas durante todo o dia, fato que, diferente da rotina de observada em outros

espaços, favorece que a unidade tenha um clima tranquilo e uma rotina de maior acesso dos

internos a seus direitos.

Page 19: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

19

IV.1.c. Entrevista com os internos.

Segundo entrevista com os internos, são cinco as refeições diárias oferecidas na

unidade. O banho de sol ocorre diariamente de 8h30 às 10h50 e as visitas dos familiares

ocorrem nas quintas e domingos, das 14h às 16h.

Em geral os produtos de higiene são levados pelas famílias, mas também são

fornecidos pelo hospital “de vez em quando”. Embora os faxinas façam a limpeza uma vez

por dia nos dormitórios, eles acreditam “que podia ser mais limpo”. A água das torneiras e

chuveiro fica disponível durante todo o tempo e as instalações sanitárias pareceram limpas,

e são um tipo de ¨boi mais alto¨, o que era considerado por todos ¨menos pior que o boi¨.

Entre as queixas os internos reclamaram de não ter parlatório; de serem agredidos

verbalmente, além de queixas sobre a dificuldade de serem atendidos pela defensoria.

Outros queixaram-se das agressões no transporte do SOE e do tempo que ficam

acompanhando o carro até que consigam chegar no seu destino. Exemplificou-se que

algumas vezes saem do HR às 7h e só retornam na madrugada. Além disso, como já é

sabido, o veículo do SOE sempre transporta mais pessoas que a sua capacidade, em

condições degradantes e desumanas. Alguns internos também queixaram-se do

procedimento de revista com os familiares, que é vexatória. Outros registraram que a tranca

é “desumana” e que um dos pacientes já ficou até 11 dias na tranca.

Na cozinha tem um dos plantões em que uma senhora que não sabiam o nome que

joga a comida nos pratos e acrescentaram que nestes plantões eles muitas vezes sentem dor

de barriga. Segundo informações do diretor, a alimentação é feita pela empresa Home

Bread16. Alguns também questionaram o fato de sofrimento mental estarem no mesmo

convívio que os dependentes químicos, pois os problemas são diferentes e por muitas vezes

aqueles que têm dependência perdem a paciência com os demais.

16 Todos as Unidades de Saúde da SEAP são abastecidas por essa mesma empresa. Disponível em: http://www.homebread.com.br/site/default.asp

Page 20: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

20

IV.1.d. Roupa, Colchões e Roupa de Cama

Segundo informações da direção, os uniformes são distribuídos de forma gradual

para que cada um tenha 3 camisas, 2 calças e 1 bermuda. Todos os internos dormiam com

colchão e em comarcas com roupa de cama. A lavagem das mesmas é feita na lavanderia da

própria unidade.

IV.1.e. Das Atividades

Além das atividades terapêuticas, ocupacionais e do banho de sol, os internos

dispõem de sala de televisão, ping pong e sinuca. São no total de 30 os internos que

participam do projeto de geração de renda. Há uma pequena sala que comporta mais ou

menos 30 pessoas aonde são oferecidas aulas do programa ¨Brasil Alfabetizado¨.

Segundo o diretor da unidade o pátio de esportes é pouco utilizado, pois há poucos

agentes para fazer plantão. Ele afirmou que a Coordenação de Segurança de Niterói e

Interior da SEAP está selecionando 03 presos de regime semiaberto para ajudá-los nas

questões da unidade e que, assim que isso ocorrer, pretende utilizar o pátio para outras

atividades.

IV.1.f. Do Corpo Técnico

A equipe do MEPCT pôde conversar com uma miniequipe técnica que se

encontrava de plantão na unidade. Essas equipes são compostas por um terapeuta

ocupacional, um técnico de enfermagem, um psicólogo, um assistente social e um

psiquiatra. As miniequipes se reúnem semanalmente, enquanto o conjunto das miniequipes,

direção e agentes se encontram quinzenalmente para discussão técnica. Mensalmente a

defensora pública participa da reunião geral.

Segundo relataram as profissionais Sandra Regina da Conceição Picolli, Margareth

Joan Bastos e Tânia Maria Regina Fernandes, o trabalho das miniequipes é o de

Page 21: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

21

implementar a ótica antimanicomial no trato com medidas de segurança. Esta lógica

iniciou-se em 2008 – com os novos concursados – e depois se fortaleceu em 2010, tendo

sido um movimento de sensibilização de “baixo para cima”.

Além do projeto individualizado para cada paciente, as miniequipes tem como

responsabilidade a sensibilização dos territórios – que, como explicitado acima são

divididos por cores que correspondem a diferentes áreas geográficas – e dos serviços de

saúde para acolhimento do ¨louco infrator¨. Acreditam que o maior gargalo atualmente é na

porta de saída dos pacientes, pois a não implementação da rede substitutiva aos manicômios

criam a dificuldade de desinstitucionalização, em especial a falta de serviço de residências

terapêuticas (SRT). Elas ainda destacaram que seu trabalho se enfrenta o tempo todo com a

lógica da pericia com viés criminológico, pois não acreditam na ¨cessação de

periculosidade¨, mas no oferecimento de alternativas para a saída do paciente.

Entre os problemas internos, destacou-se a ausência de sanitário na enfermaria de

crise. Para elas deveria haver ambulâncias para os casos de emergência que substituíssem o

transporte pelo carro do SOE.

Ao serem perguntadas sobre as sanções disciplinares, as mesmas afirmaram que

nenhum paciente vai para cela individual sem parecer da equipe técnica. Antes a lógica de

segurança se sobrepunha às questões de saúde, mas, atualmente, a equipe técnica é ¨um

todo¨, sejam os ISAPs seja a equipe técnica da saúde.

No que diz respeito à mudança de perfil de internação por medida de segurança,

demonstraram preocupação e duvidas sobre a clareza da perícia em distinguir o usuário de

álcool e outras drogas e o traficante, o que pode causar um aumento no número de medidas

de segurança com esse perfil.

Por fim, no que diz respeito às condições de trabalho todas foram unanimes em

dizer que a situação da saúde na SEAP vem se degradando progressivamente, e que os

profissionais se encontram muito desestimulados com a falta do plano de cargos e salários e

de reajuste salarial. Ainda assim isto não interfere no carinho com o qual exercem seu

trabalho, mas de fato faz com que pensem em buscar outros empregos.

Page 22: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

22

O MEPCT pôde conversar rapidamente com os Inspetores de Segurança no

momento do almoço. Segundo os mesmos, havia, anteriormente, maior dificuldade no trato

com as questões de saúde mental e desta clientela por parte deles. Atualmente com o

trabalho que é feito em conjunto com a equipe técnica, sentem-se mais preparados para

lidar com esse público. Os agentes se queixaram do afastamento de alguns de seus colegas

que, segundo eles, foram vítimas de denúncias por parte de órgãos de direitos humanos.

Aos serem perguntados sobre como se deu esse procedimento, os mesmos responderam que

a SEAP teria aberto um processo administrativo que acabou colocando o inspetor em

questão à disposição para transferência para outra unidade.

IV.2) Hospital de Custódia e Tratamento em Dependência Química Roberto de

Medeiros

Data da Fiscalização: 10 de outubro de 2012

Instituição: Centro de Tratamento em Dependência Química Roberto de Medeiros

Endereço: Complexo Penitenciário de Gericinó – Bangu - Rio de Janeiro/RJ.

Telefone: (21) 2333-5041

Fax: 2333-4738

Diretor: Jota de Souza Tomaz

Chefe de Clínica: Gabriel Simão

II. Do Centro de Tratamento em Dependência Química Roberto de Medeiros

O CTDQRM foi inaugurado em 1997, à época sob a denominação Hospital

Psiquiátrico Penal Roberto de Medeiros. Em janeiro de 2005 passa a ser denominado

Centro de Tratamento em Dependência Química Roberto de Medeiros.

Apesar do nome atribuído ao estabelecimento, o CTDQRM não possui

especialidade em tratamento de drogas no momento, segundo afirma a Direção. A unidade

Page 23: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

23

recebe pacientes das unidades prisionais para atendimento de emergência psiquiátrica ou

para cumprimento de determinação judicial. Não recebem pacientes oriundos dos hospitais

Henrique Roxo e Heitor Carrilho. Os presos em condições mais graves são destinados à

UPA de Bangu. A maioria dos pacientes do CTDQRM é internado por dependência

química, no entanto, poucos apresentam quadro de intoxicação ou abstinência.

A unidade possui capacidade para 121 leitos. No momento da visita comportava 59

pacientes, apenas 1 cumprindo medida de segurança. A ampla maioria é composta por

internados cauterlamente. Ao todo são 55 homens e 4 mulheres.

A média da internação na unidade é de 1 a 2 meses e não há, segundo informações

da direção e dos próprios internos, separação por facção.

II. 1 - Entrevista com o Diretor

A equipe do MEPCT foi composta por Renata Lira (matrícula nº 416365-5),

Taiguara Souza (matrícula nº 416355-6) e Vera Alves (matrícula nº 416.6450), Isabel

Mansur (matrícula nº 410.388-3), Patrícia Oliveira (matrícula nº 416345-7) e Fabio Simas

(matrícula nº416346-5). Ao adentrar à unidade, o MEPCT foi recebido pelo Diretor, Sr.

Jota, com formação em pedagogia, à frente do cargo por 6 anos.

Segundo informado pela Direção, o fluxo ideal dos inimputáveis no Rio de Janeiro,

deveria iniciar pelo CTDQRM, caso seja internado provisório; posteriormente seria

transferido ao Hospital Henrique Roxo, após o parecer médico oficial reconhecendo a

inimputabilidade; por fim, Hospital Heitor Carrilho, para início do processo de

desinstitucionalização.

A Direção salienta que com o advento da Nova Lei de Cautelares Penais (Lei N.

12.403/11) tem influenciado a dinâmica interna da unidade, no sentido de incremento do

número de internações provisórias.

Segundo relatado pela Direção, o Ministério Público, bem como a Defensoria

Pública têm realizado monitoramento frequente na unidade.

Page 24: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

24

II.2 - Entrevista com Inspetores Penitenciários

O MEPCT realizou entrevista com os agentes Natalino Gomes de Araújo e Jorge

Luis Ribeiro Braga. Segundo informado pelos agentes, o CTDQRM atua com 5 agentes por

turma, sendo que o ideal seriam 7 ou 8 profissionais.

Os mesmos relatam ainda que não há nenhum capacitação específica oferecida aos

agentes penitenciários que atuam em unidades de saúde mental. Destacam ainda que tal

medida seria de extrema relevância, em razão das especificidades do referido trabalho.

Também não há atividades de formação voltadas para situações de emergência. Não há

atendimento médico oferecido aos agentes.

Em relação aos vencimentos, os agentes relatam que houve valorização recente da

categoria. Foi aprovado Plano de Cargos e Salários e incrementado o vencimento. No que

se refere aos uniformes, a SEAP não fornece a contento, de modo que os agentes precisam

comprar com recursos próprios. Os agentes queixam-se que não recebem auxílio moradia,

como recebem os policiais militares.

Outro ponto destacado é o fato de que o Chefe de Segurança não recebe gratificação

no CTDQRM, como recebe em outras unidades prisionais. Todos os agentes atuantes no

CTDQRM são concursados. Os agentes destacam que a relação com a direção é muito

positiva.

III. Questões Examinadas

III.1 - Estrutura Interna

As dependências do setor administrativo encontram-se bem conservadas. Há uma

sala destinada à assistência jurídica particular. Na unidade há um grande refeitório no qual

todos os internos fazem as refeições.

Page 25: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

25

Enfermaria B

Neste espaço ficam alojados os pacientes portadores de maior grau de

comprometimento psiquiátrico. Há um total de 23 leitos em um leito coletivo, com uma

população de 18 pacientes à data da visita. O local possui televisor e ventiladores.

Nos banheiros não há chuveiro, apenas encanamento com água para banho.

Também não há vaso sanitário, apenas o denominado boi.

Enfermaria Feminina

Esta galeria é composta por 8 leitos individuais. No momento da visita do MEPCT

havia 7 mulheres, 3 em cumprimento de medida de segurança, 3 aguardando parecer

médico e 1 condenada internada por emergência. Os leitos são azulejados e receberam

pintura nova há cerca de 1 mês. Os banheiros possuem chuveiro, mas não possuem vaso

sanitário, apenas boi.

III.2 – Cozinha

Todos os dias há um nutricionista – da empresa – monitorando as refeições. Os

internos relataram que a nutricionista conversa com eles acerca do cardápio e da qualidade

da comida. Os pacientes podem comer a quantidade que quiserem. A cozinha encontra-se

em obras, em vias de ampliação e modernização.

A cozinha do CTDQRM fornece refeições também para a unidade de acautelamento

do GSE, na qual presos podem ficar custodiados por até 1 dia.

III.3 – Farmácia

Recebem remédios mensalmente, por remessa da SEAP. Em sua visita, o MEPCT

pode constatar alguns medicamentos fora do prazo de validade.

Page 26: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

26

III.4 - Corpo Técnico

O corpo técnico do CTDQRM é composto por 9 médicos psiquiatras – 1 chefe de

clínica e 2 médicos assistentes, os outros 6 realizam exames criminológicos -, 1 terapeuta

ocupacional, 2 enfermeiras, 2 psicológas, 1 assistente social, 25 profissionais de

enfermagem – técnicos de enfermagem e agentes de saúde. A Direção destaca que seriam

necessários ao menos mais 1 assistente social e 1 terapeuta ocupacional. Não havia

nenhum representante da equipe técnica na unidade no decorrer da visita. Atuam ainda no

CTDQRM, 46 agentes de segurança. Não houve reclamações quanto ao corpo técnico por

parte dos pacientes.

A Defensoria Pública realiza atendimento 1 vez por mês no CTDQRM.

III.5 – Atividades e Banho de Sol

As visitas são realizadas nos dias de quinta-feira e domingo. Não há reclamação

quanto às visitas por parte dos pacientes. A direção flexibiliza os critérios para visita, caso a

família tenha alguma dificuldade.

Há atendimento do grupo Narcóticos Anônimos, às terças-feiras. Há atividades de

assistência religiosa às segundas, terças, quintas e sextas-feiras, com a Igreja Católica e

igrejas evangélicas. O banho de sol compreende 1:30h por dia, exceto às quintas-feiras. São

desenvolvidas atividades recreativas durante o banho de sol.

III.6 – Alimentação

A comida é preparada na própria unidade, servida em 5 refeições por dia. O serviço

é prestado pela empresa Home Bread (a mesma atua em todos os hospitais da SEAP).

III.7 – Tratamento / Isolamento

Os pacientes não relataram incidentes com uso excessivo da força por parte dos

agentes. Há uma Comissão Técnica de Classificação atuante na unidade, assim como nas

Page 27: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

27

demais unidades prisionais. Entretanto, possui apenas a atribuição de avaliar os pareceres

médicos. O Poder Judiciário possui o entendimento de que os inimputáveis não devem ser

submetidos a sanções disciplinares tal qual a dos presos.

Havia 6 pacientes em isolamento. Em entrevista com os mesmos, o MEPCT pôde

constatar que alguns foram submetidos a tal medida em razão de apreensão de aparelho de

telefone celular. O isolamento dura em média 10 dias. Neste período o paciente fica

impossibilitado de receber visitas. Os isolados recebem o banho de sol à tarde, separado dos

demais pacientes. O banheiro do isolamento possui chuveiro, mas não dispõe de vaso

sanitário, apenas boi.

IV.3) Hospital de Custodia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho

Data da Fiscalização: 24 de outubro de 2012

Instituição: Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho

Endereço: Rua Frei Caneca (Fundos), 401, Estácio, Rio de Janeiro/RJ.

Telefone de contato: (21) 23337469

Diretora: Tânia Dahmer

Subdiretor: Carlos Alberto Rodrigues

O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho (HCTPHC) foi o

primeiro manicômio judiciário fundado no Brasil e América Latina, tendo sido inaugurado

em 30 de maio de 1921. A instituição foi originalmente criada para receber as pessoas que

eram portadoras de transtorno psíquico e haviam cometido crimes. Hoje, mais de noventa

anos após sua fundação e sob a égide do que preconiza a Lei 10.216/01, a Secretaria de

Estado de Administração Penitenciária, em agosto de 2012, decidiu transformar o hospital

em um abrigo para aquelas pessoas que já cumpriram sua medida de segurança e estão em

processo de desinstitucionalização.

Page 28: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

28

O HCTPHC atende usuários do sexo feminino e masculino. Segundo a direção, a

capacidade máxima é de 240 pacientes. No momento da visita abrigava 91 usuários

internados, 80 homens e 11 mulheres, sendo que a ampla maioria não recebe visitas. Do

total de pacientes, 80 já estão em processo de desinstitucionalização e 11 ainda cumprem

seus últimos meses de medida de segurança, alguns dos quais já de posse do parecer de

cessação de periculosidade. Segundo informado pela direção, boa parte dos internos possui

dificuldades no que se refere à documentação pessoal, sendo que 28 estão pleiteando em

juízo ação de registro tardio de nascimento, através da Defensoria Pública. Segundo

informou a direção, o Heitor Carrilho não está mais recebendo pacientes.

III. Das Questões Examinadas

A equipe de inspeção composta por Renata Lira (416365-5), Taiguara Souza

(416355-6) e Vera Alves (416.6450) foi recepcionada pelo chefe de segurança Sr. Vieira e

pelo subdiretor Sr. Carlos Alberto.

Como de costume os membros da equipe solicitaram uma conversa com a direção

para apresentar o Mecanismo e obter informações iniciais sobre o hospital visitado. Na sala

da direção foi possível conversar com o subdiretor e também com integrantes das

miniequipes que compõe o atendimento aos pacientes do HCTPHC.

Antes mesmo de iniciar a visita às enfermarias os membros do Mecanismo puderam

ter um panorama de que o Hospital se encontrava em péssimas condições, pois a própria

equipe técnica, apesar de informar sobre os esforços que vem sendo realizados para efetivar

a desinstitucionalização dos pacientes, também destacou a precariedade da estrutura do

Heitor Carrilho. As dificuldades se avolumam, visto que há determinação judicial no

sentido de desativação do mesmo. Vale destacar que a rede pública atualmente

implementada é ainda insuficiente para receber os internos do HCTPHC.

O HCTPHC é o mais antigo hospital do sistema prisional brasileiro e também um

dos maiores do Rio de Janeiro em espaço físico. Possui duas “casas de passagem”, uma

Page 29: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

29

feminina e outra masculina; um pequeno prédio onde ficam localizados os pacientes mais

idosos, salas de fisioterapia; salas de atendimento psicológico; posto de enfermagem, com

leitos para observação e farmácia; conta ainda com dois prédios maiores, divididos em

“enfermarias” coletivas, em um deles, estão as pacientes mulheres e no outro, o maior

deles, os pacientes homens. Há ainda área de lazer; refeitório e as dependências

administrativas.

Foram visitadas todas as instalações do HCTPHC, as condições estruturais

encontradas estão em patente estado de abandono e degradação da unidade. Com exceção

das “casas de passagem” que se encontram em estado menos precário. O MEPCT/RJ tratará

sobre cada ambiente em separado.

Das Enfermarias para Homens

O primeiro local visitado foi a “casa de passagem”, que é chamada desta forma por

que além de possuir um ambiente mais semelhante a uma casa, com quartos, janelas,

armários para objetos pessoais, cozinha, pequena lavanderia e não possuir grades, é

destinada a àqueles que já são mais idosos e já cumpriram com sua medida de segurança,

estando, portanto, em processo de desinstitucionalização.

A casa em questão tinha boa aparência externa. No local foram encontrados alguns

pacientes repousando em suas camas. Havia forte odor de urina e muitos gatos sobre as

camas. Os lençóis e o ambiente como todo tinham aspecto de sujo e desorganizado.

Em seguida foi visitado o prédio onde fica localizado o posto de enfermagem. Nesta

instalação estão pacientes idosos com dificuldade de locomoção, seus quartos e banheiros

estavam limpos e organizados.

No posto de enfermagem foi possível conversar com algumas funcionárias que nos

relataram que a maior dificuldade, para além da estrutura precária, é a falta de

medicamentos e outros insumos. Na farmácia recebemos a informação de que falta, por

Page 30: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

30

exemplo, Haldol17, medicamento frequentemente utilizado em pessoas portadoras de

transtorno psíquico.

No prédio maior ficam os pacientes que ainda estão cumprindo medida de

segurança e aqueles que aguardam pela desinstitucionalização. A arquitetura deste local é

análoga a uma unidade prisional. São três andares com grandes “enfermarias” coletivas,

que muito embora abriguem pacientes, estão dispostas pela lógica prisional, todas

gradeadas com aparência de grandes celas coletivas. Os corredores não possuem

iluminação artificial e pouca luz natural, o ambiente está muito escuro e sujo. De modo

geral, há ainda um grande problema no que se refere à acessibilidade, visto que a estrutura

do hospital possui muitos degraus, o que representa dificuldade aos cadeirantes e demais

internos com dificuldade de locomoção.

A ausência de recolhimento de lixo e manutenção da limpeza é fato gravíssimo

constatado pelo Mecanismo, segundo o subdiretor o hospital está sem equipe de limpeza há

mais de um ano. O contrato com a empresa terceirizada que realizava a limpeza no

estabelecimento expirou, e desde então tal serviço não é realizado a contento.

Esporadicamente uma equipe de profissionais do HCTHC faz uma faxina para retirar o

excesso. Em muitas “enfermarias” os próprios pacientes fazem a limpeza do ambiente

tornando-o menos precário e habitável, mas a maioria está muito suja e abandonada.

Os pacientes ficam trancados durante a noite e pela manhã os portões são abertos,

entretanto cada paciente tem outro cadeado de sua “enfermaria” e se preferir pode trancá-la

enquanto aproveita o banho de sol. O banho de sol é assegurado de 9h às 11h e de 14h às

16h. Foi possível perceber muitas enfermarias com cadeados particulares. Os pacientes

informaram que preferem assim, pois se sentem mais seguros quanto a não haver nenhum

problema com seus pertences. Segundo a direção, essa medida foi tomada para evitar

conflito entre os pacientes.

17 Segundo foi possível anotar de um quadro fixado na farmácia o Haldol tem sido substituído por Risperidona: “2caps de hadol de 5mg = 2caps de rispiridona de 2mg”.

Page 31: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

31

Das Enfermarias para Mulheres

As enfermarias masculinas do HCTPHC estão em condições precárias, mas as

femininas estão em péssimo estado de conservação.

O prédio que abriga as pacientes femininas possui dois andares. Foi o espaço mais

precário encontrado pelo MEPCT/RJ, não há luz elétrica e pouca iluminação natural, o teto

possui manchas de umidade, a fiação elétrica está exposta colocando pacientes e

funcionários a risco, as paredes em muitos casos estão com manchas de umidade ou de

fumaça, os banheiros são compostos apenas por um chuveiro e um buraco no chão, o “boi”

- em uma das “enfermarias” foi encontrado um filhote de gato dormindo no buraco do

“boi”. Há forte odor de urina e fezes.

Algumas poucas “enfermarias” estão em condição mais habitável por que as

próprias pacientes assim as tornam. Mas são ações isoladas em um prédio que

reconhecidamente não tem qualquer condição de abrigar pessoas.

A “casa de passagem” das pacientes mulheres, assim como a para homens, é um

ambiente disposto como uma casa possuindo banheiro e lavanderia, possibilitando maior

conforto as pacientes que ali vivem.

III. 1. Atividades Recreativas Segundo informado pela equipe técnica e confirmado através de conversas com os

pacientes, pequenos grupos de pessoas que já estão em processo de desinstitucionalização

tem saído para atividades externas tais como passeios recreativos com objetivo de

aproximá-los do convívio em sociedade, pois muitos pacientes estão há muito tempo

internados, sem qualquer contato extra muros. São as chamadas saídas terapêuticas.

Foram relatados passeios à praia e ao Aterro do Flamengo e também as saídas

durante os finais de semana quando os pacientes podem visitar seus familiares.

A unidade possui 3 viaturas utilizadas para tais atividades, bem como para

atendimento médico externo e realização de diligências.

Page 32: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

32

III. 2. Assistência Jurídica

O subdiretor informou que assim como nos outros HCTP’s a defensora pública

responsável pelo atendimento jurídico dos pacientes das medidas de segurança é a Dra.

Silvia Maria de Sequeira.

III. 3. Do Corpo Técnico

Como dito inicialmente, logo na chegada foi possível conversar com o corpo técnico

que se encontrava em uma confraternização na sala da direção.

Segundo foi relatado, há no Heitor Carrilho uma equipe que realiza as perícias e

outra que atende os pacientes, esta é formada por três mini equipes compostas por

psicóloga (1), assistente social (1), terapeuta ocupacional (1) e psiquiatra (1), que cumprem

30 horas semanais. No momento só existe uma psiquiatra para as três mini equipes, Dra.

Cristina. Há ainda oito estagiários(as) das categorias mencionadas. As técnicas informaram

que há um esvaziamento de médicos no sistema prisional, no hospital há uma médica

clínica, Dra. Teresa, e um fisioterapeuta. Há um claro déficit no corpo técnico, agravado

pelos vencimentos defasados sem aumento há mais de 2 anos e pela ausência de concursos

públicas para a área, tendo sido o último realizado em 1998. Muitos integrantes da equipe

técnica são contratados. Boa parte destes terá seu contrato expirado em dezembro do

presente ano.

As miniequipes trabalham os processos de desinstitucionalização de cada paciente.

Relataram que enfrentam vários desafios para efetivar a desinstitucionalização e a

transinstitucionalização, inclusive a dificuldade de identificar os pacientes, pois muitos não

possuem se quer certidão de nascimento, o que dificulta a identificação de seus familiares, a

concessão de benefícios e o consequentemente retorno a sua casa. Contaram ainda que dois

pacientes que vieram a óbito foram enterrados como indigente por falta de documentos.

Informaram que em caso de emergência os pacientes são levados para a UPA de

Bangu no Complexo de Gericinó, mas se o caso for muito grave, o encaminhamento é feito

Page 33: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

33

para o Souza Aguiar devido à proximidade com o HCTPHC. Vale destacar que o transporte

para tais atendimentos externos não é feito pelo SOE. Apenas os deslocamentos para

comparecimento a audiências judiciais permanecem realizados pelo SOE.

Na unidade há ainda 4 equipes de segurança, cada qual composta por 5 agentes. IV. Do Tratamento Dispensado Aos Pacientes

Durante a visita realizada no Heitor Carrilho não foram relatados episódios de

tortura ou maus tratos. Os pacientes pareceram ter uma boa convivência com os agentes

que fazem a segurança e também com a equipe técnica. Contudo não se pode deixar de

afirmar que as condições estruturais degradantes em quem vivem os pacientes já são por si

só reconhecidas como tratamento cruel e desumano.

Muito embora a equipe técnica tenha se mostrado empenhada em garantir a

desinstitucionalização dos pacientes de forma eficiente e breve, o hospital não possui

condições de abrigar pessoas.

Recentemente, em 04 de setembro de 2012, a 3ª Promotoria de Justiça de Saúde da

Capital ajuizou Ação Civil Pública (ACP) requerendo a imediata desinstitucionalização dos

pacientes do Heitor Carrilho que já tiveram suas medidas de segurança extintas pela Vara

de Execução Penal. Solicitou ainda ao estado que “garanta a adequação das condições de

funcionamento da unidade até a remoção dos abrigados. É pedida a regularização do

serviço de lavanderia, limpeza, manutenção, nutrição, enfermagem, assistência médica

clínica, além da alocação de novos recursos humanos no Hospital - dois psiquiatras, seis

psicólogos, seis assistentes sociais e 25 profissionais para equipe de enfermagem.”18

Em meados de outubro de 2012 a Promotoria conseguiu liminar da justiça

obrigando o estado e o município do Rio de Janeiro a oferecer dois psiquiatras, cinco

18 “MP pede desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos abrigados irregularmente no hospital de Custódia Heitor Carrilho”, O Globo online, em 05/09/12, disponível em: http://oglobo.globo.com/rio/mp-pede-desinstitucionalizacao-de-pacientes-psiquiatricos-abrigados-irregularmente-no-hospital-de-custodia-heitor-carrilho-6010850

Page 34: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

34

cuidadores, seis psicólogos, seis assistentes sociais e 25 profissionais de enfermagem para

os trabalhos de transferência em um prazo de dez dias. Ademais, deverão ser apresentados

um relatório e um cronograma para o efetivo cumprimento dos projetos terapêuticos dos

pacientes.19

IV.4) Unidade de Pronto Atendimento – UPA do Complexo de Gericinó

Data da Fiscalização: 10 de outubro de 2012. Unidade: Unidade de Pronto Atendimento - UPA Endereço: Estrada General Emílio Maurel Filho, S/Nº - Gericinó – RJ. Diretor: Agente Penitenciária, Sra. Silva Vidal da Silva Chefe de Enfermagem: Ana Lúcia Valença Muniz IV.1 – Informações Gerais

A Unidade de Pronto Atendimento foi construída em parte do terreno pertencente ao

Hospital Penal Dr. Hamilton Agostinho. É uma construção nova que foi inaugurada em

2011 e mantém os mesmos moldes das UPAS que atendem a população em geral – são

feitas em “containers” brancos e oferecem serviço de Pronto Atendimento.

IV. 2. Da visita a Unidade de Pronto Atendimento - UPA

A equipe do MEPCT/RJ designada para realizar a visita foi composta pelos

membros do Mecanismo Estadual para Prevenção e o Combate à Tortura, Vera Lucia

Alves, Fábio Simas, Patrícia Oliveira, Isabel Mansur, Renata Lira e Taiguara Souza.

Os membros do MEPCT/RJ foram recebidos pela chefe de enfermagem, Sra. Ana

Lucia Valença Muniz, que nos informou que são atendidos, diariamente, entre 60 e 70

internos (as) oriundos de todo o sistema prisional.

19“Justiça determina que governo transfira pacientes de hospital de custódia no Estácio”, Agência O Globo, em 19/10/12, disponível em: http://br.noticias.yahoo.com/justi%C3%A7a-determina-governo-transfira-pacientes-hospital-cust%C3%B3dia-est%C3%A1cio-234531422.html

Page 35: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

35

Todos os problemas de saúde não resolvidos nas unidades prisionais são

encaminhados para atendimento na UPA, inclusive as internas gestantes. Lá, a mesmas

passam por uma triagem e, caso necessário, são encaminhadas para hospitais da Rede

Pública, pois na UPA não há ginecologista ou obstetra.

A equipe do MEPCT/RJ, inicialmente, foi recebida pela enfermeira-chefe e,

posteriormente, acompanhada pela diretora, Sra. Silvana Vidal, que chegou ao local no

momento da visita.

IV. 3 – Questões Examinadas

Ao visitar internamente a unidade, o MEPCT/RJ pode constatar que há 02

enfermarias para observação, uma masculina com 09 leitos – dos quais 05 estavam

ocupados no momento da visita –, e uma enfermaria feminina que possui 04 leitos e 02

estavam ocupados. Havia 02 salas vazias onde estavam sendo guardados alguns materiais.

Externamente, no entanto, todas tinham uma placa indicativa do atendimento a ser feito,

como, por exemplo, a sala de hemodiálise. Quando é necessária a realização da mesma, os

pacientes são encaminhados para clínicas particulares conveniadas.

Em funcionamento, pode-se verificar: a unidade intermediária; a sala de gesso; a

endoscopia; o Raio X, que realiza por dia, aproximadamente, 30 exames radiológicos –

mesmo faltando mão de obra capacitada, bem como os materiais necessários para a

realização dos exames.

IV.4. Distribuição de Uniformes, Colchões, Roupa de Cama e Material de Higiene e

Limpeza

Não existe uma firma de limpeza especializada em hospitais. Quem faz a limpeza

são os próprios internos da SEAP de outras unidades, mas que lá residem.

Page 36: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

36

IV.5. Alimentação e Fornecimento de Água

A alimentação é fornecida por uma empresa terceirizada chamada Home Bread. Os

membros do MEPCT/RJ constataram que alguns pacientes que vem de unidades distantes e

só retornam no final da tarde, não recebem nenhum tipo de alimentação. Segundo a

diretora, se os pacientes chegarem ou estiverem lá entre 11h e 11:30h receberão almoço,

após este horário, não há mais nada para servir. O mesmo ocorre se caso estejam na

unidade por volta das 16:45 h, manda-lhes servir o jantar, caso contrário, “terão que se

contentar com a ração fria que recebem nas suas unidades de origem”20.

IV.6. Do Corpo Técnico

Segundo informações da enfermeira-chefe, o Corpo Técnico é composto por 52

enfermeiros e técnicos que trabalham em regime de 24 h X 120 h. Há na unidade 03

médicos por plantão, inclusive aos sábados, domingos e feriados – clínico, cirurgião e

dentista. No dia da visita havia 02 médicos de plantão, Dra. Itauã e Dra. Andréa de

Alcântara. Os médicos são contratados por uma Fundação e tem uma contratação

específica. A diretora do Hospital negou-se a dar informações sobre o tema quando

perguntada. Os demais profissionais demonstraram muita insatisfação com a distância entre

seus salários e os dos médicos contratados, sem chegar a citar o valor da remuneração dos

mesmos.

Em conversa com os profissionais, em especial enfermeiros e técnicos de

enfermagem – todos concursados, demonstrou-se forte descontentamento com o abandono

da limpeza da Unidade – segundo informações, havia uma licitação em andamento porém a

outra empresa já havia cessado seu contrato -, a ausência de reajuste salarial, de Plano de

Cargos e Salários, de estímulo profissional e da sobrecarga de trabalho.

20 Entrevista com a Diretora da Unidade.

Page 37: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

37

No que diz respeito à continuidade do trabalho foram unânimes as queixas em

relação à exposição, ao risco, ao estresse a que estão submetidos em seus plantões, em

especial os noturnos. Houve questionamento quanto à ausência de gratificação por

periculosidade visto que, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde) a profissão de

técnico penitenciário seria a 2ª profissão mais estressante do mundo. Além disso, os

profissionais do corpo técnico não desfrutam de atendimento médico ou qualquer tipo de

acompanhamento de saúde.

Houve relatos sobre a falta de materiais como Gaze e Polifixe.

V. Hospital Dr. Hamilton Agostinho Vieira de Castro

INTRODUÇÃO

Data da Fiscalização: 10 de outubro de 2012. Unidade: Hospital Dr. Hamilton Agostinho Vieira de Castro Endereço: Estrada General Emílio Maurel Filho, S/Nº - Gericinó – RJ. Telefone de contato: (21) 2333-4731 Diretora: Agente Penitenciária, Sra. Silva Vidal da Silva Chefe de Enfermagem: Ana Lúcia Valença Muniz V.1. Informações Gerais

O Hospital Dr. Hamilton Agostinho Vieira de Castro é uma unidade hospitalar, está

vinculada à Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP) e destinada a

receber internos de todas as unidades prisionais do estado do rio de janeiro.

V.2. Da visita ao Hospital Dr. Hamilton Agostinho Vieira de Castro

A equipe do MEPCT/RJ designada para realizar a visita foi composta pelos

membros do Mecanismo Estadual para Prevenção e o Combate à Tortura, Vera Lucia

Page 38: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

38

Alves, matrícula 416645-0, Fábio Simas, matrícula 416346-5 e Patrícia Oliveira, matrícula

416345-7 e Isabel Mansur matrícula 410.388-3 e Taiguara Souza.

O Hospital mantém a mesma arquitetura de quando era um hospital que atendia

apenas idosos e cadeirantes. Com a interdição e fechamento do Hospital Fábio Soares

Maciel, o Hamilton Agostinho começou a mudar suas características, pois passou a receber

os internos daquele Hospital. Com o advento da UPA, passou também a receber os

pacientes que necessitam de um tempo maior de internação.

V.3. QUESTÕES EXAMINADAS

Ao visitar internamente a unidade, o MEPCT/RJ pode constatar que a construção é

muito antiga, precisando de muitos reparos. Possui muitas infiltrações e fios aparentes. Em

nada lembra um hospital, os leitos são, na verdade, comarcas de alvenaria, de altura baixa,

dificultando muito a locomoção dos pacientes.

Em contrapartida, a equipe do MEPCT/RJ pode constatar que na galeria “G” onde

ficam os “faxinas”, todas as camas são hospitalares.

O Hospital tem capacidade para 80 internos e no dia da inspeção o efetivo era de 75.

Em cada enfermaria (10) são atendidos 08 internos.

V.4. Alimentação, Fornecimento de Água e Limpeza, Inspetores Penitenciários, Banho de Sol, Visitas dos Familiares

A alimentação, assim como em todas as unidades hospitalares, é também fornecida

pela empresa HOME BREAD. A limpeza é realizada pelos “faxinas”.

A segurança da unidade é feita por 05 inspetores diaristas, totalizando 22 inspetores.

É concedida uma hora de sol por dia aos internos e as visitas acontecem aos sábados e

domingos das 13h às 16h.

Page 39: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

39

VI. Sanatório Penal.

Data da Fiscalização: 24 de outubro de 2012.

Endereço: Estrada Gaundu do Sena, 1902. Gericinó, Rio de Janeiro

Telefone de contato: 27172842 e 27172925

O Sanatório Penal (SP) é um estabelecimento inscrito no Cadastro Nacional de

Estabelecimentos de Saúde (CNES) sob o número 2270196. Encontra-se situado em uma

rua que dá acesso à entrada do Complexo de Gericinó, sendo vizinha ao Educandário Santo

Expedito destinada a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de

internação. A unidade se destina a atender adultos privados de liberdade para tratamento de

tuberculose.

De acordo com a definição do sítio do Ministério da Saúde, tuberculose é uma

“doença infectocontagiosa causada por uma bactéria que afeta principalmente os pulmões,

mas, também pode ocorrer em outros órgãos do corpo, como ossos, rins e meninges

(membranas que envolvem o cérebro)”21. Causada pela bactéria Bacilo de Koch, os sinas e

sintomas mais frequentes são:

Tosse seca contínua no início, depois com presença de secreção por mais de quatro semanas, transformando-se, na maioria das vezes, em uma tosse com pus ou sangue; cansaço excessivo; febre baixa geralmente à tarde; sudorese noturna; falta de apetite; palidez; emagrecimento acentuado; rouquidão; fraqueza; e prostração. Os casos graves apresentam dificuldade na respiração; eliminação de grande quantidade de sangue, colapso do pulmão e acumulo de pus na pleura (membrana que reveste o pulmão) - se houver comprometimento dessa membrana, pode ocorrer dor torácica. 22

Trata-se de transmissão direta de pessoa a pessoa ao falar espirrar ou tossir

pequenas gotas de saliva. Neste sentido, há a necessidade de tratamento em separado

devido ao risco de transmissão. Por se tratar da natureza dos espaços de privação de

liberdade, local que proporciona maior isolamento de pessoas e estas convivendo no

mesmo espaço, o risco de proliferação da doença é infinitamente maior, inclusive nos

21 Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/visualizar_texto.cfm?idtxt=31081 22 Idem.

Page 40: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

40

países onde a endemicidade da população livre é considerada pequena (Sanchez et alli

2007:545).23

Certamente, o quadro se agrava pelo cenário de superlotação nas penitenciárias

fluminenses. Vale desatacar que em visita temática realizada pelo MEPCT no final do ano

passado ao Presídio Ary Franco (PAF), que à época era a única porta de entrada de presos

do sexo masculino da SEAP, muitos presos relataram e foram observados sintomas de

suposta ocorrência de quadros de tuberculose em um ambiente superlotado, insalubre, com

precárias condições estruturais e número de profissionais de saúde bastante reduzido.

VI.1. Espaço Físico e Saúde

O Sanatório Penal se localiza em uma estrutura arquitetônica antiga onde há

décadas funcionava um convento. Há uma grande área externa na unidade onde se vê

escrito os dizeres: “Missão: buscar o controle da tuberculose”. Na entrada principal, há um

longo corredor nas cores bege e branca que dá acesso as salas das equipes técnicas e de

saúde, bem como da direção.

As enfermarias onde os presos ficam a maior parte do tempo se localizam na parte

superior da unidade e são organizadas seguindo o mesmo critério do sistema penitenciário

do Rio de Janeiro: a separação por facções do tráfico de drogas. Na enfermaria A para os

presos com suposta identificação com o “Terceiro Comando”, “ADA” ou “neutro” e a

enfermaria B daqueles com suposta identidade com o “Comando Vermelho”. As

denominadas enfermarias não apresentam distinção considerável em relação às chamadas

galerias do sistema penitenciário, já que são compostas por grandes corredores compostos

por celas trancadas. Chamou atenção em um compartimento posterior à enfermaria A, duas

celas sem nenhuma iluminação, que, segundo informação dos agentes penitenciários,

estariam desativadas. Há ainda uma enfermaria destinada a presas do sexo feminino que

23 Sanchéz, Alexandra et ali. A tuberculose nas prisões do Rio de Janeiro, Brasil: uma urgência de saúde pública. In: Cadernos de Saúde Pública 23. Rio de Janeiro: Editora Fio Cruz, 2007.

Page 41: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

41

estava vazia na ocasião da inspeção do MEPCT. Há ainda uma cela pequena para receber

presos recém chegados que também é utilizada como isolamento.

VI.2. Conversa com a Direção

A equipe de inspeção foi recepcionada pela diretora da unidade Sra. Márcia

Magalhães de Barros e o Subdiretor Sr. Sebastião Marcelo Souto. Ambos estão há mais de

uma década na SEAP e são oriundos do cargo de agentes penitenciários. A direção da

unidade foi receptiva em relação à visita e franqueou as dependências à visitação do

MEPCT.

Segundo informaram, a capacidade do Sanatório Penal é de 110 leitos e no

momento da visita havia 36 apenados na unidade. Há aproximadamente 250 apenados com

tuberculose sendo acompanhados pela SEAP em todo o estado.

Foi relatada em conversa com a direção a precariedade na prevenção e atendimento

e diagnóstico de problemas de saúde nas unidades, tanto de equipamentos, salubridade e

profissionais. Por exemplo, a unidade Alfredo Tranjan (Bangu 2) que atualmente é a porta

de entrada do sistema não possui equipamento de raio-X, no Presídio Ary Franco faltam

insumos para diagnóstico da tuberculose. No tocante à problemática da tuberculose, há

apenas 01 equipe para atender todo o sistema, onde uma medida mais eficaz na prevenção e

tratamento seria a descentralização do atendimento em articulação com a Secretaria de

Estado de Saúde. O trabalho é realizado através de procedimento de busca ativa nas

unidades.

Um dos principais complicadores em detectar a enfermidade é a espécie de triagem

realizada nas unidades em que as demandas espontâneas geralmente são repassadas aos

chamados presos “faxinas” que por sua vez fazem o encaminhamento para atendimento de

saúde nas unidades. Os profissionais foram uníssonos em afirmar que há uma situação de

demanda reprimida para a identificação e tratamento do caso da tuberculose, o que só

agrava o direito à saúde das pessoas privadas de liberdade no estado. Além disso, foi

Page 42: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

42

relatado que a situação se agravou com a desativação Hospital Central Penitenciário e o

esvaziamento do Programa de Tuberculose da SEAP. Tal esvaziamento tem sido

responsável por uma queda na taxa de cura de 80% para 30% segundo dados de 2011

fornecidos pelo Fórum Permanente de Saúde do Sistema Penitenciário24. Além disso,

refletindo todo este processo de precarização, se observa a contradição explícita na

diminuição de 38% do número de consultas para diagnóstico de tuberculose entre 2009 e

2012, período que houve um acréscimo na população carcerária de 25%.

VI. 3. Corpo Funcional

Há um assistente social e um psicólogo na unidade que fazem atendimento três

vezes por semana com a carga horária de 24h semanais. Em relação aos agentes

penitenciários, estes são organizados em uma escala de plantão de 24h por 72h em 04

turmas compostas, em média, por seis agentes cada - uma deles do sexo feminino. Foi

percebido que há na unidade um contingente maior de agentes com idades mais avançadas.

No tocante à equipe do Ambulatório Médico, a organização dos profissionais,

segundo documento fornecido pela direção da unidade (referente ao mês de outubro de

2012), se dá da seguinte maneira: 02 médicos (sendo um radiologista e outro tisiologista)

que estão na unidade uma vez por semana, 01 odontólogo, 01 farmacêutica, 04 enfermeiros,

09 técnicos de enfermagem, 16 auxiliares de enfermagem, 13 técnicos de laboratório, 07

técnicos de radiologia. Os referidos profissionais em sua maioria atuam em escalas

variáveis de um ou dois dias na semana.

A equipe do MEPCT visitou as instalações para tratamento de saúde. O ambulatório

apresentava bom estado. No tocante à farmácia, foi observada satisfatória organização no

armazenamento e controle dos medicamentos, sendo os mesmos alocados em ordem

alfabética e com registros destacados em grafias expressivas sobre a validade dos mesmos e

24 http://www.crprj.org.br/publicacoes/jornal/jornal34-desenvolvimento-as-avessas.pdf

Page 43: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

43

também a não detecção de medicamentos com prazo de validade vencida, fato incomum

nas inspeções do MEPCT no sistema prisional. Pode-se entender como boa prática a

organização da farmácia do Sanatório Penal.

Já o consultório dentário, além de apresentar equipamentos antigos e de frágil

aparência, o espaço para atendimento odontológico é precário.

IV.5.c. Regimes/Atividades/Conversa com os presos

As visitas no Sanatório Penal são realizadas às 4ª e 5ª feiras, também aos sábados e

domingos. As roupas são lavadas pelos presos “faxinas”, não há lavadora industrial no SP.

São ofertadas aos presos, 05 refeições diárias compostas por café da manhã, almoço,

lanche, jantar e ceia. Os serviços de alimentação são oferecidos através de convênio com a

empresa Home Bread Alimentos. Em conversa com os apenados, os mesmos não

apresentaram incisivas reclamações, informando que a situação de salubridade e tratamento

no SP é superior às outras unidades, além de verbalizarem como satisfatório o atendimento

de saúde na unidade.

A reclamação mais expressiva dos presos se deu em relação à qualidade da comida

ofertada na unidade, que além de se apresentar fria estaria com sabor ruim. A equipe

MEPCT teve acesso as quentinhas que não estavam em bom estado, além de apresentar

uma grande quantidade de arroz em detrimento de poucos e pequenos pedaços de carne.

Ao visitar a cozinha, a equipe do MEPCT observou precários aspectos no ambiente,

tanto na parede como no teto. Já na parte posterior da cozinha, há uma sala onde os

alimentos são armazenados, onde foi observada certa organização tanto na dispensa, quanto

naqueles resfriados e congelados. Interessante notar que embora apresentasse uma razoável

quantidade e variedade de alimentos como diferentes tipos de carnes, frangos, lingüiça,

ovos a mesma variedade não é observada na alimentação oferecida aos internos.

Page 44: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

44

VI. CONSIDERAÇÕES GERAIS

O MEPCT realizou visitas a todas as unidades de saúde do sistema prisional do rio

de janeiro, incentivado pelas constantes denúncias por parte dos presos em relação ao

atendimento de saúde e dos questionamentos oriundos dos próprios técnicos da saúde

prisional. Além de considerações sobre essas unidades, o MEPTC fará, neste item,

observações sobre questões ligadas à saúde das visitas realizadas em unidades que dispõem

de ambulatórios de saúde – todas as demais unidades prisionais.

Entre os descontentamentos dos presos, a assistência médica se destaca. São

freqüentes as queixas de péssimo atendimento, falta de remédio e da demora para

atendimento de emergência. Além disso, ressaltam que no translado para atendimento em

saúde são “esculachados” pelos agentes do SOE – Serviço de Operações Externas. Há,

ainda, em muitos momentos, indisponibilidade de medicamentos visto que as unidades

recebem mensalmente uma quantidade muito aquém do necessário e que já se encontram, a

maioria, superlotadas. Esses questionamentos são quase unanimemente enfrentados pelo

MEPTC em suas visitas de rotina ao Sistema Prisional.

Médicos entrevistados pelo Mecanismo em ambulatórios apontaram graves

problemas no que diz respeito à resolutividade dos casos e afirmaram que doenças graves

não são tratadas e que não há saúde preventiva no sistema prisional do rio de janeiro. Há

muitos presos com doenças respiratórias, alergias e doenças de pele em diferentes unidades.

Pela característica juvenil dos acautelados, aponta-se que seria necessária a presença de

dermatologistas, oftalmologistas, alergistas, ortopedistas e outros especialistas que

pudessem tratar das doenças mais recorrentes para que fosse prestado um bom tratamento

de saúde. Há, ainda, uma gama de presos com hipertensão, asma e outras tantas doenças

que não tem tido atendimento adequado no sistema.

Segundo depoimento de técnicas de enfermagem para o MEPTC, a falta de

remédios e a falta de nebulização são óbices do sistema. Destaca-se, também, a carência de

material em geral. Uma das enfermeiras entrevistadas em visita do Mecanismo afirmou que

eles (técnicos de saúde) trabalham “fazendo milagres”, pois a estrutura é absolutamente

Page 45: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

45

precária. Além dos salários não serem satisfatórios os trabalhadores sequer recebem

dinheiro da passagem.

Nas unidades femininas faz-se indispensável a presença de ginecologistas.

Importante destacar, no entanto, que não foram observadas, nas visitas realizadas pelo

MEPTC ao longo de 2012, a presença de médicos ginecologistas em nenhuma das unidades

femininas visitadas. No que diz respeito aos transexuais do sistema, seria fundamental o

fornecimento da hormônio-terapia para manutenção de sua dignidade.

Como muitos presos reclamam de receber medicação com validade vencida, o

Mecanismo sempre solicita acesso aos medicamentos do ambulatório. Por diversas vezes

foi possível observar a presença de medicamentos e seringas fora da validade. A

subsecretaria de tratamento afirmou, em recente reunião com o MEPTC, que providências

estão sendo tomadas para que não mais sejam fornecidos remédios com prazo perto ou fora

do vencimento. Justificou-se que a maior parte dos medicamentos fora da validade são

oriundos de doações, o que não mais será aceito pela SEAP. O MEPTC vê a iniciativa com

bons olhos, mas alerta que, ainda assim, foi possível encontrar remédios fora da validade

nas visitas que realizou após a reunião com o Subsecretário de Tratamento.

Conforme explicitado nas considerações iniciais deste relatório, a saúde da SEAP

passa por uma crise grave. Até o ano de 2007, o serviço de saúde oferecido pela secretaria

era referência no cenário nacional. Atualmente, no entanto, profissionais apontam, no que

diz respeito às dificuldades enfrentadas, os seguintes aspectos: aumento da população

carcerária, escassez de recursos humanos, déficit salarial, contratos temporários e

diminuição da eficácia do sistema de saúde.

Segundo Resolução do Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciárias

(CNPCP), Nº 07 de 14 de abril de 2003, artigo 1º, inciso IV: “Para o atendimento

ambulatorial são necessários, no mínimo, servidores públicos das seguintes categorias

profissionais: 01 médico clínico, 01 médico psiquiatra, 01 odontólogo, 01 assistente

social, 01 psicólogo, 02 auxiliares de enfermagem e 01 auxiliar de consultório dentário

com carga horária de 20 horas semanais. Nas unidades femininas deve haver sempre, pelo

Page 46: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

46

menos, 01 médico ginecologista.”(grifo nosso). O CNPCP acrescenta no inciso V da

mesma Resolução, que cada equipe deve ser responsável por 500 presos. Nesse sentido é

possível afirmar que, no tocante às equipes técnicas de saúde nas unidades comuns da

SEAP (que tem tratamento ambulatorial), há um total descompasso com a política nacional

de acesso à saúde do preso e da presa.25

Outro aspecto cotidiano que assola o atendimento em saúde é o transporte feito pelo

Serviço de Operações Externas (SOE). Um fator recorrente no relato dos detentos é uso

contínuo e excessivo da força por parte dos agentes do Serviço de Operações Externas –

SOE – em traslados realizados pelo órgão. Um preso relatou ao MEPTC que o SOE

“esculacha muito” e que enquanto batem afirmam que “quebram e o médico conserta”.

Tal fato se refere à prática da tortura e contínuo uso da força por parte dos agentes

do Serviço de Operações Externas – SOE. O uso da força dos agentes de segurança deve

prevalecer como uma situação excepcional, utilizada em última instância, respeitando

aquilo que preconizam as “Regras Mínimas para Tratamento de Recluso adotado pelas

Nações Unidas”:

Os funcionários dos estabelecimentos não deverão, em suas relações com os reclusos, recorrer à força, salvo em caso de legítima defesa, de tentativa de evasão ou de resistência pela força ou por inércia física a uma ordem baseada na lei ou regimentos. Os funcionários que recorrerem ao uso da força se limitarão a empregá-la na medida estritamente necessária e deverão informar ao diretor do estabelecimento sobre o incidente. 2) os funcionários receberão um treinamento físico especial que os permita dominar os reclusos violentos 3) Salvo em circunstância especiais, os agentes que desempenham um serviço em contato direto com os presos não estarão armados.

Além de ineficaz do ponto de vista do transporte é necessário destacar a

inadequação e insuficiência de tratamentos de média e alta complexidade pela SEAP, o

que, por si só, é um forte obstáculo do ponto de vista do atendimento. Além do próprio

Complexo de Gericinó não ter um hospital próprio para casos de alta complexidade –

25 Resolução do Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciária, Nº 07 de 14 de abril de 2003. Disponível em: https://mail-attachment.googleusercontent.com/attachment/u/0/?ui=2&ik=59b21d0257&view=att&th=136a2ee0f276569b&attid=0.1&disp=inline&realattid=f_h0wsdq8f0&safe=1&zw&saduie=AG9B_P_wZS0nk6YD9ot6y17nvscI&sadet=1334253221612&sads=apv28yyxnLfwqi406GvqTf92Y9E&sadssc=1

Page 47: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

47

apenas uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) – as demais unidades isoladas e do

Complexo de Japerí sofrem ainda mais com a logística do transporte para atendimento

médico. Os presos, por sua vez, tem ameaçada sua integridade física frente às distâncias

que percorrem para realizar suas consultas e ao procedimento de transporte inadequado.

Em junho do corrente ano, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

aprovou a Resolução Nº2/2012, em conformidade com a Lei 8653/10, que regulamenta

sobre condições dignas de transportes de presos e internados, proíbe o transporte de presos

em condições ou situações que lhe causem sofrimento físico e moral sob pena de

responsabilidade administrativa, civil ou criminal. O documento também afirma que fica

“proibida a utilização de veículos com compartimento em proporções reduzidas, deficiente

ventilação e ausência de luminosidade ou inadequado condicionamento térmico ou de

qualquer outro modo que sujeitem as pessoas presas ou internadas sofrimentos físicos e

mentais.”(Art.1º, parágrafo 1). Além disso, recentemente a Coordenação Geral de

Instrumental Jurídico e da Fiscalização do Departamento Nacional de Trânsito

(DENATRAN) do Ministério das Cidades, a partir de uma solicitação de manifestação da

Defensoria Pública do Rio de Janeiro, afirmou que “os veículos destinado aos transportes

de presos - ainda que gozem de prioridade de trânsito, livre circulação, estacionamento e

parada (...) também devem observar todos os requisitos e condições de segurança

estabelecidos pelo Código Brasileiro de Trânsito (CTB-Lei 9503/97) e pela Resolução

CONTRAN nº14/98.”, tendo que possuir equipamentos obrigatórios, como cinto de

segurança, encosto de cabeça, equipamento suplementar de retenção, air bag frontal para o

condutor e o passageiro no banco dianteiro, além de registrador instantâneo inalterável de

velocidade e tempo no caso de transporte com mais de dez lugares. Segundo o próprio

DENATRAN, todos os veículos pertencentes aos órgãos públicos devem observar os

procedimentos previstos no Código de Trânsito Brasileiro como a vistoria regular, por

exemplo. Cita, ainda, que o Departamento de Trânsito do Rio de Janeiro (DETRAN) havia

mencionado que “a frota de 142 veículos responsável pelo transporte de pessoas privadas

Page 48: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

48

de liberdade não efetua o licenciamento anual/vistoria desde seus respectivos

emplacamentos”.

Observa-se, portanto, uma situação gravosa que merece especial atenção da SEAP.

Faz-se premente que a SEAP se adéqüe a Resolução Nº2/2012 do CNPCP, regulamente o

transporte com número máximo de detentos por viagem, hierarquização dos casos de saúde

e, em médio prazo, que seja substituído o transporte nos carros do SOE por ambulâncias

equipadas para atendimento emergencial de saúde.

Outro fato grave apurado pelo MEPCT diz respeito à informação de que a

comunicação dos presos com qualquer profissional integrante da equipe técnica, inclusive

para atendimento médico, se dá, na maioria das unidades, através dos faxinas. Em algumas

unidades tal solicitação é feita para os inspetores penitenciários. Assim, estes são os

responsáveis por anotar os pedidos de atendimento e repassar a equipe, ficando, portanto, a

critério dos mesmos determinar quem irá receber atendimento psicológico, social ou

médico. Tal fato é grave e enseja a possibilidade, tanto de corrupção, como de

arbitrariedade no acesso ao atendimento de saúde. É urgente a mudança dessa forma de

“seleção” para o atendimento que além de qualificado deve ser universal .

A equipe de um programa de tuberculose e AIDS, apesar de debilitada nos últimos

anos, é muito elogiada nas unidades. Seu trabalho consiste em ir uma vez por semana até as

unidades para levar os remédios para os presos em tratamento. Ainda assim, há reconhecida

insuficiência de médicos e materiais para diagnóstico, o que faz com que seja provável a

subnotificação dos casos de tuberculose, doença, como já dito, altamente contagiosa. O fato

torna-se ainda mais grave na medida em que a cadeia de transmissão da doença ativa pode

ser interrompida com o isolamento dos pacientes e iniciando-se uma terapia antituberculose

a critério do médico. A unidade Alfredo Tranjan (Bangu 2) que atualmente é a porta de

entrada do sistema não possui equipamentos para diagnóstico da tuberculose, tal qual não

havia no Ary Franco.

Como constatado em quase todos os relatórios do Mecanismo, a arquitetura das

unidades prisionais em muito contribuem para violação do direito à saúde e dos direitos

Page 49: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

49

humanos. A condição dos ambientes são insalubres: precária iluminação e ventilação, má

conservação da rede de esgoto, acúmulo de lixo, condição degradada das celas e ausência

de ambiente sanitário adequado. É nítida a existência de maus tratos em virtude do difícil

acesso das pessoas doentes aos serviços de saúde, a não disponibilização de água filtrada

para o consumo dos detidos, a falta de camas, colchões, roupa de cama, uniformes,

materiais de higiene e remédios agravam e vulnerabilizam ainda mais a saúde dos presos.

As soluções para melhora do sistema de saúde nas unidades prisionais passa pela

valorização da equipe técnica de saúde e isso deve ser feito através da implantação imediata

do plano de carreiras, da melhoria salarial, da adequação das condições de trabalho e

também pela captação de recursos humanos por um concurso público para preenchimento

dessas vagas ociosas. Por isso o Mecanismo soma-se ao CNPCP, ao Plano Diretor do

Sistema Prisional do Ministério da Justiça, ao Fórum de Saúde do Sistema Penitenciário e à

ASSAP pela aprovação urgente do plano de cargos e salários para os técnicos do sistema

prisional que possa viabilizar concursos, ampliação de quadro efetivo e a permanência dos

técnicos servidores. Ainda assim é necessário ressaltar a necessidade de rejeitar qualquer

privatização da saúde do sistema prisional e das contratações feitas em caráter temporário

na medida em que os profissionais de carreira demonstram melhor desempenho e maior

compromisso com esse público singular.

Para possibilitar a ressocialização de pacientes com alto grau de institucionalização

e estigma como os loucos infratores são necessárias estratégias estruturantes que passam

pela mudança no próprio perfil de internação, permanência e tratamento. Sob a lógica de

gestão penitenciária, os pacientes se deparam com problemas que lhe são singulares: o

quadro de agentes, por exemplo, não possui uma capacitação específica para lidar com

pessoas portadoras de transtornos mentais, fato que acarreta sérios problemas na relação

com perturbações e sintomas específicos.

O MEPTC considera um exemplo de boas práticas todas as modificações realizadas

pela SEAP nos manicômios judiciários, que, em reconhecimento ao fato de que a legislação

dava margem para internações abusivas, iniciou o “Programa de Reinserção Social

Page 50: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

50

Assistida” nos anos 90. Tal programa foi fundamental para cessar do critério de avaliação

da periculosidade e o condicionamento da desinternação à “remissão da sintomatologia e ao

apoio sócio-familiar”, tendo importante lugar na reorientação à assistência e atendimento

nos manicômios judiciários do estado.

Outras experiências inovadoras demonstram que o infrator fora do manicômio

judiciário e inserido nas redes de atenção à saúde mental tem maiores chances de sucesso

em seu tratamento. A rede extra-hospitalar de saúde com seus dispositivos como os CAPS,

Residências Terapêuticas, ambulatórios e Centros de Convivência, legitima-se para

oferecer tratamento a estes cidadãos. A criação em 2001, do Pai-PJ de Minas Gerais, por

exemplo, proporcionou a muitos pacientes sua recuperação com responsabilidade no

atendimento clínico, jurídico e a inserção social. Outro exemplo é o PAILI – Programa de

Atenção Integral ao Louco Infrator - em Goiás. Em ambos, boa parte dos pacientes vive

normalmente e assistidos pela rede de saúde.

A portaria 3090 de 23 de dezembro de 2011, estabelece o repasse de recursos de

incentivo de custeio e custeio mensal para implantação e/ou implementação e

funcionamento dos Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) e estabelece incentivo

financeiro para implantação de SRT Tipo I e Tipo II, observadas as diretrizes da Portaria nº

106/GM/MS de 2000. Os municípios são responsáveis por implementar tais serviços tão

fundamentais ao processo de desinstitucionalização, o que tem se dado com extrema

lentidão. Preocupa ao Mecanismo Estadual para Prevenção e o Combate à Tortura que tal

fato permita que o Hospital Heitor Carrilho se converta em abrigo de forma permanente,

oferecendo como única alternativa a continuidade da institucionalização através do

acolhimento ou a transistitucionalização dos pacientes para outros manicômios. É sabido

que não é essa a intenção da SEAP, o que indica um bom direcionamento. O Mecanismo vê

como positiva a reorganização da porta de entrada e de saída dos manicômios judiciários e

se preocupa com as dificuldades enfrentadas no processo de desinstitucionalização dos

pacientes oriundos de manicômios judiciários pelo duplo estigma que sofrem.

Page 51: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

51

Em visitas realizadas pelo Mecanismo é preocupante a presença de internos com

distúrbios psiquiátricos em unidades que não oferecem tratamento adequado. Os membros

do MEPCT/RJ encontraram em visita ao Ary Franco um interno com aparente transtorno

em uma cela comum, ingerindo fezes. Cabe destacar que durante muitas inspeções são

ouvidos relatos de presos com quadro de transtorno mental, ocasiões em que a equipe do

MEPCT/RJ encaminha uma listagem de apenados para avaliação da equipe de saúde.

No que diz respeito ao tema da tortura, é fundamental que os profissionais de saúde

do sistema possam lidar com as evidências do crime de tortura sem naturalizar marcas

físicas que podem ser oriundas de agressões. Sabe-se que,

As evidências do crime de tortura apresentam-se extremamente difíceis de ser identificadas e recolhidas. De um lado, porque os agressores recusam-se a encaminhar as vítimas aos estabelecimentos periciais oficiais (por exemplo, Institutos de Medicina Legal / IML e Instituto de Criminalística / IC). E, por outro lado, quando as vítimas são levadas a esses órgãos periciais, a permanência, por exemplo, do policial no local do exame intimida a própria vítima. Também é comum, em situação de maus-tratos e tortura excessivos, as vítimas serem atendidas por médicos em redes hospitalares, públicas ou privadas, profissionais, na maioria das vezes, sem a devida formação em medicina legal e patologia forense. Deve ser ainda mencionado que, quanto a essas situações de tratamento cruel, desumano e degradante, raramente, são efetuados exames de local e/ou eficiência de objetos utilizados em tal prática.26

No caso de unidades prisionais, a dificuldade verificada em materializar provas dos

crimes de tortura é ainda maior na medida em que o preso está sob controle e custodia do

Estado. Assim, ter um corpo técnico atento aos casos de crime de tortura é fundamental. A

comum escusa de que presos caíram da comarca e/ou entraram em conflito com outros

presos não devem ser naturalizadas. Aliás, sobre esse tema é reconhecido que, entre os

deveres do Estado na custódia de pessoas privadas de liberdade está a responsabilidade de

proteger os detentos dos outros prisioneiros: “Os atos de violência cometidos entre os

próprios detentos não devem ser ignorados – por exemplo: golpes e lesões, estupro e outro

comportamento sádico. Com freqüência, esse tipo de violência não é informado por parte 26 Protocolo Brasileiro Pericia Forense e Crime de Tortura. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/tortura/protocolo-brasileiro-periciaforense-no-crime-de-tortura-autor-grupo-de-trabalho-tortura-e-pericia-forense-sedh

Page 52: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

52

das vítimas por medo de represálias.”27. Assim sendo, qualquer possibilidade de tortura e

outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes deve poder ser averiguado pelo corpo

técnico da área de saúde das unidades.

Neste sentido, fica nítida a necessidade de uma capacitação em situações de tortura

para os profissionais de saúde do sistema baseado no acúmulo do protocolo de Istambul e

no protocolo brasileiro de perícia forense e crime de torturas, assim como em todas as

legislações internacionais pertinentes. Este tema será objeto de uma recomendação própria

do MEPCT/RJ a Subsecretaria de Tratamento Penitenciário para que seja efetivada uma

parceria com o Grupo de Trabalho (GT) sobre Tortura e Perícia Forense da Secretaria de

Direitos Humanos da Presidência da Republica, a fim de firmar uma cooperação que

permita a realização da capacitação para todos os profissionais de saúde do sistema

prisional do Rio de Janeiro.

O Mecanismo Estadual para Prevenção e o Combate à Tortura se coloca disponível

para buscar, em conjunto com as autoridades públicas competentes, as soluções às

demandas apresentadas por este relatório.

VII. RECOMENDAÇÕES

No sentido de expressar a preocupação do Mecanismo Estadual para Prevenção e o

Combate à Tortura quanto à situação da assistência à saúde dos presos; e reconhecendo que

iniciativas voltadas para expansão da rede de serviços substitutivos e consolidação da

reforma sanitária e psiquiátrica são fundamentais para a efetiva substituição da lógica do

tratamento em saúde da pessoa privada de liberdade adequando-a ao Sistema Único de

Saúde (SUS), o MEPTC indica as seguintes recomendações para apreciação das

autoridades responsáveis:

1. Governo do Estado/ Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro –

Aprovação do plano de cargos e salários dos servidores para que se viabilizem

27 Associação para Prevenção à Tortura, 2005. Monitoramento de locais de detenção: um guia prático.

Page 53: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

53

concursos com vínculo estatutário e a formação das equipes de saúde previstas no Plano Nacional de Saúde do Sistema Penitenciário. Para que se garanta a permanência desses profissionais o plano deve prever a melhoria salarial e adequação das condições de trabalho dos servidores da saúde;

2. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária - Criação do Plano Operativo Estadual (POE) para o processo de qualificação do Estado do Rio de Janeiro ao Plano Estadual de Saúde no Sistema Penitenciário, estabelecendo as metas gerais e específicas no Estado do Rio de Janeiro com vistas a promover, proteger e recuperar a saúde da população prisional. Que a Secretaria Estadual de Administração Penitenciária e a Secretaria Estadual de Saúde trabalhem integradas nas atividades do Plano Operativo Estadual de Saúde do Sistema Penitenciário e prestem contas das ações realizadas regularmente;

3. Ministério Público - Informações e providências sobre o recurso estagnado no Fundo Estadual de Saúde em decorrência de falta de prestação de contas. E, que esse recurso, assim que liberado, seja destinado às ações de atenção básica de saúde, tal qual sugeriu o CNPCP em relatório de visita às Unidades do Rio de Janeiro;

4. Governo do Estado/Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro - Que o

Governo do Estado do Rio de Janeiro e a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro ampliem as verbas orçamentárias destinadas à manutenção e melhoria do Sistema Prisional, no sentido de fornecer regular assistência material aos internos – alimentação, vestuário, material de higiene e limpeza.

5. Governo do Estado/ Secretaria de Estado de Administração Penitenciária/ Secretaria de Estado de Saúde – Rejeição de qualquer proposta tendente à privatização da Saúde do Sistema Prisional. Os serviços técnicos relacionados ao acompanhamento e à avaliação da individualização da execução penal – assistência jurídica, médica, psicológica e social – por se inserirem em atividades administrativas destinadas a instruir decisões judiciais, sob nenhuma hipótese ou pretexto deverão ser realizadas por empresas privadas, de forma direta ou delegada, uma vez que compõem requisitos da avaliação do mérito dos condenados, tal qual define a Resolução 08 do CNPCP de 09 de dezembro de 2002;

6. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária – Intervenções emergenciais para melhoria das condições de ventilação e iluminação naturais e artificiais das unidades prisionais cariocas, adequando-as aos parâmetros sugeridos no Manual de Intervenções Ambientais Para o Controle da Tuberculose nas Prisões” do Ministério da Justiça;

Page 54: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

54

7. Secretaria de Estado de Administração Penitenciária - Redução gradual do número de presos privados de liberdade até o limite máximo de capacidade de cada unidade, como orienta o Princípio XVII dos Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas - Resolução nº 1/08 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA);

8. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária -

Garantia a todos do direito à realização de atividades laborativas, esportivas, recreativas e educacionais aos presos (inclusive ao preso provisório), como dispõe respectivamente a Seção I do Cap III. e a Seção V do Cap. II do Título II da Lei de Execuções Penais (Lei Nº 7.210/84) bem como a Medida Nº 210 do Plano Nacional de Política Criminal e Carcerária do Ministério da Justiça;

9. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária -

Garantia do direito à assistência médica adequada, assegurando a presença regular de médicos nas unidades, fornecimento regular de remédios, bem como a transferência ágil para unidades de tratamento ambulatorial externo em casos de maior gravidade, como dispõe o art. 14 da Lei de Execuções Penais (Lei Nº 7.210/84) e o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário;

10. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária - Fornecimento de água potável a todos os presos de forma contínua e ininterrupta, inclusive durante as refeições, algo que pode ser obtido através da limpeza periódica das caixas d’água e da instalação de filtros de água na unidade, a fim de observar o disposto no item 20 e 21 das Regras Mínimas para Tratamento de Reclusos da ONU; Princípio XI dos Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas; Resolução nº 1/08 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA;

11. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária -

Implementação de adequadas condições nas instalações sanitárias, primando pela garantia da privacidade e da salubridade no ambiente de privação de liberdade, conforme orienta o item 15 e 14 das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos da ONU; e o Princípio XII dos Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas; Resolução nº 1/08 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA;

12. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária -

Garantia do direito à alimentação adequada, assegurando a presença regular

Page 55: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

55

de nutricionistas nas unidades e a contratação de profissionais de nutrição para o quadro técnico permanente da SEAP;

13. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Administração Penitenciária -

Garantia do acesso gratuito e adequado a insumos de higiene pessoal regularmente, conforme orienta o item 15 das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos da ONU; e o Princípio XII. 2, Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas; Resolução nº 1/08 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA;

14. Governo do Estado/Secretaria de Estado de Saúde/Secretaria de Estado de

Administração Penitenciária/Ministério Público – Criação de um sistema de informações sobre causas-morte no Sistema Prisional do Estado do Rio de Janeiro, possibilitando ao Ministério Público e à Defensoria Pública solicitar investigações céleres e imparciais. Tal banco de informação deve ser utilizado para investigar a causa morte de todos os óbitos de pessoas acauteladas pelo Estado, em especial quando houver indícios de tortura e outros tratamentos ou penais cruéis, desumanos ou degradantes.

15. Governo do Estado/ Secretaria de Estado de Administração Penitenciária,

Secretaria de Estado de Saúde - Garantia de que as transferências médicas não sejam realizadas pelo SOE, mas por ambulâncias especializadas a fim de coibir as reiteradas práticas violentas que violam o princípio da dignidade humana, insculpido no art. 1, III da Carta Magna e no artigo 10 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos;

16. À Secretaria de Estado de Administração Penitenciária - Garantir o direito à assistência médica adequada, com atenção especial para os presos cadeirantes, assegurando a sua transferência para unidade adequada;

17. Ministério da Saúde, Secretaria de Estado de Saúde e Secretaria Municipal de Saúde – Reorientação da Atenção Básica à Saúde em Unidades Prisionais através da implantação de programas que tenham como referência os “Agentes Comunitários de Saúde” e a “Estratégia de Saúde da Família”, com intuito de reorientar o modelo assistencial em ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes;

18. Ministério da Saúde, Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, Secretaria de Estado de Saúde – Fornecimento de capacitação para conhecimento específico sobre o tratamento de transtornos psiquiátricos e dependência química

Page 56: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 1

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

56

para todos os técnicos das unidades de tratamento em saúde mental – sejam os Hospitais de Custódia e Psiquiátricos, seja o Hospital para Tratamento em Dependência Química Roberto de Medeiros – assim como nas demais unidades prisionais. Melhoria das condições de trabalho da equipe, particularmente a de saúde mental, bem como o oferecimento de oportunidades regulares de treinamento, tal qual sugere o relatório de visitas do SPT da ONU ao Brasil de Setembro de 2011;

19. Ministério da Saúde, Secretaria de Estado de Administração Penitenciária,

Secretaria de Estado de Saúde – Dotação de cinco médicos em caráter emergencial no Sanatório Penal para fins de diagnóstico, prevenção e combate à Tuberculose no Sistema Prisional;

20. Prefeituras dos Municípios do Rio de Janeiro – Implantação de Serviços de

Residências Terapêuticas e outros dispositivos da rede substitutiva aos manicômios, priorizando a alocação de pacientes oriundos os manicômios judiciários;

21. Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, Defensoria Pública

Geral do Estado do Rio de Janeiro e Núcleo do Sistema Penitenciário da Defensoria Pública - Estabelecimento de um livro de registro sobre casos de tortura e maus-tratos sob controle da Defensoria Pública como instrumento para inibir o uso indiscrimado da força por parte dos agentes estatais, buscando garantir o respeito à dignidade humana conforme o artigo 10 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos;

22. Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, Subsecretaria de

Tratamento Penitenciário e Secretaria Nacional de Direitos Humanos - Que seja efetivada uma parceria com o Grupo de Trabalho (GT) sobre “Tortura e Perícia Forense” da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da Republica, a fim de permitir a realização de capacitação para todos os profissionais de saúde do sistema prisional do Rio de Janeiro no tema da tortura;

23. Secretaria de Estado de Administração Penitenciária e Subsecretaria de

Tratamento Penitenciário – Realização de um mutirão para identificação dos presos com transtornos mentais em unidades comuns, com vistas à sua transferência para unidades adequadas e capacitadas com permanente atendimento ambulatorial em saúde mental.