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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES DEPARTAMENTO DE MÚSICA INICIAÇÃO CIENTÍFICA RELATÓRIO FINAL ASPECTOS ESPACIAIS DA ARTE SONORA PESQUISADOR: BORYS MARQUES DE CASTRO LAGE DUQUE ORIENTADOR: PROF. DR. FERNANDO HENRIQUE DE OLIVEIRA IAZZETTA AGÊNCIA FINANCIADORA: PIBIC - CNPq São Paulo 2013

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES

DEPARTAMENTO DE MÚSICA

INICIAÇÃO CIENTÍFICA

RELATÓRIO FINAL

ASPECTOS ESPACIAIS DA ARTE SONORA

PESQUISADOR: BORYS MARQUES DE CASTRO LAGE DUQUE

ORIENTADOR: PROF. DR. FERNANDO HENRIQUE DE OLIVEIRA IAZZETTA

AGÊNCIA FINANCIADORA: PIBIC - CNPq

São Paulo

2013

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Resumo

Esta pesquisa tem como proposta investigar o papel do espaço nas obras de Bernhard

Leitner e Christina Kubisch, trazidos aqui como representantes do universo da arte sonora. Observa-

se não apenas o espaço geométrico, mas aquele com características perceptivas, sociais,

psicológicas, acústicas e visuais. A arte sonora é examinada sob cinco aspectos: sonoridade,

tecnologia, interação, tempo e espaço, usados como ferramenta de análise para o estudo de caso dos

dois artistas. Por se tratar de um campo artístico híbrido, os referenciais são tanto as artes visuais

quanto a própria música. As obras de Leitner e Kubisch são divididas em grupos por afinidades

sonoro-espaciais, são levantadas características gerais de cada grupo e do repertório como um todo.

Os artistas são confrontados. Finalmente, extraem-se conceitos aplicáveis globalmente à arte

sonora.

Abstract

This research proposes to investigate the role of space in the works of Bernhard Leitner and

Christina Kubisch, brought here as representatives in the world of sound art. We observe not only

geometric space, but one with perceptual, social, psychological, acoustic and visual characteristics.

Sound art is examined in five respects: sound, technology, interaction, time and space, used as a

tool of analysis for the case study of the artists. Once it is a hybrid artistic field, references are both

visual arts and music itself. The works of Leitner and Kubisch are categorized into groups by

sound-space affinities; general characteristics are deduced from each group and from repertoire as a

whole. The artists are compared. Finally, concepts globally applicable to sound art are extracted.

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Apresentação..................................................................................5  

Parte I – Arte Sonora .............................................................8  

1. Precursores....................................................................................9  

2. Características...........................................................................11  

2.1. Terminologias.......................................................... 11  2.2. Concepções.............................................................. 13  2.3. Cinco Aspectos Fundamentais ............................. 16  

2.3.1. Sonoridade .............................................................. 16  2.3.2. Tecnologia .............................................................. 16  2.3.3. Interação ................................................................. 17  2.3.4. Tempo ..................................................................... 18  2.3.5. Espaço ..................................................................... 18  

3. Repertório e Artistas..........................................................22  

3.1. Do recorte ................................................................ 23  

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4  

Parte II - Estudo de caso..................................................24  

4. Bernhard Leitner.....................................................................25  

4.1. Análise do repertório selecionado ........................ 28  4.1.1. Experimentação ..................................................... 31  4.1.2. Variações................................................................. 44  4.1.3. Parabólicas | refletores......................................... 48  4.1.4. Obras permanentes | arquiteturas sonoras ....... 50  4.1.5. Obras com ressonadores ...................................... 53  4.1.6. Obras atípicas ......................................................... 54  

Conclusões ...................................................................... 55  

5. Christina Kubisch....................................................................58  

5.1. Análise do repertório selecionado ........................ 59  5.1.1. Indução eletromagnética ...................................... 60  5.1.2. Consecutio Temporum......................................... 68  

5.2. Conclusões ............................................................... 70  

6. Análises gerais...........................................................................71  

6.1. Confrontação Leitner/Kubisch............................ 71  6.2. Apontamentos sobre Arte Sonora ....................... 73  

Considerações finais .............................................................77  

Referências bibliográficas ...............................................78

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Apresentação | 5  

Apresentação

No início do século XX, assistimos a avanços técnicos, tecnológicos e conceituais que

possibilitaram maior exploração dos recursos sonoros enquanto ciência e enquanto arte. Os registros

fonográficos conferiram materialidade ao fenômeno sonoro e as ferramentas de medição e análise

permitiram seu manejo consciente e direcionado. As potencialidades do som passam a integrar o

quotidiano e a criação dos artistas. No campo da música, pintura, escultura, dança, teatro,

arquitetura e outras áreas mais novas, como vídeo e mídias eletrônicas, as artes vem seguindo uma

forte convergência no sentido de mesclar-se e influenciar-se mutuamente, até que, na década de

1970, um conjunto bastante grande de obras, artistas e exposições começou a aparecer

reiteradamente sob o termo arte sonora.

A assimilação do dado sonoro intrinsecamente ligado à natureza das obras deixou de ser

exclusividade da música. É claro que o som está presente no cinema, no radio, no teatro, etc. Agora,

apropriado pela arte sonora, o som adquire uma potência estrutural e significacional análoga a da

música pelo modo que se organiza internamente e se relaciona a elementos não-sonoros, externos a

ele. Em relação ao tempo, as obras não tem início e fim definidos, alterando a fruição temporal.

Inserida num processo de alargamento das artes visuais, a própria aceitação do termo arte

sonora – cuja etimologia oferece não mais que um sentido genérico, considerado inexpressivo por

muitos – não é unânime, mas é crescente sua utilização por artistas que assim enquadram seus

trabalhos. As difusas fronteiras dos campos de aplicação tornam imprecisa e verdadeiramente

desnecessária a demarcação de gêneros.

Nos anos 1960, multiplicam-se ações vanguardistas como as promovidas pelo grupo Fluxus

com os Happenings; as diversas intervenções em espaços tradicionais; a montagem de parafernálias

aparentemente desconexas que procuravam agregar conteúdo às Instalações; as paisagens sonoras

derivadas de recursos e idéias da música eletroacústica. A imbricação dessas e outras atividades

resultam em novas linguagens na década seguinte, como é o caso do surgimento da arte sonora.

Características são incorporadas, alterando onde, por quem e como é feita a arte, desde a ampliação

do espaço de atuação (com apropriação de espaços públicos) e do modo de atuação (integrando o

espectador), até o estimular de abstrações baseadas num dado contexto (referencialidade) e as

provocações sobre o olhar do observador herdadas dos ready mades de Duchamp.

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Apresentação | 6  

A partida deste estudo foi relação som/espaço do ponto de vista artístico, motivado pelas

manifestações recorrentes no panorama cultural atual. Há tempos, o espaço da música tradicional

tem sido experimentado em diversas configurações de músicos, músicos e platéia, separação em

espaços adjacentes, ocupação até mesmo fora das salas de concerto, em espaços alternativos. Mais

recentemente, os recursos foram alargados devido à tecnologia e a mudanças nos hábitos sociais,

desde a música concreta. Procura-se, então, compreender os desdobramentos desses espaços de

exibição na arte sonora, culminando em tipologias mais ou menos representativas, em ambientes

internos e externos, com público passivo ou ativo.

Neste trabalho, investiga-se a exploração do espaço nas obras de Berhard Leitner e

Christina Kubisch qual um estudo de caso no âmbito da arte sonora. Para tanto, a abordagem do

tema consiste num exame geral sobre arte sonora, desde seu surgimento como tal, em meados da

década de 1970, procurando entender seu ideário a partir de artistas, obras, conceitos, linguagens,

estéticas, influências. A pesquisa propõe observar as relações entre som e espaço na arte sonora,

principalmente no tocante a interações estruturais e composicionais, considerando não apenas as

implicações acústicas do espaço arquitetônico, mas a utilização do espaço como elemento de

constituição e significação da obra.

Por questão didática, o estudo da arte sonora é feito pela abordagem de cinco aspectos,

sugeridos como fundamentais por Lílian Campesato em sua dissertação de mestrado Arte Sonora:

Uma Metamorfose das Musas (Campesato 2007: 7), quais sejam: sonoridade, tecnologia, interação,

tempo e espaço. Estes configuram tanto as matrizes de formação da arte sonora quanto sua prática.

Pretende-se maior aprofundamento no tópico espaço.

As obras levantadas de cada artista são examinadas, comparadas e divididas em grupos por

afinidades espaciais e formais em uma primeira fase do estudo. A seguir, são levantadas

características gerais de cada grupo e do repertório como um todo, configurando o perfil

programático do artista. Ulteriormente, Leitner e Kubisch são confrontados em alguns pontos de

destaque. Finalmente, munido dessas informações, procuram-se extrair noções relevantes e alguns

conceitos potencialmente aplicáveis globalmente à arte sonora. Algumas questões podem ser

pertinentes também a outros campos artísticos. As obras mostradas caso a caso em caráter

simplesmente expositivo, para serem, então, analisadas como um conjunto.

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Apresentação | 7  

Os parâmetros musicais são referenciais para compreensão do som na arte sonora e na

identificação de conceitos, processos e estéticas envolvidos. Sonoridades, timbres, forma e não

forma, tempo liso e tempo estriado (Boulez 2007: 88), objeto sonoro (Schaeffer) são todos

elementos que, mesmo um pouco distantes historicamente, ainda orientam o universo dos sons, a

produção, a escuta.

Ao se extrapolar o campo da música (considerando a filosofia da arte ao lado do

pragmatismo da arquitetura) optou-se por uma abordagem mais fenomenológica do assunto,

conseqüentemente, reduzindo a importância das conexões metafóricas para as análises.

Este texto foi dividido em duas partes. A primeira traz um breve panorama da formação da

arte sonora, suas características principais e alguns de seus artistas. A segunda parte apresenta o

estudo de caso dos dois artistas escolhidos.

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Arte Sonora | 8  

Parte I – Arte Sonora

Retângulos e labirintos preenchidos com alto-falantes e telas. Eles estão acima dos objetos esculturais arquitetando e esculpindo um espaço. São também instrumentos para reprodução de imagens e sons, superfícies para sua disseminação, mas também metáforas da atividade que os produz, do significado desta atividade e do seu modo de criar mundos.

Rancière 2002: 17

A epígrafe acima monta uma imagem sobre as atividades que vêm se desenvolvendo nas

últimas décadas, mistura de estilos e gostos, mas sobretudo de técnicas e objetivos.

Arte sonora refere-se a um conjunto bastante amplo e distinto de atividades e linguagens

artísticas, tentando simplificar o enquadramento de tais atividades no universo das artes, sem rotulá-

las, no entanto, segundo uma técnica, estética ou um meio de produção específico. Num primeiro

contato, pode parecer que arte sonora refere-se exclusivamente à arte do som ou arte feita com

sons. No começo dos anos 1980, houve um crescente número de exposições de artes visuais

voltadas para o som, mas incluíam também subgêneros tais como música, arte cinética,

instrumentos ativados pelo vento ou tocados pelo público, arte conceitual, efeitos sonoros,

gravações de textos e poesias, obras visuais que produzem som, pinturas de instrumentos musicais,

autômatos musicais, filmes, vídeos, demonstrações tecnológicas e acústicas, programas de

computador interativos que produzem som, etc.

Em relação às obras dos artistas, o som ocupa uma infinidade de funções e seu emprego

normalmente está ligado a uma outra mídia, ambas estáticas e baseadas no tempo. Como resultado,

não é possível deduzir agrupamentos distintos de artistas sonoros de modo que possam se

identificar em uma ou outra prática artística. Assim, os artistas sonoros iniciam suas carreiras em

momentos e ambientes diferentes em suas vidas, muito antes dos centros de arte metropolitanos –

com seus mercados, instituições e discursos – descobrirem o que se passou a chamar de arte sonora.

Observam-se a seguir algumas referências importantes para a formação da arte sonora. De

um lado, a música vem descobrindo relações externas há algum tempo, principalmente no que

concerne à espacialidade, e atinge um ponto culminante no século XX. De outro, as outras artes

intensificam os intercâmbios e as extrapolações.

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Arte Sonora | 9  

1. Precursores

Para compreensão da arte sonora, buscam-se indicadores referentes à sua base estrutural,

que são considerados, conforme mencionado anteriormente, os aspectos sonoridade, tecnologia,

interação, tempo e espaço. Para tanto são trazidas referências historicamente concretas que lidam

com estes temas. A música trabalha com sonoridades, tempo e vem tentando incorporar o espaço; as

artes plásticas lidam com o espaço e com aspectos estéticos visuais; as artes performáticas lidam

com espaço, tempo, interação e indiretamente com o som; a tecnologia sempre esteve presente em

todas, mas como um background elementar.

Contexto histórico-musical

A espacialização musical não é novidade, já aparece no projeto acústico das arenas da

Grécia antiga. Mas as implicações musicais dentro da tradição ocidental remontam ao renascimento

com as peças de Giovanni Gabrieli, que distribuía cantores em diferentes posições. Até o final do

século XIX, com Mahler, este tipo de programação persistiu.

A mudança de paradigma no som ocorre de fato no século XX a partir de Erik Satie e a

Musique d’Ameublement (música de mobília). Depois com Russolo e suas maquinas de barulho

conhecidas como intonarumori, Benjamin e o rédio, Ruttman e MacLaren com o “cinema sem

imagens”.

Os avanços técnicos, tecnológicos e conceituais possibilitaram uma maior exploração dos

recursos sonoros. Os registros fonográficos conferiram materialidade ao som e as ferramentas de

medição e análise permitiram seu manejo. As potencialidades do som passam a integrar o

quotidiano e a criação dos artistas com os trabalhos em estúdio.

A música após 1948

O salto decisivo ocorreu na década de 1950, nascido de três acontecimentos marcantes em

1948: os experimentos iniciais de Pierre Schaeffer, primeiro trabalho de Cage com silêncio e

gravação elétrica de Muddy Waters. Naquele momento, as artes plásticas viviam o expressionismo

abstrato.

Passaram a se desenvolver outros pólos artísticos e tecnológicos, principalmente na

Alemanha, com a criação da música eletrônica. Os trabalhos de Stockhausen e outros criam e

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manipular sons eletronicamente bem como difusão. Abriu-se campo para a acusmática e a difusão

sonora por alto-falantes.

Esses procedimentos já aparecem na construção do Pavilhão Philips por Le Corbusier e

Xenakis em 1958, com exploração da difusão espacial dos sons no Poème Électronique de Verèse.

À música eletroacústica, partir dos anos de 1950, somam-se o surgimento dos happenings e das

instalações na década de 1960.

Mundo das Artes

Uma característica da arte contemporânea, segundo Seth Kim-Cohen (2009: 261), é a

rejeição dos sistemas existentes. Isto se dá pela proposição de um outro modo de abordar as práticas

artísticas, sejam elas quais forem: ou mergulhando nos pontos fundamentais dessas práticas ou

saltando para o que é externo a elas. A primeira opção pode levar ao hermetismo da linguagem,

explorando ao extremo suas características internas, criando conceitos abstratos e analogias quase

incompreensíveis para que vê de fora. A segunda opção amplia e cria hibridismos.

Esta tendência de relacionar som e imagem visual, ou seja, de expandir pontos de vista para

além do próprio domínio, amplia a compreensão daquele domínio, do outro e da relação entre

ambos.

Convergências

As atividades humanas se interpenetram. No campo da arte, este caminho parece levar ao

cruzamento de linguagens, verdadeiros experimentos em que, por exemplo, uma música possa ser

pensada independentemente da audição, ou uma composição espacial atenda a proporções

temporais. Com a bagagem histórica até as décadas de 1960 e 1970, a partir de linguagens já

hibridizadas algumas atividades convergem para a arte sonora.

Dentre as principais categorias geradoras estão a paisagem sonora, a performance, a

escultura sonora, o happening, etc.

Campesato destaca Installation Art, Performance Art e Música Eletroacústica como sendo

as principais referências para formação da arte sonora (Campesato 2007: 28). Estas modalidades

colaboram também para a compreensão do repertório.

Trabalhos voltados ao som e as instalações surgiram no mesmo momento que a vídeo-arte,

fator que certamente aproximou seus elementos constituintes e os incorpora posteriormente na arte

sonora.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

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2. Características

2.1. Terminologias

Muitas vezes, como ocorre no estudo da história em geral, o estabelecimento de fases ou

períodos é impreciso e/ou arbitrário, apropriando-se de um evento específico para delimitar uma

passagem histórica. No caso da arte sonora, o termo foi empregado institucionalmente pela primeira

vez em 1982. A William Hellermann’s Sound Art Foundation inicialmente trabalhava com “música

experimental” ou “nova música” e organizou sua primeira mostra de escultura sonora e outros

trabalhos exibíveis no Sculpture Center em 1983 (Licht 2007: 11). Mesmo após ampla aceitação do

termo, continuam a aparecer outras denominações sugeridas por artistas que as julgam mais

apropriadas para descrever sua produção pessoal ou um conjunto específico de trabalhos.

Termos como sonic art, audio art, tone art e sound art podem ser sinônimos e representam

a variedade de intenções no uso do som em arte. Dependendo da área de origem do artista, este

pode preferir uma ou outra versão, mas também tem um apelo pessoal. Até a consolidação de um

termo predominante (sound art se estabeleceu mais fortemente), a disputa principal era por uma

diferenciação da música, arte do som por excelência. “É sempre difícil classificar [arte sonora]. O

campo da música diz que não é música suficiente e o campo da arte diz que é música demais”

(Kubisch apud Metzger 2000: 88).

A influência da paisagem sonora (soundscape) nas arte plástica, nos anos 1960, já indicava

um preocupação com a “ecologia” do som. Outras produções apareceram em direção semelhante,

sob os termos land art e earthworks. Estes trabalhos estavam voltados aos sons do entorno, ao

ambiente sonoro, ao fato de que a vida quotidiana está imersa em som.

Outra fonte referencial é a sound installation (instalação sonora), que hoje carrega maiores

significados, originou-se de apresentações musicais de Max Neuhaus, com ambiente preparado

exclusivamente, que procuravam ampliar o envolvimento com o público e as formas musicais sem

um início ou fim. A ocupação do espaço era colocado como uma das questões centrais. Surge uma

especialização do espaço, em que cada obra está fortemente vinculada ao local de instalação, num

local específico – site specific.

Na escultura sonora, Tinguely, Bertoia e os irmãos Baschet iniciaram seus trabalhos nos

anos 1950-1960, com artefatos que eram literalmente esculturas que soavam. Tinguely seguia os

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preceitos de Russolo, com criaturas mecânicas compostas de microfones, alto-falantes e engre-

nagens, até emergir a eletroeletrônica e os computadores acessíveis nos anos 1980. Diferentemente

das instalações, as esculturas concentram o desenvolvimento do dado sonoro em um objeto, em vez

de se desdobrar no entorno.

Sobre a diversidade de atividades ainda presentes na produção da chamada arte sonora,

Christina Kubisch dá sua opinião prática: “termos não são importantes para mim. Instalação sonora

é o mesmo que espaço sonoro ou sala sonora. Esculturas sonoras, por outro lado, são objetos que se

podem transportar e repetir” (Kubisch apud Metzger 2000: 87).

Na língua inglesa, o termo art refere-se às artes plásticas e artes visuais, não incluindo a

música e outros campos como teatro, dança, literatura, cinema etc. Deste modo, sound art é

indicativo de uma atividade mista, porém baseada naqueles gêneros visuais, e que acrescenta o som

em sua composição. Representa uma orientação prática dos anos 1960 que fundamentou a

miscigenação artística a partir das artes plásticas, especialmente escultura e instalação. Entretanto, o

modo como o som é utilizado e sua interferência no processo global de criação sugerem outras

fontes de embasamento (como o próprio som ou os processos artísticos) uma vez que todos os

rudimentos têm sua importância colaborativa. Naquele momento, artistas não-músicos se

identificam com idéias, procedimentos técnicos e realizações ligadas à música eletroacústica

advindos da escuta reduzida e da acusmática, e especialmente na reflexão sobre o próprio som, seja

pela arte ou pela ciência (acústica, fisiologia, psicologia etc.). Já constituição e apresentação das

obras se aproximam do happening e da performance art.

Há ainda uma diferenciação entre a expressão arte sonora em inglês – sound art – e em

alemão – Klangkunst. Sound denota uma acepção bastante ampla do fenômeno físico: som. Na

Alemanha, Klangkunst é uma área mais específica, visto que Klang significa som num sentido mais

próximo da música, e Tone exprime uma idéia mais ampla, como sound. Estas acepções serão

melhor detalhadas a seguir, no tópico Concepções.

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2.2. Concepções

Caracterizar arte sonora significa mapear alguns princípios norteadores de uma atividade

artística ainda em desenvolvimento; não se lhe pode dar atributos de um gênero autônomo, uma

nova arte, tampouco enquadrá-la como subcategoria das artes visuais.

Padrões e gostos mudam, refletidos em diferentes técnicas, cores e formas, timbres e

freqüências. Definições estéticas se metamorfoseiam ao longo da história, sensações são

representadas em entidades concretas, alternam-se abstração e figuração. A essência material na

constituição da obra de arte é constante, já caráter introspectivo, mental, parece ter alcançado status

de destaque no século XX a partir da arte conceitual, de Duchamp ao grupo Fluxus. O termo

“conceitual” é muitas vezes depreciativo mas, recorrendo-se à essência, sua influência é inegável.

Essa busca da mediação da obra de arte pelas experiências pessoais e sociais do espectador é

reinterpretada ao se destacar o aspecto sensorial na arte contemporânea, em que são criados

artifícios que lhe provoquem sensações mais que simplesmente estimular os sentidos.

Um campo para possível especulação são os meios de produção. A utilização das mais

diversas ferramentas, técnicas, métodos e condutas de criação corrobora com a idéia de hibridismo

de linguagens. Destaca-se, entretanto, um retorno a procedimentos mais artesanais em resposta à

mecanização1 do período anterior. O trabalho mais próximo ao material permite extrapolar

conteúdo e significado, conectando-o a uma outra linguagem.

Diferente da arte conceitual do período anterior, a arte sonora tem bases mais atreladas à

fenomenologia, por questões práticas de aproximação com o espectador mas também por suas

implicações científicas. Seguindo as referências de Husserl, mediadas por Schaeffer, de Merleau-

Ponty, por Chion, e de Heidegger, por Cage, vemos uma vasta aplicação dos conceitos

fenomenológicos.

O trabalho de Pierre Schaeffer (teórico, compositor e inventor da música concreta) carrega

uma relação complexa com a escola filosófica da fenomenologia. Embora seja freqüentemente visto

como trabalhando na periferia deste movimento, Kane argumenta que “o esforço de Schaeffer de

fundamentar obras musicais numa disciplina ‘híbrida’ é quase ortodoxo, modelado na crítica

fundamental de Husserl de ambos ‘realismo’ e ‘psicologismo’ lógicos” (Kane 2007: 15)

1 Entende-se por mecanização a utilização de processos que facilitem, automatizem e intensifiquem a produção das obras, como, por exemplo, o desenvolvimento de computadores e algoritmos para composição musical, a criação de música, performance, happening baseados em instruções para execução, reprodução de estilos ou gêneros etc.

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Já Merleau-Ponty, considerado por muitos como um avanço do pensamento husserliano

sobre percepção, é tomado como base por Michel Chion para relacionar os fenômenos aos sentidos,

como por exemplo, juntar visão, audição e tato por meio do som: “nós chamamos de trans-

sensoriais as percepções que não são de nenhum sentido em particular, mas podem buscar o canal

de um ou de outro, sem que seu conteúdo ou seu efeito seja restrito aos limites deste sentido”

(Chion 2002: 56)

A escuta, a intenção de escuta e o silêncio, trazidos à tona principalmente por Schaeffer e

Cage, permanecem para além da música. O som concreto e o ruído são expostos com sua carga

simbólica e imagética ao lado de outros princípios revelados pelas artes visuais, em que o contexto

é incluído. A obra tem suas relações acima do objeto em si. Na “contextualização”, o envolvimento

do observador é imprescindível: sua participação, a interação sobrepondo-se à contemplação. O

corpo, herdado da dança e do teatro, completa a obra em sua totalidade.

Uma das principais características é a mediação tecnológica, cada vez mais apropriando-se

de novas mídias e recursos eletrônicos, não apenas como elemento de construção das obras, mas

num papel fundamental de ligação com o público, permitindo maior interação.

Lidar com tempo e espaço sofre grandes alterações ao longo no século, culminando numa

relação imbricada, detalhada mais adiante.

Em 2009, os suecos Andreas Engström e Åsa Stjerna publicaram o resultado de uma

pesquisa que levantou a literatura existente sobre arte sonora até então. Buscaram em diferentes

idiomas, com retorno majoritário em inglês2 (Sound Art) e em alemão (Klangkunst). A seguir,

apresentamos um quadro comparativo fundamentado no artigo (Engström and Stjerna 2009: 11-18).

A divisão é um pouco vaga e carrega ainda imprecisões de definição e terminologia, mas ajuda a

ilustrar algumas tendências particulares da arte sonora germânica, berço de Leitner (Áustria) e

Kubisch (Alemanha), que serão trazidos no estudo de caso da segunda parte.

2 Foi encontrado um número maior de artigos e textos em inglês, como é de se supor, uma vez que seja o idioma internacional por excelência, mas parece que os autores da pesquisa conseguiram discriminar razoavelmente quais textos se aplicam a cada uma das “versões” da sound art. Considera-se positivo também o uso de arte sonora (em português) em detrimento dos estrangeirismos.

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Comparação entre sound art e Klangkunst levantada por Engström & Stjerna

quadro-resumo

Sound art

não-performática ‹ -

independente ou ligada a centros de exposição ‹ -

abordagem ampla do campo artístico ‹ -

categoria estética ‹ - referência à qualidade estética interna do som •

perspectivas culturais •

a preocupação espacial não é específica ‹ -

simultaneidade entre material sonoro e espaço ‹ -

conceito expandido de escultura ‹ -

desconstrução temporal no contexto da música ‹ - aplicação do processo não-teleológico do som •

voltado à experiência sonora: sound-in-itself (Cox 2003) ‹ -

fenomenologia acústica ‹ -

novas tecnologias em paisagem sonora e design de som ‹ -

relação com a tradição musical ‹ - música concreta e experimentalismo •

um tipo ‘alternativo’ de música • fruto da divisão entre música e sons •

equivalente musical dos ready-made de Duchamp •

som como fluxo contínuo ‹ -

arte sonora: som combinado com artes visuais ‹ - mantém certa distinção entre visual e auditivo •

referências musicológicas e filosóficas atualizadas ‹ -

mudança na concepção tradicional de música ‹ -

a música convertida em som como som (Cox 2006) •

Klangkunst

-› não-performática

-› fortemente ligada ao meio acadêmico

-› tendência a adquirir status de gênero

-› aspectos conceituais • memória afetiva, sensação, história de um lugar, etc.

-› a preocupação espacial é direcionada

-› fusão entre material sonoro e espaço • sem divisão entre artes do espaço / artes do tempo

-› ligado a esculturas e instalações

-› desconstrução temporal no contexto tempo-espaço • tratamento conjugado de tempo e espaço

-› evita uma orientação estritamente sonora

-› um campo da musicologia

-› atenção ao discurso da paisagem sonora

-› distanciamento da música eletroacústica e acusmática

-› relativização do tempo e vínculo com o espaço

-› equivalência arte sonora / instalação (Metzger 2006) • instalação é categoria da arte sonora e vice-versa

-› referências musicológicas e filosóficas antigas • desatualização acerca de site specificity

-› raiz sinestésica: visão e audição ligam tempo e espaço

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Arte Sonora | 16  

2.3. Cinco Aspectos Fundamentais

2.3.1. Sonoridade

Muitos dos artistas sonoros não vêm da música e lidam com os sons com menos

convencionalismo que um músico. A tradição musical estabeleceu regras cada vez mais precisas

(não necessariamente mais rígidas) que levavam os compositores a atividades mais objetivas

profissionalmente. A complexidade reside ao lidar com as camadas sonoras de uma composição,

sobrepostas e encadeadas, criadas racionalmente. Tudo está interligado e a escolha do material se

torna a primeira decisão. Se de um lado, a compreensão composicional ajuda a criar algo

interessante auditivamente, de outro, a livre busca por sons permite adequar-se melhor ao ambiente

e à situação. O entendimento do som por músicos e não-músicos coloca em diálogo as experiências

dos artistas atuantes em arte sonora. Um ponto comum pode ser o que John Cage apresenta em

1952 no seu TACET, ao expor sons além daqueles causados intencionalmente, mas ouvidos

cuidadosamente. Som, ruído, silêncio a partir de Schaeffer e Cage. Estimula-se a pro atividade do

ouvinte.

A música tem sido uma linguagem auto-referencial, desvinculada de elementos extra-

musicais, em que cada elemento musical tende a estabelecer uma rede de conexões com outros

elementos do próprio discurso musical, cria relações abstratas com o som. Mas o caráter

experimental permanece.

Com a proposta de materialização do som com os objetos sonoros, Schaeffer cria a musique

concrète (música concreta), expandindo não somente os sons, mas principalmente a escuta, através

da qual os sons são de fato possíveis. Paralelamente surge a elektronische musik em Colônia,

Alemanha, preocupada com a nova tradição do serialismo – os timbres sintetizados eletronicamente

são dirigidos a esta linguagem. Em um ou em outro caso persiste certa tendência abstrata de

“musicalização” dos sons.

2.3.2. Tecnologia

Agora, no saudável embate filosófico entre fenomenologia e simbologia (metáforas), com

paradigmas de sensação e sentimento, afloram com bastante liberdade fontes sonoras naturais,

mecânicas, elétricas e eletrônicas.

De fato, a tecnologia sempre fez parte da produção artística, pois o própria evolução dos

instrumentos musicais depende dela para acontecer. Como vimos, os avanços técnicos, tecnológicos

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Arte Sonora | 17  

e conceituais possibilitaram maior exploração dos recursos sonoros enquanto ciência e enquanto

arte. Os registros fonográficos conferiram materialidade ao fenômeno sonoro e as ferramentas de

medição e análise permitiram sua utilização. As potencialidades do som passam a integrar o

quotidiano e a criação dos artistas. O que aporta de modo determinante é o deslocamento da ênfase

do processo de produção para a recepção (audição) como experiência cultural. Todo o trabalho

baseado na escuta também se reflete no uso do alto-falante (o escutador) como instrumento. Ao

ouvir uma reprodução em locais e situações diferentes, o som de descontextualiza provocando, na

mediação, nova contextualização.

Este percurso histórico da materialização do som – captação, armazenamento, reprodução,

amplificação e remodelagem – incrementa a produção artística baseada no som, mas principalmente

cria um novo canal de comunicação, rompendo a barreira entre os meios de atuação da arte.

Sobre o que tem mudado desde os primeiros trabalhos híbridos nos anos 1970, Christina

Kubisch afirma que os “desenvolvimentos tecnológicos mudaram em particular e têm muito a ver

com a ascensão da arte sonora” (Metzger 2000: 87).

Com as atenções voltadas para a escuta, o receptor (ouvinte/público/visitante) toma uma

posição pivô na composição das obras.

2.3.3. Interação

Se o foco visual da performance de um músico ou um grupo é removido e os ouvintes não

mais são compelidos a se sentar em assentos fixos, mas podem se movimentar livremente pelo

espaço, é possível uma percepção espacial muito mais forte. Esta é a proposta de interatividade da

arte sonora, permitir que a pessoa usufrua livremente dos recursos em vez de uma programação

definida ou um objetivo previsto.

Existe aí um legado importante da escultura, mais especificamente do modo de apreciá-la.

Exige do observador um interesse em buscar vários ângulos de visão para apreender a obra como

um todo; o visitante a encara, espera dela diferentes manifestações. Diferente da performance, por

exemplo, que vai atrás da atenção do espectador.

“Nós todos vivemos numa Société ludique (Alain Cotte), que é incessantemente ameaçada

pelo tédio e invadida pelo jogo/brincadeira (jeu). Cabe a você escolher seu ‘papel’ dessa ‘sociedade

do espetáculo’: ator ou espectador” (Hosokawa 1984: 179).

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Arte Sonora | 18  

Os atores mudam, as referências mudam, muda igualmente a fruição temporal. Cada

execução proporciona uma obra pela primeira vez.

2.3.4. Tempo

A música é unanimemente enquadrada nas arte do tempo, pois baseia-se no som, que

essencialmente é um fenômeno temporal. Só se pode perceber o tempo graças a mudanças de

estado, alterações. Pela ação da memória, identificam-se pontos de referência no decorrer das

transformações. Se tais indicadores são imateriais, se tais parâmetros mesmo mensuráveis não são

palpáveis, então este sistema fluido se manifesta abstratamente. O som é uma entidade vaga que

preenche o tempo.

A música elabora mecanismos de manipulação da informação temporal modelando o sons e

criando formas no tempo – as formas musicais – que descrevem arcos narrativos inteligíveis. O

discurso musical conduz uma estrutura teleológica, dialogando com a capacidade de percepção do

ouvinte, em que cada passo é cuidadosamente composta num encadeamento paulatino de ações,

penetrações, sentimentos. A música se organiza no tempo.

Arte sonora se apropria de referenciais análogos aos da música. Análogos porque não são

semelhantes, estão em outro nível. O fenômeno é compreendido, atribuindo ao som características

materiais, o que permite repousar um som num canto da sala. O som passa a ser matéria escultórica,

congelando-o no tempo pelo período que se queira.

Múltiplas escalas temporais subseguem àquelas da música, se sobrepõem, se encadeiam. O

tempo que cada espectador atribui à obra depende do envolvimento psicológico (tempo interior),

cinético (percurso e fruição) e da interação destes dois. Na prática, é o espectador que define,

consciente e inconscientemente, a duração da obra.

Pode haver, é claro, músicas menos temporais e obras de arte sonora mais temporais, já que

outros parâmetros também estão em questão. Na arte sonora, a materialização do som e

conseqüente congelamento do tempo trazem à tona o espaço como meio de dialogo.

2.3.5. Espaço

A famigerada experiência de Cage em uma câmara anecóica expandiu o modo como a

cultura ocidental lida com o som: “não existe tal coisa, um espaço vazio ou um tempo vazio. Há

sempre algo para se ver, para se ouvir” (Cage 1957: 8 apud Cox 2009: 23). Não existe silêncio

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absoluto. Em vez disso, podemos inferir que há suspensão da massa sonora referencial, do som

predominante, restando apenas a matéria silente: “o som existe em relativo silêncio, impondo-se

facilmente como uma indesejada interrupção. (...) O que existe antes e depois da interrupção tem

uma maior potência” (Toop 2004: 41). Os “vazios” percebidos antes e depois de uma manifestação

sonora não devem ser entendidos como “não-som” ou “anti-som”, mas como substância de igual

importância. No vocabulário japonês, a palavra Ma significa “intervalo”, percebido indistintamente

no tempo e no espaço (Bailey 2009: 324). Ma é a parte amorfa do mundo audível a que chamamos

silêncio; é também a escuridão ao redor das estrelas.

De modo similar, a arquitetura erige espaços constituídos de aberturas e massas fechadas,

cheios e vazios. O espaço arquitetônico – e por que não dizer todo espaço – é a porção geométrica

livre e fluida pela qual fluímos, mas o que vemos e compreendemos são os elementos maciços que

o circundam e são por ele circundados. O espaço tanto pode ser percebido como a totalidade

tridimensional do universo que comporta objetos, os próprios objetos quanto, a lacuna existente

entre eles.

Em arte, esses elementos contrastantes sempre foram postos em diálogo, ora em equilíbrio,

ora rompendo-o. Massa versus plano de fundo, cheio e vazio, luz e sombra. Arquitetura e som

criam espaços flexíveis com a mudança dos contornos, criam territórios invisíveis de maior impacto

por não se limitarem a fronteiras físicas. A arquitetura é visual e tátil e expressa a vontade de

estabelecer limites e fronteiras, mas esses limites são elementares e não podem transmitir a

completa imersão da arquitetura. Através de sua própria essência interior, cria um exterior. O

exterior de um edifício cria novos espaços e todas as interconexões sutis que fazem a riqueza da

cidade.

Entenda-se espaço como um organismo constituído de objetos e as ligações concretas e

abstratas entre eles. A percepção abrangente do espaço se estabelece por meio da visão (a luz

cobrindo a geometria tridimensional) e da audição (som, acústica e psicoacústica), e esta, por sua

vez, permite-nos conectar espaço e tempo. “Visão e audição se complementam para se tornar uma

experiência espacial holística que é intensificada, suplementada e acrescentada por outros sentidos e

percebida através do movimento do corpo no espaço” (Rüth 2006: 237 apud Klein 2009: 101).

O espaço é utilizado como elemento de constituição e significação nas obras.

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Cubo branco | cubo preto

A arte era colocada em locais de uso comum, sem um espaço especialmente projetado para

ela. Palácios e museus mantinham o padrão de arquitetura usualmente empregados. A obra de arte

se destacava das paredes por ser obra de arte. A música ocupava os salões da nobreza. Nos espaços

urbanos da burguesia este mesmo modelo prevalecia.

No século XX, o espaço da arte, de sua veiculação, esteve voltado à obra em si, recebendo-a

num ambiente neutro, asséptico, para sua devida apreciação estética. Isolada de referências externas

numa espécie de cubo branco, a arte pode se desenvolver, se apresentar.

Mas a partir do momento que conceitos se expandem, com avanços científicos e misturas

artísticas, e o meio interage com as composições, o objeto passa a fazer parte de um contexto, deixa

de ser independente do entorno e o incorpora para um significado total. O observador é posto

imerso no círculo da obra e interage, não mais se relacionando à distância. O espaço sagrado deixa

de existir. A neutralidade é então sugerida pela imersão do público num recinto de paredes escuras,

que desaparecem com a ambientação apropriada (iluminação, etc.).

Lugar | Site-specific

Com a quebra de barreiras entre as linguagens, os locais de apresentação/exibição das obras

torna-se obsoleto, qualquer que seja sua configuração. Cada trabalho exige uma abordagem

específica. Além de construir a obra, monta-se seu entorno, que na verdade também faz parte da

obra. Como as galerias não atendem mais suas necessidades, os artistas procuram locais

alternativos, ocupando também espaços externos e locais públicos.

Este processo se dá pela desmaterialização da arte, em que a instalação pressupõe inúmeros

conceitos com resultado prático significando literalmente ter que instalar uma obra, preparar o

ambiente para recebê-la. Existe uma especificidade do local (site specificity)

O conceito de site specific começou com a instalações, que se ligavam inextricavelmente ao

local. Um lugar é um local com atributos particulares, que incluem sua história, seu uso, sua

aparência, sua não reprodutibilidade. Mesmo que a construção em si possa ser reproduzida em outro

local, o lugar do qual ela faz parte não poderá. Em escala menor3, foi o que a instalação propôs.

3 Geralmente em escala menor, mas evidentemente existem obras extensíssimas a exemplo das da dupla de artistas conhecida como Christo.

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Arte Sonora | 21  

Espaço acústico | arquitetura aural

A avaliação do espaço sonoro está baseada cientificamente no campo da acústica. Os

espaços devem estar adequados à ergonomia geral, incluindo audição. O tempo de reverberação de

umas sala, por exemplo, é fator decisivo para direcionamento de uso para uma ou outra atividade.

Muito da criação artística, musical, tem sido feita sobre estes valores intuitivamente, a exemplo da

forma que a homofonia se desenvolveu nas grandes igrejas em detrimento da polifonia, ou as longas

pausas para ouvir o decaimento do som.

Mesmo quando se mantém uma mesma fonte sonora (instrumentos, etc.) em diferentes

lugares, o resultado é variável. Surge o que se pode chamar de metainstrumentos; eles incorporam

qualidades sonoras do local. Justamente esta é a base da peça I’m sitting in a room, de Alvim Lucier

que, ao repetir o processo de gravação e reprodução do texto narrado numa sala, destaca seu aspecto

acústico, independente da fonte sonora.

Concepções espaciais na arte sonora

Identificam-se alguns demarcadores espaciais: arquitetura, objetos, luz, som...

Luz: “Num momento em que as artes estavam se libertando das superfícies visíveis para

revelarem estruturas ocultas e configurações secretas, para tornar visível o invisível, é

surpreendente que a luz tenha se tornado fundamental meio da prática artística contemporânea

(Ahrens 2000: 56).

Objeto sonoro: uma redefinição do termo. Originalmente cunhado por Schaeffer, restrito ao

fenômeno sonoro “imaterial”, é literalmente uma entidade sonora, mínima, com qualidades auto-

suficientes e independente da fonte de origem, um ser feito de som. Na arte sonora, objeto sonoro

passa a ser usado para indicar um artefato físico, um objeto concreto que emite som. Demarca

visual e auditivamente um lugar. Devido a suas dimensões reduzidas, “o som eletroacústico se

caracteriza por uma ‘temporalidade’ enfraquecida e uma ‘espacialidade’ reforçada” (Genevois

1998: 12), um vez que sua dispersão é mais livre e ampla.

“O objetivo musicológico reside em recriar o melhor modelo já concebido para ouvir o som:

o estúdio de áudio. (...) Sob tais circunstâncias, não é concebível imaginar uma trajetória conceitual

no modo como os curadores costumam proceder. (...) Museus ainda não têm agregado uma

museologia perfeitamente adequada a estes tipos de produto (Assche 2002: 11-12).

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3. Repertório e Artistas

Desde o início da música eletroacústica, nas décadas de 1940 e 1950, a Alemanha esteve –

juntamente com a França, num primeiro momento – à frente da exploração do som sob uma visão

mais ampla do que aquela abordagem da música ocidental tradicional. Na Europa central, as

vanguardas estéticas, acompanhadas de desenvolvimentos técnicos e tecnológicos, levaram à

proliferação linguagens artísticas nas décadas que se seguiram, que acabaram por se influenciar e se

inter-relacionar. Nos anos ’60 e 70’, estabeleceu-se uma polarização entre Europa central e Estados

Unidos, país em que se radicaram muito artistas.

Na arte sonora, as atividades são bastante dispersas geograficamente, entretanto pode-se

destacar algumas convergências:

“Os ‘centros’ de música não são os mesmos das artes visuais. Dai decorre a necessidade de elaborar uma nova topografia internacional de criação. Uma cartografia emergiu, destacando trajetórias: Berlim/Londres, Kingston/Detroit/Londres, Viena/Nova York, México, Bruxelas/Schefield; e também cidades como Marselha, Nantes Manchester e Porto” (Assche 2002: 10-11).

As metrópoles artísticas do meio do século mantêm sua participação, mas dividem sua força

com outros pólos influenciados por atividades antes tidas como alternativas.

“Que a primeira geração de artistas sonoros (Annea Lockwood, Bill Fontana, La Monte

Young, Maryanne Amancher, Bernhard Leitner, Max Neuhaus) surgiu nos anos ‘60 e início dos ’70

no mesmo momento que os Earthworks e os Land artists não pode simplesmente ser coincidência”

(Licht 2007: 124). Pode-se acrescentar ainda, Alvin Lucier, Felix Hess, Rolf Julius e Christina

Kubisch como pertencentes à primeira geração. Artistas como Robin Minard (1953), Janet Cardif

(1957), Christian Marclay (1955), Steve Roden (1964), Stephen Vitiello (1964), dentre muitos

outros, configuram uma “segunda” geração que segue até os dias atuais.

Como visto em 2.2. Concepções, existem duas correntes mais fortes, uma anglófona e uma

germanófona; desta última, comenta-se que:

Alguns dos artistas recorrentes em publicações e artigos são Berhard Leitner, Rolf Julius, Christina Kubisch, Ulrich Eller, Robin Minard, Bill Fontana, Max Neuhaus, Hans-Peter Kuhn, Akio Suzuki e Andreas Oldörp. Nem todos são alemães, porém muitos têm tomado a Alemanha como sede ou trabalhado lá em diferentes projetos, e se enquadram no conceito germânico de Klangkunst. (Engström and Stjerna 2009: 15).

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Arte Sonora | 23  

3.1. Do recorte

Como se constatou, desde os anos 1960 as práticas artísticas se misturaram gerando novas

linguagens. Do mesmo modo, artistas de diferentes áreas buscaram materiais, processos, estéticas

em outros campos para suprirem suas necessidades criadoras. A arte sonora os acolhe. Como uma

pequena (porém importante) amostra da arte sonora, representativa histórica e qualitativamente,

foram escolhidos dois artistas de origens distintas para terem seus trabalhos analisados desta

pesquisa. Bernhard Leitner, arquiteto da área de design urbano, interessou-se pelo som como forma

de modelar o espaço fundamentado na recepção do usuário. Christina Kubisch, flautista, viu a

necessidade de mudar o diálogo com o público após alguns anos de performance ao lado do vídeo-

artista Fabrizio Plessi. Leitner e Kubisch encontraram, enfim, um denominador comum: a arte

sonora. Mas isto não significa que tenham chegado a procedimentos ou resultados plásticos

semelhantes. Longe disso. Seus trabalhos têm sua própria identidade. Essas diferentes formações

artísticas são enriquecedoras ao escopo desta pesquisa por retratarem a diversidade de “estilos” da

arte sonora e ainda assim apresentarem características recorrentes, tais como: uso de aparatos

tecnológicos organicamente incorporados às peças, produção de sons de qualquer tipo orientada à

escuta e fruição temporal específicas, envolvimento ativo do público com a obra em maior ou

menor grau, e a própria questão espacial como um dos pivôs criação. De um lado, Leitner parte da

questão espacial – com intermédio do som – para desenvolver suas obras, de outro, Kubisch produz

sua arte sonora de modo mais abrangente, com implicações espaciais tão importantes quanto outros

fatores.

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Parte II - Estudo de caso

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4. Bernhard Leitner

Enquanto se discutia música de vanguarda e as artes se misturavam sem ainda rotular muitas

das novas linguagens, Leitner foi um dos pioneiros do que viria a ser arte sonora, ao concentrar seu

interesse no fenômeno sonoro como expressão. Em 1968, muda-se de Viena para Nova Iorque e

passa a trabalhar no departamento de planejamento urbano da cidade. Nos anos 1970, enquanto

ministra aulas de design urbano na Universidade de Nova Iorque, monta um estúdio-laboratório

para investigar propriedades sensoriais do som a partir de modelos teóricos e experimentos

empíricos. Ao mesmo tempo é um lugar para demonstrações e apresentações ao público. Os

conceitos e projetos teóricos então desenvolvidos foram publicados em 1978 no livro Sound: Space.

Muitos artistas sonoros de sua geração e posteriores são oriundos sobretudo das artes

plásticas e da música, e relacionam intensamente elementos sonoros e visuais. No início, Leitner

deixa o aspecto visual em segundo plano, pois parte da investigação do som como fenômeno físico

e psicológico autônomo. Durante a primeira vintena de atividades artísticas, suas ferramentas foram

nada mais que alto-falantes e seus suportes de madeira.

Parece que sua dedicação ao espaço sonoro vem da preocupação com a ergonomia acústica

da arquitetura. Como arquiteto, a compreensão geométrica e estrutural de uma edificação é direta,

mas a exploração do som surge como curiosidade acerca da psico-acústica aplicada ao espaço.

O pioneirismo deve ser destacado por seu interesse no espaço sonoro – espaço caracterizado

e dimensionado pelo som – mas também pelo uso da tecnologia de ponta disponível na época. Se

hoje não se questiona o técnica de difusão por ser evidente e acessível, em 1971 demandava

equipamentos grandes e restritos, de difícil utilização, usados sobretudo por empresas e instituições

de ensino. Uma das duas primeiras unidades de controle multicanal (1971) foi um interruptor de

relê circular com uma manivela manual para até 20 alto-falantes distribuídos por todo o espaço,

cada um dos quais poderia ser controlado dinamicamente por meio de um potenciômetro. O

segundo foi uma unidade de relé eletromecânico para 24 alto-falantes com 24 controles de volume

independente permitiu a documentação precisa e verificável de uma experiência acústica.

A partir de 1973, 40 alto-falantes distribuídos por todo o espaço foram controlados por meio

de fita perfurada de oito linhas, o que tornou possível programar uma alteração arbitrária da

velocidade de movimentos de som, bem como o volume de som de cada local (Leitner 2008: 25).

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Exemplo de codificação em fita perfurada de oito furos.

O arranjo das situações de laboratório entre 1971 e 1975 foram todos documentados em

esboços num diário de bordo, incluindo as dimensões, informações sobre o material de som usado e

os programas de movimento. “Também fiz notas sobre experiências acústico-espaciais, insights e

idéias para novas experiências espaço sonoro” (Leitner 2008: 25). Em sistemas menores, de até

quatro canais, utilizava gravação e reprodução via fita magnética de quatro pistas, processo mais

simples e reconhecível ainda hoje. Apesar desses dados, não são oferecidas informações técnicas

suficientes para serem trazidas em primeiro plano ou mesmo que sirvam substancialmente para as

análises.

São sugeridas duas grandes fases cronológicas de produção artística, distintas em parte pelo

material e pela técnica utilizados, mas principalmente pelos resultados estéticos visual e auditivo.

As fases divididas combinam, genericamente, cronologia e plasticidade, também como forma de

estruturação deste estudo.

1a Fase: experimentação e consolidação (1968 - 1986)

É o início da carreira artística, com propostas e experimentações sonoras feitas

empiricamente em um atelier com feições de estúdio-laboratório. O termo “experimentação” é

usado aqui sem conotação estética (implícita, por exemplo, na música experimental), significando

literalmente experiências e testes investigativos. Parte dos resultados passam a ser expostos ao

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público no próprio atelier e em galerias de arte. Neste período surgem e se consolidam os princípios

conceituais que aparecem esteticamente no conjunto de sua obra como uma marca registrada.

1968 - 1978

Em 1971, instalado em seu atelier em Nova Iorque, começa a testar as inúmeras

configurações de alto-falantes estudadas e projetadas nos anos anteriores, montados em estruturas

simples de madeira, num salão vazio, procurando modelar acusticamente o espaço em relação a um

ouvinte referencial. “Meu trabalho trata da experiência físico-auditiva de espaços e objetos que são

determinados em forma e conteúdo pelo movimento do som. O foco é a relação entre a estrutura

construída do som e o corpo humano”. (Leitner 1978: 13). Centrada na percepção e manipulação do

espaço através do movimento do som, a escala varia de pequenos objetos aplicados diretamente no

corpo a espaços de amplitude arquitetônica.

1979 - 1986

Mesmo com a proposta de algumas ocasiões abertas em seu atelier nos anos anteriores,

poucas foram as interações com o público e apenas um trabalho foi criado sob encomenda no

período: Aerial Spaces (1973), que esteve no lobby do Hotel Embarcadero em São Francisco (EUA)

até 1985. Posteriormente ao período direcionado quase integralmente à experimentação, Leitner

abre-se às atividades externas e passa a integrar o circuito artístico, compondo para diversas

instituições. Da aplicação direta dos experimentos, inaugura nova etapa em que cria obras para

exposições e galerias, com resultados muito bem recebidos. É o período de consolidação da

carreira, que dura até hoje.

2a Fase: produção e identidade (1987 – 2012)

Mantém o ritmo e os atributos principais da produção. O que muda essencialmente é a

valorização dos materiais e dos acabamentos, em suma, do aspecto visual do conjunto, com obras

mais plásticas. Com maior liberdade de ocupação ao provar os mais diversos locais de instalação

fora do ambiente controlado do atelier, fervilham intervenções arquitetônicas resultando também na

construção de obras permanentes, ora chamadas de “arquiteturas sonoras” pelo artista. A fase se

inicia quando expõe Sound Stars e constrói Le Cylindre Sonore, ambos de 1987). Desde Sound

Umbrella (1990), trabalha com som direcional, reduzindo consideravelmente o número de alto-

falantes. Nota-se uma ampliação da fantasia do artista, sobretudo no campo visual e na

incorporação acústica da arquitetura, que conjuntamente viabilizam maior integração dos elementos

(sonoridade, imagem, presença/corporificação, fruição temporal, etc.).

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4.1. Análise do repertório selecionado

O repertório a ser analisado foi extraído da lista de obras constante no site

www.bernhardleitner.com/works. No período que decorreu esta pesquisa, de julho de 2012 a julho

de 2013, as informações do site permaneceram sem alteração, apresentando um total de 100

trabalhos relacionados, dos quais 90 são trazidos no presente exame. Os itens excluídos foram

descartados devido à irrelevância no contexto som/espaço4 ou por não oferecerem dados suficientes.

Para acompanhamento da análise, as datas das obras estão no quadro cronológico das páginas

seguintes.

Optou-se por um grande rol por apresentar maior representatividade no levantamento de

características do artista, usado de modo quase estatístico. Não será contemplada sua obra integral,

tampouco as obras selecionadas serão detalhadas a um mesmo nível. O que interessa é estabelecer

alguns parâmetros para compreender a obra do artista e apreciá-lo enquanto investigador do espaço

no contexto da arte sonora. As análises são feitas em blocos, por semelhanças estruturais do

estímulo sonoro-espacial do público. A divisão em categorias, por si só, já exprime o resultado das

primeiras análises, mas não devem ser tomadas restritivamente, uma vez que características

secundárias reaparecem de parte a parte e se interconectam.

As obras da primeira fase (1968-1986) são ausentes de registro de áudio ou vídeo,

impossibilitando o contato com o material sonoro; dispõem apenas de fotografias e desenhos, em

que são baseadas as análises do período, ao lado de textos e depoimentos. O ponto de partida são as

conclusões práticas de Leitner publicadas em artigos, livros e entrevistas, tomadas como princípios

acústicos e psico-acústicos fidedignos, fruto de exaustiva investigação (não são passíveis de

repetição experimental ou de reprodução para averiguação). Os feitos do primeiro período estão

publicados no livro Sound: Space, de 1978, onde descreve idéias, técnicas e procedimentos

utilizados nas instalações e pormenoriza alguns aspectos, mas omite certos detalhes, o que ofusca

uma maior compreensão. É um texto sucinto, de fato, porém de inegável importância na área.

4 Leitner tem obras que se afastam desta pesquisa. P. ex., Steelspringwaves (2003) e Vassel Waves with Wooden Object (2012), por serem esculturas sonoras, objetos auto-suficientes, não se inserem no quadro das análises espaciais.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Bernhard Leitner | 29  

Cronologia das obras s e le cionadas

1969

Soundcube 1969

1970

Body Envelope Soundcube 70

1971

Sound Gate Sound Locks 4 Path Accentuations Sound Lines, Descending Soundcube Blue Book

1972

Wedge Space Wall Grid Sound Lines Sculpture ORF Tube Sound Field I Sound Tube Leading Path Inclined Sound Plane

1973

Wave Walk Arch Sound Columns, Bouncing Aerial Spaces

1974

Vertical Space Narrow Sound Space Cylinder Space

1975

Sound Chair (Deck Chair) Reclining Chair with 6 Speakers Sound Swing Vertical Space I Sound Chair Sound Suit Sound Chair with 4 LSP Hand Sound Object Vertical Space II

1976

Portable Space Horizontal-Vertical

1977

Cross Space

1978

Sound Swing

1979

Expanding / Contracting Sound Field II

1980

Large Sound Swing Sound Cube

1982

Sound Square Sound Tower

1983

Géométrie d’un Dialogue

1984

Sound Space TU Berlin

1985

Cross-Sound-Body

1987

Sound Stars Le Cylindre Sonore

1990

Sound Umbrela Sound Space / Scarred Sound Gate

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Bernhard Leitner | 30  

1991

Sound Space Buchberg Sound Chair III

1992

Pendulum Plataform I Sound Field III Sound Field 1020 Viena

1993

Agoraphon

1994

Blue Vaulting

1995

Sound Field IV Pendulum Plataform II

1996

Firmament Wing Space Ton-Höhe (Sound Dome) 4xBlue

1997

Water Mirror Space Sources

1999

Sound Columns Field Tuba Arquitecture

2000

Streaming

2001

Vertical Space

2002

Double Arch Inside Expanding Parabolic Dishes.Beaming

2003

Gallery of Mirrors Sounding Stone

2004

Serpentinata 04 Serpentinata Atelier setup Passages

2005

Sound Dome

2006

Cascade Serpentinata 06

2007

Moving Heads Pulsating Silence

2008

Large Tube Pulsating Silence / Tower

2009

Gothic Dome. Elevating Gothic Moving Head. Sound Beam

2010

HörSaal Space Reflection

2011

Space Reflection MZ Sound Mirror Path

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Bernhard Leitner | 31  

Para efeito organizacional, os apontamentos analíticos das obras são separados em seis

seções pelo modo como o espaço é abordado, segundo os critérios cronológico, conceitual, técnico

e estético aqui sugeridos. A primeira seção trata dos longos anos que o artista dedicou, no início da

carreira, à testes de espacialização sonora (1969-1978). (As demais seções incluem obras de 1979 a

2011, dividindo-as como segue). A segunda trata das obras derivadas das idéias desenvolvidas na

primeira fase. Nestas duas primeiras seções, notam-se dois perfis principais: um voltado a macro

estruturas espaciais circundantes, geralmente com ouvinte em deslocamento, e outro relacionando

espaços adjacentes, contíguos ao corpo, com ouvinte em repouso. Na terceira seção, são

examinados trabalhos feitos com pequenos sistemas sonoros do tipo fonte/rebatedor, em que o som

é direcionado e refletido. Na quarta família de obras, observam-se especificamente algumas obras

de caráter permanente de grandes dimensões, ditas “arquiteturas sonoras”. Na quinta seção, são

apresentados trabalhos que ampliam a linguagem do artista, compostos de objetos reverberantes. No

sexto e último grupo, observam-se obras atípicas de seu repertório.

4.1.1. Experimentação

Nesta seção, procuram-se levantar as principais características arroladas nas investigações

de Leitner, estabelecendo conceitos que o acompanham por toda carreira artística. Dentre outros

pontos citam-se: a espacialização acústica usando movimento/deslocamento de sons entre alto-

falantes estáticos, o estabelecimento de planos e eixos sonoro-espaciais com uso abundante de alto-

falantes, e a aplicação de espaços sonoros em diferentes tamanhos (escala arquitetônica ou contíguo

ao ouvinte). São apresentados cubos, pórticos, rampas, planos, eixos, etc.

Serão apresentados os temas do próprio artista e, depois, tecidos comentários analíticos das

obras e agrupamentos, visando extrair características gerais. Leitner organiza e categoriza seu

repertório experimental da seguinte maneira:

Eu dividi meu trabalho para esta publicação em nove seções não-seqüenciais. (...) As duas primeiras seções (“Soundcube” e “Spacial Grid”) lidam com suportes neutros que permitem muitas transformações espaciais do movimento do som. As seções três, quatro e cinco (“Sound Swing”, “Guiding Spaces” e “Corridor Variations”) são todos baseados em movimentos lineares do som. Objetos para “Lying Within Sound” e “Portable Objects” são discutidos nas seções seis e sete, respectivamente. A seção oito inclui investigações de movimentos verticais (variações de altura, apojatura espacial), notações, projetos e a execução de “Vertical Spaces”. Seção nove: sentar, levantar e andar “Expanding-Contracting Spaces”.

Apesar de “não seqüenciais”, os trabalhos incorporam acumulativamente os efeitos, em que

cada elemento desenvolvido abre caminho para criação de outros.

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Bernhard Leitner | 32  

I  -­  SOUNDCUBE  

Soundcube  1969  Soundcube  70  

Soundcube  Blue  Book  

Nos três primeiros anos de especulação acerca dos espaços sonoros, baseia-se

exclusivamente em modelos teóricos para desenvolver projetos de espacialização acústica com alto-

falantes dispostos em cada um dos seis planos (paredes, teto e chão) de um salão cúbico. Os

trabalhos práticos irão começar pouco depois.

Soundcube (cubo sonoro) é um laboratório para estudos de definição e caracterização do

espaço e para investigações na relação entre movimentos sonoros e a experiência físico-auditiva.

Soundcube é uma ferramenta para produzir espaço com som, uma grelha visualmente neutra sem

qualquer mensagem espacial específica, a não ser a própria delimitação do ambiente, cujas

dimensões dependem de cada situação. O espaço pode ser definido por linhas. Uma linha de som é

produzida quando o som se move ao longo de uma série de alto-falantes. O som é programado para

viajar de um falante a outro, criando uma infinidade de espaços ou sensações espaciais.

Soundcube 69 – desenho conceitual

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Bernhard Leitner | 33  

A ilustração apresenta utilização excessiva de alto-falantes, procurando cobrir toda a

superfície e discretizar ao máximo pontos e massas sonoros. São sugeridos 64 falantes distribuídos

uniformemente em cada face do cubo. Neste momento, o artista ainda não menciona qualidade ou

feição dos sons: posição, velocidade do deslocamento, altura e intensidade demarcam o espaço.

Começa a propor estímulos corporais, como p. ex., “enviar um impulso sonoro primeiro a um

falante no chão e depois a um no teto causa uma sensação vertical (Leitner 1978: 26). Tabelas de

endereçamento de som para os falantes geram diversas seqüências espaciais.

II  –  SPATIAL  GRID  

Sound  Lines  Sculpture  

Ainda com caráter especulativo, Spatial Grid (malha espacial) é uma grelha tridimensional

de alto-falantes que, além de cobrir as paredes, preenche toda a volumetria do salão. É uma

estrutura neutra para criar várias propostas espaciais. Quatro transformações espaciais são descritas.

A obra Sound Lines Sculpture (1972) originalmente não consta de nenhuma categoria do

livro, mas parece ser um resultado destacado, uma trajetória específica subentendida na grelha

espacial feita, justamente, com esta finalidade. Isto porque Leitner nunca executou expressamente a

grelha espacial; por questões práticas e econômicas, cada configuração efetivamente montada

posteriormente utilizou estritamente os alto-falantes necessários. A configuração de Sound Lines

Sculpture é moldada com linhas assimétricas de alto-falantes.

Sound Lines Sculpture, 1972 – Montagem experimental no atelier.

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Bernhard Leitner | 34  

Apontamentos

Em Soundcube, a malha de alto-falantes está exclusivamente nas paredes, teto e piso,

enquanto em Spatial Grid, está também no interior do cubo, possibilitando, menor distância entre

fontes sonoras e ouvinte, criação de linhas e planos virtuais no ambiente suspensos e destacados das

referências visuais da edificação (paredes, colunas, etc.), e assim, uma diferente experiência de

imersão espacial em relação ao modelo anterior. Interessante notar que, apesar do relativamente

grande número de alto-falantes, Leitner não está preocupado em testar ou simular a virtual posição

das fontes sonoras originais, como se os instrumentos gravados parecessem estar na sala, mas

constrói o percurso do som no espaço.

III  –  SOUND  SWING  

Sound  Swing  (1975)  Sound  Swing  (1978)  

Sound Swing (balanço sonoro) é um sistema em escala humana que envolve o ouvinte com

movimento pendular do som. Dois falantes marcam os pontos altos de cada lado do pêndulo; outros

dois são colocados próximos ao chão, rente à passarela do conjunto, à direita e à esquerda. Testes e

resultados explicados pelo criador apontam como necessários os falantes colocados embaixo porque

interligam os dois lados, com uma sensação interna de proximidade e continuidade. Assim, a

direção do balanço é sempre claramente estabelecida. Caso ausentes, tem-se a impressão de que

uma entidade sonora desaparece de um lado e reaparece do outro. Sound Swing 1975 é formado por

placas planas, enquanto Sound Swing 1978 é formado por superfícies curvas.

Apontamentos

Os alto-falantes são instalados em arcabouços de madeira que têm dupla função:

reverberação e reflexão. 1) a reverberação permite um aumento no corpo do som, fazendo com que

a fonte emissora deixe de ser um ponto destacado; distribui parte de sua energia nas superfícies,

prolonga o decaimento e interliga os elementos. 2) a reflexão atua na delimitação espacial do

conjunto em qualquer instante, pois o som disparado num dado alto-falante estabelece de imediato a

dimensão do lado em que está localizado e, com atraso mínimo, marca também a face oposta.

O livro é bilíngüe (alemão e inglês) e deixa transparecer nesta seção algumas peculiaridades

terminológicas: em alemão, é intitulada pêndulo espacial [Raum Wiege], e em inglês, balanço

sonoro [Sound Swing]; neste contexto de movimentação acústica, som e espaço são sinônimos para

o artista ou, pelo menos, têm igual valor prático.

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Sound Swing, 1975 – configuração do atelier.

IV  –  GUIDING  SPACES  

Sound  Gate  Sound  Locks  

4  Path  Accentuations  Sound  Lines,  Descending  

Wedge  Space  ORF  Tube  

Leading  Path  Inclined  Sound  Plane  

Guiding Spaces (espaços guiadores) são diferentes traçados lineares delimitados por

seqüências de alto-falantes que induzem o percurso do ouvinte ou reforçam a experiência do

percurso quando visita a instalação. Neste caso, a forma não é importante, mas o efeito direcional

aplicado ao ouvinte.

Sound Gate (portão sonoro) ressalta a travessia de um pórtico simples ao balizar um dos

lados na chegada, seguido do contorno, até a saída pelo lado oposto. É um movimento em arco

acima do ouvinte, seguindo um eixo linear. Volume, altura, cor, velocidade e direção do movimento

em uma linha de som entre os 16 alto-falantes altera a medida acústica do pórtico, variando o

sentido e a escala através do som.

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Bernhard Leitner | 36  

Sound Gate, 1971 – configuração do atelier

Wedge Space, 1972 – configuração do atelier

Sound Locks (comporta sonora) e Sound Lines, Descending (linhas sonoras, descendentes)

são trajetos marcados por segmentos descendentes, distintos apenas pela orientação dos falantes: no

primeiro, voltados para dentro do corredor, na direção da pessoa, no segundo, virados para cima.

Intensa acentuação da parte superior com movimento diminuendo para baixo, como o efeito de uma

comporta vertendo. 4 Paths Accentuations (quatro acentuações de percurso) é um projeto não

executado para as Olimpíada de Munique de 1972. O acesso aos bondes traria trajetos sonoros

segundo os modelos de pórticos e inclinações anteriormente desenvolvidos por Leitner e contaria

com os trechos: 1 Sound Gates, 2 Sound Slopes, 3 Echo Bridge e 4 Applause Lock.

4 Paths Accentuations, 1971

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Inclined Sound Plane (plano sonoro inclinado) é semelhante aos dois exemplos anteriores,

porém as linhas inclinadas de falantes configuram um plano oblíquo permeável.

Wedge Space (espaço afunilado [em cunha]) é uma rampa que estuda propostas de expansão

ou achatamento vertical. Em movimento linear, convergindo-se as linhas de som, a sala se torna

mais estreita em direção ao vértice localizado no nível da cabeça. Em movimento contrário, o

espaço se abre em toda a altura da pessoa. Através das ligações verticais dos alto-falantes colocados

um acima do outro, a noção acústica da elevação do espaço sonoro é reduzida ou aumentada. O

movimento de descida de uma pessoa é enfatizado por linhas descendentes de som. Linhas sonoras

ascendentes e descendentes influenciam “bio-psicologicamente” a leitura do real ângulo de

inclinação da rampa (1978: 47).

ORF Tube (tubo da ORF). A idéia era transformar a passagem para um dos estúdios da ORF

(Rádio Austríaca) numa peça de arquitetura sonora, entrar e sair do edifício através de espaços

sonoros lineares direcionais. A parte central é um espaço em espiral que combina espaços sonoros

direcionais (entrada / saída).

Leading Path (caminho condutor) é um corredor feito com duas fileiras de falantes no chão.

V  –  CORRIDOR  VARIATIONS  

Sound  Tube  

Arch  

Oito fileiras (com alto-falantes cada) definem a forma de um espaço “tubular” de 4m de

comprimento. O espaço tem 3,25m de altura e 7m de largura, com percurso medindo 2,75m. Quatro

variações espaciais são programadas e interpretadas graficamente:

1 Oscilação (pêndulo sonoro na metade inferior do tubo)

2 Círculo (movimento circular)

3 Concavidade (pêndulo sonoro na metade superior do tubo)

4 Condução (direção longitudinal do tubo)

Sound Tube (tubo sonoro) é formado por 4 pares de linhas de falantes (acima, abaixo e dos

lados) criam passagem tubular. Arch (arco) é semelhante ao Sound Tube, porém sem falantes na

parte de baixo.

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Bernhard Leitner | 38  

Sound Tube, 1972. À esquerda - oscilação; à direita - concavidade.

Apontamentos

Como no caso anterior, Corridor Variations descreve uma forma preestabelecida na qual os

sons progridem. Em Guiding Spaces, a forma é estruturada sobre uma única linha ou plano continuo

que, limitando (intencionalmente) a profundidade de campo, oferece maior direcionalidade. Já em

Corridor Variations a estrutura-base é tridimensional, volumétrica.

A própria intitulação desta tipologia indica uma exploração mais aprofundada do espaço

sonoro e aponta para a distinção das camadas constituintes: a forma estrutural é fixa – um corredor

– e a forma superficial (contorno) é variável. Há uma primeira camada sonoro-espacial em que a

identificação da posição dos objetos está tridimensionalmente clara, compatível com o aspecto

visual. A forma estrutural é geométrica, implica na fonte sonora genericamente caracterizada, sem

qualificá-la. A segunda camada é um detalhamento da primeira, discrimina os parâmetros do som

em cada ponto imputando-lhe diferentes profundidades que, em conjunto, dão relevo à superfície.

Há ainda uma terceira camada, que é o desenvolvimento temporal da segunda. Independentemente

de se considerar o som nas duas primeiras camadas como eventos no tempo, o terceiro nível só é

possível com a variação temporal das qualidades sonoras. O tempo de evolução do desenho tem um

limite mínimo e máximo para inteligibilidade, que varia dependendo da configuração e da intenção

do espaço-som. Ou seja, para se perceber (por exemplo) um movimento circular no corredor, a

migração do som entre os alto-falantes não deve ser demasiadamente rápida, pois seria notada como

um evento concomitante vos falantes, apresentando uma interferência gerada pela diferença de fase;

perceber-se-ia uma massa sonora em forma tubular (como é de fato) sem a intenção do movimento.

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Bernhard Leitner | 39  

As qualidades sonoras são altura, intensidade, duração e timbre, sendo que o timbre não sofre

alteração no percurso por ser inviável tecnicamente na ocasião (anos 1970) e a altura varia com

restrições (motivos apresentados a seguir).

N íve l

Camada 1

Camada 2

Camada 3

Camada 4

Im pl icação e s pacial

• forma geométrica

• contorno/relevo

• distribuição/ocupação do espaço

• textura

Re curs o

• posição dos alto-falantes

• qualidade dos sons

• variação da posição e da qualidade dos sons

• variação da qualidade dos sons

Re s u l tado

• volumetria

• profundidade de campo

• espacialização

• características “musicais” (melodia, etc.)

As sonoridades musicais hipnotizam em digressões auditivas de imagens e emoções,

afastando o ouvinte de outras referências sensoriais – da percepção do som através do corpo todo,

da profundidade espacial, do tato. A arte sonora permite atentar aos estímulos acústicos. Leitner

explica como conseguiu esse resultado: “O material sonoro que eu usei no início era

intencionalmente muito simples – por outro lado, porque eu não penso musicalmente no sentido

[mágico]. (...) Quando eu tenho um som vagante ao longo de uma fileira de alto-falantes como uma

forma no espaço, o material ‘sonoro’ não pode ser melodia” (Leitner 2008: 15).

VI  –  LYING  WITHIN  SOUND  

 Body  Envelope  

Narrow  Sound  Space  Sound  Chair  (Deck  Chair)  

Reclining  Chair  with  6  Speakers  Sound  Chair  

Sound  Chair  with  4  LSP  Horizontal-­Vertical  

 

Pode-se ouvir objetos sonoros, senti-los pelo corpo e retraçar mentalmente o movimento. A

posição do corpo e o movimento espacial do som devem se relacionar. Deitar-se implica numa

particular rapidez para perceber sons ao redor, ao longo e através do corpo. Lying Within Sound

(repouso no interior do som) é um grupo de obras que criam espaços sonoros contíguos ao corpo,

com ouvinte sentado ou deitado sobre o artefato criado pelo artista.

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Bernhard Leitner | 40  

Body Envelope (envelope corporal) é um experimento rudimentar que distribui oito

pequenos discos com falantes ao redor do ouvinte deitado no chão. (Faz parte ainda do período

conceitual, antes de se instalar no atelier).

Narrow Sound Space (espaço sonoro estreito) é um estrado para escuta deitado, com 4

falantes na altura do ouvinte, ao redor (norte/sul/leste/oeste), e 2 embaixo.

Sound Chair - Deck Chair (cadeira sonora - espreguiçadeira), Reclining Chair with 6

Speakers (cadeira reclinável com 6 alto-falantes), Sound Chair e Sound Chair with 4 LSP (cadeira

reclinável com 4 alto-falantes) são variações de uma mesma idéia de envolver o ouvinte com sons

por todo o corpo, instalando alto-falantes no móvel onde a pessoa jaz, acrescido de algum falante

complementar, à frente e/ou atrás. Estas quatro peças seguem um padrão: os falantes estão ao longo

do eixo longitudinal. Desta maneira cria-se uma privacidade sonoro-espacial com movimentos sutis

que mantêm o comprimento do corpo e a pequenez do espaço. O corpo como forma reverberante,

um sistema de transformação das relações entre percepção e reflexão (intelectual), um meio de se

concentrar para além da relação tríplice de som, espaço e corpo – que engloba a essência de todo

espaço acústico interno.

Sound Chair with 4 LSP, 1975. Horizontal-Vertical, 1976.

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Horizontal-Vertical oferece uma pulsação vertical para o ouvinte posicionado

horizontalmente. Com falantes sob o estrado e suspensos acima do tórax e abdômen, cria uma

relação com o ritmo da respiração, estimulando agitação ou relaxamento.

Apontamentos

Os estudos de Leitner vão além da percepção, com implicações formais, estéticas,

lingüísticas etc. Entretanto, a preocupação com o material sonoro, complexo em essência e diverso

em implicações, leva a um tipo de sinestesia que procura relacionar os sentidos não pela

comparação simbólica destes ou pela transposição bilateral de valores, mas simplesmente pela co-

participação dos sentidos na decifração de estímulos e mensagens externas. Cada sinal é recebido

simultaneamente por inúmeros receptores e transformado numa espécie de informação. A

orientação dessa informação para um uso prático específico ofusca a compreensão de sua origem,

pois a principal fonte de constituição aparece em destaque. Em meio às agitadas tarefas do mundo

urbano contemporâneo, dissociam-se as múltiplas entidades do indivíduo. A integridade é

ameaçada.

Na década de 1980, foram feitos experimentos médico-científicos com doentes que

apresentavam tenção e ansiedade em quadro pré-operatório. Os pacientes foram colocados na Sound

Chair, onde, após cerca de vinte minutos, “muitos deles puderam se recompor, aceitando um tipo de

pensamento holístico” (Leitner 2008: 19). Os estímulos provocados permitem identificar parte do

corpo esquecidas, ligá-las a outras, refletir sobre o processo de descoberta, experimentar níveis de

controle, associando “mente, alma e corpo” (idem). Uma participação passiva do público frente à

obra, contudo, intelectualmente ativa. Longe de pretender ser um estudo científico ou um

tratamento médico, a obra de Leitner visa a despertar um ponto de vista alternativo, provocar uma

reação, como, de fato, é de se esperar da arte.

VII  –  PORTABLE  OBJECTS    

Sound  Suit  Hand  Sound  Object  

Portable  Space    

O princípio dos objetos portáteis é montá-los diretamente sobre o corpo. A pessoa veste o

movimento do som. A consciência de partes individuais e das relações entre elas é ampliada quando

ativadas pelo som. A experiência psico-fisiológica depende do modo como o som viaja:

ritmicamente, com acentuações, em espiral, esticando sforzando, etc. Estes são um radicalização do

modelo anterior de estímulo corporal. As implicações são semelhantes.

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Sound Suit (traje sonoro) é um macacão reticulado em que são instalados falantes. Hand

Sound Object (objeto sonoro de mão) são alto-falantes com alça para serem usados e velados nas

mãos. Portable Space (espaço portátil) é um colete com um alto-falante no peito e um nas costas.

Sound Suit, 1975. Portable Space, 1976.

VIII  –  VERTICAL  SPACES  

 Wall  Grid  

Wave  Walk  Sound  Columns,  Bouncing  

Vertical  Space  Vertical  Space  I  Vertical  Space  II  

 

A sala teste de 3,5m é emoldurada de dois lados por elementos verticais com alto-falantes.

Quatro falantes definem uma linha horizontal, oito formam um plano horizontal. Movimentos

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verticais, alterações nas dimensões verticais, relação entre mudança de sons e percepção de espaços

verticais foram testados neste estrutura.

Wall Grid (malha de parede) é uma configuração de uso geral formado por uma malha de

alto-falantes em uma parede, alterando a altura do espaço com linhas verticais de som. Wave Walk

Corridor (corredor de caminhada ondulante) se estabelece com dois planos verticais laterais em

ziguezague. Sound Columns, Bouncing (colunas sonoras, balançando) são linhas verticais

periféricas esparsas. Vertical Space (espaço vertical) Uma linha de falantes acima; duas linhas

complementares no chão. Vertical Space I marca a verticalidade com um falante sob o ouvinte,

numa base de madeira, e um acima, de altura regulável. Vertical Space II é como o primeiro, porém

maior.

IX  –  EXPANDING-­CONTRACTING  SPACES    

Sound  Field  I  Cross  Space  

Um crescendo para dentro produz uma forte contração do espaço, um decrescendo para fora

enfatiza a expansão do espaço. Nos últimos experimentos, o número de falantes foi reduzido às

linhas interna e externa, que são os limites mínimo e máximo do espaço.

Cross Space, 1977.

Apontamentos gerais sobre a fase de experimentação

Percebe-se que a divisão é feita sobre as propostas de espacialização, as experimentações de

validação e os conseqüentes resultados; é referente, portanto, ao processo criativo inteiro, da

concepção ao resultado. Deste modo, ele pôde organizar metodologicamente seus ensaios.

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4.1.2. Variações

Muitas criações voltam a aparecer como “variações” das originais ou como releituras de

conceitos empregados. Considerando o repertório como um todo e o distanciamento temporal do

presente estudo em relação a Leitner, as nove categorias contempladas no bloco anterior são

revisadas, simplificadas e então utilizadas de maneira sintética. Interessante notar que as

peculiaridades concentram-se rigorosamente no aspecto espacial – a qualidade do som não é uma

variável que possibilite, genericamente, a distinção dos trabalhos entre si. Fatores como

interatividade e fruição temporal tem uma importância tênue na divisão: o primeiro diz respeito ao

deslocamento do visitante como forma de participar da obra, o segundo apresenta-se sob uma forma

clara (com começo e fim definidos) ou vaga (fluxo sonoro atemporal).

Após compreender os métodos e os resultados, propõem-se, neste tópico, duas classes para

análise: uma relativa a obras que explorem espaços contíguos ao ouvinte e estimulem sonoramente

todo o corpo, outra ligada a configurações espaciais mais amplas. Apesar desta redução categorial,

permanece a atenção dada às características-padrão anteriores: orientação do espaço

(vertical/longitudinal/transversal), nível dimensional (eixo/plano/volume), variação de amplitude

(expansão/contração).

A) Configurações espaciais adjacentes ao corpo

Estruturas sonoras próximas ou diretamente acopladas ao corpo do ouvinte procuram

estimular a sensação de que o som atravessa a pessoa ou que o espaço contíguo é dimensionalmente

pulsante. Geram-se, portanto, configurações espaciais adjacentes ao corpo.

Expanding  /  Contracting  

Firmament  Wing  Space  Double  Arch  

Inside  Expanding  

Estas cinco peças trabalham com movimento de expansão-contração ou pendular,

lateralmente ou acima. Quando da concentração do som na parte superior, são descrito arcos que

rompem a extrema verticalização.

Expanding / Contracting (expansão / contração) e Inside Expanding (expansão interior),

semelhante a poltronas em madeira, são equipamentos constituídos por um assento com um alto-

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

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falante nas costas e dois laterais. O primeiro expande os lados com falantes no mesmo eixo do

encosto, voltados para frente, a cerca de 1,5 m de distância do centro; o som migra simetricamente

do centro para os lados ou inversamente de fora para dentro, gerando sensações antagônicas. O

segundo envolve o ouvinte num campo mais estreito, com duas camadas de abas de cada lado;

também estimula sensações de expansão/contração, porém num plano horizontal. Ambos são

compostos em três canais.

Firmament (firmamento) e Double Arch (duplo arco) seguem o mesmo princípio das

poltronas, focando agora no espaço acima da cabeça.

Wing Space (espaço alado) oferece uma estrutura maior para que se observe a oscilação de

tamanho para os lados em pé. Pelo tamanho e formato aparente da estrutura, poderia ser enquadrada

como uma configuração espacial aberta (a seguir) como é o caso dos grandes pórticos de

passagem. Entretanto, a organismo sonoro é mais fechado, com ouvinte parado e sem uma

cobertura sobre a cabeça; as abas laterais curvilíneas funcionam como rebatedores que concentram

a energia num ponto focal, resultando uma experiência circunscrita ao corpo.

   

Sound  Field  II  Sound  Chair  III  

Obras com usuário em repouso, propõem espaços mais fechados. Sound Field II (campo

sonoro) é como o de 1972, com ouvinte deitado. Tem 6 falantes. Sound Chair III Novo design.

 

Sound  Cube  Cross-­Sound-­Body  

São pequenas salas ou espaços confinados pelo som, como câmaras. Em Sound Cube, ocorre

a aplicação dos conceitos desenvolvidos nos primeiros Sound Cubes, em um cubo translúcido

fechado. É reduzido o número de falantes. O ouvinte fica deitado. Trabalho montado no Museu de

Arte Moderna de Vienna, em 1981; publicado no Documenta 7, Kassel, 1982.

Cross-Sound-Body (corpo-som-cruz) Câmara projetada pelo artista com planta em cruz.

Ouvinte sentado no centro.

   

 

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Vertical  Space  

Vertical Space é um espaço vertical como Vertical Space I de 1975, com aro de aço acima,

como uma grande coroa, servindo de ressonador. Apesar de ser a base conceitual das cúpulas

(enquadradas nas configurações espaciais abertas a seguir), ambos são espaços verticais, maw

diferem-se pela escala e pela amplitude da parte superior, portanto pela relação espacial e percepção

do ouvinte.

Géométrie  d’un  Dialogue  

Um espaço sonoro misto, abarcando características de outros grupos: espaço aberto +

adjacente + expansão-contração.

Géométrie d’un Dialogue (geometria de um dialogo) é composta de três partes: duas

estruturas semelhantes à poltrona de Expanding / Contracting, de 1979, uma de frente para a outra;

e oito alto-falantes circundando ambiente. Movimentos e projeções sonoras são concebidos como

um diálogo entre duas pessoas.

B) Configurações espaciais abertas

Sound  Square  Sound  Space  TU  Berlin  

Sound  Stars  

(Cubo | Grid)

Sound Square Alto-falantes são colocados em quatro torres e nas paredes externas do

quadrado. Platéia ao centro.

Sound Space TU Berlin Sala cúbica de metal perfurado, com 34 falantes e 18 falantes de alta

freqüência não visíveis. TU (Universidade Técnica), 1984; premiado em competição internacional

de arte sobre arquitetura.

Sound Stars Quinze cubos livremente suspensos no espaço formam a constelação.

 

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Large  Sound  Swing  Sound  Tower  Sound  Gate  

Pendulum  Plataform  I  Pendulum  Plataform  II  

Large  Tube  Sound  Mirror  Path  

Estes trabalhos têm características de passagens, aberturas espaciais que convidam o

espectador a se deslocar e percorre-las.

Large Sound Swing Passarela cruzando duas estruturas como no 2º Sound Swing.

Sound Tower Documenta 7, Kassel.

Sound Gate Pórtico que aplica os conceitos do “Sound Gate” de 1971. Peça arquitetônica

comemorativa dos 175 anos da Universidade Técnica de Viena.

Pendulum Plataform I Anel vertical de som. Ouvinte deitado.

Pendulum Plataform II Estrutura mais delicada que a primeira, com configuração

semicircular em U.

Large Tube Semelhante a Sound Tube (1972).

Sound Mirror Path Passagem sobre tablado com duas fontes sonoras; acima, chapa metálica

refletora em arco. Georg Kargl Fine Arts 2011.

Sound  Space  Buchberg  

Ton-­Höhe  (Sound  Dome)  Sound  Dome  

Gothic  Dome.  Elevating  Gothic  

Também tem características de verticalidade, mas a largura da parte superior é maior,

formando uma espécie de cúpula.

Sound Space Buchberg (espaço sonoro Buchberg) Instalação no castelo (Buchberg Art

Space). Do centro do pátio, o trombone ascende em expansão num majestoso domo virtual no

polígono da cornija. 1991 / 1998.

Ton-Höhe (Sound Dome – cúpula sonora) Intervenção na cúpula da Kollegienkirche em

Salzburg, encomendada pela Fischer-von-Erlach-Gesellschaft, em comemoração aos 300 anos de

fundação. Técnica semelhante à de Buchberg, utilizando mais recursos.

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Sound Dome Recriação acústica da cúpula da Parochialkirche em Berlim, destruída na

guerra. Procedimento técnico semelhante a Vertical Space I.

Gothic Dome. Elevating Gothic (cúpula gótica. elevação gótica) Semelhante a Sound Dome

(2005). Klangraum Krems, Minoritenkirche, Baixa Áustria.

Sound  Field  III  Sound  Field  IV  

Espaço sonoro horizontal: campo-sonoro.

Sound Field III é um campo sonoro composto de falantes em colunas pretas de pouco mais

de 1m de altura, como caixas distribuídas num salão.

Sound Field IV Doze bancos de pedra verde polida (70x70x8cm) sobre alto-falantes

livremente distribuídos numa sala. Movimento aleatório dos sons.

Serpentinata  04  

Serpentinata  Atelier  setup  Serpentinata  06  

Peças com aspecto escultórico. Serpentinata 04 e Serpentinata Atelier setup são esculturas

sonoras feitas com tubos flexíveis de PVC de 25m e 16m, 40 alto-falantes. O cabeamento dentro do

tubo permite ao visitante livre movimentação. Kunstfest Weimar 2004. Schloss Ettersburg,

Armoury.

Serpentinata 06 Como Serpentinata 04. 48 alto-falantes. Akademie der Künste Berlin.

Sonambiente 2006.

4.1.3. Parabólicas | refletores  

Leitner tem feito trabalhos com feixes de sons (ou raios sonoros) lançados contra uma

parede a partir de um espelho parabólico. O som aparece na parede, onde não há nenhum alto-

falante. “Eu separo os falantes do fenômeno sonoro. Numa composição de três projeções sonoras na

parede, é criado um tipo de pintura acústico-gestual” (Leitner 2008: 19).

 

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Sound  Umbrela  Sound  Columns  Field  

 Guarda-chuvas suspensos num salão com pequenos alto-falantes na parte interna direcionam

os sons sobre o visitante. A mesma idéia do campo sonoro aplicada no alto do espaço.

Streaming  

Parabolic  Dishes.Beaming  Gallery  of  Mirrors  

Cascade    

A idéia de espelho ou rebatedor côncavo implícita nos guarda-chuvas sonoros é então

explorada objetivamente para tal função. A fonte sonora é composta de um alto-falante fixado no

ponto focal da parábola dirigido contra ela, gerando assim uma propagação sonora em feixe

paralelo (difusão cilíndrica ou em cone suficientemente fechado), em vez da típica propagação

cônica de um alto-falante (fazer ilustração/esquema). Deste modo, é possível se obter maior

controle do alvo, como uma “lanterna” sonora que ilumina uma área delimitada.

 

Moving  Heads  Moving  Head.  Sound  Beam  

Space  Reflection  Space  Reflection  MZ  

 Estas obras mais recentes passam a incorporar um aspecto escultórico, de maior concisão, e

direcionam o som ao ambiente com pequenos agrupamentos de fontes sonoras parabólicas. Ao

eliminar os rebatedores usados em trabalhos anteriores, Leitner configura o espaço posicionando

criteriosamente a obra no ambiente escolhido e apropriando-se das reflexões específicas do lugar.

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4.1.4. Obras permanentes | arquiteturas sonoras

Este perfil de obras está espacialmente ligado à criação de produtos com propriedade e

escala de edificação, uma peça projetada e estruturada em si mesma que cria um lugar e conforma

um particular espaço sonoro.

Le  Cylindre  Sonore  

Inserido no jardim de bambus do Parc de la Villette, em Paris, Le Cylindre Sonore (cilindro

sonoro) foi criado como uma intervenção artística pública para uma das seções do parque. O duplo

cilindro, cujo topo aberto está no mesmo nível das alamedas arborizadas do entorno, é parte

integrante do passeio. Os sons atraem curiosos e os convidam a parar, ouvir atentamente e

permanecer. Embora construído como um sólido estático inserido na paisagem – medindo 10m de

diâmetro (internamente) e 5m de altura –, foi concebido e estruturado como um evento no tempo,

uma seqüência de experiências com um início e um fim.

Le Cylindre Sonore, 1987. Vista geral.

Atrás de cada um dos oito painéis perfurados de concreto pré-fabricado (medindo 1,2 x 3,7

metros) que compõem o interior do cilindro, estão montados três alto-falantes em diferentes alturas.

Diversos espaços sonoros são construídos, desenvolvidos e variados em meio às colunas de som dos

painéis, entre 24 alto-falantes. Os vãos entre os painéis agem como rebatedores para as quais o som

é composto. Hoje, este sistema não funciona mais, porém o cilindro continua a funcionar como uma

câmara de ressonância. O espaço entre os dois cilindros, além de servir como corredor de serviço

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com acesso à sala controle no subsolo, funciona como ressonador. Oito feixes de água estreitos e

verticais são dispositivos acústicos de ajuste fino, podem ser controlados para extrair determinadas

intensidades sonoras, bandas de freqüência, regiões espaço.

Le Cylindre Sonore, 1987. À esquerda – acesso; à direita – interior.

O cilindro propõe prestar atenção aos pequenos barulhos em mutação, sons da natureza em

contraste com barulhos mecânicos, aumentados por sutis reverberações. Mesmo fora do recinto, a

experiência é bastante particular, pois concentra os ruídos do entorno. O desenho de som é montado em

camadas simultaneamente simbólica e perceptível, com linhas auxiliares de som circular que reforçam a

forma do instrumento arquitetônico, um tecido de guitarra como material estático de preenchimento,

sons agudos perfurantes ao longo das paredes contrastam com o estático e arcaico cilindro, o som da

água fluindo. Todo esse material, com tempo de reverberação retardado, suaviza o concreto.

 Le Cylindre Sonore, 1987.

À squerda - projeto; ao centro - detalhe da soleira do acesso; à direita - detalhe do painel perfurado.

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 Sound  Field  1020  Vienna  

Composto de colunas de mármore preto de 2,25m, assentadas em valas ressonantes de

1x1x0.6m com alto-falante e fonte luminosa. 1992

Agoraphon  

Exposição Mediale, Deichtorhalle Hamburg Ltd. Sete colunas de 3,4m em círculo: uma

ligação transparente entre os salões e o cenário urbano. 1993

Water  Mirror  

Uma abóboda metálica é suspensa entre as quatro colunas de um pequeno mirante num

parque da cidade de Donaueschingen, em plena Floresta Negra, de modo a refletir o som da água

vertendo no rio Brigach (afluente do Danúbio). Water Mirror (1997) funciona literalmente como

um espelho d’água, ou melhor, um espelho para a água.

A inclusão desse elemento arquitetônico autônomo filtra naturalmente os sons da correnteza,

sem microfones, amplificadores, alto-falantes ou eletrônica. No arco de metal, que também reflete a

imagem difusa da superfície da água, várias freqüências são filtradas a partir das faixas mais

agudas. Através da exploração auditiva do espaço, ao procurar posições com a cabeça e o corpo, a

pessoa pode encontrar diferentes sons em pontos específicos. O arista sugere a movimentação

corporal do visitante como uma dança em diálogo com o Danúbio.

Space  Sources  

Espelho d’água: objeto sonoro que define seu lugar no espaço e fonte sonora que fornece

material para filtragem eletrônico-acústica das estelas. O som natural permanece localizado;

enquanto o som das estelas dinamiza a forma acústica do átrio. Berlim, Friedrichstrasse, 1997.

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Bernhard Leitner | 53  

4.1.5. Obras com ressonadores

4xBlue    

Falantes fixados magneticamente no exterior de quatro colunas metálicas de 4m de altura

agrupadas em cruz lhes geram ondas estacionárias. 1996.

Tuba  Architecture  

Sessenta laminas de aço suspensas, com falantes fixados nos centros, criam corredores de

passagem. As placas ressonantes com som de tuba baixo envolvem o corpo do visitante.

Klangkunstforum Berlim. 1999

Passages  

Pórticos de aço formado por colunas ressonantes de 30x30x200cm e um pórtico laminar de

3x65x250cm com vibração magnética. Ondas de baixa freqüência percorrem o sistema via barras de

metal. 2004.

Pulsating  Silence  Pulsating  Silence  /  Tower  

Grandes chapas de metal

suspensas vibram a freqüências

sobrepostas de 74 e 85 herz

[batimento de 11Hz]. Uma pulsação

profunda e inaudível é percebida

pelo espectador.

Pulsating Silence / Tower é

semelhante a Pulsating Silence,

formado por apenas duas placas

suspensas.

Pulsating Silence / Tower, 2008

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4.1.6. Obras atípicas

Sound  Space  /  Scarred  

Espaço sonoro sem som. Ouvindo a história de uma vila em ruína da segunda guerra. 1990

Blue  Vaulting  

Colunas sonoras; reflexão no teto por abóbodas ajustáveis em movimento repetido: o teto

fica alternadamente plano ou com pequenas abóbodas. [Colaboração: Hans Walter Müller]

HörSaal  

De modo geral, sua pesquisa foca numa escala espacial relativamente grande (escala

arquitetônica) e com grande número de alto-falantes, tendo como resultado plástico sonoro

movimento e transitoriedade do espaço. Posteriormente, o artista migra do movimento do som para

fontes sonoras pontuais, sem passar explicitamente pela simulação da posição de fontes sonoras

com múltiplos alto-falantes em sistemas de reprodução multicanal com objetivo de recriar uma dada

realidade sonora.

Ao poucos, as fontes emissoras (esculturas ou objetos sonoros) passam a explorar o espaço

construído por meio de reflexões controladas, até certo ponto, com direcionamento de anteparos

como parábolas e chapas. Em 2010, montou HörSaal no auditório da Technische Universitat de

Berlim, uma instalação estruturada em WFS (Wave Field Synthesis5) com 832 canais de áudio, o

que rotulou de wave field instalation em vez de sound instalation.

Mas mesmo este incremento tecnológico (WFS), que agrega elementos em sua linguagem,

não altera essencialmente sua relativa autonomia em relação à arquitetura. Compor uma obra

artística em WFS é específico por questões técnicas, como isolamento acústico, equipamentos

precisamente distribuídos e ajustados etc., mas não é essencialmente site-specific, pois a

apropriação do espaço é de ordem estrutural. Diversos espaço podem ser simulados pelo mesmo

princípio matemático.

Leitner: múltiplos falantes = movimento WFS: múltiplos falantes = objeto

falantes grupados = objeto falantes grupados = movimento

5 Síntese de campo sonoro; também entendido como uma espécie de “holofonia”, uma holografia sonora.

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Bernhard Leitner | 55  

Conclusões

Algumas características gerais de Leitner podem ser extraídas do repertório selecionado.

Relativização do espaço, ao ser configurado pelo movimento do som

Os espaços sonoros criados pelo artista são fruto da elaboração de planos sonoros

demarcados por alto-falantes estrategicamente posicionados. O lugar toma forma com o

deslocamento dos sons entre tais alto-falantes, realçando sua disposição padrão e ampliando

virtualmente sua delimitação. O ouvinte, imóvel ou percorrendo um trajeto, recebe o estímulo

sonoro e infere acusticamente o tamanho ou a variação de tamanho do espaço. Esta variação ocorre

de um fração de segundo a alguns segundos. O visitante, ao perceber rapidamente as alterações, cria

uma relação de interdependência entre os estados espaciais produzidos, relegando o espaço extra

sistema. Ou seja, Leitner relativiza espaço sonoro, tornando-o autônomo frente a um local maior

que o comporte, interno ou externo. As características acústicas da edificação são sobrepujadas pela

instalação artística; não que elas não sejam audíveis, mas, proporcionalmente, sua interferência no

sistema é diminuta. A “Rampa Sonora”, por exemplo, é construída rente a uma das paredes de seu

atelier, claramente comprometendo o equilíbrio acústico do aparato. Porém, isto não ocorre. O que

se evidenciam são as linhas sonoras ascendentes ou descendentes que acompanham o sentido da

rampa, pouco importando sua assimetria. Portanto, há hierarquia dos eixos sonoros em diversas

obras: com forte estruturação sonora para uma percepção longitudinal, o eixo transversal se

enfraquece e vice-versa.

Abordagem fenomenológica: como os sons são percebidos no espaço = como o espaço é percebido

através do som

Seguindo as referências de Husserl, mediadas por Schaeffer, Merleau-Ponty, por Chion, e

Heidegger, por Cage, vemos uma vasta aplicação dos conceitos fenomenológicos. “Testes em

estúdio têm esclarecido que a experiência de certos espaços sonoros não dependem da

perceptividade acústico-musical da pessoa. É uma sensação bio-acústica, psico-fisiológica

imediata” (Leitner 1978: 16).

“John Cage escreveu que a música do passado estava ‘lidando com concepções e sua

comunicação, porém a nova música que está sendo criada não tem nada a ver com comunicação de

conceito, mas com percepção’” (Cage apud Leitner 1994: 30).

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Bernhard Leitner | 56  

Som como material concreto

Desde os objets sonores de Schaeffer, o fenômeno sonoro vem sendo tratado concretamente

como material manipulável, moldável. A percepção desta e de outras entidades naturais e artificiais

torna-se cada vez mais clara, proporcionando maior relação entre objetos através dos sentidos. A

sinestesia entendida pragmaticamente, como inter-relação dos sentidos e sua mutua colaboração na

interpretação de fenômenos e mensagens, torna possível a expansão e interpenetração dos vários

campos de conhecimento. Leitner procura entender “o quão tátil é a acústica” (2008: 19).

Analogia entre estruturas espaciais e musicais pelo caráter teleológico implícito no movimento do som:

Segundo Leitner, conformação do espaço com recursos sonoros é suficiente, em si, para lhe

imputar um caráter temporal. É necessário repensar e redefinir o termo “espaço”. Os limites destes espaços não podem ser experimentados de uma só vez, e não são espaços “dinâmicos, fluidos” na interpretação convencional. É um espaço que tem um início e um fim. O espaço aqui é uma seqüência de sensações espaciais – em sua grande essência um evento do tempo. O espaço se desdobra no tempo; é desenvolvido, repetido e transformado no tempo (Leitner1978: 13).

Se, de um lado, o som está intrinsecamente relacionado ao tempo em sua manifestação

física, de outro, o século 20 nos ensinou que existem diversas formas de lidar com ele. Da música

de mobília à paisagem sonora e posterior surgimento das instalações sonoras, o som é encarado em

sua natureza estática, circular; um fluxo oscilante que não conduz a um fim. O caráter teleológico

da música tradicional européia – em que uma idéia é apresentada, desenvolvida e concluída – se dá

graças à mecanismos de memória. A reiteração dos dados musicais apresentados e sua apreensão

pelo ouvinte permitem-no estabelecer relações de anterioridade e posterioridade. Temporalidade e

discursividade do som estão, portanto, na repetição, na objetivação e na referencialidade.

No caso dos ensaios desenvolvidos por Leitner, a modelagem espacial se constrói com o

som em movimento, atribuindo grande importância a cada estado momentâneo do som-espaço, pois

é a percepção desses estados que gera, sensorialmente, o dimensionamento do espaço. As

instalações sonoras estão imbuídas de temporalidade, mas não necessitam nem empregam

sonoridades ad hoc, pois a percepção do espaço já é um fenômeno desdobrado no tempo.

Entretanto, a espacialização com sons móveis, vagantes, cria certa discursividade espacial.

“Acentuar pontos no espaço (acima, abaixo, dos lados, à frente e atrás) é modelar o espaço por meio

do ritmo: uma experiência físico-auditiva tridimensional” (Leitner1978: 26).

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Bernhard Leitner | 57  

Desta maneira, pode-se deduzir um paralelo entre uma estrutura temporal típica da música e

o arcabouço espacial:

espaço estático tempo discursivo

tempo estático espaço discursivo

Talvez, essas idéias se apliquem predominantemente obras em que movimentos sonoros

estejam associados a um percurso condicionado do espectador, resultando, portanto, em arcos

discursivos, mesmo que de pequena duração (da ordem de segundos).

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Christina Kubisch | 58  

5. Christina Kubisch

Uma artista do som que tem usado cada vez mais a luz como meio de expressão ao lado da

efemeridade de tons, ruídos, timbres, silêncios. Os trabalhos que Kubisch vem criando há mais de

30 anos podem ser claramente marcados pelas diversas disciplinas com que teve contato. Estudou

artes visuais (1967/68), depois flauta, piano, composição e música eletrônica. Em 1973, dá início à

concertos e performances multimídia ao lado do vídeo-artista Fabrizio Plessi. Na década de 1970,

Kubisch teve contato com Cage, do qual recebeu grande influência, como p. ex., o processo de

ouvir sons produzidos naturalmente e artificialmente como uma experiência musical completa.

Cage partilha da idéia de Heidegger de tecnologia e natureza constituírem um mesmo ser, porém

argumenta diferentemente, sugerindo que basta abrir caminho a todo som circundante para que seja

ouvido integralmente, sem distinção de categoria (Graevenitz 2000: 24-25).

Estudou engenharia elétrica em Milão (1980/81) também como forma de empregar a

tecnologia em suas instalações. Em 1980, o amadurecimento proporcionado pelo compartilhamento

de experiências ao lado de Plessi a levou a deixar a performance como forma de expressão,

afastando-se do público como executante para dar ao visitante maior liberdade de atuação, fato que

acompanhou a crise geral da action art6 naquele momento (Seinsoth 2008: 45). Por volta de 1986, a

artista volta a explorar intensamente os interiores e muda radicalmente a condição de iluminação

dos locais de exposição com uso de luz negra; neste momento elabora seu vocabulário artístico

básico: “espaço - luz - som - homem” (Ruth 2008: 50).

Ela lida com uma estrutura baseada em sonoridades e sons que beiram o não-som, mais do

que com composição propriamente dita. Sua música-som pertence ao espaço. Erik Satie cunhou a

Musique d’Ameublement (música de mobília), em que sons podem preencher salas como mobília, p.

ex. Vexations, de 1888. Mas para Kubisch, o estranhamento sempre está presente, pois o ouvinte

percebe que foram introduzidas qualidades sonoras adicionais, como se o ambiente estivesse recém-

adornado. Ela prefere recorrer a elementos ligados à ambientação, ao clima.

6 Action art é o conjunto das modalidades artísticas que valorizam o processo, a execução de uma obra, como é o caso da performance e da intervenção.

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Christina Kubisch | 59  

5.1. Análise do repertório selecionado

Em linhas gerais, suas obras se caracterizam pela mínima interferência construtiva no local

da instalação, seja o ambiente natural ou dentro de edificações, valorizando elementos do próprio

ambiente. Entenda-se interferência construtiva como alteração de estruturas ou construção de

apêndices, acessórios. A leveza das intervenções permite que o visitante rapidamente se familiarize

visual e auditivamente com o espaço. Quando em recintos fechados, principalmente, equiparam-se

som e luz em importância e nível de detalhamento. A artista cria um ambiente verossímil ao revelar

parcialmente os elementos constituintes da obra, com os quais o espectador tem a impressão

apreender o todo; num segundo momento a percepção torna-se incerta sobre causa e efeito, sobre o

que é criação e o que é inerente ao local. Declara: “Estou sempre preocupada em deixar visíveis

certas estruturas no espaço, em revelar também contextos arquitetônicos e em tirar o observador da

sua maneira normal de ver o espaço” (Kubisch apud Ahrens 2000: 57). A ambigüidade criada leva o

espectador a encarar a estranheza daquele local comum e a se concentrar na própria percepção para

decodificar a mensagem implícita.

Christina Kubisch trabalha tanto com espaços sonoros quanto com instalações luminosas,

em sua maioria fundidos num só projeto, em obras que convidam o espectador a explorar todo o

edifício da exposição. Os trabalhos de 1980 em diante focam na reflexão sobre a multiplicidade de

silêncios, nas condições de nossa percepção sensorial e nas relações entre natureza, arte e

tecnologia. A ambigüidade entre silêncio e uma sutil (porém perceptível) intervenção

sonora/ruidosa é típica em seu trabalho, uma clara influência do pensamento de Cage acerca da

escuta e da relatividade dos sons. Sobre o próprio trabalho, ela afirma que “nada é realmente do

jeito que parece, e mesmo a primeira impressão de quietude é ilusória” (Kubisch apud Gieltowski

2000: 7).

Pretende tornar o espaço experimentável simultaneamente acústica e visualmente. Procura

fugir da neutralidade de um museu, pois deseja um lugar que ofereça algo em troca, uma resposta,

uma história. O espaço deve dialogar com sua maneira de investigar a realidade. Diversas paisagens

naturais são preparadas com alto-falantes emitindo sons de aparência natural, levantando a questão:

verdadeiro ou falso?.

A artista categoriza suas obras em seis temas: Instalações, Electrical Walks, Performances,

Esculturas Sonoras, Composições, e Trabalhos Gráficos [Photos and Graphics], dos quais apenas

Instalações, Electrical Walks e Esculturas Sonoras são apreciados nesta análise por se considerarem

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Christina Kubisch | 60  

arte sonora7. Diferentemente de Leitner, que separa seus trabalhos pela morfologia sonoro-espacial,

Kubisch elenca suas obras de acordo com a técnica empregada (tecnologia e materiais). Pode ser

entendida também como uma categorização estilística, destacando séries de obras criadas em

momentos de redefinição das relações entre forma e material.

Igualmente ao estudo de caso anterior, a divisão em categorias em si já exprime o resultado

das primeiras análises e não deve ser tomada restritivamente, pois as características secundárias de

cada caso podem estar em todo o repertório.

A produção de Kubisch parece estar voltada a famílias de obras, o que direcionou a

abordagem dos apontamentos analíticos por agrupamento e reduzindo o número de peças

examinadas. Suas séries são volumosas e podem conter dezenas de realizações (como Consecutio

Temporum e Electrical Walks), mas todo o processo é semelhante, da concepção ao resultado

plástico, sendo estudadas como uma só entidade, relevando eventuais detalhes que distingam

individualmente um trabalho.

Os apontamentos analíticos das obras são separados em duas seções: Indução

eletromagnética (dividido em Trabalhos gerais e Electrical Walks) e Consecutio Temporum (uma

série bastante peculiar).

5.1.1. Indução eletromagnética

Neste perfil, a tecnologia tem um papel estrutural fundamental, mesmo que pareça arcaica

sem a utilização de computador. A simplicidade torna os trabalhos factíveis também em ambientes

externos de grande amplitude. Essencialmente, explora o campo magnético ao redor de fios e

dispositivos condutores produzido por qualquer corrente elétrica, algumas muito fracas e

imperceptíveis, que são captadas por aparelhos inicialmente usados por técnicos de telefonia para

identificação de interferências na rede. A interação mútua dos campos magnéticos excita os

sensores nos fones de ouvido. A transmissão de som é obtido por bobinas internas que respondem

às ondas eletromagnéticas em nosso ambiente.

7 Embora não se deseje rotular uma obra de arte, mas sim relevar o aspecto espacial de certos trabalhos sonoros, as Esculturas Sonoras são incluídas pois, no contexto da produção de Kubisch, consideram-se inseridas na arte sonora. Ficam de fora as categorias: Performances e Composições, por serem trabalhos que a representam enquanto musicista, e Trabalhos Gráficos enquadram-se nas artes plásticas e fotografia. Dentro do que a artista chama de Instalação, também não são estudadas obras exclusivamente visuais, com luz.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 61  

Kubisch, no momento de transição, dos palcos para a interação do público, procurava

maneiras transformar as relações do público com a obra. Ela explica:

Eu me perguntei, como posso entrar numa sala e ouvir algo sem ter que me sentar e sem ter limite de tempo. E então, por coincidência, durante meus últimos estudos de eletrônica, me deparei com esses pequenos cubos indutores normalmente usados como amplificadores de telefone (Kubisch apud Metzger 2000: 87).

Diversos campos de cabos elétricos são distribuídos pelo espaço, formando vários

emaranhados em que sons são armazenados. Isto produz campos eletromagnéticos transmitidos e

recebidos por indução. Inicialmente, foi executado com pequenos cubos com alto-falantes que

podem ser colocados contra o ouvido. Depois, liberdade de movimento e qualidade sonora são

melhorados por meios magnéticos, isto é, fones de ouvido sem fio que a própria artista projetou.

Isto permitiu que o espectador se movesse livremente pelo salão. Cada movimento, mesmo um sutil

movimento de cabeça, criava diferentes combinações sonoras; “o visitante torna-se seu próprio

mixer e pode compor sua própria peça” (Kubisch apud Gerke 2000: 46).

Assim, desde o final dos anos 1970 e especialmente na década de 1980, Kubisch utiliza o

sistema de indução eletromagnética que se desenvolveu como uma ferramenta artística individual.

Criou incontáveis trabalhos com indução em jardins, porões, parques, igrejas, fábricas velhas,

edifícios abandonados, etc. Cada obra é simultaneamente uma exploração visual e acústica de cada

espaço.

Em 2003, começou sua pesquisa sobre uma nova série de obras no espaço público, ao

rastrear os campos eletromagnéticos de ambientes urbanos na forma de caminhadas da cidade. O

primeiro percurso da série Electrical Walks (caminhadas elétricas) ocorreu em Colônia, em 2004.

A) Trabalhos diversos

O que diferencia este grupo em relação à série Electrical Walks (a ser mostrada em seguida)

é a criação de um ambiente preparado pela artista. Sob encomenda ou criadas para uma exposição,

estas são obras projetadas e apresentam intenções mais específicas. Algumas delas são quase

programáticas, como Klanglabyrinth (labirinto sonoro), que sugere um início e um fim para o

labirinto confeccionado com fios elétricos esticados através de simples estacas de madeira num

gramado.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 62  

Klanglabyrinth – Ars Eletronica, Linz, 1987. Composição em doze canais.

Nem todos os trabalhos tem documentação acessível, especialmente os mais antigos, sendo

listados a seguir alguns deles:

» Il re s pi ro de l m are - 1981 » Écouter les murs - 1981 » Murmures en sous-sol - 1982 » On Air - 1984 » Magnetic Air - 1985 » Ocigam Trazon - 1985 » Listen Through the Air - 1983 » De r Voge lbaum - 1987 » K langlabyrin th - 1987 » Le Jardin Magnétique - 1987

» Die Konferenz der Bäume - 1988/89 » Oase - 2000 » Oas i s 2000 - Music for a concrete jungle - 2000 » Magnetic Garden - 2001 » Der Magnetic Hair - 2001 » Spaces for You - 2004 » Klänge und ein Raum - 2004 » Magnetic Nets - 2005 » Dichte Wolken - 2011 » Wolken - 2012

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 63  

Oasis 2000 é menos inofensivo do que parece. Hoje, com espaços cibernéticos, realidade

virtual e a internet, mas principalmente com a tecnologia genética, o que consideramos natural pode

ser artificial e vice-versa. Kubisch questiona o que »verdadeiro« e o que é »falso« no seu oásis, ao

tomar conhecimento de um projeto dinamarquês que previa a fabricação laboratorial da árvore de

natal perfeita.

Oasis 2000 - Music for a concrete jungle – Hayward Gallery, Londres, 2000. Composição em quatorze canais.

Em Il respiro del mare, sons regulares das ondas do mar são armazenados num labirinto de

fio azul, enquanto o labirinto vermelho tem sons de respiração tranqüila. Se o visitante se posicionar

entre estes dois campos, as seqüências sonoras serão mixadas. [Universa Ars, Capo d’Orlando,

Sicilia, 1981. Fio elétrico vermelho e azul, cubos de indução magnética; composição em dois

canais.]

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 64  

Em Der Vogelbaum (a árvore dos pássaros), o mesmo princípio de Il respiro del mare é

utilizado, em vez de ondas do mar armazena sons de pássaros de várias partes do mundo que são

raros na natureza.

Der Vogelbaum – Primeira exibição em Bremen, Alemanha, 1987.

Fio elétrico verde-amarelo para aterramento, fones de ouvido eletromagnéticos; composição em doze canais.

B) Electrical Walks

Electrical Walks é um trabalho em progresso, um passeio público com fones de ouvido

especiais, sem fio, capazes de detectar campos eletromagnéticos aéreos e subterrâneos,

amplificando-os e tornando audíveis.

A gama de ruídos, o timbre e o volume variam de lugar para lugar e de país para país. Eles

têm uma coisa em comum: são onipresentes, mesmo onde não se esperaria. Sistemas de iluminação,

sistemas de comunicação sem fio, sistemas de radar, dispositivos de segurança anti-roubo, câmeras

de vigilância, telefones celulares, computadores, cabos elétricos, antenas, sistemas de navegação,

caixas eletrônicos, internet sem fio, neon de placas de publicidade, redes de transporte público, etc.

criam campos elétricos ocultos, mas de extraordinária presença.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 65  

Os sons são muito mais musicais do que se poderia esperar. Há complexas camadas de alta e

baixa freqüências, loops de seqüências rítmicas, grupos de pequenos sinais, longos zumbidos.

Alguns sons são muito parecidos em todo o mundo, outros são específicos para uma cidade ou país

e não podem ser encontrados em qualquer lugar.

Huddersfield - Contemporary Music Festival 2007

Krems an der Donau - Festival Kontraste 2011

Com o fone de ouvido magnético e um mapa dos arredores, em que as possíveis rotas e

campos elétricos especialmente interessantes são marcados, o visitante pode desencadear por conta

própria ou em grupo. A percepção da realidade muda todos os dias quando se ouve os campos

eletromagnéticos, o que está acostumado aparece em um contexto diferente. Nada parece a maneira

como soa.

Linz - Ars Electronica Linz 2010

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 66  

Electrical Walks – cidades percorridas

1. Co l oni a

Festival Klangraum-Raumklang 2004 Faculdade de Mídia Arte

2. Oxfo rd

Festival Vent 2005

Ovada Gallery

3. Berl i m

Exposição Prolog 2005 Academia de Artes

4. Ka rl sruhe

Exposição Resonanzen 2005 ZKM

5. B rem en

Cidade da Ciência 2005

Novo Museu de Weserburg Galeria de Steinernen Kreuz

6. Londres

Festival Her Noise 2005

e Goethe-Institut

7. Ha a rl em

Festival )toon) 7 2006

8. B i rm i ng ha m

Galeria Ikon 2006

9. Londres

Expo Road motiroti/priceless 2006

10. Ri g a

Festival Skanu Mezs 2006 e Goethe-Institut

11. Nov a York

Mostra Invisible Geographies 2006

The Kitchen

12. Ol denburg

Exposição Sound//Bytes 2007 Edith-Ruß-Haus para Arte-Mídia

13. Kort r i j k

Festival Happy Ears 2007

14. Chi c a g o

Outer Ear Festival 2007 e Goethe-Institut

15. Cra c óv i a

Festival Audio Art 2007 e Goethe-Institut Bunkier Sztuki

16. Huddersf i el d

Huddersfield Music Festival 2007

17. Ci da de do Méxi c o

Festival Sonic Clouds 2008 Laboratorio de Arte Alameda

18. B rem en

Kunsthalle Bremen 2008

Sammlung / permanent collection

19. Mont rea l

OBORO e Goethe-Institut 2008

20. Quebec

Festival Mois Multi / Meduse 2008

21. Po i t i ers

Ville de Poitiers 2008

22. Da rm st a dt

INMM / Akademie für Tonkunst 2008

23. M i l ã o

Palazzo della Triennale 2009 Festival InContemporanea

24. Copenha g ue

Wundergrund Festival e Goethe-Institut 2009

25. Leeds

Expo Festival 2009

26. Rec k l i ng ha usen

Salão Recklinghausen / RUHR2010

27. Gel senk i rc hen

Museu de Arte Geksenkirchen / RUHR.2010

28. Dorst en

Jüdisches Museum / RUHR.2010

29. Ma rl

Museu da Escultura Glaskasten / RUHR.2010

30. Oberha usen

Visitorcenter / RUHR.2010

31. Li nz

Ars Electronica Linz 2010

32. Port o

Museo de Serralves 2010 Trama Festival

33. Ut rec ht

Impakt Festival 2010

34. Ta l l i nn

KUMU, Museum of Modern Art 2011

35. Turku

Festival Turku is listening 2011

36. Na nc y

Goethe-Institut Nancy 2011

37. Dort m und

Museum am Ostwall im U Dortmund 2011

38. Krem s a n der Dona u

Festival Kontraste 2011

39. Co l oni a

Festival Visual Sounds 2011

40. Hong kong

Run Run Shaw Creative Media Centre 2012

41. Ba sel

Exposição Sensing places 2012 Centro de Artes Eletrônicas Percurso permanente

42. Kosi c e

Sound City Days 2012 project of Košice 2013 European Capital of Culture

43. Aa rhus

DIEM, Danish Royal Academy of Music 2012

44. A t ena s

Hertz Festival und Goethe-Institut Athen

2012

45. Kort r i j k

Festival van Vlaanderen Kortrijk 2013 festival e caminhada permanente

46. Mosc ou

SA )))) sound artist festival 2013 e Goethe-Institut

47. B ruxel a s

Tuned City Brussels 2013

Jardim Botânico

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 67  

Apontamentos

O processo de criação/participação do público em Electrical Walks, já presente nos

trabalhos de indução eletromagnética anteriores, agora inclui o participante na cidade. O ato de

andar implica em lidar com questões mutáveis que afetam os cinco sentidos, transformando

experiências, alterando constantemente pontos de vista. Ao caminhar pela cidade, o indivíduo se

orienta por suas experiências passadas e presentes, pela interação com o ambiente e está sujeito

também às experiências do coletivo, implicitamente traduzidas em cidade pelo espaço

hipoteticamente programado e edifícios projetados.

Cria-se uma relação do eu/nós (participantes) com a cidade, em que o elementos já estão lá

colocados. Ao caminhar com dispositivo sonoro móvel, os sons transportados se misturam aos sons

da paisagem urbana. O ouvinte é envolvido num processo de interiorização dos elementos com os

quais entra em contato, similar à autonomia causada pelo walkman e a musica mobilis nos anos ’80,

com a ressalva de que no caso presente a ocorrência de interatividade é inequívoca. O walkman,

criado e lançado no Japão em 1980, afetou as transformações urbanas práticas e semânticas.

Hosokawa define musica mobilis (música móvel) como “aquela cuja fonte se move

voluntária ou involuntariamente de um ponto a outro, coordenado pelo transporte corporal do

possuidor da fonte” (Hosokawa 1984: 166). Destaca quatro fases de geração musical: a) na cidade,

não há divisão entre música e ruído e ambos se fundem; b) existem músicos de rua e outras fontes

musicais, criando música coletivamente; c) há também eventos transitórios (um carro que passa

com som alto, etc.) que tornam as pessoas ouvintes, ouvindo música coletivamente; d) e há o

ouvinte de walkman, que ouve música sozinho.

O aparelho walkman é o escutador solitário por excelência, porque depois que adquire

outras funções (relógio, calculadora, etc.) dispersa seu objetivo, distrai o usuário. “O walkman não é

causa nem efeito desta autonomia, tampouco a evoca ou a pratica. Ele é a autonomia, ou ainda a

autonomia do andar em si (idem). A redução de tamanho dos aparelhos tecnológicos contribui para

a mobilidade e os elementos portáteis são incorporados aos gestos quotidianos.

Mas a autonomia nem sempre é sinônimo de isolamento, individualização, separação da

realidade; não obstante, em aparente paradoxo, é indispensável para o processo de auto-unificação

(id: 170), ou seja, uma tomada de consciência de si do que o cerca, uma atuação constante com o

interior e a realidade externa representada pelo nomadismo (em detrimento do sedentarismo).

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 68  

Electrical Walks oferece um percurso ativo com a cidade e entre os participantes, conhecendo uma

cidade invisível e normalmente inaudível. Muitas vezes solitário, mas também coletivo.

5.1.2. Consecutio Temporum

Consecutio temporum (passagem do tempo) dá título a uma serie de instalações criadas em

salas que passaram por transformações históricas. A primeira delas foi realizada em 1993 no antigo

atelier de Joseph Beuys na cidade de Kleves, atual arquivo municipal. Começou com um convite

para criar uma instalação de luz e som, sem autorização para mudar nenhum elemento do lugar.

Kubischse deparou com um problema cuja solução se tornaria uma de suas marcas registradas,

recorrendo a elementos imateriais como som, luz, memória. No final, a sala ficou bem diferente

pela mudança radical na iluminação e pela rede acústica de geradores ultra-sônicos, quase

imperceptíveis.

Comum a todas essas obras é o fato de usar intencionalmente partes salientes para

delicadamente realçar traços de sua história. A exposição dos traços de decadência e de mudanças

espaciais que ocorreram desencadeia uma introspecção associativa para dentro da história, mas sem

o caráter historicista. Os meios artísticos de modelagem são limitados a luz e som.

As instalações têm o caráter de um processo temporal cujo curso não é determinado ou

previsível – como o próprio curso da história.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 69  

Obras da s é rie Cons e cu t io Te m porum

1 consecutio temporum

passagem do tempo, 1993

Kleve, Alemanha, arquivo municipal de Kleve / Antigo estúdio de Joseph Beuys

2 consecutio temporum II

passagem do tempo II, 1994

Berlin, Academia de Artes, Leste

3 consecutio temporum III

passagem do tempo III, 1994

Rio de Janeiro, Brasil, Paço Imperial

4 Sechs Spiegel

seis espelhos, 1994

Saarbrücken, Alemanha, Ludwigskirche

5 Wintergarten

jardim de inverno, 1995

Berlin, Haus am Waldsee, antigo jardim de inverno

6 Sky Lights

luzes celestes, 1995

Filadélfia, Estados Unidos, Eastern State Penitentiary

7 Zwei Wände und acht Klänge

doze paredes e oito sons, 1995

Hanover, Alemanha, fábrica de gelo

8 Elf Fenster und elf Klänge

onze janelas e onze sons, 1996

Saarbrücken, Alemanha, mercado municipal de St. Johanner

9 Acht Säulen und ein Raum

oito colunas e um espaço, 1996

Ulm, Alemanha, Associação de Artes de Ulm, Schuhhaussaal

10 Neun Türen und neun Klänge

nove portas e nove sons, 1996

Berlim, Podewil, antigo palácio de Podewilssches

11 A roof and twelve sounds

um telhado e doze sons, 1997

Utrecht, Holanda, Akademiegebouw, groot Kapitelhuis van de Dom

12 in memoriam

in memoriam, 1997

Kassel, Alemanha, igreja São Martin, cripta do príncipe

13 Sieben Fenster und acht Klänge

sete janelas e oito sons, 1997

Backnang, Germany, Turmschulhaus, ehem. Gotischer Chor St. Michael

14 dodici luci e undici suoni

doze luzes e doze sons, 1997

Roma, Itália, igreja de Santa Caterina de Funari

15 Zehn Säulen und zehn Klänge

dez colunas e dez sons, 1999

Paderborn, Alemanha, Capela de Bartolomeu

16 Klangquelle

fonte sonora, 1999

Paderborn, Alemanha, fonte da adega - Palácio Imperial

17 Souvenirs Fragiles

frágeis lembranças, 2000

Luxemburgo, fórum de arte contemporânea, antiga adega do cassino Luxemburgo

18 Zwölf Säulen und elf Klänge

doze colunas e onze sons, 2000

Munique, Alemanha, Igreja Carmelita

19 Zwölf Türen und zwölf Klänge

doze portas e doze sons 2000

Rüsselsheim, Alemanha, andar de funcionários da antiga vila Opel

20 Minnen

minas, 2003

Estocolmo, Suécia, Museu de Arquitetura

21 Arkadien

Arcádia, 2004

Oberhausen, Alemanha, Bunkermuseum

22 Großes Tor

grande portão, 2005

Hanover, Alemanha, Marktkirche

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Christina Kubisch | 70  

5.2. Conclusões

Criação de espaços a partir de montagens escultóricas

Os trabalhos com característica escultóricas são predominantes no universo da arte sonora,

podendo encontrar semelhanças entre Christina Kubisch e Robin Minard, dentre outros. As peças

são montadas com múltiplos alto-falantes pequenos, concentrados, formando desenhos visualmente

interessantes, com aspectos escultóricos, mas que também configuram regiões e pontos focais a

partir do som. As freqüências agudas dos falantes de pequeno porte fornecem maior

direcionalidade, facilitando a criação de campos sonoros demarcados.

O espaço-tempo alcançado pela memória

O efeito da memória pessoal e da história do local colocados no centro da percepção do

espaço; a artista lida com a relatividade psicológica do tempo.

Arte sonora além do som

Uso de iluminação especial, sobretudo luz negra, dão equilíbrio no uso de estímulos visuais

e auditivos. Se mantém fortemente atrelada à idéia de site specific porque estuda cada local de

instalação das obras, compondo-as em função do que é descoberto. Ela explora detalhes

arquitetônicos únicos, como colunas, portas e janelas (que em seqüência ou com abertura para

mundos distintos despertam nela ligações para compor), ranhuras e manchas nas paredes (que

remetem à história vivida ali), coberturas frágeis, etc.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Análises Gerais | 71  

6. Análises gerais

6.1. Confrontação Leitner/Kubisch

A comparação se dá sob os domínios fenomenológico e conceitual, isto é, sob os modos de

abordagem da percepção do visitante e certas implicações abstratas.

Em ambos, o fenômeno sonoro e a sensação são importantes, mas em Kubisch a sensação

pode freqüentemente se expandir para um tipo de sensação-sentimento. Atribui ao som uma

significação abstrata, ao associá-lo, muitas vezes, à aparência visual da fonte, à memória histórica

do lugar ou à memória afetiva do espectador. As sutilezas são atingidas na sua potencialidade

quando ocorre a entrega do visitante aos detalhes cuidadosamente oferecidos.

Concretamente, Leitner é menos visual do que Kubisch. Para ele a experiência espacial é

suficientemente completa pela audição, embora não deixe de trabalhar com acabamentos

visualmente resolvidos que se incorporam ao conjunto. Em grande parte das obras de Leitner, a

movimentação é o que leva à experiência do espaço sonoro. Em Kubisch, o som funciona mais

como uma ambientação, a criação de uma atmosfera sensível que instiga a procura por referenciais.

O grande interesse de Kubisch na porção visual está patente no uso elaborado de luz negra e outras

forma de iluminação, com as quais revela elementos quase invisíveis.

Paradoxalmente (pelo fato de Leitner ser arquiteto), Leitner inclui muito pouco a arquitetura

em suas obras ou o faz numa camada de superfície. Grande parte dos trabalhos podem não ser

considerados site specific devido à sua reprodutibilidade. Modifica a dimensão espacial sem se

preocupar fundamentalmente com o controle acústico do conjunto, a exemplo da posição dos

objetos em relação às paredes (como visto anteriormente nas conclusões sobre o artista: na

relativização do espaço provocada pelo movimento, portanto “independente” do entorno)

Evidentemente, existem muitas obras mais arraigadas à construção, como as instalações

permanentes e aquelas estruturadas na reflexão do ambiente.

Por outro lado, Kubisch, diferentemente de Leitner e de muitos colegas, incorpora

totalmente o lugar com uso de som, luz, extensas instalações, ligações internas e externas, inclusive

trazendo suas memórias.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Análises Gerais | 72  

Leitner se aproxima de Kubisch em:

• Le Cylindre Sonore - pela fusão entre sons do ambiente e sons produzidos, sons “naturais” e

“artificiais”. Os aspectos visual e sensorial da arquitetura são incorporados pelo artista como

uma ruína bucólica no parque.

• Sound Space / Scarred – é um espaço sonoro sem som, apropriando-se da memória histórica

do local. São sugeridos ruídos de guerra pela associação das peças instaladas junto a marcas

nas paredes do edifício em ruínas.

• Syn/Ergon (2006) – é uma intervenção artística mais cenográfica do que de arte sonora. Foi

encomendada comemorativamente para a fachada/entrada da Linz AG (um conglomerado

austríaco na área de infra-estrutura, transportes e telecomunicações). Apresenta painéis de

acrílico com textos aludindo à grande gama de atividades da empresa, uma paisagem sonora

urbana de 24 canais, e luz negra como principal iluminação.

Este tipo de abordagem – arquitetura sensorial e visual, memória histórica e afetiva de um

local uso de luz negra como uma forma de escuridão (silêncio relativo) – são mais recorrentes em

Kubisch, quase uma marca registrada.

Interatividade

• Leitner: o lugar está configurado, “basta” o público percorrê-lo.

• Kubisch: mais interativa / pró atividade do público;

Forma e conteúdo

• Leitner: a proposta de diferentes materiais num novo trabalho pode alterar a superfície

estética, mas preserva forma e conteúdo numa apreensão global (percepção espacial,

movimento, visão, audição etc.).

• Kubisch: algumas mudanças de material podem afetar forma e conteúdo; cada novo

mecanismo criado proporciona diferentes investigações pelo público.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Análises Gerais | 73  

6.2. Apontamentos sobre Arte Sonora

Ao estudar os dois artistas, as relações entre eles e sua inserção na arte sonora, foram

constatadas noções de maior abrangência e alguns conceitos potencialmente aplicáveis globalmente

à arte sonora. Algumas idéia estiveram patentes no decorrer do texto e integram de forma

reconhecível as generalidades da arte sonora, como p. ex., a diluição do tempo. Outras questões são

sugeridas a seguir e podem também ser pertinentes a outros campos artísticos.

Processo e presença

A interatividade de uma obra tem a ver com a idéia da arte processual, em que produto e

processo são a mesma coisa, incluída a interferência do público. A experiência acústica ocorre

durante a composição/execução, pois não é o efeito aural que está prescrito, mas o ação de gerá-lo.

Neste caso, não se questiona a reprodução de uma experiência: cada visita produz uma obra pela

primeira vez.

Registro | Gravação

Identificam-se problemas de reprodutibilidade da imersão sonoro-espacial comparáveis à

representação da escultura via fotografia. A experiência vivida ao visitar uma instalação não pode

ser reproduzida em outro ambiente, com outra estrutura. É uma questão de especificidade local (site

specificity). Mas não há a intenção do registro per se. “Inúmeras performances de Tony Conrad, La

Monte Young, Alvin Lucier, Charlemagne Palestine, Nam June Paik e outros nunca foram feitas

com a intenção de serem gravadas e preservadas. Existiram apenas no momento da própria ação”

(Assche 2002: 12).

Quando é feito o registro apenas do áudio, resulta em redução e fusão das camadas para uma

reprodução em estéreo; utilizam-se apenas dois canais, mesmo que aparelhos mais amplos já

estejam comercialmente bastante difundidos, como o sistema surround 5.1, utilizado

domesticamente em home theathers. Esses registros aparecem como idéia de peça artística em outro

plano, outra linguagem, quase uma peça eletroacústica. Podem resultar em peças audiovisuais

editadas como videoclipe ou documentário de curta/média-metragem, sobrepostos por rudimentos

ficcionais e técnicas mistas. Cria-se um “filme” tão interessante quanto a obra que este divulga,

procurando instigar o espectador a experimentá-la em toda potência, presencialmente. Portanto, o

processo de gravação/reprodução não é exatamente um problema, é apenas um registro

conscientemente limitado, que eventualmente procura complementar a obra original pela criação de

uma peça artística em outra mídia.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Análises Gerais | 74  

Arte e Ciência

“A fusão de som e imagem em um único espaço, ao mesmo tempo aberto e fechado, também tem a ver com igualdade entre arte e não-arte: a sobrevivência artística compete com a reprodução infinita; tal como operações de computador competem com o ritmo de gongos ancestrais e com o rangido de ferramentas mecânicas; tal como a manipulação de microfones compete com a evocação dos mortos; a crítica social com o tabuleiro de jogo; e a reciclagem de fragmentos e lixo com a perda no grande oceano primordial” (Rancière 2002: 18).

Nos anos 2000, as escolas de arte austríacas foram convertidas em Universidades. Sob da

orientação da Universidade Kunstlerausbildung estabeleceu-se uma forte idéia baseada no modelo

da teoria da arte dos anos 90 de que arte é uma forma de ciência. Na verdade, muitos são os artistas

neo-conceitualistas orientados dos anos 90 genuinamente científicos, que utilizam métodos como

etnógrafos, ambientalistas, urbanistas, pesquisadores sociais, dentre outros (Wagner 2005: 9). O que

é novo, desde então, é que os alunos (pelo menos teoricamente) não têm mais um professor, o

"mestre" fixo; dentro de uma instituição, toda a gama de ensino segue este modelo. O perigo de que

a relação mestre-estudante gere uma cópia do mestre é portanto, reduzida. Na verdade, os antigos

"master classes" permanecem intactos. As aulas ocorrem presencialmente e em conferencias

multimídia, recorrendo-se a outros professores apenas em caso de emergência. Por isso ainda

depende muito da amplitude do currículo, variedade de formações dentro de uma classe.

O atual acesso a informações permite conhecer o outro campo e lidar com certa autoridade

sem ter de tornar-se um “especialista”, pois o conhecimento está tacitamente estabelecido, um lado

implica o outro. “O som não é mais somente um instrumento da expressão musical; projetado com

precisão, torna-se elemento construtivo do espaço” (Leitner 1994: 30).

Isto permite maior liberdade técnico-criativa devido à não-dependência de outros envolvidos

na resolução de problemas; porém, o perigo de superficialidade é constante – mesmo estando numa

posição polivalente, a pessoa não é capaz de apreender a integral complexidade de dado assunto,

mas tem a ilusão de pleno domínio.

Na esfera do som, a técnica como arte e a arte como técnica aparecem, por exemplo, nos

dispositivos e sistemas destinados a simulação de ambientes acústicos tridimensionais que “saem

hoje do domínio da pesquisa científica para se tornarem ferramentas destinadas também à criação

musical e sonora” (Genevois 1998: 13).

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

Análises Gerais | 75  

Espaço sonoro: uma tradução do contínuo espaço-tempo

Os parâmetros musicais são referenciais para compreensão do som na arte sonora e na

identificação de conceitos, processos e estéticas envolvidos. A música como ferramenta de análise

do espaço em relação ao som oferece diferentes tratamentos do tema, conforme aponta Solomos:

Através dessas três etapas (esp aç o c omo metá f ora , esp ac ia l izaç ão d o som e p esq uisa sob re o c ontinuo esp aç o-som), vê-se o espaço penetrar cada vez mais na música desde, paradoxalmente, o sonho debussysta de uma música cósmica sob forma de levitação sem quebrar as das paredes da sala de concerto. (Solomos 1998: 107)

O contínuo espaço-som remete ao espaço-tempo da física moderna. Como visto

anteriormente, há uma confluência de arte e ciência. Cada vez mais procura-se aplicar

concretamente conceitos científicos em diversos campos, como o contínuo espaço-tempo, mas sem

a complexidade e a rigidez da física quântica na qual se baseia.

Para explicar essa idéia, Xenakis (1992: 255-267) recorre à teoria de Einstein da relatividade

do tempo, que interliga tempo e espaço graças à finitude da velocidade da luz; portanto, tempo não

é absoluto. Explica que somente percebemos o tempo devido a mudanças de estado, alterações. Não

é possível ir de um ponto a outro do espaço instantaneamente. Deslocamento demanda tempo. A

percepção de cada estado depende da relação com o estado anterior (anterioridade), apreendido pela

memória. É preciso distinguir entidades para identificar as mudanças. A seqüência de estados

anteriores e posteriores, um após o outro, gera uma continuidade de transformações, um fluxo

contínuo. Este sistema (tempo) é compreendido pelo processo inverso: existe um contínuo no qual

identificam-se pontos de referência. Esses pontos de referência são comparáveis, mensuráveis, o

que “nos permite lhes atribuir distâncias, intervalos, durações. Uma distância, traduzida

espacialmente, pode ser considerada como deslocamento, um passo, o salto de um ponto a outro,

um salto não-temporal, uma distância espacial” (Xenakis 1992: 264-5). Intervalos e durações

também estão relacionados ao fenômeno sonoro, mas Xenakis aprofunda ainda mais a ligação entre

tempo e espaço na composição musical8, concernente à forma, estrutura e sistema:

Uma regra ou lei significa procedimentos finitos ou infinitos, sempre iguais, aplicados a elementos contínuos ou “discretos”. Esta definição implica na noção de repetição, de recorrência no tempo ou simetria em domínios fora do tempo (hors temps). Portanto, para uma regra existir, deve ser aplicável inúmeras vezes na eternidade do tempo e espaço. Se uma regra existir somente uma vez, será engolida nessa imensidão e reduzida a um único ponto, portanto inobservável. Para ser observável, deve ser repetível um infinito número de vezes. (idem: 258)

8 Para esta análise, as idéias e teorias de Xenakis relativas à música são consideradas aplicáveis à composição do som como um todo, portanto, também à arte sonora.

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Análises Gerais | 76  

Espaço sonoro: paradigma do canal de comunicação

Em arte sonora, freqüentemente chega-se ao comum termo “espaço sonoro” quando em

trabalhos mais amplos, sintetizando esta linguagem ao destacar seus elementos mais particulares, ou

pelo menos uma combinação peculiar desses dois elementos – espaço e som (interação e tempo

estão de certo modo implícitos e o aspecto visual pode-lhe ser considerado historicamente

pertencente). O espaço é tão concreto quanto complexo. Historicamente, seu curso extrapola o

aspecto visual, com sons que “se desdobram em formas tridimensionais como esculturas, ativa ou

passivamente, estaticamente ou em movimento. Sua individualidade, história e evidência não são só

o meio, mas também a mensagem” (Gerke 2000: 48). Sobre os conceitos implicados nessa

associação, pode-se fazer um paralelo com as artes visuais em geral (até extrapolando para a arte de

rua), compreendendo-as como um ganho territorial para fora das galerias, ocupando a cidade.

Antes de haver uma mudança de ambiente, do salão a espaços diversos e até à rua, há que se

notar a incorporação do meio enquanto suporte, conteúdo e mensagem: desde o modernismo, as

arte plásticas rompem os limites físicos de sua manifestação. Sobre a evolução espacial da pintura

no século XX e sua expansão para além da moldura, O’Doherty discorre que “à medida que o

suporte do conteúdo se torna cada vez mais ralo, a composição e o tema e a metafísica transbordam

a beirada até que, como disse Gertrude Stein a respeito de Picasso, o esvaziamento seja total”

(O’Doherty 2007: 14). A mudança do paradigma espacial reside, antes, na ampliação da relação

objeto/observador. De um lado, o objeto passa a fazer parte de um contexto, deixa de ser

independente do entorno e o incorpora para um significado total: a arte do objeto ocupa mais que o

próprio objeto. De outro, o observador é posto imerso no círculo da obra e com ela interage, não

mais encarando-a num binômio apartado, frio, imediato.

Até meados do século XX, a música oferece alguns exemplos de tentativa de

“espacialização” dos sons sem que isso se tornasse, no entanto, uma prática recorrente e uma

qualidade universal para música. Com a acusmática, antigo procedimento recuperado pela música

eletroacústica, esta realização se torna mais freqüente, com ampliação de possibilidades. A relação

entre som e ouvinte se amplia para além de si mesmos, por meio do espaço que ocupam. O espaço

se torna parte do som e ambos acolhem o observador/ouvinte.

Invisibilidade e temporalidade, interpretadas num processo ativo, conferem características

de não-ser ao som, cuja habilidade de mesclar-se a outros sons e sua ausência de fronteiras

representam um fenômeno equivalente aos conceitos artísticos de interpenetração, não-objetividade

e não-obstrução (Leitner 1994: 30).

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Considerações finais

Inicialmente, a pesquisa baseou-se no estudo de aspectos espaciais da música a partir da

década de 1950. Esperava-se estabelecer relações entre a espacialização musical e as mais variadas

atividades artísticas contemporâneas que utilizem som e espaço como matérias primas. No entanto,

percebeu-se que não há uma relação causal entre música e arte sonora, pois esta adveio dum

intercâmbio não-linear e não-delimitado de práticas artísticas, mesclando música, artes plásticas,

arquitetura. Esta averiguação levou à alteração do recorte da pesquisa, elegendo a arte sonora como

enfoque. Todavia, a música não foi de modo algum deixada de lado, pois sempre oferece subsídios

para o emprego do som enquanto material expressivo.

Seria desejável maior aprofundamento nos estudos de caso, entender como cada artista

resolveu, da concepção à materialização das obras, empírica ou cientificamente, problemas técnicos

de: a) acústica – se ouve medição acústica das salas e materiais utilizados; como foi feito o

posicionamento das fontes sonoras, rebatedores, etc.; qual o processo da escolha de freqüências e

timbres específicos para atingir resultados com tamanha objetividade; b) tecnologia – quais

equipamentos foram usados, etc.; c) vínculos e apoios institucionais diretamente envolvidos na

produção; d) feedback do público, uma vez que são trabalhos interativos com propostas e

abordagens bem especificas, tecnicamente, receptivamente, etc. Apesar das implicações técnico-

artísticas, centrais na arte contemporânea, trata-se de trabalhos artísticos, não científicos, não sendo

necessário para boa apreciação saber quais os métodos usados. O memorial do projeto, que pode

acompanhar uma criação, geralmente ofereça informações variadas que ajudam a entender a obra,

mas muitas vezes é nada mais que uma descrição poética. Compreende-se, portanto, o nível de

aprofundamento possível.

Outro ponto da pesquisa foi o contato com o material feito à distância, sem visitar as obras,

o que, como visto no decorrer da pesquisa, implicam numa compreensão incompleta, não-imersiva;

a presença é fator intrínseco à arte sonora mesmo que determinada obra não seja site specific.

Todavia, a metodologia usada permitiu direcionar os dados para a organização das obras em

categorias e a construção parâmetros de comparação.

Assim, pelo porte da pesquisa de iniciação científica, consideram-se bastante satisfatórios os

resultados obtidos.

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Aspectos espaciais da arte sonora – Borys Duque

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