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As características do processo de produção da agricultura criam a necessidade, pelo menos em determinados estágios de desenvolvimento do setor, de que o Estado estabeleça condições de canalização de recursos ou avance ele mesmo recursos obtidos fora do setor agrícola. Geralmente isto ocorre quando as condições em que se efetiva a produção agrícola não cumprem as necessidades mais gerais da economia, ou seja, quando se configura um quadro de avanço da economia que não é acompanhado, satisfatoriamente, pela agricultura. Há, também, a necessidade de aporte de recursos externos ao setor agrícola em situações de mudança do padrão tecnológico de produção. A implantação de novas técnicas produtivas requer usualmente um volume de recursos correspondente, o qual dificilmente se encontra disponível no âmbito da produção agropecuária, ou o que é o mesmo, as características da produção agrícola não permitem ao setor gerar internamente as condições financeiras que propiciemo financiamento de um salto qualitativo a nível tecnológico. Tal situação gera a necessidade de transferência de recursos de outros setores para a agricultura. Na década de 60, a situação da agricultura brasileira aproximava-se bastante do quadro descrito acima. Havia a necessidade de mudanças nas técnicas de produção do setor, visando a sua inserção no mercado internacional, em termos de maior competitividade. Por outro lado, o processo de desenvolvimento da indústria requeria um considerável aumento tanto da oferta quanto da demanda da agricultura por bens industrializados. Nesse quadro, o Estado teve papel fundamental ao estruturar um sistema capaz de captar recursos visando a sua canalização ao setor rural. Afora isso, o Estado criou disponibilidades no âmbito do seu orçamento com o mesmo fim. Assim, um dos pontos básicos da análise elaborada baseia-se na idéia de que o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) é criado com o objetivo de aumentar a produtividade da agricultura buscando aumentar a sua competitividade no mercado internacional, mas, antes de tudo, para atender aos interesses da indústria nacional que necessitava ampliar a demanda de produtos industrializados para os quais a agricultura se configurava como um mercado potencial. A partir da institucionalização do crédito rural e até recentemente, a agricultura passou por profundas modificações internas. Mas, o que é importante captar, são as mudanças no seu relacionamento com o restante da economia, isto é, o fato de que as modificações implementadas, na década de 60, com relação ao setor agrícola levaram a um processo de crescente inter-relação entre agricultura e indústria, que passou, nos anos 70, a se dar sob o comando do capital financeiro. O objetivo do trabalho é estudar a forma inicial de estruturação do sistema de crédito rural implantado no Brasil, seus avanços e recuos e a implicação que as diversas modificações por que passaram teve em termos do desenvolvimento agrícola. A análise desenvolve-se com base em aspectos teóricos específicos do processo de produção agrícola que não demonstrar sua especificidade e explicar as características especiais no que se refere ao seu financiamento.

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As características do processo de produção da agricultura criam anecessidade, pelo menos em determinados estágios de desenvolvimento dosetor, de que o Estado estabeleça condições de canalização de recursosou avance ele mesmo recursos obtidos fora do setor agrícola. Geralmente isto ocorre quando as condições em que se efetiva a produção agrícola não cumprem as necessidades mais gerais da economia, ou seja, quando se configura um quadro de avanço da economia que não é acompanhado, satisfatoriamente, pela agricultura. Há, também, a necessidade de aporte de recursos externos ao setor agrícola em situações de mudança do padrão tecnológico de produção. A implantação de novas técnicas produtivas requer usualmente um volume de recursos correspondente, o qual dificilmente se encontra disponível no âmbito da produção agropecuária, ou o que é o mesmo, as características da produção agrícola não permitem ao setor gerar internamente as condições financeiras que propiciemo financiamento de um salto qualitativo a nível tecnológico. Tal situação gera a necessidade de transferência de recursos de outros setores para a agricultura.

Na década de 60, a situação da agricultura brasileira aproximava-se bastante do quadro descrito acima. Havia a necessidade de mudanças nas técnicas de produção do setor, visando a sua inserção no mercado internacional, em termos de maior competitividade. Por outro lado, o processo de desenvolvimento da indústria requeria um considerável aumento tanto da oferta quanto da demanda da agricultura por bens industrializados.

Nesse quadro, o Estado teve papel fundamental ao estruturar um sistema capaz de captar recursos visando a sua canalização ao setor rural. Afora isso, o Estado criou disponibilidades no âmbito do seu orçamento com o mesmo fim.

Assim, um dos pontos básicos da análise elaborada baseia-se naidéia de que o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) é criado com o objetivo de aumentar a produtividade da agricultura buscando aumentar a sua competitividade no mercado internacional, mas, antes de tudo, para atender aos interesses da indústria nacional que necessitava ampliar a demanda de produtos industrializados para os quais a agricultura se configurava como um mercado potencial.

A partir da institucionalização do crédito rural e até recentemente, a agricultura passou por profundas modificações internas. Mas, o que é importante captar, são as mudanças no seu relacionamento com o restante da economia, isto é, o fato de que as modificações implementadas, na década de 60, com relação ao setor agrícola levaram a um processo de crescente inter-relação entre agricultura e indústria, que passou, nos anos 70, a se dar sob o comando do capital financeiro.

O objetivo do trabalho é estudar a forma inicial de estruturaçãodo sistema de crédito rural implantado no Brasil, seus avanços e recuos e a implicação que as diversas modificações por que passaram teve em termos do desenvolvimento agrícola.

A análise desenvolve-se com base em aspectos teóricos específicos do processo de produção agrícola que não demonstrar sua especificidade e explicar as características especiais no que se refere ao seu financiamento.

Isso, no entanto, não significa analisar a agricultura como um todo isolado, mas a partir de sua inserção nos movimentos gerais da economia, buscando mostrar as especificidades do seu desenvolvimento frente aos demais segmentos.

A análise foi estruturada a partir de dois capítulos. O primeirodivide-se em três partes, nas quais, primeiramente, são feitas algumasconsiderações de caráter teórico sobre o crédito rural, baseando-se nas especificidades do setor agrícola frente aos demais. A seguir, são descritos os diferentes sistemas de crédito rural estruturados em países desenvolvidos, dando-se especial ênfase ao sistema de crédito

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rural francês dada a sua importância no que se refere à consecução dos objetivos propostos quando de sua concepção. Finalmente, é analisado o caso do Brasil, tanto do ponto de vista da evolução histórica do crédito rural e da agricultura nacional quando do estágio de desenvolvimento da economia como um todo, visando a detectar os determinantes da estruturação do sistema nacional de crédito rural (SNCR). Nesse item, é examinada também a evolução desse sistema no Brasil e as modificações sofridas desde a sua implantação.

No segundo capítulo, passa-se a analisar a alocação dos recursosdisponíveis no sistema de crédito rural. Sob esse ângulo, é verificadaa distribuição dos recursos financeiros entre os produtores e as diferentes regiões do País. A seguir, são examinados alguns indicadores da modernização gerada pela injeção dos recursos financeiros na agricultura. Nesta parte, é feita uma comparação entre a modernização do País e a do Rio Grande do Sul. Finalmente, tem-se a análise da agricultura gaúcha também do ponto de vista da distribuição dos empréstimos entre os diferentes produtores e a alocação dos recursos entre as culturas.

Nesse ponto, é importante salientar que, com relação à distribuição de recursos entre as diferentes culturas, somente são analisados os empréstimos realizados com a finalidade de custeio. Tal procedimento justifica-se, uma vez que os empréstimos alocados sob a rubrica de investimentos não são repassados diretamente a uma cultura porque geralmente incorporam-se a diversos produtos.

Nesse item, é feita a relação entre os recursos financeiros alocados e os aumentos de produtividade. Em vista do exposto no parágrafo anterior, essa relação somente foi feita entre os empréstimos para custeio e a produtividade. No entanto considera-se, no âmbito deste trabalho, que esses aumentos de produtividade se devem, em grande parte, aos recursos com a finalidade de investimento. Uma das idéias básicas veiculadas no texto confere aos recursos para investimento a capacidade de gerar ganhos de produtividade permanentes, ou seja, é esse tipo de empréstimo que incorpora ao processo produtivo técnicas capazes de aumentar a produtividade que uma vez incorporadas tendem a ser definitivos. Já com relação aos recursos de custeio, as modificações agregadas limitam-se, em geral, a um ano-safra, sendo necessária, anualmente, a recolocação de novos empréstimos para manter a "nova forma" de produzir.

Com relação a esse ponto, cabe assinalar a diferença entre os dois tipos de crédito mencionados acima e o de comercialização. No que tange a aumentos de produtividade, que é a questão fundamental do trabalho, o crédito de comercialização, ao contrário do de custeio e do de investimento, não tem qualquer significância. Em vista dessa inexistência de vinculação entre o crédito de comercialização e ganhos de produtividade, esse tipo de crédito não foi considerado no desenvolvimento da presente análise.

É importante, por outro lado, mencionar que a produtividade de que trata o texto se limita à chamada produtividade física da terra, a qual significa a produção física por hectare.

Período de anãlise

A escolha do período de análise engloba a fase mais importante de vigência do sistema de crédito rural. A criação do sistema em 1965 é o ponto de partida da análise elaborada, ea partir daí são analisados 20 anos de existência desse sistema. Consideram-se as décadas de 60 e 70 como de efetiva vigência do sistema de crédito

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rural, porque nesses períodos a política agrícola era implementada usando com bastante ênfase os mecanismos de financiamento à produção. A partir de 80, há uma mudança nesse comportamento, e as autoridades governamentais passam a dar maior peso à política de garantia de preços mínimos para os produtos agrícolas como incentivo a sua produção, mas ainda são mantidos certos mecanismos de financiamento específico à produção.

1- O CRt:DITO RURAL COMOINSTRUMENTO DA POllTICA AGRíCOLA

1.1 - Conceituação teórica e histórica

De acordo com o Banco Mundial,"( ...) os objetivos dos programas de crédito agrícola patrocinadospelos governos mudaram de modo notável no cursodos últimos decênios. Tradicionalmente, seu objetivoprincipal era de reduzir a dependência dos agricultores,em especial dos pequenos, com relação ao emprestador local,o qual, se acreditava, os explorava com suas taxasde juros" (Banco Mundial, 1975, p. 26).

Além disso, de acordo com o mesmo documento, várias vezes eranecessário proceder a refinanciamentos, devido ao excessivo endividamento contraído a custos elevados.

"Com a crescente importância dada ao crescimento econômicoa partir de 1950 e com o desenvolvimento de técnicas agrícolas novas e mais produtivas durante o decênio de 1960, os governos começaram a considerar muito importante a utilização dos programas de crédito para conseguir um aumento da produção" (Banco Mundial, 1975, p. 26).

Em épocas mais remotas, quando os recursos demandados pelos agricultores consistiam apenas num adiantamento do capital necessário à simples reprodução de suas lavouras,eram os comerciantes, os grandes proprietários de terras e outros "capitalistas" locais que forneciam esses recursos. Não havia nessas transações qualquer tipo de controle governamental, e os empréstimos faziam-se apenas entre particulares, apresentando, em decorrência, sérios riscos. Sendo assim, era natural que os seus juros atingissem taxas bastante elevadas, que podiam, muitas vezes, ser consideradas usurárias. Na verdade, essas taxas de juros eram reflexo, também, da escassez de recursos financeiros no meio rural já que, freqüentemente, a poupança acumulada no campo acabava sendo canalizada para as áreas urbanas, onde as garantias de rápido reembolso dos empréstimos eram, via de regra, mais satisfatórios - seja devido à velocidade de rotação dos capitais, seja devido à menor incidência de riscos climáticos e biológicos.

Nas épocas em que se torna necessário aumentar a produção e/ouprodutividade agropecuárias, ou seja, quando as necessidades de investimentos no setor superam as disponibilidades locais de recursos financeiros, esses têm que vir de fora do meio rural. O aumento dasáreas cultivadas assim como as diversas inovações tecnológicas supõenecessidades financeiras crescentes e específicas.

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Em alguns poucos casos, o aumento da produção e a mudança tecnológica podem se dar sem grandes inversões adicionais de recursos financeiros. Mas, na maioria das vezes, o capital necessário não podeser obtido pelos produtores no próprio meio rural. Nesses casos, as fontes tradicionais de crédito agrícola simplesmente não são capazes de suprir as necessidades de recursos criados pelas novas oportunidades econômicas e tecnológicas. Tais necessidades passam a ser atendidas por empréstimos e entidades externas ao setor agropecuário.

É justamente aí que se torna indispensável a criação e/ou a reformulação das instituições voltadas para o crédito rural, a fim decapacitá-las ao atendimento da crescente demanda de recursos financeiros do setor agropecuário. Essa criação e/ou reformulação envolve usualmente uma certa dose de intervenção estatal no sistema de crédito e uma mudança nas suas relações com o setor agropecuário.

De acordo com Q Banco Mundial (1975, p. 27), as políticas governamentais de crédito rural, freqüentemente formuladas e executadas dentro de uma estratégia de crescimento da produção setorial, com ou sem absorção de progresso técnico, costumam ter os seguintes objetivos gerais:

- incrementar a produtividade e os rendimentos dos agricultores;

- gerar lucros suficientes para permitir o reembolso com juros dos recursos financeiros emprestados aos mesmos;

- e, eventualmente, distribuir os recursos disponíveis entre o maior número possível e pequenos agricultores.

É indiscutível que a disponibilidade de um sistema de crédito agrícola institucionalizado ajuda a incrementar a produção do setor.

Para haver uma geração de lucros suficientes à cobertura dos custos dos empréstimos e ainda a apropriação de um excedente pelos produtores, muitos programas de crédito agrícola envolvem substanciais subsídios - ou seja, taxas de juros e/ou condições de pagamento mais favoráveis do que as vigentes no crédito não agrícola, Esses subsídios geram, por vezes, a necessidade de utilização de recursos financeiros governamentais de origem orçamentária.

Ao mesmo tempo, todavia, a distribuição do crédito rural e dos subsídios a ele inerentes deixa bastante a desejar, uma vez que os produtores de maior porte tendem a ter um acesso mais fácil aos empréstimos institucionais embora suas necessidades financeiras sejam relativamente menores que as dos pequenos produtores rurais.

Afora as considerações acima, de caráter mais histórico torna-se necessário salientar as características do desenvolvimento da produção agrícola visando a estabelecer, de forma clara as suas necessidades com relação aos financiamentos. Ou seja, as características peculiares dessa atividade, face às dos demais setores produtivos, tornam necessária a existência de condições especiais nos fluxos de recursos que se destinam ao setor. As referidas condições dizem respeito tanto aos destinatários dos recursos como aos agentes financeiros que servem de intermediários nessas transferências.

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Parece haver consenso entre alguns autores que analisam a agricultura a respeito de desvantagens de sua rentabilidade econômica face à dos demais setores da economia.

A análise dessa questão não será aprofundada aqui em função da inexistência de trabalhos empíricos que demonstrem tal afirmação. No entanto reproduz-se-á, de forma suscinta, o quadro geral esboçado por esses analistas. Na opinião desses autores, a agricultura tenderia a constituir-se numa atividade de maior risco e de menor lucratividade em comparação às demais. Dentro dessa visão, por se tratar de um setor social e politicamente importante, os seus agentes produtivos seriam capazes, na maioria das vezes, de obter compensações do restante do sistema econômico. Sob esse aspecto, é considerada fundamental a ação do Estado, ao qual caberia assegurar, na medida do possível, a manutenção das margens de lucro da atividade agrícola dentro de uma faixa de rentabilidade que fosse "normal" em relação ao restante da economia. Essa intervenção do Estado realizar-se-ia, em boa parte, através do crédito, e as "compensações" reivindicadas pelo setor agropecuário tenderiam a ser concedidas sob a forma de subsídios ao mesmo e/ou através da fixação de preços renumeradores para os produtores.

No contexto deste trabalho, tentar-se-á delinear as condições específicas em que se desenvolve a produção agrícola com o intuito, já mencionado anteriormente, de estabelecer alguns pressupostos relativos às necessidades do setor com relação aos fluxos de recursos a ele canalizados.

Segundo Madeleioe Degon (1939, p. 43), é clássico, para estabelecer as características da exploração agrícola, opor-lhe às da indústria. Nesse sentido, a autora analisa algumas particularidades do setor agrícola frente ao industrial:

a) lentidão de reconstituição do capital de giro. Enquanto a indústria pode recuperar três ou quatro vezes ao ano o capital investido numa operação de manufatura, o ciclo normal da produção agrícola é, nas circunstâncias mais favoráveis, pelo menos de nove meses. Dessa forma, com um ciclo que normalmente se estende por vários meses, muitas vezes a quase um ano, e como esse tempo de produção não pode ser reduzido de forma apreciável pelo uso de novas técnicas e/ou através da intensificação do ritmo de trabalho, dependendo de um dado prazode maturação biológica, o capital investido no início do ciclo somente poderá ser recuperado no final de um prazo bastante longo, se comparado, por exemplo, ao ciclo produtivo da indústria.

b) característica essencialmente aleatória da atividade agrícola."O volume e a natureza da matéria tratada permite ao industrial avaliar com precisão, desde o início da operação, a quantidade e a qualidade dos objetos fabricados. Ligado à natureza, o agricultor não pode evidentemente prejulgar da abundância e do valor da sua colheita, mesmo que ele tenha feito tudo para obter os melhores resultados"(Degon, 1939, p. 44).

Mesmo com o uso de técnicas avançadas, não existe a garantia de bons resultados, já que a agricultura se caracteriza, acima de tudo, por uma estreita de Pendência dos chamados "fatores naturais" (tais como as variações climáticas, as condições fitossanitárias, etc.); a periódica ocorrência de imprevisíveis e dificilmente controláveis calamidades chega, por vezes, a comprometer integralmente o resultado de um ciclo produtivo, sem qualquer possibilidade de amortecer as

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perdas por meio de uma produção mais acelerada ou de caráter emergencial.

c) impossibilidade de aumentar indefinidamente o rendimento das terras cultivadas. "O emprego de adubos e o aperfeiçoamento das máquinas terão um efeito cada vez menos eficiente além de um grau ótimo" (Degon, 1939, p. 45).

Ou seja, o crescente emprego de inovações tecnológicas é incapaz de aumentar indefinidamente o rendimento por área cultivada e/ou por pessoa ocupada - uma situação bastante diversa da que ocorre na indústria, por exemplo.

d) dificuldade no controle das aplicações."Enquanto o banqueiro pode a cada instante fazer o exame das contas correntes que refletem as operações correspondentes aos industriais e comerciantes, um tal controle sobre o agricultor é inconcebível"(Degon, 1939,p.45).

Guilherme Delgado também analisa as especificidades do ciclo de produção agrícola ressaltando as seguintes diferenças frente aos demais setores.

"A especificidade do período de produção agrícola caracteriza-se por dois tipos de descontinuidade que trazem conseqüências à rotação mais lenta dos capitais empregados na agricultura, relativamente aos capitais aplicados em processos de produção contínuos. A primeira descontinuidade está referida pelo já apontado problema da interrupção do processo de trabalho, dentro do período de produção. Isso implica em rotação mais lenta do capital que, vista de outro ângulo, significa maior necessidade de imobilização no tempo, do capital de giro que financia as operações produtivas, desde o preparo inicial do solo até o final da colheita e venda da produção. Mas há ainda uma segunda descontinuidade, que se verifica entre períodos de produção. Isso porque, mesmo quando concluído o período de produção de um produto qualquer, em geral não há renovação imediata do processo, mas tão somente em datas pré-estabelecidas no calendário agrícola, variáveis por produto e latitude geográfica" (Delgado, s.d., p. 117).

Segundo Delgado,(... ) outra característica peculiar do período de projeçãoAgrícola é o caráter inteiramente ilíquido do capital investido até o final desse período, dado que, pela sua própria natureza, a agricultura, ao contrário da pecuária, não apresenta, durante o processo produtivo, estoques de mercadorias semi elaboradas de uso intermediário.Por isso, o retorno de qualquer parcela de capital de giro (capital circulante) somente poderá apresentar algum grau de liquidez depois que se dispuser do estoque das mercadorias terminadas, que são propriamente os produtos agrícolas após a colheita. A situação da pecuária é distinta, pela simples razão de que há mercados intermediários e mesmo finais para a negociação de animais de diferentes portes e idades, conferindo a esta atividade um caráter inteiramente diverso quando às necessidades de capital de trabalho" (Delgado, s .rí., p.117-18).

As condições específicas da produção agrícola acima referidas remetem como já foi mencionado, as necessidades especiais com relação ao crédito a ela destinado.

Em primeiro lugar, tem-se que as operações de crédito devem realizar-se em prazos mais longos, que os de mesma natureza para o

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comércio e a indústria, como reflexo do ciclo também mais longo da atividade agrícola.

Em segundo lugar, há a necessidade de condições flexíveis para o reembolso dos empréstimos. A incerteza da entrada de fundos, conseqüência da irregularidade das colheitas bem como das mudanças climáticas, adapta-se mal aos termos fixos e aos prazos rígidos. Além disso, a maior flexibilidade no reembolso dos empréstimos é necessária para garantir ao produtor a possibilidade de vender seus produtos no momento em que obtiver um preço remunerador para o mesmo, sem ser pressionado a colocá-los no mercado de qualquer maneira, apenas para fazer face a seus compromissos com os agentes financeiros.

" ...Em razão das mesmas considerações o empresa agrícola deve ter a faculdade de transferir para o ano seguinte todo ou parte de seus compromissos quando uma má colheita não lhe permite recuperar o capital investido no início do ano" (Degon, 1939, p. 45).

Por outro lado, devem ser ainda analisadas as diferenças quanto à natureza das garantias exigidas para os empréstimos destinados aos produtores, as quais costumam variar conforme a natureza do empréstimo, o prazo do reembolso, o tipo de aplicação, etc.

De maneira geral, o crédito para investimento na compra de terras, por exemplo, tende a ser de longo prazo, geralmente comportando como garantia uma hipoteca. Por outro lado, classificar-se-ia como crédito de médio prazo - com períodos de reembolso variando de cinco a dez anos - os empréstimos para investimentos em novas técnicas e no melhoramento do solo. Costuma-se incluir nesse tipo de crédito o financiamento destinado à compra de máquinas, animais de tração e à construção de edifícios. Finalmente, o crédito para custeio de despesas correntes - como a compra de insumos e a remuneração da força de trabalho - seria constituído de empréstimos a curto prazo, reembolsáveis após o término da safra. Esta última modalidade não pode ser baseada em hipotecas, sob pena de prejudicar a continuidade das atividades produtivas no setor. Daí a preferência pela concessão de tais recursos sob a forma de um crédito pessoal.

Devido às especificidades que acabam de ser apontadas, e que se refletem na necessidade da formulação de normas especiais para se garantir uma adequada oferta de recursos para a agricultura, as entidades financeiras privadas não têm usualmente muito interesse em atuar no setor. Isso ocorre, de um lado, porque o retorno do capital emprestado se dá num prazo bem mais longo do que nos demais setores e, de outro, porque esse retorno é afetado por maiores taxas de risco. Além disso, no caso da indústria e do comércio, os em prestadores podem, a qualquer momento, acompanhar e controlar as contas correntes de seus prestamistas, algo que é bem mais difícil, ou até inviável, no caso da produção agropecuária.

E todo esse conjunto de fatores específicos ao crédito agrícola que leva o Estado a desempenhar um papel de grande relevância na criação de condições capazes de viabilizar o fluxo de recursos necessários à sustentação e ao desenvolvimento do setor agropecuário.

A absorção do progresso técnico pelo setor agropecuário apresenta estreita relação com o crédito rural. A necessidade de um contínuo aumento da produção, depois de alcançados os limites de expansão da fronteira agrícola, somente se viabiliza através da adoção de tecnologias que aumentem a produtividade física da terra. O crédito é um instrumento indispensável para promover a adoção e a difusão das

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inovações tecnológicas. Além disso, numa situação dessa natureza, torna - se importante, às vezes, a fixação de taxas de juros para os financiamentos à agricultura abaixo das vigentes no mercado, com o fim de estimular os produtores a absorverem a nova tecnologia.

Nesse contexto, o papel do Estado assume um caráter fundamental no sentido de criar a oferta de recursos necessários, além de arcar com o ônus dos subsídios implícitos na canalização de recursos para o setor agropecuário a custos mais reduzidos do que os de mercado. De forma global, a intervenção do Estado, refletida na sua política de crédito agrícola, aparece de várias formas:

- na estruturação de um sistema financeiro articulado, com vistas à obtenção de recursos passíveis de serem canalizados para o setor agropecuário;- no estabelecimento de normas para a correta aplicação desses recursos;- na legislação relativa às aplicações do sistema financeiro privado na agricultura;- na consignação de recursos governamentais para subsidiar o crédito rural via dotações orçamentárias.

A partir de certo estágio de desenvolvimento da produção agrícola, a existência de uma política de crédito agrícola bem definida é de extrema importância, pois, quanto mais desenvolvida ou capitalizada for a agricultura de um país ou de uma região, mais importante se torna o seu sistema de crédito rural. Uma prova disto está na existência de uma relação cada vez mais estreita e direta entre o montante dos empréstimos concedidos e o volume da produção, especialmente a curto e médio prazos.

1.2 - O sistema de crédito rural nos paísesDesenvolvidos

"Em quase todos os países, os primeiros passos do desenvolvimento de um sistema de crédito agrícola têm sido dados pelos indivíduos ou emprestadores privados. Em muitos países apareceram como continuação as cooperativas e as associações de crédito dedicados a conceder empréstimos em condições mais vantajosas. Também o Governo começou a intervir, seja como emprestador direto, seja como tutor das cooperativas de crédito, com o fim de proporcionar fontes de crédito mais adequados e normalizar as condições dos empréstimos. Em muitas economias avançadas, as cooperativas e as agências de crédito tuteladas pelo Governo tem representado na agricultura um papel muito mais importante que em qualquer outro setor destacado da economia"(Halcrow, 1968, p. 260).

Nos países desenvolvidos, encontram-se diferentes tipos de atuação governamental com relação ao crédito agrícola. "Grosso modo", poder-se-ia agrupá-los em três tipos (Halcrow, 1968, p. 260).

Sistemas cooperativos tutelados pelo Governoo Governo limita-se, neste caso, a estabelecer a legislação e os

regulamentos para a atuação das cooperativas de crédito. Além disso, costuma conceder créditos destinados aos investimentos iniciais das cooperativas que são reembolsados, pelo menos em parte, no momento em que a cooperativa passa a autofinanciar-se.

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"Na maioria dos países da Europa Ocidental, as cooperativas locais são parte de organizações regionais e nacionais incluídas em um sistema nacional. A concessão de créditos está sujeita a normas de alcance nacional, mas as decisões administrativas são tomadas pelos representantes locais responsáveis perante os membros da cooperativa. As sociedades costumam ser pequenas, atendendo a uma só aldeia ou comunidade. As operações de crédito combinam-se às vezes com outras atividades cooperativas, como as de compra, elaboração, comercialização e outros serviços" (Halcrow, 1968, p. 260).

Este tipo de cooperativa conta geralmente com outras fontes de crédito, como bancos de poupança, que facilitam os empréstimos aos agricultores.

Sistemas dirigidos pelo Governo

Nesses sistemas, o Governo faz parte da administração central. Este tipo de sistema de crédito rural dirigido pelo Governo é encontrado na França, na Itália, no Japão e na Turquia. O funcionamento do sistema de crédito francês será desenvolvido separadamente em função do material disponível e da sua importância como sistema de crédito rural. Na Itália, a estrutura do sistema de crédito é semelhante à do francês. Os créditos para melhorias agrícolas são concedidos pelas entidades regionais e/ou nacionais e subvencionados pelo Ministério da Agricultura e Silvicultura. Os créditos de curto prazo, ou seja, o capital circulante, são concedidos pelos bancos locais ou bancos cooperativos rurais. No sistema de crédito rural do Japão, os empréstimos são concedidos a longo prazo e a baixo custo por uma instituição governamental central - Banco Central Cooperativo para a Agricultura e Silvicultura - e/ou por bancos comerciais locais.

Na Turquia, o crédito rural é concedido na sua maior parcela (75%) pelo Governo através de agências do Banco Agrícola e o restante por cooperativas financiadas pelo Banco.

É o caso de muitos países subdesenvolvidos, onde os bancos comerciais e as cooperativas de crédito agrícola apresentam um desenvolvimento lento. Os empréstimos são efetuados diretamente pelo Governo por meio de agências sob controle estatal. Nos casos em que os financiamentos podem ser obtidos de fontes privadas, o Governo facilita créditos “(... ) com o fim de complementar estas fontes e proporcionar uma maior abundância de crédito, em geral a baixo custo" (Halcrow, 1968,p. 261).

Em países desenvolvidos, como por exemplo, os Estados Unidos e alguns da Europa Ocidental, existem agências para a concessão de empréstimos diretos do Governo para fins específicos, como promoção de um tipo particular de cultura, estímulos para a expansão da produção de certos cultivos e auxílios a agricultores que não podem obter créditos de outras fontes.

Nos Estados Unidos, encontra-se uma combinação dos diferentes tipos de sistema de crédito agrícola. Os empréstimos são concedidos diretamente pelo Governo ou por agências tuteladas pelo Estado, bem como por fontes privadas.

"Os serviços prestados à agricultura pelo crédito federalque compete diretamente com os bancos comerciais,com as companhias de seguros e com outros emprestadoresprivados, incluídos os individuais, são mais variados ecompletos que os prestados a qualquer outro setor daeconomia" (Halcrow, 1968, p. 261).

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Inicialmente, o Governo americano atuava no setor agrícola através de bancos agrícolas por ações, os quais foram criados e financiados como empresas privadas, e através de bancos agrícolas federais com capital governamental, dirigidos e controlados pelo Governo. Os bancos por ações não conseguiram sobreviver, e os federais passaram a atuar sob a forma de um sistema cooperativo, concedendo os empréstimos a longo prazo. Os créditos de curto e médio prazos passaram a ser concedidos por um sistema nacional de cooperativas criado para este fim. Esse sistema consiste em uma cooperativa tutelada pelo Governo, cujas ações das associações locais estão nas mãos dos membros emprestadores que são obrigados a investir 5% do empréstimo em ações. O sistema efetua empréstimos à produção por períodos de 30 dias a 15 anos.

O sistema de crédito americano é complementado pelos bancos decooperativas que são organismos federais e estão subordinados ao Banco Central Cooperativo. Esses bancos de cooperativas concedem créditos a determinadas cooperativas de agricultores dedicados à comercialização da produção agrícola, à aquisição de produtos e a proporcionar serviços às empresas agrárias. Esse tipo de banco também atua na concessão de empréstimos para facilitar a construção e a aquisição de edifícios para a compra de equipamentos, sendo concedidos por um prazo de 20 anos. Os empréstimos para funcionamento da atividade que são concedidos por períodos curtos e podem não ter garantia, são também fornecidos por esses bancos.

Com a crise de 1930, esses bancos sofreram perdas da mesma forma que outros emprestadores agrícolas, mas superada a crise, essas passaram a ser mínimas, e os retornos acumulados passaram a cobrir o capital governamental originariamente investido.

No caso da concessão de empréstimos parte do Governo, isto é feito através de "Farmers Home Administration" diretos à agricultura por uma organização denominada

"Em 1918 e durante mitos anos depois, o congresso destinou dinheiro para ajudar aos agricultores em dificuldades econômicas por causa de secas e outros desastres naturais e demasiado pobres para conseguir crédito de outras fontes. Em 1935, com a criação da 'Resettlement Administration fundiram-se numa só agência os diversos programas de crédito e de ajuda destinados a socorrer as famílias de agricultores de renda baixa. Em 1937, este programa passou sob o nome de Farm Security Administration, ao Departamento de Agricultura. Em 1946, foi criada a Farmers Home Administration, com o objetivo de fundir todos os programas de empréstimos de emergência para operações e produção, os empréstimos à zonas danificadas e os destinados a cultivos afetados pela seca e a sementes" (Halcrow, 1968, p. 262).

Os empréstimos não imobiliários são concedidos, principalmente, para financiar o funcionamento da propriedade agrária, com prazos em geral mais curtos do que os dos outros empréstimos, sendo canalizados preferencialmente a zonas em que as condições econômicas são desfavoráveis. Os empréstimos imobiliários incluem empréstimos para a propriedade agrária, para a construção de casas e, em quantidades menores, para a conservação do solo e da água. Além da concessão direta dos empréstimos, a organização avaliza os concedidos por outros banqueiros para a propriedade agrária.

A experiência americana com relação à concessão de empréstimos diretos mostra que, mesmo em situações consideradas de emergência, os empréstimos podem apresentar boas garantias de retorno se forem concedidos com base na capacidade potencial de rendas da propriedade

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agrária. Dessa forma, atualmente tem-se na economia americana uma situação, com relação aos financiamentos agrícolas, em que o gasto líquido é constituído quase exclusivamente por gastos de administração.

1.2.1 - O sistema de crédito rural francês

Na França, 75% do total do Crédito Agrícola é fornecido pelas "Caisses de Crédit Agr ícole Mutuel", cuja organização inclui a Caísse Nationale de Crédit Agrícole que tem autonomia financeira e controla e coordena as Caisses Régionales. As comunidades são atendidas pelas Caísses Locales, que são subordinadas às Caisses Régionales.

As caixas locais e regionais são sociedades cooperativas, e a nacional tornou-se um estabelecimento público de natureza comercial e industrial que controla um grupo de filiais que são sociedades comerciais (Benetti, 1987, p. 182).

Inicialmente, a intervenção do Estado objetivava romper as condições de atraso relativo da agricultura em relação aos setores urbanos da economia.

"Uma agricultura praticada em estabelecimentos de pequena escala, com problemas de crescimento e produtividade, que sofre a pressão muito forte da concorrência internacional.(...)"Foi através da CNCA (Caisse Nationale de Crédit Agricole) que o Estado financiou a agricultura. Nos seus primórdios, graciosamente, através de dotações que deveriam formar o capital próprio da instituição; depois, sob a forma de adiantamentos que deveriam retornar aos cofres do Tesouro Público, embora a longo prazo e de custos reduzidos; na última fase o financiamento estatal se fez por meio de repasse da diferença entre as taxas de juros com que a CNCA captava recursos no mercado e as que efetivamente eram cobradas dos produtores rurais pelos empréstimos a eles feitos" (Benetti, 1987, p. 185-86).

Os recursos concedidos pelo Crédit Agricole são considerados como de curto prazo quando se destinam ao plantio e à comercialização da produção; de médio prazo, quando são efetuados com o objetivo de compra de máquinas e equipamentos agrícolas, benfeitorias, etc.; e de longo prazo, quando se referem à aquisição de terras. "Tais créditos são considerados como clássicos pela instituição, no sentido de que fazem parte de suas atribuições desde que abriu suas portas no final do século passado" (Benetti, 1987, p. 149).

Os créditos para financiamento do capital de giro das explorações agropecuárias (curto prazo) têm duração máxima de dois anos e são destinados a financiar o ciclo de produção primária - despesas de plantio de um determinado produto, engorda de bovinos e estocagem da colheita.

"Os créditos de curto prazo constituem empréstimos monetários. Isto significa que são concedidos diretamente pelas Caixas Regionais tendo como base a captação de recursos nas contas de depósitos à vista. Ou então, são empréstimos mobilizáveis, no sentido de que as Caixas Regionais podem, sob certas condições, redescontar os títulos representativos desses créditos junto à Caixa Nacional, a qual por sua vez, os redesconta no mercado monetário ou no Banco da França" (Benetti, 1987, p. 151).

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Os empréstimos considerados de médio prazo são conhecidos naFrança como créditos ao financiamento do capital de exploração com prazos que variam de 5 a 15/20 anos. Esse tipo de empréstimo é concedido com base em recursos monetários - com prazo variando de 5 a 7 anos – e com base nos adiantamentos concedidos às caixas regionais pela caixa central, com origem na captação de poupanças junto ao público – com prazos de duração de 7 a 15 anos, podendo, excepcionalmente, atingir 20 anos. Esses empréstimos de médio prazo podem ser subsidiados ou não.

Finalmente, tem-se os empréstimos de longo prazo para financiamento da aquisição de terras.

"Mais recentemente, isto é, a partir dos anos 60, a condição para que esse financiamento gozasse, ou não de vantagens fiscais e dos subsídios ao crédito (e, ainda, o grau de subsídio concedido as taxas de juros dos empréstimos às aquisições fundiárias) passou a depender da maior ou menor adequação do projeto as especificações do governo no que diz respeito ao tamanho, uso e localização das terras em objeto de financiamento (... ) "Estas normas, é importante colocar, foram estabelecidas mais recentemente com o objetivo de consolidar o maior número de explorações agrícolas viáveis, pois historicamente tais empréstimos fundiários eram realizados simplesmente com o objetivo de dar acesso ao pequeno produtor à exploração da terra" (Benetti, 1987, p. 154-56).

1 As informações sobre os empréstimos veiculadas aqui foram obtidas em: FNCA (1975), cs,13-14; as relativas à política em: De Lauwe apud Benetti (19871.

Além dos créditos considerados clássicos pelo CNCA, aparecem nos anos 60 os chamados "créditos especiais" que (...) se distinguem dos primeiros porque sua concessão está atrelada a atividades e programas cujo objetivo é o de reorientar o padrão de desenvolvimento histórico da agricultura francesa. Esta nova política agrícola foi inicialmente concebida pelo próprio governo francês e, depois, corroborada em suas grandes linhas pelas decisões conjuntas dos países membros da Comunidade Econômica Européia, da qual a França sabidamente é parte integrante “(Benetti, 1987, p. 149-50)”.

Além dos créditos considerados clássicos pelo CNCA, aparecem nos anos 60 os chamados "créditos especiais" que:

(...) se distinguem dos primeiros porque sua concessão está atrelada a atividades e programas cujo objetivo é o de reorientar o padrão de desenvolvimento histórico da agricultura francesa. Esta nova política agrícola foi inicialmente concebida pelo próprio governo francês e, depois, corroborada em suas grandes linhas pelas decisões conjuntas dos países membros da Comunidade Econômica Européia, da qual a França sabidamente é parte integrante”. (Benetti, 1987, p. 149-50).

As linhas gerais dessa política agrícola estabelecida na França, na década de 60 imprimem uma mudança radical quanto à intervenção estatal na agricultura, e o crédito tem um papel fundamental nessas alterações.

Os instrumentos clássicos de crédito continuarão sendo utilizados, mas dirigidos a novos e específicos objetivos sob a

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rubrica de "créditos especiais" que serão fortemente subsidiados visando a atender aos objetivos da nova política agrícola.

Os instrumentos clássicos de crédito continuarão sendo utilizados,mas dirigidos a novos e específicos objetivos sob a rubrica de "créditos especiais" que serão fortemente subsidiados visando a atender aos objetivos da nova política agrícola.

“Um desses é precisamente o de lograr a paridade entre as rendas agrícolas e não-agrícolas”. Isto significa que os produtores, os assalariados agrícolas e os administradores, de um lado, e, de outro lado, o capital de exploração e o fundiário' (De Lauwe apud Benetti, 1987, p. 10). “Alocados na agricultura, deveriam obter uma remuneração ao mesmo nível da que prevalece para o capital e o trabalho em outros setores da economia” (Benetti,1987,p.157).

Posteriormente o objetivo de obter paridade entre as rendas dos diferentes setores sofre mudanças, estabelecendo-se o da paridade do crescimento delas. Ou seja, a taxa de crescimento anual da agricultura deveria ser igual à dos outros setores econômicos.

O objetivo de crescimento da renda agrícola seria conseqüência do aumento da produtividade via progresso técnico e racionalização do uso dos seus recursos. E isso seria viabilizado através do crédito e de um sistema de preços indicativos.

"Este último consistia em estabelecer preços para cada cultura no ano base e que vigoraria após quatro anos, considerado como o ano-meta para efeitos da política. O objetivo desta última era o de dar um horizonte relativamente estável para o produtor agropecuário para ele poder estabelecer um programa de produção, sem ficar a mercê das acentuadas variações de preços anuais que caracterizam o mercado da produção agrícola" (Benetti, 1987,p. 160).

Segundo a autora, essas grandes linhas da política agrícola francesa combinavam com as propostas da CEE para o desenvolvimento da agricultura dos países membros.

1.3 - O crédito rural no Brasil

1.3.1 – Histórico

"( ... ) a história do crédito rural no Brasil pode ser dividida em três grandes períodos:um primeiro,que vai desde a descoberta, atravessando o período colonial, imperial e a chamada Primeira República, prolongando-se até 1937; um segundo período que se estende de 1937 até 1965 e, finalmente, um terceiro que se inicia em 1965 e se estende até os dias de hoje" (Pinto, 1981, p. 1).

De acordo com o autor, já no primeiro período, apresentaram-se inúmeras iniciativas no campo do financiamento às atividades agropecuárias. A característica do período foi, no entanto, financiamentos restritos a determinados produtos de exportação, que variavam de acordo com o comportamento do mercado internacional.

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Segundo Guedes Pinto, chegou-se a desenvolver um sistema regular de crédito rural para financiamento

“(...) dos senhores de engenho para instalação de suas fábricas de açúcar, em especial durante a ocupação holandesa no Nordeste (...) No período imperial tem-se a fase em que as casas comerciais, em geral inglesas, supriam os recursos necessários para a atividade agrícola; outra fonte de recursos eram as ordens religiosas e alguns bancos que se dedicaram ao financiamento da atividade agropecuária. "A expansão da cafeicultura deu origem às firmas comissionárias que exerceram um papel bastante importante no financiamento às atividades vinculadas ao café" (Pinto, 1981, p. 1).

"A preocupação de um crédito racional à agricultura já ocorria desde os tempos do Segundo Império, quando surgiu no Brasil, quatro anos antes do advento da República, o penhor agrícola através do artigo 10 do Decreto Imperial nº 3.272, de 15 de outubro de 1.885" (Aguiar, 1980, p. 30).

Na primeira década do século, o Banco do Brasil já realizava empréstimos diretos à lavoura do café, e esses créditos eram obtidos de forma fácil e com abundância.

Além disso, em função das crescentes necessidades de crédito rural, foi criado, em 1909, o Banco de Crédito Hipotecário e Agrícola do Estado de São Paulo que, posterior corrente,em 1926, transformou-se no atual Banco do Estado de São Paulo S/A.

O segundo período distinguiu-se pela tentativa de sistematização do financiamento à agrícola. A aprovação da Lei nº 454, de 09.07.37, refletiu essa preocupação, estabelecendo normas de aplicação dos recursos e tratando do sistema de garantias, com o objetivo de aumentar o alcance do crédito rural. No mesmo ano, foi criada a Carteira de Crédito Agrícola e Industrial (CREAI) no Banco do Brasil, que foi encarregada de agilizar a concessão de financiamentos.

Para Dércio Munhoz, a criação da CREAI "(...) terá constituído o passo decisivo para a formulação e consolidação de uma política de assistência creditícia ao setor rural, na qual se lastrearia no futuro a política agrícola do país" (Munhoz, 1982, p. 20).

A CREAI objetivava proporcionar ao setor rural, em primeiro lugar, a garantia de recursos para o financiamento de suas atividades, a partir de fontes supridoras que alimentariam o Banco do Brasil; em segundo lugar, o estabelecimento de prazos adequados à natureza e especificidades das operações; e, finalmente, a concessão de empréstimos a taxas de juros favorecidas, já que os financiamentos seriam feitos a custos inferiores àqueles normalmente cobrados de outros setores da economia.

De acordo com os dados apresentados por Pinto (1981, p. 3), observa-se, nesse período, uma inegável expansão dos financiamentos ao setor agropecuário. Em 1938, foram efetivados 1.021 contratos, passando para 9.482 em 1948 e atingindo 93.859 em 1958. É interessante enfatizar que, nesta fase, os recursos provinham quase que totalmente do Banco do Brasil através de recursos próprios, com pequena participação de outros bancos oficiais.

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"Para captação de recursos que dessem lastro aos financiamentos da CREAI foram criados os << Bônus da Creai >> ainda em 1937, e, posteriormente, se viria a determinar que os Institutos de Previdência aplicassem 15% de seus depósitos ou fundos em tais títulos; supria-se ainda o Banco do Brasil dos depósitos judiciais, na mesma oportunidade tornados obrigatórios naquele estabelecimento, e de 'depósitos em dinheiro para garantir a execução dos contratos firmados pelas empresas que exploram serviços de utilidade pública li' (Munhoz, 1982, p. 20).

De acordo com a legislação, nesse período, os financiamentos ao setor rural seriam feitos a taxas que não deveriam superar 7%, percentual esse inferior aos cobrados de outros setores da economia.

Em 1952, foram feitas substanciais alterações na regulamentação da CREAI, especialmente quanto ao suprimento de recursos, cujas fontes haviam se revelado insuficientes. Essa carência de recursos frente às necessidades obrigava o Banco do Brasil à utilizar disponibilidades próprias.

Esse fato não havia tido até aquele momento grandes implicações, porque o crescimento das operações de financiamento foi contido, até o início dos anos 50, através da limitação, instituída em 1939, do total do empréstimo concedido por produtor - o limite máximo foi fixado em um terço da estimativa da safra ou do rendimento da criação. Essa restrição foi abrandada somente em 1942, quando o limite máximo foi alterado para 60% das garantias. Nessa data, foi também ampliado o prazo de retorno dos empréstimos.

No início da década de 50, a intenção governamental de atender a novos tipos de operações, aliada a já observada insuficiência de recursos das fontes definidas anteriormente, levou à nova regulamentação da Carteira.

"A reforma de 1952 foi ampla: criou linhas de financiamento visando à conservação, transpor~e e armazenamento da produção, a fim de proteger o produtor da ação do intermediário por ocasião das colheitas; ampliou prazos de financiamento para a formação de culturas perenes; criou linhas de financiamento para a construção de escolas em propriedades rurais; introduziu empréstimos para investimentos; criou condições especiais para os pequenos produtores; estabeleceu diferentes linhas de financiamento a cooperativas para, dentre outros objetos, conceder adiantamentos a seus associados por conta de produtos colhidos e entregues à venda, e para a compra de insumos agrícolas; e, dentre outros pontos ligados inclusive ao financiamento industrial, criou empréstimos fundiários com vistas à formação de pequenas propriedades" (Munhoz, 1982, p. 21).

o novo regulamento da Carteira, de abril de 1952, ampliava as fontes supridoras de recursos para o financiamento à agropecuária. Assim, além dos recursos próprios do Banco do Brasil, provenientes do encaixe geral e de recursos obtidos através do redesconto de seus contratos de financiamento, foram buscados recursos externos para a CREAI através do estabelecimento das seguintes normas:

- colocação de letras hipotecárias e bônus emitidos pelo Banco do Brasil;

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- obrigatoriedade de depósitos judiciais - depósitos em dinheiro para garantir a execução dos contratos firmados pelas em de utilidade pública;

- aplicação de recursos dos institutos de previdência - 15% dosdepósitos ou fundos possuídos;

- arrecadação de tributos ou contribuições criadas para esse fim;

- destinação de outras verbas, ,,(...) inclusive do lucro líquidoapurado na venda de terras devolutas que a União viesse a doarao Banco para formação de pequenas propriedades ou de colôniasagrícolas" (Munhoz, 1982, p , 21-2).

A partir de 1953, foram acrescidas às fontes supridoras da CREAI os saldos dos recursos derivados da Política de Ágios e Bonificaçã02, propiciando substancial expansão dos recursos destinados ao financiamento da atividade rural.

Entretanto a desativação do sistema de taxas múltiplas de câmbio e do sistema de ágios e bonificações, a partir de 1961, reduziu novamente os recursos disponíveis da CREAl. Esse fato, aliado aos níveis assumidos pela inflação no início dos anos 60, que geraram uma crescente deterioração dos retornos das operações de crédito rural, levou ao rápido esgotamento dos recursos existentes para o financiamento da agropecuária.

Assim, apesar das diferentes tentativas visando à diversificação das fontes de recursos para o financiamento rural, encontrou-se novamente o Governo, no início da década de 60, com a responsabilidade de repassar os recursos necessários para a atividade agrícola, via Banco do Brasil.

o terceiro período, que se iniciou em 1965, caracterizou-se pela estruturação de um sistema de crédito rural no bojo de uma série de mudanças na política econômica brasileira. O sistema institucionalizado em 1965 visava, basicamente, à ampliação dos recursos financeiros postos à disposição do setor agropecuário, bem como a Incorporação de agentes financeiros privados na dotação desses recursos.

1.3.2 - A experiência brasileira recente

Marco geral

A transição de um período em que o desenvolvimento economlCO repousa na produção agropecuária para uma fase em que o setor urbano-industrial passa a liderar este processo gera ligações, primeiramente, apenas da agricultura para a indústria, cujos mercados transferem-se, predominantemente, para as cidades. Numa fase posterior, com a expansão da produção de bens de consumo e com a instalação de um departamento produtivo de bens intermediários e de produção, completa-se a subordinação da agricultura, e as ligações estabelecem-se também da indústria para a agricultura. O setor agropecuário constitui-se, então, num importante mercado para o setor industrial, inicialmente para a crescente produção de bens de consumo e depois para os bens de produção e insumos agrícolas.

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Nesse processo, torna-se cada vez mais importante a ação do Estado no sentido de harmonizar as relações de interdependência entre os dois setores. A intervenção do Estado, visando a manter o desempenho do setor agropecuário condizente com as mudanças no seu relacionamento com a indústria, consubstancia-se na política agrícola. A política agrícola, nesse estágio, não pode mais ser entendida isoladamente, já que faz parte de um contexto global, podendo somente ser analisada a partir das novas relações entre agricultura e indústria.

Em geral, paralelamente à industrialização, tem-se o surgimento de mecanismos financeiros capazes de dar suporte a esse processo. No caso dos países latino-americanos, a criação desses mecanismos financeiros para sustentação das modificações impostas pela industrialização ocorreu posteriormente, como foi o caso do Brasil.

Na economia brasileira, a fase de transição para uma economia industrializada pode ser identificada a partir da crise de 1929130, com a ruptura do chamado modelo primário-exportador.

Até o final dos anos 20, a economia brasileira correspondia ao modelo primário-exportador, no qual o setor dinâmico no processo era a agropecuária que, além de produzir os alimentos requeridos pela população urbana, obtinha, através de suas exportações, as divisas necessárias às importações de bens de consumo para essa população.

Período posterior estendeu-se até a década de 60 e é conhecido como processo de industrialização através da substituição de importações. Este período pode ser dividido em duas fases. Do início da década de 30 até o final dos anos 40, ocorreu o que se pode chamar de transição para uma economia urbana e industrial. A partir de 1950, especialmente de meados dessa década em diante, ocorreu uma aceleração do desenvolvimento industrial, e é nesse período também que se verificou uma crescente subordinação do setor agropecuário ao setor industrial.

De acordo com Lessa (1975, p. 14), durante todas essas fases, o comportamento da agricultura foi bastante dinâmico, pois continuou apresentando crescimento, aumentando a taxas superiores às do crescimento demográfico através da incorporação de novas terras. Manteve, dessa forma, até o início dos anos 60, uma expansão compatível com a crescente demanda de alimentos e insumos industriais de origem primaria gerada pela urbanização e pela industrialização e continuou fornecendo excedentes exportáveis, obtendo as divisas para a importação de bens intermediários e de produção que a indústria necessitava para fabricar os bens de consumo, nesse período, produzidos internamente. No final da década de 50, um segmento do setor agropecuário passou a se constituir, também, num importante mercado para os produtos industrializados no País I primeiramente para os bens de consumo e posteriormente para os bens de produção. A internalização da produção de tratores, máquinas e implementas agrícolas, de alguns fertilizantes e de outros insumos fez com que o setor agropecuário passasse a adquirir da indústria nacional os bens de produção e insumos que antes importava.

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No período posterior, a dinamização dessa produção pela indústria nacional levaria à necessidade de criação de mecanismos que possibilitassem o acesso crescente do setor agropecuário a esses bens. A modernização da agricultura implementada, através da absorção de máquinas e insumos modernos produzidos no setor industrial nacional, levaria a um aumento de produção e produtividade no setor agrícola. Esse aumento de produção obtido dessa forma criaria crescentes excedentes exportáveis a um custo de produção mais reduzido que possibilitaria colocá-los, de forma competitiva, no mercado internacional. O mecanismo acionado pelo governo neste contexto foi o crédito rural através da criação do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) em 1965.

A criação do SNCR encontra-se no bojo da estruturação do sistema financeiro na economia brasileira. Segundo Maria da Conceição Tavares, no início da década de 60, estava explícito.

,,(...) que a expansão e sustentação do crescimento exigiriam que o Sistema Financeiro efetivamente desenvolvesse novas formas de criação de crédito e intermediação financeira correspondentes ao grau de desenvolvimento já alcançado pelo sistema industrial" (Tavares,1978, p. 136).

Foram então efetivadas a reforma no Sistema Monetário-Creditício em 1964 e a reforma financeira de 1965, através das quais foram desdobradas as funções financeiras do sistema bancário brasileiro.

A partir de então, o sistema econômico brasileiro evoluiu para um alto grau de complexidade, com as relações econômicas passando a se dar sob a égide do capital financeiro (Delgado, s.d.).

A modernização da agricultura

Uma das hipóteses veiculadas no texto refere-se ao processo de modernização da agricultura gerado pela disponibilidade de recursos financeiros para alocação em alguns segmentos do setor, podendo ser comprovada de duas formas. A primeira seria através das informações sobre a evolução do uso de máquinas no processo de produção e a partir de dados sobre os insumos usados para preparação e conservação dos solos, isto é, a quantidade aplicada de adubos e corretivos, etc. A segunda forma de demonstrar a modernização da agricultura seria através da evolução do consumo intermediário do setor.

Para efetivação da primeira vertente de observação proposta, esbarra-se, no entanto, na limitação dos dados disponíveis. Se, de um lado, os Censos Agropecuários fornecem o número de tratores, arados e outras máquinas utilizadas no processo de produção agrícola, por outro, no que se refere aos insumos, os dados disponíveis nos Censos são apenas do número de estabelecimentos que utilizam os referidos insumos e não da quantidade usada dos mesmos. Além disso, apesar da consulta a outras fontes, não foi possível obter informações sobre a variação das quantidades utilizadas, o que inviabilizou a análise do processo de modernização baseada no uso de insumos.

Em vista do exposto acima, serão analisados, neste texto, os indicadores baseados na evolução da utilização de máquinas e implementos agrícolas com o objetivo de comprovar empiricamente a modernização da agricultura.

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Em vista do exposto acima, serão analisados, neste texto, os indicadores baseados na evolução da utilização de máquinas e implementos agrícolas com o objetivo de comprovar empiricamente a modernização da agricultura.

O Prof. Tamás Szmrecsányi (1984, v.2, p. 115) elaborou, a partir de dados do Censo Agropecuário para o Brasil, indicadores que refletem a evolução do uso de arados e tratores (Tabela 1). A partir desta tabela verifica-se que, em 1920, havia um arado para cada cinco estabelecimentos, em 1950 para cada três estabelecimentos, chegando-se,em1975, a um arado em cada dois estabelecimentos, situação que se mantém em1980.

Com relação ao uso de tratores no Brasil, observa-se que em 1920 havia um trator para 102.641ha e em 1940 esta área se reduz para 56.443ha. O salto, no entanto, na utilização dos tratores é observado entre 1950 e 1960 - em 1950 havia um trator para 27.737ha, o que se reduz em 1960a um trator para 4.073ha (Tabela 1).

É interessante observar que esse grande aumento no uso de tratores se deu inicialmente sem a participação da indústria nacional, pois é nos anos 60 e 70 que se dá a substituição na oferta desse tipo de maquinaria. "Até 1960 a oferta interna de tratores era nula, dependendo-se inteiramente das importações (...) Mas já em 1964 a produção interna supria 90% da oferta, crescendo para 99% em 1970" (Kageyama &Silva, 1987).

Nos anos censitários posteriores, há uma redução da área por trator, chegando-se em 1980 com um trator para 669ha.

Com relação à adoção de máquinas no Estado do Rio Grande do Sul, verifica-se que, se comparada com a média de utilização desses equipamentos representada pelos indicadores anteriores referentes ao Brasil, tem-se uma situação que poderia ser definida como de maior avanço da modernização no Estado. Senão, veja-se: se no Brasil, em 1920, havia um arado para cada cinco estabelecimentos, para o Rio Grande do Sul, neste ano, existe um arado para dois estabelecimentos. Este número é significativo menos porque demonstra que em 1920 o Rio Grande do sul apresentava um grau de mecanização bastante superior à média nacional do que pelo fato de que somente em 1975 se encontra para o Brasil a existência de um arado para cada dois estabelecimentos (Tabela 2).

Em 1940 já se observa o indicador de um arado por estabelecimento na exploração agrícola gaúcha, padrão que se mantém inalterado até 1980.

A respeito da utilização de tratores na agricultura gaúcha, verifica-se que, em 1920, havia um trator para cada 22.~40ha, área esta que diminui para 596ha por trator em 1970. Essa situação encontrada para o Rio Grande do Sul no início da década de 70 corresponde à situação da agricultura brasileira em 1980, ou seja, se no Rio Grande do Sul em 1970 há um trator para 596ha, para o Brasil encontra-se uma relação próxima a esta - um trator para 665ha - apenas no início da década de 80 (Tabela 2).

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A outra forma de verificação da modernização do processo produtivo agrícola é a usada por Ângela Kageyama & Graziano da Silva (Silva, 1987). Segundo os autores:

“(...) o processo de modernização reflete-se na elevação do consumo intermediário na agricultura, que indica a crescente dependência da agricultura de compras industriais para a produção de suas mercadorias (...) (Kageyama & Silva, 1987, p. 21)”."O aumento da participação do consumo intermediário no valor bruto da produção significa que esta depende cada vez mais de compras (intra e inter-setoriais) para que possa se efetivar. Em outras palavras, o processo de produzir se torna cada vez mais complexo, mais dependente da produção de outros setores da economia, mais intensivo no uso de capital fixo e circulante. A participação do consumo intermediário no valor da produção pode então ser vista como um indicador síntese do processo de modernização: quanto mais complexa se torna a base técnica da produção, com a utilização crescente de insumos (químicos, físicos e biológicos) maior tende a ser a proporção do consumo intermediário na produção" (Kageyama & Silva, 1987, p. 22).

Os dados utilizados pelos autores relativos ao consumo intermediário foram elaborados por Ribeiro & Gheventer (1983) e complementados por Kageyama (1986) e se referem ao percentual do Valor Bruto da Produção da agricultura considerado como consumo intermediário do setor.

A observação desses dados torna bastante evidente o crescimento do consumo intermediário no Valor Bruto da Produção da agricultura brasileira, que passa de 14,4% ao final dos anos 40 para 30% em 1970, chegando a quase 40% em 1980 (Tabela 3).

Segundo Silva e Kageyama:“(...) a intensificação do crescimento (relativo do consumo intermediário na agricultura dá-se a partir de meados dos anos 60, já na fase que denominamos 'industrialização da agricultura'. Entre 1959 e 1965 o índice passa de 131,5 para 180 ,8, principalmente porque a base em 1959 é ainda pequena (17,1% na média dos dois valores).Já a partir de 1965 nota-se um crescimento mais firme do índice, mesmo a partir de uma base maior. “É nesse período que a ‘industrialização do campo’ deslancha, já sobre uma base suficientemente ampla, com efeitos qualitativamente mais complexos sobre o processo de produção agrícola” (Kageyama & Silva, 1987, p. 21).

o Credito rural e o ciclo econômico

"Passado o período da política de estabilização do PAEG (Plano Estratégico de Governo, 1964/67) que conseguiu criar boa parte das pré-condições para a retomada do crescimento (controle da inflação, arrocho salarial, reformas fiscal e bancária, etc.), o governo lança uma série de mecanismos de política econômica para efetivamente por a máquina em movimento" (Serra, 1982).

Desse momento em diante, de acordo com Comin & Müller (p. 6)7,a política econômica para a agricultura esteve fortemente associada aos ciclos da economia brasileira. No período 1967-73, que consistiu numa fase de excepcional crescimento industrial -, baseado, fundamentalmente, no grande desempenho da indústria de bens de consumo duráveis e, secundariamente, no da indústria de bens de capital - e da economia como um todo, o Estado assume uma importância crescente. A

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política governamental de estímulo às exportações, numa situação favorável no mercado mundial, tem profundas repercussões na agricultura e nos segmentos da indústria, cuja produção é voltada para o setor agrícola. É nesta fase que ocorre o crescimento vertiginoso da cultura de soja.

De acordo com os autores citados anteriormente, “(...)o período de ouro do crédito rural é o que vai de 65 a 76. Nesta fase foi criado e consolida-se o SNCR, que conta com recursos crescentes por parte do governo. É neste período que o impulso à modernização na agricultura ocorre com maior intensidade, particularmente no que concerne aos investimento de médio e longo prazos" (Comin& Müller, ,p. 7).

As situações interna e externa favoráveis existentes até 1973 e alteram-se com os problemas decorrentes das descontinuidades técnicas na cadeia produtiva industrial, com o choque do petróleo e com a desaceleração do ciclo expansivo das economias capitalistas centrais.

A manutenção de um certo nível de crescimento econômico no período 1974-76 deve-se à implementação do 11 PND, que, apesar de não ter atingido as metas propostas, foi responsável por elevado volume de gastos produtivos das empresas estatais. O Plano previa profundas mudanças estruturais para a economia brasileira no último qüinqüênio da década de 70. "Mas já em 1976 o controle à inflação levava o Governo a conter seus gastos e a desacelerar parte dos projetos previstos no 11 PND" (Comin & Müller, ,p. 8). Para Comin e Müller, a virada na política de crédito rural no final de 1976 coincide com a desativação parcial do 11 PND.

"Convém observar que nos anos de 1974176, anos em que a implementação do Plano seguia a concepção original, a política de crédito foi fortemente impulsionada, sobretudo no que concerneà adoção de insumos e máquinas modernas. Ou seja, há uma correspondência entre a~ modificações na agricultura e na indústria no que diz respeito ao esforço estatal de mudanças estruturais; o elo de ligação estabelece- se entre a indústria de bens de capital e de insumos e a agricultura, que passa a usar mais intensivamente tratores e máquinas agrícolas, fertilizantes e defensivos" (Comin & Müller, ).

O período iniciado em 1976 estende-se até 1980 com a diminuição gradativa - se bem que neste período ainda não substancial - dos recursos canalizados ao setor agrícola pelo Governo.

No entanto a mudança mais relevante refere-se ao tipo de crédito disponível, ou seja, o financiamento para investimento perde cada vez mais importância frente ao crédito de custeio.

"O avanço da modernização via máquinas, implementos, benfeitorias produtivas, reprodutores bovinos, etc. diminui face ao avanço da modernização via fertilizantes, defensivos, etc. Num contexto de redução global dos recursos para investimento" (Comin & Müller).

A mudança na política governamental de diminuição dos recursos passíveis de serem apropriados pelo setor agrícola tem como pano de fundo os problemas crescentes apresentados no comércio internacional e especificamente o patamar já significativo alcançado pela inflação que torna crescente o custo do dinheiro.

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"Por volta de 78 em diante as dificuldades se ampliam, repercutindo na disponibilidade de recursos públicos (seja de bancos públicos, seja de bancos privados sob pressão do governo) para crédito agrícola: (i) a dívida externa passa a crescer rapidamente (ii) a 78 já é o dobro da de 73; (iii) a segunda preços do petróleo em 79, e (iv) a explosãojuros internacionais em 79/80" (Comin & p. 9).

o início dos anos 80 tem como marca a adoção pelo Governo de uma política ortodoxa, imposta pelas entidades financeiras internacionais de combate à inflação e ao desequilíbrio nas contas externas.8 Ou seja, com isso, a característica do período iniciado em 1980 é a diminuição paulatina dos recursos destinados pelo Governo ao financiamento da atividade agrícola, o corte do crédito destinado à investimentos no setor, mantendo-se apenas os financiamentos para custeio, e a retirada gradual dos subsídios ao crédito rural.

A evolução do sistema nacional de crédito rural

A criação do 5NCR em meados da década de 60 apresenta uma série de características que enquadram o sistema no panorama geral traçado pelo Governo com a intenção de alterar estruturalmente o funcionamento da economia brasileira.

Do ponto de vista da política agrícola tratava-se de aumentar a produção e produtividade do setor, buscando um crescente excedente agrícola a ser canalizado para o mercado externo, cuja produção apresentasse custos que possibilitassem colocá-lo, de forma competitiva, nesse mercado. Esse aumento de produção e produtividade seria obtido através da alocação de recursos na agricultura que propiciariam a incorporação de novas técnicas e/ou o seu uso disseminado no conjunto de produtores agrícolas. O aumento da demanda por máquinas, equipamentos e insumos para uso na agricultura gerada desta forma obedecia aos interesses da indústria nacional produtora desses itens, que tinha necessidade de ampliar, de forma significativa, o mercado para a sua produção em crescimento.

A legislação de criação do sistema de crédito previa, de forma explícita, através dos seus diversos objetivos, a intenção de incentivar o aumento da produção agropecuária através da implementação de melhorias obtidas pela disponibilidade de recursos aplicáveis nas diferentes fases do seu processo produtivo. No texto da Lei nºQ 4.829, que cria o Sistema Nacional de Crédito Rural, é prevista a disponibilidade de recursos para diferentes finalidades de aplicação. Eram satisfeitas, no âmbito legal, tanto as necessidades de recursos para financiamento de curto prazo - custeio e comercialização - quanto os recursos destinados a aplicações de médio e longo prazos, que eram contemplados na forma de empréstimos para investimento, que são os que parecem mais importantes num espectro mais amplo, abrangendo modificações da estrutura da produção agrária.

A importância da disponibilidade de recursos com a finalidade de investimento provém do fato de que é esse tipo de aplicação que introduz ou amplia o uso de técnicas mais produtivas alterando, em geral, definitivamente, os ganhos de produtividade da terra e do trabalho. Alguns exemplos podem ser citados como o caso da adoção de máquinas em fases do processo produtivo que anteriormente eram

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cumpridas através do trabalho manual; do aperfeiçoamento do sistema de irrigação das lavouras; na pecuária, a melhoria ou introdução de pastagens artificiais e o uso de novas técnicas de criação. Todos os exemplos citados refletem a incorporação no processo produtivo de inovações que aumentam, de forma permanente, a produtividade do setor.

O crédito de custeio também apresenta-se importante mas restringe- se a acréscimos de produtividade somente durante o ano-safra. A disponibilidade de recursos nas mãos do produtor para custear sua lavoura permite o uso de insumos - adubos, defensivos, etc. - que geram um incremento da produtividade da terra no período, mas não oferecem quase nenhum ou mesmo nenhum resultado quanto a safras futuras. Pode até haver casos de redução da produtividade com o resto indiscriminado de adubos e defensivos que comprometem a qualidade do solo.

A partir da evolução dos créditos por finalidade, verifica-se que são os créditos de curto prazo, no caso do crédito de custeio, que absorvem a maior parcela do total dos recursos destinados à atividade rural. Isto poderia indicar um incentivo aos produtores no sentido de serem usados recursos de curto prazo (custeio) em detrimento da efetivação de empréstimos de prazo mais longo.

Ressalve-se que, até meados dos anos 70, com o crescimento substancial dos recursos à disposição dos agricultores, houve, apesar de sempre em menor grau frente ao custeio, um incremento de recursos para investimento. No entanto acredita-se que podem ser encontradas, mesmo no período inicial de vigência da política de crédito rural, distorções quanto aos seus propósitos explícitos de mudanças profundas no processo de produção agrícola. Essa suposição se concretiza em 1980/81, quando são suspensos os recursos destinados a investimento - são mantidos apenas para alguns projetos específicos. Esse comportamento das autoridades em relação ao setor nos anos 80 é reflexo de uma visão preocupada apenas com soluções conjunturais.

Outro item que fez parte dos objetivos do SNCR, aparecendo explicitamente no texto da lei que cria o sistema, refere-se à destinação de recursos aos pequenos produtores. Esta era uma proposta apenas formal das autoridades, já que desde o início o sistema promoveu a concentração dos recursos nas mãos dos médios e grandes produtores, especialmente dos grandes.

A partir de meados da década de 70, parece ter havido uma certa preocupação das autoridades monetárias em implementar a diretriz de destinação de crédito rural para pequenos produtores. Durante o período compreendido entre 1975 e 1980, ocorreu um aumento do número de contratos favorecendo os pequenos e mini produtores, mas que, em vista dos montantes irrisórios em termos de valor dos contratos, não alterou de forma significativa a estrutura de concentração observada desde a implementação do sistema.

Fontes dos recursos

Uma das questões fundamentais quando da criação do SNCR era a diversificação das fontes supridoras de recursos para a agropecuana, que tinha como objetivo fundamental ampliar a oferta desses recursos. Com essa finalidade, são incorporados ao sistema de financiamento à agricultura - anteriormente baseado quase que exclusivamente no Banco do Brasil - os bancos regionais, o Banco Nacional de Crédito Cooperativo, os bancos estaduais, os bancos privados, as sociedades de

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crédito, financiamento e investimentos e as cooperativas, perfazendo a quase totalidade dos intermediários financeiros do País. A supervisão de todo o programa e sistematização dos órgãos envolvidos seria tarefa do Banco Centrpl. A formulação das diretrizes básicas, bem como a determinação da origem e dotação dos recursos, foi atribuída ao Conselho Monetário Nacional (CMN).

Dentre as várias fontes de financiamento ao setor rural no Brasil, tem-se, em primeiro lugar, as que podem ser consideradas, mesmo pela teoria monetária mais ortodoxa, como não-inflacionárias, uma vez que não implicariam emissão primária de moeda:- saldos dos depósitos à vista dos bancos comerciais;- recursos dos fundos e programas agrícolas;- outros recursos (depósitos à vista do Banco do Brasil, saldos líquidos do Tesouro Nacional e depósitos em moeda dos bancos comerciais no Banco Central).

Mas, apenas os recursos captados através dos depósitos à vista dos bancos comerciais e os provenientes dos fundos e programas agrícolas são destinados efetivamente ao crédito rural. O último item"( ... ) contém uma massa de recursos financeiros, de destinação indiscriminada, mas que é em parte utilizada como suporte às várias linhas de crédito subsidiado do BACEN" (Delgado, s.d., p. 68).

Visando a viabilizar a participação dos bancos Comerciais no financiamento agrícola, foi estabelecido, em 1967, que este deveria atingir 10% do total dos depósitos à vista dos bancos comerciais. Essa resolução, criando a compulsoriedade da aplicação no financiamento agrícola, tornou-se necessária dada a dificuldade de engajamento espontâneo do sistema privado no financiamento de uma atividade de maior risco e menor retorno como a agricultura e ainda a taxas inferiores às demais operações.

Sabe-se que é da própria natureza do sistema financeiro a opção pelas aplicações em atividades que oferecem maior garantia. E, no caso das consideradas de maior risco, é regra do sistema a aplicação de uma taxa diretamente proporcional ao risco do investimento, isto é, quanto maior o risco, maior a taxa de juros aplicada ao financiamento. Como reflexo da estrita observação dessas regras gerais de financiamento do sistema financeiro privado, tem-se como resultado a sua não participação, a não ser compulsoriamente, nos financiamentos à atividade agrícola.

São esses fatores que levam usualmente a que créditos concedidos a taxas de juros não compatíveis com o risco do investimento sejam responsabilidade do Estado. E que o sistema bancário privado quando participante dos financiamentos por injunções da política governamental o faz concentrando a distribuição dos recursos para poucos e grandes produtores que são os que em geral apresentam menor risco de inadimplência e fornecem garantias reais (terras, "melhores" informações cadastrais, etc.). Há também o problema de custos que se reduzem com a celebração de um número menor de grandes contratos em contraposição a vários contratos de valores baixos.

A partir da Resolução nº 69, de 22.09.67, que estabeleceu a compulsoriedade da aplicação de 10% dos saldos dos bancos comerciais no financiamento agrícola, houve um incremento substancial nos saldos de crédito rural obtidos através das entidades bancárias privadas. Em 1968, os saldos de crédito rural existentes no Banco do Brasil igualavam-se aos dos bancos comerciais. A partir de 1969, verifica-se que o processo de expansão do volume de créditos era de

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responsabilidade crescente do Banco do Brasil. Conforme pode ser visto na Tabela 4, a participação desse banco no financiamento rural elevou-se permanentemente, situando- se em 70 a 80% do total dos créditos na década de 70.

A tendência verificada na economia brasileira - como de resto em qualquer sistema econômico - a partir da estruturação de seu sistema financeiro foi de uma sensível perda de importância relativa das fontes monetárias (depósitos à vista) frente às aplicações não monetárias. Assim, a perda de importância da parcela destinada ao crédito rural pelos bancos comerciais através da aplicação compulsória de um percentual fixo de seus depósitos à vista pode ser considerada inerente ao processo de crescimento econômico.

A diminuição dos recursos provenientes do setor privado levou as autoridades monetárias a elevarem de 10 para 15% a participação compulsória do setor privado em 1973. Diante da queda persistente dessa participação, em dezembro de 1980, o percentual de exigibilidade foi novamente alterado para 20%. E, em julho de 1981, foi estabelecido o aumento gradual desse percentual compulsório até atingir 25%.

O que se verificou é que o aumento permanente do percentual sobre os depósitos à vista dos bancos comerciais não foi capaz de compensar a perda de importância relativa dessa fonte. A cada aumento do percentual, houve um incremento de financiamento rural proveniente dessa fonte, mas que se esgotou rapidamente, o que pode ser constatado através da Tabela 4.

Apesar desses movimentos com relação ao volume de recursos advindos das fontes privadas derivados de mudanças na legislação, o que se observa é que, na evolução do sistema de crédito rural, essa fonte não assumiu a importância esperada e/ou desejada, e foi o Banco do Brasil que manteve elevada e crescente participação no total do crédito concedido à atividade rural.

Essa participação do Banco do Brasil dava-se através da canalização de seus depósitos à vista ao setor rural - fonte não inflacionária - e, é mui to importante salientar, da expansão de recursos de crédito rural sem base prévia de depósitos. Essa expansão ativa derivada da expansão de crédito sem base prévia de depósitos gera a necessidade de emissões de moeda, podendo assim ser considerada inflacionária. Além disso, uma vez que os empréstimos são concedidos a taxas de juros negativas e numa conjuntura de elevação da taxa de inflação, são necessárias emissões primárias de moeda para cobrir a defasagem existente no retorno desvalorizado dos empréstimos.

O movimento de perda de importância relativa das fontes monetárias (depósitos à vista), frente às aplicações não monetárias constatado de forma importante até meados da década de 70, atinge, igualmente, o Banco do Brasil. Com base nessa constatação, pode-se supor que o crescimento verificado no crédito rural até 1980 se deu crescentemente através da expansão de recursos sem base prévia de depósitos efetuada pelo Banco do Brasil.

"Nesse sentido, é lícito supor que a política de crédito rural tenha sido responsável a partir de 1974 pela expansão primária de moeda. Não se conclua daí que tal pressão tenha sido de molde a promover pressões inflacionárias na economia em seu conjunto. Isso porque, com o crescimento ainda elevado do conjunto da economia até 1980, a expansão primária dos meios de pagamento que se infiltrasse sob a forma de

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expansão ativa do crédito rural não teria, em princípio, que exercer pressão inflacionária, dependendo evidentemente dos ritmos de expansão que estivessem ocorrendo. Como o crédito rural já começa a declinar em termos reais a partir de 1977, não há razão para se atribuir pressão inflacionária aos 'subsídios', pelo menos até 1980" (Delgado, s.d., p. 72).

A crise e a eliminação dos subsídiosApesar das considerações anteriores, a partir de 1977, começaram

a ser questionadas as taxas de juros aplicadas nos financiamentos agrícolas.

Foram, então, introduzidas, já neste ano, pequenas modificações em seu cálculo. Em 1979, são feitas novas alterações visando à redução no diferencial de taxas de juros aplicadas no crédito rural e à taxa de infIação, levando a um aumento expressivo nos custos dos empréstimos. Foram favorecidos através da aplicação de taxas diferenciadas os pequenos produtores, as Regiões Norte e Nordeste e o custeio em relação ao investimento.

É a perda de importância do crédito para investimento frente ao de custeio a mudança que pode ser considerada mais relevante no período1976-80, significando uma mudança de rota no processo de modernização da agricultura (Tabela 5). A característica fundamental do período seria o avanço da modernização da produção agrícola via insumos – defensivos e fertilizantes - ao invés de mudanças estruturais via máquinas, implementos, etc.

No período que se segue, pode-se dizer que ocorre o "desmantelamento" do SNCR gerado pela adoção de uma política econômica ortodoxa. Dentre o rol de medidas adotadas, as que atingem diretamente o setor agrícola são a retirada gradual dos subsídios ao crédito rural e a redução dos recursos destinados ao setor em função do corte nos gastos governamentais.

No final de 1980, foram aumentadas as taxas de juros dos empréstimos de custeio que passaram a se situar no patamar de 45% a.a .. Além disso, foi determinado pelo CMN que os financiamentos de custeio seriam de 100% dos recursos necessários apenas para os mini e pequenos produtores, para os médios e grandes seriam concedidos 80 e 60% respectivamente. A parcela não financiada aos médios e grandes produtores deveria ser coberta com recursos próprios ou obtidos no mercado. 12 Com a relativa estabilização de taxa de inflação entre 1980 e 1981, num patamar entre 110,2 e 95,2 respectivamente, ficou então reduzido o diferencial entre a taxa de juros aplicada ao crédito rural e à inflação, significando uma diminuição dos subsídios.

Fazendo parte desse quadro de restrições creditícias à agricultura, encontra-se também a eliminação de recursos destinados a investimentos que só poderiam ser obtidos a taxas de mercado, ou seja, o produtor rural que desejasse fazer investimentos obteria os recursos necessários às mesmas taxas que os consumidores de automóveis por exemplo, Mantiveram-se apenas linhas de investimento para programas especiais.

A retirada gradual dos subsídios ao setor rural prossegue no financiamento de custeio para a safra de 1982. Os mini e pequenos produtores continuaram recebendo financiamentos para o total de recursos requeridos a uma taxa de 45% a.a., mas o financiamento para

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os médios passa a ser de 70% do total necessário e para os grandes de 50% deste total.

A eliminação dos subsídios não havia sido ainda exigida explicitamente pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), do qual o Brasil já se encontrava sob tutela, mas a política de ajustamento econômico proposta pelo órgão ao restringir o orçamento monetário para 1983 como forma de controlar a inflação e o déficit público levou, indiretamente, à aceleração do movimento de redução dos subsídios à agricultura. As taxas de juros para o custeio agrícola foram então elevadas, para a safra de 1983, de 45 para 60% a.a .. Paralelamente, reduziu-se para 90% a parcela financiada aos mini e pequenos produtores. Os médios receberiam financiamento para 60% dos recursos requeridos e os grandes, 40%. O resultado dessas medidas foi uma redução da área de plantio das lavouras em 1983.

Durante o ano de 1983, o FMI começou a exigir a redução drástica dos subsídios à agricultura. Os financiamentos passaram então a ser concedidos a uma taxa de juros de 3% a.a. acrescida de uma parcela crescente de correção monetária. Essa parcela para o Centro-Sul seria de 85% da correção monetária para 1983, de 95% para 1984 e de 100% para 1985. Já no final de 1983, no entanto, por pressão do FMI, foram antecipadas as medidas descritas, e o CMN adiantou, para 1984, a eliminação plena dos subsídios ao crédito rural. Assim, já em 1984 as taxas de juros passaram a ser de 100% da correção monetária mais 3% a.a .. Foi estabelecida também uma contenção do crédito ao setor rural que, em 1984, deveria apresentar uma expansão de apenas 60% do volume de crédito utilizado em 1983.

Durante 1984, foi eliminada a faixa de médios produtores para efeitos de crédito de custeio. Foram também alterados os percentuais de crédito concedido de acordo com o volume da produção dos tomadores de financiamento. Os pequenos produtores teriam financiamento para 80%dos recursos necessários e os grandes 60%.

A evolução observada quanto às medidas governamentais mostra um processo drástico de restrição creditícia à agricultura a partir de1980. Isso se deu, de um lado, através da limitação da parcela de produção a ser financiada, que, inicialmente, manteve para os pequenos produtores o acesso ao financiamento total de sua safra, restringindo o crédito para os médios e especialmente para os grandes. As sucessivas modificações acabaram reduzindo essa parcela financiada para todas as faixas de produtores. Por outro lado, e nesse caso a restrição ao crédito rural foi mais eficaz, teve-se a elevação da taxa de juros para os empréstimos ao setor, aproximando-a e quase equiparando-a à vigente no mercado.

O custo extremamente elevado dos financiamentos, decorrente da retirada dos subsídios a esse crédito, limitou bastante a sua utilização. Em virtude das características inerentes à atividade agrícola, tornam extremamente arriscada uma aplicação de recursos obtidos a taxas de juros de mercado. No caso de quebra de safra, por exemplo devido a fatores climáticos, ou seja, fatores incontroláveis tecnicamente pelo produtor, o endividamento decorrente inviabilizaria e/ou comprometeria, na maioria das vezes, a produção futura. Finalmente, agrega-se ao rol de medidas a limitação do crescimento do crédito rural.

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Deve-se, ainda, observar que as restrições impostas a partir de 1980 referem-se ao crédito de custeio, pois os recursos governamentais para o crédito de investimento foram eliminados na previsão orçamentária para 1981. Assim, além da utilização de recursos próprios, os investimentos só poderiam ser feitos com empréstimos obtidos no setor bancário privado a taxas de juros de mercado, o que inviabiliza qualquer intenção neste sentido. Caso se considere que são os investimentos que efetivamente propiciam a introdução de melhorias tecnológicas mais importantes no sentido de aumento da produtividade da terra e do trabalho, poder-se-ia considerar que a agricultura brasileira não tem condições de avanços tecnológicos significativos. Esta é a situação encontrada na década de 80.

2 - EVOLUÇÃO E DistribuiçãoDOS RECURSOS DO SISTEMANACIONAL DE CRÉDITO RURALE MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURABRASILEIRA E DA GAÚCHA

2.1 - A distribuição do crédito rural entre os produtores no Brasil

A incorporação da produção agropecuária ao movimento geral de acumulação da economia brasileira ocorreu através de sua crescente vinculação com o sistema financeiro, acompanhada de um aprofundamento de suas ligações com o setor industrial fornecedor de meios de produção e insumos agrícolas. O processo de modernização gerado dessa forma na atividade agropecuária foi baseado numa crescente destinação de recursos financeiros ao setor e na alocação concentrada desses recursos em determinadas regiões, em certas linhas produtivas e nas mãos de produtores capazes de incorporar, rapidamente de forma crescente, os meios de produção gerados pelo setor industrial nacional.

Os dados existentes sobre crédito rural deixam bastante a desejar quando se trata de comprovar empiricamente a concentração deste nas mãos dos grandes produtores. Guedes Pinto (1981) realizou um trabalho pioneiro no sentido de demonstrar essa concentração a nível nacional.

Esse autor partiu do universo de estabelecimentos agropecuários existentes no Brasil apontado pelo Censo Agropecuáriode 1975- 4.993.252 estabelecimentos. Para facilitar os cálculos, o autor trabalhou com número arredondado de 5.000.000. As dificuldades para estabelecer o número de estabelecimentos que são atingidos pela política de crédito rural aparecem quando são examinadas as estatísticas existentes sobre crédito rural. Os dados mais completos disponíveis são os elaborados pelo Banco Central, onde constam apenas o número total de contratos realizados e o valor destes, não sendo feita referência ao número de estabelecimentos abrangidos. Com o fjm restabelecer o "número médio" de contratos por estabelecimentos, Guedes Pinto utilizou um estudo da Escola Superior Luiz de Queiroz (ESALQ) - USP, para a Região de Ribeirão Preto, o qual concluiu que os pequenos agricultores tinham, em média, menos de um contrato, os médios, dois contratos, e 05 grandes, três contratos.

Dado que o número de contratos efetuados pelo SNCR ficava em torno de 2.000.000 (Tabela 5), Guedes Pinto concluiu que o número de

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estabelecimentos atingidos devia situar-se entre 1.000.000 e 1.200.000 estabelecimentos, o que significava que apenas 20% dos agricultores são beneficiados pelo SNCR. O autor chegou a esse número baseado na pesquisa da USP/ESALQ, que leva à conclusão de que o número de contratos apresentados nas estatísticas do Banco Central abrange um número menor de estabelecimentos, contrabalançando essa conclusão com o fato de que esses dados fornecidos pelo Banco Central incluem os créditos concedidos a cooperativas, o que significa que cada contrato firmado através das mesmas atinge vários estabelecimentos.

Para analisar a distribuição do crédito entre os 20% dos produtores rurais que têm acesso a esse crédito, Guedes Pinto utilizou dados do Banco do Brasil, o qual possui informações com base em classes de valor dos empréstimos concedidos e é responsável pela aplicação de aproximadamente 75% dos recursos dirigidos ao setor rural. Segundo o autor, ao serem examinados os dados que estratificam os produtores em pequenos, médios e grandes em função do valor dos contratos, vê-se claramente:

"( ... ) tanto na agricultura como na pecuária a diminuição da participação dos pequenos produtores e aumento dos grandes, tanto no número quanto no valor dos contratos, endo mais acentuada em relação a este último"(Pinto, 981, p. 13).

Em termos do valor dos financiamentos à atividade agrícola – agropecuária apresentando um comportamento semelhante -, tem-se que a participação os grandes produtores saltou de um patamar de 20% nos últimos nos da década de 60 para quase 40% em 1972, continuando a aumentar de forma significativa até atingir 53% em 1976. Os pequenos produtores apresentam um movimento de redução sistemática de sua participação no período, pois recebiam 1/3 dos recursos em 1966, passando a apenas 10% de utilização desses em 1976. Os médios produtores, que recebia a maior fatia de financiamentos quando da criação do sistema - 0% dos recursos - tiveram reduzida paulatinamente a sua participação até atingirem 35% no final do período observado (Tabela 6). através desses dados, fica evidenciado que, além da concentração inicial dos recursos do 5NCR nas mãos dos médios e grandes produtores, o movimento ocorrido no período até 1976 demonstra uma tendência constante à concentração desses recursos em relação aos grandes produtores.

Por outro lado, de acordo com Comin & Müller,“(...) no momento em que se exacerba a concentração, ao nos aproximarmos do ano de 1975, também se verifica o crescimento mais acelerado da concessão de crédito rural. A taxa de crescimento real do mesmo se eleva para mais de 40% em 73, e mais de 20% nos dois anos seguintes" (Comin & Müller,p. 37).

Considerando-se esse crescimento na concessão de recursos na década de 70 e a tendência concentradora na alocação desses recursos no período até 1976, conclui-seque, pelo menos nessa fase, tem-se uma política de crédito rural concentradora na sua expansão.

Guedes Pinto confirma a concentração verificada no decorrer dos anos 70 através do índice de Gini da distribuição do crédito. 15 Além disso, o mesmo tipo de índice calculado para a distribuição da terra demonstra a estreita relação entre a distribuição de terra e a do crédit016, o que significa para Guedes Pinto que "(...) a política agrícola é condicionada pela estrutura agrária" (Pinto, 1981, p. 17).

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"A bem da verdade, onde dizer que o movimento de acesso ao crédito por parte dos produtores rurais é idêntico ao movimento de modernização do· campo, ou seja, a modernização foi concentrada segundo o tamanho fundiário dos estabelecimentos rurais, segundo as regiões e segundo as linhas produtivas" (Comin & Müller, p. 37).

Outra forma utilizada pelo mesmo autor para evidenciar a concentração do crédito rural é a comparação entre o valor dos financiamentos, a área cultivada e o valor da produção por estrato de área para os anos de 1970 e 1975.

Será usada aqui a relação entre financiamento e valor da produção, acrescentando a esses dados os referentes a 1980. Calculando essa relação entre valor da produção por estratos de área (Tabela 7), comprova-se, inicialmente, que os estratos de menor área recebiam uma quantia bem menor de financiamento, relativamente ao valor da produção, do que os de médio e os de grande. Exemplificando, em 1970, para0 estrato de área até 10ha, o valor do financiamento correspondia a 5% do valor da produção, enquanto para o estrato de área superior a 10.000ha o financiamento correspondia a 36% do valor da produção.

Examinando-se essas relações entre financiamentos concedidos e valor da produção por estratos de área, conclui-se, também, que, além da concentração já existente - descrita no parágrafo anterior para o ano de 1970 -, tem-se um movimento no sentido de aumento dessa concentração entre este ano e o de 1975. Para as áreas de menos de 10ha, o valor do financiamento em relação ao valor da produção manteve-se praticamente estável - atingiu 6% em 1975 -, enquanto para os estabelecimentos de área superior a 10.000ha, essa relação passou a ser de 75% contra os 36% apontados em 1970.

Dado o grau de concentração da distribuição dos recursos do SNCR observado nesse período, comprova-se que os mecanismos de controle da oferta de crédito criados institucionalmente não foram eficazes frente à lógica do sistema bancário, que prefere, por várias razões - custo, garantias -, efetuar um menor número de grandes contratos.

As exigências governamentais que visavam a contrabalançar os interesses bancários vigoraram por pouco tempo. De acordo com a legislação vigente entre 1968 a 1970, era obrigatória a aplicação de 70% do crédito de custeio e investimento em financiamentos equivalentes a 500 salários mínimos, (5.000 para as cooperativas). Para a comercialização, o percentual era o mesmo sendo fixado um teto máximo de valor dos empréstimos em 600 salários mínimos (6.000 para as cooperativas). Era ainda obrigatória a concessão de 10% do total dos contratos a pequenos produtores - contratos até 50 salários mínimos.

Essas disposições que já não se mostravam eficientes frente à racionalidade bancária foram revogadas em 1970, com exceção da última. Parece claro, portanto, que a concentração do crédito rural gerada pela lógica bancária foi sancionada pelo Governo durante o período compreendido entre 1966 e 1976 e, de forma especial, após 1970. Essa sanção por parte do Estado provavelmente decorreu da aliança entre o sistema bancário, a indústria nacional produtora de meios de produção e os grandes capitais agrários.

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Examinando a relação entre o valor dos financiamentos e o valor da produção no ano de 1980, verifica-se que neste ano as relações encontradas para os diferentes estratos de área se assemelhavam às de 1970.

O estrato de área até 10ha recebeu financiamento para 8% do valor da sua produção, enquanto o estrato de maior área, que recebia 75% em 1975, voltou a receber algo em torno dos 36% recebidos em 1970. De acordo com esses dados, tem-se, então, que entre 1975 e 1980, houve uma reversão na tendência concentracionista, já que a situação de distribuição do crédito no início da década de 80 era semelhante à dos anos 70.

Essa involução da tendência à concentração do crédito rural pode ser atribuída a alterações da política econômica no sentido de se criarem melhores condições de acesso ao SNCR para os pequenos produtores.

Uma medida que se deu no bojo de um conjunto de pequenas medidas voltadas para os pequenos produtores é o desdobramento dessa categoria em mini e pequenos produtores. Pela Resolução nº 540, de maio de 1979, os produtores rurais passaram a ser classificados em mini produtores, cujo valor da produção atinge até 100 MVRs; pequenos, com um valor de produção de 100 a 400 MVRS; médios, de 400 a 2.000 MVRs; e grandes, quando o valor da produção ultrapassa 2.000 MVRs17.

Os mini e pequenos produtores passaram através da Resolução nº 546, a ser beneficiados com a obrigatoriedade de as instituições estatais concederem, no mínimo, 25% do total dos empréstimos rurais18 para as duas categorias, sendo garantido, além disto, a concessão de 10% para os mini.

Essas medidas levaram a uma reversão da tendência concentradora verificada até 1975, sendo mantido, no entanto, o privilegiamento aos maiores produtores estabelecido quando da criação do SNCR.

"Podemos dizer que as medidas tomadas pelo Governo no sentido de melhorar o atendimento aos pequenos e miniprodutore de fato lograram atingir tal objetivo, mas que, no entanto, isto não foi suficiente para tirar dos maiores produtores a posição de maiores beneficiários do desvio de recursos ocasionado pela política de crédito rural o Tão somente o que ocorreu foi que uma parcela dos produtores de baixa renda passou a ter acesso a crédito; quantia que, se para eles, é bastante expressiva, no agregado, representa montantes irrisórios" (Pinto,1981,p. 55).

As observações de que até meados da década de 70 o Governo adotou uma política econômica de concentração do crédito para a agricultura e de que, posteriormente, sua atuação reverteu esta tendência podem ser explicadas pelos movimentos gerais da economia brasileira.

O crescimento acelerado da economia verificado no final da década de 60 apresenta sinais de esgotamento em 1973. O Estado consegue, através do 11 PND, postergar a crise que só se estabeleceu de forma ampla a partir de meados dos anos 70.

No período de crescimento acelerado, a política econômica para o setor agrícola obedeceu aos interesses dos produtores desse setor interessados em tornar cada vez mais rentável a sua produção através da capitalização da mesma e, principalmente, aos interesses da

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indústria produtora de insumos mecânicos e químicos para a agricultura, cuja produção crescente necessitava ampliar o mercado. O círculo fecha-se dada a lógica do setor bancário que prefere alocar recursos nas mãos de grandes produtores.

Os problemas gerados na economia pela crise que se estabeleceu pela forma ampliada a partir de meados da década de 70 levaram a uma reversão da tendência de concentração do crédito. A disponibilidade de recursos governamentais gerada pelo crescimento econômico do período anterior havia acarretado uma crescente participação dos órgãos financeiros do Governo na geração de recursos para o setor agropecuário ou, o que é o mesmo, a não-estruturação de um sistema de financiamento agrícola razoavelmente autônomo. Uma vez instalada a crise,tornaram-se crescentes as dificuldades relativas à geração de recursos por parte do Estado, levando, em primeiro lugar, a uma pressão sobre o sistema bancário privado através de mudanças na legislação e, posteriormente, a uma retirada gradual dos subsídios e à quase eliminação do crédito para investimento.

A aproximação dos juros dos financiamentos agrícolas aos juros de mercado provavelmente levou os maiores produtores, detentores de recursos próprios, a financiarem uma parte de suas despesas ou efetuarem investimentos com recursos não obtidos através do SNCR. Além disso, os "desvios" desses recursos para outras finalidades tenderam a diminuir consideravelmente.

A limitação inicial do crédito para investimento, seguida da sua quase eliminação - foram conservados apenas recursos para investimentos em projetos específicos -. e o direcionamento dos recursos existentes para o financiamento de custeio levaram a uma pulverização na alocação de recursos. Considerando que os empréstimos passaram a ser obtidos a taxas semelhantes às do mercado, eliminaram-se os "desvios" desses recursos para outros setores, e os produtores começaram a contratar com as entidades financeiras apenas o necessário para o custeio de sua lavoura. Nesse caso, mesmo tratando-se de recursos escassos, houve uma tendência à alocação mais diversificada dos recursos existentes. Essa suposição talvez explique uma diminuição da disparidade, verificada no período anterior, em relação à distribuição dos recursos do SNCR.

O aumento da participação dos pequenos produtores observado a partir de meados da década de 70 pode também ser creditado a algumas normas estabelecidas pelo Governo, como por exemplo a abertura de postos avançados do Banco do Brasil que tinha por fim facilitar o acesso dos menores produtores ao sistema de crédito. Como já foi comentado, houve também mudanças na legislação visando favorecer os pequenos produtores.

As considerações anteriores podem levar a crer na existência de um movimento no sentido da desconcentração do Crédito Rural até o momento. No entanto deve ser considerado que essas disposições governamentais e a tendência à pulverização dos recursos decorrente da aproximação dos juros dos financiamentos agrícolas aos do mercado podem ser contrarrestadas pela diminuição considerável da disponibilidade de recursos governamentais para o financiamento da produção agropecuária. A passagem para o setor privado da tarefa de financiar a produção agrícola pode gerar novamente uma tendência à concentração, obedecendo à lógica do sistema bancário que prefere estabelecer um número pequeno de contratos de maior porte.]

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2.2 - A distribuição dos recursos por regiõesCom relação à alocação do crédito rural entre as regiões do

País,verifica-se que, no início da série, uma grande concentração dos créditos era dirigida à Região Sudeste - em termos de valor quase 50% do crédito rural ia para os estados desta região, especialmente para São Paulo19. No transcorrer da década de 70, observou-se um movimento de aparente substituição entre os créditos à Região Sudeste e à Sul, ou seja, a participação da Sudeste, em termos de valor contratado, no crédito rural total diminuiu de 49,95% em 1970 para algo que varia de 30 a 34% no início da década de 80, e a Região Sul, que atingia em torno de 32% do crédito total concedido em 1970, cresceu durante a década, alcançando, em 1984, 40%. O aumento da participação da Região Sul no crédito rural total deveu-se especialmente ao crescimento do percentual recebido pelo Paraná, apesar de o Rio Grande do Sul também ter apresentado algum incremento (Tabelas 8 e 10). A Região Centro-Oeste também adquiriu maior participação nos financiamentos totais nesse período, passou de 7% em 1969 para 13% em 1984.

Quanto às Regiões Norte e Nordeste, ambas mantêm a mesma participação no primeiro e no último ano da série. No que diz respeito à Região Norte, tem-se um percentual de participação ínfimo nos financiamentos, da ordem de 1 a 3%. Com relação à Região Nordeste, observa-se que essa região absorvia em torno de 13% do crédito concedido em 1969, apresentando um movimento crescente de absorção de recursos entre 1978 e 1981, quando chegou a atingir 18,51%, decrescendo daí em diante e voltando, em 1984, à mesma situação apresentada inicialmente (Tabela 8).

Observando-se os valores médios por contrato nas diferentes regloes (Tabela 9), verifica-se que as Regiões Sudeste e Sul apresentam um valor médio semelhante ao do País, enquanto a Centro-Oeste apresenta, em todos os anos da série, um valor médio por contrato superior ao da média brasileira, chegando ao dobro desta média em 1984. Isso significa contratos estabelecidos com valores bem mais altos do que nas outras regiões. Nesse caso, a Região Centro-Oeste apresentaria uma concentração nos financiamentos maior do que as demais regiões, uma vez que estariam sendo estabelecidos menos contratos com valores mais elevados, significando que, nesta região, são especialrrenteos grandes produtores que recebem financiamentos. Tendo-se em conta a situação generalizada de privilegiamento aos maiores produtores descrita anteriormente, pode-se concluir que esta situação ainda é mais intensa no que diz respeito à distribuição do crédito rural na Região Centro-Oeste.

Retomando a análise da distribuição do crédito rural entre as diferentes regiões do Brasil, constata-se que a situação de privilegiamento que gozaram a Região Sudeste e a Sul em termos de absorção de recursos foi reflexo da concentração de sua distribuição entre alguns estados. Em 1969, somente quatro estados - Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul - absorviam 70% dos recursos do SNCR, em relação tanto ao número de contratos quanto ao valor dos financiamentos (Tabela 10). Essa situação de privilegiamento foi apenas levemente atenuada durante os anos 70 e o início da década de 80, já que 1984 apresentou um total de 65% de participação desses estados no valor global dos financiamentos. Houve uma retração um pouco maior da participação desses estados no número de contratos, o que indica uma concentração maior de recursos entre os produtores.

O Rio Grande do Sul, que absorvia em torno de 15% dos créditos concedidos no início da década de 70, aumentou a sua participação,

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passando a apropriar 20% dos financiamentos nos anos 80. Em vista disso, aparece como o segundo estado em importância na absorção dos recursos do crédito rural, ficando atrás apenas de São Paulo.

Essa concentração dos recursos do SNCR em alguns estados poderia ser explicada pela alocação de crédito em determinadas culturas. Seriam especialmente os chamados produtos de exportação os que receberam maior parcela de crédito - no caso do Rio Grande do Sul, particularmente a soja. E, entre os produtos de mercado interno, cederam-se recursos às culturas que apresentavam um potencial maior de absorção de novas técnicas, ou seja, culturas que, na década de 60, já se encontravam com algum grau de capitalização - é o caso, por exemplo, do arroz e do trigo no Rio Grande do Sul.

2.3 - A distribuição do crédito rural entre os produtores no Rio Grande do Sul

A partir do raciocínio empregado por Guedes Pinto (1981) para oBrasil, encontramos no caso do Rio Grande do Sul algumas diferenças com relação ao alcance do sistema de crédito rural.

No Brasil, o número de estabelecimentos agropecuários atingia, em 1975, a soma arredondada de 5.000.000, e as estatísticas do Banco Central acusavam um total de 2.000.000 contratos de crédito rural. Com base nesses dados e na pesquisa realizada pela ESALQ, Guedes Pinto fixou entre 1.000.000 e 1.200.000 o número de estabelecimentos atingidos pelo SNCR, ou seja, 20 a 24% do universo de estabelecimentos agropecuários no Brasil recebiam crédito rural.

Para o Rio Grande do Sul, tem-se um total de 471.622 estabelecimentos agropecuários, usando-se os dados referentes a 1975 para possibilitar a comparação. Nesse caso, foram efetuados 267.488 contratos de crédito rural. Com base nesses dados, observa-se que a proporção do número de contratos em relação ao número de estabelecimentos do Rio Grande do Sul é maior do que a do Brasil. Assim, mesmo considerando que os médios e principalmente os grandes produtores tenham mais de um contrato, pode-se supôr que, na agropecuária gaúcha, tem-se um número maior de estabelecimentos atingidos pelo sistema de crédito rural do que na média do País.

Essa suposição, no entanto, não significa que a distribuição do crédito rural no Rio Grande do Sul seja diversificada, atingindo, de forma expressiva, a faixa dos pequenos produtores.

Tal distribuição dos recursos do crédito rural entre as diferentes faixas de produtores somente pode ser analisada a partir dos dados fornecidos pelo Banco do Brasil, já que o Banco Central, da mesma forma que para o Brasil, não fornece os dados referentes ao Rio Grande do Sul com base em classes de valor dos empréstimos concedidos pelo sistema como um todo.

A série obtida refere-se aos dados de créditos concedidos tanto para a agricultura como para a pecuária de 1966 a 1985, por classes de valor dos empréstimos divididos em faixas de minis, pequenos, médios e grandes produtores.

Analisaremos os dados referentes aos recursos alocados na agricultura, dada a maior importância dos mesmos em termos de valor da produção relativamente aos da pecuária, bem como com relação à absorção de recursos de crédito rural. Deve-se, no entanto, salientar

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que o comportamento dos dados referentes ao crédito concedido à pecuária acompanha, de maneira geral, as variações apresentadas pelo crédito alocado na agricultura.

Inicialmente, o que se verifica é que, até 1975, as estatísticas do Banco do Brasil mostram a concessão de crédito somente para médios produtores (Tabela 11). É provável que o crédito concedido pelas outras instituições integrantes do SNCR, especialmente as privadas, tenha se dirigido à faixa dos grandes produtores, obedecendo à racionalidade bancária. Nesse caso, verificar-se-ia que, até 1975, no Rio Grande do Sul, não era concedido crédito rural para pequenos produtores ou, o que é o mesmo, não foram efetivados contratos de crédito com valores baixos.

A partir de 1977, houve uma diversificação na concessão de recursos por parte do Banco do Brasil. Os pequenos produtores efetuaram 35,7% dos contratos de crédito, com um valor que atingiu apenas 5,44% do valor do crédito. Situação inversa é encontrada com relação à participação dos grandes produtores que realizaram 4,43% dos contratos, mas receberam 20% em termos de valor.

O movimento observado até 1980 é uma evolução positiva do número de contratos efetuados com pequenos produtores, acompanhada de um aumento também em relação à sua participação no valor total dos contratos, embora em proporções bem menores do que o acréscimo do número de contratos.

Pelo lado dos grandes produtores, encontramos um comportamento estável com referência ao número de contratos efetivados, os quais tiveram, no entanto, aumentado seu valor.

Essa ampliação da participação tanto dos pequenos como dos grandes produtores ocorreu em detrimento dos médios que viram a sua capacidade de obtenção de recursos bastante diminuída.

A partir de 1980, a categoria dos pequenos produtores foi desmembrada em pequenos e minis em função do valor dos contratos. Em conjunto, esses dois grupos estabeleceram um movimento crescente de absorção de recursos tanto com relação ao número de contratos como em valor destes. Essas duas faixas de produtores apresentaram um crescimento importante em termos de efetivação de contratos, com a instituição, atingindo, em 1985, mais de 75% do total dos mesmos. Essa participação, no entanto, não se refletiu igualmente em termos de valor, já que esse percentual de contratos representou 18% do valor.

Encontramos novamente um movimento inverso para a faixa dos grandes produtores. Esses tiveram reduzida a sua participação no total dos contratos estabelecidos, mas absorveram, em 1985, mais da metade dos recursos repassados pelo Banco do Brasil.

O que parece ocorrer é que, a partir de 1977, os pequenos produtores, incluídos os chamados minis, começaram a ter acesso aos recursos do SNCR, passando efetivamente a utilizá-los, mas, dadas a dificuldade desse grupo em oferecer garantia e a sua própria limitação com relação ao aumento da sua produção, os contratos foram firmados com valores baixos, isso se refletindo numa pequena participação em relação ao valor total do crédito.

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Os médios produtores, que tiveram sua participação diminuída, mantiveram, no entanto, uma captação de valores maior que a dos pequenos - 25% dos recursos foram para os médios produtores.

Nessa evolução, são os grandes produtores que acabaram privilegiados com a celebração de um número reduzido de contratos, mas com valores bastante elevados. Dessa forma, constata-se que a diversificação tentada na concessão de recursos por parte do Governo levou realmente a um maior acesso dos produtores menores ao SNCR, mas, contraditoriamente, manteve-se e até exacerbou-se a concentração desses recursos nas mãos dos grandes produtores.

Agregando-se a esse processo o fato de que o restante do crédito rural fornecido pelas instituições bancárias privadas provavelmente passou às mãos dos maiores produtores, dada a própria racionalidade bancária privada, tem-se evidenciado a extrema concentração dos recursos do SNCR na faixa dos grandes produtores agrícolas.

2.4 - A distribuição do crédito rural entre os produtos agrícolas no Rio Grande do Sul

Para analisar a distribuição do crédito entre os produtos agrícolas gaúchos, serão usados os oito produtos considerados mais importantes na lavoura do Rio Grande do Sul. A importância dos produtos escolhidos advém dos montantes alcançados pelo valor da produção dos mesmos, que atingem cifras significativas no âmbito da produção agrícola riograndense e são também importantes se for examinada a pauta de produtos da agricultura do País.

Os produtos selecionados a partir dessa ótica são os seguintes: arroz, feijão, fumo, mandioca, milho, soja, trigo e uva, os quais respondiam por quase 90% do valor da produção da lavoura gaúcha em 1980. Em termos de crédito, esses mesmos produtos absorvem de 85 a 90% dos recursos alocados no Rio Grande do Sul no período 1980-84.

Neste texto, não é analisado o crédito destinado à pecuarla em função do pouco significado que atingem os recursos destinados a essa atividade se comparados aos canalizados à lavoura. Enquanto a lavoura recebe em torno de 75% do total do crédito rural, na década de 70, à pecuária são destinados apenas os restantes 25%. Nos anos 80, o desnível na alocação dos recursos torna-se mais agudo com a pecuária, recebendo apenas 11% em 1983 e 1984 com a lavoura absorvendo, portanto, nesses anos, quase 90% do crédito rural (Tabela 12).

As informações sobre o crédito direcionado aos produtos mencionados estão discriminadas por finalidade de financiamento apenas com relação ao custeio e comercialização. Entretanto, como foi mencionado anteriormente, o crédito de comercialização não é analisado neste texto, uma vez que este tipo de crédito não tem influência sobre a produtividade das lavouras.

De acordo com as informações disponíveis, os produtos que recebem maior volume de crédito são, pela ordem, soja e arroz, que absorveram, nos últimos anos, em torno de 60% do crédito agrícola destinado ao Rio Grande do Sul. O percentual alcançado por esses dois produtos evidencia, de forma extremamente clara, a concentração existente na alocação desses recursos.

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Em todos os anos da série examinada, 1969 a 1984, observa-se uma grande distância entre o crédito fornecido ao arroz e à. soja e o alocado nas demais culturas. Mais da metade do crédito com a finalidade de custeio é absorvido por essas duas lavouras, sendo o restante distribuído entre os demais produtos.

"A monopolização dos empréstimos em torno da soja e do arroz é ainda maior por ocasião da comercialização. De 1974 a 1979, período para o qual foram obtidas as informações, essas culturas tiveram elevadas parcelas desse tipo de financiamento, com uma participação relativa que chegou a alcançar 93,20% e que nunca foi inferior a 71,72% do total do crédito de comercialização do Estado" (FEE, 1982, p , 68).

Manifesta-se, assim, de forma clara, a política estabelecida pelo governo, a qual, de um lado, privilegia os produtos de exportação - caso da soja no Rio Grande do Sul - que necessitam absorver novas técnicas mais produtivas para viabilizar a concorrência externa e, de outro, as culturas que lideram o processo de crescimento da produção agrícola e que, dado o estágio alçado de desenvolvimento, são as mais capazes de absorver novas técnicas de produção - no caso do Rio Grande do Sul, especialmente a cultura de arroz.

A seguir, será examinado o comportamento dos oito produtos selecionados. Será analisada a absorção do crédito, os aumentos de produção gerados bem como o aumento da produtividade física dessas culturas.

Arroz

A produção de arroz no Brasil absorvia, no início da década de 70, em torno de 8% do crédito agrícola distribuído no País. Essa participação elevou-se até 1976, quando atingiu 15%. A partir daí, observa-se um leve decréscimo, estabilizando-se em torno de 12% nos últimos anos da série examinada (Tabela 22.o arroz gaúcho recebe parcela importante do crédito rural alocado nesta cultura no Brasil - oscilando entre 35 e 40% ao longo da série, atingindo 46% em 1983 e quase 55% em 1984. Essa evolução mostra acrescente importância assumida por esta cultura do Rio Grande do Sul na produção nacional (Tabela 22).

O arroz é o produto que juntamente com a soja absorve mais da metade dos recursos de crédito agrícola destinados ao Rio Grande do Sul. Isoladamente a sua participação no crédito agrícola total do Rio Grande do Sul oscila em torno de 20% na década de 70. Posteriormente, verifica-se um incremento nessa participação a cada ano, chegando a atingir 33,87% em 1984 (Tabela 13a).

o dado importante a ser considerado, no entanto, é que, no período pós 80, há um aumento da produção orizícola gaúcha frente à nacional. Sua participação, em termos de valor da produção, passa de 25% em 1980 para 40% em 1984 (Tabela 14). De acordo com a análise efetuada pela FEE, ,,(... ) a produção do conjunto do país, no período 68-81, se expandiu unicamente em função do aumento da área cultivada, porque o rendimento físico da terra, em termos médios nacionais não apresentam qualquer tendência ascendente" (FEE, 1983, p. 103).

No caso do Rio Grande do Sul, o que se verifica é que o aumento da área cultivada foi proporcionalmente menor do que o incremento observado em termos de produção. Em vista disso, o aumento da

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participação da produção gaúcha na nacional seria o principalmente reflexo de um aumento da produtividade física da lavoura rio-grandense (Tabela 14).

Essa afirmação encontra respaldo nos cálculos do volume médio de produção por hectare da lavoura de arroz gaúcha - já no início da década de 80, há um salto na produtividade física dessa lavoura, que atinge 4,01 toneladas por hectare em relação à média de 3,6/3,7t/ha observada na década de 70 - e, principalmente, no processo de crescimento apresentado por essa variável: em 1982, a produtividade passa para 4,15tl lha, atingindo 4,30t/ha em 1984. O ano de 1983 seria considerado exceção nesse processo de permanentes incrementos de produtividade, já que neste ano o rendimento físico médio foi de 3,49t/ha, abaixo inclusive da média observada na década anterior (Tabela 14).

A respeito do desempenho observado no início da década de 80, de acordo com os autores do trabalho citado anteriormente.

"( ...) no início de uma nova década, o estado sulino ultrapassava a marca dos 4.000 quilos por hectare, superandoseus próprios recordes e aproximando-se, gradativamente,daqueles países que detem os mais elevados níveisde produtividade em âmbito mundial" (FEE, 1983, p. 104)(Tabela 14).

A partir das considerações anteriores, poder-se-ia afirmar que, pelo menos no caso de uma lavoura capitalizada como a de arroz no Rio Grande do Sul, o crédito apresenta efeitos diretos quanto ao aumento da produção. E que, além disso, a partir de um certo grau de capitalização - bastante elevado, atualmente, no caso dessa cultura no Rio Grande do Sul -,os recursos aplicados apresentam crescente retorno em termos de rentabilidade.

Deve-se, no entanto, considerar a hipótese de que, com os repasses dos recursos de crédito estarem sendo feitos, ultimamente, a um custo que poderia ser considerado elevado por se situarem cada vez mais próximos aos de mercado, os produtores passem a se "interessar" efetivamente em aumentar a produtividade de suas lavouras. Dessa forma, buscariam incrementar a rentabilidade do capital empregado, contrariamente à situação anterior, na qual uma parcela dessa rentabilidade originava-se do custo baixo ou subsidiado dos recursos obtidos.

Soja

A prioridade dada à alocação de recursos de crédito rural às culturas de exportação pode ser comprovada empiricamente de forma bastante evidente através da observação da participação da cultura da soja no total dos empréstimos agrícolas no Rio Grande do Sul e no Brasil.

No âmbito nacional, a lavoura de soja recebia, no início da década de 70, em torno de 5% do total do crédito agrícola, atingindo 84,20% deste total. Esse processo de crescimento da importância do crédito destinado à soja demonstra a afirmação anterior elaborada a respeito das prioridades do sistema de crédito rural no Brasil (Tabela 23).

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No Rio Grande do Sul, esta cultura é a que recebe a maior parcela de recursos de crédito repassados à agricultura - em torno de 40% a partir de 1974. Coincidentemente é neste ano, pelo menos segundo os dados disponíveis, que começa a ser efetivada a canalização de recursos com o fim de comercialização, e a soja é um dos produtos que absorve um montante significativo de recursos com essa finalidade (Tabela 13b).

Em relação ao total do crédito rural destinado à soja a nível nacional, o Rio Grande do Sul absorvia, no início da década, mais de 50% desses recursos. Apesar dessa participação diminuir, situando-se em torno de 40% no fim dos anos 70 e início dos 80, manteve-se num patamar bastante elevado (Tabela 23).

Uma vez que a cultura da soja no Brasil tornou-se importante principalmente nos anos 70, graças aos incentivos governamentais tendo em vista as crescentes possibilidades de colocação deste produto no mercado internacional, outras regiões implementaram essa produção no decorrer do período observado. Esse comportamento explica a diminuição da participação do Rio Grande do Sul no total do crédito do País, ou seja, a retração observada advém de um movimento de crescente produção deste grão em um maior número de estados, o qual seria responsável pela maior disseminação na alocação dos recursos de crédito.

O volume de crédito aplicado na cultura da soja apresenta reflexos importantes em termos da sua produção: há acréscimos anuais até 1981, estabilizando-se a partir daí até o final da série analisada. Em termos de valor, em 1984 a soja gaúcha é responsável por quase 40% do valor da produção do Brasil (Tabela 15).

"A soja foi uma das culturas que mais cresceu entre 1968 e 1981 no País, apresentando incrementos de 1.075% na área cultivada e de 2.188% na quantidade produzida. Sua produção concentrou-se basicamente em cinco estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Mato Grosso. No entanto, foram os estados do Rio Grande do Sul e do Paraná que geraram, juntos, sempre mais de 73% da oferta física nacional no período" (FEE, 1983, p. 154).

Analisando a evolução da produtividade física dessa lavoura noRio Grande do Sul, no período, observa-se um crescimento importante dessa variável até 1974 - passa de 0,78t/ha em 1968 para 1,75t/ha em 1974 -, estabilizando-se a partir daí. Verificam-se quebras importantes de safra apenas nos anos de 1978 e 1979, que apresentam uma média de produção por hectare bastante aquém da encontrada na série observada(Tabela 15).

"Durante o período analisado, a soja teve sua produção anualmente acrescida alcançando inclusive um aumento de 57% em 1974.A partir daí, no entanto, as taxas de crescimento passaram a ser muito menores; até que em 1978 foi registrada, em todo o País uma quebra considerável da produção, da ordem de 24%, única variação negativa nesse período, decorrente de problemas básicamente climáticos que, aliás, assolaram todas as safras agrícolas de verão desse ano. Em seguida, porém, a produção de soja retomou seu ritmo de crescimento em todos os estados, apresentando em 1980 uma produção nacional 48% maior que no ano anterior" (FEE, 1983, p. 155).

Trigo

A participação do crédito repassado à produção de trigo no Brasil no total do crédito concedido à agricultura era de 5% no início da

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década de 70. Excetuando-se o ano de 1973 em que há uma redução importante dos recursos alocados na lavoura tritícola, tem-se, no período observado, um incremento dos empréstimos à nível nacional que chegam a atingir 8% em 1975 e 1976. Até o final da década de 70, essa variável mantém-se em níveis apenas um "pouco inferiores. No início da década de 80 é que se observa uma redução importante nessa participação, a qual não se recupera até o final da série examinada (Tabela 24).

Com relação ao crédito agrícola alocado no Rio Grande do Sul, o movimento guarda semelhanças com o observado nacionalmente. Ou seja, a lavoura de trigo gaúcha recebe em torno de 20% do crédito agrícola existente no Estado, no início da década de 70. A partir daí, apresenta uma retração, mas mantém-se ainda elevado ao longo da década – em torno de 15%. ~ nos anos 80 que pode ser observada uma redução importante do crédito alocado na produção de trigo em relação ao total do crédito agrícola - essa variável se situa em apenas 6% em 1984 (Tabela 13d).

Essa redução a nível estadual como nacional do crédito destinado à lavoura tritícola pode ser explicada pela prioridade que se tornou cada vez mais nítida, no decorrer do período, quanto ao financiamento das culturas de exportação, cujo exemplo, no caso do Rio Grande do Sul, é a lavoura de soja. Como foi visto anteriormente, a produção de soja absorve, nos anos analisados, uma parcela crescente dos recursos de crédito rural. Assim, poder-se-ia supor que recursos antes dirigidos ao financiamento da cultura de trigo estariam sendo desviados para aplicação em outras lavouras, no caso gaúcho a soja. Em termos de produção, observa-se que o trigo produzido no Estado gozava de maior importância em relação à procição nacional nos idos de 70, pelo menos no que diz respeito à sua capacidade de obter financiamentos.

No período citado, a lavoura de trigo gaúcha absorvia mais de 80% do crédito destinado à produção tritícola brasileira. Parece ter havido, ao longo da década de 70, um incentivo à produção desse cereal em outros estados ou regiões que teriam absorvido parcelas dos recursos antes destinados ao Rio Grande do Sul. Isso explicaria a redução importante observada em relação à parcela de crédito absorvida pela produção tritícola gaúcha, que se situava, em 1984, em torno de 30% (Tabela 16).

A elevada parcela de financiamento absorvida pelo trigo gaúcho refletia-se na importância da produção desse cereal em termos de valor frente à produção brasileira. O Estado gaúcho era responsável por 70 a 80% da produção nacional de trigo até meados da década de 70. A importância da produção gaúcha diminui a partir de 1976, sendo o Estado responsável, em 1984, por pouco mais de 30% do valor total da produção de trigo obtida nacionalmente.

De acordo com o já citado estudo da FEE, a produção tritícola é concentrada na Região Sul. "No primeiro e Gltimo qGinqGênio da série, a participação média do Rio Grande do Sul e do Paraná no agregado nacional da produção ficou em torno de 90%" (FEE, 1983, p. 130).Neste quadro, no entanto

"(...) é importante referir que o Rio Grande do Sul perdeu sua condição de estado-líder na atividade cerealeira, tendo sua contribuição para a produção global baixado da marca dos 75% para a de 40% entre o primeiro e o segundo dos pontos médios considerados. Quem ganhou em participação foi precisamente o Estado do Paraná, pois de

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uma contribuição de 18% evoluiu para a de 51% no mesmo período" (FEE, 1983, p. 131).

Com relação à produtividade física da lavoura de trigo, a variação encontrada de ano para ano torna difícil avaliar a existência ou não de ganhos nessa variável no período. É bastante singular a evolução da quantidade produzida no Rio Grande do Sul, no período, que, dadas as grandes oscilações apresentadas somente podem ser derivadas de fatores naturais (Tabela 16).

A análise da variável produtividade efetuada pela FEE conclui que para o Brasil houve

"(...) uma evolução positiva, ainda que modesta, da ordem de 0,7% a.a. Tendo em vista que a produção cresceu - à razão de 6,6% a.a. (sempre considerando o primeiro e o Gltimo qüinqüênio da série), a economia tríticola desenvolveu-se extensivamente, no fundamental vinculada ao aumento da área cultivada (5,9% a.a.)" (FEE, 1983, p. 132).

A produtividade física da lavoura de trigo gaúcha variou no intervalo de 0,36t/ha a 1,2t/ha ao longo da série.

Segundo os autores do trabalho da FEE, as variações da produtividade decorrem de fatores naturais, ou seja, ,,(...) as boas e más safras decorrem do comportamento do clima durante o ciclo produtivo do cereal" (FEE, 1983, p. 130).

"Estudos como o PIIRS - Programa de Investimentos Integrados para o Setor Agropecuário - entretanto, colocam a possibilidade de se alcançar (para o Rio Grande do Sul, pelo menos) níveis de produtividade de até 1,67t/ha, sempre que sejam observadas as restrições de clima e de capacidade de uso dos solos, bem como técnicas de produção mais adequadas ao seu plantio. É inevitável recolocar aqui a questão da importância dos condicionantes físicos sobre a produtividade e, assim, a relevância desses elementos sobre os demais inventariados, tendo em vista que o cultivo de trigo já é realizado em bases modernas, isto é, utilizando adubos e defensivos agrícolas, não devendo ser muito grandes, portanto, os efeitos da introdução desses quesitos sobre a produtividade da terra" (FEE, 1983, p. 134).

Milho

A produção de milho tem uma participação razoavelmente estável na absorção do crédito distribuído no Brasil. Mantém-se, durante quase toda a década de 70, em torno de 6 a 8%; aumentando sua participaçãono primeiro qüinqüênio dos anos 80, situando-se, então, no patamar de 9 a 12% (Tabela 25).

Esse crescimento da participação da produção de milho na absorção de recursos do crédito rural seria reflexo de uma maior importância dada a esta produção nos últimos anos.

A valorização da cultura do milho aparece também no volume alocado nesta produção no Rio Grande do Sul. O milho gaúcho recebia de 3 a 4% nos anos 70, passando para 9 a 10% na atual década. (Tabela 25). Na estrutura de produção agrícola do Rio Grande do Sul, no entanto, comparativamente aos outros produtos, o milho recebe apenas

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de 2 a 3,5% do crédito agrícola repassado aos produtores gaúchos no período.

Houve um movimento de absorção de volumes crescentes de recursos nos anos de 1980 a 1982, invertendo-se este processo, entretanto, já a partir de 1983 (Tabela 13b).De acordo com o já citado trabalho sobre a produção agrícola gaúcha, houve, no Rio Grande do Sul, um aumento da produtividade física da ordem de 77% no período examinado e que superou de longe a média nacional.

"O milho é uma cultura que se expandiu no Brasil no período 1968-81, e essa expansão não se deu tão significativamente em termos de área cultivada (cujo aumento não chegou a 20%) senão que por aumento da produtividade física, cujo aumento médio foi de 37% no período para o Brasil" (FEE, 1983, p. 175).

No Rio Grande do Sul, a produtividade física da cultura do milho, no período, aumentou de forma substancial se comparada aos outros estados. No entanto "(...) é necessário assinalar que esse salto se deu no final do período considerado na análise. O ano de 1979 ainda foi o de mais fraco desempenho produtivo da cultura no Estado (nesse período) como de resto o foi o ano anterior para os outros estados mais produtivos, mas uma recuperação muito forte se deu nos dois últimos anos da série em análise" (FEE, 1983, p. 176).

Uma vez que o período de análise a que se refere a citação acima encerra-se em 1981, a recuperação constatada pode ser relacionada com o aumento observado via absorção de recursos creditícios ocorrida em 1980 e que se manteve até 1982. Com o refluxo do movimento de absorção de recursos de crédito pela lavoura de milho a partir de 1983, poderiater havido um decréscimo da produtividade física (Tabela 17). Uma vez que tal não ocorreu, mantendo-se os ganhos de produtividade observados para o ano de 1980, poder-se-ia supor que os recursos obtidos foram aplicados em investimentos. Ou seja, de acordo com uma das suposições do trabalho, são os créditos usados com a finalidade de investimento os que garantem ganhos mais permanentes de produtividade física, contrariamente aos de custeio, cujos acréscimos de produtividade gerados esgotam-se num ano-safra.

FumoO Rio Grande do Sul absorveu sozinho mais de 40% do crédito

repassado à produção de fumo nos últimos anos. Em termos de volume, no entanto, essa alta participação não tem grande significado em vista da pequena participação de recursos alocados na produção de fumo como um todo - em termos percentuais, os recursos alocados nesta produção, no Brasil, alcançam o máximo de 2%. É necessário considerar, no entanto, que a distribuição dos recursos, neste caso escassos, é extremamente concentrada em algumas regiões, privilegiando o Rio Grande do Sul (Tabela 26).

A alta participação da produção de fumo gaúcho na distribuição dos recursos creditícios é reflexo e/ou reflete-se na participação do Rio Grande do Sul em termos de produção de fumo, que também gira em torno de 40% (Tabela 18).

Na distribuição do crédito agrícola no âmbito estadual, a cultura de fumo vem aumentando sua participação, apesar dessa não alcança volumes

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que possam ser considerados importantes. O percentual de participação desta produção na absorção de recursos que logrou alcançar apenas 2% na década de 70 atingiu, em 1984, quase 4% (Tabela 13d).

Os dois estados produtores de fumo em folha no Brasil são o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. "Juntos eles vem respondendo por parcelas que oscilam em torno de dois terços da oferta nacional do produto a partir da segunda metade dos anos 70" (FEE, 1983, p. 248).

"Embora o Rio Grande do Sul - com percentuais na produção brasileira que variavam entre 43,5% em 1968 e 33,9% em 1979 - seja o estado em que mais se produz fumo no País, somente em um ano (1976) do período 1968-81 conseguiu superar Santa Catarina no que diz respeito aos rendimentos médios por hectare, no que este estado detém a hegemonia nacional. Ainda que os rendimentos físicos obtidos em solo gaúcho se tenham mantido acima da média nacional durante todos esses anos, em alguns pontos da série aqui considerada os diferenciais de produtividade a favor de Santa Catarina chegaram a ser particularmente elevados, como em 1968, 1969 e 1979, quando a produção de fumo em folha por hectare neste estado superou em mais de 500 quilos a do Rio Grande do Sul. Não considerando os anos de 1974, o mais favorável ao último estado quanto à produtividade física da terra com essa cultura, e de 1976, extremamente adverso a Santa Catarina no mesmo aspecto, no restante do período o pior desempenho neste estado equipara-se aos melhores resultados obtidos por aquele. Mesmo assim, pode-se dizer que o Rio Grande do Sul procura lentamente se aproximar do patamar mais elevado de produtividade física em que se situa Santa Catarina" (FEE, 1983, p.248)”

De acordo com a avaliação anterior, o ano de 1974 foi o mais favorável ao Rio Grande em termos de produtividade, 1,54t/ha, considerando- se o período de 1968 a 1981. Observando-se a evolução dessa variável para os anos subseqüentes, verifica-se que já em 1982é superada essa marca, se bem que modestamente - são produzidos, neste ano, 1,55t/ha. Mas já em 1984 a produção gaúcha de fumo em folha situa-se em 1,62t1ha.

Feijo, mandioca e uva

Os demais produtos considerados importantes na estrutura da produção agrícola no Rio Grande do Sul pela sua contribuição em termos de produção - feijão, mandioca e uva - não apresentam percentuais importantes em termos de absorção de recursos de crédito.

A afirmativa anterior é especialmente demonstrada no caso da uva, em que a alocação dos financiamentos agrícolas no Brasil contempla essa produção com percentuais que não ultrapassam 0,25% do total dos recursos. Desses, o Rio Grande do Sul absorve em torno da metade, sendo também responsável por 50% da produção nacional de uva (Tabela 27).

No que diz respeito à cultura de mandioca, também são encontrados percentuais irrelevantes quando se examina a distribuição nacional de crédito agrícola, sendo, também, reduzidíssimos os recursos repassados ao Rio Grande do Sul (Tabela 28).

Quanto à produção de feijão, essa não consegue, durante a década de 70, granjear volumes de créditos que possam ser considerados importantes. Nos anos 80, no entanto, essa lavoura consegue, na

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distribuição do crédito agrícola do País, receber 5,8% dos recursos em 1981, e mantém uma participação razoável nos demais anos da década (Tabela 29).

O Rio Grande do Sul, no entanto, pouco recebe dos recursos destinados a essa produção. O feijão gaúcho absorve, no máximo, 3,5% do crédito distribuído nacionalmente. Na distribuição interna dos recursos obtidos, o feijão também não aparece com importância, já que atinge apenas 0,5% comparativamente aos demais produtos agrícolas gaúchos (Tabela 13a).

Em termos de produtividade física das lavouras consideradas neste item, pode-se dizer a respeito da cultura de feijão que sua produção apresenta uma tendência de diminuição da produtividade de meados dos anos 70 ~m diante, mais especialmente nos anos 80 (Tabela 21).

Com relação à produção de mandioca, o que se verifica é uma razoável estabilidade a nível de produtividade durante todo o período. Há, no entanto, uma redução da área de plantio e conseqüente decréscimo da produção. Esse comportamento da produção estadual nada mais é do que reflexo do movimento ocorrido nacionalmente, ou seja, manutenção dos níveis de produtividade com diminuição da área colhida e da produção (Tabela 20).

Ao contrário do ocorrido com os dois produtos analisados acima, a uva apresenta ganhos de produtividade. Já na década de 70, há um salto importante nesta variável no ano de 1973 se comparado ao ano anterior, havendo permanentes acréscimos até atingir, no ano de 1979, o maior índice de produtividade do período - 11,20t/ha. Em 1980, há uma quebra violenta dessa tendência quando são colhidas 5,77t/ha – a produção mais baixa do período examinado. A partir de 1981, no entanto, essa cultura se recupera, mantendo-se estável em torno de uma produtividade de 10 a llt/ha (Tabela 19).

CONCLUSÕES

A política de crédito rural institucionalizadas em meados dos anos 60 foi responsável por importantes mudanças qualitativas no processo produtivo agrícola. As medidas tomadas obedeciam a dois eixos básicos: de um lado, a ampliação do excedente agrícola a ser colocado no mercado externo e redução dos custos de sua produção através do aumento de produtividade buscando torná-lo competitivo neste mercado, e, de outro lado, aumento da demanda por máquinas e insumos de uso agrícola obedecendo aos interesses da indústria nacional produtora desses bens que, ao ampliar sua produção, necessitava de um mercado capaz de absorvê-la de forma crescente.

Até meados dos anos 70, o processo engendrado teve pleno êxito, havendo um aumento considerável do excedente agrícola gerado pelo incentivo creditício à produção, cumprindo-se, assim, a diretriz de aumento da produtividade agrícola através de um importante processo de modernização do setor através da incorporação de tecnologia.

A partir de 1976, há um arrefecimento dos propósitos iniciais da política de crédito rural com a diminuição, embora ainda não substancial, dos recursos canalizados ao setor. É nos níveis crescentes alcançados pela taxa de inflação - decorrente da crise da economia

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brasileira que se amplia a partir de 1973 - que se encontra a causa imediata dos problemas que começam a se apresentar no sistema de financiamento à agricultura.

O aumento do subsídio implícito nos empréstimos rurais decorrentes do crescimento da inflação faz com que a redução desses passem a ser objeto de preocupação do governo. A partir de 1977, passam, então, a ser recalculadas as taxas de juros aplicadas aos financiamentos agrícolas.

A mudança relevante, no entanto, no período 1976-80, refere-se ao redirecionamento dos recursos segundo sua finalidade. Os créditos para investimento - longo prazo - perdem cada vez mais importância frente aos créditos de curto prazo. A preocupação das autoridades passa a ser o financiamento das safras, demonstrando a "desistência" de manter o projeto de mudanças estruturais do setor.

Sob o ponto de vista dos interesses da indústria nacional, poder-se-ia dizer que são esguardados os interesses da indústria química - produtora de defensivos, fertilizantes, etc. - em detrimento da indústria produtora de máquinas e implementos agrícolas.

A mudança relevante, no entanto, no período 1976-80, refere-se ao redirecionamento dos recursos segundo sua finalidade. Os créditos para investimento - longo prazo - perdem cada vez mais importância frente aos créditos de curto prazo. A preocupação das autoridades passa a ser o financiamento das safras, demonstrando a "desistência" de manter o projeto de mudanças estruturais do setor. Sob o ponto de vista dos interesses da indústria nacional, poder-se-ia dizer que são esguardados os interesses da indústria química - produtora de defensivos, fertilizantes, etc. - em detrimento da indústria produtora de máquinas e implementos agrícolas.

Sob o ponto de vista dos interesses da indústria nacional, poder-se-ia dizer que são esguardados os interesses da indústria química - produtora de defensivos, fertilizantes, etc. - em detrimento da indústria produtora de máquinas e implementos agrícolas.

A partir de 1980, ocorre um processo de restrição creditícia geral que atinge o setor agrícola através da diminuição de recursos passíveis de serem canalizados ao setor. A essa escassez de recursos alia-se a elevação dos custos desses com a eliminação dos subsídios. o processo de eliminação gradativa dos subsídios, detonado em 1980, atinge pleno êxito em 1984 quando os financiamentos à agricultura passam a ser repassados a uma taxa de juros semelhante à de mercado. Como já foi salientado, as restrições impostas referem-se ao crédito de custeio, uma vez que os recursos para investimentos foram eliminados em 1980.

Apesar dos desvios de suas propostas iniciais, pode-se concluir que os objetivos gerais que levaram à implantação de um sistema de crédito agrícola como o aumento da produtividade do setor e a transformação do seu inter-relacionamento com a indústria foram obtidos.

No entanto deve-se ressaltar que as mudanças efetivadas se restringem a uma parcela de produtores rurais, a determinadas regiões e a certas culturas. Foram privilegiadas na distribuição do crédito os grandes e médios produtores, as Regiões onde a agricultura encontrava-se num estágio mais avançado e as culturas mais capitalizadas e de exportação. Essa alocação foi regida pelos interesses da indústria

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nacional, pois eram esses segmentos os mais habilitados a incorporar rapidamente, e de forma crescente, as inovações técnicas oferecidas. O Rio Grande do Sul foi um Estado privilegiado nessa distribuição de empréstimos, e, através do exame dos dados de incrementos de produtividade, pode-se comprovar a importância adquirida para a agricultura gaúcha de um sistema de crédito capaz de canalizar para esta atividade um volume considerável de recursos. No entanto a perda de força desse processo, observada a partir de 1976 e mais claramente na década de 80, certamente já teve e ainda terá sérias repercussões sobre o desenvolvimento da agricultura gaúcha.

A inexistência de recursos, a partir de 1980, com a finalidade de investimento, que são os empréstimos que possibilitam a incorporação de novas técnicas ao processo produtivo, significa que atualmente a agricultura produz nos mesmos moldes do início da presente década. Apesar disso, acredita-se que os investimentos feitos anteriormente têm demonstrado um fôlego considerável já que parece que as safras obtidas nos anos recentes se devem aos investimentos efetivados nas décadas de 60 e 70 e que continuam gerando frutos. A suposição em que tal conclusão se baseia é de que, a partir de um certo patamar de investimentos realizados, tem-se um período de retorno desses investimentos, bastando para que isto se efetive que sejam alocados empréstimos para custear o ano-safra - crédito de custeio - ou sejam garantidos preços remuneradores ao produtor.

Resta apenas saber até quando se manterá o fôlego dos investimentos efetivados no passado. E, quando este acabar, qual será a nova fórmulapara a retomada do desenvolvimento agrícola?

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