artigo jiane jogo1

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0 A Importância do Lúdico na Alfabetização Infantil Jiane Martins Soares 1 RESUMO Este artigo tem como objetivo analisar as contribuições do lúdico no trabalho com a alfabetização sob a luz da psicologia educacional. A relevância do lúdico no desenvolvimento da criança tem sido demonstrada por inúmeros autores que atestam a sua importância já que proporciona muitas maneiras de levar a criança a aprender de forma motivada e significativa. Tendo como base uma pesquisa bibliográfica, onde autores como: Piaget (1978), Vygotsky (1984) e Antunes (1998) entre outros que apresentam estudos importantes sobre esta temática, este trabalho proporciona uma leitura significativa sobre a utilização dos jogos na educação. Em seu teor é possível fazer uma breve caminhada histórica sobre a inclusão do jogo no campo educacional, além de saber sobre algumas contribuições científicas deste recurso imprescindível no campo da alfabetização. Os resultados evidenciam o jogo e a brincadeira, pois fazem parte do processo de formação do ser humano, e, portanto, não podem ser excluídos como instrumentos didáticos no campo escolar, principalmente no período de alfabetização. Enfatiza também a necessidade do professor ter competência para utilizar o jogo, onde o planejamento e a base teórica não podem faltar ao utilizar o lúdico como recurso de ensino e aprendizagem. Palavras-chave: Lúdico. Alfabetização. Educação. Aprendizagem. 1 - INTRODUÇÃO O processo de alfabetização da criança no campo escolar ainda merece algumas reflexões, já que os avanços no ensino da leitura e da escrita inseridos no ambiente escolar estão longe de serem considerados excelentes. Caminhou-se bastante, porém, é preciso ir mais longe. A alfabetização tem sido alvo de muitas discussões no mundo atual, isto porque apesar do reconhecimento desse direito cidadão e das muitas medidas que vêm sendo tomadas para garanti-lo, ainda existem elevados índices de evasão e repetência escolar. Portanto, construir um espaço, meios e tempo para que os educandos se alfabetizem através de atividades que lhes propiciem diferentes maneiras de alcançar o aprendizado da leitura e escrita é um compromisso, considerando que em 1 Licenciatura Plena em Pedagogia com habilitação em docência de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental e Administração Educacional pelo Instituto de Ensino Superior do Amapá - IESAP; Pós- graduação em Psicopedagogia Institucional pela Faculdade Meta de Macapá.

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Artigo sobre a utilização dos jogos na educação infantil e alfabetização!!!

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    A Importncia do Ldico na Alfabetizao Infantil

    Jiane Martins Soares1

    RESUMO

    Este artigo tem como objetivo analisar as contribuies do ldico no trabalho com a alfabetizao sob a luz da psicologia educacional. A relevncia do ldico no desenvolvimento da criana tem sido demonstrada por inmeros autores que atestam a sua importncia j que proporciona muitas maneiras de levar a criana a aprender de forma motivada e significativa. Tendo como base uma pesquisa bibliogrfica, onde autores como: Piaget (1978), Vygotsky (1984) e Antunes (1998) entre outros que apresentam estudos importantes sobre esta temtica, este trabalho proporciona uma leitura significativa sobre a utilizao dos jogos na educao. Em seu teor possvel fazer uma breve caminhada histrica sobre a incluso do jogo no campo educacional, alm de saber sobre algumas contribuies cientficas deste recurso imprescindvel no campo da alfabetizao. Os resultados evidenciam o jogo e a brincadeira, pois fazem parte do processo de formao do ser humano, e, portanto, no podem ser excludos como instrumentos didticos no campo escolar, principalmente no perodo de alfabetizao. Enfatiza tambm a necessidade do professor ter competncia para utilizar o jogo, onde o planejamento e a base terica no podem faltar ao utilizar o ldico como recurso de ensino e aprendizagem.

    Palavras-chave: Ldico. Alfabetizao. Educao. Aprendizagem.

    1 - INTRODUO

    O processo de alfabetizao da criana no campo escolar ainda merece algumas reflexes, j que os avanos no ensino da leitura e da escrita inseridos no ambiente escolar esto longe de serem considerados excelentes. Caminhou-se bastante, porm, preciso ir mais longe. A alfabetizao tem sido alvo de muitas discusses no mundo atual, isto porque apesar do reconhecimento desse direito cidado e das muitas medidas que vm sendo tomadas para garanti-lo, ainda existem elevados ndices de evaso e repetncia escolar. Portanto, construir um espao, meios e tempo para que os educandos se alfabetizem atravs de atividades que lhes propiciem diferentes maneiras de alcanar o aprendizado da leitura e escrita um compromisso, considerando que em

    1 Licenciatura Plena em Pedagogia com habilitao em docncia de 1 a 4 srie do Ensino

    Fundamental e Administrao Educacional pelo Instituto de Ensino Superior do Amap - IESAP; Ps-graduao em Psicopedagogia Institucional pela Faculdade Meta de Macap.

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    nome da educao formal as crianas so monopolizadas cada vez mais cedo para atividades pouco criativas e inteligentes no espao escolar, dificultando-lhes assim, o seu processo de alfabetizao. Ao ponderar a necessidade de uma postura interdisciplinar para entender as causas do no aprendizado da leitura e da escrita, acredita-se que a alfabetizao possa ser construda atravs de atividades que permitam aos alunos comparar e reformular suas hipteses, desenvolver habilidades e interao social. Uma possibilidade pode ser o uso de atividades ldicas como um meio de superao das dificuldades de aprendizagem que possam vir a produzir o fracasso escolar. Diante desta problemtica, este artigo tem como objetivo analisar as contribuies do ldico para a alfabetizao sob a luz das teorias psicolgicas. Para alcanar esta meta, a fundamentao terica deste estudo ir abordar, alm dos conceitos de alfabetizao, o contexto histrico sobre a utilizao do ldico na educao. Alm disso, evidenciam-se as inmeras contribuies de Piaget (1978), Vygotsky (1984) e Antunes (1998) que contriburam de forma relevante para com muitos educadores no trabalho com o ldico na alfabetizao. O papel do professor tambm ser destacado j que este um dos grandes responsveis para que a utilizao do ldico como instrumento didtico seja feito com eficincia e competncia pedaggica.

    1 - CONCEITOS E CARACTERSTICAS DO JOGO

    Ao destacar o jogo como instrumento didtico possvel constatar teoricamente inmeras consideraes e nomeaes a seu respeito, onde se destacam algumas expresses como: jogos, brincadeiras, brinquedo, atividade ldica e esporte. As linhas que separam os jogos, esportes, ginstica, brincadeiras ou danas so muito tnues, servindo mais para uma definio didtica. Na viso de Brotto (2001, p. 12) no existe uma teoria completa do jogo, nem ideias admitidas universalmente, o autor apresenta uma sntese dos principais campos culturais e cientficos onde os jogos so utilizados:

    Sociolgico: influncia do contexto social no quais os diferentes grupos de crianas brincam.

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    Educacional: a contribuio do jogo para a educao; desenvolvimento e/ou aprendizagem da criana.

    Psicolgico: o jogo como meio para compreender melhor o funcionamento da psique, das emoes e da personalidade dos indivduos.

    Antropolgico: a maneira como o jogo reflete, em cada sociedade, os costumes e a histria da diferenas culturais.

    Folclrico: analisa o jogo como expresso da cultura infantil atravs das diversas geraes, bem como as tradies e costumes atravs dos tempos nele refletidos.

    Mediante tais concepes compreende-se que o jogo uma atividade ou ocupao voluntria, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espao, segundo regras livremente consentidas no meio cultural do povo, mas absolutamente obrigatrias dotadas de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentido de tenso e de alegria e de uma conscincia de ser diferente da vida quotidiana. Nesta perspectiva, Brougre (2004, p. 16) complementa que:

    A palavra "jogos" aplica-se mais s crianas e jovens, exclui qualquer atividade profissional, com interesse e tenso e, por isso, vai alm dos jogos competitivos e de regras, podendo contemplar outras atividades de mesma caracterstica como: histrias, dramatizaes, canes, danas e outras manifestaes artsticas.

    Diante disto, percebe-se que o jogo constitui-se numa atividade primria do ser humano. principalmente na criana que se manifesta de maneira espontnea; alivia a tenso interior e permite a educao do comportamento. Sendo assim, verifica-se que o jogo auxilia no desenvolvimento fsico, mental, emocional e social do sujeito. Como forma de referendar a importncia do jogo como um dos componentes imprescindveis da cultura humana, Murcia (2005, p. 9) ressalta que:

    O jogo um fenmeno antropolgico que se deve considerar no estudo do ser humano. uma constante em todas as civilizaes, esteve sempre unido cultura dos povos, a sua histria, ao mgico, ao sagrado, ao amor, a arte, a lngua, a literatura, aos costumes, a guerra. O jogo serviu de vnculo entre povos, um facilitador da comunicao entre os seres humanos.

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    Dentre todas as contribuies ofertadas ao desenvolvimento do ser humano, o jogo possui grande relevncia em funo de viabilizar condies para o aprendizado e entre estas se destaca um aspecto fundamental que a socializao, onde atravs das quais os indivduos constroem seu leque de conhecimentos mediatizadas pelas relaes que estabelecem com o meio. Nas pesquisas de Murcia (2005, p. 11), evidencia-se o jogo como uma atividade natural de todo ser humano, ressalta que: essa palavra est em constante movimento e crescimento, e faz parte de nossa maneira de viver e de pensar; o jogo sinnimo de conduta humana Neste processo necessrio lembrar que desde muito cedo o jogo na vida da criana de fundamental importncia, pois quando ela brinca, explora e manuseia tudo aquilo que est a sua volta, atravs de esforos fsicos e mentais e sem se sentir coagida pelo adulto, comea a ter sentimentos de liberdade e satisfao pelo que faz, dando, portanto, real valor e ateno s atividades vivenciadas naquele instante. Nas pesquisas de Pinto e Lima (2003, p. 5) verifica-se que:

    A brincadeira e o jogo so as melhores maneiras de a criana comunicar-se sendo um instrumento que ela possui para relacionar-se com outras crianas. atravs das atividades ldicas que a criana pode conviver com os diferentes sentimentos que fazem parte da sua realidade interior. Ela ir aos poucos se conhecendo melhor e aceitando a existncia dos outros, estabelecendo suas relaes sociais.

    Como se observa o jogo um estmulo tanto para o desenvolvimento do intelecto da criana quanto para sua relao interpessoal, fundamental para o processo de aprendizagem infantil. Assim sendo, quando jogam ou criam os seus prprios jogos, as crianas tero uma compreenso maior de como o mundo funciona e de como podero lidar com ele sua maneira. Os jogos, portanto, podem ser afirmaes do que est acontecendo, ou representaes do que as crianas entendem. No que consiste aos tipos de jogos, importante destacar que so normais s expresses como: jogo tradicional e jogo popular, como se constata nos estudos de Murcia (2005, p. 110):

    O jogo tradicional aquele transmitido de gerao em gerao, quase sempre de forma oral. De pais para filhos e de filhos para netos; de crianas mais velhas para crianas menores. (...) O jogo popular faz referncia ao que procede do povo, por isso se define o jogo popular como aqueles que so praticados pelas massas e no necessariamente so jogos tradicionais, mesmo que com o tempo possam se perpetuar.

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    Na viso deste autor, verifica-se que os jogos podem ser classificados por diferentes nomenclaturas dependendo da sua origem no meio social e cultural do povo. Contudo, o jogo est inserido em diversos contextos e modalidades, onde conforme o mesmo autor, tambm se destaca os jogos folclricos por evidenciarem um leque de manifestaes oriundas da realidade scio-histrica de uma dada sociedade. Quanto utilizao do jogo, este pode ser direcionado a uma clientela bem diversificada e com diferentes idades, as pesquisas de Brougre (2004, p. 13) evidenciam que: O jogo pode ser destinado tanto criana quanto ao adulto: ele no restrito a uma faixa etria. Os objetos ldicos dos adultos so chamados exclusivamente de jogos, definindo-se, assim, pela sua funo ldica. Portanto, os jogos podem ser utilizados por qualquer pessoa. Os jogos em suas diversas fases contriburam sensivelmente com os aspectos formativos dos seres humanos, tendo em vista que na Educao Infantil o mesmo serve como recreao, favorecendo a aprendizagem da leitura e escrita e, ao mesmo tempo, pode ser utilizado como recurso para adequar o ensino s necessidades infantis. Conforme a vasta oportunidade de recursos que envolvem o ldico, no se pode perder de vista o referencial da cultura, que por sua vez, muito importante, pois retrata a histria de um povo e nesse contexto, o jogo tem um elo de ligao com historicidade dos antepassados da humanidade que deixaram um legado de modalidades ldicas que servem como entretenimento e lazer.

    1.2 RESGATANDO A HISTRIA DO JOGO NA EDUCAO

    Ao analisar a histria da educao possvel perceber que a aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras foi incentivada por inmeros tericos que desde os tempos da Grcia antiga j ressaltavam sobre a importncia da atividade ldica no processo de formao da criana. Embora a utilizao de brinquedos e jogos como recurso para o ensino tenha sido empregado somente sculos depois, desde a antiguidade havia quem defendesse a ideia da brincadeira como instrumento de crescimento intelectual da criana. Os jogos destinados ao preparo fsico aparecem entre os romanos com a finalidade de formar soldados e cidados obedientes e devotos. A influncia grega traz s

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    escolas romanas uma nova orientao, acrescentando cultura fsica formao esttica e espiritual. De acordo com Aranha (1996, p. 52):

    Sob a orientao do pedcriba (instrutor fsico), iniciado em corrida, salto, lanamento de disco, de dardo e em luta, as cinco modalidades do pentatlo, competio famosa de jogos. Aprende assim a fortalecer o corpo e a exercer o domnio sobre si prprio, j que a educao fsica nuca se reduz mera destreza corporal, mas vem acompanhada pela orientao moral e esttica.

    Deste modo, verifica-se que a Grcia utilizava-se dos jogos no apenas como recurso de desenvolvimento corporal da populao, mas como uma importante atividade de crescimento moral, auxiliando assim no processo de formao da criana e do jovem. Nos estudos Kishimoto (2003, p. 40) evidenciam que na Idade Mdia com imposio de dogmas pela igreja distanciou-se o desenvolvimento da inteligncia e da arte de pensar pela atividade ldica onde: Neste clima no houve condies para a expanso dos jogos, considerados delituosos, semelhana da prostituio e embriaguez.. Assim, nas pesquisas do autor, os jogos neste perodo foram associados aos jogos de azar, muito utilizado nesta poca. Por outro lado, no se constatou nos registros dos pesquisadores consultados a utilizao de jogos como uma atividade com fins educacionais, mas apenas como uma brincadeira utilizada pela populao sem objetivos pedaggicos. A partir do sculo XVIII fortaleceram as ideias sobre a importncia do ldico na educao. Segundo Oliveira (2002, p. 64) o educador Comnio (1592-1670) defendia que: A explorao do mundo no brincar era vista como uma forma de educao pelos sentidos. Da sua defesa de uma programao bem elaborada, com bons recursos materiais, racionalizao do tempo e do espao escolar. Assim sendo possvel entender que os jogos eram utilizados para estimular os sentidos e com isto fazer com que as crianas pudessem avanar em seu desenvolvimento cognitivo. Importante ressaltar que a influncia de Comnio no campo educacional incentivou o planejamento e a elaborao das aulas com objetivos pr-determinados. Outro importante pesquisador que contribuiu para o incentivo da atividade ldica na educao foi Rousseau (1712-1778), para ele as atividades ldicas deveriam ser aproveitadas no ambiente educacional j que proporcionavam a ideia de liberdade de expresso, utilizao da experincia e a emoo como incentivo aprendizagem.

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    Froebel (1782-1852) tambm utilizou os jogos no campo educacional, alm de ter contribudo tambm com diversos recursos pedaggicos. Com base nesse pressuposto, Kishimoto (1996, p. 42) enfatiza que:

    com Froebel que o jogo entendido como objeto e ao de brincar, passa a fazer parte da histria da educao pr-escolar. Partindo do principio de que, manipulando e brincando com materiais como bola, cubo e cilindro, montando e desmontando cubos a criana estabelece relaes matemticas e adquire noes primrias de Fsica e Metafsicas.

    Portanto, ao criar muitas formas de utilizar o jogo como recurso pedaggico Froebel permitiu a criana ao do brincar e ao mesmo de adquirir conhecimentos intelectuais importantes no espao escolares onde diferentes contedos disciplinares puderam ser compreendidos. Maria Montessouri (1879-1952) que, apesar de mdica, tambm se dedicou ao magistrio e ressaltou de forma ampla e significativa a utilizao do brinquedo como instrumento de aprendizagem. Para Oliveira (2002, p. 74), esta educadora tambm construiu recursos pedaggicos como: letras mveis, letras recortadas em cartes lixa, contadores e diversos outros instrumentos para levar a criana a aprender de forma ldica e prazerosa. Sua proposta levava em conta a valorizao da criana e a adaptao da escola conforme a faixa etria do educando. Destacou-se tambm, na primeira metade do sculo XX, Celestin Freinet (1896-1966) que adaptou sua prtica pedaggica mediante inmeras atividades manuais e intelectuais onde os limites da sala de aula eram extrapolados dando a criana oportunidade de viver experincias no meio social. Oliveira (2002, p. 77) ressalta que, A seu ver, as atividades manuais e intelectuais permitem a formao de uma disciplina pessoal e a criao do trabalho-jogo, que associa atividade e prazer e por ele encarado como eixo central de uma escola popular. Freinet considerou a aquisio do conhecimento como fundamental, mas, essa aquisio deve ser garantida de forma significativa, respeitando-se o livre arbtrio da criana. Seu trabalho envolvendo jogos criava um clima de confiana, dilogo, respeito, tolerncia, compromisso e responsabilidade entre os alunos. De acordo com Paiva (1996), Freinet elaborou sua pedagogia, com tcnicas construdas com base na experimentao e documentao, que do criana instrumentos para aprofundar seu crescimento e desenvolver sua ao. Decroly (1871-1932) tambm valorizou na sua pedagogia, a atividade ldica,

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    transformando os jogos sensoriais e motores em jogos cognitivos, ou de iniciao s atividades intelectuais propriamente ditas. Nele, a ideia-chave o desenvolvimento da relao nas necessidades da criana, no trabalho e, sobretudo, na reflexo. Aranha (1996, p. 145) coloca que:

    Segundo Decroly, as unidades de globalizao, a que ele chama de centros de interesse, devem ser determinadas de acordo com as necessidades primordiais da criana _ alimentao, respirao, asseio, proteo contra as intempries e os perigos, jogo e trabalho em toas as atividades, em todas as matrias, devem girar em torno de tais centros.

    Apesar das crticas que foram tecidas contra a utilizao dos jogos nas escolas, os mesmos contriburam e expandiram-se de todas as formas: jogos para aprendizagens das matemticas, das cincias, portugus, geografia e histria; enfim uma sequncia infindvel de jogos didticos. Sendo assim, ao constatar no passado a utilizao do ldico atravs de importantes educadores, verifica-se que o jogo no esteve presente somente como mais uma atividade pedaggica a ser includa no planejamento escolar, mas como uma ao que mobilizou os profissionais at aqui mencionados, principalmente pelos resultados positivos alcanados e tambm por saberem que o ldico, um recurso de extrema importncia para o desenvolvimento da criana.

    1.3 OS JOGOS NA ALFABETIZAO

    Ao utilizar os jogos no processo de alfabetizao das crianas possvel alcanar inmeras aes que possibilitam uma aprendizagem eficaz, como denotam as pesquisas de Queiroz (2003) o jogo pode ser extremamente interessante como instrumento pedaggico, pois incentiva a interao e desperta o interesse pelo tema estudado, alm de fomentar o prazer e a curiosidade. Os jogos auxiliam e muito na educao integral do indivduo, pois podem dar conta de uma reflexo scio-histrica do movimento humano, oportunizando a criana investigar e problematizar as prticas, advindas das mais diversas manifestaes culturais e presentes no seu cotidiano, tematizando-as para melhor compreenso. Portanto, fundamental tomar conscincia de que o jogo fornece informaes a respeito da criana, suas emoes, a forma de interagir com seus colegas, seu desempenho fsico-motor, seu estgio de desenvolvimento, seu nvel lingustico, sua

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    formao moral. Divertindo-se a criana aprende a se relacionar com os colegas e a descobrir o mundo em sua volta. Aps a divulgao dos Parmetros Curriculares Nacionais2 do Ensino Fundamental na rea de Lngua Portuguesa, destacou-se no mbito educacional uma grande preocupao com as dificuldades de leitura e escrita nas sries iniciais devido ao resultado de um trabalho inadequado com a alfabetizao. A linguagem passou a ser vista como um elemento de comunicao e no, de discriminao. Assim, no mais valorizada uma nica linguagem padro ou culta como elemento de produo oral e escrita. O universo lingustico dos alunos comeou a ser respeitado, j que seus conhecimentos e expresses so anteriores ao ingresso na escola. A utilizao de jogos e textos variados podem se tornar excelentes recursos para facilitar a participao, integrao e comunicao dos alunos que, por certo, tero meios para compreender e expressar-se bem, inclusive na lngua padro, aps o domnio das diferentes linguagens e instrumentos textuais. Neste sentido, o jogo na escola, como coloca Santos (2000, p. 37):

    Ganha espao, como ferramenta ideal da aprendizagem, na medida em que prope estmulo ao interesse do aluno, desenvolve nveis diferentes de sua experincia pessoal e social, ajuda-o a construir novas descobertas, desenvolve e enriquece sua personalidade e simboliza um instrumento pedaggico que leva ao professor a condio de condutor, estimulador e avaliador da aprendizagem.

    Compreende-se desta forma, que o jogo importante e necessrio para o desenvolvimento intelectual e social da criana, estimulando sua criticidade, criatividade e habilidades sociais. Portanto, ao utilizar-se de atividades ldicas o professor propicia ao aluno a oportunidade de interagir-se por meio da Lngua Portuguesa de forma dinmica, interpretando texto, expondo ideias e ou mesmo extrapolando seus conhecimentos para outras reas. Nesse sentido, considera-se que determinados objetivos s podem ser conquistados se os contedos tiverem um tratamento didtico especfico, ou seja, se houver uma estreita relao entre o que e como ensinar. Mais do que isso: parte-se do pressuposto de que a prpria definio dos contedos uma questo didtica que

    2 PCN Parmetros Curriculares Nacionais: proposta lanada a todas as escolas pblicas do Brasil

    pelo Ministrio da Educao atravs de 10 volumes que abrangem as diferentes disciplinas do Ensino Fundamental e Mdio (BRASIL, 1997).

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    tem direta relao com os objetivos colocados, bem como com as propostas curriculares. Muitas propostas pedaggicas para o Ensino Fundamental se baseiam em atividades onde o ldico possa estar presente, de forma constante no ambiente educacional. Tal afirmao baseia-se nos amplos estudos acadmicos que estudiosos apropriam-se ao levantar informaes sobre a psicologia educacional, como tambm em inmeros exemplos satisfatrios que o jogo didtico pode proporcionar ao educando, principalmente no trabalho com a alfabetizao.

    1.4 PERSPECTIVAS PSICOLGICAS SOBRE O JOGO

    Apesar de haver outros profissionais do campo da psicologia da educao que enfatizam a utilizao do jogo como importante instrumento educacional, Piaget, Vygotsky e Antunes foram selecionados devido ao fato de suas pesquisas terem alcanado grande popularidade no campo educacional devido as suas importantes contribuies tericas. Alm disso, contribuem significativamente para com o educador alfabetizador.

    1.4.1 Concepes de Jean Piaget

    Jean Piaget com suas pesquisas proporcionou contribuies significativas para a educao escolar, embora este no fosse seu objetivo primordial. Porm, os reflexos de sua teoria auxiliam no entendimento acerca da criana, em idade escolar ou no. Seguindo uma orientao cognitivista, este pesquisador analisou o jogo integrando-o a vida mental da criana, onde atravs da experincia ldica o educando pode alcanar o seu crescimento intelectual denominando este comportamento como assimilao. Conforme o pensamento de Piaget (1998, p. 35), cada ato de inteligncia definido pelo equilbrio entre duas tendncias: assimilao e acomodao. Na assimilao, o sujeito incorpora eventos, objetos ou situaes dentro de fonemas de pensamento, que constituem as estruturas mentais organizadas. Na acomodao, as estruturas mentais existentes reorganizam-se para incorporar novos aspectos do ambiente externo. Durante o ato da inteligncia, o sujeito adapta-se s exigncias do ambiente externo, enquanto ao mesmo tempo, mantm sua estrutura mental intacta. O

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    brincar, neste caso, indicado pela primazia da assimilao sobre a acomodao. Ou seja, o sujeito assimila eventos e objetos ao seu eu e suas estruturas mentais. Desta forma, entende-se que atravs do jogo a criana compreende as regras (acomodao), pois devidamente orientada pelos educadores e aps esta fase poder atingir o segundo estgio, ou seja, adquirir o conhecimento (assimilao) avanando ento em seu processo de aprendizagem por meio da experincia simblica. Nos estudos de Piaget (1998) possvel verificar a importncia dos estgios do desenvolvimento infantil que so as fases: sensrio-motora, pr-operatria, operatrio-concreta e operatrio-formal. De acordo com este autor, na fase sensrio-motora, que vai do zero at o terceiro ano de idade, o interesse da criana se volta para a explorao sensrio-motora do mundo fsico. Ela adquire nesta fase uma maior autonomia na manipulao dos objetos e na explorao de espaos. Outro marco fundamental deste estgio o desenvolvimento da funo simblica da linguagem. No que consiste ao jogo, neste estgio a criana brinca sozinha, sem utilizao da noo de regras. Assim, ao final ter conseguido atingir uma forma de equilbrio, isto , dever desenvolver recursos pessoais para resolver uma srie de situaes atravs de uma inteligncia explcita, ou sensrio-motora. A fase pr-operatria (dos 2 aos 5 ou 6 anos aproximadamente) a criana estar desenvolvendo ativamente a linguagem, o que lhe dar possibilidades de, alm de se utilizar inteligncia prtica decorrente dos esquemas sensoriais-motores formados na fase anterior, iniciar a capacidade de representar uma coisa por outra, ou seja, formar esquemas simblicos. Isto ser conseguido tanto a partir do uso de um objeto como se fosse outro, de uma situao por outra ou ainda de um objeto, pessoa ou situao por uma palavra. O alcance do pensamento ir aumentar, obviamente, mas lenta e gradualmente, e assim a criana continuar bastante egocntrica e presa s aes. Nesta etapa ela j capaz de adquirir a noo da existncia de regras e comea a jogar com outras crianas jogos de faz de conta, brincadeiras de roda, fantoche etc. Na fase das operaes concretas (dos 7 aos 11 anos aproximadamente), na qual se constata tambm a frequncia escola, ser marcada por grandes aquisies intelectuais. Observa-se nos estudos de Piaget (1998) que neste perodo ocorre um declnio do egocentrismo intelectual e um crescente incremento do pensamento

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    lgico formal. A criana ter um conhecimento real, correto e adequado de objetos e situaes da realidade externa, e poder trabalhar com eles de modo lgico. Nesta importante etapa, as crianas aprendem as regras dos jogos e jogam em grupos. Esta a fase dos jogos de regras como futebol, damas, ludo, amarelinha, domin etc. envolvendo principalmente atividades de cooperao e discusso. Na fase operatrio-formal (dos 12 anos em diante) a inteligncia da criana manifesta progressos notveis, comea a raciocinar logicamente e j capaz de pensar sobre os acontecimentos a sua volta. Na adolescncia que o perodo entre a infncia e idade adulta, caracteriza-se pelo desenvolvimento biolgico, psicolgico e social. Nesta etapa, jogos envolvendo o raciocnio lgico, estratgias e a criticidade tendem a chamar a ateno dos adolescentes. Embora tais estgios enfatizem principalmente a maturao do sistema nervoso e a experincia com objetos concretos, Piaget (1998) em seus estudos ressalta a interao social como condio necessria para o desenvolvimento intelectual. Assim, para que a criana possa se desenvolver fsica e cognitivamente, torna-se importante que ela seja includa em atividades grupais, sendo o jogo neste caso, um significativo instrumento para o seu crescimento. Neste sentido, Piaget (1998, p. 37) ao longo de seus estudos classificou os jogos em trs sucessivos sistemas: de exerccio, simblico e de regras que correspondem s trs fases do desenvolvimento infantil. O jogo de exerccio, que aparece durante os primeiros 18 meses de vida, envolve a repetio de sequncias j estabelecidas de aes e manipulaes, no com propsitos prticos ou instrumentais, mas por mero prazer derivado das mestrias de atividades motoras. Em torno de um ano de idade tais exerccios prticos tornam-se menos numerosos e diminuem em importncia. Esses comeam a se transformar em outras formas: 1) A criana passa a fazer repeties fortuitas e combinaes e aes e de manipulaes; depois define metas para si mesmas e os jogos de exerccios so transformados em construes; 2) Os jogos de exerccios adquirem regras explcitas e, ento se transformam em jogos de regras. Os jogos simblicos surgem no segundo ano de vida da criana com o aparecimento da representao e da linguagem. Segundo Oliveira (1988, p. 47), na teoria piagetiana, a brincadeira de faz de conta inicialmente uma atividade solitria envolvendo a utilizao de smbolos e brincadeiras sociodramticas, j os smbolos coletivos no aparecem seno no terceiro ano de vida. Neta fase o faz de conta

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    precoce envolve elementos que variam com o tempo como: comportamento descontextualizado, como dormir, comer; realizaes com outros, como dar de comer ou fazer dormir; uso de objetos substitutos, como blocos no lugar de bonecas e combinaes sequncias imitando aes que desenvolvem o faz de conta. Com o aparecimento do jogo simblico a criana ultrapassa a simples satisfao da manipulao. Ela vai assimilar a realidade externa ao seu eu, fazendo distores ou transposies. Da mesma forma, o jogo simblico usado para encontrar satisfao fantasiosa por meio de compensao, superao de conflitos, preenchimento de desejos. Quanto mais avana em idade mais caminha para realidade. O terceiro tipo de jogo que Piaget (1998) examina o de regra, que marca a transio da atividade individual para a socializada. Este jogo no ocorre antes de 4 a 7 anos e predomina no perodo de 7 a 12 anos. Este tipo de jogo continua durante toda a vida do indivduo (esportes, trabalho, jogos de xadrez, baralho, etc.). Para este autor, a regra pressupe a interao de dois indivduos e sua funo regular e interar o grupo social. Os jogos de regras so classificados em jogos: sensrio-motor (exemplo: futebol), e intelectual (exemplo: xadrez). O que caracteriza este tipo de jogo a existncia de um conjunto de leis impostas pelo grupo, sendo que seu descumprimento normalmente penalizado, e uma forte competio entre os indivduos. O jogo de regra pressupe a existncia de parceiros e um conjunto de obrigaes (as regras), o que lhe confere um carter eminentemente social. Em suma, Piaget (1998) assegura que o desenvolvimento do jogo progride de processos puramente individuais e smbolos privados que derivam da estrutura mental da criana e que s por eles podem ser explicados. Com o advento da capacidade de representao, a assimilao fica no s distorcida, mas tambm fonte de deliberados faz de conta. Assim, o jogo de faz de conta leva a criana a rever sua experincia passada para a satisfao do ego mais do que a subordinao realidade. Assim, possvel verificar que para Piaget (1998) a interao social implica transformao e contatos com instrumentos fsicos e/ou simblicos mediadores do processo de ao. Esta concepo reconhece o papel do jogo para formao do sujeito, atribuindo-lhe um espao importante no desenvolvimento das estruturas psicolgicas.

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    1.4.2 Concepes de Vygotsky

    J Vygotsky (1984) classifica o brincar em trs fases. Durante a primeira fase a criana comea a se distanciar de seu primeiro meio social, representado pela me, comea a falar, andar e movimentar-se em volta das coisas. Pode-se dizer que esta fase estende-se at em torno dos sete anos. A segunda fase caracterizada pela imitao, a criana copia os modelos dos adultos. A terceira fase marcada pelas convenes que surgem de regras e convenes a elas associadas. Segundo Vygotsky (1984, p.39), o ldico influencia enormemente o desenvolvimento da criana. atravs do jogo que a criana aprende a agir, sua curiosidade estimulada, adquire iniciativa e autoconfiana, proporciona o desenvolvimento da linguagem, pensamento, interao e da concentrao. Percebe-se com isto que no ato de jogar, o sujeito desenvolve a capacidade imaginativa, possibilitando a construo de relaes entre o imaginrio pleno e o real. Nas consideraes deste importante pesquisador possvel descobrir que a realidade imediata que a criana capaz de construir e nela atuar possibilita ainda o ajuste ao real, acatando-a, negando-a ou modificando-a, atravs de sua capacidade de se interagir e se socializar com o ambiente. Sendo assim, atravs de jogos e brincadeiras a criana tem como possibilidade aquisio de conhecimentos que afetaro em seu crescimento cognitivo. Entender o papel do jogo na aprendizagem requer a percepo de estudos de carter psicolgico, como mecanismos mais complexos, tpicos do ser humano, como a memria, linguagem, ateno, percepo e principalmente: a aprendizagem. Elegendo a aprendizagem como processo principal do desenvolvimento humano, Vygotsky (1984, p. 35) afirma que:

    A brincadeira cria para as crianas uma zona de desenvolvimento proximal que no outra coisa seno a distncia entre o nvel atual de desenvolvimento, determinado pela capacidade de resolver independentemente um problema, e o nvel de desenvolvimento potencial, determinado atravs da resoluo de um problema, sob a orientao de um adulto, ou de um companheiro mais capaz.

    Assim, constata-se que ao brincar a criana se interage com o ambiente e com isto vai construindo novos significados, utilizando para isto seu prprio potencial intelectual. De acordo com este pesquisador no brinquedo que a criana aprende a agir numa esfera cognitiva. A criana comporta-se de forma mais avanada do que

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    nas atividades da vida real, tanto pela vivncia de uma situao imaginria, quanto pela capacidade de subordinao s regras. O jogo e a brincadeira esto presentes em todos as fazes da vida dos seres humanos, tornando especial a sua existncia. De alguma forma o ldico se faz presente e acrescenta um ingrediente indispensvel no relacionamento entre as pessoas, possibilitando que a criatividade aflore, principalmente no ambiente escolar.

    1.4.3 Concepes de Antunes

    Contribuindo para com o trabalho das habilidades da criana, Antunes (1998, p. 13) ao explorar o trabalho do psiclogo Howard Gartner sobre a teoria das Inteligncias Mltiplas3, define a inteligncia humana como sendo uma capacidade de resolver problemas ou de elaborar produtos que sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais ou comunitrios. Para Gartner (2000), a inteligncia abrange uma srie de habilidades onde todos os seres humanos possuem potencialidades, mas por razes genticas e ambientais os indivduos diferem enormemente entre si quanto aos seus perfis intelectuais. Mediante os estudos de Antunes (2003) possvel descobrir que o jogo o mais eficiente meio estimulador das inteligncias, permitindo que o indivduo realize tudo que deseja. Quando joga, passa a viver quem quer ser, organiza o que quer organizar, e decide sem limitaes. Pode ser grande, livre, e na aceitao das regras pode ter seus impulsos controlados. Brincando dentro de seu espao, envolve-se com a fantasia, estabelecendo um gancho entre o inconsciente e o real. Os jogos precisam ser rigorosamente estudados e analisados para serem de fato eficientes, porque aqueles que so ocasionais, e que no passam pela experimentao e pesquisa, so ineficazes. Ao mesmo tempo, uma quantidade exagerada deles sem que estejam devidamente associados aos contedos e aos

    3 Inteligncias mltiplas: Lingustica domnio da expresso com a linguagem verbal, dar arquitetura

    s palavras, usar a linguagem para convencer ou transmitir ideias. Lgico-Matemtica capacidade de raciocnio lgico e compreenso de modelos matemticos; Musical capacidade de compreender os sons; Espacial sentido de movimento, localizao e direo, percepo de objetos; Sinestsica domnio dos movimentos do corpo; Naturalista sensibilidade para aprender os processos da natureza; Intrapessoal capacidade de auto-compreenso e conhecimento de si mesmo; habilidade para ministrar os sentimentos a seu favor; Interpessoal capacidade de se relacionar com o outro, entender reaes e criar empatia. (ANTUNES, 1998, p. 13).

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    objetivos dentro da aprendizagem, tambm no tem nenhuma valia. Podem at partir de materiais que o professor tenha disponvel em sala, porm precisam atentar para a forma como devem ser trabalhados. O professor precisa ter muito mais criatividade, vontade, seriedade, competncia, sensibilidade, que dinheiro. Para Huizinga (APUD ANTUNES, 1998, p. 46) o elemento que separa um jogo pedaggico de um outro apenas de carter ldico quando:

    Provoca aprendizagem significativa, estimula a construo de novo conhecimento e principalmente desperta o desenvolvimento de uma habilidade operatria, ou seja, o desenvolvimento de uma aptido ou capacidade cognitiva e apreciativa especfica que possibilita a compreenso e a interveno do indivduo nos fenmenos sociais e culturais e que o ajude a construir conexes.

    Para o autor, os jogos devem ser utilizados como proposta pedaggica somente quando a programao possibilitar e quando puder se constituir em auxlio eficiente ao alcance de um objetivo, dentro dessa programao. De certa forma, a elaborao do programa deve ser precedida do conhecimento dos jogos especficos, e na medida em que estes aparecerem na proposta pedaggica que devem ser aplicados, sempre com o esprito crtico para mant-los, alter-los, substitu-los por outros ao se perceber que ficaram distantes dos objetivos. Assim, pode-se concluir nos estudos de Antunes que perfeitamente possvel alfabetizar a criana atravs dos jogos, levando o aluno a vivenciar situaes que agucem suas funes cerebrais e abasteam suas memrias de informaes prontas para serem usadas caso necessitem. Mas para utilizar os jogos no planejamento escolar no basta levar um jogo para sala de aula e utiliz-lo como um recurso ldico somente, preciso mais do que isto nesta aplicao pedaggica.

    1.5 O papel do professor alfabetizador na aplicao do ldico

    A ludicidade uma necessidade do ser humano em qualquer idade e no pode ser vista apenas como diverso. O desenvolvimento do aspecto ldico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa sade mental, prepara para um estado interior frtil, facilita os processos de socializao, comunicao, expresso e construo do conhecimento. O profissional envolvido com jogos e brincadeiras no ambiente escolar, de acordo

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    com Negrine (1994, p. 13) deve estar preparado no apenas para atuar como animador, mas tambm como observador e investigador das relaes e acontecimentos que ocorrem na escola. Para uma tarefa desta dimenso social, o indivduo necessita de uma formao slida, fundamentada em trs pilares: formao terica, pedaggica e pessoal. Deste modo, preciso que o educador, alm da prtica tenha tambm uma base terica para que possa se sustentar na aplicao do ldico pois na prtica pedaggica sempre importante utilizar um recurso didtico com uma explicao cientfica comprovando sua eficcia emprica. Segundo Nvoa (1991, p. 34), o sentido de formao profissional implica em entender a aprendizagem numa perspectiva interdisciplinar e como um processo contnuo que requer uma anlise cuidadosa desse aprender em suas etapas, evolues, avanos e concretizaes. Requer tambm redimensionamento dos conceitos que aliceram tal possibilidade de busca na compreenso de novas ideias e valores. A formao ldica de professores , hoje, uma preocupao constante para aqueles que acreditam na necessidade de transformar o quadro educacional presente, pois da forma como ele se apresenta fica evidente que no condiz com as reais necessidades dos que procuram a escola com o intuito de aprender o saber, para que, de posse dele, tenham condio de reivindicar seus direitos e cumprir seus deveres na sociedade. O professor a pea chave desse processo, e deve ser encarado como um elemento essencial e fundamental. Quanto maior e mais rica for sua histria de vida profissional, maiores sero as possibilidades de ele desempenhar uma prtica educacional consistente e significativa. Desse modo, Nvoa (1991, p. 34) evidencia:

    No possvel construir um conhecimento pedaggico para alm dos professores, isto , que ignore as dimenses pessoais e profissionais do trabalho docente. No quer dizer, com isso, que o professor seja o nico responsvel pelo sucesso ou insucesso do processo educativo. No entanto, de suma importncia sua ao como pessoa e como profissional.

    Sob essa perspectiva, o jogo, compreendido sob a tica do brinquedo e da criatividade, dever encontrar maior espao para ser entendido como importante instrumento no processo educacional, na medida em que os professores compreenderem melhor toda sua capacidade potencial de contribuir para com o

  • 17

    desenvolvimento da criana. Importante ressaltar que os jogos, ao serem utilizados pelo educador no espao escolar, devem ser devidamente planejados. Neste enfoque, Antunes (1998, p. 37) destaca que:

    Jamais pense em usar os jogos pedaggicos sem um rigoroso e cuidadoso planejamento, marcado por etapas muito ntidas e que efetivamente acompanhem o progresso dos alunos, e jamais avalie qualidade de professor pela quantidade de jogos que emprega, e sim pela qualidade dos jogos que se preocupou em pesquisar e selecionar.

    Assim, ao incluir no planejamento uma atividade ldica, o professor deve antes adequar o tipo de jogo ao seu pblico e ao contedo a ser trabalhado, para que os resultados venham ser satisfatrios e os objetivos alcanados. Outras consideraes so enfatizadas por Fortuna (2003, p.10) ao trabalho ldico do professor como:

    O professor deve se preocupar em construir uma relao democrtica e respeitosa com as crianas em todas as situaes, principalmente no que diz respeito conservao dos jogos e brinquedos.

    Os jogos devem ser elaborados, junto com as crianas, os combinados e as regras de utilizao e manuteno dos materiais, como por exemplo: quem brincou guarda ou no final da brincadeira todos devem guardar os materiais e at a localizao dos jogos nas estantes.

    Cabe ao educador oferecer materiais variados e interessantes e que, principalmente, estimulem a imaginao infantil.

    Alm dos jogos e brinquedos estruturados (fabricados), sugere-se que o educador incremente este aceso atravs da contribuio de novos jogos, utilizando-se basicamente de sucatas. Estes materiais (que normalmente so descartados como lixo) apresentam uma infinita variedade de cores, formas, texturas e tamanhos e possibilitam que as crianas montem, desmontem, construam (castelos, cabanas, comidinha para o doente, um navio, etc.) e brinquem.

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    O espao da sala ocupada pelas crianas outro ponto que deve ser observado com ateno. interessante que elas tenham rea livre para brincar, assim como opes de mexer no mobilirio, montar casinhas, vendinhas, cabanas, tendas, circo etc.

    A rotina diria e o tempo que as crianas tm disposio para brincar tambm devem ser considerados. Deve-se procurar dar tempo suficiente para que as brincadeiras surjam se desenvolvam e se encerrem.

    O educador no deve ser um mero espectador que apenas intervm em casos de acidentes, brigas ou choros. Nem tampouco ter sempre a iniciativa de propor e coordenar as brincadeiras. necessria certa dose de sensibilidade para saber distinguir em que momentos sua presena mais ativa fundamental (como, por exemplo, para estimular a participao de determinadas crianas ou propor novas brincadeiras) e as ocasies em que prefervel deixar que as prprias crianas interajam, organizem e reinventem as brincadeiras.

    Desta forma, o educador que deseja usar o jogo como ferramenta educacional usar estas observaes, aplicando jogos que suscitem diferentes formas de cooperao entre os alunos, mesclando times e elementos, trabalhando com as lideranas, incentivando desafios e criando situaes que faam florescer as habilidades e competncias dos alunos. De acordo com as pesquisas de Santos (2000), para que o relacionamento entre os alunos na hora do jogo ocorra de forma efetiva preciso que o educador esteja atento, variando os objetivos de forma a requisitar ao mximo o feixe de habilidade de cada um dos alunos, estimulando novas combinaes de foras, novas combinaes de habilidades. Uma vez que o objetivo proposto diferente, a vitria tambm caber a pessoas e times diferentes, o que colabora com o auto-conhecimento e a formao da auto-estima de todos. Ficar clara a situao que cada um tem o seu papel e que cada papel tem a sua importncia e o seu momento.

    2 - METODOLOGIA

    Esta pesquisa define-se como bibliogrfica que segundo Lakatos e Markoni (1993, p.

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    66): trata-se do levantamento, seleo e documentao de toda bibliografia j publicada sobre o assunto que est sendo pesquisado, em livros, revistas, jornais, boletins, monografias, teses, dissertaes (...), com o objetivo de colocar o pesquisador em contato direto com todo material j escrito sobre o mesmo.

    Sendo assim, neste trabalho procurou-se analisar materiais cientificamente j publicados por outros pesquisadores, tendo como mtodo de abordagem o hipottico-dedutivo que de acordo com Silva e Silveira (2007, p. 146) trata-se de uma pesquisa onde se utiliza o: raciocnio lgico ponderado por hipteses. Portanto, os dados foram coletados por meio de literaturas especializadas que viabilizaram o levantamento bibliogrfico e anlise dos dados para possvel alcance dos objetivos deste estudo.

    CONSIDERAES FINAIS

    Conforme o estudo levantado, verificou-se que o jogo sempre esteve presente na vida dos seres humanos, pois se trata de uma atividade necessria, j que permite que a criana expresse seus sentimentos, sejam eles positivos ou negativos. Muitos autores foram destacados neste trabalho comprovando que os jogos e brincadeiras fazem parte do processo de formao do ser humano. Tal evidncia justifica as razes da atividade ldica e sua consistncia no trabalho de alfabetizao da criana. Alm disto, descobriu-se o quanto se faz necessrio obteno de conhecimentos especficos sobre a aplicao da psicologia da educao no ambiente escolar, j que as necessidades especficas de cada fase da criana, muitas vezes modificam o tipo de jogo a ser aplicado na escola. Tais aes partem de uma formao consistente por parte do educador, onde a busca pelo conhecimento atravs da pesquisa e da formao continuada. No basta levar o jogo para sala de aula, sem ter conhecimentos prvios sobre como aplic-lo devidamente, ou seja, com seu devido planejamento voltado para a realidade do alunado, objetivos propostos, critrios avaliativos ps, durante a aps a atividade. S assim, a atividade ldica poder trazer resultados positivos tanto para o professor, quanto para os demais profissionais da instituio. Deste modo, acredita-se que a utilizao de jogos na alfabetizao possa vir a

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    melhorar a forma de: ensinar e aprender. Assim, o jogo, compreendido sob a tica do brinquedo e da criatividade, dever encontrar maior espao para ser entendido como importante instrumento de alfabetizao, na medida em que os professores compreenderem melhor toda sua capacidade potencial de contribuir para com o desenvolvimento da criana. Com os estudos tericos, alcanaram-se os objetivos desta pesquisa, pois se obteve inmeras informaes sobre a contribuio do ldico, no somente no processo de alfabetizao da criana, mas na prpria formao do ser humano. Ao levantar as informaes psicolgicas entre Piaget, Vygotsky e Antunes verificou-se que para Piaget, os jogos adquirem maior significado medida que a criana desenvolve atravs de estgios. Vygotsky assegura que a criana cria a partir do que conhece das oportunidades do meio, em funo de suas necessidades e Antunes, baseado nos estudos de Gartner destaca que a ideia essencial de sua teoria assumir que todo aluno pode expressar saberes atravs de diferentes linguagens e que, se devidamente estimulado, pode explorar sua potencialidade de forma diversificada atravs de atividades ldicas. Assim, na impossibilidade de esgotar o assunto, mas apenas cumprindo o percurso temporal ao qual este trabalho se props no incio de sua caminhada, ao resgatar as contribuies do ldico na educao, pode-se inferir sobre inmeros aspectos que deram sustentao a esta pesquisa. O presente estudo no se esgota, procurou apenas responder as questes e os objetivos do tema proposto. Sugere-se, dessa forma, que outras pesquisas sejam efetuadas no campo da alfabetizao, a fim de complementarem os resultados obtidos neste trabalho.

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