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1 =: I LUSTRACAO PoRTUGUEZA :J= 1

E<:ti.çã o s em.ana1 do jorna l "O S E C U LO" 1 Dlrcetor - J. J, DA SILVA Gl\AÇA ' ISSI NA T Ull A>< : Por tu11111. Ili'"" n<l)ncc n ti•• e i>spnnhn:

Pr oprJe<ln<lo <ln SOCJEDAD~ N ACIONAL DE 'l'IPOGRAl'lA Trimostre 6l)60. -sem estrc.13$00. - 1no 26tOO. " 1111 . INTO"H' MAIUA LOPES 'OL ONI I S l'OHTUGUl•::<AS: S<·mest1•c 14$00 - A 110 28$00

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Directora: - MADAME CAMPOS . bureada pela Escola Superior de Farmacia da Universidade de Colmbra.-Oiplomada com frequencia em massa· gem MEDICA ESTETICA, peclicure, manucure e tintura de cabelos, pela Escola Francesa de Paris d'ORTOPEOIA E MASSAGEM.- Ex-massaglsta assistente do Hotel Oieu, de Paris. Antiga professora diplomada inscrita e premiada

em diferentes cadeiras. Quimlca-Perfumista e Socia efectiva de diferentes Sociedades Scientificas, etc., etc.

A VENIDA DA LIBERDADE, a3-A Telefone

Eslabelecln;enla unlco no genero e111 Purluga1 e o 11als 111po111n1. da h nlnsula

Esthetica Feminina .Jrafamenfos de }Je/e:(o p•lo êlecfriciclade aplicada sob todas os suos j6rmas

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I ACADEMIA SClfu;FléðoÊ eÓÊ~~osT•~·~v~·~.;~ .. ;:~~~;~~~~:;:·~~~

COMPOSIÇÃO DE MAMIA ROQUE GAMEIRO

li Serie - N.• 827 Lisboa, 24 de Oeze:nbro de 1921, 60 centavoa

O INVERNO

MEZ de dezembro. O inverno começou a

desenrolar-se em ftlm interessante e co­lorido. O limpido ceu portuguas, de sol doirado, quasi nos faz crêr que as arvo:.,. res despidas de folhas são o acessorio melancolico dum cenario mentiroso e o

frio cortante numa ilusão doentia. E está frio, um frio que o nordeste aviva e vai

avivar o carmim dos rostos. De noite, nestas noites de cidade, em que rara­

mente erguemos os olhos ao ceu, as estrelas lustrosas tremeluzem indiferentes, vendo passar as estrelas da terra, de olhos luminosos. de sorriso claro, na ele­~ncia dos vestidos caros.

Enfeita-se o pinhetro festivo das arvores do Natal, -iue as crianças pobres fitam com olhos cubiçosos. Os automoveis passam. carregados de .brinquedos, com os vidros bri lhantes e os c/zauf{eurs ricamente agasalhados.

Os ultimos retardalarios recolhem á capital, vaci­lando entre o inverno que os attai e o receio que os retem. O pulso da cidade ainda está febril, ha o mal estar latente dum enervamento de incerteza.

E o Natal chega ... a festa da paz, da familia. das criai1ças .•. das crianças que põem na lareira o sapa­tinho minusculo, delicado, que ás vezes é um sapati­nho roto de pequenino pobre. que tem por um acaso feliz uma ternura de mi'le piedosa e crente.

Ha violetas e cravos nos floristas, violetas roxas, cravos roseos, perfumados. frescos. Nas 111011/res ha joias e bolos, peles e veludos. Aparece o livro novo, os teatros anunciam premiéres, fala-se de S. Carlos e de réueillo11s elegantes. e de vez em quando uma bomba estrondosa chama-nos a uma realidade per"t"~~~ badora e séria. J

Mas a vida segue. nessa ansia de viver caracteris­tica nas epocas revolucionarias, a vida caríssima que faz perder a noção da conta de spmar. tfa coragem inconsciente, frivolidade despreocupada, egoismos insensatos.

Os asilos sofrem. os pequeninos choram, os ve­lhinhos penam.

E o Menino Deus. que os cristãos ha vinte secu­los deitam nas humildes palhinhas dum presépio, en­l:lina-nos a simplicidade, o amôr e a paz.

Mez de dezembro. Inverno gi!lado. Chega o Natal. Pensemos nos pobres.

MAIHA 1)1! CAl{VALHO

Uma das nossas leitoras da 'Beira Baixa, concelho de Seia, acaba de nos enviar o soneto que em

seguida publicamos, em atençi'lo á gentilissima se­nhora e por entendermos que a sua publicação deve ser agradavel a alguns dos nossos colaboradores.

Eis o soneto:

A minha alma já quer luí muito tempo, Contar um segredo á Ilustração; Mas tem medo que seja indiscrição Perdoem pois o me11 atreuimetito.

Os poetas que admiro são só trez, Não sei d'orule me uem a opinião, Pois entraram tio meu coração, ju111inhos como a conta que Deus fez.

Dizer os nomes não me custa nada, Mas st11to-me um pouco e11uergo11hada Vá lá, sempre digo ... o coração manda ...

Os poetas da mi11/z' alma acrea11çada, Alma de quinze anos agarotada, São a Virgínia, o Ferro e <z Fernanda.

•MARIA-.

E' evidente que se trata de Antonio Ferro, Vir­ginia Vitorino e Fernanda de Castro. A' gentillssima feitors e inspirada poetisa, agradecemos reconhecidos em nome dos felizes contem1>lados.

NO passado numero publicou a !lastração Por/11-gueza na 1.ª pagina, o retrato da filha mais nova

do distinto pintor Carlos Reis, que ha dias, juntamente com seu irmão, o pintor João Reis, inaugurou na Ruü da Trombeta uma exposição dos seus ultimos traba­lhos. Por lapso houve uma mudança de nomes. O re­trato publicado é da sr." O. Mana Luiza Reis, e não da sua irmã, e poetisa Maria Leonor Reis, como d.sse a Ilustração.

Q Diario de Lisboa publicou ha dias um artigo em que se tratava do preenchimento da vaga dei­

xada na Academia de Sciencius pela morte da ~rande escritora D. Maria Amai a Vez de Carvalho. A /l11straçdo Portugueza en~rev iston algumas das se­nhoras indigitadas para o /aute11ll da Academia.

-Que pensa a este respeito?-perguntámos 'a uma poetisa há pouco enriquecida - gostava de _ir para lá? .,

-Eu não ... Nunca vou para fauleuils Só_se me dessem camarote ..•

Ü proximo numero da /tustraçcio Portugueza é co-laborado pelos melhores escritores portugue:r.es.

Deram-nos a honra de dar colaboração inédita para esse numero, entre outros nome:;, o grande poeta Eu­genio de Castro, Aquilino Ribeiro, O. Branca de Gon­ta Colaço, Virgínia Vitorino, Fernanda de Castro, Dr. Samuel Maia, •'unes Claro, Souza Cost 1, João Ameai. Manuel de Souza Pinto, Dr. Al1redo Pimenta. Americo Durão. ,.... O numero será ~rofusamente ilustrado por Alice Rey Colaço, Milly Passos, Albert Jourdain, Almada Negreiros, Jorge Barradas. Apeles Espanca, Leitão de Barros, Rocha Vieira e Bernardo Marques.-A capa é de Manuel Gameiro, filho do ilustre pintor, Roque Gameiro.

A N · A T o L E

M Berget, ou por outra, Anatole France, quando o vi a vez primeira, ha já um bom par de anos, usava ainda uma p~ra de coronel tarimbeiro na reserva, tal

• como outr'ora Carrier e e Henri Martin o haviam retratado. Alto, insinuante,

le\lemente curvado e \lagaroso nas falas, o Mestre da «Jeanne d'Arc», socialista e crente apesar do seu septicismo, apenas agora está mais branco e de bar­bicha mais livre. Os seus olhos é que já eram os mesmos do quadro ultimo de Van Dongen, o genial colorista das mundanic-es deste Paris no\lo·rico. Só nos oll1os de Junqueiro vi a expressão fonnidavel dos do autor da «Thais», ainda que os deste, filosofo e burguesoide, fossem mais fracos de e/Ir e ele brilho, menos \lerrumantes, menos aguia, como soe dizer·se em calão de café. · Anatole. como qualquer Deus deste vale de lagri­

mas, vestia uma quinsena singela, e na cabeça trazia um barretinho encarnado, unica nota viva que ti lém do seu olhar se lhe descortina\la ao primeiro remar­que. Estava doente, disse-me, e andava preocupado com a saude de uma Senhora a quem muito queria, e que eu presumo ser Aquela a quem ha poucos meses ainda, segundo os camets bisbilhotaram, ele ofertou o anel de noi \lado, com receio da morte. De resto, logo á entrada, a velha que me abrira a porta da Vila florida, me mostrou haver tristesa em ,casa. ·

Anal olc. scéplico e in crédulo. se teme a morte é porque precisa da vida para escrever ... o testamen­to, pelo menos. Sereno, de sorriso resignado, falava fJOuco e sem nervos, sem apostolisar ne111 pensar em Deus, corno um filósofo que espera conscienciosa­mente, superiormente, o feixe da consciencia, para a sua gloriosa vida de artista e pensador.

Quando o procurei na Avenida do Bois, na Villa Said, Vila cheia de mara\lilhas góticas e romanices. ia-lhe apresentado pelo deputado socialista do meu arrondissemenl, atravéz duma carta singela que este lhe escrevC!ra. Recebeu-me simplesmente. fazendo­me apenus as;iuarda-lo uns cinco minutos, tempo sufi­ciente para que eu notasse umas esculturas, fa ianças e umas arcas antigas da sua ante-camara. Aberta a porta, ei-lo qne aparece com um paliclo sorriso aga­salhador. Os seus olhos acharam-me joven.

Deseja então Fazer o meu busto? . . . Pois muito prazer me dá. Apenas o meu tempo é curto ... Mas sempre lhe destinarei algum.»

Mestre, titubiei: Eu pouco mais desejo que vê-lo. Não ouso roubar-lhe muitos minutos, porc1ue seria .roubar preciosidades d'arte. Seria maior crime que roubar uma montra de joalheiro ...

Sorriu como menina maliciosa c1ue não crê nas amabilidades, e contou-me a historia do busto de Victor I-fugo feito por Rodin, de quem me pareceu

F R A N e E não gostar. Eu já não a conhecia mas eacutei-o como quem ouve um conto inédito.

«Conhece a minha obra? inlrerrogou-me. E qual lhe agrada mais dos meus bouquims?»

Tremi e mal soube responder-Ilhe. Como se me fe­chassem a memoria rapidamente, /havia-me esquecido até dos títulos dos seus li\lros.

- Conheço. A melhor que conlheço, a minha Mes­tra que só existe na minha ancia, <D seu «Lys Rouge,» disse entiio como quem me arramca um aente, é tal­vez o que mais me emociona ...

Sorriu ele novo e ajudou-me. -«Sim ... Tambem gosto dessse li\lro. Mas tenho

outros que prefiro. Porém, você airnda é novo para os estimar de preferencia... O Sen)hor é hespanhol ?»

- Não, Mestre. Sou português. Vós sois o literato francês que na minha terra mais se estima. Lêmo-lo como quem IC! a Bíblia ...

-«O senhor é religioso. pelo qwe vejo ... » - Todo o português o é, respomdi pimponamente.

«Eu sei ... eu sei ... Sempre me interessou Por­tugal pelo seu ca\ldlheirismo ... »

-C~ue é um modo de ser relligioso, interrompi. Portugal tem bons pqetas, sei bem. E prosa­

dores?» O meu país é um país de fé e de lenda. Eº o mar

que nos ensina os versos. A nossa. prosa são resas ... - «Lembro-me de Eça de Que~iroz, um ar tista su­

blimado ... » - lnfelismente só esse se conh1ece cá fóra. Ainda

bem que é dos maiores. Mas temois outros. muitos ... - «Eu sei de Portugal pela sma l listoria ... A ln­

dia . .. Camões ... Tenho até annigos porh15-!ueses! Artistas é que não conheço.»

Citei-lhe uns tres ou quatro. :falei-lhe de Nuno Gonçal\les que não conhecia. Tãlo pouco Sequeira nem Soares dos Reis.

Escutou-me em silencio. Olhom um relogio. Fala­mos um pouco mais do nosso bust'to. combinamos um encontro, e o Mestre corren a bmscar-me umas foto­grafias subsídios, apressado porque alguem o esperava.

Fixei o ambiente cheio de belesrn. Moveis com fer­rarias virgens de madeira polycroonada, livros. faian­ças, recordações. . . Bom gosto e riquesa; tradição e espiri tualidade.

Reaparece o Deus. Acompanhoo.1-me até à portada, estendeu-me uma mão ma5-!ra, ossuola, sorriu, olhou-me até cá dentro e ao despedir-se pedliu-me beaucoup de de choses para o comum amigo qme nos aproximara.

Cá fóra, respirei largo. Corri ao atelier e esbocei um busto a murro. Ainaa o conser"<Jo.

Já lá 11ae um bom par de anos •.. Que longa foi a guerra! . . .

D. rwM.

SEM

~ º~o

RASTRO (Ao Guilhenn<' de Carvalho Junior)

Usboa, 11111 solâo de châ com as caracteristicas ba11aisle pobres dum salüo de châ publico e moderno. Seis e mela da­das. Apenas Ires mesas ocupadas: a primeira por 11111a ame­rica11a ae passagem, escrevendo postais ilustrados com uma caneta de tinta per111a11e11fe; outra por 11111a porf11J!ues<1 p/an­lurosa, cabelos <111111 neuro vidrento, espreitando de dentro do s11a peliça e através a rotula do 1Jéo a clle{fada d' alu11e111; a terceira mesa por dois homens dos seus triida e poucos anos

A 111erico 11 Vicente.

Americo - E attui tens lu a minha \lida: aturar a:s confidencias do Pedro, desarmar-lhe os desesperos, consolá-lo e repreendê-lo. scmp e il espera de que ele faça uma tolice. Para que não haja homem mais tõlo do que o apaixonado. basta a 1>aixão ser a mais rematada das tolices!

do:s e dos amantes. limas 11ezes :-ão despedidos, ou­tras são eles çue se despedem. Zan~am-se, berram, ameaçam, por f 111 encontram oulrJ casa ou outra mulher . e e:;quecem.

Amer ico Mas emquanto não encontram outra casa ou ontra mulher dizem mal ela casa ou da Vida.

Vicente- Não, o Pedro não fez nem faz nenhuma tolice. Apaixonou-se? Ela não é nenhuma asneira ! Pez muito bem. Ela desped iu-o? E' a sorte dos crea-

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Vicente - Coitados! Gente sem cotocaçilo ! ... O desespero dos desempre~ados !

Americo Ora dêsse desespero dos amantes de-

~ º~º

sarrumados é que cu tenho mêdo. Dou-te a minha pa­lallra de honra: entre guardar um amisto apaixonado e 11elar um doido não ha diferença nenhuma!

Vicenfe As paixões silo justamente como as f11-rias dos alienados - quanto mais 11iolculas mais brc· 11es. Depois 11em um periodo de acalmia, socegam,

Americo Por via de rc~ra .. . Vicente Sempre! De paixão ha quem tenha mor­

rido. Nnnca 11iste ninstuem 11i11er em plena pJixão. nem um louco 11iver em pleno acésso.

Americo Com o Pedro não sei ... Se 11isses que torturante 11iver o daquele r:ipaz . ..

Vicente Cura·se e brelle. E' um cas-i classico, 11uli;iar na mi11ha clinica de almas. Não ha muito ti11c um doente semelhante. hoje radicalmente curado. Foi um caso bonito!

Americo Parecia-se com o do Pedro? Vicente Como o mesmo trecho duma serra da

Beira vista ao luar de dois janeiros ! Americo Gente conhecida? Vicente Estás desérto por saber ... Americo Interessa-nos sempre a doença e o

doente que se parece com as nessas enfermidades ou com enfermos que estimamos.

Vicente - Deixa saír essa americana que eu fa-ço-te a historia do meu caso ...

Americo Do teu caso? ! Vicente - ... Clinico. Americo Ah! JulS!uei ... Vicente O <1uê? Que era cu o .. . Werther? Oh!

filho! ... Americo Pcr~untar não oiencle. Vicente A's 11ezes ... Americo Vamos lá a ou11ir, que os creados que­

rem pôr as mesas para o jantar. Vicente Ação do t." e 5.0 acto passa-se cm Pa­

ris. A do 2, 0 cm Lisboa. Americo Actualidade? Vicente Actualidade. Plena guerra europêa. Per­

sonastens: uma mulher ... Americo Casada? Vicente ln se sabe ... e um hr mem ... solteiro.

Ele cst{1 em' Paris, numa fabrica de munições. Ela 11ac lá parar, acompanhando o marido le11ado a Fran­ça pela guerra.

Americo Portugueses. Vicente Todos portui;iueses. Ela fica sosinha em

Paris e os dois encon1ram-se de outros portugueses. Con11ersam. Grande im1>rcssão, nenh11ma premedita­çã > de côrte. Dias depois tornam a encontrar-se .•

Americo O diabo tece-as. Vicente - Em geral, o diabo não le11a a teia até

ao fim, quem a conclue suo os amorosos. Estes. não f11<1irarn ao seu destino. O terceiro encontro ameia foi casual mas prenuncio d 1 cu111plicid.1de tàcita de outros s11cessi11os.

Americo Até aqui banal como um rei;iisto cilli!. Vicente Banalissimo ! Adoraram-se, era a feli­

cidade, e a felicidade é sempre banul. Sem um pro­logo de lai;irimas ou um epilogo de sangue, a felici­dade não dá uma no11ela, uma peça de teatro, um soneto. A felicidade (• umu casa 1101111 que cheira a t intas. Essa casa castii;iada de temporaes, com as 11idraças estilhaçadas por 11entania de desgraça, po­voada de almus do outro mundo, com criptogamicas na pedra da soleir a, com fendas a abrir rugas nas paredes, o telhado às calvas, uma trepadeira bra11a a selar-lhe as grades do jardim; essa casa, com ~ me­laucolia da idade e o encanto do sofrimento, sim, é uma singularidade. um prestigio. .

Americo Tens razão! Até para os que a 111vcm, a felicidade só assume grandeza depois de ameai;-ar ruína.

Vicente - A. beleza inspirati11a dos 11elhos caste­los! A questão é construir. O tempo é implaca11el. A ruina é certa. O castelo da felicidade quanto mais tempo tem de construido mais perto está da rulna ou da morte!. . . Ao lindo castelo por essas duas personagens construido nas suas almas, não foi pre-

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ciso muito tempo para a patine da desventura lhe enesirecer os altos muros .. .

Americo - Surgiu o . . . Vicellie Nada disso. Era o periodo nj:tudo do

conflito europeu. Nus fabricas de munições 1rabalha-11a-se de dia e de noite. Ele er a um soldado, a quem os soldados que se batiam haviam confiad 1 parte da 11icloria. a felicidade de entes que arna11urn e de quem eram amados. Esses ª"!ores rnar!da~am no seu amt r individual. E tinha séries de seis dias cm que não saía da fabrico. Ela entrou a estranhá-!o:

1l111erlco Não sabia ela o que o prendm? Vicente Vae lá convencer uma mulh r c1ue o .ho­

mem que ela ama a mlo póde ir beijar todos os dia~! A mulher em amor ~burocrata: C;ntradas e s~udas as horas re<1u\arnentares, pontualidade de repartição.

1lmerfco Vieram as ine11itaveis scenas? ..• Vicente Na primeira fol!!a correu a casa dela.

Bateu, bateu, e ninl!uem ! Ao descer, per!!lmtou à porteira: «11 senhora do entre.~ol ?» < 11 senhora do entresol jcí câ mío está.»- Para onde foi? - 1Não disse.» E quando ele ia a sair:-xO senhor é o sr. fulano de tal?» «Sou, sim, senhora. <<Ah! e~rfão talvez seja para si esta carta que a senhora derxor~ parn fite ser entregu<' no caso de a procnrar .• >-«Esta cltrro que é!», respondeu, arrancando-lhe da mão a cartn que a escarninha rnalcvolencia da porteira não mostra11a pressa de entregar-lhe. A carta ...

Am<'rico Cartn precatoria ... ? Vicente Lon!!C disso. A carta, muito bre11c, dizia

em resumo : que prcsentia no amor dêleos prcnuncios do outono; que. por ernquanto, era apenas o amare­lecer dn rolha, é certo. mas que ela não dispunha de forças para assistir ao despiu mar da ar 11ore. da _sua ilusão; por isso. antes que entrassem os primeiros frios e o coração ele todo stelasse para ela, que se afasta11a.

11merico Isso é o que se chama um strito de «agarra-me que eu j'u/o».

Vi<'ente-Parece mas não é. J\ carta concluia exa­ctamcute por este a11iso : «Nat> tente procurar-me. Embora eu vá para Portugal e l'ortugal f/(/O seja o infinito, mio me encontrará.»

Americo-E ele? Vicente Ele fe7. o que tu ou eu fariamos. o

o que faz todo o homem a quem tos:!e o que ele i rna­gina ser 11 sua felicidade.

Americo-Foi a1raz dela? Vicente Pois jà se deixa 11er. Pediu quinze dias

de licença e abalou para Portu~bll. (~uando chegou a Lisboa. descontado o tempo p.ara a viagem de re­s;iresso. fica11a111-lhe tres dias. Correu tudo, lançou mão de todas as aj.!encias de in&orrnação secreta.

Americo-E não a encontrou? Vicente Tinham-se passado clois dias e nem som­

bra! Sabendo que ela deixi1ra dois filhitos num cole­gio. tclefon •li parn todas as cal:>llS de educa~·ào. Só numa presentiu umn hesitação na resposta. Talvez não cornprcendcs!:'ern logo o nome ... Fosse o que fosse. ne${aram que esti Ilessem hí filhos des!:'a senho­ra. Amanheceu o terceiro dia ...

Americo- E ... ? Vicente E anoiteceu o ultimo dia ele <1ue ele dis­

punha para estar em Lisboa. A poucas horas de to­rnar o comboio para França. esse homem fazia dó! A paixào. mas a paixilo á Beyle, a paixão em carne 11i11a, sangrando, desesperada, estava ali, a jorrar mal dições do peilo daquêle infeliz. «E pensar que hei-de viver, que hei-de traballwrl. . . exclamalla ele. Partiu na manhã sei;!uince.

Americo- Sem saber nada dela? Vicent:! Sem rastro seq 1er. Ao 11oltar da estação,

tinha a impressão de que vinha de deixar um nmigo no mani comio ou no Alto de S. João. Dez horas a darem, e á porta da a~encia de policia pri1111da que o meu amis:!O encarrei;iara de continuar as pesquizas. Nada! Voltou á tarde, sete horas, ainda luz de dia. Era Ilerão. A agencia conseguira saber , meia hora antes. o paradeiro de Madame Z: estava crn casa dos pàis, rua tal, numero tantos.

~ º~o

Americo - A felicidade vem sempre ter comnosco, mas atrazada ! Por isso quasi nunca nos encontra,

Vicente - Fui ali ao telegrafo. e dois dias depois de ele chegar a Paris, tinha lá a morada da sua Paixão.

Amerlco - Pediu outra licença, voltou a Lisboa ... Vice11te Não voltou. Deve ter-lhe escri to, a contar

a sua viagem, o seu desespero. a forma romanesca como a procurára e viera a saber do seu paradeiro.

Americo - Com o que ela gosou decerto muito mais do que se ele lhe tivesse chorado nos braços! .. .

Vicente - E' de crêr. As mulheres s;iostam de saber que nos fazem sofrer mesmo quando não gostam de n6s; .

Americo- ... E as trovoadas passam, as chuvas cessam, a primavera volta. Voltou?

Vicente O que se passou entre os dois ignoro-o. Comigo passou-se isto: Ele agradeceu-me num alvo­roçado telegrama os meus serviços de bom amigo, e depois de sr guir-se um largo periodo de silencio, um d'esses silencios de póços onde parece ter caido a morte. Volveram mezes. Um dia escreveu-me, a ped ir qualquer coisa simples e facil, não sei o quê: um livro, um mapa, <1 ,1alquer insign ificancia. Respondi e nessa carta, perguntei-lhe pela sua Paixão incompor­tavel. D'al a uns vinte dias recebi um postal com a concisão das noticias do frout. Dizia-me que ma­dame Z era uma pessoa de tanto juiso que lhe dera a êle um bocado e não se emprobrecera. t:: comentava:

498

Procurar a felicidade sem esperança e com médo de a não encontrar é o verdadeiro goso espiritual uma «reprise» d' amor, é reler um livro ou assistir pela se­gml(/a vez a uma peça de romantismo.

Americo Que desfecho! ... Viceule - Que querias tu? Rapto, tiros, duelos,

gente esganada ou loucos de !irantes, um homem en­forcado, um di-Jorcio seguido d'um registo ci.;il e cl'aí a anos uma mulher com as formas amadurecidas a este belo sol tornadas em peles e o 'galã com uma cinta de lôna a comprimir a obesidade, bocejando e esperando a morte, figurada numa febre infecciosa ou numa diabctis? .•.

Americo - Eu não queria nada d'isso. Eu queria logica!

Vicente Ingénuo amigo ! A logica cm amôr é o absurdo. Precisamente por isso te contei este caso, J>ara que te não apoquentes com a exaltação do Pedro. O que receias? que elê se suicide? Por não ter di­nheiro? Aconselho-te que o vigies. Não o largues. Mas não é fa lta de dinheiro, apenas a falta de uma mulher? Está descançado, Escusas de ir á morgue que o não encontras. Vae á sala de jantar d' um c/11/J que deve lá estar.

JOAQUIM LEITÃO 1111 1ca<lum1a das sc1e11c 111b 11~ 1.i,hv 1<

-

o COMI CIO INTELECTUAL NO ~"CHIADO TERRASSE"

.ttt;

O sr. Antonío Ferro pronunciando o seu discurso

Um aspeclo da assístencia durante o ilscurso ·de Raul leal

PAUL POIRET

..

PAUL POI­RET- o grande cos­tureiro da

nossa Epoca - con­segue, todos os dias, o maior triunfo: es­pantar Paris . . . Ora é a creação duma «toilette» arrojadis­sima, ora o teatro do « Oasis », ora uma revista sump­tuosa, como essa «Vogue» que está actualmente em sce­na no teatro «Mi­chel ». Paul Poi­ret é aquele que nunca se repete. Os vestidos de Poiret aparecem nos «Bou­levards », nas cor­ridas de cavalos,

Paul Poiret

1

Um modelo de Poiret-(l)esenlio de Marfifl)

o FEITICEIRO

DE

PARIS

nos teatros, como os «Vient-de-paraitre nas montras dos 1 i­vreiros. Paul de Poiret é afinal um dos maiores pinto­res da nossa epoca. Ele pinta com sedas, com «crepes » com « organdis». Os cor­pos das mulheres são as suas telas. Paris, o autentico Paris, veste de Poi­ret. Poiret é o feiti­ceiro de Paris, o «mdgicien., dos Bou­levards. No dia em Poire morrêsse que Paris vestiriJ de ne­~ro. . . O arco-iris das « Toilettes» é monopolio de Poi­ret.

Penso. Verbo, sou uma voz sonora .. . Abalo os mundos, pelo céo alastro .. . Aza e togo. Crepito e subo, astro A arder, errante, pela noite t6ra ...

Transcendo ao 1nhmto, Zoroastro, Jesus ou Budha, a procurar a aurora Dum dia eterno emquanto a dór clamora: - "Deus passou por aqui: segue-lhe o rasttro ..• "

O soluço imortal! . . . <) grito amargo, V are embora os abismos, não me asson1bra~. E arremesso-me além! mais alto! e ao largo!

E Deus? Como atingi-lo? Dilacero A sombra onde se oculta, e - ó desespero, O' vóo inutil!- não se acaba a sombra ...

DEZEMBRO DE 1921 CANDIDO GUERREIRO 501

O SILVO DA PEQUENA FLAUTA

N OITE célida do Oriente. oriu1tHI tlc• lasd­

v111; sobrecarregadH de uromus. Nem uma aral<ern. Luar. F.slreltts. como

beijos do azul. Pavões frondosos. Boda de sátrapa, espullrnfatoi->a. Uma

senilidade concup1scentc duma 11ova mo-ddade em flor. Mais uma! Como <lllt' 11111 iru:esto rc­pubivo.

Calor. Rubis e esmeraldas. ScinlihHcies. V~ns, caçoula!i, plumachos. Ma~nificência.

E mudo para ela irremediável mente lamulltl\'a-se o silvo da pcc1uena flauta!

O monarca avistara-a do palanquim. sonolento. ao recolher du111a peregrinação. Da entrada do seu jar­clim, se~uia, no monte. os ultimos passos de a lguem, com um sorriso íosforecente.

A cubiça da luminosidade desse sorriso levou-o a ordenar. imedi&tamente, que lhe fl\sse trazido: igua­ria picante para o seu esgotado paladar.

A::onteceu não ser ela nenhuma misera escrava. Filha dum vassalo poderoso. houve que prc meter ao pai o casamento. Só assim, relutante. a deixou levar. bela e linda, numa manhã em que as aves e as rosas manifestavam menos vontade de desabrochar em cântico e em perfume.

Enlutados os labios, e orfãos de sorriso o rosto e o olhar. denunciava a tristeza cios que velam uma defunta esperança.

Nessa hora amaq~a de violencia, ia para a côrte mais acabrunhada do que se fôsse para a morte. Cho-rava. •

Aquele roubo, que lhe faziam, ele si própria, era, de facto. a a~onia da sua ,iraciosa liberdade, e. mal maior. era o seu amor para sempre malof,lradó. '50-luçava.

Porque. no seu coração alvorescente. o amor sur­~ira: luz formosa a iluminá-la toda, como o so1 da alvorada à montanha c1ue lh'o depurara.

Amor fundo. inicial. cheio de paradisíaca can­dura. Amor ainda com seu quê de 111fontil na soíre-

1 ' guidào; pueril, inocente. ' , Todo o con'ttáriu do sórdido oseudo-amor do 11elho

déspota luxurioso. inspirado no de$ejo mau de ba­bujar essa centésima fresc11ra virstinal.

Lanças Sold<1dos. Clangores de metal e rnfos dr tambores, quu11do a recemvinda transpôs, mais triste do <1ue ames. o limiar da morada s11111pt uost1 do vi­cioso.

Alcatifas, coxi11s. tecidos !lloriosos, oíereccnclo repouso. aco11sclhando indolencia. ffosinas caras vo­latilisando perturba\·ões. Espirais afrodii->iacas dl' fumo, move11do-sc no ar como toutas caridas inter­mináveis.

Numa jaula de oiro. uma gazela saj.!radn e mansís­sima: vivo símbolo ela j.!raça prisioneira.

Fontes constantes e11chendo piscir111s de mar111orc sonoro, i1 beira das quais, como sombras nuas, es­cravas solícitas apresentando adornos e bálsamos.

Fausto, rique1.11, esplendor. Mas nem a lépida água abrandadora, nem u mu­

sica dolente ele invisíveis cordas, nem a novidade do ambiente. nem as surpresas do recinto, 11e111 oi:; consôlos dus aias e a doçura das essencias lhe es­tancaram. nos olhos de topasio ou nu 1-'mpalidecida bôca de rosu esquecida da sua côr, as láj.!rin111s e as queixas <ln penu de deixar de o ver. quando, ao ~u­mir-se o dia. ele vinha, alegre e môço, fazê-la duvidar de que a noite se aproximava.

De que lhe serviam as unturas precios<ls. para que prestavam manilhas e colares. o oiro e as pé­rolas, se o amor não tornaria a ungi-la castamente. e. joia da sua vida, o ia perder - cuidava - o tinha per­dido já?

Se nunca mais ai dela! - a tardinha lhe traria, abençoado. desejado. o leve chamado do silvo clR pequena flauta, que o anunciava, que o precedia, que a tornava feli1. !

Tra11sformudo. para a ver, em humilde e11cantador de serpl!ntes. 11e11hum dos reptis cio seu venenoso saco obedecia ás 11otas misteriosas da flautilha com mais pres,;a e <.,!arbo do que ela. ao ouvi-las. tremente. com o ,,~11 corpo s11ss11ltante e a sm1 alma fascinada.

.. Proml•ssas. ameac;as. conselhos. presentes. nada

11ale11 para a alegrar. Triste che!lara, triste estivera. e mais triste ainda asshstira, pálida, ao banquete nupcial.

. Um 111iu11to só a sua dor se suspcudern. iludida, Jttli;!u11do ler ouvido no purq11c.:. onde alvos el<'fantes passea11am e boia11am cisnes nestros. o saudoso sil\lo da pequena flauta. Mas não; não era a dele.

Ç~lebrado o .desposório entre nrnsinificas pompas astrd~osas. av1s111hou-se, terrível. odiento, a hora

do no111ado. Quando as damas a deixaram sósinhu e fra~ranle

na recílmara aparatosa. ia desfalecendo. Cobrou. porém, ílnimo p11ra lutar com o ridiculo esposo, a quem os vapores do hidromel ha11iam roubado os restos do seu simulado aprnmo.

O c1ue ela viu entrar no aposento. e c.:111 breve ro­lar desamparado sõbre os fôfos almofadões, foi uma trouxa constelada de pedrarias e dislinti11os.

lss~ ª·serenou no propósito decidido. que formou, de res1sttr, de não ser dE:le; de se defender até mor­rer ou até matar.

Vendo o tirano adormecido, anulado. respirou melhor.

Fóra, a noite era um idilio de astros e perfumes. Abriu a janela, saíu à varanda. olhou, pôs-se a

sonhar. Rils taS!arelas importunavam o silencio Uma que

outra ave carpia ou canta\la escondida, de c1uando em c1u~ndo. O ar era 11olupia.

Mais calma com a ausencia temporaria do peristo d~ repente estremeceu, vacilou, passou a ser um 011~ 111do apurado e uns olhos que farejam.

Parecera-l he escutar, como ao lousie, o sil110 da pcc1ueua flauta e \ler, fendendo o bosque, nma forma a avançar.

Enfirmon-se, atentou, duvidou. . No11am1lnte, confirrnadoramcnte. n pe,p1cna flauta

deixou soar, de manso. o silvo inconfund111el, prome­tedor.

Teye então, divinamente. a certeia de ,1ue ele se apr~x1maya, de c1ue a procuralla. Com a lâmpada que ardia mais perto, ~enunciou-lhe a sua presença. A!!ra­d.ecendo-lho, o silvo da pequena flauta foi um cân­tico.

Logo, como nos passados dias de 11entura, ele es­tava á sua beira, namorado. O beijo que se deram extasiados, foi o primeiro. '

A.gora, que era noiva contra a sua vontade. ela queria s~r mulher. Na varanda engrinaldada, perto da embriaguez do vil esposo oficial , noi11uram des­llairad!lmente, à claridade longinqna das estrelas.

Uniu-os. soldou·os um ao outro, o amor llitorioso t~o fortemente, que, 11encidos de prazer. esc1uecida a s1hta9ão. a manhã os su.rpreendeu dormindo a par.

V1~am os jtuardas o 111truso junto da nova favorita, e hesitaram em proceder.

Um .houve que deu o alarme. Despertando, a furia do ébno não conheceu limites. Foi um Vnlcão de pragas.

Encarcerados os culpados. losio se convocon um conselho, nilo para os julgar. que nilo era preciso; para assentar no género de morte correspondente à andacia inconcebivel do delito,

Foram vários os alvitres crucis. Para lison!o(ear o senhor, cada valido se improvisava em carrasco.

Prevaleceu o malvado plano dum eunuco impie-

doso e hiporrita. que u todos pareceu igualar em torturn a c11ormicl11clc cio crime.

Nilo tardou em publicar-se a sentença. Mandava que, despojados do vestuario e postos

de costas um para o outro. fossem apertadameute li­gados e. depois de besuntados de mel, submetidos à gula d<?s moscardos. das vêspas e dos abelhões.

Assim. surpreendidos como haviam sido de labios nos lábios. não poderiam mais beijar-se. Acabariam por morrer, pouco a pouco, sentindo-se juntos, sem se poderem tornar sequer a ver, e mandando cada um os seus gemidos a um ponto di11erso do horisonte.

Cumpriu-se à risca o determinado. A expiação co­meçou.

Atados brutalmente um contra o outro, as fortes espáduas dele calcando os ombros dela, delicados. levaram-nos para um descampado onde os insectos enxameavam .

. Era horrivel o suplicio. Nem a voz. partindo em direcções opostas. lograva confirmar· lhes. animado­ramente. a aproximação das almas. irmanadas no castig~ aviltante, como nas horas apaixonadas.

Avidos do dulçume. que aos dois queimava a pele os fer~ôes pm~giam-nos à~ centenas. Já o sangue lhe~ e~corna d~s 111umeras picadas quando a noite, sua­v1sante, foi tombando.

Para que ela repousasse vagamente. atirou-se ele ao chilo, de bruços. aguentando o peso ligeiro du­qu~le corpo querido. Protestou, quiz ser ela u sofrer mais, tentou voltar-se.

As cordas. retesadas. não lhes permitiam <1m1lqucr movimento. Cada 11e1. mais ardente. o amor ameaçava prolonstar sobrenaturalmente o bárbaro tormenfo.

Na .noite escura, misteriosamente. o silvo da pe­quena !~anta ecoou. Talvez alg1C,m vigia. entretendo-se a expernnentar ac1uela lembrança do condenado!

O som emocionante perturbou-os. espicaçou-o;;. Mo_111dos. por fôrça soberar_ia, os labios apeteceram-se mais. qu1~eram colar-se. ftndar ·beijando-se.

Cumphcemente. sugerindo uim ao outro o herois1110 dolo~oso de cada esforço tend(ente a realisar-lhes o 1 deseio. desp~ezendo as angustia.is da carne a11ergoada. foram aprox1m11nclo as faces, voltando as cabeças, torcendo os corpos.

. Num esforço supremo, a~ duias bocas con;;eS(niram u111r·se. tocar-se, confunclir·se.. Triunfante como o primeir'>, llibrou nelus o ultimo ll>eijo.

,\ d.ese:;perada manobra apre:ssara-lhes o fim. Solidas, as fortes amarras haviam-lhes mordido

os membros como gumes, escaichando-lhes os arca­bouços e pondo-lhes a de~cobertto os corações.

Coração com coração, bõca com bôca num beijo insepara\lel, os dois amantes mostraram' ao sol do outro dia terem. na morte conno na vida. cumprido exemplarmente o 111a11dado am1oroso do sil110 da pe­quena flauta.

MANOW. 0)1-: SOUSA PINTO

IW.Sl!NllOS 01; AUll'lll JOllRDAIN

1 1

I • 1' 1

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luiga Baccara por Adolfo Carolis

A· O A 'G 1 O A f..,u t ZA D • CJOARA

F LORENÇA- a moldura de Dante, um Dan­

te em tamanho sobrenatural, a cidade que está no interior de Itália, como um sachet, a eonservar-lhe o perfume da Renascença, vive tambem nos meus olhos líquidos, nos meus olhos- miniaturas

de Florênça- com os cílios a rodeá-los, arvoredo das c.olinas, com um Arno tranquilo na agua quie­ta que me cerca as pupilas ...

Sinto reviver em mim a hora em que cheguei á cidade, essa hora eleita que a sombra de Dona­tello esculpiu na minha saudade. Chego a Florença Julgo-me a unica verdade numa terra que me pa­rece mentira. As velhas casas, de telha.dos aba.­tidos, como ca.~quelles, pa.s.saim por mirn, a olhar­me, a resmungarem nos gonzos dos portões- as desdentadas bôcas dos palácios do quatrocentos ... A catedral enguaritada de santos, sai-me ao ca­minho, obriga-me Q. olhar o céu, no grande dedo erguido do campana.rio de Giotto... Em frente, no Beptisterio, as portas de Ghiberti, acotoveladas ele santos, murmuram, rezam, de sol a sol, nos cor­pos bíblicos, bronzeados, expressivos como pala­:nas .. ! •

Sinto agora bater o coração de Flol'ênça. Es­tou na Piazza della Signoria, a praça evocadora, vibrante como um orgão ... O Palazzo Vecchio, em­brulhado na capa remendada da sua pedra mu­lata, encapuçado na velha tôrre medié~a, é a son:.­bra de Dante isobre a cidade, a .sombra desse Dan­te cujo ·perfil parece um punlial-um punhal de Cellini. ... A' direita, a Loggia dei Lan­zi- o pálio de Florênça--cobre com piedade e ter­nura, as esta.tuas de Benvenuto, de Jean de Bou­logne, de Donatello-corpos que o sol abl'aça, que a chuva molha de beijos ... Na fonte Ammanati os

Tritões endiabrados, as nereidas desejosas, dan­çam em volta de Neptuno- um corpo de Deus com olhos de leão manso ... A' entrada do «Palazzo Vec­chion, uma copia perfeita do David de Miguel An­gelo parece erguer a praça, parece sustenta-la nos seus olhos recemnascidos, nos seus olhos atléticas de pureza ...

Pela praça, habitualmente quiéta, sonolenta, a repousar ainda das lutas dos Buondelmonf.i e dos Uberti, vai um clamor de pregões, uma bal­burdia de vozes, uma m:airé cheia de emoção ...

- ull Nuovo della Sera». .. uLa Tribuna•1 ... «Giornale de Itália>l ...

Sã.o sete horas da tarde, a hora em que Flo­rênça começa a ageitar-se na sua antiga capa, em que MachiaveJ ressuscita no crepusculo dos bêcos tortuosos ...

Dia de Natal, um natal falhád-0, um natal sem perdão, um natal sem Jesus, um natal com (l'Annunzio ... Luta-se em Fiume. O poeta-en-tllte

da Italia- é a en-téle de todos os jornais ... Cone um boato sinistro, um boato que põe luto 1:1ª Ho­ra D' Annunzio está feri(lo na cabeça, fendo na sua.Ideia!. .. Nos a.ngulos da Praça form~m-se gr~1-pos, comentam-se os jornais, chora-s.e d Annunz10 chora..se aquêle que jamais c~orou, cho1:a-se o ldeaJ mort,o do Maior Poeta, da. maior rorça vwa des!-ê. se­culo ... Vou de grupo em grupo, áv1ao de noticias, com o coração em estilhas..,.--altait· dum santo derru­hado ... O «Pa.lazzo Vecchion curva..se tambem parn onvir, para sal)()r que ~ai fizeram ao seu herdeiro, -a:o herdeiro da Renascênça.,. .

Desorien~ado com as mãos a sangrarem dos jornais ainda fl:escos, perco-me .pelas vielas- ver­soo livres de Florênça .. . Sem saber como, encontro­me sôbre a ponte velba., a ponte dos ourives, ess'.1-mendiga de chale retalhado, de ossos á supe.rf!­cie, de dentes cariados, mas ainda com as falanges cintadas de aneis, mas com vel'sas de Dant.e ain- · da na memoria ...

Atravesso a ponte, labirintiso-me pelas vi.elas e bêcos, tomo, sem querer, o caminho das colinas, longe de miro, acordado apenas, de quando em quando, pelo riso claro dos coltaaes, das vilas, destais vilas florentinas que riem, que riem muito, de dia, de tarde,, de noite, que a tréva não consegue apagar, não consegue venc'er ...

Estou na praça Miguel Angelo. Debruço-me do balção que rodeia a praça, ponho-me a assisti1· á morte de Florênço., ao seu despetalar ... E' a hora do Poente, a hora maquiavélica, a hora em que a cidade começa a aferrolhar-se... Os dômos, os palácios, as iôrres, quebram o seu aprumo, espe­ctralizam-se, põem-se a rezar, perdem a rigidez que o sol lhes dá, soluçam em penumbra ... Santa Maria Novella, Santa Croce, a Catedral, soltam os ultimos suspiros, os suspiros agudos dos cam­panários ... Sôbre o Arno já não ha pontes ... Foi o· sol, no poente, quem as destruiu ... O próprio

• Arno va,i deixar de existk .. O Arno da; F lorênça noturna- é o luar que a banha ...

Olho em volta de mim. Os pinheiros, os euca­liptos, os cipréstes, agonisam na sombra ... E eu sinto nas minhas mãos trémulas, doentes, caídas ao longo do meu corpo, o ritmo das fôlhas mortas pela estação morta ...

Florênça chora, Florênça sofre, Florênça apres­soi.1 a noite para esconder a sua dõr ... D'Annunzio foi vencido... Morreu a ultima esperança de F lo­rênça, moneu a ultima esperança da Itália re­nasc'er outra vez ... Chegaram a rir dêle, chegaram a rir daquêle que desejou ter a bola do mundo, nais suas mãos femininas, para a devolver a Deus, para a arremessar ao céu ... Não o compreenderam, não souberam o que êle queria. ... Não o de ixar~

Fotografia oferecida por Gabriel d' Amumzio a Anfonio Ferro;quaudo da~sua estada en(Fiwne

esbanjar alé ao fim a herança de Beleza que a Renasc~nça lhe legou ...

Noite do natal... Noite em que Jesus nasceu, noite om que Florê11ço. ó o sarcofago do Sonho do M11io1· Poeta ...

Quo importa, afinal, a incompreensão dos ou­tros, de lodos aquêles que têm algibeiras por todo o corpo, que têm a alma fechada., como uma casa onde ha ta.ntasmaa?

Deus está com D'Anuunzio, Deus soluça ... Noi-

te de Nalal... O menino JesuR a.corda e chora ... O menino Jesus tem pena de ter nw;cido ...

Flo1·ênça cobre-se de crepes ... Florênça veste­se de luto, veste-se de noite ... E' de recear que o sol não volto mais... E eu próprio, sosinho, na Praça Miguel Angelo, exilado na tréva, levando as mãos aflilM á minha cabeça dolorida, sinto crepes nos meus cabelos-nos meus cabelos ne­gros ...

A1nos10 FERRO Ulllmo eo.pltulo do livro •Gabrtel ll'A1111u11~to• a a11ar~cur em Janeiro

ME MORIAS DE SUA A LTEZA

o DUQUE DO PUBLICAÇÃO AUTORISADA PELA SENHORA DUQUEZA D O PO RT O

(CON llNUAÇÃO)

A' ultima hora. quundo os creados de D. Afonso já estavam na estação com a ba· ~al-(em. o rei mandou-lhe dizer que não seguia viagem; foi nm grande desaponta­mento para o Principe e produziu um pecisimo efeito no Porto. Todos sabiam

o motivo da ausencia do Principe herdeiro: mal co­nheciam D. Manuel. emquanto que, ainda rapa1.inho. D. :\fonso já tinha ali uma rua com o seu nome.

Sele anos mais tarde, quando Sua Al teza Real Pslava em Espanha, já casado com a unice mulher que amou. era vi­s i tado diaria-111cnte por deze­nas de porlu1tuê­scs dos ma's in­leli\!entes de to­dos os part idos. As conversas r<.'­caiam muitas 11<'­zes sobre o Porto e a adoração da sua siente por O. Afonso. Os visi­tante!' então per­siuntavam in va­riavelmente ao Principe se tinha esperanças de voltar a Portu­~al; sorria e não rcs11ondia. Diri­i;tiam-se em se­~uida á Prince­sa. fazendo-lhe a mesma perjtun­ta; ela. so1 ria esiualmente. olhava para o mur ido e tambem não dava outra rcspt1sta.

CAPITULO VII

O IOILIO DE UM PR!i\CIPE

QUANDO O. Afonso tinha õ8 anos encon­

trou em Napoles, e mais tarde em Roma. uma rapariga de 18 anos, que viajava com a fa1111lia; conviveram apenas uns meses, de1>ois ela vol tou para a sua casa na America com seus pais, e ele part iu par a Lisboa. Como quasf todas as pes-

soas que estão apaixonadas. fa­laram de casa­mento, mas con­cor dar a m que era imposs i11el realisa-lo nac1ue­la ocasião e com esse senso p1 ati . co moderno de que eram ambos dotados, decidi­ram espe r ar, co 11 servando-se fieis um ao ou­tro. (1)

Los;io depois da chegada de D. Afonso a Lis­boa, e depois do res;iresso da ra­par i<!a a New­York , tiv er am ambos, por uma coincidencia cu­riosa. um ataque de febre tifoide que lhes toi qua­si fatal e os dei­xou mais profun­damente apaixo­nados do que nunca.

P r o l o n ~ava­sc o silencio, prenhe de recor­dações. e quan­do esses leaes patriotas se se­paravam do seu Principe. os la­ços entre eles apertavam - se cada vez mais. A' despedida, o Príncipe agrade­cia-lhes a sua visita, com um

D. Afonso "º ultimo carro em que andou afifes do assassinato do rei D. Carlos

Havia 11arios obs tacu l os ao casamento : am­bos er am pobres; só mais tarde é que a rapariga herqpu uma for­tuna e a familia dela tão arden­temente protes­tante, como a de­le ere fervorosa-

for te aper to de mão e o seu tão doce sorriso. dizen­do-lhes: «Awadeço-vos a lealdade que se1111>re me mostraste e a meu irmão.>,

Quando os monarquicos o encontravam. no seu exílio, diri1tiam-lhe habitualmente em s;iuisa de sauda­ção as ~guintes palavras: i N\eu senhor, em bre'le a Família Real estará de rei;!resso cm Por tugal.»

E todas as vezes recebiam a mesma resposla sin­cera e sem rodeios: «Não me parece.»

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mente catolica, opunha-se, portanto; submeteram-se ao Destino, se­parando-se na aparencia mas rião de coração.

Trocavam telegramas e escre11iam·Se muitas car­tas. mas não se tornaram Iler durante anos. No de­correr desse tempo, muitos acontecimentos kaleidos­copicos e rapidos se sucederam na 11ida da rapariga,

( ' ) A s~uhMa O•· q11<• rn su Lra•a (• \1188 N1•1• ua :. ()u c, clc-1101• d••&IO t•xtllo, cMou O uns ou t re~ veze~ . 1'. 'I'.

até que por fim encontrou-se na situação de poder casar com o homem que amava.

Facto estranho: no mesmo ano cm que foi possi­vet á rapariga ir ter com ele. tinha D. Afonso atra­vessado uma crise tragica. A sombra da morte e da ruina estendera-se sobre a sua vida; parecia que a Providencia os tinha aproximado pelo cominho doso­frimento e da tragedia.

Desde então. raras vezes se se1>araram, acabaram por casar e foram supremamente felizes. apesar de condenados a nunca verem juntos esse Portugal, c1ue o Principe tanto ttmava.

Agora algumas pala\lras sobre a rapariga, hoje mulher. que tinha moldado a sua vida na mira de vir a ser a esposa do unico homem por quem sentiu amor. pois em toda a sua vida nunca nenhum outro conseguira de8pertar nela a mais leve som-bra de simpatio.(l)

Nascida na mes· ma cidade que seu pai, nas margens dum lindo rio de lnglater­ra, educada com a severidade pro p ri a das familias rigoro­samente protestan· tes. A sua educaçilo foi toda feita em ca· sa. Dos seis aos de· sasseis anos dedi­cou· se exclusiva­mente ao estudo; era um prazer ver a ale· jlria que sentia ao aprender q u u 1 quer coisa.

Aos 18 anos fez com 8eus país a pri • meira viagem á ltalia; até entilo, nunca ti­nha ido a diverti­mento algum. Os con­certo::. e teatros eram -lhe completamente desconhecidos; fre­quentava a egreja e ia ali nas mesmas disposições em c1ue as outras raparigas \Ião nos espectocu­tos.

foram remo\lidos t· o IE>lejlrama portanto >'Clllprc es­perado che~ou emfim á America:

«Vem para junto de mim. para sempre

~1(011.m».

Antes ele casarem, a princesa teve de voltar Ncw­York a arranjar os seus papeis para se poder rea­lisar a cerimonia. O vapor em que embarcou era o «Patria»; foi atacado por um submarino e só por mi­lagre escapou. No primeiro porto em que tocou. Lis­boa, a futura princesa recebeu um telei;!rama ele Sua Altesa ordenando-lhe voltas8e por terra para lfoma, pois assustara-se com o peri~o em que ela esti\lera; a princesa. como sempre, obedeceu ao desejo de seu

noivo e só mais tar­de é que partiu num vapor amercono che· ~ando salvo ao seu destino visto os Es­tados Unidos nllo te­rem ainda entrado nu guerra.

o amor de n. Afonso era dos que não conhecem hesi­tações ou obstacu· los; nesse a~sunto como em todos os outros da sua Vida, foi franco e leal. To· dos sabiam dl•ssa afeição, D. A fon~o não a escondia e da­"ª sempre provus dela. estivesse <1uem estives~e.

Duma o c 11 si ilo. estando retido cm casa, recebeu a Vi>11· to da duquesa da Aosta. irmã da Hai­nha Amelia, qnc o c o n h e cera hoviu muitos anos em l,is· boa e c1ue tinha uma grande simpatia por ele. Encontrou-os sentado, de fro 11 te dum :;!rande retrato da prince::;a, maj.!ni­ficamente emmoldu· rado e cerrado de flores.

Na realidade ha­via um certo extose uas suas devoções; filha de pais muito religioso8, a adora­ção do Divino Des­conhecido era o sua rasào de ser; foi isto que o salvou no

D. Afonso, <1s princesas Mafalda e )o/anda e o príncipe //11111-berto de Saboia. Fofo/:rafio tirada pelo rainha l/c•lena de /falia

Descobrira o :->e· !!redo !

- Afonso. disse. apontando par a o retrato, vais casar?

- Vou. unico desgosto grande da sua vida: a perda de D. Afonso.

O Princioe foi o primeiro homem que lhe prendeu a atenção. pode considerar-se um caso de amor á primeira vista, e desde então nenhum deles 8e des­\liou da linha directa do seu mutuo amor. na lon~a estrade c1ue os conduziu ao altar.

Ele amovo-a apaixonadamente; nas cartas que lhe escrevia em l!)I ,, manda\la-lhe dizer no seu inS!lês pitoresco: «F::;ton arranjando tndo parn que possa­mos casar para i.e1npre.»

Todas snas cartas, acabavam invariavelmente: «Cada dia que passo sem ti. parece-me um seculo.»

O amor da princesa era tambem profundo e cons­tante. o facto de saber que ele existia bnstiwa para lhe tornar a vida luminosa. Um a um, os obstaculos

!i07

Um dia. D. Afonso trouxe da casa de campo do Rei de ltalia um ramo de alecrim. Deu-o á princesa. expticando·lhe: Nós, os portu~ue:;es, dizemos: «Quem pelo alecrim passou e um ramo não apanhou, o seu amor não lembrou.,.

O Rei viu-me apanha-lo e acrescentou sorrindo -sabia para quem era.

Loj!o depois da morte de sua mãe, a Rainha Maria Pia, o Infante principiou a faze1· preparativo.- para o seu casamento, qnc se realisou em Roma. 110 m~s d(• setembro de IU17, A princesa tornou-se catolicn. to­mando no bapt ismo o nome de Maria Pia. [)epoi:;; de ter comungado, recebeu a benção nupcial.

Nenhum dac1ueles que assistiram á cerimonia se esquecerão jámais do tom de absoluta felicidade com que o Príncipe disse. tomando as mãc-s de ~ua mulher ~sou teu marido: .

As separações e tristezas ha\liam acabado; dai por deante estiveram sempre juntos e ele interessa\la-se

pelos menores detalhes da vida da sua princesa, che­gando mesmo a estar presente, quando vinham mo­àistas tratar de toílletes e de outros assuntos seme­lhantes.

Muitas vezes aconteceu virem as mesmas costu­reiras que tinham provado vestidos á Rainha Maria Pia, o que sempre dava prazer a D. Afonso, porque gostava que sua · mulher tivesse os vestidos feitos nas mesmas casas que sua mãe.

Nessa ocasião contavam-se mui­tas historias dos tempos passados e D. Afonso, com a sua prodigiosa memoria, lembra­va-se dos mais pe­quenos incidentes, contando-nos, um dia, que uma das aias da Rainha Maria Pia, fôra contramestre de Worth.

A memoria de

milia- real. Não foi a grande e generosa massa do povo ê1ue planeou os factos que se deram, precedidos pela atróz · tragedia dos assassinatos, De todos . os membros da familia dos Braganças, era D. Afonso o mais adorado; ainda hoje, depois de 10 anos de Re­publica, encontram-se bilhetes postais com o •retrato do Duque do Porto, embora não existam os de ne-

nhum outro • mem­bro da fa m i 1 i a . Esse amor era bel]'l merecido, pois D. Afonso, mesmo no exilio, não se es­quecia deles. Du­rante os terri veis anos de 1916 e 19 8, em que os portuguêses esti­veram nas trin­cheiras, D. Afonso interessou-se sem­pre pelos prisionei­ros de guerra, e a Duquesa do Porto recebia tantas cen­tenc1s de cartas que em Madrid pu­zeram ás suas or­dens uma pessoll cujo unico serv.iço era enlresiar ao re­gio par a sua cor­respondencia.

D . Afonso causa­va admiração a to­dos. Quando en­contrava pessoas que havia muito tempo não tinha visto, ficavam admiradas das mi­nucias de que ele se recordava. (1)

D. Afonso saindo da egreja da Sé, fardado de ge11eral do exercito portugués

Todas essas cartas suplicavam á Duquesa que tomasse parte acti­va nos serviços da

O grande desgosto de O. Afonso era não poder voltar a Portugal.

Duma vez encontrou um homem que, chora11do copiosaas lagrimas, disse ser português e desejar in­tensamente voltar a Lisboa, donde s&!ra, havia vinte anos, não tendo, porém, dinheiro para o fazer. lme-d ia tamente, O. Afonso abriu a bol-sa e deu-lhe a so­ma necessaria. Sa­bia bem o que era ter saudades de Lisboa!

Cruz Vermelha portuguesa, visto suporem-na mais moderna nas suas ideias por pertencer a um país mais avançado.

Respondeu a estes pedidos, mandando dinheiro. por Afonso não querer ouvir falar em ela ir ás trin­cheiras.

A vida corria­lhes idealmente fe­liz, sem desgostos nem cuidados, era uma historia de fa­das realisada. Aos olhos do Príncipe, só ela tinha rasão, quando alguem não concordava com a opinião de sua mu­lher ele, sem mes­mo saber do <1ue se tratava, aproxima­vase e dizia com olhar severo e voz trovejante: «Sua Alteza tem razão, deixe-nos».

A princesa ten­tou, por todos os meios, obter, atra­véz os governos inglês e america­no, que se. abrisse uma excepção a favor de D. Afon­so, rescindindo a lei do exilio. Não o conseguiu. O In­fante, parn se con­solar, apertava o seu tesouro con­tra o peito e dizia: «E' melhor assim; quem sabe se ·não te aconteceria a

Em licoli, ltalia, em 1915. D. Afonso e a Condessa de Po11talto

Pouco te rn po depois do casa­mento um creado do hotel, em Ma­drid, foi despedido por ordem de D. Afonso, por ter usado a palavra «Ustd>>' em vez de mesma coisa que a

meu irmão.» Quando tratava do seu exílio nunca falava como se o povo fosse o culpado, bem sabia que não era por vontade dele que estava fóra de Portugal, mas sim pela dos politicos que haviam querido entre si os proveitos da governação e do tesouro publico em logar de gastar parte deles com a lista civil duma fa-

508

«Vossa Alteza» dirigindo-se a Princeza. Os príncipes portugueses foram sempre bons tna­

ridos; consideravam o casamento como um actt> serio e a mulher era sempre querida e respeitada.

(Contlnúa)

~ o~~c

NOS DO MINI OS A OBRA DUM

O UVIRA, por \lezes falar da Casa de Sande

da ldanha, como uma instituição modelar no genero, o que me le\1011 a incluil-a na serie de artigos sobre casas ele cari­dade, qne venho arquivando nu /Insira ção Portuguesa.

O Ilustre chefe do distrito, o Sr. Or. Falcão Ribei· ro, manifestara-me desejos de acompanhar·me na excursão, pondo gentilmente o seu automo\lel ao meu dispor e ao do en\liado grafico do conceituado sema­nario.

S.ª Ex. 3 , porem. te\le que desistir da sua intençilo, á ultima hora, por ter de receber a visita do Sr. Presidente do Mi· nisterio, no Governo, Civil, que se realisa· va, justamente. no dia escolhido para a mi­nha ida ao interes· sanle estabeleci­mento.

Fez-se, portanto. representar pelos seus secretarios. Ar­mando Rodrigues Min· gachos e Domingos Monteiro, pedindo ao medico assistente, dr.

.Sil\la Teles, para acompanhar-me na vi· site e prestar-me to­dos os esclarecimen­tos.

Ainda no antomo­vel, para não perder tempo, puz-me a en­trevistar o distinto clínico, sobre as ori­gens da Casa de Sau­ude e mais coisas curiosas, que adean· te se relatam.

DA LOUCURA FILANTROPO

Dr .. e quaes são as loucuras mais facilmente curaveis?

As furiosas, as grandes agitações. desde que não haja sifilis ou taras hereditarias. As loucuras mansas, as manias, resistem muito ao tratamento. po­dem tomar um caracter chronico, ou apresentar ma­nifestações periodicas. Tenho doentes que fazem uma cura todos os anos.

Ouvi di ,er que lá fóra não consentem um me­dico. numa casa de doidos, senão durante sete anos, qne maior permanencia seria peri~osa para a integri­dade do seu juízo. Não é desta opmião, Dr.?

Já lá estou ha dezenove anos e ain­da nilo me sinto malu­co ... pelo menos, nilo tenho dado por isso. Se bem que, no dizer de uma das minhas doentes, o quartel ge­neral seja na ldanha e o regimento dos doi­dos ande cá fóra a solta. Uma outra Iam­

. bem, numa ocasião,

.em que eu estava mui­lto atento nas minhas <Observações, me dis-1se do lado:- <Assim 1é que eu comecei e. 1\lim cá parar.

Mas ha coeren­<Cia na loucura, dizem 1coisas acertad1ssi-1mas. Estou convenci­cda que apertamos por mhi a mão a muito «lo ido.

E' provavel. E' (()Uasi certo. ,l\\as, co­nno não manifestam r'furia, nem manias pro­rnunciadas ...

A íamilia que os mture e os estranhos lUlll pouco ta m bem, mão é isso?

O fundador foi um italiano, Angclo Mcri. l10111em instruidíssi­mo, que se dedicou á cura cios alienados. abrindo casas em va­rios pontos da Euro­pa, como em Espanha, (a séde,) França, lta­lia, Inglaterra. etc. Es-

Mercedes Biasco conoersa11do com a baronesa de Stempel

Chegámos, diz· mos o nosso paciente i1nformador.

Logo na cerca, pa­receu-nos entrar num (I>aiz fantastico, onde cada qual desse lar-ta, de Portugal, come-

çou por uma simples casinha. com seis quartos. ape­nas. A articulista pôde fantasiar penas de amor, de um amor louco, que o levou á compaixão pela loucura dos onlros.

Dr.. inquirimos nós, quaes são as causas da loucura?

O alcoolismo, a sífilis e doenças intestinaes. Isto. sob o ponto de vista fisiologico. Agora. razões subje­tivas, temos os amores contrariados, as dificuldades de vida, as revoluções ...

- As revoluções tambem teem desarranjado cére­bros?

Olhe, a implantação da Republica deu alguns doidos. Os cataclismos cosmícos fornecem lambem os manicomios, como, por exemplo, o terramoto de Benavente:

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gas á sua imalo!inaçilo em delirie>. Algumas mulherc•s cantavam. muitas dançavam. em«111anto que outras so­luçavam angusliadamente.

Lá em cima nas salas. uma ~obre creatura, com uma boneca de trapos ao colo. adormecia um filho imaginario. talvez aquele que a morte lhe arrancúra dos braços.

Uma outra a~arra-se ao fotog:rafo Salgado e diz­lhe que está ah sequestrada, que é uma boa republi­cana ... Urna \lelhinha corre atraz do medico, cha­mando-lhe seu marido e julgando seus filhos os secre­tarios do Governador Civil.

De repente, gritos estridulos gelam-nos o sangue nas veias, e uma doida furiosa s!l•e da casa de banho. dando-nos uma fugidia impressão da Eva no Paraizo.

Numa galeria. deparamos com a Generala, uma

~ ~

desgraçada que tem a mania de governar todos os exercitos de terra e mar.

E logo vem ter comnosco a Rainha, uma morena de olhos risonhos, que se imagina casada com D. Car-

o

Nos quartos encontramos uma senhora muito ins­truída e espirituosa, que se lembra de toda a gente, e que, ao falar-nos de Antonio José de Almeida, teev esta frase: - «Muito bom sugei to que pena ter-se me-

A baronesa de « Stempel » com a «Rainha» á sua esquerda

tos, em cuja morte não acredita. Pede-nos para se­_guir para ;Portugal, onde tem palacios sumptuosos,

tido na política!» E nós pensámos ser muito difícil saber onde o juizo acaba e a loucura começa ...

Duas curiosas expressões de loucura

diz, e oferece-nos cheques feitos por ela, para lhe comprarmos preciosidades. Prestou-se a vestir uma disparatada toilete, confeccionada por suas mãos, para se deixar fotografar.

510

A doente mais curiosa do estabelecimento é a ba­roneza de Stcmpel, muito conhecida em Lisboa pelas suas excentricidades. Vivia para os lados da Ajuda, num rez-do-chão, e ali albergava toda a cesta de ani-

~ ~ .

maes. O Dr. Silva Teles, ao tempo delegado desande, foi levado a passar-lhe revista á casa, por queixas da visinhança. A baroneza r ecebeu-o de espada em p11-t1ho e l.!ritou-lhe:

-· Que quer o Sr. daqui? Olhe que eu jogo a es­pada!

O Dr. lá a calmou como poude e conseguio ver a casa.

No quarto, tinha um carneiro amarrado aos pés da cama, e por toda a parte, circulavam galinhas, patos, pombos, cães, gatos, e numa das dependencias abri­~ava-se um cavalo.

Os empenhos foram tantos, que a excentrica con­tinuou vivendo com a sua estranha familia, até <1ue foi parar á mansão das loucas.

Conversei com ela, em varios idiomas e cm todos me respondia. Passa o tempo pintando, com tintas que ela mesma prepara com o suco de flores e plan­tas e imagina-se redactora de um periodico, Terra, Mar, e Ceu.

Sempre é certo que o talento anda visinho da lou­curll.

O Rostand, depois de pôr a falar os animaes do !'CU Chantec/er, lambem teve uns tempos de 1nanico­mio. E' bom não esticar as cordas demasiado ...

Falemos 11111 pouco do estabelecimento propria­mente dito. Compõe-se de Ires pavilhões, elciiante­mente traçados. e com todos os confortos modernos. Os aposentos das pensionistas de 1. ª classe dilo-nos a impressão de estarmos visitando um grande hotel.

E, por toda a casa, observa-se uma meticulosidade de de limpeza, que nos espanta, sobre tudo, sabendo que esse serviço. assim como a enfermagem, é feito por mulheres, antigas religiosas, secularisadas.

Preside a todos os cuidados a dir ectora, Maria Clotilde, de uma bondade inexcedivel, aliada á mais fina educação. Diz-nos ela qa1e isto só se póde fazer pelo amor de Deus, porque não havia dinheiro que pagasse a abnegação que é precisa para se tratar de doidos.

Ela comanda 60 cmpre~adas e ninguem ali é pago. Quem seria capaz de tal sacrificio, senão estas

santas mulheres que só em Deus esperam.? Dá-se ali guarida a 95 doentes pobres, o que repre­

senta, pelo menos, 50 contos por ano de economia para o estado.

A' volta, en tinha ainda na retina todas as scenas dolorosas a que assistira. a cabeça estonteada pelo falar monotono de umas, pelos gritos de outras, pelas cascalhadas de riso de muitas. e que aos meus ouvi­dos soavam como dobre de finados ...

Triste coisa, a loucura! Triste, para qem a vê, que para eles, os pobres

loucos, ~ a felicidade sem mancha, a felicidade de · juljiar realisados todos os sonhos e todas as çhimeras.

Cá fóra, os outros, doidos com juízo, continuavam correndo após uma ventura para t<empre defe1.a ...

L_ __ _

.• \11'.t<Cml'.s BLASCO

, \ directora acaricía11do uma pobre louca paralitica

( Clic!tés Salgado)

511

AS EXPOSICOES I

j. Teixeira Bastos

H A certa timidez so:ihadora e muila

sinceridade no~ quadros do Sr. Julio Tei,cira Bastos, um pintor desespalhafatoso, que realizou

agora a sua quarta expo$ição nas salas da Casa Araujo & Bastos L.da, na Rua da Palma. oi:~

Telas, cm grande maioria, e'<ecutadas lá fóra, sobretudo em Paris, onde o autor, qual outro Jacob, passou ultimamente sete anos ao serviço de sua Ra 1uel, ou seja a ambição um pouco afrancesada dos s.eus pinceis, amantes .da névoa e do esbatido.

Não entusiasma, mas não repele, a ma­neira velada do Sr. Teixeira Bastos, que, familiarizado com os mestres parisienses, trata os aspectos francezcs muito melhor que outros quaisquer.

A alguns dos seus apontamentos típicos da Paris monumental e arredores, nas horas em que a bruma enfantasia as coisas, não falta suavidade misteriosa.

Já o mesmo, infelizmente, se não pode dizer doutros assuntos, para que se requere qualidades diferentes. Os seus tipos espa­nhois e portugueses são mai3 fracos. A Condução do gado é uma hostil floresta de chifres.

Em compensação, o seu Campo de Papoilas tem a ngoros~ secura das a_/11.eras madrilenas, onde a primavera se ltm1ta a uma chamasinha rasteira.

Lembrando Millet no arranjo, as Quei­madas são mais felízes do que A Volta do can po.

A Cabeça de Cri::,fo, muito teatral na angustia, pareceu-me em demasia painel de indulgências.

Destacável, o carinho dos estudos de certas cabeças loiras, sobretudo a do n,º 82 do catalogo, Perfil de mulher, cujo cabelo tem leveza e movimento.

ll

João Reis e D. Maria Luisa Reis

RUA da Trombeta, n.0 5 (ao Calhariz). Atelier fraterno de dois artistas novos,

o Sr. João Reis e a ~enhora O. Maria Luiza Reis, fi lhos do consagrado pintor Carlos Reis.

Seguindo os paternos ensinamentos e ar-

' cando com a:; responsabilidades do seu patronimico, esforçam-se. os dois jovens coloristas em servir a pmtur a, na med da das suas forças, como uma honrosa tradição familiar.

Não estamos, claro, d:ante de .arti tas feitos, ma~ de aspirações bem enc:a1111n~adas cuja actividade segue fielmente a es~etra do progenitor, com <ice:ituada s.mpa~a p~la paisagem e pelos assuntos de ar ltvre, em que Carlos Reis marcou na pintura portu­guesa o logar que todos ~abem.

Assim a Senhora D. Maria Luiza Reis, só nos m~stra aspectos de Louzã e do Arieiro. em horas pálidas ou gloriosas, ~cv~l~ndo um fiosi 1ho de melancolia na sua mc1p1cnte visão ela natureza.

Em contraste, o Sr. João Reis, qu.e em certos trabalhos mais antigos preferia os tons discretos emprega na-> suas manchas recentes uma' grande exuberânci~ ele côr~s, apresentando-nos algumas m~rmhas 11~­boetas talvez um pouco excessiva~ na polt­cromia.

E' evidentemente u111 pintor que ainda não descobriu por completo a sua person~lidade, e que, á semelhança de muitos post-~~pres­siomstas, abusou da pochada, sacnfic~ ido a soltdez e o equilibrio ao brilho dos efeitos.

A maioria dos seus quadros acabados s.ó difere dos seu, apontamentos, entre os quais citarei o Depois da froooada e um Trecho de Caldelas, nas proporções. A. maneira .de fazer é quasi a mesma, limitada a sumánas inJicações, que deixam por tratar não só­mente os permonores, como certas part~s essenciais. I laja vista o n.º 19, A rnlllS

cabra, onde o desenho falha em absolu~o. Convir-lhe-ia por isso, prestar maior

atenção ás su~s por cmquanto deficientes faculdades construtivas, de que o retrato da senhora, que vimos na ultima expos~ção da Nacional, é uma frisante demonstraçao.

Pela alegria e rutilancia, chama os olha­res o quadro n.º 21, Estendendo a mw,~, manifestadamente intlucnciada pelo vir­tuosismo com que Carlos Reis tem, nos ultimos anos, tratado os brancos.

Agradável na sua frescura soalhenta, póde tomar-se à conta uma promessa de futuras obras em que o moço pintor, domi­nando a impaciente superficialidade, cuide de impôr ao seu colorismo uma estrutura mais firme.

MANOlll. l)H SOUSA PINTO

A EXPOSICÃO OE O. MAR.IÃ LUIZA .REIS E JOÃO REIS ,

Um "Sfl<'clo da exposiçao

No dia da inauguraçcio

No a João Vaz, banquete

oferecido

pelos novos

A11tonio de Monsanto Enviado especial junto da Academia

de Coimbra

João Vaz o grande artista dos Mastros e das

Ondas

-----~ --.......

?)~"'~ t-:- j' , , < . ) \ /

'-Antonío Ferro

dlreclor da Ilustração Porl11st11e:;a

O pintor Carlos Porfirio

no

Restaurant

Leão

Angnslo d' Esaguy autor de varias livros a sair

/oâo da Silva que em breoe abre uma exposição nos salóe~

da Ilustração Portuguesa o escultor de tlg11es Soure/, a mulher mais li11da

de França

51-l

I

José de AúnadaWegrelros Croquis «feito contra ele»,:se­

gundo a sua expresslio

fosé Pacheco Leader do Mooimento dos Nooos contra

~/' \f.;,~ ç - --...._,

li; ,m 11•,IA,

foão Vaz, por jo{Jo Siloa

a atitude da Sociedade Nacional ãe Belas Arles

Raul Leal

\ ,.;:' ..... 7

/

_) D. Tomaz de Almeida

Critico de Arte

' \~" \_/

Amerlco Dur{Jo Um dos grandes poetas

da geração

Victor Falcôo /omcalista

)

.!.: ,

O grande poeta Cauuiido Guerreiro

(Os croQuis assinados L. C. são de Leal da Camara. Os outros são da autoria de Jo:sé Dias Sancho)

A primeira reunião do conselho de ministros, do gabinete Cunha leal