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1 Aspectos Gerais Sobre o Biomagnetismo (General Aspects Of The Biomagnetism) Alysson H. O. Silvério¹, Diego O. Nolasco 1 ¹Curso de Física - Universidade católica de Brasília Neste trabalho mostraremos o Biomagnetismo, uma junção da Física com a Biologia e Medicina. Através de pesquisas em livros e artigos busca-se ter uma visão mais clara dessa área que trata das medidas de campos magnéticos dos seres vivos. Apesar de seu elevado custo, se faz melhor que as técnicas usadas hoje por conta de sua exatidão de medida e seus constantes avanços. Palavras-chave: Biomagnetismo, Física moderna. In this paper we show the Biomagnetism, a junction of Physics to Biology and Medicine. Through research in books and articles have a vision of the area that deals with measures of magnetic fields of living beings. Despite its high cost, it does better than the techniques used today because of its accuracy of measurement and its constant progress. Keywords: Biomagnetism, Modern Physics 1. INTRODUÇÃO 1.1. O Biomagnetismo Antes de entrar no assunto, temos que separar as duas áreas que dizem respeito ao magnetismo dos seres vivos. De um lado temos a Magnetobiologia e do outro o biomagnetismo. Podemos dizer que uma é de dentro pra fora e outra de fora pra dentro, enquanto a Magnetobiologia estuda os fenômenos que o magnetismo pode causar nos seres vivos, que no momento é a preocupação sobre os efeitos das ondas eletromagnéticas nos seres vivos, o Biomagnetismo estuda os campos magnéticos gerados pelos seres vivos e, através deles, tenta-se achar novas informações sobre os sistemas biofísicos. É uma das áreas interdisciplinares mais novas da física, pois por precisar de instrumentação muito sensível que só foi descoberta a partir da década de 70. (BAFFA et al, 1999) Os campos originados pelos seres vivos são extremamente tênues, sendo da ordem do nanoTesla ao fentoTesla. (BAFFA et al, 1999)

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1

Aspectos Gerais Sobre o Biomagnetismo

(General Aspects Of The Biomagnetism)

Alysson H. O. Silvério¹, Diego O. Nolasco1

¹Curso de Física - Universidade católica de Brasília

Neste trabalho mostraremos o Biomagnetismo, uma junção da Física

com a Biologia e Medicina. Através de pesquisas em livros e artigos busca-se

ter uma visão mais clara dessa área que trata das medidas de campos

magnéticos dos seres vivos. Apesar de seu elevado custo, se faz melhor que

as técnicas usadas hoje por conta de sua exatidão de medida e seus

constantes avanços.

Palavras-chave: Biomagnetismo, Física moderna.

In this paper we show the Biomagnetism, a junction of Physics to Biology

and Medicine. Through research in books and articles have a vision of the area

that deals with measures of magnetic fields of living beings. Despite its high

cost, it does better than the techniques used today because of its accuracy of

measurement and its constant progress.

Keywords: Biomagnetism, Modern Physics

1. INTRODUÇÃO

1.1. O Biomagnetismo

Antes de entrar no assunto, temos que separar as duas áreas que dizem

respeito ao magnetismo dos seres vivos. De um lado temos a Magnetobiologia

e do outro o biomagnetismo. Podemos dizer que uma é de dentro pra fora e

outra de fora pra dentro, enquanto a Magnetobiologia estuda os fenômenos

que o magnetismo pode causar nos seres vivos, que no momento é a

preocupação sobre os efeitos das ondas eletromagnéticas nos seres vivos, o

Biomagnetismo estuda os campos magnéticos gerados pelos seres vivos e,

através deles, tenta-se achar novas informações sobre os sistemas biofísicos.

É uma das áreas interdisciplinares mais novas da física, pois por precisar de

instrumentação muito sensível que só foi descoberta a partir da década de 70.

(BAFFA et al, 1999)

Os campos originados pelos seres vivos são extremamente tênues,

sendo da ordem do nanoTesla ao fentoTesla. (BAFFA et al, 1999)

2

Estes campos são originados por correntes elétricas que percorrem

algumas células (como no coração e no sistema nervoso), ou de materiais

magnéticos presentes em alguns órgãos (como no fígado e no pulmão). A

medida destes campos nos diz com precisão de onde eles vêm, e a

intensidade da corrente ou concentração dos materiais. Esta tarefa não é muito

fácil, pois estes campos podem até ser um bilhão de vezes menores que

campos magnéticos de outras fontes, como é o caso do campo magnético

terrestre. (BAFFA et al, 1999)

Nas células nervosas estas correntes elétricas são devidas as mudanças

na permeabilidade das paredes celulares. No coração ocorre este mesmo

fenômeno, porém de forma sincronizada. Vários outros campos magnéticos

foram detectados nos seres humanos figura 03. Estes campos são

pesquisados por cerca de 50 grupos em todo o mundo (este número se trata

até o ano de 1999, ano de publicação do artigo), sendo apenas quatro no

Brasil: Pontifícia Universidade Católica de do Rio de Janeiro, na Universidade

de São Paulo (Ribeirão Preto), na Universidade Estadual Paulista (Botucatu), e

na Universidade Federal do Paraná. (BAFFA et al, 1999)

As áreas onde se vê um maior potencial para aplicações futuras são: o

Neuromagnetismo, Cardiomagnetismo, Gastroenterologia,

Pneumomagnetismo e biosusceptibilidade do fígado.

Figura 03 – Principais áreas de atuação do Biomagnetismo nos seres humanos.

3

1.2. História do Biomagnetismo

No século XVIII, o médico austríaco Franz Anton Mesmer (1734 – 1815),

propôs a teoria que todos os seres vivos tinham uma espécie de “fluido

magnético” o qual permitia que fossem influenciados por campos magnéticos.

Com base nessas idéias, ele dizia que conseguia curar qualquer enfermidade

através do contato das partes do corpo afetadas com ímãs e com outros

objetos magnéticos. Se passado algum tempo, foi vendo que não se passava

de puro charlatanismo e acabou sendo desmascarado. Apesar de seu

charlatanismo, o que Mesmer fez, de certa forma, foi o início do estudo sobre o

magnetismo nos seres vivos (SOSA, 1995).

Em 1963 Gerhard M. Baule e Richard McFee com duas bobinas com

cerca de dois milhões de voltas cada uma, e com um núcleo de ferrite, ligadas

em série, foram colocadas em paralelo no peito de um paciente como mostra a

figura 01. (NOVAK; ANDRÄ, 2007).

Figura 01 – Esquema usado no primeiro Magnetocardiograma.

As bobinas foram ligadas em série e dispostas paralelamente uma da

outra para que o campo magnético proveniente de outras fontes externas fosse

cancelado e não detectado pelo medidor. O campo magnético oriundo do

coração como estaria em uma diferente disposição das fontes externas seria

sentido pelas bobinas. Sobre o aparelho utilizado pelos dois, podemos dizer

que era algo bem primitivo, embora seja o primeiro magnetocardiograma feito

(MCG), mas que nos mostrou que se podia medir campos magnéticos fracos

em locais sem blindagem magnética (NOVAK; ANDRÄ, 2007).

Na década de 60, com a criação do Superconducting Quantum

Interference Device (SQUID), foi possível fazer medidas de campos

magnéticos muito fracos, por conta da sensibilidade destes aparelhos David

4

Cohen em 1970 conseguiu medir o ritmo Alfa do cérebro em uma câmara

blindada magneticamente, desenvolvendo assim o Magnetoencefalograma

(MEG). (NOVAK; ANDRÄ, 2007)

Em 1986 a descoberta de supercondutores de alta temperatura feita por

Alex Muller e Georg Bednorz foi outro grande avanço. Pois agora ao invés de

precisarmos de hélio líquido para se esfriar um supercondutor, usaríamos o

nitrogênio, que é bem mais barato. (NOVAK; ANDRÄ, 2007)

2. Áreas de atuação

2.1 Neuromagnetismo

Uma das áreas mais interessantes de pesquisa atual é o estudo do

cérebro. Constituído por células chamadas de neurônios ele ainda mantém

muitos mistérios a serem revelados sobre os seres humanos. Questões

mínimas como o pensamento, as emoções ainda não foram respondidas. Na

tentativa de resolver algumas destas questões, foram desenvolvidos métodos

experimentais. (BAFFA et al, 2000) Antes para se conseguir acessar o cérebro,

era necessário um contato direto, com a implantação de eletrodos em sua

superfície, hoje já não necessitamos desse método tão invasivo. Foram

desenvolvidos métodos que conseguem fazer medidas com certa exatidão do

nosso cérebro sem ter um contato direto, tais como a magnetoencefalografia

(MEG), a eletroencefalografia (EEG), a medicina nuclear através da emissão

de pósitrons (PET), dentre outras. Todas estas técnicas apresentam vantagens

e desvantagens. A seguir iremos discutir mais sobre a magnetoencefalografia.

(TRINDADE, 2004)

Os neurônios são percorridos por correntes elétricas. Como Hans

Oersted constatou em seus estudos, toda corrente elétrica é capaz de produzir

um campo magnético, este campo magnético pode ser medido e através dele,

saber de onde vem, é o chamado problema inverso. Modela-se a atividade

elétrica neuronal como um dipolo de corrente Q

que definimos por um vetor

expresso pela relação. (ILMONIEME, 1993)

sdiQ

(1)

5

onde i é a corrente que atravessa o neurônio e ds seu comprimento.

Em um ponto p qualquer, um elemento de corrente dsi é capaz de

gerar um campo magnético, onde podemos calculá-lo através da lei de Biot-

Savart:

rsdr

iBd

³4

0 (2)

Aqui o r

representa o vetor que vai do elemento de corrente até onde o

campo é medido. Unindo as duas equações temos:

rQr

Bd

³4

0 (3)

Dada a equação acima, ainda não conseguiríamos resolver o problema

inverso, pois ela dá várias configurações de correntes que podem gerar um

mesmo padrão de campo magnético. Para a resolução iniciamos com duas

aproximações. A primeira é que o cérebro consiste em um volume

perfeitamente esférico. A segunda aproximação é que esta atividade elétrica é

gerada apenas por uma única fonte que é delimitada espacialmente por

informações adicionais. (BAFFA et al, 2000).

Além destas duas aproximações que fazemos para se ter uma

localização precisa da origem daquele campo, utilizamos o método “mínimos

quadrados” e outros métodos numéricos. Apesar das aproximações irreais, a

estimativa desses dipolos é bem precisa em vários casos

A magnetoencefalografia mede estes campos apenas do contato da

cabeça com a máquina desde que 10000 neurônios sejam ativados (BAFFA et

al, 2000). A medida de um neurônio seria impossível por conta de sua pequena

intensidade.

A MEG recorre ao magnetômetro SQUID para suas medidas. As

máquinas que fazem estas medidas geralmente são compostas por um sistema

que utiliza vários SQUIDs (canais) e bobinas. Para que a medida dos campos

seja feita de diversas medidas simultaneamente. Um sistema com poucos

canais gera certa dificuldade para se medir a atividade cerebral, para uma

completa medição tem que movimentar os SQUIDs. Para acabar com este

6

problema, em 1989 foram inventados os sensores com mais de 20 canais. Hoje

existem sistemas magnetoencefalográficos que fazem por completo um mapa

topográfico magnético de todo o córtex cerebral, estes sistemas são chamados

de sistemas de cabeça inteira (figura 04) que são extremamente vantajosos do

ponto de vista do tempo experimental, para a precisão das informações obtidas

(TRINDADE, 2004).

Figura 04 – Magnetoencefalógrafo – Sistema cabeça inteira.

O desenvolvimento dos aparelhos usados neste tipo de imagem tem

levado os cientistas a terem uma maior precisão e rapidez em seus exames.

Em particular o desenvolvimento do procedimento técnico para se obter a

localização tridimensional da fonte geradora de sinal.

2.1.1. Aplicações clínicas da magnetoencefalografia

1. Localização pré-cirúrgica: a MEG pode ser usada para se

mapear áreas específicas do cérebro, como a região da linguagem; a

localização córtex visual primário e o estudo de sua organização retinotópica;

localização das atividades do córtex motor, que antecedem o movimento

voluntário; localização do córtex auditivo primário. A localização exata destas

áreas faz com que os cirurgiões tenham uma exatidão na retirada, por

exemplo, de neoplasias, ou de uma malformação vascular e preservar com

precisão a parte essencial do córtex cerebral (TRINDADE, 2004).

2. Epilepsia: quando se trata de epilepsias em que os remédios não

ajudaram no tratamento, é necessário que o paciente faça uma cirurgia. Alguns

grupos estão tendo a oportunidade de confirmar com a MEG as pontas

interictais (fora da fase epiléptica) através de comparações com medições

7

intracerebrais e correntes intracerebrais artificiais. Ela possui vantagens em

particular comparando com o EEG no estudo dos casos de epilepsia parcial

complexa, quando se considera regiões ativas múltiplas. Fez-se melhor

também na epilepsia de lobo frontal, onde é necessária uma distinção entre

focos frontais e temporais. Além destas vantagens, diminui o risco para o

paciente, pois não será preciso fazer medições elétricas subdurais, além de

diminuir o tempo da cirurgia (TRINDADE, 2004).

3. Isquemia: através da MEG consegue-se avaliar o tecido do

córtex cerebral adjacente ao tecido lesionado em um acidente vascular

cerebral. A capacidade de detectar, localizar, e diagnosticar poderá ser útil para

acompanhar e definir os tratamentos terapêuticos e preventivos (TRINDADE,

2004).

2.2. Cardiomagnetismo

Por conta de sua grande incidência de doenças e da possibilidade de

intervenção, o coração é o segundo órgão mais importante dentro das

aplicações do biomagnetismo (BAFFA et al, 2000). Por isso um método que

não seja invasivo, se faz melhor para a detecção de doenças em seus estágios

iniciais de desenvolvimento. Com o avanço da tecnologia, hoje temos os

SQUIDs que nos auxiliam na detecção dos campos magnéticos gerados pelo

coração. Através destes campos magnéticos é possível determinar onde está a

fonte de atividade elétrica anormal. A magnetocardiografia (MCG) apresenta

um potencial igual ao de um diagnostico através de um eletrocardiograma

(EEG). Porém a MCG se faz melhor por conta de sua rapidez de diagnostico,

pois não é necessária a fixação de dispositivos na pele do paciente (SOSA et

al, 2002).

Como já foi discutido anteriormente, a localização das fontes de campo

magnético dependem da resolução do problema inverso (localizar a fonte do

campo magnético através de seu campo). Com o avanço das pesquisas nesse

sentido irá fazer com que o MCG tenha grande precisão sobre outros métodos

já que ele será capaz de definir as áreas danificadas do coração, orientando

assim a cirurgia de forma não-invasiva.

8

Outra aplicação extremamente importante do MCG é a aplicação na

magnetocardiografia fetal (MCGf). O estudo dos batimentos cardíacos do feto

são importantes para saber da saúde do fetal. Comparando esta técnica com o

método atual (ECGf) temos uma melhor recepção de sinais, pois o sinal do

ECGf vem com muito ruído por conta dos batimentos cardíacos da mãe, e o

sinal elétrico não tem uma boa relação sinal/ruído. Outra coisa que atrapalha o

uso desta técnica é que no final da gestação, o feto é coberto pelo vernix

caseoso, uma substancia que é um isolante elétrico (SOSA et al, 2002). Com o

MCGf não temos este problema já que sua recepção se dá por campo

magnético e não por elétrico, além de apresentar uma ótima relação

sinal/ruído.

As células do coração são interligadas por células com baixa resistência

elétrica chamadas de nexus (GARCIA, 2005). Por isso que a corrente elétrica

pode fluir de uma célula a outra. Porém a propagação do impulso elétrico não

pode ser em qualquer direção senão não teríamos um batimento que

poderíamos definir como “organizado”. Uma direção para a propagação do

impulso elétrico é privilegiada. Essa propagação privilegiada se dá nas fibras

cardíacas (BAFFA et al, 2000).

Para melhor entender o que acontece com o campo magnético gerado

pelo coração, veremos uma breve descrição do modelo elétrico usado. Antes

faz-se necessário duas aproximações, a primeira é que despreza-se a

condutividade do torso, e a segunda considera que todas as células do

miocárdio estão eqüidistantes dos eletrodos usados (BAFFA et al, 2000).

Para uma única célula com origem em um meio com condução

homogênea, o potencial elétrico desta célula é definido como:

³4 0r

rpv

(4)

onde o p

é o vetor atividade elétrica ou como os fisiologistas chamam, vetor

força elétrica, e aponta na direção de propagação da onda de despolarização

de um ponto 1x a um ponto 2x qualquer (demonstrado na figura 06). E o vetor r

9

é a distancia da célula ao ponto de observação, e é diferente em cada célula. A

intensidade do vetor p

é:

)]()([ 21

2 xvxvap (5)

Para uma melhor compreensão do que é este vetor p , recordemos que

um dipolo de corrente pode ser expresso pela lei de Biot-Savart. Considerando

que o interior da célula segue a lei de Ohm, e que é a condutividade da

mesma, a corrente sobre ela é proporcional ao gradiente de potencial

(HOBBIE, 1997), ou matematicamente

x

vai ³

(6)

Integrando está equação temos a equação (5) que por ter dimensão de

corrente multiplicado por distancia e ter semelhança com o dipolo elétrico,

poderíamos chamar o vetor p de momento de dipolo de corrente.

Figura 06 – Diagrama simplificado do coração.

No miocárdio, as células se polarizam e despolarizam fazendo assim o

ciclo cardíaco, ou a sístole (contração do coração), e diástole (o relaxamento).

O vetor atividade elétrica total em qualquer instante se dá pela soma de todos

os vetores para todas as células do coração, quando estão despolarizadas.

Inicialmente, o coração está com todas as suas células polarizadas,

fazendo com que não se tenha um momento de dipolo resultante. Estas células

iniciam sua despolarização através do nódulo sino-atrial (nódulo SA) localizado

no átrio direito, que envia um estímulo elétrico através de toda a câmara

10

fazendo uma onda de despolarização que se propaga concentricamente

(DUBIN,1995; HOBBIE, 1997).

Os vetores destas células que estão se despolarizando formam uma

onda progressiva que se move através do coração e podem ser captadas por

eletrodos cutâneos. Estes eletrodos darão origem a um traçado com tensões e

campos magnéticos variáveis (BAFFA et al, 2000).

A onda de despolarização viaja primeiro pelo átrio originado a onda P,

quando o coração está totalmente despolarizado não há mais vetor atividade

elétrica devido a atividade mecânica de passar o sangue pelas válvulas

atrioventriculares (AV). Quando a onda de despolarização atinge o nódulo AV,

ela se dispersa rapidamente pelas paredes internas dos ventrículos e atravessa

pelo miocárdio de cada ventrículo saindo para as paredes externas, assim

originando uma onda de despolarização. Este momento do ciclo é onde surge o

complexo QRS. A repolarização ventricular dá surgimento a onda T (BAFFA et

al, 2000).

O vetor atividade elétrica total de um ciclo cardíaco normal é

apresentado na figura 07 (a) e na figura 07 (b) temos o ciclo P, QRS e T assim

como é visto em um ECG.

Figura 07 – a) Trajetórias do vetor atividade elétrica. b) Segmentos P, QRS, e T

representando o ciclo do coração.

Em um MCG a medição do campo magnético se dá pelas ondas de

despolarização e repolarização. Para se ter a magnitude desse campo

matematicamente, substituímos na equação (11) na equação (3) e

consideramos que o seguimento ds está na direção dx , o campo magnético em

um plano xy aponta para a direção z e tem magnitude igual a:

11

2/3

00

00

²])²[(

]/[

4

²

yxx

dxxvyaBz

(7)

sendo 2/1

00 })²{( yxxr .

Como a despolarização do coração ocupa uma região bem pequena, da

ordem de milímetros, e as medidas são feitas no dorso do paciente, ou seja, a

uma distancia muito maior, podemos retirar o denominador do integrando e ter

uma boa aproximação para o valor do campo magnético. Teremos que zB será

2/3

00

1200

²]²[4

)]()([²

yx

xvxvyaBz

(8)

Ou substituindo a equação (6) na equação (9) teremos

2/3

00

00

²]²[4 yx

pyBz

(9)

Nas expressões acima, o valor de B está representado em uma direção

xy, com isso temos que

rpsenrpyp )(0 (10)

ou seja, a direção de B é consistente com o produto vetorial. Com isso, o

campo magnético para uma única célula pode ser representado por:

³4

0

r

rpB

(11)

Todo este potencial que a MCG e a MCGf tem, além de mais avanços

que vários outros grupos tem em relação a medição de campos magnéticos e

suas relações com as arritmias cardíacas, elas ainda não são empregadas

devido a questões sociais e econômicas. Porém já está comprovada a

importância das medidas dos campos magnéticos do coração para a Medicina

(BAFFA et al, 2000).

2.3. Gastroenterologia

O estômago desempenha um papel de fundamental importância no

sistema digestivo, ele é responsável por armazenamento, trituração, e mistura

12

dos alimentos que vão nutrir o ser (BAFFA et al, 2000). Todo seu trabalho é

feito através de contrações musculares que estão associadas à troca de íons

entre os meios intra e extracelulares. Quando falamos de troca de íons

estamos falando indiretamente de uma corrente elétrica já que na troca há

movimento de cargas.

As células musculares do estômago em geral, representam um potencial

de repouso entre os meios intra e extracelulares. O fluxo de íons irá

despolarizar esse repouso e conseqüentemente provocar ou não uma

contração muscular . Mas caso ocorra essa contração, a região contraída do

estomago se propaga junto com o potencial de ação, ou seja, em fase. Estas

contrações ocorrem a cada 20 segundos (BAFFA et al, 2000). Como esses

potenciais de ação geram também campos magnéticos, é possível utilizar a

Magnetogastrografia para medição utilizando-se de SQUIDs.

A finalidade do biomagnetismo na gastroenterologia é simplesmente a

análise da motilidade do sistema gastrointestinal. Essa análise pode ser feita

através de duas maneiras, a direta que é a medida dos campos magnéticos

gerados pela despolarização do estômago, e a indireta que é a análise feita

através da ingestão de alimentos com material magnético. O uso da

magnetogastrografia oferece uma vantagem sobre o sistema elétrico para esse

tipo de medição (Eletrogastrografia), porque o sistema elétrico mede a

atividade elétrica como um todo, e o sistema magnético mede o campo

magnético em determinada região (BAFFA et al, 2000).

Para se modelar matematicamente o campo magnético gerado pelo

estômago, podemos representar a propagação do potencial de ação através de

um anel de despolarização com espessura que percorre as paredes do

estômago. Neste anel existe uma densidade superficial de corrente sJ que gera

uma corrente

sJaI 2 (12)

em que a é o raio da região despolarizada no estômago (anel de

despolarização). É necessário modelar o estômago também como um cone

curvo como representado na figura 08 (b).

13

Figura 08 – a) Esquema simplificado do estômago. b) Modelagem do estômago para estudo.

Utilizando a Lei de Biot-Savart chegamos a uma equação que mostrará

o campo magnético de uma distância R do centro do anel de despolarização

em um ponto P qualquer

2

0

1

1

²4

R

aR

IB

(13)

Tomando o conceito de dipolo de corrente, o produto da corrente pelo seu

comprimento (HOBBIE, 1997), nossa equação fica da seguinte forma:

2

0

1²4

R

a

Q

RB

(14)

como um dipolo de corrente é dado pela expressão (ERNÉ et al, 1980)

²4

0

R

QB

(15)

Comparando as equações (14) e (15) vemos que só não são idênticas

por conta do termo

2

1

1

R

a

(16)

Podemos então definir nesse caso, um dipolo de corrente equivalente

para o anel de despolarização sendo:

14

2

*

1R

a

QQ

(17)

Assim nossa equação para o dipolo de corrente ficará da seguinte forma

²4

0

*

R

QB

(18)

Através de algumas normalizações na equação, podemos calcular o

campo magnético no eixo z através da equação.

dd

d

dd

zyx

x

yxd

ad

QB

²²1

²²1²

²1

1

²4

0

*

(19)

Através do campo magnético zB , dados anatômicos e medidas

independentes, temos um campo magnético como mostrado na simulação feita

na figura 09 com um sistema de SQUIDs (BAFFA et al, 2000).

Figura 09 – Simulação em um sistema de 7 canais de uma magnetogastrografia.

2.4. Pneumomagnetismo e biosusceptometria do fígado

A maioria dos tecidos biológicos tem suscetibilidade magnética próxima

a da água, ou seja, para ficar magnetizada precisa de um campo magnético

próximo a da água e são compostos por moléculas diamagnéticas. Poucos

órgãos como o fígado, o baço, e o coração têm propriedades paramagnéticas

por conta dos compostos de ferritina que estão em seus tecidos. Algumas

anomalias clínicas como a hemocromatose e as anemias hemolíticas

aparecem justamente quando a quantidade de ferro nos tecidos está alterada

(BAFFA et al, 2000).

15

Existem outros órgãos que também armazenam partículas magnéticas,

como os pulmões que também são objetos de estudo do pneumomagnetismo.

Algumas pessoas devido a suas ocupações acabam por acumular partículas

magnéticas que irão afetar a respiração. Trabalhadores de minas podem

acumular uma quantidade grande de magnetita, há relatos também de pessoas

que trabalham com soldagem a arco elétrico (SOSA et al, 2002).

O fígado nessa parte é um dor órgãos mais estudados por conta de sua

quantidade significativa de 3Fe . Em bom estado, a concentração desse

composto esta em cerca de 0,1 a 0,5 mg/g de tecido. Se sobrecarregado, essa

concentração pode chegar a 50 mg/g. A susceptibilidade magnética do volume

hepático ( figx ) é proporcionalmente linear a concentração de 3Fe presente.

Fazem-se medidas não invasivas para determinar a quantidade desse material

através da susceptibilidade magnética do tecido. Esse método acontece por

conta da medida da magnetização gerada por um campo magnético externo.

No caso de nossas amostras de material biológico, esta magnetização é cerca

de um milhão de vezes menor que o campo magnético externo (BAFFA et al,

2000).

Atomicamente falando, observamos que a magnetização do material se

dá por conta do movimento dos elétrons em torno do núcleo e do seu próprio

eixo. Devido a desorganização dos átomos, temos vários dipolos magnéticos

em direções diferentes, a resultante desses dipolos é nula por conta disso.

Quando colocamos um campo externo, esses dipolos se orientam em um só

sentido, fazendo que o tecido torne-se polarizado magneticamente. A

polarização adquirida pelos tecidos será paralela ao campo aplicado

(paramagnéticos), ou antiparalelo (diamagnéticos). Esta polarização será

representada por um vetor magnetização M

que é definido como momento de

dipolo por unidade de volume.

)(1

lim rmv

M

(20)

em que )(rm

é o momento de dipolo magnético da partícula na posição r

em

um volume v . Em materiais diamagnéticos, que são repelidos por campos

magnéticos, e paramagnéticos, que é a tendência dos dipolos magnéticos se

16

alinharem ao campo magnético externo, a magnetização através do campo,

quando o mesmo é cessado a magnetização acaba.

Para a determinação da susceptibilidade hepática é necessário fazer

duas aproximações, a primeira é que o órgão é formado apenas por duas

substâncias, a ferritina e o tecido, e a segunda é que como os tecidos tenham

susceptibilidade magnética muito próxima a da água, dessa forma, a

susceptibilidade do tecido é igual a soma das susceptibilidades de cada

material multiplicado pela concentração de cada um (BAFFA et al, 2000).

fefeOHfig xcxx2

(21)

aqui figx é a susceptibilidade do fígado, OHx2

é a susceptibilidade dos tecidos,

fec é a concentração de ferritina e fex a susceptibilidade (BAFFA et a, 2000).

O valor então dessa susceptibilidade é obtido indiretamente

relacionando o sinal medido )( V com o fluxo magnético que o material produz

sobre as bobinas do sensor (BAFFA et a, 2000).

³)(

)(..

0

drI

rBrB

xCV

r

rrfigVol

fe

(22)

onde fex é a susceptibilidade da ferritina no fígado, apB

o campo magnético

aplicado, rB

e rI são o campo magnético e a corrente no gradiômetro, e C é o

fator de calibração do SQUID. Esta integral é feita sobre todo o volume do

fígado (BAFFA et a, 2000).

3. Detectores de Campos Magnéticos

3.1. Breve histórico da supercondutividade

Em 1911, o físico holandês Heike Kammerlingh Onnes descobriu o

fenômeno da supercondutividade três anos após conseguir liquefazer o hélio,

fenômeno que ocorre a uma temperatura de 4,2K. Ele observou que uma

amostra de mercúrio a uma temperatura inferior a 4K sua resistência elétrica

desaparecia.

17

Os supercondutores são conhecidos por duas principais características:

a ausência de resistividade elétrica dada por sua organização atômica,

acabando assim com o efeito Joule; e o efeito Meissner (Figura 10) que

consiste na exclusão por completo do campo magnético no interior de um

supercondutor para supercondutores do tipo I.

Figura 10 – Supercondutor do tipo I. Fonte:

http://wwwp.fc.unesp.br/~rafael/historico_supercondutividade.htm

O estudo dos supercondutores despertou no mundo científico um grande

interesse, tanto é que só neste ramo da física, temos várias premiações do

Nobel. Podemos até contar a história da supercondutividade através dos

ganhadores do prêmio.

O primeiro deles foi recebido por Kammerlingh Onnes, entregue em

1913 por conta da descoberta da Supercondutividade. No final de 1911, Onnes

estava estudando co comportamento de alguns metais quando estavam

imersos em Hélio líquido. A descoberta da supercondutividade aconteceu por

acaso pois ele conseguiu observar um comportamento diferente em uma

amostra de mercúrio: quando a uma temperatura próxima de 4 Kelvin, sua

resistência a passagem de corrente caia para zero. A esse fenômeno foi dado

o nome de supercondutividade. Descobriu também que a Supercondutividade

pode ser destruída se passarmos determinada corrente, por determinado

campo magnético, ou por determinada temperatura. A essas grandezas ele deu

o nome de temperatura crítica, corrente crítica e campo magnético crítico.

Em 1957, os cientistas americanos John Bardeen, Leon Cooper, e John

Schrieffer desenvolveram a Teoria BCS, que levava este nome por conta das

iniciais de seus nomes. O ponto principal desta teoria, é a explicação da

corrente elétrica no material supercondutor, que passa por conta da formação

de pares de Cooper. Os pares de Cooper ocorrem quando dois elétrons com

movimento de spin inverso acabam por existirem no mesmo nível de energia.

Este fato só pode acontecer, pois os elétrons tem um comportamento diferente

18

do normal, ele acabam por se comportar como bósons, partículas com spin

inteiro o qual permite que dois elétrons podem coexistir em um mesmo nível de

energia. Em 1972 eles foram agraciados com o prêmio Nobel.

Em 1973, os ganhadores do prêmio Nobel foram Leo Esaki, Brian David

Josephson e Iavar Giaever. Josephson previu que os pares de Cooper

poderiam passar por uma superfície isolante que fosse colocada entre dois

supercondutores. A este tunelamento de elétrons fora dado o nome de Efeito

Josephson. Giaever conseguiu este efeito em um supercondutor e Esaki

conseguiu em semicondutores. Graças a este efeito, hoje temos um sensor

capaz de medir campos magnéticos da ordem de fento Tesla. E é este sensor,

o SQUID (superconducting quantum interference device), que é usado na

medição de campos magnéticos gerados pelos seres vivos. Veremos mais

sobre este tema a seguir.

Porém a explicação desenvolvida pela Teoria BCS não satisfazia a todos

os materiais supercondutores. Na década de 80, os esforços dos cientistas

para descobrir materiais supercondutores com temperaturas críticas maiores

começou a mostrar resultados. O primeiro destes compostos foi descoberto por

Alex Muller e Georg Bednorz em 1986. O material feito a partir de La-Ba-Cu-O,

um cuprato de lantânio e bário que a temperatura ambiente era isolante, se

tornava supercondutor a aproximadamente 30 K. Em 1987 ganharam o prêmio

Nobel por esta descoberta.

Em 2003, bem depois de suas descobertas, os físicos ganhadores do

prêmio Nobel pelo estudo dos supercondutores foram Alexei Abrikosov

(laboratório Nacional Argonne, EUA), Vitaly Ginzburg (Instituto Lebedev,

Moscou), e Anthony Legget (Universidade de Illinois, EUA). Alexei apoiado por

uma teoria já existente de seus compatriotas Ginzburg e Landau, desenvolveu

uma teoria para um tipo especial de supercondutor, os supercondutores do tipo

II, eles se diferem do tipo I por conta do campo magnético, enquanto no tipo I, o

campo magnético é completamente repelido, no tipo II, ele passa entre o

material. (Figura 11)

19

Figura 11 – Diferença entre supercondutores

Vitaly Ginzburg e Lev Landau desenvolveram uma teoria nos anos 50

onde propôs a descrição da supercondutividade e campo magnético crítico em

termos de sua densidade do condensado supercondutor.

Anthony Legget ganhou o Nobel pelos seus estudos do estado

superfluido do 3He, a forma mais rara do hélio, que é análogo a

supercondutividade. A supercondutividade e a superfluidez estão relacionadas,

a primeira fala sobre partículas neutras, e a segunda sobre partículas

carregadas. Em um superfluido, os pares são formados por átomos onde os

spins apontam na mesma direção. No supercondutor os elétrons que

percorrem o material aos pares e estão com spins em direções opostas.

a) Efeito Josephson

O efeito Josephson, é o responsável pelas aplicações de materiais

supercondutores na eletrônica, uma das mais importantes aplicações que

existe. Na física do estado sólido, é comum trabalharmos com junções,

materiais sanduichados figura 12 (ARAÚJO-MOREIRA et al, 2002), onde há

diferentes materiais envolvidos como: isolantes, metais, e semicondutores. Em

qualquer caso, a corrente elétrica, irá depender das propriedades dos

portadores de carga. Como o trabalho está sendo feito sobre materiais

supercondutores, os portadores de carga são os pares de Cooper, que já fora

mencionado no texto. Assim, espera-se que junções com este tipo de material

tem um comportamento diferente das junções com outros materiais. Vejamos

como funcionam.

20

Figura 12 – Diferentes tipos de junções.

Considere dois supercondutores, juntamos os dois a uma distancia

extremamente pequena, algo em torno de 30 Å (trinta ângstrons, onde 1Å=

m1510 ). Mesmo sem um campo elétrico aplicado, existirá uma circulação de

elétrons de um supercondutor a outro. Reduzindo ainda mais essa separação,

a distancias menores que 10 Å, veremos também a passagem de pares de

Cooper. Esse efeito de tunelamento dos pares de Cooper através de dois

supercondutores ligados por uma camada extremamente fina é chamado de

tunelamento Josephson, e o material onde isso ocorre é chamado de Junção

Josephson (ARAÚJO-MOREIRA et al, 2002).

Como a natureza da supercondutividade é quântica e macroscópica,

temos uma função de onda efetiva para cada eletrodo da Junção Josephson.

Representamos através da equação 23 (OSTERMANN et al, 2005).

ii

i e0 (23)

Onde através da figura 13 1i ou 2, 0 é uma amplitude (que para

simplificar admitimos ser a mesma dos dois lados), e i é uma fase

(OSTERMANN et al, 2005).

Figura 13 – Junção Josephson.

Se uma fonte de corrente for conectada a uma junção Josephson, sem

que exista uma ddp seja aplicada, será observada uma passagem dos pares

de Cooper através de uma corrente contínua através da junção que pode ser

expressa pela equação 24.

)sin( 210ii (24)

Onde 0i é a corrente máxima e é dependente da espessura da barreira I.

Se a corrente aplicada não exceder o valor de 0i , a diferença das fases dos

21

supercondutores se ajustará de forma que satisfaça a equação 24 . Caso essa

corrente exceder o valor de 0i , não haverá tunelamento de elétrons. Este é o

efeito Josephson DC ou contínuo.

Aplicando uma ddp constante a junção, teremos uma corrente alternada

dada pela equação 25 (OSTERMANN et al, 2005).

h

eVtii

2sin0

(25)

onde é a variação das fases, V a ddp aplicada, e a carga elementar e h a

constante de Plank.

A este efeito deu-se o nome de efeito josephson AC ou alternado, pois a

corrente é alternada e possui uma frequencia oscilatória expressa pela

equação 26 (OSTERMANN et al, 2005).

h

eVf

2

(26)

As junções Josephson são muito adequados na geração e detecção de

oscilações eletromagnéticas na ordem de gigahertz. Outra coisa que se é

capaz de determinar muito preciso através da voltagem e da frequencia é a

medida da constante fundamental (equação 27) (OSTERMANN et al, 2005).

e

h

20

(27)

Existem diferentes maneiras de se produzir uma junção josephson.

Neste tópico descrevemos a junção josephson que é feita “sanduichando” uma

fina película isolante entre dois supercondutores, ela é chamada de junção

túnel. Outras estruturas são conhecidas, tais como a junção microponte, e a

junção ponto.

b) SQUID

Os Dispositivos Supercondutores de Interferência Quantica, ou SQUID,

são os equipamentos mais sensíveis quando se diz respeito a medição de fluxo

magnéticos. Por medir os fluxos magnéticos mais sensíveis, são utilizados em

vários estudos na física, desde o estudo das ondas gravitacionais até a

22

construção de picovoltímetros. Sua ordem de medida é na casa do fentoTesla,

ou seja 1510 T (BAFFA et al, 2000).

Um aparelho desta magnitude, como é de se esperar, tem um alto custo

de produção. Seu funcionamento baseia-se na supercondutividade. Já foi

mostrado anteriomente os saltos do estudo dessa área, mas ainda não chegou

ao ponto de baratear tal tecnologia. Para um material se tornar supercondutor,

é necessário que esteja em determinada temperatura, os primeiros

supercondutores essa temperatura era da ordem de 4 K, o que fazia que

utilizassemos hélio líquido para seu resfriamento. Se fazer este material já era

demasiado caro, agora com a utilização de hélio liquido para resfria-lo

encarecia mais ainda seu custo, pois deixar o hélio em seu estado líquido

também é muito caro. Porém não conformados, os pesquisadores procuraram

encontrar os supercondutores de altas temperaturas. A descoberta dos

supercondutores cerâmicos foi o grande salto nesta área. Agora os materiais

se tornavam supercontuores a uma temperatura de 95 K, aproximadamente -

178 °C, o que barateava a tecnologia pois agora precisariamos apenas de

nitrogênio líquido, uma material bem mais barato de se conseguir. Os cientistas

ainda procuram por materiais supercondutores com temperaturas mais altas, o

que reduzirá ainda mais o custo.

Existem hoje em laboratórios, dois tipos de SQUID, o SQUID DC e o

SQUID RF. O SQUID DC percorrem duas correntes em caminhos diferentes

cada um com uma junção. Estas correntes na ausência de um campo

magnético têm a mesma fase. Quando aplicamos um campo magnético no anel

supercondutor, esta fase da função de onda muda e um fenomeno de

interferencia é observado.

O padrão de interferência dado por essa supercorrente é espresso pela

equação (28) onde 0 é um quantum de fluxo e vale 151007,2 x Wb (BAFFA et al,

2000).

(28)

Na figura 14 (a) temos o funcionamento do SQUID DC, em em (b)

vemos um gráfico que demostra a voltagem em função do fluxo magnético presente na junção.

0n

23

Figura 14 – a) Funcionamento de um SQUID DC. b) Voltagem em função do fluxo magnético.

O SQUID-RF figura 15, também conhecido como amplificador

paramétrico, pois a detecção do campo magnético é devida a variação de um

dos parâmetros do circuito sintonizado, utiliza um campo magnético de

radiofreqüência (na casa dos Megahertz) para polarizar o anel supercondutor

que possui apenas uma junção. O campo que se quer medir é adicionado ao

campo produzido pela corrente de polarização, fazendo com que a junção

passe por uma região dissipativa onde irá absorver energia. Esta absorção é

medida por um circuito, e é relacionada com o campo aplicado nas bobinas

detectoras (BAFFA et al, 2000).

Figura 15 – Representação de um SQUID – RF descrito pelo Professor James Edward Zimmermam

(Co-inventor do SQUID).

3.2 Fluxgate

a) Histórico

Os primeiros magnetometros deste tipo, eram construídos com ligas

cristalinas de núcleo e ferro, eram chamados de -metal, e tinha a fórmula

química 521677 CuCrFeNi . Posteriormente a descoberta desta liga, surgiu outras

ligas com melhor estabilidade. Porém a melhor liga para núcleo foi

desenvolvida pela marinha americana, era o 6 – 81 Mo-Permalloy 61381 MoFeNi .

Esta liga foi amplamente aplicada ao programa espacial da NASA. Sua venda é

24

controlada por conta de seu caráter estratégico, além se sua difícil obtenção

(KABATA et al, 2004).

Na década de 80, um grupo do Instituto de Pesquisas Espaciais da

Dinamarca, que era liderado por Fritz Primdahl estudava a construção dos

núcleos com vidros metálicos amorfos. Alguns estudos posteriores,

(TEODOSIO et al, 1996), (SHIRAE, 1984), (NAROD et al, 1985), mostraram

que fitas de vidro metálico amorfo apresentavam ótimas propriedades para

construir fluxgates.

Em 1984, Shirae teve sucesso com a utilização de uma fita amorfa, com

sua com fórmula química 793,01515367 CrBeSiFeCo , como núcleo de um fluxgate.

Seu único problema era sua baixa temperatura de Curie, temperatura onde os

materiais perdem suas propriedades magnéticas, que era de 50 °C o que

limitava seu uso (KABATA et al, 2004).

Atualmente foi desenvolvida uma liga amorfa com o nome de VITROVAC 6025

com composição ((CoFe)70(MoSiB)30). Vendida comercialmente, os

resultados obtidos usando fitas deste tipo, nos mostram resultados similares ou

até melhores que a melhor fita para este tipo de medida 18125,35,66 BSiFeCo .

(KABATA et al,2004).

b) O aparelho

Os magnetometros de fluxo saturado, ou fluxgates, são dispositivos em

estado sólido que medem direção, sentido, e magnitude de campos

magnéticos. Trabalham com campos estáticos e alternados de até alguns

Kilohertz e tem sensibilidade para campos da ordem de 1010 a 410 T. Não

contém partes móveis e consome pouca energia (KABATA et al,2004).

Sua resolução alcança até 10 pT (porém alguns aparelhos comerciais

conseguem até 100 pT) e estabilidade de até 1 nT para períodos longos. Sua

sensibilidade é ótima, na seção dos magnetosensores perde apenas para o

SQUID, mas diferente dele, não precisa ser resfriado para operar e não tem

também um custo tão alto (KABATA et al,2004).

Na variação de um fluxo magnético em relação ao tempo, irá gerar uma

força eletromotriz induzida, e isso é largamente usado na detecção de campos

magnéticos. Para um campo magnético externo que se queira medir, coloca-se

a bobina imersa nesse campo. Devido a sua alta permeabilidade magnética, as

25

linhas de campo irão passar pelo núcleo da bobina, como esse campo é

constante, seu fluxo não irá variar e nenhuma força eletromotriz é percebida

(KABATA et al,2004).

Esta variação do fluxo magnético para se obter essa força eletromotriz,

pode acontecer espontaneamente, caso o fluxo varie naturalmente em relação

ao tempo de acordo com a Lei de Faraday

dt

td )(

(29)

ou pode ser provocada. Para obtermos essa força eletromotriz pode ocorrer

indiretamente através da mudança da permeabilidade magnética do núcleo.

Quando mudamos repentinamente a permeabilidade do núcleo, o campo

deixará de se concentrar dentro da espira e com isso diminuirá, essa

diminuição gera uma força induzida, que é proporcional ao campo que se quer

medir. Podemos também variar a área por onde passam as linhas de campo;

outro exemplo é o magnetômetro rotativo de indução, onde a espira irá rodar

no campo estático, tornando a tensão induzida proporcional a freqüência de

rotação, ao campo e a área da espira.

Os fluxgates geralmente são compostos por duas bobinas (Figura 16).

Uma bobina primaria e outra secundária. Na bobina primária, também chamada

de enrolamento primário ou excitação, é responsável apenas por mudar a

permeabilidade magnética do núcleo, saturando-o. A bobina secundária,

enrolamento secundário ou bobina de detecção, fica responsável pela medida

do campo magnético desejado. O sinal que aparece no enrolamento

secundário (tensão ou corrente, dependendo do fluxgate) é então amplificado e

filtrado e é proporcional ao campo magnético externo.

Figura 16 – Esquema de um fluxgate. Figura retirada e traduzida de :

http://gretchen.geo.rpi.edu/roecker/AppGeo96/lectures/mag/fluxgate.html

26

Considerações finais

De acordo com as pesquisas atuais, a medição dos campos magnéticos

gerados pelos seres vivos, ou o biomagnetismo, é a melhor saída quando

falamos de determinados exames. Áreas da Medicina como o tratamento do

coração, fígado, pulmão, estômago, e cérebro se tornam mais precisas.

Como toda área nova da física, um dos problemas do Biomagnetismo é

o alto custo para construção e manutenção de seus equipamentos, dispositivos

como o SQUID, um dos melhores sistemas de medição, precisam, por

exemplo, de sempre estar imersos em hélio líquido, e uma boa blindagem

magnética para diminuir o ruído feito por fontes externas.

É importante ressaltar a dificuldade que se tem para encontrar material

acerca do tema. No Brasil temos apenas quatro grupos de 50 no mundo que o

estudam. Para se concluir o trabalho foi necessário recorrer a textos em outras

línguas, por exemplo, o que deixava o mesmo mais trabalhoso e com certa

desconfiança por parte das traduções. Pouco investimento por parte do

governo nos deixa bem atrás de outros países, pois este sistema em um futuro

próximo será comum, mas se não tivermos mão de obra qualificada, e grandes

colaborações em suas construções estaremos apenas comprando tecnologia e

deixando ainda mais demorado e precário nosso frágil sistema de saúde.

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