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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ VAGNER DE SOUZA ASPECTOS DESTACADOS DO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO E DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL Tijucas 2009

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

VAGNER DE SOUZA

ASPECTOS DESTACADOS DO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO E DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

Tijucas

2009

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VAGNER DE SOUZA

ASPECTOS DESTACADOS DO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO E DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas. Orientadora: MSc. Fernando Francisco A. Fernandez

Tijucas

2009

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VAGNER DE SOUZA

ASPECTOS DESTACADOS DO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO E DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e

aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas.

Direito Público/Direito Eleitoral

Tijucas, 4 de dezembro de 2009.

Prof. MSc. Fernando Fracisco A. Fernandez

Orientador

Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas

Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica

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Dedico este trabalho a meus pais, admiráveis enquanto pessoas, meu

estímulo impulsionador na busca do conhecimento, meus

agradecimentos por terem concedido a mim a oportunidade de cursar a

faculdade de Direito e me realizar ainda mais.

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5

Agradeço primeiramente a Jesus Cristo, nosso senhor e salvador, por me dar saúde,

inteligência e muita força de vontade pra realizar este trabalho e por colocar tantas pessoas

maravilhosas no meu caminho, durante esses cinco anos que frequentei a universidade.

Ao meu orientador Prof. Fernando Afonso Francisco Fernandes, pelo incentivo,

dedicação e presteza no auxílio ao desenvolvimento desta monografia de conclusão de curso,

através do seu conhecimento e experiência na área jurídica, especificamente no Direito

Eleitoral.

A todos os professores, pelo carinho, dedicação e entusiasmo demonstrado ao longo

do curso.

Aos demais idealizadores, coordenadores e funcionários da Universidade do Vale do

Itajaí -UNIVALI do campus de Tijucas.

Aos colegas de classe pela espontaneidade e alegria na troca de informações e

materiais, numa demonstração de amizade e solidariedade.

Aos meus amigos Juliano, Luiz, Ednei, Cristiano e Felipe, pelo companheirismo e

amizade, durante esses cinco anos que passamos juntos na faculdade, pessoas essas que

ficarão para sempre guardadas em meu coração.

Aos advogados Dr. André Luiz Dadam e o Dr. Rodrigo dos Santos César, pelo apoio e

sugestões que me deram para a realização deste trabalho e ainda pelos ensinamentos jurídicos,

sendo que são excelentes profissionais do Direito.

E, finalmente a toda minha família e a minha namorada Solange, pela paciência em

suportar a minha ausência e pelo apoio durante todas as dificuldades enfrentadas.

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Meu ideal Político é a Democracia, para que todo homem seja

respeitado e nenhum venerado.

Albert Einstein

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí -

UNIVALI, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda

e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Tijucas, 4 de dezembro de 2009.

Vagner de Souza

Graduando

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é o estudo do Direito Eleitoral brasileiro, conhecendo sua evolução histórica e a demanda pela criação do instrumento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral capaz de garantir um processo eleitoral idôneo e democrático. A importância desse tema se justifica no fato de que o Direito Eleitoral é um processo de permanente construção, tendo iniciado em nosso país com o desafio de vencer diversos obstáculos que impediam a preponderância da liberdade política, em seu caráter mais amplo e democrático. Ao longo das décadas, a nação passou por inúmeras lutas populares em favor da liberdade política, igualdade de condições de disputa e garantia da idoneidade do processo eleitoral, até chegar ao estágio em que nos encontramos, quando o sistema eleitoral brasileiro é considerado um dos mais modernos do planeta. Para se chegar nesse estágio foi preciso aprimorar a legislação eleitoral e criar mecanismos como a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, visando ampliar a segurança jurídica do processo eleitoral e garantir a supremacia da vontade popular manifesta pelo voto. Palavras-chave: Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Direito Eleitoral.

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RESUMEN

El objetivo de este trabajo es el estudio del Derecho Electoral brasileño, conociendo su evolución histórica y la demanda por la creación del instrumento de la Acción de Investigación Judicial Electoral capaz de garantir un proceso electoral idóneo y democrático. La importancia de ese tema se justifica en el hecho de que el Derecho Electoral es un proceso de permanente construcción, habiendo iniciado en nuestro País con el desafío de vencer diversos obstáculos que impedían la preponderancia de la libertad política, en su carácter más amplio y democrático. Alo largo de las décadas, la Nación paso por innumeras luchas populares en favor de la libertad política, igualdad de condiciones de disputa y garantía de idoneidad del proceso electoral, hasta llegar a la etapa en que nos encontramos, en que el sistema electoral brasileño es considerado uno de los más modernos del planeta. Para alcanzar ese peldaño fue preciso mejorar la legislación electoral y crear mecanismos como la Acción de Investigación Judicial Electoral, visando ampliar la seguridad jurídica del proceso electoral y garantir la supremacía de la voluntad popular manifestada por el voto. Palabras-clave: Derecho Electoral. Acción de Investigación Judicial Electoral.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AIJE Ação de Investigação Judicial eleitoral

AIRC Ação de Impugnação de Registro de Candidatura

AIME Ação de Impugnação de Mandato Eletivo

Apud Citado por

Art. Artigo

Caput Cabeça

CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

EC Emenda Constitucional

Ed. Edição

In verbis Nestas palavras

MPE Ministério Público Eleitoral

n. Número

Parágrafo Parágrafo

TER Tribunal Regional Eleitoral

TSE Tribunal Superior Eleitoral

SNI Serviço Nacional de Informações

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LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS

Lista de categorias1 que o autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com

seus respectivos conceitos operacionais2.

Ação de Investigação Judicial Eleitoral

Instrumento administrativo judicial direcionado aos partidos políticos, candidatos e às demais pessoas que contribuam para a prática condenável, justamente no intuito de proteger a lisura do pleito e punir qualquer um que atentar contra a idoneidade do processe eleitoral, tentando se prevalecer do abuso do poder econômico e/ou político3.

Direito Eleitoral

O Direito Eleitoral é o ramo do Direito Publico que disciplina a criação dos partidos, o ingresso do cidadão no corpo eleitoral para fruição dos direitos políticos, o registro das candidaturas, a propaganda eleitoral, o processo eleitoral e a investidura no mandato eletivo4.

Voto

É a manifestação da vontade, ou a opinião manifestada, pelo membro de uma corporação, ou de uma assembléia, acerca de certos fatos e mediante sistema ou forma, preestabelecida5.

Elegibilidade

Refere-se ao Direito de ser eleito para cargo político, desde que reunidas as condições de elegibilidade e ausentes as causas de inelegibilidade6.

Inelegibilidades

1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do presente trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 VELOSO, Valtier de Barros. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Curitiba: Revista Paraná Eleitoral n. 70. Publicado em janeiro de 2009. p. 11. 4 PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal – noções gerais. São Paulo: Atlas, 2003. p. 29. 5 SILVA. De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 1.496. 6 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito Eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum , 2006. p. 65.

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As inelegibilidades previstas no art. 14, parágrafos 5° a 10º e, residualmente na Lei complementar 64/90, podem ser conceituados como situações jurídicas tipificadas em lei, que, uma vez materializadas ou consolidadas suprimem a capacidade passiva do cidadão: vale dizer, a capacidade de ser eleito, de se situar como candidato. De um lado se manifestam como medida de sanção política (perda da capacidade eleitoral passiva) ao virtual candidato que incorre na situação tipificada, enquanto, de outro lado, assumem uma característica de proteção do eleitor, de preservação e inteireza ou a liberdade do seu voto contra candidato reputados nocivos, ou melhor, reprovados pelo ordenamento [...]7.

Sistema Eleitoral

Assim entendido como o conjunto de normas jurídico-eleitorais que regulam o processo de realização do exercício do sufrágio, vale dizer, o processo de escolha, dos representantes nas eleições majoritárias e proporcionais, na esfera da União, dos Estados ou do Distrito Federal e Municípios, contempla classificação que leve em conta o aspecto cronológico e a normatização aplicável8.

Democracia

Conjunto de regras por meio dos quais a vontade popular participa e intervêm direta ou indiretamente na formação do Estado, na determinação de suas finalidades, na amplitude da distribuição das funções públicas, na escolha dos agentes e na criação e aplicação do direito positivo9.

Crimes Eleitorais

São infrações tipificadas como tal no Código Eleitoral e em leis extravagantes, punidas com multa, detenção ou reclusão, objetivando a preservação da lisura na formação do corpo eleitoral, a normalidade do processo eletivo e a regularidade da indicação dos representantes do povo para o exercício do mandato10.

7 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito Eleitoral: teoria e prática. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 79. 8 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito Eleitoral: teoria e prática. p. 95. 9 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à Teoria das Inelegibilidades. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 17. 10 PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal – noções gerais. p. 288.

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................. 08

RESUMEN .............................................................................................................................. 09

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ........................................................................... 10 LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS . ........................... 11 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14 2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA ELEITORAL BRASILE IRO ............... 18 2.1 A DECLARAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA: AURORA POLÍTICA DA NAÇÃO ......... 18 2.2 AS PRIMEIRAS LEIS ELEITORAIS ............................................................................... 22 2.3 A PRIMEIRA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E O NOVO DIREITO ELEITORAL .................................................................................................................................................. 26 2.4 A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O DIREITO ELEITORAL NA ATUALIDADE .......... 41

3 O DIREITO ELEITORAL NO BRASIL CONTEMPORÂNEO ..... .............................. 44 3.1 A DEMOCRACIA POPULISTA ....................................................................................... 44 3.2 O GOLPE DE 1964 E O GOVERNO DITATORIAL ....................................................... 45 3.3 A REABERTURA DEMOCRÁTICA E A NOVA CONFIGURAÇÃO POLÍTICO-ELEITORAL DO PAÍS ............................................................................................................ 48 3.4 O DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO – CONCEITO ................................................ 51 3.5 AS FONTES DO DIREITO ELEITORAL ........................................................................ 55 3.6 A ORGANIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL ............................................................ 58

4 A AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL ....... .................................... 64 4.1 CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGIBILIDADES ............... 64 4.2 CABIMENTO E OBJETIVO DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL ............................................................................................................................ 73 4.3 NATUREZA JURÍDICA ................................................................................................... 77 4.4 LEGITIMIDADE ............................................................................................................... 79 4.5 DO CABIMENTO DE MEDIDA LIMINAR .................................................................... 80 4.6 OS EFEITOS DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ........................................... 81 4.7 DO RECURSO ................................................................................................................... 84

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 87

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objeto11 o estudo do Direito Eleitoral brasileiro, sua

evolução histórica e a criação do instrumento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

A importância deste tema reside no fato de que o Direito Eleitoral no país é um

processo de permanente construção, iniciando por uma fase bastante primitiva, do ponto de

vista da garantia da implantação de um sistema democrático verdadeiro, passando por

diversas lutas populares em favor da liberdade política, igualdade de condições de disputa e

garantia da idoneidade do processo eleitoral, até chegar ao estágio em que se encontra

atualmente, considerado um dos sistemas mais modernos do planeta.

Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito

na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem

colaborar para o conhecimento de um tema que, apesar de não poder ser tratado como

novidade no campo jurídico, na dimensão social-prática ainda pode ser tratado como elemento

novo e repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos.

O presente tema, na atualidade, encontra-se em processo de aprimoramento de seu

caráter científico. Embora não seja uma área nova do Direito, o aumento do interesse de

juristas, em especial advogados, de atuar exclusivamente nessa área, vem crescendo

significativamente nos últimos anos, sobretudo após a promulgação da Constituição de 1988 e

das mudanças incidentes na legislação eleitoral em época recente.

A escolha do tema é fruto do interesse pessoal do pesquisador na área do Direito

Eleitoral, visando compreender esse que é mais um ramo de relevante interesse político e

social inserido no processo de construção dos direitos e garantias dos cidadãos brasileiros no

caminho da conquista da consolidação permanente da Democracia, assim como para instigar

novas contribuições para estes direitos na compreensão dos fenômenos jurídicos-políticos,

especialmente no âmbito de atuação do Direito Eleitoral.

11 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 170-181.

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15

Em vista do parâmetro delineado, constitui-se como objetivo geral deste trabalho:

Fazer um estudo sobre a aplicabilidade da Ação de Investigação Judicial Eleitoral como

instrumento de garantia de idoneidade do processo eleitoral brasileiro.

O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel

em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,

campus de Tijucas.

Como objetivo específico, pretende-se:

a) Demonstrar a evolução histórica do processo eleitoral brasileiro, identificando a

necessidade permanente de se estabelecer instrumentos jurídicos que garantam maior

segurança democrática aos pleitos;

b) Traçar um panorama sobre o sistema eleitoral vigente no País;

c) Fazer um estudo sobre aspectos gerais da Ação de Investigação Judicial Eleitoral,

identificando-a como um dos instrumentos do atual sistema eleitoral que buscam imprimir

uma maior idoneidade possível ao processo eleitoral brasileiro, depois da Constituição de

1988.

A análise do objeto do presente estudo incidirá sobre as diretrizes teóricas propostas

por Djalma Pinto, na obra Direito Eleitoral; Joel J. Cândido, na obra Inelegibilidades no

Direito Brasileiro e; Alberto Rollo, na obra Elegibilidade e Inelegibilidade. Este será, pois, o

marco teórico que norteará a reflexão a ser realizada sobre o tema escolhido.

Não é o propósito deste trabalho encerrar as discussões sobre o tema, chagando a uma

conclusão permanente. Por certo não se estabelecerá um ponto final em referida discussão.

Pretende-se, tão-somente, aclarar o pensamento existente sobre o tema, circunscrevendo-o

como um dos instrumentos do atual Sistema Eleitoral.

Para o desenvolvimento da presente pesquisa foram formulados os seguintes

questionamentos:

a) Qual a importância histórica para a criação de mecanismos que garantam uma maior

segurança jurídica ao sistema eleitoral brasileiro como processo de implantação da

Democracia?

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16

b) Como a Ação de Investigação Judicial Eleitoral pode contribuir para aperfeiçoar o

processo eleitoral brasileiro, conferindo-lhe maior segurança?

Já as hipóteses consideradas foram as seguintes:

a) A fragilidade política do Brasil, marcado por grandes períodos de ausência de

Democracia, faz surgir a demanda por uma legislação eleitoral moderna e capaz de sustentar a

vigência de um sistema plenamente democrático;

b) Enquanto instrumento de segurança do sistema democrático, a Ação de

Investigação Judicial Eleitoral, só poderá ser interposta após o registro da candidatura, pois se

o beneficiário não conseguir ser indicado em convenção partidária, beneficio algum obteve,

pois nem sequer concorreu para o cargo.

Finalmente, buscou-se nortear as hipóteses formuladas com a seguinte variável:

- Muito embora as hipóteses de Inelegibilidades sejam controladas pela Lei 64/90,

base legal da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, eventualmente caso essa venha a ser

modificada, pode interferir na pesquisa.

O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,

delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente a evolução

histórica do Direito Eleitoral brasileiro; a segunda, traçando um panorama geral do Sistema

Eleitoral vigente no país; e, por derradeiro, um estudo sobre a Ação de Investigação Judicial

Eleitoral.

Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado

o dedutivo que, segundo Pasold12, consiste em “[...] estabelecer uma formulação geral e, em

seguida, buscar as partes do fenômeno de modo a sustentar a formulação geral”, e, o relatório

dos resultados expresso na presente monografia é composto na base lógica dedutiva, já que se

parte de uma formulação geral do problema, buscando-se posições científicas que os

sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a prevalência, ou não, das hipóteses

elencadas.

12 PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do direito, p. 88.

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17

Nas diversas fases da pesquisa, serão acionadas técnicas13 de pesquisa do referente14,

da categoria15, do conceito operacional16 e da pesquisa17 bibliográfica.

Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa

e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e

seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais

aprofundados no corpo da pesquisa.

A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta monografia estão em

conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada, Ano 2, número 4;

assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas

úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho

científico.

A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são

apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos

estudos e das reflexões sobre o tema.

13 “[...] é um conjunto diferenciado de informações reunidas e acionadas em forma instrumental para realizar operações intelectuais ou físicas, sob o comando de uma ou mais bases lógicas investigatórias”. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. p. 88. 14 “[...] a explicitação prévia do(s) motivo(s) do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. p. 62. 15 “[...] a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia”. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. p. 31. 16 “Quando nos estabelecemos ou propomos uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos, estamos fixando um Conceito Operacional [...]”. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. p. 45. 17 “[...] atividade investigatória, conduzida conforme padrões metodológicos, buscando a obtenção de informações que permita a ampliação da cultura geral ou específica de uma determinada área [...]”. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. p. 77.

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18

2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA ELEITORAL

BRASILEIRO

Não cabe neste trabalho avaliar os sucessos ou insucessos das administrações políticas

dos entes públicos, pois para isso seria necessária uma coleção de teses doutorandas. Antes, o

objetivo neste primeiro capítulo é traçar uma linha histórica da evolução do processo eleitoral

brasileiro, com todas as suas metamorfoses, desde a proclamação da Independência até os dias

atuais. Para que se possa situar a evolução histórica do processo eleitoral brasileiro é

necessário que se faça um paralelo com a própria história do Brasil.

2.1 A DECLARAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA: AURORA POLÍTICA DA NAÇÃO

A história das eleições no Brasil se confunde com a história da própria Democracia em

nosso país. Um jovem país de 187 anos, marcado por longos períodos sob o jugo de governos

centrais não eleitos de forma democrática. Repleto de presidentes que não conseguiram

cumprir a totalidade de seus mandatos e uma cultura eleitoral que privilegiou, por muito

tempo, a escolha de representantes da elite econômica nacional. Essa poderia ser uma síntese

da história eleitoral da nação tupiniquim.

O Brasil deixou de ser dependente de Portugal em 7 de setembro do ano de 1822,

passando então após esta data, a ter sua própria legislação eleitoral.

A independência do Brasil, enquanto processo histórico se desenhou muito tempo

antes do príncipe regente Dom Pedro I proclamar o fim dos nossos laços coloniais às margens

do rio Ipiranga. De fato, para entender como o Brasil se tornou uma nação independente,

deve-se perceber como as transformações políticas, econômicas e sociais inauguradas com a

chegada da família da Corte Lusitana ao país abriram espaço para a possibilidade da

independência.

Com a vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil, em 1808, houve uma tentativa

de acomodar os ânimos mais exaltados da Colônia, elevando o Brasil à condição de Reino

Unido a Portugal.

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19

A chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil foi episódio de grande importância

para que se possa iniciar as justificativas da independência. Ao pisar em solo brasileiro, Dom

João VI tratou de cumprir os acordos firmados com a Inglaterra, que se comprometera em

defender Portugal das tropas de Napoleão e escoltar a Corte Portuguesa ao litoral brasileiro.

Por isso, mesmo antes de chegar à capital da colônia, o Rei português realizou a abertura dos

portos brasileiros às demais nações do mundo.

Do ponto de vista econômico, essa medida pôde ser vista como um primeiro “grito de

independência” onde a colônia brasileira não mais estaria atrelada ao monopólio comercial

imposto pelo antigo pacto colonial. Com tal medida, os grandes produtores agrícolas e

comerciantes nacionais puderam avolumar os seus negócios e viver um tempo de

prosperidade material nunca antes experimentado em toda história colonial. A liberdade já era

sentida no bolso de nossas elites18.

Nessa época, Portugal sofria os efeitos de uma significativa crise econômica e

financeira. Essa situação era, na verdade, um agravamento de uma realidade que assolava

Portugal desde o século XVIII. A burguesia lusitana, ao perder sua hegemonia colonial, não

conseguia resistir à concorrência britânica, a grande superpotência econômica e naval da

época.19

Nesse cenário de enfraquecimento da monarquia portuguesa em seu próprio território,

era inevitável que ganhassem força no Brasil as aspirações separatistas. Todavia, como grande

parte da história brasileira, as transformações acabaram vindas de cima para baixo. No dizer

de Silva e Costa:

A aristocracia rural brasileira (senhores de terras e escravos) conduziu o processo de ruptura com a Metrópole, sem abalar sua estrutura de privilégios, fundada na organização econômica e social que se definiu ao longo da colonização. Assim, a independência foi efetuada de cima para baixo, com a preocupação de manter a unidade nacional, conciliar os conflitos existentes dentro da própria classe dominante e afastar do processo os setores mais baixos da sociedade (povo e escravos). No início da regência e D. Pedro, a elite agrária não desejava a Independência, contentando-se com a manutenção do Reino Unido, conquistado no período em que o Brasil foi sede do Estado Português. Entretanto, o governo dos revolucionários liberais de 1820 não via o Brasil em um plano de igualdade com Portugal, iniciando, assim, a pressão recolonizadora. A evolução dos acontecimentos ao final do ano 1821, com o aumento das pressões que exigiam a volta do Príncipe-

18 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. São Paulo: CERED, 2000. p. 90. 19 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 90.

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Regente para Portugal (o que deixaria o Brasil à mercê dos planos reacionários das Cortes), colocou a aristocracia rural frente a um dilema perturbador: evitar a regressão, ou seja, o retorno à antiga condição de Colônia, e, ao mesmo tempo, evitar que a ruptura com Portugal assumisse um caráter revolucionário20.

No dia 26 de abril de 1821, obedecendo às determinações das Cortes, D. João VI

retornava para Portugal, levando consigo todo o ouro do Banco do Brasil. Em seguida,

diversas medidas claramente recolonizadoras foram tomadas pela Metrópole, causando

grande insatisfação no Brasil21.

No aspecto eleitoral, antes da edição da primeira lei eleitoral brasileira, no período que

antecedeu a declaração da Independência, o país adotava as regras da lei eleitoral da

Constituição espanhola. Nesse período, três eleições gerais foram convocadas no Brasil,

sendo uma delas para escolha dos deputados que representariam o Brasil nas Cortes de

Lisboa, outra para escolha das juntas governativas das províncias e uma terceira para eleição

dos procuradores das províncias22.

No final de 1821, quando as pressões das Cortes atingiram sua força máxima, os

defensores da independência organizaram um grande abaixo-assinado requerendo a

permanência e Dom Pedro no Brasil. A demonstração de apoio dada foi retribuída quando, em

9 de janeiro de 1822, Dom Pedro I reafirmou sua permanência no conhecido Dia do Fico23.

A partir desse ato público, o príncipe regente assinalou qual era seu posicionamento

político. Logo em seguida, Dom Pedro I incorporou figuras políticas pró-independência aos

quadros administrativos de seu governo. Entre eles estavam José Bonifácio, grande

conselheiro político de Dom Pedro e defensor de um processo de independência conservador

guiado pelas mãos de um regime monárquico24.

Além disso, Dom Pedro I firmou uma resolução onde dizia que nenhuma ordem vinda

de Portugal poderia ser adotada sem sua autorização prévia. Essa última medida de Dom

Pedro I tornou sua relação política com as Cortes praticamente insustentável.

20 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 91. 21 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2001. p. 116. 22 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 116. 23 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 116. 24 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 116.

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Em setembro de 1822, a assembléia lusitana enviou um novo documento para o Brasil

exigindo o retorno do príncipe para Portugal sob a ameaça de invasão militar, caso a

exigência não fosse imediatamente cumprida. Ao tomar conhecimento do documento, Dom

Pedro I (que estava em viagem) declarou a independência do país no dia 7 de setembro de

1822, às margens do rio Ipiranga25.

No dia 14 de agosto de 1822, tendo por objetivo pacificar a província de com a sua

presença, como já havia feito em relação à província de Minas Gerais em abril, D. Pedro

partiu para São Paulo, que estava enfrentando diversos distúrbios internos, afetando,

inclusive, o prestígio de José Bonifácio, o homem forte do governo26.

No dia 7 de setembro de 1822, voltando de Santos, onde tinha ido inspecionar as

defesas do litoral paulista, D. Pedro é surpreendido pelos emissários da Corte, às margens do

riacho Ipiranga, nas proximidades de São Paulo. Depois da leitura da mensagem, que continha

novas ordens da Coroa Portuguesa, uma carta de José Bonifácio e outra de sua esposa, D.

Leopoldina, D. Pedro proclamou a Independência do Brasil27.

A partir da Independência, começam as disputas pelo poder político do Império. As

forças se dividiam, basicamente em liberais e conservadores, com suas variáveis. Silva e

Costa ensinam:

As divergências dentro do Partido Brasileiro, que marcaram o processo final da ruptura definitiva com Portugal, e que prosseguiram durante a montagem do Estado Nacional, revelam a existência de duas alas em que se dividiam as forças liberais brasileiras: a autoritária ou conservadora, constituída pelos liberais moderados, e a radical ou liberal, para alguns estudiosos, liberais radicais. A ala autoritária tinha a vantagem de possuir em seus quadros José Bonifácio, que viria a ser, depois do Fico, o homem forte da regência de D. Pedro. Assim, quando ficou evidente que o rompimento com Portugal era irreversível, essa passou a bater-se pela criação da monarquia centralizada, com as decisões fluindo através de um Executivo forte e, principalmente, pela limitação da participação política28.

A nova realidade política do país trazia consigo a necessidade de se conceber novas

regras que dirigissem o jogo político da pátria recém criada. O país carecia de regras para o

jogo eleitoral.

25 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 91. 26 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 116. 27 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 91. 28 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 117.

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2.2. AS PRIMEIRAS LEIS ELEITORAIS

Em 19 de junho de 1822 foi editada pelo Império, aquela que foi considerada a

primeira lei eleitoral elaborada especialmente para presidir as eleições do Brasil.

As leis anteriores eram basicamente cópias de normas de outros países. Nesse sentido

Ferreira assevera que:

Constituem a primeira lei eleitoral brasileira, isto e, a primeira elaborada especialmente para presidir as eleições no Brasil. Ao contrário da lei eleitoral copiada da Constituição espanhola, esta de 19 de junho de 1822, era perfeita para a época. Toda a matéria eleitoral era bem estruturada e ainda hoje nota-se a sua redação simples e acessível. Não havia, ainda, partidos políticos. O sistema era indireto, em dois graus: o povo escolhia eleitores, os quais, por sua vez, iriam eleger os deputados. Não havia, em primeiro grau (o povo), qualificação ou registro. Somente os seus delegados, os eleitores da paróquia, possuiriam o necessário diploma, uma cópia das atas das eleições. Observemos ainda, que a religião católica era a religião oficial, adotada pela Monarquia portuguesa, o que explica as missas estabelecidas nas Instruções. E, finalmente, que a eleição era única e exclusivamente deputados à Assembléia Geral, não havendo, ainda, assembléias nas províncias29.

A nova legislação estabelecia diversas regras quando à qualificação dos eleitores,

quem poderia ou não votar e como se daria todo o processo eleitoral. Instituía uma forte

participação da Igreja Católica do processo e excluía as classes menos favorecidas

economicamente, como se pode perceber da explicação a seguir:

Antes do dia designado para as eleições, os párocos das freguesas eram obrigados a afixar, nas paredes das suas igrejas editais onde contavam o número de fogos (moradias), ficando eles mesmos responsáveis pela exatidão do censo. O povo de cada freguesia escolhia os seus eleitores (do 2.º Grau). [...] O art. 8.º determinava os que podiam não votar: ‘São excluídos do voto todos aqueles que recebem salário ou soldadas por qualquer modo que seja’, exceto os guarda-livros, os primeiros-caixeiros de casas comerciais, os criados da Casa Real (que não forem de galão branco), e os administradores de fazendas e fábricas30.

Ferreira comenta que:

[...] somente podiam ser eleitores os assalariados das mais altas categorias e os proprietários de terras ou de outros bens que lhes descem renda. Também

29 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 121. 30 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 122.

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não podiam votar ‘os religiosos regulares, os estrangeiros não naturalizados e os criminosos’ (art. 9.º). A restrição ao voto era imposta às classes econômicas menos favorecidas, isto é, não proprietária, não obstante se estendesse o direito do voto às mais altas categorias dos empregados31.

A pouco mais de um ano da independência do Brasil, Dom Pedro I, concede ao povo

Brasileiro, em 25 de março de 1824, a primeira Constituição Política do país. E já no dia

seguinte foram convocadas eleições para a Assembléia Legislativa, sendo que no ato da

convocação, o Imperador expediu as regras que regulariam as referidas eleições32.

Estas regras dispunham em seus arts 90 e 97, sobre alistamento eleitoral, a

Elegibilidade e a forma de apuração dos votos33.

Essas regras pouco diferiam da Lei anterior e ratificavam ainda mais a participação da

Igreja Católica no processo, através das paróquias. As eleições, nas cidades e vilas, eram

realizadas em dia a ser designado pelas respectivas câmaras, e ‘nas freguesias do termo, no

primeiro domingo que a elas chegarem os presidentes nomeados para assistirem este ato’ (art.

8.º)34.

O art. 2.º dizia: “Em cada freguesia deste Império se fará uma assembléia eleitoral, a

qual será presidida pelo juiz de fora, ou ordinário, ou quem suas vezes fizer, da cidade ou vila,

a que a freguesia pertence, com assistência do pároco, ou de seu legítimo substituto” 35.

Do art. 5.º “Os párocos farão afixar nas portas das suas igrejas editais por onde conste

o número de fogos das suas freguesias, e ficam responsáveis pela exatidão”. Os párocos

ficavam encarregados do censo na sua freguesia36.

O povo, isto é, aqueles do povo que tinham o direito de votar, escolheriam os eleitores

de paróquia, cujo número era fácil de calcular: “Toda a Paróquia dará tantos eleitores quantas

vezes contiver o número de cem fogos na sua população (art. 4º)” 37.

31 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 122. 32 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 143. 33 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 34 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 35 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 36 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39.

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Não havia alistamento ou registro prévio dos eleitores, a não ser as relações que os

párocos faziam na Dominga Septuagésima, dos seus fregueses (art. 6.º). A novidade, nesta lei,

era a eleição ser realizada dentro da própria igreja, ao contrário das anteriores, que eram

realizadas nos passos dos conselhos38.

Pela primeira vez, as eleições passavam a ser realizadas no recinto da igreja. O

presidente (juiz de fora ou ordinário), de acordo com o pároco, propunha à assembléia

eleitoral dois cidadãos para secretários e dois para escrutinadores. Seriam aprovados, ou

rejeitados, por aclamação. Formava-se a mesa: presidente, pároco, dois secretários, dois

escrutinadores39.

Cada cidadão que votava escrevia numa folha de papel (cédula), os nomes das pessoas

que escolhia para eleitores de 2.º Grau. Tantos os nomes, com as respectivas ocupações,

quanto os eleitores (2.º Grau) a eleger. Como não havia partidos políticos sem registro prévio

de candidatos, o cidadão votava nas pessoas que bem entendia40.

Essa lei trazia algumas inovações que a diferiam significativamente da lei anterior.

Uma das principais inovações foi a instituição da possibilidade do eleitor que não soubesse

escrever ditar o seu Voto ao secretário da mesa. Além disso, o Voto não se constituía apenas

num direito como também um dever legal. Os eleitores com direito ao Voto não poderiam

deixar de comparecer ao pleito ou enviar um procurador que o representasse, em caso de

ausência com motivo justificado41.

Assim, essa lei diferia substancialmente da anterior, que permitia ao cidadão que não

soubesse escrever ditar ao secretário o nome das pessoas em que votava, e fazer uma cruz,

sinal que seria identificado pelo secretário. O art. 8.º dizia: ‘Nenhum cidadão que tem direito

de votar nestas eleições poderá isentar-se de apresentar a lista de sua nomeação.

Tendo legítimo impedimento, comparecerá por seu procurador enviando a sua lista

assinada e reconhecida por tabelião nas cidades ou vilas, e no termo por pessoa reconhecida e

de confiança’. Esta lei eleitoral instituía, assim, o Voto por procuração. Terminada a eleição, o

37 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 38 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 39 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 39. 40 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 144. 41 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 144.

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secretário organizava a relação dos mais votados, que seriam eleitos ou nomeados, como dizia

a lei: ‘Esta nomeação será regulada pela pluralidade relativa de votos’42.

Antes da declaração da Independência, quem nascia no Brasil era considerado

português. Em 3 de junho de 1822, D. Pedro convocou uma Assembléia Geral Constituinte e

Legislativa com o nome de Assembléia Luso-brasiliense, nome conferido pelo próprio texto

do decreto de criação da Assembléia. Nesse período, podiam votar portugueses nascidos em

todas as partes do Império português, inclusive aqueles nascidos no Brasil43.

Com a declaração da Independência do Brasil, a Constituição de 1824 estabeleceu que

todos aqueles nascidos no Brasil eram cidadãos brasileiros. Também reconhecia como

cidadãos brasileiros todos os nascidos em Portugal que residiam no Brasil na época da

Independência e aderiram a esta, optando por permanecer residindo onde já habitavam antes.

A adesão poderia ser expressa ou tácita, bastando continuar na sua residência para se

considerar a opção pela cidadania brasileira44.

A partir de 1828 o processo eleitoral passou a ser regido por duas leis eleitorais

distintas. Uma delas, sancionada em 26 de março de 1824, regulava as eleições gerais de

senadores e deputados, a outra, sancionada em 1º de outubro de 1828, regulamentava as

eleições para vereadores.

A Lei de 26 de março de 1824 permitia que as eleições, tanto as de primeiro como as

de segundo grau, fossem realizadas segundo as conveniências e circunstâncias nas freguesias

e nos distritos. Não havia simultaneidade em todo o país, na realização das eleições. Um

decreto, de 29 de julho de 1828, determinou que as eleições para a legislatura seguinte fossem

feitas pela Lei de 26 de março45.

Mas, ao mesmo tempo, determinou que, numa mesma província, as eleições primeiras

(1.º grau) deveriam ser realizadas, em todas as freguesias, num mesmo dia. Identicamente, as

eleições secundárias (de 2.º grau). Estabelecia também aquele decreto que os eleitores das

eleições primárias que faltassem sem causa justificada seriam multados numa quantia variável

42 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 43 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 151. 44 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 45 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 151.

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de 30 a 60 mil réis. As deficiências das Instruções de 26 de março de 1824 aos poucos iam

sendo eliminados.

Assim, o Decreto de 6 de novembro de 1828 estabelecia um modo de formação das

mesas dos colégios eleitorais (2.º grau), de maneira a evitar dúvidas. Também o Decreto de 28

de junho de 1830 providenciava sobre alguns detalhes não muito claros quanto à realização

das assembléias (eleições) paroquiais46.

A Lei eleitoral de 26 de março de 1824 trazia uma instrução polêmica. No art. 7.º do

Capítulo II determinava que o eleitor deveria ser homem probo e honrado, e que não pesasse

sobre ele qualquer suspeita de que fosse inimigo da “causa brasileira”.

Essa exigência deve ter dado origem a muitos abusos, pois bastaria que a mesa, no

momento de o cidadão votar, considerasse sem qualquer uma daquelas qualidades, para privá-

lo do Voto. E não havia recurso. No entanto, a avaliação daquelas qualidades era algo

subjetivo, não exibindo padrão que pudesse servir de comparação de medida.

Por isso, o Decreto de 30 de junho de 1830 resolveu o problema dizendo: “1.º As

qualidades exigidas nos eleitores paroquiais pelo art. 7.º do Capítulo II das Instruções de 26

de março de 1824 devem ser avaliadas na consciência dos votantes. 2.º Nenhuma dúvida ou

questão poderá suscitar-se acerca de tais qualidades”. Depois dessas considerações o referido

decreto revogava aquele art. 7.º, menos na parte relativa à “‘intimidade à causa do Brasil”47.

2.3. A PRIMEIRA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E O NOVO DIREITO ELEITORAL

Pela Constituição de 1824 o regente, enquanto perdurasse a menoridade do imperador,

deveria ser eleito pela Assembléia Geral. No dia 12 de agosto de 1834, uma nova lei, que foi

identificada pelo nº 16 alterou a Constituição, mudando o processo de escolha do regente.

Pelas novas regras, os eleitores aptos a elegerem os deputados e senadores, também deveriam

eleger o regente do Império48.

Conforme vimos, a lei eleitoral sancionada em 1º de outubro de 1828, versava sobre as

regras para as eleições de vereadores, substituindo as antigas Ordenações do Reino. Nessa

46 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 152. 47 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 48 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 152.

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primeira regulamentação sobre essa matéria, ficava estabelecido que as Câmaras de todas as

cidades deveriam ser compostas de nove membros e, as Câmaras das Vilas deveriam ser

compostas por sete membros e um secretário. As eleições deveriam ser realizadas a cada

quatro anos. Uma inovação dessa nova lei foi a instituição da necessidade de cadastramento

prévio dos eleitores49.

Mas esta Lei de 1.º de outubro de 1828 determinava que quinze dias antes da eleição,

o “juiz de paz da paróquia fará publicar e afixar nas portas da igreja matriz, e das capelas

filiais dela, a lista geral de todas as pessoas da mesma paróquia, que têm direito de votar [...]”.

(Art. 5º)50.

Essa lei eleitoral, para presidir as eleições municipais, foi a primeira no Brasil a exigir

a inscrição prévia dos eleitores, verdadeiro processo de alistamento compulsório, ex officio. O

art. 6º resolvia que o cidadão que quisesse poderia fazer queixa do fato de ter sido

indevidamente colocado ou excluído da inscrição de eleitores. Se não tivesse razão, pagaria

uma multa de trezentos mil réis51.

Havia também outra multa de dez mil réis para o eleitoral que faltasse à eleição sem

motivo justificado. Essa lei que estamos tratando permitia que o eleitor fosse analfabeto, mas

o sinal (uma cruz), que ele poderia fazer, é substituído pela assinatura de uma pessoa que

assinasse a seu rogo.

O eleitor entregava ao presidente da mesa duas cédulas: uma, com os nomes dos

cidadãos em quem se votava para vereadores; e a outra, com dois nomes, um para juiz de paz

e outro para suplente. Ambas as cédulas eram, no verso, assinadas pelo eleitor ou por outra

pessoa a seu rogo. Os eleitores que não pudessem comparecer, por impedimento grave,

mandariam seus votos, em carta fechada, ao presidente da Assembléia, “declarando o motivo

por que não compareceram” (art. 8º)52.

É importante destacar o fato de que esse alvorecer da nação e a instituição de suas

primeiras normas legais não se deram de uma forma absolutamente pacífica. Diversas

agitações abalaram o Império nesse período. A política vivia uma verdadeira ebulição de

49 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 152. 50 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009.. 51 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 160-161. 52 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009.

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aspirações, com pessoas de todos os pensamentos desejando ter o controle de parte do poder

do jovem país. As principais modificações no processo eleitoral nesses primeiros anos foram

em decorrência de lutas políticas53.

A partir de 1831 começam a surgir os primeiros partidos políticos oficiais, pelos quais

os principais segmentos passaram a lutar por posições no governo54.

Até 1831, não havia partido político. A luta estabelecia-se entre governo e oposição, e

essas facções recebiam nomes pitorescos. Em 1831, aparecem, na cena política, os primeiros

partidos: Restaurador, Republicano e Liberal. O primeiro pugnava pela volta de D. Pedro I; o

segundo, pela abolição da monarquia; o terceiro, pela reforma da Constituição de 1824, mas

conservada a forma monárquica.

Os liberais dividiam-se em duas alas: moderados e exaltados. Em 1837, aparece o

Partido Conservador, em oposição ao Liberal. O Conservador pugnava pela unidade do

Império sob o regime representativo e monárquico, e resistia a quaisquer inovações políticas

que não fossem maduramente estudadas55.

O surgimento desses partidos fez surgir também um furor ainda mais acirrado que

norteavam as disputas eleitorais. As discussões, antes das eleições, basicamente se restringiam

ao campo do Poder Legislativo em todas as suas instâncias56.

Todavia, quando as eleições se aproximavam, vinham com ela todas as paixões dos

militantes partidários. Como a legislação eleitoral era frágil para garantir a ordem e lisura do

processo. Vigoravam espaços para toda sorte de fraudes, corrupções e armações57.

A Lei eleitoral de 26 de março de 1824 falhava na organização das mesas eleitorais,

que em geral eram irregulares, facciosas, arbitrárias. Como não havia nenhum alistamento ou

registro provisório de eleitores, a mesa era absoluta para julgar da qualidade dos votantes,

negando-lhes o direito de Voto, se quisesse. Em 1837, as fraudes no colégio de Lagarto, em

Sergipe, foram tantas, que o governo resolveu anular as eleições de deputados por essa

província.

53 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 160-161. 54 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 55 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 168. 56 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 57 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 168.

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29

No ano de 1842, é sancionada uma nova lei, as Instruções de 4 de maio de 1842, que

estabelecia regras para as eleições gerais e provinciais. A nova legislação foi considerada um

avanço importante no processo de construção das leis eleitorais brasileiras58.

Este novo Sistema Eleitoral constitui um marco importante na história da evolução das

leis eleitorais brasileiras. O Capítulo I tratava do alistamento dos cidadãos ativos e dos Fogos.

A Lei eleitoral de 1.º de outubro de 1828, para eleição de vereadores, já cuidava de uma

relação prévia de eleitores, a ser organizada pela primeira vez no Brasil, dispunha, em

capítulo especial, sobre o alistamento de eleitores59.

Segundo o art. 1.º, em cada paróquia seria formada uma junta de alistamento, sendo

presidente o juiz de paz do Distrito; outro membro seria o subdelegado, na qualidade de fiscal

da junta; e o terceiro membro da junta seria o pároco. Entretanto essa junta nasceu sob

grandes apreensões, pois, por uma lei anterior, de 3 de dezembro de 1841, que reformava o

Código do Processo Criminal, as autoridades agora investidas no cargo de membros da junta

pareciam oferecer um aspecto de intervenção do governo60.

Em 1846 foi sancionada aquela que seria considerada como uma das leis eleitorais

mais importantes do período monárquico do Brasil. Foi a primeira vez que uma proposta de

lei eleitoral foi apresentada por um parlamentar. Antes dessa lei, todas as normas anteriores

eram concebidas pelo Poder Executivo61.

Enviada ao imperador, a nova lei eleitoral foi por ele assinada em 19 de agosto de

1846. Ficavam, e conseqüência, revogadas todas as leis e disposições anteriores, em matéria

eleitoral. Essa Lei eleitoral de 19 de agosto de 1846 é um marco importante na história da

evolução dos regimes eleitorais brasileiros. Procurava ser a mais perfeita e completa para a

época. E provavelmente o era62.

Foram necessários, entretanto, vinte e cinco anos de experiência, desde as primeiras

eleições gerais brasileiras, para que se chegasse àquele resultado. A eleição, por esta nova lei,

continuaria, entretanto, a ser indireta, em dois graus; os eleitores do primeiro grau elegiam os

58 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 168. 59 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 60 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 173. 61 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 62 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 181-182.

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do segundo grau, que por sua vez iriam eleger os senadores, deputados e membros das

assembléias legislativas provinciais. Esta Lei de 19 de agosto de 1846, além da eleição desses

representantes, também dava instrução sobre a eleição das autoridades municipais. Isto é,

juízes de paz e câmaras municipais63.

Apesar de sua chegada festejada, a Lei eleitoral de 19 de agosto de 1846 foi objeto de

protestos por parte de alguns segmentos políticos da época. O próprio Governo reconhecia sua

dificuldade em colocá-la em prática64.

No ano de 1849, com a edição de instruções que visavam sanar as dificuldades da Lei

eleitoral de 19 de agosto de 1846, o Governo tenta manter a sua vigência sem a necessidade

de uma reforma. No entanto as instruções não foram suficientes para resolver os problemas

existentes.

Assim, em 19 de setembro de 1855, um novo decreto era assinado pelo imperador D.

Pedro, instituindo uma nova lei eleitoral que alterava a lei anterior. A nova lei continha apenas

20 artigos e ficou conhecida como Lei dos Círculos, imprimindo profundas alterações no

processo eleitoral existente até antão65.

Um dos pontos importantes da nova lei eleitoral, que seria discutida e votada, era o da

representação das minorias. Dizia a comissão que era essencial distinguir nos sistemas da

representação das minorias ou da representação proporcional os diversos processos sugeridos.

Estes poderiam ser empíricos ou racionais:

[...] pelo processo empírico obteria somente a representação de minorias; pelo processo racionaria também a representação das minorias, porque a proporcionalidade é a garantia do resultado. Entre os processos empíricos, existia a pluralidade simples, o voto limitado, o voto cumulativo, o voto plural e o voto por pontos. Entre os processos racionais são classificados a representação pessoal como o voto contingente, o voto sucessivo como o voto eventual, a lista livre com voto simultâneo, o sufrágio uninominal com o voto transferível66.

63 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 181-182. 64 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 65 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 225-226. 66 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 225-226.

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Também nessa época, destacam-se o surgimento de diversos partidos políticos. Em

1870, existiam oficialmente seis partidos: o Partido Liberal, o Partido Conservador, o Partido

Progressista, O Partido Liberal-Radical, o Partido Liberal e o Partido Republicano.

Um pouco depois de 1870, diversos conflitos começaram a surgir no campo político

em torno da pretensão de se elaborar uma nova lei eleitoral. As principais razões dos

descontentamentos giravam em torno da grande incidência de fraudes eleitorais e casos de

corrupção. A inexistência de um título de eleitor favorecia também a ocorrência de fraudes.

As lutas políticas no Império travavam-se, em grande parte, em torno do Sistema

Eleitoral. As fraudes, a corrupção, a intervenção das autoridades no dia das eleições, a

inexistência de título de eleitor, a eleição indireta (em dois graus), o processo de eleição, as

restrições do voto (privilégio), as incompatibilidades, etc. eram os temas em torno dos quais

se travavam acesos debates67.

Era o Partido Liberal o que mais agitava esses problemas. No entanto, todos os

partidos procuravam pôr o próprio regime monárquico acima das disputas políticas. Foi o

Partido Republicano que, aproveitando-se das circunstâncias e num hábil sofisma político,

levou à conta do próprio regime monárquico todas as agitações políticas. Na Assembléia

Geral, cuidou-se da reforma da legislação eleitoral68.

Depois de votada, foi enviada à sanção do Imperador. Assinada no dia 20 de outubro

de 1875, e cujo decreto tomou o número 2.675, não constituiu uma lei geral que substituísse a

de 1846. Em verdade, a Lei de 1846 não foi revogada.

Simplesmente, nela foram introduzidas inovações e modificações que objetivaram

aperfeiçoá-la. Em si mesmas, as disposições do Decreto n. 2.675, de 20 de outubro de 1875,

formavam um conjunto sem ordem alguma. Entretanto, a regulamentação desta lei apareceria

pelo Decreto n. 6.097, de 21 de janeiro de 1876, formando um todo harmônico com a Lei

Eleitoral Geral de 1846 (Decreto n. 387). Aliás, esta regulamentação combinava não somente

essas duas leis, mas também todas as disposições esparsas, decretadas após 184669.

Essa Lei eleitoral de 20 de outubro de 1875 criava as juntas paroquiais de qualificação,

que ficavam encarregadas da organização das listas dos eleitores de 1.º grau, ou seja, de sua

67 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 226. 68 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 69 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 226.

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respectiva paróquia. As juntas eram compostas pelos próprios eleitores, em eleição interna

realizada três dias antes do início dos trabalhos de qualificação dos eleitores70.

É importante destacar que essa Lei eleitoral de 20 de outubro de 1875 foi a primeira

norma brasileira que incumbiu à Justiça o papel de dirimir dúvidas em relação ao processo

eleitoral. Não se tratava ainda da criação de uma Justiça Eleitoral, mas apenas a designação à

Justiça comum de importantes atribuições71.

Em 12 de janeiro de 1876 é sancionado o Decreto n. 6.097, pelo qual eram concebidas

instruções regulamentares para execução do Decreto n. 2.675, de 20 de outubro de 1875,

mesclando o mesmo com a Lei eleitoral de 184672.

Desde 1973, quando o governo enviou à Câmara um novo projeto de Lei Eleitoral,

existia uma grande polêmica quanto à garantia da representatividade das minorias. Como a

representação proporcional era um sistema novo, havia ainda muito receio na sua aplicação73.

Depois de um longo período de discussões sobre o tema, a Lei eleitoral de 1875,

também conhecida como Lei do Terço, instituía um sistema pelo qual os partidos ou

coligações vencidas poderiam ocupar um terço das vagas em disputa74.

A Lei do Terço não era um processo proporcional. Simplesmente dividia os cargos

eletivos a preencher em dois terços para a maioria e um terço para a minoria. Mas os partidos

geralmente não se apresentavam sozinhos, e sim em coligações75.

A coligação que vencesse, ganhando os dois terços, seria formada de elementos de

mais de um partido. E nas câmaras seria difícil garantir que a unidade obtida nas eleições seria

70 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29set. 2009. 71 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 72 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 226. 73 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 74 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 248. 75 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009.

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mantida no plenário. Assim, maioria era um conceito que se relacionava mais com uma

vitória eleitoral do que propriamente com uma organização de governo76.

O primeiro título de eleitor do Brasil foi instituído, também, em 1875, pelo Decreto n.

2.675. Antes dele, desde a proclamação da independência, os eleitores eram apenas

identificados no momento da eleição e de acordo com as regras pré-estabelecidas. Existia uma

qualificação do eleitor no momento do pleito77.

Com a instituição do primeiro título, não foram extintas as juntas de qualificação, às

quais incumbia sua distribuição entre os eleitores. No parecer de Ferreira:

A referida regulamentação também adotou um modelo de título, cujo clichê publicamos juntamente com este capítulo. Esse modelo era enviado às câmaras municipais das províncias, as quais deveriam mandar imprimi-los e fornecê-los às juntas de qualificação. Os títulos não eram impressos avulsamente, mas sim constituíam livros-talões. Observe-se o clichê do modelo que publicamos: junto à vinheta vertical onde se lê “Império do Brasil”, corria uma linha onde era destacado o título. A parte à esquerda constituía o canhoto do livro-talão de títulos. Os títulos eram assinados pelo secretário da Câmara Municipal e pelo presidente da junta. O votante (1.º grau) assinava o título. Se não soubesse ler nem escrever, poderia alguém assinar a seu rogo, no momento de retirá-lo. Conforme se poderá verificar no modelo, a lei exigia o número do título, o nome da província, do município, da paróquia, do distrito e do quarteirão. (por quarteirão subentendiam-se os bairros rurais distantes). Relativamente ao votante devia constar no título seu nome, idade, estado civil, profissão, renda, filiação, domicílio e elegibilidade, isto é, se era somente simples votante (1.º grau) ou se podia ser eleitor (2.º grau). Havia também a seguinte observação: Declarar-se-á especialmente se sabe ou não ler e escrever78.

Ao sancionar uma nova lei eleitoral, no dia 9 de janeiro de 1881, pelo Decreto n.

3.029, o imperador revogava todas as normas anteriores. Diversas inovações foram trazidas

pelo Decreto de 1881, também chamada de Lei do Censo ou Lei Saraiva. Destaque ao fato de

que os senadores, deputados da Assembléia Geral e membros da Assembléia Legislativa

ficavam proibidos durante o exercício de seus mandatos e até seis meses após o término, de

ocuparem comissões ou empregos remunerados no governo geral ou provincial79.

76 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 77 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 248. 78 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 251-252. 79 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009.

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A Lei Saraiva foi considerada uma das normas eleitorais de maior significado para a

vida política brasileira. Suas inovações foram responsáveis por profundas mudanças nas

configurações políticas do país80.

Em 14 de outubro de 1887, foi sancionada pela princesa regente Isabel aquela que

seria a última lei do Império. Basicamente, essa nova norma teve como objetivo modificar as

eleições dos vereadores das câmaras municipais e dos membros das Assembléias Legislativas

provinciais. Era mantida quase a totalidade das regras implantadas pela Lei Saraiva. Ao se

aproximar o fim do período imperial, o Brasil possuía uma legislação eleitoral considerada

por muitos, como completa.

Ao findar o Império, a 15 de novembro de 1889, o Brasil possuía uma legislação

eleitoral perfeita. A Lei Saraiva, de 1881, foi a culminância de um processo evolutivo que

durou 67 anos, desde os primeiros dias da independência81.

Durante todo o Império, os partidos, os políticos nas Assembléias, os jornais, os

publicistas, enfim, a classe dirigente da sociedade esteve voltada para o aperfeiçoamento do

sistema eleitoral. Esse esforço culminou com a Lei Saraiva, que colocou o Brasil entre as

nações civilizadas82.

A República, ao instalar-se aos 15 de novembro de 1889, nada teria a fazer, em

matéria eleitoral, senão suprimir os privilégios (do Voto, das Elegibilidades) e adaptar aquela

legislação á nova organização político-administrativa do país. Permaneceria a essência da

legislação eleitoral do Império, o espírito que a ditou, e que nada mais visava senão dotar o

país de uma instituição que fosse perfeita para a época, como realmente foi. A República, para

poder sobreviver nos seus primeiros anos, teria de demolir aquele magnífico edifício que era a

Lei Saraiva83.

E ao iniciar-se dessa maneira, a República daria o mau exemplo que seria seguido

durante quase meio século, origem dos nossos males políticos durante todo esse interregno: as

leis eleitorais feitas para ganhar eleições84.

80 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 251-252 81 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 82 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 252. 83 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 84 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 284-285.

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Com o fim do Império, se encerrava um ciclo na história política do país. Embora os

anos tenham trazido amadurecimento ao processo de construção legislativa da nação, a

instituição da República traria um novo começo, marcado por um longo período de

desconstrução. Um novo momento na história do Brasil começava85.

A partir de 1874, o Brasil teve avanços significativos na indústria. A lavoura do café

se desenvolvia, a exportação de borracha crescia e se consolidava um mercado interno, graças

ao aumento da utilização de mão de obra assalariada. Os setores de transportes e financeiro

também sentiam os reflexos dos novos tempos. Começava uma tendência à urbanização.

Nesse contexto, o Regime Monárquico se revelava incompatível com a nova realidade. Era

necessária a implantação de um novo sistema de governo, capaz de conceder maior autonomia

aos entes da federação86.

O movimento republicano iniciou-se em 1870, com a fundação do Clube Republicano

e do jornal A República e o lançamento de um Manifesto Republicano. Duas correntes se

chocaram no Partido Republicano: a evolucionista (liderada pelos republicanos históricos),

que preferia a via pacífica para conseguir o poder e a revolucionária (liderada por Silva

Jardim), que pregava a revolução popular.

A corrente evolucionista predominou.

Em 15 de novembro de 1889, através de um movimento onde se reuniram republicanos e militares, foi proclamada da República e o fim do Império. Como chefe do governo provisório foi indicado o Marechal Deodoro da Fonseca, que gozava de grande prestígio dentro do exército87.

A proclamação da República trouxe consigo o começo de um novo período na história

da legislação eleitoral brasileira. O primeiro ato da fase republicana foi o Decreto n. 6, de 10

de novembro de 1889, editado pelo governo provisório, que assumiu a administração do

Brasil logo após a proclamação, e era chefiado pelo Marechal Deodoro da Fonseca. No dizer

de Ferreira:

Era o sufrágio universal. Caiam, pois, todos os privilégios eleitorais do Império. A 3 de dezembro de 1889, o governo provisório nomeou uma comissão de cinco membros para redigir um projeto de Constituição. A 21

85 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009. 86 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 285. 87 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 289.

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de dezembro desse mesmo ano, era decretada a convocação de uma Assembléia Geral Constituinte, que se deveria reunir a 15 de novembro de 1890. Quando os futuros deputados à Constituinte se reunissem, já receberiam do governo provisório o projeto de Constituição elaborado pela comissão de cinco membros. Pouco teriam a fazer os representantes do povo. A República foi um regime outorgado ao povo brasileiro. Aliás, os regimes políticos no Brasil nunca foram submetidos à escolha do povo. A este, sempre, só foi dado escolher os dirigentes dos regimes recém-inaugurados. Os republicanos de 89 temiam que as primeiras eleições para escolha dos representantes do povo à Constituinte fossem transformadas em consulta popular, pois poderia ser eleita uma maioria monarquista88.

Em 8 de fevereiro do ano de 1890, era assinado pelo Marechal Deodoro da Fonseca,

chefe do governo provisório, o regulamento eleitoral, identificado como Decreto n. 200-A e

tratava basicamente da qualificação de eleitores. Nesse sentido Ferreira ensina que:

A qualificação eleitoral seria feita por comissões distritais compostas de três membros: juiz de paz, subdelegado da paróquia e de um cidadão que tivesse as qualidades de eleitor, que fosse residente no distrito e que seria nomeado pelo presidente da Câmara. (Não obstante a República já tivesse substituído o vocábulo paróquia por município, ele ainda aqui aparece por força de costume). Para ser eleitor, o cidadão deveria provar, no momento da qualificação, que sabia ler e escrever e, também, que residia há mais de seis meses no distrito. Essa qualificação seria revista por uma segunda comissão, municipal, e formada de um juiz municipal (presidente), do presidente da Câmara e pelo delegado de polícia. Esta segunda comissão podia eliminar eleitores da lista organizada pela primeira. Dos cidadãos excluídos, havia recurso ao juiz de direito. Não obstante este recurso é de notar que tanto a primeira como a segunda comissões de qualificação eram integradas por elementos diretamente dependentes do governo89.

Esse Decreto n. 200-A de fevereiro de 1990, o qual fora organizado pelo ministro do

Interior, Aristides Lobo, versava basicamente sobre a qualificação dos eleitores. Em 23 de

junho de 1890, pelo Decreto n. 511, organizado pelo novo ministro do Interior, José Cesário

de Faria Alvim, foi apresentada uma nova norma eleitoral, também chamada de Regulamento

Alvim.

O Regulamento Alvim constava de três capítulos e 71 artigos, e era, em grande parte,

baseado na Lei Saraiva, quanto ao processe da eleição:

Pelo Capítulo I, art. 1.º, era exigência para o cidadão ser elegível: 1.º estar na posse dos direitos do eleitor; 2.º para a Câmara, ter mai de sete anos como cidadão brasileiro, e mais de nove para o Senado. Pelo artigo 2.º eram inelegíveis: 1.º os clérigos e religiosos regulares e seculares de qualquer

88 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 289-290. 89 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 295-296.

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confissão; 2.º os governadores; 3.º os chefes de polícia; 4.º os comandantes de armas, bem como os demais funcionários militares que exercessem comandos de forças de terra e mar equivalentes ou superiores; 5.º os comandantes dos corpos de polícia; 6.º os magistrados; 7.º os funcionários demissíveis ad nutum90.

O Congresso que fora convocado com as atribuições de Assembléia Constituinte foi

instalado em 15 de novembro de 1890. O Congresso recebeu o projeto da nova Constituição

do próprio governo provisório e, apenas dois meses após sua instalação, em janeiro de 1891,

aprovava a primeira Carta Magna da República, a Constituição da República dos Estados

Unidos do Brasil91.

Esta primeira Constituição do Período Republicano previu eleições por sufrágio direto

da nação e maioria absoluta de votos para Presidente e Vice-Presidente da República. Exigia

maioria absoluta entre os votados; isso não ocorrendo, o Congresso elegia um entre os dois

mais votados, por maioria dos votos presentes. Previu, também, inelegibilidades para os

cargos de presidente e vice-presidente da República, deixando para a lei ordinária regular o

processo de eleição e de apuração92.

A primeira lei eleitoral Republicana foi editada logo após a promulgação da

Constituição de 1891, em 25 de janeiro de 1892, identificada como n. 32. O Congresso

elaborou e aprovou a nova lei eleitoral e o presidente Floriano Peixoto sancionou-a. Constava

de 66 artigos e mais parágrafos. A lei cuidava dos eleitores, discriminando os que podiam e os

que não podiam ser qualificados, segundo os preceitos constitucionais93.

O alistamento era preparado por comissões seccionais (dos municípios) e

definitivamente organizado por uma comissão municipal.

As comissões seccionais eram organizadas com cinco membros, todos cidadãos

eleitores escolhidos pelos governos municipais. Os presidentes das comissões municipais

eram os próprios presidentes das câmaras municipais (governos municipais). Havia recurso

para uma junta eleitoral da capital do estado respectivo94.

90 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 301-302. 91 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. Bauru: Edipro, 1996. p. 21. 92 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 21. 93 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 21. 94 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 21.

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Os títulos de eleitor eram iguais aos da lei anterior. As condições de Elegibilidade (a

lei só tratava dos mandatos aos cargos federais, isto é, senadores e deputados), eram as

contidas na Constituição.

As incompatibilidades eram poucas, não podendo ser votadas (para senador ou

deputado): os ministros do presidente da República e os diretores de suas secretarias e do

Tesouro Nacional; os governadores ou presidentes e seus vices: os ajudantes-generais do

Exército e da Armada; os comandantes de distrito militar no respectivo distrito; os

funcionários militares investidos de comando, inclusive policiais; as autoridades policiais; os

membros do Poder Judiciário; os magistrados; os funcionários demissíveis ad nutum. Havia a

incompatibilidade, que deveria ser verificada seis meses antes das eleições95.

Posteriormente, a Lei eleitoral n. 69, de 1 de agosto de 1893, tratava somente sobre a

qualificação dos eleitores para as eleições de deputados federais. Outras inovações foram

introduzidas por diversas normas eleitorais elaboradas nestes primeiros anos da República.

No dia 15 de novembro de 1904 a nova lei eleitoral da República, identificada pelo n.

1.269, foi sancionada pelo presidente Rodrigues Alves. A nova lei revogava a Lei eleitoral n.

35.

O alistamento dos eleitores seria preparado, em cada município, por uma comissão

especial. Os coletores (exatores) extrairiam dos livros de lançamento de impostos uma lista

dos maiores contribuintes do município, assim classificados: 15 do imposto predial e 15 dos

impostos sobre propriedade rural ou de indústrias e profissões.

Essas listas seriam tornadas públicas. Quatro meses após, o juiz de Direito da comarca

convocaria aqueles contribuintes e os membros do governo municipal para se reunirem dali a

dez dias. Seria, então, constituída a comissão de alistamento de eleitores: o juiz de Direito,

dos maiores contribuintes de imposto predial, mais dois dos impostos sobre propriedade rural

e, finalmente, mais três cidadãos eleitos pelos membros do governo municipal96.

Para ser eleitor, o cidadão deveria se encaixar nos seguintes requisitos:

1º idade mínima; 2º saber ler e escrever, para isso escrevendo de próprio punho, em livro especial, seu nome, estado civil, filiação, idade, profissão e

95 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 315-316. 96 MOREIRA, Ricardo. Sistema eleitoral brasileiro: evolução histórica. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3468>. Acesso em: 29 set. 2009.

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residência. Havia recursos, revisões de alistamento (periódicos) e títulos de eleitores97.

Após a Lei n. 1.269 de 15 de novembro de 1904, diversas normas eleitorais foram

editadas, no entanto, não se pode considerar que houve grandes inovações ou quaisquer

aperfeiçoamentos significativos. Até 1930, as normas eleitorais ficaram conhecidas como

permissivas de um sistema falho e permeado de fraudes e toda sorte aberrações98.

Faz-se necessário observar, portanto, que na época do império o processo eleitoral era

arbitrário e discricionário, permanecendo assim, por mais de meio século. Nem mesmo a

Proclamação da República que ocorreu em 15 de novembro de 1889, foi capaz de interferir ou

modificar as regras eleitorais da época.

Neste sentido assevera Joel José Candido:

A maioria dos autores que se dedicou ao estudo da evolução das leis eleitorais e suas repercussões divide o período republicano em dois: da proclamação em 1889, até 1930, com a Revolução; e desta, até nossos dias. A razão maior desta divisão é histórica, mais que didática. É que na 1° República a legislação continuou esparsa, sensivelmente ainda influenciada pelas praticas que vigoraram no Império99.

Para a história da legislação eleitoral brasileira, o período trazido a partir da revolução

de 1930 pode ser considerado o de maior evolução, cujas transformações permanecem, na sua

maioria, até os dias de hoje.

A legislação eleitoral que surgiu no Brasil após a Revolução de 1930 e até os dias de

hoje caracteriza um dos mais importantes períodos da vida política brasileira:

Inicialmente, a instituição de uma Justiça Eleitoral independente de injunções políticas, e que coloca o Brasil acima dos países mais civilizados do globo; a instituição do voto feminino; a adoção da representação proporcional; o registro de partidos políticos; a cédula oficial e única nas eleições majoritárias; a volta à unidade nacional em matéria eleitoral, retirando dos estados o direito de legislar e restabelecendo o sistema que prevaleceu no Império100.

97 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 341-342. 98 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. 99 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 25-26. 100 FERREIRA, Manoel Rodrigues. A evolução do sistema eleitoral brasileiro. p. 356.

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Após a revolução de 1930, surge o primeiro avanço significativo na legislação

eleitoral brasileira, trazida pelo Decreto n. 21.076, de 24 de 1932, o qual instituiu o primeiro

Código Eleitoral brasileiro, que tratou sistematicamente de toda a matéria eleitoral.

Cândido enumera as seguintes características trazidas pelo advento do Código

Eleitoral de 1932:

No Código Eleitoral de 1932 foi criada a justiça eleitoral; o voto feminino; a representação proporcional; o voto secreto em cabina indevassável; o sufrágio era universal e direto; a eleição era direta e em dois turnos. O domicilio eleitoral era de livre escolha do eleitor; delegou-se a lei especial os casos de inelegibilidades; todas as eleições eram reguladas pelo código; o eleitor era parte legitima para a ação penal; a competência para processar e julgar os crimes eleitorais era do tribunal Regional e aos juízes incumbia apenas a preparação dos processos ou a instrução desde que expressamente para tal designados; o prazo prescricional de qualquer crime eleitoral era de 10anos. O ministério Público, inclusive o Ministério Publico Estadual, sem capitulo próprio no Código, tinha nele aparecimento apenas episódico101.

A Justiça Eleitoral foi recepcionada pela Constituição de 1934, a qual tratou pela

primeira vez na historia do Brasil, da jurisdição eleitoral.

Esta carta teve um grande mérito de criar, no seio da constituição porquanto já havia

sido criada pelo Código Eleitoral (Decreto n 21.076, de 24.02.32) – a Justiça Eleitoral como

órgão do Poder Judiciário (art.63, d).

Atribuiu jurisdição eleitoral plena aos juízes vitalícios, na forma da lei (art.82,

Parágrafo 7º).

Estabeleceu a competência privativa da Justiça Eleitoral para o processo das eleições federais, estaduais e municipais, inclusive a dos representantes das profissões (art.83, caput) competência essa que ia desde em organizar a divisão eleitoral do país até o poder de decretar a perda do mandato legislativo, passando pela competência para processar e julgar os delitos eleitorais e os comus que lhe fossem conexos102.

Dispôs, também sobre o alistamento, direitos políticos e inelegibilidades (arts. 108 a

112), assim como sobre as eleições para Presidente da República (art. 52)103.

101 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 22. 102 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009. 103 CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral brasileiro. p. 23-24.

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Em 1935 um novo Código Eleitoral foi promulgado, recepcionando praticamente todo

o conteúdo do Código anterior, trazendo apenas algumas alterações:

[...] todas as eleições, federais, estaduais e municipais; as mulheres só eram obrigadas a se alistar se exercessem função pública remunerada (CF, 1934, art. 109); o voto era secreto e havia sistema de representação proporcional para os parlamentos; dispôs sobre juntas Especiais para a apuração somente de eleições municipais; como órgãos da Justiça Eleitoral; os juízes adquiriram parcial competência decisória em matéria criminal eleitoral; dispôs, em longo capítulo próprio (arts. 49 a 57), pela primeira vez, sobre o Ministério Público, proibindo o procurador – Geral atividades político-partidárias e, inclusive, regulando a ampla participação do Ministério Público dos Estados em todas as fases do processo; reduziu sensivelmente, a prescrição por crime eleitoral, para 5 anos (casos com pena privativa de liberdade) e para 2 anos (demais casos), aceitando as hipóteses de sua suspensão e interrupção prevista na lei penal comum; restringiu a regra do domicilio eleitoral, obrigando-o a coincidir com o domicilio civil; elencou, longamente, as inelegibilidades delegando a constituição e as leis estaduais o direito de aumentar esse elenco104.

Apenas cinco anos após sua criação, a Justiça Eleitoral é extinta em 1937 pela

Constituição do Estado Novo. Em 28 de fevereiro de 1945, a Lei Constitucional n. 9, ensejou

a edição do Decreto n. 7.586, de 28 de maio de 1945, que recriou a Justiça Eleitoral105A

Justiça Eleitoral foi mantida pela Constituição de 1946, que fixou suas competências, casos de

Inelegibilidades e direitos políticos. A partir desta Constituição, a União passou a ter

competência privativa para legislar sobre Direito Eleitoral106.

As constituições de 1967 e 1969 trataram de questões relacionadas aos direitos

políticos, partidos políticos e regulou a Justiça Eleitoral dentro dos órgãos do Poder

Judiciário107.

2.4 A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O DIREITO ELEITORAL NA ATUALIDADE

O Brasil vivia sob o jugo de um regime autoritário de uma ditadura militar desde 1964.

A Constituição de 1967 foi imposta pelo governo de exceção. Além disso, principalmente a

década de sessenta foi marcada pela edição dos chamados Atos Institucionais.

104 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009. 105 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 23-24. 106 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 23-24. 107 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009.

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Nesse período, os direitos individuais e sociais foram suprimidos, inclusive muitos

direitos eleitorais.

A abertura política, iniciada por volta de 1979 foi finalizada em 1985 com a eleição,

ainda pelo Colégio Eleitoral, de Tancredo Neves para assumir como primeiro presidente da

República civil, depois de mais de 20 anos de ditadura. Em 21 de abril do mesmo ano, o

presidente eleito, morre mesmo antes de ter sido empossado. Em razão do falecimento de

Tancredo, assume a presidência, seu vice, José Sarney (hoje presidente do Senado Federal)108.

Essa saída do regime ditatorial fazia crescer um anseio popular por uma nova Carta

Magna, capaz de defender valores da Democracia e criar mecanismos legais e de impedir no

futuro, que o país repetisse sua história recente de autoritarismo e desrespeito aos direitos

individuais109.

Em 27 de julho de 1988, o Deputado Federal Ulysses Guimarães, presidente da

Assembléia Nacional Constituinte, promulgava a atual Carta Magna, declarando as seguintes

palavras: “Essa será a Constituição Cidadã, porque recuperará como cidadãos milhões de

brasileiros, vítimas da pior das discriminações: a miséria [...] O povo nos mandou aqui para

fazê-la, não para ter medo. Viva a Constituição de 1988! Viva a vida que ela vai defender e

semear110”.

A Constituição de 1988 conseguiu contemplar uma série de direitos e garantias

individuais, sociais e políticas. No aspecto eleitoral, seu grande objetivo era consolidar a

Democracia como regime vigente e permanente no país.

Entre as principais conquistas no campo eleitoral, Cândido enfatiza:

A atual Constituição regulou os Direitos Políticos (arts. 14 a 16) e dispôs sobre os Partidos Políticos (art. 17), mantendo a Justiça Eleitoral dentro do Poder Judiciário, como um de seus órgãos (art. 92, V e arts. 118 a 121). Regulou amplamente a eleição para Presidente e Vice-Presidente da República, indicando as substituições e seu processo, nos casos de impedimento e vacância. No ato das Disposições Constitucionais

108 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 23-24. 109 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009. 110 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009.

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Transitórias contém vários artigos referentes ao Direito Eleitoral, mormente sobre plebiscito, mandatos e eleições (arts. 2.º, 4.º, 5.º, etc)111.

Enfim, a Constituição de 1988, pode, de fato, ser chamada de Constituição Cidadã,

como bem declarou o saudoso deputado federal Ulysses Guimarães. No entanto, as conquistas

no campo do Direito Eleitoral, advindas a partir daí, não se restringem à Constituição de

1988112.

Desde a promulgação da atual Carta Magna, o Brasil teve diversas e profundas

alterações em sua norma eleitoral. Essas transformações serão objeto de estudo nos próximos

capítulos desta pesquisa, onde se buscará traçar um perfil completo do atual Sistema Eleitoral

brasileiro113.

Não cabe aqui nenhuma conclusão precipitada, senão apenas a percepção preliminar

de que a história do Direito Eleitoral, embora muitas conquistas, não é um processo acabado,

mas apenas uma metamorfose permanente, em busca da implantação de uma sociedade

democrática e com justiça social.

111 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009. 112 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. p. 21-22. 113 ANGELO, Vitor Amorim de. Contexto histórico e político. UOL educação. Disponível em: <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/constituicao-1988.jhtm>. Acesso em 25 jul. 2009.

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3 O DIREITO ELEITORAL NO BRASIL CONTEMPORÂNEO

3.1 A DEMOCRACIA POPULISTA

Durante o período compreendido a partir de 1946 o Brasil viveu sob o signo da

Democracia populista, numa fase denominada República Liberal; seguiram-se depois os vinte

e um anos do Estado Autoritário, iniciado com o golpe de 1964 e encerrado nas eleições

diretas de janeiro de 1985, com a vitória de Tancredo Neves. A partir daí, teve início a última

fase, marcada pelo fim do autoritarismo e pelo retorno à normalidade democrática, chamada

por muitos de Nova República114.

A partir de 1930, economia e a sociedade brasileira passaram por transformações

significativas. No aspecto político, com o colapso do sistema oligárquico da República Velha,

iniciou-se o processo de modernização do Estado. A crise da economia agrário-exportadora,

até então dominante, permitiu o avanço da industrialização, especialmente na Região Sudeste.

O aumento da população nos principais centros urbanos mostrou que as cidades estavam

começando a predominar sobre o campo115.

A industrialização, a urbanização e a expansão do setor de serviços permitiram o

crescimento de novas forças sociais: o empresariado industrial, a classe média e o operariado.

Essas novas forças, embora possuíssem algumas aspirações comuns, também apresentavam

interesses completamente divergentes; o primeiro, por exemplo, defendia o crescimento

econômico a qualquer custo; o segundo, o poder de consumo; o terceiro, o real valor dos

salários116.

Nessa época deu-se a proliferação dos partidos políticos (pluripartidarismo) refletindo

os desencontros que envolviam os vários segmentos de uma nova sociedade urbana e

industrial do século XX; as massas urbanas foram incorporadas ao processo político e, como

114 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 89. 115 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 89. 116 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 89.

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suas aspirações não podiam ser ignoradas, passaram a ser manipuladas por políticos e pelo

próprio Estado, dando origem ao populismo117.

A República Populista, iniciada com o fim do Estado Novo (1945) e encerrada com o

golpe militar de 1964, teve suas características moldadas a partir dessas transformações, mas

também sofreu influência dos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra.

Após a II Guerra Mundial, dois blocos disputaram a liderança política, econômica, militar e

ideológica do Mundo Contemporâneo: o Bloco Oriental, socialista, dirigido pela União

Soviética. Sendo o Brasil integrante do Bloco Ocidental, as manifestações populares ocorridas

no País passaram a ser encaradas como agitações comunistas118.

Ainda na República Populista, os governos presidenciais adotaram diversos planos e

programas econômicos, acentuando o papel do Estado como promotor e coordenador do

desenvolvimento nacional.

O país estava dividido entre duas propostas de desenvolvimento: “a nacionalista-

industrial, favorável à intervenção do Estado na economia, e a desenvolvimentista-industrial,

que defendia a participação do capital estrangeiro na economia brasileira119”.

3.2 A O GOLPE DE 1964 E O GOVERNO DITATORIAL

Em 1960 foi eleito Jânio da Silva Quadros, ex-governador de São Paulo, acompanhado

na Vice-Presidência por João Goulart. Jânio venceu com 5.604.000 votos (48%), apoiado pela

UDN, enquanto seu principal concorrente, o Marechal Lott, obteve 3.810.000 votos (28%),

pelo PTB. Sua posse, a primeira em Brasília, deu-se em 31 de janeiro de 1961120.

O polêmico político, que chegou à presidência da República com a maior votação que

um homem público jamais havia alcançado no Brasil até então, surpreendeu toda a nação, no

dia 25 de agosto de 1961, após quase 7 meses de governo, com a sua renúncia ao cargo de

presidente. Este gesto nunca foi totalmente esclarecido. Na ausência do vice-presidente, João

117 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: jurisprudência, legislação, doutrina e prática. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989. p. 54. 118 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 119 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 120 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54.

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Goulart, que se encontrava visitando a República Popular da China, assumiu o posto o

presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli121.

Após a renúncia de Jânio, os ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica julgaram

inconveniente à Segurança Nacional o regresso do vice-presidente, acusado e

comprometimento com os comunistas.

Em oposição aos ministros militares levantou-se o governador do Rio Grande do Sul,

Leonel Brizola, defendendo a legalidade. Com a evolução da crise política e a radicalização

dos grupos antagônicos, o País se viu diante da possibilidade de uma guerra civil122.

Diante da grave situação interna e visando contornar o veto dos ministros militares à

posse do vice-presidente como chefe de um regime presidencialista, o Congresso aprovou a

Emenda Constitucional n.º 4 à Carta de 1946, que instaurava o regime parlamentarista no

Brasil.

João Goulart era o herdeiro político de Getúlio e também alvo dos adversários de

Vargas. Era o líder de uma grande partido, o PTB. Rico estancieiro do Rio Grande do Sul,

Jango carecia de visão política a longo prazo e não tinha a popularidade de um grande

político. Seu primeiro período de governo, enfraquecido pelo regime parlamentarista e

tumultuado pelas sucessivas tentativas de se formar um gabinete, representou uma época de

manobras políticas para recuperar a plenitude dos poderes presidenciais123.

Procurou conquistar a confiança dos grupos conservadores e dos militares, revelando

princípios que pudessem ser identificados como anticomunistas e comprometidos com o

processo democrático. Mas, ao mesmo tempo, manobrava para garantir-se com a esquerda

através de programas tipo reformas de base, etc. Esse seu jogo com a esquerda revelou-se

perigoso, ante a multiplicidade de interesses e pressões que as lideranças deste grupo

(fracionado em inúmeros subgrupos) procuraram impor a seu governo124.

121 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 94. 122 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: jurisprudência, legislação, doutrina e prática. p. 54. 123 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 94.. 124 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54.

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Com a cooperação dos governadores dos estados de Minas Gerais, São Paulo,

Guanabara e Rio Grande do Sul, as Forças Armadas depuseram o presidente Goulart, aos 31

de março de 1964.

O Congresso Nacional no dia 2 de abril declarou a vacância da presidência da

República, assumindo-a o presidente da Câmara Ranieri Mazzilli. Em 9 de abril, o Alto

Comando Revolucionário, composto dos novos ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica,

o General Costa e Silva, o Vice-Almirante Augusto Rademaker Grunewaid e o Tenente-

Brigadeiro Correia de Melo, editaram o Ato Institucional Número 1, redigido por Francisco

Campos125.

De acordo com o Ato, o Congresso Nacional elegia para presidência da República o

chefe do Estado-Maior do Exército, o General Humberto de Alencar Castelo Branco, que

tomou posse em 15 de abril de 1964.

O golpe militar de 1964 foi desfechado para evitar a suposta ameaça comunista, e em

defesa de uma pseudo-democracia e pseudo-liberdade. Com ele, iniciavam-se os vinte e um

anos do chamado regime militar, marcado pelas restrições aos direitos e garantias individuais,

pela extinção dos antigos partidos políticos e pela violência, típica dos regimes ditatoriais126.

Procurando descaracterizar-se como um Estado de exceção, a nova ordem, dita

revolucionária, manteve algumas instituições democráticas:

O Congresso Nacional, tolhido em suas prerrogativas se tornaria um dócil homologador das decisões dos governos militares, e as eleições, em todos os níveis se processariam dentro das variadas regras e restrições, que se estabeleceriam a partir de 1964.

De outro lado, o regime autoritário buscou sua legitimação através de uma legislação

de exceção, ou seja, através dos atos institucionais (que estão acima da Carta Magna) e da

Constituição de 1967, mais tarde modificada pela Emenda Constitucional de 1969.

125 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 126 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54.

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O novo regime tinha um dos seus mais importantes fundamentos na doutrina de

segurança nacional, fortemente influenciada pela conjuntura da guerra fria e pela crise do

populismo127.

Segundo essa doutrina, que substituía o conceito de defesa nacional pelo de segurança

nacional, era preciso combater os comunistas e outras forças “subversivas” que se infiltravam

em todos os setores da comunidade brasileira, visando desestabilizar o governo, as

autoridades e as instituições nacionais128.

Para isso deu-se início à planificação global do País, visando à superação dos

problemas de natureza social, política e econômica, instrumentalizados pelas forças do

comunismo. Foram criadas novas políticas, abrangendo todas as atividades nacionais,

destacando-se, entre elas, a política econômica, cujo objetivo maior era o desenvolvimento

econômico e a integração nacional centralizada, associadas ao capital estrangeiro129.

A Lei de segurança nacional, em vigor a partir de 29 de setembro de 1969,

transformava todo o cidadão em responsável pela segurança do país. A referida lei previa a

prisão de grevistas; a apreensão de edições inteiras de jornais e revistas; a censura plena; a

punição para quem desrespeitasse as autoridades do governo ou distribuísse propaganda

“subversiva”, e muitas outras medidas de caráter repressivo130.

3.3 A REABERTURA DEMOCRÁTICA E A NOVA CONFIGURAÇÃO POLÍTICO-

ELEITORAL DO PAÍS

Considerado o presidente da abertura, o general João Baptista de Oliveira Figueiredo

foi eleito pelo Colégio Eleitoral em 1979, frustrando dois outros candidatos sem nenhuma

chance de vitória: o Senador Magalhães Pinto e o General Euler Bentes Monteiro131.

Pela primeira vez, um candidato do chamado Ciclo Revolucionário percorreu o País

inteiro antes de tomar posse no Planalto. Como homem da Revolução de 1964, Figueiredo

sempre esteve ligado a seu predecessor, o General Geisel, tendo ainda sido chefe do Gabinete 127 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 94. 128 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 94. 129 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 55. 130 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 55. 131 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 94.

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Militar do presidente Geisel, tendo ainda sido chefe do Gabinete Militar do presidente Médici

e chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI)132.

O novo presidente aproveitou ex-ministros dos quatro governos pós-64, atraiu técnicos

e aceitou algumas indicações políticas. A seu Ministro do planejamento, Antônio Delfim

Neto, coube pôr em prática um programa de governo que previa a contenção das despesas, a

descentralização administrativa, a diminuição da inflação, a privatização de empresas e

serviços estatais e a concessão de prioridade à agricultura e às exportações133.

No âmbito da política interna, Figueiredo assinou, em 27 de junho de 1979, o projeto

de anistia que seria enviado para a aprovação do Congresso, sem, no entanto, beneficiar os

terroristas e tampouco devolvendo aos funcionários e militares cassados os cargos e patentes

perdidos134.

Em novembro do mesmo ano, a reforma partidária extinguiu o bipartidarismo do País,

possibilitando a formação de novas agremiações político-partidárias. Conseqüentemente, uma

nova ordem política começou a se delinear através do surgimento do PDS (Partido

Democrático Scoial), composto pela maioria dos antigos arenistas), PMDB (Partido do

Movimento Democrático Brasileiro, que manteve seu caráter de frente oposicionista criado

em 1965, quando da fundação do antigo MDB), PTB (Partido Trabalhista Brasileiro,

organizado pelo ex-governador Leonel Brizola, mas que acabou passando para o controle da

ex-deputada Ivete Vargas, o que levou Brizola a criar o PDT – Partido Democrático

Trabalhista) e PT (Partido dos Trabalhadores, liderado por muito tempo pelo metalúrgico Luiz

Inácio Lula da Silva). Com as eleições diretas para os governos estaduais, em 1982, o mapa

político do País foi profundamente alterado. A oposição elegeu 10 dos 22 governadores (entre

eles, os de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro) e a maioria da Câmara dos

Deputados135.

132 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 133 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 134 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98. 135 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98.

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50

A partir de 1983, a sociedade civil participou ativamente do movimento das Diretas Já.

No ano seguinte, a Emenda Dante de Oliveira, que propunha o restabelecimento das eleições

diretas para presidente da República, foi derrotada no Congresso Nacional136.

Nesse mesmo ano, as oposições decidiram enfrentar o regime militar nas eleições do

Colégio Militar, valendo-se da cisão dentro do PDS que deu origem ao PFL (Partido da Frente

Liberal). A aliança do PMDB e PFL resultou na Aliança Democrática, que lançou a chapa

Tancredo Neves – José Sarney137.

Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves, candidato das oposições, derrotou Paulo

Maluf, o candidato do governo, dentro do próprio Colégio Eleitoral. Eleito presidente da

República, Tancredo Neves não chegou a tomar posse, vindo a falecer em 21 de abril de

1985138.

A partir de 1985 o Brasil passa a viver um momento da sua História conhecido como

Nova República. Com a redemocratização, as liberdades, direitos e garantias individuais

foram restabelecidas, e uma nova Constituição assegurou várias conquistas sociais.

A nova Constituição brasileira foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Manteve a

forma republicana do governo, o sistema presidencialista, a divisão harmônica dos três

poderes e ampliou o mandato presidencial para 5 anos.

Além disso, apresentou importantes inovações. O voto universal, secreto e obrigatório

para ambos os sexos, dos 18 aos 70 anos, tornou-se facultativo entre os 16 e os 18 anos, bem

como para analfabetos139.

No plano eleitoral, foram estabelecidas as eleições diretas em dois turnos para

presidente da República, governadores dos estados e prefeitos das cidades com mais de 200

mil eleitores140.

136 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 137 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 138 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98. 139 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 54. 140 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98.

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No terreno social garantiu-se a livre criação de sindicatos, a ampliação do direito de

greve, a ampliação da licença-gestante para 120 dias e as férias remuneradas com acréscimo

de 1/3 sobre o salário.

3.4 O DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO – CONCEITO

Fez-se necessária essa introdução histórica para falarmos sobre o tema objeto deste

capítulo, o Direito Eleitoral contemporâneo brasileiro. Não existe democracia plena se não

existir um processo eleitoral legítimo e justo, capaz de regular o “jogo” político de maneira a

proporcionar a escolha transparente o mais ilibada possível dos agentes públicos que terão por

atribuição administrar a coisa pública141.

Tão importante quanto o conhecimento do contexto histórico que culminou com a

configuração eleitoral contemporânea é entender o que é o Direito Eleitoral e, antes dele, a

definição da própria Democracia. No dizer de Carlos Mendes:

[...] o termo democracia tem, nesse contexto, conteúdo procedimental e preordena-se à resposta de questões fundamentais como, por exemplo, quem e como deve ser exercido o poder político ou quem e como deve governar. Assim posto o assunto, a locução democracia assume feição procedimental, identificando-se com noção própria que a distingue dos demais sentidos: a democracia política142.

Nessa acepção, Democracia política, como princípio estrutural do Estado

Democrático, assenta-se na forma de governo segundo a qual o poder político ou a soberania

é exercida pelo povo e não por uma pessoa ou um grupo específico e determinado143.

Dessa maneira, o exercício da soberania popular se faz de acordo com as “regras do

jogo”, para usar a expressão cunhada por Bobbio, permitindo ampla e segura participação da

maioria dos cidadãos nas decisões políticas144.

O conceito de Democracia sob o prisma procedimental encerra concepção dinâmico-

formal, compreendendo todos os Estados Democráticos contemporâneos e consiste:

141 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98. 142 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 135. 143 NOGUEIRA, José da Cunha. Manual prático de direito eleitoral: Jurisprudência, Legislação, Doutrina e Prática. p. 56. 144 SILVA, Francisco Alves da; COSTA, Hernani Maia. História integrada: Brasil e América I. p. 98.

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[...] num conjunto de regras por meio das quais a vontade popular participa e intervém direta ou indiretamente na formação do Estado, na determinação de suas finalidades, na amplitude da distribuição das funções públicas, na escolha dos agentes e na criação e aplicação do direito positivo145.

A rigor, segundo a elaboração teórica de Francisco Berlín Valenzuela, a democracia é

uma concepção de convivência racional sob uma ordem jurídica, caracterizada pela igualdade,

liberdade e solidariedade, emergindo como resultado do consentimento e participação do

Povo, que, por meio de procedimentos idôneos, confirmam a identidade de fins entre

governantes e governados146.

O processo eleitoral, regulado pelo Direito Eleitoral é um instrumento efetivador da

Democracia. Uma de suas funções é a promoção da equidade na disputa pela titularidade do

poder estatal.

Numa democracia verdadeira, todos os cidadãos, no pleno gozo dos seus direitos

políticos, podem ser atores do processo eleitoral, respeitados os critérios de elegibilidade.

Quem definirá as regras do processo eleitoral é, originalmente, o Poder Legislativo, com a

criação de normas específicas que terão por afã organizar e regulamentar o processo de

escolha dos representantes do povo147.

O estudo desse conjunto de normas e regulamentações que regem o processo eleitoral

é denominado de Direito Eleitoral.

Dentre os vários autores que apresentam cada qual a sua própria definição, destaca-se

a de Fávila Ribeiro ao ensinar que o Direito Eleitoral:

[...] dedica-se ao estudo das normas e procedimentos que organizam e disciplinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo que se estabeleça a precisa equação entre a vontade do povo e a atividade governamental148.

Igualmente relevante é a lição de Elcias da Costa que explica ser o Direito Eleitoral:

[...] um sistema de normas de direito público que regulam, primordialmente, os deveres do cidadão de participar na formação do governo constitucional e, secundariamente, os direitos políticos correlatos àquele dever, tanto os que

145 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 16-17. 146 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 16-17. 147 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 16-17. 148 RIBEIRO, Fávila. Direito eleitoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 12.

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são pressupostos como os que são conseqüentes ao adimplemento daquele dever149.

Pinto Ferreira, de sua vez, conceitua o Direito Eleitoral como “um conjunto

sistemático de normas de direito público regulando no regime representativo moderno a

participação do povo na formação do governo constitucional150”

Sem desprezar o que já se resgatou dos diversos autores citados, pode-se definir o

Direito Eleitoral como o ramo do Direito Público interno (pois trata de interesses de ordem

coletiva) que regula os direitos e os deveres do cidadão no tocante aos institutos da

representação política e o processo eleitoral pelo qual se constrói o governo constitucional151.

O processo eleitoral de construção desse governo constitucional envolve uma

dinâmica de grande complexidade. A criação e funcionamento dos partidos políticos, a

regulamentação das propagandas eleitorais, os registros de candidaturas e os critérios de

elegibilidades são alguns dos temas disciplinados pelo Direito Eleitoral.

No entendimento de Djalma Pinto:

O Direito Eleitoral é o ramo do Direito Público que disciplina a criação dos partidos, o ingresso do cidadão no corpo eleitoral para a fruição dos direitos políticos, o registro das candidaturas, a propaganda eleitoral, o processo eletivo e a investidura no mandato. Somente a União pode legislar sobre Direito Eleitoral (art. 22, CF). Essa competência privativa é fundamental para a segurança do processo de escolha dos governantes. Uma multiplicidade de competência para disciplinamento dessa matéria acarreta conseqüências desastrosas para o grupo social152.

Integra o Direito Eleitoral todas as normas que regulam a aquisição, o exercício e a

perda dos direitos políticos, bem como as que disciplinam a criação dos partidos políticos e o

acesso ao poder pela via do voto.

Encontram-se essas normas na CF, na Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de

1990, no CE – Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965, na Lei n. 4.410, de 24 de setembro de

1964, que instituiu prioridade para os feitos eleitorais, Lei n. 6.091, de 15 de agosto de 1974,

dispondo sobre o fornecimento gratuito de transporte, em dia de eleição, a eleitores residentes

149 COSTA, Elcias Ferreira da. Direito eleitoral. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 1. 150 FERREIRA, Pinto. Comentários à lei orgânica dos partidos políticos. São Paulo: Saraiva, 1992. p. 36-37. 151 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 27-28. 152 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. São Paulo: Atlas, 2006. p. 16.

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nas zonas rurais; na Lei n. 6.999, de 7 de junho de 1982, autorizando a requisição de

servidores públicos pela Justiça Eleitoral, na Lei dos Partidos Políticos, n. 9.096, de 19 de

setembro de 1995, na Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997, que disciplina as eleições no

Brasil, em diversas outras leis ordinárias e nas Resoluções expedidas pelo Tribunal Superior

Eleitoral, no exercício de sua competência regulamentadora153.

A Constituição é a fonte por excelência de todo o Direito positivo. Nela se projeta a

síntese dos valores e dos princípios consagrados por um país em determinado momento de sua

história. Os princípios não são inseridos na norma constitucional apenas para fins de retórica e

ilustração. Traduzem a vontade e a determinação dos cidadãos de serem conduzidos através

das diretrizes, dos paradigmas que eles expressam154.

A manifestação da vontade popular é fundamental para existência do Direito Eleitoral,

enquanto garantidor da Democracia. Embora existam diferentes modelos de Democracia, a

Carta Magna brasileira traz em seu escopo as diretrizes norteadoras da construção do Direito

Eleitoral, segundo as concepções ideológicas pátrias155.

Além disso, a Constituição de 1988 teve como um de seus principais objetivos impedir

a volta a um novo período de autoritarismo, do qual o Brasil tinha, a duras penas, se libertado

em 1985156.

É importante ressaltar que, quando da promulgação da Constituição de 1988, o país

ainda vivia sob a sombra da ausência de Democracia, pois o então presidente, José Sarney,

eleito Vice-presidente de Tancredo Neves e conduzido ao poder após a morte deste, havia

sido eleito pelo Colégio Eleitoral, num processo indireto. Somente em 1989 o Brasil voltaria a

escolher seu representante máximo por meio de eleições diretas157.

Assim, e, sobretudo por esse histórico recente e traumático, havia uma preocupação

elevada em conceber um Direito Eleitoral que garantisse plenamente a participação popular.

Partindo-se da premissa de que não há Direito Eleitoral onde não funcione a

participação popular na construção da soberania de determinado Estado, forçoso considerar

153 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 16. 154 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 28. 155 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 17. 156 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 29. 157 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 18.

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que o Brasil, ao adotar sistema constitucional rígido, traz na Carta Magna diretrizes de um

perfil ideológico e pragmático do modelo democrático a ser seguido.

Espelhando fielmente a expectativa dos constituintes de 1988, ávidos em sepultar

quaisquer resquícios de “ditadura”, a Constituição Federal conta com dispositivos definidores

de princípios democráticos pautados pela mistura de concepções liberais e socialistas, bem

retratando a necessidade de resgate da cidadania e de mitigação da apartação social. Não

obstante, longe de representarem uma mudança radical no sistema de acesso e participação no

poder, as bases democráticas constitucionais ficaram relegadas a papel meramente

dogmático158.

Desse modo, se pode entender que o Direito Eleitoral é o ramo da ciência jurídica que

estuda o conjunto de normas que regem o processo eleitoral de um país. Esse estudo leva em

consideração as características ideológicas do povo onde as normas estão sendo aplicadas.

Essa sintonia com os princípios ideológicos do povo é fundamental para garantir o pleno

exercício da própria Democracia. Quando o contrário existe, e sobressaem as vontades de um

grupo minoritário, então temos o lado perverso do poder estatal, pela imposição dos interesses

de uns em detrimento da maioria.

3.5 AS FONTES DO DIREITO ELEITORAL

Embora o Direito Eleitoral tenha como fontes as mesmas de outros ramos do direito,

tem também uma grande variedade além dessas. Outra característica fundamental é o fato de

se interligarem com outros ramos do direito.

Existe ainda uma subdivisão entre as fontes, podendo ser consideradas como

principais ou diretas e as secundárias ou indiretas.

O ordenamento jurídico-eleitoral rege-se estruturalmente pelas mesmas regras que

informam a organização do direito positivo, prevalecendo a norma de nível mais superior e

sempre a de natureza constitucional, a revogação de uma norma por outra superveniente de

mesma hierarquia, valendo os princípios gerais do direito como mecanismos de

interpretação159.

158 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito eleitoral: teoria e prática. p. 21. 159 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito eleitoral: teoria e prática. p. 21.

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Quanto às suas fontes, essas apresentam as seguintes características:

1) são de vasta variedade; 2) vinculam-se a diversos ramos do Direito, pela unicidade da ordem jurídica; 3) compete exclusivamente à União legislar sobre o tema, sem possibilidade de ação supletiva das Unidades Federais e Municípios; 4) a própria Constituição Federal orienta seu funcionamento, os órgãos competentes e as formalidades que devem ser seguidas no cumprimento de suas atividades160.

E podem ser elencadas da seguinte forma:

Principais ou diretas: a) O Direito Constitucional, do qual o Direito Eleitoral se originou, sendo pois a sua principal fonte e no qual se encontram seus princípios mais elementares; b) as leis federais (conforme art. 22, I. da Constituição Federal de 1988); c) as resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (conforme art. 1º, parágrafo único do Código Eleitoral – Lei n. 4.737/65).

Secundárias ou indiretas: a) a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (conforme art. 23, IX, do Código Eleitoral); b) a doutrina eleitoral; c) os estatutos dos partidos políticos (conforme a Lei n. 9.096/95); 2.4) as leis ordinárias pertinentes (Código Penal, Código de Processo Penal, Código Civil e Código de Processo Civil)161.

A doutrina é uma importante fonte do Direito Eleitoral, na medida em que tem a

função de orientar na interpretação da fria norma. O Direito, como um todo, é uma ciência de

alta complexidade e mutabilidade. Ainda que as normas possam permanecer as mesmas

durante décadas, a interpretação dessas deve se coadunar com a realidade vigente na

sociedade de cada época. Nesse sentido, é a doutrina uma importante “bússola”, capaz de

apontar o norte da interpretação adequadamente a cada momento histórico162.

Outra importante fonte é jurisprudência. Talvez em nenhum outro ramo do Direito a

jurisprudência seja tão importante como no Direito Eleitoral. Alguns autores, inclusive,

entendem que, diferentemente de outros ramos, no Direito Eleitoral brasileiro prevalece o

sistema do Common Law. A própria Democracia brasileira, no seu sentido mais amplo, é uma

160 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito eleitoral: teoria e prática. p. 21. 161 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 36-37. 162 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 36-37.

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prática que pode ser considerada nova, com regras ainda em acelerado processo de

construção163.

Dentre as fontes do Direito Eleitoral destacam-se a lei, os Princípios de Direito, as

resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, a doutrina e a jurisprudência. A doutrina é fonte do

Direito Eleitoral na medida em que esclarece o conceito dos institutos jurídicos por ele

utilizados, auxiliando na interpretação dos comandos legais, propondo, enfim, solução para as

situações intrincadas que a generalidade e abstração da norma não permitiram detalhar em seu

disciplinamento.

Por outro lado, em nenhum outro ramo do Direito brasileiro, como lembra o jurista

Aroldo Mota, a jurisprudência se mostra tão relevante como no Eleitoral. Não é exagero

afirmar-se que nele prevalece o sistema Common Law, em que o precedente vincula o

julgador como se fora norma para caso concreto. Embora sem regra formal expressa, sem

norma que o determine, na prática, o efeito vinculante das decisões do TSE é uma realidade

no âmbito da Justiça Eleitoral.

A lei se pode dizer sem exagero, é produzida no TSE, onde são elaborados os leading

cases164 seguidos pacificamente por juízes e pelos Tribunais Regionais Eleitorais. É frequente

ouvir-se de integrante dos Tribunais Eleitorais a ponderação de que, embora convencido da

posição defendida em determinado voto, é inútil mantê-la diante da certeza da reforma da

decisão pela Corte Superior e do desconforto gerado na mídia pela notícia da retificação165.

O legislador constrói as leis de acordo com os valores sociais vigentes na sociedade

em uma determinada época. Todavia, invariavelmente esse processo de criação leva em

consideração a realidade momentânea. É a ciência que iluminará essas normas em

conformidade com as transformações sociais ao longo do tempo. A interpretação científica

transforma permite a aplicação da fria norma à realidade de cada época166.

163 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 36-37. 164 Denomina-se Leading Case “uma decisão que tenha constituído em regra importante , em torno da qual outras gravitam” que “cria o procedente, com força obrigatória para casos futuros. SOARES, Guido Fernandes Silva. Common law: introdução ao direito do EUA. 1° ed. Revista dos Tribunais, RT, 199, p. 40-42. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5363. Acesso em 17 de agosto de 2009. 165 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 20. 166 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 36-37.

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Com as regras expressas subsistem as regras latentes, germens fecundos que o

legislador, formulando o pensamento e a necessidade de seu tempo, depositou no texto da lei,

sem uma consciência clara do assunto. A ciência e a prática arrancam aquelas regras dos veios

em que permanecem ocultas, dando-lhes uma precisão luminosa, as reduzem a máximas

definidas. Ainda mais a combinação dos diversos elementos fornecidos pelos textos permite à

ciência a formação de novas noções e de novas regras167.

As fontes do direito, como se disse anteriormente, são vetores norteadores para a

interpretação da norma crua. O legislador absorve os anseios da sociedade e os tipos de

relações sociais que carecem de regulamentação, transformando esses anseios em normas

positivas.

Todavia, ainda que mudem as concepções ideológicas da sociedade que germinou a

norma, ainda perdurarão as leis concebidas, devendo, para que não perca sua razão de

existência, ser interpretada à luz da ciência jurídica.

3.6 A ORGANIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL

Embora, no âmbito do Direito Eleitoral, o art. 92 da Constituição da República de

1988 tenha definido como órgão do Poder Judiciário os Tribunais e Juízes Eleitorais, deve-se

fazer uma distinção com os órgãos da Justiça Eleitoral. Primeiramente, há que se destacar que

ainda não foi instituída a magistratura de carreira no âmbito da Justiça Eleitoral. Além disso,

existe a participação de cidadãos sem formação jurídica durante todo o processo.

Exemplificativamente na formação das mesas receptoras de votos e de apuração168.

O art. 92, inc. V, da Constituição Federal define como órgãos do Poder Judiciário,

apenas e tão-só os Tribunais e Juízes Eleitorais. No entanto, a ordem constitucional não

ensejou Magistratura Eleitoral de carreira, razão pela qual não se deve confundir Órgãos do

Poder Judiciário com Órgãos da Justiça Eleitoral169.

Com efeito, o constituinte não deixou o papel administrativo e fiscalizatório do

processo eleitoral somente nas mãos de uma só classe da burocracia do Estado (Magistratura),

ou seja, tanto na composição dos tribunais quanto na conformação das mesas receptoras de

167 CÂMARA, Leal. Direito das coisas: da prescrição e da decadência. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 117 168 CÂMARA, Leal. Direito das coisas: da prescrição e da decadência. p. 117. 169 CÂMARA, Leal. Direito das coisas: da prescrição e da decadência. p. 117.

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votos e juntas eleitorais (apuração), a participação de cidadãos (advogados e eleitores sem

formação jurídica), no pleno gozo dos direitos políticos, dá à Justiça Eleitoral legitimidade

democrática170.

Além disso, não se olvidou das dificuldades de compreensão sistêmica da Carta

Política e de acessibilidade ao contencioso eleitoral, criando a figura do defensor do regime

democrático, o Ministério Público. Em harmonia com o disposto no art. 118 da Constituição

Federal, são órgãos da Justiça Eleitoral: “Tribunal Superior Eleitoral; Tribunais Regionais

Eleitorais; Juízes Eleitorais; Juntas Eleitorais171”.

Desde a Constituição de 1946, a organização da Justiça Eleitoral vem se mantendo a

mesma. Embora politicamente o Brasil tenha sofrido profundas mudanças ao longo dos anos,

e que essas mudanças alteraram profundamente a configuração dos poderes, não provocaram

mudanças significativas na formação e estrutura da Justiça Eleitoral.

Desde a Constituição de 1946 que os órgãos colegiados da Justiça Eleitoral têm-se

mantido os mesmos e com a mesma composição:

Tribunal Superior Eleitoral – TSE – 7 Ministros; Tribunais Regionais Eleitorais – TREs – 7 Juízes; Juntas Eleitorais – 3 a 5 membros. Os sucessivos textos constitucionais, a partir de então, dispuseram sobre os órgãos da Justiça Eleitoral, sua composição, modo de investidura, seus juízes e sua competência básica.

A Constituição Federal/ 46 regulou a matéria nos arts. 109 a 121. A Constituição

Federal / 67, nos arts. 123 a 140. A CF / 69, nos arts. 130 a 140, e a Constituição Federal / 88,

nos arts. 118 a 121.

Embora a Constituição de 1988 preveja a competência básica dos Tribunais Eleitorais,

quanto aos Juízes Eleitorais monocráticos, que atuam perante cada Zona Eleitoral, como ainda

não foi editada a lei complementar prevista no art. 121, caput, da CF, suas atribuições são

aquelas que estão especificadas no Código Eleitoral, que foi recepcionado com status de lei

complementar.

Também as Juntas Eleitorais têm a sua composição e competência regrada no Código

Eleitoral, Lei n. 4.737 / 65. A Justiça Eleitoral no Brasil foi criada após a Revolução de 1930,

170 CÂMARA, Leal. Direito das coisas: da prescrição e da decadência. p. 117. 171 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009.

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através do Decreto n. 21.076, de 24/02/32 (1º Código Eleitoral) e incorporada à Constituição

de 1934. Contudo, foi extinta no período ditatorial de 1937 a 1945, sendo revigorada através

do Decreto n. 7.586, de 28/05/45 e, a partir daí, sempre agasalhada nos textos constitucionais,

a partir da Constituição Federal / 46172.

O caput do art. 121 da Constituição de 1988 declara que: “Lei complementar disporá

sobre a organização e competência dos Tribunais, dos juízes de direito e das juntas

eleitorais173”.

Conforme visto, embora não tenha sido elaborada e Lei Complementar prevista pelo

art. 121 da Constituição, o Código Eleitoral acabou sendo recepcionado com status de Lei

Complementar.

Outra atribuição da esperada Lei Complementar é a fixação da competência dos

tribunais e juízes eleitorais. Assim qualquer alteração que porventura tenha que ser feita no

Código Eleitoral, deverá ser procedida por meio de Lei Complementar174.

A norma constitucional confere atribuição à lei complementar para a fixação da

competência dos tribunais e juízes eleitorais.

Quando foi editado o Código Eleitoral - Lei n. 4.737/65, estava em vigor a

Constituição Federal/1946, que estabelecia ser tarefa da lei ordinária dispor sobre a

competência dos tribunais e juízes eleitorais (art. 119).

Posteriormente, a Constituição Federal/1967, art. 130 e a Constituição Federal/1969,

art. 137, repetiram a mesma regra, exigindo que referida competência fosse fixada por lei

ordinária. Como a nova regra, da Constituição Federal/1988, art. 121, é da fixação da

competência dos tribunais e juízes eleitorais por lei complementar, as alterações que tiveram

de ser feitas no Código Eleitoral somente poderão ser editadas por lei complementar175.

172 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 47. 173 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009. 174 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 47. 175 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 47.

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61

É constitucional, por exemplo, o acréscimo procedido pela LC 86/96 (DOU 15.5.1996,

p. 8367), que deu competência ao TSE para o julgamento de ação rescisória nos casos de

inelegibilidade (Código Eleitoral 22, I, “j”)176.

Cândido, também discorre sobre o fato de que a Justiça Eleitoral, no concernente à sua

estrutura e organização continua a mesma desde 1946:

Desde a Constituição de 1946 que os órgãos colegiados da Justiça Eleitoral têm-se mantido os mesmos e com a mesma composição: Tribunal Superior Eleitoral – TSE – 7 ministros; Tribunais Regionais Eleitorais – TRE – 7 juízes; Juntas Eleitorais – 3 a 5 membros177.

Os sucessivos textos constitucionais, a partir de então, dispuseram, invariavelmente,

sobre os órgãos da Justiça Eleitoral, suas composições, modo de investidura de seus membros

e sobre sua competência básica. Assim: Constituição de 1946 – arts. 109 a 121; Constituição

de 1967 – arts. 123 a 140; Constituição de 1969 – arts. 130 a 140; Constituição de 1988 – arts.

118 a 121178.

Relativamente às juntas e aos juízes eleitorais, a composição e competência sempre

ficaram delegadas à lei infraconstitucional e delas se sucumbiram os sucessivos códigos

eleitorais179.

É importante ressaltar que o fato de a Justiça Eleitoral não possuir quadro próprio de

magistratura, não diminui em nada a eficácia de seu trabalho. Essa configuração cria uma

blindagem contra as paixões que a política provoca nos homens180.

As verdadeiras guerras travadas entre os partidos políticos, não raras vezes, acabam

por atingir os magistrados que, porventura, precisam tomar decisões contrárias aos interesses

de um ou de outro grupo.

O sistema vigente na Justiça Eleitoral prevê a renovação obrigatória de mandatos após

o decurso do segundo biênio para todos os juízes integrantes dos Tribunais Eleitorais181.

176 NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 327. 177 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. Bauru: Edipro, 2003. p. 39. 178 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 39. 179 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 39. 180 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 39. 181 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48.

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62

Esse sistema fortalece o caráter de imparcialidade necessário em todas as esferas do

Poder Judiciário, ainda mais no âmbito da Justiça Eleitoral, quando o papel do Judiciário está

em garantir a idoneidade do processo de escolha dos governantes e representantes do povo

junto às instituições de Poder182.

Outra característica da Justiça Eleitoral é a configuração da formação das Juntas

Eleitorais, as quais atuam de forma colegiada durante a apuração dos votos e diplomação dos

eleitos.

Outro aspecto peculiar da Justiça Eleitoral é a composição eventualmente colegiada

que assumem os órgãos da 1.º instância na fase de apuração dos votos à diplomação dos

eleitos através das Juntas Eleitorais183.

As Juntas Eleitorais funcionam presididas por um juiz de direito e mais dois ou quatro

membros leigos, dentre os eleitores das Zonas, designados pelo TRE de cada Estado,

mediante indicação dos respectivos juízes de direito (arts. 36 a 41 do Código Eleitoral).

Nas demais atividades, os juízes eleitorais funcionam singularmente, processando e

julgando os crimes eleitorais, conhecendo e decidindo o habeas corpus, os mandados de

segurança, dirigindo o alistamento eleitoral, localizando as seções eleitorais e nomeando os

respectivos mesários e apreciando as reclamações que sobre essas sejam interpostas, enfim,

praticando todos os atos decisórios que processual ou administrativamente lhes sejam

cometidos pelo Código Eleitoral. A competência dos Juízes Eleitorais monocráticos está

regrada no art. 35 do Código Eleitoral184.

Assim, conforme se observou, essas funções são executadas por juízes de direito que

são designados para exercer o mandato de modo periódico. Não há vinculação por parte do

magistrado à Justiça Eleitoral, na qual se integra com prazo de duração pré-determinado.

A Justiça Eleitoral não dispõe de quadro próprio de magistrados. Os magistrados que

compõem a Justiça Eleitoral vêm de outros setores do Judiciário e possuem mandatos

periódicos.

Na Justiça Eleitoral, o princípio da temporariedade é extensivo a todos os seus

membros, o que equivale a dizer que nenhum magistrado tem vinculação permanente na

182 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48. 183 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48. 184 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48-49.

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63

Justiça Eleitoral, integrando-a sempre por prazo determinado, portanto, com maior amplitude

do que na Justiça Militar e na Justiça do Trabalho, onde a renovação era parcial, aplicada

apenas aos vogais, sendo excluídos os magistrados togados185.

Aliás, muito se tem propagado para que seja a Justiça Eleitoral dotada de seus próprios

juízes. Contudo, não é esse o entendimento majoritário, tendo em vista que a rotatividade dos

membros da Justiça Eleitoral é recomendada como eficiente esquematização institucional e

deve ser ela conservada, como medida de sabedoria política186.

É importante ainda ressaltar que o Tribunal Superior Eleitoral, os Tribunais Regionais

Eleitorais, bem como as Juntas Eleitorais são órgãos colegiados da Justiça Eleitoral. Não são

integrantes do Poder Judiciário, mas possuem função jurisdicional excepcional.

A jurisdição eleitoral em primeiro grau se dá perante as Zonas Eleitorais, a qual é

exercida pelos juízes de direito designados para a função187.

As atribuições dos juízes eleitorais se dividem em administrativas e jurisdicionais. As

primeiras são as atividades de instalação, fiscalização, escrituração dos atos necessários à

efetivação dos direitos políticos. A segunda trata-se da apreciação na forma voluntária ou

contenciosa das demandas geradas pelos conflitos de interesses entre os candidatos ou entre

esses e a sociedade, na esfera judicial188.

185 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48. 186 MICHELS, Vera Maria Nunes. Direito eleitoral. p. 48 187 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito eleitoral: teoria e prática. p. 46-55. 188 SOBREIRO NETO, Armando Antônio. Direito eleitoral: teoria e prática. p. 58.

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64

4 A AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

4.1 CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGIBILIDADES

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral é uma das funções jurisdicionais da Justiça

Eleitoral, que visa garantir a idoneidade do processo eleitoral. Antes de entrar nesse tema

propriamente dito, é importante que se conheça as condições impostas pela legislação eleitoral

pátria vigente para que o cidadão tenha o direito de disputar uma eleição. A essas da-se o

nome de Condições de Elegibilidade189.

Paralelamente, existem as Causas de Inelegibilidade, que são fatores quem impedem

legalmente que o indivíduo possa ser eleito para o exercício de um cargo público.

Elegibilidade tem um significado positivo. Denota o direito público subjetivo de ser votado. Evidentemente, a elegibilidade tem a forma e o conteúdo que lhe empresta o direito, posto que constrói as hipóteses ou estabelece os requisitos indispensáveis à caracterização do “ius honorum”190.

No Brasil, a Elegibilidade é matéria constitucionalizada. Porém, o legislador ordinário

federal poderá dispor acerca das condições de exercício da Elegibilidade sem, contudo,

desnaturar esse direito público subjetivo. Portanto, o direito de ser votado emerge de preceitos

constitucionais cujo conteúdo normativo permite a integração de lei ordinária federal com

fulcro no art. 14, Parágrafo 3º e no art. 22, I, da Constituição Federal de 1988, combinados191.

Dessa maneira, o assunto submete-se ao princípio da legalidade e o legislador

ordinário federal não poderá desbordar dos lindes que lhe são impostos pelos preceitos e

princípios constitucionais. Consequentemente, a lei ordinária federal irá regulamentar,

integrar ou desenvolver as condições de exercício da elegibilidade192.

189 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 101. 190 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 101. 191 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 101. 192 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 101.

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65

Todavia, não poderá criar outras hipóteses além daquelas constantes de preceitos

constitucionais e sequer restringi-los excessivamente, negando-lhes o conteúdo normativo193.

Ainda segundo Mendes194, Elegibilidade significa “o direito de ser votado. O elegível

é aquele cidadão que está apto a ser votado e poderá assumir seu cargo, caso seja eleito”.

A elegibilidade é uma possibilidade jurídica de ser votado e eleito. O individuo deve

reunir uma série de condições previstas na legislação eleitoral que possibilitarão sua

participação, se assim desejar, no processo eleitoral. Note-se que um indivíduo pode possuir

todas as condições de elegibilidade sem necessariamente participar do processo eleitoral195.

Conforme será visto adiante, as condições de elegibilidades devem existir

cumulativamente. Ou seja, para que o cidadão seja considerável elegível, não basta somente

estar em gozo de seus direitos políticos. É preciso, também, ser eleitor, ter idade mínima para

ocupar o cargo para o qual está se candidatando, possuir domicílio eleitoral de onde pretende

ser eleito como representante e filiação partidária.

Para que uma pessoa possa se candidatar a um mandato eletivo, exercendo sua

capacidade eleitoral passiva, não basta que ela esteja no pleno gozo de seus direitos políticos,

ou usufruindo o direito de ser votado (ius honorum).

É preciso que ela implemente uma série de outros requisitos, indicados pela lei, e que

são uniformes para todos os candidatos. Mais do que isso, é preciso que o cabal atendimento a

esses requisitos se dê dentro dos prazos fixados também pela lei, ou por resoluções do

Tribunal Superior Eleitoral. A esse conjunto de exigências a serem satisfeitas pelos candidatos

denominamos “condições de elegibilidade196”.

A capacidade eleitoral ativa (ius suffragii) pertence ao eleitor que estiver devidamente

cadastrado na Justiça Eleitoral e também no gozo dos direitos políticos. As condições de

Elegibilidade estão previstas na Constituição Federal (art. 14, Parágrafo 3º, CF)197.

Nada impede, porém, que a lei complementar contenha elenco de condições de

elegibilidade a serem atendidas pelos candidatos. As inelegibilidades não se confundem com

193 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 101. 194 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 102. 195 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 102. 196 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 102. 197 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 102.

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as condições de elegibilidade, embora também possam constar ou da própria Constituição

Federal, ou da lei complementar, exclusivamente.

A lei complementar pode criar várias outras condições de Elegibilidade, estejam ou

não previstas na Constituição Federal. Poderá, também, o legislador ordinário, dispensar o

cumprimento de condições que entenda não ser mais importantes, desde que estas não sejam

exigidas pela Carta Magna198.

Ainda nos ensinamentos de Cândido199, uma vez que não são preenchidos os requisitos

de Elegibilidade o pedido de registro de candidatura deve ser indeferido, impossibilitando que

o pretenso candidato concorra naquele pleito.

Portanto, se considera que para as eleições em que foi indeferido o pedido de registro

de candidatura, o candidato está inelegível. Todavia, se nas eleições seguintes, o mesmo

candidato preencher todas as condições de elegibilidade, poderá concorrer normalmente.

Nesse sentido de impedir que o indivíduo possa concorrer no pleito, as condições de

elegibilidade se aproximam significativamente das causas de Inelegibilidade. Todavia, esta

última enquanto conceito pode ser considerado o oposto da Elegibilidade. A Inelegibilidade é

a inaptidão, por parte do indivíduo para ser eleito200.

O significado literal de Inelegibilidade pode ser tomado pelo seu antônimo que é a

Elegibilidade. Esta é a aptidão de ser eleito por reunir as condições jurídicas exigidas.

Portanto, Inelegibilidade é a inaptidão de ser eleito, isto é, não possuir as condições de

Elegibilidade. Entretanto, a interpretação literal implica equívocos conceituais que

desnaturam esse instituto jurídico.

A rigor, inelegibilidade não traduz a ausência do “ius honorum”. Não se encarta, pois,

no campo do reconhecimento pela ordem jurídica do direito público subjetivo de ser votado.

A conseqüência material é idêntica: a impossibilidade de da apresentação da candidatura ao

eleitorado201.

198 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 83-84. 199 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 84. 200 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 84. 201 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 84.

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67

Elegibilidade e Inelegibilidade, porém, são institutos jurídicos distintos e não podem

ser tomados, segundo o significado literal, como o verso e o reverso da mesma realidade

normativa.

A Elegibilidade pressupõe a implementação das condições de outorga do direito

público subjetivo de ser votado. A Inelegibilidade configura a existência de proibição que

impossibilita a candidatura. A Inelegibilidade visa à garantia da liberdade de Voto. A

Elegibilidade tem como finalidade obter o voto livre. Com efeito, a Inelegibilidade está para o

Voto assim como a incompatibilidade está para o mandato202.

Esta assegura o correto exercício do mandato eletivo e aquela proíbe pressão indébita

contra o eleitorado. São conceitos de relação entre normas e situações jurídicas e dependem,

para sua adequada compreensão, dos pressupostos e das conseqüências decorrentes da

“injuridicidade”. Nesse sentido, a Inelegibilidade traduz hipótese de impedimento do

exercício do “ius honorum” e a incompatibilidade o pressuposto de perda do mandato

eletivo203.

O instituto da Inelegibilidade não é a única garantia estabelecida pela ordem jurídica

para preservar a idoneidade do processo eleitoral. Junto com as causas de Inelegibilidades,

existe a lei penal e as normas jurídicas eleitorais.

Adiante, será estudado mais a fundo a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, que é

um desses instrumentos utilizados para proteger a lisura e legitimidade das eleições.

A Inelegibilidade se distingue das condições de Elegibilidade por ser circunstância

negativa que impede a candidatura do indivíduo204.

A evocação da Inelegibilidade pode ser feita por meio de impugnação, de ofício pelo

Juiz Eleitoral, ou a pedido de um dos legitimados.

A inelegibilidade é circunstância negativa na vida do candidato e que o impede de concorrer; é uma restrição parcial aos direitos políticos da pessoa, inviabilizando exerça ela a sua capacidade eleitoral passiva, ou o direito de ser votado. O candidato não pode ter uma inelegibilidade sequer em sua vida para que possa se candidatar. As condições de elegibilidade, ao contrário,

202 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 84. 203 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 108-109. 204 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 108-109

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são atributo positivo na vida do candidato. Elas devem ser totalmente preenchidas para que ele possa concorrer205.

Assim, a arguição de uma Inelegibilidade ou a alegação do não-preenchimento de uma

condição de Elegibilidade, em relação a um candidato, pode ser feita através de impugnação,

de ofício ou a pedido dos legitimados. O próprio juiz ou tribunal, em primeiro lugar, poderá

declarar uma Inelegibilidade ou alegar a falta de cumprimento de uma condição de

Elegibilidade pelo candidato. E poderá fazê-lo quer tenha havido, ou não, impugnação ao

pedido de registro do candidato206.

O questionamento de ofício pode se dar de duas formas:

a) de forma absoluta, quando a falta de preenchimento da condição é irreversível, não sendo mais possível atendê-la; nesse caso, indeferirá o pedido de registro de candidatura;

b) de forma relativa, ou seja, quando a condição de elegibilidade não cumprida, ou não provada, pode ser ainda resolvida; nesse caso, baixará o processo em diligência para que o interessado resolva o problema, no prazo que determinar207.

As condições de Elegibilidade e Inelegibilidade são de duas naturezas distintas: podem

ser constitucionais ou legais. Essa natureza interfere diretamente no prazo de sua arguição.

A arguição de uma inelegibilidade, ou a impugnação a uma condição de elegibilidade

legal não-preenchida pelo candidato, só pode ser feita no prazo a que se refere o art. 3.º,

caput, da Lei das inelegibilidades. Fora dessa oportunidade, opera-se a preclusão e não há

mais oportunidade para a argüição.

Porém, a condição de elegibilidade constitucional – e não a legal – pode ser

questionada tanto nesse prazo do art. 3.º, como em momento processual superveniente, tal

como, em ser de RCD. Vale dizer, perdida uma oportunidade, em outra, subsequente, pode-se

ainda arguir condição de Elegibilidade ou Inelegibilidade de ordem constitucional.

É constitucional a Inelegibilidade ou a condição de Elegibilidade que estiver prevista

diretamente no texto da Constituição Federal, como as dos art. 14, Parágrafo 4º a 7º e as do

205 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 108-109 206 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. p. 109. 207 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 85-86.

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69

art. 14, Parágrafo 3º. “São legais as inelegibilidades ou condições de elegibilidade que estão

previstas no texto da lei complementar de regência208”.

É relevante ressaltar que não deve existir confusão entre as condições de Elegibilidade

e as condições para que o candidato seja diplomado e nem as condições para a posse. As

primeiras são requisitos que precisam necessariamente ser preenchidos previamente, de modo

a possibilitar que o registro da candidatura seja aceito209.

Já a diplomação, poderá ser concedida ao candidato que for eleito com a votação

necessária para tal, segundo as regras estabelecidas pela norma eleitoral vigente. Poderão

tomar posso aqueles candidatos que tenham recebido diplomação válida e que tenham sido

respeitadas as regras do art. 54 da Constituição Federal210.

As condições de Elegibilidades estão previstas no Parágrafo 3º do Art.14 da

Constituição da República, elencando como condições a nacionalidade brasileira, o pleno

exercício dos direitos políticos, o alistamento eleitoral, o domicílio eleitoral na circunscrição,

a filiação partidária e a idade mínima para o exercício de cada mandato eletivo211.

O Parágrafo 3º, do art. 14 da Constituição Federal, traz um rol de fatos, cuja presença

é necessária para que alguém possa ser candidato a mandato eletivo.

É a seguinte a redação daquele parágrafo:

Art. 14. [...].

Parágrafo 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: I – a nacionalidade brasileira; II – o pleno exercício dos direitos políticos; III – o alistamento eleitoral; IV – o domicílio eleitoral na circunscrição; V – a filiação partidária; VI a idade mínima de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e Juiz de Paz; d) dezoito anos para Vereador.”.

208 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009. 209 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 86. 210 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 86. 211 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 86.

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70

Já o Parágrafo 4º, do mesmo artigo da Constituição Federal, considera também

inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos. Existem ainda condições de Elegibilidade

peculiares aos militares, previstas pelo Parágrafo 8º, do art. 14 da Constituição Federal212.

Por fim, algo ainda haverá de ser dito especificamente sobre os membros do Poder

Judiciário e do Ministério Público. Tudo isso será desenvolvido adiante, na análise específica

de cada uma das condições de Elegibilidade, e bem assim nas observações acerca das causas

de Inelegibilidade, previstas atualmente na Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990,

editada em obediência ao disposto no Parágrafo 9º, do mesmo artigo da Constituição213.

Desse modo, as condições de Elegibilidade são requisitos que devem ser preenchidos

pelo candidato, tornando legalmente possível o registro de sua candidatura. Sem o

preenchimento dessas condições, não há como levar adiante a candidatura que esbarra em

limitações normativas214.

Para melhor compreender o que seriam as condições de Elegibilidade, é pertinente se

fazer uma comparação com a capacidade que o indivíduo tem de se alistar como eleitor.

Exemplificativamente, o indivíduo que ainda não completou 16 (dezesseis) anos, ainda que

tenha o desejo de votar, não poderá fazê-lo porque não atingiu a condição de alistabilidade

relativa à idade mínima para tal.

Condições de Elegibilidade são exigências positivas para que o cidadão possa

candidatar-se. A alistabilidade está para a capacidade de ser eleitor assim como a

Elegibilidade está para a capacidade de ser eleito. Só será elegível quem preencher a todas as

condições impostas pela lei e não incidir em nenhuma das hipóteses de inelegibilidade.

Pode-se dizer, então, que as condições de Elegibilidade são pressupostos positivos, ou

seja, condições que devem estar presentes para tornar viável a candidatura, e as

Inelegibilidades são pressupostos negativos, situações que não podem estar presentes, sob

pena de obstar a candidatura. Tanto a ausência de uma das condições de Elegibilidade quanto

a presença de qualquer das Inelegibilidades obstam a candidatura, tornando o candidato

inelegível215.

212 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 86. 213 DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidade. São Paulo: Dialética, 2004. p. 12. 214 DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 12. 215 ROLLO, Alberto. Elegibilidade e inelegibilidade. Caxias do Sul: Plenum, 2008. p. 43-44.

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71

Na prática, o efeito da falta de condições de Elegibilidade e da existência de causas de

Inelegibilidade é o mesmo, ou seja, a impossibilidade da candidatura. Essas condições de

Elegibilidades, embora possam ser arguidas pelos outros candidatos ou pelo representante do

Ministério Público, devem ser verificadas pelos servidores da Justiça Eleitoral no momento da

apresentação do pedido de registro da candidatura216.

O resultado prático da ausência das condições de Elegibilidade e da presença das

situações de Inelegibilidade é o mesmo, qual seja a inviabilidade da candidatura.

Como adverte José Afonso da Silva citado por Rollo:

As condições de elegibilidade e as inelegibilidades variam em razão da natureza ou tipo de mandato pleiteado. A condição básica e comum a todas as hipóteses é a de o postulante estar no gozo dos direitos políticos (ser eleitor), o que já envolve as condições de nacionalidade brasileira217.

A Constituição Federal enumera as condições de Elegibilidade no seu art. 14,

Parágrafo 3º218. São elas:

Art. 14 – [...] Parágrafo 3º - nacionalidade brasileira, sendo que os candidatos a Presidente e a Vice-Presidente da República devem ser brasileiros natos; pleno exercício dos direitos políticos; alistamento eleitoral; domicílio eleitoral na circunscrição; filiação partidária; idade mínima de 35 anos para Presidente, Vice-Presidente da República e Senador Federal, de 30 anos para Governador e Vice-Governador, de 21 anos para Deputado Federal, Estadual ou Distrital, Prefeito e Vice-Prefeito e 18 anos para Vereador.

De modo geral, tanto as condições de Elegibilidade, quanto as causas de

Inelegibilidade são instrumentos que visam garantir o pleno exercício da democracia pelos

membros da sociedade.

Se por um lado, existem regras para definir quem são as pessoas que estarão aptas para

escolher os representantes da sociedade no exercício de gestão da coisa pública, por outro é

necessário, também, a existência de regras que definam aqueles que poderão concorrer a um

cargo público eletivo.

216 ROLLO, Alberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 43-44. 217 SILVA, José Afonso. apud ROLLO, Alberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 44. 218 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009.

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72

Sendo inerente à República a alternância no poder dos ocupantes de determinados

cargos e exercentes de determinadas funções (embora isso não seja estranho às Monarquias

modernas, em que apenas a Chefia do Estado tem cunho vitalício, ao passo que as demais

funções do Estado – eventualmente até mesmo as do Poder Judiciário – são exercidas por

pessoas eleitas periodicamente), e devendo os responsáveis pelo exercício desse poder ser

escolhidos pela população, necessária mostra-se a definição de regras não apenas para

estabelecer quem escolhe as pessoas que irão ocupar tais cargos e exercer tais funções, como

também regras definindo as condições que os candidatos a elas devem necessariamente

preencher, assim como outras tantas regras, definindo circunstâncias nas quais determinadas

pessoas possam estar temporária ou permanentemente impedidas de pleitearem mandatos

eletivos. Existem certas circunstâncias, cuja presença é exigida pela Constituição Federal ou

por outras leis, para que alguém possa ser candidato. Tais circunstâncias são denominadas de

condições de Elegibilidade.

São fatos positivos, isto é, sua presença é necessária, para que a pessoa possa revestir a

condição de candidato. Paralelamente, outras circunstâncias existem que, estando presentes,

impedem a candidatura. São fatos, cuja ocorrência representa obstáculo para que alguém

possa ser candidato a mandato eletivo. Esses fatos são denominados de causas de

Inelegibilidade.

Em presença de algum desses fatos, aquele que nele estiver envolvido, não poderá ser

candidato. Tais fatos funcionam, portanto, ao inverso das circunstâncias de Elegibilidade:

aquelas devem estar presentes, para que a pessoa possa candidatar-se. Estas, ao inverso,

devem estar ausentes219.

Os institutos da Inelegibilidade e condições de Elegibilidade são, embora antagônicos

na sua definição, complementares na sua função. No sábio entendimento do professor

Adriano Soares da Costa, “a Inelegibilidade é o estado jurídico de ausência ou perda de

Elegibilidade220”.

219 DECOMAIN, Pedro Roberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 09-10. 220 COSTA, Adriano Soares. Teoria da inelegibilidade e o direito processual eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. p. 145.

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73

4.2 CABIMENTO E OBJETIVO DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL

ELEITORAL

A Investigação Judicial Eleitoral está fundamentada no art.14, Parágrafo 9º da

Constituição da República, o qual foi regulamentado pela Lei Complementar n. 64, de 18 de

maio de 1990.

Diz o mencionado art. da Carta Magna, in verbis:

Art.14 - A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: [...]

Parágrafo 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta221.

Conforme abordado no tópico anterior, os casos de inelegibilidade são causas que

impedem a candidatura do indivíduo. A Lei Complementar n. 64 trouxe a regulamentação do

art. 14, Parágrafo 9.º da Constituição e elencou quais são os casos de Inelegibilidade, além de

prever as medidas judiciais cabíveis para combater qualquer tentativa de desrespeito a essa

norma eleitoral.

Uma das medidas judiciais com previsão na Lei Complementar n. 64 é a Ação de

Investigação Judicial Eleitoral, a qual tem por objetivo apurar denúncias de abuso de poder,

influências indevidas no processo eleitoral e garantir a aplicação das sentenças proferidas em

cada processo.

Dando eficácia concreta a esse dispositivo constitucional, foi promulgada a Lei

Complementar n. 64, em 18 de maio de 1990. Nela foi previsto o procedimento da Ação de

Investigação Judicial Eleitoral, com o objetivo de apurar denúncias de abuso de poder e

influência no processo eleitoral, bem como a eficácia das sentenças proferidas nos respectivos

processos.

221 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009.

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Portanto, a Investigação Judicial Eleitoral tem manifesto conteúdo de processo, dotada

de procedimentos céleres e conteúdo sentencial determinado, conforme o momento de seu

julgamento por parte do Juiz Eleitoral, quando se trata de eleições municipais, ou por parte

dos Tribunais Eleitorais para os demais pleitos.

A ação de Investigação Judicial Eleitoral, portanto, tem a finalidade de promover a

apuração de fatos suscetíveis de configurar o cometimento de qualquer irregularidade no

processo eleitoral e a perniciosa influência do abuso do poder econômico, do exercício de

função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

A Constituição da República, no seu art. 14, Parágrafo 9º, possibilitou a previsão de

outras causas de Inelegibilidade, determinadas por lei complementar, espécie legislativa essa

que ostenta hierarquia superior a das leis ordinárias, bem como no tocante ao plano material

de sua incidência e ao seu processo de elaboração e existência constitucional.

Isso, contudo, não afasta por completo a incidência do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997,

introduzido por força da Lei n. 9.840, de 28.9.1999, por se tratar de lei ordinária, uma vez que

o referido art. 41-A não contempla nova hipótese de inelegibilidade, o que somente poderia se

dar através de Lei Complementar.

O dispositivo impõe a pena de cassação de diploma para os condenados em ação de

investigação eleitoral, quando o julgamento ocorrer depois da diplomação, estabelecendo

ainda a pena pecuniária, que não é causa de inelegibilidade. Ora, o candidato que tiver seu

registro ou diploma cassado não se torna inelegível para o período eleitoral posterior222.

A Emenda Constitucional n. 4/1997 deu a nova redação ao Parágrafo 9º do art. 14 da

Constituição. Além disso, a Lei Complementar n. 81, de 13 de abril de 1994 aumentou o

período de duração da inelegibilidade para os parlamentares que tiverem seus mandatos

cassados por falta de decoro parlamentar.

Redação dada pela ECR 4/94 1º. O texto revogado era o seguinte:

Parágrafo 9º - Lei Complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o

222 CERELLO, Anselmo. Ação de Investigação Judicial. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.tre-sc.gov.br/site/fileadmin/arquivos/biblioteca/doutrinas/anselmo3.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009.

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abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

Inelegibilidade. A Lei complementar n. 64, de 18.5.1990, estabelece casos de

Inelegibilidade de parlamentares. A LC 81, de 13.4.1994, modificou a redação da LC 64/90

1º, I, b para aumentar de três para oito anos o prazo de Inelegibilidade para os parlamentares

que perderam o mandato por falta de decoro parlamentar223.

Um dos principais objetivos da Ação de Investigação Judicial é evitar abusos do poder

econômico e do poder político para beneficiar candidatos nas eleições. O que deve prevalecer

é tão somente a vontade popular, manifesta pelo Voto livre e direto.

A AIJE é ação própria para apuração das transgressões pertinentes a origem de valores

pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de Voto (art.

19 da LC 64/90), cominando, em caso de procedência, na Inelegibilidade do representado e de

quantos hajam contribuído para a prática do ato para as eleições a se realizarem nos 03 (três)

anos subsequentes à eleição em que se verificou na cassação do registro do candidato

diretamente beneficiado e na remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral - MPE, para

eventuais providências (art. 22, inc. XIV, LC 64/90).

À luz da natureza jurídica do instituto (ação) e de suas consequências previstas em lei

(cassação do registro e Inelegibilidade), pode-se analisar qual a conseqüência advinda da

renúncia ou do indeferimento do registro do investigado. Em primeiro lugar, é mister ressaltar

que as normas eleitorais protegem precipuamente a lisura do pleito.

Assim é que o Direito Eleitoral se municia de mecanismos para coibir a prática de

condutas que possam violar a legitimidade das eleições, normas estas que não são dirigidas

aos eleitores, aos partidos, nem aos candidatos, mas a todos. É certo que algumas ações, por

sua própria natureza, só podem atingir candidatos, tal como ocorre com a AIRC, a AIME ou o

Recurso Contra a Expedição de Diploma.

A AIJE, porém, embora pressuponha um candidato beneficiado, é instrumento voltado

também aos partidos políticos e às pessoas que contribuam para a prática coibida (Art. 22,

223 NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada. p. 191.

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caput e inc. XIV, LC 64/90), justamente no intuito de proteger a lisura do pleito e punir

qualquer um que atentar contra tal bem224.

Segundo alguns autores, existe uma certa tendência dos juízes eleitorais apurarem com

mais rigor os casos ensejadores da proposição de Ação de Investigação Judicial Eleitoral. A

AIJE não prevê diretamente uma sanção penal, como os crimes previstos no Código Eleitoral.

Todavia, a averiguação da existência de fatos que culminem na condenação ao final da

instrução da AIJE, acaba se direcionando para aplicação de uma punição, ou seja, a cassação

do registro da candidatura, com a consequente Inelegibilidade por certo lapso temporal, ou

ainda, a impugnação do mandato.

Transgressões à parte, os casos e abuso do poder econômico estão previstos em leis

complementares, (LC 5/70 e LC 64/90), modificativas das Leis n. 1.579/52 e 4.410/64 e

quando praticados, têm por escopo beneficiar candidatos ou partidos políticos, notadamente

quanto aos valores pecuniários a eles destinados. Ao que parece, há de fato uma tendência dos

juízes para apurar com mais vigor essas infringências do que as estipuladas como crimes no

Código Eleitoral.

Não há nessa fase propriamente uma pena no sentido claro do Código Penal, mas a

cassação do registro, a inelegibilidade por certo tempo, a impugnação de mandato. Mediante

procedimento sumaríssimo de investigação judicial, a reclamação ou representação é

encaminhada diretamente ao Corregedor (ou ao juiz eleitoral se for o caso de eleição

municipal) onde ali se relatam fatos e se indicam provas ou indícios para a abertura da

investigação225.

Assim, não resta dúvida que apesar de se constituir num processo investigatório, a

Ação de Investigação Judicial Eleitoral pode culminar numa sentença condenatória, com

aplicação de pena. Ainda que não seja uma pena, no sentido criminal da palavra, é uma

punição no âmbito eleitoral, com efeitos, muitas vezes, tão significativos quanto aqueles

previstos pelo Código Penal ou pelo Código Eleitoral.

224 VELOSO, Valtier de Barros. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Curitiba: Revista Paraná Eleitoral n. 70. Publicado em janeiro de 2009. p. 11. 225 D’ALMEIDA, Noely Manfredini; SANTOS, Fernando José dos; RANCIARO JÚNIOR, Antônio. Crimes Eleitorais e Outras Infringências. Curitiba: Juruá, 1994. p. 311.

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4.3 NATUREZA JURÍDICA

A Ação de Investigação Eleitoral é um procedimento administrativo eleitoral, que tem

seu trâmite perante a Corregedoria-Geral, no caso das eleições presidenciais; perante as

Corregedorias Regionais, no caso das eleições estaduais e perante os Juízes Eleitorais, no caso

das eleições municipais.

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral tem sua previsão legal do art. 22 ao art. 24

da Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990, conforme transcrito a seguir:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: I - o Corregedor, que terá as mesmas atribuições do Relator em processos judiciais, ao despachar a inicial, adotará as seguintes providências: a) ordenará que se notifique o representado do conteúdo da petição, entregando-se-lhe a segunda via apresentada pelo representante com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 5 (cinco) dias, ofereça ampla defesa, juntada de documentos e rol de testemunhas, se cabível; b) determinará que se suspenda o ato que deu motivo à representação, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso seja julgada procedente; c) indeferirá desde logo a inicial, quando não for caso de representação ou lhe faltar algum requisito desta lei complementar; II - no caso do Corregedor indeferir a reclamação ou representação, ou retardar-lhe a solução, poderá o interessado renová-la perante o Tribunal, que resolverá dentro de 24 (vinte e quatro) horas; III - o interessado, quando for atendido ou ocorrer demora, poderá levar o fato ao conhecimento do Tribunal Superior Eleitoral, a fim de que sejam tomadas as providências necessárias; IV - feita a notificação, a Secretaria do Tribunal juntará aos autos cópia autêntica do ofício endereçado ao representado, bem como a prova da entrega ou da sua recusa em aceitá-la ou dar recibo; V - findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, abrir-se-á prazo de 5 (cinco) dias para inquirição, em uma só assentada, de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado, até o máximo de 6 (seis) para cada um, as quais comparecerão independentemente de intimação; VI - nos 3 (três) dias subseqüentes, o Corregedor procederá a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes; VII - no prazo da alínea anterior, o Corregedor poderá ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas, como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam influir na decisão do feito; VIII - quando qualquer documento necessário à formação da prova se achar em poder de terceiro, inclusive estabelecimento de crédito, oficial ou privado, o Corregedor poderá, ainda, no mesmo prazo, ordenar o respectivo depósito ou requisitar cópias; IX - se o terceiro, sem justa causa, não exibir o documento, ou não comparecer a juízo, o Juiz poderá expedir contra ele mandado de prisão e instaurar processo s por crime

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de desobediência; X - encerrado o prazo da dilação probatória, as partes, inclusive o Ministério Público, poderão apresentar alegações no prazo comum de 2 (dois) dias; XI - terminado o prazo para alegações, os autos serão conclusos ao Corregedor, no dia imediato, para apresentação de relatório conclusivo sobre o que houver sido apurado; XII - o relatório do Corregedor, que será assentado em 3 (três) dias, e os autos da representação serão encaminhados ao Tribunal competente, no dia imediato, com pedido de inclusão incontinenti do feito em pauta, para julgamento na primeira sessão subseqüente; XIII - no Tribunal, o Procurador-Geral ou Regional Eleitoral terá vista dos autos por 48 (quarenta e oito) horas, para se pronunciar sobre as imputações e conclusões do Relatório; XIV - julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e pelo desvio ou abuso do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar; XV - se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato serão remetidas cópias de todo o processo ao Ministério Público Eleitoral, para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11 da Constituição Federal, e art. 262, inciso IV, do Código Eleitoral. Parágrafo único. O recurso contra a diplomação, interposto pelo representante, não impede a atuação do Ministério Público no mesmo sentido.

Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

Art. 24. Nas eleições municipais, o Juiz Eleitoral será competente para conhecer e processar a representação prevista nesta lei complementar, exercendo todas as funções atribuídas ao Corregedor-Geral ou Regional, constantes dos incisos I a XV do art. 22 desta lei complementar, cabendo ao representante do Ministério Público Eleitoral em função da Zona Eleitoral as atribuições deferidas ao Procurador-Geral e Regional Eleitoral, observadas as normas do procedimento previstas nesta lei complementar226.

Sendo um processo administrativo, assim como nos processos judiciais, são garantidos

às partes os princípios do contraditório e da ampla defesa, como prevê o Art. 5º, inciso LV da

Constituição da República de 1988, “Aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e

aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa a ela inerentes227”.

226 BRASIL. Lei Complementar n. 64, de 18 de maio de 1990. Estabelece, de acordo com o art. 14, § 9º da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação, e determina outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp64.htm>. Acesso em 20 jul. 2009. 227 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em 20 jul. 2009.

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4.4 LEGITIMIDADE

A legitimidade passiva da Ação de Investigação Judicial Eleitoral pode recair em

todos os administradores da coisa pública, no âmbito do Poder Executivo e do Poder

Legislativo, incluindo mesmo aqueles que ocupam a função executiva de forma transitória,

como o vice-presidente, vice-governadores e vice-prefeitos.

Os detentores de cargos públicos, como secretários, ministros, assessores, diretores

têm responsabilidade pelo ato condenável, se dele contribuirão por ação ou omissão, de

alguma forma. Nesse sentido Rollo relata que:

Todos os administradores da coisa pública podem ser atingidos pela sanção. Assim, na relação, estão os detentores de mandato executivo, neles incluídos, além dos chefes do Poder Executivo, também os detentores de cargo de direção administrativa do Poder Legislativo e do Poder Judiciário. Também são atingidos aqueles que ocupam, como os vice-prefeitos, vice-governadores e vice-presidentes da República, a função executiva de forma transitória, em substituição do respectivo titular, desde que tenham eles praticado o ato condenado. Igualmente são afetados os ministros, secretários, diretores, enfim, todos aqueles que participam da administração pública e têm responsabilidade pela pratica de ato condenável. Para Joel José Cândido, detentor de cargo na administração pública, seria ‘qualquer agente público ou administrativo, servidor ou não, que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional, da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios’. Ainda, segundo esse mesmo autor, os titulares de mandatos eletivos estão sujeitos à alínea ‘d’, deste mesmo artigo, como se viu (LC n.º 64/1990, Art.1.º, I, d). São agentes políticos e não detentores de cargo na administração pública228.

A legitimidade ativa para propor a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, conforme

prevê o caput do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, pertence a qualquer partido político,

coligação, candidato e o Ministério Público Eleitoral. Os pré-candidatos, que ainda não

tenham seus pedidos de registro deferidos pela Justiça Eleitoral, também possuem

legitimidade para propor a Ação.

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral somente poderá se proposta a partir da

apresentação do pedido de registro de candidatura, mesmo que o pedido ainda esteja sub

judice.

228 ROLLO, Alberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 199.

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O marco inicial para o seu ajuizamento é o pedido de registro de candidatura, ainda

que esteja sub judice. E o marco final é a sessão de diplomação, segundo adverte Costa229,

conforme reiterada jurisprudência eleitoral.

Não obstante ter sido admitido como marco final até as eleições, nos termos do art. 22,

inciso XV, da Lei Complementar n. 64/90, ainda assim o Tribunal Superior Eleitoral tem

alongado esse termo final até a sessão de diplomação230.

4.5 DO CABIMENTO DE MEDIDA LIMINAR

É cabível na Ação de Investigação Judicial Eleitoral a concessão de Medida Liminar

que vise interromper a prática do ato tipificado como de abuso de poder econômico ou

político, desde que exista prova suficiente da ocorrência da prática condenável e o Juiz

Eleitoral se convença da verossimilhança do alegado.

No parecer de Cândido, são dois os requisitos para que o juiz possa suspender

liminarmente o ato impugnado na Representação:

1) quando for relevante o fundamento da queixa no sentido de preservar a normalidade e legitimidade das eleições e houver prova razoável dos fatos, desde logo apresentada; e,

2) quando a continuidade desse ato puder inviabilizar, tornando ineficaz, no todo ou em parte, eventual prestação jurisdicional positiva final. Faltando um desses requisitos, ou havendo dúvidas fundada sobre um deles, não deve o juiz conceder a liminar. Existindo os requisitos, deve, ainda, antes de suspender o ato, examinar se há outro meio, menos lesivo, de evitar o prejuízo, que não a pura e simples suspensão. Tudo deve ser feito em razão do Princípio do Intervenção Mínima e da Restrição da Cautela Antecipada, sempre perigosa231.

Assim, ressalte-se que a tutela antecipada incide sobre o ato condenável, sobre a

prática de abuso do poder econômico e/ou político e não sobre a candidatura. Casos comuns

ensejadores de tutela antecipada é o uso indevido de veículos ou de meios de comunicação.

229 COSTA, Adriano Soares. Teoria da inelegibilidade e o Direito Processual Eleitoral. p. 125. 230 CERELLO, Anselmo. Ação de Investigação Judicial. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.tre-sc.gov.br/site/fileadmin/arquivos/biblioteca/doutrinas/anselmo3.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009. 231 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no Direito Brasileiro. p. 358.

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Assim, busca-se evitar a desigualdade no processo eleitoral, primando pela eleição livre, onde

prevaleça unicamente a vontade do eleitor.

4.6 OS EFEITOS DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral busca a decretação da Inelegibilidade do

Requerido e de todos aqueles que tenham participado do ilícito. Uma das discussões sobre os

efeitos da condenação promovida pelo procedimento da Lei Complementar n. 64/90 é quanto

à duração da Inelegibilidade de apenas três anos.

Esse fato recebeu uma nova complicação por força da Súmula 19232 do TSE que

atribuiu efeito ex tunc à sentença, ou seja, retroagindo os efeitos à data da posse do autor do

ato ilícito, se tiver sido eleito.

Exemplificativamente, em eleição para Governador do Estado, que ocorre a cada

quatro anos, sendo o candidato punido e retroagindo os efeitos da sentença à data da sua

posse, caso o recebedor da pena tenha a pretensão de concorrer somente ao cargo de

governador ou vice-governador, ou ainda, a senador, deputado estadual ou federal, presidente

ou vice-presidente da república, na prática, a sentença não lhe atingirá.

Existem alguns juristas que defendem a aplicação da sentença com efeito ex nunc, ou

seja, com duração da vigência do período de Inelegibilidade contada a partir da decretação da

sentença. Desse modo, se teria uma garantia maior de que a punição, de fato, seria sentida

pelo sentenciado233.

Alguns autores entendem que a inelegibilidade por abuso de poder econômico ou

político, tem o início da contagem trienal a partir do dia seguinte ao término do mandato ou

do exercício da função pública. Essa circunstância gera outros problemas quanto à aplicação

da pena, sobretudo em relação aos servidores públicos.

A Inelegibilidade por prática de abuso do poder incide por três anos. A contagem

desse prazo trienal começa no dia seguinte ao término do mandato ou do período do exercício 232 BRASIL. Súmula nº 19 - Publicada no DJ de 21, 22 e 23/8/2000. O prazo de inelegibilidade de três anos, por abuso de poder econômico ou político, é contado a partir da data da eleição em que se verificou (art. 22, XIV, da LC 64, de 18/5/90). Disponível em: <http://www.tre-mg.gov.br/portal/website/jurisprudencia/publicacao_sumulas/sumula_19.pdf >. Acesso em 20 jul. 2009. 233 CERELLO, Anselmo. Ação de Investigação Judicial. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.tre-sc.gov.br/site/fileadmin/arquivos/biblioteca/doutrinas/anselmo3.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009.

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da função pública. Assim, por exemplo, o detentor de cargo na administração pública que o

deixa em 4 de junho de 2010, permanecerá inelegível até 4 de junho de 2013. Aspecto

interessante acerca da Inelegibilidade em questão, é que sua incidência fica condicionada a

evento futuro (término do período de permanência no cargo).

Assim, se funcionário público concursado e estável vier a praticar algum abuso de

poder em benefício próprio ou de outrem, sendo condenado, por exemplo, em Ação Popular

com decisão transitada em julgado, sua eventual Inelegibilidade somente incidirá se e quando

ele deixar seu cargo. Assim, se ele desejar candidatar-se deverá se desincompatibilizar e, ao

fazer isso, iniciará daí seus três anos de Inelegibilidade, já que a desincompatibilização fará

com que ele não permanecerá mais no cargo, ainda que temporariamente. Todavia, se ele

nunca desejar candidatar-se, somente após sua aposentadoria (ainda que seja compulsória ao

completar 70 anos de idade), é que tal Inelegibilidade começará a fluir. Isso é curioso já que

se tal funcionário é condenado em Ação Popular com 30 anos de idade, e se ele deixar seu

cargo público tão-somente com 70 anos, sua Inelegibilidade ficaria ‘congelada’ por 40 anos,

para somente então, iniciar sua fluência234.

Assim, na prática, o agente que recebeu como pena a decretação de Inelegibilidade, a

partir de sentença condenatória em Ação de Investigação Judicial Eleitoral, ficará impedido

de concorrer em dois pleitos. Um deles é aquele em que ocorreu o fato ensejador da

condenação. O segundo será nos dois anos seguintes, considerando a atual configuração

eleitoral do país, pela qual se realizam eleições a cada dois anos.

Por ocasião da próxima eleição para disputa ao mesmo cargo para o qual o agente

pretendia ser eleito (ou foi eleito), cuja prática resultou na sua Inelegibilidade, o indivíduo

estará livre da pena, podendo concorrer novamente:

Punido o agente, ele ficará impedido de concorrer, na prática, só em dois pleitos: aquele em que ocorreu o fato e o que se realizar no biênio seguinte, pois no terceiro (que só se dará 4 anos após o fato) ele já estará elegível novamente. Pelo menos, enquanto se mantiver a nossa prática constitucional de eleições de 2 em 2 anos, ou de mandatos com duração de 4 anos235.

Ressalte-se que a Inelegibilidade não significa a supressão da total capacidade eleitoral

do cidadão. É perfeitamente possível que a Inelegibilidade resultante de condenação em Ação

234 ROLLO, Alberto. Elegibilidade e inelegibilidade. p. 200. 235 CÂNDIDO, Joel José. Inelegibilidades no direito brasileiro. p. 200.

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de Investigação Judicial Eleitoral possa conviver com a capacidade eleitoral ativa do cidadão,

ou seja, sua capacidade de votar:

Não significa, necessariamente, total ausência de capacidade eleitoral, pois pode a capacidade eleitoral ativa conviver simultaneamente com a inelegibilidade do cidadão. Tome-se, como exemplo, a declaração de inelegibilidade decorrente de investigação judicial ou ação de impugnação de mandato, julgada procedente pela Justiça Eleitoral em face da comprovação de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. Não ocorre nesse caso, a perda da capacidade eleitoral ativa. Não há o cancelamento ou a exclusão do alistamento. O cidadão pode exercer o direito do voto, apenas não pode ser votado nas eleições que se realizarem nos três anos seguintes (art. 1.º, letra d, LC n.º 64/90)236.

Assim, os efeitos da Ação de Investigação Judicial Eleitoral, caso a decisão seja

proferida antes da data das eleições, incluem:

a decretação da inelegibilidade do candidato e de quem tenha contribuído para o ato ilícito; a pena de inelegibilidade para as eleições a serem realizadas nos três anos subsequentes aos da eleição em que o fato ensejador ocorreu e; a cassação do registro do candidato beneficiado pelos atos ilícitos237.

Os efeitos da sentença condenatória na Ação de Investigação Judicial Eleitoral têm

algumas variações, de acordo com o momento eleitoral em que for proferida a decisão.

Conforme a época em que a sentença for proferida, o candidato não poderá concorrer, se for feita antes da eleição; o candidato não poderá ser diplomado, se ocorrer após a eleição e antes da diplomação (se fundada a AIJE em captação); o candidato terá contra si ajuizado recurso – ação – contra a diplomação ou ação de impugnação de mandato eletivo, ambos com efeito ex nunc, se for prolatada após a diplomação, sem prejuízo da inelegibilidade (acórdão RESPE n.º 19.832, de 25.03.2003, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence)238.

236 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 157. 237 PINTO, Djalma. Direito eleitoral. p. 157. 238 SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Luiz Fabio. Direito eleitoral: para compreender a dinâmica do poder político. p. 211.

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4.7 DO RECURSO

Da sentença proferida ao final da Ação de Investigação Judicial Eleitoral caberá

recurso, conforme preconiza o art. 265 e 266239 do Código Eleitoral, sendo admitido o juízo

de retratação.

Art. 265. Dos atos, resoluções ou despachos dos juízes ou juntas eleitorais caberá recurso para o Tribunal Regional.

Parágrafo único. Os recursos das decisões das Juntas serão processados na forma estabelecida pelos artigos. 169 e seguintes.

Art. 266. O recurso independerá de têrmo e será interposto por petição devidamente fundamentada, dirigida ao juiz eleitoral e acompanhada, se o entender o recorrente, de novos documentos.

No dizer do Desembargador Anselmo Cerello:

[...] da qual receberá recurso; nas eleições municipais haverá o recurso inominado – art. 265 do CE -, admitido o juízo de retratação; quando as eleições forem federais, estaduais ou distritais, das decisões dos TREs caberá recurso ordinário ao TSE (art. 21, § 4.º, incisos III e IV, da CF e art. 276, letra “a”, do CE); se a eleição for presidencial, o recurso contra a decisão do TSE estará subordinado à demonstração de afronta à Constituição Federal, hipótese em que poderá ser manejado o recurso extraordinário para o STF (art. 121, § 3.º, da CF e art. 281 do CE)240.

Não resta dúvida que a Ação de Investigação Judicial Eleitoral é um importantíssimo

instrumento que visa reprimir o abuso do poder econômico e político nas eleições, tendo por

finalidade garantir a legitimidade dos pleitos e a verdadeira supremacia da vontade popular,

manifesta pelo voto.

239 BRASIL. Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L4737.htm.>. Acesso em: 04 set. 2009. 240 CERELLO, Anselmo. Ação de Investigação Judicial. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Disponível em: <http://www.tre-sc.gov.br/site/fileadmin/arquivos/biblioteca/doutrinas/anselmo3.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do estudo realizado, embora ainda não seja possível conceber nenhuma

conclusão definitiva sobre o tema abordado, visto ser o Direito Eleitoral uma ciência dinâmica

e em permanente construção, ainda assim é possível traçar algumas considerações pertinentes.

Do ponto de vista da ciência jurídica, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, cuja

previsão legal está fundamentada no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, é um importante

instrumento que tem por escopo a repressão de práticas de abuso de poder econômico e/ou

político nas eleições, com a finalidade de garantir a idoneidade do processo eleitoral e a

preponderância da vontade popular, manifesta pelo voto secreto, direto e livre.

O objeto central da Ação de Investigação Judicial Eleitoral é coibir o uso indevido dos

meios de comunicação e de outras práticas classificadas como de abuso do poder econômico

ou político.

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral deverá ser proposta perante o TSE no caso

das eleições presidenciais, perante os TREs no caso das eleições para governador, deputados e

senadores e perante os Juízes Eleitorais, no caso das eleições municipais.

O efeito da sentença condenatória em Ação de Investigação Judicial Eleitoral é a

declaração da Inelegibilidade do agente que cometeu o ato ilícito, tendo a duração da vigência

da pena por três anos, com efeito ex tunc.

Sua natureza é declaratória e constitutiva, possuindo, também, um caráter preventivo e

punitivo. Pode ser também considerada de caráter preparatório de ação de impugnação de

mandato eletivo ou de recurso contra diplomação, podendo, ainda, servir como base para a

instauração de ação criminal.

Do ponto de vista histórico, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral é resultado da

evolução do processo eleitoral brasileiro ao longo da história, o qual teve seu nascimento a

partir da influência direta de normas vigentes em outros países, mas conseguiu juntar esses

modelos alheios com sua própria experiência vivenciada ao longo das décadas, como diria

Churchill, a custa de muito “sangue, suor e lágrimas”.

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No Brasil, tanto a declaração da Independência, como a proclamação da República

foram processos quase que “silenciosos”, sem grandes revoluções para servir de inspiração

aos compositores de nosso Hino Nacional, o que, de certo modo, é bastante criticado por

alguns pesquisadores do tema, que atribuem a isso a fragilidade política da Nação, a qual teria

se acostumado a imposições de cima para baixo das grandes decisões.

Todavia, esse “silêncio” inicial está longe de ser sinônimo de passividade por parte do

povo. A história brasileira é marcada por lutas populares pela consolidação de uma

Democracia plena. Cumpre ressaltar que não há Democracia verdadeira se não houver um

processo eleitoral capaz de garantir a idoneidade, transparência e equidade dos pleitos

destinados a escolha de nossos representantes políticos.

A atual legislação eleitoral brasileira (incluindo aí instrumentos como a Ação de

Investigação Judicial Eleitoral), considerada por muitos como uma das mais democráticas do

mundo, é fruto dessa evolução histórica, da conquista pelo povo da promulgação da

Constituição de 1988 e da necessidade de se extirpar, cada vez mais, os fantasmas da

corrupção, da fraude eleitoral e da preponderância dos interesses de uns poucos, em

detrimento da maioria.

Embora nem todos os fantasmas tenham sido vencidos, pode-se dizer que o pais está

no caminho certo. O Brasil, hoje, é um país respeitado, reconhecido internacionalmente por

muitas qualidades, incluindo seu processo eleitoral moderno e altamente seguro.

É verdade que toda a evolução promovida em nosso sistema eleitoral não garante um

sistema perfeito, eternamente livre das práticas desonestas que teimam em macular o processo

eleitoral, buscando beneficiar candidatos inescrupulosos. Como em todas as áreas da vida, no

Direito Eleitoral a luta contra as práticas criadas por indivíduos que buscam burlar o sistema

para se beneficiarem é um processo permanente, construído por muitas batalhas, cuja vitória

pertence à democracia e ao povo brasileiro.

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______ Súmula nº 19 - Publicada no DJ de 21, 22 e 23/8/2000. O prazo de inelegibilidade de três anos, por abuso de poder econômico ou político, é contado a partir da data da eleição em que se verificou (art. 22, XIV, da LC 64, de 18/5/90). Disponível em: <http://www.tre-mg.gov.br/portal/website/jurisprudencia/publicacao_sumulas/sumula_19.pdf >. Acesso em 20 jul. 2009.

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