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NeuroAtual Volume 3, número 2, 2007

NEUROLOGIA GERAL Dr. Osvaldo M. Takayanagui

Emergency diagnosis and treatment of adult meningitis. Fitch MT et al. Lancet Infect

Dis, 7: 191, 2007.

Epidemiologia

A incidência estimada de meningite bacteriana é de 0,6 a 4/100.000 adultos/ano no países

desenvolvidos mas pode ser até 10 vezes maior em outras partes do mundo. A meningite

causada por Haemophilus influenzae do tipo b foi praticamente eliminada nos paises

desenvolvidos desde a introdução rotineira da vacinação das crianças e o desenvolvimento

de vacinas conjugadas contra sete sorotipos de Streptococcus pneumoniae reduziu

substancialmente a freqüência de meningite pneumocócica da infância. A recente

aprovação de uma vacina conjugada contra os sorogrupos A, C, Y e W135 da Neisseria

meningitidis pode levar a um futuro decréscimo da incidência desta devastadora infecção.

Em conseqüência desses programas de vacinação, a incidência de meningite bacteriana tem

diminuído nas crianças e aumentado nos adultos. Em 2005, 56% dos casos de meningite

bacteriana na Holanda eram de pacientes maiores de 16 anos de idade. Atualmente, nos

adultos, a meningite bacteriana tem como agentes mais freqüentes o S. pneumoniae e N.

meningitidis, responsáveis por 80% - 85% dos casos.

Avaliação inicial da meningite

O intervalo entre o início dos sintomas e o primeiro atendimento médico é um aspecto

pouco conhecido. Um estudo retrospectivo da meningite meningocócica mostrou que o

quadro clássico de rash, meningismo e comprometimento da consciência é de surgimento

tardio no período pré-hospitalar. Os sinais precoces antes da admissão de adolescentes (15-

16 anos) com meningite meningocócica foram dor nas pernas (53%) e nas mãos e pés frios

(44%).

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No atendimento dos serviços de emergência, a história clínica pode auxiliar na

suspeita de meningite. Uma meta-análise que incluiu 845 casos mostrou baixos níveis de

sensibilidade e especificidade dos sintomas tais como cefaléia, náusea e vômitos para o

diagnóstico de meningite. Isto não chega a ser surpreendente posto que tais sintomas

inespecíficos são encontrados em muitos pacientes com uma ampla variedade de afecções.

Um estudo realizado em um hospital de atendimento terciário mostrou que a tríade

clássica de febre, rigidez de nuca e alteração do nível de consciência estava presente em

apenas 2/3 dos adultos; a febre foi o achado mais freqüente (presente em 95%). Em outras

análises retrospectivas a febre esteve presente em 84-97% associada a freqüências menores

da tríade clássica (21-51%), ou sintomas de febre, rigidez de nuca e cefaléia (66%).

Embora, haja um alerta de que apenas os sinais e sintomas não sejam suficientes para

sugerir o diagnóstico, uma meta-análise indica que a ausência de febre, rigidez de nuca e

alteração do nível de consciência exclui meningite como provável diagnóstico, com uma

sensibilidade de 99-100%.

O estudo prospectivo holandês mostrou até mesmo uma menor freqüência (44%) da

tríade clássica de febre, rigidez de nuca e distúrbio da consciência (definido como escala de

Glasgow igual ou inferior a 4). Embora a febre tivesse sido constatada em apenas 77% dos

casos, 95% dos pacientes apresentavam pelo menos dois dos seguintes sintomas ou sinais:

cefaléia, febre, rigidez de nuca e alteração da consciência e, 99%, pelo menos uma destas

manifestações.

Dos achados clínicos específicos, o tradicional rash cutâneo da doença

meningocócica esteve presente em apenas 11% dos casos num estudo retrospectivo e em

26% num outro prospectivo. Quanto aos demais sinais meníngeos, como os de Kernig e

Brudzinski, apresentam níveis insuficientes de sensibilidade para confirmar ou excluir, de

forma isolada, a suspeita de meningite. Um estudo prospectivo de 297 pacientes mostrou

que a rigidez de nuca, os sinais de Kernig e de Brudzinski apresentam baixa sensibilidade

(5%) e elevada especificidade (95%). Neste estudo populacional, 80 dos 297 pacientes dos

que tinham meningite, mas apenas 24 apresentavam rigidez nucal (sensibilidade de 30%) e

estava ausente em 148 daqueles sem meningite (especificidade de 68%). O teste de

acentuação da cefaléia à rotação horizontal a um ritmo de 2 a 3 vezes por segundo é outro

sinal meníngeo. Num estudo prospectivo, a sensibilidade da rigidez de nuca e do sinal de

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Kernig eram muito baixa (15% e 9%, respectivamente), mas a do teste de acentuação foi de

97%, com especificidade de 60%.

Diagnóstico

Indicação da tomografia computadorizada antes do LCR

O exame do LCR é o procedimento de escolha para o diagnóstico. Entretanto, uma das

preocupações é quanto ao risco da precipitação de herniação e de possível fatalidade da

punção do LCR. Uma questão importante é se haveria necessidade da realização de exames

de neuroimagem (TC ou ressonância magnética) antes do LCR, pela possibilidade da

existência de lesão com efeito de massa (tumor ou toxoplasmose). Baseado nos trabalhos

até agora publicados, os autores consideram que a punção do LCR pode ser realizada sem

o exame de neuroimagem na ausência de qualquer dos seguintes sintomas ou sinais: 1-

crises recentes; 2- imunodepressão; 3- sinais suspeitos de lesão com efeito de massa

(papiledema ou sinais neurológicos focais {excluindo nervos cranianos}); 4- rebaixamento

do nível de consciência.

Interpretação dos resultados do LCR

As anormalidades clássicas do LCR na meningite bacteriana incluem pleocitose >1.000

leucócitos/mm3 (na viral é <300 leucócitos/mm3), predomínio de neutrofilos,

hiperproteinorraquia e hipoglicorraquia. A coloração pelo Gram, apesar de sensibilidade de

apenas 50-90%, pode ser valiosa para o diagnóstico, com uma especificidade próxima de

100%. Os adultos com meningite pneumocócica apresentam resultado positivo do Gram

em 81-93% dos casos. A coloração pelo Gram e a subseqüente cultura podem ser

prejudicadas por uso prévio de antibióticos. Os autores advertem, contudo, que alguns

pacientes com meningite bacteriana podem apresentar detalhes destoantes do quadro

clássico, como pleocitose inferior a 100 leucócitos/mm3, e que não há uma única

característica que, de forma isolada, possa ser suficientemente confiável para diferenciar

meningite bacteriana da viral. Não há ainda estudos adequadamente desenhados para

permitir a orientação dos clínicos sobre os níveis aceitáveis de risco na decisão de

diagnosticar um paciente como tendo meningite viral e considerá-lo candidato a receber

alta com seguimento ambulatorial.

Tratamento

Administração imediata de antibióticos de amplo espectro

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A meningite bacteriana é uma emergência neurológica e envolve níveis substanciais de

morbidade e de mortalidade. Os estudos recentes têm evidenciado uma taxa de mortalidade

de 13-27%, apesar do tratamento antimicrobiano adequado, com dados sugerindo pior

desfecho nos casos de demora no diagnóstico e no início da antibioticoterapia. Como

possíveis causas do retardo do tratamento estão a espera pela realização da TC, dos exames

laboratoriais e na admissão hospitalar. É importante destacar que os pacientes para quem

foi indicada a TC antes do LCR, devem ser submetidos a coleta da hemocultura e

receberem a antibioticoterapia.

O antibiótico inicial de escolha é uma cefalosporina de 3ª geração (cefotaxima ou

ceftriaxona) por ser de amplo espectro e por sua excelente capacidade de penetração no

SNC. O aumento da prevalência de S. pneumoniae resistente a múltiplas drogas em várias

regiões do mundo (35% em partes dos EUA) motivou a adição de vancomicina ao esquema

terapêutico inicial de pacientes adultos. Adicionalmente, os indivíduos acima de 50 anos de

idade devem receber ampicilina associada aos antibióticos acima citados para a cobertura

de Listeria monocytogenes que atinge maior incidência nesta faixa etária.

Corticoterapia

A intensa reação inflamatória promovida pela infecção e pela antibioticoterapia está

vinculada à significativa morbidade e mortalidade. Com o intuito de modular esta resposta

inflamatória, a corticoterapia tem sido associada aos antimicrobianos. Deve-se ressalvar

que a administração endovenosa de dexametasona deve ser efetuada no momento da

primeira dose de antibióticos. Um estudo multicêntrico, prospectivo, randomizado, duplo-

cego e controlado com placebo mostrou que a associação de dexametasona (10mg EV de

6/6 horas, por 4 dias) resultou numa redução do risco de desfecho desfavorável e de

mortalidade. Nos pacientes com meningite pneumocócica a mortalidade foi reduzida de

34% para 14%. Uma meta-análise de 623 adultos com meningite bacteriana tratados com

corticoterapia associada mostrou uma redução global da mortalidade e de seqüelas

neurológicas. Uma revisão sistemática no Cochrane Database, incluindo 1.800 adultos e

crianças também revelou uma substancial diminuição da fatalidade, da hipoacusia e de

seqüelas neurológicas com a corticoterapia. Os guias práticos atuais e a opinião de

especialistas recomendam a utilização de dexametasona administrada de 6/6 horas, por 4

dias.

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Uma preocupação do uso de corticosteróides é se a redução do processo

inflamatório não poderia diminuir a permeabilidade da barreira hematencefálica e impedir

a penetração de antibióticos no LCR. Os estudos experimentais sugerem que embora a

concentração de ceftriaxona não seja afetada, os níveis de vancomicina são mais baixos

nos animais recebendo corticosteróides. No homem, tem sido descrita a falha terapêutica

de vancomicina associada a corticosteróides na meningite causada por pneumococos multi-

resistentes.

Os dados disponíveis sugerem que o momento do início do corticóide é crucial e

que deve ser administrado antes ou simultaneamente à antibioticoterapia. Assim, os

médicos atuando nos serviços de emergência devem considerar fortemente a administração

de 10 mg de dexametasona EV no momento de iniciar a antibioticoterapia nos pacientes

suspeitos de meningite bacteriana, repetindo-a de 6/6 horas, por 4 dias.

Comentários: Embora o peso das evidências seja inegavelmente forte a favor do benefício

da administração associada de dexametasona, devemos ter certa cautela em adotar de

imediato essa conduta. Não seria excessiva a dose de dexametasona (10 mg de 6/6 h, isto é,

40 mg/dia) para os pacientes brasileiros? O estabelecimento desta dose foi baseado no

estudo realizado na Holanda e aceito pela comunidade científica, predominantemente dos

países desenvolvidos. Seria esta dose igualmente recomendada para os nossos pacientes

que, em geral, têm menor peso que os dos países desenvolvidos, com maior risco de

reações colaterais? Não seria recomendável a realização de mais estudos, ajustando a dose

de acordo com o peso corporal?

Acute disseminated encephalomyelitis. Tenembaum S et al. Neurology, 68 (suppl 2):

S23, 2007.

É uma excelente revisão sobre a Encefalomielite Disseminada Aguda (ADEM),

uma doença inflamatória do SNC caracterizada por um processo disseminado de

desmielinização que envolve predominantemente a substância branca do cérebro e da

medula espinhal. A condição é geralmente precipitada por uma infecção viral ou

vacinação. Afeta preferencialmente crianças.

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Manifestações clínicas

O quadro de ADEM é descrito classicamente como evento monofásico que se inicia

2 dias a 4 semanas após a exposição antigênica. Em cerca de 70% a 77% dos casos há

relato de um antecedente infeccioso clinicamente evidente ou de vacinação no período de 4

semanas precedentes. As características da apresentação incluem uma encefalopatia de

início súbito com uma variedade de sinais e sintomas neurológicos multifocais. Pode ser

observado um quadro prodrômico de febre, mal estar, cefaléia, náusea e vômitos pouco

antes do surgimento de sinais meníngeos e comprometimento da consciência. A evolução é

rapidamente progressiva, ocorrendo dentro de algumas horas e atingindo um máximo em

poucos dias (média de 4,5 dias). O quadro neurológico depende da localização das lesões

no SNC, incluindo sinais piramidais uni ou bilaterais (60% a 95%), hemiplegia aguda

(76%), ataxia (18% a 65%), paralisia de nervos cranianos (22% a 45%), comprometimento

visual por neurite óptica (7% a 23%), crises (13% a 35%), síndrome medular (24%),

distúrbios da fala (5% a 21%) e hemiparestesia (2% a 3%), geralmente com

comprometimento do estado mental, variando de letargia a coma. Embora certos sinais

possam ocorrer tanto em crianças como em adultos, como o comprometimento da

consciência, ataxia, déficits motores e envolvimento do tronco, outras características

parecem ser dependentes da idade. A febre prolongada e a cefaléia ocorrem mais

freqüentemente nas crianças, enquanto que os sintomas sensitivos predominam nos

adultos. As crises são raramente observadas nos adultos com ADEM e são mais comuns

em crianças menores de 5 anos. Um estudo documentou crises parciais motoras em 70%

dos pacientes mais jovens, com 82% destes evoluindo para o estado de mal. Pode ocorrer o

comprometimento do sistema nervoso periférico, como polirradiculoneuropatia aguda, mas

é raramente observado na ADEM infantil. A combinação do comprometimento do SNC e

do periférico pode ser mais comum nos adultos e ocorreu em 43,6% em um estudo de

coorte de pacientes adultos. A insuficiência respiratória secundária ao comprometimento

do tronco encefálico ou nos casos de comprometimento mais grave da consciência ocorre

em 11% a 16% dos pacientes.

Neuroimagem

A neuroimagem é um instrumento diagnóstico extremamente valioso. As

anormalidades na ressonância magnética são mais facilmente identificáveis nas seqüências

em T2 e no FLAIR, com lesões hiperintensas. As lesões são classicamente grandes,

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múltiplas e assimétricas. Envolvem a substância branca subcortical e central e a junção

entre a substância branca e cinzenta de ambos os hemisférios cerebrais, cerebelo, tronco e

medula espinhal. A substância cinzenta do tálamo e dos gânglios da base é freqüentemente

acometida, tipicamente em caráter simétrico. A substância branca periventricular é também

freqüentemente afetada. São descritos 4 padrões de anormalidades do envolvimento

cerebral na ressonância magnética:

1- ADEM com lesões pequenas (menos de 5 mm)

2- ADEM com lesões grandes, confluentes ou tumefeitas, com extenso edema

perilesional e efeito de massa

3- ADEM com envolvimento talâmico bilateral e simétrico

4- Encefalomielite hemorrágica aguda em que há presença de hemorragia nas lesões

desmielinizantes maiores

A freqüência de reforço na fase contrastada com gadolíneo é variável e depende do

estadio do processo inflamatório. As lesões com reforço são descritas em 30% a 100% dos

casos.

O envolvimento medular na ADEM é descrito em 11% a 28%, predominantemente

na região torácica.

A análise seqüencial da ressonância magnética desempenha papel importante no

estabelecimento diagnóstico. A ADEM monofásica não é associada com o surgimento de

novas lesões. A resolução completa das anormalidades após o tratamento é descrita em

37% a 75% e a melhora parcial em 25% a 53%. Diversos autores sugerem a repetição do

exame pelo menos por 2 vezes após a primeira ressonância normal, durante o período de

5 anos após o episodio inicial para assegurar a ausência do surgimento de lesões adicionais.

ADEM e suas variantes

Apesar de ser geralmente monofásica, a ADEM pode ter caráter recorrente cuja

freqüência varia de 5,5% a 21%. O caráter multifásico de ADEM foi descrito em 2 séries

de crianças seguidas por longo período de tempo.

A leucoencefalite hemorrágica aguda, a encefalomielite hemorrágica e a

leucoencefalite hemorrágica necrotizante aguda são variantes de um processo

desmielinizante hemorrágico inflamatório agudo da substância branca do SNC,

rapidamente progressivo e freqüentemente fulminante. A morte decorrente do edema

cerebral ocorre habitualmente dentro da primeira semana de instalação, mas há relatos cada

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vez mais freqüentes de evolução favorável em decorrência de um tratamento precoce e

agressivo utilizando várias combinações de corticosteróides, imunoglobulina,

ciclofosfamida e plasmaferese. Estas variantes são consideradas subformas hiperagudas de

ADEM e são observadas em 2% dos casos.

A ADEM deve ser definida de forma adequada e diferenciada de outras doenças

que comprometem a substância branca. Especificamente, a distinção entre a forma

multifásica de ADEM e esclerose múltipla representa um desafio diagnóstico. Este ponto é

extremamente relevante não apenas para o prognóstico mas também porque a esclerose

múltipla requer, pelo menos nos adultos, o tratamento precoce com imunomoduladores.

Com o objetivo de estabelecer uma classificação uniforme, The International Pediatric MS

Study Group propôs uma uniformização da definição de ADEM e suas variantes:

ADEM: um primeiro evento com uma encefalopatia polissintomática, com início

agudo ou subagudo, evidenciando lesões hiperintensas focais ou multifocais afetando

predominantemente a substância branca; nenhuma ocorrência de alterações destrutivas da

substância branca previamente e nenhum antecedente de fenômeno anterior com

características de evento desmielinizante.

ADEM recorrente: novo evento desmielinizante preenchendo os critérios

diagnósticos de ADEM, ocorrendo pelo menos 3 meses após o primeiro episódio e pelo

menos 4 semanas após completar a corticoterapia, evidenciando a mesma apresentação

clínica e afetando as mesmas áreas na ressonância em relação ao episódio inaugural.

ADEM multifásico: um ou mais episódios de ADEM, incluindo encefalopatia e

déficits multifocais, mas acometendo novas áreas do SNC tanto no exame neurológico

como na ressonância. A repetição ocorre pelo menos 3 meses após a ADEM inicial e pelo

menos 4 semanas após completar a corticoterapia.

Tratamento

Não há um tratamento padrão para ADEM. A maioria dos procedimentos terapêuticos

emprega alguma modalidade de terapia imunosupressora inespecífica, similarmente ao que

se adota na esclerose múltipla e outras doenças autoimunes, incluindo corticosteróides,

imunoglobulina EV ou plasmaferese. A maioria dos dados descrevendo as diversas

medidas terapêuticas é fundamentada no relato de pequeno número de casos, inexistindo,

até o momento, ensaios controlados e randomizados, nem em crianças, nem em adultos.

Corticosteróides

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A corticoterapia é a mais amplamente utilizada, habitualmente em doses elevadas. A

maioria dos grupos pediátricos descreve o uso de metilprednisolona EV, na dose de 10 a 30

mg/kg/dia até um máximo de 1 g/d ou dexametasona 1 mg/kg por 3 a 5 dias, seguidos de

redução gradual por 4 a 6 semanas, com descrição de recuperação em 50% a 80% dos

casos.

Imunoglobulina EV

Há inúmeros relatos de sucesso com o uso isolado de imunoglobulina EV, ou em

combinação com corticosteroides, mas inexiste qualquer trabalho comparando a

imunoglobulina com os esteroides ou com a plasmaferese. A dose total de imunoglobulina

EV habitualmente empregada é 1 a 2 g/kg, administrada em dose única ou em 3 a 5 dias.

Geralmente é bem tolerada pela população pediátrica. Há relatos de repetição do esquema

de imunoglobulina nos episódios de recorrência.

Plasmaferese

Este recurso é descrito apenas em um pequeno número de casos, tipicamente nos

mais graves quando a corticoterapia não revela ser eficaz. Uma série recente utilizou a

plasmaferese em 59 pacientes com uma variedade de doenças desmielinizantes

acometendo a substância branca, incluindo 10 casos de ADEM, revelando melhora

moderada a significativa em 40% dos casos (incluindo ADEM); nesse estudo o número

médio de sessões foi 7, variando de 2 a 20.

Outros tratamentos

Não há qualquer registro do uso de interferon-β ou de acetato de glatinamer na fase

aguda de ADEM, embora haja descrições anedóticas do emprego de interferon-β nos

episódios de eventos desmielinizantes recorrentes, compatíveis com ADEM multifásico.

Há relato de alguma melhora com ciclofosfamida em pacientes adultos que não haviam

respondido de forma satisfatória à corticoterapia.

Os recursos terapêuticos atualmente disponíveis propiciam geralmente uma

evolução aceitável. Entretanto, há necessidade de estudos melhor conduzidos para avaliar

novas drogas ou procedimentos, particularmente para os casos refratários ou multifásicos.

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Clinical update: diagnosis and treatment of essential tremor. Benito-León J et al.

Lancet, 369: 1152, 2007.

O tremor é um movimento oscilatório rítmico de uma parte do corpo, resultado de uma

contração de grupos musculares oponentes. É o tremor mais freqüente e uma das doenças

neurológicas mais comuns no adulto. O diagnóstico envolve a história, exame físico e,

eventualmente, exames complementares. Na história, são importantes os detalhes cobre a

idade de início, fatores de exacerbação e melhora, antecedentes familiares, moléstias

associadas, medicamentos utilizados, ingestão de cafeína e tabagismo. As drogas que

podem exacerbar o tremor incluem lítio, antidepressivos, broncodilatadores, neurolépticos,

amiodarona, procainamida, prednisona, cinarizina, flunarizina, ciclosporina,

metoclopramida, metilfenidato e ácido valpróico.

Cerca de 30-50% dos pacientes com tremor essencial são confundidos com doença

de Parkinson. O tremor associado a outras doenças como hipertireoidismo, distonias,

doença de Wilson e síndromes parkinsonianas podem ter sintomas associados. P. ex., no

hipertireoidismo ocorrem emagrecimento, irritabilidade, etc.

O exame físico começa pela observação do tremor. O tremor de repouso dos braços

ocorre quando estes são mantidos contra a gravidade e completamente em repouso (por

exemplo, quando os braços estão apoiados sobre o colo ou quando o paciente caminha ou

quando os braços estão abaixados). O tremor postural ocorre quando as partes afetadas do

corpo são mantidas contra a gravidade (p.ex. extensão dos braços à frente do corpo). O

tremor de ação ocorre durante o movimento voluntário (p. ex. durante a escrita ou

desenhando figuras de espirais de Arquimedes). O tremor de intenção ocorre durante um

movimento visualmente dirigido a um alvo (p. ex. pegar um copo de água).

Embora o tremor cinético seja a característica tipicamente do tremor essencial, pode

ocorrer em outras doenças tais como a de Parkinson, distonia, hipertireoidismo, ou tremor

fisiológico exacerbado.

Na maioria dos casos a investigação laboratorial é restrita a exames da função

tireiodiana e para exclusão da doença de Wilson.

O tremor essencial é uma doença progressiva e os fatores da progressão incluem a

assimetria e a unilateralidade inaugural do tremor.

O tratamento medicamentoso é iniciado quando o tremor começa a afetar a

habilidade do paciente nas atividades diárias ou quando começa a assumir caráter

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embaraçoso. A recomendação é de “start low and go slow” para reduzir o risco de reações

colaterais e permitir a tolerância dos pacientes. Se um determinado medicamento não for

benéfico, deve ser reduzido gradualmente antes da suspensão. Se o benefício for apenas

parcial, um segundo medicamento pode ser adicionado. Os pacientes que necessitarem

apenas do controle momentâneo e intermitente do tremor (p. ex. comparecer a um evento

social) podem ser beneficiados com a ingestão de propranolol 10-40 mg, cerca de 30

minutos antes do evento. A cirurgia é reservada aos que apresentam tremor essencial

incapacitante e que não respondem aos medicamentos.

Propranolol e primidona são eficazes em 30% a 70% dos casos. O propranolol, que

atua principalmente no sistema nervoso periférico, pode reduzir a amplitude do tremor com

doses diárias iguais ou superiores a 120 mg/d. A primidona tem se mostrado eficaz nos

estudos controlados com placebo em doses de até 750 mg/d. Contudo, a tolerabilidade é

uma limitação da primidona; cerca de 20% dos pacientes interrompem o tratamento por

causa das reações adversas de sonolência e desequilíbrio. A eficácia não difere

significativamente entre propranolol e primidona, embora a primidona possa ser melhor

tolerada a longo prazo que o propranolol.

Vários outros medicamentos podem ser úteis no tremor essencial. Outros

antagonistas de receptores β-adrenérgicos, tais como atenolol e sotalol, podem reduzir o

tremor essencial. Alprazolam, um benzodiazepínico, pode auxiliar na redução do tremor

essencial. Um estudo multicêntrico, duplo-cego e randomizado mostrou que o topiramato

(até no máximo 400 mg/d.) foi mais eficaz que placebo no tratamento do tremor essencial.

A gabapentina, um anticonvulsivante, tem se mostrado benéfico em alguns estudos mas

não em outros.

Doses únicas de 40-400 U de toxina botulínica A podem melhorar o tremor do

pescoço (os medicamentos para administração oral são menos eficazes no tratamento do

tremor do pescoço que dos braços), e doses de 50-100 U injetados na musculatura do braço

tem eficácia modesta no tratamento do tremor das mãos. Embora sejam bem conhecidos os

efeitos positivos do etanol sobre o tremor essencial, seus malefícios sobre a saúde não

recomendam o uso mantido dessa substância.

A estimulação talâmica (estimulação contínua do núcleo ventral intermediário) é

um recurso cirúrgico reservado a casos rebeldes aos medicamentos e vem substituindo a

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talamotomia. A estimulação bilateral desde ser indicada com cautela pois pode causar

disartria e incoordenação.

Antiepileptic drugs: generic versus branded treatments. Heaney DC et al. Lancet

Neurol, 6: 465, 2007.

A epilepsia é uma doença crônica cuja prevalência é de 0,5% a 1% na maioria dos países.

As drogas antiepilépticas (DAE) geralmente não são caras mas o enorme volume de

prescrições faz com que o custo global seja elevado. Como em todos os tipos de

tratamento, há um interesse nas medidas de contenção de gastos. O controle das crises

requer o uso adequado e regular das DAE por um período de muitos anos e, por vezes, por

toda a vida. A prescrição de DAE genéricas envolve inúmeras vantagens, principalmente

no que concerne ao preço. Por exemplo, no Reino Unido, em 2002, os produtos genéricos

foram responsáveis por 53% do total de prescrições, mas representando apenas 20% do

gasto com medicamentos, pois a diferença média entre os medicamentos de marca e os

genéricos é aproximadamente de 80%. Isto significa que nos países em desenvolvimento,

onde as DAE de marca podem ser inacessíveis, os produtos equivalentes genéricos

ampliam o acesso a drogas mais novas e possivelmente melhor toleradas.

Quando uma indústria farmacêutica produz uma nova DAE, a patente garante legal

e comercialmente a produção exclusiva por um período de 10 anos na Comunidade

Européia, com o estabelecimento do preço comercial englobando o custo da pesquisa e

também os lucros que são parcialmente reinvestidos no desenvolvimento de novas drogas.

Ao término deste período, outras indústrias podem solicitar licenças para produção de

similares em termos de formulação farmacêutica e de bioequivalência. Esta composição

permite a comercialização como genérico, sem a necessidade de novos ensaios clínicos

regulatórios.

A maioria das DAE é livre de patente ou será em breve. Por exemplo, a patente da

lamotrigina expirou em 2004 e, após um ano, 50% das prescrições eram de genéricos, com

uma economia geral estimada de 35%. Mas, por que, então, alguns grupos, incluindo

associações de pacientes, mostram resistência?

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Primeiro, a aparência é diferente. A maioria dos neurologistas descreve situações de

pacientes que ficam confusos com a aparência diferente dos medicamentos e que

apresentam toxicidade pela mistura de formulações de marca com genéricos.

Segundo, há uma preocupação de que a definição de “similaridade” entre os

remédios de marca e os genéricos não seja suficientemente exata para as DAE. Do ponto

de vista da produção de medicamentos, a “similaridade” é definida em termos de

biodisponibilidade, sem necessidade da comprovação de equivalência terapêutica.

Terceiro, há uma preocupação de que os testes industriais de bioequivalência sejam

fundamentados num contingente pequeno de voluntários sadios (cerca de 20 a 30) e não

numa grande população de pacientes efetivamente tratados em quem doenças

concomitantes ou outros medicamentos podem interferir na farmacologia do medicamento.

Todo esse conjunto de preocupações introduz novas incertezas na mudança de

medicamentos de marca para os genéricos.

A prescrição de drogas genéricas acarreta inegavelmente uma redução do custo,

mas a longo prazo não há uma garantia de uma economia persistente na mudança para os

genéricos, pois a manutenção do preço e a continuidade do fornecimento não estão

asseguradas, além dos gastos envolvidos no processo educacional da população sobre

mudanças na formulação e eventuais reações colaterais requerendo internações

hospitalares. Surpreendentemente, apesar do desejo generalizado de aceitar a política de

prescrição de genéricos, não há dados que quantifiquem o benefício econômico da

mudança para marcas disponíveis mais baratas.

No Reino Unido, em 1999, 40 dos 200 principais medicamentos genéricos eram

produzidos por apenas 3 ou menos indústrias proprietárias de licença. Os pacientes com

epilepsia necessitam da garantia de acesso por um longo período. Por outro lado, a

indústria produtora não tem qualquer compromisso ou obrigação de continuar a produzir

um medicamento se as margens de lucro forem muito baixas. Assim, no decorrer dos anos,

o paciente tomando a droga genérica mais barata pode ser forçado a mudar de diferentes

fornecedores de DAE à medida que diferentes indústrias introduzem ou retiram os

medicamentos do comércio. Adicionalmente, quando a empresa retira um produto do

mercado, não há uma garantia de acesso. A maioria dos neurologistas vivenciou as

dificuldades recentes com o fornecimento mundial de primidona e etosuximida, em que as

indústrias interromperam, em conjunto, a produção dessas DAE.

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Teratogenesis of sodium valproate. Duncan S. Curr Opin Neurol, 20: 175, 2007.

O ácido valpróico é uma droga antiepiléptica de amplo espectro, introduzido inicialmente

na Europa em 1967. Embora os detratores destaquem os efeitos indesejáveis, o ácido

valpróico continua sendo a droga de escolha na epilepsia mioclônica juvenil, assim como

eficaz nas epilepsias generalizadas idiopáticas. Infelizmente, este medicamento é

teratogênico.

O conhecimento da inegável eficácia do ácido valpróico tem intensificado o dilema

dos neurologistas no tratamento de pacientes com epilepsia, e em particular de mulheres

jovens. Os recentes dados de registros de gravidez não apenas confirmam a

teratogenicidade do ácido valpróico mas também alertam para a associação com retardo no

neurodesenvolvimento e doença de espectro autístico em crianças de mães expostas à

droga durante a gravidez. Assim, o neurologista deve ponderar sobre os inegáveis

benefícios da paciente permanecer livre de crises e as potenciais riscos envolvidos nas

conseqüências permanentes nos seus filhos.

Há necessidade de pesquisas futuras para melhor identificação das mulheres cujos

filhos podem ser afetados, ajudando na mensuração do risco do surgimento de retardo no

neurodesenvolvimento por exposição ao medicamento durante a gravidez.

Indications for brain CT scan in patients with minor head injury. Saboori et al. Clin

Neurol Neurosurg, 109: 399, 2007.

O trauma craniano menor representa o tipo mais frequente de trauma craniano nos

serviços de emergência, chegando a quase 85% dos casos. Este termo é reservado aos

casos com o escore de 15 na escala de coma de Glasgow. A maioria desses pacientes não

requer qualquer tratamento e recebe alta hospitalar sem complicações, mas um pequeno

número deles apresenta hemorragia intracraniana, necessitando de intervenção cirúrgica. A

indicação de tomografia computadorizada (TC) é muito controversa, havendo disparidade

de conduta, com a realização rotineira em todos os indivíduos ou apenas em casos

selecionados, como a presença de fratura no RX de crânio.

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Este estudo prospectivo avaliou 682 indivíduos consecutivos maiores de 6 anos de

idade com trauma craniano com escore de 15 de Glasgow, tendo como objetivo a avaliação

de sinais e sintomas clínicos que possam auxiliar na indicação de TC.

Os fatores de risco para a presença de lesões intracranianas pós-traumáticas na TC

foram:

1- Amnésia pós-traumática

2- Perda da consciência

3- Crises pós-traumáticas

4- Cefaléia

5- Vômitos

6- Déficit neurológico focal

7- Fratura de crânio

8- Coagulopatia

9- Antecedentes de tratamento com anticoagulantes

10- Idade superior a 60 anos

A associação de vários fatores num mesmo indivíduo aumentou a probabilidade de lesão

pós-traumática na TC.

The inner ear and the neurologist. Agrup C et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78:

114, 2007.

A diminuição da audição é o comprometimento sensorial mais freqüente no ser humano,

afetando mais de 5% dos indivíduos nos países industrializados. É importante na população

idosa e 40% das pessoas acima de 65 anos de idade apresentam hipoacusia de magnitude

suficiente para comprometer a comunicação. Adicionalmente, um terço da população geral

refere sintomas vestibulares. A diminuição da audição geralmente motiva o paciente a

procurar um otorrinolaringologista. Entretanto, aqueles com comprometimento vestibular

isolado são freqüentemente atendidos por neurologistas, com queixas de tonturas,

instabilidade na marcha e oscilopsia, mas sem diminuição da audição. O foco desta revisão

é o comprometimento vestibular, tendo como objetivo discutir algumas condições

audiovestibulares que podem ser vistos no consultório do neurologista, incluindo os

recentes avanços neste campo.

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Anatomia

O ouvido interno é uma estrutura diminuta mas complexa, preenchida por um fluido e

circundado por um labirinto ósseo localizado na profundidade do osso temporal. A cóclea

corresponde ao órgão acústico terminal e os órgãos vestibulares distais são os 3 canais

semicirculares e o utrículo.

Manifestações clínicas das doenças vestibulares

A tontura pode ser causada por várias condições médicas identificadas e doenças

psíquicas, mas 13% dos casos permanecem sem elucidação etiológica. Os distúrbios

vestibulares podem ser divididos em periféricos e centrais. A maioria das doenças

periféricas tem uma etiologia, sendo extremamente importante a obtenção de detalhes da

história. A disfunção vestibular periférica aguda surge geralmente sob a forma de tontura

aguda, acentuada, espontânea e acompanhada da sensação de rotação. Uma característica

típica da perda da função unilateral da função vestibular é o nistagmo à torção horizontal

com a fase rápida dirigida para o lado oposto ao da lesão. A disfunção periférica aguda é

habitualmente associada a náusea, vômitos, sudorese e palidez. Se o componente auditivo

estiver também acometido, o paciente pode referir também diminuição da audição e

zumbido. A maioria das doenças vestibulares periféricas resolve em 6 a 12 semanas, em

conseqüência de uma série de mecanismos diferentes e complexos, denominados

coletivamente como compensação vestibular. Esta envolve o tronco encefálico, cerebelo e

funções corticais e medulares. A melhora sintomática não é necessariamente acompanhada

da recuperação da função vestibular, e a perda da função é freqüentemente irreversível. Em

alguns pacientes, especialmente nos idosos e naqueles com doenças do SNC, a

compensação vestibular não é tão marcante, resultando numa disfunção vestibular

periférica crônica ou em episódios recorrentes (isto é, descompensação). As causas mais

freqüentes de descompensação são doenças psicológicas, comprometimento da visão e/ou

da propriocepção, comorbidades sistêmicas e o uso de drogas com ação no SNC.

A disfunção vestibular central é freqüentemente associada com outros sintomas

neurológicos e tende a ser mais insidiosa e prolongada que as doenças vestibulares

periféricas. Nos casos em que a vertigem for o único sintoma, o diagnóstico diferencial

entre o comprometimento central e periférico é problemático. Um detalhe útil é a queixa da

sensação de movimento, característica da disfunção periférica. As doenças que provocam a

disfunção vestibular central incluem lesões com efeito de massa na fossa posterior,

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esclerose múltipla, e infarto cerebral ou no tronco encefálico.A vertigem episódica pode

ser a manifestação inaugural de AVC cerebelar ou de tronco encefálico e, de fato,

pequenas áreas de isquemia nessas regiões podem se manifestar com vertigem e ataxia,

sem outros sintomas ou sinais localizatórios.

Doenças audiovestibulares: variações clínicas

A seguir, os autores apresentam detalhes de várias doenças que provocam disfunção

vestibular, tais como otite média, colesteatoma, doença de Menière, enxaqueca, trauma

cranioencefálico, doenças autoimunes sistêmicas, labirintite, etc.

Drogas ototóxicas

Mais de 130 medicamentos ou produtos químicos são considerados potencialmente

ototóxicos. As drogas mais comumente associadas com ototoxicidade são os

aminoglicosídeos, diuréticos, medicamentos citotóxicos, quinina, drogas anti-inflamatórias

não esteroidais e aspirina. Quase todas essas drogas apresentam tonturas como possível

reação colateral. A maioria das drogas que causam tonturas provoca esse sintoma por

redução da pressão arterial com subseqüente disfunção do SNC ou por comprometimento

de informações visuais/proprioceptivas. Tanto a carbamazepina como o ácido valpróico

podem levar a anormalidades da audição e de zumbido de caráter temporário.

Tratamento

Reabilitação

Como a lesão do ouvido interno é em geral irreversível, a reabilitação desempenha papel

fundamental nas doenças audiovestibulares.

A reabilitação vestibular é segura e eficiente. É baseada nos exercícios físicos,

exercícios de Cawthorne-Cooksey, assim como no retreinamento da marcha.

A maioria das drogas antivertiginosas (p. ex. antihistaminicos, anticolinérgicos,

fenotiazidas, benzodiazepínicos e butirofenonas) é constituída de sedativos vestibulares e

pode controlar o sintoma através desse mecanismo. Os sedativos devem ser usados apenas

durante a fase aguda da doença, especialmente se a náusea for um sintoma relevante. Estes

medicamentos não estão indicados para pacientes apresentando tontura crônica.

Os autores enumeram os modernos recursos para recuperação ou compensação da

hipoacusia, com o uso de aparelhos externos ou internos, os implantes de cóclea, entre

outros.

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Wernicke’s encephalopathy: new clinical settings and recent advances in diagnosis

and management. Sechi GP et al. Lancet Neurol, 6: 442, 2007.

A encefalopatia de Wernicke é uma síndrome neuropsiquiátrica aguda resultante da

deficiência de tiamina, que é associada com elevados níveis de morbidade e mortalidade.

De acordo com os estudos necroscópicos, a doença é ainda subdiagnosticada tanto em

adultos como em crianças. Esta revisão apresenta um visão atualizada sobre os fatores e

condições clínicas que predispõem à encefalopatia de Wernicke e discute os aspectos mais

recentes de epidemiologia, fisiopatologia, genética, diagnóstico e tratamento. Para facilitar

o diagnóstico, os autores separam os sintomas em freqüentes e raros na apresentação e os

quadros tardios. Ressaltam a dose ótima de tiamina parenteral requerida para a profilaxia e

tratamento da encefalopatia de Wernicke e prevenção da síndrome de Korsakoff associada

com abuse de álcool.

Human T-lymphotropic vírus 1: recent knowledge about an ancient infection.

Verdonck K et al. Lancet Infect, 7: 266, 2007.

O HTLV-1 infecta o ser humano há milhares de anos, mas o conhecimento sobre a

infecção e sua patogênese está surgindo apenas recentemente. O vírus pode ser transmitido

através da relação sexual, por produtos sanguíneos contaminados ou da mãe para o filho.

Existem áreas no Japão, na África sub-sahariana, no Caribe e na América do Sul onde mais

de 1% da população geral está infectada. Apesar da maioria dos portadores permaneça

assintomática, o vírus é associado com graves doenças que podem ser subdivididas em 3

categorias: doenças neoplásicas (Leucemia/Linfoma de Células T do Adulto), síndromes

inflamatórias (Mielopatia Associada ao HTLV-1/Paraparesia Espástica Tropical e Uveíte,

entre outras) e infecções oportunistas (hiperinfecção por Strongyloides stercoralis e

outras). A compreensão da interação entre o virus e a resposta do hospedeiro tem

aumentado de forma expressiva, mas os marcadores do prognóstico não estão ainda claros

e há poucas opções terapêuticas.

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NEUROLOGIA COGNITIVA E DO ENVELHECIMENTODr. Paulo Caramelli

Neuropsychological deficits in frontotemporal dementia and Alzheimer’s disease: A

meta-analytic review. [Déficits neuropsicológicos na demência frontotemporal e na

doença de Alzheimer: uma revisão meta-analítica]. Hutchinson AD et al. J Neurol

Neurosurg Psychiatry, 2007, in press

Objetivo: Identificar os testes cognitivos que melhor discriminam a doença de Alzheimer

(DA) da demência frontotemporal (DFT).

Métodos: Foi realizada pesquisa bibliográfica detalhada de todos os estudos publicados

entre 1980 e 2006 que examinaram o desempenho cognitivo na DA e na DFT. Noventa e

quatro estudos foram identificados, que avaliaram ao todo 2.936 pacientes com DA e 1.748

pacientes com DFT. Medidas estatísticas específicas foram determinadas para cada teste

cognitivo que tivesse sido utilizado em dois ou mais estudos.

Resultados: Os testes cognitivos mais discriminantes avaliavam de orientação, memória,

linguagem, função visual-motora e função cognitiva global. De forma mais específica, os

testes identificados foram: os subtestes de orientação e memória da bateria ACE, teste de

evocação tardia e reconhecimento de aprendizagem auditiva verbal (AVLT), evocação

tardia do desenho da figura de Rey, teste de reconhecimento de palavras, subteste de

memória lógica da bateria Wechsler (% de retenção e escore de evocação tardia), subteste

de reprodução visual da bateria Wechsler (escore de evocação tardia), teste de recordação

seletiva (escore de evocação total), teste de nomeação graduada, emparelhamento palavra-

figura, subteste de fluência verbal e de compreensão da Western Aphasia Battery, teste das

pirâmides e das palmeiras (escores de palavras e de figuras), tarefas de nomeação de

figuras, teste de integração visual motora de Beery e o Mini-Exame do Estado Mental.

Embora tenham sido observadas diferenças marcantes e estatisticamente significativas para

todas estas medidas, houve sobreposição substancial dos escores dos grupos de pacientes

com DA e DFT. Idade, nível educacional e os critérios diagnósticos utilizados não

contribuíram de forma significativa para estas diferenças.

Conclusões: Em função da grande sobreposição dos desempenhos de pacientes com

diagnóstico de DA e de DFT nos diferentes testes, a avaliação cognitiva deve ser

empregada com cautela e em conjunção com a história clínica, com dados

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comportamentais e de neuroimagem, além de informações obtidas dos familiares, com o

intuito de se fazer este diagnóstico diferencial.

Clinical and psychometric distinction of frontotemporal and Alzheimer dementias.

[Distinção clínica e psicométrica entre as demências frontotemporal e de Alzheimer].

Liscic RM et al. Arch Neurol, 64: 535, 2007.

Fundamentos: Uma parcela de pacientes que preenchem critérios diagnósticos de doença

de Alzheimer (DA) do NINCDS-ADRDA tem degeneração lobar frontotemporal (DLFT)

confirmada à autópsia, com ou sem DA concomitante. Portanto, os fenótipos clínicos das

duas condições podem se sobrepor.

Objetivos: Identificar marcadores clínicos e psicométricos que distinguem DA e DLFT no

momento da apresentação clínica.

Desenho: Estudo longitudinal de memória e envelhecimento.

Local de estudo: Centro de Pesquisa sobre doença de Alzheimer, Faculdade de Medicina

da Universidade de Washington, Saint Louis, EUA.

Participantes: Quarenta e oito casos com diagnóstico de DLFT confirmado à autópsia e

bem caracterizados clinicamente (27 com resultado de testes neuropsicológicos) foram

comparados a 27 casos com diagnóstico de DA confirmado à autópsia.

Resultados: Alterações de comportamento, particularmente impulsividade (p<0,001),

desinibição (p<0,001), isolamento social (p=0,01) e a presença de afasia progressiva não

fluente, distinguiram os indivíduos com DLFT daqueles com DA. Os pacientes com DLFT

tiveram melhor desempenho do que os com DA em um teste de memória episódica visual

(p=0,01), mas pior em um teste de fluência verbal (p=0,02) (desempenho este

correlacionado a alterações afásicas). Outras alterações cognitivas, como disfunção

executiva e comprometimento de memória, foram comparáveis entre os dois grupos.

Achados histopatológicos característicos de DA foram observados concomitantemente em

11 dos 48 pacientes com DLFT.

Conclusões: Aspectos clínicos e cognitivos da DLFT podem se sobrepor aos da DA,

embora alterações de comportamento e de linguagem diferenciem os pacientes com DLFT.

O déficit de memória em pacientes com DLFT pode, em parte, ser um reflexo da

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dificuldade para encontrar palavras, característica do transtorno de linguagem. Soma-se à

sobreposição dos fenótipos clínicos da DLFT e da DA a presença de alterações

neuropatológicas de DA em quase 1/4 dos pacientes com DLFT.

Comentários

Os dois estudos citados abordam temática semelhante e de grande relevância na prática

clínica, com implicações relacionadas tanto ao prognóstico quanto à terapêutica: o

diagnóstico diferencial entre DA e DFT. Embora a DA seja a causa mais freqüente de

demência em indivíduos com idade ≥ 65 anos, alguns indivíduos nesta faixa etária, e

principalmente aqueles com idade abaixo de 65 anos, podem apresentar outra forma de

demência degenerativa, a DFT. Alguns investigadores sugerem que na faixa etária pré-

senil (< 65 anos), a DFT teria prevalência muito próxima à da DA. Tanto a meta-análise

apresentada no primeiro artigo quanto os dados da casuística original apresentada no

segundo (que tem como grande diferencial o fato do diagnóstico final ter sido confirmado

ao exame anatomopatológico) demonstram a marcante sobreposição das manifestações

cognitivas nestas duas formas de demência. A análise dos resultados apresentados implica

em que o diagnóstico diferencial entre DA e DFT seja feito com cautela e baseado no

conjunto de dados clínicos e de exames de neuroimagem disponíveis e não apenas nos

dados de avaliação neuropsicológica. Particularmente importantes são as informações

relativas à ocorrência de alterações de comportamento, sobretudo impulsividade,

desinibição e isolamento social, que seriam bons indicadores do diagnóstico de DFT. A

observação, no segundo estudo, da associação de patologia do tipo Alzheimer em quase

25% dos cérebros dos pacientes com DFT é até certo ponto surpreendente, e pode explicar

parte da sobreposição clínica observada entre estas duas formas de demência degenerativa.

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Category fluency as a screening test for Alzheimer disease in illiterate and literate

patients. [Fluência verbal semântica como teste de rastreio para a doença de

Alzheimer em pacientes analfabetos e alfabetizados]. Caramelli P et al. Alzheimer Dis

Assoc Dis, 21: 65, 2007.

Objetivos: Testes de avaliação cognitiva breve são amplamente utilizados para rastreio de

demência, embora sejam usualmente influenciados pelo nível educacional. O presente

estudo teve como objetivos determinar escores do teste de fluência verbal (FV) semântica

(animais por minuto) ajustados à escolaridade e seus valores correspondentes de

sensibilidade (S) e de especificidade (E) como instrumento de rastreio diagnóstico na

doença de Alzheimer (DA).

Métodos: Oitenta e oito pacientes com DA leve e 117 controles devidamente pareados

foram avaliados. Pacientes e controles foram subdivididos em quatro grupos de acordo

com a escolaridade (analfabetos, 1-3 anos, 4-7 anos e ≥ 8 anos) e submetidos ao teste de

FV semântica (animais). Em cada grupo, as notas de corte foram determinadas por meio de

análise das áreas sob as curvas ROC.

Resultados: Os valores das áreas sob as curvas ROC foram 0,922 / 0,914 / 0,963 / 0,954

para a o diagnóstico de DA entre os grupos de analfabetos, 1-3, 4-7 e ≥ 8 anos de

escolaridade, respectivamente. As notas de corte para cada grupo, juntamente com os

valores de sensibilidade e especificidade, foram: < 9 (S=90,5%; E=80,6%) para

analfabetos; < 12 (S=95,2%%; E=80,0%) para aqueles com 1-3 anos; < 12 (S=91,3%;

E=91,9%) para os com 4-7 anos e < 13 (S=82,6%; E=100,0%) para os indivíduos com

escolaridade ≥ 8 anos.

Conclusões: Estes resultados sugerem que o teste de FV semântica (animais) pode ser útil

como instrumento de rastreio em casos de DA leve com diferentes níveis educacionais,

desde que sejam utilizados pontos de corte ajustados para cada faixa de escolaridade.

Comentários

O teste de FV (animais) é muito empregado em nosso país como parte da avaliação

cognitiva de pacientes com demência, especialmente DA. É bastante conhecida a

interferência da escolaridade sobre o desempenho neste e em muitos outros testes

empregados na prática clínica e mesmo na avaliação neuropsicológica formal. Para que o

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emprego destes instrumentos seja mais informativo e mesmo seguro por parte do médico e

do neuropsicólogo, recomenda-se que sejam estabelecidas notas de corte adequadas à

nossa população, levando-se em consideração tanto particularidades educacionais como

também culturais. É neste contexto que se enquadram os objetivos deste estudo, que

apresenta sugestões de pontos de corte para o referido teste no rastreio de DA leve em

diferentes níveis de escolaridade. Os resultados obtidos reproduzem as impressões

positivas de várias publicações internacionais anteriores com este mesmo teste, que pela

sua brevidade e facilidade constitui ferramenta útil para a avaliação clínica de pacientes

com demência, particularmente aqueles com suspeita de DA.

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NEUROIMUNOLOGIA Dr. Marcos Moreira

Dr. Charles Peter Tilbery

Dr. André Luiz Muniz Alves dos Santos

Dr. Rogério de Rizo Morales

Dra. Nívea de Macedo Oliveira Morales

Autologous haematopoietic stem cell transplantation fails to stop demyelination and

neurodegeneration in multiple sclerosis. Metz I et al. Brain, 130: 1254,2007.

Esclerose múltipla (EM) é uma doença inflamatória crônica imunomediada

desmielinizante do sistema nervoso central. A causa da EM permanece desconhecida.

Vários estudos sugerem que a exposição a um agente ambiental desencadearia uma

disfunção do sistema imune em pessoas geneticamente predispostas precipitando a doença.

A disfunção do sistema imune levaria a uma ação autolesiva dirigida fundamentalmente

contra a substância branca com perda de oligodendrócitos, mielina e axônios.

O transplante autólogo de células tronco hematopoiéticas (TACT) na EM está

baseado em resultados favoráveis de transplantes em modelos animais e em observações

clínicas de pacientes submetidos a transplante para doenças malignas que apresentavam

doença auto-imune associada. No entanto, o modelo animal de EM não é totalmente

reproduzível em humanos e pacientes com lesões graves caracterizadas por perda axonal e

atrofia cortical não apresentariam melhora.

A base terapêutica do TACT na esclerose múltipla é a imunossupressão radical ou

mesmo a imunoablação, desencadeadas por dose alta de quimioterapia e/ou radioterapia e a

reconstituição de um novo sistema imune após a infusão de células-tronco autólogas

oriundas do sangue periférico ou da medula óssea do próprio paciente. A fonte preferida de

células tronco é o sangue periférico devido à curta duração da aplasia, resultando em

menor morbidade e mortalidade. O efeito de longo prazo de dose alta de imunossupressão

seguida de TACT sobre a freqüência dos surtos ou progressão da EM é desconhecida.

No Brasil, o primeiro TACT em um paciente com EM foi realizado em 2001.

Aproximadamente 250 pacientes com EM foram tratados com dose alta de quimioterapia

seguida de TACT em todo mundo, como parte de estudos abertos fase I e II.

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O objetivo deste estudo foi caracterizar a histopatologia de lesões da EM em

pacientes que receberam TACT. Um total de 53 lesões da substância branca (de 05

pacientes) foi investigado utilizando corantes imunohistoquímicos para caracterizar

atividade desmielinizante, infiltrados inflamatórios, axônios lesados agudamente e células

microgliais/macrófagos. Os autores encontraram evidências de desmielinização ativa em

todos os pacientes. O infiltrado inflamatório dentro das lesões mostrou somente poucas

células T com predomínio de células T citotóxicas CD8+. Células B e plasmócitos estavam

completamente ausentes nas lesões. Alto número de axônios lesados agudamente foi

encontrado nas áreas de lesão ativa. A injúria tissular foi associada com células

microgliais/macrófagos ativados.

Os resultados deste estudo indicam que a desmielinização ativa e a degeneração

axonal ocorrem apesar de uma imunossupressão radical seguida de TACT. Em conclusão,

os dados do estudo mostram que dano axonal e desmielinização estão presentes em

pacientes com longo tempo de doença e alto EDSS que se submeteram a imunossupressão

seguida de TACT.

Neutralizing antibodies to interferon beta: Assessment of their clinical and

radiographic impact: an evidence report. Report of the Therapeutics and Technology

Assessment Subcommittee of the American Academy of Neurology. Goodin DS et al.

Neurology, 68: 977, 2007.

Este estudo foi baseado em evidências científicas disponíveis na literatura e

realizado sob os auspícios da Academia Americana de Neurologia. O estudo analisou o

impacto radiológico e clínico do desenvolvimento de anticorpos neutralizantes (NAbs)

para o interferon beta (INFβ). Com base em evidências classe II e III (quadro 1), concluiu-

se que o tratamento de pacientes com esclerose múltipla (EM) com INFβ está associado

com a produção de NAbs (recomendação A). A presença dos NAbs no soro está

provavelmente associada com a redução na eficácia clínica e radiológica do tratamento

com INFβ (recomendação B). Além disso, a taxa de produção de Nabs é provavelmente

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menor com o tratamento com INFβ-1a quando comparado com o tratamento com INFβ-1b,

embora a magnitude e persistência desta diferença seja difícil de determinar

(recomendação B).

É provável que exista uma diferença na soroprevalência devido a variabilidade da

dose de INFβ injetada ou na freqüência ou via de administração (recomendação B). Parece

claro que o INFβ-1a de uso intramuscular é menos imunogênico que as outras preparações

de INFβ (recomendação A). No entanto, devido ao fato dos NAbs desaparecerem em

alguns pacientes mesmo em uso continuado de INFβ, a persistência desta diferença é difícil

de determinar (recomendação B). Apesar do achado de que altos títulos de NAbs (>100 a

200 NU/ml) estão associados com uma redução no efeito terapêutico do INFβ, não há

informação suficiente para a utilização de testes para dosagem de NAbs com a finalidade

de fornecer recomendações específicas; visto que ainda não está definido que teste usar;

quando fazer o teste, quantos testes são necessários ou ainda, que títulos seriam

importantes (recomendação U).

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Quadro 1. Classes de Evidência para intervenção terapêutica e tipos de Recomendação

Classes de evidências dos ensaios terapêuticos Tipos de recomendação Tradução da evidência para a

recomendação

Classe I: Ensaio clínico controlado com avaliação

mascarada do resultado, numa população

representativa. São necessários:

a) Resultado(s) primário(s) claramente definido(s)

b) Critérios de inclusão/exclusão claramente

definidos

c) Contagem adequada das desistências e cross-

overs com números suficientemente baixos para se

ter mínimo potencial para viés

d) Características relevantes do quadro inicial são

apresentadas e substancialmente equivalentes entre

os grupos de tratamento, ou há ajustes estatísticos

apropriados para as diferenças.

A = Estabelecido como

eficaz, ineficaz, ou

prejudicial para a dada

condição na população

especificada

Recomendação Tipo A requer no

mínimo um estudo Classe I

convincente, ou no mínimo dois

estudos convincentes classe II

Classe II: Estudo de coorte prospectivo com

grupos pareados numa população representativa

com avaliação mascarada do resultado que

preencha a – d acima; ou um ensaio clínico

terapêutico numa população representativa faltando

um dos critérios a – d.

B = Provavelmente eficaz,

ineficaz, ou prejudicial para

a dada condição na

população especificada

Recomendação Tipo B requer no

mínimo um estudo convincente Classe

II, ou no mínimo três estudos

consistentes Classe III.

Classe III: Todos os outros ensaios controlados

(incluindo controles com história natural bem

definida ou pacientes servindo como seus próprios

controles) numa população representativa, onde a

avaliação da desistência é independente do

tratamento do paciente.

C = Possivelmente eficaz,

ineficaz, ou prejudicial para

a dada condição na

população especificada

Recomendação Tipo C requer no

mínimo dois estudos convincentes e

consistentes Classe III

Classe IV: Evidência a partir de estudos não

controlados, séries de casos, relatos de casos ou

opinião de especialistas.

U = Dados inadequados ou

conflitantes.

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Immunomodulatory treatment in multiple sclerosis: experience at a Brazilian center

with 390 patients. Tilbery CP et al. Arq Neuropsiquiatr, 64: 51,2006.

A esclerose múltipla é uma enfermidade crônica, progressiva e imunomediada.

Geralmente compromete indivíduos jovens, sendo a principal causa de incapacidade

laborial nos EUA e Europa. Nos últimos anos a prevalência desta enfermidade tem

aumentado gradativamente e, recentes publicações, detectaram aumento significativo da

EM em mulheres e crianças. Este fato foi confirmado entre nós, de maneira que inúmeros

neurologistas tem descrito séries crescentes de pacientes com a EM no Brasil, com

semelhanças às séries ocidentais. Do ponto de vista evolutivo há uma tendência entre nós

de considerá-la mais benigna comparativamente as mesmas séries.

Até meados dos anos 90 o tratamento na EM se resumia a reverter os surtos com uso

de corticóides e seus derivados. Após esta intervenção medicamentosa, o paciente

gradativamente evoluía para progressão e acúmulo de incapacidades nos anos

subseqüentes, sem haver até então medicamentos que alterariam este grave cenário.

Felizmente, após a aprovação do FDA em 1993, o arsenal terapêutico do neurologista para

tratar estes pacientes foi beneficiado com a aprovação dos interferons, drogas

modificadoras do curso da moléstia. Esta nova intervenção medicamentosa causou

alteração significativa na evolução dos portadores de EM. Entre nós, o Ministério da Saúde

incorporou, paulatinamente, a partir de 1997, na sua lista de medicamentos os interferons e

o acetato de glatirâmer, como medicamentos imunomoduladores

A indicação do uso destes medicamentos está bem estabelecida atualmente. Há

indicação de se iniciar o tratamento tanto mais precoce possível, uma vez que o diagnóstico

seja definido pelos critérios adotados por McDonald WI e cols em 2001 e revistos por

Polman CH em 2005. Deve-se medicar apenas pacientes com formas ativas da EM, pois

suas características anti-inflamatórias restringem seu uso nestes casos, pois pacientes com

progressão da doença e portanto com seqüelas e lesões axonais não tem benefícios

comprovados com estes medicamentos

A experiência com uso de imunomoduladores nos últimos 10 anos tem revelado dados

impotantes, que devem ser abordados com os pacientes para manter a aderência ao

tratamento. Não é possível, pelo menos atualmente, prever a resposta terapêutica, por

ausência de marcador biológico para este fim e, apenas a escala de incapacidade (EDSS), o

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número de surtos durante o uso do medicamento comparativamente ao ocorrido antes do

início do tratamento e a IRM (imagem por ressonância magnética) sinalizam a resposta

terapêutica. A impressão prática sugere que os medicamentos imunomoduladores tem a

mesma eficácia e, portanto, ao recomendar seu uso, devemos esclarecer ao paciente as

eventuais diferenças posológicas destes medicamentos, ocorrência de efeitos colaterais,

resultados esperados, etc. Nota-se que as taxas de aderência e migração são variáveis nos

estudos e dependem de vários fatores. Observa-se que pacientes que convertem de formas

remitentes para as progressivas da doença são fatores que influenciam no abandono do

tratamento. Efeitos colaterais, que normalmente são transitórios, são fatores importantes

para alguns pacientes migrarem de imunomodulador.

Os autores relatam estas ocorrências em sua casuística, que representa o perfil dos

pacientes e a conduta que adotamos no nosso meio.

High-dose cyclophosphamide for moderate to severe refractory multiple

sclerosis. Gladstone DE et al. Arch Neurol, 63: 1388,2006.

Trata-se de um estudo realizado em New York, no qual foram estudados 13

portadores de esclerose múltipla (EM), forma remitente-recorrente ou secundariamente

progressiva, com EDSS maior ou igual a 3,5, e submetidos anteriormente a pelo menos

dois tratamentos com drogas modificadoras da doença (imunomoduladores,

imunoglobulinas, mitoxantrone, e outros). Esses pacientes receberam ciclofosfamida

200mg/kg por quatro dias, e foram seguidos por dois anos com avaliações clínicas, de

ressonância e de qualidade de vida.

Durante o seguimento, nenhum paciente piorou o EDSS inicial em mais de um

ponto, e cinco apresentaram melhora entre 1,0 e 5,0. Observou-se estabilização dos

parâmetros radiológicos, e melhora em sintomas neurológicos e em todos os domínios de

qualidade de vida avaliados pelo SF-36. Dessa forma, os autores concluem que a

ciclofosfamida em altas doses para portadores de EM refratária é uma opção a ser

considerada, mas reforçam ainda a necessidade da melhor determinação do tipo de

pacientes para esse tratamento.

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A systematic review of oral methotrexate for multiple sclerosis. Gray OM et al. Mult

Scler, 12:507, 2006.

Neste estudo, os autores apresentam os resultados de uma busca na literatura,

através de várias fontes, de estudos randomizados e controlados sobre a utilização do

metotrexate oral na esclerose múltipla (EM). Foram incluídos estudos com portadores de

EM com forma remitente-recorrente ou progressiva de acordo com os critérios de Poser,

que utilizaram metotrexate na dose de 7,5 mg/semana por pelo menos três meses, e com

vários critérios para avaliação da evolução e de efeitos colaterais.

Dos 1085 artigos encontrados inicialmente, 1083 foram excluídos por não se

tratarem de estudos controlados, e um foi excluído porque, em duas ocasiões, os pacientes

apresentaram surtos, e foi comunicado aos médicos que o paciente estava usando a droga

ou o placebo. O artigo avaliado estudou 60 pacientes, 31 com metotrexate e 29 com

placebo, e não foram evidenciadas diferenças após 36 meses de acompanhamento, sendo

24 meses em uso da medicação.

Assim, pela falta de evidências fortes, os autores da revisão não recomendam o uso

do metotrexate oral na EM, até que mais estudos randomizados e controlados sejam

realizados.

Prognostic factors for early severity in a childhood multiple sclerosis cohort.

Mikaeloff Y et al. Pediatrics, 118:1133, 2006.

Um estudo do tipo coorte foi conduzido em uma população francesa com

diagnóstico de esclerose múltipla (EM), com manifestação inicial antes de 16 anos de

idade. O objetivo do estudo foi o de identificar fatores prognósticos para gravidade e

fornecer elementos para o desenvolvimento de um instrumento que pudesse predizer

precocemente a gravidade da doença, por meio de um escore.

Participaram do estudo 197 crianças com história de dois episódios clinicamente

definidos de desmielinização inflamatória aguda em intervalo de pelo menos 30 dias. O

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diagnóstico de EM baseou-se em critérios clínicos de disseminação espacial e temporal. O

período de inclusão foi de janeiro de 1990 a dezembro de 2003 para o primeiro episódio de

desmielinização. Os pacientes foram acompanhados até junho de 2005.

De 197, 144 pacientes (73%) evoluíram de forma grave. O risco de gravidade foi

maior para o gênero feminino, para indivíduos com intervalo entre o primeiro e segundo

surto inferior a um ano, para crianças que já preenchiam critérios para diagnóstico de EM

no exame de ressonância magnética inicial, na ausência de mudanças na gravidade do

estado mental no início do quadro e para a forma de evolução progressiva da doença.

O estudo obteve um índice potencial para estabelecer a gravidade precoce da EM de

início na infância, com valor preditivo de 35% para segundo quartil. Todavia, o

instrumento elaborado ainda necessita ser validado.

Segundo os autores, esse estudo permitiu a determinação dos fatores de risco para

evolução precocemente grave da EM, o que pode possibilitar a identificação dos indivíduos

com maior risco e favorecê-los mediante abordagem terapêutica apropriada por meio de

novos estudos.

Early abnormalities of evoked potentials and future disability in patients with

multiple sclerosis. Kallmann BA et al. Mult Scler, 12: 2006, 58.

Os autores iniciam o artigo salientando que os potenciais evocados (PEs) têm um

papel no diagnóstico da Esclerose Múltipla (EM), mas sua implicação para predizer o

curso futuro da EM está sob debate. Neste artigo os PEs de 94 pacientes foram realizados

na primeira visita, após cinco e dez anos e analisados retrospectivamente. Os pacientes

foram divididos em dois grupos com relação à duração da doença: grupo 1 (n= 44) foram

examinados nos primeiros dois anos após o início da doença, e grupo 2 (n= 50) nas formas

mais tardias da doença.

No grupo 1 foi encontrado um valor preditivo significativo para o PE (Potencial

Evocado Somatossensitivo - PESS e Potencial Evocado Motor - PEM) que se correlaciona

significativamente com os valores do EDSS após cinco anos e o PEM após 10 anos. Os

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PEM, PESS e PEV (Potencial Evocado Visual) anormais indicam também uma grande

incapacidade funcional com EDSS>3,5 após cinco anos. Achados anormais combinados de

PESS e PEM na primeira avaliação se correlacionam mais com EDSS > 3.5 após cinco

anos. Os dados dos PEs e EDSS na primeira avaliação não foram associados

significativamente, o que sugere que as anormalidades do PE pelo menos em parte

representaram lesões silenciosas. No grupo 2 nenhuma associação significativa entre dados

dos PEs na primeira avaliação e o EDSS em cinco e dez anos de acompanhamento foram

detectados. Os autores salientam a importância do PEV no diagnóstico de EM, porém

escrevem que os mesmos não são úteis para o acompanhamento.

Os autores concluem que achados clínicos juntamente com achados da ressonância

magnética e os dados combinados dos PEs podem ajudar identificar pacientes de alto risco

de incapacidade e ajudar na decisão do uso do imunomodulador. Recomendam estudos

prospectivos para avaliar o valor dos PEs no acompanhamento desses pacientes.

Can abnormal evoked potentials predict future clinical disability in patients with

multiple sclerosis? Mastaglia FL. Nat Clin Pract Neurol, 2: 2006,304.

Mastaglia comenta que o curso clínico dos pacientes com EM é extremamente

variável, e predizer a progressão e o grau eventual da incapacidade é difícil nos estágios

precoces da doença. Determinadas características tais como a idade de início, a área do

sistema nervoso central afetada inicialmente (por ex: medula espinhal, tronco cerebral,

cerebelo) e a freqüência dos surtos nos primeiros dois anos da doença podem servir de

marcador prognóstico. O número e o volume das lesões no cérebro na ressonância

magnética já são considerados marcadores prognósticos. Segundo Mastaglia, nenhum

destes critérios possui real valor quando analisamos individualmente cada paciente.

Estudos prévios já evidenciaram uma relação entre registros anormais dos

potenciais evocados e a incapacidade funcional dos pacientes com Esclerose Múltipla

indicando o valor prognóstico dos PEs. O estudo de Kallmann et al. mostra uma correlação

convincente entre o número e a severidade de anormalidades dos PEs quando os registros

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foram obtidos nos primeiros 2 anos após o início do sintoma, e o grau da incapacidade

subseqüente avaliada após 5 anos pelo EDSS.

Kallman e cols. sugerem que os PEs em associação com o exame por imagem por

ressonância magnética (IRM) podem ajudar no prognóstico dos pacientes e identificar

quem se beneficiará com a terapia imunomoduladora. No entanto,deve-se pensar no custo

desses exames.

O potencial evocado visual (PEV) já é reconhecidamente o PE mais útil para

detectar lesões assintomáticas da via visual nos pacientes com IRM normais ou

inconclusivas. O PEV é útil também nos pacientes com lesões restritas ao cérebro ou na

medula espinhal, sendo que o mesmo já está incluído nos critérios diagnósticos revisados

de McDonald para EM.

Early abnormalities in evoked potentials and future disability in patients with

multiple sclerosis. Casanova B et al. Mult Scler, 12: 2006,521.

Na carta para o editor, Casanova et al., comentam sobre o valor preditivo das

anormalidades dos potenciais evocados na incapacidade futura dos pacientes com esclerose

múltipla. Eles concordam com o estudo de Kallmann e salientam que os potenciais

evocados realizados no início dos sintomas se correlacionam não só com a incapacidade

como também com a progressão rápida da doença. Eles acreditam que os potenciais

evocados juntamente com a clínica, IRM e marcadores biológicos podem nos auxiliar no

prognóstico destes indivíduos e na seleção de pacientes de alto risco para uma intervenção

terapêutica precoce.

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CEFALÉIA

Drª. Célia Aparecida de Paula Roesler

Migraine in the elderly: a review. Haan J et al. Cephalalgia, 27: 97, 2007.

Neste artigo, a epidemiologia e aspectos clínicos da migrânea em grupos de 60 anos

ou mais são reunidos, com especial atenção para comorbidade. São também mostradas as

opções de tratamento em idosos.

Em geral, a migrânea tem um prognóstico relativamente favorável: em torno de 40% de

pacientes com migrânea com aura (MA) e migrânea sem aura (MoA) pararam de ter crise.

Essa diminuição é iniciada a partir dos 50 ou 60 anos de idade e ocorre não somente no

período pós-menopausa da mulher, mas também em homens.

Quando a migrânea persiste, suas características podem mudar com o avanço da idade. O

problema de transformação da migrânea numa forma crônica pode acontecer em todas as

idades, inclusive nos idosos. Abuso de medicação tem seu papel nisso, mas essa

transformação também pode refletir um mal diagnóstico. Devemos lembrar que, ao

envelhecer, ataques de MA podem perder o elemento da dor de cabeça e os pacientes

podem somente apresentar os sintomas visuais (aura).

O avanço na idade geralmente vem acompanhado do aumento de suscetibilidade de um

grande número de doenças, como hipertensão, diabetes e consequências (como AVC e

problemas no coração). Há também inúmeras doenças que ocorrem mais freqüentemente

em associação com a migrânea, como o AVC isquêmico (que não deve ser somente

associado aos pacientes idosos).

Migrânea e doenças cérebros-vasculares: os achados são só consideráveis em mulheres

jovens; não há nada consistente em populações mais idosas.

Migrânea e depressão: sintomas depressivos podem influenciar a ocorrência e severidade

de migrânea em pacientes mais velhos.

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Migrânea e cognição: uma alta incidência de lesões na substância branca em pacientes com

migrânea e o fato desta também causar ruptura na fisiologia do cérebro poderia nos levar a

assumir que há uma relação entre migrânea e declínio cognitivo, mas isso não foi

comprovado em estudos.

Migrânea e vertigem: apesar de tontura ser uma reclamação comum na população em

geral, e parece crescer com o aumento da idade, migrânea com vertigem não é

especificamente associada com pessoas maiores de 60 anos.

Migrânea e epilepsia: não há dados conclusivos, visto que a maioria dos estudos foi focada

na população jovem.

A tabela a seguir mostra qual tratamento deve ser usado em pacientes idosos.

Tratamento da crise

Primeira escolha Acetaminofen

Segunda escolha Triptanos

Não usar, ou usar com cautela NSAIDs ; Ácido Acetilsalicílico

Tratamento Preventivo

Primeira escolha Propanolol ;Topiramato ;valproato de sódio

Segunda escolha Bloqueadores dos canais de cálcio

Não usar, ou usar com cautela Nortriptilina

Não usar Amitriptilina

A migrânea em pacientes idosos tem sido negligenciada, apesar de muitos pacientes com

idades maiores que 50, 60 e 70 anos sofram de migrânea. Atenção especial é necessária

para o diagnóstico da migrânea em pacientes idosos, onde outras doenças que causam dor

de cabeça devem ser consideradas e excluídas.

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Prospective analysis of factors related to migraine attacks: the PAMINA study.

Wöber C et al. Cephalalgia, 27: 304, 2007.

A migrânea é relacionada a numerosos fatores, como hormônios, stress e nutrição, por

exemplo, mas informações sobre seus reais envolvimentos no assunto são limitadas. Neste

estudo, foi analisado um amplo espectro de fatores relacionados com dor de cabeça em

migranosos.

A migrânea é uma desordem neurológica paroxismal que afeta pelo menos 10% da

população mundial, causando desconforto individual e até mesmo um largo problema

econômico na sociedade. Como sabemos, a migrânea requer tratamentos farmacológicos e

não-farmacológicos, mas não devemos esquecer que os gatilhos desencadeantes das crises

devem ser usados como estratégia de tratamento.

A grande maioria dos estudos sobre os fatores desencadeantes dos ataques de migrânea são

baseados em recordações, o que é uma informação subjetiva. Neste estudo, foi entregue

aos pacientes um diário que relacionava 52 itens potencialmente relacionados com

migrânea e incluía questões como presença de dor de cabeça, assim como as características

desta.

Foram observadas a ocorrência e persistência de dor de cabeça em migranosos e, como

resultados, percebemos que a menstruação tem um papel desfavorável em 96% dos casos.

Além disso, tem também efeitos desfavoráveis tensão muscular no pescoço, tensão

psicológica, cansaço, barulho, odores e exaustão física. Com esses resultados enfatizamos

que a educação do paciente deve ser feita juntamente com o tratamento farmacológico.

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TRANSTORNOS DO MOVIMENTO Dra. Mônica Santoro Haddad

RISCOS ELEVADOS DE PROBLEMAS VALVARES CARDÍACOS

REPORTADOS EM PACIENTES COM DOENÇA DE PARKINSON USANDO

AGONISTAS DOPAMINÉRGICOS DERIVADOS DO ERGOT.

Valvular heart disease during treatment with dopamine agonists for Parkinson´s

disease. Zanettini R et al. N Engl J Med, 356: 39, 2007.

Dopamine agonists and the risk of cardiac-valve regurgitation. Schade R et al. N Engl

J Med, 356: 29, 2007.

E Coméntários de Kurt Samson para o Neurology Today 2007, vol 7, n 3

Dois novos estudos, publicados no início de 2007, confirmam que pacientes com doença

de Parkinson (DP) usando agonistas dopaminérgicos ergolínicos podem estar em risco

elevado de doença valvar cardíaca. Os sintomas da doença cardíaca podem escapar da

atenção do neurologista pois são similares àqueles experimentados pelos pacinetes com DP

e são apenas detectados por ecocardiogramas.

O grupo italiano encontrou um aumento significante na regurgitação valvar moderada a

grave em pacientes usando pergolida ou cabergolina quando comparados com indivíduos

não tratados. A regurgitação também não foi encontrada nos pacientes usando agonistas

não ergolínicos. Ecocardiogramas foram realizados em 155 pacientes ( 64 usando

pergolida, 49 usando cabergolina e 42 com agonistas não ergolínicos) e comparados com

90 controles pareados por sexo e idade. Os resultados revelaram que 23,4% dos pacientes

com pergolida e 28,6% dos pacientes com cabergolina tinham regurgitação valvar cardíaca

moderada a grave(graus3 e 4), clinicamente significativas e que acometiam uma ou mais

vávulas de três ( aórtica, mitral e tricúspide). Comparativamente, apenas 5,6% dos

controles e nenhum dos pacientes em uso de agonistas não ergolínicos apresentaram tal

problema. Os autores também relatam que os pacientes tratados com agonistas ergolínicos

que tinham grau 3 a 4 de regurgitação de qualquer das valvas cardíacas recebiam uma dose

cumulativa significantemente mais alta de pergolida ou cabergolina quando comparados

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com pacientes com graus mais baixos de regurgitação. O risco relativo (RR) para

regurgitação valvar moderada ou grave foi estatisticamente significante para válvula mitral

nos usuários de pergolida (RR=6,3;p=0,008) e regurgitação aórtica (RR=4,2;p= 0,01). Nos

pacientes usando cabergolina, apenas o risco de regurgitação aórtica foi significativo

(RR=7,3;p<0,001). Os autores ressaltam que os sintomas de insuficiência valvar podem se

instalar lentamente e serem referidos de forma vaga pelos pacientes, na forma de casaco,

tonturas, dificuldade para caminhar ou seja, facilmente confundidos com queixas comum

nos pacientes parkinsonianos e o diagnóstico só pode ser feito pelo estudo

ecocardiográfico. Assim, sugerem que os neurologistas devem estar cientes do risco,

discuti-lo com seus pacientes e realizar acompanhamento ecocardiográfico periódico nos

pacientes usando agonistas dopaminérgicos ergolínicos.

O segundo estudo foi conduzido por pesquisadores alemães, que revisaram dados de

11417 pacientes registrados no United Kingdom General Practice Research Database no

período de 1988 até 2005. Encontraram um significante aumento de regurgitação valvar

cardíaca durante um tempo médio de seguimento de 4,2 anos, particularmente naqueles

que usavam doses superiores a 3mg e por períodos maiores de seis meses. A incidência

anual de doença valvar cardíca foi significantemente mais alta com o pergolide (30 /10000

pacientes) e cabergolina (33/10000 pacientes), do que com pacientes não tratados (

5,5/10000). Em 31 pacientes com insuficiência valvar recentemente diagnosticada, seis

estavam usando pergolida, seis estavam usando cabergolina e 19 não estavam usando

nenhum agonista dopaminérgico. Não se observou entretanto diferenças nos pacientes

usando bromocriptina ou lisuride, assim como nos agonistas não ergolínicos, como

ropinirole e premipexole.

O professor Joseph Tenenbaum cita, nos comentários ao Neurology Today, que estes

achados lembram os que levou a suspensão do uso de moderadores de apetite do tipo

fenfluramina, há uma década atrás. Já há na literatura médica evid~encias suficientes

quanto ao risco dos derivados do ergot, porém os neurologistas habitualmente não incluem

ecocardiogramas em sua rotina quando prescrevem estes medicamentos. Isto é um

equivoco, pois embora o número de pacientes afetados seja pequeno, o risco é alto e os

neuologistas devem estar alertas, completa.

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EPILEPSIA Dr. Luiz Eduardo Betting

Dr. Fernando Cendes

Idiosyncratic adverse reactions to antiepileptic drugs. Zaccara G et al. Epilepsia 2007;

OnlineEarly Articles: 1-22

1) Introdução

A prevenção e o manuseio de eventos adversos é um grande desafio na prática

diária dos médicos que lidam com epilepsia. De modo geral, as reações adversas podem ser

divididas em dois grandes grupos:

- Tipo A (dose dependente): mais comum. Esta relacionada aos mecanismos de ação da

medicação em uso. Na maioria das vezes o ajuste da dose do medicamento melhora os

sintomas. Raramente requer descontinuação da droga antiepiléptica.

- Tipo B (idiossincrásica): mais rara. Este tipo de reação adversa ocorre sem aviso e de

forma imprevisível. Apesar de sua menor freqüência, as reações adversas idiossincrásicas

constituem um grande problema. Estas reações são responsáveis por elevada taxa de

morbi-mortalidade e na maioria das vezes requerem descontinuação da medicação.

2) Definição de reação adversa idiossincrásica

Qualquer efeito adverso que não pode ser explicado com base nos conhecidos

mecanismos de ação da medicação. A ocorrência na maioria das vezes é imprevisível.

Incide em indivíduos susceptíveis, independentemente da dosagem.

3) Avaliação e identificação

Existem muitas dificuldades metodológicas no estudo dos efeitos adversos

idiossincrásicos. Uma das dificuldades é a rara ocorrência podendo passar despercebida

nos estudos iniciais. Outra dificuldade é o estabelecimento de uma relação causal, pois

muitas vezes a reação pode aparecer anos após o inicio da medicação dificultando a sua

identificação. A epidemiologia das reações idiossincrásicas é bastante complexa em

decorrência das incertezas quanto às incidências reportadas, relação causal entre outros.

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4) Mecanismos:

Podem ser divididos em três principais:

- Citotoxicidade direita: uma medicação ou metabólito pode causar dano celular direito.

- Reações de hipersensibilidade imunomediadas.

- Farmacologia relacionada a outro sistema: a droga ou um metabólito interage diretamente

com outro sistema.

5) Fatores de risco:

a) Fatores genéticos: a ocorrência de efeitos adversos idiossincrásicos em gêmeos e em

algumas famílias sugere uma predisposição geneticamente determinada. Resultados

interessantes estão sendo observados das investigações de genes que controlam as

respostas imuno-inflamatórias. Futuramente, testes genéticos poderão se tornar importantes

ferramentas na investigação de pacientes com riscos de reações adversas idiossincrásicas.

b) Idade: o risco de apresentar reações adversas idiossincrásicas é idade-dependente. Esta

susceptibilidade é explicada pelas diferenças no metabolismo relacionado a idade.

Indivíduos mais jovens e idosos apresentam uma maior predisposição aos efeitos adversos

idiossincrásicos.

c) Dose de início e velocidade de titulação: o início com doses altas e o rápido aumento na

dosagem das medicações antiepilépticas estão associados a um maior número de efeitos

adversos idiossincrásicos.

d) Fatores relacionados a doenças: várias patologias de base podem predispor a um maior

risco de reações adversas idiossincrásicas. Deste modo, em pacientes com comorbidades o

manuseio das drogas antiepilépticas deve ser realizado de forma mais cautelosa.

e) Outros fatores:

- reações idiossincrásicas a uma determinada medicação ocorrem com uma

freqüência maior quando o paciente apresenta história de reação a outras medicações.

Particularmente, quando os compostos são semelhantes. Um exemplo é a reação de

hipersensibilidade cruzada entre medicações antiepiléticas aromáticas (carbamazepina,

fenitoína e fenobarbital). Nestes pacientes, medicações não-aromáticas como valproato e

benzodiazepínicos constituem alternativas mais seguras.

- o uso de múltiplas medicações é outro fator associado a predisposição as reações

adversas. Um exemplo é a combinação entre lamotrigina e valproato. Esta combinação

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favorece o aparecimento dos efeitos de hipersensibilidade relacionados a lamotrigina, em

especial nos pacientes com rápido aumento das doses.

6) Reações idiossincrásicas mais comuns a medicações antiepilépticas:

a) Reações cutâneas: constituem a manifestação mais comum de uma reação adversa

idiossincrásica. Podem variar de leve a grave inclusive com potencial de letalidade.

- Rash relacionado à droga com eosinofilia e sintomas sistêmicos (drug-related rash

with eosinophilia and systemic symptons – DRESS): é uma reação severa caracterizada por

febre, erupção cutânea, eosinofilia, linfocitose atípica, artralgia, linfadenopatia e

envolvimento multiorgânico (discrasias sanguíneas, hepatite, nefrite, miocardite, tireoidite,

pneumonite intersticial e encefalite). Mais comumente observada em pacientes com

fenitoína e carbamazepina.

- Síndrome de Stevens-Johnson e necrólise tóxica epidérmica: consistem em

reações caracterizadas por rápido aparecimento de erupções bolhosas, exantematosas, com

máculas purpúricas e lesões em alvo, acompanhadas de envolvimento de mucosas e

descamação da pele. São classificadas de acordo com a porcentagem de descamação

(menor do que 10% na Síndrome de Stevens-Johnson e maior do que 30% na necrólise

tóxica epidérmica). A mortalidade esta relacionada com a extensão do envolvimento da

pele e é maior em idosos. O prognóstico é melhor quando a medicação ofensiva tem uma

meia-vida curta e é retirada de forma precoce.

- Reações leves: são reações benignas, localizadas, não confluentes com aspecto

mais sólido, que geralmente são descritas como morbiliforme ou maculopapular em

aparência. Ocorrem tipicamente entre 5 dias a 8 semanas após o início da terapia. Apesar

destas reações poderem ocorrer com todas as medicações antiepilépticas, elas ocorrem

mais freqüentemente com o fenobarbital, fenitoína, carbamazepina e lamotrigina.

b) Reações hematológicas: nas discrasias sanguíneas induzidas por drogas, o agente

ofensivo provoca redução da sobrevivência e apoptose das células da medula óssea

levando a uma supressão global ou seletiva da hematopoiese. A reação mais séria é a

anemia aplástica.

c) Reações envolvendo o fígado e o pâncreas:

- Hepatotoxicidade: o fígado está exposto a uma elevada concentração das

medicações durante a fase absortiva e é também o órgão primário responsável pela

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metabolização das medicações. Desta forma, o fígado é particularmente vulnerável a

toxicidade induzida pelas medicações. Medicações antiepilépticas aromáticas constituem

uma causa reconhecida de hepatotoxicidade imuno-mediada. A lamotrigina também pode

causar hepatotoxicidade. O valproato requer especial atenção, pois a hepatotoxicidade fatal

varia de acordo com a idade e terapia associada. O maior risco ocorre em crianças menores

que dois anos e em politerapia. A suspensão precoce da medicação e a administração

rápida de L-carnitina parecem melhorar a sobrevivência de pacientes com hepatotoxicidade

induzida pelo valproato.

- Pancreatite: complicação rara associada a terapia com o valproato.

d) Reações do sistema nervoso central.

7) Prevenção, identificação precoce e manuseio:

a) Prevenção: Apesar de imprevisíveis algumas ações podem minimizar a ocorrência das

reações adversas: investigar o contexto clínico do paciente, considerar a tolerabilidade das

medicações (especialmente na utilização de politerapia), início com dosagem baixa e

aumento lento e gradativo das doses.

b) Identificação precoce: a principal estratégia para identificação precoce é informar o

paciente da possibilidade de reações adversas. Acompanhamento periódico regular com

história clínica e exame físico cautelosos também auxiliam na detecção precoce das

reações adversas. Em geral a monitorização laboratorial periódica não auxilia na

detecção destes efeitos adversos. As indicações de exames laboratoriais estão listadas na

tabela 1.

Tabela 1: Indicações de exames laboratoriais.

Antes de iniciar o tratamento

Em pacientes de alto risco

Em pacientes com dificuldade de comunicação

Na presença de sinais ou sintomas possivelmente relacionados a uma reação adversa

c) Manuseio

- Reações adversas sérias requerem a retirada imediata da medicação. A introdução

de uma nova medicação deve ser realizada concomitantemente. Quando a reação adversa é

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causada por uma droga antiepiléptica aromática, outras medicações aromáticas e a

lamotrigina devem ser evitadas. Alternativas seriam os benzodiazepínicos, gabapentina e

dependendo do quadro topiramato e valproato.

- O uso de corticoides é controverso. A maioria dos médicos utiliza prednisona 1-2

mg/Kg se os sintomas são graves. Reações adversas graves necessitam de hospitalização e

suporte adequados.

8) Conclusão:

Conseqüências sérias relacionadas aos efeitos adversos idiossincrásicos de

medicações antiepilépticas podem ser evitadas. Para isso, é preciso o conhecimento dos

fatores de risco, evitar drogas antiepilépticas específicas em subpopulações de risco,

alterações cuidadosas nas dosagens e especialmente uma monitorização cuidadosa da

resposta clínica tendo em mente a possibilidade da ocorrência destas reações.

Non-convulsive status epilepticus in adults: clinical forms and treatment. Meierkord

H. et al. Lancet Neurol, 6: 329, 2007.

1) Definição

Estado de mal epiléptico não-convulsivo é definido como uma alteração no

comportamento e/ou nos processos mentais associados com descargas epileptiformes

contínuas no eletroencefalograma. Portanto, é uma atividade ictal prolongada com ausência

de sinais motores maiores. Apesar da definição ser difícil e controversa, a maioria dos

autores concordam que o diagnóstico deve ser clínico-eletroencefalográfico. Apenas as

alterações clínicas não são suficientes para o diagnóstico, pois elas podem ser muito sutis e

em algumas ocasiões de difícil diferenciação com eventos não-epilépticos. A tabela 1

mostra os principais diagnósticos diferenciais.

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Tabela 1: Diagnóstico diferencial. Patologias que mimetizam o estado de mal epiléptico

não-convulsivo.

Encefalopatia metabólica

Aura migranosa

Amnésia pós-traumática

Confusão pós-ictal prolongada

Patologias psiquiátricas

Intoxicação exógena

Amnésia global transitória

Ataque isquêmico transitório

2) Epidemiologia

O estado de mal epiléptico não-convulsivo é uma condição comum. Sua incidência

aproximada é de 2-8 por 100000 habitantes por ano. Entretanto, este número pode ser

ainda maior devido ao diagnóstico pouco reconhecido. De modo geral, existe um

predomínio do estado de mal epiléptico nos indivíduos mais idosos (maiores que 60 anos).

O estado de mal epiléptico não-convulsivo também predomina nesta idade refletindo a

observação clínica de que a atividade epiléptica tende a generalizar menos freqüentemente

em indivíduos mais idosos.

3) Formas clínicas

O estado de mal epiléptico não-convulsivo pode ser dividido em quatro subtipos

principais: estado de mal epiléptico de ausência, estado de mal epiléptico parcial simples,

estado de mal epiléptico parcial complexo e estado de mal epiléptico durante o coma. O

estado de mal epiléptico sutil é considerado um outro subtipo. Esta forma de estado de mal

epiléptico ocorre em decorrência da evolução do estado de mal epiléptico convulsivo. Vale

a pena lembrar que a dicotomização entre epilepsias parciais e generalizadas também é

válida para o estado de mal epiléptico não-convulsivo. A melhor forma de diferenciação

entre os diversos subtipos é através do quadro clínico, padrão eletroencefalográfico e o

contexto da síndrome epiléptica pré-existente. As características clínicas mais sugestivas

de um estado de mal epiléptico não-convulsivo são: anormalidades da movimentação

ocular e fatores de risco para crises epilépticas como doença cerebrovascular, neoplasia,

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demência e neurocirurgia prévia. Estes pacientes devem obrigatoriamente ser investigados

através do eletroencefalograma.

a) Estado de mal epiléptico de ausência: a principal manifestação clínica é a

alteração de consciência. Alterações de comportamento também foram relatadas. O

eletroencefalograma mostra atividade epileptiforme generalizada do tipo espícula-onda

lenta com aproximadamente 3Hz. Ocorre geralmente no contexto das epilepsias

generalizadas idiopáticas particularmente em pacientes com epilepsia ausência ou epilepsia

mioclônica juvenil. Pode ser desencadeado pelo uso inapropriado de algumas medicações

antiepilépticas como, por exemplo, a carbamazepina.

b) Estado de mal epiléptico parcial simples: neste caso, a difusão da crise epiléptica

é restrita e as descargas epileptiformes também permanecem circunscritas. O paciente

permanece consciente e interagindo. A manifestação clínica depende da região cerebral

acometida. Podem ocorrer manifestações auditivas, afasia, sensitivas (disestesias),

gustatorias, olfatorias, psíquicas, vegetativas, sintomas visuais ou alteração de

comportamento. O eletroencefalograma de superfície é variável podendo ser inclusive

normal. Em alguns casos o exame mostra espículas ou complexos espícula-onda lenta

focais. Tanto o estado de mal epiléptico não-convulsivo parcial simples, quanto o parcial

complexo podem ter como etiologia epilepsia lesional ou não-lesional pré-existente.

Podem ocorrer “de novo” devido a patologias agudas, progressivas ou remotas do sistema

nervoso central.

c) Estado de mal epiléptico parcial complexo: é resultante de uma descarga ictal

mais difusa e geralmente bilateral. Pode ser de difícil diferenciação com o estado de mal

epiléptico de ausência. O quadro clínico é bastante variável. A consciência esta sempre

comprometida impossibilitando a interação do paciente com o meio. As manifestações

incluem confusão mental, comportamentos estranhos, automatismos orais ou manuais. A

maioria dos casos tem origem no lobo temporal e frontal. O eletroencefalograma é

semelhante ao estado de mal epiléptico não-convulsivo parcial simples, entretanto as

descargas ocorrem de forma mais difusa e o eletroencefalograma de superfície tem uma

melhor sensibilidade.

d) Estado de mal epiléptico não-convulsivo durante o coma: constitui um problema

importante. Na maioria das vezes o diagnóstico é difícil, uma vez que a patologia de base e

o uso de medicações como anestésicos, relaxantes musculares e anticonvulsivantes

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obscurecem a manifestação clínica. O diagnóstico deve ser realizado na presença de

alterações clínicas e eletroencefalográficas.

4) Prognóstico

O prognóstico depende da patologia de base e das complicações associadas. De

modo geral, a maioria dos estados de mal epiléptico não-convulsivos tem um bom

prognóstico com baixa morbidade e a mortalidade. Entretanto, a decisão do tratamento não

deve ser baseada exclusivamente nestes dados. O risco de danos físicos graves,

especialmente quando existe o comprometimento da consciência, deve ser considerado.

5) Tratamento

Depende do tipo e da causa. Devido a baixa incidência de complicações sistêmicas

agudas e neurológicas crônicas, os autores sugerem um tratamento menos agressivo.

a) Estado de mal epiléptico de ausência: geralmente respondem bem a

administração de diazepam 10mg que pode ser repetido se as crises persistirem. Se

necessário, o fenobarbital sódico intravenoso na dose de 20mg/kg ou valproato podem ser

utilizados. Em ambiente extra-hospitalar a administração de benzodiazepínicos via oral ou

retal pode ser utilizada.

b) Estado de mal epiléptico parcial simples e complexo: a resposta ao tratamento

inicial depende se o estado de mal ocorre em pacientes com epilepsia pré-existente ou “de

novo”. Em pacientes com história de epilepsia de lobo frontal ou temporal o tratamento

inicial pode ser realizado com diazepam 10mg que pode ser repetido se necessário. Se as

crises persistirem uma dose adicional de fenitoína (15-18mg/kg) pode ser utilizada. Por

outro lado, no estado de mal epiléptico parcial ocorrendo “de novo” os autores

recomendam o uso de fenobarbital intravenoso na dose de 20mg/kg ou valproato. Se as

crises não terminarem, é preciso ter cuidado com o tratamento agressivo, pois o uso de

anestésicos intravenosos parece estar relacionado a uma maior morbi-mortalidade. O uso

de anestésicos (midazolam, propofol, tiopental ou pentobarbital) deve ser considerado nos

raros casos de estado de mal epiléptico parcial complexo refratário em que o paciente é

jovem e não tem comorbidades.

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LÍQUIDO CEFALORRAQUIDIANO Dr. Luís dos Ramos Machado

Cerebrospinal fluid tau protein is increased in neurosyphilis: a discrimination from

syphilis without nervous system involvement? Paraskevas GP et al. Sex Transm Dis, 34:

220, 2007.

É um estudo de pesquisadores gregos que procura estabelecer critérios para

distinguir uma sífilis sistêmica de uma neurossífilis.

1. O ESTUDO

Os pressupostos básicos do estudo são os seguintes:

(1) segundo os autores, o critério para diagnóstico da neurossífilis é o teste de VDRL

reagente no LCR (teste com alta especificidade mas baixa sensibilidade). Quando esse

teste fosse falso-negativo, o diagnóstico dependeria do aumento do teor de proteínas

e/ou da pleocitose na vigência de quadro clínico compatível, uma vez feita a exclusão

de outras doenças neurológicas;

(2) a proteína tau no LCR é um marcador de lesão axonal / neuronal. Por esse motivo, seria

de esperar que a proteína tau estivesse aumentada seletivamente no LCR dos doentes

com neurossífilis em relação àqueles que apresentam apenas acometimento sistêmico, à

semelhança do que ocorre em outras doenças do sistema nervoso nas quais há lesão

neuronal.

Foram estudados 4 grupos de doentes: (1) 12 com neurossífilis; (2) 17 com sífilis

sistêmica, sem acometimento do sistema nervoso; (3) 14 controles; (4) 14 com doença de

Alzheimer.

No grupo 1, a mediana da proteína tau foi de 349 pg/mL; no grupo 2, 190 pg/mL;

no grupo 3, 189 pg/mL; no grupo 4, 543 pg/mL. Portanto, a proteína tau está aumentada

significativamente nos grupos neurossífilis e doença de Alzheimer. No caso específico da

sífilis, o teste permitiria discriminar as formas com acometimento neurológico daquelas

formas em que não há esse acometimento.

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Os autores fazem, ao final, uma ressalva relativa ao pequeno número de casos

estudados, afirmando serem necessários estudos mais amplos para confirmação.

2. COMENTÁRIOS SOBRE O ESTUDO

O ponto-chave na discussão é o pressuposto admitido quanto à caracterização do

acometimento do sistema nervoso pela sífilis. Por desconhecimento metódico (não

reconhecido para valorizar os dados pesquisados e os resultados obtidos) ou por

desconhecimento real, há uma desinformação inadmissível quanto ao diagnóstico da

neurossífilis. Creio ser de extrema importância referir alguns pontos:

(1) a reação do VDRL deve ser sempre acompanhada por outras reações imunológicas para

diagnóstico da sífilis: pelo menos uma reação não treponêminca (VDRL ou

Wasserman) e pelo menos uma reação treponêmica (hemaglutinação passiva ou ensaio

imunoenzimático). A utilização de uma reação isolada não é reconhecida como válida

para o diagnóstico da sífilis;

(2) a positividade das reações imunológicas por si não permite caracterizar o acometimento

do sistema nervoso, seja da sífilis, seja de outras doenças infecciosas. No caso da sífilis

deve haver: (a) reação inflamatória no LCR, com aumento ligeiro ou discreto do

número de células e aumento do teor de proteínas; (b) aumento do teor de globulinas

gama, que costuma ser muito significativo e não guarda relação direta com os títulos de

anticorpos específicos; (c) pelo menos nos casos em que há imunossupressão ou

quando for difícil o reconhecimento da neurossífilis, deve ser determinado o índice de

anticorpos específicos de Reiber e Felgenhauer, que permite a caracterização de

imunoliberação de anticorpos específicos no sistema nervoso.

Uma vez sumariamente ignorados estes pontos como foram no presente estudo, fica

sem fundamento o segundo pressuposto. Por isso, a determinação da proteína tau para

caracterização da neurossífilis tem interesse mais ilustrativo do que real. Fica difícil

imaginar a utilização de metodologia tão dispendiosa e de difícil acesso a laboratórios de

análises clínicas no Brasil como é o caso da proteína tau para caracterizar uma doença

estudada em nosso país com a competência com que foi a neurossífilis.

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DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ ELA

Dr. Mário Emílio Teixeira Dourado Júnior

As doenças do neurônio motor apresentam-se de forma heterogênea. Não existe um

exame que seja um marcador biológico definitivo para o diagnóstico, entretanto, nos

últimos anos, vários estudos foram realizados na busca de um marcador, de diagnóstico ou

de acompanhamento, que permita distinguir o envolvimento do primeiro ou do segundo

neurônio motor. (Lancet Neurol 2005:4:229-238)

A Ressonância Magnética com espectroscopia visa ao estudo do metabolismo

cerebral in vivo analisando o N-acetilaspartato, entre outros, que reflete a densidade e a

viabilidade neuronal e axonal. A imagem por tensão de difusão (DTI – diffusion tensor

imaging), analisa a presença de anisotropia de difusão, resultante da preferência das

moléculas da água de difundirem-se ao longo dos axônios em vez de cruzá-los, permitindo

diagnosticar o comprometimento do axônio no Sistema Nervoso Central. A estimulação

magnética transcraniana avalia a integridade neurofisiológica da via cortico-espinhal. A

estimativa do número de unidades motoras (ENUM) quantifica o número de neurônios

motores inervando um músculo.

Quantitative objective markers for upper and lower motor neuron dysfunction in

ALS. Mitsumoto H et al. Neurology, 68: 1402, 2007.

Mitsumoto e col estudaram prospectivamente 66 pacientes com doenças do

neurônio motor (43 com ELA, 9 com AMP, 6 com ELP e 6 com ELA familiar) com a

finalidade de determinar marcadores de envolvimento do primeiro e do segundo neurônio

motor. Para avaliar o primeiro neurônio motor, foram utilizados espectroscopia de prótons

do encéfalo, imagens por tensão de difusão e estimulação magnética transcraniana. Para

avaliar o segundo neurônio motor, utilizou-se a estimativa do número de unidades motoras

(ENUM) através da técnica de estimulação em múltiplos pontos.

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Os pacientes com ELA cumpriam os critérios do El Escorial. Indivíduos normais

eram utilizados como controles. Todos eram submetidos à avaliação clínica (força

muscular, finger tapping, foot tapping, medida da capacidade vital forçada e ALS-

functional rating Scale-Revised).

A duração média de doença era 34,8 meses indicando que uma progressão

substancial da doença já podia ter ocorrido em alguns pacientes. Os pacientes foram

avaliados a cada 3 meses; todos tinham pelo menos uma segunda visita.

Nos pacientes com ELA havia redução na concentração de NAA no giro pré-central

de 11% e na razão de NAA⁄creatina de 24% comparados com controles (p=0,009 e

p=<0,0005, respectivamente). Quando analisados todos os indivíduos com

comprometimento do primeiro neurônio motor, a redução de NAA foi de 8% em relação

aos controles. A redução da razão de NAA⁄creatina nos portadores de ELP foi de 20% em

relação aos controles (p=0,001).

No estudo de imagens de tensão por difusão, foram utilizados dois parâmetros para

detectar anormalidades no trato cortico-espinhal (coeficiente de difusão e anisotropia). Os

valores de anisotropia medidos no braço posterior da cápsula interna estiveram reduzidos

nos indivíduos com ELA-f.

O tempo de condução motora central para o tibial anterior estava aumentado em

todos os pacientes com ELA (24ms, média), ELA-f (23ms, média) e DNM com

comprometimento do primeiro neurônio quando comparado com o de controles (13ms,

média).

A ENUM estava reduzida nos indivíduos com AMP (29; p<0.0005), com ELA

(76), com ELA-f (80) e com ELP (174) do que o de controles (267). A média de ENUM

estava maior nos pacientes com ELP do que nos de ELA.

Todos esses marcadores correlacionavam com a avaliação clínica. Os marcadores

clínicos de disfunção do primeiro neurônio, finger-tapping e foot-tapping, correlacionavam

com NAA e com o tempo de condução motora central. A ENUM correlacionou com a

CVF e força muscular manual.

As medidas clínicas pioravam com o tempo. Entretanto, os marcadores de imagem

(NAA, NAA/creatina, imagem por tensão de difusão) não modificavam significativamente.

Já a ENUM e o tempo de condução motora central, modificavam com o tempo.

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Na discussão os autores discutem a importância das novas técnicas de

neuroimagem, especialmente utilizando equipamentos de RNM de alto campo, como

marcadores quantitativos nos portadores de ELA.

As técnicas neurofisiológicas mereceram destaque. A ENUM, marcador de

envolvimento do segundo neurônio motor, estava diminuída em todos os grupos de doença.

Entre os outros marcadores, a ENUM foi a que mais consistentemente correlacionou com

os achados clínicos (força muscular manual e a CVF, influenciados primariamente pelo

segundo neurônio motor). A redução na ENUM foi também detectada nos portadores de

ELP, porém menos acentuada do que na ELA. É necessário estudos para tentar diferenciar

ELP dos portadores de ELA que iniciam com sinais de primeiro neurônio motor. No

estudo, demonstrou-se a alta sensibilidade da ENUM em detectar a redução do segundo

neurônio motor com o tempo.

Nesse estudo, a estimulação magnética transcraniana foi capaz de detectar

prolongamento do tempo de condução central em 81% dos pacientes com sinais de

envolvimento do primeiro neurônio motor. Houve correlação dos marcadores de disfunção

do primeiro neurônio motor, NAA e tempo de condução motora central, com as medidas

clínicas (finger tapping e foot tappin).

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MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES Dra. Márcia Cruz

Mitochondrial neurogastrointestinal encephalomyopathy in three siblings. Schüpbach

WMMK et al. J Neurol, 254: 146, 2007.

Trata-se de um relato muito rico das características clínicas, genéticas e neuroradiológicas

(incluindo espectroscopia) de 3 irmãos acometidos por esta mitocondriopatia que afeta o

cérebro causando leucoencefalopatia, os nervos periféricos gerando polineuropatia, além

de miopatia caracterizada principalmente por ptose palpebral, oftalmoplegia , e

compromete ainda o sistema gastrintestinal levando a quadros importantes e graves de

pseudo obstrução intestinal

É conhecida pela sigla MNGIE e pela multiplicidade de acometimento dos sistemas

nervosos: central e periférico faz diagnóstico diferencial com inúmeras patologias entre

elas: as leucodistrofias; outras miopatias mitocondriais como a síndrome de Kearns- Sayre

e a CEPO; além de diversas polineuropatias com componente disautonômico e a miastenia

gravis devido ao comprometimento da musculatura extraocular.

A discussão deste artigo é na verdade uma revisão da literatura que pode atualizar o leitor

com respeito a esta patologia.

A mutação geradora desta afecção está no gene da timidina fosforilase, que gera redução

da atividade da enzima timidina fosforilase e aumento da timidina no plasma e urina. A

disfunção mitocondrial decorre do excesso de deoxitimidina trifosfato. É portanto, uma

mitocondriopatia por mutação no DNA nuclear e não no DNA mitocondrial com herança

autossômica recessiva.

Myopathy associated with gluten sensibility. Hadjivassiliou M et al. Muscle & Nerve,

35: 443, 2007.

É apresentada a experiência dos autores com 13 casos cujo diagnóstico de sensibilidade ao

glúten foi determinado após início da miopatia. Alguns destes pacientes também

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apresentaram o quadro clássico de polineuropatia e ataxia que costumam estar associados à

sensibilidade ao glúten. Miopatia inflamatória foi o achado mais comum nos estudos

histopatológicos, e um dos pacientes tinha achados sugestivos de miosite por corpos de

inclusão. A faixa etária em geral foi superior ao 50 anos, que coincide com a faixa etária

dos casos de miosite por corpos de inclusão.

O autores compararam ainda um grupo de 6 pacientes que receberam tratamento

imunossupressor associado a dieta apropriada, a outro de 7 pacientes que permaneceram

apenas com a dieta livre do glúten. Houve melhora em ambos os grupos ficando a sugestão

de que a sensibilidade ao glúten possa causar miopatia imunomediada e que a intervenção

dietética seja capaz de levar à melhora independente do tratamento imunossupressor.