as limitações do método científico: implicações para a educação física

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228 Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, 12(2): 228-48, jul./dez. 1998 CDD. 20.ed. 001.42 121 AS LIMITAÇÕES DO MÉTODO CIENTÍFICO: IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA Benedito PEREIRA * RESUMO A Educação Física tem procurado se afirmar como disciplina acadêmica e profissão recorrendo a algumas estratégias. Por exemplo, tentou-se modificar o seu nome, caracterizar o seu objeto de estudo e desenvolver metodologia própria. Para o seu desenvolvimento enquanto profissão, não encontramos uma ampla discussão desta questão. Este ensaio teve por objetivo discutir o terceiro item através de uma ampla revisão dos principais métodos científicos disponíveis. Constatamos com isso que existe confusão entre métodos e técnicas entre os profissionais da Educação Física e que a metodologia ainda não desenvolveu um método científico isento de problemas. UNITERMOS: Epistemologia; Filosofia da ciência; Hermenêutica; Método científico; Paradigmas; Positivismo; Racionalismo crítico; Pluralismo. INTRODUÇÃO * Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo. A Educação Física (EF) tem discutido, nos últimos 30 anos, questões referentes a essa área ser ciência, profissão ou tecnologia (Henry, 1964; Kokubun, 1995; Manoel, 1986; Rarick, 1967). Essas questões surgiram em função da necessidade que as unidades que compõem uma universidade têm de formar recursos humanos, tanto para a pesquisa científica como para o mercado de trabalho e prestação de serviços à comunidade (Demo, 1997). Dentre essas questões, encontramos as seguintes: a) o que é EF?; b) qual é o seu objeto de estudo?; e c) que metodologias próprias devem ser desenvolvidas pela EF para que se caracterize como ciência (disciplina acadêmica)? O principal objetivo deste ensaio é o de apresentar evidências de que a discussão dessas questões tem assumido uma estratégia pouco eficaz sob o ponto de vista da fiosofia da ciência. Propomos que, antes de discutir essas questões, devemos nos envolver com assuntos metodológicos. Entretanto, com isso não estamos afirmando que a discussão dessas questões não seja importante. Pelo contrário, para se fazer pesquisa, é fundamental que se tenha um objeto de estudos bem definido, assim como os problemas que esse oferece à área a que pertence. Além disso, a área em questão também precisa ser bem definida, principalmente para o exercício profissional e o conhecimento público. Demo (1997) considera que, sem pesquisa, não é possível existir ensino e prestação de serviços, o que torna a pesquisa científica a essência das universidades. Para a ciência e filosofia da ciência, somente a primeira questão não deve ser considerada importante, porque para ambas, o que interessa é a solução de problemas e não a definição correta de uma área (Popper, 1987). De fato, definir e caracterizar os problemas da EF de forma precisa e como próprios dessa área, é mais relevante do que discutir questões definicionais (Popper, 1987). O valor da pesquisa em EF torna-se evidente e vital, principalmente para a formação dos profissionais dessa área, porque, pela pesquisa, podemos motivá-los a pensarem o conhecimento

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Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, 12(2): 228-48, jul./dez. 1998

CDD. 20.ed. 001.42121

AS LIMITAÇÕES DO MÉTODO CIENTÍFICO:IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA

Benedito PEREIRA*

RESUMO

A Educação Física tem procurado se afirmar como disciplina acadêmica e profissão recorrendoa algumas estratégias. Por exemplo, tentou-se modificar o seu nome, caracterizar o seu objeto de estudo edesenvolver metodologia própria. Para o seu desenvolvimento enquanto profissão, não encontramos umaampla discussão desta questão. Este ensaio teve por objetivo discutir o terceiro item através de uma amplarevisão dos principais métodos científicos disponíveis. Constatamos com isso que existe confusão entremétodos e técnicas entre os profissionais da Educação Física e que a metodologia ainda não desenvolveu ummétodo científico isento de problemas.

UNITERMOS: Epistemologia; Filosofia da ciência; Hermenêutica; Método científico; Paradigmas;Positivismo; Racionalismo crítico; Pluralismo.

INTRODUÇÃO

*Escola deEducação Física eEsporteda UniversidadedeSão Paulo.

A Educação Física (EF) temdiscutido, nos últimos 30 anos, questões referentesa essa área ser ciência, profissão ou tecnologia(Henry, 1964; Kokubun, 1995; Manoel, 1986;Rarick, 1967). Essas questões surgiram em funçãoda necessidade que as unidades que compõem umauniversidade têm de formar recursos humanos,tanto para a pesquisa científica como para omercado de trabalho e prestação de serviços àcomunidade (Demo, 1997). Dentre essas questões,encontramos as seguintes: a) o que é EF?; b) qual éo seu objeto de estudo?; e c) que metodologiaspróprias devem ser desenvolvidas pela EF para quese caracterize como ciência (disciplinaacadêmica)? O principal objetivo deste ensaio é ode apresentar evidências de que a discussão dessasquestões tem assumido uma estratégia pouco eficazsob o ponto de vista da fiosofia da ciência.Propomos que, antes de discutir essas questões,devemos nos envolver com assuntosmetodológicos. Entretanto, com isso não estamosafirmando que a discussão dessas questões não seja

importante. Pelo contrário, para se fazer pesquisa, éfundamental que se tenha um objeto de estudosbem definido, assim como os problemas que esseoferece à área a que pertence. Além disso, a áreaem questão também precisa ser bem definida,principalmente para o exercício profissional e oconhecimento público. Demo (1997) consideraque, sem pesquisa, não é possível existir ensino eprestação de serviços, o que torna a pesquisacientífica a essência das universidades. Para aciência e filosofia da ciência, somente a primeiraquestão não deve ser considerada importante,porque para ambas, o que interessa é a solução deproblemas e não a definição correta de uma área(Popper, 1987). De fato, definir e caracterizar osproblemas da EF de forma precisa e como própriosdessa área, é mais relevante do que discutirquestõesdefinicionais (Popper, 1987).

O valor da pesquisa em EF torna-seevidente e vital, principalmente para a formaçãodos profissionais dessa área, porque, pela pesquisa,podemos motivá-los a pensarem o conhecimento

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existente, no sentido de buscar as suas limitações ede proporem soluções. Mas, o que mais interessa éque, através da pesquisa, propiciamos o aprender aaprender permanente, independente do ensinoformal. Nesse sentido, não interessa o tipo depesquisa a ser feito, desde que algum tipo (básica,aplicada ou técnica) seja realizado. Para o filósofoJosef Pieper (citado por Lauand, 1987), o tipo depesquisa característico das unidades acadêmicasdeve ser essencialmente básico e não aplicado outecnológico. Entretanto, Demo (1997) aponta paraa importância da pesquisa mesmo nas unidadescom características profissionalizantes, como namedicina, administração, economia, enfermagem,engenharia e serviços sociais, o que sugere que,atualmente, deve-se também, fazer pesquisaaplicada e tecnológica nas universidades, além dabásica.

A importância de se fazer pesquisapelas unidades acadêmicas tem sido vivenciadapela EF desde o início da década de 60. Isso ficouevidente com a crise acadêmica desencadeada porBryant Conant, em 1963. Bryant Conant, um reitorde Harvard, questionou, naquela época, a presençada EF nas universidades exatamente porque, paraele, a EF não possuía um objeto de estudospróprio.Ou seja, foi alegado com isso, que a EF não tinha oque pesquisar e não deveria permanecer nasuniversidades. A partir deste episódio, Henry(1964) e Rarick (1967) desencadearam ummovimento de valorização acadêmica da EF comouma reação a essa tentativa de excluí-la dasuniversidades. Esse movimento fez com que, aolongo desses 30 anos, a EF produzisse muitoconhecimento através das inúmeras teses edissertações publicadas durante esse tempo. Mas, oque Conant questionou, não foi a competênciaindividual dos professores de EF e sim o conteúdodo conhecimento presente nas teses e dissertaçõesproduzidas naquela época. Portanto, oquestionamento feito por Conant não foi decompetência pessoal dos profissionais dessa área,mas da sua indefinição acadêmica. Conant alegouque o conhecimento produzido não se caracterizavapor ser próprio da EF, podendo ser desenvolvidopor outras áreas. Portanto, se a EF produziu e vemproduzindo, desde então, um conhecimento quenão lhe pertence, essa área precisa definir o quepesquisar.

Duas considerações recentes realçamessa preocupação. A primeira foi retirada de umacitação presente em uma publicação da coleção“Handbook of physiology” , de 1996, que diz oseguinte: “o exercício físico continua a ser um

meio muito eficiente para a exploração dosaspectos integrativos da totalidade das funçõescorporais” . Quando examinamos essa afirmação everificamos que é muito comum encontrarmosmédicos, farmacêuticos, biólogos, químicos,físicos, fisiologístas, bioquímicos e nutricionístas,além de professores de EF, realizando esse tipo depesquisa, concluímos que esse não é um tipo depesquisa próprio da EF e não a caracteriza comodisciplina acadêmica. Nesse contexto, nãoestaríamos nós da EF apenas utilizando o exercíciofísico para explorar a funcionalidade das células,órgãos e sistemas de órgãos, quando estudamos o“efeito do exercício físico sobre as funções eestruturas presentes no organismo” , contribuindodessa forma para aumentar o seu conhecimentosem o produzir para a EF? Além disso, oconhecimento não é renovado porque é a pesquisabásica a responsável por isso, pois suas pesquisasnão são realizadas com o propósito de aplicaçãoimediata. A pesquisa básica visa estudar umacélula, por exemplo, apenas por curiosidade, semse importar se o conhecimento gerado vai ser útilpara uma melhor compreensão de uma célulacausadora desta ou daquela doença (pesquisaaplicada) ou, para desenvolver uma drogaqualquer, uma vacina, por exemplo (pesquisatecnológica).

A segunda consideração vem deDemo (1997), quando diz que muitas disciplinasutilizam referenciais teóricos de outras, o que temcontribuído para inúmeras crises existenciais dosrespectivos profissionais, como as queencontramos na EF atualmente. Demo (1997)afirma que muitas dessas crises levam váriospesquisadores a uma disputa ainda vigente sobre aimportância acadêmica de certas disciplinas. Oexemplo utilizado por Demo (1997), entretanto,não é o da EF, mas sim, o da enfermagem,contabilidade, serviço social, politécnicas, etc..,que, em muitos países, são desenvolvidos nosegundo grau. No caso da enfermagem, Demo(1997) é mais minucioso nas suas considerações,afirmando que essa está dividida entre a função deinstrumentação médica e a de cuidado com ospacientes, sendo que para isso, vale-se dereferenciais teóricos das ciências da vida e dashumanas, padecendo visivelmente de identidadeteórica e metodológica.

Achamos que a EF está em situaçãosemelhante à da enfermagem em alguns aspectos.Por exemplo, é comum médicos recomendarem aprática de atividade física com objetivos voltadospara a saúde, com os professores de EF atuando de

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forma semelhante a um técnico, como se fosseminstrumentadores de médicos, exercendo, dessaforma, função auxiliar destes. Com oaprofundamento dessa situação, o professor de EFacaba utilizando justificativas médicas paramotivar a prática de atividade física pela populaçãoem geral, mesmo quando o primeiro não seencontra à mercê do último. Essa é uma situaçãopouco discutida pelos profissionais de EF, masamplamente aceita pelos mesmos. Entretanto, éfácil superá-la, uma vez que sabemos que aatividade física não é totalmente causadora deefeitos fisiológicos e bioquímicos voltados para asaúde. Os estudos realizados por fisiologistas ebioquímicos nos últimos 30 anos, mostraram que aatividade física, mesmo se realizada comintensidade moderada, pode causar váriosproblemas orgânicos devido ao aumento daprodução de oxi-radicais e peróxido de hidrogêniono interior das células de organismos aeróbios,podendo resultar, por exemplo, em envelhecimentoprecoce (Pereira, 1994; Sohal, 1989; Sohal &Allen, 1986). Quando a atividade física for intensa,já se sabe que a funcionalidade imunológica écomprometida (Pereira, 1996).

Embora o conceito saúde/doença nãoesteja bem definido, atualmente tenta-se melhorá-lo com um novo conceito, denominado “doençasdinâmicas” , que significa que, quando umorganismo tem a sua estrutura e funções alteradas,resultando em menores interações entre as suaspartes constituintes, esse organismo apresenta essetipo de doença. Após ocorrer a desorganizaçãoorgânica, o mesmo pode, então, desenvolver asdoenças classicamente conhecidas. Isso quer dizerque, o organismo pode desenvolver uma doença e,muitas vezes, só passa a apresentá-la quando seencontra preparado para isso. A atividade aeróbiaprovoca desestruturação da funcionalidadeorgânica semelhante a uma doença dinâmica.Devemos salientar que esse tipo de atividade físicaé amplamente recomendado por médicos e, comoconseqüência, por professores de EF. Quando essetipo de atividade física é enfatizado, todas asestruturas e funções orgânicas se adaptam de formaespecífica. Entretanto, os sistemas que somente sãoativados, quando o estímulo é intenso, degeneramprogressivamente, provocando desorganizaçãoestrutural-funcional do organismo. Isto poderesultar, como conseqüência, em aparecimento dedoenças oportunistas. Dessa forma, o pretexto deque a atividade física promove saúde não deve serutilizado para motivar a sua prática, já que esta nãoé 100% causadora desse fenômeno. Pode, sim, ser

utilizada, quando a atividade física deixa de ser oque é e passa a ser um “remédio” paracoronáriopatas, obesos, hipertensos, diabéticos,etc., ou para portadores de fatores de riscos paraesses tiposde doenças.

Não pretendemos com essasconsiderações, diminuir a importância da prática deatividade física, mas mostrar que essa áreaapresenta indefinição profissional, além daacadêmica. A utilização de um motivo médico -saúde - para justificar a prática de atividade física,é o exemplo mais notório que encontramos parajustificar essa afirmação. Portanto, a EF não devediscutir apenas questões referentes às suasindefinições acadêmicas, mas tambémprofissionais. No que diz respeito à sua indefiniçãoacadêmica, essa área precisa desenvolver pesquisacientífica de alto nível para permanecer nasuniversidades. Por outro lado, a EF, enquantoprofissão, também a deve desenvolver para que oseu reconhecimento social seja melhorado. Nãovamos entrar, neste momento, no mérito da questãoquanto ao tipo de pesquisa ser básico, aplicado outecnológico porque, como ficou claro nasconsiderações de Pieper (citado por Lauand, 1987)e de Demo (1997), citadas acima, ainda não se sabemuito bem qual tipo deva prevalecer nas unidadesque compõem asuniversidades.

Para Kokubun (1995), se fordecidido que para permanecer nas universidades, aEF, assim como as demais áreas, devam fazerpesquisa básica, a EF será pulverizada dasuniversidades. De fato, segundo Kokubun, a EFpossui problemas de aplicação e não de explicação,o que impõe que a pesquisa seja de naturezaaplicada ou técnica. No que diz respeito a suaindefinição profissional, existe a necessidade deuma ampla discussão desse problema, como a quevem sendo feita com relação a sua indefiniçãoacadêmica, para não corrermos o risco de dizer quesomos profissionais simplesmente porque nãoconseguimos ser acadêmicos. Ou seja, se essaafirmação for correta, é o mesmo que ficar com oque sobrou sem ter sido feita uma ampla discussãodo problema. A questão envolvendo a utilização dasaúde como justificativa profissional para a práticade atividade física é incipiente, como foi descritaacima. Outro argumento, que não seja médico,deve ser procurado pelos profissionais de EF paramotivar a população à prática de atividade física.Isso também precisa ser discutido. Em outro ensaiofaremos mais considerações sobre o problema dasaúde e a prática de atividade física (Pereira, nãopublicado).

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DIFERENÇAS ENTRE MÉTODOS ETÉCNICAS

Henry (1964), Rarick (1967) eManoel (1986) utilizaram as seguintes estratégiaspara solucionar o problema da indefiniçãoacadêmica da EF: a) sugeriram modificações nonome EF já que o mesmo é equivocado; e b)consideraram que a caracterização do seu objeto deestudos é de vital importância e responsável poressa indefinição. A justificativa para a primeiraquestão é a de que não existe a possibilidade de seeducar o físico de um indivíduo de forma separadadeste. Isso é sintetizado na expressão “educadoresfísicos” , comumentemente atribuída aosprofessores de EF por profissionais de outras áreas.Ou seja, o que na verdade se educa é o indivíduo enão o seu físico. Portanto, o termo EF foiconsiderado conceitualmente errado, devendo,como conseqüência, ser modificado. Com relaçãoao segundo item, há consenso de que o movimentohumano é o objeto de estudos da EF (Manoel,1986). Entretanto, podemos afirmar que adiscussão dessas questões é irrelevante quando setem a intenção de justificar a permanência da EFnas universidades. Justificamos essa afirmação,tomando por base a epistemologia popperiana(Popper, 1987). O conceito de epistemologia serádiscutido adiante em outro item deste ensaio.

Na epistemologia popperiana, o queimporta, sobretudo, é o desenvolvimento doconhecimento científico no seu sentido mais forte;ou seja, não existe a disciplina acadêmica e, sim, aciência. A disciplina acadêmica é considerada porPopper apenas uma unidade administrativa dasuniversidades, sendo que a sua caracterizaçãocomo tal deve ser procurada nos problemas quepossui e nas tentativas de soluções empreendidas.Não importa saber qual é o verdadeiro objeto deestudos da EF e sim os problemas que essa áreatem para investigar (Campos-Pourchet, 1996;Hegenberg, 1976). De fato, segundo Popper (1987)e Bunge (1980), para caracterizar uma determinadaárea como importante para a ciência, devemos sercapazes de constatar a existência de problemaspara solucionar e, da mesma forma, se estãoutilizando métodos e técnicas de modo adequado.Portanto, caso a EF possua, de fato, um objeto deestudos próprio e, em sendo este o movimentohumano, podem-se fazer as seguintes perguntas: a)esse objeto de estudos fornece problemas nãocompartilhados com outras áreas?; b) que métodoscientíficos são utilizados pelos profissionais dessaárea para solucionar esses problemas ou construir

hipóteses ou teorias?; c) a utilização dessesmétodos se dá de forma consciente ou é o resultadoda influência de outras áreas?; d) os problemaspodem ser solucionados com auxílio de técnicasexistentes ou devemos criá-las? A resposta para aprimeira pergunta parece que foi fornecida porKokubun (1995) quando afirma que os problemasda EF são de aplicação e não de explicação. Aresposta para as outras questões é objeto deinteresse deste ensaio.

Neste momento, gostaríamos dechamar atenção para o fato de que váriospesquisadores confundem procedimentos técnicoscom metodológicos, haja vista as mais variadasteses defendidas com a sessão Materiais eMétodos, descrevendo apenas técnicas e nenhummétodo científico conhecido. Nesse caso, somenteum especialista em metodologia teria condições deencontrar, nas entrelinhas, o método que foiutilizado. Além disso, para aqueles que conseguemdiferenciar métodos de técnicas, a seguinteafirmação mostra-se confusa: “a EF só se tornaráuma disciplina acadêmica quando caracterizar oseu objeto de estudos e desenvolver metodologiaprópria” . Como afirmado anteriormente, o queimporta são os problemas que uma disciplina tempara resolver. Com relação à EF desenvolvermetodologia própria, essa proposta é equivocadadevido à má diferenciação, já comentada, que sefaz entre métodos e técnicas. Entretanto, comoafirma Hegenberg (1976), a confusão entremétodose técnicasnão ocorre somente na EF.

De acordo com Campos-Porchet(1996) e Hegenberg (1976), metodologia significaestudo de métodos e, em especial, dos métodos dasciências, ou ainda, caminho pelo qual se chega adeterminado resultado, ainda que esse caminho nãotenha sido fixado de antemão de modo refletido edeliberado. Para Demo (1989), metodologiadistingue-se da técnica por estar em jogo, nosegundo caso, o trato da realidade empírica,enquanto no primeiro, existe a intenção dadiscussão problematizante. Metodologia significa,portanto, a arte de dirigir o espírito na investigaçãoda verdade através do conhecimento de teorias,paradigmas e métodos científicos. Aqui,diferenciamos paradigma de teoria apenas pelograu de universalidade restrito das teorias e amplodos paradigmas (Kuhn, 1991; Popper, 1987).Portanto, neste ensaio consideramos paradigmacomo sinônimo de princípio universal, porque podeorientar a conduta de várias áreas de estudos,inclusive as humanas. Entretanto, teorias muitoamplas precisam dar origem a teorias mais restritas

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para poderem ser submetidasao teste empírico.Como esses princípios universais

vigoram na esfera humana, podem sercontinuamente modificados com o passar dotempo, não sendo, portanto, princípios imutáveis.Por exemplo, a mecânica newtoniana prevaleceupor muitos anos como paradigma, porque os seuspreceitos não se limitavam à esfera da física. Amecânica de Newton foi superada pela relativista.Essa, por sua vez, está sendo suplantada pelamecânica quântica e teoria da matriz S, conhecidapor abordagem “bootstrap” (Capra, 1982). Existemoutros exemplos que apresentam característicasparadigmáticas, como: a) os dois sistemasdominantes no ocidente - o industrial e onacionalista - os quais têm servido de paradigmapara os pensadores que aí residem (Toynbee,1987); b) a religião, ao estabelecer preceitos queorientam a conduta dos indivíduos (Toynbee,1987); c) as regras estabelecidas pela ciência e oseu método (Demo, 1997); d) para Collins (citadopor Futuyma, 1992), a teoria darwiniana, queinfluiu grandemente no conceito de mudançaadotado como paradigma por diversas áreas deestudo, incluindo a do treinamento físico (Pereira,1995). De fato, segundo Collins, “não existemciências atuais, atitudes humanas ou poderesinstitucionais que não permaneceram afetadospelas idéiascontidasno trabalho de Darwin” .

Continuando nossas considerações arespeito das diferenças entre métodos e técnicas,poderíamos dizer que uma técnica científicaequivale a uma forma de atingir um objetivo, adado modo de agir. As técnicas equiparam-se, pois,a modos de utilização dos instrumentos. Métodocientífico é uma forma de selecionar técnicas ouforma de avaliar alternativas para a ação científica.Métodos são regras de escolha e as técnicas aspróprias escolhas. Ou seja, as técnicas devem seraprendidas à medida que as necessidades foremsurgindo, porque existem muitas técnicas de que sevalem os cientistas e elas variam muito, conformea área de pesquisa e o problema que se pretenderesolver. Por exemplo, o microscópio éextremamente útil ao biólogo, mas de pequenavalia ao sociólogo, ao passo que a técnica deentrevista pode auxiliar ao psicólogo, mas ser depouca serventia ao astrônomo. Essa ampla gama detécnicas existentes se faz necessária porque osproblemas investigados por essas áreas sãodiferentes e as técnicas foram desenvolvidasexatamente com o propósito de facilitar a busca desolução para esses. Temos certeza de que, se umatécnica desenvolvida em uma área fosse útil para

outras, essa seria utilizada e não se perderia tempobuscando a invenção de outra. Entretanto, caso seconstate que nenhuma técnica existente seja útil, aísim, poderemos pensar na criação de uma técnicainovadora.

Essa grande variedade de técnicasdisponíveis levou muitos estudiosos a sustentarem,paralelamente, que também existiria uma grandediversidade de métodos - cada qual apropriado aum domínio específico de investigação(Hegenberg, 1976). Não haveria, pois, um sómétodo, mas uma pluralidade de métodos.Devemos salientar que método não é algo quedependa de técnicas transitórias (em alteraçãoconstante), mas, ao contrário, é a base em que seassentam, para qualquer disciplina, a rejeição ouaceitação de suas hipóteses e teorias. Portanto,contrariando algumas expectativas conservadoras,consideramos que a iniciação científica deveria serconduzida preliminarmente com a discussão dosproblemas que uma área tem para resolver, dosparadigmas que vigoram na ciência, teorias emétodos científicos, sendo que as técnicasdeveriam ser estudadas posteriormente quando asnecessidades forem surgindo durante a busca desolução para um problema.

Depois dessas afirmações,consideramos prudente mudar a sessão “Materiaise Métodos” de nossas dissertações e teses para“Materiais e Técnicas” , já que é assim quenormalmente se apresentam. O método científicoutilizado está, como já comentado, nas entrelinhas.Isso mostra a importância de se discutir questõesmetodológicas em EF num momento deindefinição acadêmica e profissional. Esse é umdos nossos objetivos neste ensaio. Essa afirmação éreforçada com argumentos retirados de Gigh(1990). Para ele, o crescimento e desenvolvimentode qualquer disciplina reside no estudo dos seusdilemas e anomalias epistemológicas, no sentido dequestionar os seus fundamentos e sua metodologia,e não técnicas que podem ser facilmenteimportadas de qualquer disciplina oudesenvolvidas na medida em que foremnecessárias. O que dirige a construção de técnicassão os problemas, não o contrário. Para Demo(1989), a falta de preocupação metodológica leva àmediocridade fatal. Por outro lado, o excesso deênfase na técnica só pode servir para formartécnicosde laboratório, não cientistas.

Feitas essas considerações, pode-sedizer, seguindo Hegenberg (1976) e Popper (1987),que seria muito bom se existisse apenas um métodocientífico. Os métodos dedutivo, indutivo,

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hipotético-dedutivo e hermenêutico, serãodiscutidos detalhadamente neste ensaio. Assim,temos observado que existe uma necessidadebásica na epistemologia de descobrir oucaracterizar esse “método científico universal” útila todas as disciplinas, de forma a tornar o discursoacadêmico homogêneo e previsível, ouracionalmente ordenado. Isso está de acordo comalguns cientistas que consideram que a evolução doconhecimento caminha para a unificação daciência, tendo por base a física e o seu método.Mas, qual seria o método da física que a EF, assimcomo todas as áreas, deveria utilizar? Portanto, se aEF pretende contribuir para o crescimentoqualitativo do conhecimento científico, devemosinverter a estratégia adotada até o momento,procurando caracterizar os problemas existentesnessa área e verificar se não estão localizados emoutras, para, posteriormente, procurarmos o melhormétodo disponível para construir teorias ouhipóteses para solucioná-los, ou até mesmo discutirteorias e paradigmas, cuja escolha dependebasicamente do conhecimento dos seus própriosproblemas.

Após isso feito, as questõesreferentes a ser ou não a EF uma disciplinaacadêmica, ou se o seu nome não é o mais corretotambém, poderão ser discutidas. Portanto, o que defato vai tornar a EF uma disciplina acadêmicainteressante para a comunidade científica não éapenas o domínio de um determinado método outécnica mas, sim, a qualidade da pesquisa realizadasobre problemas próprios. Para que isso sejaalcançado de forma satisfatória na EF, a discussãometodológica deve ser priorizada em relação àtécnica, porque questões metodológicas estãodiretamente envolvidas com a qualidade doconhecimento produzido (Demo, 1997). Quantosmétodos científicos existem? Que métodocientífico é melhor para produzir ou modificar oconhecimento? Será que existe apenas um métodocientífico caracterizado como o “métodouniversal” , como o praticado pela física?Afirmamos que ainda não existe tal métodocientífico, sendo que o principal objetivo desteensaio é o de justificar essa afirmação. Isso nãosignifica que não existam métodos científicos úteisà EF para solucionar osseusproblemas.

A IMPORTÂNCIA DAS DISCUSSÕESMETODOLÓGICAS

Como o nível do presente ensaio éessencialmente filosófico, e alguns profissionais daEF poderiam dizer o mesmo que disse Waddington(1979): “pelo amor de Deus, até que ponto vocêquer ser sistemático? Vamos saltar isso aí e tratarde algo que realmente importa” , gostaríamos defazer menção ao que foi dito por alguns cientistas efilósofos sobre a importância da discussãometodológica por uma disciplina ou peloscientistas em geral. Antes disso, o que Waddingtonestaria querendo dizer com esse “saltar isso aí etratar de algo que realmente importa”? Seria algoque renda “papers” (artigos de revistas) em grandesquantidades e que garanta nossa estabilidadeacadêmica? De fato, isso aparece nasafirmaçõesdeBohm & Peat (1987), que dizem o seguinte: “amaior parte dos cientistas não estava interessadanesses gêneros de interrogações filosóficas, comose elas nada tivessem que ver com o seu trabalhorotineiro de investigação” . Ao invés, “éramos”encorajados a dar toda atenção à obtenção deresultados concretos, bons para os “papers” , e atrabalhar em problemas “cientificamenteaceitáveis” . E continuam:

só que pela minha parte sentia-me aresvalar para os pontos quentes, porquesempre me atraíram muito mais asquestões para as quais não conheciaqualquer resposta do que o dia-a-dia dainvestigação rotineira. O que por certonão é a via excelente para construir umaboa lista de publicaçõescientíficas.

Para Waddington (1979), a filosofiatem importância vital em particular àqueles cujavida é dedicada a trazer mudanças ao mundo queos rodeia. Popper (1975), em artigo intitulado “Asduas faces do senso comum” e em entrevistaconduzida por Franz Kreuzer (1987) disse:

todos nós temos nossas filosofias,estejamos ou não conscientes desse fato,e nossas filosofias não valem grandecoisa. Mas o impacto de nossas filosofiassobre nossas ações e nossas vidas émuitas vezes devastador. Isto tornanecessário que testemos melhor nossasfilosofiaspor meio da crítica.

Essa é a única desculpa de Popper (1975) pelacontinuada existência da filosofia. Ou nos dizeresde Bunge (1974),

ao dizermos que não nos interessamospela filosofia, o que estamos

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provavelmente a fazer é substituir a umafilosofia explícita, uma filosofiaimplícita, por isso, imatura edesordenada.

Nesse caso, a filosofia implícita citada por Bungerefere-se ao que nos é ensinado ou que étransmitido pela tradição, e que se instaurafacilmente num espírito ao qual as leis naturais esocioculturais são apresentadas como verdadesprimárias inquestionáveis que se consolidamatravésdo ensino e experiência (Demo, 1997).

Notamos, em Ekeland (1987), umaposição muito parecida quando lemosque

o ensino é herdeiro de uma tradiçãomesmo na matemática: somenteapresentamos aquilo que sabemos fazer,aquilo que é bem compreendido e foimuito utilizado, entretanto, deixamospassar em silêncio os pontos obscuros eos fatos embaraçosos. Neste caso, ojovem pesquisador só pensará ter feitotrabalho útil se apresentar a seus colegasum modelo com as propriedades deregularidades que se esperam. Ao fazeristo ele contribuirá para aumentar oestoque de exemplos e conferir maiorpeso à ideologia ambiente.

De acordo com Kuhn (1991), o desenvolvimentoda ciência só ocorre quando nos libertamos dasconcepções reinantes, sendo que, para isso ocorrer,as discussões metodológicas são fundamentais(Gigh, 1990).

Outra consideração que enfatiza aimportância de discussões metodológicas por umadisciplina acadêmica, encontramos nas afirmaçõesfeitas por Josef Pieper (citado por Lauand, 1987).De acordo com Pieper, acadêmico significafilosófico, indagador e crítico e, um estudo semfilosofia, não pode ser considerado acadêmico.Portanto, além daquelas preocupações usuaisvoltadas para o ensino, pesquisa e prestação deserviços, que normalmente figuram numauniversidade, o desenvolvimento do espírito críticodeve ser uma preocupação constante (Covian,1978). Para que isso aconteça, as discussõesmetodológicas e a própria pesquisa científica sãofundamentais (Demo, 1989, 1997). Por exemplo,para que um estudo numa faculdade voltada paraobjetivos práticos, como ocorre na medicina eengenharia, seja filosófico, segundo Pieper, nãobasta que figure no seu currículo alguma disciplinafilosófica, é preciso que os seus praticantes sejamanimados pela indagação filosófica; ou seja, énecessário que se perceba, na universidade, algo

mais que a pura preocupação com o resultado útil eimediato. Com essa afirmação, Pieper critica asuniversidades modernas por estudarem muitasdisciplinas diferentes com objetivos práticos eprofissionais, sem se envolverem com a indagaçãofilosófica. Nesse contexto, o relativismo depensamento que se desenvolve quando não nosenvolvemos com questões filosóficas,principalmente de natureza metodológica, é umaameaça aos estudos acadêmicos e propicia oestabelecimento da filosofia implícita, ingênua edescontrolada, sem nos darmos conta disso (Bunge,1974).

Relativismo significa: que tudo seequivale, tudo é relativo, tudo é questão decivilização, de época, de momento, de moda, deinteresses pessoais ou da coletividade, ou que nadapodemos fazer a não ser viver e aproveitar o que as“modas” , que vêm e que vão, têm de melhor a nosoferecer, sem podermos atuar sobre elas. Portanto,pode-se dizer que a filosofia implícita leva aorelativismo de pensamento que, em últimainstância, pode levar ao dogmatismo (Demo,1997). Para aqueles que se deixam levar pelorelativismo, Popper (1989) disse: “o relativismo é amaior ameaça que paira sobre a nossa sociedade” .Segundo Popper, o relativismo é uma doença dopensamento, ou melhor, uma doença dospensadores, principalmente quando enfatizam quea escolha entre doutrinas rivais é arbitrária, sejaporque a verdade não existe, seja porque não hámeios para se decidir se, entre duas teorias, uma ésuperior à outra. Para Popper, é absolutamentepossível saber se uma teoria é mais verdadeira queoutra ou se um método científico é superior aoutro. Para isso, dispomos de um instrumento demedida: são as normas ou regras estabelecidas pelacomunidade científica. Podem-se julgar os fatos apartir das normas e decidir, por exemplo, se umasituação é justa ou injusta. Portanto, apesar deconstatarmos nesse ensaio que não existe ummétodo científico universal isento de problemas,isso não significa que não possamos encontrar ummétodo superior aos demais; podendo, desta forma,ser escolhido como o método orientador de nossaspráticas científicas até que outro venha a seestabelecer.

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O QUE É EPISTEMOLOGIA?

Epistemologia é um ramo dafilosofia que estuda a origem, a estrutura, osmétodos e a validade do conhecimento produzidopelo homem. Ou ainda, estudo crítico dosprincípios, hipóteses e resultados produzidos pordiversas ciências. Para alguns filósofos, aepistemologia é um tipo de reflexão de segundograu sobre a ciência, uma metaciência que, emborasujeita à contaminação filosófica, se integra cadavez mais na ciência pela obediência aos critérios daobjetividade científica (Bunge, 1980; Santos,1989). Bunge (1980) considera a epistemologiacomo o mesmo que filosofia da ciência. Portanto,para a EF orientar a sua discussão metodológica, amelhor fonte de consulta é a epistemologia. Sãocentrais, na epistemologia moderna, os conceitosde paradigma e pesquisa normal e revolucionária,sendo a linha divisória entre os discursoscaracterísticos de uma ciência madura de outraimatura, aquela que separa o discurso normal doanormal (Hoyningen-Huene, 1993; Kuhn, 1991).Ou seja, no discurso normal encontramos um“pano de fundo” sustentando as suasconsiderações, críticas, afirmações e o conteúdo deverdade dessas afirmações. Ciência normal,portanto, é a prática da resolução de problemascontra o fundo de um consenso determinante doque é uma boa explicação ou que contém oselementos necessários à sua solução, sendo essepano de fundo genericamente definido por Kuhn(1991) como paradigma.

O discurso normal é aqueleconduzido dentro de um conjunto acordado deconvenções acerca do que conta como contribuiçãorelevante ou o que é uma boa resposta a umapergunta, assim como uma boa crítica a ela. Deforma que, quando o paradigma vigente foidominado pelos membros de uma sociedade, essesindivíduos passam a ser considerados normais e emcondições de o fortalecer ou de o ensinar e,inversamente, a-racionais (anormais) quandoignoram as convenções estabelecidas peloparadigma aceito. Entretanto, quando os problemasexistentes resistem aos preceitos desse paradigma,podem aparecer momentos de crise gerando muitaspropostas paradigmáticas. Nesse momento, podemsurgir discursos não totalmente inteligíveis porparte da totalidade da comunidade científica,refletindo com isso, o resultado da instabilidadeintelectual presente nos momentos em que não sepode contar com um paradigma definitivo, mesmoque seja por pouco tempo. Isso porque, com o

surgimento de um novo paradigma pode haver umarevolução nas concepções científicas reinantes,resultando em promoção de novos conjuntos deproblemas e de explicações para esses. Nesse caso,poderemos encontrar indivíduos praticandopesquisa normal em momentos diferentes:primeiro, existem aqueles que tentam resistir àinovação e ainda utilizam os preceitos oriundos doantigo paradigma que, dependendo do momento,podem ser a maioria; segundo, poderemosencontrar alguns cientistas que tentam praticar assuas pesquisas já com os preceitos do novoparadigma que aflora.

A noção de paradigma e ciêncianormal, como definida por Kuhn (1991), tem sidomuito criticada por vários cientistas e filósofoscontemporâneos. Bohm & Peat (1987) dizem oseguinte sobre a noção de paradigma:

um paradigma tende a interferir com ojogo livre da mente, essencial àcriatividade. À primeira vista, oparadigma deveria ter um uso óbvio nacomunidade científica, mas também tem,em contrapartida, um preço, o de a menteser mantida dentro de certos canais fixosque se aprofundam com o tempo, até quecada cientista individual deixa de terconsciência da sua posição limitada.

Para Feyerabend (1975), a ideologia-padrão(paradigma) da ciência de um período normal,surge como um obstáculo ao progresso doconhecimento. Para Prigogine & Stengers (1984),na concepção de ciência normal, está implícito queas comunidades científicas provocam crisessistematicamente, mas apenas na medida em quenão as procuram. Ou seja, tal cientista caracteriza-se mais por ser um sonâmbulo (pesquisadornormal), diferentemente daquele que tomainiciativa de integrar, nas ciências, perspectivas equestõesnovas.

Popper (1974) disse que tem pena docientista normal. Para ele, esse cientista descritopor Kuhn foi ensinado com espírito dogmático: éuma vítima da doutrinação. Aprendeu uma técnicaque se pode aplicar sem que seja preciso perguntara razão pela qual pode ser aplicada. Portanto,segundo as afirmações de Popper, um cientista, noperíodo de prática normal, não apresentapreocupações metodológicas, já que o seu interesseé voltado, quase exclusivamente, para o domíniode técnicas. Não seria isso a causa da confusãoexistente entre método e técnica, uma vez que agrande maioria dos cientistas está mais envolvidacom pesquisa normal do que com pesquisa

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revolucionária, como afirmado por Demo (1997)?Nesse caso, pode-se dizer que ele foi um cientistamal ensinado porque só foi orientado para fazerpesquisa normal, ou a sua área não lhe propicia avantagem de ter problemas que o leve a fazerpesquisa revolucionária. Segundo Popper (1987),para sermos revolucionários, devemos colocar asteorias científicas em tensão constante no sentidode reconhecermos os seus limites e conseguirmos,através desse método de crítica constante, nosaproximar cada vez mais da verdadeiraconstituição da natureza. Entretanto, casovenhamos a nos interessar por pesquisarevolucionária, como afirmado por Waddington(1979) e Bohm & Peat (1987), deveremos,necessariamente, nos envolver com epistemologiae estudar os métodos científicos antes de fazermospesquisa experimental.

Outra característica do cientistanormal é que ele está sempre envolvido comregularidades conhecidas e, portanto, o seutrabalho será conduzido com o intuito deapresentar a seus colegas um modelo com aspropriedades presentes nessas regularidades,contribuindo dessa forma para aumentar o estoquede exemplos e conferir maior peso à ideologiadominante (paradigma), mas não para ocrescimento qualitativo do conhecimento (Ekeland,1987). De fato, para Gigh (1990), quando umaciência torna-se normal/ordinária, perde a suacriatividade e originalidade. Ele considera,portanto, que qualquer novidade intelectual,somente assim pode ser considerada se afetar oparadigma vigente. Dessa forma, a renovação doconhecimento significa modificar o paradigmapresentemente aceito. Para isso, Gigh (1990) fazalgumas sugestões: a) Tudo começa com umproblema bem definido, no qual a suacaracterização é influenciada pela teoria adotada(grau de universalidade amplo ou restrito). Acaracterização desse problema, num alto nível deabstração, facilita a integração dos níveis menores.b) As diferenças no nível de abstração não afetamsomente os problemas, mas também a lógicaadotada. Questões de lógica surgem quandotécnicos (nível prático), cientistas (nível do objeto)e filósofos de ciência (no metanível) não secompreendem. Não utilizam basicamente a mesmalinguagem. c) Criação de modelos com alto nívelde abstração (metateoria). De acordo com Bunge(1980), a adoção dos procedimentos de Gigh(1990) está de acordo com os preceitos do métodocientífico. Na proposta de Bunge (1980),encontramos que as duas principais etapas na

investigação científica são: a) o descobrimento doproblema ou uma lacuna no conhecimento vigente;e b) colocação precisa do problema, caso esseainda não tenha sido caracterizado de formaadequada. Essas considerações reforçam as queforam feitas anteriormente nesse ensaio, de que aEF só se caracterizará como disciplina acadêmicase contar com problemasprópriospara resolver.

O MÉTODO DEDUTIVO

Partindo do proposto por Bunge(1980) e Gigh (1990) e supondo que temos umproblema bem definido, que método científico émais recomendado para solucioná-lo ou construirteorias e paradigmas? Tomando por base o que foidiscutido de que, no contexto da epistemiologia, oconhecimento é visto como sinônimo de paradigmadominante justificado pela sua validade “a priori” ,podemos concluir que o método científico utilizadopara efetivá-lo na ciência normal é o dedutivo.Portanto, criticar o método dedutivo é o mesmoque questionar o meio pelo qual um determinadoparadigma busca efetivação. A dedução é o métodoutilizado pela ciência normal porque parte semprede um conhecimento valido “a priori” e comcaráter genérico, descendo em seguida aoparticular, com o silogismo sendo o seu protótipo,por exemplo (Demo, 1989): a) Todo homem émortal; b) Pedro é homem; c) Pedro é mortal. Umexemplo da utilização desse método na práticacientífica, vamos encontrar na biologia evolutiva.Segundo Dawkins (1986), Darwin e Wallacedesvendaram o enigma da evolução biológica e sóresta aos biólogos modernos acrescentarem notasde rodapé ao que foi descoberto por eles. E, nasopiniões de Dobzhansky e Mayr, os estudosrealizados em biologia e medicina só têm sentidosob o ponto de vista evolutivo ou biomédico(Dawkins, 1986). Ou seja, com isso se quer dizerque o trabalho do biólogo moderno deve restringir-se a fazer tautologias, porque o essencial, o básico,o caminho a ser trilhado já foi estabelecido,bastando seguir o trabalho dos mestres, sem havera necessidade de colocá-losem dúvida.

Tautologia, por definição, repete nopredicado o que já se dissera no sujeito. Umatautologia é uma afirmação, como por exemplo,“meu pai é homem”, cujo predicado não contémnenhuma informação que já não esteja implícita nosujeito. As tautologias são ótimas como definições,mas não há nada a ser comprovado numaafirmação verdadeira por definição (Gould, 1987).

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O significado de paradigma e pesquisa normaltambém pode ser explorado com essas afirmaçõesde Dawkins sobre a teoria da evolução e o papel deDarwin e Wallace, porque Dawkins afirma que,uma vez que o paradigma da evolução foiestabelecido por eles, só resta aos biólogosmodernos fazerem pesquisa normal. Por outro lado,quando diz “não sendo necessário colocá-los emdúvida” , está afirmando que para irmos além dapesquisa normal e fazermos pesquisarevolucionária, devemos criticar o que foi feitopelos mestres; isso, caso o trabalho anterior tenhase mostrado falho neste ou naquele aspecto. Essanecessidade de crítica constante para fazermospesquisa revolucionária também se faz presente naobra de Popper (1987) e, mais recentemente, na deDemo (1997).

Outro exemplo de aplicação dométodo dedutivo à pesquisa biológica,principalmente à molecular, envolve osquestionamentos freqüentemente realizados porpesquisadores dessa área quanto ao mecanismo deuma determinada reação bioquímica, sobre o fatorregulador de um processo, a causa de um efeito,etc.; como se, ao utilizar tais conceitos, estivessempraticando pesquisa isenta de subjetivismo.Subjetivismo, nesse caso, significa que essesconceitos só têm sentido quando forem respaldadospor um paradigma. De fato, mecanismos, fatoresreguladores ou controladores, causa-efeito, código(genético), informação (genética), são conceitoscom significados específicos e oriundos daconcepção intelectual aristotélica e platônica queexistiu durante dois milênios e que separou asvisões dos estudiosos quanto ao mundo natural(Lewin, 1994). Portanto, esses conceitos estãoimpregnados de teorias. Do lado aristotélico,diziam que os organismos vivos “são nada maisque máquinas” , e que são completamenteexplicáveis pelas leis da física e química. Daíresulta, por exemplo, a freqüente indagação pelomecanismo de uma reação bioquímica presente nometabolismo celular, já que, para esses, ofuncionamento celular ou orgânico assemelha-seao de uma máquina.

Os platônicos concordavam que osorganismos vivos obedeciam a essas leis físicas,mas insistiam que a essência da vida era algumacoisa a mais, uma força vital soprada no que erameramente material. Para os vitalistas, portanto,muitas das propriedades mais interessantes dosorganismos estavam, por sua natureza, além daanálise científica. Como o vitalismo não atende aoscritérios de uma abordagem científica moderna,

porque os seus pressupostos não podem sertestados empiricamente, a corrente intelectualdominante em biologia e medicina tornou-seessencialmente mecanicista. A biologia molecularé tida como a expressão máxima da abordagemreducionista-mecanicista para compreender osorganismos e a sua história. Com isso, queremosdizer que, ao nos referirmos ao mecanismo de umareação, etc., não estamos investigando a realidadederradeira dos processos biológicos, mas, sim,estamos atendendo às exigências básicas contidasem um paradigma que se arrasta por muitos anos eque se iniciou com o filósofo Aristóteles na GréciaAntiga. Além disso, a utilização de tais conceitosnas pesquisas mostra que é a pesquisa normal queestá prevalecendo.

O MÉTODO INDUTIVO

Os principais críticos do métododedutivo são representados pelos indutivistas.Estes, ao contrário dos dedutivistas, começam comcasos particulares isolados e colocam ageneralização como produto posterior. Ou seja, vãodo específico para o geral. Assim, segundo essemétodo, para se estabelecer uma regularidadecientífica é necessário, antes de tudo, constatarempiricamente a repetição suficiente de casosconcretos confirmadores da suposta regularidade.Com isso, observamos que a indução inverte omovimento evolutivo do pensamento, colocandocomo ponto de partida a observação. Osindutivistas apresentam ao método dedutivo,sobretudo, duas objeções. A primeira é a de que oraciocínio dedutivo é essencialmente tautológico, oque se pode verificar no silogismo apresentadoacima. Uma vez aceito que todo homem é mortal, oresto é pleonasmo ou repetição. A acusação detautologia recairía no parasitismo da deduçãoporque é meramente repetitiva nas aplicaçõesparticulares. A segunda objeção ao métododedutivo acentua o seu caráter apriorístico. Comefeito, partir de um enunciado geral significa suporconhecimento prévio. De onde vem esseconhecimento? Não o retiramos da aplicaçãorepetida a casos particulares porque isso seriaindução. Assim, o enunciado geral está preso auma postura previamente adotada não colocada emdiscussão. Há um dogmatismo na origem dométodo dedutivo (Demo, 1989).

Os filósofos Francis Bacon, JohnLocke e David Hume, autênticos indutivistas,defenderam a hipótese contrária à dos dedutivistas,

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dizendo que nascemos com um cérebro vazio, querecolhe passivamente as informações recebidaspelos órgãos dos sentidos. O conhecimento nasce,nesse caso, através da associação dessasinformações recebidas pelo cérebro. Segundo essateoria filosófica, conhecida por empirismo, todo ouquase todo nosso conhecimento provém daexperiência, e é o único meio de que dispomosparadecidir a verdade acerca dos fatos. Novosconhecimentos podem surgir a partir daobservação, através de um processo de associaçãode idéias, pelo qual nossa mente une os dados entresi, produzindo um conhecimento mais complexo.Entretanto, esse novo conhecimento é menosseguro, uma vez que, nessa etapa, podemos fazerassociações erradas, não interpretandocorretamente as relações existentes entre os dados.Para corrigir isso, basta observar os fatos semqualquer idéia preconcebida. A idéia de umconhecimento passivo do mundo através de umaobservação pura foi chamada por Popper (1975) deteoria do “balde mental” . De acordo com essateoria, nossa mente seria representada por umbalde, inicialmente vazio, onde as informaçõesentrariam passivamente pelosórgãosdossentidos.

Decartes, Bacon, Hume, Spinoza eNewton julgavam que esse era o únicoprocedimento capaz de levar à certezainquestionável. Ainda hoje, muitos pesquisadores,principalmente na biologia, acreditam naperspectiva do balde mental, tanto que Thom(1989) afirmou que as ciências biológicasatualmente limitam-se a descrever fatos o maisrigorosamente possível. Ou, nos dizeres de Jacob(1983): “na biologia há muitas generalizações maspoucas teorias” . Thomas (citado por Capra, 1982)também disse que “nas ciências biológicas não seproduzem teorias, com poucas ou raras exceções,ao invés, mais uma proteína é descrita” . Apesar deessas críticas aos biólogos modernos seremsignificativas, uma boa parte delas não se justifica,principalmente na perspectiva relativista presenteno raciocínio dedutivista, já comentada. Ou seja, aafirmação de que o biólogo utiliza o métodoindutivo é questionável, uma vez que os biólogosretiram os seus pressupostos básicos de paradigmaspreviamente elaborados por cientistas e filósofos.Além disso, a aparente superioridade da induçãosobre a dedução apresentou-se problemática,principalmente com o problema de lógicaencontrado por Hume no raciocínio indutivo(“problema de Hume”).

Como foi sintetizado por Watkins(citado por Gewandsznajder, 1989), as críticas de

Hume à lógica indutiva baseiam-se em trêspremissas: a) somente a inferência dedutiva éválida; ou seja, os argumentos lógicos sãodedutivos. A lógica nos mostra que a partir doenunciado “todos os cisnes são brancos” podemosdeduzir que alguns cisnes são brancos” . Essadedução é logicamente válida mas, a indução faz oraciocínio oposto, inferindo do enunciado “algunscisnes são brancos” o enunciado “todos os cisnessão brancos” . Esse raciocínio não pode serjustificado pela lógica. Em outras palavras, asconclusões dos argumentos indutivos trazem maisinformações do que as contidas nas premissas; b)todo conhecimento do mundo exterior vem daobservação; e c) a verdade sobre esseconhecimento só pode ser decidida pelaexperiência. Se aceitarmos essas teses, ficará difícilnegar que Hume tenha razão: nenhum número decasos observados, por maior que seja esse número,pode implicar conhecimento geral.

Contudo, Hume não afirmou quedevemos rejeitar conclusões baseadas na indução.Ele não duvida de que todos acreditamos que o solnascerá amanhã, nem está pedindo que deixemosde acreditar nisso. Hume, apenas, procurou mostrarque essas conclusões não podem ser justificadaspela lógica ou experiência e, sendo assim, éimpossível justificar racionalmente as nossascrenças. Modernamente, o “problema de Hume”foi envolvido na teoria das probabilidades, queconsegue demonstrar apenas regularidades, e nãocertezas, como pretendido pelos positivistas. Apossibilidade de o sol não nascer é pequena, masreal. Desta forma, a incapacidade de generalizarconstatações indutivas, coloca o empirista dianteda trágica situação de a ciência ser incapaz depredizer o futuro e ter de restringir-se ao meroregistro estático daquilo que aconteceu (Demo,1989). As teorias científicas, que não foramproduzidas indutivamente, mas sim, inventadaspelo homem, prevêem que, em cinco bilhões deanos, o sol deixará de aparecer. Apesar dessaprevisão não se originar indutivamente, pode servirde teste para a teoria que a propôs. Entretanto, issonão quer dizer que tal fato deva obrigatoriamenteacontecer pois, o contrário também é possível, jáque a “Teoria do Caos” mostra que o ideal deprevisibilidade do futuro não pode ser totalmenteatingido, porque o grau de incerteza inerente aosistema e seu ambiente é difícil de ser controlado(Gleick, 1990), e as próprias teorias científicas nãoestão isentas de erro (Popper, 1987). Com relaçãoao exemplo dos cisnes brancos, citado acima,foram descobertos, na Austrália, cisnesnegros.

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Assim, se o método científico é oindutivo e ele é incapaz de nos orientar noplanejamento do futuro, a miséria científica instala-se. O empirismo radical acaba por negar apossibilidade do conhecimento, já que a repetiçãodo fenômeno que fundamenta a regularidade e apossibilidade de generalização não pode sergarantida indutivamente (Demo, 1989). Com isso,fica claro que a prática científica orientada pelaindução só pode acumular informações (dados),sendo incapaz de gerar um conhecimento comvalidade universal. Portanto, quando utiliza essemétodo, a atividade científica qualifica-se comomero registro de dados, porque a generalizaçãodecorrente do raciocínio indutivo não possuivalidade lógica. Podemos concluir dessasdiscussões, que a crítica indutiva ao métododedutivo da ciência normal, apesar de sersignificativa, não consegue fazer dele um métodocientífico isento de problemas. Com efeito, tanto adedução como a indução não garantem o ideal deprodução de um conhecimento com validadeuniversal e ditador de normas invioláveis.

O MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO

Apesar de a lógica privilegiar oraciocínio dedutivo (Hume), a concepçãoverificacionista (confirmacionista) nele presentepode ser criticada com o seguinte exemplo: seprocurássemos verificar (confirmar) o enunciadoprimitivo de que a água ferve a 100 °C,acumulando casos positivos, não teríamosdificuldades para reunir bilhões de exemplos. Oaspecto negativo, todavia, está em que, aoacumularmos evidência favorável, não lançamosdúvidas sobre o enunciado original, de modo quenão surgem motivos para substituí-lo por outro e,como conseqüência, o conhecimento ficaestagnado naquele estágio (Popper, 1987). ComoHume demonstrou claramente que o raciocínioindutivo é, por razões lógicas, incorreto, e a teoriado balde mental é questionada pelo relativismo doraciocínio dedutivo, Popper considera a indução e adedução, ambas apoiadas na verificação(confirmação), conceitos dispensáveis - mitos. Nãoexistem e não servem para promover o crescimentoqualitativo do conhecimento.

Em artigo intitulado “sobre aschamadas fontes do conhecimento” , Popper (1989)fez a seguinte pergunta: Qual é a derradeira fontedo nosso conhecimento, o intelecto ou a percepçãosensorial? A resposta: a) não existe fonte

derradeira do conhecimento; b) o que interessasobretudo é saber se uma dada afirmação éverdadeira, isto é, se está em concordância com osfatos; c) um método importante consiste emanalisar as nossas próprias teorias; d) a tradiçãoconstitui a fonte mais importante; e) oconhecimento não pode partir do nada. A evoluçãodo nosso saber consiste na modificação, nacorreção de um saber anterior; f) a clareza é em sium valor intelectual, mas não o são nem a exatidãonem a precisão porque são inatingíveis, e é inútilser mais rigoroso do que exige a problemática emcausa. Está implícito, nessa resposta, o métodohipotético-dedutivo, que consiste na elaboração deteorias seguida da eliminação de possíveis erros.Popper (1987) espera, com isso, que oconhecimento cresça em função da tentativa teóricada solução de problemas e da substituição dessaspor teorias cada vez melhores. Nesse contexto, ocrescimento do conhecimento deve ser visto comoum caso de seleção natural darwiniana, em que asmelhores teorias científicas, inventadas pelohomem, sobrevivem por mais tempo do que as suasrivais que se mostraram incapazes de passar emtesteselaborados rigorosamente.

Einstein foi favorável às idéias dePopper quando declarou que “uma teoria não podeser fabricada com os dados da observação(indutivamente)” . “Ela só pode ser inventada” . Ouseja, para podermos encontrar sentido na natureza enas suas manifestações, precisamos imporpreviamente a ela esse sentido que procuramos,para posteriormente podermos interpretar o queobservamos. Esse “ impor previamente” significa ateoria inventada pelo homem. Com isso, estamosafirmando que os dados obtidos através daobservação ou das medidas realizadas só têmsentido se precedidos de uma teoria. Eles só têmsentido para quem dispõe do conhecimentonecessário para a sua compreensão, sendo esseconhecimento representado pelas teoriaspreviamente elaboradas. Portanto, é errada aexpressão “as tabelas mostram” ou “os dadossugerem”, como alguns cientistas costumam seexpressar quando apresentam os seus resultados empúblico. Se os dados sugerissem ou se as tabelasmostrassem alguma coisa que independesse doconhecimento prévio de quem a observa, ou dopróprio expositor, qualquer um que olhasse para atabela rapidamente entenderia o que ela transmite.

Entretanto, como afirmado porPopper (1987), a observação é sempre seletiva.Para que se efetive, necessita de um objetoescolhido, de uma tarefa definida, de um ponto de

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vista, de um problema e de uma teoria ouparadigma. Ou seja, a observação é guiada por umponto de vista dependente de teorias ouparadigmas. Além disso, segundo Barrass (1978),“não são os dados que sugerem, mas sim ocientista” , utilizando para isso, o instrumentalteórico de que dispõe. Também não são as tabelasque mostram, mas sim o cientista que a expõe aoseu público. Para isso, utiliza uma série deconceitos e informações inteligíveis para ele, sendoque a inteligibilidade dessa informação é resultantedo domínio prévio do paradigma por esse público.Caso contrário, não adiantaria qualquer esforço oua utilização de didática avançada. Tudo isso mostraque não é possível ao cientista ficar à margem doque produz ou do que apresenta ao seu público, naverdade, está constantemente em processo deinteração com ele.

Para justificar as suas propostas,Popper (1987) desenvolveu o critério derefutabilidade, em oposição ao verificacionista queleva às tautologias da ciência normal, e o deverossimilitude, para superar as críticas de Hume àindução. O critério de refutabilidade torna possíveljustificar, através de argumentos lógicos eracionais, nossa preferência por uma teoria aoinvés de outra. Por exemplo, não podemos saber sea teoria de Einstein e de Darwin são verdadeiras(no sentido de corretas) porém, após termosrealizado testes e discutido criticamente as teoriasde Newton e de Einstein, ou a de Wallace e deDarwin, e termos aceitado que as observações querefutam uma das teorias não refutam a outra,podemos dizer que a primeira é falsa, optando pelasegunda, pelo menos enquanto não surgir outrateoria melhor. O que podemos dizer é que a teoriada relatividade, por exemplo, foi corroborada eaproxima-se mais da verdade do que a de Newton,ou seja, possui maior verossimilhança.

O conceito de verossimilhançadepende, na prática, do grau de corroboração dateoria, porque determina o seu conteúdo deverdade. Uma vez que a corroboração é sempreconjectural - qualquer alteração no conhecimentode base, por exemplo, pode alterar o grau decorroboração e a verossimilhança da teoria - elaindicaria apenas a sua verossimilhança aparente.Nesse caso, a verossimilhança, assim como averdade, seria um ideal que tentamos atingir naprática, embora nunca cheguemos a saber, comcerteza, qual é a verossimilhança real da teoria.Portanto, uma primeira conclusão a ser extraída daproposta de Popper é a de que as leis universais eas teorias científicas devem ter caráter apenas

conjectural (hipotéticas). Para aqueles que buscam,na ciência, um conhecimento seguro, essa é umaconclusão desanimadora.

Para alguns filósofos como Popper(1987) e Bunge (1974), as teorias científicas nãosão fotografias da natureza, mas modelos ouconstruções hipotéticas. Assim, o que a ciênciaprocura, de acordo com esses filósofos, é aconstrução de modelos que possam ser corrigidosprogressivamente de forma a se aproximar cadavez mais da realidade. Essa concepção filosófica,conhecida por racionalismo crítico, pressupõe aexistência de um mundo exterior cujosacontecimentos obedecem a leis que tentamosconhecer. Para Kuhn (1991), entretanto, as leis e osconceitos científicos são apenas construçõesmatemáticas úteis, que servem para descrever epredizer fenômenos, sem corresponder a nada dereal. Essa posição é conhecida comoconvencionalismo ou instrumentalismo, porque asteorias funcionam, nessa perspectiva, apenas comouma espécie de computador, isto é, como uminstrumento para reunir e processar dados,realizando previsões a respeito de fenômenosobserváveis. São convenções no sentido de que nãotratam da realidade existente.

Para Popper, ao negligenciarmos arefutação com acentuação da aplicação, oinstrumentalismo perde muito do espírito crítico daciência, tornando-se incapaz de explicar os testesrigorosos a que uma teoria é submetida sem queesses testes tenham, muitas vezes, qualquerutilidade prática. Além disso, as teorias científicasnão se limitam a prever eventos do tipo conhecido,podendo prever igualmente efeitos totalmenteinesperados. É esse o caso do desvio da luz quandose aproxima de um corpo com grande massa,previsto pela teoria da relatividade. Para Popper, oinstrumentalismo só pode explicar o primeiro tipode previsão. Com isso, podemos dizer que, assimcomo o filósofo Josef Pieper (citado por Lauand,1987), Popper (1987) também tem por objetivocaracterizar a pesquisa básica como própria dasacademias, colocando em segundo plano apesquisa aplicada ou técnica. Além disso, paraPopper (1987), a pesquisa básica, para serrevolucionária, deve valer-se do método hipotético-dedutivo. Nesse momento, podemos dizer que foiencontrado um paralelo entre pesquisa básica erevolucionária, e pesquisa normal e aplicada.

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CONFLITO DE MÉTODOS CIENTÍFICOS

A tentativa de Popper em estabelecera verossimilitude como um ideal a ser alcançadopela ciência sofreu severas críticas por Miller(1974) e Tychy (1974). Esses filósofosargumentaram que, se a teoria mais ampla T2 forfalsa, o número de previsões falsas dela extraídoserá maior que o de T1. Isso quer dizer que tanto oseu conteúdo de verdade como o de falsidade serãomaiores que os de T1, o que nos impossibilita decomparar a verossimilitude dessas duas teorias.Essa comparação somente seria possível se a teoriamais ampla da qual decorre T1 fosse verdadeira.Nesse caso, poderíamos afirmar que T2 possuimaior verossimilitude que T1. Mas, como nuncapodemos saber se uma teoria é verdadeira, oobjetivo de Popper de comparar teorias quanto asua verossimilitude não pode ser atingido. ParaWatkins (1974), a afirmação de que uma teoria temmaior verossimilitude do que outra implica umaprevisão a respeito do desempenho futuro da teoria,contendo, portanto, um argumento indutivo abertoàscríticasde Hume.

Watkins, portanto, não aceita que averossimilitude possa servir como guia para aescolha entre duas teorias. Assim, embora nosguiemos pela idéia de verdade - quandoprocuramos, por exemplo, refutar uma teoria - paraWatkins, nosso objetivo deve ser mais modesto.Devemos buscar teorias que sejam apenaspossivelmente verdadeiras, isto é, teorias queresistiram às mais severas críticas, sem que tenhasido possível, pelo menos até determinadomomento, descobrir qualquer inconsistência entreos princípios da teoria ou entre ela e as evidênciasdisponíveis. Kuhn (1991) também não achapossível, nem necessário, apelar para o conceito deverdade - no sentido de haver uma correspondênciaentre conceitos como elétron, campo, etc., comaquilo que realmente existe - ou de verossimilitude.Para ele, não é possível afirmar que há umaaproximação sucessiva das teorias em direção àverdadeira constituição da natureza. Nesse caso,pode-se considerar que o progresso científicoconsiste apenas em formular teorias eficazes eexatas para a resolução de problemas específicos.Isso está de acordo com a visão instrumentalista deKuhn sobre as teoriascientíficas.

A incomensurabilidade, conceitodesenvolvido por Feyerabend (1989) e Kuhn(1991), mostra que mesmo aquilo a que chamamosde “fato” , também sofre alterações de acordo como paradigma adotado. Ou seja, os principais

conceitos da física mudam de sentido quandoadotamos como paradigma a mecânica newtoniana,a mecânica relativista ou a mecânica quântica(Feyerabend, 1989; Kuhn, 1991). Mas, nesse caso,que critérios teríamos para avaliar teorias eparadigmas diferentes no sentido de saber qualdeles é mais verdadeiro ou possuidor de maiorverossimilitude? Kuhn (1991) e Feyerabend (1989)não estariam defendendo a idéia de que não hácritérios racionais para decidir quando uma teoria émelhor que outra, como afirmam os seus críticos?Watkins, por sua vez, mostra que a tese daincomensurabilidade contradiz outra tese de Kuhn,a de que os paradigmas também são incompatíveisentre si. Entretanto, se afirmarmos que o sistema deCopérnico é logicamente incompatível com o dePtolomeu, é porque dispomos de critérios lógicospara compará-los; logo, eles não sãoincomensuráveis. Uma coisa não pode serincompatível e incomensurável ao mesmo tempo.

Segundo Feyerabend (1989), nãoexistem normas que garantam o progresso daciência e a diferenciem de outras formas deconhecimento; a ciência não tem método próprionem é uma atividade racional; a história mostra queo progresso científico ocorre quando se agesegundo novas idéias contrárias às metodologiasvigentes. Segundo os críticos de Feyerabend, umdefensor do anarquismo metodológico não poderiacondenar ou proibir qualquer tipo de charlatanice.Bunge (1974) diz que, quando afirmamos que tudovale, estamos dizendo nada vale, ou então, comodisse Popper (1987), se uma teoria nada proíbe etudo explica, ela nada explica. Enfim, talvez asolução mais coerente com a filosofia deFeyerabend (1989) seja simplesmente admitir que,como não há escolha nem avaliação objetiva ouracional de qualquer teoria, parece que todas asescolhas e avaliações são determinadas pelascondições sociais da época. Essa é a premissabásica de alguns representantes da sociologia doconhecimento (Chrétien, 1994; Hekman, 1990).Portanto, para os filósofos anti-popperianos e anti-indutivistas, resta a opção de desenvolver as idéiasde Kuhn em dois caminhos: modificando-as, demodo a produzir critérios mais precisos e objetivospara a avaliação das teorias científicas; ouradicalizando a tese sociológica, de forma amostrar que todo conhecimento produzido écompletamente determinado por fatores sociais nãoobjetivos e não racionais, estabelecendo assim, quequalquer critério de avaliação será sempre relativoà época em que foi gerado.

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Resumindo, os métodos dedutivos,indutivo e hipotético-dedutivo não se sustentamsem sérias limitações e, ainda mais, com uma boadose de subjetivismo, assim como o observado nasidéias de Kuhn, Feyerabend e na perspectivasociológica; além disso, não conseguem atingir oideal de conhecimento exato pretendido pelaciência positivista. Entretanto, não podemos negarque a proposta de Popper seja vantajosa em algunsaspectos. De fato, para Popper (1987), a atituderacionalísta consiste na disposição para ouvirargumentos críticos e aprender com a experiência,reconhecendo que sempre podemos estar errados.Ela se opõe, assim, a argumentos de autoridade,quer seja a autoridade de um grande cientista oufilósofo, a autoridade de um sistema, ou a de leisdogmáticas, consideradas acima de qualquersuspeita. Consiste, enfim, em recusar que tenhamosa posse de um método infalível para fazerdescobertas (Rorty, 1988, 1994; Santos, 1989).

Parece que chegamos àquilo a quePorchat-Pereira (1993) chamou de “o conflito dasfilosofias” , ou “conflito de opiniões” , ou ainda,“conflito de métodos científicos” . Para essefilósofo, as condições de possibilidade para asolução desse conflito não parecem poder cumprir-se senão pelo recurso ao dogmatismo filosófico,isto é, pelo exercício de uma opção filosófica, aqual pode traduzir-se, seja pela preferênciaconcedida a uma das filosofias ou métodos emconflitos, seja pela criação original de uma novaalternativa, que por sua vez, ao que tudo indica,também deverá ser contestada por outras e fazer,portanto, parte do eterno conflito. Assim, pareceque esse conflito só pode ser resolvido no interiorde cada proposta, na medida em que se instauracomo recusa inexorável da validade das outras. Ouseja, duas filosofias ou métodos científicos emcontato são sempre dois mundos que se enfrentam,visceralmente incompatíveis (incomensuráveis) eordenados sempre à negação do outro. Não seespera, portanto, da discussão entre filósofos, maisdo que uma mútua benevolência na clarificaçãodos fundamentos e raízes da sua posiçãoirredutível.

Esse posicionamento em relação àinexistência de critérios que possam justificar asupremacia de determinada escola filosófica, demétodo científico, de ponto de vista, etc., levouPorchat-Pereira a dizer que quando nos dispomos afilosofar, deparamos com o conflito das filosofias,nos tornamos seus espectadores e nos deixamosenfeitiçar pelos seus discursos. Assim, sugere aadoção de uma postura céptica e abstém-se de

qualquer asserção positiva acerca da realidadeexterior. O céptico, nesse caso, deve agir como umterapeuta que se serve do discurso para curar oshomens da sua propensão ao dogmatismo. Océptico dirá, então, ao dogmático que a tododiscurso se opõe um discurso de igual peso. Nãotendo como aceitar uma opinião ou rejeitá-la, océptico é levado a suspender o juízo. Ou seja, elenão encontrou um critério de verdade que regule acrença na realidade ou irrealidade porque, segundoele, o intelecto não tem acesso à realidade dosfatos, mas tão somente às suas representações.Nietzche já havia dito que “não existem fatos,apenas interpretações” (Marton, 1990).

MÉTODO HERMENÊUTICO EPLURALISMO

A discussão precedente écaracterística do período modernista definido comopositivista, tecnocêntrico, racionalista eorganizado, visando à busca do conhecimentoexato, isento de subjetivismo. Entretanto, comodiscutido anteriormente, o resultado dessa buscafrenética é o dogmatismo, ceticismo ou nihilismo,porque não há nada de semelhante a umconhecimento positivo com essas características(Santos, 1989). Assim, se negarmos que existamfundamentos para justificar as nossas pretensões aoconhecimento exato, a posição do filósofo, docientista ou de qualquer candidato ao posto desacerdote guardião do saber e da racionalidadeparece ameaçada. Por outro lado, o questionamentoda existência da comensuração entre os diversospontos de vista parece ser o primeiro passo emdireção à guerra de todos contra todos (Rorty,1994).

Com relação ao último aspecto, asabordagens holistas parecem autorizar a todosconstruir o seu próprio pequeno todo - seu própriopequeno paradigma, a sua própria pequena práticaou o seu próprio pequeno jogo de linguagem. Porexemplo, isso é evidente na epistemologia deFeyerabend (1975, 1989, 1991). Para ele, o idealpara o crescimento qualitativo do conhecimento é abusca de revoluções permanentes através daconstrução de teorias e paradigmas, evitando osmomentos de prática científica normal. Entretanto,essa concepção holista também entra no conflitodas filosofias, porque o seu confronto com osargumentos reducionístas nos levam ao círculovicioso da discussão do todo e da parte. Ou seja,não conseguiremos isolar e entender os elementos

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básicos de um sistema, exceto tendo por base umconhecimento prévio da totalidade da estrutura emque esses elementos se encerram. Por outro lado,segundo os reducionistas, não poderemosapreender o modo como o todo funciona até quetenhamos alguma compreensão a respeito dafuncionalidade dassuaspartes.

Koestler (1981) parece ter resolvidoesse dilema através da criação do termo “Holon” ,que incorpora, ao mesmo tempo, as noções do todoe da parte. Mas, quando um todo é um todo e umaparte é uma parte? E, inversamente, quando umtodo é uma parte e uma parte é um todo? Eis aí anecessidade das hierarquias. De fato, outro termocriado por Koestler é o de “Holarquia” ,significando que, em uma hierarquia constituídapor diversas partes, estas devem apresentar, cadaqual, as características do todo e da parte. SegundoKoestler (1981), dependendo do nível em que nosencontramos na hierarquia, poderemos ser todos epartes ao mesmo tempo. Ou seja, seremos partesenquanto membros de uma sociedade e todosenquanto organismos auto-contidos (Romesín &García, 1997). Entretanto, dificilmente deixaremosde ser parte em um sentido mais amplo, poissempre estaremos sobrevivendo às custas do meioque nos circunda, e esse, por sua vez, será parte deum outro meio ainda maisabrangente.

O que deve prevalecer: argumentosholistas ou reducionistas? De acordo com Capra(1996), a concepção de rede fornece uma novaalternativa para as chamadas hierarquias danatureza, trazendo como conseqüência uma novaperspectiva para a questão do todo e da parte. ParaCapra (1996), o padrão de organização de umorganismo e das sociedades é o da rede, o que nosimpossibilita de afirmar que exista um alto e umbaixo ou uma parte e um todo, próprios dashierarquias. No conceito de rede, a discussão dotodo e da parte torna-se irrelevante e nos leva aométodo hermenêutico, cuja função é fortalecer ascorrelações polimorfas e micromorfas existentesentre as diversas partes de um sistema. Porexemplo, as células de um organismo possuemvárias estruturas celulares que interagem entre si(correlações micromorfas). Essas correlaçõestambém ocorrem entre células presentes em ummesmo tecido. Por outro lado, essas mesmascélulas estão sujeitas a serem afetadas por diversos“fatores” circulantes pelo sangue (correlaçõesmacromorfas) que interferem positivamente ounegativamente nas suas atividades. Ou seja, quandolidamos com sistemas, e nossa intenção é darmosênfase às correlações existentes entre os seus

componentes; as partes e o todo são difíceis deserem identificados (Capra, 1996).

O método hermenêutico caracteriza-se por dar ênfase às correlações polimorfas emicromorfas existentes entre as várias partes quecompõem um sistema ou entre os vários discursosexistentes, como se fossem fios imaginários queunem essas partes entre si. Filósofos e cientistasque adotam o método hermenêutico comoorientador de suas condutas práticas, qualificam-secomo indivíduos bem informados (culto) queservem de intermediários nas discussões entre osseus semelhantes, que acham que são detentores daverdade, no sentido de mostrar a eles que semprehaverá uma afirmação contrária de igual valor queé desconhecida (Porchat-Pereira, 1993; Rorty,1988). Nesse sentido, o método hermenêuticoimpõe que sejamos conhecedores do conteúdopresente nesses discursos para podermos atuar deforma a mostrar as falhas neles existentes. SegundoDemo (1997), esse procedimento favorece ainterdisciplinaridade e a cross-disciplinaridade.Essas noções sugerem que um problema pode ser“atacado” por profissionais especialistas emdiversas áreas, mas de forma conjunta e, nummesmo momento, reunidos em institutosapropriados para o desenvolvimento desse tipo depesquisa. Seria o mesmo que reunir esforços parasuperar o problema. Contudo, a hermenêutica nãose baseia, para isso, num conhecimentoanteriormente existente para tentar reduzir toda aconversação aos preceitos de um paradigmaqualquer.

O método hermenêutico utiliza adiscussão apenas como uma estratégia para mostraro valor e as limitações do conhecimento existente.Quando adotamos o método hermenêutico,aumenta a possibilidade de nos mantermospróximos do conteúdo presente nesses diversosdiscursos, o que também nos torna detentores doconhecimento existente de forma nãoespecializada. Entretanto, o método hermenêuticotambém pode ser utilizado quando indivíduosespecializados se unem para solucionar umdeterminado problema, como afirmado acima(Demo, 1997). Para a hermenêutica, ser racional équerer abster-se da epistemologia – o que equivalea se recusar a aceitar que exista um conjuntoespecial de termos em que pudessem ser colocadastodas as contribuições para a conversação entre osindivíduos, genericamente definido comoparadigma. Ou seja, quando alguém que utiliza ométodo hermenêutico resolve questionar outroindivíduo durante uma conversação, isso é visto

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como parte da rotina de demonstração constante deque, por mais que o conhecimento esteja evoluído,sempre haverá limitações que podem sersuperadas. Com isso, o método hermenêuticoprocura nos livrar de nossa tendência aodogmatismo e atende, com isso, ao que Porchat-Pereira (1993) disse a respeito do céptico, que agecomo terapeuta para nos prevenir da nossapropensão ao dogmatismo.

O método hermenêutico caracteriza-se por considerar todo conhecimento comoimaturo, onde várias alternativas possuem pesosiguais, o que dificulta, com isso, a sua descriçãoepistemológica normal. Nesse estágio, ainda nosencontramos demasiado incertos e confusos acercadesse conhecimento para podermos descrevê-lo e,portanto, para assumirmos a sua descriçãoepistemológica. De certa forma, o passo seguinte àutilização do método hermenêutico seria adescrição do conhecimento de formaepistemológica, quando nos encontramos seguros arespeito do conhecimento disponível. Desse pontode vista, a linha divisória que separa os respectivosdomínios da epistemologia e da hermenêutica, nãosepara o que é próprio das ciências da natureza edo homem, nem entre fato e valor, nem entre oteórico e o prático, nem entre o conhecimentoobjetivo e algo dúbio e incerto. A diferença épuramente de familiaridade e segurança pessoal oucoletiva sobre o conhecimento existente. Seremosepistemológicos sempre que compreendermosperfeitamente bem o que se passa e se estivermosseguros sobre o conhecimento disponível, ehermenêuticos quando tentarmos lidar com aquilocom que ficamos quando deixamos de serepistemológicos, isto é, quando o conhecimentoseguro ainda não se tornou evidente para nós.Queremos dizer com isso, que a pesquisa normal éepistemológica, enquanto a pesquisarevolucionária, hermenêutica, esta últimaaparecendo constantemente nos momentos de crise,devido à existência de inúmeros candidatos aoposto de paradigma (Kuhn, 1989). A necessidadeque os pesquisadores têm de interagir,compreender e interpretar os textos disponíveis emque esses candidatos a paradigmas se encerram, éum procedimento característico da hermenêutica(Gadamer, 1998).

CARACTERÍSTICAS DA PÓS-MODERNIDADE

As principais características damodernidade resumem-se nas crenças no progressolinear, nas verdades absolutas e no planejamentoracional de ordens sociais ideais. Por outro lado, omundo pós-moderno que surge, encara opluralismo decorrente da constatação daimpossibilidade da comensuração entre os diversosdiscursos e o aparecimento do métodohermenêutico, como uma legítima reação àmonotonia da visão do mundo moderno (Harvey,1993; Rossi, 1992; Touraine, 1994). Devemosrealçar que moderno é aquele que pratica suaspesquisas, tendo por base o modelo positivista darealidade que investiga, acreditando em certezas ouem leis eternas isentas de subjetivismo (Rossi,1992). Ao contrário do moderno, o pós-modernoprivilegia a heterogeneidade e a diferença como asforças libertadoras na redefinição do discursocultural, político e científico. A fragmentação, aindeterminação e a intensa desconfiança de todosos discursos universais (totalizantes) são o marcodo pensamento pós-moderno. A redescoberta dopragmatismo na filosofia (Rorty); a descoberta dosubjetivismo na prática científica (Kuhn eFeyerabend); a ênfase foulcautiana nadescontinuidade e na diferença na história, e aprimazia dada por ele às correlações polimorfas emvez da causalidade simples ou complexa; novosdesenvolvimentos na matemática acentuando aindeterminação dos fenômenos (Capra, 1996;Gleick, 1990; Woodcook & Davies, 1991); oressurgimento da preocupação com a validade edignidade do outro na ética, na política e naantropologia (Berlin, 1991; Capra, 1996;Fukuyama, 1992; Touraine, 1994); tudo isso é umsintoma de que está por ocorrer uma ampla eprofunda mudança na estrutura do pensamentocorrente.

O que há em comum nessesexemplos é a rejeição das metanarrativas(interpretações teóricas de larga escalapretensiosamente de aplicação universal)sintetizada por Egleton (citado por Harvey, 1993)na sua definição de pós-modernismo:

o pós-modernismo assinala a mortedessas metanarrativas, cuja funçãoterrorista secreta era fundamentar elegitimar a ilusão de uma históriauniversal. Estamos agora no processo dedespertar do pesadelo da modernidade,com a sua razão manipuladora e seu

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fetiche da totalidade, para o pluralismoretornado do pós-modernismo, essa gamaheterogênea de estilos de vida e de jogosde linguagem que renunciou ao impulsonostálgico de totalizar e legitimar a simesma. Com isso, a ciência e a filosofiadevem abandonar as suas grandiosaspretensões e reivindicações metafísicas ever a si mesmas, mais modestamente,como apenas outro conjunto denarrativas.

Portanto, o pluralismo pretendido pelos pós-modernistas pode ser visto como a afirmação daexistência de fins que podem ser procurados devárias maneiras pelos homens, fazendo com que sesintam plenamente realizados e capazes deentendimento mútuo. Essa é a concepção depluralismo de Isaiah Berlin.

Para Berlin (1991), o pluralismo éfundamental à sociedade e ao homem porque, semele, inexiste a possibilidade da ocorrência dofenômeno da mudança. Portanto, o mecanismoresponsável pela mudança, como defende Berlin, éo equilíbrio precário resultante do choque entrevárias concepções e opiniões diferentes, pois essavariedade e pluralidade pode implicar apossibilidade de conflitos de valores, deincompatibilidade entre ideais ou entre objetivosimediatos de homens plenamente realizados.Entretanto, nenhuma doutrina que traga, no seucerne, uma concepção monísta do certo e doerrado, do bem e do belo, nenhuma teologia queconspira para uma resolução final harmoniosa dosproblemas humanos e naturais, pode admitir apluralidade como um valor independente a serprocurado como tal.

A EDUCAÇÃO FÍSICA E O ESPORTE NAPÓS-MODERNIDADE

Do que foi discutido, pode-se afirmarque: a) não existe um método científico isento deproblemas; b) os paradigmas são incomensuráveisentre si, dificultando o nosso confronto acadêmicoquando debatemos utilizando paradigmasdiferentes; c) a epistemologia é própria da pesquisanormal, porque o ideal epistemológico deconhecimento exato só se justifica nos momentosde prática normal, dominado por um paradigma; d)a pesquisa revolucionária caracteriza-se por serhermenêutica porque não é dominada por umparadigma, o que abre a possibilidade de“aventuras intelectuais” no sentido de produzirmos

novas alternativas para o paradigma envelhecido;e) portanto, no momento de prática destituída deparadigma, pode ocorrer pluralidade de idéias,resultando em conflitos; f) como sugerido porBerlin, é esse conflito que vai propiciar osurgimento de um conhecimento inovador. De quemaneira tais afirmações e outros pontos discutidosanteriormente podem afetar a EF e o esporte,alterando a sua conduta acadêmica e profissional?Acreditamos que o principal desafio dessas áreas éadaptar as suas condutas teórico-práticas aos novosavanços do conhecimento propiciados pela pós-modernidade.

Esses conceitos são importantes paraessas áreas porque ambas atuam sobre organismoshumanos, cuja constituição é pluri-estratificadacom correlações polimorfas e micromorfas entre assuas partes constituintes. Portanto, para podermosentender o significado desses conceitos e as suasimplicações para essas áreas, a complexidadeorganizacional de um organismo em forma de rede,como proposto por Capra (1996), também deve serlevada em conta. Ou seja, o domínio dessesconceitos pela EF e Esporte pode trazer alteraçõesna conduta prática dos profissionais dessas áreas.Dessa forma, podemos dizer que até mesmo essanoção de complexidade orgânica está inserida nocontexto da pós-modernidade. A complexidadeorganizacional de um organismo, para serentendida, deve ser discutida com o auxílio deoutros conceitos além dos que já foramapresentados, como: a) o significado decomplexidade estrutural, desenvolvido por Nicolis(1986) e amplamente discutido por Salthe (1993);b) autopoiese, desenvolvida por Romesín & García(1997); c) co-adaptação, formulado por Weber(1992) e; d) simmorforose, descrito por Weibel,Taylor & Hoppler (1991). A apresentação ediscussão desses conceitos e o levantamento desuas implicações para a EF e o Esporte fogem aoescopo do presente trabalho e são objetivo de outroensaio (Pereira, não publicado). Aqui, poderíamosadiantar que todos os desenvolvimentos científicospropiciados pela pós-modernidade, sintetizados nosconceitos apresentados nesse ensaio, nos levam afalar de um princípio da variabilidade. São essasnoções que justificam a nossa ênfase navariabilidade como um princípio vital para o serhumano em todas as áreas de atuação, incluindo aprática de atividade física, pois incorpora asnoçõesde rede, complexidade estrutural e demaisconceitos discutidos nesse ensaio (Pereira, 1995,não publicado).

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CONCLUSÃO

A EF tem procurado se afirmar comodisciplina acadêmica e profissão recorrendo aalgumas estratégias. Para se estabelecer comodisciplina acadêmica, tentou-se modificar o seunome, caracterizar o seu objeto de estudo edesenvolver metodologia própria. Para o seudesenvolvimento enquanto profissão, nãoencontramos uma ampla discussão dessa questão.O objetivo desse ensaio foi de mostrar que além

dessas considerações, questões metodológicasdevem também ser discutidas. A partir disso,constatamos que existe confusão entre métodos etécnicas pelos professores de EF, além de outrosprofissionais, verificada, principalmente, quandoanalisamos a sessão Materiais e Métodos dasdissertações e tesesproduzidaspor essasáreas. Issomostra a importância de os profissionais de EFtambém se envolverem com questõesmetodológicasda pesquisa científica.

ABSTRACT

THE LIMITATIONS OF THE SCIENTIFIC METHOD:IMPLICATIONS FOR PHYSICAL EDUCATION

Physical education has been searching for its academic and professional status for a long time.In order to become an academic discipline the strategy used was: attemptes to change its name; to characteriseits subject matter and to develop its own methodology. In regard to its professional development, we are yetto find a comprehensive debate about it. This essay addresses the issue of metholodoly by discussing theavailable scientific methods. We concluded that the professionals of physical education have shown greatconfusion about methods and techniques and that the methodology has yet to develop a method free ofproblems.

UNITERMS: Epistemology; Hermeneutics; Scientific method; Paradigms; Positivism, Critic rationalism;Variability.

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Recebido para publicação em: 12 set. 19971a. revisão: 23 dez. 1997

2a. revisão: 27 maio 1998Aceito em: 26 nov. 1998

ENDEREÇO: Benedito PereiraDepto. de Biodinâmica do Mov. do Corpo HumanoEscola de Educação Física e Esporte - USPAv. Prof. Mello Moraes, 6505508-900 - São Paulo - SP - BRASIL