as qualidades expressivas dos eco-materiais

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Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Arquitectura Qualidades expressivas dos eco-materiais Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo Dissertação para Obtenção do Grau de Mestre em ARQUITECTURA Orientador Cientifico: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte Júri Presidente: Professor Doutor António Pedro Assunção Nobre Lima Vogais: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte Professora Doutora Maria Luísa Caldas Lisboa, FAUTL, Dezembro, 2010

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ResumoA dissertação de Mestrado que se apresenta pretende aprofundar sobre as capacidades expressivas dos eco-materiais na arquitectura.O apelo que habitualmente surge para se utilizarem eco-materiais no projecto tem como base a muita e variada informação técnica que os acompanham. Dominantemente apelam ao seu uso com base valores quantitativos (a massa, a poupança energética, poupança de CO2, etc).Este estudo pretende valorizar as qualidades expressivas dos eco-materiais, contribuindo para a sua utilização.Para o efeito utilizamos os critérios adoptados por Peter Zumthor no livro “Atmosferas”. Escolhemos esta obra pois é obra influente na actual produção arquitectónica e fala de valores essencialmente substantivos. A identificação destes valores qualitativos em obras de referencia que reflectem uma consciência ecológica e utilizam eco-materiais, valorizando a sua significância e aumentando a sua premência arquitectónica, complementará os aspectos quantitativos que habitualmente suportam os apelos para sua divulgação.

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Page 1: As qualidades expressivas dos eco-materiais

Universidade Técnica de Lisboa - Faculdade de Arquitectura

Q u a l i d a d e s e x p r e s s i v a s d o s e c o - m a t e r i a i s

Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo

Dissertação para Obtenção do Grau de Mestre em

ARQUITECTURA

Orientador Cientifico: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte

Júri

Presidente: Professor Doutor António Pedro Assunção Nobre Lima

Vogais: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte

Professora Doutora Maria Luísa Caldas

Lisboa, FAUTL, Dezembro, 2010

Page 2: As qualidades expressivas dos eco-materiais

F I L I P E H U M B E R T O T O R R E S M E S Q U I T A B O R G E S D E M A C E D O

II

Faculdade de Arquitectura

Universidade Técnica de Lisboa

Título da Dissertação: As qualidades expressivas dos eco-materiais.

Nome do Aluno: Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo

Orientador: Professor Doutor Rui Duarte Barreiros

Mestrado: Arquitectura

Data: Setembro de 2010

Resumo A dissertação de Mestrado que se apresenta pretende aprofundar sobre as

capacidades expressivas dos eco-materiais na arquitectura.

O apelo que habitualmente surge para se utilizarem eco-materiais no projecto tem

como base a muita e variada informação técnica que os acompanham.

Dominantemente apelam ao seu uso com base valores quantitativos (a massa, a

poupança energética, poupança de CO2, etc).

Este estudo pretende valorizar as qualidades expressivas dos eco-materiais,

contribuindo para a sua utilização.

Para o efeito utilizamos os critérios adoptados por Peter Zumthor no livro “Atmosferas”.

Escolhemos esta obra pois é obra influente na actual produção arquitectónica e fala de

valores essencialmente substantivos.

A identificação destes valores qualitativos em obras de referencia que reflectem uma

consciência ecológica e utilizam eco-materiais, valorizando a sua significância e

aumentando a sua premência arquitectónica, complementará os aspectos

quantitativos que habitualmente suportam os apelos para sua divulgação.

Palavras-chave:

Eco-materiais, Expressividade, Sustentabilidade, Consciência ética.

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III

Faculdade de Arquitectura

Universidade Técnica de Lisboa

The expressive capacities of eco-materials

Abstract

The Master's dissertation presented here aims to discuss the expressive capacities of

eco-materials in architecture.

The appeal that usually comes to foment the use of eco-materials in the project is

based on the many and varied technical information. Normally call for its use is based

on quantitative values (mass, energy saving, saving CO2, etc.).

This study will try to highlight the expressive qualities of eco-materials, contributing to

their use.

To this end we follow the criteria adopted by Peter Zumthor in the book "Atmospheres."

We chose this work because it's very influential work in the current architectural

production and it values and speaks mainly of qualitative values. We chose it also

because it is a work with which we identify.

The visualization of qualitative values in works that reflect an ecological awareness and

use eco-materials will complement and reinforce the need to their implementation. This

posture will highlight its significance and increase its eagerness as an architectural

complement to the quantitative and bureaucratic aspects that usually support the calls

to is use in construction.

Keywords:

Eco-materials, Expressiveness, Sustainability, Ethical awareness.

Page 4: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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IV

Agradecimentos

Feito com graças ao amor, a paciência e o incentivo da Xanda, dedicado a ela e às

nossas filhas, a Mariana, a Joana e a Teresa. Também um obrigado especial á minha

ameixoeira, cujo tronco se ofereceu para a fotografia da capa.

Lisboa, Setembro 2010

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V

ÍNDICE

Índice de ilustrações: ............................................................................................. VII

Prefácio ...................................................................................................................... 1

1-Introdução .............................................................................................................. 3

Introdução .................................................................................................................. 4

2- O estado dos conhecimentos ........................................................................ 15

2.1- O processo de consciencialização ambiental: ............................................. 16

2.2- A arquitectura como resposta a habitats insatisfatórios: ........................... 29

2.3-A responsabilidade social do arquitecto: ....................................................... 33

2.4- Construção sustentável: ................................................................................. 38

2.5 – Entendimento do eco material. ..................................................................... 42

2.6 – Os eco-materiais vernaculares. .................................................................... 46

2.6 – Os eco-materiais reciclados. ........................................................................ 51

2.7 – Os materiais de nova tecnologia. ................................................................. 57

2.8 – Os materiais bio-construidos. ...................................................................... 62

3- Desenvolvimento ................................................................................................ 65

3.1- A expressividade ............................................................................................. 66

3.2- O corpo da Arquitectura .................................................................................. 72

3.3- A consonância dos Materiais ......................................................................... 75

3.4- O som do espaço ............................................................................................. 79

3.5- A temperatura do espaço ................................................................................ 82

3.6- As coisas que me rodeiam. ............................................................................. 86

3.8- Tensão entre o interior e o exterior ................................................................ 93

3.9- Degraus da intimidade .................................................................................... 96

4- Conclusão .......................................................................................................... 103

4.1- Da expressividade. ........................................................................................ 104

4.2- Da sustentabilidade. ...................................................................................... 108

4.3- Dos limites da investigação. ......................................................................... 111

4.4- Dos desenvolvimentos futuros. ................................................................... 112

Bibliografia: ........................................................................................................... 114

Declaração ............................................................................................................. 119

Anexos: .................................................................................................................. 120

Page 6: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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VI

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VII

ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES:

Fig.- 1 Gráfico da variação dos teores de CO2 ............................................................................. 4

Fig.- 2 Toyota Prius, carro híbrido ................................................................................................. 5

Fig.- 3 Aterro com resíduos da industria da construção ............................................................... 6

Fig.- 4 Campo de refugiados no Dafur .......................................................................................... 6

Fig.- 5 Quadro explicativo do processo de classificação energética em vigor em Portugal ......... 7

Fig.- 6- Esquema explicativo das valências do programa LiderA ................................................. 8

Fig.- 7 Buckminster Fuller ............................................................................................................. 9

Fig.- 8 Le Corbusier, Plano Voisin............................................................................................... 10

Fig.- 9 Cidade Berbere em Marrocos, Ouarzazate ..................................................................... 11

Fig.- 10 Peter Zumthor,Capela de S. Bento, em Sumvitg, Suíça ............................................... 12

Fig.- 11 Peter Zumthor, Capela do Irmão Klaus, em Wachendorf, Eifel, Alemanha ................. 13

Fig.- 12 Mina de carvão, circa 1910 ............................................................................................ 16

Fig.- 13 Explosão atómica em Hiroshima, .................................................................................. 17

Fig.- 14- Thomas Edison. ............................................................................................................ 18

Fig.- 15- Foto de Mãe e Filho, Minamata. ................................................................................... 19

Fig.- 16- Protestos de cidadãos na década de 60 ...................................................................... 20

Fig.- 17- Nascimento da Greenpeace em 1973 .......................................................................... 21

Fig.- 18- Fotografia do nascer da Terra ...................................................................................... 22

Fig.- 19- UNEP ............................................................................................................................ 23

Fig.- 20- Evolução do buraco de ozono ...................................................................................... 24

Fig.- 21- capa do relatório “O nosso futuro comum” ................................................................... 25

Fig.- 22- Manifestante no COP 15............................................................................................... 26

Fig.- 23- Al Gore .......................................................................................................................... 27

Fig.- 24- Karl Marx Hof, de Karl Ehn ........................................................................................... 29

Fig.- 25- Pavilhão da Finlândia na Feira Mundial de Nova York, 1938/39, de Alvar Aalto ......... 30

Fig.- 26- Pavilhão Vasarely, Aix-en-provence, de Shigeru Ban .................................................. 31

Fig.- 27- Malmo's Western Harbour. ........................................................................................... 32

Fig.- 28- Gráfico da evolução da população humana ................................................................. 33

Fig.- 29- Vista de do centro de Xangai ........................................................................................ 34

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VIII

Fig.- 30- Pavilhão de Espanha, 2008, Francisco Mangado ........................................................ 35

Fig.- 31- Pavilhão Médico em Khartoun, Sudão, TAMassociati. ................................................. 36

Fig.- 32- Pavilhão de Oração no Darfur, Sudão , TAMassociati. ................................................ 37

Fig.- 33- A epidemia de obesidade ............................................................................................ 38

Fig.- 34- Shangai. ........................................................................................................................ 38

Fig.- 35 Tijolos de cânhamo. ....................................................................................................... 46

Fig.- 36 Blocos de terra compactada .......................................................................................... 47

Fig.- 37 Isolamentos térmicos em lã ........................................................................................... 48

Fig.- 38 Bambu ............................................................................................................................ 49

Fig.- 39 Pavilhão de Portugal, Expo 2010, Xangai, Carlos Couto. ............................................. 50

Fig.- 40 Muralha Bizantina de Selçuk, Tuquia ............................................................................ 51

Fig.- 41 Parede de Polly-brics. .................................................................................................... 52

Fig.- 42 Sucata de Ferro. ............................................................................................................ 53

Fig.- 43, Atelier, Quito, Equador, Arq. David Moreno.................................................................. 54

Fig.- 44 The Ricyclops, Utrech, Holanda, 2012 Architeten. ....................................................... 55

Fig.- 45 Platoon Kunsthalle, Seul, Coreia do Sul, Platoon+ Graft Architects. ............................. 56

Fig.- 46 Solar Ivy ......................................................................................................................... 57

Fig.- 47 Flash Bricks .................................................................................................................... 58

Fig.- 48 Thermeleon .................................................................................................................... 59

Fig.- 49 PORO, Arq. Miguel Veríssimo ....................................................................................... 60

Fig.- 50 Monocoque. ................................................................................................................... 61

Fig.- 51 Ford Rouge Centre, Dearborn, Michigan, William McDonough ..................................... 62

Fig.- 52 La Caixa, Madrid, Herzog de Meuron, .......................................................................... 63

Fig.- 53 Institut for Forest na Nature Research, Wageningen, Holanda, Günther Behnisch, ..... 64

Fig.- 54- Bambu…………………………………………………………………………………66

Fig.- 55- Centro Cultural Tjibaou, Renzo Piano, ......................................................................... 67

Fig.- 56- Termas de Vals, Peter Zumthor, ................................................................................... 68

Fig.- 57- Loblolly House, Chesapeake Bay, Maryland Kieran Timberlake, .............................. 69

Fig.- 58- Plastic House, Tokio, Kenso Kuma .............................................................................. 70

Fig.- 59- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer ................................... 72

Fig.- 60- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer, .................................. 73

Fig.- 61- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer. .................................. 74

Fig.- 62- Hamadera House, Sakai, Japão, Coo Planing ............................................................. 75

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IX

Fig.- 63- The Trufle, Costa da Morte, Galiza, Espanha .............................................................. 76

Fig.- 64- Rauch House, Schlins, Austria, Boltshauser Architekten ............................................. 77

Fig.- 65- Casas na Areia, Comporta, Portugal, Aires Mateus ..................................................... 78

Fig.- 66- Great Bamboo Wall, Bejing, Kenso Kuma .................................................................... 79

Fig.- 67- Restaurante Yellow Tree House, Workworth, Pacific Environment Architects, ............ 80

Fig.- 68- Papertainer Museum, Seoul, Korea do Sul, Shigeru Ban ............................................ 81

Fig.- 69- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia ....................................... 82

Fig.- 70- Maison à Marrakech, Marrocos, Guilhem Eustache ..................................................... 83

Fig.- 71- Igreja de Kärsmäki, Finlândia, Lassila Hirvilammi ........................................................ 84

Fig.- 72- Dragspelhuset, Lago Ovre Gla, Suécia, 24h Architecture, ........................................... 85

Fig.- 73- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia ....................................... 86

Fig.- 74- Vista de Nova Iorque .................................................................................................... 87

Fig.- 75- Casa Manifesto, Curacavi, Chile, James & Mau for Infiniski ........................................ 88

Fig.- 76- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia, ...................................... 90

Fig.- 77- Capela em Tarnow, Polónia, Beton Architekt ............................................................... 91

Fig.- 78- Bamboo House, Osaka, Japão, Katsuhiro Miyamoto ................................................... 92

Fig.- 79- Plasticamente, Riccardo Giovaneti ............................................................................... 93

Fig.- 80- Centro médico, Khartoum, TAMassociati ..................................................................... 94

Fig.- 81- Casas na Areia, Comporta. Portugal, Aires Mateus ..................................................... 95

Fig.- 82- Abrigo de montanha, Kamounamoto, Japão, Sou Fujimoto ......................................... 96

Fig.- 83- Instalação, Victoria & Abert Museum, Londres, Rintala Eggertsson Architects .......... 97

Fig.- 84- Apartamento transformável, Hong Kong, Gary Chang ................................................. 98

Fig.- 85- Mapungubwe visitors Centre, Africa do Sul, Peter Rich ............................................... 99

Fig.- 86- Rauch House, Schlins, Austria, Boltshauser Architekten, .......................................... 100

Fig.- 87- Nk’Mip Desert Cultural Centre, Osoyoos, Canada, HBBH Architecs ......................... 101

Fig.- 88- I’m lost in Paris, Paris, França, R&S(ien) ................................................................... 102

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1

PREFÁCIO

Desde tempos imemoriais que a humanidade edificou abrigos e desde esses tempos

que utilizou recursos para a sua construção e para o seu conforto. Durante milénios a

humanidade alterou os habitats existentes adaptando-os para as suas necessidades,

quer elas resultassem de uma exploração agrícola, quer fosse para a extracção de

matérias-primas.

Até a cerca de 250 anos, no início da revolução industrial, a humanização de habitats

naturais não implicou grandes alterações nos grandes ciclos que regem o equilíbrio

planetário. Contudo, com o aumento exponencial da população humana, fortemente

impulsionado pelo desenvolvimento iniciado na revolução industrial, o equilíbrio

planetário começou gradualmente a ser alterado. Hoje na sociedade pós-industrial em

que vivemos, e devido ao enorme aumento da população humana e acompanhado

pela necessidade de recursos que sustentam este crescimento, estes ciclos estão a

ser profundamente alterados.

A indústria da construção é uma das grandes responsáveis por este consumo

excessivo de recursos, quer por via da construção propriamente dita, quer por via dos

recursos que a utilização e manutenção do edificado exigem. Existe uma urgência de

alterar este estado, para isso torna-se necessário que a indústria da construção

edifique sem exaurir os recursos, que construa sem desperdiçar, que reaproveite o

que se desperdiça, que produza energia e que repare os habitats.

Não pretende esta dissertação renegar a história do edificado, e em particular da

arquitectura. Esta investigação pretende sim, construir uma visão que apele à

utilização de materialidades mais sustentáveis. Pois a edificação é fenómeno humano

por excelência, e o homem, como ser pensante, procurará sempre encontrar novas e

imaginativas soluções aos problemas com que se depara.

Procuraremos nesta investigação complementar o apelo à utilização de eco-materiais.

Por norma, os apelos ao seu uso estão consubstanciados ou nas vantagens

ecológicas que os eco-materiais proporcionam, ou na sua vantagem económica, pois

proporcionam alternativas a materiais e procedimentos cujos custos se tornem

proibitivos devidos à escassez de recursos, ou, por último, o derradeiro apelo ao seu

uso reside numa qualquer imposição normativa.

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2

É nossa vontade que esta investigação evidencie as qualidades expressivas dos eco-

materiais, e que desse modo possamos demonstrar que a sua utilização no projecto,

para além dos óbvios ganho ambientais, potencia tanto a riqueza expressiva como a

complexidade do projecto arquitectónico.

Procuramos deste modo demonstrar que a urgência de estratégias de sustentabilidade

do projecto, neste caso com a utilização de eco-materiais, para além de vantagens de

ordem técnica, reflecte a vontade de desenhar no projecto de arquitectura a imagem

idealizada de um homem melhor.

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3

1-INTRODUÇÃO

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4

INTRODUÇÃO

Os processos de industrialização e o exponencial crescimento demográfico

contribuíram para o esgotamento rápido de recursos energéticos, matéricos e da

biodiversidade. Contudo nas últimas quatro décadas tem-se verificado um progressivo

processo de consciencialização ambiental por parte da humanidade. Este processo

tem sido alicerçado pelas sucessivas crises ambientais com que a humanidade se tem

confrontado.

Nos últimos anos a chamada crise do carbono saltou da agenda de alguns grupos

ecologistas e investigadores para palco do discurso político dos dirigentes das

principais nações. A importância desta temática é consequência da progressiva

pressão que os cidadãos e as suas organizações representativas têm exercido sobre

os poderes políticos.

Fig.- 1 Gráfico da variação dos teores de CO2 no gelo da Antárctida, das temperaturas e nível do mar, de 400 mil anos

até ao presente. Fonte Instituto Goddard Estudos Espaciais – NASA; na National Geographic, Outubro 2008

A clara percepção que a crise do carbono, motivada pela progressiva industrialização

e urbanização do planeta, podem criar um desequilíbrio irreparável nas harmonias

planetárias e desse modo pôr em causa as gerações futuras, tem originado uma

profunda reflexão sobre o modo como vivemos nesta nossa casa que é o Planeta

Terra.

A consciencialização deste problema, e de um modo mais vasto do problema da

gestão dos recursos, tem motivado o aparecimento de graduais mudanças nos nossos

métodos de produção e hábitos de consumo.

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5

Essas mudanças, começam a ser implementadas devido a uma série de factores: em

primeiro lugar a sensibilização das questões ecológicas tem motivado a uma maior

consciencialização ambiental por parte dos consumidores, o que por sua vez leva as

empresas a procurem adaptar os seus produtos a essa exigência. A abundância de

produtos e serviços ditos verdes no nosso quotidiano é reflexo desse processo.

Por outro lado as indústrias desenvolvem novas tecnologias e produtos para

responder ao desafio da sustentabilidade. Com este tipo de investigação as indústrias

minimizam desperdícios e custos. Naturalmente, as empresas ganham vantagens

competitivas perante a concorrência e criam novos mercado para os seus produtos.

Fig.- 2 Toyota Prius, carro híbrido, com propulsão mista a combustão e motor eléctrico, utiliza um conjunto de baterias

para reutilizar a energia despendida com as travagens. Lançado em 1997 pela Toyota, e visto na altura pelas outras

marcas como uma experiencia fútil. Contudo a existência de um crescente numero de clientes ecologicamente

responsáveis, fez disparar a sua venda, tendo-se tornado num ícone de um estilo de vida sustentável. Fonte:

www.toyota. com

Podemos hoje afirmar que a maior parte das estratégias de mitigação dos processos

industriais e energéticos têm sido implementadas pela via regulamentar e legal. Dou

um exemplo, hoje todos os carros produzidos são recicláveis a 90%. No início dos

anos 90 a percentagem de reciclagem dos veículos em fim de vida situava-se nos

30%. Foi a introdução da Directiva 200/53/CE de 18 de Setembro de 2000 que alterou

a postura da indústria.

Esta directiva, tal como outras directivas e normativas europeias, foram

implementadas com base numa decisão política por parte da Comissão Europeia. Na

ocasião os fabricantes manifestaram a sua oposição a esta medida. O mesmo já tinha

acontecido à introdução de limites de consumo e características de segurança em

veículos. Hoje os fabricantes de automóveis, reconhecem que as mudanças nos seus

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6

princípios de produção foram benéficas para as suas empresas e para a sua indústria

em geral. A implementação de alterações por via regulamentar é bastante eficiente,

salvaguardando que exista de facto vontade política de as implementar.

As medidas de mitigação são particularmente prementes nas áreas do urbanismo e da

Arquitectura. Boa parte da energia e dos recursos que despendemos são afectos ao

modo como vivemos, quer nas nossas construções, quer nas nossas cidades. A

indústria da construção gasta cerca de um terço dos recursos e energia consumidos

pela humanidade cada ano (ADENE 2010). Em termos dos gases de efeito de estufa,

o edificado é responsável por 35% do total anual de emissões (A Green Vitruvius

1999). A edificação consome igualmente uma enorme quantidade de recursos

naturais. Todos os anos cerca de 40% de todos os recursos extraídos destinam-se à

indústria da edificação (A Green Vitruvius 1999). O impacto ambiental destas

extracções é enorme, da desflorestação, à contaminação das linhas de águas, da

destruição de habitats aos derrames, etc..

Fig.- 3 Aterro com resíduos da industria da construção, cerca de 40% dos resíduos tem como origem a industria da construção, quer em virtude de demolições, quer como resultado das sobras e desperdícios de construção nova. Fonte: (www.ecy.wa.gov/.../greenbuilding/AltWaste.html) Fig.- 4 Campo de refugiados no Dafur, em contraponto ao desperdício de materiais de construção encontramos cerca de 1/6 da população mundial, cerca de mil milhões de pessoas, a viver em habitações precárias. Fonte: (http://jbcs.blogspot.com/2007/07/vidas-que-no-valen-nada-darfur-es.html)

É preciso ter em conta que esta é a situação actual, mas também ter em atenção que

com o desenvolvimento económico e o aumento populacional dos países em vias de

industrialização, associados ao aumento dos níveis de consumo causados por uma

urbanização progressiva, as necessidades de recursos e energia vão aumentar.

Consequentemente a edificação vai crescer exponencialmente para satisfazer as

crescente necessidades da humanidade.

Por outro lado a indústria da construção é responsável por uma enorme quantidade de

desperdícios, cerca de 40% dos desperdícios que acabam em aterro ou em lixeiras

provêm da indústria da construção (Arnal, Sauer, et al. 2008). O que não deixa de ser

um paradoxo, quando um sexto da população mundial não tem habitação condigna.

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7

Os actuais métodos de produção e materialização arquitectónicos continuam a

proceder como se o planeta não tivesses limites de utilização, e essa é uma

percepção que inevitavelmente irá mudar. A mudança já começou a acontecer,

conforme já tínhamos aflorado nas questões relativas à indústria automóvel, onde

verificamos que a realidade dessa indústria mudou, por um lado devido à introdução

de regulamentos impostos politicamente e por outro lado devido a um aumento de

exigência dos consumidores, na indústria da construção essa mudança começa a

acontecer.

Obviamente que face às pressões que a crise do carbono e a escassez de recursos

colocam, os governos, nomeadamente a comunidade europeia, já começaram a

estabelecer novos parâmetros para a industria. Com a directiva nº 2002/91/CE 1 ,

iniciaram-se as certificações energéticas do edificado na Europa. Esta directiva

estabelece normas e critérios de eficiência energética na construção. Facilmente se

constata que esta recente normativa começa a alterar o desenho das novas

construções. As novas arquitecturas procuram responder a este desafio criando

melhores condições bioclimáticas nos edifícios, o que a seu tempo irá diminuir a

pegada ecológica da edificação.

z Fig.- 5 Quadro explicativo do processo de classificação energética em vigor em Portugal, resultado da implementação

da directiva 2002/91/ CE. Fonte: (http://www.adene.pt/NR/rdonlyres/C2A3E54E-5B8B-46F6-ACAD-

12B42F726368/821/SCE_Geral2.pdf)

1 A Directiva 2002/91/CE foi implementada em Portugal através dos Decreto-Lei n.º 78/2006 de 4 de Abril, Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior nos Edifícios (SCE), Decreto-Lei n.º 79/2006 de 4 Abril, Regulamento dos Sistemas Energéticos e de Climatização dos Edifícios (RSECE) e Decreto-Lei n.º 80/2006 de 4 Abril, Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios (RCCTE), encontrando-se os novos edifícios obrigados a elevada eficiência energética, e sendo classificados todos os restantes na altura de nova transacção que ocorra, permitindo deste modo que os compradores tenham uma clara noção dos seus custos energéticos.

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8

Esta nova realidade, a mudança de um sistema de produção e consumo lineares,

típicos da industrialização e da sociedade de consumo, para um ciclo virtuoso onde

não exista desperdício e a sustentabilidade seja palavra de ordem, começa a impor-

se, quer por via da exigência regulamentar, quer pela cada vez maior

consciencialização ambiental dos cidadãos, quer ainda pelo aumento do custo das

matérias primas, cada vez mais escassas, associado às leis do mercado.

Em breve começarão a ser implementados novos sistemas de certificação dos

imóveis. Estes sistemas assentarão nas análises de ciclo de vida do edificado. Nestas

análises, o edifício é contemplado como um todo, ou seja serão escrutinados todos os

seus custos. Desde a energia incorporada na sua construção, às exigências de

manutenção, à sua eficiência energética e a futura reciclagem da construção.

Embora estes sistemas de certificação ainda não estejam implementados, muito me

custaria que os arquitectos apenas os implementassem devido a exigências

burocráticas e regulamentares ou por via da imposição dos promotores e clientes.

Fig.- 6- Esquema explicativo das valências do programa LiderA, desenvolvido em parceria entre o Instituto do

Ambiente e o IST, apresenta um sistema de análise de ciclo de vida voluntário, que permite aos projectistas quantificar

o impacto ambiental dos seus projectos. Fonte: http://www.lidera.info

Está na essência do ser arquitecto complementar e melhorar o habitat onde vivemos,

consequentemente estas mudanças estão predestinadas acontecer, pois estão no

âmago da praxis da arquitectónica. Procura-se nesta dissertação mostrar que estas

novas exigências não se resumam à obtenção de uma nota de certificação, mas que

as adoptemos, porque com elas vamos conseguir atingir novos paradigmas

arquitectónicos, tornando as nossas construções e as nossas cidades como parte da

solução deste problema civilizacional, pois tal é o nosso fado como arquitectos.

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Pretende-se demonstrar que uma atitude ecologicamente responsável não é

antagónica de uma prática arquitectónica significante e premente. Antes pelo contrário,

tal como Távora escreveu, “Que seja assim o arquitecto - homem entre os homens -

organizador do espaço - criador de felicidade” (Távora 1962). Uma atitude

ecologicamente responsável é consequência natural da vontade de fazer melhor, que

caracteriza a essência do acto arquitectónico.

A inovação e a descoberta de novas formas arquitectónicas estão no âmago na nossa

profissão, sempre foram elas que nos motivaram a continuar a descoberta do caminho

arquitectónico. Essas novas solicitações sempre foram mais significantes do que

burocráticas. Na história da arquitectura nunca foram muito relevantes os maiores

edifícios, ou os maiores vãos, ou qualquer outra visão cartesiana do objecto

arquitectónico. O significado sempre foi valor fundamental no desenvolvimento da

prática arquitectónica.

Fig.- 7 Buckminster Fuller posa em frente ao Fly's Eye, copula geodésica, desenhada para poder responder ao desafio

de mais construção menos material, e ao Dymaxion Car, desenhado com os mesmos princípios. Foto: Roger White

Stoller

Para atingir esse propósito, iremos estruturar esta dissertação do seguinte modo.

Em primeiro lugar iremos enunciar as fases marcantes do processo de

consciencialização ambiental, que desde os anos 60 tem vindo a mudar o modo como

a humanidade percepciona o Mundo. A visão do percurso que as preocupações

ambientais e as noções de sustentabilidade realizaram até começarmos a perceber a

sua necessidade, são fundamentais para compreendermos, que, apesar de termos

uma vida efémera, os nossos actos perduram e afectam as gerações vindouras. Deste

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modo, procurar-se-á demonstrar a necessidade dos problemas ambientais passarem a

estar num primeiro plano das nossas preocupações como arquitectos.

Em segundo lugar, perante a actual situação ambiental, demonstraremos que existe

uma tradição na resposta arquitectónica de responder a habitats insatisfatórios, e que

esse foi sempre motor de desenvolvimento de novos paradigmas arquitectónicos.

Essa resposta esteve sempre ligada à ética arquitectónica, faz parte da essência do

ser arquitecto responder a desafios com imaginação. E de cada vez que existem

essas novas respostas, o percurso da Arquitectura enriquece-se com novas

complexidades e significados, sendo esse o propósito da prática. Desconhecemos

etapas na história da Arquitectura que tenham sido impostas por via da

regulamentação ou da burocracia, apenas escrutino avanços na história da

arquitectura que aconteceram por crença num mundo melhor. E esse é desígnio ético

primordial da nossa profissão.

Fig.- 8 Le Corbusier, Plano Voisin, profunda reflexão acerca do urbanismo, concretizada em plano provocador que

propunha a demolição parcial de Paris , para responder a necessidades de alojamento e de salubridade ambiental.

Esta dissertação, conforme o seu título afirma, versará sobre as qualidades

expressivas dos eco-materiais. Contudo não podemos deixar de abordar o problema

da arquitectura sustentável, pelo que vamos rever algumas questões que marcam a

sustentabilidade de uma edificação. Iremos abordar as questões gerais que regem os

conceitos de arquitectura sustentável, como o emprego de sistemas solares passivos,

conceitos de produção de energia no edificado, a importância dos sistemas de análise

do ciclo de vida e toda a panóplia de soluções que procuram a mitigar a crise

ambiental.

Aos eco-materiais corresponde um papel importante nesta fase da resposta que

devemos dar como arquitectos, ou seja, na criação de um novo modelo de

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sustentabilidade. Ou seja, que as nossas construções passem a integrar-se no meio,

sem esgotar os recursos e participando nos ciclos naturais da sua renovação.

A importância de se adoptarem estratégias para reduzir desperdícios, a utilização de

materiais que sejam reserva de carbono, a reformulação de métodos de produção,

permitir a reciclagem da edificação, entre outras práticas, terão um papel fundamental

na resposta ao desafio que temos pela frente. Na sequência da lógica da dissertação,

é nesta altura que iremos caracterizar o que são eco-materiais.

Abordamos a questão dos eco-materiais por vários motivos, em primeiro lugar porque

os materiais constroem a coisa arquitectónica e são intervenientes fundamentais na

sua caracterização. É impensável dissociar o antigo Egipto com a monumentalidade

do calcário. É impossível imaginar a arquitectura moderna sem o betão e o vidro. A

materialidade das construções condiciona os seus conceitos e a sua concretização, e,

acima de tudo, condiciona a nossa relação com o habitat humano por excelência que é

o edificado.

Fig.- 9 Cidade berbere em Marrocos, Ouarzazate a leste de Marrakeshe, é exemplar no modo como os materiais

disponíveis condicionam a arquitectura, e em simultâneo, a arquitectura acrescenta novos significado à materialidade

da construção. Foto: (moroccotravelblog.wordpress.com)

A necessidade primordial de abrigo criou no ser humano uma estreita ligação com o

carácter matérico das suas construções. São os materiais com que construímos que

condicionam forma, textura, som e temperatura dos espaços. É esta relação intrínseca

que temos com a materialidade das coisas que nos permite sentir e relacionarmo-nos

com o espaço e com o modo como o concretizamos. O carácter ancestral da

materialidade é inato aos nossos sentidos. É apenas a experiência intensa de

percorrer um espaço, utilizando todos os nossos sentidos para o percepcionar, que

nos revela o verdadeiro significado do sítio.

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A sensibilidade com que encaramos estes fenómenos na caracterização do edificado,

leva-nos a acreditar, que devido à responsabilidade social e ética do arquitecto, iremos

começar a construir com estes eco-materiais de modo cada vez mais frequente. A

introdução destas novas materialidades irá trazer novos paradigmas ao modo como

fazemos Arquitectura.

É nossa tese, que essa mudança no modo como se constrói, assente na vontade dos

Arquitectos em fazer novas arquitecturas com maior exigência e maior respeito pelos

nossos recursos, irá vingar. Já existem muitos Arquitectos de referência que começam

a utilizar esta postura na elaboração dos seus projectos. Na última parte da

dissertação irei abordar a significância e a expressividade que a utilização destes eco-

materiais traz ao projecto de arquitectura.

Fig.- 10 Peter Zumthor, 1989,Capela de S. Bento, em Sumvitg, Suíça,

Para realizar esta interpretação procurar-se-ão seguir os critérios adoptados por Peter

Zumthor no livro “Atmosferas”. Escolhemos esta obra, pois é obra influente na actual

produção arquitectónica e fala de valores essencialmente substantivos. Na sua obra a

materialidade dos espaços é o fio condutor do discurso. A relevância do discurso de

Zumthor provem do modo como encara a prática da arquitectura. O método cuidado

com que projecta o conceito da obra é complementado pelo rigor com que os materiais

que a constroem são seleccionados. O resultado final ganha significados e

significâncias complementares que criam a poesia das suas obras, transformando-as

em paradigmas arquitectónicos. Por via da sua prática de excelência arquitectónica e

do seu discurso complexo e sedutor, Peter Zumthor, tornou-se numa das vozes mais

respeitadas e influentes no actual panorama da arquitectura.

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Logo tornou-se evidente para nós, que o seu modo de ver e praticar a arquitectura,

seria particularmente adequado para enquadrar a significância dos eco-materiais e

apelar à sua utilização, pois para além do seu discurso, muito ligado à significância da

materialidade das coisas, a sua notoriedade enquanto autor respeitado possibilitará

que o nosso discurso nesta dissertação seja enquadrado por uma obra que influencia

alguma da actual produção arquitectónica. É desse modo que nos propomos persuadir

os futuros leitores desta dissertação a participarem na solução deste grave problema,

que nós e os nossos filhos temos pela frente. Demonstraremos que para além dos

óbvios ganhos, quer eles sejam ambientais e económicos, quer residam num

cumprimento mais efectivo da responsabilidade social e ética do arquitecto, a principal

vantagem da sua utilização reside na capacidade de edificarmos arquitecturas

originais para o nosso tempo.

Fig.- 11 Peter Zumthor, 2007, Capela do Irmão Klaus, em Wachendorf, Eifel, Alemanha.

Os arquitectos deverão participar nesta mudança para a sustentabilidade porque é o

seu papel como arquitectos. “Orientar o exercício da sua profissão pelo respeito pela

natureza, bem como pela atenção pelo edificado pré-existente, de modo a contribuir

para melhorar a qualidade do ambiente e do património edificado” (O. d. Arquitectos

s.d.), logo é coisa inerente à prática da arquitectura o contributo para um melhor

ambiente em sentido lato. É também princípio essencial no exercício da praxis

arquitectónica a necessidade de manifestar a criatividade intrínseca à profissão. A

conjunção destes dois factores irá sem sombra de dúvida pôr os arquitecto a utilizar

estes materiais nos seus projecto sem necessidade de esperar pela obrigatoriedade

dos regulamentos.

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Esperamos que esta dissertação possa contribuir para esta mudança pois:

As lições do lento processo de consciencialização ambiental vão permitir tornar os

leitores mais conscientes.

Ao longo da história da arquitectura, ela sempre deu resposta a habitats

insatisfatórios, e de cada vez que o faz, elaborou novos paradigmas.

É desígnio dos arquitectos ser ética e socialmente responsáveis, sendo os

desafios da sustentabilidade uma das condicionantes da responsabilidade ética e

social inerentes à profissão.

Ao procurarmos simplificar noções de sustentabilidade ajudamos a desmistificar

um problema complexo, pois podemos deste modo e numa primeira etapa do

projecto estruturar estratégias de resposta simplificada

Ao procurarmos definir o que são eco-materiais de um modo simplificado,

propomos contribuir para a sua utilização de um modo mais intuitivo, sem recorrer

a sistemas complexos e burocratizados

Ao catalogarmos as diferentes famílias de eco-materiais, podem os leitores ficar

mais esclarecidos das suas possibilidades construtivas e vantagens ecológicas.

Ao encontrarmos situações significantes em obras de referência, seguindo as

obras de Arquitectos marcantes e contemporâneos, vamos apelar a novos

paradigmas arquitectónicos, pois apelo para a utilização é feito sem referência a

aspectos quantitativos e burocráticos.

Em suma será deste modo que esta dissertação discorrerá acerca das

expressividades dos eco-materiais.

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2- O ESTADO DOS CONHECIMENTOS

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2.1- O PROCESSO DE CONSCIENCIALIZAÇÃO AMBIENTAL:

Torna-se necessário saber qual tem sido a evolução das preocupações ambientais

para compreender a sua urgência. Para o efeito vamos descrever sumariamente

algumas das etapas desse processo. Este enquadramento permitirá compreender

melhor a necessidade de implementar cada vez mais critérios e pressupostos de

sustentabilidade na construção.

O processo de consciencialização ambiental é um fenómeno relativamente recente na

história da humanidade. A insatisfação ambiental é um processo que acompanha a

história da humanidade desde a sua origem. Foi o processo de insatisfação ambiental

que levou o homem a alterar as circunstâncias ambientais que o rodeavam.

Construindo alojamentos, inventando a agricultura, extraindo os metais, etc. Até à

revolução industrial, esta progressiva modulação das realidades ambientais às

necessidades e desejo do ser humano implicou algumas crises ambientais localizadas,

mas não interferiu com equilíbrio planetário.

Fig.- 12 Mina de carvão, bairro de mineiros, País de Gales, circa 1910, fonte Library of Congress

A partir da revolução industrial, a humanidade iniciou um processo de extracção e

transformação de recursos como nunca até então se tinha verificado. As necessidades

das indústrias assim o ditaram. Com esse processo de industrialização as populações

humanas começam a sentir os benefícios de um rápido crescimento.

Simultaneamente, começaram a sentir os efeitos das emissões e a sentir a presença

dos resíduos industriais no seu quotidiano. Devido ao fenómeno da urbanização as

populações começaram a conviver com espaços urbanos insalubres e habitats

poluídos, numa escala como até então nunca se tinha verificado.

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Em 1798 e 1803, Thomas Malthus, escreve dois ensaios sobre o princípio da

população, onde constata a insustentabilidade da manutenção de um crescimento

geométrico da população. Simultaneamente o Romantismo começa a disseminar uma

visão edílica da natureza, quase em contraponto com a sua leitura da

degenerescência da vida em cidade. O campo e a natureza começam a ser encarados

como um paraíso perdido. Subconscientemente começam a existir na sociedade

proto-sinais de alerta para a situação ambiental, contudo, apesar do contributo de

Malthus, este era sentimento geral sem base científica.

Apenas com a publicação de “A origem das espécies”, por Charles Darwin, em 1859, é

que começa a existir uma base científica que explique a evolução das espécies como

resultado de uma progressiva adaptação das mesmas a um ambiente específico. Em

simultâneo com as descobertas paleontológicas da época constatou-se que súbitas

extinções de espécies faziam parte da historia do mundo. Essa compreensão acabou

com um mito enraizado no subconsciente da espécie humana, o mito da imutabilidade

da natureza.

Fig.- 13 Explosão atómica em Hiroshima, 6 de Agosto 1945, 08,15h. Neste preciso momento, o mundo conhece o

alcance que a tecnologia humana adquiriu em termos de capacidade destrutiva, foto A P

Entre a segunda metade do Sec. XIX e meados do Sec. XX, o mundo viveu tempos

conturbados. Proliferaram os impérios coloniais, destinados a alimentarem a sua

industrialização com mais recursos e novos mercados. A industrialização desenvolveu

tensões sociais que fomentaram o aparecimento e desenvolvimento de teorias

políticas revolucionárias. Simultaneamente guerras eclodem em intervalos temporais

não muito distantes: ocorre a Guerra da Secessão nos EUA, as guerras europeias do

Sec XIX, a guerra Rússia Japão, o colapso do sistema imperial na China culminado

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pelas duas Guerras Mundiais, já para não referir a Revolução Soviética pelo meio, e a

entrada na era Nuclear, tudo isto até á primeira metade de Sec. XX.

Envolvida em tal sucessão de acontecimentos a espécie humana ficou com pouco

discernimento para percepcionar claramente que a situação ambiental se alterou

significativamente ao longo desse período.

Fig.- 14- Thomas Edison, 1857-1931- Inventor genial, representa o optimismo e a fé nas descobertas científicas e

tecnológicas como meio de responder às necessidades humanas. Parte desse optimismo impediu que a generalidade

das pessoas percepcionasse o alcance das alterações que a industrialização provocava no seu habitat.

Foto: William Eugene Smith, 1972

Contudo não podemos deixar de referir que durante o mesmo período, existiu um

progresso notável no desenvolvimento civilizacional, com a industrialização a atingir

níveis sem precedentes e simultaneamente a verificarem-se descobertas cientificas

revolucionárias em todas as áreas do conhecimento. Este desenvolvimento

civilizacional foi profundamente influenciado por descobertas científicas e tecnológicas

marcantes. As melhorias significativas no campo da medicina passaram pela

compreensão do papel das bactérias e micro organismos na doença, com o

consequente aparecimento das vacinas e desenvolvimento de novas técnicas

cirúrgicas. Na área dos transportes começa uma nova era de mobilidade, o comboio e

o aparecimento do automóvel e do avião abrem novos mundo. Na física assistimos a

uma autêntica revolução com a teoria da relatividade e as experiencias do casal Curie.

Nas cidades e no campo este período é marcado por profundas alterações, da

implementação das redes eléctricas, à massificação dos meios de comunicação, como

os jornais e a rádio, a vida das pessoas sofre uma alteração profundíssima. Em todas

as áreas do saber e da produção, quer seja ela agrícola ou industrial, as descobertas e

as novidades marcam o quotidiano.

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A esperança numa era de bem-estar baseada nas soluções da ciência e nos

benefícios da industrialização, aliada às conturbações históricas deste período tolda a

capacidade de se percepcionarem as alterações que o planeta sofria a nível

ambiental.

No final da 2ª Guerra Mundial o mundo entra na era nuclear e encontra-se perante

uma nova realidade, a Guerra Fria. Com ela veio a noção clara que espécie humana

podia deixar de existir por sua responsabilidade. Esta noção que os humanos têm a

capacidade de se auto-destruírem, inicia um processo que permite aumentar o nível

de consciência com que as pessoas encaram sua presença neste planeta.

Com esta percepção no seu subconsciente, a humanidade foi pela primeira realmente

confrontada com as consequências da industrialização em Minamata, no Japão, pois

entre 1958 e 1971 morreram cerca de 3 mil pessoas em virtude da contaminação da

cadeia alimentar. Essa contaminação foi originada pela poluição da Baia por uma

fábrica de PVC. Desse modo, o peixe e moluscos que faziam parte da alimentação

desta população adquiram altos níveis de mercúrio e outros metais pesados,

envenenando as populações vizinhas. Face ao aumento do número de mortes na zona

a Universidade de Kumamoto realizou uma investigação que concluiu que as pessoas

morriam de envenenamento por metais pesados. O envenenamento causava também

degenerações genéticas, afectando deste modo as gerações futuras.

Fig.- 15- Foto de Mãe a dar banho a filho de 16 anos, nascido com a doença de Minamata. Com este desastre,

percepcionamos de modo inequívoco, que os danos ambientais afectam-nos a nós e às gerações seguintes

Foto: William Eugene Smith, 1972

Na ocasião as autoridades políticas não intervieram, pois consideravam a fábrica

como elemento de progresso e de desenvolvimento. Em resultado desta atitude existiu

uma revolta popular que culminou com a ocupação pelas populações da fábrica da

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Chisso Corporation. Posteriormente com apresentação de uma acção judicial, a

fábrica foi reconvertida e a população indemnizada. Este é momento crucial na tomada

de consciência das populações nos processos ambientais. A partir deste momento as

populações verificam que tem capacidade, com esforço, de alterar e combater focos

de poluição. Com este acontecimento, os cidadãos apercebem-se que as questões

ambientais podem mudar radicalmente o curso expectável da sua vida. E como tal têm

o direito moral de entrevir.

Em 1961, em Londres, na VII conferência da União Internacional dos Arquitectos, R.

Buckminster Fuller, apresenta uma proposta para resolver o seguinte problema:

porque é apenas 40% da população usufrui dos recursos existentes? Em colaboração

com a Southern Illinois University, realiza um primeiro estudo, o “Inventory of World

Resources Human Trends and Needs”, em que analisa criteriosamente as

necessidades humanas, desde a alimentação, à extracção mineral, passando pelas

necessidades energéticas. Nesse estudo conclui-se que existe uma necessidade de

reformular os pressupostos que norteiam a nossa postura no mundo, pois os recursos

disponíveis não chegam para todos.

Fig.- 16- Protestos de cidadãos, a revolução cultural dos anos 60, altera a postura dos cidadãos perante o mundo, o

movimento ecologista começa a ganhar vigor e presença na sociedade, Foto: Bernie Boston, 1967

Durante o mesmo período, devido ao desenvolvimento dos media, nomeadamente da

televisão e das comunicações via satélite, a globalização das notícias na hora

transmite os sinais de alerta a toda a população. A população começa então a

relacionar os sinais de alerta que ecoam nas notícias. Começam também a ter a

noção que algo não estava a correr bem, e isso não se passava apenas no seu

quintal. Estes alarmes, secas, fomes, desastres industriais, derrames etc., estavam a

começar a acontecer simultaneamente em muitos locais distintos. Na segunda metade

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desta época tumultuosa, assistimos a uma profunda mudança social e política. O Maio

de 1968, os protestos contra a guerra do Vietname, a luta contra as tiranias, as lutas

pela independência, a revolução sexual e a música revolucionam o modo como

encaramos o mundo. No seio dessas movimentações, aparecem no meio académico

da Costa Leste dos E.U.A. determinados grupos que começaram a teorizar acerca da

componente política da defesa do meio ambiente. Estes grupos de estudantes aliam à

sua acção ambiental uma forte componente política. Dessa reflexão saem dois grupos

distintos.

Entre eles encontramos ao anarco-ecologistas, corrente que renega o

desenvolvimento e a sociedade de consumo, preconizando um neo primitivismo como

modo de vida. Esta corrente de pensamento tornou-se notória por numerosas

experiencias comunitárias auto-suficientes e pelas acções eco-terroristas que inspirou.

Entre os seus mais extremistas seguidores encontramos Ted Kasinsky, mais

conhecido por Unabomber. O filósofo John Zerzan foi um dos seus principais mentores

teóricos. Ele é o editor da revista Green Anarchy e a sua obra mais influente é “Future

Primitive” de 1994.

Por outro lado, a discussão política destas problemáticas motivou uma outra corrente

de pensamento. Esta defendia que se deveria sensibilizar as populações, pois caso as

populações tivessem conhecimento das consequências da crise ambiental, elas

constituiriam uma força política para poder alterar a situação. É desse modo que

assistimos nascimento dos primeiros organizações de carácter ecologista como a

Greenpeace e a WWF.

Fig.- 17- Nascimento da Greenpeace. Foto: Greenpeace., 1973

Pouco tempo depois, em 1973, o mundo é confrontado, com a primeira crise

petrolífera. O mundo desenvolvido sente na pele a falta de abundância de recursos. A

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consciência colectiva começa a perceber o significado de sustentabilidade, o mundo

dá uma prova da sua finitude.

Outra ocasião importante para aumentar esta crescente noção de finitude foi a celebre

fotografia tirada pela Apollo VII em que se vê o nascer da Terra visto da lua, em 1968.

A visão clara que o nosso planeta era um minúsculo círculo colorido na infinitude do

espaço, despertou consciências. Passámos a conceptualizar o local onde vivemos

como raro e precioso. Este é um momento importante na consciência colectiva da

humanidade.

Fig.- 18- Fotografia do nascer da Terra, tirada na Lua pela missão Apollo VIII. Nesta fotografia, a intensidade de cor e

vida da Terra contrastam com a aridez do espaço e da Lua. A nossa casa é coisa rara e valiosa. Foto: Nasa

Em 1966, preocupado com a situação económica e ambiental, Aurélio Peccei,

administrador da FIAT e da Olliveti, propõe a mais empresas e à comunidade científica

o estudo da questão. Em 1967 é fundado o Clube de Roma. Tinha como objectivo

discutir e analisar os limites do crescimento económico, levando em conta o uso

crescente dos recursos naturais. Numa primeira análise consideraram o crescimento

demográfico como o cerne do problema, pois origina uma industrialização acelerada, a

escassez de alimentos, o esgotamento de recursos não renováveis e a deterioração

do meio ambiente.

Em 1972 o Clube de Roma, encomenda ao MIT e a outras prestigiadas instituições,

um estudo científico para caracterizar a situação e realizar uma projecção a 100 anos

da situação do planeta e dos seus recursos. O estudo foi publicado em 1972 e tem

como titulo "Os Limites do crescimento". As suas principais conclusões são:

1. Se as actuais tendências de crescimento da população mundial, industrialização,

poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais continuarem

imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro

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dos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito e

incontrolável, tanto da população como da capacidade industrial.

2. É possível modificar estas tendências de crescimento e formar uma condição de

estabilidade ecológica e económica que se possa manter até um futuro remoto. O

estado de equilíbrio global poderá ser planejado de tal modo que as necessidades

materiais básicas de cada pessoa na Terra sejam satisfeitas, e que cada pessoa tenha

igual oportunidade de realizar seu potencial humano individual.

3. Se a população do mundo decidir empenhar-se em obter este segundo resultado,

em vez de lutar pelo primeiro, quanto mais cedo ela começar a trabalhar para alcançá-

lo, maiores serão suas possibilidades de êxito.

Fig.- 19- Com a fundação da UNEP, as Nações Unidas, passam a dispor de um organismo que coordena os

programas de protecção ambiental numa perspectiva integrada, relacionando-os sempre com a componente do

desenvolvimento humano. Foto: UNEP

Em consequência da existência do Clube de Roma e de outras organizações, a

Nações Unidas realizam em Junho de 1972 a Primeira Conferência Mundial sobre o

Homem e o Meio Ambiente, também conhecida pela Conferencia de Estocolmo. Nesta

primeira conferência dedicada a temas ambientais não foi possível chegar a acordo,

pois os países subdesenvolvidos não aceitaram restrições ao seu desenvolvimento, e

os países desenvolvidos também não queriam pagar o diferencial de possíveis

restrições no desenvolvimento dos países do terceiro mundo. Contudo devemos

ressalvar, que apesar do fracasso em atingir um acordo, esta conferência teve como

maior virtude o facto de os estados reconhecerem os problemas ambientais, para além

desse reconhecimento, passou a existir a clara noção que a sua solução ou minoração

só será possível através de acções concertadas a nível global.

Em consequência da Conferencia de Estocolmo, é criada pelas Nações Unidas a

UNEP, United Nations Environment Programme. Esta agência tem como função

assessorar as Nações Unidas em programas de monitorização ambiental, promover e

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fomentar a realização de tratados internacionais, fomentar os programas e

instrumentos de desenvolvimento económico e ambiental sustentável. A criação deste

organismo foi de vital importância, pois pela primeira vez começaram a existir meios

para relacionar as visões e estudos nacionais, de modo a começar a ter uma imagem

global do estado ambiental do planeta. Foi através da UNEP que começou a

monitorização dos dados que permitiram começar a percepcionar o verdadeiro

problema da emissão de poluentes para a atmosfera com uma visão global do

problema. A primeira noção da gravidade da crise ambiental proveio da chamada crise

do Ozono. As medições dos níveis de ozono atmosférico sobre as calotes polares, em

especial na Antárctida, revelaram uma súbita diminuição dos seus níveis. De acordo

com os dados científicos e com modelos então disponíveis alertaram o mundo para

um possível derretimento dos gelos polares e relacionaram a rarefacção do ozono com

a poluição causada por aerossóis de uso industrial, nomeadamente os CFC (Cloro

flúor carbonetos)

Fig.- 20- Evolução do buraco de ozono desde 1980 até 2004, onde se verifica uma ligeiro decréscimo da sua dimensão

desde 2002, o que vem confirmar as previsões dos modelos adoptados na conferencia de Montreal. Com a aferição

dos resultados da conferência de Montreal podemos concluir que a humanidade pode reverter situações perigosas,

tendo o conhecimento cientifico do caso, basta vontade politica para agir. Foto: Nasa

Na mesma ocasião começam os primeiros alertas institucionais dados perante a

alarmante subida dos níveis de carbono na nossa atmosfera, relacionando-os com o

aumento de temperatura média do planeta e com o nível dos oceanos. Graças às

Nações Unidas e ao crescente grau de consciência ambiental, quer de governos, quer

de ONG’s, quer dos cidadãos, é realizada a conferencia de Montreal, em 1987, que

culmina com o Protocolo de Protecção da Camada de Ozono, onde é estabelecido um

programa para a limitar produção de CFC, e é criado um fundo de contrapartidas

financeiras aos países subdesenvolvidos de modo a compensá-los pela sua renúncia

em criar fabricas que os utilizem nos seus processos de desenvolvimento. Este

programa é o grande exemplo de como a cooperação internacional em problemas

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globais é a única resposta. Desde 2008 que o buraco de ozono tem vindo

progressivamente a diminuir, esperando-se, de acordo com os modelos científicos

empregues na sua monitorização, que a ordem natural das coisas esta restabelecida

em 2050.

É a UNEP que cria a em 1983 a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, também conhecida pela Comissão Bundtland, dado ser presidida

pela Dr. Harlen Gro Brundtlan, médica e antiga ministra do Ambiente, e Primeira

Ministra da Noruega. A Comissão Bruntdland com um papel chave no processo de

consciencialização ambiental, tinha como missão reavaliar as questões críticas

relativas ao meio ambiente e reformular propostas realistas para a sua solução. A

principal conclusão retirada pela comissão Brundtland foi a constatação da falência do

modelo de desenvolvimento vigente, pois caso os países desenvolvidos optassem

pelo modelo de desenvolvimento dos países industrializados todos os recursos se

esgotariam rapidamente.

Fig.- 21- Documento fundamental na compreensão das relações entre meio ambiente, desenvolvimento e

sustentabilidade. Fruto de um trabalho de 15 anos desenvolvido pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento, nele o conhecimento científico é sistematizado e as medidas para alterar a situação são

preconizadas, mas falta ainda a vontade política. Foto: UNEP

No seu relatório final, publicado em 1987, conclui-se que se terá de substituir o actual

modelo de desenvolvimento por um novo modelo. O modelo de desenvolvimento

sustentável é apresentado como solução e é concebido pela seguinte premissa “ele é

o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a

capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” (Brundtland

1987). Esta definição de sustentabilidade é marco fundamental no processo de

consciencialização ambiental, pois até esse momento, as preocupações estavam

centradas em duas situações tipo. Por um lado existia uma grande preocupação com

os problemas ambientais mais locais, o que motivava os cidadãos e as instituições a

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começar a agir. Por outro lado, em relação à situação global, a noção de falência do

modelo começava a estar enraizada nas consciências, mas ainda não existia um plano

alternativo que permitisse à humanidade sair desta situação. Só depois do relatório

Brundtland, e face às suas conclusões, é que as nações começaram a procurar as

primeiras tentativas exequíveis para projectar um caminho sustentável para o

problema. A cidadania começa a ganhar peso no quotidiano das nações, são os

cidadãos a pressionar os governos para intervirem cada vez mais nas questões

ambientais. O mesmo se passa em relação às empresas, a consciencialização

ambiental é cada vez mais um fenómeno global.

Em 1992 realiza-se a Conferencia do Rio que culmina com o tratado que cria a

Convenção - Quadro das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas. Este tratado

tem como objectivo a estabilização da concentração de gases do efeito estufa na

atmosfera em níveis tais que evitem a sua interferência perigosa com o sistema

climático. É esta convenção que lança as bases para o protocolo de Quioto, onde

finalmente em 1997, se chega a acordo para a redução progressiva de emissões de

CO2 para níveis de 1990. O acordo prevê sistemas de monitorização, de cotas de

carbono e de mecanismos de compensação aos países em vias de desenvolvimento.

O Protocolo foi muito criticado pela comunidade científica e pelas ONG ecologistas,

pois nos seus modelos consideram que a redução proposta, reduzir os níveis de

emissões para o patamar de 1990, não será suficiente para mitigar a situação. Por

outro lado, apenas em 2005 é que foi concluído o processo de ratificação do protocolo,

que deveria ter estado em vigor entre 2000 até 2012. Não deixa apesar de ser tudo de

ser mais um momento marcante neste processo contínuo de consciencialização

ambiental em que ainda nos encontramos.

Fig.- 22- Manifestante em durante a realização do COP 15 em Copenhaga em Dezembro de 2009. Com o aumento da

consciência ambiental dos cidadãos, as acções de protesto para incrementar os níveis de resposta à crise ambiental

tem aumentado exponencialmente. Esperemos que com a proliferação de democracias a nível mundial esta pressão

seja efectiva em tempo útil. Foto: sorenbosteendahl.wordpress.com

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Em 2006, Al Gore lança o documentário “Uma Verdade Inconveniente”, uma

adaptação das suas conferências sobre as alterações climáticas, que foi largamente

difundido e discutido e marca um ponto crucial na democratização de uma realidade

nem sempre acessível aos menos bem informados. Este é um momento importante

neste processo de consciencialização ambiental em que nos encontramos. Graças a

este filme, e devido ao seu êxito, muitos milhões de cidadãos perceberam um pouco

melhor de qual o verdadeiro problema que enfrentamos.

Fig.- 23- Al Gore, antigo Vice-presidente dos E.U.A. durante o mandato Clinton, lança o documentário “Uma Verdade

Inconveniente”, baseado nas suas conferências sobre o aquecimento global e a sua relação com crise ambiental. Êxito

de bilheteiro em 2006 e ganhador de dois Óscares, este documentário teve a vicissitude de alertar os mais distraídos

para a gravidade da situação. Foto: www.algore.com

A recente Cimeira da Terra em Copenhaga, apesar do relativo insucesso, deu

seguimento ao Protocolo de Quioto, alargando o âmbito de acção e controle,

estabelecendo fundos de compensação para os países menos desenvolvidos e

aumentando as medidas de redução de emissões nos países desenvolvidos. Marcante

na COP 15 foi o movimento de massas que mobilizou para tentar pressionar o poder

político em adoptar medidas mais realistas. Reflexo da democratização da informação

motivada pela revolução digital, ela lança um sério aviso ao poder político. Cada vez

mais o processo de consciencialização ambiental pressionará o poder politico com as

suas preocupações ambientais.

A grande virtude do processo de consciencialização é que cada indivíduo passa a ter a

clara consciência que os seus actos importam para resolver a situação. Que por mais

conferências, protocolos e tratados que existam, se o individuo não mudar o modo

como se relaciona com o mundo essa é uma batalha perdida. A mudança de

paradigma passa sem sombra de dúvidas por uma imensidão de actos individuais.

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Esta é uma esperança e um dever para o futuro, sendo que cada vez mais, na nossa

qualidade de cidadãos, iremos pesar a consequência dos nossos actos em termos

ambientais. O significado ético do conceito de sustentabilidade pesa no nosso

quotidiano e isso é o princípio de uma mudança, uma mudança, que passo a passo,

nos permitirá alterar as perspectivas mais sombrias que neste momento nos são

apresentadas.

A grande esperança para o futuro alicerça-se no nosso passado como espécie. O ser

humano sempre conseguiu adaptar-se a novas realidades e é dado histórico que

quase sempre se saiu bem e prosperou após a adaptação.

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2.2- A ARQUITECTURA COMO RESPOSTA A HABITATS INSATISFATÓRIOS:

Cada vez que a arquitectura se viu confrontada com temas de urgência civilizacional,

criou novos paradigmas e soluções de modo a dar resposta aos mesmos. A

concretização desta resposta teve uma concretização alicerçada nas materialidades

do seu tempo.

Assistimos a este tipo de actuação desde o séc. XIX, como resposta aos problemas

sociais e de salubridade causados pela urbanização originada pela revolução

industrial. Situação esta que deu origem a uma serie de conceitos, que começaram

com Charles Fourrier e acabaram por culminar em Le Corbusier e a Carta de Atenas,

passando pelas cidades jardim, pelo modernismo, pelo racionalismo, entre outros.

Fig.- 24- Karl Marx Hof, de Karl Ehn, Viena 1932. Conjunto habitacional para operários, incluía espaços verdes,

infantários e lavandarias, de modo a melhorar as suas condições de vida. Numerosos avanços na arquitectura foram

marcados pela vontade dos arquitectos em resolverem problemas reais.

Ou seja, a origem do modernismo, incluindo as suas correntes organicista e

racionalista, surgiu também como resposta ao problema civilizacional da falência do

modelo urbano medieval perante a voracidade da urbanização de origem industrial.

Esta resposta elaborou uma serie de novos modelos arquitectónicos e urbanos, a

concretização desses modelos apoiou-se em grande parte na utilização das

materialidades icónicas da revolução industrial.

A massificação dos processos de produção do ferro, do aço, do vidro abriu portas a

que o desenvolvimento arquitectónico passasse a incorporar este materiais,

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reformulando a sua linguagem e adquirindo novas expressividades como parte da

resposta ao problema da falência do modelo da cidade medieval.

Com O fim da 2ª Guerra Mundial, acrescente necessidade de construção e seriação

da reconstrução, desencadeou desafios que foram parcialmente resolvidos pelas

intervenções governamentais e pela industrialização massiva da indústria da

construção. O problema da contínua urbanização levantou novos paradigmas. Com as

intervenções realizadas, a falta de referências urbanas, a progressiva desumanização

do espaço público e urbano e o excessivo zonamento levantaram novos problemas, o

que originou por sua vez, novas respostas, como o regionalismo crítico e o pós-

modernismo.

Fig.- 25- Pavilhão da Finlândia na Feira Mundial de Nova York, 1938/39, de Alvar Aalto. A utilização de materiais

tradicionais, utilizando-os de um modo novo e surpreendente permitiu a Alvar Aalto um percurso de carreira influente e

marcante.

Cada uma dessas respostas teve associadas materialidades e expressividades

próprias. No caso do regionalismo crítico é de ressalvar a utilização de materiais e

técnicas de tradição local associadas à tradição moderna. Já o Pós-modernismo se

caracterizou pela junção da tradição clássica aos materiais mais expressivos da

sociedade de consumo.

Estas respostas fazem parte de um processo contínuo iniciado no inicio do Sec. XIX,

tendo todas estas correntes e movimentos uma premissa comum: a crença num

crescimento contínuo. Essa premissa não é exclusiva das correntes e pensamento

arquitectónico, ela é uma premissa transversal à génese política, económica e social

da sociedade capitalista.

Hoje é um dado adquirido que o nosso processo de exploração e crescimento nos

conduziu a uma encruzilhada civilizacional. Essa encruzilhada tem um potencial que

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nenhuma outra teve na história da humanidade, ela tem o potencial de poder alterar

definitivamente o equilíbrio planetário, podendo em última análise acabar com o

processo civilizacional tal como o conhecemos. Contudo esta situação não é uma

inevitabilidade. Encontramo-nos numa altura onde mais uma vez o engenho e a

capacidade de adaptação da espécie humana se preparam para reagir à adversidade.

No campo da Arquitectura, nos últimos 20 anos começam a aparecer novas atitudes.

A resposta a problemas ambientais começa a fazer parte do léxico da profissão. A

profusão de exemplos de arquitecturas bioclimáticas, as tentativas de formular

arquitecturas de urgência têm uma presença cada vez mais significativa na produção

arquitectónica. A necessidade deste tipo de respostas tem vindo a ter um lugar de

maior destaque nas preocupações da produção arquitectónica, e isso deve-se à

consciência de que o objecto arquitectónico não é um mero elemento isolado, mas sim

parte de uma realidade complexa e interdependente.

Fig.- 26- Pavilhão Vasarely, Aix-en-provence, 2006, de Shigeru Ban. A utilização de materiais reciclados marca a obra

de Shigeru Ban de modo notável, neste caso vemos o aproveitamento de tubos de cartão, resíduos de cartão da

indústria têxtil.

Por outro lado, o actual estado das cidades, autênticos sorvedouros de recursos e

produtoras em massa de resíduos, tem proporcionado uma incessante investigação

por parte de urbanistas e arquitectos para reformular este paradigma. A realidade das

cidades actuais, expoentes máximos da sociedade liberal de consumo, tem criado

numerosos conflitos sociais e ambientais. Boa parte da população urbana, apesar de

ter beneficiado enormemente em termos materiais e civilizacionais com o

desenvolvimento da cidade pós industrial, encontra-se num estado de insatisfação

generalizado. A visão materialista de que o acesso a bens e serviços de um modo fácil

e generalizado compensaria a perda de partes significantes que integravam parte da

vida das pessoas, começa a ser questionada.

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A recente crise financeira que afecta o mundo desde final de 2008 é resultado desta

visão do mundo. Richards Meadows, o coordenador do estudo "Os Limites do

Crescimento", na conferência de atribuição do Japan Prize, afirma que as piores

consequências da crise da falta de recursos que o mundo atravessa, não se

verificarão quando os recursos começarem a diminuir drasticamente, mas sim quando

nos aproximarmos do pico da sua utilização. Ou seja é antes do decréscimo que as

piores convulsões se vão sentir na vida das pessoas, pois é nessa altura que as

principais tensões do esgotamento dos actuais modelos económico e de

desenvolvimento se vão manifestar. Segundo Meadows é esse o momento em que

vivemos.

Estas tensões motivam também um grande sentimento de descontentamento nos

cidadãos. John Pawson, conceituado arquitecto britânico, a respeito dos actuais

modelos arquitectónicos, afirma que a implementação de novos modelos de vida

sustentáveis é imperiosa, não só por causa da problemática ambiental, mas também

porque o sentimento generalizado de insatisfação que as pessoas sentem em relação

ao seu actual modo de vida, gerador de infelicidade, deve ser posto em causa, pois

desenvolvimento humano e felicidade estão intrinsecamente ligados.

Fig.- 27- Malmo's Western Harbour, 2004. Começam a ser numerosos os exemplos de cidades que se lançam em

experiencias de sustentabilidade, aqui em Malmo, nesta antiga e poluída zona portuária cresce agora uma nova porção

de cidade, sustentável, com um impacto mínimo na emissão de resíduos e fomentadora da bio-diversidade.

Logo verificamos que a produção arquitectónica, tal como o tem repetidamente feito

nos últimos duzentos anos, encontra-se num momento de charneira e mudança de

paradigmas. Para os arquitectos esta é uma altura única de poder contribuir para a

resolução dos problemas com que nos defrontamos. Reflectindo sobre as reais

necessidades das pessoas, das edificações e das cidades e com a criatividade que

historicamente temos tido, criando novos paradigmas arquitectónicos. Cumprindo

desse modo a função ética e primordial do arquitecto, ser “criador de felicidade”.

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2.3-A RESPONSABILIDADE SOCIAL DO ARQUITECTO:

No seguimento desta mudança de hábitos de consumo, os Arquitectos têm um papel a

desempenhar.

Existe a nível global uma grande parte da população que ainda não dispõe de

habitação salubre e digna. Por outro lado, o desenvolvimento económico de algumas

nações, nomeadamente as designadas nações BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China),

irá aumentar o nível de consumo das respectivas populações.

A isto ainda teremos de somar a resposta que irá ser dada às necessidades dos fluxos

migratórios. Com este quadro futuro, podemos deduzir que uma enorme quantidade

de recursos naturais e energia serão consumidos na resposta a esta situação.

Fig.- 28- Gráfico da evolução da população humana desde 1750 com previsão de crescimento até 2150. Fonte: World

Populations Propects, United Nations Population Division

Boa parte destes recursos será dispendida nas construções indispensáveis para

responder a esta necessidade. Falamos de construção, a um nível sem precedentes,

de novas cidades e partes de cidade, com a sua panóplia de infra-estruturas,

habitações e equipamentos. Falamos também de um enorme fluxo de energia que

alimentará esta nova realidade.

Como intervenientes neste processo, os arquitectos devem ter a consciência clara que

a sua prática irá ter consequências globais. O somatório das diferentes opções de

projecto irá pesar de um modo claro no resultado final. Tem de existir uma clara

percepção de que todas as obras, das mais insignificantes às mais notórias, têm de

ser tratadas com a mesma preocupação. Cada projecto que realizarmos deve encarar

a sustentabilidade como parte fundamental da sua génese.

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Claro que a Arquitectura, como actividade humana imprescindível, reflecte os

condicionalismos da História, não sendo de estranhar que numa época de excessos,

boa parte da história recente da arquitectura tenha sido marcada pelo chamado Star

System. Durante as últimas décadas, o papel e a responsabilidade social do arquitecto

perderam notoriedade face às questões de autoria. Numa altura de mudanças globais

e de uma grave crise ambiental é de esperar que a ética e a responsabilidade social

do arquitecto voltem à da prática.

Fig.- 29- Vista de do centro de Xangai, 2009. A pressão populacional e desenvolvimento económico das cidades dos

países em via de desenvolvimento vão criar enormes necessidades de construção nas cidades, o processo de

urbanização ainda não estabilizou e os recursos necessários para o concluir serão imensos. Foto: Planet Shanghai

No artigo nº 47 do estatuto da Ordem do Arquitectos lemos que “O arquitecto, no

exercício da sua profissão, deve: a) Actuar de forma que o seu trabalho, como criação

artística e técnica, contribua para melhorar a qualidade do ambiente e do património

cultural; b) Utilizar os processos e adoptar as soluções capazes de assegurar a

qualidade da construção, o bem-estar e a segurança das pessoas;” (O. d. Arquitectos

s.d.).

No artigo nº 3 do Regulamento de Deontologia da Ordem dos Arquitectos lemos que

“Constituem deveres do arquitecto para com a comunidade: a) Orientar o exercício da

sua profissão pelo respeito pela natureza, bem como pela atenção pelo edificado pré-

existente, de modo a contribuir para melhorar a qualidade do ambiente e do património

edificado.” (O. d. Arquitectos s.d.)

Como acabamos de ler, na regulação da profissão, a responsabilidade ética do

Arquitecto, enquanto elemento responsável pelas consequências ambientais da obra,

está claramente considerada. A responsabilidade ética do arquitecto nada mais é do

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que um prolongamento da sua responsabilidade enquanto cidadão. Nesta urgência em

que procuramos encontrar um equilíbrio sustentável entre o ser humano e o seu

planeta, cada cidadão tem a sua cota parte de responsabilidade e o arquitecto tem

responsabilidades acrescidas, pois no edificado está uma grossa fatia do nosso

consumo de recursos.

Fig.- 30- Pavilhão de Espanha, 2008, Francisco Mangado. Reinventando a cerâmica, Francisco Mangado, cria um bio

mimetismo com o bambu, utilizando os elementos cerâmicos como depuradores de águas, climatizando o edifício e

minimizando o consumo de recursos. Foto: http://www.fmangado.com

Lembremo-nos que na edificação actualmente são dispendidos cerca de 40% dos

recursos e da energia consumida a nível mundial, e que, com as necessidades

previstas para alojar o aumento populacional com que nos deparamos, elas serão

muito maiores. Daí a urgência em aumentar exponencialmente as respostas eficazes a

estas necessidades, pois caso não tenhamos o rigor e a imaginação de encontrar

estas respostas, assistiremos a tragédia de dimensões inimagináveis.

Torna-se igualmente necessário, para além de encontrar processos de construir

sustentavelmente, que o projecto de arquitectura encontre meios de iniciar a

regeneração de habitats danificados. Quer eles sejam na reconstrução de zonas de

catástrofes, quer os mesmos tratem de recuperar a biodiversidade, reconstruindo

inteligentemente ecossistemas ou promovendo habitats artificialmente naturais nos

nossos edifícios e cidades.

Cada vez menos se pode encarar o fenómeno da construção como algo distinto do

ecossistema do planeta. A visão da criação arquitectónica como um mero objecto

técnico e criativo, separado do meio onde se encontra e desligado das consequências

que provoca é uma ideia ultrapassada e perigosa. Hoje em dia não chega cumprir o

triunvirato vitruviano da Fermitas, Utilitas e Venustas pois a complexidade da

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crescente exigência de solicitações a que o projecto arquitectónico deve responder

não para de aumentar. Entre essas novas solicitações destacamos a capacidade do

edificado em produzir e economizar energia, ser eficiente na utilização de recursos,

salvaguardar o solo, ter a possibilidade de alojar várias funções, constituir-se para

regenerar o ambiente, quer do ponto de vista da biodiversidade, quer do ponto de vista

da regeneração social e económica, entre outras e cada vez mais complexas

solicitações. Estas são tarefas que se impõem atendendo à responsabilidade social e

a ética da profissão actual. E esta deverá utilizar as técnicas e os saberes que a

humanidade vem desenvolvendo para desvendar novas arquitecturas.

Fig.- 31- Pavilhão Médico em Khartoun, Sudão , 2008, TAMassociati. As arquitecturas da emergência concretizam

plenamente a responsabilidade social que se espera dos arquitectos. Estas resposta não invalidam que se obtenham

resultados de grande valia arquitectónica com orçamentos mínimos e respeitando exigentes critérios de

sustentabilidade. Neste centro médico a construção utiliza contentores reciclados e materiais locais e sustentáveis.

Foto: http://www. tamassociati.org

Cada vez mais as opções do projecto deverão incluir uma análise dos custos

energéticos e ambientais das nossas escolhas. Obviamente que esta obrigação ética e

social, não se deverá sobrepor a todas as outras obrigações da praxis, devendo o

carácter artístico, estético e autoral da prática continuar a ser valor fundamental. Tal

como o deverão ser a integração urbana, o respeito pelo património cultural, a

adaptação do projecto aos hábitos sociais e culturais das populações, a acessibilidade

dos espaços, a economia da construção, etc.

A componente ambiental das opções de projecto será mais uma das diversas

solicitações a que um projecto deverá responder. A resposta ambiental do projecto

deverá ser alicerçada em duas componentes. Em primeiro lugar deverá minimizar os

custos ambientais da vida útil do edificado, em segundo lugar deverá minimizar a

utilização de recursos no acto da construção. Ou seja, a necessidade de resposta a

estes novos desafios, irá aumentar a complexidade e a exigência da prática

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arquitectónica. Esse aumento de solicitações irá com certeza provocar novos

paradigmas no fenómeno arquitectónico. Esses novos paradigmas irão sem dúvida

enriquecer a história da arquitectura pois são motivados por novas respostas a novas

necessidades, e sempre que tal aconteceu, tivemos revoluções no modo em como se

pensa e executa a prática arquitectónica.

Fig.- 32- Pavilhão de Oração no Darfur, Sudão , 2007, TAMassociati. Programa complexo e significante, um centro de

oração inter-religioso para um campo de refugiados. Construído apenas com materiais locais, taipa e madeira,

edificado pela população refugiada. Foto: http://www. tamassociati.org

O Arq. João Belo Rodeia, Presidente da Ordem dos Arquitectos escreve a esse

respeito o seguinte “ Num planeta cada vez mais pequeno, morada definitiva da

aventura humana, a finitude abre novas oportunidades a uma Arquitectura com

responsabilidade ética, relevância social e significado físico.” (Rodeia 2006) e

Fernando Távora, na sua teoria geral da organização do espaço, dissertando acerca

do papel do arquitecto, afirma “ Para além da sua formação especializada e porque ele

é homem antes de arquitecto que ele procure conhecer não apenas os problemas dos

seus mais directos colaboradores, mas os do homem em geral. Que a par de um

intenso e necessário especialismo ele coloque um profundo e necessário humanismo.

Que seja assim o arquitecto - homem entre os homens - organizador do espaço -

criador de felicidade” (Távora 1962). Em suma, apesar de proferidas em tempos

diferentes, ambos apontam o caminho seguir. Caminho esse que na prática, nada

mais é do que sempre foi ser Arquitecto, praticando a arquitectura de um modo

consciente e responsável. Utilizando o ofício engenhosamente em favor do bem

comum, seja “ criador de felicidade”.

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2.4- CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL:

O modo como temos construído nos últimos 100 anos contribui muito para o actual

estado do planeta. A indústria da construção, com todas as suas exigências

energéticas, de recursos e de resíduos esgotou e danificou seriamente a

sustentabilidade dos mesmos. Por outro lado as exigências do edificado vão aumentar

brutalmente nas próximas décadas.

Convêm relembrar que durante 100 anos beneficiámos dos méritos da

industrialização. Os sistemas de construção embarateceram substancialmente face

aos sistemas tradicionais, democratizando a edificação.

O mesmo se passou com a energia, o que permitiu uma enorme melhoria na vida de

milhões de seres humanos, melhorando os sistemas de produção, permitindo

armazenamento de víveres em melhores condições, alterando por completo os modos

de distribuição dos produtos e climatizando o edificado, entre outros inúmeros

benefícios civilizacionais.

Fig.- 33- A epidemia de obesidade que a nossa sociedade presencia é consequência do consumo desregrado, ela é

mais um sinal em como devemos mudar os nossos comportamentos

Fonte: http://www.abc.net

Fig.- 34- Boa parte das nossas cidades estão edificadas para fomentar um consumo desenfreado de recursos, tanto

elas como a epidemia de obesidade são consequência da sociedade de consumo.

Fonte: http:// www.intelligenteconomy.com

Face ao seu baixo custo, a eficácia na utilização dos recursos e da energia não era

critério a ter em conta na altura de construir. Se era necessário climatizar um edifício,

o ar condicionado ou o aquecimento resolviam, o custo da energia dispendida para o

efeito era negligenciável. O mesmo se passava em relação aos desperdícios e aos

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materiais empregues. O emprego destes critérios, ao contrário do que seria lógico,

valorizava o edificado.

Contudo apesar do custo dos recursos e da energia ser baixo, isso não implica que

como espécie, não tenhamos de o pagar. Hoje estamos no início de um processo

onde o verdadeiro custo das coisas tende para a verdade. Logo cada vez mais vamos

pagar o preço da insustentabilidade.

Devidos aos custos da insustentabilidade encontramo-nos na altura de alterar este

modelo. As principais mudanças que devemos implementar estão no modo como

pensamos a construção. Em vez da resposta imediata, devemos aprofundar o projecto

no sentido de perceber os seus reais impactos ao longo da sua vida útil e

consequentemente diminui-los.

Para atingir esse objectivo, o projecto deverá ser objecto de uma análise de ciclo de

vida, (ACV). Esta metodologia permite aferir as opções de projecto em termos

energéticos e ambientais. Para entender o que é uma análise de ciclo de vida temos

de considerar em primeiro lugar a vida expectável do edifício. De seguida

consideraremos os custos energéticos dispendidos com a sua execução, designado

de energia incorporada. A estes custos teremos de realizar o somatório dos custos

energéticos do edificado relativamente às suas necessidades de iluminação,

climatização, ventilação e manutenção.

Diferentes opções conduzem a diferentes resultados, por norma as situações mais

eficientes conduzem a poupanças monetárias efectivas, se bem que em algumas

situações exijam investimentos iniciais mais elevados. O importante nestas análises é

ter um instrumento que permita medir de um modo rigoroso quais as consequências

das opções de projecto.

Parte deste análise já se reflecte nos nossos projectos, a certificação energética,

instituída nos países da Comunidade Europeia. Contudo os custos da energia

incorporada e da manutenção do imóvel ainda não são reflectidos na informação

prestada ao utilizador.

Relativamente à Análise de Ciclo de Vida (ACV), ainda não existem parâmetros e

métodos padrão que sejam claramente aceites por todos. Contudo, a breve prazo,

teremos esta situação mais clarificada, dado que as normativas a implementar da CE

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irão clarificar esta situação. Existem contudo numerosos programas implantados, ou

em vias de serem implantados em vários países: método Viiki na Noruega, Breeam no

Reino Unido, o LiderA desenvolvido pelo Instituto Superior Técnico, o sistema Cradle

to Cradle desenvolvido pelo Hamburger Umweltinstitut (Instituto do Ambiente de

Hamburgo), LEED (U.S. Green Building Council), a norma ISO 14000 entre outros.

São sistemas muito complexos, de carácter fortemente burocratizado, adequados para

a certificação, mas não dispondo da ligeireza e agilidade necessárias para

constituírem um instrumento ágil que permita ao arquitecto ir aferindo a

sustentabilidade do projecto durante o seu desenvolvimento. Tal apenas se torna

possível com equipas pluridisciplinares, vastas e de grandes estruturas, o que no caso

da maioria dos ateliês, caracterizados por serem pequenas estruturas, torna inviável a

sua utilização em projectos de pequena e media dimensão, projectos esses que

constituem a maioria do edificado. Tem portanto o arquitecto de socorrer-se de

estratégias alternativas para conseguir atingir esse propósito.

De um modo simples, pois esta dissertação não pretende analisar ou comparar

métodos de ACV, podemos afirmar que se o projecto procurar seguir as seguintes

directrizes, ele estará a contribuir para mudar o paradigma construtivo:

“1- É melhor não construir.

2-Se é necessário construir, é preferível reabilitar.

3-É melhor construir com materiais renováveis, estejam perto ou longe.

4-É mais ecológica uma construção leve do que uma construção pesada.

5-É preferível montar do que construir, sobretudo para se poder desmontar facilmente.

6-É necessário diminuir a procura energética. E depois de a limitar, o ideal seria

produzi-la através de fontes renováveis.” (Arnal, Eco productos 2008).

Com seis princípios, Ignaci Perez Arnal delineia um conjunto de pressupostos

facilmente conciliáveis com a prática do projecto. No seu papel, o arquitecto concilia os

mais diversos saberes para conceptualizar um projecto. Esse processo é complexo e

atreito a muitas solicitações, sendo que um somatório de solicitações não faz um

projecto, mas a conceptualização de uma ideia que concilie e hierarquize as diferentes

solicitações é o projecto.

Mais que responder a uma longa lista de solicitações, o arquitecto, necessita de

incorporar na sua raiz genética a necessidade de construir sustentavelmente. Para

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isso, e na ausência de instrumentos intuitivos de projecto que permitam realizar essa

avaliação, ele precisa de princípios óbvios que lhe apresentem estratégias viáveis e

intuitivas. Estratégias que não colidam com o acto criador do projecto, mas que o

complementem, sem constituir uma interrupção burocrática no processo criativo.

Nesse sentido, os seis pressupostos que Ignaci Perez Arnal enunciou, são uma boa

base de partida para caminhar para a sustentabilidade de qualquer projecto.

Convêm acima de tudo encarar a construção como um organismo vivo. O ser humano,

e em especial os arquitectos, deverão compreender, que tal como um organismo vivo,

o edificado deverá subsistir com os recurso de que dispõe à sua volta. Deverão ainda

compreender, que tal como as folhas das árvores quando morrem, caem ao solo e vão

passar a alimentar as gerações futuras, num magistral ciclo biológico, igual ao que a

natureza pratica desde tempos imemoriais.

Claro que não depende apenas do Arquitecto esta mudança, depende dos extractores

de matérias-primas, depende dos fabricantes, depende dos consumidores, dos

políticos, das famílias, enfim depende de todos nós. Mas imperativamente o faremos,

podemos faze-lo à posteriori, e nesse caso não controlando o paradigma e não

acautelando as consequências. Ou podemos realiza-lo acautelando o futuro, e nesse

caso, alterando estruturas e métodos de construir e acima de tudo mudando modos de

vida, mudando o paradigma civilizacional onde nos encontramos. Caso tal não

aconteça, podemos correr o risco de interromper este ciclo virtuoso que permitiu o

florescimento do Homem a da civilização na Terra. Essa é a urgência de nos

tornarmos sustentáveis.

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2.5 – ENTENDIMENTO DO ECO MATERIAL.

Antes de começarmos a explorar a qualidades expressivas dos eco-materiais,

devemos definir com exactidão o que é um eco-material. Temos correntes de

pensamento, nomeadamente os anarco ecologistas que na sua visão de rejeição da

sociedade industrial, advogam por uma definição estreita do que é um eco-material,

aceitando apenas que materiais sustentáveis de génese não tecnológica nessa

categoria. Claro que na sua coerência, advogam também a rejeição de todos os

avanços tecnológicos da humanidade, atitude extremista e contraproducente.

Temos a noção que estas visões mais extremadas podem ter sido úteis a determinada

altura da tomada de consciência da problemática ecológica. Contudo, acreditamos que

a fase panfletária desta questão está ultrapassada. A tomada de consciência para os

problemas ambientais já se encontra numa fase onde as questões pragmáticas

impõem a sua lógica. E essa lógica não se atinge com mudanças instantâneas de

modelo, elas serão conquistadas gradualmente, sendo obvio que essa conquista é

coisa de muita urgência.

Hoje a premência está do lado das medidas de mitigação da nossa pegada de

carbono e na progressiva sustentabilidade do nosso modelo produtivo. Para atingirmos

esse objectivo não existem respostas rápidas nem soluções instantâneas. A

reformulação do processo de produção linear para um modelo circular atinge-se pela

junção de numerosos e diversificados esforços.

A certificação ambiental dos materiais que dispomos ainda se encontra numa fase de

implementação. Existem, tal como nas Analises de Ciclo de Vida, numerosos sistemas

de avaliação, de certificação ambiental dos materiais de construção, a exemplo a ISO

14020, ISO 21930, Cradle to Cradle, CEN BT 14/2005, PEFC (Programme for the

Endorsement of Forest Certification), entre outros, que estabelecem critérios e

abordagens distintas para emitir declarações de impacto ambiental. Estas declarações

devem ser formuladas pelos fabricantes dos diversos materiais de construção de

modo a servirem de instrumento na escolha dos que elegemos para os nossos

projectos. Existem organizações de produtores que certificam a sustentabilidade dos

seus produtos. Em boa parte dos catálogos de materiais que habitualmente

acompanham o acto do projecto, o arquitecto deve começar a encarar os indicadores

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ambientais, do mesmo modo que encara a categoria de resistência ao desgaste de um

pavimento. Estas declarações são um dos instrumentos mais eficazes de que

dispomos na aferição da sustentabilidade das nossas escolhas.

Contudo devemos realçar que, mais do que comparar exaustivamente as

características dos materiais, é necessário ter uma visão estratégica dos conceitos de

sustentabilidade que nos permita balizar as orientações gerais das nossas escolhas no

projecto, quer ao nível da sustentabilidade, quer ao nível da abordagem inicial da

escolha dos materiais dos nossos projectos.

Perante esta situação deparamo-nos com muita investigação que afere a

mensurabilidade da sustentabilidade, nomeadamente ao nível das questões da

certificação ambiental, das análises de ciclo de vida e desenvolvimento de eco-

materiais particulares, existindo poucos documentos científicos que proponham

estratégias de sustentabilidade para a construção no âmbito dos eco-materiais.

Contudo podemos destacar as investigações desenvolvidas pela Escola d’Arquitectura

de Barcelona da Universidade Internacional da Catalunya que tem produzido uma

série de investigação muito centrada na questão dos eco-materiais. Um dos mentores

destas investigações é o Arq. Ignasi Perez Arnal. No livro “Eco Productos, en la

arquitectura e el deseño” (Arnal, Sauer, et al. 2008), encontramos uma definição lata

do que são eco-materiais. Esta definição é extraordinariamente útil pois consegue

sintetizar em linhas gerais critérios de escolha para a questão dos eco-materiais.

Na sua visão estratégica, o Arq. Ignasi Perez Arnal sintetiza um conjunto de 10

pressupostos que nos permitem um bom enquadramento na problemática do que são

os eco-materiais.

“ 1- Material absorvente de CO2: A escolha de um material que participe activamente

na solução de uns dos mais complicados problemas actuais. A mitigação do

aquecimento global é a melhor opção que a construção pode dar ao meio ambiente.

2- Material sustentável: Se utilizarmos as matérias-primas que a natureza nos oferece

de maneira inesgotável, não condicionamos o futuro das nossas reservas.

3- Materiais recicláveis: O destino de um material reciclável encontrasse na

reutilização, não acaba no aterro.

4- Material reciclado: Evitamos a contaminação e o consumo de energia necessários

para a fabricação nova do mesmo material, consequentemente reduzimos a

quantidade de resíduos.

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5- A pureza compositiva: Quanto mais matérias-primas sejam necessárias para obter

um material, mais complicada se torna a sua separação e a sua reciclagem.

6- Energia incorporada: Para além de dos custos energéticos iniciais (extracção,

transporte, fabricação…), é importante compreender a dependência energética do

material ao longo do seu ciclo de vida (inércia térmica, manutenção, rupturas e

desgaste, possibilidade de ser reciclado ou reutilizado).

7-Grau de industrialização: Apenas para projectos de muito pequena escala se justifica

a utilização de um material artesanal que exija muita mão-de-obra e a utilização

intensiva de recursos em obra (água e energia). Em todos os restantes projectos

deveria-se utilizar materiais industriais onde existe um consumo controlado de

recursos e energia.

8- Materiais saudáveis: Evitar o uso de produtos que possam afectar a saúde do

fabricante, do utilizador e do trabalhador no processo de reciclagem. Principalmente

no que se refere a partículas tóxicas ou cancerígenas.

9- Exigências de manutenção: Materiais com baixa manutenção favorecem o conforto

do utilizador e diminuem a utilização de pinturas, lubrificantes e vernizes.

10- Materiais com certificação ecológica: Poucos materiais tem certificação que

garanta uma boa utilização dos recursos, os que a têm merecem um tratamento

privilegiado (Sauer 2008)”.

Para além de uma noção estratégica inicial da problemática dos eco-materiais, deverá

o arquitecto com o desenvolvimento do projecto, investigar mais profundamente as

suas características, quer em termos de extracção/fabrico, quer em termos de

desempenho e reciclagem no final da sua vida útil. Esta é uma postura que em certa

medida pode ser encarada como um regresso ao passado. Na altura dos mestres

construtores, a materialidade da edificação era escolhida com um rigor extremo.

Hoje em dia parte dessa metodologia saiu da alçada do arquitecto. Os materiais são

escolhidos por catálogo durante o projecto, sendo escrutinados pelas exigências

regulamentares que constroem os cadernos de encargos. Posteriormente é a

fiscalização da obra que afere se realmente os materiais apresentados cumprem as

exigências técnicas descritas nos cadernos de encargos. Por via dessa repartição de

trabalho a relação entre o arquitecto e a materialidade da coisa construída perdeu

profundidade. O arquitecto prima mais a pele do edificado do que a sua essência e

essa é uma tendência que urge combater.

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Com as novas solicitações que a sustentabilidade levanta em relação à materialidade

da obra, o arquitecto enquanto autor do projecto, deverá recuperar um pouco desse

espírito de mestre construtor. A elaboração de um projecto sustentável não se

coaduna com um conhecimento superficial das matérias que o edificam. Esse

conhecimento acrescido, pode e deve contribuir para a elaboração de obras mais

complexas, pois a consonância entre as matérias e os conceitos do projecto, são

questões primordiais para atingir a excelência de uma obra. E essa é procura

essencial que o arquitecto deve ter em todos os projectos em que participa.

Por outro lado, a procura de sustentabilidade levada a cabo sem critérios de qualidade

arquitectónica é contraproducente. Verificamos nesta investigação que existem

numerosas obras que atingem critérios óptimos de sustentabilidade, mas como são

resultado de um conjunto de situações óptimas, agregadas sem critério ou conceito

arquitectónico, elas resultam num retrocesso, pois em numerosas ocasiões, elas são

publicitadas como sendo exemplo a seguir. Ora o arquitecto que se inicie nas

questões da sustentabilidade e as encontre no seu caminho, verifica imediatamente,

que se trata de arquitectura pouco apelativa, de desenho sofrível e pouca relevância

arquitectónica, logo, coisa a evitar. Mais, estas situações, obras sem qualidade, pois

nada mais se trata do que uma colecção de técnicas agrupadas sem critério

arquitectónico, contribuem para a associação negativa da imagem de arquitectura

sustentável, não só pelos arquitectos, como pelo publico em geral. E essa é uma

questão fundamental: urge cativar público, arquitectos, produtores de materiais,

promotores e demais intervenientes nas questões da edificação para a necessidade

de edificar sustentavelmente. Tal não se atinge sem a sedução da boa obra.

Consequentemente é indispensável construir a sustentabilidade arquitectónica com

qualidade, pois só deste modo poderemos alargar a utilização dos critérios de

sustentabilidade, pois para além dos claros ganhos energéticos e ambientais que

essas obras garantem, elas serão igualmente referência de qualidade, quer para os

profissionais da arquitectura, quer cativando o público em geral, pois essas obras

serão igualmente objectos de desejo. Acreditamos que estas mudanças, que a nossa

a ética de cidadãos arquitectos impõem, irão provocar novos paradigmas

arquitectónicos. A introdução de novos materiais e os novos modos de utilizar os

materiais e técnicas tradicionais irão, com certeza, subverter o carácter e a imagem

das novas arquitecturas. Esse é sem sombra de dúvida um dos mais aliciantes

desafios que se coloca os arquitectos no seu futuro próximo, utilizar a sua criatividade

para responder aos desafios do mundo.

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2.6 – OS ECO-MATERIAIS VERNACULARES.

Os materiais vernaculares estão presentes desde tempos imemoriais nas nossas

construções, eles foram a nossa primeira resposta para nos abrigarmos. Essa

resposta foi alicerçada nos recursos que o nosso habitat próximo tinha para nos

oferecer, fossem eles florestas, montanhas, deserto ou gelo. Com esses parcos

recursos o ser humano aprendeu a conceber abrigos e começou a construir.

Estes materiais foram descobertos e utilizados pelo homem durante milénios. Durante

esses milénios o homem viveu num ambiente de escassos recursos energéticos. A

construção tradicional tem na sua génese uma utilização muito cuidada desses

recursos. Exceptuando para algumas edificações simbólicas, a construção apenas

podia concretizar-se com os meios que o homem tinha na sua proximidade. Isso

desenvolveu nas culturas humanas respostas eficazes para as suas necessidades de

edificação.

Para além da eficiência, esses materiais, a pedra, o adobe, a palha, o tijolo de terra

seca, a madeira, o têxtil, as peles etc., faziam parte do meio onde eram edificados, de

igual modo, as soluções arquitectónicas adoptadas também se encontravam em

simbiose com o habitat, adquirindo assim uma linguagem muito vincada na sua

relação com a mãe natureza. Por esse motivo encontramos nestes materiais,

características tectónicas na sua expressividade, dado que nascem da terra, e

normalmente se encontram em harmonia com o território.

Fig.- 35 Tijolos de cânhamo. Elaborado á base de cânhamo, cal hidráulica e inertes seleccionados, apresentam

excelentes características térmicas e acústicas, permitem a transpiração das paredes, dispõem de grande resistência

ao fogo, não emitem nenhum gás tóxico para o ambiente interior e respondem a grandes solicitações mecânicas, eles

são um exemplo de como técnicas ancestrais foram adaptadas com recurso a investigação científica.

Fonte: www.cannabric.com

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Parte desses métodos construtivos tendeu a desaparecer com a massificação da

construção. Em parte porque limitavam a rapidez da construção e tinham na sua

origem processos de manufactura que eram incompatíveis com a produção industrial,

por outro lado, a génese da arquitectura industrial e moderna adoptou linguagens

distintas das que eram concretizadas pela construção tradicional.

Contudo, com a urgência da crise ambiental com que nos confrontamos, começaram a

encontrar virtudes na sua utilização. A atitude vernacular de habitar apenas com os

recursos do habitat, proporcionou lições valiosas. Hoje em dia muitos materiais

tradicionais estão a ser encarados como possíveis respostas a este nosso habitat

esgotado. E estas respostas têm-se desenvolvido com a recuperação e melhoramento

de numerosas técnicas e tecnologias inspiradas nas materialidades ancestrais de

construir.

Fig.- 36 Blocos de terra compactada, vulgarmente conhecidos por BTC. Resultam da compactação de terra não

vegetal com argamassas pozolânicas (compósitos de cal ou cimento com pozolana), apesar da sua eficiência

ambiental, necessitam de pouca energia incorporada no seu fabrico. São um material adequado para situações de

pequena escala ou de autoconstrução. Fonte: http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/7584

Estas respostas também foram despoletadas porque a indústria da construção é um

dos principais sectores na economia dos países. Os industriais ligados a este sector

procuram maximizar as suas potencialidades económicas. Graças ao aumento da

concorrência, todos eles procuram sempre adquirir vantagens competitivas face aos

seus concorrentes. Os materiais vernaculares tiveram na sua génese critérios de

escassez, tendo consequentemente desenvolvido respostas eficazes, quer do ponto

de vista económico, de modo geral são de fácil extracção e execução, quer energético,

pois lidamos com produtos que normalmente não requerem muita energia incorporada

para se concretizarem.

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Estas qualidades permitem, com investigação e criatividade, se adapte esses produtos

eficazmente para o mercado da construção. Elas são especialmente notórias que

pelas suas baixas emissões de carbono, quer com a consequente diminuição de

custos motivados pelas cotas de carbono, quer pela capacidade que têm de apelar a

um grupo cada vez maior de consumidores com consciência ecológica que querem

diminuir a sua pegada ecológica, e finalmente, porque, com o desenvolvimento de

processos normativos e de certificação do edificado, as construções que os utilizarem

terão mais facilidade em responder a estas solicitações

A sua elevada capacidade de resposta a solicitações ambientais e energéticas deve-

se ao facto de muitos dos eco-materiais tradicionais serem renováveis,

nomeadamente as madeiras e os elementos vegetais e animais. Os materiais não

renováveis, tais como a extracção de inertes e as pedreiras, quando explorados com

precaução e simultaneamente próximos do local da construção, devem ser utilizados,

pois apresentam um baixo custo de transporte, com consequente diminuição de

emissões de CO2.

Fig.- 37 Isolamentos térmicos em lã. Uma boa alternativa aos tradicionais isolamentos térmicos, com a vatangem de

provir de um recurso renovável, não depender dos hidrocarbonetos e não necessitar de Hidrofluorcarbonetos (Hfc)

como agente expansivo. Os Hfc’s são um potente gás de efeito de estufa.

Fonte: http://www.domus-materiaux.fr/DOSSIER_DAEMWOOL.pdf

Estes materiais apresentam grandes vantagens na sua utilização, nomeadamente

devido ao seu desempenho térmico e bioclimático, e ao nível do seu ciclo de vida.

Uma construção em adobe é naturalmente reciclada no final da sua vida útil, o solo ao

solo retorna, sem causar problemas de resíduos ou contaminações. Muitos destes

materiais tradicionais têm também uma outra enorme vantagem, são materiais que

acumulam e armazenam CO2, nomeadamente a madeira e os seus derivados, as

fibras animais, as fibras vegetais e alguns compostos químicos, por exemplo as

argamassas de cal aérea, onde a reacção química da argamassa se prolonga no

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tempo, transformando o carbono atmosférico em carbonato de cálcio devido à reacção

do hidróxido de cálcio presente na argamassa.

Esta reutilização de métodos e materiais tradicionais tem sido caracterizado por duas

estratégias de acção: se por um lado se tem recuperado as tecnologias tradicionais,

como o adobe, a construção em madeira sustentável, as argamassas e ligantes

tradicionais, como a cal aérea e as argamassas de terra com fibras vegetais, a

construção em palha entre outros; por outro lado alguns destes materiais tradicionais

sofreram updates tecnológicos. Encontramos nesta situação o super adobe, os blocos

de terra compactada, as coberturas em terra vegetal, os derivados do bambu entre

muitos outros. Esta actualização tecnológica veio suprir algumas das desvantagens

dos materiais tradicionais, como o risco sísmico, a propensão para incêndios, a

resistência à água, a facilidade de construção e a durabilidade (Studio 2010).

Fig.- 38 Bambu na primeira etapa de processamento. As novas tecnologias revolucionaram a utilização de materiais

tradicionais. Deste modo o bambu passou a ser utilizado como elemento laminado, permitindo a sua utilização como

pavimento, caixilharias e elementos estruturais, em vigas, pilares e paredes portantes. Fonte: www. Lamboo.us

A existência de mercados que apelam à sustentabilidade como valor de construção,

veio permitir que as indústrias produtoras de alguns destes materiais antigos, como a

indústria da cortiça e do bambu, reformulassem métodos de produção e

desenvolvessem novos produtos. No caso da cortiça, material sustentável por

excelência, a multiplicação de aplicações, é evidente: dos aglomerados de cortiça

expandida, em painéis e a granel, passando pelos pavimentos, em parquet, simples ou

compostos, até à sua utilização em mobiliário ou em juntas. A industria tem expandido

consistentemente a sua oferta, tendo iniciado os estudos de aproveitamento de cortiça

reciclada (Gil 2007).

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Um outro factor determinante no ressurgimento destes materiais vernaculares, deve-

se ao facto de eles passarem a estar inseridos em estratégias de mitigação dos efeitos

da crise ambiental. Por esse motivo, para além da tradicional utilização destes

materiais, passaram a existir novas reinterpretações, a investigação dá-nos novos

usos e formas de utilização este recursos.

As fibras animais, nomeadamente a lã começam a substituir em alguns casos os

isolamentos térmicos, os resíduos agrícolas surgem incorporados em novos materiais

de construção, desde a palha ao cânhamo ( painéis térmicos ou então em blocos de

alvenaria), passando igualmente pela juta para pavimentos, tapetes ou então pelas

novas tecnologias do bambu e da cortiça, que nos fornecem uma vasta gama de

materiais, pavimentos, isolamentos etc.

Apesar de terem sofrido reformulações tecnológicas recentes, muitos destes materiais

ainda retêm na sua génese um carácter expressivo muito próximo dos valores das

materialidades ancestrais, quer seja pela sua textura, ou pelo modo como ainda têm

na sua composição uma proximidade matérica à da matéria-prima que lhes deu

origem. Esta proximidade matérica permite que na sua utilização arquitectónica, o

projecto ganhe uma riqueza tectónica e uma verdade construtiva, ao mesmo tempo

que mostra uma modernidade concreta, pois é construído com materiais do nosso

tempo.

Fig.- 39 Pavilhão de Portugal, Expo 2010, Xangai, Carlos Couto. A utilização da cortiça como elemento de

revestimento exterior, só se tornou possível devido aos avanços tecnológicos da indústria. Apesar de ter uma

expressão inovadora na nossa tradição arquitectónica, a cortiça, tal como os outros materiais ancestrais, quando

sujeitos a inovações tecnológicas, ainda mantém parte da sua expressividade vernacular. Fonte: Archdaily.com

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2.6 – OS ECO-MATERIAIS RECICLADOS.

A existência de uma indústria de gestão de resíduos leva a índices de reciclagem cada

vez mais elevados. Consequentemente passamos a dispor de recursos que podemos

utilizar sem por em causa os recursos naturais de que ainda dispomos. Com a

vantagem adicional de contribuirmos para minorar o problema dos resíduos que nos

contaminam o ambiente.

Em tempos antigos, a reciclagem de materiais de construção era uma prática corrente.

Essa reciclagem envolvia quase todos os elementos construtivos e materiais

utilizados. Quando uma muralha ou templo perdiam a sua função, utilizavam-se as

suas cantarias e demais elementos na construção nova. Parte do Cairo actual foi

edificada com as pedras das antigas pirâmides e templos dos Faraós. Na Europa, as

cidades, quando atingiam os limites das muralhas, alimentavam parte da construção

da nova cidade que crescia com os materiais sobrantes da sua demolição. No mundo

rural estas práticas ainda se mantiveram até tempos relativamente recentes. Devido à

escassez de recursos, as populações rurais aproveitavam regularmente os restos de

construções desactivadas para novas edificações. É frequente ao realizar trabalhos de

restauro e reabilitação de construções antigas, encontrar partes de alvenarias e outros

elementos reaproveitados de construções ainda mais ancestrais.

Fig.- 40 Muralha Bizantina de Selçuk, Tuquia, Sec. VI. A muralha Bizantina, apresenta o reaproveitamento de

elementos romanos, criando uma textura sui generis neste pano da muralha da cidadela de Selçuk. A tradição de

reaproveitamento de elementos construtivos em desuso ou em ruína foi uma constante durante séculos. Só após a

industrialização é que este hábito se perdeu. Foto: Maria Fremlin

Contudo com o advento da industrialização e do consequente processo de

crescimento populacional e urbano, a indústria da construção abandonou estas

práticas. A rapidez e a facilidade com que a industrialização disponibiliza materiais de

construção, aliada à crescente mecanização da construção, tornavam os resíduos da

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construção como elementos pouco competitivos na paleta de materiais que utiliza.

Apesar deste grande desprezo com que os materiais resultantes das demolições eram

encarados pela indústria, ainda existia uma tradição residual de reciclagem,

nomeadamente ao nível dos materiais com valor comercial mais elevado, como o

ferro, o alumínio, o cobre e o chumbo.

Hoje em dia essa postura de encarar os desperdícios como uma consequência normal

dos métodos de produção está a desaparecer. Por um lado, devido ao aumento dos

custos de matérias-primas e energia ligados à transformação, armazenagem e

transporte dos materiais utilizados e, por outro lado, devido à exaustão dos recursos

naturais e energéticos. Este aumento de custos de produção leva a que muitos

materiais que não tinham valor económico passem a ser apelativos de um ponto de

vista económico.

Fig.- 41 Parede de Polly-brics, sistema de encaixe translúcido, realizado a partir da reciclagem de garrafas de plástico

(PET), graças ao seu funcionamento, inspirado no Lego, este material permite a sua remontagem múltiplas vezes.

Neste caso, construiu o Pavilhão da Moda para a Taipei International Expo. Um edifício provisório de 130 m.

Fonte: http://inhabitat.com/

Outro factor determinante nesta alteração é a aplicação, cada vez mais intensa, por

partes dos governos do princípio do poluidor e da política dos RRR (Reduzir,

Reutilizar, Reciclar). Deste modo a criação de resíduos tem sido fortemente

penalizada. Para além das desvantagens económicas e operacionais que a

penalização regulamentar impõe, a existência de resíduos é encarada como indicador

do grau de eficiência e competitividade das indústrias e isso tem forte reflexo na sua

capacidade de atrair investidores e clientes. Quando forçosamente existem resíduos

resultantes de um qualquer processo de fabrico, as indústrias começam a estudar

processos de reutilizar e valorizar esses resíduos num produto que possam

comercializar. Basta lembrar que actualmente parte das cinzas das centrais

energéticas a carvão já são utilizadas no fabrico de betão armado, reduzindo

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consideravelmente a utilização de cimento Portland, e tornando a aplicação de betão

armado num processo menos agressivo para o ambiente e mais económico.

Esta procura da eficiência, que levou à investigação de produtos derivados de

reciclados, quer por via da reutilização directa dos recursos existentes, quer por via do

desenvolvimento de novos produtos que valorizem o resíduo, tendo aumentado de um

modo exponencial nos últimos 20 anos.

Hoje a paleta de materiais reciclados com que podemos construir aumentou

significativamente. Quer ao nível dos materiais tradicionalmente reciclados, como o

ferro e o alumínio entre outros, que viram a sua percentagem de reciclagem

aumentarem vertiginosamente, no caso de aço para a construção civil a percentagem

de material incorporado situa-se nos 80% (Gervásio 2008), quer ao nível dos produtos

derivados de novos processos de reciclagem, como é o caso do vidro e dos plásticos.

Fig.- 42 Sucata de Ferro. Cerca de 80% do aço consumido na construção civil provém da reciclagem de sucata. Esta

taxa de reaproveitamento deste recurso deve-se à eficácia económica do processo. O aço reciclado consome cerca de

20% da energia que a fundição do aço requereria a partir do processamento do minério de ferro. Foto: Filipe Borges de

Macedo

Temos várias estratégias presentes na reciclagem de produtos, mas o princípio geral

que as rege é o princípio da separação e valorização. O resíduo é recolhido, separado

e depois segue dois caminhos distintos. Em menor escala temos um grupo de

produtos que retoma a tradição milenar de reaproveitamento de elementos e materiais

de construções antigas. Esses materiais são recolhidos na demolição e depois de

separados vão directamente para o mercado. Encontramos no mercado uma oferta

cada vez maior de empresas que separam e revendem elementos de construções

demolidas, desde portas, vãos, pavimentos em madeira, antigas coberturas, vigas de

madeira etc. Estes elementos são residuais no nosso mercado mas permitem

encontrar soluções onde podemos tirar partido expressivo da antiguidade desses

materiais. É relativamente corrente na reconstrução e na reabilitação utilizar esses

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materiais. Um pavimento de tábuas de Riga com 200 anos, tem uma qualidade

expressiva excepcional, e hoje em dia é impossível encontrar pavimentos novos com

essas características, o que numa recuperação de edifício com história e carácter

pode ser factor de valorização do património, para além do mais, com a utilização

desses produtos estamos a evitar a exploração dos nossos recursos.

Infelizmente no mercado português essas práticas ainda não estão muito

implementadas, e com frequência verificamos que numerosas empresas estrangeiras

se dedicam a comprar esses resíduos em Portugal para depois os comercializarem

nos seus países, onde são devidamente valorizados. A principal vantagem expressiva

que este grupo de materiais pode trazer à arquitectura que projectamos reside na

história que lhes está inerente, desse modo juntamos novos significados expressivos à

narrativa que são os nossos projectos.

Fig.- 43, Atelier, Quito, Equador, Arq. David Moreno. O aproveitamento das madeiras provenientes de demolição traz

as complexidades expressivas do tempo à obra. O contraste entre o novo e o antigo constrói riqueza expressiva. Fonte:

www.archdaily.com

Um segundo grupo de materiais reciclados que tem vindo a crescer no nosso mercado

de materiais de construção são os materiais derivados de resíduos de produtos de

grande consumo. Este conjunto de materiais é resultado da separação e recolha

desses resíduos, que posteriormente são transformados em novos produtos. Esses

materiais resultantes da transformação dos resíduos do papel, das embalagens (Tetra

Pack, PET etc.), dos resíduos da indústria de madeira, de têxteis fora de uso, de

resíduos sobrantes das pedreiras e das indústrias exploradoras, etc., e que hoje em

dia são hoje em dia utilizados como matéria-prima de novos materiais de construção,

originam toda uma recente panóplia de soluções que responde às mais diversas

solicitações da construção.

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Desde materiais de isolamento térmico que diminuem a utilização de produtos

petrolíferos e requerem menos recursos energéticos (papel e têxteis projectados, lã de

vidro vinda da reciclagem do vidro, etc.), a pavimentos técnicos (aproveitamentos da

borracha de pneus para parques infantis, decks e pavimentos sobrelevados derivados

da reciclagem de plásticos, numerosos inertes com as mais diversas origens, etc.),

passando por elementos de mobiliário urbano, blocos de construção, tijolos e painéis

que aproveitam resíduos de madeira e da industria agrícola entre outras numerosas

aplicações. Dentro deste tipo de materiais destacamos os plásticos, pois a sua

versatilidade e capacidade de reaproveitamento é enorme, onde do mobiliário urbano,

às coberturas, à exploração das suas capacidades como elemento portatante,

passando pela sua utilização como película em estruturas geodésicas, ou pelo seu uso

como enquanto inerte. Umas das grandes vantagens dos plásticos reciclados reside

na sua durabilidade. A outra vantagem dos plásticos reciclados deve-se ao facto de

necessitarem de pouca manutenção ao longo da sua vida útil tornando o seu ciclo de

vida muito concorrencial. Veja-se o caso dos decks ou do mobiliário urbano: se forem

realizados em madeiras exóticas, vão contribuir para a destruição de florestas e

habitats tropicais que se encontram muito delapidados e em grande perigo, para além

do mais, estas madeiras necessitam de manutenção, habitualmente realizada através

da utilização de óleos e vernizes, cujos processos de fabrico são fortemente

poluidores. Utilizando decks e mobiliário urbano de plástico reciclado, tem-se um

material que reduz o problema dos resíduos, não destrói floresta tropical, e tem um

ciclo de vida muito eficiente, pois não necessita de manutenção.

Fig.- 44 The Ricyclops, Utrech, Holanda, 2012 Architeten. Aproveitamento de cubas de cozinha provenientes de

demolição para a construção de depósito de aproveitamento de águas pluviais. Fonte: http://www.2012architecten.nl

Neste grupo de materiais, os materiais derivados da reciclagem de resíduos, existe

uma contínua investigação e a cada ano que passa os materiais que nos são

oferecidos pela indústria não pára de aumentar. A utilização destes materiais tem uma

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mais-valia enorme, pois diminui o nosso grau de desperdício substancialmente e

permite que estes materiais possam ser reutilizados múltiplas vezes sem esgotar as

nossas reservas de recursos naturais.

Existe ainda um terceiro grupo destes materiais reciclados que prima pela

experimentação e pela busca de novas soluções. Este grupo de materiais tem como

principal particularidade o facto de utilizar os resíduos directamente sem nenhuma

transformação industrial. Vamos passar a designá-los com materiais directamente

reciclados. Neste grupo de materiais podemos encontrar algumas das soluções mais

imaginativas e surpreendentes com que os arquitectos e construtores nos têm

brindado. A reutilização de contentores marítimos, a utilização de tubos de cartão, a

construção em papel e utilização de garrafas de plástico são alguns dos modos como

que se tem marcado a procura de aproveitamento para os resíduos que a sociedade

actual produz. Esta reutilização e adaptação, sem a intervenção de processos

industriais de transformação, tem especial relevância, pois na maioria dos casos ela

revela uma grande capacidade de reformulação dos princípios de construção. Estas

construções constituem casos emblemáticos na capacidade de redesenhar um

material conferindo-lhe novos usos e significados expressivos. Mais, com estas

estratégias de reutilização de materiais provenientes directamente de reciclagem, a

obra ganha uma vantagem inédita, a surpresa das coisas novas, pois no seu

reaproveitamento, este materiais ganham materialidades surpreendentes.

Fig.- 45 Platoon Kunsthalle, Seul, Coreia do Sul, 2009 Platoon+ Graft Architects. Passada uma vida útil de 20 anos, os

contentores marítimos normalmente são desactivados. Hoje em dia encontramos cerca de 20 milhoes de contentores

desactivados à espera de uso. Este centro cultural, construído recorrendo a 28 contentores ISO High Cube

devidamente recuperados, demonstra como o desenho arquitectónico consegue trazer novos significados e usos aos

desperdícios da sociedade de consumo. Este é apenas um dos muitos exemplos de arquitectura que recorre a estes

elementos, que constroem arquitecturas de emergência, residências de estudantes, habitações e muitos outros usos

com as mais variadas expressões. http://www.archdaily.com/27386/platoon-kunsthalle-graft-architects/

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2.7 – OS MATERIAIS DE NOVA TECNOLOGIA.

Nesta procura de materialidades ecologicamente correctas, temos de ter em

consideração que a vontade do ser humano em realizar novas resposta é algo

intrínseco à espécie. Face às necessidades actuais de mitigar a crise ambiental, a

comunidade científica tem desenvolvido novos materiais e novos métodos de

adaptação de produtos existentes. Deste modo começa a estar ao dispor da indústria

da construção de toda uma serie de novos materiais amigos do ambiente. Estes

materiais são em parte resultado de um apuramento de materialidades existentes no

mercado, substituindo produtos já existentes. Simultaneamente, começam a existir

produtos amigos do ambiente que nos proporcionam respostas radicalmente novas

face às solicitações dos dias que correm.

Fig.- 46 Solar Ivy, Smit- Sustainable Design, 2009. A Solar Ivy é um novo modo de produção de energia solar por

através de elementos foto voltaicos. Composto por numerosas células individuais, com os elementos foto voltaicos e

circuitos eléctricos impressos em folhas de Polietileno reciclado, com um baixo custo económico e um impacto

ambiental mínimo. Este material comporta-se de um modo flexível, mimetizando as folhas de uma hera, pode ser

disponibilizado com vários graus de transparência e em várias cores. Tem ainda como vantagem adicional o seu baixo

custo e a possibilidade de se substituir as folhas que se danificam. Expressivamente, este material reage às correntes

de ar, provocando efeitos cinéticos surpreendentes. Fonte: http://solarivy.com/#

Sumariamente podemos distinguir dois campos de resposta em que estas novas

materialidades se têm distinguido. Temos a optimização de produtos tradicionais de

construção, em que um produto habitualmente poluente e gastador de recursos

energia, vê a sua configuração alterada de modo a tornar-se amigo do ambiente. Por

outro lado temos novos produtos que são criados de raiz de modo a responder a

novas solicitações que são identificadas.

No campo do melhoramento das tecnologias existentes aparecem numerosos

avanços, sendo um dos mais significativos, pois trata-se de um material que edifica a

maior parte da edificações e infra-estruturas do mundo inteiro, o cimento Portland, que

com a aplicação de novas tecnologias de sequestro de carbono deixa de emitir 900k

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de CO2 por tonelada de cimento, para passar a ser um material com carbono neutro.

Com a vantagem de utilizar cinzas provenientes de centrais energéticas de carvão,

diminuir a quantidade de calcário e simultaneamente tornar um dos materiais

primordiais da construção mundial e que actualmente causa cerca 9% das emissões

de Gases de efeito de Estufa no mundo, num material muito menos agressivo para o

meio ambiente (Calera 2010).

Esta estratégia passa na maior parte dos casos pela alteração de processos de

produção, reduzindo os gastos energético e diminuindo a utilização de matérias-

primas e tornando-os mais eficientes, quer mecânica quer termicamente. Caso

paradigmático destas estratégias são as alvenarias cerâmicas, o vulgar tijolo, existindo

numerosas investigações que tentam melhorar a sua eficiência. Desde a produção e

tijolo utilizando gás natural, menos poluente que os fornos eléctricos, muito

dependentes das centrais térmicas, pois o gás natural emite muito menos gases de

efeitos de estufa (Ceranor 2010), passando pelo redesenho da sua estrutura de modo

a melhorar a sua eficiência térmica e mecânica, até ao fabrico de tijolos utilizando

cinzas provenientes de centrais térmicas, o que aumenta a suas características físicas

e térmicas, sequestrando carbono e evitando as explorações de barro que destoem a

camada superior do solo fértil. (Kayali 2008).

Fig.- 47 Flash Bricks, na foto o Dr. Obada Kayali, da University of New South Wales que desenvolveu este tijolo a

partir das cinzas de carvão das centrais térmicas, tornando um desperdício tóxico das centrais energéticas, num

recurso construtivo. Este tijolo substitui as alvenarias cerâmicas habituais, criando um produto com mais 24% de

resistência mecânica, quando comparado com o tijolo cerâmico, poupando emissões de CO2 e transformando um

resíduo tóxico num material sem emissões tóxicas. Fonte: http://www.unsw.edu.au/research/res/resm/Turning_ash.pdf

Uma outra tendência nos materiais de nova tecnologia provém da nano tecnologia, a

manipulação a nível molecular permite o desenho de produtos de modo inovador. Esta

tecnologia permite o desenho de materiais de acordo com a utilização final que lhe

desejamos dar. O desenho da materialidade adquire assim novo significado, nunca

antes na história da humanidade tivemos tecnologia que nos permitisse criar produtos

tão eficientes. Habitualmente a noção que temos de nano tecnologia não entra no

léxico habitual do fenómeno arquitectónico. Contudo o controle de materiais a nível

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molecular não é coisa nova no âmbito da arquitectura, basta lembrarmo-nos dos vitrais

das catedrais europeias, a diferenciação da cor era controlada pela intensidade da

cozedura do vidro. Esse controle da temperatura permitia que os cristais dos

pigmentos adquirissem a sua cor final, ou seja, o controle de temperatura interagia

com a disposição molecular dos pigmentos e foi um dos primeiros modos de utilizar a

nano tecnologia de um modo consistente. Claro que os artífices medievais não sabiam

o que utilizavam nano tecnologia, mas sabiam executá-la (KQED 2008).

Fig.- 48 Thermeleon. Um novo material de revestimento, desenvolvido pelo MIT, que pode ser aplicado em telhas ou

em vidro, permite controlar os ganhos solares térmicos alterando a sua coloração. Na fotografia temos o exemplo da

telha. No caso do vidro, a baixas temperaturas o material fica transparente, permitindo ganhos térmicos no interior,

tornando-se opalino quando a temperatura aumenta, reflectindo o calor desse modo. Fonte:

http://www.guiadastecnologias.com/index/2009/12/04/telhas-thermeleon-mudam-de-cor-para-regular-a-temperatura-no-

interior-da-casa/

Hoje em dia não é a natureza do divino que interessa à nano tecnologia, mas esta

interessa-se em realizar tintas e vernizes que nos permitam utilizar madeiras sem que

a sua manutenção dependa de produtos tóxicos derivados do petróleo, que têm um

pequeno ciclo de vida. Hoje com a nano tecnologia podemos ter tintas e vernizes

ecológicos, com especificações únicas, e com ciclos de vida mais prolongados

(rubiomonocoat 2010). Interessa também aos materiais que possam alterar as suas

materialidades de acordo com as condições climáticas, por exemplo as tecnologia

Thermeleon, desenvolvida no MIT, que permite a alteração cromática de um gel. Essa

alteração caracteriza-se pelo facto de a altas temperaturas exteriores a cor do material

ser branca, consequentemente reduzindo a sua capacidade de acumular calor,

quando a situação se inverte, e as temperaturas exteriores ficam frias, o material

passa a cor negra, acumulando energia e calor (MADMEC, et al. 2009), estando

vocacionada para ser aplicada em coberturas, nomeadamente em telhas, ou em

vidros, regulando trocas térmicas que os envidraçados efectuam com o interior das

construções.

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As nano tecnologias têm como grande virtude uma outra característica, a partir do

momento em que podemos manipular as moléculas para criar materiais, podemos

estudar os materiais naturais e observar o modo como eles respondem às diversas

solicitações. Olhemos para o osso humano, a sua largura e geometria não são

uniformes, onde é necessária mais rigidez o osso é mais espesso, onde a flexibilidade

é precisa, o cálcio organiza-se de outro modo. Qualquer estrutura ou material natural

responde a especificações exactas, nunca desperdiçando recursos ou energia. Com a

nano tecnologia e atitudes de desenho bio miméticas, podemos tentar replicar essa

eficiência para materiais e estruturas desenhadas pelo homem. Estas linhas de

investigação prometem materiais revolucionários, materiais que vão alterar o desenho

arquitectónico das coisas.

Fig.- 49 PORO, Arq. Miguel Veríssimo. Estudo de material bio mimético, utilizando nano tecnologia, de modo a

comportar-se como a pele humana, reagindo às necessidades energéticas da edificação. Poderá vir a ser utilizado na

câmara-de-ar dos vidros duplos ou como revestimento. Fonte: http://www.revarqa.com/uploads/docs/dossier/78-79-

Dossier.pdf

Esta tendência de ir procurar respostas nas soluções que a natureza gera na sua

infinita criatividade, tem permitido a abertura de múltiplas linhas de investigação, não

só no desenvolvimento de novas materialidades, mas também na procura de novas

soluções arquitectónicas. As possibilidades que estas estratégias abrem já estão a ser

exploradas pelos arquitectos: podemos referir as investigações do Arq. Miguel

Veríssimo (Premio BES Inovação 2007) que procura desenvolver uma parede

inspirada na pele humana, PORO (Verrissimo 2010), onde os poros serão substituídos

por células reguladoras de ventilação e de ganhos solares. Outros arquitectos levam o

desenvolvimento destas noções ao nível dos próprios conceitos da matéria,

procurando atingir novos paradigmas arquitectónicos, como a arquitecta Nery Oxman,

que explora a hiper-modernidade do fenómeno arquitectónico, criando novos

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materiais, que resultam da adaptação do desenho de materiais naturais ao nível do

seu desenho estrutural. (Oxman, http://www.materialecology.com/ 2010).

Com a implementação de novas tecnologias o nível de eficiência ecológica do

edificado tenderá a aumentar. As soluções matéricas que estas materialidades

originam prometem grandes alterações na arquitectura dos dias que virão. E não se

trata apenas de uma simples substituição de materiais, onde matérias menos

eficientes são substituídas por materiais mais eficientes, trata-se acima de tudo de

uma alteração radical no modo como o edificado se relacionará com a sua envolvente

e com o ser humano. Esta alteração proporcionará enormes mudanças a todos os

níveis. O edificado deixará de ser um ser inanimado e passará a aproximar-se, em

termos de conceito e performance, de um ser biológico que reagirá com a sua

envolvente do mesmo modo que os seres vivos. Esta constituirá provavelmente uma

das maiores alterações de conceito com que o fenómeno arquitectónico alguma vez se

deparou. Sendo portanto de esperar novas e excitantes arquitecturas num futuro.

Fig.- 50 Monocoque, Arq.Neri Oxman. Bio mimetismo. O principio na esquerda, o osso humano, e o protótipo na

direita. O osso humano distribui a sua densidade e flexibilidade à medida das solicitações, Neri Oxman propõe replicar

a mesma performance utilizando dois materiais distintos, a negro o material rígido e a branco o material flexível. Esta

Arquitecta lidera projectos de investigação para a criação de materiais de nova tecnologia, socorrendo-se de algoritmos

e tecnologias de ponta. Através destas investigações procura uma hiper-modernidade que replique a sofisticação com

que natureza responde às mais diversas solicitações. Fonte: http://www.materialecology.com/

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2.8 – OS MATERIAIS BIO-CONSTRUIDOS.

Uma das facetas mais interessantes que tem surgido nas últimas décadas da

arquitectura mundial tem a ver com a utilização de elementos biológicos na

construção. A presença de elemento naturais na construção de edifícios tem vindo a

aumentar progressivamente.

Em primeiro lugar temos de apontar o enorme sucesso que as coberturas ajardinadas

têm vindo a conquistar, quer pela vontade dos promotores e projectistas em aumentar

a eficiência bioclimática dos seus edifícios, quer pela sua vontade em devolver solo à

natureza, compensando-a assim pela perda de solo natural em favor da construção.

Existe ainda um aumento da qualidade do ar exterior assim como uma diminuição da

temperatura circundante, quando comparada com uma cobertura clássica. Este tipo de

coberturas têm cumpre igualmente uma importante função como armazenadora de

águas pluviais, retendo cerca de 30% do seu volume na terra, e contribuindo para a

sua filtragem para posterior utilização em sistemas secundários de água canalizada

(regas e águas sanitárias) ou para reabastecer lençóis freáticos exauridos.

Fig.- 51 Ford Rouge Centre, Dearborn, Michigan, William McDonough, 1998. Projecto de reconversão da Ford Motor

Company, onde, por proposta do Arq, William McDonough, a cobertura do principal edifício fabril, foi ajardinada com

plantas autóctones. Para além dos enormes ganhos económicos decorrentes das poupanças energéticas, verificaram-

se ganhos consideráveis na qualidade do ar e das aguas pluviais e culminando essa experiência, verificou-se que a

cobertura passou a ser utilizada por numerosas espécies para nidificação. Aqui temos um ninho de ave que nidificou,

apenas 5 dias após a conclusão da obra. Fonte: www.mcdonoughpartners.com

Estas estratégias dispõem igualmente de uma resposta para as fachadas dos

edifícios, a das fachadas verdes. Como no centro cultural La Caixa em Madrid de

Herzog & de Meuron, estas fachadas permitem igualmente reforçar a qualidade do ar

exterior, diminuir temperaturas na proximidade do edifício, melhorando a eficiência

térmica e acústica do edifício e reter águas pluviais (www.biotecture.uk.com 2010).

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Existe ainda um valor intrínseco à utilização destes elementos biológicos no exterior

dos edifícios, e esse valor reside no facto que estas estratégias estarem a devolver

espaço à natureza. Estas coberturas ajardinadas e as fachadas verdes criam

condições para nelas habitarem insectos, aves e outros pequenos animais, criando

assim circunstâncias para a natureza florescer em ambientes, que sem estas

estratégias, nada mais seriam do que espaços estéreis de vida.

Fig.- 52 La Caixa, Madrid, Herzog de Meuron, 2007. A utilização de elementos bio-construídos, neste caso um jardim

fachada, para além de aumentar as capacidades bioclimáticas do imóvel, e acrescentar biomassa às zonas urbanas,

contribui significativamente para expressividade deste projecto. Os contrastes entre o aço Corten, a alvenaria de tijolo e

a fachada verde alteram a lógica habitual do objecto arquitectónico. Fonte: www.swissmade-architecture.com

O mesmo se passa em relação aos interiores dos edifícios, onde a presença de

plantas pode contribuir significativamente para a qualidade do espaço tornando assim

o seu interior muito mais agradável e saudável para os seus utilizadores. A utilização

destas estratégias, para além da sua agradabilidade, tem resultados práticos muito

eficientes ao nível da climatização interior e da qualidade do ar, diminuindo os custos

energéticos dos sistemas de ventilação e de climatização. Estas estratégias de

implementação de elementos vegetais e biológicos em espaço interiores conseguem

que edifícios de escritórios e serviços diminuam a níveis residuais a existência de

equipamentos de ar condicionado e de ventilação forçada, pois através da selecção

adequada de espécies vegetais próprias para o interior consegue-se que o tratamento

e climatização do espaço sejam realizados pelas plantas. No Paharpur Business

Centre and Software Technology Incubator Park em Nova Deli, temos um exemplo de

como, num clima tropical, onde as questões de climatização e ventilação do interior de

edifícios são de profunda premência, se conseguiu atingir esse objectivo. O Dr Karmal

Meatle director do Paharpur Business Centre e antigo professor do MIT, através desta

estratégia atingiu esse objectivo, recorrendo apenas a três plantas de interior vulgares,

(a Areca (Chrysalidocarpus lutescens), a Espada de S. Jorge (Sansevieria trifasciata)

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e a Erva do diabo (Epipremnum Aureum)) (Meattle 2009) e mantendo a qualidade do

ar interior com os mesmos parâmetros exigidos nas nações desenvolvidas.

Fig.- 53 Institut for Forest na Nature Research, Wageningen, Holanda, Günther Behnisch, 1998. A utilização de

elementos vegetais no interior do edifício contribui para melhorar significativamente a qualidade do ar, o que, aliado ao

grande pátio central arquitectónico, contribui para optimizar a performance bio climática do projecto.

Fonte: www. www.behnisch.com

Neste complexo, encomendado pelo governo indiano para servir de modelo a

repartições, serviços públicos e escritórios na Índia, o ar é monitorizado diariamente.

Com esta simples estratégia conseguiram superar os parâmetros exigidos em edifícios

com pesados equipamentos de ventilação e ar condicionado, como os edifícios nos

E.U.A. e na União Europeia, minimizando o uso de energia a níveis de consumo

impensáveis de atingir com os sistemas habitualmente utilizados nas nações

desenvolvidas. Como vantagem suplementar, este sistema ecológico de renovação e

climatização do ar diminui drasticamente os níveis de poluentes interiores, devido ao

efeito de filtragem do ar que as plantas executam. Aumentam também os níveis de

produtividade dos seus utilizadores em cerca de 20% face aos habituais standards de

edifícios de escritórios tradicionais. (Paharpur Business Centre 2010) .

A bio-construção tem em si um paradigma novo, ao longo dos séculos cada vez que o

ser humano urbanizava uma zona, esta deixava de albergar habitats naturais. Hoje em

dia, com a utilização de elementos bio construídos, sejam coberturas ou fachadas,

podemos começar a devolver à natureza espaços que lhe eram interditos. Deste modo

com e através destas técnicas podemos contribuir para uma regeneração dos habitats.

Basta lembrarmo-nos que a vida está assente no ciclo do carbono. Cada ser vivo, ou

habitat funcional é um reservatório de carbono. A implementação de sistemas que

multipliquem a proliferação de seres vivos retira carbono da atmosfera e contribui para

a sustentabilidade trazendo uma nova expressividade no fenómeno arquitectónico, e

essa nova expressividade é o retorno da natureza à coisa construída.

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3- DESENVOLVIMENTO

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3.1- A EXPRESSIVIDADE

Entramos no âmbito restrito desta dissertação: dissertar acerca das qualidades

expressivas dos eco-materiais. Temos em mente muitos dos catálogos de materiais

com que nos cruzamos amiúde no decurso da profissão e neles detectamos uma

seriação das características físicas e técnicas das suas virtudes, vemo-los quase

como uma colecção de cromos de futebol, onde nos aparecem as fotografias dos

jogadores, cada um delas com a sua pose, transmitindo um olhar viril, ou então

mostrando orgulho na camisola dos seu clube. No final corremos essas colecções e

vemos uma seriação de rostos e cores de camisola, mas nada disso nos transmite a

beleza do jogo, a sua expressividade ou a atmosfera que eles proporcionam no

estádio. Em relação aos materiais a maioria dos trabalhos que se dedicam ao seu

estudo pecam do mesmo mal, falam-nos da sua textura, ou do seu comportamento

térmico, ou da economia de construção que proporcionam, mas no fundo não

explanam sobre a relação intrínseca com que eles colaboram na essência da obra.

Fig.- 54- Material sustentável por excelência, o bambu, quando cultivado em floresta sustentável, constitui um material

com inúmeras possibilidades, do pavimento, à estrutura, passando pelo mobiliário. Traz-nos uma multiplicidade de

expressividades fabulosas. Aqui empregue como estrutura de uma escola, mostra como os sistemas tradicionais

podem ter um update com a introdução de elementos industriais ou de nova tecnologia. Foto: Boris Zeisser

Aqui, nesta dissertação, e porque falamos de materiais que nos vão permitir construir

um futuro melhor, corrigindo erros passados, queremos mostrar como eles podem dar

origem a projectos inovadores. Queremos atingir esse propósito mostrando como uma

consciência ética do projecto aporta novas significâncias ao edificado, como a

utilização destes materiais vai alterar linguagens, por vezes repescando significâncias

do passado, outras vezes construindo significâncias futuras.

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O relacionamento entre os materiais e a arquitectura não se confina às condicionantes

físicas que estes impõem aos limites da construção. Mais significativamente, os

materiais condicionam e moldam a expressividade da forma arquitectónica. A

utilização de eco-materiais e de uma arquitectura bioclimática enriquecem o projecto,

pois permitem que a construção complemente e melhore o habitat. Simultaneamente

os eco-materiais conseguem responder aos mesmos desafios que os materiais

habituais da construção concretizam. É desígnio de uma postura ética responsável

construir de um modo a não esgotar ou destruir o habitat.

Por outro lado, é com a junção do desenho do projecto e da materialidade da

construção, que a coisa arquitectónica se torna um todo. Esse fenómeno é

perfeitamente perceptível quando vamos visitar uma obra que já conhecíamos, quer

por fotografia, desenho ou vídeo. O conhecimento da obra que pensávamos que

tínhamos é transformado pela vivência que passamos a ter da mesma. Percorrer um

espaço, percepcionando-o com todos os nossos sentidos, permite-nos entrar em toda

sua complexidade e esse conhecimento não se pode adquirir através de meios que

nos distanciem da obra. A percepção do espaço é um acto pessoal e intransmissível.

Fig.- 55- Centro Cultural Tjibaou, Renzo Piano, 1998. Neste projecto Renzo Piano materializa uma homenagem à

cultura Karnak da Nova Guiné, reinterpretando a construção tradicional, adicionando-lhe a eficiência tecnológica e

energética que o caracteriza. Este projecto reinventa a atmosfera da comunidade que pretende celebrar. O projecto,

com sua a utilização dos materiais tradicionais, enaltece a significância do modo de vida sustentável característico da

cultura Karnak. A atmosfera, tal como Zumthor a descreve, está enfatizada pela harmonia entre o construído e a

natureza circundante. Foto: Archenova

Peter Zumthor define muito bem essa essência quase intangível do fenómeno

arquitectónico. Ele estabelece um nexo entre a qualidade da obra arquitectónica e a

sua capacidade se relacionar com o utente, transmitindo significados por via da

atmosfera que cria. Este conceito quase etéreo, a atmosfera de uma obra, é resultado

da nossa percepção intuitiva do espaço. Esta percepção está intrinsecamente

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relacionada com o instinto emocional embutido na nossa formatação genética. Foi

através desse instinto que nos relacionámos intuitivamente com a natureza, e é esse

instinto que nos leva a ter uma empatia com um local ou espaço que acabamos de

percepcionar. Segundo Zumthor, é também a qualidade da atmosfera para qual o

espaço nos remete, que constitui factor qualificador do mesmo.

Zumthor define a atmosfera do edifício como um conjunto de várias singularidades. A

atmosfera de um edifício está contida no corpo da arquitectura, formatado pela

consonância dos materiais. Eles por sua vez estabelecem o som e a temperatura do espaço que dialoga com as coisas que o rodeiam. Estas características por sua

vez interagem com a nossa percepção, criando em nós sentimentos de serenidade e sedução, enfatizados pelas tensões entre o interior e o exterior que delimitam os

degraus de intimidade do objecto arquitectónico. Por fim é a luz sobre as coisas

que une e hierarquiza a atmosfera do objecto arquitectónico.

Fig.- 56- Termas de Vals, Peter Zumthor, 1996. O fenómeno arquitectónico ganha consistência estética e espiritual

quando existe uma coerência entre a matéria e os conceitos. Neste caso o projecto utiliza a pedra de uma pedreira das

proximidades, e reinventa o modo como ela era tradicionalmente utilizada. A ligação do conceito à realidade do sítio,

constrói uma atmosfera significante e ecologicamente correcta. Foto: Pablo Echávarri

Através deste discurso Zumthor consegue enunciar uma série de qualidades, que no

seu todo, definem a sua visão do fenómeno arquitectónico. Esta visão está muito

ligada a uma visão poética e introspectiva do mundo, que não dispensa a sedução.

A poesia e a sedução são termos fundamentais na compreensão da expressão da

coisa artística. Refere Arnhein que “… assim definimos expressão como maneiras de

comportamentos orgânicos ou inorgânicos revelados na aparência de objectos

preceptivos. As propriedades estruturais destas maneiras não são limitadas ao que é

captado pelas sensações externas, elas são visivelmente activas no comportamento

da mente humana e são metaforicamente usadas para caracterizar uma infinidade de

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fenómenos não sensoriais” (Arnhein 1954). Refere ainda Arnhein que “as nossas

sensações não são dispositivos de registo autónomo, operando para si próprias. Elas

foram desenvolvidas como um auxiliar para reagir ao meio, e o organismo está

interessado prioritariamente em forças activas circundantes, seu lugar, sua força, sua

direcção. Hostilidade e amabilidade são atributos das forças. E a percepção dos

impactos das forças conduz ao que chamamos de expressão.” (Arnhein 1954).

A expressão das coisas é um elemento crucial na nossa relação com o meio físico que

nos rodeia. Esta capacidade humana de complementar a informação que os nossos

órgãos sensoriais nos transmitem do entorno, adicionando-lhe significados

expressivos, é um processo primordial da nossa conceptualização do meio. A

capacidade de nos seduzirmos, de nos repugnarmos, de sentirmos o sagrado, ou o

sublime no entorno onde vivemos, resultam da nossa aptidão de percepcionarmos a

expressividade e com ela formularmos emoções, que fazem parte da nossa

formatação biológica enquanto espécie, e é esta capacidade que nos torna a única

espécie produtora e consumidora do fenómeno artístico.

Fig.- 57- Loblolly House, Chesapeake Bay, Maryland Kieran Timberlake, 2007. Casa pré fabricada, a integração do

projecto encontra inspiração na floresta que circunda a baía de Chesapeake, A utilização de madeira mimetiza o ritmo

vertical da floresta, esta simbiose de ritmos transmite uma vontade de integração e respeito pela natureza. A

contemporaneidade convive e inspira-se no meio, ganhando expressividades telúricas e proporcionando um ambiente

crítico à artificialidade da cidade consumista. Fonte: http://kierantimberlake.com

Zumthor retoma estes processos primordiais de relacionamento com o meio e dá-lhes

uma importância perdida. A relação de proximidade física entre o homem e o edificado

é recuperada pela poesia e pela sedução que o edificado consubstancia nas emoções

que o homem apreende. Zumthor traduz as emoções com que se unifica este

processo numa reflexão dos significados íntimos da vida. Esses elementos criadores

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de felicidade, que Zumthor enaltece, criam um enquadramento físico reconfortante por

onde o percurso da vida possa decorrer de modo mais harmonioso.

Esta visão, de valorizar esses elementos significantes, essas relações íntimas que

Zumthor estabelece da experiência do objecto arquitectónico, encontra-se

profundamente dissociada da fruição imediata que a artificialidade da sociedade de

consumo apregoa. A lógica deste discurso remete-nos para uma fruição e concepção

do objecto arquitectónico ligada a significados intemporais. Estes significados

intemporais que se enaltecem neste discurso, não pretendem renunciar a uma

contemporaneidade. A contemporaneidade que aqui se apregoa é consequência de

uma reflexão mais profunda. Ela é resposta à massificação que a sociedade de

consumo impõe. Em suma, Zumthor retoma a individualização das emoções como

resposta à massificação.

Fig.- 58- Plastic House, Tokio, Kenso Kuma, 2005. A paleta que os eco-materiais nos fornecem é enorme, isso permite

desenvolver numerosas e diversas respostas na sua utilização. Neste caso Kenso Kuma constrói um ensombramento e

recobre a cobertura com granulado de plástico reciclado. O plástico reciclado é um dos muitos eco-materiais que temos

ao nosso dispor. Fonte: http://www.kkaa.co.jp

A individualização do objecto arquitectónico, assente nas especificidades do sítio, do

programa e das suas expressividades, é um claro contraponto à tipificação das

respostas da sociedade de consumo. Esta visão do fenómeno arquitectónico

enquadra-se de um modo muito eficiente nos novos paradigmas que precisamos de

implantar de modo a responder à crise ambiental em que vivemos. A construção deve

passar a relacionar-se de modo muito mais intenso como o sítio, quer de um ponto de

vista bioclimático, quer em relação à sua materialidade. A escolha de materiais é parte

fundamental para atingir esse objectivo. A sua proximidade com o local de construção

é um dos factores a ter em conta na sua selecção. Tudo isto se pode relacionar com o

discurso de Zumthor, e desse modo, passar a fazer parte de uma estratégia, onde

para além das respostas necessárias à crise ambiental, se cultive a realização de uma

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arquitectura individualizada nas suas respostas, significante para o utilizador e para a

praxis, respeitadora do homem e do mundo e que transmita a expressividade das suas

matérias.

Metodologicamente, vamos realizar a abordagem à expressividade dos eco-materiais,

utilizando as premissas que Zumthor aborda no seu livro “Atmosferas”: o corpo da

arquitectura, a consonância dos materiais, o som e a temperatura do espaço, coisas

que o rodeiam, serenidade e sedução, as tensões entre o interior e o exterior, os

degraus de intimidade e a luz sobre as coisas

Iremos seleccionar obras que utilizem eco-materiais e que cumpram esse desejo de

sustentabilidade, demonstrando a eficiência expressiva da utilização de eco-materiais.

Obviamente, a selecção será realizada de acordo com a significância da obra. Esta

significância está estruturada em dois pressupostos de igual importância. Em primeiro

lugar temos que todas as obras seleccionadas são obras sustentáveis onde a

utilização dos eco-materiais marca profundamente a sua concretização. O segundo

pressuposto, é que estas obras apresentem, na medida da sua especificidade e

salvaguardando a individualidade do autor, espaços enquadráveis na leitura que

fazemos da reflexão de Zumthor. Deste modo iremos tentar encontrar características

próprias na materialidade dos eco-materiais, características essas que os notabilizem

na sua expressividade e demonstrando que a sua utilização pode trazer significados

enriquecedores ao projecto.

Simultaneamente, esses significados, ao estarem fundamentados na obra de Zumthor,

reflectem uma visão crítica do imediatismo da sociedade de consumo, e essa crítica é

crucial para que os modelos arquitectónicos dum passado recente, sejam postos em

causa, pois foi nestas arquitecturas que a sociedade de consumo floresceu. E foi essa

sociedade de consumo imediato e impensado que deu origem a à crise ambiental e de

recursos com que nos deparamos. Urge criticá-lo e apresentar alternativas

sustentáveis, quer em termos ambientais, quer em termos vivenciais.

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3.2- O CORPO DA ARQUITECTURA

“O que considero o primeiro e maior segredo da arquitectura, é que consegue juntar as

coisas do mundo, os materiais do mundo e criar este espaço. Porque para mim é

como uma anatomia. É verdade, tomo o conceito de corpo quase literalmente. Tal

como nós temos o nosso corpo e coisas que não se vêem e uma pele... etc., assim

funciona também a arquitectura e assim tento pensá-la. Corporalmente, como uma

massa, como um tecido ou invólucro, pano, veludo, seda, tudo o que me rodeia. O

corpo! Não a ideia do corpo - o corpo! Que me pode tocar.” (Zumthor, Atmosferas

2006).

O corpo da arquitectura, o modo como ele se constrói e articula, reflecte a resposta à

necessidade de abrigo, de construção, e é ele que materializa a resposta ao habitat

insatisfatório. É esse corpo que estrutura a realidade construída, e é essa construção

que nos dá significados e conforto. A sua anatomia edifica as respostas com que se

confronta. Essas respostas interagem com a nossa percepção do espaço e dão-nos

respostas à nossa necessidade de ler e compreender o meio onde nos encontramos.

É esse prolongamento artificial do nosso corpo, que nos abriga e nos traz conforto,

perante o entorno que nos circunda. É esse corpo que materializa os conceitos de

vivência dos espaços e da sociedade onde nos enquadramos.

Fig.- 59- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer, 2006. A construção é a necessidade de

complementar o meio, criando cultura e reforçando os laços da comunidade. As necessidades em países e

comunidades necessitadas implicam muitas vezes um esforço comum na construção. Aqui a comunidade constrói uma

escola contemporânea, utilizando tecnologias ancestrais: a roda de bois mistura a terra e a palha para as paredes de

taipa. Fonte: http:// http://www.anna-heringer.com

A materialização do homem, enquanto animal social, está alicerçada nessas

construções onde se desenrolam os rituais sociais, culturais e económicos. O corpo da

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arquitectura, por sua vez, está adaptado a essas vicissitudes que são a satisfação das

necessidades individuais dos cidadãos e da sociedade. A construção reflecte e

conceptualiza esse entorno social e civilizacional. Se uma sociedade reflecte

insatisfação e entra num processo de crise, o corpo da arquitectura reflecte essas

idiossincrasias e procura dar novas respostas a esse habitat insatisfatório.

Os processos de industrialização constituíram um marco fundamental na criação de

bem-estar global, contudo, esse processo originou problemas que urge resolver.

Esses problemas, para além da crise ambiental com que nos confrontamos, estão

presentes no grau de insatisfação pessoal dos cidadãos. Ambos os fenómenos estão

ligados, a mesma sociedade que criou a crise ambiental, criou um ambiente de grande

insatisfação psicológica nos seus cidadãos. A feroz concorrência pessoal, o

desenraizamento de grandes franjas da população, o alheamento dos rituais sociais

de comunhão com a natureza e a quebra de laços de solidariedade social, entre

muitos outros fenómenos sociais e psicológicos que a sociedade de consumo deixou

para trás, consolidaram essa insatisfação.

Fig.- 60- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer, 2006. O resultado final, apresenta uma

linguagem de fusão, se por um lado temos valores da arquitectura tradicional, por outro lado, a contemporaneidade

acrescenta-lhe um carácter distinto. A harmonia do conjunto resulta dessa fusão, acrescida por dois factores

qualitativos, a sustentabilidade da construção e o esforço colectivo da comunidade em erguê-la. Fonte: http://

http://www.anna-heringer.com

O fenómeno arquitectónico na sua réplica à crise ambiental, deve incorporar a

conceptualização do corpo da arquitectura na resposta a essas insatisfações. Não

cabe ao fenómeno arquitectónico conceptualizar a solução de todos os problemas com

que a sociedade se confronta. Deve o fenómeno arquitectónico criar conceitos

concretizáveis que procurem responder aos problemas que se nos apresentam e que

estão ao seu alcance resolver, tornando-se assim, o fenómeno arquitectónico, em

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mais um elemento de transformação que, em conjunto com os esforços que as outras

áreas de conhecimento e da sociedade estão a realizar, procurará atingir um novo

modo de alcançar uma sustentabilidade perdida.

Do mesmo modo que o nosso corpo procura responder aos problemas com que se

confronta, o projecto arquitectónico será tanto mais válido quanto melhores respostas

concretizar na edificação. Não se limitando a responder quantitativamente aos

problemas, mas qualificando as suas respostas com significados prementes. A

resposta arquitectónica à crise ambiental, não se pode resumir ao desenho

bioclimático eficiente, nem à utilização inteligente dos eco-materiais. Ela deverá incluir

também uma reflexão sobre os modos de vida e sobre a sua importância na felicidade

das pessoas.

No centro desta procura pela felicidade das gentes, o corpo da arquitectura, deverá

adicionar significados qualitativos à coisa construída. A responsabilidade social, a

reflexão humanista sobre as respostas arquitectónicas, o respeito pelo ambiente,

natural e edificado, a poupança de recursos e a significância poética do edificado,

devem consubstanciar a qualidade da resposta desenhada pelo arquitecto. O corpo da

arquitectura é o resultado equilibrado destas premissas, pois só assim se atinge o

equilíbrio delicado entre o artifício e a natureza, sendo que a edificação deve ser

complemento da natureza. A edificação como substituição artificial da natureza é um

erro que não devemos repetir.

Fig.- 61- Meti Handmade Schol, Rodrapur, Bangladesh, Anna Heringer, 2006. O objecto arquitectónico torna-se corpo,

corpo da arquitectura, fundação da sociedade, preparando o seu futuro e garantindo a sua sustentabilidade. A

materialidade da construção personifica todas essas intenções, elevando a expressividade da obra e construindo uma

poesia concreta e significante.

Fonte: http:// http://www.anna-heringer.com

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3.3- A CONSONÂNCIA DOS MATERIAIS

“Existe uma proximidade crítica entre os materiais que depende dos próprios materiais

e do seu peso. Ao conciliar materiais numa obra existe um ponto em que estão

demasiado próximos, e outro ainda em que estão mortos.” (Zumthor, Atmosferas

2006).

A consonância dos materiais é o equilíbrio delicado das partes que constroem a forma

do objecto arquitectónico. A materialidade consubstancia a expressão da forma

equilibrando as tensões, complementando a composição, formatando o tacto e o sentir

da edificação que construímos.

A arquitectura é coisa matérica, assente no objecto edificado. Esse objecto adquire

carácter e significado, não só através da forma como se constrói, mas também através

da matéria que o estrutura. Essa matéria dialoga e interage com o solo onde cresce.

Essa matéria, para além da sua aplicação directa na construção, traz atrás de si, toda

uma história intemporal. Essa história começou no Big Bang, onde energia e matéria,

nas suas formas mais básicas se envolveram em transformações constantes. Do

hidrogénio ao urânio, todos os elementos se transfiguraram em núcleos de estrelas e

outros fenómenos cósmicos.

Fig.- 62- Hamadera House, Sakai, Japão, Coo Planing, 2010. Numa zona de enormes riscos sísmicos, uma casa

integralmente construída em contraplacado, contudo, apesar da espartana escolha de materiais, todo o espaço da

habitação está qualificado, criando uma atmosfera que reinterpreta a tradição nipónica de um modo contemporâneo.

Fonte: http://www.floornature.com

Na Terra, todos esses elementos se juntaram, criaram a vida e transfiguram-se em

modos de complexidade crescente. A matéria é elemento da vida e do planeta, e o

planeta e a vida são a génese da humanidade. Matéria e materialidade são coisa

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complexa. São coisa ainda mais complexa pois para além da sua física, da sua

biologia, são os recursos que permitiram ao Homem criar civilização. É com essas

matérias e materiais que complementamos o nosso habitat, criamos os nossos

abrigos, albergamos as nossas actividades, e é também com elas, que construímos o

palco das nossas vidas.

A construção é processo difícil pois é o culminar de múltiplas complexidades; a

complexidade da matéria; a complexidade do meio; a complexidade social; a

complexidade dos significados e a complexidade do ecossistema resultante da

construção final. O controlo destas interacções está na natureza do projecto e é razão

da sua dificuldade. Essa dificuldade é crescente, pois a resposta com que nos últimos

cinquenta anos encaramos a necessidade de construir, edificando sem compreender

todas as implicações desse acto, contribui significativamente para o esgotamento de

recursos e para a crise ambiental com que nos confrontamos.

Fig.- 63- The Trufle, Costa da Morte, Galiza, Espanha, 2010. Abrigo Inspirado no Cabanon de Le Coubusier, utilizando

um programa similar, desta feita explorando os limites expressivos do betão, na sua construção foram utilizados fardos

de palha que serviram de alimento a um vitelo durante um ano. Esta atitude exploratória, a utilização de fardos de

palha como cofragem e o seu consumo pelo vitelo, procurou explorar a capacidade expressiva do betão, atingindo

assim a matéria construtiva uma expressividade única, fortemente realçada pelos delicados contraste entre a textura do

betão, os tecidos e o pavimento em cortiça, Fonte: http://www.archdaily.com

A compreensão entretanto adquirida acerca da finitude da Terra implica uma utilização

cautelosa dos recursos limitados do planeta. O equilíbrio ecológico da materialidade

do projecto terá de ser uma das suas grandes preocupações. Esse equilíbrio deve ser

atingido através de uma rigorosa compreensão da natureza dos materiais. Essa

compreensão deve resultar da mensurabilidade dos materiais utilizados de acordo

com critérios científicos. Contudo, a génese da compreensão não deve começar

apenas na mensurabilidade das consequências ambientais dos materiais utilizados.

Essa atitude poderia levar que o acto do projecto, em determinada altura, fosse

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determinado pela medição desses parâmetros, levando à substituição de elementos

do projecto por outros ecologicamente mais eficientes, descorando os outros

significados do projecto.

A génese dessa compreensão deve começar pela implementação de princípios

genéricos de sustentabilidade tais com a utilização de materiais reciclados, materiais

sustentáveis, materiais de proximidade entre outros. Contudo esta génese do projecto

pode consubstanciar uma atitude poeticamente relevante, construir é colaborar com a

Terra. Passar a conceber o projecto como um prolongamento dos processos

biológicos de crescimento acrescentará nova riqueza ao léxico do projecto. O projecto

pode ser encarado como um ser vivo, nascendo do solo, vivendo com o seu entorno e

quando terminar o seu ciclo de vida, que ele contribua para o seu renascimento dentro

dos ciclos da natureza.

Fig.- 64- Rauch House, Schlins, Austria, Boltshauser Architekten, 2008. Paredes estruturais em taipa aparente,

degraus de betão pré fabricados, guarda em aço e mosaicos hidráulicos no pavimento, delicadamente equilibrados

para atingir a atmosfera imaginada para a casa. Fonte: http://www.architonic.com

A compreensão das matérias construtivas também não se resume um mero equilíbrio

ecológico da edificação, a escolha da matéria deve sempre ser feita de acordo com os

conceitos do projecto. Esta escolha deve ser coerente consubstanciada, não se

limitando à pele do edificado.

O projecto, e a consequente edificação, resultam de um complexo processo de

conceptualização. Esta conceptualização deve resultar num todo coerente e

significante. Coerente pois ele deve transmitir em toda a sua construção uma linha de

raciocínio una, que se interligue, das suas linhas gerais de volumetria, ao seu

pormenor mais ínfimo. Este raciocínio deve reflectir, para além das questões técnicas

inerentes ao programa, a economia de construção, a facilidade de manutenção, os

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impactos ecológicos e o conforto dos seus utilizadores e as outras solicitações do

projecto, concretizando uma reflexão que permita ao arquitecto conceptualizar um

conceito coerente que una a obra.

A conjunção destes pressupostos, pode então proporcionar um ambiente propício para

a criação de uma linguagem arquitectónica mais poética, onde o gesto da construção

se possa aproximar, em termos de conceito, dos momentos da vida, nascer, crescer,

mudar nas estações e renascer na terra.

Onde o projecto seja também contraponto à vida contemporânea, que combata a

ansiedade, promovendo uma ligação mais profunda e pacífica aos ciclos naturais,

onde ao imediatismo da vida dos dias que correm se contrabalancem espaços que

promovam a reflexão. E onde a vida possa decorrer de modo menos artificial e em

maior harmonia com a Natureza.

Esta não é uma postura de retorno ao passado, esta terá de ser uma postura de

reequilíbrio entre a vida imposta pela sociedade de consumo e a nossa vontade de

reconstruir um novo equilíbrio.

Fig.- 65- Casas na Areia, Comporta, Portugal, Aires Mateus, 2010. A consonância dos materiais apela a um conceito

diferente de vida, apela a um retorno ao ritmo dos ciclos natureza. Parte da sedução que este tipo de atmosferas cria

reside na insatisfação e no estado de ansiedade generalizado que a sociedade de consumo pós-industrial provoca.

Fonte: http://www.dezeen.com

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3.4- O SOM DO ESPAÇO

“Cada espaço funciona como um instrumento grande, colecciona, amplia e transmite

sons. Isso tem a ver como a sua forma, com a superfície dos materiais e com a

maneira como estão fixos” (Zumthor, Atmosferas 2006).

O espaço e o som que nele se propaga estão intimamente ligados, do som que a

matéria reflecte, ao modo como ele ressoa, passando pelas sonoridades, ou ruído,

que chega da envolvente, som e espaço condicionam-se mutuamente. Está na

natureza dos espaços que a sua caracterização sonora altere o modo como

interagimos e nos percepcionamos com ele. O contrário também é verdade, a

caracterização do espaço altera a natureza dos sons.

Fig.- 66- Great Bamboo Wall, Bejing, Kenso Kuma, 2002. A serenidade é coisa construída de maneira delicada e

complexa. Três pavimentos, duas pedras, uma polida a outra amaciada, e um pavimento em bambu, uma cortina,

também em bambo, a complexidade de sons emitidos e absorvidos pelas diferentes matérias constroem complexa

serenidade de um local de contemplação. Fonte: http://www.kkaa.co.jp

A título de experiência, podemos tentar reproduzir o mesmo som ou melodia em

espaços de características diversas. A audição de um som, num espaço revestido com

superfícies reflectoras, é muito distinta da do mesmo do som ou melodia emitida num

espaço onde as suas superfícies o absorvem. Mais diferente será ainda se as

superfícies que delimitam o espaço funcionem como caixas de ressonância, ampliando

a frequência sonora.

A percepção humana do som é outra componente essencial nesta relação íntima entre

som e espaço. A audição é um sentido humano crucial para a percepção espacial do

meio. Não é por acaso que a nossa audição é estereofónica, pois graças aos nossos

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dois ouvidos conseguimos identificar no espaço a origem do som. Esta configuração

biológica torna a audição no sentido mais importante de percepção espacial a seguir à

visão. Podemos então começar a compreender a importância do fenómeno acústico

nas questões do espaço.

Por norma, estas questões são colocadas em três níveis de solicitações no projecto. O

primeiro nível é a questão do conforto acústico do edificado, controlando o nível de

isolamento, ou interacção acústica dos espaços interiores face à envolvente. A

segunda questão que se coloca é a adequação do nível de reverberação do espaço,

sendo que cada espaço, de acordo com as funções e as actividades nele exercidas,

deverá ter o nível adequado de reverberação, sendo esta controlada em conjunto pela

sua geometria e pelo mix de materiais, absorventes e reflectores de som, que

constroem o espaço. A terceira preocupação que deverá ponderar o projecto

relaciona-se com o som produzido pelos materiais aplicados, sendo que os materiais

não produzem som directamente, mas a actividade exercida pelos utentes sobre os

mesmos, produz som. Contudo estas são questões técnicas a que o projecto

arquitectónico deverá responder.

Fig.- 67- Restaurante Yellow Tree House, Workworth, Nova Zelândia, Pacific Environment Architects, 2008. Situado

num parque natural, este restaurante inspirado nos casulos de insectos, agarra-se às arvores, mimetizando um

processo natural. A sua integração na natureza é complementada pela sua abertura aos sons da floresta. Apenas

deste modo a sua atmosfera fica completa, do mesmo modo que o som da natureza percorre a floresta, ele atravessa a

madeira que constrói o espaço onde nos encontramos. Fonte http://www.contemporist.com

A nível expressivo o som tem sido um dos instrumentos primordiais de caracterização

do espaço, na arquitectura do sagrado, sempre desempenhou papel fundamental na

sua concepção. No modo como as igrejas e templos são edificados, o som reflecte e

reverbera, moldando o carácter dos espaços. Este característica é fortemente

condicionada pela forma e pelos materiais que constroem o espaço religioso e é um

exemplo de como a utilização cuidada de formas e materiais pode transformar um

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82

3.5- A TEMPERATURA DO ESPAÇO

“O facto de que os materiais retiram mais ou menos do nosso calor corporal é

conhecido. Histórias de como o aço é frio e por isso retira calor. Mas ao falar disto,

ocorre-me a palavra temperar. É semelhante a temperar pianos, ou seja encontrar o

ambiente certo. No sentido literal e figurativo. Quer dizer que esta temperatura é física

e provavelmente psicológica ” (Zumthor, Atmosferas 2006).

O projecto arquitectónico responde a vários tipos de exigências; funcionais,

estruturais, de acessibilidade, da integração no sítio ou na cidade, da acessibilidade,

do conforto, da segurança, da hierarquização dos espaços, da composição e da

criatividade entre outras. Essas solicitações são ponderadas e conjugadas pelo

arquitecto de modo a encontrar uma solução equilibrada e criativa. Uma das

solicitações a que os projectos devem responder é ao conforto térmico e ao equilíbrio

bioclimático do projecto.

Fig.- 69- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia, 2009. A materialidade da cultura reflecte as

condicionantes bioclimáticas, as transparências permitem a ventilação. Uma textura expressiva reforçada por uma

riqueza matérica, sombra e ventilação são parte da cultura local, aqui acentuadas pela herança da cultura islâmica de

Bali. Fonte: http://www.archdaily.com/59740/alila-villas-uluwatu-woha/

Esse tipo de solicitações não aparecem de modo anónimo no projecto, a sua resposta

implica um conhecimento profundo do sítio e do clima onde se desenvolverá a

construção. A consubstanciação deste conhecimento garante ao projecto uma

harmonia profunda com as condicionantes climáticas do sítio, consequentemente a

eficácia de resposta do projecto aumenta. A procura desta eficácia não implica só um

refinado desenho do projecto, encontrando o equilíbrio entre as solicitações

programáticas do projecto e as necessidades de respostas bioclimáticas, conjugando

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ganhos solares com ensombramento, ou equilibrando as necessidades de

aproveitamento, ou protecção, de ventos dominantes. Implica igualmente a escolha de

materiais que se adeqúem às inércias térmicas desejadas.

Por norma as arquitecturas tradicionais dispõem de uma paleta de materiais, que em

conjunto com o seu desenho, respondem eficazmente a estas necessidades. Contudo

o projecto não se resume a um somatório de respostas. O projecto deve também

consubstanciar, a criatividade e a busca de originalidade do seu autor. O arquitecto,

enquanto autor criativo, utiliza uma vasta paleta de soluções e materiais que deve

adequar à resposta criativa que procura.

Essa resposta utiliza o objecto arquitectónico como meio expressivo. A expressividade

desse objecto, com as respostas que ele consubstancia, procura contar uma história

que se desenrola à medida que o utilizador deambula pelo espaço. Essa história é o

verdadeiro significado do projecto, ela só se revela com toda a envolvência da obra.

Fig.- 70- Maison à Marrakech, Marrocos, Guilhem Eustache, 2008. Num clima desértico, uma casa construída em

taipa, pavimento em tijoleira artesanal e a visão da piscina no seguimento da sala. A temperatura refresca-se pela

materialidade da construção, tal não é apenas fenómeno físico, é também fenómeno perceptivo. É a materialidade da

obra constrói essa temperatura psicológica que nos conforta. Fonte: http://www.amush.org

A envolvência em que nos posicionamos, quando abordamos o espaço, remete-nos

para uma experiencia multissensorial. Esta multiplicidade de feedbacks sensórios

provoca no utilizador uma abundância de emoções que acentuam os conceitos do

projecto.

A temperatura do espaço, física e psicológica, acentua o dramatismo da resposta

arquitectónica. A utilização da temperatura começa desde logo com a utilização da

cor, lembremo-nos das casas marroquinas como interior pintado de azul, cor fria, ou

das casas nórdicas, pintadas de encarnados escuros e outras cores quentes. Em

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ambas as utilizações, revela-se uma vontade de complementar a realidade ambiental,

em climas quentes cores frias, em climas frios cores quentes. Esta prática não traduz

apenas um meio de adquirir ganhos ambientais, no calor do deserto as cores frias

reflectem as radiações solares, permitindo que as superfícies expostas fiquem mais

frescas, o contrário acontecem nos países nórdico, onde as cores quentes acumulam

as radiações e aquecem as superfícies. Esta prática ganha eficácia adicional, pois a

nossa percepção psicológica da cor, permite-nos um maior conforto face aos climas

extremos.

A utilização da temperatura como elemento expressivo não termina na cor. A

condutibilidade térmica dos materiais também é factor que marca a temperatura de um

espaço. A utilização de materiais cerâmicos, ou de pedra, ou de elementos metálicos,

todos eles materiais com grande condutibilidade térmica, arrefece a temperatura de

um espaço. Por outro lado as madeiras, o gesso, paredes de terra, tapeçarias ou

alcatifas, peles animais, alguns polímeros plásticos ou elementos têxteis, materiais de

fraca condutibilidade térmica, tornam o espaço mais quente.

Fig.- 71- Igreja de Kärsmäki, Finlândia, Lassila Hirvilammi, 2005. O calor da madeira não é apenas táctil, a sua cor e a

sua textura são fortemente percepcionados pelo ser humano como algo reconfortante e quente. O espaço desta igreja

reflecte essa realidade, o calor não é apenas físico. Fonte: http://www.architonic.com

Outro factor que condiciona a temperatura é a ventilação do espaço. Uma aragem

fresca numa varanda ou numa caixa de escadas, o calor duma cozinha, entre outros

exemplos, condicionam o carácter do espaço, tornando esse local do projecto

aprazível, ou então ligeiramente desconfortável, consoante a intenções do projecto.

Estas situações quando acontecem em sintonia com a espacialidade do sítio

arquitectónico, não são questões menores, são questões primordiais na complexidade

da resposta arquitectónica. Os eco-materiais por norma não se comportam de modo

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diferente dos outros materiais. Os materiais de modo genérico são instrumentos de

consubstanciação do projecto. A expressividade da temperatura do projecto é uma

questão transversal à materialidade, eco materialidade, ou materialidade de modo

genérico.

A temperatura do espaço é coisa mais próxima da arquitectura bioclimática. Certo é

que dessa temperatura induzida, psicológica ou real, construímos emoções e

sensações, de conforto ou repulsa, e com elas condicionamos a reacção das pessoas

perante cada situação espacial.

Contudo, a utilização de eco-materiais vernaculares em particular, ganha uma

expressividade especial. Através da sua utilização, a temperatura física e psicológica

do espaço, ganha novos significados. Esses significados são adquiridos pois a sua

ligação com as coisas da natureza e do solo, permite construir espaços onde a

temperatura é percepcionada como um prolongamento amenizado da coisa natural.

Quase como um micro clima criado por uma floresta ou por um vale. Esse micro clima

nasce da natureza e é uma dádiva natural da sua materialidade, essa expressão

poética da construção é uma expressividade peculiar dos eco-materiais vernaculares.

Fig.- 72- Dragspelhuset, Lago Ovre Gla, Suécia, 24h Architecture, 2001. Num clima nórdico, onde os longos invernos

marcam a vida das pessoas e dos edifícios, existe uma necessidade real de exacerbar a temperatura dos espaços.

Neste caso de um modo surpreendente, somos aconchegados por peles a revestir a nossa envolvente. Fonte:

http://www.inhabitat.com

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3.6- AS COISAS QUE ME RODEIAM.

“Esta ideia, de que entrarão necessariamente coisas num edifício que eu como

arquitecto concebo, mas nas quais não penso, dá-me de certa forma uma visão futura

dos meus edifícios. Este facto faz-me bem, ajuda-me muito imaginar este futuro dos

espaços, das casas, de como serão uma vez utilizadas ” (Zumthor, Atmosferas 2006).

O projecto, actividade maior da profissão, é acto criador. Este acto criador é

impulsionado pelo programa, habitualmente definido pelo cliente, balizado pelas

exigências técnicas e regulamentares impostas pelo mundo real e pela sociedade. O

projecto é acima de tudo acto de autoria do seu criador, o Arquitecto. Como muitos

actos criadores, o sofrimento e o amor empregues na sua génese, criam imensas

afectividades na alma do seu criador. Em numerosas ocasiões o criador tem

dificuldade em libertar-se da imagem que idealiza da sua criação. Essa ligação entre

criador e criação é sempre coisa complexa, contudo, a criação, quando saudável e

madura, autonomiza-se do criador, ganhando vida própria.

Fig.- 73- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia, 2009. A utilização de materiais locais, guiados

por um desenho inteligente, constrói texturas que complementam os ritmos da floresta tropical de Bali. Um resort , tal

como qualquer edificação, deve complementar o meio que o rodeia. Fonte: http://www.archdaily.com/59740/alila-villas-

uluwatu-woha/

Quando a obra ganha autonomia e vida própria segue o seu percurso. Este percurso é

marcado pelos diferentes utilizadores e usos que se seguem ao longo da sua vida.

Cada um dos seus utilizadores vai caracterizar a obra à sua imagem, adaptando-a e

dando-lhe uma vida que transcende a criação original. Quando a construção tem um

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fim demasiado rígido com um formulação que não permite adaptações, essa

construção está destinada à demolição, Assim se passou com numerosos templos,

cuja liturgia não permitiu adaptações a novos credos religiosos, o mesmo se passará

com construções cujos programas são de tal modo rígidos que não permitem outro

uso.

O mesmo se passa com a habitação, independentemente do suporte arquitectónico, o

espaço habitado é sempre marcado pelos seus habitantes. Por vezes encontramos

alguns exemplos de arquitectos que se insurgem contra a intervenção dos habitantes

nas suas obras. Lembremo-nos de Frank Loyd Wright, que numa das suas casas,

processou os habitantes, pois as cadeiras por ele desenhadas para a sala se

encontravam noutra divisão. Contudo as construções destinam-se aos homens e a

eles devem proporcionar espaço para a vida se desenrolar. Em alguns casos

especiais os clientes pedem uma obra integral ao arquitecto, mas estes casos são a

excepção. E mesmo nestas obras, a não ser que sejam mesmo muito importantes e

constituam património pela sua valia extraordinária, o mais normal é que os seguintes

ocupantes destes espaços já tenham ideias diversas acerca dos mesmos. É boa

prática arquitectónica conceber o projecto para as pessoas, logo torna-se necessário

encontrar um equilíbrio delicado entre a individualidade do projecto e a necessária

flexibilidade do mesmo.

Fig.- 74- Vista de Nova Iorque, 2010. Num edifício anónimo da grande metrópole, os seus habitantes marcam uma

posição, querem contribuir para salvar o planeta, A capacidade do clássico prédio nova-iorquino em se adaptar aos

seus habitantes, é notável. Nem sempre tal acontece nos edifícios com grande individualidade. Fonte:

http://www.inhabitat.com

Zumthor refere-se em particular ao encanto que espaços profundamente marcados

pela vivência dos seus habitantes exercem sobre quem os visita. Estes espaço

povoados de objectos com história e significado são contagiados na qualidade

espacial por essa riqueza de individualidade dos seus habitantes. É pela capacidade

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dos espaços serem profundamente marcados pelo carácter dos seus habitantes, que

Zumthor considera que os espaços por ele desenhados devem ter flexibilidade de

abraçar.

Zumthor sugere, implicitamente, que o projecto deve conciliar a sua vontade de

afirmação com alguma humildade. Pois caso a afirmação de autoria se transforme em

sobranceria, a obra perde uma das suas principais funções, ela deixa de ser espaço

de vida e retira individualidade aos seus habitantes, não cumprindo desse modo a sua

função de ser espaço de harmonia e felicidade. Mais, quando o projecto afirma a sua

vontade de autoria de um modo desmesurado, ele fica inevitavelmente datado,

perdendo igualmente capacidade de se adaptar aos tempos que virão.

Esta questão de adequar o projecto aos seus tempos, e em simultâneo, garantir uma

certa aura de intemporalidade é problema significativo no uso expressivo com que

utilizamos a expressividade dos materiais na composição arquitectónica. Uma dose

necessária de expressividade é fundamental para afirmar a qualidade da obra,

contudo o seu excesso pode ditar-lhe uma curta vida.

Fig.- 75- Casa Manifesto, Curacavi, Chile, James & Mau for Infiniski, 2009. Apesar de integralmente construída com

elementos reciclados, contentores, paletes usadas, etc., esta habitação não dispensa um desenho forte, que apesar

disso, permite aos seus habitantes personalizar o espaço à medida das suas individualidades. Fonte:

http://www.archdaily.com

A capacidade do edificado prolongar a sua vida útil, e de ser passível de múltiplas

ocupações e utilizações ao longo da sua vida, é uma vantagem, pois quando uma

edificação consegue realizar esse feito, ela poupa recursos futuros e torna-se mais

sustentável. O que em relação à utilização de eco-materiais se torna num problema

delicado. Se por um lado estamos numa altura da nossa história em que o seu uso

deve ser promovido, enfatizando as suas vantagens, quer em termos de

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sustentabilidade, quer em termos de expressividade, por outro lado a enfatização

excessiva das suas expressividades pode ser contraproducente, pois pode datar as

obras e comprometer o seu uso prolongado.

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3.7- Entre serenidade e sedução

“É também o que tento fazer nos meus edifícios. De forma que eu goste e que vocês

gostem, e sobretudo, que corresponda à utilização do edifício. Conduzir, preparar,

iniciar, alegre surpresa, descontracção, mas sempre de forma que, já nada tem de

didáctico, mas sim de parecer natural ” (Zumthor, Atmosferas 2006).

A construção e a coisa arquitectónica são produto do homem, nascendo da resposta a

uma necessidade funcional, seja uma habitação, uma oficina, um armazém, uma

fábrica, um templo ou qualquer outro tipo de edificação, mas não se resumem a essa

resolução técnica. A resposta edificada, normalmente resultado de grande esforço,

necessita de atingir elevados graus de eficácia. Para conquistar essa eficácia a

resposta arquitectónica, para além das exigências programáticas, necessita de

interagir com três realidades distintas; ela tem de responder às necessidades

ambientais, tem de se adequar às contingências culturais e tem de interagir

eficazmente com os seus utilizadores.

Fig.- 76- Alila Villas Uluwatu, Tokio, Woha Architects, Bali, Indonesia, 2009. Serenidade e sedução, um equilíbrio

delicado, entre a vontade de sugerir um percurso e um convite para ficar, cada espaço deverá construir o seu carácter,

aqui fica-se, observando o que nos espera no exterior. Fonte: http://www.archdaily.com/59740/alila-villas-uluwatu-woha/

Quando Zumthor enuncia as qualidades de serenidade e sedução que emanam da

boa obra, ele refere-se à capacidade da obra interagir de naturalmente com os seus

utilizadores. Esta capacidade resulta do modo com a construção anuncia as suas

intenções de um modo perceptível a todos, sem se socorrer de mais nenhum elemento

alheio a si mesma. Essa enunciação resulta da expressividade com que as diversas

situações espaciais da construção se consubstanciam. É através da percepção deste

carácter expressivo que os espaços dialogam com o seu utilizador.

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Essas expressividades motivam no utilizador dos espaços diversas emoções que

complementam a sua percepção da realidade tridimensional do espaço. A percepção

destas emoções permite ao utilizador apreender o carácter do espaço, seja ele um

sereno espaço de estar, ou uma circulação vibrante, ou a introspecção de um local de

culto. São as expressividades da resposta arquitectónica que permitem clarificar o

sentido de orientação do espaço, caracterizando os espaços de acordo com as

funções e o conceito, anunciando acontecimentos, conjugando as realidades

exteriores com as necessidades do programa.

Para além de nos proporcionarem um entendimento mais completo do espaço, a

capacidade dos diversos espaços emanarem estas emotividades, entre a serenidade e

a sedução, passando pela excitação, a alegria, a surpresa ou pela solenidade,

constroem a relação psicológica que o homem estabelece com o edificado.

Fig.- 77- Capela em Tarnow, Polónia, Beton Architekt, 2009. Cada espaço deve adquirir a sua atmosfera de acordo

com a função. Neste caso um conhecido escritor polaco decidiu financiar uma capela na sua propriedade para os seus

vizinhos. Construída com madeira local e executada pela população. A atmosfera de recolhimento e introspecção é

reforçada pelo desenho da estrutura da capela e pelo modo como dialoga com a paisagem. Fonte:

http://www.archdaily.com

É esta relação psicológica, que permite aos edifícios dialogarem com o homem,

transmitindo os seus conceitos e, quando a obra se destaca, propagar a poesia com

que a edificação nos pode brindar. Quando Zumthor nos alicia a utilizar essas

capacidades expressivas dos espaços, de modo a proporcionar as diferentes emoções

que complementam a resposta funcional do projecto, ele apela a que essas respostas

surjam com naturalidade.

Na sua, e na nossa óptica, é essa naturalidade que caracteriza a intemporalidade

poética com que nos brinda em muitas das suas obras. Esse apelo é consubstanciado

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na materialidade da construção e na ligação ao sítio. As matérias utilizadas na

construção, de forte carácter tectónico, aliando as tradições locais a uma profunda

reflexão da vida contemporânea, que concretizam o apelo a uma nova vontade de ver

o mundo, mais humana, mais ligada ao sitio e aos rituais naturais, menos consumista

e mais poética.

Tal como na poesia escrita, são os sentimentos de acolher, esperar, correr, ansiar,

amar, sugerir, descansar, compartilhar, solidão, comunhão, reflexão entre outros que

nos permitem construir uma narrativa poética. No caso da obra, essa narrativa poética

é concretizada através da implantação, da orientação, do desenho e hierarquização

dos espaços, das significâncias culturais, do sítio, que nos permitem, como

arquitectos, transmitir os conceitos da obra, na esperança de criar espaços onde a

vida possa florescer em felicidade. Sempre na esperança, desse modo podermos

contribuir para um mundo onde um homem melhor possa crescer e ser feliz.

“Belief in the significance of architecture is premised on the notion that we are, for

better or for worse, different people in different places- and on the conviction that is

architecture’s task to render vivid to us who we might ideally be” (Botton 2006)

Fig.- 78- Bamboo House, Osaka, Japão, Katsuhiro Miyamoto, 2009. Por entre o ritmo vertical do bambo que marca o

espaço da habitação, aparece um vislumbre da rua, a luz atravessa a verticalidade do bambo, a escada realça a

horizontalidade dos seus degraus. A serenidade preenche a atmosfera interior, contudo a sedução do exterior e do

resto da habitação são serenamente anunciadas. Fonte: http://www.archdaily.com

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3.8- TENSÃO ENTRE O INTERIOR E O EXTERIOR

“Na arquitectura retiramos um pedaço do globo terrestre e colocamo-lo numa pequena

caixa. E de repente existe um interior e um exterior. Estar dentro e estar fora.

Fantástico. E isto implica outras coisas igualmente fantásticas: soleiras, passagens,

pequenos refúgios, passagens imperceptíveis entre interior e exterior, uma

sensibilidade incrível para o lugar.” (Zumthor, Atmosferas 2006).

O gesto de retirar um pedaço do globo terrestre e com ele construir uma nova

realidade inexistente, é uma analogia poderosa e assertiva. A poesia da analogia,

reflecte uma profunda reflexão acerca do acto de construir e essa analogia

corresponde a uma realidade inquestionável. Construir implica sempre retirar algo

matérico de algum lugar, utilizando essa matéria para edificar. Esse aparentemente

gesto simples de retirar, transformar e construir é coisa complexa. Em primeiro lugar,

para construir retiramos sempre algo, extraímos e destruímos uma realidade natural,

seja uma montanha para retirarmos a sua pedra, seja uma floresta onde abatemos as

suas árvores, ou uma praia de onde extraímos a sua areia, enfim, quer seja para

materiais de construção, quer para recursos energéticos, existe sempre uma

destruição do meio natural. A destruição continua para além da extracção dos

recursos, o sítio onde construímos, provavelmente um campo, floresta, sapal, estuário,

etc., deixa de ser um local naturalmente produtivo, e transforma-se num sítio onde a

natureza tem dificuldade em persistir.

Fig.- 79- Plasticamente, Riccardo Giovaneti, 2009. Discos e pratos em plástico reciclado, constroem uma cúpula quase

fechada. Contudo as transparências que restam entre os elementos, criam uma tensão que convida ao usufruto do

espaço. Fonte: http://www.contemporist.com

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Quando Zumthor apela a uma sensibilidade incrível para o lugar, está a dar-nos pistas

sobre a sua importância. Sobre a importância de construir respeitando e colaborando

com a terra, procurando que a construção seja um complemento da natureza. Zumthor

faz esse apelo maximizando a importância arquitectónica das tensões entre o interior e

o exterior do construído. Tensões essas que alargam o limite do projecto. Tensões que

poética e simbolicamente, representam a interacção que o edificado tem com o meio.

O exterior e o interior do construído são partes complementares de uma mesma

realidade, a essa realidade podemos referir o ecossistema onde a espécie humana

vive e floresce.

O fascínio que a arquitectura dedica a esse momentos tensos do projecto, os limites

da interacção entre o interior e o exterior, constituem instantes delicados e tensos do

projecto. É nesses apontamentos, que interior e exterior se fundem e interagem,

criando ambiguidades e convites de interacção, inserindo os conceitos do projecto na

envolvente e trazendo a envolvente para o conceito do projecto.

Fig.- 80- Centro médico, Khartoum, TAMassociati, 2009. Centro médico para refugiados, paradigma de inserção e

respeito pelo local, pois apesar de ter sido construído reaproveitando contentores marítimos, consegue reinventar o

sítio, adoptando materiais locais no ensombramento. Parte da reconstrução do sítio resulta da forte ambiguidade entre

o seu espaço interior e a adjacência. A estrutura de ensombramento reforça essa ambiguidade e complementa essa

diluição de fronteiras. Fonte: http://www.tamassociati.org

Encontramos essas tensões em toda a arquitectura, da vernacular à moderna, contudo

em todas essas tendências e movimentos arquitectónicos, não existem fórmulas para

atingir a poesia inerente a essa zona indefinida da coisa arquitectónica. Pode

acontecer num alpendre de uma casa minhota, ou na janela de casa japonesa, ou no

prolongamento de uma cobertura modernista, certo é que essa magia do espaço

acontece sempre quando a coisa arquitectónica dilui as suas fronteiras entregando-se

ao mundo.

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Terá de existir na procura destes momentos uma reflexão e conhecimento profundo do

meio onde edificamos, principalmente a um nível bioclimático, pois sem esse

conhecimento a interacção torna-se inútil. Expor uma varanda aos ventos dominantes

num clima frio, torna-se num desperdício inútil, pois a sua fruição não é possível. O

mesmo acontece com um grande envidraçado voltado ao sol num clima desértico. A

eficácia destes momentos está profundamente interligada no meio e na relação que a

obra estabelece com ele.

A sua poesia está ligada a dois factores, em primeiro lugar são momentos de convite e

prolongamento do espaço, convidam-nos a perceber o interior e apropriam-se do

exterior, dependendo da nossa posição relativa face objecto arquitectónico. Em

segundo lugar, ao compreenderem o habitat, estas situações criam na coisa

arquitectónica uma magia, a coisa arquitectónica passa comportar-se como um

elemento natural, em vez de estar construída no sítio, como um objecto indiferenciado,

ela nasce da terra, passando a ganhar características expressivas que a ligam ao

meio, pois a ele está intimamente ligada. A coisa arquitectónica passa a crescer da

terra e colabora com ela do mesmo modo que uma arvore cresce adequando-se ao

local preciso onde nasce, vivendo do que a terra lhe dá e alimentando o solo.

Fig.- 81- Casas na Areia, Comporta. Portugal, Aires Mateus, 2010. Construir colaborando com a terra, a poesia da

sugestão convida a entrar e reforça o desejo de uma nova harmonia. O projecto procura sempre coisa delicada que

nos faça sonhar com um futuro melhor. Fonte: http://www.dezeen.com

A utilização de eco-materiais amplia o significado desta atitude, pois o respeito com

que estes materiais tratam o meio enfatiza essa relação. Esse significado, por vezes

ausente na imagem da construção, não deixa de trazer riqueza acrescida ao acto de

construir, complementando o meio, em vez de o esgotar. Pode-se constatar que os

eco-materiais vernaculares, o adobe, a madeira, a pedra do local da construção entre

outros, podem traduzir esses significados de um modo mais expressivo, anunciando

visualmente essa atitude de construir colaborando com a terra.

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3.9- DEGRAUS DA INTIMIDADE

“Relaciona-se com proximidade e distância, um arquitecto clássico diria: escala. Mas

isso soa muito académico, estou a falar num sentido mais corporal de escala e

dimensão. O que abrange vários aspectos que se relacionam comigo, o tamanho, a

dimensão, a escala e a massa da obra. Por vezes são elementos maiores do que eu e

noutras são objectos mais pequenos. ” (Zumthor, Atmosferas 2006).

A intimidade, essa relação entre o nosso corpo e a obra, é factor primordial no modo

como nos relacionamos com o edificado. Essa intimidade, ou relação corporal entre

nós e a massa do edificado, constitui igualmente um dos modos principais como os

conceitos do edificado se percepcionam. A escala do edificado e dos seus espaços é

um dos factores primordiais de qualificação do edificado. É esta gradação da

intimidade que vai marcar o modo como o edifício se apresenta face ao utilizador.

Fig.- 82- Abrigo de montanha, Kamounamoto, Japão, Sou Fujimoto, 2008. A escala mínima do abrigo potencia a

construção de uma atmosfera protectora e única. A utilização de madeira compacta como módulo construtivo cria o

aconchego que nos retempera depois de uma longa caminhada. O seu uso excessivo cria expressividades únicas,

relacionando-se com a floresta envolvente e dispensando o mobiliário. A aparente brutalidade do módulo construtivo é

dissolvida pelo desenho delicado da obra. Fonte: http://www.archdaily.com

Um edifício institucional num regime autoritário apresenta-se normalmente com uma

escala que esclarece o carácter do regime. Olhemos para dois exemplos no mesmo

país. Por um lado encontramos o estádio de olímpico de Berlim de Speer de 1936 em

pleno nazismo, com as suas colunatas monumentais de granito, e uma escala que

vincava o carácter ditatorial do nazismo. Por outro lado o estádio olímpico de Munique

de 1972 de Günther Behnisch e Frei Otto com a sua cobertura tênsil, leve e

transparente anuncia o optimismo da democracia.

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É a capacidade do edificado se relacionar com o ser humano, através da escala, e do

modo como se ela se adapta e respeita o homem, que marca a diferença de atitude

política entre ambas as obras. Na ditadura nazi o cidadão é diminuído na sua posição,

ele é transformado num servidor/admirador do estado. Na democracia da Alemanha

Federal dos anos 70, a obra está ao serviço do cidadão.

Nos dias que correm, onde a crise ambiental e a escassez de recursos marcam o

nosso dia-a-dia, as questões de escala continuam prementes, tal como na sua

associação a ideais políticos, a escala também reflecte as condicionantes da nossa

sociedade. As catedrais do consumo, os centros comerciais, talvez os edifícios mais

representativos desta era de excessos, utilizam a escala de um modo muito particular.

Misto de templo e de arquitectura institucional, com disfarces de playground, o homem

e natureza são subjugados pela escala do edifício. Os múltiplos pés direitos com as

suas varandas sobrepostas remetem-nos para a imagética das naves centrais de uma

catedral gótica. As suas fachadas imponentes com entradas fortemente marcadas

podem ser comparadas à enormidade da arquitectura estalinista. Nestes templos o

homem é separado da natureza e da cidade. Os ciclos naturais são cortados na nossa

permanência no seu interior para prolongar os impulsos consumistas.

Fig.- 83- Instalação, Victoria & Abert Museum, Londres, Rintala Eggertsson Architects, 2010. Nesta instalação, Rintala

Eggertsson, desenha uma biblioteca controlando a sua escala e adequando-a à magnificência do espaço disponível,

sobressai a obra pelo desenho requintado. Fonte: http://www.archdaily.com

Igual atitude encontramos em numerosas outras construções desta nossa sociedade

consumista. Por exemplo, os condomínios fechados com os seus muros e uma

artificialidade contida que nos separam da cidade e da natureza, criando uma

artificialidade assente num infindável consumo recursos, seguem uma lógica idêntica.

A escala doméstica reflecte igualmente essa perda de escala humana, os vestíbulos

com enormes escadarias e a salas enormes que servem micro famílias, apenas se

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destinam a impressionar o visitante ocasional. Esta utilização da escala na construção

é reflexo dos excessos da sociedade de consumo.

A escala da edificação é coisa da sustentabilidade, é-o pois a escala reflecte o uso de

recursos e numa época de escassez eles devem ser utilizados parcimoniosamente. É-

o igualmente, pois a escala reflecte o ideal de vida que está subjacente ao projecto.

Nas palavras de Zumthor, a escala é traduzida pela expressão os degraus da

intimidade, através dessa expressão Zumthor tenta ilustrar um modo de conceber a

construção que proporcione um ideal de vida, mais reflectivo, mais próximo da

natureza, menos consumistas e menos imediato. Nesse ideal vida, a beleza e poesia,

consubstanciados na sua arquitectura, procuram construir palcos onde a vida possa

encontrar a felicidade através de valores qualitativos. Onde a significância do espaço

se reflicta na harmonia entre o homem e a natureza.

A expressividade da matéria aliada à escala das coisas construirá essa harmonia.

Mais uma vez é através dessa expressividade, resultado da forma e da matéria que o

edificado comunicará com o ser humano, pois a matéria nada é sem forma, e a forma

sem matéria não existe, e é através desta capacidade de comunicar com o homem

que a arquitectura concretizará um dos seus grandes desígnios, procurar

consubstanciar a visão de um homem melhor.

Fig.- 84- Apartamento transformável, Hong Kong, Gary Chang, 2009. Com a densidade populacional de Hong Kong, o

espaço torna-se em bem valioso, neste apartamento de 40m2, e graças a um imaginativo sistema de paredes móveis,

a divisão única vai-se transformando de acordo com as diferentes necessidades. Esta condensação de funções e de

espaço não pôs em causa qualidade da habitação, nem a qualidade de vida do habitante. Os espaços estão

qualificados sem esbanjamento de recursos. Fonte: http://www.nytimes.com

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3.10- A luz sobre as coisas.

“Uma das ideias é a seguinte: pensar o edifício como uma massa de sombras e a

seguir, como num processo de escavação, colocar luzes e deixar a luminosidade

infiltrar-se. (…). A segunda ideia preferida é colocar os materiais e superfícies,

propositadamente, à luz e observar como reflectem. É necessário, portanto, escolher

os materiais tendo presente o modo como reflectem a luz e afiná-los ” (Zumthor,

Atmosferas 2006).

A luz é responsável em última análise por toda a matéria, é das estrelas e das

constelações que toda a matéria provém. Quando os textos sagrados dizem, “fez-se

luz”, dizem-no num sentido metafórico, no sentido do inicio dos tempos e da vida, mas

o nosso actual conhecimento científico constata que na realidade existe um relação

indesmentível entre luz e matéria. A luz provém dos actos cósmicos e nucleares que

são responsáveis pela criação da matéria e da energia. É o seu reflexo ténue, que

depois de uma viagem intemporal, nos permite situarmo-nos no cosmos. A vida em

termos genéricos é indissociável da luz, a maioria da vida à face da terra assenta no

ciclo do carbono, e este ciclo está dependente da existência de luz solar.

Fig.- 85- Mapungubwe visitors Centre, Africa do Sul, Peter Rich, 2008. Esta estrutura de ensombramento, cria com a

sua sombra ritmos surpreendentes realçados pela irregularidade das matérias vernaculares que usa. A sombra

percorre os pavimentos e as paredes de taipa, com ritmos e texturas únicos a cada hora do dia. A textura rica da taipa

e a irregularidade da madeira potenciam expressões únicas que constroem uma poesia mutante, filha do ciclo natural

da luz e da textura das coisas da terra. Fonte: http://www.peterricharchitects.co.za

Para além da sua responsabilidade na criação original da matéria, a luz representa

para a Terra o nosso suprimento primordial de energia. Todo o petróleo e carvão que

consumimos são resultado do ciclo do carbono, por sua vez alimentado pela luz. A luz

é em última análise responsável pela existência de vida na Terra. Luz é energia e

calor. Luz influencia todos os ciclos naturais, é a sua duração que marca as estações

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determinando os ciclos da vida e da reprodução. É a sua reflexão na Lua que nos

mostra as suas fases.

A luz é coisa primordial, pois é ela que corre sobre toda a coisa construída, corre

sobre toda a coisa não construída, corre igualmente sobre a maior parte da coisa viva.

É ela que marca a sombra e que se reflecte em tudo, permitindo-nos construir uma

imagem da realidade. Na coisa arquitectónica, é a luz que nos realça a expressividade

da sua forma. Não o faz directamente, mas realiza-o pela sua ausência, é pela sombra

que a forma arquitectónica ganha os seus maiores momentos de expressividade.

É essa ausência de luz, a sombra, que determina algumas das diferenças entre as

arquitecturas das nações meridionais e as arquitecturas dos países mais próximos do

dos círculos polares. Basta um pequeno relevo, seja um friso ou uma cornija, para que

com o sol do Mediterrâneo se expresse uma sombra dramática na fachada. Tal não se

passa nos países nórdicos, onde por seu lado a uma cor forte e quente realça a luz

suave dos países sem sombra. A luz dramatiza também a matéria, quer reflectindo-se

nas superfícies espelhadas, quer dando espessura às matérias de textura vincada, ou

então mostrando a manualidade de um reboco ancestral.

Fig.- 86- Rauch House, Schlins, Austria, Boltshauser Architekten, 2008. Ao longo do dia as texturas, o brilho, a luz e as

sombras vão metamorfosear -se, revelando toda a sua riqueza expressiva. Fonte: http://www.architonic.com

A luz desempenha igualmente papel fundamental na caracterização interior dos

espaços, realçando-lhes o carácter, quer seja realçando o seu cunho etéreo com uma

luz zenital ou com os vitrais de uma igreja, ou então criando sombras dramáticas que

mudam visualmente o ambiente do espaço ao longo do dia.

Luz e matéria são indissociáveis, e matéria e espaço constituem a coisa construída.

Coisa construída que para além das luzes e sombras do seus grandes gestos,

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volumes, planos e espaços, vive da expressividade da matéria. Essa expressividade,

na sua textura, brilho ou forma construtiva ganha diferentes consistências ao longo do

percurso da luz. Seja ela a luz solar, ou os nossos substitutos artificiais.

Com a ligação intrínseca que existe entre a luz e a expressão da matéria a obra ganha

inúmeros significados diferentes consoante a viagem que a luz realiza sobre a coisa

construída. Textura, sombra, brilho, reflexo, penumbra e contraste variam minuto a

minuto durante o dia, variam pela posição solar, variam pelas variantes atmosféricas,

pela estação do ano e variam pela utilização que fazemos da luz artificial. A obra

ganha vida com essas interacções luminosas, as expressividades constroem emoções

diversas que fazem da vivencia arquitectónica coisa complexa. A obra relaciona-se

com a natureza de modo inequívoco, passa a ser parte de realidade superior, a

realidade da luz que comanda o cosmos.

Fig.- 87- Nk’Mip Desert Cultural Centre, Osoyoos, Canada, HBBH Architecs, 2006. A diferença entre a iluminação

natural e a luz artificial marca a entrada neste centro cultural. A primeira flui naturalmente, marcando a entrada,

contudo, e sem perca de luz, o carácter da iluminação artificial, com a sua luz quente e os seus focos mais limitados,

anunciam a entrada no espaço museológico. Fonte: http://www.archdaily.com

Os eco-materiais não são distintos dos restantes materiais, contudo a sua relação de

respeito pela sacralidade da coisa natural, dá-lhes especial significado. Com eles, o

sentido de construir colaborando com a Terra ganha um significado concreto. Com

eles, a materialidade da construção concretiza o desígnio de complementar e melhorar

o meio existente.

Obviamente, perante a forma arquitectónica, as materialidades não se distinguem,

sejam ou não respeitadoras do meio. Um vidro é um vidro, seja ele proveniente da

reciclagem ou seja ele novo, um tijolo que gaste menos energia não se destaca de

outro que seja muito consumidor da mesma no seu fabrico, e por aí fora. Contudo os

materiais vernaculares, com as suas texturas muito ligadas ao lado telúrico da

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expressividade construída, ganham uma expressividade diferenciada. A sua intrínseca

ligação à intemporalidade matérica da natureza, com suas texturas ainda próximas da

sua criação natural, reforça esse carácter, pois essas texturas vão expressar-se como

os elementos da natureza na sua relação com a luz que os ilumina.

Outro grupo de materiais que ganha expressividades únicas na sua relação com a

luminosidade, são alguns dos materiais de nova tecnologia, uma parede que se

comporte como um ser vivo, adaptando-se á realidade existente, alterando a sua

forma ou cor de acordo com a luz que recebe e precisa, vais sem dúvida reforçar esse

lado de ligação e aceitação da realidade natural como parte fundamental da nossa

vida.

Dado imutável na criação arquitectónica continuará a ser a realidade que as obras por

nós concebidas só ganharão todo o seu sentido quando devidamente iluminadas. É

essa luz que permite que o edificado dialogue com o homem, contando-lhe a sua

história e transmitindo-lhe as suas emoções e a sua poesia. É através da luz que a

obra nos permite, enquanto autores, consubstanciar a nossa vontade de mostrar que

podemos construir essa nova realidade que conceptualizamos para um Homem

melhor e mais feliz.

Fig.- 88- I’m lost in Paris, Paris, França, R&S(ien), 2008. Luz e natureza, entidades inseparáveis, aqui na reformulação

de um laboratório, equipamento de artificialidade intrínseca à nossa era tecnológica, o colectivo de arquitectos

R&S(ien) desenvolve a natureza, equilibrando a artificialidade do sitio, banhando-o com uma luz coada pela vegetação.

A atmosfera criada equilibra então natureza e artificialidade, quase como metáfora do que pretendemos como para o

nosso futuro. Fonte: http://www.archdaily.com

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4- CONCLUSÃO

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4.1- DA EXPRESSIVIDADE.

A utilização cada vez mais frequente de eco-materiais é consequência de múltiplas

solicitações, desde as crescentes necessidades motivadas pelo aumento populacional,

à expansão dos níveis de conforto e consumo originados pelo incremento da

industrialização, passando pela globalização dos processos de consciencialização

ambiental, grandemente alicerçados pela evidência da crise climática e profundamente

reforçados pelas consequências económicas da progressiva exaustão dos recursos

naturais e energéticos.

A implementação do uso de eco-materiais é igualmente consequência da capacidade

humana em responder aos desafios de um modo imaginativo. Este uso da criatividade

humana para resolver desafios, não nos conduz apenas a novas soluções matéricas,

mas leva-nos a reutilizar técnicas ancestrais. Esta capacidade de reutilizar e inventar

soluções, consubstancia uma resposta em termos das materialidades construtivas,

muito próxima daquilo que tem sido a resposta global às consequências da crise

ambiental.

Tal como na resposta à crise energética, onde no passado dependemos quase

exclusivamente do carvão e do petróleo, agora encontramo-nos perante uma

tendência que procura a resposta ao problema energético em múltiplas fontes: do

eólico, ao hídrico, passando pelo solar, pelo nuclear, quer com a tradicional fissão

nuclear ou então na procura da fusão nuclear, pelos hidrocarbonetos com captura e

sequestro do CO2 emitido sem descurar a biomassa e os aproveitamentos de

resíduos. Na resposta às necessidades matéricas da edificação, conforme vimos, a

resposta tem sido alicerçada numa multiplicidade de diferentes estratégias.

Sucintamente encontramos cinco situações distintas: em primeiro lugar podemos

constatar que numerosos eco-materiais não trazem novas expressividades no seu uso

no fenómeno arquitectónico pois eles resultam de um update tecnológico de materiais

tradicionais de construção, sendo que essa actualização tecnológica não alterou as

características perceptíveis das matérias originais. Uma alvenaria cerâmica que utilize

uma cozedura energeticamente eficiente, ou cujas matérias-primas provenham de

reciclagem, não se apresenta uma expressividade distinta das alvenarias cerâmicas

menos eficientes de um ponto de vista sustentável. O mesmo se passa em relação a

numerosos outros materiais como o vidro, o alumínio o aço ou betão. Contudo, apesar

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da expressividade visual e da textura de tais materiais não se distinguir dos originais, a

sua utilização é elemento significante. Essa significância é atingida porque na

conceptualização da obra, a importância de projectar tendo em mente um futuro

melhor foi considerada, e isso é factor de enriquecimento da complexidade e

expressividade do projecto e da obra.

Outra estratégia de utilização de eco-materiais tem sido caracterizada pela

recuperação da utilização de materiais ditos vernaculares. Esta reabilitação no uso de

materiais vernaculares tem assentado na essência comum de todas as arquitecturas

vernaculares. Todas as arquitecturas vernaculares são por norma arquitecturas

alicerçadas na escassez de recursos e profundamente embrenhadas no seu habitat. A

eficiência com que as arquitecturas tradicionais e vernaculares lidam com essa

escassez, quer por via da sua eficácia bioclimática, quer por via do uso regrado com

utilizam os materiais, tem sido inspiradora de respostas sustentáveis para a

problemática da construção.

Esta classe de materiais tem uma expressividade peculiar, pois a sua proximidade

com o meio, enfatiza sua ligação ao habitat onde se inserem. Esta relação de

adjacência com o habitat envolvente, aliada a uma eficiência espartana na utilização

de recursos naturais, fornece às obras construídas com os eco-materiais vernaculares,

uma característica única, elas constroem-se colaborando com a terra.

Esta expressividade consubstancia uma das mais relevantes mudanças políticas e

filosóficas que o progressivo processo de consciencialização ambiental tem

implementado, ela concretiza o desejo de respeitar o planeta e construir em harmonia

e complementando o meio. Neste caso a eficiência expressiva dos eco-materiais

vernaculares também é reforçada por motivos culturais. A utilização de matérias

habitualmente associadas a um passado, que no nosso imaginário colectivo era tempo

de harmonia perdida, reforça na nossa percepção, a vontade de criar um futuro que

recupere essa harmonia perdida. Pelos motivos atrás expostos os eco-materiais

vernaculares constroem expressividades significantes, marcando a imagem das

construções que o utilizam de um modo fortíssimo.

Em terceiro lugar, em alguns dos eco-materiais reciclados, como na utilização para

construção de garrafas PET, reaproveitamento de contentores, ou na reutilização de

materiais reciclados de construção, como na utilização de madeiras antigas ou no

aproveitamento genérico de elementos reciclados de construção, podemos presenciar

duas classes de expressividades diferentes. A utilização de resíduos da sociedade de

consumo aproveitados como recursos para construir sem processamento industrial,

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descobrimos imaginativas soluções construtivas. Sendo que estas adquirem um

carácter totalmente novo, pois a sua utilização é recente a sua utilização

arquitectónica, e as soluções encontradas proporcionam a surpresa das coisas quase

novas. Digo quase novas pois desde meados do Sec XX numerosos artistas plásticos

já exploravam este tipo de expressividade.

Por outro lado a utilização de resíduos de construção, pavimentos, caixilharias,

alvenarias, etc., não sendo fenómeno recente, aporta à obra a complexidade da

passagem do tempo de alguns dos elementos nela utilizados, atingindo assim a obra,

uma complexidade acrescida que multiplica a expressividade com que obra dialoga

com o homem.

Em quarto lugar verificamos que expressividades fortíssimas são atingidas pelos

materiais de nova tecnologia. Em boa parte, essas expressividades, por mais

paradoxais que se possam apresentar, são atingidas porque esses materiais

mimetizam processos naturais. A adopção destes processos, quer seja ao nível da sua

estrutura, muitas vezes inspirada em elementos biológicos, quer pela adaptação com

que reagem às condicionantes atmosféricas, regulando a sua forma, cor ou estrutura

interna para proporcionarem níveis de conforto e segurança adequados aos seus

utilizadores é resultado de investigações, onde a tecnologia que é desenvolvida

reflecte um reconhecimento e valorização dos processos que a natureza nos oferece.

Com a utilização destes novos materiais, que devido à sua capacidade de adaptação

às necessidades, minimizam a utilização de recursos e de energia, atinge-se níveis de

expressividade singulares. Por um lado, e em simultâneo, eles afirmam a sua

sofisticação tecnológica, materializando o engenho do ser humano em resolver os

problemas e inovar, por outro lado, pela sua eficiência e respeito pelo ambiente, eles

afirmam a vontade de construir um futuro melhor.

Em quinto lugar, temos o caso singular dos materiais bio-construídos, que se

distinguem de toda a construção tradicional, pois a matéria construtiva não é

manufacturada, ela é cultivada, logo é ser vivo. A sua principal característica

expressiva reside na incorporação de elementos biológicos na artificialidade da

construção. Estes elementos quando cultivados, começam por constituir uma espécie

de jardins ou cultura de inegável artificialidade, mas pouco tempo depois da sua

cultura, estes espaços são rapidamente apropriados por numerosas espécies de

insectos, répteis, aves e pequenos mamíferos criando assim ecossistemas

autónomos, onde a vida floresce.

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Esta característica altera o paradigma da construção, pois por norma cada vez que

edificávamos, retirávamos espaço ao entorno natural ou agrícola. E essa alteração de

modelo, é per sí, uma expressão grandiloquente, profundamente revolucionária no

modo como encaramos o fenómeno arquitectónico, sendo uma das respostas mais

expressivas e significantes que o campo dos eco-materiais nos apresenta.

A variedade com que nos podemos expressar utilizando eco-materiais, criando

arquitecturas plenas de emoções e significados é quase ilimitada. A sua variedade

ultrapassa a multiplicidade dos materiais não ecológicos, muitos eco-materiais

ultrapassam igualmente as solicitações dos materiais não ecológicos. Mas a

derradeira diferença, encontra-se na capacidade dos eco-materiais nos possibilitarem

a esperança de continuar a construir sem exaurir recursos. Esta é, em última análise,

a grande expressividade dos eco-materiais. A sua utilização permite-nos projectar

obras complexas de expressividade que reflectem a formação humanista dos

arquitectos, pois no conceito do projecto e da obra, encontramos a vontade de

respeitar as gerações que virão.

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4.2- DA SUSTENTABILIDADE.

Contudo, e apesar destas múltiplas e variadas expressividades que a introdução de

eco-materiais no projecto de arquitectura proporciona, retemos um conceito, a

utilização de eco-materiais per sí não garante a sustentabilidade de uma edificação. A

sustentabilidade na construção é fenómeno mais complexo, ele depende de múltiplos

factores, que vão do desenho bioclimático, à eficiência no uso da água, produção

energia, aproveitamento de águas residuais, da sua localização, do uso do solo, da

inserção em redes de transporte, dos sistemas de aproveitamento de resíduos, da

envolvente social, toxidade das matérias da construção, acessibilidades, etc., etc.

A procura de uma arquitectura sustentável implica também que devamos acrescentar

novas e complexas funções à tríade Virtrúviana, pois para além Firmitas, Utilitas e

Venustas, o projecto sustentável deve produzir e economizar energia, ser eficiente na

utilização de recursos, salvaguardar o solo, ter a possibilidade de alojar várias

funções, constituir-se para regenerar o ambiente, quer do ponto de vista da

biodiversidade, quer do ponto de vista da regeneração social e económica, entre

outras e cada vez mais complexas solicitações.

Para atingir estes objectivos, o projecto deve incorporar novas metodologias, ele deve

medir e contabilizar todos os seus custos, utilizando análises do ciclo de vida, apostar

na utilização de produtos certificados quer na construção, quer na manutenção do

edificado, quer do seu desmembramento quando o seu ciclo de vida terminar. Isto

implica que o arquitecto, e as equipas pluridisciplinares que integram o projecto,

devem aferir, medir e comparar as diversas opções que tomam para atingirem as

soluções mais sustentáveis, pois de outro modo as intenções podem não passar disso

mesmo. Devem começar a preparar o futuro pois parte destas medidas começarão a

ser implementadas progressivamente por via legislativa.

Deve acima de tudo o arquitecto encarar estas questões como parte integrante da

razão de ser da sua profissão, pois será sempre essência da arquitectura resolver

problemas do habitar, logo na equação inicial do problema que qualquer projecto

constitui, a sustentabilidade é problema maior dos nossos tempos.

É igualmente problema ético da praxis da arquitectura, pois os nossos actos sempre

perduraram durante um espaço de tempo longo. Tal implica que as consequências dos

nossos erros e omissões, não se extinguem na obra. Erros e omissões que cada vez

mais implicam consequências que interferirão na vida dos que nos seguirão.

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Dadas as necessidades de construção a nível mundial, motivadas pelo exponencial

aumento populacional do planeta e consequente acréscimo das pressões urbanas, as

edificações que projectarmos irão em boa parte determinar o futuro do nosso planeta.

Uma postura como tem sido a de boa parte dos arquitectos, baseada num sistema

onde as afirmações de individualismo criativo sem preocupações de sustentabilidade

alicerçam os role models da profissão, constitui claramente um sintoma da doença que

urge combater. Urge combater, pois essa situação constitui um reflexo doentio de uma

sociedade de consumo imediato, onde a satisfação imediata se sobrepõem a

considerações de ordem mais substancial. Sociedade essa, que em ultima analise é a

responsável pela vertiginosa insustentabilidade em que vivemos.

No fundo as questões da sustentabilidade são de ordem política, económica e social,

mas tal não deve servir de desculpa para a inacção. As sociedades são um reflexo de

múltiplas e complexas partes, são igualmente fenómeno mutável, sendo que essa

mutação é originada gradualmente pelas acções individuais das suas partes. Se as

dificuldades causadas pela complexidade das situações fossem impeditivas de tomar

medidas e combater por elas, ainda viveríamos num mundo ditatorial. Mas a história

conta-nos que as grandes ideias, como a democracia, ou os direitos do homem,

contêm em si uma força que paulatinamente vai derrubando os obstáculos.

Conforme já abordámos, as tendências de mudança já se fazem sentir no nosso tecido

político, económico e social, sendo que agora se começam a anunciar lentamente na

esfera da produção arquitectónica. Esta lentidão na resposta dos arquitectos também

não é fenómeno novo, basta lembrarmo-nos que a resposta arquitectónica à revolução

industrial começou cerca de 150 anos após o inicio da mesma, e começou no seu

início muito a reboque de obras de engenharia. Lembremo-nos que enquanto os

arquitectos discutiam as virtudes dos neo-revivalismos, em 1851 o Eng. Joseph

Paxton desenhava o Palácio de Cristal, revolucionando o desenho da coisa

arquitectónica e lançando pistas para as arquitecturas que haveriam de vir.

Contudo, passadas poucas décadas, e num mundo que vivia o tempo de modo mais

vagaroso, a resposta da arquitectura foi fulgurante, modificando o mundo que

conhecíamos. Esta resposta alicerçada no irromper do movimento moderno, absorveu

as conquistas que as engenharias haviam desenvolvido, aglutinando-as numa reflexão

humanista que ultrapassou a mera conquista técnica.

Tal como nos finais do Sec XIX, hoje espera-se da arquitectura uma resposta

semelhante, que construa uma resposta humanista para este difícil desafio. Esta

resposta terá, como habitualmente, de se alicerçar, por um lado no desenvolvimento

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científico e tecnológico a que se assiste, e por outro lado complementando-o com o

seu desígnio criativo por excelência, sendo esse motivado pela necessidade de

conceptualizar a visão de um futuro melhor e mais feliz nos projectos que elaboramos.

Conforme vimos, hoje em dia as questões da sustentabilidade estão muito centradas

em áreas que habitualmente encontramos longínquas da esfera de preocupações da

maior parte dos arquitectos, sendo notórios esforços que as diversas áreas das

engenharias têm dedicado a esta problemática.

Por vezes, a complexidade da aferição da sustentabilidade, pode afigurar-se ao

arquitecto de formação tradicional como uma perda de poder no desenrolar do

processo criativo, pois a mensurabilidade das consequências é etapa complexa e que

muitas vezes foge ao domínio técnico do arquitecto. Convém argumentar perante tal

posição, que o mesmo tipo de argumentação foi proferido no passado em relação a

numerosos aspectos do projecto que hoje consideramos imprescindíveis na resposta

do mesmo, tais como as questões de segurança, acessibilidade, respeito e

preservação do património, entre outras solicitações.

Verificamos que a adopção, quer por via voluntária, quer por via legislativa, dessas

condicionantes de projecto, não interferirá na capacidade do fenómeno arquitectónico

nos continuar surpreender com obras inovadoras de elevada qualidade.

Sendo o acto do projecto, a nível conceptual, um modo de projectarmos o ideal de um

futuro melhor, para um Homem mais ditoso, as questões da sustentabilidade cumprem

e complementam esse desígnio ético do projecto. Questões essas, da

sustentabilidade, que traduzirão a continuação de uma nobre tradição da história da

arquitectura, a tradição de responder a habitats insatisfatórios, com respostas que

criem novas linguagens, desenvolvam novas complexidades e construam a sedutora

história da arquitectura.

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4.3- DOS LIMITES DA INVESTIGAÇÃO.

No decorrer desta dissertação, procurámos encontrar fontes directas para elaborar a

nossa investigação. Tal estratégia encontrou tanto de eficácia como dificuldades;

Passemos a explaná-las;

Em relação às questões da sustentabilidade encontrámos numerosa bibliografia, com

um fácil acesso a numerosos artigos, teses científicas e relatórios de organizações

multinacionais que se debruçam sobre a temática, pois trata-se de uma área onde a

premência da crise ambiental, climática e de recursos tem motivado numerosas

investigações. Neste campo o acesso à informação de relevância científica foi

bastante facilitado, devendo contudo ressalvar que face aos esforços científicos que

as questões da sustentabilidade motivam, deve este ser um campo onde a

actualização de conhecimentos deve ser permanente.

Relativamente às questões da aplicação e desenvolvimento de eco-materiais na

construção e na arquitectura, encontrámos igualmente numerosa investigação

publicada. Devemos ressalvar que a maioria destas publicações tratam a questão dos

eco-materiais de um ponto de vista meramente técnico, enunciando as suas

qualidades térmicas, económicas, ambientais, energéticas ou de poupança de CO2.

Quanto às estratégias de sustentabilidade no projecto, a produção científica é vasta e

está acessível. Mais uma vez recordamos que este é um campo de conhecimento em

desenvolvimento acelerado e como tal é fundamental uma actualização permanente

dos nossos conhecimentos.

Relativamente aos meios de pesquisa e informação acerca das obras, a internet

revelou-se de máxima utilidade. A existência de páginas dedicadas à arquitectura e à

sustentabilidade permite uma actualização diária da produção arquitectónica mundial.

Esta circunstância facilitou imenso esta investigação.

A parte mais complexa e de maior dificuldade nesta investigação foi a parte relativa às

questões da expressividade do fenómeno arquitectónico, pois a produção cientifica é

escassa, o que nos obrigou a construir o nosso discurso baseando-nos em poucas

fontes. Encontrámos que esta questão, profundamente relacionada com as questões

das linguagens arquitectónicas deveria merecer um maior aprofundamento, pois das

expressividades da coisa, nascem as emoções com que nos relacionamos em

primeira instância com o meio que nos circunda, quer seja ele o meio natural, ou o

edificado.

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4.4- DOS DESENVOLVIMENTOS FUTUROS.

A premência da sustentabilidade tem conduzido a muitas alterações no modo como

encaramos a nossa presença no planeta. Estas mudanças tem sido precedidas por

numerosos avanços técnicos, quer ao nível dos materiais, quer do desenho

bioclimático, quer ao nível das funções do edificado. Estes avanços contêm em si uma

enorme vontade de alterar a actual situação ambiental, propondo novos modos de

encarar o planeta, propondo modificar o nosso consumo de recursos, alterando

conceitos económicos, políticos e modelos de produção de modo a resolver este

importante desafio da humanidade.

No seu âmago a resposta a este desafio procura a reinvenção de um mundo melhor,

onde a humanidade possa prosperar de maneira mais harmoniosa. Esta vontade está

presente em todo o projecto de arquitectura, pois nesse acto, o acto de projectar, e

para além das soluções técnicas, o arquitecto conceptualiza essa vontade no seu

labor. Nos dias que correm, a sustentabilidade entra recorrentemente na génese dos

conceitos que nos guiam no projecto.

A vontade de construir um mundo sustentável começa a alterar o modo com que se

projecta, e tal, na nossa opinião, não resulta apenas na resolução de problemas

técnicos. As estratégias, métodos, técnicas e matérias que consubstanciam a

arquitectura sustentável, para além dos óbvios ganho ambientais, potenciam tanto a

sua riqueza expressiva como a complexidade do projecto arquitectónico. Ambas,

complexidade e riqueza expressiva, são reflexo dos desafios que se colocam à

humanidade e que o arquitecto tenta responder na medida da sua responsabilidade

social e ética.

Esta resposta está a ser dada de modo cada vez mais consistente, cada vez mais os

arquitectos desenvolvem o seu labor com essa intenção. E este fenómeno corre todos

os continentes, e atravessa arquitectos com as mais variadas formações. Nas obras

que seleccionámos para esta investigação podemos aferir isso mesmo.

No decorrer da investigação que realizámos durante a elaboração desta dissertação,

observámos pistas que nos levam a crer que a implementação de práticas

arquitectónicas sustentáveis, estão a desenvolver linguagens arquitectónicas

especificas e que esse poderá ser um campo de investigação a desenvolver.

Pelo que é nossa vontade desenvolver essa pesquisa em investigações futuras, no

sentido de documentar as profundas alterações que as questões da sustentabilidade

trazem aos conceitos e à linguagem da arquitectura.

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DECLARAÇÃO

A dissertação “ As qualidades expressivas do eco-materiais” foi escrita utilizando trinta e duas mil e cinquenta e quatro palavras escritas em cento e catorze páginas

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ANEXOS:

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Nota Neste anexo estão reunidas as 50 obras que reúnem as seguintes condições:

Utilizam eco-materiais.

Cumprem critérios latos de sustentabilidade.

Contém uma qualidade arquitectónica relevante.

No decurso desta investigação foram visionadas centenas de obras de produção

recente, construídas após 2000, sendo estas as obras que encontramos com maior

relevância, tal não impede que não possam existir outras obras com igual ou maior

relevância.

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A-2

Ficha de Obra: 1 Autor: Shigeru Ban & Frei Otto

Obra: Pavilhão do Japão Expo 2000

Localização: Hanover, Alemanha

Ano: 2000

Breve descrição: Obra icónica de Shigeru Ban & Frei Otto para a Expo de Hanover, caracterizada pela sua cobertura, misto de copula geodésica e de cobertura tênsil, representa apropriadamente a capacidade do engenho humano em encontrar novas e surpreendentes soluções. Fotografias:

Ficha de Obra: 2 Autor: Nicholas Lacey & Partners

Obra: Container city

Localização: Londres, Reino Unido

Ano: 2001

Breve descrição: Primeiro dos projectos da Container city, construídos reciclando contentores marítimos, propõem soluções rápidas e económicas de habitação, escritórios e turismo. (05 das matérias utilizadas são de origem sustentável e a eficiência energética é admirável. Fotografias:

Page 133: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Page 134: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-4

Ficha de Obra: 5 Autor: Kenso Kuma

Obra: Plastic House

Localização: Meguro-ku, Tokyo , Japão

Ano: 2002

Breve descrição: Moradia construída com utilização intensiva de plásticos reciclados, das caixilharias, passando por revestimentos de fachadas, até ao ensombramento. Fotografias:

Ficha de Obra: 6 Autor: Kenso Kuma

Obra: Great bamboo Wall

Localização: Bejing, China

Ano: 2002

Breve descrição: Moradia para hóspedes do corpo diplomático, construída com bambu de floresta sustentável, estrutura parcial em aço reciclado (perfis soldados) e com utilização intensa de materiais locais. Fotografias:

Page 135: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-5

Ficha de Obra: 7 Autor: Atelier kempe Thil

Obra: Pavilhão da Holanda

Localização: Rostock, Alemanha

Ano: 2003

Breve descrição: Pavilhão da Holanda na International Garden Exhibition IGA 2003 explora a integração de elementos vegetais no projecto arquitectónico. Fotografias:

Ficha de Obra: 8 Autor: Lassila Hirvilammi

Obra: Igreja

Localização: Kärsmäki, Finlândia

Ano: 2004

Breve descrição: Igreja edificada no mesmo local onde em 1841 tinha existido o local de culto da comunidade, tendo sido construída utilizando técnicas construtivas do Sec. XIX na Finlândia. É notável a expressividade que as diferentes técnicas utilizadas dão á madeira. Fotografias:

Page 136: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-6

Ficha de Obra: 09 Autor: Donovan Hill, Architects

Obra: F2 House

Localização: Fingal, Austrália

Ano: 2006

Breve descrição: Moradia multifamiliar com forro exterior e caixilharias em madeira de floresta sustentável, estrutura parcial em madeira de floresta sustentável e reutilização de materiais locais. Fotografias:

Ficha de Obra: 10 Autor: Kieran Timberlake

Obra: Loblolly House

Localização: Chesapeake Bay,

Maryland, EUA

Ano: 2006

Breve descrição: Casa de férias, com fundação em madeira de pinho, estrutura superior em alumínio reciclado, madeira

de floresta sustentável, casa auto-suficiente energeticamente, uma das obras paradigmáticas da

arquitectura sustentável nos E.U.A.

Fotografias:

Page 137: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-7

Ficha de Obra: 11 Autor: Anna Heringer

Obra: Meti School

Localização: Rodrapur, Bangladesh

Ano: 2006

Breve descrição: Parede em taipa, estrutura em bambu, tecidos e tapeçaria local, tintas artesanais, A escola foi construída pela população local., premio de arquitectura Fundação Aga Khan 2007 Fotografias:

Ficha de Obra: 12 Autor: Shigeru Ban

Obra: Papertainer Museum

Localização: Seoul, Korea do Sul

Ano: 2006

Breve descrição: Nesta obra, como é característico no trabalho de Shigeru Ban, a edificação é sustentável pois é esse o desígnio do arquitecto, Tubos de papel e contentores constroem, a genialidade do autor, faz o resto. Fotografias:

Page 138: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-8

Ficha de Obra: 13 Autor: HBBH Architects

Obra: Centro Cultural do Deserto Mk’Mip.

Localização: Osoyoos, Canada

Ano: 2006

Breve descrição: Este centro cultural do deserto Mk’Mip procura preservar a herança dos povos nativos, A utilização extensiva de muros em taipa, confere uma enorme capacidade de integração, quer na paisagem, quer pelo respeito pelas tradições que pretende preservar. Fotografias:

Ficha de Obra: 14 Autor: 2012 Architechten

Obra: The Recyclops

Localização: Amsterdam, Utrecht,

Vlaardinger, Holanda

Ano: 2007

Breve descrição:

Reaproveitamento de cubas de cozinha provenientes de demolição para instalações temporárias de arte pública, depósito de aproveitamento de águas pluviais e apoios em parque público.

Fotografias:

Page 139: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-9

Ficha de Obra: 15 Autor: IwamotoScott Architecture

Obra: Voussoir Cloud

Localização: Los Angeles, EUA

Ano: 2008

Breve descrição: Estrutura portante em madeira laminada ultra leve, de origem certificada, explora as potencialidades de uma construção leve, tecnologicamente avançada. Fotografias:

Ficha de Obra: 16 Autor: E.B. Min, J. L.Day Architects

Obra: Lake Okoboji House

Localização: Lake Okoboji, Iowa,, EUA

Ano: 2008

Breve descrição: Moradia unifamiliar utilizando de madeiras em forros (OSB) e pavimento de floresta sustentável, estrutura em betão com incorporação de 30 % de cinzas de centrais térmicas de carvão. Fotografias:

Page 140: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-10

Ficha de Obra: 17 Autor: Peter Rich

Obra: Mapungubwe

Interpretation Centre

Localização: Mapungubwe,

Africa do Sul

Ano: 2008

Breve descrição: Totalmente construído com materiais sustentáveis, taipa, adobe e madeira Holcim Award for Sustainable Construction Prémio World Building of the Year 2009. Durante o World Architectural Festival de Barcelona

Fotografias:

Ficha de Obra: 18 Autor: Peter Rich

Obra: Mapungubwe visitors

Centre

Localização: Mapungubwe,

Africa do Sul

Ano: 2008

Breve descrição: Totalmente construído com materiais sustentáveis e técnicas tradicionais, taipa e madeira

Fotografias:

Page 141: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-11

Ficha de Obra: 19 Autor: Architects C-Laboratory

Obra: Chen House

Localização: Sanjhih, Taiwan

Ano: 2008

Breve descrição: Casa de apoio para trabalhadores agrícolas, construída em madeira sustentável.

Fotografias:

Ficha de Obra: 20 Autor: Sou Fujimoto

Obra: Abrigo de montanha

Localização: Kamunamoto, Japão

Ano: 2008

Breve descrição: Abrigo de apoio para caminhantes, construído em madeira de proveniência certificada.

Fotografias:

Page 142: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-12

Ficha de Obra: 21 Autor: Pacific Environment Architects

Obra: Yellow Tree House

Restaurante

Localização: Workworth,

Nova Zelândia

Ano: 2008

Breve descrição: Restaurante de inspiração biomimética, construído numa sequóia secular, utiliza madeira laminada em toda a sua construção. Fotografias:

Ficha de Obra: 22 Autor: Plano B

Obra: Casa Arruda dos vinhos

Localização: Arruda dos Vinhos Portugal

Ano: 2008

Breve descrição: Casa unifamiliar integralmente construída estrutura de madeira, paredes exterior em taipa, com isolamento de cortiça, paredes interiores em tabique, rebocos de cal aérea, aproveitamento de resíduos de construção, Apesar do recurso a tecnologias tradicionais, a linguagem é claramente contemporânea. Fotografias:

Page 143: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-13

Ficha de Obra: 23 Autor: Guilhem Eustache

Obra: Casa em Marakesh

Localização: Marrakesh, Marrocos

Ano: 2008

Breve descrição: Casa unifamiliar integralmente construída em taipa, com isolamento de cortiça, paredes interiores em tabique, rebocos de cal aérea, tijoleiras artesanais, Mais uma vez o recurso a tecnologias tradicionais permite linguagens contemporâneas. Fotografias:

Ficha de Obra: 24 Autor: Boltshauser Architekten

Obra: Rauch House

Localização: Schlins,Austria,

Ano: 2008

Breve descrição:

Casa construída em taipa aparente, quer no exterior, quer no interior, procurando explorar toda a sua expressividade, obra notável pela atmosfera criada.

Fotografias:

Page 144: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-14

Ficha de Obra: 25 Autor: R&S(ien)

Obra: I’m lost in Paris

Localização: Paris, França

Ano: 2008

Breve descrição: Reformulação de laboratório num saguão de Paris, O colectivo R&S(ien) devolve a natureza a esse ícone do nosso desenvolvimento civilizacional, o laboratório. Fotografias:

Ficha de Obra: 26 Autor: Skene Catling, de La Peña, Architects

Obra: The Dairy House

Localização: Somerset, Reino Unido

Ano: 2009

Breve descrição: Acrescento a casa existente, utilizando madeira de floresta sustentável não tratada e reaproveitamento de resíduos de construção. Fotografias:

Page 145: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-15

Ficha de Obra: 27 Autor: Make Architecs

Obra: Casa Gary Neville

Localização: Bolton, Reino Unido

Ano: 2009

Breve descrição: Baseado em estruturas megalíticas da vizinhança, este projecto constrói uma casa enterrada, onde para além dos materiais locais e da eficiência energética, se constroem espaço qualificados homenageando o património local. Fotografias:

Ficha de Obra: 28 Autor:

KARAWITZ , Architects

Obra: Passivhaus

Localização: Bessancourt, França

Ano: 2009

Breve descrição: Moradia unifamiliar em madeira de floresta sustentável, Bambu floresta sustentável para

ensombramento exterior, estrutura em madeira laminada, casa com saldo energético positivo.

Fotografias:

Page 146: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-16

Ficha de Obra: 29 Autor: TAMassociati, achitecture

Obra: Centro médico

Localização: Soba, Khartoum, Sudão

Ano: 2009

Breve descrição: Centro médico de apoio a refugiados, construído com contentores marítimos e materiais locais.

Fotografias:

Ficha de Obra: 30 Autor: Coo Planing

Obra: Hamadera House

Localização: Sakai, Japão

Ano: 2010

Breve descrição: Casa unifamiliar integralmente construída com contraplacado de madeira, incluído estrutura, revestimentos exteriores e interiores, pavimentos e mobiliário Fotografias:

Page 147: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-17

Ficha de Obra: 31 Autor: Daniel Moreno, Arquitecto

Obra: Atelier

Localização: Quito, Equador

Ano: 2009

Breve descrição: Recuperação económica de espaço utilizando resíduos de demolições, tais como varões de aço, e madeira usada. Fotografias:

Ficha de Obra: 32 Autor: James & Mau for Infiniski

Obra: Casa Manifesto

Localização: Curacavi, Chile

Ano: 2009

Breve descrição: Casa unifamiliar notável, integralmente construída com contentores, paletes usadas e outros elementos reciclados, edificada em 90 dias, é prova que economia de construção, sustentabilidade e qualidade arquitectónica são possíveis e desejáveis. Fotografias:

Page 148: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 33 Autor: Murman Arktitekter

Obra: Restaurant Tusen

Localização: Ramundberget , Suécia

Ano: 2009

Breve descrição: Construído com troncos da floresta circundante, adopta a forma de um cone seccionado,. Fotografias:

Ficha de Obra: 34 Autor: Woha Architects

Obra: Alila Villas Uluwatu

Localização: Bali, Indonésia

Ano: 2009

Breve descrição: Resort com forro exterior e caixilharias em madeira de floresta sustentável, estrutura parcial em madeira de floresta sustentável, reutilização de materiais locais. Fotografias:

Page 149: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 35 Autor: Riccardo Giovaneti

Obra: Plasticamente

Paviion

Localização: Varias

Ano: 2009

Breve descrição: Estrutura portátil para promoção de filme da Disney, totalmente realizada com elementos de plástico reciclado. Fotografias:

Ficha de Obra: 36 Autor: Pieta-Linda Auttila

Obra: Wisa Hotel

Localização: Helsínquia, Finlândia

Ano: 2009

Breve descrição: Projecto de Design Hotel integralmente construído em madeira, explorando a tradição Escandinávia da madeira laminada. Trabalho de grande virtuosismo, que tira partido de um modo surpreendente da possibilidades construtivas madeira laminada. Fotografias:

Page 150: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-20

Ficha de Obra: 37 Autor: Ateliereen Arcgitecten

Obra: Viewing Tower

Localização: Reusel, Holanda

Ano: 2009

Breve descrição: Torre de apoio a zona de lazer numa floresta pública, realizada em estrutura de aço, e toros de madeira de floresta sustentável, serve igualmente como torre de escalada. Fotografias:

Ficha de Obra: 38 Autor: Bouman Architects

Obra: Expansão de centro de dia.

Localização: Delft, Holanda

Ano: 2009

Breve descrição: Ampliação de centro de dia para idosos, sendo que a ampliação reinventou a utilização do colmo. Nesta obra ele é empregue como revestimento de paredes, isolando termicamente a ampliação e tirando partido expressivo da sua singular textura. Fotografias:

Page 151: As qualidades expressivas dos eco-materiais

A-21

Ficha de Obra: 39 Autor: Shigeru Ban

Obra: Pavilhão Artek

Localização: Milão, Itália

Ano: 2009

Breve descrição: Mais possibilidades expressivas para construir em papel, desta feita sem tubos, apenas com papel e cartão, Shigeru Ban continuam a explorar os limites da leveza. Fotografias:

Ficha de Obra: 40 Autor: Beton Architekt

Obra: Capela em Tarnow

Localização: Tarnow, Polónia

Ano: 2009

Breve descrição: Neste caso um conhecido escritor polaco decidiu financiar uma capela na sua propriedade, construída com madeira local e executada pela população. Pelo exterior a madeira não é tratada, apresentando deste modo um expressivo cinzento. Fotografias:

Page 152: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 41 Autor: Kutsuhiro Miyamoto

Obra: Gather House

Localização: Tokio, Japão

Ano: 2009

Breve descrição: Reabilitação de casa em madeira, mantendo-se os principais elementos construtivo, a casa foi reformulada requalificando as fachadas e os interiores utilizando o bambo como elemento principal. O Arq. procurou explorar os ritmos do bambo e das tensões que provoca na fachada Fotografias:

Ficha de Obra: 42 Autor: Gary Chang

Obra: Apartamento Com 24 divisões

Localização: Hong Kong, China

Ano: 2009

Breve descrição: Num apartamento de 40m2 e através de um engenhoso sistema de paredes moveis, e moveis reclináveis, o proprietário consegue todas as comodidades da vida moderna, sem consumir espaço e recursos. Fotografias:

Page 153: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 43 Autor: Mark Merer

Obra: Welham Studios

Localização: Welham, Reino Unido

Ano: 2009

Breve descrição: Neste projecto Mark Merer, procura uma simbiose entre o prado que circunda a propriedade e a construção, para o efeito utiliza uma cobertura verde que asseguram essa continuidade, a utilização de madeira no revestimento, reforça essa vontade de integração. Fotografias:

Ficha de Obra: 44 Autor: Miralles Tagliabue

Obra: Pavilhão da Espanha

Localização: Shangai, China

Ano: 2010

Breve descrição: Pavilhão da Holanda na Expo 2010, exploração expressiva dos ritmos do trabalho em vime. Fotografias:

Page 154: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 45 Autor: Aires Mateus

Obra: Casas da Areia

Localização: Comporta, Portugal

Ano: 2010

Breve descrição: Casas de exploração turística em zona protegida, construídas socorrendo-se de técnicas e materiais tradicionais, A utilização da areia como pavimento das zonas de estar conferem-lhe uma atmosfera única. A utilização da cana como elemento de construção reforça-lhes a integração com a paisagem. Fotografias:

Ficha de Obra: 46 Autor: José Maria Chofre

Obra: Qualificação de empena

Localização: San Vicente del Raspeig , Espanha

Ano: 2010

Breve descrição: Uma empenha desolada e inóspita é transformada numa parede com vida. Este tipo de intervenções devolve a natureza à urbe. Fotografias:

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Ficha de Obra: 47 Autor: Ensemble Studio

Anton Garcia- Abril

Obra: The Trufle

Abrigo de montanha

Localização: Costa da Morte, Galiza

Espanha

Ano: 2010

Breve descrição: Abrigo inspirado no Cabanon de Le Coubusier, ao nível do seu programa, desta feita explorando as qualidades expressivas do betão, com adição de 30% cinzas de centrais térmicas, na sua cofragem foram utilizados fardos de palha que depois serviram de alimento a um vitelo durante um ano. Fotografias:

Ficha de Obra: 48 Autor: Rintala Eggertsson Architects

Obra: Victoria & Abert Museum

Localização: Londres, Reino Unido

Ano: 2010

Breve descrição: Sobre o tema, arquitectos desenham pequenos espaços, surge uma biblioteca numa escadaria, brilhantemente integrada no Museu, totalmente construída com madeira sustentável. Fotografias:

Page 156: As qualidades expressivas dos eco-materiais

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Ficha de Obra: 49 Autor: Heatherwick Studio

Obra: Aberystwyth Creative

Units

Localização: Aberystwyth ,

Reino Unido

Ano: 2010

Breve descrição: Conjunto de ateliers para industrias criativas, construído em estrutura de madeira, isolamentos térmico sem CFC, revestido com uma finíssima capa em aço inox enrugado. Este revestimento fora do vulgar procura reflectir a floresta circundante, criando um expressivo efeito visual. Fotografias:

Ficha de Obra: 50 Autor: BCHO Architects

Obra: Hearth House

Localização: Seoul, Korea

Ano: 2010

Breve descrição: Obra de atmosfera serena, construída com muro de contenção em betão, restantes paredes em taipa, utilizando madeiras recicladas. Fotografias: