artigo - túllio victorino

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Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino. Uma proposta de ação educativa no museu Casa Atelier Túllio Victorino Felipe Aristimuño 1 Andreia Marques 2 Resumo Apresentamos neste artigo reflexões acerca dos processos de desenvolvimento dos recursos pedagógicos interativos elaborados para a ação educativa “Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino ”, no Museu Casa Atelier Túllio Victorino, em Cernache do Bonjardim, Portugal. Nossa investigação/ação insere-se no projeto de residências Artísticas Ré-Vés, da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. A partir do objetivo geral da residência Rés- Vés em Cernache do Bonjardim, de gerar conexões entre o espaço do museu e a comunidade, desenhamos um projeto de ações educativas que abrangesse atividades presenciais e online, incluindo workshops, a criação de um aplicativo para plataforma Android e um blog. Nosso público-alvo são alunos dos ciclos finais do Ensino Básico. Apontaremos as bases conceituais da nossa proposta pedagógica, revelando como pretendemos, especificamente, desenvolver competências visuais que envolvam entender, produzir e propagar imagens, observando o nosso poder enquanto produtores de sentidos e construtores de identidades nas mídias pós-massivas. Desta forma, a obra de Túllio Victorino não é conteúdo exclusivo da nossa investigação, mas ponto de partida para a exploração de diversas obras da cultura visual que compartilhem seus temas e preocupações, incluindo nossas próprias produções. Identificaremos, também, as tecnologias utilizadas para a concretização do aplicativo e do blog (Adobe Air, Flash e Blogger), bem como as vantagens e desvantagens das ferramentas escolhidas, demonstrando e refletindo acerca dos resultados alcançados. Palavras-chave: Educação artística, ação educativa em artes visuais, cultura visual, identidade 1. Introdução Pensaremos neste artigo acerca dos processos de desenvolvimento dos recursos pedagógicos interativos elaborados para a ação educativa “Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino ”, no Museu Casa Atelier Túllio Victorino em Cernache do Bonjardim, Portugal. Essa ação, posta em prática em julho de 2015, insere-se no projeto de residências Artísticas Ré-Vés, da Faculdade de Belas-Artes da 1 Doutorando em Educação Artística pela Faculdade de Belas-Artes/ULisboa e Mestre em Ensino de Artes Visuais pelo Instituto de Educação/ULisboa – [email protected] 2 Mestranda em Educação Artística e Licenciada em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes/ULisboa - [email protected]

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Page 1: Artigo - Túllio Victorino

Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino. Uma proposta de ação educativa no museu Casa Atelier Túllio Victorino

Felipe Aristimuño1 Andreia Marques2

ResumoApresentamos neste artigo reflexões acerca dos processos de desenvolvimento dos recursos pedagógicos interativos elaborados para a ação educativa “Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino”, no Museu Casa Atelier Túllio Victorino, em Cernache do Bonjardim, Portugal. Nossa investigação/ação insere-se no projeto de residências Artísticas Ré-Vés, da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. A partir do objetivo geral da residência Rés-Vés em Cernache do Bonjardim, de gerar conexões entre o espaço do museu e a comunidade, desenhamos um projeto de ações educativas que abrangesse atividades presenciais e online, incluindo workshops, a criação de um aplicativo para plataforma Android e um blog. Nosso público-alvo são alunos dos ciclos finais do Ensino Básico. Apontaremos as bases conceituais da nossa proposta pedagógica, revelando como pretendemos, especificamente, desenvolver competências visuais que envolvam entender, produzir e propagar imagens, observando o nosso poder enquanto produtores de sentidos e construtores de identidades nas mídias pós-massivas. Desta forma, a obra de Túllio Victorino não é conteúdo exclusivo da nossa investigação, mas ponto de partida para a exploração de diversas obras da cultura visual que compartilhem seus temas e preocupações, incluindo nossas próprias produções. Identificaremos, também, as tecnologias utilizadas para a concretização do aplicativo e do blog (Adobe Air, Flash e Blogger), bem como as vantagens e desvantagens das ferramentas escolhidas, demonstrando e refletindo acerca dos resultados alcançados.

Palavras-chave: Educação artística, ação educativa em artes visuais, cultura visual, identidade

1. Introdução

Pensaremos neste artigo acerca dos processos de desenvolvimento dos recursos pedagógicos interativos elaborados para a ação educativa “Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino”, no Museu Casa Atelier Túllio Victorino em Cernache do Bonjardim, Portugal. Essa ação, posta em prática em julho de 2015, insere-se no projeto de residências Artísticas Ré-Vés, da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. A partir do objetivo geral da residência Rés-Vés em Cernache do Bonjardim, de gerar conexões entre o espaço do museu e a comunidade, desenhamos um projeto de ações educativas que abrangesse atividades presenciais e online, incluindo workshops, a criação de um aplicativo para plataforma Android e um blog. Nosso público-alvo foram os alunos dos ciclos finais do ensino básico (equivalente ao segundo segmento do ensino fundamental no Brasil), provenientes do Instituto Vaz Serra, a principal escola particular da região.

Partindo do contato que tivemos com o museu e seu acervo durante a primeira fase da residência artística Rés-Vés, em março de 2015, refletiremos acerca dos conceitos que serviram de base à nossa proposta de desenvolvimento de materiais pedagógicos e a ação educativa, observando abordagens pedagógicos que

1 Doutorando em Educação Artística pela Faculdade de Belas-Artes/ULisboa e Mestre em Ensino de Artes Visuais

pelo Instituto de Educação/ULisboa – [email protected] Mestranda em Educação Artística e Licenciada em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes/ULisboa -

[email protected]

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consideramos pertinentes aos objetivos de descoberta e contextualização da obra de Túllio Victorino. Neste sentido, analisaremos o conceito de “educação artística multicultural”, de Efland, Freedman e Stuhr (1006/2003), a “proposta triangular” de Ana Mae Barbosa (1998, 2001) e o currículo Placenta de Maria Acaso (2009). Pretendemos, a partir da observação crítica dessas diferentes abordagens, apresentar as bases conceituais para o desenho do nosso plano de ação, refletindo acerca dos motivos pedagógicos e técnicos que nos levaram a escolher procedimentos, linguagens e tecnologias utilizadas na construção e realização deste projeto.

2. O projeto Rés-Vés da FBAUL

“Rés-vés é o nome que da vida ao ciclo de residências artísticas da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. Um projeto que tem como principal propósito estabelecer uma relação entre o valor e o reconhecimento de diferentes locais, pessoas ou tradições e a promoção de diversas metodologias e práticas de ensino artístico.” (BENTO, 2014)

O projeto Rés-Vés consiste, então, na organização de residências artísticas em regiões centenárias e quase esquecidas do interior de Portugal, levando estudantes da graduação e da pós graduação da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa a desenvolverem projetos artísticos e de investigação que se relacionem e interajam com a realidade material, histórica e humana do local de intervenção. Por seu caráter transdisciplinar, o projeto reúne participantes com propostas que vão do campo das poéticas visuais (artistas), educação artística (educadores), filosofia e história da arte (teóricos).

Nossa proposta de ação educativa insere-se na terceira edição do RésVés, nas cidades de Sertã e Cernache do Bonjardim. O objetivo dessa edição foi recuperar, dinamizar e divulgar o Museu Casa Atelier Túllio Victorino, um espaço cultural dedicado ao artista homônimo, natural de Cernache do Bonjardim, que foi sendo esquecido no tempo. Sob a supervisão da professora Marta Castelo, nosso trabalho realizou-se durante duas semanas alternadas, uma em março, quando tivemos o primeiro contato com o museu e traçamos as primeiras hipóteses para nossa ação, e outra em julho de 2015, quando desenvolvemos os workshops e apresentamos os materiais destinados a estudantes do ensino básico do Instituto Vaz Serra.

3. Traçando objetivos

Observando as necessidades do museu Casa Atelier Túllio Victorino, percebemos que, entre outras carências, a instituição não possuía qualquer presença online. Apesar do museu ter abrigado um ponto de acesso à Internet para jovens (iniciado em 2008 e descontinuado atualmente), não existe atualmente qualquer atividade que leve o acervo para a Rede, a não ser uma breve descrição na página Web do Município da Sertã. Além disso, a Casa não possui materiais informativos ou educativos, nem possui recursos humanos e financeiros para produzi-los. Neste sentido, traçamos como objetivo primeiro do nosso projeto gerar uma presença online significativa para o museu. Tendo em vista a carência de recursos, optamos por utilizar a plataforma do Blogger, que é gratuita e permite diversas interações. Pensamos, também, em fazer materiais interativos (aplicações para dispositivos móveis), uma vez que essas podem ser armazenadas em espaços gratuitos, como o Blogger e Google Drive, ficando disponíveis para outros educadores que os queiram aproveitar em outras ocasiões.

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3.1 Objetivos cognitivos: competências visuais

Para além dos já descritos objetivos gerais de criar a presença online, aproveitar o espaço do museu e propor atividades que apresentem as obras de Túllio Victorino para estudantes dos ciclos finais do ensino básico do Instituto Vaz Serra, consideramos indispensável gerar diálogos que produzam sentidos e desenvolvam competências visuais para todos os participantes (professores e alunos). Por isso, a partir do conceito de visual literacy (Elkins, 2003: 128), aqui interpretado como competências visuais, pensamos acerca do que pretendemos alcançar, do ponto de vista cognitivo, com esta proposta de ação educativa e criação de materiais didáticos.

Observando o conceito de competências visuais de Elkins (2003) e nossas vivências enquanto docentes de artes, listamos algumas competência visuais que pretendemos desenvolver através deste projeto:

1) Habilidades interpretativas a partir da relação de imagens: considerando que as competências visuais relacionam-se mais com a interpretação de imagens do que com apenas conhecê-las, propomos, em nosso blog e na aplicação interativa, a confrontação de diversas imagens da cultura visual para pensarmos os temas trabalhados por Túllio Victorino em sua obra; 2) Capacidade de entendimento crítico da função social e efeitos das práticas visuais: acreditamos ser fundamental fomentar o pensamento crítico acerca de como as nossas identidades podem ser construídas por repetidos encontro com imagens da cultura visual, sejam elas da história da arte ou de anúncios publicitários. O pensamento crítico pode nos levar a perceber a arte como forma de transformar as relações sociais, como uma ferramenta política; 3) Criação e expressão pelas artes visuais: pensamos que estudar as imagens não é o suficiente para entendê-las. Na medida em que os estudos visuais evoluem, como afirma Elkins, são consideradas diversas maneiras de trazer a produção de imagens para a sala de aula, emergindo ideias não replicáveis em aulas onde imagens não são produzidas (ELKINS, 2003: 158).

4. Bases metodológicas, modelos e conceitos para pensar a nossa planificação curricular

Existem diversas propostas pedagógicas contemporâneas desenvolvidas especificamente para ações educativas em museus, como o Visual Thinking Strategy (HOUSEN, 2015), desenvolvido para o MoMa de Nova Iorque, ou a proposta triangular de Ana Mae Barbosa, desenvolvida para o Museu de Arte contemporânea da USP (BARBOSA, 1998). Entretanto, entendendo a pedagogia como algo irrepetível, que não se pode copiar, vender ou intercambiar (ACASO, 2009: 202), não pretendemos escolher um método de ensino e reproduzi-lo em nosso plano para esta ação educativa. Queremos desenvolver uma nova proposta, cruzando e re-significando abordagens pedagógicas que consideremos pertinentes para a nossa realidade específica. Para isso, observamos algumas propostas curriculares contemporâneas (educação artística multicultural, currículo placenta e proposta triangular) e as relacionamos com as particularidades do Museu Casa Atelier Túllio Victorino, com o acervo a ser explorado, os objetivos específicos traçados, o perfil dos alunos participantes, a região onde nos inserimos etc.

4.1 Multiculturalidade e reciclagem

Observando a obra de Túllio Victorino, representada aqui pela pintura “casaquinho

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da bisavó” (figura 1), de 1930, podemos pensar que o artista não comungou, pelo menos no desenvolvimento da sua linguagem formal, das rupturas propostas pelas vanguardas presentes nos grandes centros europeus. Na obra percebemos uma valorização da tradição da representação, dos cânones do desenho e da composição, conectando-se a artistas acadêmicos da época, como Bordalo Pinheiro e José Malhoa. A educação artística multicultural (que questiona o progressismo na arte) não irá desvalorizar o trabalho “desconectado” de Túllio Victorino, mas buscará meios de o interpretar. Propomos, neste sentido, a conexão com a história da arte pelas relações iconográficas possíveis com a temática abordada pelo artista. Observando a obra de Picasso, menina em frente ao espelho, bem como outras obras da cultura visual (figura 2), podemos pensar na representação da mulher (identidade feminina) e da presença do espelho como metáfora para a pintura/representação. Neste sentido, pensando acerca da proposta da educação multicultural (EFLAND etal, 2003: 126), julgamos que não caiba a nós professores de arte dizer se a obra de Túllio Victorino enquadra-se ou não nas prateleiras da História da arte. Ao invés disso, nosso papel será o de fomentar o pensamento acerca da arte como uma forma de produção cultural destinada a criar símbolos de realidade comum, relacionando e criticando toda a produção criativa, independentemente das fronteiras entre “popular” e “erudito”. Pretendemos que todos, professores, estudantes e comunidade, utilizem argumentos relacionados com a desconstrução (de cânones da arte, de rótulos etc) para mostras que não há pontos de vista privilegiados, uma vez que o objetivo da educação artística multicultural é melhorar e aprofundar nosso entendimento do panorama social e cultural.

Figura 1:Túllio Victorino. O Casaquinho da Bisavó, Portugal, 1930Óleo s/ Tela. Cortesia do museu Casa Atelier Túllio Victorino

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Figura 2:Detalhe de obras da cultura visual com o tema da mulher diante do espelhoAutoria própria a partir de pesquisas online

O conceito de “reciclagem” metodológica (Efland etal, 2003: 126) na educação artística pós-moderna sugere-nos que existe a possibilidade de mesclar métodos e linguagens do passado com novas propostas, re-significando procedimentos consoante a realidade a ser experimentada. Tendo esse conceito em mente, utilizamos a linguagem dos memes da Internet como base da construção dos nossos materiais pedagógicos (figura 3). Essa escolha justifica-se pelo fato dos memes serem obras visuais que se criam a partir da reciclagem constante de imagens da cultura visual. Além disso, esse modo de expressão contemporâneo faz parte do dia-a-dia da cultura adolescente, como já apontamos em investigações anteriores (Aristimuño 2013, 2014).

Figura 3: Captura de tela da aplicação, utilização dosmemes GrumpyCat e Alice / Autoria própria

A partir dos conceitos de resíduos e reciclagem na cultura contemporânea, a proposta curricular Placenta de Maria Acaso (2009: 175) traz o conceito do “descartável”, uma vez que a metáfora da placenta apresenta a educação como uma matéria vital para o surgimento e desenvolvimento inicial da vida, mas inútil (e descartada) após o “parto”. O currículo, na concepção de Acaso (2009: 181), não é a realidade, mas uma representação/interpretação criativa construída pelo professor. Por isso, nenhum plano curricular possui a verdade absoluta, e a ideia de contexto é potencializada: as noções de verdade variam segundo o tempo, o local e os indivíduos. O ponto que consideramos o principal da proposta curricular placenta de Maria Acaso é o manifesto docente (2009:192). A transparência, conseguida

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quando o professor manifesta-se e revela suas escolhas e fontes, é descrita por Acaso como fundamental para uma educação ética. nossas referências, pensamentos e razões para a construção curricular dos nossos materiais pedagógicos.

Ana Mae Barbosa desenvolveu sua metodologia de ensino de artes visuais, a proposta triangular, no Museu de Arte contemporânea da USP durante os anos de 1987 e 1989 (BARBOSA, 1998). Tendo sido desenvolvida em um museu, esta abordagem pedagógica atende aos principais desafios dos educadores de museu: planejar atividades que se enquadrem a diversos contextos de obras e públicos. Como afirma Barbosa, “qualquer conteúdo, de qualquer natureza visual e estética pode ser explorado, interpretado e executado através da proposta triangular” (BARBOSA, 1998: 9). Em nosso caso, também não tivemos contato com os estudantes antes da planificação, possuindo apenas um perfil geral dos alunos (região de origem, idade e ano de escolaridade). Por isso optamos pela proposta de Ana Mae Barbosa e utilizamos a tríade “ver, contextualizar e criar” para traçar os nossos objetivos, bem como as etapas gerais de desenvolvimento das atividades e dos materiais interativos.

5. Visão geral do plano de ação

Resumidamente, nosso projeto consistiu no desenvolvimento de um workshop e dois materiais digitais para disponibilização online, um blog e uma aplicação para tablets e smartphones Android. O objectivo geral do workshop (e dos materiais interativos) foi “ver, contextualizar e criar” a partir da obra de Túllio Victorino. Neste sentido, desenvolvemos o plano de ação para organizar e documentar o que pretendíamos realizar em nossa proposta em dois planos distintos: um geral para toda a atividade, onde definimos nossas escolhas metodológicas e pedagógicas, objetivos e metodologias, e um plano específico para o desenvolvimento do aplicativo. O blog foi desenvolvido sem uma planificação estruturada, porque pensamos em realizá-lo em conjunto com os participantes, durante as atividades presenciais, por meio do aplicativo Blogger instalado nos telemóveis.

A tecnologia adotada para o desenvolvimento da aplicação foi o Adobe Flash e Adobe Air for Android CS6. Essas ferramentas permitem que projetos interativos desenvolvidos em Flash/ActionScript3 sejam convertidos em aplicações compatíveis com tablets e smartphones Android. Apresar desses softwares não serem gratuitos (utilizamos os softwares licenciados pela nossa universidade), é possível criar aplicações que podem ser publicadas e descarregadas gratuitamente. A linguagem de programação ActionScript 3 permite uma imensa variedade de ações e interações, incluindo as que aproveitam as funcionalidades dos dispositivos móveis, como geo-localização, mapas e multi-touch. Como ainda não dominamos completamente essa linguagem, utilizamos os recurso básicos de Drag and Drop para crir o jogo interativo com partes da obra de Túllio Victorino, e o Snapshot para permitir que os alunos gravem e compartilharem suas montagens. Inserimos também um vídeo que criamos a partir da linguagem dos memes.

Assim, dividimos a aplicação em 6 ecrãs, sendo eles: 1) menu geral com o título da aplicação e os botões de navegação; 2) ecrã introdutório (o ver), com o vídeo “Descobrindo o mundo da arte com Alice e Grumpy Cat”; 3) ecrã para exploração da obra “Casaquinho da bisavó” (o criar); 4) ecrã para o enquadramento e relação entre obras que compartilhem temáticas com a obra de Túllio Victorino (o contextualizar); 5) ecrã para exploração da obra “O rancho das azeitonas”; 6) ecrã para enquadramento da obra “O rancho das azeitonas”.

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Para iniciar a exploração dos temas dessas obras de Túllio Victorino, resolvemos desenvolver um vídeo para integrar o aplicativo. Observando a linguagem adolescente contemporânea e o conceito de reciclagem da educação artística multicultural (Efland etal, 2003), optamos pela reapropriação de imagens da Internet, utilizando personagens de médias sociais conhecidos como "memes". Escolhemos, então, os memes "Grumpy Cat" e “Alice” (figura 3). Todos os cenários, elementos gráficos, músicas e efeitos sonoros foram retirados de buscas na Internet. Tivemos o cuidado de certificarmo-nos de que as músicas possuíssem licenciamento Creative Commons (direitos autorais liberados), utilizando repositórios especializados no armazenamento e compartilhamento deste tipo de conteúdo, como o www.freesound.org. O argumento do vídeo baseia-se no romance infantil de Lewis Carrol (1895/2005), Alice No País do Espelho. Em nossa história, Alice e o gato acabam entrando no espelho e descobrem um mundo ao revés: o mundo das imagens da arte. Neste mundo, os dois personagens descobrem que os temas utilizados por Túllio Victorino em suas obras é recorrente em diversos momentos da história da cultura e da arte, levantando a hipótese de que a arte talvez funcione como um espelho para o mundo. Utilizamos ferramentas profissionais, como o PhotoShop, After Effects CS6 e o Final Cut para a montagem final do vídeo.

Como não dispomos de tablets para todos os participantes do workshop, projetamos em data-show as atividades e distribuímos um cartão contendo o endereço do blog (com o link para a aplicação, o vídeo e mais informações) (MARQUES e ARISTIMUÑO, 2015). Como já referimos, o blog teve sua construção continuada durante as atividades presenciais, com as postagens sendo feitas durante a criação dos alunos por meio da aplicação Blogger. Essa aplicação permite que possamos tirar fotografias, fazer vídeos e escrever textos e publicá-los no blog em tempo real a partir do telemóvel.

6. Conclusão e Avaliação das atividades

A partir da primeira visita que fizemos ao museu em abril, percebemos que a Casa Atelier Túllio Victorino adotou e vem utilizando um sistema de exposições tradicional, com a simples mostra de obras sem nenhuma atividade paralela de dinamização educativa. Essa prática resultou na redução do público que frequenta o museu, principalmente dos jovens. Com base nesse distanciamento, e pensando em estratégias para contribuir para a solução do problema, desenvolvemos este projeto de ação educativa. Como percebemos que quem pode resolver realmente o problema são os atores locais, pensamos que este projeto tem uma utilidade como primeira motivação para, caso haja interesse da comunidade, que professores da região desenvolvam novos projetos educativos a partir do museu.

Em nosso plano inicial queríamos ter a participação de 60 alunos. Como a ação foi realizada em julho, período de férias escolares, tivemos apenas 24 participantes divididos em dois grupos. Acreditamos que o número reduzido de participantes não prejudicou o alcance da nossa proposta, uma vez que os materiais seguem online e poderão ser reutilizados (ou reciclados), seja por grupos ou por indivíduos.

O aplicativo, o vídeo e o blog tiveram uma excelente recepção e aceitação por parte dos alunos. Como utilizamos imagens da cultura visual, como o "selfie" ao lado de obras da história da arte, como a menina diante do espelho de Picasso, criamos uma aproximação entre as imagens do campo das artes visuais e as da cultura adolescente contemporânea, o que gerou muito interesse e motivação. Os dois personagens da história no vídeo, o Grumpy Cat e a Alice, também foram logo reconhecidos. Percebemos que essa aproximação dos jovens com os memes

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facilitou muito o desenvolvimento da atividade.

Referências

ACASO, M. (2009). La educación artística no son manualidades. Madrid: UCM, 2009

ARISTIMUÑO, F. (2013). ‘Os memes na representação de identidades adolescentes: Uma proposta de pensamento acerca do “eu” em uma aula de arte’. Revista Matéria Prima: Práticas Artísticas no Ensino Básico e Secundário, Universidade de Lisboa, v.1, n. 2, p. 80-88, julho/dezembro. 2013_________ (2014). ‘O meme como expressão popular no ensino de arte: Alguns pensamentos e conceitos base do projeto de pesquisa EVMS’. Art& (CAPES/Qualis B3), São Paulo v.15 Nov. 2014.

BARBOSA, A. M. (1991). A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Editora Perspectiva._________ (1998). Tópicos utópicos. Belo Horizonte: Ed. C/Arte, 1998.

BENTO, B. (2014). Rés-Vés. Ciclo de residências artísticas transdisciplinares da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL). (consult. 2015-08-05), Disponível em <URL: http://prototipolisboa.fba.ul.pt/resves> EFLAND A, FREEDMAN K, STUHR P (1996/2003). La educación en el arte posmoderno. Trad. Lucas Vermal. Barcelona: Paidos.

ELKINS, J. (2003). Visual studies: a skeptical introduction / James Elkins. - New York : Routlege

HOUSEN, A. (2007). ‘Art Viewing and Aesthetic Development: Designing for the Viewer’ in From Periphery to Center. Art Museum Education in The 21st Century. Reston: Pat Villeneuve, Editor. (consult. 2015-06-05), Disponível em <URL: http://www.vtshome.org/research/articles-other-readings>

LYOTARD, J. F. (1987/1991). La condición postmoderna - Informe sobre el saber. Trad. Mariano Antolín Rato. 2. Ed. Madrid: Cátedra

MARQUES, A. e ARISTIMUÑO, F. (2015). Descobrindo o nosso olhar na obra de Túllio Victorino (Blog). (consult. 2015-08-05), Disponível em <URL: criatividade2015.blogspot.pt>